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DIREITO CIVIL I
INTENSIVO I
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AULA 1: 28/01/2010
I – PERSONALIDADE JURÍDICA
Personalidade, para a teoria do Direito Civil, é a aptidão genérica para se titularizar direitos e contrair
obrigações na ordem jurídica, ou seja, é a qualidade para ser sujeito de direito. Tanto a PF quanto a PJ são
pessoas jurídicas porque são dotados dessa aptidão genérica que lhes dão personalidade.
R: Aparentemente, a resposta encontra-se na primeira parte do art. 2 do CC/02: a partir do nascimento com
vida (funcionamento do aparelho cardiorrespiratório) a personalidade é adquirida.
Art. 2. A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde
a concepção, os direitos do nascituro.
OBS: o sistema brasileiro, a luz do princípio da dignidade da pessoa humana, não exige, para efeito civil, na
aferição do nascimento com vida a forma humana e o tempo mínimo de sobrevida. Como se dá no art. 30 do
Código Espanhol.
Conceito: nascituro é o ente concebido, mas ainda não nascido, com vida intra-uterina.
- Natalista (Eduardo Espínola, Vicente Ráo, Silvio Rodrigues): é uma primeira teoria básica acerca do
nascituro. Banca mais conservadora. Para essa primeira teoria, a personalidade só seria adquirida a partir do
nascimento com vida, de maneira que o nascituro não seria considerado pessoa, gozando de mera
expectativa de direitos. O Natalista puro considera o nascituro uma coisa.
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- Concepcionista (Teixeira de Freitas, Silmara Chinelato): Banca mais aberta. Sob influência do Direito
Francês, os adeptos da linha concepcionista afirmam que o nascituro é pessoa, ou seja, adquire
personalidade jurídica desde a concepção inclusive para determinados direitos patrimoniais. Se uma mulher
concebe um filho e há aborto a ele transmitida a herança.
OBS: Há uma teoria intermediária. A denominada teoria da personalidade Formal ou condicional sustenta
que o nascituro gozaria formalmente de personalidade no que tange a direitos personalíssimos, mas direitos
patrimoniais em geral só seriam consolidados sob a condição de nascer com vida.
Pergunta: Qual é a teoria adotada pelo Código Civil Brasileiro? R: (Clovis Bevilaqua) O art. 2 é quase uma
cópia do código anterior (CC/16). Independentemente da teoria adotada, o nascituro goza de tutela jurídica
em diversos pontos do sistema (ver quadro esquemático no material de apoio). Segundo Clóvis Bevilaqua,
em seus comentários a obra Comentários ao Código Civil dos estados Unidos do Brasil –Editora Rio – 1975 –
pag. 178, o legislador teria adotado a teoria natalista “por ser mais prática”, mas, em diversos pontos do
sistema é sentida a influência concepcionista, na medida em que o nascituro é tratado como se pessoa fosse.
1) A jurisprudência do TJRS já havia apontado no sentido de reconhecer ao nascituro, como se pessoa fosse,
o direito patrimonial aos alimentos (AI 7000.642.9096), tendência esta consolidada pela Lei dos Alimentos
Gravídicos (Lei 11804/08).
- O natimorto tem personalidade jurídica? Natimorto: é o nascido morto. A lei de registro público atrapalha o
entendimento doutrinário mais moderno. Segundo o enunciado n. 1 da primeira jornada de Direito Civil, o
natimorto, respeitada a sua condição, mereceria a tutela de alguns direitos da personalidade. (o enunciado
se encontra no site).
2.3 – CAPACIDADE:
Capacidade de Direito + Capacidade de Fato: Capacidade Civil Plena que, em geral, é adquirida aos 18 anos.
Capacidade de Direito X Personalidade = (Orlando Gomes) a capacidade de direito nos dias de hoje
confunde-se com a personalidade jurídica. OBS: Se Orlando Gomes não distinguiu são muito semelhantes.
Capacidade de Fato: há pessoas que são incapazes. A incapacidade civil é a ausência da capacidade de
fato. A incapacidade pode ser:
OBS: Qual a diferença entre capacidade e legitimidade? A legitimidade, segundo o pensamento do prof.
Calmon de Passos, traduziria a pertinência subjetiva para a prática de determinado ato. Vale dizer, uma
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pessoa pode até ser capaz, mas está impedida de praticar determinado ato, sob pena de invalidade. Falta-
lhe no caso legitimidade. Pode existir um impedimento legal que proíba uma pessoa capaz de praticar
determinado ato. Ex: 1521, inc. IV do CC/02.
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a
prática desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
- enfermidade ou deficiência mental não tiver necessário discernimento para a prática de seus atos.
No que se refere ao inc. II do art. 3, este caso, vale lembrar que, nos termos dos arts. 1177 e
seguintes dos CPC, a incapacidade derivada de enfermidade e deficiência mental deve ser aferida no
bojo de procedimento de interdição. O procedimento judicial é chamado de procedimento de
interdição. Proferida a sentença de interdição, publicada e registrada, qualquer ato que o incapaz
venha a praticar a partir dali, mesmo em momento de lucidez, sem o seu representante legal é nulo
de pleno direito.
OBS: Que tratamento deverá ser dispensado às pessoas naturalmente incapazes, ainda não
interditadas, e que lhes seja prejudicial?
R: O CC/02 é omisso quanto a este problema. O Código Francês prevê a possibilidade de invalidar os
atos do incapaz ainda não interditado. Porém, segundo Orlando Gomes, amparado na doutrina
Italiana, o ato praticado pelo incapaz ainda não interditado poderá ser invalidado se concorrerem
três requisitos: 1) a incapacidade anterior. 2) o prejuízo ao incapaz. 3) a má-fé da outra parte (esta
má-fé poderá ser investigada segunda as circunstancias do caso).
- mesmo por causa temporária não puderem exprimir sua vontade (ex: intoxicação fortuita por uma
droga / pessoa que esta sujeita a uma causa exterior que impede a sua manifestação social – pessoa
em coma).
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Art. 4. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
- os pródigos: o pródigo relativamente incapaz, nos termos do inc. IV do art. 4, terá em seu favor no
bojo de procedimento de interdição, nomeado um curador para assisti-lo em atos de disposição ou
repercussão patrimonial – art. 1782 – cc/02.
Art. 1.782. A interdição do pródigo só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar
quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que
não sejam de mera administração.
OBS: O professor Luiz Edson Fachin, em sua obra O Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo, afirma
que, em uma perspectiva constitucional, as normas civis devem sempre resguardar a cada pessoa
um mínimo de patrimônio para que tenha vida digna. Isso explica a tutela do pródigo e a proteção
jurídica de família.
Pergunta de concurso: e para casar o curador do pródigo tem que se manifestar? O curador do
pródigo só se manifesta em questões patrimoniais, ele se manifestará, no casamento do pródigo,
quanto ao regime de bens.
Qual o tratamento jurídico dado ao Índio no Código Novo, pois no cc/16 era relativamente incapaz?
No CC/02, nos termos do par único do art. 34, a capacidade do índio é remetida ao tratamento da Lei
Especial (ver art. 8 da Lei 6001/73 – Estatuto do Índio).
OBS: ver no material de apoio questão especial referente ao tema restitutio in integrum (benifício
de restituição).
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Segundo Clóvis Beviláqua, em sua obra “Theoria Geral do Direito Civil” (RED, 1999, págs.
120- 123), este instituto tem origem romana, consistindo “no benefício concedido aos
menores e às pessoas que se lhes equiparam, a fim de poderem anular quaisquer atos
válidos sob outros pontos de vista, nos quais tenham sido lesadas” (pág. 121). Nesse sentido
cita-se como exemplo o art. 119 do CC/02:
No campo previdenciário, o próprio governo federal havia publicado a nota SAJ n. 42/03 – JMF no
sentido de não permitir o cancelamento de pagamento de benefício previdenciário sob o argumento
de redução da maioridade no CC/02, uma vez que deveria ser respeitado o limite etário da lei
previdenciária especial (ver também enunciado 3 da primeira jornada de Direito Civil).
No campo de Direito de Família. O STJ já pacificou o entendimento (HC 55606/SP) no sentido de que
ao atingir a maioridade civil, o credor não poderá ter cancelada automaticamente a pensão
alimentícia (paga em geral até a conclusão dos estudos), garantindo-se sempre o contraditório para
que possa demonstrar a necessidade dos alimentos. Se o devedor quiser exonerar-se da pensão, o
juiz garantirá ao credor o contraditório. Súmula 358 do STJ. Súmula 358. O cancelamento de pensão
alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório,
ainda que nos próprios autos.
AULA 2: 05/02/2010
2.4 - EMANCIPAÇÃO:
Art. 5. A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de
todos os atos da vida civil.
Pergunta: Torna-se maior no primeiro segundo no dia em que se completa 18 anos, ou é quando se
completa 24h do seu aniversario?
R: Segundo Washington de Barros Monteiro a maioridade é atingida no primeiro instante do dia em que se
completa os 18 anos de idade.
Mas, mesmo antes dos 18 anos a capacidade civil poderá ser antecipada, nos termos do par único do art. 5
do CC, mediante a emancipação.
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Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público,
independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor
tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em
função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.
– Emancipação Voluntaria: é aquela concedida por ato dos pais, ou por um deles na falta do outro,
mediante instrumento público, em caráter irrevogável, independentemente de homologação judicial, desde
que o menor tenha 16 anos completos.
OBS2: o fato de um dos pais ter a guarda do filho, não afasta o ato do outro pai que não possui a guarda,
pois o poder familiar ainda existe em relação a este. O ato emancipatório é um ato dos pais.
OBS3: a doutrina brasileira (Silvio Venosa), assim como a jurisprudência (RTJ 62/108, RT 494.92) já
apontaram no sentido de que, para evitar situações de injustiça, a emancipação voluntária não exclui a
responsabilidade civil dos pais por ilícito cometido pelo menor emancipado até que complete 18 anos.
– Emancipação Judicial: a emancipação judicial é aquela concedida pelo juiz, ouvido o tutor, desde que o
menor tenha 16 completos. É o menor sob tutela.
– Emancipação Legal:
A - casamento: o casamento emancipa. Idade mínima para casamento: M-16 e H-16, sendo que até
os 18 precisa de autorização.
Pergunta: Capacidade para casamento vem aos 16 anos, casando está emancipada. É possível o
casamento antes dos 16 anos? OBS: abaixo dos 16 anos, conforme veremos na aula de família, o art.
1520 admite excepcionalmente o matrimonio em caso de gravidez ou para evitar imposição ou
cumprimento de pena criminal. A questão é polêmica, no entanto, também nesses casos, na letra
fria da lei a emancipação ocorreria.
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Mesmo que haja separação ou divórcio, uma vez que os seus efeitos são para o futuro, a
emancipação persiste.
B - exercício de emprego público efetivo: em geral, é muito raro acontecer, pois nos editais
geralmente exigem maior de 18 anos.
Dúvida1: a perda da função publica por improbidade administrativa, nos casos do art. 37, § 4 da CF
(Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da
função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível) retorna a situação de incapacidade?
D - o estabelecimento civil comercial ou a relação de emprego, desde que o menor, com 16 anos
completos, em função deles tenha economia própria: o estabelecimento civil não significa
estabelecimento empresarial.
OBS1: e se o menor perder ao emprego? R: isso não retorna a sua situação de incapacidade, pelo
princípio da segurança jurídica, pois esse emancipado pode ter feito contratos e assumido
obrigações.
OBS2: partindo-se da idéia de que o nosso sistema civil é aberto, ou seja, permeado por conceitos
indeterminados e cláusulas gerais, a fim de permitir, a luz do princípio da operabilidade, a melhor
aplicação da norma ao caso concreto, temos que “economia própria” traduz um conceito vago, a ser
fixado a cada atividade hermenêutica.
OBS FINAIS1: sobre emancipação: o emancipado pode ser criminalmente responsabilizado? R: Não, a
emancipação não repercute no campo penal. Ele comete ato infracional na forma do ECA.
OBS FINAIS2: o menor emancipado pode sofrer prisão civil. Há alguns autores que defendem que o
menor emancipado pode falir pela nova lei de falência.
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Pergunta final: Por que o menor emancipado não pode dirigir? R: menor emancipado deve respeitar
norma administrativa específica: o art. 140, inc. I do CTB estabelece que a imputabilidade penal é
condição para ser condutor de veículo.
Ler texto de Humberto Ávila: Neoconstitucionalismo entre a ciência do Direito e o Direito da Ciência.
A extinção da pessoa natural se dá pela morte. A medicina legal estuda a morte pela tanatologia.
A morte marca o fim da pessoa física ou natural nos termos do art. 6 do CC/02.
Art. 6. A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes,
nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.
A noção comum de morte, segundo a Prof.ª Maria Helena Diniz, é a parada cardíaca prolongada e ausência
de respiração. Todavia, para efeito de transplante, o critério mais seguro é a morte encefálica por ser
irreversível (ver art. 4 da resolução 1480/97 do Conselho Federal de Medicina). O óbito deve ser declarado
por médico, ou caso não haja, duas testemunhas que possam fazê-lo (art. 77 da Lei de Registro Públicos).
O CC brasileiro, na segunda parte do art. 6 e no art. 7, estabelece duas situações de morte presumida: a
primeira decorrente da ausência e a segunda sem que exista procedimento de ausência.
Art. 6. A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes,
nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.
II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos
após o término da guerra.
Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida
depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do
falecimento.
OBS: a ausência (ver apostila no material de apoio) traduz a situação da pessoa que desaparece de seu
domicílio sem deixar noticias ou representante que administre o seu patrimônio. O CC/02, a partir do art.
22, estabelece um procedimento de transmissibilidade dos bens: ABERTA A SUCESSÃO DEFINITIVA, O
AUSENTE É RECONHECIDO PRESUMIDAMENTE MORTE. A ausência é um procedimento. Basicamente é um
procedimento com duas etapas. Primeiro ocorre a transmissão provisória, depois terminado um prazo de 10
anos os herdeiros recebem os bens de caráter definitivo. A sentença que reconhece aberta a sucessão
definitiva não é registrada no livro de óbito, essa é registra em livro especial no cartório. Haverá morte por
presunção na ausência quando aberta a sucessão definitiva.
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Haverá morte presumida também, sem declaração de ausência, nas hipóteses do art.7 do CC/02, mediante
procedimento de justificação. A sentença que declara a data provável do falecimento é registrada no livro de
óbito.
R: a comoriência traduz a situação jurídica de morte simultânea. Vale dizer, nos termos do art. 8 do CC/02,
se duas ou mais pessoas falecerem na mesma ocasião sem que se possa precisar se qualquer delas precedeu
à outra, considerar-se-ão simultaneamente mortas.
Caso seja reconhecida a simultaneidade das mortes, ABREM-SE CADEIAS SUCESSÓRIAS DISTINTAS, de
maneira que um comoriente não herda do outro.
OBS: não posso confundir comoriência (morte simultânea) com premoriência, pois, esta última significa a
morte precedente de uma das partes.
Art. 8. Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum
dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.
3 – PESSOA JURÍDICA:
Partindo-se do fato associativo “noção oriunda da sociologia, podemos, num primeiro momento definir PJ
como um grupo humano, criado na forma da lei, com personalidade jurídica própria, para a realização de
determinados fins”.
B - afirmativista: aceitava e reconhecia a autonomia da PJ como sujeito de direito. Dentro desta, três
teorias afirmavam e reconheciam a PJ como sujeito de direito:
B.1 - ficção (Savigny): a teoria da ficção reconhecia a PJ como um ente abstrato, fruto da
técnica jurídica pura. Savigny teve dificuldades em reconhecer que a PJ integra relações
sociais.
B.2 - realidade objetiva/organicista sociológica (Clóvis Beviláqua): para esta teoria, baseada
no organicismo sociológico, a PJ não seria uma mera criação do Direito, mas sim um
organismo vivo com atuação social.
B.3 - realidade técnica (Ferrara): esta teoria (em nosso sentir, adotada no art. 45 do CC/02) é
a mais equilibrada: reconhece que a PJ é personifica pela técnica do direito, mas não nega a
sua atuação social.
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Pergunta: PJ pode sofrer dano moral? R: é firme na jurisprudência brasileira (súmula 227 do STJ, ver também
Ag Rg no REsp 865658/RJ) o entendimento segundo o qual a PJ pode sofrer dano moral. Aliás, se dano moral
é lesão a direito da personalidade, o próprio art. 52 do CC/02 admite que a PJ possa titularizar tais. Todavia,
há quem sustente o contrário criticando o reconhecimento deste tipo de dano pela ausência da dimensão
psicológica da PJ (Wilson Melo da Silva, ver também o enunciado 286 da 4ª jornada de Direito Civil).
AULA 3: 11/02/2010:
Nos termos do art. 45 do CC/02, observamos que a PJ só se constitui a partir do registro do seu ato
constitutivo (contrato social ou estatuto) no registro público competente. Em geral, o registro público
competente para o qual você leva o ato constitutivo da PJ é ou a Junta Comercial ou o CRPJ (Cartório de
Registro de Pessoa Jurídica).
Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato
constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do
Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato
constitutivo.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de
direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua i nscrição no
registro.
O CC/02 não traz só matérias de Direito Civil há também normas de Direito Comercial (Empresarial).
Não havendo o devido registro do ato constitutivo no registro público competente, existirá uma mera
sociedade irregular ou de fato, despersonificada, nos termos do art. 986 do CC/02 e com possível
responsabilidade pessoa; dos seus membros.
Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações
em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele
forem compatíveis, as normas da sociedade simples.
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Existem entidades que, embora tecnicamente não devam ser consideradas PJs, têm capacidade processual, a
teor do art. 12 do CPC, a exemplo da massa falida, do espólio e até mesmo do condomínio. Quanto ao
condomínio há certa polêmica. Ele não precisa registrar a convenção, mesmo assim não é ato constitutivo é
uma convenção, e possui CNPJ para fins tributários.
O CC/02 na redação original do art. 44 estabelecia três espécies básicas de PJs de Direito Privado:
associações, sociedades e fundações. Na redação atual, acrescentaram-se dois incisos para incluir
organizações religiosas e partidos políticos. Essas duas entidades (partido político e organizações religiosas)
são essencialmente associações.
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
A disciplina autônoma das organizações religiosas e partidos políticos no art. 44, a despeito de serem
associações explica-se pela necessidade de “blindá-las” da norma impositiva de adaptação ao CC/02 prevista
no art. 2031 (VER NO MATERIAL DE APOIO 02 O ITEM 9 – referente ao art. 2031). Para as PJs que não se
adaptaram ao CC/02, excetuado as organizações religiosas e os partidos políticos, a doutrina visualiza
sanções: impossibilidade de obtenção de crédito bancário, impossibilidade de participação em licitação e até
mesmo, dado o funcionamento irregular, a possível responsabilidade pessoal dos sócios ou administradores.
- Conceito: a Fundação (Privada) não resulta da União de Indivíduos, mas sim da afetação de um
patrimônio, que se personifica, mediante a manifestação de vontade do instituidor para a realização
de fins ideais (não pode ter finalidade de lucro), nos termos do art. 62 do CC. OBS: destacamento
patrimonial que se personifica em PJ, para fins ideais. NÃO PODE TER FINALIDADE LUCRATIVA.
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Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento,
dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser,
a maneira de administrá-la.
Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais,
culturais ou de assistência.
As Fundações podem cobrar pelo serviço (exemplo: Faculdade que são Fundações), mas a receita
gerada tem que ser reinvestida na própria Fundação.
Só pode ser criada por escritura pública no tabelionato ou testamento (pode ser de qualquer forma,
a lei não especifica se é público).
3) A elaboração de um estatuto. Fundação não possui contrato social, pois ela não resulta de
indivíduos. A luz do art. 65 do CC/02 o estatuto da Fundação poderá ser elaborado pelo próprio
instituidor, fiduciariamente (em confiança) por terceiro ou subsidiariamente pelo MP.
Art. 65. Aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, em tendo ciência do
encargo, formularão logo, de acordo com as suas bases (art. 62), o estatuto da fundação
projetada, submetendo-o, em seguida, à aprovação da autoridade competente, com recurso
ao juiz.
Parágrafo único. Se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou,
não havendo prazo, em cento e oitenta dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.
4) A aprovação do estatuto. O estatuto deve ser aprovado. Em geral, quem aprova é o MP. Em
norma “esquisita” (art. 1202 do CPC), está estabelecido que se o MP elabora o estatuto o juiz deverá
aprová-lo.
II - quando a pessoa encarregada não cumprir o encargo no prazo assinado pelo instituidor
ou, não havendo prazo, dentro em 6 (seis) meses.
- O papel do MP: vale salientar a precípua função fiscalizatória do MP nos termos do art. 66 do
CC/02.
Art. 66. Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas.
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§ 1. Se funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério
Público Federal. (Vide ADIN nº 2.794-8)
A norma do par. 1 do art. 66, por conta da ADIN 2794-8, deve ser lida no sentido de reconhecer ao
MP do DF, e não ao MPF (Procuradoria da República), a atribuição precípua de fiscalizar Fundação
situada no DF. Se quem fiscaliza fundação do Estado é o MPE, logo quem fiscaliza as do DF é o MP do
DF (segundo a ADIN). OBS: é óbvio que se a Fundação recebe recurso do governo federal nada
impede que o MPE atuará em parceria com MPF. Havendo razão e justificativa, a exemplo da
percepção de verba federal o MPF também poderá ter atribuição fiscalizatória.
- Alteração do Estatuto: o estatuto pode ser alterado nos termos do art. 67 e 68 do CC/02. Quorum
de 2/3; não contrarie a finalidade; aprovada pelo MP.
Art. 67. Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a reforma:
I - seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação;
III - seja aprovada pelo órgão do Ministério Público, e, caso este a denegue, poderá o juiz
supri-la, a requerimento do interessado.
Art. 68. Quando a alteração não houver sido aprovada por votação unânime, os
administradores da fundação, ao submeterem o estatuto ao órgão do Ministério Público,
requererão que se dê ciência à minoria vencida para impugná-la, se quiser, em dez dias.
Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou
vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado,
lhe promoverá a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em
contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz,
que se proponha a fim igual ou semelhante.
Sociedades:
As sociedades, PJ de Direito Privado, dotadas de personalidade jurídica própria e instituídas por meio
de contrato social visam a FINALIDADE ECONÔMICA (art. 981 do CC/02). Sociedade visa LUCRO, essa
é a essência desta instituição. As sociedades são constituídas por pessoa.
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Na regra geral as sociedades não possuem estatuto, mas sim contrato social.
OBS: no que tange a sociedade entre cônjuges, o art. 977 do CC/02 a proíbe se forem casados no
regime de comunhão universal ou separação obrigatória de bens. O legislador criou essa norma sob
a premissa de que os cônjuges estarão fraudando o regime de bens. Isso é uma presunção que o
código fez. Isso fere princípio constitucional.
Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde
que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação
obrigatória.
Pergunta: e as sociedades, formadas por cônjuges nos regimes de comunhão universal ou separação
obrigatória de bens, constituídas na vigência do CC anterior? Sociedades anteriores ao novo Código,
em respeito ao princípio do ato jurídico perfeito, consoante firmado pelo próprio DNRC –
Departamento Nacional de registro de Comércio (Parecer n 125/03) –, não são atingidas pelo novo
Código Civil.
Fundamentalmente possuímos dois tipos de sociedades (aqui não se fala em espécie de sociedade).
No Código velho possuímos dois tipos de sociedades: Sociedades Civil e Sociedade mercantil. Ambas
queriam o lucro, a diferença é que a luz da Teoria Francesa, a sociedade mercantil realizava atos de
comercio, e a Civil não.
A noção de comércio foi perdendo espaço para a nomenclatura de empresa e empresário. O novo CC
não se fala mais em sociedade civil e mercantil, mas sim em Sociedade simples e sociedade
empresária, nos termos do art. 982 do CC/02. Não houve apenas mudança de nomes, pois a noção
de empresa é mais ampla que a de comércio. Em geral a sociedade simples corresponde a civil e
sociedade comercial corresponde a empresaria, mas o conceito de empresa é mais amplo que o de
comércio.
Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por
objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e,
simples, as demais.
- Sociedade Simples X Sociedade Empresária: Nos termos do art. 982, para ser empresária uma
sociedade deve conjugar dois requisitos, um requisito material (exercício de uma atividade típica de
empresário a luz do art. 966) e um requisito formal (necessário registro obrigatório na Junta
Comercial). Faltando qualquer desses requisitos, por exclusão a sociedade é simples. Sociedade
simples será sempre simples pois falta o requisito formal, tendo em vista que é registrada na OAB.
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Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de
natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou
colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.
As sociedades empresárias, filhas diletas do capitalismo, são marcadas pela impessoalidade, uma
vez que os seus sócios atuam simplesmente como articuladores de fatores de produção (capital,
trabalho, matéria prima e tecnologia), a exemplo de uma revenda de automóveis. Ademais, tem
registro obrigatório na Junta Comercial; diferentemente, as sociedades simples são marcadas pela
pessoalidade, uma vez que os seus sócios realizam ou supervisionam pessoal e diretamente a
atividade desenvolvida, a exemplo de uma sociedade de médicos ou advogados. Por isso, em geral,
são prestadoras de serviços técnicos, artísticos ou científicos e o seu registro é feito no CRPJ,
excetuado os advogados que o registro é feito na OAB.
OBS: por força de lei (parágrafo único do art. 982), a sociedade anônima é considerada empresária e
a cooperativa sociedade simples (ver Ag Rg no REsp 808241/SP).
Associações:
- Conceito: parecem com as Fundações. A semelhança é que as associações têm a finalidade ideal.
Não pode visar lucro. Pode haver receita, mas essa deve reinvestir na própria atividade.
As associações são formadas pela união de indivíduos com o propósito de realizar fins não
econômicos (art. 53 do CC). O sindicato é considerado associação (natureza privada de maneira que
não cabe sindicato).
Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins
não econômicos.
O ato normativo que constitui as associações é o estatuto. Será registrado no CRPJ (cartório de
registro de PJ).
Pergunta: Na associação pode haver discriminação entre os associados? R: Sim. Exemplo: associados
fundadores com peso de voto maior.
OBS: em uma associação, um clube, por exemplo, pode haver categorias diferentes de associados,
mas os associados de uma mesma categoria não podem ser discriminados entre si.
Em regra, a luz do art. 61, dissolvida a associação o seu patrimônio será atribuído a entidades de fins
não econômicos designados no estatuto ou, omisso este, à instituição municipal, estadual ou federal
de fins iguais ou semelhantes.
16
por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos
ou semelhantes.
§ 1. Por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por deliberação dos associados, podem
estes, antes da destinação do remanescente referida neste artigo, receber em restituição,
atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da
associação.
Art. 59. Compete privativamente à assembléia geral: (Redação dada pela Lei nº
11.127, de 2005)
O art. mais importante das associações é o art. 57 que prevê poderes para exclusão de associado.
Poderá ser excluído por justa causa e mediante ampla defesa e contraditório (Devido processo legal
privado). Essa norma não cabe ao condomínio, pois condomínio não é associação. Há de analisar as
normas específicas ao condomínio.
Art. 57. A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida
em procedimento que assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no
estatuto. (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)
AULA 4: 18/02/2010
(ver Resp. 1.026.981-RJ que diz acerca da união homo afetiva. União homo afetiva forma união estável e
deve ser considerado família.)
17
1) Convencional: é aquela em que os próprios sócios ou administradores deliberam a extinção da pessoa
jurídica. Ela é mais comum para sociedades. O contrato pelo qual você desfaz o que fez antes é o contrato de
destrato. Os sócios celebram um contrato de destrato.
3) Judicial: é aquela que se opera por meio de sentença, a exemplo do que se dá no procedimento de
falência.
OBS: entidades não sujeitas à falência podem ter a sua dissolução judicial regulada pelo artigo 1218, VII do
CPC, que remete ao rito do CPC de 39. (recentemente, julgando o RESP 976522, o STJ também aplicou o CPC
de 39 para decidir sob divisão de bem com múltiplas penhoras).
Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica. (disregard doctrine). O professor, no Brasil, que trouxe
essa teoria em nossos tribunais foi Rubens Requião. No plano internacional o autor que discutia essa teoria
foi Rolf Serick.
Desconsideração X Despersonificação:
Desconsiderar não é aniquilar a PJ, não é cancelar o seu registro. Na essência você desconsidera e depois a
PJ pode continuar suas atividades, inclusive sob a ótica do princípio da continuidade da empresa.
OBS: Não se deve confundir a desconsideração da PJ, que tem requisitos próprios, com a responsabilidade
tributária subsidiária de sócio ou administrador. Não se pode confundir também a desconsideração com a
teoria ULTRA VIRES SOCIETATIS. Por meio desta teoria, de origem anglo-saxônica, e regulada no art. 1015 do
CC/02, considera-se nulo o ato praticado pelo sócio que extrapolou os poderes conferidos pelo contrato
social. A sociedade, portanto, não responde pelo ato praticado.
O CC/16 não trouxe norma específica sobre o tema. No âmbito das relações privadas, ressalvado o Direito do
Trabalho, a primeira grande lei a tratar da desconsideração foi o CDC, em seu art. 28. No CC em vigor, a
matéria é tratada em seu art. 50 (também atinge as PJ anteriores ao CC, pois é norma de eficácia).
18
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou
pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público
quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de
obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Pergunta: a desconsideração da PJ pode ser aplicada pela administração pública? R: segundo o professor
Edmar Andrade, a desconsideração é matéria sob reserva de jurisdição, ou seja, deve ser decretada pelo juiz,
garantido o contraditório. Excepcionalmente, todavia, a própria doutrina (Gustavo Tepedino) e a
jurisprudência (RMC 15166/BA) tem admitido a desconsideração administrativa em caso grave de fraude,
por exemplo em caso de licitação.
1) Descumprido uma obrigação. Em geral, quem descumpre é insolvente. Ocorre que se uma PJ descumpre
uma obrigação e é insolvente há preocupação e pode ser desconsiderada sua personalidade para atingir o
patrimônio dos sócios ou administradores.
+
2) Abuso:
2.1) Por desvio de finalidade: exemplo: no contrato social há um tópico chamado objeto. Se o sócio
não estiver realizando a atividade do objeto do contrato social. Sócio que utiliza a sociedade para
lavagem de dinheiro.
2.2) Confusão patrimonial: não é possível verificar quando é pessoa jurídica ou quando é pessoa
física.
OBS1: não basta somente o descumprimento da obrigação a que se avaliar se houve abuso por desvio de
finalidade ou confusão patrimonial.
OBS2: em uma inicial para colocar essa teoria tem que colocar os dois tópicos, o descumprimento de uma
obrigação (Insolvência) e também colocar o abuso do ato dos sócios e/ou administradores (por desvio de
finalidade ou confusão do patrimônio).
OBS3: inspirando-se na doutrina do professor Fábio Konder Comparato (em sua obra O Poder de Controle da
S/A, editora Forense) o sistema jurídico brasileiro não exige para efeito de desconsideração, que o credor
demonstre a intenção ou o dolo específico do sócio no cometimento de ato ilícito.
OBS4: como vimos acima, o abuso pode se caracterizar por um desvio de finalidade ou pela confusão
patrimônio. Mas também pode caracterizar abuso por confusão de patrimônio, apto a permitir a
desconsideração, a situação em que uma empresa controladora atua fraudulentamente por meio de outra
empresa do mesmo grupo. Neste caso, opera-se uma desconsideração indireta: desconsidera-se a empresa
controlada para se atingir a controladora.
OBS5: para efeito de aprofundamento ver a obra o Novo Direito Societário do Professor Calixto Salomão
Filho.
19
Em mais de uma oportunidade, o STJ tem afirmado que a regra geral, no âmbito da desconsideração, é a
teoria maior que, além da insolvência da PJ, exige também a demonstração do abuso do sócio caracterizado
pelo desvio de finalidade ou confusão de patrimônio (art. 50 do CC/02). Entretanto, em situações jurídicas
especiais, para facilitar a satisfação do direito, adota-se a teoria menor, que se contenta simplesmente com
a demonstração do descumprimento da obrigação ou insolvência da PJ (e o que se dá no âmbito do CDC). A
respeito dessa diferença, ver farta jurisprudência no material de apoio, inclusive o Resp. 279273/SP.
3) o que é desconsideração inversa? Acórdão do TJSP em sede de agravo n. 33453/01. Neste tipo de
desconsideração, enfrentada pioneiramente pelo professor Fabio Comparato, atinge-se a própria PJ,
detentora de bens e valores, para alcançar a pessoa física que está por traz. OBS: como vimos acima, o abuso
pode se caracterizar por um desvio de finalidade ou pela confusão patrimônio.
