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Fisiologia do Sistema Digestório

Conteudista: Prof.ª Dra. Tábata de Paula Facioli Marinheiro


Revisão Textual: Esp. Laryssa Fazolo

Objetivos da Unidade:

Compreender o funcionamento fisiológico básico do sistema digestório;

Conhecer as principais respostas desse sistema diante das exigências


físicas.

ʪ Contextualização

ʪ Material Teórico

ʪ Material Complementar

ʪ Referências
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ʪ Contextualização

A Fisiologia do Sistema Digestório, tópico abordado nesta unidade, dedica-se a estudar os


mecanismos que o corpo humano utiliza para absorver nutrientes a partir de alimentos
complexos para a utilização e bom funcionamento do organismo. O entendimento desse sistema
em repouso e também diante de situações de maiores exigências físicas, como durante a
prática de exercício físico, é relevante. Durante o exercício físico, por exemplo, necessitamos
de um maior aporte energético para manutenção do desempenho atlético, o que está
diretamente relacionado ao sistema digestório. E, além disso, atualmente, devido à maior
incidência de obesidade na população, o entendimento de como o sistema digestório funciona
em repouso vem apresentando uma maior relevância, principalmente pelo fato de a obesidade
estar relacionada ao desenvolvimento de outras doenças graves. 

A obesidade ocorre quando a ingestão calórica é maior que o dispêndio de energia. Duas
ferramentas são essenciais no combate à obesidade: a reeducação alimentar e a prática
de exercício físico. Nesse sentido, tanto o sedentarismo quanto um desequilíbrio na
alimentação, mas também a presença de doenças metabólicas como, por exemplo, diabetes tipo
II e dislipidemia, que podem ser decorrentes da obesidade, exigem um trabalho
multiprofissional da área da saúde, a fim de combater os fatores que estão relacionados à
obesidade e proporcionar uma melhora na qualidade de vida e controle das doenças. Portanto,
ao final desta unidade, entenderemos como o corpo absorve nutrientes, as quantidades diárias
necessárias e como o exercício físico pode regular a ingestão calórica.
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ʪ Material Teórico

Introdução ao Sistema Digestório


Há muitos e muitos anos, muito antes de comida congelada, micro-ondas e fast food existirem,
o ato de se alimentar era um dos maiores desafios dos seres humanos. Era preciso caçar,
preparar e criar métodos para conservar os alimentos, tendo disponíveis poucos utensílios. A
fome e a necessidade de se alimentar fez com que os seres humanos primitivos criassem
utensílios que tornariam o ato de se alimentar menos difícil. Com o desenvolvimento de novas
armas, foi mais fácil prover alimentos, as comunidades puderam se desenvolver e se organizar
melhor. A necessidade de se alimentar também estipulava os locais que seriam habitados, as
pessoas procuravam locais onde a disponibilidade de alimentos era maior. Uma das maiores
revoluções, durante o desenvolvimento dos humanos, foi a técnica de cultivo. Eles perceberam
que, se plantassem e cuidassem daquela semente, mais alimento estaria disponível. 

E é por meio da alimentação que conseguimos energia para manter o funcionamento dessa
poderosa máquina que é o organismo humano. Sem a energia que é obtida por meio da
alimentação, nenhum outro sistema conseguiria realizar suas funções fisiológicas
adequadamente. Além de todos os processos de transformação que acontecem quando o
alimento é transformado em energia, o sistema digestório também tem importante papel em
manter o balanço entre fome e saciedade. A sensação de fome é um poderoso mecanismo para a
conservação da vida, assim como a sensação de saciedade. Nesse sentido, a alimentação é a base
para se ter uma vida saudável. Porém, hoje em dia, com a vida moderna, está cada vez mais difícil
manter uma alimentação saudável e equilibrada e, consequentemente, manter esse poderoso
sistema funcionando adequadamente. 

Organização do Sistema Digestório


Quando nos alimentamos, estamos ingerindo diferentes substâncias necessárias para o bom
funcionamento do organismo, tais como vitaminas, aminoácidos, íons, açúcares. Para que essas
substâncias sejam absorvidas pelo organismo, é necessário que o alimento seja processado. O
sistema digestório é o sistema responsável pelo processamento, absorção e excreção dos
alimentos. Diferente de outros sistemas do organismo humano, como o respiratório, que só
compreende um órgão, o sistema digestório envolve muitos órgãos e todos precisam estar em
perfeito funcionamento para que os alimentos sejam devidamente digeridos.

