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Poder Judiciário do Estado de Sergipe

2ª Vara Civel de Estância

Nº Processo 201950101331 - Número Único: 0006422-73.2019.8.25.0027


Autor: JOSILEIDE DE FRANCA LIMA SOARES
Réu: ADRIANA ROCHA FONTES

Movimento: Julgamento >> Com Resolução do Mérito >> Procedência

SENTENÇA

I- RELATÓRIO

JOSILEIDE DE FRANÇA LIMA, devidamente qualificada, por intermédio de advogada regularmente


constituída, ingressou em juízo com MANDADO DE SEGURANÇA em face ato de ato da Secretária
Municipal de Educação do Município de Estância, a Sra Adriana Rocha Fontes.

Narra o Impetrante, em síntese, que é servidora pública municipal, ocupante do cargo de Agente
Administrativo, lotada na Secretaria Municipal de Educação do Município de Estância, desde 07 de
janeiro de 2009 e que é casada com Marcos Flaviano Matos Soares, e tem uma filha.

Afirma que a família sempre residiu em Estancia-se, no entanto, seu esposo passou a residir no
Estado do Rio de Janeiro, em virtude de ter sido aprovado em concurso público para o cargo de
Analista de Tecnologia da Informação da Empresa Pública Federal DATAPREV.

Diante desse fato, a impetrante aduz que resolveu gozar das licenças que já tinha direito. Assim, gozou
licença prêmio de três meses no período de 28/12/2016 a 27/03/2017e licença para tratar de interesses
particular, pelo período de 08/09/2017 a 09/09/2019.

Relata que, antes de finalizar a última licença, em 26/07/2019, requereu Licença sem Remuneração por
motivo de Afastamento do Cônjuge, com fulcro na Lei Complementar n. 16/2007- Estatuto dos
Servidores Públicos Municipais, contudo, o mesmo foi indeferido sob alegação de que a servidora não
se enquadra nos requisitos legais para a concessão da licença pretendida, visto que o afastamento
do cônjuge se deu em virtude de provimento originário, fundamentando sua decisão no art. 84 § 2º
da Lei Federal 8.112/90.

Requer a concessão da segurança reclamada para liminarmente ter deferida a licença sem
Remuneração por Motivo de Afastamento do Cônjuge.

Após a manifestação da autoridade coatora, pede a confirmação da liminar pleiteada,


encerrando-se o processo com a resolução do mérito

Juntou documentos.

Decisão proferida em 08/10/2019 indeferiu o pedido liminar.

Assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância,
em 14/02/2020 às 18:05:28, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
Conferência em www.tjse.jus.br/portal/servicos/judiciais/autenticacao-de-documentos. Número de Consulta: 2020000353637-19. fl: 1/5
Manifestação Municipal adunada em 18/12/2019 alegando a ausência de direito líquido e certo. Alega
que, no caso em comento, o esposo da servidora realizou o concurso público para cargo de provimento
originário no Município de Rio de Janeiro/RJ, ou seja, não houve deslocamento.

Manifestação Ministerial adunada em 09/01/2020, pela não intervenção na lide.

Conforme certidão do dia 04/02/2020, transcorreu o prazo de 10 dias sem que houvesse manifestação da
autoridade coatora, apesar de devidamente intimada em 05/11/2019.

Manifestação da impetrante em 10/02/2020. Alega que o direito pretendido pela impetrante trata de
direito público subjetivo, sendo já concedido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe em
sede de Agravo de Instrumento n. 201900831925.

Em seguida vieram-me conclusos.

É o relatório.

DECIDO

Cuida-se de Mandado Segurança impetrado contra ato de autoridade pública que negou pedido de Licença
sem Remuneração para Acompanhamento do Cônjuge.

A autoridade administrativa fundamentou sua decisão na suposta inobservância do art. 141 da LC


municipal nº 16/2007, uma vez que o cônjuge da requerente não foi deslocado pela Administração, mas
sim tomou posse em cargo público após aprovação em concurso público, portanto em vínculo público
originário.

De partida, importa trazer à baila algumas digressões sobre a via eleita pela ora requerente.

O Mandado de Segurança é garantia prevista expressamente no art. 5º, inciso LXIX , da Constituição
Federal, e tem seu processamento disciplinado pela Lei nº 12.016 /2009.