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II - DOMICÍLIO
A palavra domicílio tem origem na palavra latina domus de origem Romana. Para se entender o conceito de
domicilio é preciso passar pelos conceitos de residência e de morada:
- morada: possui uma idéia de estadia. É simplesmente o lugar em que a pessoa física se estabelece
temporariamente.
- residência: é mais do que morada, porque a residência pressupõe estabilidade: é um ligar em que a PF se
estabelece habitualmente.
- Domicílio: é o conceito mais abrangente, uma vez que traduz o lugar em que a PF se estabelece com ânimo
definitivo (animus manendi), convertendo-o em centro principal de sua vida jurídica. Abrange a residência e
possui um “plus” que o é ânimo de definitividade.
Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo
definitivo.
Na linha do Código de Portugal, o CC/02, em seu art. 72, consagra, PARA DETERMINADOS EFEITOS, um
domicílio profissional.
Art. 72. É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar
onde esta é exercida.
Parágrafo único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá
domicílio para as relações que lhe corresponderem.
Art. 74. Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de o mudar.
Parágrafo único. A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa às municipalidades dos
lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais declarações não fizer, da própria mudança, com as
circunstâncias que a acompanharem.
OBS: o domicílio da PJ é regulado no art. 75 do CC/02 (as questões jurídicas mais profundas devem ser vistas
na grade processo).
21
§ 1º Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será
considerado domicílio para os atos nele praticados.
Questão: O que se entende por domicílio aparente ou ocasional? (Henri de Page) Trata-se de uma ficção
jurídica baseada na teoria da aparência: à luz do art. 73 do CC/02, para pessoas que não têm domicílio certo,
como profissionais do circo, consideram-se o seu domicílio o lugar em que forem encontradas.
Art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for
encontrada.
1 - ESPÉCIES DE DOMICÍLIO:
1) Domicílio convencional ou voluntário: é o mais comum, fixado por simples ato de vontade segundo
autonomia privada.
Natureza jurídica: fato, bem ou pessoal. A natureza jurídica do ato de fixação do domicilio é de ato jurídico
em sentido estrito não negocial.
2) Especial ou de eleição: regulado nos arts. 78 do CC e 111 do CPC, trata-se do domicílio escolhido pelas
próprias partes no contrato.
Art. 78. Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e
cumpram os direitos e obrigações deles resultantes.
§ 1º O acordo, porém, só produz efeito, quando constar de contrato escrito e aludir expressamente a
determinado negócio jurídico.
OBS: à luz do princípio da função social, nos termos do parágrafo único do artigo 112 do CPC, a nulidade da
clausula de eleição de foro, especialmente em contratos de consumo, pode ser declarada de ofício pelo juiz,
independentemente de exceção de incompetência.
Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser
declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu.
3) Domicílio Legal: duas regras a respeito do domicilio legal, regra do art. 77 (mais observado em questões
internacionais) e regra do art. 76 (regra matriz/base no domicilio legal).
Art. 76. Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso.
22
Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor
público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo
da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado;
o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença.
Art. 77. O agente diplomático do Brasil, que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem
designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último
ponto do território brasileiro onde o teve.
- incapaz: o de seu representante ou assistente. OBS: a despeito desta regra, a súmula 383 do STJ
estabelece que “a competência para processar e julgar as ações conexas de interesse do menor é em
princípio o foro do domicílio do detentor da guarda”.
- servidor público: é o lugar em que exercer permanentemente as suas funções. OBS: lembra a
professora Maria Helena Diniz que o servidor público tem domicílio obrigatório no lugar em que
exerce função permanente, e não simplesmente comissionada. Acrescenta ainda a professora que a
obtenção de uma simples licença não altera o domicilio legal.
- militar: onde servir, e, sendo da Marinha ou Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar
imediatamente subordinado.
-marítimo: marinheiro da marinha mercante privada, não é o militar das forças armada. O seu
domicilio obrigatório é onde o navio estiver matriculado.
AULA 5: 25/02/2010
23
III – BEM JURÍDICO
1 – CONCEITO:
A despeito da polêmica, na linha do direito germânico com influência no direito brasileiro (Orlando Gomes),
coisa é conceito mais restrito, pois se refere apenas à utilidades materiais ou corpóreas (essa linha de
pensamento facilitará no entendimento da posse quando no estudo dos direitos reais). Bens são não
somente as coisas, como também utilidades ideais.
OBS: inspirando-se na doutrina dos direitos da personalidade, autores do quilate de Wilson Melo da Silva,
Carlos Alberto Bittar, direta ou indiretamente, reconhecem ainda que uma pessoa titulariza o seu patrimônio
moral (honra, imagem, via privada, etc.)
3.1 – “SOBRE PATRIMÔNIO MÍNIMO DISCORREMOS EM AULAS ANTERIORES, MAS O QUE SERIA
PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO?”
Patrimônio mínimo: cada pessoa deve ter o mínimo de patrimônio para que tenha vida digna. Consagrado
pela lei 10.931/04, o patrimônio de afetação visa a imprimir maior segurança jurídica nas relações do
mercado imobiliário, ao vincular bens aos custos do empreendimento. Assim, destaca-se um patrimônio
específico, independente do da incorporada para a garantia da obra.
Comprometo-me a fazer a leitura do tópico “revisão de conceitos básicos”, no material de apoio. Em sala de
aula, o professor destacou os mais importantes os seguintes aspectos:
Esta figura encontra-se disciplinada no art. 80 do CC/02, em que o próprio legislador determina a natureza
imobiliária.
OBS: ao considerar de natureza imobiliária o direito à herança, o legislador cerca de formalismos a sua
transferência, a exemplo da exigência de escritura pública e, segundo alguns autores (Francisco Cahali) de
outorga uxória.
24
4.2 – O ART. 84 DO CC/02 CUIDA DOS BENS MÓVEIS EMPREGADOS EM CONSTRUÇÃO. QUAL É A SUA
NATUREZA JURÍDICA? R: vide art. 84 do CC/02.
Art. 84. Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam
sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio.
4.3 – O CDC, EM SEU ART. 26, ADOTA UMA CLASSIFICAÇÃO DE BENS, PARA EFEITO DE SE RECLAMAR POR
VÍCIO DE QUALIDADE, NÃO CONSAGRADA NO CC/02: BENS DURÁVEIS E NÃO DURÁVEIS.
Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:
Essa classificação não foi adotada pelo CC/02. Garantias: 30 dias bens não duráveis e 90 dias bens duráveis.
- fruto: é uma utilidade renovável que a coisa principal periodicamente produz e cuja percepção não
diminui a substancia da coisa principal (ver no material de apoio a classificação dos frutos). Ex: a
laranja em face do pé de laranja, o bezerro em face da vaca, os alugueis.
- produtos: os produtos, por sua vez, são utilidades não renováveis cuja percepção esgota a coisa
principal. Ex: pedras de uma pedreira.
- pertenças: não estava no Código Velho, novidade do CC/02. As pertenças, que não são partes
integrantes da coisa principal, justapõem-se ou acoplam-se a ela para servi-la (art. 93 do CC/02). É o
contrario de parte integrante. Ex: aparelho de ar condicionado, ventilador de teto, irrigador de
lavouras. Pertença não é benfeitoria. A pertença serve a coisa principal, mas não a integra.
OBS: o enunciado 11 da 1ª jornada de Direito Civil, ao não reconhecer mais a categoria de bem
imóvel por acessão intelectual tem sido combatido pela doutrina, autores como Flávio Tartuce.
Entende-se que não é possível, mais bem imobilizado por União intelectual por parte do
proprietário. Esse pensamento é equivocado, segundo o professor, porque há casos em que essa
acessão intelectual é amplamente possível.
- benfeitorias: toda benfeitoria é sempre artificial. A benfeitoria (art. 96 e 97 do CC/02) é toda obra
realizada pelo homem na estrutura de uma coisa como propósito de conservá-la (benfeitoria
necessária), melhorar a sua utilização (benfeitoria útil) ou proporcionar prazer (benfeitoria
voluptuária).
25
Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.
§ 1º São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do
bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.
§ 3º São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.
Uma construção, por implicar aumento de volume da coisa principal é acessão artificial e não
benfeitoria.
Reflexão e crítica pessoal: Piscina é acessão e não é benfeitoria, pois ela, mesmo que seja de mero
deleito ou recreio, aumenta o uso habitual do bem, ainda que torne o bem mais agradável e seja de
alto valor (art. 96). Fazer uma alusão ao enunciado 11 da 1ª jornada de Direito Civil. A piscina não
aumentaria o uso habitual do bem, mesmo que o tornem mais agradável, ou seja, de elevado valor,
logo, não estaria em confronto com art. 96 do CC/02? Não seria acessão artificial (já vi
posicionamento nesse sentido). O professor respondeu no sentido em que piscinas menores (Igui)
seriam benfeitorias, mas se forem aquelas piscinas “cavalares”com deques, e outros exageros,
seriam acessão artificial.
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IV – BEM DE FAMÍLIA
1 – HISTÓRICO:
Fonte histórica mais importante encontrada no Direito norte-americano: Lei Texana de 1839 (Homestead
Act).
2.1 – VOLUNTÁRIO:
(1711 do CC/02) - Bem de família voluntário é aquele constituído por ato de vontade do casal, da
entidade familiar ou de terceiro, mediante registro no cartório de imóveis. É uma instituição por ato
de vontade e que necessita de registro.
Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição,
salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio.
2) inalienabilidade: art. 1.715, CC). Ademais, uma vez inscrito o bem de família voluntário, ele só
poderá ser alienado com a autorização dos interessados, cabendo ao MP intervir quando houver
participação de incapaz (art. 1.717).
Art. 1.717. O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem da família, não podem
ter destino diverso do previsto no art. 1.712 ou serem alienados sem o consentimento dos
interessados e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público.
- Esses dois efeitos são relativos, nos termos dos arts. 1715 e 1717 do CC/02.
1) o valor do bem de família não poderá ultrapassar o teto de 1/3 do patrimônio líquido dos
instituidores (art. 1711 do CC/02).
2) poderão também integrar a instituição do bem de família voluntário valores mobiliários ou rendas
(art. 1712 do CC/02).
Art. 1.712. O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas
pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá
27
abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no
sustento da família.
OBS: diferente é a situação em que o casal é compelido a alugar o seu imóvel residencial para
sobreviver com base na renda do aluguel: neste caso, o STJ tem decidido pela impenhorabilidade
desta renda (Ag Rg no RESP 975.858/SP).
A administração do bem de família voluntário está regulada no art. 1720 e a extinção no art. 1722.
Art. 1.722. Extingue-se, igualmente, o bem de família com a morte de ambos os cônjuges e a
maioridade dos filhos, desde que não sujeitos a curatela.
Consagrado pela Lei 8.009/90 – que, segundo o STJ, pode ser aplicada até mesmo em face de
penhora anteriores a sua vigência (Súmula 205) – este tipo de bem de família traduz uma proteção
automática da lei (impenhorabilidade do imóvel residencial), INDEPENDENTEMENTE de escritura ou
registro cartorário. Não há restrições a alienação.
OBS: poderá haver interesse na inscrição do bem de família voluntário, por exemplo, na hipótese do
parágrafo único do art. 5 da lei 8009/90. A proteção automática do bem de família recaíra no bem de
menor valor, em caso de possuidor de vários imóveis, a não ser que você registre outro como bem
de família.
OBS: o STJ, mitigando o alcance hermenêutico do parágrafo único do art. 1, tem admitido
desmembramento do imóvel para efeito de penhora (RESP 515.122/RS, RESP 510.643/DF).
O art. 2 da lei é lacônico no que tange a que tipos de bens móveis estariam protegidos pela
impenhorabilidade legal. Já houve decisões reconhecendo a proteção para o televisor, o ar
condicionado, o freezer, e até mesmo teclado musical (RESP 218.882/SP).
OBS: no que tange a vaga de garagem STJ já afirmou entendimento (Ag Rg no Ag 1.058.070
no sentido de que a impenhorabilidade só é possível se a vaga de garagem não tiver registro
e matricula próprios.
O prof. entende que essas exceções devem/podem ser aplicadas ao bem de família
voluntário.
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meramente eventuais como diarista, eletricista ou pintor não podem se valer da exceção do
inc. I do art. 3.
OBS: a despeito de não ser tributo, o próprio STF (RE 439003/SP) já afirmou entendimento
no sentido de que cobrança de despesa condominial também excepciona a proteção do bem
de família. Quem não paga taxa de condomínio corre o risco de perder o imóvel.
5) execução de hipoteca sobre o imóvel fornecido como garantia real pelo casal ou entidade
familiar. Casal vai ao banco pegar empréstimo e coloca o imóvel como hipoteca, não pode
posteriormente alegar o bem de família. O STJ vem entendendo, em sentido contrário ao inc.
V, que a garantia do bem de família é uma garantia irrenunciável. OBS: o STJ em mais de uma
oportunidade, a exemplo do que se lê no Ag Rg no RESP 813546/DF, tem admitido que o
devedor, que haja indicado bem de família à penhora, possa posteriormente volta atrás.
6) bem adquirido por produto de crime, bem como cometeu um crime e invoca o bem de
família na execução de sentença condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento
de bens.
7) processo foi movido para cobrança em caso de fiança em contrato de locação. Fiador não
pode alegar o bem de família no contrato de locação cuja dívida é do afiançável.
AULA: 04/03/2010
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V – FATO JURÍDICO
1 – CONCEITO: é todo acontecimento natural ou humano apto a criar, modificar ou extinguir relações
jurídicas. Para que um fato seja jurídico é preciso que o fato tenha relevância para o direito.
A – Fato Jurídico em sentido estrito: fato jurídico em sentido estrito, ordinário ou extraordinário, é todo
acontecimento natural deflagrador de efeitos jurídicos. É um acontecimento da natureza, alheio a vontade
do homem. Ex: uma chuva corriqueira que causa desabamento. OBS: natureza jurídica do tempo: decurso do
tempo, esse é considerado um fato jurídico em sentido estrito ordinário.
B – Ato - Fato: Pontes de Miranda diz que algumas situações são ato (natureza) e fato (humanos).
B.1 – Conceito: o ato-fato é aquele comportamento que, embora derive do homem, é desprovido de
vontade consciente na sua realização e na projeção dos efeitos jurídicos realizados.
OBS: O ato-fato produz efeitos jurídicos mesmo que o comportamento humano seja desprovido de
intencionalidade e consciência.
Exemplo: (Jorge Ferreira) absolutamente incapaz em tenra idade que compre um doce, subsume
melhor a sua conduta na categoria de ato-fato do que na de Negócio Jurídico, dada a ausência da
necessária consciência do ato que pratica. (Silvio Venosa): É um Negócio Jurídico nulo, mas
socialmente aceito.
C.1 – ilícitas: o CC/02 adota na categoria de ato ilícito / anti-jurídico. O ato ilícito / anti-jurídico será
visto em responsabilidade civil. Alguns autores chamam o ato ilícito de ato anti-jurídico. O CC/02
separou o ato ilícito em categoria separada.
- O ato jurídico em sentido amplo se subdivide em negócio jurídico e ato jurídico em sentido
estrito.
C.2.1 – ato jurídico em sentido estrito: também denominado de ato não negocial, traduz um
simples comportamento humano voluntário e consciente cujos efeitos jurídicos estão
previamente determinados na lei. Não existe aqui liberdade de escolha dos efeitos jurídicos
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alcançados. Concretiza o pressuposto fático da norma. Exs: 1) caça, pesca em zonas
permitidas são formas de ato jurídico em sentido estrito, no momento que você pesca ou
caça automaticamente você se torna proprietário da coisa, e gera os efeitos previstos na lei.
2) Especificação: transformar voluntariamente matéria bruta e obra final, a lei torna
proprietário aquele transformou em obra final. 3) Atos de comunicação: notificação,
protesto. Efeito produzido é automaticamente determinado pela lei – dar ciência você não
pode escolher outros efeitos que não estejam previstos na lei.
C.2.2 – negócio jurídico: há uma liberdade negocial, uma autonomia negocial maior que no
ato jurídico em sentido estrito. O negócio jurídico, por sua vez, não é um simples
comportamento humano, mas sim uma declaração de vontade emitida segundo o princípio
da autonomia privada, pela qual o declarante, nos limites da função social e da boa-fé
objetiva visa atingir efeitos jurídicos escolhidos e possíveis. Exemplos: contratado,
testamento.
OBS1: as duas teorias não são paradoxais, elas se complementam. Vontade interna é
vontade que se declara. Até porque tem que existir essa harmonia entra a intenção e
o que se declara
O nosso sistema civil brasileiro é dualista, regula o ato jurídico em sentido estrito (art. 185) e o Negócio
Jurídico.
Art. 185. Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as
disposições do Título anterior.
31
3 – PLANOS DE ANÁLISE DO NEGÓCIO JURÍDICO
- Plano de existência
- Plano de validade
- Plano de eficácia
Eficácia
Validade
Existência
Elementos acidentais do NJ
Elementos essenciais do NJ
NEGÓCIO JURÍDICO:
A.1 – manifestação de vontade: vontade externa e interna. Não havendo vontade, não há
juridicamente um negócio.
OBS: o silêncio pode ser entendido como manifestação de vontade para efeito de
reconhecimento da existência do negócio? R: Segundo o professor Caio Mário, em sua obra
Instituições de Direito Civil Vol. I, em regra, o silencio é a ausência da manifestação de
vontade e por isso não produz efeitos jurídicos. Ocorre que, excepcionalmente, na linha dos
direitos belga, frances e alemão, o art. 111 do CC/02 reconhece efeitos jurídicos ao silêncio.
Exemplo: no caso da doação pura (sem encargo – art. 539) o silêncio do donatário traduz
aceitação.
A.2 – agente: para que exista o NJ deverá haver o agente emissor da vontade.
A.3 – objeto do negócio: se o NJ não tiver o objeto que não incide, não haverá NJ. Todo NJ
pressupõe um objeto.
A.4 – forma: (Vicente Ráo) a forma é o meio pelo qual a vontade se manifesta. Poderá ser
verbal, escrita, mímica. Deve ser destacada da manifestação de vontade, pois a forma é o
revestimento exterior da vontade, é a roupagem da vontade.
32
B – PLANO DE VALIDADE: O CC/02 já começa a disciplina do NJ regulando o plano de validade no art.
104 (em nosso sentir este artigo é incompleto). Se o NJ existe, você parte para plano de validade. O
plano de validade estuda os pressupostos do negócio jurídico que conferem ao NJ existente aptidão
para gerar efeitos. Por isso que se diz que é um plano qualitativo.
- Para que exista NJ Vontade e seja válido vontade deve ser livre e de boa-fé
* Nos defeitos do NJ, podem atacar a validade do NJ: erro, dolo (o dolo ataca a boa-fé, logo ele
interfere na validade do NJ), coação (coação moral interfere não na existência, mas na validade, pois
quem é coagido tem vontade, mas não é totalmente livre. Já a coação física interfere na validade.),
lesão, etc.
OBS: em geral, a doutrina civilista diz que a licitude significa legalidade e adequação ao padrão
médio de moralidade.
Vigora no Brasil, nos termos do art. 107 do CC/02, o princípio da liberdade da forma: em regra, os
NJs têm forma livre. Todavia, a própria lei (art. 227 do CC/02) pode exigir a forma escrita para efeito
de prova do negócio (negócio Ad Probacionem) – NJ acima de 10 SM exige forma escrita, tão
somente para efeito de se provar em juízo. Além disso, pode-se exigir forma também como requisito
de validade do próprio negócio (art. 108 CC/02): nesse caso, temos um negócio Ad Solemmitatem.
Imóvel acima de 30 Sm a forma pública prescrita em lei é pressuposto de forma de validade do NJ.
Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão
quando a lei expressamente a exigir.
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos
negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de
direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no
País.
Art. 227. Salvo os casos expressos, a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos
negócios jurídicos cujo valor não ultrapasse o décuplo do maior salário mínimo vigente no
País ao tempo em que foram celebrados.
Parágrafo único. Qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é
admissível como subsidiária ou complementar da prova por escrito.
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C – PLANO DE EFICÁCIA: aqui se estuda os elementos que se interferem na existência do NJ, será
visto posteriormente:
- condição
- termo
- modo ou encargo
4.1 – ERRO: ou ignorância. Defeito do negócio jurídico que o torna ANULÁVEL. Há autores que entendem
que são diferentes (teoria pura do direito) erro ou ignorância. Na teoria pura do direito, erro traduz um
comportamento positivo equivocado à falsa percepção da realidade; já a ignorância traduz um estado de
espírito negativo, uma ausência de conhecimento ao celebrar o negócio. Para nós não há que se fazer essa
distinção. O que se interesse é dizer que o erro é defeito invalidante do Negócio Jurídico, nos termos dos
arts. 138 e seguintes do CC. O erro é o equivoco que torna o NJ inválido.
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro
substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do
negócio.
A doutrina clássica, desde Clóvis Bevilaqua, sustenta que o erro, para invalidar o negócio, deve conjugar
dois requisitos:
Demonstrar que o erro ataca a substância, a essência do negócio é que o erro é perdoável.
34
AULA: 11/03/2010
4.1.1 – Espécies de erro (fático). Seguindo a doutrina de Roberto de Ruggiero, podemos identificar 3
espécies de erro (art. 139 do CC/02):
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou
principal do negócio jurídico.
B – negócio: incide na própria estrutura do negócio jurídico. Ataca a causa do negócio. A parte
imagina está celebrando um negócio jurídico, mas está celebrando outro tipo de contrato.
C – pessoa: é aquele que incide nas características pessoais ou identidade da outra parte. Celebra-se
um contrato de prestação de serviço com Pedro, no outro dia celebro um contrato com João, que é
irmão gêmeo de Pedro.
OBS: o erro sobre pessoa tem especial aplicação no Direito de Família (art. 1556 e 1557 do CC/02),
uma vez que permite a anulação do casamento.
Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um
dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.
I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu
conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a
vida conjugal;
IV - a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza,
torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.
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Questão especial de concurso: Qual é o tratamento jurídico dado ao erro de direito? (ou seja, erro
não fático, mas na ilicitude do conteúdo).
- Clóvis Bevilaqua não aceitava a teoria do erro de direito, razão pela qual o CC/16 não consagrava.
Sucede que autores Eduardo Espínola, Carvalho Santos e Caio Mário sustentaram a admissibilidade
da teoria. Nessa linha, desde que não traduza intencional recusa ao império da lei, a parte pode
interpretar equivocadamente norma jurídica, ao celebrar o negócio incorrendo em erro de direito
(art 139, inc III do CC/02).
Resposta do Pedro Henrique (Bobs), mais completa: Clóvis Beviláqua não gostava da Teoria do Erro
de Direito, razão porque o CC/16 não é explícito a respeito; Eduardo Espínola, assim como Carvalho
Santos e Caio Mário, defendiam essa possibilidade. À luz do Princípio da Boa-fé, o novo Direito Civil
(art. 139, III, CC) passou a admitir explicitamente o erro de direito, aquele que, sem traduzir
intencional recusa à aplicação da lei, incide no âmbito de atuação permissiva da norma. Em outras
palavras, é um erro de interpretação quanto à ilicitude do ato. O erro de direito, portanto, não
significa a intenção de não cumprir a lei, mas sim um erro sobre a interpretação da norma.
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou
principal do negócio jurídico.
4.2 – DOLO
Também é um defeito do negócio jurídico que também o torna ANULÁVEL. O dolo, vício invalidante do
negócio jurídico. Caracteriza-se pelo artifício malicioso imposto a uma das partes que, enganada celebra o
negócio.
OBS: o dolo é irmão do erro, mas possui uma carga de má-fé que o erro não tem. O dolo é um erro que se
provoca. A parte que é vítima do dolo é vítima de um erro provocado.
Nos termos do art. 145 do CC/02, dolo invalidante é o principal, ou seja, aquele que ataca a própria causa do
negócio; mas, se for simplesmente acidental não invalida, gerando apenas perdas e danos (art. 146 do
CC/02).
Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa (dolo principal).
Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu
despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.
Exemplo1: celebração de contrato de compra e venda. Ao comprador só interessa carro a gasolina (ano
2009). Estipula-se cláusula dizendo que o carro será entregue ao comprador pelo vendedor. Quando da
tradição, o carro é um calhambeque, não atende a finalidade proposta. Nesse caso o negócio será invalidado
– dolo principal.
Exemplo2: mesmo contrato acima, o carro atende a finalidade de compra, mas o comprador percebe que o
não poderá ser entregue conforme combinado (pela pessoa X, na data Y, etc). OBS: nesse caso o negócio
será realizado, mas haverá perdas e danos.
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Ver no CC/02 dolo de representando art. 149 e dolo bilateral art. 150.
Art. 149. O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder
civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante
convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio,
ou reclamar indenização.
A luz do princípio da boa-fé objetiva, dolo negativo, nos termos do art. 147 do CC/02, traduz o silêncio ou a
omissão intencional de informação, invalidante do negócio jurídico.
Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato
ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o
negócio não se teria celebrado.
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem
aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio
jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.
Ou seja, o negócio só será anulado se o terceiro sabia ou tinha como saber do dolo. Não se pode esquecer
que a anulação só ocorrerá se o beneficiário soubesse ou tivesse como saber do engodo; em caso contrário,
o negócio é mantido e apenas o terceiro responde pelas perdas e danos.
Idéia básica do professor: Nos termos do art. 149 do CC/02, deve ficar claro que o negócio só será
invalidado, se o beneficiário soubesse ou tivesse como saber do dolo de terceiro.
Esse dolo de terceiro, na dicção clássica, é chamado de “dolo malus” (direito romano).
- “Dolo bônus”: No meio publicitário, como forma de chamar a atenção do produto, valorizando as
características do produto, existe a figura do “dolo bônus” (socialmente aceito). Exemplos: sanduíche na
propaganda (foto) do Macdonalds. Propaganda de xampu. É juridicamente lícito. O que é ilícito é a mudança
das características e divulgar o que não exista.
A denominada mensagem subliminar é aquela que no captada diretamente pela faculdade cognitiva
humana, é absorvida pelo inconsciente e induz o sujeito a comportamento não desejado. Tramita no
Congresso dois projetos de lei coibindo a prática (PL 4068/2008 e PL 4825/2009). Esses projetos visam
alterar o CDC para proibir esse tipo de prática dolosa.
4.3 – COAÇÃO:
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A coação, vício INVALIDANTE do negócio jurídico, caracteriza-se pela violência psicológica apta a influenciar
a vítima a realizar negócio jurídico que lhe é prejudicial. Enquanto o dolo é o engano e você realiza um
negócio jurídico que lhe prejudica, já na coação você é ameaçado, coagido para realizar o negócio jurídico
prejudicial.
Essa ameaça é direcionada a você ou um terceiro (família, amigo, etc). Você expressa vontade, mas essa
vontade é viciada.
Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado
temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.
Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base
nas circunstâncias, decidirá se houve coação.
Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o
temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.
OBS: A coação deve ser apreciada de acordo com o homem médio (Falso). A coação aprecia-se em concreto
A ameaça de um exercício regular de um direito não caracteriza-se coação. Exemplo: notificação de empresa
de cartão de crédito pedindo para quitar a fatura em aberto, sob pena de inscrição em cadastro de
inadimplentes.
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor
reverencial.
OBS: vale lembrar que a recente súmula 385 do STJ nega o direito à reparação por dano moral a aquele que
já tendo o nome negativado, sofre outra inscrição indevida. (para o professor esse entendimento é um
retrocesso).
Súmula 385 do STJ: Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização
por dano moral,quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.
- Temor reverencial: respeito à autoridade, não significa coação. O simples temor não gera coação. Pontes
de Miranda: juntamente com o temor vir a ameaça. Ex: patrão pede dinheiro emprestado, mas se no
emprestar será despedido.
- Coação de terceiro: muita parecida com o dolo de terceiro, mas possui uma diferencia em um advérbio. A
coação de terceiro (art. 154 e 155 do CC/02) tem disciplina semelhante a dolo de terceiro. Todavia,
diferencia-se na medida em que a vítima poderá exigir indenização do beneficiário e do terceiro em
solidariedade passiva. Havendo coação de 3º o NJ é anulado desde que o beneficiário saiba ou tinha como
saber do vício, respondendo solidariamente pelas perdas e danos; caso não saiba ou não tinha como saber,
o NJ é mantido, respondendo apenas o 3º pelas perdas e danos.
Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter
conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e
danos.
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Art. 155. Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que
aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as
perdas e danos que houver causado ao coacto.
4.4 – LESÃO
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se
obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1º - Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi
celebrado o negócio jurídico.
Os romanos diziam: existirá lesão enorme quando o preço praticado no contrato for inferior a metade do
preço justo ao tempo da venda. Para os romanos é uma forma de usura, um abuso. Será enormíssima se for
superior a 2/3 do preço justo. O vendedor era lesado em mais de 2/3 do preço justo (preço de mercado) ao
tempo da venda.
- CONCEITO: a lesão, vício invalidante do negócio jurídico, caracteriza-se pelo prejuízo resultante da
desproporção existente entre as prestações do negócio, em face do abuso da necessidade ou inexperiência
de uma das partes.
A tônica da lesão, o que está por trás dela, é o abuso do poder econômico, o interesse econômico,
especialmente.
A primeira lei no Brasil que trata do assunto foi uma lei criminal, lei 1521/51 – lei de economia popular, que
em seu art. 4, tipificava o crime de usura.
O STJ, no Resp. 434.687/RJ, firmou entendimento de que, no direito anterior, o negócio jurídico com lesão
deveria ser considerado nulo por ilicitude do objeto, a teor do CC/16.
A luz do CDC (art. 6º, inc. V; art. 39, inc. V; art. 51, inc. IV), a lesão é tratada como causa de NULIDADE
ABSOLUTA do negócio jurídico.
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No CC/02, a lesão não exige o dolo de aproveitamento. Na disciplina do CC/02, o dolo de aproveitamento
(intenção de aproveitar de alguém) não foi exigido. O CC/02 manteve o requisito objetivo/material, mas não
exigiu que demonstrasse em juízo o dolo de aproveitamento, ou seja, o codificador não exigiu a prova do
dolo, da intenção de aproveitar, de prejudicar, de abusar.
OBS: a lesão no CDC é causa de nulidade absoluta; mas, no CC/02, de simples anulabilidade.
4.5 – SIMULAÇÃO:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na
substância e na forma.
Na simulação existe uma bilateralidade lícita. Duas partes se unem para prejudicar um terceiro ou a própria
lei.
- Conceito: na simulação celebra-se um negócio jurídico com aparência normal, mas que, em verdade, não
pretende atingir o efeito que juridicamente deveria produzir.
A) Absoluta: na absoluta as partes criam um negócio jurídico destinado a não gerar efeito algum. H á
a aparência de um negócio, mas as partes não desejam celebrar negócio algum; é tudo mentira .
Exemplo: homem que simula um negócio com outra pessoa, mas o negócio na verdade não existe
(simula uma compra e venda para terceiro, mas na realidade não transfere a propriedade).
OBS: Na simulação relativa subjetiva, a mentira está nas partes (ex.: “laranja”); na simulação relativa
objetiva o que é falso é o objeto, a condição, a data, o preço, etc.
O CC/16 negócio simulado era anulável, sucede que o novo CC/02, quer seja absoluta o relativa, o art. 167
do CC/02 estabelece que a simulação é causa de nulidade absoluta.
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OBS: o enunciado 294 da 4ª jornada de Direito Civil (“Sendo a simulação uma causa de nulidade do negócio
jurídico, pode ser alegada por uma das partes contra a outra”) traz uma informação de clareza meridiana:
uma vez que a simulação é causa de nulidade absoluta, qualquer dos simuladores pode alegá-la. Pode ser
declarada de ofício pelo juiz, pois se trata de nulidade absoluta. Vale observar que, a luz do princípio da
conservação, e nos termos da segunda parte do art. 167, na simulação relativa, o negócio simulado é nulo,
mas o negócio dissimulado poderá ser aproveitado se não ofender a lei ou prejudicar terceiro (enunciado
153 da 3ª jornada). Ex: separado de fato pode constituir união estável. Faço uma doação para minha
companheira, simulo uma compra e venda para realizar a doação para a companheira. Nesse caso o juiz
poderá aproveitar o negócio.
