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Pikler e o Ar Livre
Pikler e o Ar Livre
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DESENVOLVIMENTO DE CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Resumo: Este artigo resulta de um estudo teórico, cujo objetivo foi compreender as
implicações do brincar livre, na perspectiva de Emilie Pikler, para o desenvolvimento
de crianças no contexto da educação infantil. Foi utilizada como proposta
metodológica a pesquisa bibliográfica, priorizando-se discussões relacionadas à
abordagem em que a criança é colocada no centro do seu processo de
aprendizagem. Assim, os principais descritores foram: brincar livre, educação infantil
e Emilie Pikler, a partir de bases científicas como: Scielo e Pepsic. Também foi
analisado o conteúdo de três importantes livros sobre o tema. As principais
discussões sugerem que o brincar livre é de suma importância e traz ganhos
indispensáveis para as crianças. Portanto, tendo em vista que não existem muitos
estudos que abordam essa vertente, este trabalho apresenta relevância na área da
Psicologia, por destacar, a partir de análise crítica, o quanto o brincar livre contribui
para o desenvolvimento infantil, ressaltando-se os aspectos cognitivo, motor e
social.
Abstract: This article is the result of a theoretical study, whose objective was to
understand the implications of free play, from Emilie Pikler's perspective, for the
development of children in the context of early childhood education. Bibliographic
research was used as a methodological proposal, prioritizing discussions related to
the approach in which the child is placed at the center of their learning process.
Thus, the main descriptors were: free play, early childhood education and Emilie
Pikler, based on scientific bases such as: Scielo and Pepsic. The content of three
important books on the subject was also analyzed. The main discussions suggest
that free play is of paramount importance and brings indispensable gains for children.
Therefore, considering that there are not many studies that address this aspect, this
work is relevant in the area of Psychology, by highlighting, from a critical analysis,
how much free play contributes to child development, emphasizing the cognitive
aspect. , motor and social.
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Trabalho apresentado como requisito parcial de avaliação para obtenção do título de bacharel no curso de
Psicologia do Centro Universitário Una, sob orientação da professora Dra. Fabíola Fernanda Patrocínio Alves.
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Graduanda em Psicologia no Centro Universitário Una. E-mail: alinevasconcelosc@hotmail.com
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Graduando em Psicologia no Centro Universitário Una. E-mail: fernanndo181197@hotmail.com
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Graduando em Psicologia no Centro Universitário Una. E-mail: rodrigobritobh31@gmail.com
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I - INTRODUÇÃO
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abordagem teórica, que é o tema deste trabalho; a quarta seção será abordada uma
contextuação da história da educação infantil. Na sequência, a seção 5 se propõe a
discutir as contribuições do brincar livre, teorizado por Emmi Pikler, para as crianças
na perspectiva da educação infantil. Por fim, serão pontuadas as considerações
finais do estudo.
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2 METODOLOGIA
Além disso, pensando em uma apuração de dados que preze pela qualidade
das informações dentro da pesquisa bibliográfica, a abordagem qualitativa foi a que
se apresentou mais em sintonia com o tema de discussão escolhido. De acordo com
Minayo (2001), “a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, [...]
o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis” (p. 14).
Dessa forma, fizemos uma pesquisa bibliográfica com enfoque em materiais de
estudo qualitativos.
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3 EMILIE PIKLER
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O primeiro princípio é a base de todos os outros, o profundo respeito pelo
bebê e sua individualidade, reconhecendo-o como sujeito de direitos, desejos e
escolhas. Emmi Pikler acreditava que ao invés de lidar com o bebê como um objeto
a ser manipulado, que recebe as ações do adulto passivamente, como
majoritariamente via acontecer, o bebê deveria ser tratado como participante e
colaborador, seja nos momentos de higiene, alimentação ou afeto. Quando o adulto
comunica o que está acontecendo, narra passo a passo, oferece oportunidades de
escolha e posicionamento, percebe com atenção os sinais do bebê e adapta suas
respostas de acordo, ele “para de fazer as coisas para o bebê ou pelo bebê e passa
a fazer as coisas com o bebê” (FALK, 2003 apud DALLEDONE; COUTINHO, 2020,
p. 53). Seguindo o mesmo viés de pensamento:
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É crucial que a criança descubra por si mesma tanto quanto possível. Se a
ajudamos a finalizar cada tarefa a estamos privando do mais importante
aspecto de seu desenvolvimento. Uma criança que consegue as coisas por
meio da experimentação independente, adquire um tipo de conhecimento
completamente diferente daquela criança para a qual são oferecidas
soluções prontas (PIKLER apud KÁLLÓ; BALOG, 2021, p. 6).