Na via mandamental, o direito líquido e certo que se almeja proteger e a ilegalidade ou abusividade que
pretende ver afastada do ordenamento jurídico devem estar plenamente demonstrados de plano. Destaco,
in verbis:

Art. 5º (…) LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

O direito líquido e certo a que alude a Constituição, portanto, é aquele que se mostra inequívoco,
concreto, comprovado de plano, sem necessidade de dilação probatória. Na lição do mestre Hely Lopes
Meirelles, em sua obra MANDADO DE SEGURANÇA, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de
Injunção, Habeas Data , 14ª Edição, 1992, pág. 25:

"...o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e
trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for
duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos
ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios
judiciais."

Feitas as considerações precedentes, passo à análise da existência do direito líquido e certo pretendido
pela impetrante.

Analisando os fatos narrados na peça exordial, vejo que o impetrante pretende ter reconhecido seu
suposto direito de gozar de licença sem Remuneração por motivo de Afastamento do Cônjuge, com
fulcro na Lei Complementar n. 16/2007- Estatuto dos Servidores Públicos Municipais.

Assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância,
em 14/02/2020 às 18:05:28, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
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Vejo ainda que pleito fora indeferido administrativamente pela autoridade coatora, nos termos do
doc. De fls. 17/22 do processo materializado.

Pois bem.

A licença por Motivo de Afastamento do Cônjuge encontra respaldo legal na Lei Complementar
nº16/2007, no Capítulo VI que trata das Licenças, especificamente nos artigos 119 e 141:

Art. 119 Conceder-se-á Licenças:

(...) X- por motivo de afastamento do Cônjuge;

Art. 141- Poderá ser concedida licença ao servidor efetivo para acompanhar cônjuge ou
companheiro, servidor ou militar, que for deslocado para exercer suas atividades fora do
Município.

Parágrafo único- A licença será sem remuneração e não ultrapassará o prazo de 48 (quarenta e
oito) meses.

Trago à colação, ainda, o regramento da licença em comento na esfera federal.

A licença por motivo de afastamento do cônjuge está amparada pelo princípio constitucional da proteção
da unidade familiar e tem previsão no art. 84, da Lei 8.112/90:

Art. 84. Poderá ser concedida licença ao servidor para acompanhar cônjuge ou companheiro
que foi deslocado para outro ponto do território nacional, para o exterior ou para o exercício
de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo.

§ 1o A licença será por prazo indeterminado e sem remuneração.

§ 2o No deslocamento de servidor cujo cônjuge ou companheiro também seja servidor público,


civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, poderá haver exercício provisório em órgão ou entidade da Administração Federal
direta, autárquica ou fundacional, desde que para o exercício de atividade compatível com o
seu cargo.

Neste contexto, destaca-se uma diferenciação entre a licença estipulada no §1º, art. 84 e aquela disposta
no §2º do art. 84, ambas oriundas na Lei 8112/90. Com relação à primeira, contempla a hipótese de
licença do servidor por motivo de afastamento do seu cônjuge ou companheiro, que sequer precisa
ser servidor público.

Isto posto, vejo que, quanto às normas que regem a matéria, a Lei Complementar nº16/2007 não
disciplina expressamente a possibilidade de concessão de licença sem remuneração para
acompanhamento de cônjuge, apenas trata de afastamento de cônjuge servidor público ou militar,
também disciplinada pelo art. 84, 2º do art. 84 da Lei 8112/90.

Dessa forma, seguindo precedente do STJ e em reforma do entendimento anterior, deve ser aplicada a
norma geral dos servidores públicos civis federais referente à licença em questão, em atenção à proteção
especial atribuída pela Lei Maior à família.

Nesse sentido:

Assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância,
em 14/02/2020 às 18:05:28, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
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MANDADO DE SEGURANÇA. BOMBEIRO MILITAR DO DISTRITO FEDERAL. LICENÇA
PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NO ESTATUTO MILITAR
PRÓPRIO. LEI 8.112/90. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. POSSIBILIDADE. PROTEÇÃO À
FAMÍLIA ASSEGURADA CONSTITUCIONALMENTE. 1. O Estatuto do Corpo de Bombeiros
Militar do Distrito Federal não disciplina expressamente a possibilidade de concessão de licença sem
remuneração para acompanhamento de cônjuge que foi transferido ex officio para local diverso de onde
exercia suas atribuições. 2. O Estatuto dos Militares das Forças Armadas (Lei n. 6.880/80), a qual o
Recorrente busca aplicação subsidiária, é anterior à Constituição Federal, que disciplina, em seu art. 226,
a família como base da sociedade, atribuindo-lhe especial proteção do Estado, cabendo a este último a
competência de desenvolver políticas que salvaguardem esse instituto. 3. Dessa forma, impõe-se a
aplicação da norma geral dos servidores públicos referente à licença em questão, como medida necessária
à concretização da proteção especial atribuída pela Carta Magna à família. 4. Recurso voluntário e
Reexame Necessário conhecidos e desprovidos. (TJ-DF 07151420720188070000 DF
0715142-07.2018.8.07.0000, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de Julgamento:
30/01/2019, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/02/2019 . Pág.: Sem Página
Cadastrada.)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. Servidora da LEMEPREV.