R: Pontes de Miranda. A reserva mental se configura quando o agente emite declaração de vontade,
resguardando o íntimo propósito de não cumprir a finalidade projetada. A reserva mental, enquanto
encerrada na mente do agente, não tem repercussão jurídica. Todavia, uma vez externada a reserva
e dela tomando conhecimento a outra parte, parte da doutrina defende a invalidade do negócio
jurídico por dolo ou simulação (Carlos Roberto Gonçalves e o professor Pablo; mas, vale frisar que o
CC/02, na linha de pensamento do Ministro Moreira Alves (art. 110 do CC/02) dispõe que
manifestada a reserva o negócio torna-se inexistente. Se a outra parte toma conhecimento o
negócio subsiste.
Ex.: um prof. qualquer acabou de publicar um livro, chegou a uma universidade para lançar o livro e
disse que toda a renda gerada com a venda do livro naquele dia seria doada a uma instituição de
caridade, mas mantém no seu intelecto a íntima idéia de não doar nada. Até ai não há repercussão
no direito. Mas, se ele assume para alguém ou fala para si mesmo e alguém o escuta dizendo que
não vai doar o dinheiro e o aborda, ai sim haverá repercussão no direito.
Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva
mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento.
R: parceria pecuária: transferência de animais para um terceiro e esse terceiro explora o leite,
recebe algumas crias e depois devolve os animais com algumas crias. No contrato de vaca papel
simula-se o contrato de parceria pecuária para mascarar a transferência de dinheiro a juros abusivos.
Contrato de vaca papel é um negócio simulado que cobre, a título de parceria pecuária, empréstimo
a juros extorsivos ou ilegais (ver Resp. 441.903/SP).
É uma aplicação do estado de necessidade na teoria do negócio. O desespero está no estado de perigo.
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- Conceito: o estado de perigo, vício invalidante do negócio jurídico (causa de ANULAÇÃO), configura-se
quando o agente, diante de situação de perigo de dano conhecido pela outra parte assume obrigação
excessivamente onerosa para salvar-se ou pessoa próxima (art. 156 do CC/02).
Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a
pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente
onerosa.
Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá
segundo as circunstâncias.
OBS1: não confundir o estado de perigo com a lesão e nem com a coação. Não há coação, a outra parte não
causou o mal. A outra parte sabe de minha situação e aproveita-se dessa minha fragilidade. Na lesão
assume-se uma obrigação onerosa por necessidade ou inexperiência. No estado de perigo você está
desesperado para salvar alguém ou a si mesmo de dano existencial grave (saúde, integridade física, vida
etc.), ou seja, é muito mais do que a lesão.
OBS2: o art. 156, ao referir o conhecimento do perigo pela outra parte, traduz a existência do dolo de
aproveitamento.
Exemplos: Venosa: perfeita a aplicação da teoria do estado de perigo refere-se à situação de emissão de
cheque caução como condição para internamento hospitalar de emergência. Afronta-se a função social. Na
jurisprudência ver AP 833355-7/SP e Resp. 918392 do RN.
A ANS, por meio da Resolução 44/03, nos seus termos, proíbe a exigência desse tipo de caução,
estabelecendo que as denúncias deverão ser remetidas ao MPF.
AULA: 16/03/2010
- Conceito: a fraude contra credores, regulada a partir do art. 158 do CC/02, caracteriza-se pela prática de
um ato negocial que diminui o patrimônio do devedor, prejudicando credor preexistente.
A fraude contra credores pressupõe que a insolvência do devedor seja atual ou iminente.
Ou seja, é a atuação maliciosa do devedor insolvente ou na iminência de assim se tornar, que se desfaz do
seu patrimônio procurando não responder pelas obrigações anteriormente assumidas.
OBS: diferentemente da simulação, na fraude contra credores não há um necessário disfarce e a vítima é
qualificada (o credor preexistente).
- Elementos da fraude contra credores: Existem duas diferenças básicas entre a fraude contra credores e a
simulação: na fraude, não há um necessário disfarce, e, além disso, a sua vítima é específica (o credor
preexistente) – tradicionalmente, a fraude contra credores pressupõe 2 requisitos (além é claro da
anterioridade do crédito ou obrigação):
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- concilium fradis: ou seja, a má-fé das partes envolvidas
OBS: autores brasileiros desde Clóvis Bevilaqua chegando a Maria Helena Diniz afirmam que o
concilium fraudi não necessita de prova cabal, sendo presumido, especialmente nos negócios
gratuitos. A má-fé presume-se pela situação fática.
Ex: O credor doa seus bens para sua esposa. Essa doação não é possível em face dos credores
preexistentes, pois este fato caracteriza fraude.
- Hipóteses legais de fraudes contra credores: há dispositivos em outras leis, mas o ficaremos aqui nas
hipóteses estancadas no CC/02.
a) Negócios de transmissão gratuita de bens (art. 158 do CC/02). Nesta hipótese existe uma doação
fraudulenta.
b) Remissão fraudulenta de dívidas (art. 158). Remissão é o perdão. Aqui verifica-se o perdão
fraudulento.
c) haverá fraude também nos negócios onerosos, quando a insolvência do devedor for notória ou
houver motivo para ser conhecida pelo outro contratante (art. 159). Se o credor preexistente
verificar que em um contrato de compra e venda de um terreno avaliado em R$ 90.000,00, mas o
devedor realiza a venda por R$ 20.000,00, por exemplo, e o credor sofrer com essa alienação, é caso
de fraude.
e) haverá ainda fraude nos casos de outorga fraudulenta de garantia de dívida (art. 163). O devedor
insolvente possui 4 credores sem garantias, do patrimônio do insolvente o que lhe é resta é um
prédio. O devedor teria que alienar o prédio e pagaria na ordem. Ocorre que o insolvente não pago
na ordem. O devedor insolvente vai ao 4º credor e diz que hipotecará o imóvel no favor dele,
pedindo um desconto na dívida. Prejudicará os outros credores e será causa de fraude.
A fraude à execução é mais grave, uma vez que já existe contra o devedor demanda capaz de reluzi-lo à
insolvência: trata-se de instituto processual que autoriza o reconhecimento da sua ineficácia total,
garantindo-se o contraditório (ver Resp. 684925/RS e súmula 375 do STJ) Na fraude à execução, o devedor já
esta sendo processado. Não precisa estar na fase de execução, em fase de conhecimento também pode se
verificar a fraude.
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Aqui ainda não existe demanda instaurada É instituto processual, podendo o juiz pronunciar a sua
contra o devedor (Resp. 684.925/RS). nulidade absoluta de ofício (resguardado o direito de
defesa); se configura quando já existe contra o devedor
Caderno do prof. André Barros: demanda capaz de reconhecer ou reduzi-lo à insolvência. É
- é instituto de Direito Civil; mais grave. Desrespeita a justiça, o Poder Judiciário.
- há presunção de má-fé.
Açao Paulina: Denomina-se ação pauliana a ação judicial que visa impugnar o negócio jurídico em fraude
contra credores. Trata-se de uma ação pessoal, com prazo decadência de 4 anos para a sua propositura.
Trata-se de uma ação específica, o que explica inclusive não se poder discutir a fraude em sede de embargos
de terceiro (súmula 195 do STJ).
Súmula 195 do STJ: em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores
A legitimidade ativa da ação pauliana é do credor preexistente, inclusive aquele com garantia, se esta se
tornar insuficiente (parágrafo 1º do art. 158). Em regra quem tem interesse é o credor preexistente sem
garantia, mas se o credor com garantia e esta se tornar insuficiente, este também tem direito à ação
pauliana.
A ação pauliana deverá ser proposta em face do devedor insolvente, e, se for o caso, contra a pessoa que
com ele contratou e também o terceiro de má-fé (ver Resp. 242151/MG). Com base no princípio da boa-fé,
que orienta a interpretação do artigo 161, se o terceiro a quem se transferiu o bem demonstrar a sua boa-fé,
não poderá ser prejudicado: neste caso, o credor buscará outras vias de compensação. Ex: um terceiro
compra um bem de devedor, mas não sabe de sua dívida. Se de boa-fé a ação paulina não ser em face dele.
1ª Corrente: essa corrente, tradicional (Nelson Nery, Moreira Alves, Clóvis Bevilaqua), alicerçada no art. 165
do CC/02, afirma: trata-se de sentença anulatória de negócio jurídico inválido. Essa corrente é a do Código
Civil. Para esta corrente quando o juiz proferir a sentença, ele anula o negócio jurídico que surtiria os efeitos,
pois uma vez anulado, não surtirá os seus efeitos.
Art. 165. Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo
sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.
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Parágrafo único. Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante
hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência
ajustada.
2ª Corrente: nesta corrente, mais arrojada (Yussef Said cahali, Federico Pinheiro, Alexandre Câmara),
sustenta que a sentença na pauliana simplesmente é declaratória da ineficácia jurídica do negócio
fraudulento em face do credor prejudicado (ver Resp. 506312/MS). Nesse julgado o STJ adota postura
contra a letra do CC/02. Ex: faço uma doação para o meu filho, mas existe um credor preexistente. Ocorre
que ganho na loteria e pago o credor, logo, o negócio (doação) seria válido e não poderia ser anulado.
5 – PLANO DE EFICÁCIA:
Neste terceiro plano, segundo o professor Junqueira de Azevedo, estuda-se a projeção da eficácia jurídica do
negócio e dos Elementos que ai interferem. Estudando-se aqui, os elementos acidentais do negócio jurídico:
condição, termo e modo ou encargo. Eles podem ou não ocorrer, por isso são acidentais.
5.1 – ENCARGO:
Elemento acidental típico de negócios gratuitos. Traduz um ônus a ser cumprido, em prol de uma
liberalidade maior. Típicos de contratos gratuitos como a doação. No CC/02 é disciplinado em dois artigos
136 e 137.
Art. 136. O encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito, salvo quando
expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente, como condição suspensiva.
Art. 137. Considera-se não escrito o encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir o motivo
determinante da liberalidade, caso em que se invalida o negócio jurídico.
Não escrito é o mesmo que inexistente; mas, atenção, se na interpretação do contrato o juiz entender que o
encargo foi a própria finalidade do negócio, todo o negócio será inválido (ex.: dôo meu apartamento com o
encargo de você, todas as quintas-feiras, realizar nele jogos de azar). É uma questão interpretativa.
OBS: o art. 137 dispõe que, em regra, considera-se não escrito encargo ilícito ou impossível; mas, se ficar
demonstrado que este encargo foi a própria finalidade do negócio, todo este deverá ser invalidado. É uma
questão de interpretação jurídica.
5.2 – CONDIÇÃO
Conceito: trata-se de um elemento acidental consistente em um acontecimento futuro e incerto, por meio
do qual subordinam-se ou resolvem-se os efeitos jurídicos de determinados negócios.
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- futuridade: significa que fatos passados pretéritos não caracterizam condição. Ex: quando se casar com
minha irmã, lhe dou o apartamento. Para que seja condição o fato deve ser futuro.
- incerteza: a incerteza da condição refere-se a sua ocorrência: para ser condição, não há certeza de que o
fato ocorrerá. Ex: eu celebro com alguém um contrato pelo qual doarei um carro ou uma casa, sob a
condição do cruzeiro ser campeão. Trata-se de um evento futuro e incerto. OBS: a morte por se tratar de um
evento certo em nossas vidas, regra geral, não traduz condição. Todavia, se a previsão da morte for dentro
de determinado prazo, neste caso, não se sabe se ocorrerá, de maneira que haverá condição. O CC/02, em
seu art. 121, deixa claro que a condição é sempre estipulada pela vontade das partes e refere-se a evento
futuro e incerto. Condições impostas pela lei (condiciones júris) não mais existem a luz do art. 121 do CC/02.
Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes,
subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
- Classificação da Condição:
Suspensiva é aquela que subordina o início da eficácia jurídica do negócio; já a resolutiva, resolve ou
desfaz os efeitos jurídicos até então produzidos pelo negócio. Na resolutiva, o negócio é celebrado e
tem eficácia jurídica de imediato até que o negócio se complemente. A luz do art. 125 do CC/02 a
condição suspensiva “suspende” não apenas a exigibilidade, mas a própria aquisição do direito e da
obrigação correspondente. Enquanto a condição suspensiva não se implementa, as partes não
adquirem os direitos e as obrigações correspondentes, de maneira que em caso de pagamento
antecipado, em regra, é cabível a devolução do que se pagou (Caio Mário). No que tange à condição
resolutiva, matéria tratada na grade de teoria geral do contrato, o CC/02 a disciplina nos artigos 127
e 128.
- lícita: nos termos do art. 122 do C/02, fixou-se a seguinte regra: lícita é a condição que não for
contrária à lei, a ordem pública e aos bons costumes.
- ilícita: quando for contrária à lei, à ordem pública e aos bons costumes. Consideram-se ilícitas
também a condição perplexa e a condição puramente potestativa. Condição perplexa, reputada
ilícita, é aquela contraditória nos seus próprios termos. A condição puramente potestativa é ilícita
pois o acontecimento que subordina a eficácia jurídica do negócio, deriva do exclusivo capricho de
uma das partes. OBS1: a ilicitude da condição puramente potestativa não deve ser invocada nas
situações em que o próprio legislador admite a prevalência excepcional da vontade exclusiva de uma
das partes. Ex: art. 49 do CDC, 509 do CC/02. Já a condição simplesmente potestativa, por sua vez, é
lícita, pois embora derive da vontade de uma das partes é temperada pelas próprias circunstâncias
do negócio. OBS2: e o que seria a condição promiscua? R: trata-se daquela condição que nasce
simplesmente potestativa e se impossibilita depois por conta de acontecimento superveniente. Ex:
pagamento de bicho para ser artilheiro, se quebro a perna, a condição se impossibilita. Nos termos
do art. 123 do CC/02, inciso II C/C com o art. 166, inciso VII, a condição ilícita tem por conseqüência
invalidar todo o negócio jurídico (nulidade absoluta).
c) Quanto à origem:
46
- casual: evento da natureza.
- mista: deriva da vontade de uma das partes e de um fator externo, em geral a vontade de um
terceiro. (eu lhe dou capital de que você precisa sob condição de formar sociedade com meu irmão).
- potestativa: é a que deriva da vontade das partes, podendo ser simplesmente ou puramente
postestiva. A puramente é ilícita.
5.3 – TERMO:
Conceito: o termo, elemento acidental do negócio jurídico, é o acontecimento futuro e certo que interfere
na eficácia jurídica do negócio. Duas características: futuridade e certeza quanto a sua ocorrência.
Diferentemente da condição o termo é futuro e certo. Em geral o termo é data do boleto que vence a fatura
do cartão e credito, por exemplo. São datas certas previstas em contrato. Art.131 do CC/02.
Art. 131. O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito.
Teoricamente, costuma-se classificar o termo em: convencional (estipulado pela vontade das partes), legal
(determinado por lei) ou judicial (também chamado de termo de graça, aquele fixado pelo juiz).
Obs.: diferentemente da condição suspensiva, o termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do
direito. Vale dizer, celebrado o negócio, as partes já têm desde já direitos e obrigações recíprocos, posto
ainda não exigíveis.
- certus an certus quando: é o termo certo; é aquele que é certo que ocorrerá e que se sabe quando
ocorrerá (ex.: data futura);
- certus an incertus quando: é o termo incerto; é aquele que é certo que ocorrerá, mas não se sabe quando
ocorrerá (ex.: morte).
AULA: 23/03/2010
- NULIDADE ABSOLUTA
47
A luz do princípio da conservação, o intérprete deve tentar, como diretriz da sua atividade hermenêutica,
sempre que possível, conservar o negócio jurídico invalido, a exemplo do que se da por meio da sua
“redução” (art. 184 do CC/02).
Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o
prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das
obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal.
Como regra geral, nulidades não se presumem. As bases na nulidade absoluta estão nos arts. 166 e 167. O
art. 167 já foi estudado quando da simulação, restando a análise do art. 166 do CC/02.
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
III – o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito: o legislador está se referindo à própria
finalidade do negócio, à sua causa. Quando a finalidade for ilícita.OBS: a despeito de Clóvis Bevilaqua haver
sido anti causalista, resistindo ao pensamento de autores como Domat, Pothier e Cariota Ferrara, percebe-se
a influência da teoria da causa no inciso III do art. 166, quando constatamos ser nulo o NJ de causa ou
finalidade ilícita. Quando se detectar que as finalidades da partes é ilícitas, mas o objeto é lícito, o NJ é
inválido.
IV – forma prescrita em lei. A inobservância da forma pode gerar nulidade absoluta. Ex: venda de um imóvel
acima de 30 SM (art. 108 do CC/02) exige forma pública.
V – preterida alguma solenidade: há situações em que as solenidades devem ser observadas, e caso não
seja, é inválido o NJ.
VI – se o NJ estiver objetivo de fraudar a lei objetiva: a fraude à lei é muito abrangente. Para o prof., nesse
artigo, o legislador quis resguardar o Direito Tributário e trabalhista.
VII – quando a lei proíbe e não diz qual é a sanção, ou quando a lei diz ser nulo o NJ.
48
6.1.1) CARACTERÍSTICAS DA NULIDADE ABSOLUTA:
A) A nulidade absoluta, dada a sua gravidade, poderá ser argüida por qualquer interessado, pelo MP
(quando lhe couber intervir), podendo inclusive ser reconhecida de ofício pelo próprio juiz (art. 168 do
CC/02).
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou
pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.
Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico
ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a
requerimento das partes.
OBS: no caso da nulidade absoluta de casamento, art. 1549 do CC/02, autores como Tartuce e Simão, com
propriedade, observam a impossibilidade do reconhecimento de ofício pelo juiz.
B) a nulidade absoluta não admite confirmação nem convalesce pelo decurso do tempo (art. 169 do CC/02).
Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do
tempo.
OBS: esta imprescritibilidade (não há prazo para argüir a nulidade) refere-se à declaração da nulidade
absoluta e não aos eventuais efeitos patrimoniais, que são prescritíveis.
C) a sentença declaratória de nulidade absoluta opera efeitos retroativos (ex tunc), para fulminar o negócio
nulo na sua origem, respeitados por óbvio efeitos em face de 3º de boa-fé.
A base da nulidade relativa encontra-se no artigo 171 do CC/02. Existem outras previsões de nulidade, por
isso que o artigo diz que: além dos casos expressamente declarados em lei (...), ou seja, o casos trazidos no
art. 171 são meramente exemplificativos.
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:
II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
A) A nulidade relativa deverá ser argüida por meio de ação anulatória, proposta por quem tenha interesse
jurídico, não podendo o juiz reconhecer de ofício a anulabilidade (art. 177).
49
Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício;
só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de
solidariedade ou indivisibilidade.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico,
contado:
II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o
negócio jurídico;
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-
se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.
OBS: até que seja proferida a sentença anulatória, o NJ anulável gera efeitos jurídicos o que se convencionou
chamar de eficácia interimística.
Em regra, ação anulatória de NJ anulável possui o prazo prescricional de 4 anos. Porém, quando a lei não
dispuser o prazo do NJ anulável, este prazo é dois anos a contar da conclusão do ato. OBS: o art. 179, ao
estabelecer o prazo decadencial de 2 anos para a propositura de ação anulatória, quando não haja sido
previsto prazo, revogou a súmula 494 do STF, referente à venda de ascendente a descendente (ver também
enunciado 368 da 4ª jornada de Direito Civil).
C) Por ser menos grave, a nulidade relativa admite confirmação expressa ou tácita (arts. 172 a 174).
Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.
Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa
de mantê-lo.
Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo
devedor, ciente do vício que o inquinava.
D) a despeito da polêmica, entendemos, com base no art. 182 do CC/02, na linha de pensamento do
professor Humberto Theodoro Junior, que a sentença anulatória, posto desconstitutiva, gera efeitos
retroativos (ex tunc). Se a sentença não retroagi as partes não poderão retornar ao estado anterior.
Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se
achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente.
Questões:
- O que é conversão substancial do Negócio Jurídico? R: Trata-se de uma medida sanatória por meio da qual
aproveitam-se os elementos materiais de um negócio inválido, convertendo-o em outro negócio válido e de
50
fins lícitos. A despeito de a doutrina admitir a conversibilidade tanto para o negócio nulo como para o
anulável (Marcos Bernardes de Melo), o art. 170 do CC/02 regula o instituto para o negócio nulo. Existe mais
utilidade em converter o negócio nulo, pois o anulável possui outras hipóteses de aproveitamento.
Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o
fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.
Para que haja conversão do negócio, é necessário o aproveitamento dos elementos materiais do negócio
invalido (requisito objetivo) e também que fique demonstrado que se as partes houvessem previsto a
nulidade, teriam desejado o negócio convertido (requisito subjetivo).
Exemplo de conversão: o aproveitamento do contrato de compra e venda nulo por vício de forma em
promessa de compra e venda.
51
VI – PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA
Mas, qual é a natureza jurídica do decurso do tempo? Ele deflagra efeitos aquisitivos (é possível adquirir
direitos – ex.: usucapião); modificativos de situações jurídicas (a capacidade, por ex., muda com o decurso
do tempo); bem como, pode também ter eficácia extintiva, de perda de direitos e prerrogativas (que é o
caso da prescrição e decadência).
O tempo, portanto, é um fato jurídico em sentido estrito, comum, ordinário. Esta é a sua natureza jurídica, já
que ele deflagra importantíssimos efeitos na ordem jurídica.
1) PRESCRIÇÃO:
Houve um tempo em que se dizia que a prescrição ataca a ação. Esta afirmativa não possui mais espaço no
nosso atual Direito Civil brasileiro. Existe um dogma do Direito Civil Clássico que precisa ser derrubado no
Direito Civil Moderno: não se pode mais dizer que a ação está prescrita, ou que a prescrição ataca a ação. A
prescrição não tem nada a ver com o direito de ação. Isso se dizia no passado, de acordo com a Teoria
Imanentista da ação, quando não se conseguia visualizar a independência entre o direito material e o direito
de ação.
A partir de Agnelo Amorim Filho, a doutrina começou perceber no Brasil que a prescrição não ataca a ação,
as ações não prescrevem.
Não é correto o entendimento da doutrina clássica, segundo o qual a prescrição “extingue a ação”, uma vez
que o moderno direito de ação (direito abstrato constitucional de se pedir ao Estado uma prestação
jurisdicional), por óbvio não prescreve nunca.
EXEMPLO: Pablo celebrou com Freddie determinado contrato. Contrato em que Pablo é credor e Freddie é
devedor de uma prestação de R$ 1000,00. Contrato celebrado em 23/03/2010. O vencimento seria dia
23/04/2010 (fixada data tem-se um termo). Freddie no dia do vencimento não paga, logo, violou o direito à
prestação. A partir desse dia começa a correr o prazo prescricional, Dentro desse prazo eu tenho que
formular a pretensão em juízo. Por influência do direito Alemão, o art. 189 do CC/02 deixa claro que o que
prescreve não é o direito de ação, mas sim a PRETENSÃO do credor, nascida a partir da violação do seu
direito à prestação. Por pretensão, entenda-se o poder de coercitivamente exigir-se um cumprimento da
prestação inadimplida. O que prescreve não é a ação, é a pretensão. A pretensão é a munição que o
ordenamento jurídico me dá. Passado prazo prescricional, eu tenho o direito de ação, mas eu não tenho o
poder de coercitividade.
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos
prazos a que aludem os arts. 205 e 206.
2) DECADÊNCIA:
52
A decadência, também chamada de caducidade nada tem a ver com o direito à prestação, nem, muito
menos, refere-se à pretensão. Decadência refere-se a direitos potestativos, por direito potestivo entenda-se
aquele que, sem conteúdo prestacional, interfere na esfera jurídica alheia sem que esta pessoa nada possa
fazer, é um direito de interferência, quando você exerce o direito, a outra parte não terá que realizar
qualquer prestação, o direito somente interfere na esfera jurídica dessa pessoa.
Existem diretos potestativos sem prazo, mas sempre que um direito potestativo possuir prazo para o seu
exercício ESTE PRAZO SERÁ DECADENCIAL.
OBS: diferentemente dos prazos prescricionais, que sempre são previstos em lei, os prazos decadenciais
podem ser legais ou convencionais, já os prescricionais não.
3) OBSERVAÇÕES GERAIS
Se na hora da prova der branco, e eu não me lembrar da diferença entre prescrição e decadência, basta
recordar que os prazos prescricionais estão em dois únicos artigos do CC/02 (205, prazo geral de 10 anos, e
206, que traz inúmeros prazos prescricionais especiais)
As causas impeditivas impedem que o prazo prescricional comece a correr. A mesma causa poderá ser
suspensiva se o prazo havia começado a correr .
As causas impeditivas ou suspensivas do prazo prescricional encontram-se nos artigos 197 a 199.
III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
53
Art. 197, Inc. I: significa que na constância da sociedade conjugal o prazo prescricional pode estar impedido
ou suspenso. Dizer que o prazo está impedido significa dizer que ele não começa a correr. O prazo suspenso
é aquele que estava correndo e fica paralisado.
OBS: Prazos decadenciais, como regra, não se submetem a tais causas (impeditivas, suspensivas e
interruptivas), embora existam exceções no sistema (art. 26, parágrafo 2º do CDC).
A causa interruptiva é o grande temor dos devedores, uma vez que, quando verificada, o prazo prescricional
remoça a contar do zero (art. 202).
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no
prazo e na forma da lei processual;
VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo
devedor.
Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou
do último ato do processo para a interromper.
Inc. III: esse inciso derrubou a súmula 153 do STF que dizia exatamente ao contrário (dizia que não
interrompia a prescrição.
Pergunta: Devedor do banco, prazo correndo, na última semana do fim do prazo o banco envia uma
notificação via AR, esta notificação interrompe o prazo? OBS: a rigor, e na letra fria do CC/02, uma mera
notificação extrajudicial não interrompe o prazo prescricional (o PL 3293 de 2008 pretende incluir este tipo
de notificação como causa interruptiva da prescrição).
5.1) os prazos prescricionais, por serem regulados por lei, não podem ser alterados pela vontade das partes
(art. 192); já os decadenciais, se forem convencionais, por óbvio poderão.
54
5.2) a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição pela parte interessada (art. 193); a
decadência também, embora valha lembrar que a decadência legal poderá ser reconhecida de ofício. Arts.
210 e 211 do CC/02.
5.3) E a prescrição pode ser reconhecida de ofício pelo juiz? Inovando, a lei 11.280/2006, pondo por terra o
art. 194 do CC/02, alterou ainda a redação do parágrafo 5º do art. 219 do CPC, para dispor: “o juiz
pronunciará de ofício a prescrição”.
A despeito da polêmica em doutrina, estando em curso um processo com pretensão prescrita, a luz do
princípio da cooperatividade, e respeitando a faculdade conferida ao devedor de renunciar à prescrição (art.
191 do CC/02, enunciado 295 da 4ª jornada), deverá o juiz, antes de pronunciar a prescrição, abrir prazo
para que as partes se manifestem: o credor poderá, por exemplo, demonstrar que o prazo não se consumou,
e o devedor poderá renunciar à sua defesa. Mas, uma vez silente o juiz pronunciará de ofício a prescrição.
DICA PROFESSOR: Não posso deixar de ler o art. no material de apoio que trata da contagem de prazo, art.
2028 do CC/02.
- O tema prescrição intercorrente, a ser estudado na grade processo, traduz a situação da prescrição que se
consuma dentro de um processo já existente. Em regra, no processo civil em geral, como a paralisação é
atribuída ao próprio judiciário, há um tendência no reconhecimento da tese (AgRg no Ag 618909/PE). Se o
processo ficar parado por muito tempo, pode ocorrer uma prescrição dentro do processo.
PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA:
Vejamos:
55
Direitos Subjetivos:
Violado um direito subjetivo, o seu titular passa a ter uma pretensão de exigir
judicialmente o comportamento ou a reparação do dano causado.
Exemplos:
Direitos Potestativos:
São aqueles que conferem ao seu titular a possibilidade, o poder de fazer produzir
efeitos pela simples manifestação de vontade.
56
Todos os efeitos decorrem da manifestação de vontade do titular. O direito
potestativo jamais admite violação, jamais pode ser violado, pois ele só depende do seu
titular.
O que caracteriza o direito potestativo é o poder do titular de fazer surtir efeitos pela
sua própria manifestação de vontade.
Exemplos:
- Jus variandi: no direito do trabalho, o jus variandi é o poder diretivo (de comando)
que o empregador tem na relação de trabalho;
Alguns direitos potestativos terão prazo previsto em lei para o seu exercício, outros
não. A lei estabelecerá um prazo para o exercício de alguns direitos potestativos, para
outros não, pois eles poderão ser exercidos a qualquer tempo.
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela
prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.
57
PRESCRIÇÃO é a perda de uma pretensão de exigir de alguém um determinado
comportamento.
Ou seja, nem todo direito subjetivo prescreve, pois não prescrevem os direitos
subjetivos extra-patrimoniais e absolutos.
☺art. 810, CPC, que confirma que prescrição e decadência são decisões de mérito
(com resolução de mérito): o único caso no sistema brasileiro de extinção de um processo
cautelar com resolução de mérito é no caso de o juiz acolher a prescrição ou a decadência.
Se o juiz extinguiu o processo com resolução de mérito, o que se perdeu não foi o
direito de ação, mas sim a pretensão.
Como vimos, nem todo direito subjetivo prescreve, pois só prescrevem os direitos
subjetivos patrimoniais e relativos. Assim, diz-se que a prescrição é um instituto
visivelmente de interesse privado. Ela diz respeito a interesses econômicos, patrimoniais.
Há apenas uma exceção: o sistema permite ao juiz conhecê-la de ofício. Mas,
essencialmente, ela é um instituto de interesse privado.
A DECADÊNCIA é a perda de um direito que não foi exercido por seu titular no prazo
contemplado em lei. A decadência é, pois, a perda de um direito que deveria ter sido
exercido e não o foi.
O único tipo de direito que só depende do seu titular para ser exercido é o direito
potestativo. Assim, toda decadência é de direito potestativo.
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decadência os direitos potestativos que tenham prazo prescrito em lei. Nessa medida, se
não há prazo prescrito em lei, já não se pode falar mais em decadência.
Ou seja, nem todo direito potestativo decai. Só decaem os direitos potestativos com
prazo prescrito em lei, quando não forem exercidos naquele prazo.
Características da Prescrição:
A Lei 11.280/06 modificou o CPC e permitiu, no art. 219, §5º, que o juiz conhecesse
de ofício a prescrição.
59
Assim, sabendo que o juiz agora pode conhecer de ofício a prescrição, surge a
dúvida: a prescrição deixou de ter interesse privado e passou a ser de interesse público?
Não! Peremptoriamente não!
295 – Art. 191. A revogação do art. 194 do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006, que
determina ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a
possibilidade de renúncia admitida no art. 191 do texto codificado.
Os prazos prescricionais não podem ser modificados pela vontade das partes. Eles
não admitem modificação. E há muita lógica nisso: a prescrição admite renúncia dentro de
determinados limites. Se as partes pudessem modificar os prazos prescricionais, por via
transversa, por via oblíqua, elas estariam renunciando à prescrição antecipadamente, o
que, como vimos, é vedado. Ou seja, essa impossibilidade de modificação dos prazos,
portanto, se coaduna com a impossibilidade de renúncia antecipada.
Não havendo pré-questionamento, portanto, a prescrição não pode ser debatida nas
instâncias excepcionais.
60
Exceção: art. 516, CPC – efeito translativo (ou expansivo) dos recursos: toda vez que
uma instância for aberta (e a abertura de uma instância é a admissibilidade de um recurso),
ou seja, toda vez que um recurso for admitido (passando pelo juízo de prelibação), todas as
questões de mérito são devolvidas ao julgador; todas as questões de mérito – mesmo as
ainda não decididas – ficam submetidas ao órgão julgador.
Ex.: numa ação de cobrança em que o réu em nenhum momento alegou a prescrição
e nem o juiz dela conheceu de ofício, teve uma apelação cível com base em falta de
fundamentação da sentença. O Tribunal mantém a sentença, dizendo que ela estava
fundamentada. Cabe RE ou Resp.? Sim, porque a matéria é jurídica, não é matéria de fato
(não implica em reapreciação de prova). Assim, porque presente os pressupostos recursais,
o STJ admite o Resp. e, ai, em sede extraordinária, poderá ele apreciar a prescrição, por
força do efeito translativo (mesmo quando a prescrição não tiver sido pré-questionada). O
recurso foi admitido por outro motivo, mas ainda assim a prescrição pode ser apreciada, em
razão do efeito translativo dos recursos.
Obs.: ☺art. 189, CC – da maneira como está redigido esse art., tudo leva a crer que o
termo inicial do prazo prescricional é a partir do momento que nasce a pretensão, ou seja,
assim que violado o direito.