Os principais órgãos do sistema digestório são: boca, esôfago, estômago, intestino delgado e
grosso. De forma geral, o sistema digestório pode ser divido em três partes funcionais: 

Transporte dos alimentos;

Digestão;

Absorção e excreção.

A boca e o esôfago são responsáveis pelo transporte do alimento até o estômago, onde ele
começará a ser digerido e quebrado em partículas menores. Após ser processado, o alimento se
transforma em macromoléculas e depois micromoléculas que serão digeridas e absorvidas no
intestino. Por outro lado, o que não for necessário para o corpo será excretado. 

As principais macromoléculas ingeridas por meio da alimentação são os carboidratos


(polissacarídeos), as gorduras e as proteínas. São essas moléculas que sofrerão ação de enzimas
digestivas e se tornarão micromoléculas. Além disso, para que o alimento seja processado, são
necessárias diferentes substâncias e enzimas, que variam de acordo com o tipo de alimento
ingerido. Essas substâncias são produzidas por outros órgãos, acessórios do sistema digestório,
como o pâncreas, o fígado, a vesícula biliar e as glândulas parótida e salivar (Figura 1). 
Figura 1 – Visão geral do sistema digestório
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011

Boca
A principal função da boca é, por meio dos dentes, quebrar o alimento em partes menores. Além
da trituração exercida pelos dentes, a boca também tem a função de umedecer o bolo alimentar.
As glândulas parótidas e salivares secretam a saliva, que irá umedecer o bolo alimentar,
ajudando no transporte através do esôfago. A saliva contém uma enzima chamada amilase
salivar (chamada também de ptialina) que tem como função converter o amido em maltose,
atuando assim na digestão de polissacarídeos (carboidratos). Os polissacarídeos são as únicas
macromoléculas que têm a digestão iniciada ainda na boca. 

Você Sabia?
Para secretar saliva, as glândulas não precisam do estímulo mecânico
da mastigação, apenas o estímulo visual e olfativo de ver e sentir o
cheiro do alimento já é suficiente para fazer as glândulas secretarem
saliva. É o famoso “isso me deu água na boca”!

Faringe/Esôfago 
A deglutição envolve diversos mecanismos que são importantes para que o alimento passe da
cavidade bucal para a faringe e, em seguida, para o esôfago, sem que a respiração seja
atrapalhada ou que haja o refluxo do alimento para o nariz e para traqueia. Os principais
envolvidos nesse mecanismo são os receptores epiteliais da deglutição, que estimulam as
contrações musculares faríngeas automáticas, os nervos vago, trigêmeo, glossofaríngeo e a
epiglote (Figura 2). 

De forma resumida, a deglutição começa com o fechamento da traqueia, seguido pela abertura
do esfíncter superior do esôfago. Então, a onda peristáltica criada pelos nervos da faringe
empurra o bolo alimentar para a parte superior do esôfago. O processo todo, em média, dura
apenas 2 segundos.
Glossário
Deglutição: ato de engolir os alimentos; é uma ação automática
comandada pelo tronco cerebral e que visa a transportar o bolo
alimentar da boca para o esôfago.

Figura 2 – Mecanismo da deglutição


Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011
Esôfago 
O esôfago mede aproximadamente 25 centímetros de comprimento e 3 centímetros de diâmetro.
Para realizar sua função de transportar o bolo alimentar da cavidade bucal até o estômago, o
esôfago exerce o movimento de peristaltismo, esse movimento acontece graças à camada
muscular ali presente. No primeiro terço do órgão, o tecido muscular é composto pelo músculo
estriado, seus movimentos são controlados por fibras nervosas dos nervos glossofaríngeo e
vago. Por sua vez, a porção restante do esôfago apresenta tecido muscular composto por
músculo liso, que é controlado pelos nervos vagos. 

Na porção superior do esôfago, existe uma estrutura chamada esfíncter, que se abre quando o
bolo alimentar precisa passar da cavidade bucal para o esôfago e fecha assim que o bolo adentra
o órgão, evitando que o alimento retorne para a cavidade bucal. A mesma estrutura também está
presente na parte inferior do esôfago e impede que o alimento retorne do estômago para o
esôfago. Porém, por estar muito perto do diafragma, a atividade do esfíncter inferior pode ser
prejudicada caso haja disfunções no diafragma.