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resultado de sua ação; aprende a sentir os limites de suas possibilidades, a
modificar seu movimento, seus atos; aprende a aprender. Numa palavra: o
bebê desenvolve sua competência, reforça sua exigência de competência
(FALK; TARDOS, 2022, p. 58).
Deste modo, para o bebê conseguir usufruir dessa autonomia que foi citada,
ele precisa sentir-se seguro dentro da relação que o liga ao adulto, portanto, este
vínculo deve ser profundo e afetivo, proporcionando um bom estado emocional. Para
isso, o responsável deve conhecer a criança, seus gostos, preferências e as
condições necessárias para oferecer recursos a serem explorados, além de saber
dosar a relação entre dependência e autonomia. “É o adulto quem cria e modifica
para o bebê e a criança as possibilidades materiais do comportamento competente,
um ambiente sem perigos que proporciona a ocasião de atuar” (FALK; TARDOS,
2022, p. 63). Por conseguinte:
Quando o adulto coloca o bebê numa posição que ele ainda não conquistou
sozinho (o senta quando ainda não sabe se levantar e voltar ao chão) para
o bebê, o torna inativo, desajeitado (torna-o incompetênte); quando o distrai
com o brinquedo ou o incita a mover-se, a brincar, não só perturba a
situação de autonomia, como também incrementa artificialmente, a
dependência atual do bebê e se torna indispensável para ele. Propondo-lhe
coisas que estão acima de suas forças e competências, o bebê terá
necessidade da ajuda do adulto. [...]
Entretanto, a atitude de apoiar por parte do adulto, a atividade autônoma,
em particular a organização do cotidiano e do espaço material, é mais
essencial do que a falta de intervenções supérfluas e inoportunas (FALK;
TARDOS, 2022, p. 62).
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primeiras representações mentais do bebê, que são a base do pensamento, fazendo
com que, com o tempo e a repetição dessas ações, elas se tornem previsíveis, além
das codificações e decodificações de gestos e sinais, que se transformarão, ao
longo prazo, na linguagem verbal. Somado a isso, Emmi Pikler enfatizava a
importância da interação com o bebê ser extremamente delicada, cuidadosa e
consciente, com concentração, olho no olho, diálogos com tom de voz ameno, com
intervalos de silêncio para dar espaço às reações e um ritmo compatível, sempre
considerando-o como protagonista da ação. É nesse vínculo, também, que o bebê
se insere na cultura e aprende o que é comunicar-se e relacionar-se (SOARES,
2020, p. 24). Assim sendo:
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interesses, limites, necessidades e desenvolve a imaginação, com base nas suas
vivências. Diante desses aspectos a autora problematiza como título desta
publicação: “Brincar Livre? Livre de quê? Livre de quem?”, com a intenção de
ressaltar a necessidade dessa autocrítica nos educadores e estudiosos da infância,
pois essa liberdade também necessita de observação, planejamento e cuidado.
Concordando com este pensamento, Suzana Macedo Soares diz que:
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4 EDUCAÇÃO INFANTIL
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anos: a primeira etapa é caracterizada como creche e não é obrigatória, englobando
crianças de zero a cinco anos; a segunda etapa é chamada pré-escola e é
obrigatória, envolvendo crianças de quatro a seis anos (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2018).
Em 1998, o Ministério da Educação (MEC) publicou o Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), com o intuito de orientar os professores
em suas práticas educativas e definir os objetivos gerais da Educação Infantil. Em
âmbito geral, o documento é dividido em três partes. A primeira apresenta uma
reflexão sobre o contexto das creches e pré-escolas da época, englobando a
concepção de criança, de educação, de instituição e do profissional, que orientaram
a organização das discussões subsequentes, sobre eixos de trabalho. A segunda
parte é relativa ao âmbito de experiência chamado “Formação Pessoal e Social”,
que favorece, majoritariamente, o processo de construção da autonomia e
identidade das crianças. Por outro lado, a terceira parte é relativa ao âmbito de
experiência e é definida como “Conhecimentos de Mundo”, que agrega na
construção das diferentes linguagens pelas crianças e também nas relações que
elas estabelecem com os objetos que estão conhecendo (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 1998). Este documento foi de suma importância para a época, pois,
por muitos anos, as creches e as pré-escolas recebiam as crianças sem nenhum
objetivo emancipatório, apenas assistencialista. Todavia, serviu como um guia em
relação a conteúdo e objetivos de aprendizagem, mas não colocou a criança como
protagonista, considerando-a alguém que apenas responde aos estímulos dados
pelos adultos, recebendo passivamente tudo que lhe é depositado.