Porém, o STJ abraçou a tese da actio nata: o início do prazo prescricional (o termo
inicial da prescrição) não é necessariamente a violação do direito, mas sim o conhecimento
pelo titular da violação do seu direito. Com isso o STJ vai temperando a dureza do art. 189,
CC, partindo da premissa de que a prescrição somente pode fluir quando o titular toma
conhecimento da violação do seu direito.
O STJ aplica essa tese da actio nata tanto no direito privado, quanto no direito
público.
61
No CDC existe acolhimento expresso desta tese: ☺art. 27, CDC.
→ Dicas de cursinho:
No CC, as causas suspensivas estão nos arts. 197, 198 e 199, e cada um traz 3
hipóteses, perfazendo um total de 9 causas suspensivas.
As causas interruptivas são judiciais. Tem ato do juiz. E, portanto, teve processo.
Há, porem, duas exceções a esta regra: protesto cambial (protesto em cartório) e
confissão de dívida são atos não judiciais e, por conseguinte, estariam elencadas dentre as
causas suspensivas, mas não o são – são causas interruptivas! O CC excepcionalmente
admitiu o protesto cambial e a confissão de dívida como causas interruptivas da prescrição.
Com isso, portanto, fica esvaziada a Súm. 153, STJ, pois agora o protesto cambial
interrompe sim a prescrição (e a súmula dizia exatamente o contrário).
Se o prazo prescricional parou (ou porque foi suspenso ou porque foi interrompido),
quando é que ele será retomado? Depende:
62
- se não teve ato judicial, ou seja, se o prazo prescricional foi suspenso: ele será
retomado quando cessada a causa. Ex.: quando o casamento foi dissolvido;
Ocorre que a coisa julgada pode ser meramente formal. O processo pode ser extinto
sem resolução de mérito. Nesse caso, como fica a prescrição? Mesmo que o processo seja
extinto sem resolução do mérito, a prescrição estará interrompida. Ocorre a interrupção
mesmo que a coisa julgada seja meramente formal. Nesse sentido temos a Súm. 268 do
TST, que confirma que haverá interrupção mesmo que a extinção do processo seja sem
resolução de mérito.
Falta ainda, agora, tratar dos casos excepcionais vistos acima (protesto cambial e
confissão de dívida) – hipóteses não judiciais interruptivas: para esses casos é inaplicável a
regra, pois não há trânsito em julgado. Então, o prazo se reinicia do dia seguinte à prática
do ato.
Este dispositivo diz que a interrupção da prescrição somente pode ocorrer uma vez.
Mas, o que significa essa regra da interrupção única da prescrição?
Há uma regra no sentido de que a parte nunca pode ser prejudicada pela demora do
Estado na prestação jurisdicional. Isso significa que a parte não pode ser prejudicada
porque o Estado demorou a proferir a sentença.
63
O CC quer com essa regra, forçar o credor a ir a juízo.
Se A tem uma dívida com B que venceu e não foi paga, começa a correr a prescrição,
pouco antes de prescrever, B vai ao Cartório e protesta a dívida e a prescrição se
interrompe Volta a correr o prazo do zero. Na véspera de prescrever de novo, B vai ao
cartório e protesta de novo. Aqui o prazo não será novamente interrompido. O CC quer,
então, forçar o credor a ir a juízo, a promover a ação.
Súm. 150, STF, que estabelece que a prescrição da pretensão executiva ocorre no
mesmo prazo da prescrição da pretensão cognitiva:
Com as novas regras de cumprimento de sentença (art. 475, CPC), esta Súm. 150, STF
sofreu um abalo sísmico, pois com essas novas regras é possível notar que agora esta
súmula não precisa mais ter tanta incidência, já que de ordinário o juiz já vai dar o comando
sentencial, a forma de cumprimento de sentença.
→ Prescrição intercorrente:
No direito civil, porém, é diferente: o particular não pode ser prejudicado pela
demora do Estado. Assim, de ordinário, não se tolera a prescrição intercorrente em sede
civil. Não é razoável falar-se nessa prescrição que é interna, endógena do processo.
64
1ª) art. 40, §4º, da Lei de Execuções Fiscais: no executivo fiscal, o titular da
pretensão é a mesma pessoa que demorou a julgar (é o próprio Estado), então,
justificadamente, se admite esta prescrição intercorrente;
2ª) prescrição intercorrente admitida pelo STJ - ☺ Resp. 474771/SP (que foi o
primeiro julgado – leading case, sendo que a partir dele o STJ passou a admiti-la): quando o
andamento do procedimento restou paralisado, por culpa do autor, por tempo suficiente
para que ocorresse a prescrição, caso o juiz tivesse sentenciado, extinguindo o processo
sem resolução de mérito.
Ex.: A ajuíza ação contra B e abandona o processo. O juiz o intima para dar
andamento e ele não dá. O juiz poderia ter extinguido o processo, mas não o faz por algum
motivo. O processo vai para uma pilha junto com muitos outros. Por alguma outra razão
(ex.: inspeção da Corregedoria), o processo volta ao juiz depois de algum tempo, para
despacho. Se a prescrição era de 5 anos (ação de cobrança) e o processo ficou parado 6 ou
7 anos sem despacho, o juiz não poderia despachar e fazer a prescrição reiniciar. Assim, se o
processo está abandonado por tempo suficiente para que a prescrição já tivesse se operado
se o juiz tivesse sentenciado, será extinto por prescrição intercorrente.
§1º do art. 267, CPC, que diz que o autor precisa ser intimado pessoalmente. Só se
pode falar em prescrição intercorrente se o autor foi intimado pessoalmente (não serve a
intimação na pessoa do seu advogado). A intimação deve ser pessoal. E somente se pode
falar em prescrição intercorrente quando o autor, embora intimado pessoalmente, não
tenha dado andamento ao processo.
65
Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e,
ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a
prescrição.
A nova redação deste dispositivo, dada pela Lei 11.280/06, permitiu que o juiz
conhecesse de ofício a prescrição, revogando o art. 194, CC:
Art. 194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a
absolutamente incapaz. (Revogado pela Lei nº 11.280, de 2006)
O juiz pode conhecer de ofício a prescrição em qualquer caso, mesmo nas hipóteses
em que se admite excepcionalmente a prescrição intercorrente.
Alexandre Câmara, inclusive, disse, a esse respeito, que o legislador perdeu o siso (o
dente do juízo).
A razão pela qual o Brasil, inteligentemente, admite que o juiz conheça de ofício a
prescrição é a celeridade processual. E isso está na exposição de motivos da Lei 11.280/06.
Ocorre que, em nome dessa celeridade processual, está sendo violada a natureza do
instituto. Ou seja, não devia, mas pode o juiz conhecer de ofício a prescrição.
Exceção: o TST não admite que o juiz do trabalho conheça de ofício a prescrição no
âmbito do direito do trabalho, pois isso prejudicaria o trabalhador.
O STJ, porém, acolheu uma reflexão importante que vem sendo debatida pela
doutrina: Resp. 1.005.209/RJ – nesse julgado o STJ fixou o entendimento de que o juiz
somente pode conhecer de ofício a prescrição depois de intimadas as partes, ou seja,
somente depois de formalizado o devido processo legal. Isto porque “o juiz não tem bola de
cristal” (e isso está escrito no acórdão!) para antever se houve ou não renúncia da
prescrição, ou alguma causa de suspensão ou interrupção da prescrição. A renúncia pode
ser inclusive tácita. Por isso, o conhecimento de ofício da prescrição pelo juiz fica submetido
66
à formação do devido processo legal, com intimação das partes, para que eventual renúncia
possa ser levada ao conhecimento do juiz.
Assim, não é possível ao juiz conhecer de ofício a prescrição na sentença prima facie
(art. 285-A), porque nela o juiz ainda não intimou as partes.
Detalhe substancialmente relevante: quando se diz que o juiz deve intimar as partes,
sempre pensamos que o juiz deve intimar o autor, porque ele tem interesse em não ver
reconhecida a prescrição. Mas o juiz não deve intimar apenas o autor, mas também o réu,
porque existe uma possibilidade de o réu se objetar ao conhecimento de ofício da
prescrição (e não é quando o réu pretender uma sentença de mérito, porque a prescrição já
é sentença de mérito): em razão da incidência do art. 940, CC, que fala da responsabilidade
objetiva por cobrança indevida de dívida. Esse art. diz que o credor que cobrar
indevidamente uma dívida responde objetivamente, repetindo em dobro. O réu que já
pagou a dívida não quer que o juiz extinga o processo com resolução de mérito pela
prescrição, mas sim que o juiz reconheça que houve o pagamento, porque ai ele terá direito
a repetição em dobro.
→ Observações finais:
Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não
correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.
Toda vez que um fato repercutir ao mesmo tempo em sede civil e em sede penal, a
prescrição da pretensão civil só começa a correr com o trânsito em julgado da decisão
penal.
O que o sistema quer com isso é fazer com que a vítima aguarde a sentença penal.
Porque se a sentença penal for condenatória, um dos seus efeitos será tornar certa a
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reparação do dano, e ai já será possível promover a ação civil ex delito, na qual só é preciso
liquidar e executar a dívida. Elimina-se então, a possibilidade de decisões conflitantes.
A situação da vítima agora melhorou, porque com a reforma do CPP, o juiz penal
pode não só reconhecer a existência do dano, como também já pode fixar o valor
indenizatório.
Se a sentença penal for absolutória, começa a correr o prazo e a vítima poderá ainda
também ajuizar a ação civil.
Mas há um problema nessa espera da vítima: ao fixar a indenização por dano moral o
juiz deve levar em consideração a demora da vítima em promover a ação. Assim, quanto
mais tempo ela demora, menor será a sua indenização. Por esta razão, a vítima pode já não
querer esperar para promover a ação (não tem só vantagens essa espera, portanto).
Na contestação o réu pode se defender por preliminar (art. 301, CPC) e pode se
defender também no mérito. A defesa de mérito, por sua vez, pode ser uma defesa de
mérito direta e uma defesa de mérito indireta. A defesa de mérito direta se dá quando o
réu nega os fatos alegados pelo autor. A defesa de mérito indireta (art. 326, CPC) se dá
quando o réu, independentemente de negar ou não, apresenta fatos supervenientes
impeditivos, extintivos ou modificativos do direito do autor. Esses fatos supervenientes que
constituem defesa de mérito indireta podem ou não ser conhecidos de ofício pelo juiz. Se
puderem ser conhecidos de ofício pelo juiz, chamam-se objeção; se não podem se
conhecidos de ofício pelo juiz, serão chamados de exceção substancial.
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Ex.: se há uma dívida que já está prescrita, procede uma eventual alegação de
compensação? Não. Porque junto com o ataque prescreve a defesa! Com a pretensão
(ataque) prescreve a exceção substancial. Se o titular já não pode mais alegar aquela
matéria porque esvaziada a sua pretensão, já não pode também mais invocá-la como
exceção substancial. Se não pode mais atacar, também não pode mais se defender
alegando aquela matéria. A exceção substancial prescreve junto com a pretensão.
Características da Decadência:
2) Decadência pode ser conhecida a qualquer tempo ou grau de jurisdição: nas vias
ordinárias; porque nas vias extraordinárias a decadência, assim como a prescrição, só pode
ser conhecida se houver pré-questionamento ou por força do efeito translativo.
4) A decadência deve ser conhecida de ofício pelo juiz: aqui o juiz não só pode como
deve reconhecer de ofício.
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O melhor de todos os exemplos de decadência convencional é o prazo de garantia
(de um eletrodoméstico, por ex.).
Art. 211. Se a decadência for convencional, a parte a quem aproveita pode alegá-la em
qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação.
Assim, é nula de pleno direito toda e qualquer cláusula contratual que promova a
fusão, a mistura desses prazos.
Dicas finais:
Exercício de fixação: Indique, para cada uma das ações seguintes, se se trata de
hipótese de prescrição ou de decadência:
- investigação de paternidade:
- usucapião:
- separação e divórcio:
- anulação de contrato:
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- execução de alimentos:
- cobrança:
Pelo que estudamos até agora ainda fica difícil resolver este exercício.
De acordo com a classificação trinaria (italiana, clássica) das ações, as ações podem
ser:
1) Declaratórias;
2) Constitutivas; ou
3) Condenatórias.
Assim:
Os prazos de prescrição estão todos no art. 206, CC. Os prazos de prescrição que
estão ali se dividem em 5 diferentes grupos:
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- 5 anos: ex.: ações de cobrança em geral.
Problema: se uma ação condenatória não tiver prazo no art. 206, CC, ela será
imprescritível? Não. O art. 205, CC estabelece uma cláusula geral de prescrição, que é de 10
anos.
Assim, podemos afirmar que toda ação condenatória prescreve. Se não prescrever no
prazo específico do art. 206, CC, prescreverá em 10 anos. Ex.: ação de sonegados e ação de
petição de herança, que são duas ações condenatórias que não estão no rol do art. 206, CC
e, por isso, terão prazo prescricional de 10 anos.
Assim, todos os prazos prescricionais estão nos arts. 205 e 206, CC. Dessa forma,
qualquer outro prazo que encontremos no código só pode ser decadencial.
Agora, depois de tudo o que foi estudado, podemos então voltar ao exercício
proposto acima e resolvê-lo com maior facilidade:
Atenção:
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- Como vimos, nas ações constitutivas que têm prazo em lei, o prazo é de decadência,
e quando elas não têm prazo, elas não se extinguem. Mas existe uma categoria especial de
ações constitutivas – as ações constitutivas anulatórias – que terão regime especial. O CC
dedicou um regime especial a essas ações constitutivas anulatórias. Portanto, se se tratar
de ação anulatória e não tiver prazo ao invés de não extinguir-se, ocorrerá uma outra
situação: o CC estabeleceu uma cláusula geral de decadência para as ações anulatórias sem
prazo, em seu art. 179: prazo de 2 anos. Se assim não fosse, isso causaria uma insegurança
jurídica muito grande (porque sendo imprescritível, seria possível ajuizar a ação até 50 anos
depois).
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para
pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.
“A ação para anular venda de ascendente a descendente, sem consentimento dos demais,
prescreve em vinte anos, contados da data do ato, revogada a Súmula nº 152”.
Esta súmula contém 2 erros: ela trata de ação anulatória de venda de ascendente a
descendente, sem o consentimento dos demais. O primeiro defeito dessa súmula é que
quando ela fala em prescrição, devemos ler decadência (o prazo ai não é de prescrição, mas
sim de decadência, já que a ação é constitutiva). E o segundo erro é o seguinte: a súmula se
valeu de um prazo de 20 anos, mas, em verdade, esse prazo deve ser de 2 anos (porque se
trata de ação anulatória sem prazo específico).
“A ação para anular venda de ascendente a descendente, sem consentimento dos demais,
decai em dois anos, contados da data do ato, revogada a Súmula nº 152”.
Art. 745. Em caso de informação inexata ou falsa descrição no documento a que se refere o
artigo antecedente, será o transportador indenizado pelo prejuízo que sofrer, devendo a ação
respectiva ser ajuizada no prazo de cento e vinte dias, a contar daquele ato, sob pena de
decadência.
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Este art. fala da ação indenizatória que o transportador tem direito de propor em
razão de informação inverídica (o que fere o dever de informação): se a informação for falsa
ou imprecisa, o transportador tem direito a uma indenização. Esta ação indenizatória deve
ser ajuizada no prazo de 120 dias, sob pena de decadência. Mas há um erro nesse
dispositivo: não se trata de decadência, mas sim de prescrição (a ação é condenatória).
Ocorre que não há prescrição fora do rol dos art. 205 e 206, CC. Assim, por uma questão
topológica, de inserção, o legislador não quis criar um novo prazo prescricional, e então
disse que se trata de decadência. Assim, em provas objetivas é preciso dizer que o prazo é
decadencial, mas em provas dissertativas é preciso dizer que em verdade se trata de prazo
prescricional.
AULA: 30/01/2010
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VII – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
1) CONCEITO:
O Direito das obrigações, ramo do direito civil, é o conjunto de normas que disciplina a relação jurídica
pessoal entre credor e devedor, em virtude da qual este último compromete-se a satisfazer uma prestação
de dar, fazer ou não fazer.
O que o Direito das Obrigações regula é a relação jurídica existente entre o sujeito ativo da relação
obrigacional (credor – titular do crédito) e o sujeito passivo (devedor). É a relação jurídica pessoal que
vincula credor e devedor.
Esta é uma relação horizontal, que é diferente da relação jurídica real – dos direitos reais, já que esta
disciplina uma relação jurídica vertical entre o sujeito e o objeto, relação esta (vertical) que tem por
característica a tipicidade, coisa que a relação jurídica horizontal não precisa ter. Os direitos reais são típicos,
ou seja, sempre previstos na lei; já a relação obrigacional não prima pela tipicidade, nela não precisa haver
tipicidade.
A relação obrigacional é uma relação eminentemente pessoal (não típica), que vincula credor e devedor.
É atributivo; É cooperativo;
É permanente; É transitório;
A obrigação propter rem, ob rem, ou mista situa-se na zona cinzenta entre o direito das obrigações e o
direito das coisas. Trata-se de uma obrigação de natureza híbrida, uma vez que, posto vincule pessoas, adere
a uma coisa, acompanhando-a. Trata-se de uma obrigação que se une a uma coisa, acompanhando-a Para
onde quer que a coisa vai, a obrigação vai junto. Exemplo: obrigação de pagar taxa de condomínio. IPTU e
IPVA também possuem a natureza propter rem, mas não entraremos na seara do Direito Tributário. Ver RESP
846187/SP.
OBS: o STJ, em recente julgado (Ag Rg no Resp 1039117/SP), afirmou a preferência do crédito condominial,
por ser propter rem, em face da hipoteca.
OBS: A obrigação com eficácia real é aquela que, mediante registro, passa a ter eficácia erga omnes (ex:
obrigação locatícia levada a registro imobiliário – art. 8º da lei do inquilinato). Se o contrato de locação foi
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previamente levado a registro ela passa a ser de eficácia real. (registrar o contrato de locação no registro de
imóvel, para garantir este efeito erga omnes).
Pelo fato de ter essa natureza real, a obrigação propter rem tem que estar prevista em lei (a taxa
condominial, por ex., tem previsão no CC).
Obs.: atenção – não se pode confundir obrigação propter rem com obrigação de eficácia real. Esta última
traduz uma prestação com oponibilidade erga omnes (ex.: locação registrada no Cartório de Imóveis – art.
8º, Lei 8.245/91).
Lembra-nos Guilherme Nogueira da Gama que o fiador tem responsabilidade (haftung), embora a dívida
(schuld) seja de outro. O devedor em geral tem em geral o schuld e também o haftung. Mas, pode
acontecer, de o devedor ter o débito (schuld) e outra pessoa ter assumido a responsabilidade (haftung),
como, por ex., no caso do fiador (terceiro que assumiu a responsabilidade).
De fato a norma é a fonte de as obrigações, a LEI é fonte primaria. Só que entre a norma legal e a norma
obrigacional há de um fato que concretize o preceito da norma e que faz nascer a obrigação.
Embora a lei seja a fonte primária das relações jurídicas em geral, por “fonte das obrigações” deve se
entender o fato jurídico que, concretizando o preceito normativo, cria a relação obrigacional. Isso é a fonte
da obrigação. É o fato jurídico que concretiza a lei e constitui a relação obrigacional.
A classificação clássica de Gaio subdividia as fontes em: contrato, quase contrato (outros atos negociais que
não fossem contrato), delito (ilícito doloso) e quase delito (ilícito culposo). É a classificação romana das
fontes das obrigações. É uma obrigação não mais adotada, mas é importante citá-la nas provas de concurso.
Modernamente, superada a classificação de Gaio, são fontes das obrigações: atos negociais (contrato,
promessa de recompensa), atos não negociais (como o fato material da vizinhança). É também fonte das
obrigações o ato ilícito.
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Fundamentalmente são três elementos:
- requisito ideal/imaterial
- subjetivo
- Objetivo
- Elemento ideal
- Elemento subjetivo
- Elemento objetivo
- O primeiro elemento ideal/imaterial é o próprio vínculo jurídico abstrato que une o credor ao devedor.
- O segundo elemento, subjetivo, deve ter ao menos sujeito determinados ou determináveis. São os sujeitos
da relação obrigacional: credor e devedor.
Prestação é a atividade do devedor satisfativa do crédito, podendo ser de dar, fazer, ou não fazer. O
objeto direto de uma relação obrigacional sempre é a prestação. A prestação deverá ser lícita, possível e
determinada ou ao menos determinável.
Pergunta: toda prestação em direito das obrigações sempre deverá ter natureza patrimonial ou econômica?
R: em geral, a doutrina costuma reconhecer a natureza patrimonial ou econômica da prestação. Até porque,
é difícil encontrarmos exemplos de obrigação não patrimonial. Todavia, ainda que em situações especiais,
autores como Pontes de Miranda, Paulo Lobo e Silvio Venosa reconhecem algumas obrigações não
patrimoniais, a exemplo da obrigação que o testador impôs de ser enterrado de determinada maneira.
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Do Direito Inglês: Duty to mitigate – significa o dever de mitigar. Sob o influxo do Princípio da boa fé na
relação obrigacional, impõe-se ao credor o dever de mitigar o dano, sob pena de perda da indenização
correspondente.
Lembra-nos Emilio Betti, em sua clássica obra Teoria Geral das Obrigações, a existência de uma nítida “crise
de cooperação” entre credor e devedor, com uma acentuada vocação opressiva da autonomia privada.
Nesse contexto, atua especialmente o princípio da boa-fé objetiva, para determinar um comportamento leal
e harmônico entre as partes, a exemplo do que se dá por meio do instituto jurídico do “duty to mitigate”.
Por meio desta figura jurídica, impõe-se ao próprio credor o dever de não agravar a situação do devedor.
Ex.: A bate no carro de B. A vai no orelhão chamar o reboque.B (que é o credor da obrigação de indenizar)
verifica que começa a sair fumaça de seu veículo, ou seja, estaria para iniciar-se um incêndio, e, assim, ele
tem o dever de usar o extintor para evitá-lo, sob pena de, não o fazendo, não receber o valor agregado à
indenização.
Do Direito Francês: Droit de suite – significa o direito de seqüência. Segundo o prof. Rodrigo Morais, o direito
de seqüência reconhece ao artista plástico e a seus sucessores um crédito (participação) no aumento do
preço nas sucessivas revendas da obra de arte (direito intelectual).
- positiva - incerta:
- fazer:
A obrigação de não fazer tem por objeto uma prestação negativa, ou seja, um comportamento omissivo do
devedor. Ex: obrigação de não concorrência, obrigação de não construir acima de determinada altura.
OBS: a conhecida servidão de não construir nada mais é do que uma obrigação de não fazer registrada no
cartório de imóveis.
Pode decorrer do Princípio da Boa-fé Objetiva (ou da Eticidade). Ex.: uma construtora vende um
apartamento cuja melhor propaganda é a vista para o mar e depois de um tempo esta mesma construtora
constrói um outro empreendimento que retira a vista do primeiro prédio, o que viola a boa-fé objetiva –
neste caso, pois, há quebra da boa-fé objetiva (já que se tratava de uma obrigação de não fazer decorrente
deste Princípio). Se, contudo, for a área vendida para outra construtora, seria preciso instituir uma servidão
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para que o limite da altura não fosse ultrapassado e não fosse retirada a vista; já é, pois, uma situação mais
complicada.
Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do devedor, se lhe torne
impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.
Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o
desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos.
A luz do art. 250, é obvio que se o devedor de uma obrigação de não fazer for obrigado a atuar (exemplo: foi
notificado pela prefeitura) a obrigação é simplesmente extinta, sem perdas e danos. Mas, se culposamente o
devedor descumpre a obrigação de não fazer poderá ser civilmente responsabilizado, sem prejuízo da tutela
especifica (art. 251, será visto a fundo em processo civil).
A obrigação de fazer, por sua vez, tem por objeto a prestação de um fato, nos termos dos arts. 248 e 249 do
CC/02. Tem por objeto a atividade do devedor.
Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele
só imposta, ou só por ele exeqüível.
Art. 248. Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a
obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos.
Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa
do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.
OBS: vale lembrar que a obrigação de fazer é infungível ou personalíssima quando só interesse a atividade
do próprio devedor, intuito persone.
Caso a obrigação de fazer seja descumprida sem culpa do devedor, a relação obrigacional é extinta, sem
perdas e danos (art. 248).
Caso a obrigação de fazer seja descumprida por culpa do devedor, é cabível a sua responsabilidade civil por
perdas e danos, sem prejuízo de o credor optar pela tutela jurídica específica. (art. 247 e 249).
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Obrigação de dar é aquela que tem por objeto a prestação de uma coisa, podendo-se entender
juridicamente o verbo dar em três sentidos básicos:
Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo
se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.
Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da
tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a
perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos.
Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou
aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.
Art. 236. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado
em que se acha, com direito a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos.
Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos
quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.
Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da
tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia
da perda.
Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e
danos.
Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se
ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239.
Art. 241. Se, no caso do art. 238, sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou
trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização.
Art. 242. Se para o melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho ou dispêndio, o caso
se regulará pelas normas deste Código atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé
ou de má-fé.
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Parágrafo único. Quanto aos frutos percebidos, observar-se-á, do mesmo modo, o disposto neste
Código, acerca do possuidor de boa-fé ou de má-fé.
OBS: em geral, na teoria das obrigações, o legislador estabeleceu a fórmula segunda a qual impossibilitada a
obrigação sem culpa do devedor, ela será extinta, sem perdas e danos; mas, impossibilitada por culpa do
devedor, este poderá ser compelido a devolver o preço equivalente, sem prejuízo das perdas e danos.
OBS: Vale lembrar que, o princípio, especialmente aplicado na obrigação de dar coisa certa, o credor não
esta obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa (art. 313).
Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais
valiosa.
Conceito: nos termos da lei brasileira, art. 243 a 246 do CC/02, a obrigação de dar coisa incerta é aquela
indicada apenas pelo gênero e pela quantidade. Alguns chamam de obrigação genérica.
Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade.
Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se
o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado
a prestar a melhor.
Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que
por força maior ou caso fortuito.
Ex: obrigação de entregar 10 cabeças de gado. Logicamente, a indeterminabilidade deste tipo de obrigação é
temporário, devendo ser feita a necessária escolha da qualidade da coisa para efeito de pagamento (art. 244
e 245). Vale observar que, regra geral, a escolha da coisa é feita pelo devedor (concentração do débito ou da
prestação devida). A escolha é feita pela média.
Nos termos do art. 246, tradicional regra do direito brasileiro, enquanto não for feita a escolha, ou seja,
enquanto ainda for incerta a obrigação, não poderá o devedor para se eximir, alegar caso fortuito ou força
maior, uma vez que “o gênero não perece jamais”.
O projeto de reforma do CC/02, em sua redação original, adverte que se o gênero for limitado na natureza,
ai sim poderá o devedor eximir-se da sua obrigação.
DATA: 06/04/2010
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7.1 – OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA
Existe solidariedade quando, na mesma obrigação, concorre uma pluralidade de credores ou devedores,
cada um com direito ou obrigado a toda a dívida. Vide art. 264, CC. Há, basicamente, duas espécies de
solidariedade: ativa (entre credores) e passiva (entre devedores).
Na solidariedade ativa há mais de um credor com direito a toda dívida ou a parte da dívida. Na solidariedade
passiva há pluralidade de devedores, e o credor pode cobrar a parte de cada um, ou cobrar de qualquer dos
devedores toda a dívida.
Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um
devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda
Solidariedade, quer seja passiva ou ativa, não se presume nunca. OBS: o art. 265 do CC/02 estabelece
verdadeiro dogma: solidariedade jamais se presume, resulta da lei ou da vontade das partes.
Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.
Questão de concurso: diferença entre obrigação solidária e obrigação “in solidum”? R: Alguns autores, a
exemplo de Silvio Venosa e Guillermo Borda, estabelecem diferença: na obrigação in solidum, posto os
devedores estejam vinculados ao mesmo fato, não há necessária solidariedade entre eles. Ex: A causa um
incêndio na casa de B; A é devedor da obrigação de indenizar a vítima B, mas a seguradora também está
vinculada já que havia sido contratada por B. Não existe solidariedade entre eles, é uma obrigação in
solidum, ou seja, decorre do mesmo fato, mas não há solidariedade entre eles.
A) SOLIDARIEDADE ATIVA:
Lembra-nos Antunes Varella que a solidariedade ativa caracteriza-se especialmente pelo fato de qualquer
dos credores poder exigir a prestação por inteiro. A disciplina no CC/02 é trazida a partir do art. 267.
Art. 267. Cada um dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o cumprimento da
prestação por inteiro.
Art. 268. Enquanto alguns dos credores solidários não demandarem o devedor comum, a qualquer
daqueles poderá este pagar.
Art. 269. O pagamento feito a um dos credores solidários extingue a dívida até o montante do que foi
pago.
Art. 270. Se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros, cada um destes só terá direito a
exigir e receber a quota do crédito que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação
for indivisível.
Art. 271. Convertendo-se a prestação em perdas e danos, subsiste, para todos os efeitos, a
solidariedade.
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Art. 272. O credor que tiver remitido a dívida ou recebido o pagamento responderá aos outros pela
parte que lhes caiba.
Art. 273. A um dos credores solidários não pode o devedor opor as exceções pessoais oponíveis aos
outros.
Art. 274. O julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os demais; o julgamento
favorável aproveita-lhes, a menos que se funde em exceção pessoal ao credor que o obteve.
Isso traduz um certo grau de risco para a atividade obrigacional (porque esta solidariedade dá poderes
demais a cada um dos credores – ex.: um dos credores perdoa toda a dívida, sendo necessário, depois, que
os demais ingressem na via ordinária contra este credor para reaver suas partes, correndo o risco de não
consegui-lo).
A solidariedade ativa por força de lei é rara, mas podemos encontrá-la no art. 2º da lei do inquilinato no art.
12 da lei 209/48. Por outro lado, um bom exemplo de solidariedade ativa prevista em contrato é o
conhecido contrato de abertura de conta corrente conjunta (ver Resp 708612/RO).
O que vai caracterizar a solidariedade ativa é que qualquer dos credores pode pedir a totalidade do crédito.
B) SOLIDARIEDADE PASSIVA:
A disciplina da solidariedade entre devedores é feita a partir do art. 275 do CC/02 e a sua principal
característica reside no fato de que qualquer dos devedores pode ser compelido a pagar toda a dívida.
Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou
totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores
continuam obrigados solidariamente pelo resto.
Parágrafo único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra
um ou alguns dos devedores.
Art. 276. Se um dos devedores solidários falecer deixando herdeiros, nenhum destes será obrigado a
pagar senão a quota que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for
indivisível; mas todos reunidos serão considerados como um devedor solidário em relação aos demais
devedores.
Art. 277. O pagamento parcial feito por um dos devedores e a remissão por ele obtida não
aproveitam aos outros devedores, senão até à concorrência da quantia paga ou relevada.
Art. 278. Qualquer cláusula, condição ou obrigação adicional, estipulada entre um dos devedores
solidários e o credor, não poderá agravar a posição dos outros sem consentimento destes.
Art. 279. Impossibilitando-se a prestação por culpa de um dos devedores solidários, subsiste para
todos o encargo de pagar o equivalente; mas pelas perdas e danos só responde o culpado.
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Art. 280. Todos os devedores respondem pelos juros da mora, ainda que a ação tenha sido proposta
somente contra um; mas o culpado responde aos outros pela obrigação acrescida.
Art. 281. O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais e as comuns
a todos; não lhe aproveitando as exceções pessoais a outro co-devedor.
Art. 282. O credor pode renunciar à solidariedade em favor de um, de alguns ou de todos os
devedores.
Art. 283. O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos co-devedores
a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do insolvente, se o houver, presumindo-se iguais, no
débito, as partes de todos os co-devedores.
Art. 285. Se a dívida solidária interessar exclusivamente a um dos devedores, responderá este por
toda ela para com aquele que pagar.
OBS: não se pode esquecer que a solidariedade não se presume, resultando da lei (a exemplo da
solidariedade passiva do art. 932) ou resulta da vontade das partes, como freqüentemente vemos nos
contratos de locação em que o fiador solidariamente obriga-se com o locatário.
Nos termos do art. 281, vale lembrar que o devedor demandado pode opor ao credor defesas pessoais e
comuns (Ex: ter sido vítima de coação ou prescrição da dívida), MAS NÃO PODERÁ MANEJAR DEFESA
PESSOAL DE OUTRO DEVEDOR.
Mesmo tendo sido prevista a solidariedade, pelas perdas e danos, caso impossibilitada a prestação, só
responderá o culpado. Mas, se todos os devedores forem culpados responderão todos pelas perdas e danos
em solidariedade (Caio Mário).