Estômago 
O estômago é divido em duas partes principais, o corpo e o antro (Figura 3), e possui duas
funções principais: armazenar o bolo alimentar e começar a digestão desse formando o quimo
(mistura semilíquida formada no interior do estômago), que será liberado lentamente para o
próximo órgão do tubo digestório. Em situações fisiológicas normais, o estômago tem a
capacidade de armazenar de 0,8 a 1,5 litros. Ademais, na parede do corpo do estômago, estão
presentes as glândulas gástricas, responsáveis pela secreção de suco gástrico o qual, em
conjunto com os movimentos peristálticos do estômago, transforma o bolo alimentar no
quimo. 
Figura 3 – Anatomia do Estômago
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011

Intestinos
O intestino delgado é dividido em três partes:

Duodeno;

Jejuno;

Íleo.

O quimo sai do estômago e adentra o intestino delgado pelo piloro, responsável por liberar o
quimo, pouco a pouco, para o duodeno (porção inicial do intestino delgado). Após, o quimo sai
do intestino delgado e vai para o intestino grosso pela parte ilíaca. O íleo, assim como nas outras
estruturas terminais dos órgãos do sistema digestório, também possui um mecanismo para
evitar o refluxo, a válvula ileocecal. O intestino grosso também é dividido em três partes, elas são
denominadas cólon ascendente, cólon transverso e cólon descendente (Figura 4). As principais
funções dos intestinos são digerir o quimo e absorver as micromoléculas presentes nele. Porém
o que não é interessante para o organismo é misturado com água e formará o bolo fecal, que
sairá do intestino e chegará ao ânus, local de excreção, através do reto.

Figura 4 – Anatomia do intestino delgado e intestino


grosso
Fonte: Adaptado de GUYTON; HALL, 2011

Motilidade do Trato Gastrointestinal


O trato gastrointestinal possui seu próprio sistema nervoso, denominado sistema nervoso
entérico. Esse sistema atua principalmente no controle dos movimentos e das secreções
gastrointestinal, sendo a primeira função controlada principalmente pelo plexo mioentérico, e a
segunda pelo plexo submucoso (que também controla o fluxo sanguíneo). Ambos os plexos
podem receber estímulos do sistema nervoso simpático e do sistema nervoso parassimpático
(Fig. 5). As funções motoras do intestino ocorrem por meio da estimulação das diferentes
camadas musculares do intestino (Figura 6) que são excitadas por atividade elétrica, geradas
pelos neurônios entéricos. Existem dois tipos básicos dessa atividade elétrica: ondas lentas e
potenciais em ponta. Porém as ondas lentas, sozinhas, não geram contração muscular. Por
outro lado, potenciais em ponta são verdadeiros potenciais de ação e podem, de fato, causar
contração muscular.
Glossário
Plexo: redes de vasos ou nervos.

Você Sabia?
A quantidade de neurônio no sistema nervoso entérico é de cerca de 100
milhões, quase a mesma quantidade da medula espinhal.
Figura 5 – Controle do Sistema Nervoso no intestino
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011
Figura 6 – Corte transversal do tecido intestinal,
mostrando as diferentes camadas musculares
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011

Existem dois tipos de movimentos gastrointestinais: o de propulsão-peristaltismo, responsável


por transportar o bolo alimentar através do tubo digestório, e o movimento de mistura,
responsável por misturar o bolo alimentar com as secreções enzimáticas que fazem a digestão.
Esses movimentos podem ser regulados por diferentes mecanismos, sendo um deles a liberação
de neurotransmissores. O neurotransmissor acetilcolina, por exemplo, age estimulando a
atividade gastrointestinal, enquanto a norepinefrina quase sempre inibe essa atividade. Os
sistemas nervoso simpático e parassimpático também podem exercer essa regulação. O sistema
nervoso simpático atua ativando ainda mais a atividade do trato gastrointestinal, enquanto o
sistema parassimpático atua inibindo a atividade gastrointestinal.
Importante!
Lembre-se de que a principal diferença entre o sistema nervoso
simpático e o parassimpático é que o primeiro atua estimulando ações
perante estímulos de “estresse”, enquanto o parassimpático atua
estimulando ações perante estímulos de “calma”. 