Procuradora da autarquia. Pedido de licença para tratar de interesse particular, pelo período de 2 anos e
sem remuneração. Liminar indeferida. Inadmissibilidade. Licença para acompanhar o cônjuge, que foi
transferido para a Espanha, desde setembro de 2017. Direito constitucional à proteção da família e
da criança. Inteligência dos arts. 226 e 227, da CF. Presentes os requisitos do art. 7º, III, da Lei n.
12.016/09. Decisão agravada reformada. Recurso provido. (TJ-SP 20375714420188260000 SP
2037571-44.2018.8.26.0000, Relator: Paulo Galizia, Data de Julgamento: 16/07/2018, 10ª Câmara de
Direito Público, Data de Publicação: 17/07/2018)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR


PÚBLICO ESTADUAL. POLICIAL CIVIL. INDEFERIMENTO DE LICENÇA SEM
REMUNERAÇÃO PARA TRATAMENTO DE INTERESSES PARTICULARES.
ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE EM VIAGEM PARA O EXTERIOR. AUSÊNCIA DE ÔNUS
AO PODER PÚBLICO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO À FAMÍLIA. ART. 226 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES DO STJ. LIMINAR CONCEDIDA. RECURSO
PROVIDO. A jurisprudência do STJ, em situações em tudo análogas à presente, admite a concessão
de licença a servidor para acompanhar cônjuge deslocado para outro ponto do território nacional,
por tempo indeterminado e sem remuneração, independentemente de aquele que for deslocado ser
servidor público ou não, em homenagem à proteção da unidade familiar insculpida no art. 226 da
CF. Cabível, na hipótese, a interpretação analógica da Lei 8.112/1990, na ausência de disposição em
norma municipal. (TJ-SC - AI: 40207604520188240900 Capital 4020760-45.2018.8.24.0900, Relator:
Pedro Manoel Abreu, Data de Julgamento: 12/02/2019, Primeira Câmara de Direito Público)

Ademais, ressalta-se que a concessão de licença vindicada pela impetrante não importará em ônus ao
Poder Público, vez que, como se disse, se dará sem vencimentos.

Assim, restando provado o afastamento do cônjuge da autora, conforme documento de fls. 08/11 do
processo materializado, bem como observando-se o posicionamento firmado pelo Superior Tribunal
de Justiça, no sentido de que a licença para acompanhar cônjuge, sem remuneração, é um direito
assegurado ao servidor público, e, ainda, que a Constituição Federal, no art. 226, determina que a
família deve merecer especial proteção do Estado, entendo que a segurança deve ser concedida.

III- DISPOSITIVO

Assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância,
em 14/02/2020 às 18:05:28, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
Conferência em www.tjse.jus.br/portal/servicos/judiciais/autenticacao-de-documentos. Número de Consulta: 2020000353637-19. fl: 4/5
Diante do exposto, CONCEDO a SEGURANÇA pretendida para determinar à autoridade coatora
que conceda à impetrante licença sem remuneração para acompanhar o cônjuge com fulcro no
art. 84, §1º da Lei 8.112/90, com efeitos retroativos a 09/09/2019.

CONDENO a impetrado ao pagamento das custas processuais.

Sem condenação em honorários, face ao disposto no art. 25 da Lei 12.016/2009.

P.R.I, sendo a parte ré, pessoalmente.

Certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se com as cautelas de praxe.

Estância/SE, 11 de fevereiro de 2020.

Documento assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE


ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância, em 14/02/2020, às 18:05:28,
conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.

A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico


www.tjse.jus.br/portal/servicos/judiciais/autenticacao-de-documentos, mediante
preenchimento do número de consulta pública 2020000353637-19.

Assinado eletronicamente por TATIANY NASCIMENTO CHAGAS DE ALBUQUERQUE, Juiz(a) de 2ª Vara Civel de Estância,
em 14/02/2020 às 18:05:28, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.
Conferência em www.tjse.jus.br/portal/servicos/judiciais/autenticacao-de-documentos. Número de Consulta: 2020000353637-19. fl: 5/5

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