Existem defesas, na mecânica obrigacional, que são pessoais (ex.: incapacidade de um devedor), enquanto
outras são gerais, comuns a todos os devedores (ex.: a prescrição da pretensão, o pagamento da dívida,
etc.).
Obs.: quanto às defesas do devedor, sendo pessoais, não podem ser aproveitadas pelo outro devedor.
No que tange à responsabilidade dos devedores solidários, o art. 279, CC estabelece a mantença da
solidariedade pelo valor devido, respondendo o culpado pelas perdas e danos.
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1º) A obrigação de pagar alimentos é complementar, respeitada a ordem de devedores previstos
conjuntamente na lei de família. Sucede que, em benefício do idoso, na forma do seu estatuto, estabelece-se
uma solidariedade passiva entre os prestadores (Resp 775.564/SP).
2º) Existem julgados no STJ, a exemplo do Resp. 577.902/DF, que reconhece a solidariedade passiva entre o
proprietário do veículo e o seu condutor, pelo risco criado aos semelhantes.
3º) Não se deve confundir remissão com renúncia à solidariedade (ver arts. 277 e 282 do CC/02), bem como
os enunciados 349 a 351 da 4ª JDC.
Ex.: X, Y e Z são credores de W, na quantia de 300. se X paga 100, W pode cobrar os outros 200 de Y e Z.
Assim, se o credor renuncia a solidariedade em face de todos os devedores, isso significa que só poderá
cobrar a quota parte de cada um. Se, no entanto, renuncia à solidariedade em face de um só devedor, dele
só pode cobrar sua quota parte, mas em relação aos demais poderá cobrar a integralidade da dívida (mas a
doutrina hoje aponta no sentido de que só poderá cobrar dos demais devedores, em solidariedade, o que
restou).
As obrigações alternativas ou disjuntivas são aquelas que tem por objeto duas ou mais prestações, sendo
que o devedor se exonera cumprindo apenas uma delas. Trata-se de uma obrigação com objeto múltiplo ou
composto.
Nos termos do art. 252, seguindo a regra geral do sistema, a escolha é feita pelo devedor.
Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.
§ 1º Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.
§ 2º Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá ser exercida em
cada período.
§ 3º No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz,
findo o prazo por este assinado para a deliberação.
§ 4º Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a
escolha se não houver acordo entre as partes.
Art. 253. Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se tornada inexeqüível,
subsistirá o débito quanto à outra.
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Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações, não competindo
ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que por último se impossibilitou, mais
as perdas e danos que o caso determinar.
Art. 255. Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se impossível por culpa do
devedor, o credor terá direito de exigir a prestação subsistente ou o valor da outra, com perdas e
danos; se, por culpa do devedor, ambas as prestações se tornarem inexeqüíveis, poderá o credor
reclamar o valor de qualquer das duas, além da indenização por perdas e danos.
Art. 256. Se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa do devedor, extinguir-se-á a
obrigação.
Ela se notabiliza pelo conectivo “ou” – o devedor se exonera prestando uma coisa ou outra.
(no material de apoio quadro esquemático que trata da impossibilidade de cumprimento da obrigação
alternativa – arts. 253 a 256, CC).
§1º: “não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra”.
§3º: “no caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz, findo o
prazo por este assinado para a deliberação”.
Obs.: a doutrina, a despeito da omissão do CC, diferencia obrigação alternativa de obrigação facultativa.
Nesta última, há uma obrigação simples de objeto único, facultando-se, todavia, ao devedor, a substituição
do objeto do pagamento.
Na obrigação alternativa, o próprio título da obrigação, o próprio contrato, já delineia que a obrigação tem
objeto múltiplo; há duas prestações que podem ser cumpridas uma excluindo a outra. Ela já nasce múltipla.
OBS: ver no material um detalhado quadro esquemático acerca do tratamento jurídico dispensado em caso
de impossibilidade total ou parcial das prestações, na obrigação alternativa.
Questão especial de concurso: Qual é a diferença entre obrigação alternativa e facultativa? R: A obrigação é
considerada facultativa quando, tendo um único objeto, estipula-se a faculdade de o devedor cumprir
prestação diversa, prevista subsidiariamente.
A obrigação facultativa, por sua vez, é uma obrigação com objeto único – ela tem um único objeto, mas terá
o devedor a faculdade de substituir a obrigação de dar coisa certa (ex.: um carro), por ex., por uma entrega
de dinheiro ou outra coisa. É uma faculdade de substituição prevista no contrato. Se a obrigação única e
principal se extinguir por caso fortuito ou força maior, ou seja, se o objeto perecer (ex.: o carro a ser
entregue for roubado) o credor não pode exigir a faculdade, a prerrogativa da substituição (entrega do
dinheiro), se não houver culpa. Assim, caso o objeto da obrigação pereça, o credor não tem poder para
forçar o devedor a cumprir obrigação facultativa.
Três características aptas a diferenciar estas duas obrigações: Orlando Gomes reconhece que a obrigação
facultativa gera três efeitos fundamentais: 1º) o credor não pode exigir a prestação facultativa. 2º) se o
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objeto da obrigação torna-se impossível, a relação obrigacional é extinta. 3º) uma vez que a obrigação
facultativa em objeto único, defeito nesse objeto poderá prejudicar a obrigação.
Obrigação divisível é aquela que admite cumprimento fracionado da prestação ; já a obrigação indivisível, é
aquela que só admite o cumprimento da prestação por inteiro. Doutrinariamente a indivisibilidade poderá
ser natural, legal ou convencional.
Art. 257. Havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação divisível, esta presume-
se dividida em tantas obrigações, iguais e distintas, quantos os credores ou devedores.
Art. 258. A obrigação é indivisível quando a prestação tem por objeto uma coisa ou um fato não
suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de ordem econômica, ou dada a razão
determinante do negócio jurídico.
OBS1: mais uma vez deve ficar claro que indivisibilidade é critério que diz respeito ao objeto; ao passo que
solidariedade é critério que diz respeito aos sujeitos. Até porque, se a obrigação apenas indivisível resolve-
se em perdas e danos, fraciona-se (art. 263), não havendo que se falar aqui em solidariedade.
OBS2: havendo pluralidade de credores, na obrigação indivisível, a teor do art. 260, o devedor se exonera
pagando a todos os credores conjuntamente, ou, pagando a apenas um dos credores, desde que este
apresente “caução de ratificação dos outros credores” (OBVIAMENTE, SE TAMBÉM FOI PREVISTA A
SOLIDARIEDADE ATIVA, TAL DOCUMENTO É DESNECESSÁRIO).
10 – OBRIGAÇÃO NATURAL
Trata-se de um tipo de obrigação civil desprovida de coercibilidade jurídica (a título de aprofundamento, ver
Sérgio Covello, em “A obrigação natural: elementos para uma possível teoria”.
Ela não pode ser cobrada, mas o sistema jurídico reconhece um efeito jurídico a esta obrigação: a
irrepetibilidade do pagamento (soluti retentio) – a pessoa não pode ser coagida a cumprir uma obrigação
natural, o credor não tem poder de subordinar o interesse do devedor ao dele, mas se o devedor resolver
pagar, pagando o credor pode reter o pagamento. Uma vez efetivado o pagamento, ele se torna irrepetível,
com apenas uma exceção:
A luz do art. 882, bem como do art. 814, são exemplos de obrigação natural a dívida prescrita e a dívida de
jogo e aposta.
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A obrigação natural gera o efeito jurídico da “soluti retentio” (retenção do pagamento), ou seja, embora não
seja compelido a pagar, caso o devedor pague, não poderá exigir de volta o que pagou.
Conceito: a obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga a empreender uma atividade, sem
garantir o resultado esperado; já a obrigação de resultado é aquela em que o devedor se obriga também a
cumprir o resultado projetado.
A obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga a realizar uma atividade sem garantir o resultado
esperado; já a obrigação de resultado é aquela que só se torna perfeita quando a meta proposta é
alcançada.
A doutrina cita a obrigação do advogado e do médico como uma obrigação de meio, como regra. O
empreiteiro, por sua vez, assume uma obrigação de resultado, porque ele se obriga a realizar uma obra.
O cirurgião plástico reparador assume obrigação de meio; ao passo que o estético, de resultado (Ag. RG. no
Resp. 256.174/DF).
Obs.: a cirurgia de miopia a laser traduz obrigação de meio ou de resultado? A maioria da jurisprudência
entende que traduz obrigação de meio e não de resultado (apesar de haver algumas jurisprudências dizendo
o contrário, em especial em MG – AC 1070701044481-8/001). Se houver melhora na acuidade visual, o
médico teve sucesso (não é preciso que a miopia desapareça, se o grau diminuir já houve sucesso).
Existe na jurisprudência, ver revista consultor jurídico de 25/06/2007, entendimento no sentido de que a
cirurgia para correção de miopia impõe ao médico obrigação de meio e não de resultado, ou seja, havendo
melhora na acuidade visual a sua finalidade foi atingida, não podendo o médico garantir a visão perfeita.
12 – TEORIA DO PAGAMENTO
Pagamento tecnicamente significa cumprimento voluntário da obrigação, quer seja de dar, fazer, ou não
fazer. Respeitável parcela da doutrina (Roberto de Ruggiero, Caio Mário) reconhece a natureza negocial do
pagamento, razão porque podem ser aplicados aqui os vícios da vontade para efeito de invalidação.
Conceito: derivada do Direito Inglês, esta doutrina sustenta que não se deve considerar resolvida a
obrigação quando a atividade do devedor, embora não tenha atingido plenamente o fim proposto,
aproxima-se consideravelmente do seu resultado final.
A mais importante aplicação desta Teoria opera-se nos contratos de seguro. Ex.: X fez um contrato de seguro
de carro, tendo sido convencionado com a seguradora que o prêmio (aquilo que se paga à seguradora) seria
pago em 4 parcelas de R$ 500,00. X pagou as 3 primeiras parcelas corretamente, mas atrasou 2 dias para
pagar a 4ª parcela e o seu carro foi roubado. Por esta teoria, a seguradora deve pagar o seguro a X, já que se
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aproximou muito do pagamento (claro que se descontando o valor devido). Mas existe posicionamento
contrário na doutrina e na jurisprudência. Existe entendimento jurisprudencial, inclusive, dizendo que a
seguradora não pode cancelar o contrato por inadimplemento sem noticiar o segurado devedor.
AULA: 20/04/2010
Apenas observando essas condições e requisitos se evita o famoso ditado: “quem paga mal paga duas
vezes”.
Nas condições subjetivas se estuda quem deve pagar e a quem se deve pagar.
Nas condições objetivas se estuda o objeto do pagamento, a prova do pagamento, o tempo do pagamento e,
finalmente, o lugar do pagamento.
A) CONDIÇÕES SUBJETIVAS
- QUEM DEVE PAGAR? O pagamento pode ser feito pelo devedor ou por terceiro. Arts. 304 e 305,
CC.
Art. 304. Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o credor se
opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.
Parágrafo único. Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e à conta
do devedor, salvo oposição deste.
Art. 305. O terceiro não interessado, que paga a dívida em seu próprio nome, tem direito a
reembolsar-se do que pagar; mas não se sub-roga nos direitos do credor.
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Se o terceiro não interessado pagar, DUAS SITUAÇÕES PODEM OCORRER: 1) se paga em seu próprio
nome, tem pelo menos o direito ao reembolso do que pagou; 2) mas, se paga em nome do próprio
devedor, não terá direito a nada.
OBS: O devedor pode se opor ao pagamento feito por terceiro? Sim. O pagamento feito por terceiro
admite a oposição ou recusa do devedor, nos termos do seu art. 306:
Art. 306. O pagamento feito por terceiro, com desconhecimento ou oposição do devedor, não
obriga a reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha meios para ilidir a ação.
O pagamento feito por terceiro, com desconhecimento ou oposição do devedor, não obriga a
reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha meios para ilidir a ação.
A recusa ou a oposição do devedor deverá ser fundamentada (ex: ilegalidade da dívida, prescrição,
ou, até mesmo, admitimos a recusa com base na preservação dos direitos da personalidade).
O devedor pode dizer ao terceiro que o notifica para que ele não pague. Exemplos que
fundamentam a oposição feita pelo devedor (Silvio Venosa): o argumento de que não se deve pagar
porque a obrigação é inválida, ou porque já ocorreu a prescrição, ou, ainda, baseando-se nos direitos
da personalidade, no caso em que o terceiro queira pagar somente para menosprezar o devedor
diante da sociedade (ex.: o maior desafeto do devedor paga sua dívida para colocar o devedor numa
situação vexatória).
- A QUEM SE DEVE PAGAR? Esta é a segunda condição subjetiva do pagamento. Arts. 308 e 309 do
CC/02.
Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena
de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito.
Art. 309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que
não era credor.
O CC estabelece que o pagamento deve ser feito ao credor (ou a seu representante), bem como se
admite o pagamento feito a terceiro, nas seguintes situações: 1) se ocredor ratificar o pagamento ou
houver prova de que reverteu em seu proveito (art. 308), ou; 2) no caso do credor aparente ou
putativos (art. 309) Esta é uma situação especialíssima de pagamento feito a terceiro (muito cobrada
em concursos): o pagamento feito ao credor putativo ou aparente pode ser considerado eficaz, à luz
do Princípio da Boa-fé e da Confiança, nos termos do art. 309. É uma aplicação do Direito Civil
Constitucional (eticidade e boa fé) – em respeito à confiança que se tem na relação jurídica e à boa
fé.
Nos termos do art. 309, consagrador da teoria da aparência, o pagamento feito à pessoa que,
segundo a boa-fé do devedor apresenta crível condição de credor, poderá ter eficácia jurídica.
Alguns autores, a exemplo de Guilherme Calmon Nogueira da Gama, com propriedade, afirmam que
o pagamento feito de boa-fé ao mandatário ou representante putativo, com base na teoria da
aparência também poderá ser considerado eficaz.
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B) CONDIÇÕES OBJETIVAS:
Aqui estudaremos:
- o objeto do pagamento
- prova do pagamento
- tempo do pagamento
- lugar do pagamento.
O art 313, já visto em sala de aula, estabelece que o credor não está obrigado a receber prestação diversa,
ainda que mais valiosa.
Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais
valiosa.
O art 314, por sua vez, consagra a indivisibilidade do pagamento como regra.
Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado
a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou.
À luz do art. 315, concluímos que a moeda nacional (R$) é que tem curso forçado no Brasil, razão por que o
credor não está obrigado a receber em cheque ou em cartão de crédito ou débito. Apesar de não ser de
obrigação obrigatória, o comerciante anunciando que recebe cheque, cartão, etc, está obrigada a receber.
Art. 315, CC: As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo
valor nominal, salvo o disposto nos arts. subseqüentes.
Obs: somente em situações excepcionais a moeda estrangeira é admitida como índice de correção do valor
da obrigação (ver art. 6º da lei 8.880/94 e AgRg no Ag 845988/SP).
Obs: O art. 315, ao tratar das dívidas em dinheiro, consagra o vetusto princípio do nominalismo, segundo o
qual o devedor se libera pagamento a mesma quantidade de moeda prevista no titula da obrigação.
Obs: este princípio do nominalismo é flexibilizado. A lei 6.899/81, inovadora, estabeleceu a incidência da
correção monetária nos débitos decorrentes de decisão judicial. A partir daí diversos índices oficiais seriam
adotados para correção monetária das obrigações no Brasil (INPC, IGPM, etc).
O art. 316 (na visão do professor é uma redação infeliz), defendido por alguns brilhantes autores como
Mário Delgado é apontado como o dispositivo do Código consagrador da correção monetária da obrigação.
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R: É também chamada de Sistema Francês de Amortização. Foi criada por Richard Price. Segundo Afonso
Gomes a Tabela Price é o sistema, por meio de um complexo cálculo de matemática financeira que incorpora
juros compostos às amortizações de empréstimos e financiamentos (quando alguém faz um contrato incide
juros, mas a prestação durante todo o financiamento é igual).
Muitas entidades de defesa do consumidor reputam a tabela Price abusiva, sob o argumento de que
mascara a anatocismo (capitalização em juros compostos - juros sobre juros). E como pensa o STJ. Em mais
de uma oportunidade (ver noticiário de 21/09/2009) o STJ tem adotado posição neutra ao afirmar que a
ilegalidade ou não da tabela depende de cálculo matemático do caso concreto. Ele adota uma postura de
neutralidade quando enfrenta a questão, argumentando ser uma questão de matéria financeira, que escapa
da órbita do recurso especial (Ag. Rg. No Ag. 67099/RJ).
R: A regra geral, a luz do art. 7º inc. IV da CF/88, o SM não deve ser utilizado como critério de correção
monetária, na mesma linha ver SV n. 4 (“salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado (...) sendo
vedada sua vinculação para qualquer fim”). Todavia, lembra-nos a professor Maria Berenice Dias (ver artigo
no material de apoio) que, no caso da obrigação de alimentos, a despeito de alguma polêmica, o próprio STF
admite a utilização do SM como base de cálculo (RE 274897). Ver também art. 475-Q, §4º, CPC, que utiliza
SM como critério de cálculo para o pagamento de pensão alimentícia decorrente de ato ilícito: “Quando a
indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, poderá ordenar ao
devedor constituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão”. §4º: “os
alimentos podem ser fixados tomando por base o salário-mínimo”.
Quanto à prova do pagamento o ato jurídico que efetivamente prova o pagamento denomina-se quitação.
(Arts. 319 e 320).
Art. 319 - O devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento, enquanto
não lhe seja dada.
art. 320: A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a
espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do
pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante.
Parágrafo único: Ainda sem os requisitos estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de seus
termos ou das circunstâncias resultar haver sido paga a dívida.
OBS: a recusa do credor à quitação oportuniza a consignação e pagamento (tema da grade de Processo Civil).
OBS: há situações em que o próprio legislador admitiu presunções relativas de pagamento. Arts. 322 ea 324
Art. 322: Quando o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da última estabelece, até prova
em contrário, a presunção de estarem solvidas as anteriores.
Art. 323: Sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes presumem-se pagos.
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Art. 324: A entrega do título ao devedor firma a presunção do pagamento.
Parágrafo único: Ficará sem efeito a quitação assim operada se o credor provar, em 60 dias, a falta
do pagamento.
Em linha de princípio, todo pagamento deve ser efetuado no dia do vencimento da dívida entretando, não
dispondo a lei em contrário, regra geral, caso não tenha vencimento certo, o credor poderá exigir a
obrigação de imediato (Arts 331 e 332).
OBS em casa, ver art. no art. 333 hipóteses de vencimento antecipado da dívida.
Art. 331:Salvo disposição legal em contrário, não tendo sido ajustada época para o pagamento, pode
o credor exigi-lo imediatamente
Assim, se não há vencimento, o CC estabelece que o credor pode exigir a obrigação imediatamente.
Obs.: No caso do mútuo, a luz do art. 592, inc. II CC/02, existe regra específica para o empréstimo de
dinheiro: não convencionado o vencimento o prazo mínimo para pagamento é de 30 dias.
Art. 333 - Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de vencido o prazo estipulado no
contrato ou marcado neste Código: I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores; II -
se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução por outro credor; III - se
cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito, fidejussórias, ou reais, e o devedor,
intimado, se negar a reforçá-las.
Parágrafo único: Nos casos deste artigo, se houver, no débito, solidariedade passiva, não se reputará
vencido quanto aos outros devedores solventes.
Lugar do pagamento: nos termos do art. 327, CC, a regra geral do Direito Brasileiro é a de que as dívidas
devem ser pagas no domicílio do devedor (dívida querables ou quesível). Todavia, por exceção, se o devedor
precisar se deslocar até o domicílio do credor, no entanto, fala-se em dívida “portable”.
Se o contrato designar dois ou mais lugares para o pagamento, a escolha é do credor (P.U. do art. 327).
Parágrafo único. Designados dois ou mais lugares, cabe ao credor escolher entre eles.
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E se for caso de transferência de imóvel, o pagamento é feito no lugar em que for situado o bem (art. 328,
CC.
OBS: o art. 330, ainda se referindo ao lugar do pagamento, consagra o princípio do “venire contra factum
proprium”, que proíbe o comportamento contraditório da parte. Este artigo guarda conexão com este
princípio, pois dispõe que:
Art. 330 - O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor
relativamente ao previsto no contrato.
OBS: tema a ser visto na teoria do contrato, por ocasião do estudo dos desdobramentos ou funções reativas
na boa-fé objetiva, a regra proibitiva do “venire contra factum proprium” pretende impedir a adoção de um
comportamento contraditório (exemplo art. 330 do CC/02).
De acordo como nosso programa, estudaremos em sala de aula (sem prejuízo de alguns institutos serem
tratados no material de apoio) as seguintes modalidades especiais:
- Imputação do pagamento
- Dação em pagamento
- Novação
- Compensação
AULA: 27/04/2010
A) SUB-ROGAÇÃO:
Sub-rogação significa substituição. Assim, o pagamento com sub-rogação, que é forma especial de
cumprimento da obrigação disciplinada a partir do art. 346, CC, traduz o cumprimento da obrigação por
terceiro, com a conseqüente substituição de credores.
É forma de extinção da obrigação porque para o credor que sai a obrigação está cumprida. Atenção: não é a
mesma coisa de cessão de crédito, tendo em vista que cessão é transferência, transmissão, enquanto o
pagamento com sub-rogação é pagamento em sentido estrito. A cessão pode ser gratuita. O pagamento com
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sub-rogação sempre será pagamento. OBS: embora exista ponto de contato, não podemos dizer que cessão
de crédito e pagamento com sub-rogação são a mesma coisa, até porque, como veremos na próxima aula, a
cessão poderá ser gratuita.
A.1) Espécies:
a) legal: art. 346 do CC/02. Substituição por força de lei. Opera-se de pleno direito em favor:
I - do credor que paga a dívida do devedor comum (ex.: caso exista ordem de preferência, nada
impede que um determinado credor que receberá em segundo lugar pague o crédito do primeiro
credor, sub-rogando-se no direito do credor contra o devedor, tendo, assim, dois créditos);
II - do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário (o imóvel hipotecado pode
ser alienado, mas a hipoteca vai junto), bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser
privado de direito sobre imóvel (A é inquilino de um apartamento em frente ao mar, o locador paga
ao credor sub-rogando-se nos direitos dele contra o devedor e negocia os descontos do aluguel);
Pergunta: imóvel hipotecado pode ser alienado? Sim. O terceiro adquirente que paga ao credor
hipotecário sub-roga-se no direito do credor satisfeito.
III - do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em
parte (fiador que paga a fiança). O fiador é um terceiro interessado que paga e sub-roga-se no direito
d credor satisfeito.
b) convencional: o art. 347 do CC/02 traz hipóteses de pagamento com sub-rogação convencional, em que a
substituição de credores pressupõe um negócio jurídico (acordo de vontades).
I - quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus
direitos (neste caso há tipicamente uma cessão de crédito); OBS: no caso do inc. I do art. 347 existe
um nítido ponto de contato com a chamada cessão de crédito, uma vez que o credor originário,
mediante pagamento, cederá o seu crédito ao novo credor.
II - quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a
condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito. A luz do art. 349
do CC/02, principal efeito do pagamento com sub-rogação, além de liberar o credor originário, é
transferir ao novo credor os direitos, ações, privilégios e garantias existentes na relação obrigacional.
O Código Civil brasileiro, na linha do at. 593 do Código de Portugal, estabelece no art. 350 do CC/02
que o novo credor sub-rogado só poderá exigir do devedor o que efetivamente houver
desembolsado.
B) NOVAÇÃO:
Novação vem do latim: novatio. Traz uma idéia de novo, nos remete à idéia de nova obrigação.
CONCEITO: opera-se a novação quando, por meio de uma estipulação negocial, cria-se uma OBRIGAÇÃO
NOVA destinada a substituir e extinguir a obrigação anterior.
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Ex.: A e B, por meio de um contrato, criam determinada relação obrigacional que os vinculam. A é o credor e
B é o devedor. Por conta deste contrato (e por conseqüência, dessa relação obrigacional), B tem que pagar a
A a quantia de R$10.000,00. B então diz a A que invés de pagar-lhe essa quantia, quer criar uma nova relação
obrigacional, para substituir a obrigação anterior, extinguindo-a, e no seu lugar, viria uma obrigação de, por
ex., dar aulas de piano em vez de pagar.
Pergunta: a obrigação nova tem que ser igual a anterior ou pode ser diferente. Ex: Contrato inicial obrigação
de dar, depois celebra, em novação, obrigação de fazer. Devo 10.000 e quero pagar em aulas de Inglês (se eu
for professor de inglês), por exemplo. Ou obrigatoriamente tem que ser assim: se devo R$ 10.000,00 em 5X
de 2.000, mas quero realizar uma obrigação em pagar os R$10.000 em 10 X 1.000. Pode ser em obrigação
diversa?R: ver 2º requisito para responder esta pergunta.
A novação, que não imposta por lei, dependendo, portanto de um novo ajuste de vontades, resulta no fato
de que a antiga obrigação é QUITADA, os prazos são ZERADOS e o novo do devedor não pode permanecer
negativado.
1º) A existência de uma obrigação. Vale ressaltar, todavia, que nos termos do art. 367, salvo as obrigações
simplesmente anuláveis, não podem renovadas as obrigações nulas ou extintas.
Obrigação anulável pode ser novada, por quê? R: o NJ anulável pode ser convalidado, confirmado. Assim,
quanto mais novada.
OBS: uma obrigação natural pode ser novada? R: Obrigação natural é aquela desprovida de coercibilidade,
ou seja, juridicamente inexigível. Ex.: dívidas de jogo (art. 814, CC); dívida prescrita, etc. R: é polêmica na
doutrina a possibilidade de se novar uma obrigação natural: Marcel Planiol, Serpa Lopes e Silvio Rodrigues
são favoráveis, mas Barros Monteiro e Clóvis Beviláqua são contra. É razoável a tese defensiva da novação
de obrigação natural com base na previsão do parágrafo primeiro do art. 814 (“Estende-se esta disposição a
qualquer contrato que encubra ou envolva reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo...”).
2º) a criação de uma obrigação nova substancialmente diversa da primeira – com isso quer se dizer que,
para haver novação, deverá haver aliquidi novi (elemento novo), o que afasta a hipótese de simplesmente se
estar renegociando a mesma dívida. Ou seja, para que haja novação, a segunda obrigação deve ser
substancialmente diversa da primeira. Não existe novação quando apenas se verifiquem acréscimos ou
outras alterações secundárias na mesma obrigação. Mudanças secundárias da mesma obrigação, a exemplo
do perdão de uma multa, não caracterizam novação, pois é preciso ficar demonstrado haver sido criada uma
obrigação nova e quitada a anterior. O próprio STJ já decidiu no Resp. 685.023/RS que a simples
continuidade da mesma obrigação não significa que as partes tenham novado.
3º) Para que haja novação é preciso haver animus novandi (a intenção de novar), ou seja, intenção de
constituir uma obrigação nova. Lembra-nos o clássico Eduardo Espínola que “poucos são os códigos que
exigem uma declaração expressa da intenção de novar (a exemplo do art. 2.215 do Código do México). No
Brasil, a intenção pode derivar das circunstancias do contrato (comportamento concludente). Significa que o
juiz, na análise do caso concreto, pode deduzir no comportamento das partes que elas tiveram a intenção de
novar.
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B.2) ESPÉCIES DE NOVAÇÃO:
Fundamentalmente possuímos dois tipos de novação: objetiva e a subjetiva. Há também a situação mista.
a) Objetiva: prevista no art. 360, inc. I do CC/02. Ocorre quando as mesmas partes da relação obrigacional
criam obrigação nova destinadas a substituir e extinguir a obrigação anterior. Ex: A e B vinculados por uma
obrigação, resolvem novar por meio de um contrato novo, destinada extinguir e substituir a obrigação
anterior.
b) Subjetiva: art. 360, inc. II e III do CC/02. Neste caso, temos: a novação subjetiva ativa e passiva.
b.1) Subjetiva ativa: ocorre quando um novo credor substitui o antigo, considerando-se a partir
criada uma obrigação nova.
b.2) Subjetiva passiva: ocorre quando um novo devedor substitui o antigo, considerando-se criada a
partir daí uma obrigação nova. Esta novação, de estrutura mais complexa, opera-se quando há
mudança de devedores, considerando-se criada a obrigação nova a partir do ingresso do novo
devedor, que poderá se dar de duas formas:
b.2.2) por delegação: não há art. específico para delegação no CC/02. Na delegação, o
devedor originário participa do ato novatório.
Operando-se a novação, regra geral, extinguem-se as garantias da obrigação primitiva (art. 364 e 366).
No AgRg nos Edcl no Resp 726.293/RS, assentou o Ministro Luiz Fux que a inserção no REFIS importa
novação. Adesão no REFIS não é um parcelamento é uma obrigação nova.
Não posso me esquecer que a novação ou a simples renegociação de dívida não convalida cláusulas ilegais,
admitindo-se, na perspectiva da função social do contrato, a sua revisão. Ver Ag Rg no Ag 831.930/SC e
Súmula 286 do STJ. Não se deve invocar contra a parte que pretende a revisão do contrato a regra proibitiva
de comportamento contraditório (venire contra factum proprium), uma vez que a impugnação de cláusula
abusiva é medida justa e justificada por interesse de ordem pública.
C) DAÇÃO EM PAGAMENTO
(DATIO INSOLUTUM)
CONCEITO: trata-se de uma forma de extinção da obrigação, regulada nos arts. 356 a 359, por meio da qual
o credor consente em receber prestação diversa da que lhe é devida.
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OBS: em geral, a prestação diversa aceita pelo credor consiste na entrega de uma coisa. E nada tem a ver
com novação, uma vez que não se esta constituindo obrigação nova. Ex: o devedor deve pagar R$ 10.000,00
ao credor e sugere, no bojo da mesma relação obrigacional, a entrega do seu carro e credor aceita: houve
dação em pagamento.
2º) o devedor se propõe, com animus solvendi a cumprir prestação diversa, COM A AQUIESCÊNCIA DO
CREDOR;
AULA: 04/05/2010
D) EVICÇÃO:
E) COMPENSAÇÃO
Conceito: a compensação, regulada a partir do art. 368 do CC/02, é uma forma de extinção da obrigação em
que as partes são, ao mesmo tempo, credora e devedora uma da outra.
Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas
obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.
OBS: não se pode confundir compensação, em que duas partes são reciprocamente credora e devedora uma
da outra, com o instituto da confusão (ver apostila), pois neste ultimo caso, na mesma pessoa reúnem-se de
credor e devedor.
a) judicial ou processual: é aquela em que o juiz mediante decisão, no bojo do próprio processo,
independentemente de provocação opera uma compensação entre as partes (art. 21 do CPC).
Expressão utilizada pelos juízes no processo: “Custas processuais pro rata”.
b) Compensação legal: é aquela em que, reunidos os requisitos do CC/02 (art. 369), o juiz, mediante
provocação do interessado, deverá reconhecê-la.
Art. 369. A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.
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Requisitos da Compensação Legal
1 – reciprocidade dos débitos: vale dizer, para que haja compensação legal as partes devem
ser reciprocamente credora e devedora uma da outra.
OBS: mitiga este primeiro requisito o art. 371 do CC/02 que autoriza o fiador (que não é
parte recíproca na relação principal, ele é um terceiro interessado) operar a compensação de
um crédito do afiançado (devedor). O fiador não faz parte da relação obrigacional principal,
mas de uma relação autônoma. Se o fiador for demandado por débitos do afiançado, poderá
compensar eventuais créditos em face de quem lhe demanda. Mas a regra é que a
compensação se dê entre as mesmas partes da obrigação principal.
Art. 371. O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever; mas
o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado.
2 – Liquidez das dividas recíprocas: significa que as dívidas devem ser certas, líquidas.
3 – Vencimento das dívidas: as dividas recíprocas devem estar vencidas, ou seja, tem que
ser exigíveis.
Art. 370. Embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto das duas
prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na qualidade, quando
especificada no contrato.
OBS: se esses 4 requisitos forem reunidos, o juiz não terá escolha, terá que acatar o pedido de
compensação legal. Por força de lei o juiz só estará obrigado a acatar a compensação se os 4
requisitos forem respeitados.
c) compensação convencional (ou, segundo Eduardo Espínola, facultativa): trata-se de uma forma
de compensação que independe dos requisitos da lei, operando-se mediante acordo de vontades, a
luz do princípio da autonomia privada.
Em regra, as causas dos débitos não interferem na compensação, ressalvadas as hipóteses do art. 373.
Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto:
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I - se provier de esbulho, furto ou roubo;
Existem situações em que a compensação não é possível por conta da causa que gerou cada uma das
obrigações. Por conta do interesse social envolvido, o CC no importante art. 373, disciplina hipóteses de
impossibilidade de compensação. Não poderá ocorrer compensação: se qualquer das dívidas provier de
esbulho, furto ou roubo; se uma se originar de comodato (empréstimo gratuito de coisa não fungível),
depósito ou alimentos; se uma for de coisa não suscetível de penhora.
Obs.: a despeito de o CC/02 na parte final do inciso II do art. 373 claramente dispor não se poder compensar
débito de alimentos, o STJ, em situações excepcionais, tem mitigado a regra. O STJ tem flexibilizado a
proibição de compensação de débito alimentar, como podemos observar no Resp. 982.857/RJ, julgado em
18/09/2008 (super recente!).
Obs.: o próprio STJ julgando o Ag. Rg. no Ag. 353.291/RS apontou que o banco não pode automaticamente
bloquear verba salarial para efeito de compensação (isso só seria possível mediante previsão em norma
especial ou decisão do juiz).
O clássico jurista Clóvis do Couto e Silva, em sua festejada obra “A obrigação como um processo” preleciona
que a relação obrigacional é dinâmica, como se uma relação processual fosse, visando a satisfação do
interesse do credor.
Neste contexto, insere-se a transmissão das obrigações como forma de movimentação da relação
obrigacional, por meio de:
- cessão de crédito;
- cessão de débito;
- cessão de contrato;
A cessão de crédito consiste em negócio jurídico por meio do qual o credor (cedente) transmite total ou
parcialmente o seu crédito a um terceiro (cessionário), MANTEDO-SE A MESMA RELAÇÃO OBRIGACIONAL
COM O DEVEDOR (CEDIDO).
A cessão de crédito não pode ser confundida com a novação subjetiva ativa, eis que não há o surgimento de
uma nova obrigação.
100
A cessão de crédito pode ser onerosa ou gratuita.
OBS: no caso da cessão de crédito onerosa (mediante pagamento), existirá uma identificação com o
chamado “pagamento com sub-rogação convencional”, abordado na última aula. Vale acrescentar ainda que
não é correto dizer existir novação em uma cessão de crédito, uma vez que não é criada a obrigação nova.
Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou
a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de
boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
Nos termos do referido art. 286, regra geral, todo crédito poderá ser cedido, se a isso não se opuser: a
natureza do próprio direito de crédito (é o caso do crédito de alimentos que não pode ser cedido); a lei (pois
o próprio legislador poderá proibir a cessão de um crédito, como na hipótese do art. 1.749, inc. III); bem
como a cessão também não será possível se houver cláusula proibitiva expressa (pacto de Non Cedendo).
Obs.: A cláusula proibitiva somente terá eficácia, em respeito ao Princípio da Eticidade, se constar do título
da obrigação.
Na vereda do art. 290 CC/2 em respeito ao dever anexo de informação derivado do princípio da boa-fé
objetiva, embora o devedor não precise previamente autorizar a cessão do crédito, deverá ser comunicado
para que surta efeitos em sua esfera jurídica (art. 290) e afim de que possa pagar ao novo credor (art. 292).
Em respeito ao Princípio da Boa-fé objetiva, especialmente o dever de informação, o art. 290, CC exige que o
devedor seja comunicado da cessão feita, como condição de eficácia do ato.
OBS: na mesma do art. 1474 do Código Civil Argentino, o nosso art. 294 permite que o devedor, a partir da
comunicação da cessão feita, possa opor ao cessionário (novo credor) as suas defesas. Vale observar que o
devedor pode opor ao novo credor as defesas que têm em face do primeiro.
Nos termos e nas condições dos arts. 295 a 297 do CC/02, em regra, o cedente somente garantirá a existente
do crédito que cedeu (cessão pro soluto), mas, caso concorde, segundo a sua autonomia privada, poderá
garantir ainda o pagamento pelo devedor, caso em que a cessão denomina-se pro solvendo.
Nos termos dos arts. 295 a 297, CC, podemos chegar às seguintes conclusões: regra geral, salvo estipulação
em contrário, o credor originário (cedente) garante apenas a existência do crédito que cedeu (cessão pro
soluto); por exceção, havendo cláusula expressa, poderá o cedente também garantir a solvência do devedor,
neste caso temos a cessão pro solvendo.
Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize, fica responsável
ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe
cabe nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.
Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.
101
Art. 297. O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não responde por mais do
que daquele recebeu, com os respectivos juros; mas tem de ressarcir-lhe as despesas da cessão e as
que o cessionário houver feito com a cobrança.
Conceito: a cessão de débito consiste em um negócio jurídico por meio do qual o devedor COM EXPRESSO
CONSENTIMENTO DO CREDOR, transmite a um terceiro o seu débito na mesma relação obrigacional.
OBS: o consentimento do credor deverá ser expresso, de maneira que o seu silêncio é interpretado como
uma recusa.
Se o novo devedor for insolvente e o credor o ignorar, o antigo devedor reassumirá a obrigação.
A cessão de débito se opera por meio de um negócio jurídico por meio do qual o devedor, com expresso
consentimento do credor, transmite a um terceiro o seu débito, na mesma relação obrigacional.
Não se confunde com novação subjetiva passiva porque nesta, no momento em que há a transferência,
considera-se uma como uma nova relação obrigacional. Aqui, na cessão de débito, a relação obrigacional
continua a mesma.
Obs.: nos termos da parte final do art. 299, CC, é correto dizer que o antigo devedor continuará responsável,
caso o novo seja insolvente e o credor de nada saiba.
P.U.: “qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida,
interpretando-se o seus silencio como recusa” (significa que ele não aceitou o novo devedor).
Art. 300, CC: salvo consentimento expresso, as garantias que o devedor originário deu desaparecem.
Art. 302, CC: o novo devedor não pode opor ao credor as exceções (defesas) pessoais que só cabiam ao
devedor primitivo (ex.: coação, dolo, etc.).
AULA: 06/05/2010
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13.3) CESSÃO DE CONTRATO
Ela não foi regulada pelo CC Brasileiro, embora devesse ser, já que havia razão para que ela fosse regulada.
Emílio Betti, em seu livro Teoria Geral das Obrigações, ensina que a cessão de contrato realiza a forma mais
completa de substituição na relação obrigacional.
O Código Civil de Portugal disciplinou a matéria nos seus arts. 424 a 427. Vejamos:
ART. 424º (Noção. Requisitos): 1. No contrato com prestações recíprocas, qualquer das partes tem a
faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente, antes ou
depois da celebração do contrato, consinta na transmissão. 2. Se o consentimento do outro
contraente for anterior à cessão, esta só produz efeitos a partir da sua notificação ou
reconhecimento.
ART. 425º (Regime): A forma da transmissão, a capacidade de dispor e de receber, a falta e vícios da
vontade e as relações entre as partes definem-se em função do tipo de negócio que serve de base à
cessão.
ART. 427º (Relações entre o outro contraente e o cessionário): A outra parte no contrato tem o
direito de opor ao cessionário os meios de defesa provenientes desse contrato, mas não os que
provenham de outras relações com o cedente, a não ser que os tenha reservado ao consentir na
cessão.
Conceito: na cessão de contrato, o cedente transfere a sua própria posição contratual, a sua situação no
contrato, a um terceiro (cessionário), mediante a anuência da outra parte.
2) Teoria Unitária: é defendida por Pontes de Mirante e Antunes Varela; Estes sustentam, por sua
vez que a melhor teoria explicativa é a unitária. Esta teoria afirma que a cessão da posição de
contrato opera-se como um todo, de maneira uniforme. Na cessão não existe um conjunto de
cessões de credito e débitos, quando eu cedo eu sedo globalmente a minha posição no contrato a
alguém.
103
São três requisitos básicos para que se possa ocorrer a cessão de contrato:
2º) A integralidade da cessão (cessão global). Você não pode transferir uma parte da cessão
contratual.
OBS: como vimos acima, anuência da outra parte é requisito necessário para a cessão de contrato.
Todavia, excepcionalmente, a lei autoriza uma cessão de contrato independentemente da anuência
da pare adversa, a exemplo do parágrafo 1º do art. 31 da lei 6766/70. Este tipo de cessão denomina-
se cessão legal ou imprópria.
Contrato de gaveta: a regra geral, segundo a teoria da cessão de contrato, é no sentido de que a
instituição financeira, especialmente no âmbito do SFH (sistema financeiro de habitação - sistema
imobiliário), deverá anuir na cessão de contrato (Resp. 1.180.397/RJ, Resp 783.389/RO, Resp 1.102.757/CE).
Vale acrescentar, todavia, que, excepcionalmente, a Lei 10.150/00, nos TERMOS e nas CONDIÇÕES do seu
art. 20, admitiu a cessão sem a anuência da parte contrária (“contrato de gaveta”) – Ag no Resp 838. 127/DF,
Resp. 653.415/SC.
Art. 20. As transferências no âmbito do SFH, à exceção daquelas que envolvam contratos
enquadrados nos planos de reajustamento definidos pela Lei no 8.692, de 28 de julho de 1993, que
tenham sido celebradas entre o mutuário e o adquirente até 25 de outubro de 1996, sem a
interveniência da instituição financiadora, poderão ser regularizadas nos termos desta Lei.
P.U.: A condição de cessionário poderá ser comprovada junto à instituição financiadora, por
intermédio de documentos formalizados junto a Cartórios de Registro de Imóveis, Títulos e
Documentos, ou de Notas, onde se caracterize que a transferência do imóvel foi realizada até 25 de
outubro de 1996.
Cessão de contrato imprópria: é a cessão que se opera por força de lei. É uma exceção, trata-se, pois, de
hipótese atípica (figura anômala). Ex. dado pelo prof. Luis Borrelli: art. 8º, Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato):
Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o
prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o
contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do
imóvel.
§ 2º A denúncia deverá ser exercitada no prazo de noventa dias contados do registro da venda ou do
compromisso, presumindo - se, após esse prazo, a concordância na manutenção da locação.
14 – TEORIA DO INADIMPLEMENTO
104
14.1) MORA:
Conceito: ocorre a mora quando o pagamento não é feito no tempo, lugar ou forma convencionados.
Existem basicamente dois tipos de mora. Temos a mora do credor (mora credendi/accipiendi) e temos a
mora do devedor (mora debendi/solvendi).
A) MORA DO DEVEDOR
A mora do devedor, mais comum e conhecida, ocorre quando o sujeito passivo retarda culposamente o
cumprimento da obrigação.
OBS: no que se refere ao vencimento da dívida, vale lembrar que, tendo vencimento certo (exemplo:
dia 15 de abril) a mora opera-se automaticamente, segundo o adágio dies interpellat pro homine (a
mora neste caso denomina-se ex re). Todavia, caso não haja vencimento certo ou exista previsão
legal específica, o credor deverá interpelar o devedor para constituí-lo em mora (mora ex persona).
OBS: o STJ já pacificou entendimento no sentido de que, a despeito da notificação enviada pelo
credor, a mora na alienação fiduciária deriva automaticamente do vencimento, ou seja, é EX RE (Ag
Rg no Ag 997.534/GO). A notificação do devedor é apenas comprobatória da mora, pois a mora
decorre automaticamente do vencimento.
3º) a culpa do devedor; somente haverá mora do devedor se houver fato imputável a ele (art. 396
do CC/02). Não havendo falta imputável ao devedor mora não haverá.
4º) a viabilidade do cumprimento tardio da obrigação: não posse me esquecer de que a mora do
devedor pressupõe ainda haver viabilidade no cumprimento tardio da obrigação principal. Isso
porque se viabilidade não houver significa ter havido descumprimento absoluto da obrigação,
resolvendo-se em perdas e danos. Mora ocorrerá se o devedor, ainda em atraso, puder cumprir a
obrigação principal. Se não houver possibilidade do cumprimento tardio da obrigação ocorrerá é
inadimplemento. Parágrafo único do art. 395 do CC/02.
OBS: o enunciado 162, da 3ª JDC, dispõe: “a inutilidade da prestação que autoriza a recusa da
prestação por parte do credor deverá ser aferida OBJETIVAMENTE, consoante o princípio da boa-fé e
a manutenção do sinalagma (idéia de equilíbrio nos contratos, interdependência entra as
prestações), e não de acordo com o mero interesse subjetivo do credor.”
Efeitos da mora:
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Pergunta: Quais são os efeitos da mora do devedor?
R: A mora do devedor gera a sua responsabilidade civil pelo prejuízo causado ao credor, nos termos do caput
do art. 395. Existe ainda um segundo efeito da mora. O segundo é a responsabilidade pela integridade da
coisa devida durante a mora (perpetuatio obligationis).
a) Nos termos do caput do art. 395, CC, o devedor deverá ressarcir o credor pelo atraso no pagamento.
b) Responsabilidade pela integridade da coisa durante a mora, nos termos do art. 399, CC. Este segundo
efeito também é chamado de perpetuatio obligationis, significando que a obrigação do devedor se perpetua
durante a mora.
Regra geral, o devedor responde pela impossibilidade da prestação ainda que esta resulte de caso fortuito
ou de força maior, mas, em sua defesa, o devedor poderá provar que não teve culpa na mora ou que ainda
que houvesse oportunamente desempenhado a prestação, ela se impossibilitaria do mesmo jeito.
B) MORA DO CREDOR:
Segundo Washington de Barros Monteiro e Maria Helena Diniz, havendo mora recíproca do credor e do
devedor, compensam-se proporcionalmente.
→ Conceito e Finalidade: a cláusula penal, também denominada pena convencional, consiste em um pacto
acessório pelo qual as partes fixam previamente a indenização devida em caso de mora ou descumprimento
de alguma cláusula específica do contrato (cláusula penal moratória), bem como para o caso de total
inadimplemento da obrigação principal (cláusula penal compensatória).
É um pacto assessório pelo qual as partes de determinado negócio jurídico fixam previamente a indenização
devida em caso de descumprimento da obrigação principal, de mora ou, simplesmente, o descumprimento
de uma das cláusulas do contrato.
Ela tem uma nítida função indenizatória, de ressarcimento. Tem como objetivo antecipar ou pré-liquidar o
valor da obrigação devida nos acasos acima expostos.
Cláusula penal é sinônimo de pena convencional. Alguns contratos chamam esta cláusula de multa, mas este
não é um termo muito adequado (é termo técnico específico) - lembramos aqui que a multa é reprimenda,
tem função sancionatória, e não indenizatória.
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descumprimento de alguma outra cláusula do contrato e, neste caso, será chamada cláusula penal
moratória.
OBS: Por princípio, especialmente para se evitar enriquecimento sem causa, o valor de uma cláusula penal
não poderá ultrapassar o da própria obrigação principal “art. 412”
Na linha do art. 1.152 do Código da Espanha, o art. 410 do CC/02 estabelece que a execução da cláusula
penal compensatória afigura-se como uma alternativa ao credor, uma vez que pode ele optar em exigir o
específico cumprimento da obrigação principal. Pode executá-la, ou exigir o cumprimento da obrigação
principal pela via própria.
Pergunta: cabe indenização suplementar se o prejuízo do credor for superior ao valor da cláusula penal?
O CC foi específico quanto a isso: nos termos do P.U. do art. 416, a indenização só é possível se tiver havido
previsão no contrato. Este art. estabelece que se o prejuízo do credor exceder ao previsto na cláusula penal,
SO SERÁ POSSÍVEL INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR SE HOUVER SIDO CONVENCIONADA.
É de menor importância. É estipulada para o caso de mora ou de descumprimento de uma das cláusulas do
contrato (e não da obrigação principal).
O credor poderá exigir a obrigação principal, que ainda é viável, mais a cláusula penal moratória.
O juiz poderia reduzir uma cláusula penal? O CC segue a linha do Código de Portugal (art. 812). O código
português admite, pois, a redução da cláusula penal.
O CC brasileiro também a admite, em seu art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz
em duas situações: quando a obrigação principal foi cumprida em parte, ou quando o valor da cláusula penal
superar o valor da obrigação principal.
A doutrina mais tradicional é muito ligada à autonomia privada, à livre iniciativa. Assim, uma linha mais
conservadora numa banca de concursos não aceitaria a redução de ofício, exigindo a manifestação do
interessado, que deve pedir a redução, já que se trata de interesse privado. Mas não é este o melhor
entendimento.
A doutrina hoje, à luz do Princípio da Função Social (Flávio Tartuci e, na mesma linha, o En. 356, da 4ª JDC),
admite a redução de ofício. Não é justo que um contrato tenha uma cláusula penal de valor superior ao de
seu objeto principal.
107
Obs.: nos termos do En. 355, não poderá haver renúncia à possibilidade de redução da cláusula penal. É
matéria de ordem pública, e se houvesse essa possibilidade seria considerada como cláusula abusiva.
→ Outras Considerações:
É lícita a cláusula que prevê a perda de todas as prestações pagas a título de cláusula penal?
O STJ tem o entendimento (Resp. 399.123/SC, Resp. 435.608/PR) no sentido de que os contratos celebrados
após a entrada em vigor do CDC, por conta do Princípio Constitucional de Defesa do Consumidor, pode em
tese ter esta cláusula impugnada.
a) inadimplemento fortuito e
b) inadimplemento culposo
Em havendo inadimplemento fortuito, a regra geral é no sentido de que a obrigação é resolvida sem perdas
e danos.
O prof. Álvaro Villaça Azevedo afirma que caso fortuito é o evento da natureza, enquanto a força maior é um
fato ligado ao homem. Já a prof. Maria Helena Diniz, afirma que força maior é o evento inevitável como o
fato da natureza, e o caso fortuito é o imprevisível. Silvio Rodrigues, por sua vez, lembra que pode haver
sinonímia.
Segundo o prof., a corrente que deve predominar é a que afirma que força maior é o inevitável (pode até ser
previsto, mas é inevitável – ex.: terremoto); já o caso fortuito é imprevisível (ex.: seqüestro relâmpago).
O CC, corretamente não diferencia, não traz essa distinção entre caso fortuito e força maior. Ele é neutro, e
trata a ambos de forma homogênea – tanto o caso fortuito como a força maior como um fato necessário.
→ Inadimplemento culposo:
Em havendo este inadimplemento, haverá perdas e danos. A idéia geral do CC é esta: em havendo o
inadimplemento culposo haverá a responsabilidade civil por perdas e danos ( ☺ arts. 389 e 402), sem
prejuízo de eventual tutela específica.
As perdas e danos englobam o dano emergente (prejuízo emergente) e o lucro cessante (o que o credor
deixou de ganhar).
108
Obs.: o lucro cessante tem que ser suficientemente provado.
AULA: 18/05/2010
15 – RESPONSABILIDADE CIVIL
Art. 186
A responsabilidade civil deriva da transgressão de uma norma jurídica preexistente, com a conseqüente
imposição ao causador do dano do dever de indenizar.
A idéia de responsabilidade civil é uma idéia de atribuição – atribuir a alguém a obrigação da indenizar,
desde que verificados os efeitos jurídicos danosos de seu comportamento.
É clássico forte o entendimento de que a responsabilidade civil pressupõe uma norma jurídica anterior: para
que haja responsabilidade civil deve haver uma norma jurídica anterior que, quando quebrada, determinará
a obrigação de indenizar.
A depender da natureza jurídica da norma preexistente violada, a responsabilidade civil pode ser: contratual
ou extracontratual (aquiliana).
A responsabilidade civil contratual tem por premissa uma norma jurídica anterior de natureza contratual.
Obs.: no campo da responsabilidade civil contratual, o que se entende por violação positiva do contrato?
Esta expressão traduz o descumprimento dos deveres anexos (Nebensflichten) decorrentes da boa fé, a
exemplo do dever de informação, de sigilo, etc.
Quando a norma jurídica violada for extracontratual, ou seja, quando for a própria norma legal, teremos a
chamada responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana.
109
O art. do CC que serve como regra geral para a responsabilidade civil aquiliana no Brasil é a norma do art.
186, que define ato ilícito. Este art. consagra o “Princípio do neminem laedere”, que significa que a ninguém
é dado causar prejuízo a outrem.
O art. 186 do CC/02 ao definir o ato ilícito, consagra uma regra geral de responsabilidade civil,
complementada pelos artigos 187 (que define o abuso de direito) e 927 CC/02. Em verdade, tal sistema visa
a coibir comportamentos danosos, em atenção ao princípio do neminem laedere (segundo o qual a ninguém
é dado causar prejuízo a outrem).
Atenção: o art. 186 traz a regra geral. Mas não se pode dizer que toda a responsabilidade civil se funda neste
artigo. Esse artigo é complementado por outras normas. Por quê? Porque se parar para pensar, o art. 186,
quando definiu o ato ilícito, consagrou uma noção subjetiva de responsabilidade civil. O art. 186 utilizou o
critério da culpa. Isso é uma herança do Código Civil Francês.
E a imperícia? Deveria estar nesse artigo. Mas há quem diga que a imperícia é uma imprudência técnica.
Não existe também a responsabilidade sem culpa? Claro. A regra do art. 186 é geral.
O art. 186 é complementado por outros artigos que consagram uma ilicitude objetiva – art. 187 e art. 927,
CC. Percebam que se tem ai um sistema normativo de responsabilidade.
Art. 187: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” (Função de Controle
da Boa-fé objetiva).
O art. 187 consagra uma ilicitude objetiva, porque não utilizou o elemento culpa ao definir o abuso de
direito.
O elemento usado pelo art. 187 foi um elemento objetivo ou finalístico para a configuração do abuso de
direito.
O artigo 186 consagra uma ilicitude subjetiva (baseada na culpa ou no dolo). Todavia, ao lado desta ilicitude,
há também o reconhecimento da ilicitude objetiva (art. 187 e 927), razão pela qual em nosso direito
convivem dois tipos de responsabilidade: subjetiva e objetiva.
O art. 187, na linha de pensamento de Daniel Boulos (Abuso de Direito no Novo Código Civil – Ed. Metodo),
consagrou uma ilicitude objetiva, uma vez que, para aferição do abuso, não se analisa culpa ou dolo, senão a
própria finalidade do agente (se ultrapassou ou não os limites ditados pelo fim social ou econômico, pela
boa-fé ou pelos bons costumes).
Como nasceu a teoria do abuso de direito? Na França. Um determinado sujeito se incomodava com balões
no céu. O sujeito, então, colocou hastes pontiagudas altíssimas para que furassem os balões quando eles
passassem. Utilizava-se a regra do direito romano em que a propriedade ia do céu ao inferno. Não importa
se o sujeito tinha intenção ou não de prejudicar.
Podemos perceber que em nenhum momento o art. 187 fala de intenção de prejudicar outrem. Não falou
em dolo, nem em culpa. O elemento utilizado nesse art. foi um elemento objetivo ou finalístico para a
110
configuração do abuso de direito. Foi utilizado um elemento teleológico. Este artigo pressupõe um
desvirtuamento da finalidade do direito. Abusa-se do direito quando, ao exercê-lo, se desvirtua da finalidade
dele.
Obs.: não configura abuso de direito a constituição de direito ou prerrogativa via “surrectio” – quando
determinado direito deixa de ser exercido por período mais ou menos longo, o seu titular pode perdê-lo via
suprectio, constituindo-se, por conseqüência, em favor da outra parte por surrectio direito correspondente.
A surrectio não traduz abuso de direito. É uma forma lícita, legítima, de adquirir direitos. Para entender a
surrectio, é necessário entender a supressio. São elementos concatenados.
Quando determinado direito deixa de ser exercido, por período mais ou menos longo, o seu titular pode
perdê-lo via supressio, constituindo-se, por conseqüência em favor da outra parte por surrectio, direito
correspondente. Ex: condomínio. Uso de área comum de condomínio. (A) tem a garagem (X). Na garagem,
tem-se uma parede e, próximo dela, tem-se a garagem (Y). A área entre a parede e a outra garagem tinha
uma área comum do condomínio. (A) passou a colocar o carro dele nesse espaço. Durante muito tempo, o
condomínio poderia notificar o sujeito (A) para que ele pagasse o aluguel daquela área. (A) chegou ao ponto
de pedir para quebrar a parede para colocar melhor o carro dele. O condomínio poderia cobrar o aluguel do
período de uso? Não. Na verdade, o fato de o condomínio ter deixado isso acontecer por muito tempo, teria
perdido o direito (surrectio). (A) teria ganhado esse direito (supressio). Poderia notificar (A), cobrando os
aluguéis dali pra frente? Sim.
Como diferenciar ilícito penal e ilícito civil e, conseqüentemente, responsabilidade civil e responsabilidade
penal?
Não podemos querer buscar essa diferença no plano ontológico. A diferença entre o ilícito civil e penal não
está no plano essencial, não está na conduta em si. O mesmo comportamento, uma mesma conduta, tanto
pode deflagrar ilícito civil, ilícito penal e ilícito administrativo. Ex: (A) ultrapassa o sinal vermelho e atropela
alguém. A mesma conduta será analisada sob o prisma penal – lesão corporal; sob o prisma administrativo –
multa e sob o prisma civil – indenização. A diferença está, principalmente, nos efeitos, na resposta do
ordenamento jurídico. A resposta penal é mais gravosa. Pode culminar com a privação da liberdade por 30
anos. O direito penal é um direito excepcional. Segundo Miguel Fenech, a resposta civil para o ato ilícito é a
indenização. É claro que do ilícito penal também pode haver efeito civil.
Além disso, há outra diferença – a tipicidade. Somente os ilícitos penais exigem tipicidade, por segurança do
cidadão. Não se tem tipos especiais civis. Ex: Não está no CC xingamento – pena civil. As normas civis do CC
são normas gerais, calcado no prejuízo. No campo penal, não basta o prejuízo, é necessário ter o tipo. Ex:
Furto de uso não é crime.
111
1) conduta humana
2) nexo de causalidade
3) dano ou prejuízo
Esses são os 3 elementos fundamentais e necessários para toda e qualquer forma de responsabilidade civil.
A culpa é um elemento acidental e não obrigatório, necessário. A culpa pode não ocorrer. Há formas de
ilicitude objetiva. Por isso a culpa não entre nessa estrutura de elementos necessários.
OBS: a culpa, base da responsabilidade do Código Civil da França (art. 1382 e 1383) e também do Código Civil
de 1916, não é um elemento obrigatório da responsabilidade civil, uma vez que, como sabemos, existe
responsabilidade civil sem análise da culpa.
A conduta humana, primeiro elemento da responsabilidade civil, traduz o comportamento humano positivo
ou negativo voluntário e consciente, causador do resultado danoso
A responsabilidade civil pressupõe sempre uma conduta humana. Martinho de Assis Neto refere em sua
obra que houve um tempo, na antiguidade, em que havia processos contra animais, o que é totalmente
ilógico. Já no caso de animais violentos como o pitbul, a responsabilidade não é do animal, e sim do homem.
Giuseppe Bettiol, grande penalista, em sua obra fala exatamente sobre essa voluntariedade. Atos reflexos,
por ex., não são consideradas condutas humanas voluntárias; sonambulismo também pode retirar da
conduta o elemento voluntariedade.
Atenção: o elemento da responsabilidade não é conduta humana ilícita. O ato ilícito não é regra absoluta, é
regra geral.
Excepcionalmente poderá haver responsabilidade civil decorrente de ato lícito (tese sustentada por diversos
autores a exemplo Garcez Neto, Windsheid, Paulo Lobo, Von Thur. Não é a regra, mas pode acontecer.
Aqueles autores admitem isso – ex.: desapropriação, que é o típico exemplo de ato lícito, permitido, que
gera dano e responsabilidade civil; outro ex. é a passagem forçada.
112
O nexo de causalidade, também requisito da responsabilidade civil, traduz o liame ou vinculo jurídico
necessário que une o agente ao resultado danoso.
Não há falar-se em responsabilidade civil se não se puder atribuir o prejuízo ao agente, por meio do nexo de
causalidade.
1ª) Teoria da Equivalência de Condições, também conhecida como a Teoria da conditio sine qua (non):
esta teoria afirma, segundo o pensamento filosófico de Von Buri, que tudo que concorra para o resultado é
causa, ou seja, todo e qualquer antecedente fático que concorra para o resultado é causa. Esta teoria se
desenvolveu muito no direito penal, mas foi bastante criticada pelo seu superdimensionamento, o espiral de
causas, o retorno ao infinito (trata-se daquela teoria segundo a qual o fabricante da arma é responsável pelo
homicídio praticado pelo agente que a comprou e utilizou num crime). Por isso hoje o direito penal lida com
o critério do risco, com a mitigação da imputação objetiva. Esta teoria não é muito acolhida no direito civil.
2ª) Teoria da Causalidade Adequada (Von Kries): é uma teoria mais refinada. Para ela nem todo
antecedente que concorra para o resultado é causa. Causa é apenas o antecedente abstratamente idôneo à
deflagração do resultado. É uma teoria mais reflexiva, porque devemos refletir quais as causas realmente
idôneas à produção do resultado. O disparo da arma é o antecedente absolutamente idôneo, e não a
fabricação dessa arma. Esta segunda teoria é forte não direito brasileiro. É defendida por autores como Sergi
Cavalieri Filho. É também a teoria adotada no Código da Argentina. Mas essa teoria não é a única adotada no
Brasil. Há divergência doutrinária.
3ª) Teoria da Causalidade Direta e Imediata, também chamada Teoria da Necessariedade do Dano:
também é defendida no Brasil. Gustavo Terpendino (RTDC ano 2, vol. 6/02), Carlos Alberto Gonçalves,
Agostinho Alvim, dentre outros defendem esta teoria. Esta teoria é mais imediata, é mais objetiva, e por isso
é mais fácil de se aplicar e de se compreender, cognitivamente. Esta teoria sustenta que causa é apenas o
antecedente fático que determina o resultado danoso como conseqüência sua direta e imediata. É como se
houvesse um vínculo necessário, de imediatidade entre aquela causa e aquele resultado. Num caso
concreto, o STF, ao decidir que a suspensão de medicamento determinou direta e imediatamente a perda de
um rim do paciente, teria abraçado esta teoria. É a teoria adotada pelo CC/02 - art. 403: “Ainda que a
inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros
cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”. O STJ, no Resp.
686.308, ao decidir que a suspensão de medicamento determinou direta e imediatamente a perda de um
rim do paciente teria abraçado essa teoria (também o RE 130.764, STF). OBS: Todavia, esta matéria esta
longe de ser pacífica. Grande parte da doutrina, a exemplo de Cavaliere Filho e Romualdo dos Santos, a
despeito da dicção do art. 403, entende que o CC/02 adotou a teoria da causalidade adequada.
Em nosso pensar, todavia, a teoria adotada foi a da causalidade direta e imediata, o que encontra reforço
inclusive no RESP 686/2008 e no noticiário especial do STJ de 4 de maio de 2010.
113
Nem todo dano é indenizável, ou seja, nem todo dano gera responsabilidade civil.
Não poderia haver responsabilidade civil sem dano ou prejuízo? Os autores, em ampla maioria, colocam o
dano como terceiro elemento. O prof. acha inconcebível se falar em responsabilidade civil sem dano. O que
seria então indenizado? Há um artigo do CC que diz que a indenização se mede pela extensão do dano. Obs.:
há situações em que o dano é presumido.
Conceito: dano traduz a lesão ao interesse jurídico tutelado material (patrimonial) ou moral.
Para o dano ser indenizável é preciso que ele observe 3 características: a violação a um interesse jurídico, a
certeza do dano, e a subsistência do dano.
a) Violação a interesse jurídico: Ex: dor de fim de afeto não é indenizado. Não há responsabilidade civil.
Embora o afeto seja um valor juridicamente considerado, o seu fim não é dano passível de indenização. O
afeto não viola interesse jurídico. Pode haver por outros motivos. Ex: Inscrição indevida no SPC é traduzida
pela jurisprudência como violência ao interesse jurídico. Ela gera indenização, portanto.
b) Certeza do dano: Só se pode indenizar dano certo, não se indeniza dano hipotético. É por isso que não se
pode indenizar o mero aborrecimento.
Obs.: a despeito do requisito da certeza, o que falar da perda de uma chance em Direito Civil? – Teoria da
perda de uma chance: nasceu na França e mitiga a certeza do dando porque também pode gerar
responsabilidade civil. Conceito: Segundo Fernando Gaburri, a perda de uma chance pode ser indenizável
por afastar uma expectativa ou probabilidade favorável ao lesado. O que se indeniza aqui não é o dano certo
e sim a expectativa, a probabilidade que se perde. Não é a mesma situação de ter sofrido um dano
específico. Ex.: advogado que não prepara o recurso (não se sabe se o cliente teria a vitória desejada);
médico que deixa de anotar algo no prontuário do paciente; maratonista brasileiro estava em primeiro lugar
na corrida e alguém o derruba; etc. A indenização deve ser reduzida porque o que se perdeu não foi o
direito, e sim a probabilidade de se obter um êxito. A perda de uma chance entoa não significa indenização
integral.