Você Sabia?
O “frio na barriga” que sentimos quando estamos com medo é uma
resposta do sistema nervoso simpático que restringe a circulação
sanguínea das vísceras (causando queda na temperatura) e manda o
fluxo para o músculo que precisa de maior fluxo sanguíneo para
“correr e fugir do perigo”.

Durante o processo de digestão, diversos hormônios são secretados e se ligam a receptores


específicos em diferentes tipos celulares. Essa ligação hormônio-receptor desencadeia uma
série de sinais nas células específicas, as quais respondem de diferentes formas. Por exemplo,
após o estímulo oriundo de produtos da digestão de gordura, as células I, da porção jejuno do
intestino delgado, secretam CCK (colecistocinina), um hormônio que consegue inibir
moderadamente as contrações do estômago, retardando a saída do quimo do estômago. A CCK
também tem a capacidade de contrair fortemente a vesícula biliar, aumentando a liberação da
bile. Outros hormônios, como a gastrina e secretina, também podem atuar na regulação de
movimentos peristálticos. 

Digestão

Secreção Gástrica
Quando o bolo alimentar chega ao estômago, já existe ali um microambiente propício para
iniciar a digestão alimentar. Na mucosa gástrica, há dois tipos de glândulas: as glândulas
oxínticas, que produzem e secretam ácido clorídrico (HCl - o qual a produção pode ser
estimulada pelo hormônio gastrina, que é liberado quando há presença de proteína no
estômago), pepsinogênio (forma inativa da enzima pepsina) e muco, e as glândulas pilóricas,
que secretam muco (para proteger a mucosa gástrica do ácido clorídrico) e gastrina. O HCl, as
enzimas e o muco presentes no estômago formam uma substância chamada suco gástrico. Além
disso, a principal função do HCl é ajudar na digestão de proteínas e ele exerce essa função de
duas formas diferentes:

Na ativação de pepsinogênio que, na presença de HCl, se torna a enzima ativa


pepsina (enzima que digere proteínas); e

No pH extremamente ácido do HCl, que também ajuda na digestão das proteínas.

Ademais, além de atuar na digestão das proteínas, o HCl também atua controlando o
crescimento bacteriano. 
Importante!
Apesar de ser essencial para a digestão do bolo alimentar, o HCl pode
causar danos à mucosa do estômago, e é por isso que a sua produção e
secreção precisam ser extremamente controladas. 

Saiba Mais
Existem milhares de bactérias colonizando o estômago e os intestinos.
Essas bactérias são chamadas de bactérias comensais e ajudam na
digestão de determinados alimentos, os quais o nosso trato digestório
não daria conta sozinho. 

Secreção Pancreática
Por sua vez, as enzimas necessárias para a digestão dos carboidratos e da gordura são
produzidas pelo pâncreas, mais especificamente pelos ácinos pancreáticos. Os ácinos
pancreáticos também produzem grande quantidade de bicarbonato de sódio e de enzimas que
atuam na digestão de proteínas (tripsina é a mais abundante). As enzimas e o bicarbonato de
sódio são depositados no ducto pancreático e depois são drenados para o ducto hepático,
chegando, em seguida, ao jejuno. A enzima pancreática que digere carboidratos é a amilase
pancreática, que hidrolisa os polissacarídeos para formar carboidratos menores, chamados de
dissacarídeos. Além disso, a amilase também hidrolisa amido e glicogênio. Por outro lado, para a
digestão de gordura, o pâncreas produz três enzimas: a lipase pancreática, colesterol esterase e a
fosfolipase. 

Glossário
Hidrolisar: quebra de uma substância pela ação da água.

Importante!
As enzimas que digerem proteína são secretadas na forma inativa e só
se tornam enzimas ativas no intestino. Se elas fossem secretadas já
ativas, elas seriam capazes de digerir o próprio pâncreas.

O pâncreas também produz insulina, mas as células responsáveis por


essa produção são as células de Langerhans. A insulina não é secretada
no ducto pancreático, e sim no sangue.
Assim como a motilidade gastrointestinal, a secreção das enzimas pancreáticas também pode
ser regulada por diversos mecanismos. Há três estímulos básicos para a secreção das enzimas
pancreáticas: a acetilcolina, liberada pelas terminações nervosas parassimpáticas; a CCK,
liberada pelas células da mucosa duodenal e do jejuno quando há presença de quimo no
intestino delgado; e a secretina, liberada pelas mesmas células quando há presença de alimentos
muito ácidos. 