Em 2010, o MEC publicou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI), com o objetivo de nortear o que deve ser observado na
elaboração de propostas pedagógicas desse grupo. Este documento ampliou a
concepção que, comumente, abrangia a criança, considerando-a como um sujeito
complexo e central do próprio processo de aprendizagem, ao mesmo tempo em que
entende as interações sociais como condições importantes e essenciais, tais como
as brincadeiras, o contato com a natureza e com a cultura (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2010). Dessa maneira, as DCNEI definem a criança como:
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imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona
e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2010, p. 12).
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dança, teatro, poesia e literatura;
Promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento da
biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não
desperdício dos recursos naturais;
Propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifestações e
tradições culturais brasileiras;
Possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores,
máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2010, p. 25-27).
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de linguagens variadas, seus desejos, necessidades, sentimentos, emoções,
dúvidas, opiniões e hipóteses. Conhecer-se, reconhecer-se e construir sua
identidade de forma positiva (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2018, p. 38).
Somado a isso, para assegurar à criança o cumprimento desses direitos, a
organização curricular da Educação Infantil na BNCC está estruturada em cinco
campos de experiência, os quais definem de forma didática quais são os objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento. Esses campos são:
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infância como etapa da vida essencial essencial na formação do indivíduo na
sociedade. Contudo, ainda existem muitos espaços escolares que preservam uma
concepção reducionista de infância e, por essa razão, apresentam dificuldades para
implantar uma proposta pedagógica que considere a liberdade, autonomia e
capacidade de criação das crianças.
Acreditamos que as propostas oficiais evidenciadas nos documentos legais
mencionados sugerem princípios fundamentais para a organização da educação
infantil. Tais princípios visam à emancipação das crianças e vem ao encontro da
concepção do “brincar livre” proposto por Pikler. Deste modo, discutiremos como as
ideias de Pikler favorecem o desenvolvimento das crianças no âmbito da Educação
Infantil.
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5 IMPLICAÇÕES DO BRINCAR LIVRE NA EDUCAÇÃO INFANTIL
O brincar livre, como já foi mencionado, é um conceito que Emmi Pikler usou
para defender a liberdade da criança. Os autores clássicos que dialogam sobre a
infância, como Vygotsky, Piaget, Anna Freud, Wallon e Melanie também defendem
esse campo da liberdade. Portanto, questionam a tradição histórica em que a
criança foi silenciada e submetida, reafirmando que a criança constrói sua própria
autonomia. Contudo, embora concordemos com as contribuições relevantes desses
autores, este trabalho se dedica a uma perspectiva teórica específica e, assim,
seguiremos com as discussões a partir da autora Emmi Pikler, no contexto da
educação infantil.
Considerando nosso objeto de pesquisa, a presente seção abordará três
importantes âmbitos do desenvolvimento infantil: motor, cognitivo e social. É
importante ressaltar que, na prática, esses três campos são estimulados
simultaneamente, a separação neste trabalho é feita somente para fins didáticos.
Dessa forma, as considerações feitas para uns, automaticamente, servem para os
outros.
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5.1 Desenvolvimento motor
Figura 1
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média, apenas vinte minutos para esses momentos livres, colocando como
prioridade do resto do tempo atividades nas quais as crianças ficam sentadas em
fileiras dentro da sala de aula. Jussara Miller, professora de dança em Campinas,
em entrevista para o programa “Território do Brincar”, que reúne documentários e
trabalhos que difundem a cultura infantil, afirma que, na sua experiência “o
movimento, em muitas realidades escolares, é sinônimo de indisciplina, então, uma
classe disciplinada é uma classe em não movimento” (MILLER, 2019). Seguindo o
mesmo pensamento, no livro “Abordagem Pikler - educação infantil”, Anna Tardos
relata que:
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aspectos que potencializam o desenvolvimento emancipatório.