OBS: Importante analisar uma decisão do STJ RESP 788.459/BA em que se reconheceu a perda de uma
chance por impropriedade de pergunta formulada em programa de televisão.
- Dano reflexo ou em ricochete: desenvolvido pela doutrina francesa, o dano reflexo se configura quando o
prejuízo atinge por via oblíqua pessoa próxima à vítima do ato ilícito (atinge a vítima ligada a vítima principal
– ex.: filho que sofre com o assassinato do pai).
Dano reflexo é aquele que atinge a vítima indireta, ligada à vítima direta da atuação ilícita.
114
Obs.: não confundir o dano reflexo (em que há uma vítima primaria e outra secundária) com o que alguns
autores chamam de danos indiretos (Fernando Caburri), caso em que a mesma vítima sofre uma cadeia de
prejuízos. Neste tipo de dano (indireto), a mesma vítima pode sofrer uma cadeia de prejuízos. No dano
reflexo, há 2 vítimas – a primária e a secundária. No dano indireto, a mesma vítima pode sofrer uma cadeia
de prejuízos. Ex: (A) vendeu uma vaca aftosa. É uma doença bovina. (B) compra a vaca. Ele sofre o dano pela
doença da vaca. Além disso, essa vaca infectou outras cabeças do rebanho. A análise do nexo causal é mais
polêmica, mas se tem o dano indireto.
Especialmente no campo do dano moral é muito utilizada a expressão dano in re ipsa, que é o dano
presumido, que dispensa prova em juízo (ver Resp 776.766/PR). Ex.: negativação indevida no SPC e no
Serasa.
Obs.: o STJ tem entendimento no sentido de que “devedor com vários registros em cadastro de proteção ao
crédito não tem direito a indenização por dano moral” (Resp. 1.002.985). O prof. não concorda com isso. O
juiz deve levar isso em consideração no momento da quantificação do dano. Só há dano moral se a inscrição
for indevida.
Também gera dano in re ipsa a ausência de notificação para efeito de inscrição no sistema de proteção ao
crédito.
A cerca de um mês atrás, o STJ editou uma súmula – Súm. 359 – que afirma que quem tem legitimidade para
notificar o consumidor – SPC, SERASA, banco ou loja seria o próprio órgão mantenedor (a ele cabe a
notificação do devedor antes da inscrição). Quem responderá pela falta de notificação é o sistema de
proteção ao crédito. Deve-se enviar uma carta, informando que o seu nome será negativo em tantos dias.
Súm. 359, STJ: “quem tem obrigação de notificar o consumidor é o órgão mantenedor do cadastro de
proteção ao crédito e esta informação tem que se dar antes de se proceder a inscrição”.
c) Subsistência do dano: significa que para o dano ser indenizável, ele deve ser subsistente. Ou seja, o dano
que já foi recomposto não é passível de indenização.
É muito comum o jurista apontar que o elemento necessário da responsabilidade civil é a culpa. O prof. evita
fazer isso. Os elementos necessários são 03, e a culpa é apenas um elemento acidental. Esta pode não
ocorrer, tanto é que temos formas de ilicitude objetiva.
Durante o Séc. XX a humanidade experimentou um avanço tecnológico imenso, e quanto mais avançada se
torna uma sociedade, maior é o risco de nela se viver. Por conta desse risco o Direito Brasileiro trouxe a
responsabilidade objetiva, segundo a qual aquele que foi responsável pelo dano deve por ele responder
115
objetivamente. Ou seja, aquele que cria o risco para dele extrair um proveito, deve responder
objetivamente.
Primeiramente o CC/16 só trazia a responsabilidade com culpa (calcava a responsabilidade civil na noção de
culpa), ou seja, na responsabilidade civil subjetiva. Não era prevista a responsabilidade objetiva. Mas, uma
vez que o risco de se viver em sociedade foi aumentado, observamos uma desconcentração do Direito Civil.
Assim, ao longo do Séc. XX muitas leis especiais foram sendo aprovadas, muitas delas consagrando a
responsabilidade sem culpa (responsabilidade sem análise da culpa), ou seja, a responsabilidade objetiva.
Assim, a responsabilidade civil objetiva nasceu no Brasil, paulatinamente, no Séc. XX justamente por conta
dessa descentralização sofrida pelo Direito Civil.
A primeira lei que consagrou essa responsabilidade objetiva no Brasil foi o Decreto 2.681/1912, que
consagrou a responsabilidade objetiva por acidente ferroviário. Posteriormente veio a legislação do acidente
de trabalho, a legislação do DPVAT, o CDC, e tantas outras leis especiais que também consagraram esse tipo
de responsabilidade.
O NCC acompanhando essa tendência, esse processo que se desencadeou durante o Séc. XX, consagrou as
duas formas de responsabilidade - ☺art. 927, que consagra tanto a responsabilidade subjetiva, baseada na
noção de culpa, como também a responsabilidade objetiva, que independe de culpa. Assim, convivem no
CC/02 a ilicitude subjetiva e a ilicitude objetiva: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo”. ☺ P.U.: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
Este art. faz remissão a outros dois arts., sendo que o art. 186 cuida da responsabilidade baseada na culpa
(subjetiva), e o art. 187 cuida do abuso do direito (responsabilidade objetiva).
O P.U. deste art. 927 também consagra a responsabilidade objetiva (sem aferição da culpa) em duas
situações: (e este P.U. é a base da responsabilidade civil em nosso CC).
a) nos casos especificados em lei (as leis especiais que consagram a responsabilidade objetiva continuam,
pois, em vigor, no que não foram revogadas – ex.: acidente de trabalho, CDC, normas ambientais,
responsabilidade do Estado, etc.); ou
b) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para
os direitos de outrem.
Atenção: atividade de risco não é sempre causa de responsabilidade objetiva; não é qualquer atividade de
risco que gera a responsabilidade objetiva, já que quase todas as atividades do homem, hoje, envolvem
algum tipo de risco, ainda que seja apenas um risco-probabilidade de dano. O CC foi muito claro ao
especificar que a responsabilidade objetiva haverá somente quando a atividade estiver sendo normalmente
desenvolvida (reiterada) e quando implicar, por sua natureza, um risco. É preciso, pois, que a atividade
traduza uma ação reiterada, habitual, expondo a vítima a uma probabilidade de dano maior do que a
experimentada por outras pessoas da coletividade, enquanto o agente busca com sua atividade um proveito.
Por isso é justo que o agente responda independentemente de culpa.
116
Enfim, embora a tendência seja a de sempre mais objetivar a responsabilidade, deve haver critérios para
essa objetivação.
O Estado de necessidade, previsto no art. 188, II, CC, traduz uma situação de agressão a interesse jurídico
alheio, visando a remover perigo iminente não causado pelo agente.
Obs.: na forma dos arts. 929 e 930, no estado de necessidade, assim como na legítima defesa, caso seja
atingido terceiro inocente, este poderá demandar o agente, que indenizando-o, terá ação regressiva em face
do verdadeiro culpado.
Vale lembrar que a legítima defesa, prevista no art. 188, I, CC, ocorre quando o agente reage
proporcionalmente a uma situação de agressão injusta, atual ou iminente.
Embora o CC não regule explicitamente o estrito cumprimento do dever legal, o jurista Frederico Marques
observa que este instituto está compreendido no próprio exercício regular de direito ( ☺art. 188, I, segunda
parte, CC).
Exs.: atuação dos funcionários da Infraero no raio-x do aeroporto, desde que não haja excesso ou
desequilíbrio, a atuação desses agentes é causa excludente de responsabilidade civil; policial que cumpre
mandado de busca e apreensão; oficial de justiça, etc.
Mas há também situações mais genéricas de ERD, como no caso dos supermercados que solicitam que os
clientes deixem suas bolsas nos guarda-volumes.
O STJ já decidiu, no Ag. Rg. no Ag. 792.824/SP, que atua no ERD o credor que, na forma da lei exerce a
faculdade de protestar título. O STJ, no entanto, negou a tese no Resp. 164.391/RJ, quando se refere a
cerceamento de liberdade e de direitos fundamentais.
O CC disciplina ambas as matérias no art. 393: “O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso
fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. P.U.: O caso fortuito ou
de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possível evitar ou impedir.”
O STJ já firmou o entendimento de que o assalto a mão armada em coletivo é um evento fortuito (em
sentido genérico). A empresa viária não tem responsabilidade civil. A regra, portanto, é excluir a
responsabilidade do transportador.
117
Resp. 726.371/RJ (☺material de apoio).
Mas, existe corrente em tribunais inferiores no sentido de que se o assalto é freqüente, sucessivo, na mesma
linha, passa a ser previsível, não traduzindo mais caso fortuito ou força maior, embora não seja esta a
posição do STJ.
Também é causa excludente da responsabilidade civil por ruptura do nexo jurídico de causalidade.
Esta defesa tem que estar devidamente comprovada nos autos. Não cabe presunção de culpa exclusiva da
vítima.
Não se pode confundir a culpa exclusiva da vítima (que exclui a responsabilidade civil) com culpa
concorrente da vítima - ☺art. 945, CC: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a
sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do
dano”. Na culpa concorrente o juiz reduz uma fração da indenização devida (minimiza o quantum
indenizatório), mas não exclui a responsabilidade.
Obs.: no âmbito do direito do consumidor, o que se entende por fortuito interno e externo? O fortuito
interno é o que incide no processo de elaboração do produto ou execução do serviço, não excluindo a
responsabilidade do fornecedor. O fortuito externo, por sua vez, poderá eximir o fornecedor de
responsabilidade, uma vez que incide após a consumação do processo de elaboração do produto ou é alheio
à execução do serviço.
Tem o condão de excluir a responsabilidade civil por ruptura do nexo de causalidade. Ex.: ator de filme foi
morto por uma metralhadora que não teve as suas balas trocadas por festim. É o típico fato de terceiro.
☺Súm. 187, STF: “A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é
elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”.
A Teoria do Corpo Neutro, aplicação do fato de terceiro, exime a responsabilidade do condutor de veículo
que, atingido por outrem, é arremessado, violando direito de pessoa inocente. Ocorre, excepcionalmente,
nos acidentes de trânsito. É o que acontece geralmente em caso de engavetamento de veículos. Para que o
condutor alegue fato de terceiro (corpo neutro), é necessário que o condutor seja arremessado pra fora. Se
ele fizer alguma manobra voluntariamente, ele estará agindo em estado de necessidade.
Existem 02 correntes doutrinárias tratando dos efeitos jurídicos da Teoria do Corpo Neutro, a saber:
Argumenta que a vítima inocente poderá demandar o condutor do veículo arremessado, que terá ação
regressiva em face do verdadeiro culpado ( ☺RT 646/89, RT 437/127). O prof. não concorda com essa
118
corrente. A pessoa que foi arremessada para fora da estrada não fez uma manobra evasiva. Quem é
arremessado está sendo lançado como se fosse um projétil. Ele é tão vítima quanto a vítima.
Uma segunda corrente sustenta que o condutor do veículo arremessado também é vítima, de maneira que o
único legitimado a responder em sede de responsabilidade civil é o verdadeiro culpado, não cabendo
interpretação extensiva dos artigos 929 e 930, CC ( ☺Resp. 54.444/SP).
E se não se descobrir quem é o condutor do veículo causador do acidente (que obrigou o outro carro a
chocar-se contra um terceiro)? Isso é um problema sério. Numa visão técnica, a pessoa que é arremessada
para fora não teria responsabilidade civil.
Questão de concurso: O que é cláusula de não indenizar? Trata-se de uma convenção pela qual as partes,
segundo a autonomia privada, excluem a responsabilidade civil. Essa cláusula é muito desenvolvida no
direito Frances. Ela é abusiva? Depende. Se for pactuado em contrato, em relação civil, entre partes em que
haja equilíbrio, essa cláusula é possível. Na prática, essa cláusula é muito pouco usual. Ela, normalmente, ela
está incluída em relação contratual desigual. Neste caso, ela pode ser considerada abusiva. Ex:
Estacionamento do shopping. Tem o ticket que fala que não se responsabiliza por nada. Ignore essa cláusula,
pois ela é abusiva, na forma do art. 25 do CDC: “É vedada a estipulação contratual de cláusula que
impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores. §1°:
Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação
prevista nesta e nas seções anteriores. §2° Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao
produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a
incorporação”.
Ex: A dá carona a alguém, bate o carro, e esse alguém bate o rosto no vidro. A terá de indenizar a pessoa que
tomou a carona?
O enriquecimento ilícito (☺ material de apoio), embora não traduza causa excludente de responsabilidade
civil, pode interferir na fixação do quantum. Geralmente, alega-se em defesa para reduzir o valor da
indenização. Isso é muito aplicado na indenização por dano moral.
A responsabilidade civil é chamada indireta porque ela se dá por meio da coisa, do animal ou de terceiro.
119
choque, pit Bull que mata, etc. Nós vivemos em uma sociedade extremamente perigosa, por isso que há a
responsabilidade pelo fato da coisa ou do animal.
Segundo a Teoria do Guardião (ou Teoria da Guarda), a responsabilidade pelo fato da coisa ou do animal é
da pessoa que detém poder de comando sobre ele (guardião). O proprietário é o guardião presuntivo. Em
princípio, o dono que é o guardião da coisa e do animal. Porém, há situações em que o sistema jurídico
brasileiro reconhece que o guardião não seja o dono.
Responsabilidade pelo fato do animal: Ex: o cachorro de A soltou-se, e mordeu o seu namorado B. De quem
é a responsabilidade? Ela está prevista no CC/02. Se o fato ocorreu à luz do CC/16, tecnicamente, deve-se
aplicar o CC antigo, no que tange à responsabilidade. No CC/16, art. 1527, a responsabilidade civil era
subjetiva, ou seja, o guardião do animal poderia eximir-se de responsabilidade, alegando que não teve culpa,
por ter guardado e vigiado com cuidado preciso. Tantos foram os casos envolvendo animais ferozes, que o
CC/02 acabou com isso. O novo CC, no seu art. 936, consagrou responsabilidade civil objetiva pelo fato do
animal. Não importa se vigiou bem o animal. Não importa a análise da culpa do dono do animal. Se houver a
lesão, haverá responsabilidade civil.
De quem será a responsabilidade? O dono ou detentor do animal, se não provar culpa da vítima ou força
maior. Ex: adestrador de animal. A responsabilidade pode ser deste adestrador também. Se o adestrador é
um técnico, poderia se defender, alegando que a responsabilidade é do detentor. Houve a transferência do
poder de comando para o adestrador.
Ex: Casa com muro. Tem um portão de entrada que estava fechado. Tinha um aviso “cuidado com animal”.
Um senhor de 90 anos resolveu visitar o dono da casa. O cachorro fica solto no quintal. O senhor abriu a
trinca, tirou a corrente, trancou o portão e foi em direção da casa. O cachorro disparou para atacar o senhor.
O dono gritou o nome do cachorro. Como estava chovendo, o cachorro escorregou e saiu girando. Trata-se
de caso de culpa exclusiva da vítima.
- Responsabilidade pela ruína de edifício ou construção: Cavalieri Filho diz que a ruína pode ser total (toda a
construção vem abaixo) ou parcial (parte da construção vem abaixo). De quem é a responsabilidade pelo
fato da coisa? Ex: Uma placa de cimento de um banco se descolou e atingiu um aposentado, matando-o. É
um típico caso de ruína parcial. A responsabilidade é objetiva, nos termos do art. 937, CC, do dono da
construção ou do edifício. A ação regressiva deve ser discutida em outro plano. No caso de ruína, a
responsabilidade estampada no Código é do dono. O CC não falou em detentor. Essa responsabilidade
também é baseada no risco. Esse artigo tem base no art. 1.386, Código da França – o proprietário de um
edifício será responsabilizado pelo dano causado de sua ruína.
- Responsabilidade por objetos lançados ou caídos: Art. 938, CC. Ex: vaso de flor que caiu da janela. É do
dono? Pode não ser. Tecnicamente, o responsável pelo fato da coisa é o guardião. O dono é guardião
presuntivo. Porém, nos casos de objetos lançados ou caídos, o CC utiliza uma previsão ampliada. A
responsabilidade pelo fato da coisa é objetiva. Além disso, a responsabilidade é do habitante. Este pode ser
o dono, o locatário, o promitente-comprador, etc. Ex: todos os dias, as pessoas arremessavam pela janela
“pombo ou balão” (necessidades enroladas num jornal). Nesse caso, a vítima do projétil ajuizará a ação de
responsabilidade civil contra a pessoa que habita o 15º andar, por exemplo.
120
Como se chama a ação judicial proposta pela vítima em face do habitante do lugar de onde proveio o
projétil? Actio de effusis et dejectis. O prazo de prescrição da pretensão é de 03 anos. Não tem nada a ver
com o CDC.
E se não souber de onde partiu o projétil, de quem é a responsabilidade? Se não se souber de onde ele
proveio, o direito brasileiro dispõe que a responsabilidade é de todo o condomínio, com base na
denominada Teoria da Causalidade Alternativa, segundo a qual todos os agentes possíveis do dano poderão
ser responsabilizados, para que a vítima não fique irressarcida.
Obs.: A jurisprudência (RT 530/213, REsp 64.682/RJ) exclui a responsabilidade das unidades habitacionais de
onde seria impossível o arremesso. Se o condomínio for formado pelo bloco 1 e pelo bloco 2, e desse bloco,
é impossível o arremesso, este bloco não será responsabilizado.
Questão de concurso: de quem é a responsabilidade pelo acidente com veículo locado? Poderia até
argumentar que no momento em que se irá alugar um carro, a empresa locadora transfere ao locatário o
poder de comando sobre a coisa. Além disso, o locatário é habilitado. Isto firma a presunção de perícia. A
locadora, por acidente causado pelo locatário, não teria nenhuma responsabilidade? Sim. Todavia, o STF não
quer nem saber disso. O STF responsabiliza solidariamente a locadora de veículo pelo acidente causado, e a
base deste entendimento pode ser encontrada na própria Teoria do Risco (a empresa que loca carros criou
risco, devendo responder por ele). Mas a solidariedade pode ser presumida? Não. Não temos artigo
específico, mas há um artigo genérico – art. 942, CC. Para o CC, todo agente que concorra para a ofensa é
solidariamente responsável por ela.
E se emprestar o carro para a mãe? Ela sai com o carro e bate numa Ferrari. O filho será responsável? Isso
será visto na próxima aula.
O CC/16, em seus arts. 1.521 e 1.523, criava um sistema de responsabilidade por ato de terceiro baseado em
presunções de culpa. O CC/02, alterando a matéria, converteu este sistema em responsabilidade objetiva
(arts. 932 e 933). Essa responsabilidade decorre da lei.
A partir da entrada em vigor do novo código, o pai responde pelo ato do filho independente de ter que se
demonstrar a culpa do pai na criação e formação do filho, a responsabilidade é objetiva. Da mesma forma o
empregador responde objetivamente pelos atos do empregado.
Mas isso não quer dizer que na relação entre o empregado e a vítima, ou entre o filho e a vítima, não se
possa discutir culpa.
Obs.: O fato de o art. 933 haver consagrado um sistema de responsabilidade objetiva, ao significa que em
toda situação o representante fique impedido de alegar em defesa que o representado não atuou com
culpa, a exemplo de um acidente de trânsito.
Se por ex. o empregador pagar prelo empregado, cabe ação regressiva contra o empregado? Se o pai pagar
pelo filho, cabe ação regressiva contra o filho?
121
Art. 934, CC: “Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por
quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente capaz”. Ou seja,
em geral cabe a ação regressiva, mas, no caso do pai e filho, se o filho era absolutamente capaz na data do
ato, a ação regressiva não será possível.
OBS: o fato de a relação interna entre representante e representado haver sido objetivada (art. 933) não
significa que nunca se possa discutir culpa na relação entre o representado e a vítima: por isso, a título de
exemplo, o empregador não possa alegar ausência de culpa na escolha do empregado, poderá
perfeitamente, em caso de acidente de trânsito, afirmar que o seu empregado não teve culpa.
OBS: no que tange à ação de regresso, ver o art. 934. Vale dizer, a ação de regresso em regra é possível,
ressalvada a hipótese de o representado ser descendente absoluta ou relativamente incapaz do
representante que efetuou o pagamento à vítima.
Art. 932, CC: “São também responsáveis pela reparação civil: (...)”, ou seja, são solidariamente responsáveis.
O que caracteriza a solidariedade passiva é que qualquer dos devedores pode responder por toda a dívida.
São eles:
I) os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia: e o que se fala aqui
vale para ou demais incisos. Este inciso é problemático porque se você estiver diante de uma hipótese de
guarda compartilhada não haverá problema algum, mas a guarda compartilhada ainda não é a regra no
Brasil (a regra é a da guarda unilateral). No caso de guarda unilateral, haverá um dos pais que não terá o
filho sob a sua companhia (que estará apenas na companhia da mãe), assim, a responsabilidade, na
literalidade do art., será da mãe ou do pai. Assim, uma primeira corrente interpreta o inciso I do art. 932 de
forma literal, atribuindo responsabilidade ao pai ou mãe que tenha o filho em sua companhia ( ☺Resp.
540.459/RS). Já uma segunda corrente atribui responsabilidade a ambos (independentemente de quem
tenha a guarda), uma vez que o dever de educar cabe ao pai e a mãe ( ☺§3º, do art. 1.583, CC, alterado pela
Lei 11.698/08).
Obs.: nas hipóteses dos incisos I e II do art. 932, à luz do art. 928, podemos concluir haver uma solidariedade
especial ou subsidiariedade quanto à responsabilidade civil do incapaz.
Lembrar: “o incapaz responde atrás” – tanto ele como o representante dele podem ser compelidos a pagar a
dívida. O representante dele responde primeiro, mas se o representante não responder perante a vítima, o
incapaz responde atrás.
Art. 928, CC: “O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem
obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes”.
Ou seja, o incapaz só será responsabilizado subsidiariamente se o seu representante não dispuser de meios
econômicos (por ex., se for pobre), ou se o seu representante não tiver a obrigação de indenizar a vítima
(ex.: aplicação da medida sócio educativa de reparação de danos, nos termos do ECA).
122
OBS: é muito importante frisar que o CC/02, rompendo com o sistema anterior, admite a responsabilidade
civil do incapaz, quer seja a incapacidade absoluta ou relativa, nos termos do art. 928 do CC/02: segundo a
norma, se o representante não tiver condição econômica ou obrigação de indenizar a vítima, HAVERÁ
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO PRÓPRIO INCAPAZ.
OBS: na sistemática do ECA, no bojo de ação sócio-educativa, poderá o juiz da infância fixar “medida
reparatória”, em favor da vítima, que deverá ser cumprida pelo próprio incapaz, e não por seus pais, que não
a obrigação de fazê-lo.
OBS: em uma interpretação literal, o inciso I do art. 932 do CC/02 eximiria de responsabilidade o genitor que
não tivesse o filho em sua companhia, na oportunidade do ato danoso (nesse sentido já decidiu o STJ no
Resp. 540.459/RS); entretanto, a matéria é polêmica, considerando-se que o próprio STJ, em julgado mais
recente, levando em conta que o dever de educar é de ambos os pais, não afastou a responsabilidade
daquele que não detinha a guarda (Resp. 1074937/MA).
IV) os donos de hotéis, hospedarias, casas, etc. O dono da escola é objetivamente responsável pelos atos
dos educandos menores (o que já não acontece em faculdades, com alunos maiores de idade). O que
justifica a responsabilidade dos donos de hotéis e estabelecimentos congêneres pelos atos danosos dos seus
hospedes é o dever de segurança reforçado pelas regras do CDC.
V) os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime. É para evitar o enriquecimento sem
causa.
AULA: 24/05/2010
a) empregados: quando um empregado sofre um dano o que se tem é um acidente de trabalho. A tendência
hoje é a responsabilidade objetiva do empregador quando o empregado exerce atividade de risco. Esta
matéria é estudada em Direito do Trabalho.
b) clientes (consumidores): o cliente bancário é consumidor. Já existia uma súm. do STJ a respeito. E o STF
firmou sua posição: a despeito de o STJ, na Súm. 297, firmar o entendimento de que o CDC era aplicável às
instituições financeiras, a ADI 2591 pretendeu revogar esta regra, declarando, neste particular,
inconstitucional o CDC. O STF firmou entendimento, em síntese, no sentido de que o CDC é aplicável aos
bancos, excluindo-se, todavia, a atividade específica de intermediação de dinheiro, especialmente fixação de
juros, sem prejuízo do controle pelo Poder Judiciário.
123
Ex.: pagamento de cheque falso – o banco pode se responsabilizar por isso? Pode. Existe uma súmula muito
antiga do STF, a Súm. 28, que já dizia que é possível responsabilizar o banco pelo pagamento de cheque
falso.
Outro ex.: assalto ao cofre do banco, que também pode gerar responsabilidade civil e a responsabilidade
também é objetiva, baseada na teoria do risco (trata-se de relação de consumo). Lembra-nos o prof. Rui
Stoco que o que existe ai é um contrato de depósito, regrado pelo CDC.
c) terceiros: o terceiro que sofre o dano, a ex. da hipótese do uso indevido de documento para abertura de
conta, pode demandar o banco com base na responsabilidade objetiva alicerçada na teoria do risco.
No julgamento do Resp. 488.310/RJ, o STJ firmou entendimento de que se o assalto ocorre no interior da
agencia bancária, ainda que fora do horário de expediente, a responsabilidade é do banco; mas se o assalto
ocorre em via pública, é do Estado.
Erro médico é o dano imputável ao profissional da medicina resultando em sua responsabilidade civil
subjetiva, nos termos do art. 14 §4º, CDC. A responsabilidade é baseada na culpa profissional.
Obs.: em regra, a obrigação assumida pelo médico é de meio, ressalvando-se o cirurgião plástico estético,
que assume obrigação de resultado. É possível ao paciente pleitear a inversão do ônus da prova quando
discute a responsabilidade do médico.
O anestesista assume obrigação de meio, devendo empreender os melhores esforços para alcançar o
resultado esperado. O que dizer do dever de prestar socorro em face dos adeptos da religião “Testemunhas
de Jeová”?
Uma primeira corrente sustenta a impossibilidade da transfusão de sangue, ainda que seja o único meio
terapêutico para salvar a vida do paciente, sob o argumento de que a dignidade só é preservada se a
vontade do paciente é respeitada.
Uma segunda corrente doutrinária, que é a que tem preponderado, defende a possibilidade de transfusão
de sangue como único meio para salvaguardar a vida do paciente, segundo a doutrina da ponderação de
interesses.
A lógica seria se tratar de uma responsabilidade objetiva. Contudo, o STJ, a despeito de o hospital não ser
profissional liberal, tem reafirmado a tese de que a sua responsabilidade também é subjetiva ( ☺Resp.
258.389/SP e Ag. Rg. no Ag. 721.956/PR). Ou seja, para demandar o hospital será preciso discutir culpa,
igualmente.
124
Obs.: no que tange, todavia, à infecção hospitalar, o STJ, no Resp. 629.212/RJ, entendeu que a
responsabilidade do hospital passaria a ser objetiva.
No que tange à companhia de seguro de saúde, o STJ também tem precedente responsabilizando plano de
saúde por erro do médico credenciado (☺Resp. 328.309/RJ).
O que é Termo de consentimento informado: à luz do Princípio da Boa-fé Objetiva, especialmente com base
no dever de informação, o consentimento informado, com amparo no art. 15, CC, dá ao paciente
conhecimento formal dos efeitos e conseqüências do tratamento ou intervenção. Não traduz, todavia,
absoluta excludente de responsabilidade civil em caso de erro médico.
Segundo Júlio Meireles, a Teoria da Perda de uma Chance ( ☺aulas anteriores) também pode se aplicar ao
médico que, diante dos recursos disponíveis, deixa de adotar o procedimento mais recomendável para
alcançar o diagnóstico mais rápido. Consiste no uso indevido de meios, violando o art. 5º do Código de Ética
Médica. Em tais casos, haverá responsabilidade civil com indenização reduzida.
O prof. recomenda a leitura de um texto do prof. Ricardo Zart, que podemos acessar no site
www.jus.com.br.
A responsabilidade civil do dentista é equiparável à do médico, uma vez que, por se tratar de profissional
liberal, somente poderá ser responsabilizado com base em sua culpa profissional.
O prof. recomenda a leitura da obra: “A responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance”, de
Sérgio Novais Dias, Ed. Ltr.
O advogado, na condição de profissional liberal, também responde com base na culpa profissional, à luz do
§4º, do art. 14, do CDC (na mesma linha o art. 32, do Estatuto da OAB), ou seja, o advogado responde
quando atuar com dolo ou culpa no exercício da sua profissão.
O advogado assume uma obrigação de meio. Não se pode impor a ele a garantia do resultado final. Isso vale,
inclusive, no caso de advocacia consultiva, ou seja, quando o advogado dá um parecer, consulta, o que se
tem ali também é uma obrigação de meio. Se não atingido o resultado esperado não se pode atribuir ao
advogado responsabilidade civil.
Pode acontecer a responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, quando ele deixa de
realizar determinados atos que poderiam favorecer a situação do seu cliente.
125
Há entendimento no STJ (☺Resp. 438.831/RS) no sentido de que acidente de transito causado por animal na
pista pode resultar na responsabilidade subjetiva do Estado por omissão; mas, em rodovia gerida por
concessionária de serviço público (rodovia pedagiada), em havendo acidente, a responsabilidade é objetiva
com base no CDC (☺Resp. 647.710/RJ). É relação de consumo, já que pagamos por isso.
Como fica a responsabilidade civil em acidente envolvendo transporte de mera cortesia (carona)? A carona é
o transporte desinteressado, aquele sem expectativa de contrapartida.
Súm. 145, STJ: “No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente
responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”.
Quanto ao transporte aéreo, a Convenção de Varsóvia estabelece limite de valor máximo por perda de
bagagem, em caso de viagens internacionais. Já nas viagens domésticas, como o conteúdo da Convenção foi
absorvido no âmbito interno, também nessas, como lembra-nos o prof. Eduardo Sens, o direito consagrado
na Convenção de Varsóvia é semelhantemente aplicado, ou seja, também haverá um limite por valor de
mala perdida nas viagens pelo interior do Brasil.
Ocorre que o STJ tem aplicado o CDC, para permitir indenização acima do limite previsto pela Convenção de
Varsóvia ou na norma aplicável no vôo doméstico. E isso vale tanto para o dano material como para o moral.
Como fica a responsabilidade civil do condomínio por furto ocorrido em área comum? O STJ tem entendido
que a responsabilidade do condomínio pressupõe previsão expressa da assunção do dever de vigilância em
áreas comuns (☺Resp. 618.533/SP e Emb. no Resp. 268.669/SP).
15.14 – RESPONSABILIDADE PELO FATO DA COISA (em caso de ruína ou de objeto lançado ou caídos)
RUÍNA: No que se refere à responsabilidade civil pela ruína de edifício ou construção, o código de 2002,
em seu art. 937, admitiu a responsabilidade do dono, que, segundo a doutrina (Flávio Tartuce, Fernando
Simão) é objetiva. A despeito de respeitáveis posições em contrario, coadunamos com esta doutrina de que
também é objetiva. O dono é responsável pela ruína.
Vide art. 937 do CC/02 Pergunta: o art. 937, quando diz falta de reparo, não seria caso de
responsabilidade subjetiva? R: Cavaliere responde o seguinte: se o acidente aconteceu é porque o reparo
não foi feito.
126
Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta
provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.
Vide art. 938 do CC/02. Neste caso também é caso de responsabilidade objetiva.
Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que
dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.
OBS: o art. diz sobre que a responsabilidade é de quem HABITA. Pergunta: convidado joga um objeto de seu
apartamento, responsabilidade é de quem? R: mesmo neste caso é de quem HABITA, podendo caber ação
regressiva.
Pergunta: nome da demanda (ação judicial) que a vitima ajuíza (propõe) contra a pessoa que habita a
unidade que partiu o projétil? OBS: denomina-se actio de effusis et dejectis a demanda proposta pela vítima
de um objeto lançado ou caído (o prazo prescricional, na forma do art. 206, par 3º, inc. V, do CC/22, será de
3 anos).
OBS: caso não se possa identificar a unidade habitacional de onde partiu o projétil, a demanda poderá ser
proposta, com base na teoria da causalidade alternativa, contra todo o condomínio, excluindo-se,
logicamente, os blocos ou fachadas de onde seria impossível o arremesso (RT 530/213).