Secreção de Bile pelo Fígado


Outro órgão acessório do sistema digestório, o fígado, produz e secreta a bile, importante para a
digestão e absorção de gordura no intestino. Diferentemente do suco pancreático, a bile não
contém nenhuma enzima digestiva. Os sais presentes na bile ajudam a emulsificar partículas
grandes de gordura, tornando-as menores e mais suscetíveis à ação da lipase. A bile também
ajuda na absorção dos produtos finais da digestão da gordura. A vesícula biliar esvazia no
duodeno seus sais biliares após estimulação da CCK, que é liberada em resposta a alimentos
gordurosos.

Glossário 
Emulsificar: mistura de uma substância gordurosa com uma não
gordurosa.
Importante!
A bile é constantemente secretada pelo fígado e permanece
armazenada na vesícula biliar.

Digestão de Carboidratos
Há três principais fontes de carboidrato no organismo:

Sacarose, um dissacarídeo encontrado na cana;

Lactose, dissacarídeo encontrado no leite; e

Amido, polissacarídeo presente em alimento que não seja de origem animal (batata,
por exemplo).

Esses sacarídeos maiores são digeridos por enzimas liberadas no intestino delgado
denominadas, lactase, sacarase, maltase e α-dextrinase. A lactase hidrolisa a lactose, gerando
uma molécula de galactose e uma de glicose. A sacarose hidrolisa a sacarase, formando uma
molécula de frutose e uma de glicose, a maltose se divide em inúmeras moléculas de glicose. Os
produtos finais são monossacarídeos e podem finalmente ser absorvidos. 
Saiba Mais
Alergia à lactose e intolerância à lactose são duas condições distintas.
A primeira acontece por um processo alérgico em que o sistema imune
assume que a molécula de lactose é perigosa para o organismo e
começa a atacá-las. A intolerância é uma incapacidade de produzir a
enzima lactase. Quem tem intolerância à lactose pode tomar um
comprimido que contém a lactase antes de ingerir alimentos ricos em
lactose e, assim, minimizar a falta da lactase.

Digestão de Proteínas
No estômago, a enzima pepsina reduz as proteínas (por meio de hidrólise, quebrando as
ligações peptídicas entre os aminoácidos), para proteosas, peptonas e polipepitídeos. As
enzimas presentes no suco pancreático reduzem essas moléculas para moléculas ainda
menores, denominadas dipeptídeo e tripeptídeo. Os enterócitos, células presentes na parte
duodenal e do jejuno, apresentam bordas em escova, que consistem em milhares de
microvilosidades projetadas na superfície da célula. Nessas microvilosidades, há peptidades,
enzimas que hidrolisam os maiores polipeptídeos remanescentes e os reduzem para di e
tripeptídeos que poderão então ser absorvidos. 

Digestão de Gorduras
A principal fonte de gordura são os triglicerídeos, um tipo de gordura neutra. O triglicerídeo é
formado por três moléculas de ácidos graxos e uma de glicerol esterificado. A digestão da
gordura começa com a emulsão que ocorre no estômago. Os movimentos peristálticos do
estômago misturam a gordura com as secreções gástricas. A gordura passa, então, a ser
quebrada em moléculas menores, que sofrerão a ação das enzimas digestivas. Quando o quimo
chega ao duodeno, a emulsão se torna ainda mais ativa com a presença dos sais biliares. O
principal sal biliar presente na bile é a lecitina, que irá, sob agitação, quebrar os glóbulos
gordurosos e os tornar pequenos fragmentos. Em resumo, a bile, em conjunto com a agitação,
transforma a gordura em gordura emulsificada e, então, a lipase transforma a gordura
emulsificada em ácidos graxos. A maior parte do colesterol está associada a uma molécula de
ácido graxo; a enzima hidrolase de éster colesterol digere essa molécula. Os fosfolipídeos
também estão conjugados a uma molécula de ácido graxo, mas são digeridos por outra a enzima,
a fosfolipase A2. 