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5.2 Desenvolvimento cognitivo
Figura 2
A figura 2 expressa uma criança brincando com um telescópio feito por ela
mesma utilizando madeira, fita e papelão. Para o desenvolvimento cognitivo, Pikler
entende que o brincar livre proporciona experiências que auxiliam na formação da
identidade, personalidade, autonomia, atenção, imaginação, memória, imitação,
interação, criatividade, percepção, associação, raciocínio, etc. Para isso, o adulto
não precisa, necessariamente, oferecer brinquedos, prontos, capitalizados, para que
a criança se interesse e crie seu “faz de conta”. Existem outras formas de convite ao
brincar livre, como a brincadeira heurística, que acontece por meio de objetos não
estruturados, como carretéis, rolhas de vinho, argolas, esponjas, tecidos, areia,
terra, caixas de papelão e tudo aquilo que, mesmo com outra função pré-definida, é
colocado para a criança como possibilidade de criação (SILVA, 2013).
No livro “As origens do brincar livre”, de Éva Kálló e Györgyi Balog há um
relato sobre a observação de uma educadora perante o brincar de uma criança
pequena:
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vermelho observa, até que o verde fique descoberto. Depois, retorna a
cobri-lo novamente com o vermelho e repete o processo com muito cuidado,
deixando que o pote vermelho apareça e desapareça oito vezes. Denovo,
descansa; porém, mantém o verde em sua mão. Na sequência, pega o
vermelho novamente, coloca os potes um em cima do outro; logo um dentro
do outro, então, os agita provocando a queda do menor. Na continuação
busca um pote ainda menor, encaixa os três, um dentro do outro e os agita
até que os dois menores caiam. Repete esse processo várias vezes. Essa
brincadeira de Lívia durou cinco minutos. Nesse tempo, seu prazer e
interesse foram evidentes pela expressão de seu rosto (KÁLLÓ, BALOG,
2021, p. 48-49).
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5.3 Desenvolvimento social
Figura 3
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estética e interessante de oferecer a atividade que envolverá o brincar livre. Em
relação ao convite às artes plásticas, por exemplo:
Embora os primeiros traços que as crianças façam no papel possam não ter
sentido algum para os adultos, essas garatujas são partes importantes do
desenvolvimento e devem ser encorajadas. O tato e a manipulação dos
materiais artísticos já constituem, por si só, uma aprendizagem
(LOWENFELD apud SOARES, 2020, p. 69).
Dito de outro modo, mesmo que os adultos não dêem a devida importância às
produções das crianças, esses materiais são expressivos, são arte e comunicam o
que estão vivenciando naquele momento. Em resumo:
(...) como benefícios do brincar livre temos uma lista enorme. A interação
com o meio promove descobertas incríveis, principalmente se a criança tiver
oportunidade de observar, explorar e experimentar as possibilidades de
corpo e alma. Ao pular, correr, subir, descer, cavar, fazer castelos, amarrar
cordas, fazer experimentos e experiências, ela desenvolve a motricidade
ampla e fina, o equilíbrio, a destreza, a força, a coragem e a autoconfiança.
(...) Se ela puder criar, imaginar e fantasiar isso contribuirá para o
desenvolvimento da criatividade, da resiliência e da autoestima. Se a
brincadeira acontece em grupo, ela ainda favorece a capacidade de
socialização e tudo que deriva dela: empatia, respeito, coletividade e o
desenvolvimento ético e moral. (...) E se a gente proporcionar a brincadeira
livre ao ar livre, em contato com a natureza, ainda contribuímos para a
saúde física das crianças e para a formação de seres que que respeitam o
meio ambiente por se verem parte dele. (...) E é por isso tudo e por trazer
felicidade às crianças que o “brincar livre” se faz cada vez mais urgente e
necessário à infância. Brincar? Sim, só brincar! (HORTA, 2017, p. 101).
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
Diálogos do Brincar - 'A Escuta do Corpo para Crianças', com Jussara Miller.
Publicado pelo canal Território do Brincar. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=-bxCYiI11ew&t=2962s. Acesso em outubro de
2022.
FALK, J (org). Abordagem Pikler: educação infantil. 3ª edição. São Paulo: Editora
Omnisciência, 2022.
HORTA, Carolina. Brincar livre? Livre de quê? Livre de quem?. In: PELLEGRINI, F;
BARRETO, M. Beagá pra brincar: passeios, natureza, cultura e diversão em família.
1ª edição. Belo Horizonte: Editora Scrittore, 2017, p. 100-101.
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acadêmicos. São Paulo: Atlas, 2001.
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