Absorção
Após a digestão do bolo alimentar, as micromoléculas estão prontas para serem absorvidas pelo
organismo. Para absorver as micromoléculas, o intestino delgado possui uma superfície
característica. Para aumentar a área de superfície do intestino, as células da mucosa intestinal
possuem várias pregas denominadas válvulas coniventes. Essas pregas se estendem até 8
milímetros no lúmen intestinal (Figura 7). A capacidade de absorção do intestino delgado é de
100 gramas ou mais de gordura, 50 a 100 gramas de aminoácidos e íons, muitas gramas de
carboidrato e de 7 a 8 litros de água. O intestino grosso pode absorver ainda mais água e íons,
mas poucos nutrientes.
Figura 7 – Corte longitudinal do intestino, mostrando as
projeções da mucosa que têm como função aumentar a
superfície de absorção
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011

A absorção da água presente no quimo acontece no intestino delgado, por meio de osmose. Já os
íons, como o sódio, são absorvidos pelas células da mucosa intestinal por transporte ativo. Em
condições fisiológicas normais, apenas cerca de 0,5% do sódio não é absorvido pelo organismo
e é excretado por meio das fezes. Por sua vez, a glicose, principal monossacarídeo da digestão de
carboidratos, é absorvida pelas células epiteliais através do cotransporte com o sódio. Uma
molécula de sódio se liga à proteína transportadora que só irá fazer o transporte quando uma
molécula de glicose estiver ligada a ela também. É dessa mesma forma que a galactose também é
absorvida. Por outro lado, a frutose é transportada por difusão facilitada. Dentro da célula
epitelial, a frutose será transformada também em glicose. 
Glossário 
Osmose: é a passagem de uma substância para dentro de uma célula
por diferença de concentração. Por exemplo, se houver mais água no
espaço extracelular e menos nas células, a água entrará na célula até
essa concentração se igualar.

Transporte ativo: transporte de uma substância do meio menos


concentrado para o mais concentrado, com gasto de energia.

Difusão facilitada: transporte de uma substância do meio mais


concentrado para o menos concentrado por meio de moléculas
transportadoras, sem gasto de energia.

Para a absorção das micromoléculas peptídicas, o transporte utilizado também é cotransporte


com o sódio. Existem cinco diferentes tipos de proteínas transportadoras e essa variação é
importante por causa da variação das propriedades químicas dos aminoácidos e peptídeos. Os
monoglicerídeos e ácidos graxos provenientes da digestão da gordura se ligam à membrana das
células epiteliais e entram nessas células. Em resumo, a absorção de nutrientes no intestino
delgado acontece por meio dos diferentes tipos de transporte celular, que fazem com que as
micromoléculas saiam do lúmen do intestino e adentrem as células epiteliais. Depois, essas
micromoléculas são transportadas para o sangue, que levará o suprimento para todos os outros
órgãos.
Quando o quimo chega ao intestino grosso, há pouquíssima quantidade de substâncias para ser
absorvida. Nessa parte do tubo digestório, o que não foi absorvido se mistura à água e formará o
bolo fecal (fezes). As fezes são compostas por 75% de água e 25% de matéria seca, sendo 30% de
bactérias mortas, 10 a 20% de gordura, 10 a 20% de matéria inorgânica, 2 a 3% de proteínas e
30% de restos ingeridos de alimentos. A consistência do bolo fecal varia de acordo com a porção
do intestino em que ele se encontra (Figura 8). A motilidade no intestino grosso é importante
para a consistência das fezes; se há muitos movimentos, o bolo fecal passa mais rapidamente
pelo intestino, gerando fezes diarreicas ou fezes moles. Por outro lado, se há comprometimento
da motilidade, isso resulta em maior absorção, gerando fezes duras e causando constipação. 

Figura 8 – Consistência do bolo alimentar ao longo do


intestino grosso
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011
Você Sabia?
A cor marrom das fezes é devido à presença de estercobilina e
urobilina, derivadas da bilirrubina presente na bile. O odor é causado
por metabólitos da ação bacteriana e pode variar de pessoa para
pessoa, porque cada indivíduo tem uma flora bacteriana diferente. 

Fome e Saciedade
A ingestão de alimentos é essencial para a manutenção do organismo, entretanto essa ingestão
precisa ser controlada para que ela não ocorra em excesso. Se ingerirmos mais alimentos que o
necessário para a manutenção do nosso organismo (essa quantidade varia de indivíduo para
indivíduo e dos tipos de atividades físicas praticadas), os nutrientes, principalmente a gordura,
se acumularão no organismo, podendo causar diversas doenças, como a obesidade, pressão alta,
diabetes. Contudo o organismo tem formas de controlar a ingestão de alimentos por meio da
saciedade.

Importante!
Fome e apetite não são a mesma coisa. Apetite é o desejo por comer
determinados alimentos, fome é necessidade energética. Excesso de
apetite é denominado gula.
No hipotálamo, há uma área denominada núcleos laterais, que atua como o centro da fome, em
contrapartida, os núcleos ventromediais do hipotálamo atuam como o centro da saciedade. Se o
centro da saciedade não está ativado, ele estimulará o centro da fome, por outro lado, se o centro
da saciedade estiver ativado, ele inibirá o da fome. Nesse sentido, diferentes substâncias
secretadas por órgãos que compõem o tubo digestório podem ativar o centro da saciedade
(Figura 9).
Figura 9 – Substâncias que podem regular o centro da
fome, localizado no hipotálamo 
Fonte: Adaptada de GUYTON; HALL, 2011
As substâncias que inibem o centro da fome podem ser subdivididas em fatores pré-absortivos e
pós-absortivos. A estimulação do nervo vago causada pela distensão gástrica estimula o centro
da saciedade, inibindo o centro da fome. Quando o quimo adentra o duodeno, o hormônio CCK é
produzido, este hormônio, por meio da corrente sanguínea, ativará o centro da saciedade. De
forma contrária, ou seja, estimulando a fome, ocorre a produção do hormônio grelina pelo
estômago, quando este está vazio ou quando há rápida perda de peso. A grelina chega ao
hipotálamo pela corrente sanguínea e inibe o centro da saciedade. Porém, quando a glicose é
absorvida e cai na corrente sanguínea, há uma diferença de concentração de glicose no sangue
arterial e venoso (sangue arterial fica com concentração superior ao sangue venoso), e essa
diferença causa ativação do centro da saciedade.

Você Sabia?
A temperatura corpórea também pode regular o centro da saciedade.
Quando a temperatura está elevada, ela ativa o centro da saciedade, por
isso tendemos a comer mais durante o frio e não sentir fome quando
estamos em estado febril.

No controle da saciedade e da fome, existem também os fatores não nutricionais, sendo a


leptina, hormônio secretado pelo tecido adiposo, um dos principais fatores não nutricionais.
Quando nos alimentamos, o tecido adiposo aumenta, aumentando, assim, a liberação de leptina.
A leptina age estimulando a liberação de hormônio liberador de corticotrofina, que ativa o centro
da saciedade. O neuropeptídeo Y (NPY) atua de forma contrária, ele tem a capacidade de inibir o
centro da fome. A Tabela 1 sumariza as substâncias que estimulam o aumento e a diminuição da
ingestão de alimentos. 
Glossário
Tecido adiposo: tecido conjuntivo que tem uma célula chamada
adipócito, o qual tem a capacidade de guardar pequenas gotículas de
lipídeo no seu citoplasma. 

Saiba Mais
Substâncias endocanabinoides estimulam o hipotálamo a liberar NPY,
inibindo o centro da saciedade. É por isso que pessoas que fumam
cannabis tendem a sentir fome após o uso.

Tabela 1 – Substâncias Liberadas pelo Tubo Digestório que podem agir Aumentando ou
Diminuindo a Ingestão de Alimentos

Diminuem a Ingestão de Aumentam a Ingestão de


Alimentos (Anorexígenos) Alimentos (Orexígenos)
Diminuem a Ingestão de Aumentam a Ingestão de
Alimentos (Anorexígenos) Alimentos (Orexígenos)

Hormônio Estimulante do α-
Neuropeptídeo Y
MSH)

Proteína Relacionada à Agouti


Leptina
(AGRP)

Hormônio Concentrador de
Serotonina
Melanina (MCH)

Norepinefrina Orexinas A e B

Hormônio Liberador da
Endorfinas
Corticotropina

Insulina Gelanina (GAL)

Aminoácidos (Glutamato e
Colecistocinina
ácido γ-aminobutírico)

Peptídeo Semelhante ao
Cortisol
Glucagon (GLP)

Transcrito Regulado pela


Cocaína e pela Anfetamina Grelina
(CART)

Peptídeo YY (PYY) Endocanabinoides


Fonte: Adaptada GUYTON; HALL, 2011

Vídeos
Sistema Digestório
Que tal ilustrarmos, de forma rápida, um pouco do que foi falado até
aqui? Para isso, assista ao vídeo a seguir. Bom vídeo!

SISTEMA DIGESTÓRIO

Nutrição e Efeitos da Atividade Física no Sistema


Digestório
Os alimentos que ingerimos são as nossas fontes de energia, vitaminas e nutrientes essenciais
para o bom funcionamento do nosso organismo. Os nutrientes atuam no funcionamento
fisiológico dos sistemas e na prevenção de uma série de patologias. Nas últimas décadas,
cientistas do mundo inteiro têm estudado a relação da alimentação com a saúde. A junção de
uma alimentação saudável com a prática de exercícios físicos tem provado ser a melhor maneira
de prolongar, de forma saudável, a vida. Nesse sentido, o sistema digestório tem papel
fundamental nesse processo, pois, se qualquer um dos seus órgãos não funcionar
corretamente, o organismo ficará sem essas micromoléculas essenciais para a vida. 

Os nutrientes podem ser divididos em macro e micronutrientes. Os macronutrientes são os


carboidratos, as proteínas e os lipídios. Os carboidratos podem ser do tipo monossacarídeos e
dissacarídeos (os chamados açúcares) ou polissacarídeos, conhecidos como carboidratos
complexos. Como função geral, os carboidratos são os nutrientes que irão gerar a glicose,
combustível principal para a energia celular. Já as proteínas são formadas por aminoácidos, e
elas podem ser classificadas como completas ou de alto valor biológico (contém grande
quantidade de aminoácidos essenciais) e incompletas ou de baixo valor biológico (quantidade
pequena, ou nenhum, de aminoácidos essenciais). As proteínas ingeridas a partir da
alimentação são essenciais para a manutenção da produção das nossas próprias proteínas,
especialmente do tecido muscular. Por sua vez, os micronutrientes são as vitaminas e minerais.
As vitaminas estimulam diversos processos no organismo, desde o crescimento de cabelos e
unhas, assim como na manutenção da saúde óssea (vitamina D). De forma geral, todos esses
nutrientes têm um papel fundamental na manutenção da homeostase do organismo, sendo
indispensáveis. 

Importante!
Mesmo os nutrientes sendo importantes para a saúde, o seu excesso,
assim como a falta, pode ser prejudicial. É importante manter o
equilíbrio da ingestão dos diversos tipos alimentares, nas porções
recomendadas. 

Dessa forma, o balanço energético corresponde à quantidade de energia de alimentos que deve
ser ingerida para a manutenção do organismo, massa e composição corporal, considerando a
ingestão calórica em relação à quantidade de dispêndio energético, incluindo atividades diárias e
a prática esportiva. Nesse caso, a nutrição se torna ainda mais importante pois, quando um
indivíduo pratica com regularidade algum exercício físico, principalmente exercícios de alta
intensidade (incluindo atletas de elite), as recomendações nutricionais são essenciais para um
bom desempenho físico. Quando um nutricionista avalia um atleta, por exemplo, ele leva em
consideração diferentes variáveis, como o tipo de treino, a modalidade esportiva praticada, a
intensidade do treinamento e o planejamento e objetivos a curto e longo prazo a partir da
periodização. Variáveis do indivíduo como o peso, altura, força muscular, assim como seus
objetivos: aumento da massa magra, da força muscular, aumento do metabolismo, também são
importantes na prescrição. Somente após uma análise completa, as recomendações serão
passadas, assim como a necessidade de suplementos nutricionais. 

Além do controle no balanço energético, o exercício físico também tem efeitos importantes no
sistema digestório. Dentre esses efeitos, podemos citar a inibição do processo digestório de
digestão e absorção dos nutrientes durante a prática de exercícios, especialmente os intensos.
Isso se deve à necessidade de aporte energético para manutenção do desempenho, assim como
a ativação do sistema nervoso simpático, que inibe ações digestórias e privilegia processos que
disponibilizem energia para os membros da periferia, especialmente o tecido muscular
esquelético.
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ʪ Material Complementar

Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

  Vídeos  

O Cérebro no seu Intestino

Heribert Watzke: The brain in your gut


Suplementação Esportiva do Tubo de Ensaio à Medalha de
Ouro – Parte 1

Suplementação Esportiva do Tubo de Ensaio à Medalha de


Ouro – Parte 2
Sistema Nervoso Entérico e Inervação do TG

Sistema Nervoso Entérico e inervação do TG


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ʪ Referências

GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de fisiologia médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. 

PITHON-CURI, T. C. Fisiologia do exercício. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

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