16 – DANO MORAL
16.1 – HISTÓRICO:
Num primeiro momento, o dano moral não era passível de reparação jurídica, especialmente pela
dificuldade de se mensurar o preço da dor.
Lafayette Pereira e Jorge Americano, doutrina clássica no Brasil na época, diziam que seria uma idéia
extravagante a mensuração do dano moral. É este o entendimento que vigorou no Brasil no final do Séc. XIX
e início do Séc. XX.
Num segundo momento, o dano moral passou a ser considerado, desde que fosse reflexo de um dano
patrimonial sofrido. Neste segundo momento, portanto, não havia autonomia do dano moral. Ele só existiria
se correlato, condicionado a um dano material.
O CC/16, ao disciplinar o ato ilícito no seu art. 159, não proibiu o reconhecimento do dano moral. Mas,
infelizmente, o nosso sistema é positivista ainda (apesar da influencia dos princípios, que aumentou muito).
O CC/16 não proibia, mas também não era explícito quanto a possibilidade de haver dano moral.
Somente com a CR/88, em seu art. 5º, incisos V e X, que o dano moral passou a ser reconhecido e reparado
de forma autônoma.
127
O CC/02, diferentemente do anterior, ao definir ato ilícito em seu art. 186, explicitamente faz referencia ao
dano moral.
art. 186, CC: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
16.2 – CONCEITO:
Dano moral é lesão a direito da personalidade. Por isso é considerado um dano extra patrimonial.
OBS: vale lembrar que o tema dano moral e Pessoa Jurídica fora visto em parte geral.
Vale ler o noticiário do STJ de 13/09/2009 a respeito de parâmetros de quantificação do dano moral.
Doutrinariamente, a respeito da quantificação, existem dois sistemas básicos:
1º) o sistema livre ou aberto, defendido por autores como Carlos Alberto Bittar, Ronaldo Andrade e
amplamente consagrado em nossa jurisprudência: segundo este sistema, caberá ao juiz, na sentença
por arbitramento, fixar o valor indenizatório devido. Nessa linha de entendimento, seria
inconstitucional o arbitramento legal. É o sistema adotado no Brasil. Este sistema é aquele em que o
dano moral é quantificado por arbitramento com base no art. 4º da LICC, e no art. 126, CPC. Tem por
base a equidade. A crítica que se faz desse sistema é a de que hoje encontramos desequilíbrios
extremamente impactantes: situações em que o dano moral é supervalorizado e situações em que
ele é pormenorizado. Vale dizer que o não estabelecimento de critérios legais não impede a busca
doutrinária e jurisprudencial por critérios objetivos ou menos subjetivos.
OBS: A Súm. 362, STJ, recentemente publicada, reforça o sistema do arbitramento, ao dizer: “A
correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.
2º) Sistema tarifado, ou do tarifamento legal: Existe, ainda, um sistema diverso de quantificação do
dano moral denominado. Este sistema pretende o tabelamento da indenização devida por dano
moral na própria lei (ver no material de apoio, PL 7.124/2002, bem como o PLS 114/2008). Ests
projetos pretendem alterar o CC, dizendo, no que tange à indenização por dano moral, que fica
proibida qualquer indenização superior a R$20.000,00; já outros projetos pretendem um
tabelamento mais detalhado, classificando o dano em leve, médio ou grave. Crítica: a nossa CR/88
não estabeleceu esse tipo de parâmetro.
128
16.4 – NATUREZA JURÍDICA DO MORAL:
Atualmente, a doutrina brasileira (Salomão Resedá – A Função Social do Dano Moral), além da natureza
compensatória da vítima, tem reconhecido também a função pedagógica ou de desestimulo em face do
próprio réu. Esta segunda função punitiva, com reflexos em alguns julgados da jurisprudência do STJ (RESP
860705/DF, Resp 910.764/RJ), teoricamente é traduzida no que se convencionou chamar de Teoria do
desestimulo, oriunda do instituto do “punitive damages” do direito norte-americano.
Qual é a função da indenização em sede de responsabilidade civil? Haveria uma função social nisso? A
indenização fixada seria compensatória ou punitiva?
A responsabilidade civil e a indenização fixada não devem exercer apenas um efeito compensatório, mas
também pedagógica.
Esta teoria foi desenvolvida nos EUA, com o nome de “Teoria do Punitive Damage”, abraçada pelo En. 379,
da 4ª JDC, e já presente em alguns julgados (Resp. 860.705/DF), sustenta que a indenização por dano moral,
em respeito ao Princípio da Função Social, deve compensar a vítima e desestimular o lesante.
“O art. 944, caput, do CC não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da
responsabilidade civil”.
OBS: dada a ausência de norma legal específica, em sede de tutela individual, o caráter punitivo da
indenização por dano moral ainda não é amplamente abraçado pela jurisprudência. Todavia, além dos
julgados acima mencionados vale citar dois projetos de lei: 1) O projeto de reforma do CC, em sua redação
original, pretende assentar que a indenização deve compensar a vítima e “desestimular o lesante”; 2) Além
disso, o PL 2496/2007 pretende deixar claro que, na relação de consumo o juiz, ao fixar a indenização deve
estabelecer um valor compensatório da vítima e um valor punitivo. Por fim, lembremo-nos do enunciado
379 da 4ª jornada de Direito Civil, que reforça a função dúplice da indenização por dano moral.
No material de apoio, ver farta e atualizada jurisprudência, inclusive as novas súmulas sobre o tema, a
exemplo da 420, 402, 388, 387, 385 e 370.
Vale lembrar que a pretensão reparatória de responsabilidade civil prescreve em 3 ou 5 anos, na forma do
CC/02 ou do CDC, respectivamente.
129
16.7 – DANO MORAL E IMPOSTO DE RENDA
O STJ, recentemente, no Resp. 963.387 (de out./08) afastou a incidência de IR na indenização por dano
moral.
AULA: 08/06/2010
130
VII – TEORIA GERAL DOS CONTRATOS
1) HISTÓRICO
A par do importante desenvolvimento atribuído ao direito romano, observa Orlando Gomes que a teoria
clássica do contrato, em sua concepção moderna, só se explica a luz da ideologia típica dos regimes
capitalistas de produção.
Ao longo do sec. XX, fatores de ordem sócio econômica e política, mormente sob o influxo da técnica do
contrato por adesão (Raymond Saleilles), determinaram a reconstrução da teoria do contrato, na
perspectiva de um dirigismo contratual ditado por valores socialmente relevantes.
OBS: Georges Ribert na monumental obra “a regra moral nas obrigações civis”, traça um detido panorama
da evolução do contrato no sec. XX, observando inclusive a necessidade de se conter os abusos de poder
econômico derivados da autonomia privada nos contratos por adesão.
Não podemos fixar na linha do tempo uma data específica para o surgimento do contrato.
A sua função pacificadora nasceu com ele mesmo, porque o contrato visa conciliar interesses contrapostos.
Embora o contrato seja anterior ao Direito Romano, a Roma Clássica consagrou o tratamento jurídico do
contrato, denominado “contractus”.
Foi o Capitalismo, segundo Orlando Gomes, que desenvolveu a teoria clássica do contrato, calcada em dois
dogmas:
a) autonomia da vontade, e
O Séc. XX, marcado por duas grandes Guerras, causou um grande impacto na Teoria do Contrato, com o
surgimento do Estado Social, mitigando, relativizando os seus dogmas fundamentais. Durante o Séc. XX o
direito mudou. O Estado deixa de ser ausente e passa a ser intervencionista. O Estado passou a intervir, e
precisava aprimorar o seu instrumentário jurídico. O contrato passou, pois, do meramente individual para
totalmente social.
A Teoria do Contrato foi reconstruída com o objetivo de, sem aniquilar a autonomia da vontade, condicioná-
la a parâmetros constitucionais de ordem superior, a exemplo dos princípios da função social e da boa-fé
objetiva. Isso é o que se chama “Constitucionalização do Direito Civil”.
O contrato deixou de ser uma figura que manifestava de forma absoluta a autonomia da vontade, para ser
apenas uma oportunidade para a manifestação da vontade. Ele não pode ser um instrumento de opressão,
porque a manifestação da vontade e a autonomia privada não são mais absolutas, devendo respeitar uma
ordem social harmônica, ou seja, respeitar a sua função social.
131
O contrato não é um átomo que só interessa as duas partes. Ele tem uma repercussão social.
E o contrato de adesão? Seria ele tecnicamente um contrato? Onde fica a autonomia da vontade? Não seria
mais uma expressão de uma autoridade privada?
O contrato de adesão vem sendo muito utilizado atualmente. Ele é um mal necessário. E mesmo nele a
vontade ainda existe, mesmo que seja só para decidir se deve-se aderir ou não a ele.
O contrato de adesão, consagrado em 1901, por Raymond Saleilles, jurista francês, fruto da moderna
sociedade de massa, nos dá a exata medida da importância das novas bases da teoria do contrato que busca
elementos de contensão da autonomia privada.
2) CONCEITO
Trata-se de uma declaração negocial de vontade, emitida segundo o princípio da autonomia privada, pela
qual os contratantes perseguem efeitos jurídicos possíveis, em observância aos princípios da função social e
da boa-fé objetiva.
Trata-se de um negócio jurídico por meio do qual as partes, segundo a autonomia privada, convergem as
suas vontades, criando um dever jurídico principal de dar, fazer ou não fazer, e, bem assim, deveres
acessórios, em respeito aos princípios da função social e da boa fé objetiva.
O contrato é fonte de obrigação. Ele cria um dever jurídico principal. Ele é um negócio jurídico que constitui
um dever principal de dar, fazer ou não fazer. Mas esta é apenas uma concepção simplória.
O contrato não cria apenas esse dever principal. À luz do moderno Direito Civil, o contrato cria também
deveres anexos, que os portugueses chamavam de deveres de proteção (nebenpflicten, para os alemães).
Deveres que decorrem normativamente da boa fé objetiva.
Quanto à forma, nos termos do art. 107, CC, vigora o Princípio da liberdade da forma dos negócios em geral.
Para alguns casos, o Código exige determinada forma do contrato, para efeito de prova em juízo (forma ad
probationem); em outros casos, a lei exige determinada forma como requisito de validade, ou seja, como
solenidade, sob pena de nulidade. Nesse caso, fala-se que a forma é ad solemnitatem.
Existe um autor, considerado o pai do romance moderno, Honoré de Balzac, que tem um livro intitulado “O
contrato de casamento”.
No direito, há duas correntes básicas: a) a corrente de direito público, e b) a corrente de direito privado.
132
A corrente de direito público afirma que o casamento não é um instituto privado, sendo um ato
administrativo. Esta corrente não tem eco no direito moderno.
A corrente que prevalece é a corrente de direito privado, segundo a qual o casamento é um instituto
privado, embora regrado por normas de direito público. Aqui dentro existem duas sub-correntes: a corrente
não-contratualista e a corrente contratualista.
Os adeptos da corrente não-contratualista dizem que o casamento não é um contrato (ex.: Maria Helena
Diniz), usando como argumentos, por ex., o fato de o casamento ser uma instituição ou de ser um negócio
complexo com participação do juiz, ou, ainda, seguindo a posição de Leon Duguit, o de ser um ato-condição
(aquele que quando você o realiza, você é colocado numa situação impessoal, com normas que não se pode
mudar).
Mas é forte no Brasil a corrente contratualista, desde Clóvis Beviláqua, passando por Silvio Rodrigues e
Orlando Gomes. Segundo eles o casamento é um contrato especial de direito de família. Isso porque o
núcleo do casamento é o mesmo núcleo de todo e qualquer contrato, ou seja, o consentimento.
3) FORMAÇÃO DO CONTRATO
Para que o contrato se formar, a doutrina, na fase preliminar de discussões ou tratativas iniciais, reconheceu
uma importante etapa denominada de fase de puntuação ou punctação (Darcy Berssone). Fase de minuta do
contrato.
- Fase de puntuação: tratativas preliminares. A formação dos contratos pressupõe que em certo momento a
parte faz uma policitação.
- Policitação, Oferta e Proposta: a proposta deve chegar na esfera da outra parte. Ela é disciplinada a partir
do art. 427, CC, é uma declaração receptícia de vontade séria e vinculativa, com os temperamentos
admitidos (exceções) em lei (art. 427, segunda parte, e art. 428, CC). No CDC o tratamento é bem mais
rigoroso, por conta do caráter absoluto da vinculação da proposta (art. 35, CDC).
A proposta de contrato é a declaração de vontade feita pelo proponente ou policitante, dirigida ao aceitante
ou oblato, nos termos dos arts. 427 e seguintes do CC/02.
Art. 427: “A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da
natureza do negócio, ou das circunstancias do caso”.
A proposta de contrato nos termos do CC/02, em regra, obriga o proponente, mas, o próprio código, admite
situações em que a proposta deixa de ser obrigatória (no âmbito do CDC, a obrigatoriedade da proposta é
muito mais severa.
133
Obs.: Proposta entre presentes e proposta entre ausentes – para facilitar o entendimento das exceções
contidas no art. 428, CC, é preciso constatar que pessoas presentes são aquelas que estão em contato
direto, simultâneo (ex.: contratação por telefone, contratação por chat na internet). Por outro lado,
consideram-se ausentes as pessoas que não mantém contato direto, ou seja, existe lapso de tempo entre a
proposta e a aceitação (ex.: contratação por carta, contratação por e-mail).
OBS: Vale lembrar quanto a aceitação da proposta, que o art. 431 estabelece a sua descaracterização se a
referida aceitação ocorrer fora do prazo com adições ou modificações, pois em tal caso haverá nova
proposta. No que tange a esta matéria, existem duas teorias fundamentais: 1) teoria da cognição: segundo a
qual o contrato só se forma quando o proponente toma conhecimento da resposta (teoria em desuso). 2)
teoria da agnição: segundo a qual não se faz necessário que o proponente tome conhecimento da resposta.
Tal teoria se subdivide-se em três subteorias: a) declaração propriamente dita. B) expedição c) recepção.
O contrato vai se formar quando a parte 1 (proponente) faz a proposta, a parte 2 (oblato) recebe esta
proposta e resolve aceitá-la.
Questão: na contratação entre ausentes, especialmente por carta, em que momento se considera formado o
contrato?
Existem 2 sistemas doutrinários enfrentando esta matéria: o sistema da cognição e o sistema da agnição. O
sistema da cognição, pouco recomendável, exige que o proponente tome conhecimento da resposta (por
isso é pouco usual – é difícil provar quando foi que o proponente tome conhecimento da resposta). O
sistema da agnição, por sua vez, dispensa que o proponente tome conhecimento da resposta (não exige,
pois, que ele leia a aceitação). Esse sistema da agnição se subdivide em 3 teorias que têm uma base em
comum (todas dispensam que o proponente tome conhecimento da resposta). Ele se desdobra em:
- Teoria da declaração propriamente dita: para esta teoria o contrato se forma quando o aceitante
declara que aceitou. Também é uma teoria criticada, porque é difícil provar o momento em que ele
aceitou.
- Teoria da expedição: sustenta que o contrato se forma quando a resposta é expedida, enviada.
- Teoria da recepção: para esta terceira teoria, o contrato se forma quando a resposta é recebida
pelo proponente, ainda que não chegue ao seu conhecimento.
Parte da doutrina, desde Clóvis Beviláqua, adota a Teoria da expedição, amparando-se fundamentalmente
no art. 434, CC. Outra corrente doutrinária (Carlos Roberto Gonçalves) sustenta, interpretando
sistematicamente o art. 434 e 433, CC, que a melhor teoria é a da recepção (é o entendimento do prof.
também).
É mais lógica a conclusão da segunda corrente doutrinária, uma vez que, nos termos do art. 433, CC, o
contrato só se considera efetivamente formado quando o proponente recebe a resposta sem retratação
(Enunciado 173, 3ª JDC).
134
O contrato somente se forma quando a resposta é recebida pelo proponente sem retratação. Por isso, a
teoria que melhor explica o nosso direito e da recepção.
AULA: 11/06/2010
4) PRINCÍPIOS CONTRATUAIS
A primeira leitura da autonomia privada foi feita pela Escola Jusnaturalística com base no Direito Natural do
homem de dispor livremente das suas ações. Pietro Perlingieri lembra-nos de que a autonomia privada não
se limita ao campo contratual, aplicando-se a outras situações existenciais do homem. Na perspectiva
contratual, a autonomia privada reflete-se, à luz da livre iniciativa, na liberdade de contratar e na liberdade
contratual. Liberdade contratual significa liberdade no conteúdo do contrato, e a liberdade de contratar
significa a escolha da pessoa com quem se contrata. O contrato pressupõe que exista alguma liberdade no
conteúdo do contrato ou na escolha da pessoa com quem se contrata. Mesmo no contrato de adesão tem
de haver alguma liberdade (liberdade na aderência, liberdade de aderir ou não ao que foi proposto).
“Contrato sem liberdade é corpo sem alma”.
A autonomia privada, para evitar abuso de poder econômico, é relativizada, porque sofre a interferência de
elementos constitucionais de contenção, como os princípios da função social e da boa fé objetiva. Por isso,
pode-se dizer, que a autonomia privada, segundo afirmou a prof. Judith Martins-Costa, sofreu a limitação
por valores constitucionais superiores.
Este princípio traduz a regra geral de que um contrato só surte efeitos obrigacionais entre as próprias partes
contratantes. Isso significa, numa linguagem bem simples, que o contrato entre A e B não vincula C.
Este princípio, que não é tratado em artigo específico do CC/02 (diferentemente do Código da Espanha art.
1257 e do Código da França art. 1165), comporta algumas exceções: estipulação em favor de 3º (como
seguro de vida) e o contrato com pessoa a declarar:
1º) este contrato trata-se de uma promessa de prestação de fato de terceiro, que assumirá os
direitos e obrigações decorrentes do negócio caso aceite a indicação da cláusula pro amicu eligendo
(art. 467 do CC/02).
2º) também excepciona o princípio a figura jurídica do consumidor equiparado (Bystander) prevista
no art. 17 do CDC.
3º) Tutela externa do credito: deve-se essa expressão a doutrina do professor Antonio Junqueira de
Azevedo. Trata-se de um instituto jurídico que relativiza o princípio ora estudado, na medida em que
135
reconhece uma eficácia transsubjetiva na perspectiva da eticidade, para impedir indevidada
intervenção de 3º no contrato.
Há, no entanto, algumas figuras contratuais especiais que excepcionam a relatividade dos efeitos do
contrato, a exemplo da estipulação em favor de terceiro (ex.: seguro de vida) e o contrato com pessoa a
declarar. O contrato com pessoa a declarar traduz uma promessa de prestação de fato de terceiro que
assumirá os direitos e as obrigações do negócio, caso aceite a indicação realizada (art. 467, CC – um contrato
entre A e B repercutirá em C, se C aceitar). Não se confunde com a cessão de contrato, porque no caso do
contrato com pessoa a declarar, o próprio contrato já indica C para que, querendo, assuma os direitos e
obrigações decorrentes do contrato.
A doutrina moderna tem feito uma crítica muito grande a este princípio. A prof. Judith Martins-Costa
publicou um artigo sobre o caso Zeca Pagodinho a respeito do tema: no primeiro contrato firmado entre o
cantor e a Nova Schin deveria gerar efeitos apenas entre eles; posteriormente, o cantor celebrou novo
contrato com um terceiro. Hoje o contrato está para além do contrato. Este Princípio da relatividade não é
uma regra absoluta. Um contrato, numa perspectiva da eticidade, todo contrato tem uma dimensão trans-
subjetiva para impedir que terceiros possam interferir na relação (é o que Junqueira de Azevedo chama de
Tutela Externa do Crédito).
Este é o moderno Direito Civil, que respeita a autonomia privada, mas respeita parâmetros constitucionais.
Resumindo: na linha do pensamento da prof. Judith Martins-Costa, o Princípio da Relatividade dos Efeitos do
Contrato não é um dogma absoluto, uma vez que deve se reconhecer, invocando Junqueira de Azevedo
(USP), que todo contrato experimenta uma Tutela Externa do Crédito, ou seja, existe uma eficácia ética
trans-subjetiva visando a protegê-lo da interferência de terceiros (“Tort of induction” do Direito
Anglosaxônico).
O contrato vincula A e B e cria uma espécie de campo de força para impedir a ação de terceiros. Por isso é
que se diz que o contrato está para além do contrato.
a) Histórico: O gérmen mais longínquo da Teoria da Imprevisão está no Código de Hamurabi. Mas, a fonte
histórica mais relevante deste teoria foi a cláusula canônica do Rebus Sic Stantibus. A primeira lei no mundo
que disciplinou a Teoria da imprevisão foi uma lei francesa de 1918 (Lei Falliot), no fim da 1ª GM.
O Código de Amurabi, em sua lei 48, já trazia a noção da imprevisibilidade, entretanto, é a cláusula rebus sic
stantibus a fonte histórica mais importante da teoria. Segundo tal cláusula, um contrato deveria ser revisado
se houvesse mudança de situação ao longo da sua execução.
Durante muito tempo esta cláusula permaneceu esquecida, até a eclosão da 1ª guerra mundial (1914). Foi
na França, a partir da aprovação da lei Falliot de 1918 e do labor da jurisprudência francesa que a doutrina
da imprevisão, resgatando a antiga cláusula rebus siv stantibusi, se desenvolveu.
b) Conceito de teoria da imprevisão: trata-se de uma doutrina que admite a revisão ou a resolução do
contrato, caso acontecimento superveniente e imprevisível desequilibre a base econômica do contrato,
impondo a uma das partes obrigação excessivamente onerosa.
136
c) Elementos do conceito da Teoria da Imprevisão: para se justificar a aplicação da Teoria da imprevisão é
preciso demonstrar os seguintes 3 (três) elementos:
OBS1: para se configurar a Teoria da Imprevisão, é necessário que à onerosidade excessiva corresponda a
extrema vantagem da outra parte? Não. A extrema vantagem para a outra parte não é um quarto elemento.
Acompanhando a melhor doutrina (cita-se aqui Otávio Luiz Rodrigues Jr. e Ruy Rosado de Aguiar), este
elemento da extrema vantagem da outra parte não é obrigatório, não é absoluto, sendo apenas um
elemento acidental (En. 365, 4ª JDC).
Para se aplicar a teoria não é necessário se demonstrar a extrema vantagem da outra parte. Esta poderá
ocorrer ou não. Lembremos, por ex., da época do “apagão”, em que muitas empresas precisaram contratar
geradores, em razão de um acontecimento superveniente e imprevisível, aumentando seus custos, e as
pessoas não experimentaram vantagem nenhuma com isso.
A doutrina brasileira especializada (Ruy Rosado de Aguiar) e, na mesma linha, o enunciado 365 da 4ª JDC,
afirmam que a vantagem extrema da outra parte é uma circunstancia meramente acidental na configuração
da teoria.
Pergunta: Pablito, a perda do emprego ou redução significativa da renda do contratante pode caracterizar
teoria da imprevisão, ou até mesmo caracterizar teoria da onerosidade excessiva, no caso de consumidor,
podendo assim, desembocar na revisão ou na resolução do contrato afirmado?
Não se pode confundir lesão com teoria da imprevisão. A lesão, causa de invalidade do negócio jurídico (art.
157 do CC/02), nasce com o próprio contrato; já a teoria da imprevisão, que nada tem haver com invalidade,
pressupõe um contrato válido que se desequilibra depois.
Lembramos que também na lesão, que é um defeito do negócio jurídico, existe onerosidade excessiva. A
lesão nasce com o contrato, e é causa de invalidade do negócio jurídico. A teoria da imprevisão pressupõe
um contrato válido que, no curso de sua execução, em virtude de um acontecimento superveniente, se
desequilibra, impondo a uma das partes uma onerosidade excessiva; ela desemboca na revisão ou na
resolução. Podemos então dizer que a lesão nasce com o próprio contrato, desequilibrando-o, e é causa de
sua invalidade; diferentemente, a aplicação da teoria da imprevisão, pressupõe um contrato válido que se
desequilibra no curso da sua execução, justificando que seja revisado ou resolvido. Estas as diferenças entre
os dois institutos.
O CC brasileiro, em seus arts. 317 e 478 a 480, estabeleceu um regramento mais complexo de tratamento da
teoria da imprevisão.
- Disciplina pelo Código Civil: arts. 478 a 480 – obs.: a teoria da imprevisão do CC, para ser aplicada na
relação civil, não é fácil. O CC adotou a posição mais clássica e conservadora possível, nada facilitadora.
137
art. 478, CC: diz que o devedor pode pedir a resolução do contrato, não fala em revisão. Mas onde fica a
busca pela conservação do contrato?
O art. 479, CC tenta minimizar este radicalismo, numa redação muito estranha (o réu em geral é o credor, é
quem detém o poder econômico, e então, segundo o art., o juiz não poderia revisar o contrato, ficando na
dependência da vontade do réu).
É óbvio que à luz do Princípio da função social, e nos termos do En. 176 da 3ªJDC (que estabelece a revisão
do contrato como regra), é defensável a tese segundo a qual o juiz pode revisar o contrato
independentemente da vontade da outra parte (ele não está adstrito à vontade do réu). Reforça este
pensamento o art. 317, CC.
Este enunciado, 176 da 3ª LDC, com absoluta propriedade e a luz do próprio princípio da função social,
auxilia na interpretação adequada do art. 479, na medida em que carece de razoabilidade deixar ao capricho
do réu a revisão ou não do contrato.
- CDC: Art. 6º, V, 2ª parte – neste dispositivo é feita uma leitura facilitadora da Teoria em favor do
consumidor, dispensando-se inclusive o requisito da imprevisibilidade, razão porque a teoria é comumente
denominada de “Teoria da Onerosidade Excessiva”.
O tratamento dispensado pelo CDC a esta teoria (art. 6º inc., V) é mais facilitado, uma vez que, para o
consumidor obter a revisão do contrato, basta demonstrar que um acontecimento superveniente impôs
obrigação excessiva, independentemente de ser imprevisível.
A funcionalização do contrato, na esteira do que ocorrei com o direito de propriedade, é fenômeno que
deve ser entendido coma cautela necessária, na medida em que não poderemos com isso equivocadamente
concluir ter havido uma estatização da relação contratual.
Vale anotar, inicialmente, a diferença entre conceito aberto ou indeterminado e cláusula geral. O primeiro
traduz um conceito vago (Arruda Alvim) de dimensão fluídica a ser preenchido pelo juiz no caso concreto
(Ex: justa causa, risco, família). Já a cláusula geral, além de conter um conceito indeterminado, possui uma
carga normativa muito maior, na medida em que orienta e limita a própria atividade do juiz (Ex: a cláusula
geral da boa-fé objetiva).
Conceito de Cláusula Geral: como se trata de cláusula geral é muito difícil de conceituar, pois está sempre
em atualização: o princípio da função social do contrato traduz uma cláusula geral de natureza
principiológica limitativa da liberdade contratual, nas perspectivas extrínsecas e intrínseca, a teor do artigo
421 do CC/02.
Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.
138
Segundo o professor Paulo Roberto Nalin, a função social projetar-se-ia em dois níveis: intrínseco e
extrínseco do contrato.
No plano intrínseco, a função social se projeta para, em conexão com a boa-fé, impor a lealdade recíproca, e,
bem assim, a equivalência material das prestações (o justo equilíbrio do contrato). A doutrina (Flavio
Tartuce), com base na função social projetada no âmbito interno do contrato, sustenta que o juiz poderá até
mesmo de ofício reduzir o valor da cláusula penal.
Já no âmbito extrínseco, a função social equilibra o impacto do contrato em face da própria sociedade.
Contratos que, por exemplo, agridam direitos dos consumidores em geral ou até mesmo o meio ambiente
estão desrespeitando a função social em seu âmbito extrínseco.
No STJ, a moderna jurisprudência consagra amplamente o princípio da função social (ex: Resp. 476.649/SP e
Súmula 302 do STJ).
A socialização do contrato não significa, lembra-nos Giselda Hironaka, a sua estatização, ou seja, o contrato
atender a sua função social não significa suprir o interesse público do Estado (não significa atender o
interesse público dos entes federativos: U, E, DF e M).
O atendimento da função social significa sim respeito aos valores objetivamente consagrados como
fundamentais pela sociedade brasileira.
Respeitar a função social é respeitar por ex., o valor do meio ambiente, de defesa do consumidor, da
eticidade aplicada à relação contratual, etc. São esses valores que traduzem o que chamamos de Princípio da
Função Social.
Pergunta: qual é a diferença entre conceito aberto e cláusula geral? É uma diferenciação que no plano
eficacial não é simples de ser feita. Mas a prof. Judith Martins-Costa desenvolveu um trabalho
diferenciando-os. Segundo ela, conceito aberto consiste simplesmente naquele conceito de conteúdo
indeterminado ou fluídico, a ser preenchido no caso concreto, a exemplo da expressão “justa causa”. É o que
o prof. Arruda Alvim chama de “conceito vago”. Outros ex.: risco, família, etc. Ou seja, é um conceito de
conteúdo vago, fluídico, que de acordo com o Princípio da Operabilidade, será preenchido no caso concreto.
A cláusula geral, por sua vez, também compreende um conceito aberto, mas é um algo mais, porque traduz
uma disposição normativa, impositiva ao juiz, é uma regra que o juiz tem obrigação de observar na sua
atuação; ela impõe ao juiz uma conduta auto-responsabilizante. Ex.: boa fé objetiva, função social são muito
mais do que simples conceitos abertos, pois traduzem disposições normativas ao juiz. O juiz, ao interpretar o
contrato, tem a obrigação de fazê-lo à luz dos princípios da boa fé objetiva e da função social. Sua força
cogente é muito maior.
Assim, a cláusula geral, a par de compreender um conceito aberto, traduz uma disposição normativa
impositiva ao juiz, de modo a conferir-lhe um mandato, uma determinação, em sua aplicação ao caso
concreto. Ex.: a cláusula geral da boa fé objetiva e a cláusula geral da função social, que são ambos também
princípios. Estas chegam ao ponto de conduzir a interpretação no caso concreto.
Na prática, esta diagnose diferencial não é simples, mas nessa linha teórica de raciocínio, não há dúvidas de
que a função social do contrato pode ser conceituada como uma cláusula geral.
139
Assim, a função social do contrato é uma cláusula geral de natureza principiológica, amparada no art. 421,
CC, que tem função ou finalidade limitativa da autonomia privada, em respeito a valores
constitucionalmente consagrados.
Quando o art. 170, CR/88 estabeleceu que o nosso Estado Democrático de Direito pressupõe uma ordem
social harmônica, percebemos que ela aplicou o princípio da função social, seja da propriedade, seja dos
contratos.
A função social tem razão de ser na limitação na liberdade de contratar, na liberdade contratual, na
autonomia dos contratantes, já que não vivemos mais numa era de autonomia absoluta e sim numa era de
autonomia solidária.
Hoje no Brasil os contratantes não têm mais liberdade absoluta, eles encontram uma barreira constitucional
na função social do contrato.
Segundo Paula Nalin, o Princípio da função social se projetaria em dois níveis: em um nível extrínseco e em
um nível intrínseco.
A função social também se projeta no plano intrínseco, interno, entre os próprios contratantes, para impor
eticidade e equilíbrio contratual. No exercício da autonomia privada, os contratantes devem respeitar, entre
si, o equilíbrio e a eticidade. Ex.: cláusula penal, que o juiz pode reduzir de ofício se verificar que ela excede o
valor principal; os contratantes não podem no contrato estipular uma cláusula dizendo que nenhuma das
partes pode aplicar a teoria da imprevisão, isso seria uma cláusula abusiva, que vulnera o princípio da função
social.
Os contratos que violam o Princípio da função social são contratos nulos de pleno direito ( ☺P.U. do art.
2.035, CC). Há quem diga que há, neste caso, uma nulidade virtual, aquela que é tão grave que é projetada
independentemente do prejuízo.
→ O STJ e o Princípio da função social: o STJ hoje exerce um importante papel na aplicação deste princípio.
☺Resp. 476.649/SP – o STJ diminuiu uma multa de mensalidade escolar de 10% para 2%, com base neste
princípio e no art. 52, CDC.
Aplicar este princípio é ter o ônus da argumentação jurídica, segundo Robert Alexy. Ou seja, é preciso
argumentar adequadamente, não apenas lançar mão do princípio para rasgar o contrato.
Súm. 302, STJ: “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação
hospitalar do segurado”. É também uma aplicação do princípio no plano interno.
Outro ex. de projeção do princípio pelo STJ é a Súm. 308: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente
financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os
adquirentes do imóvel”. Esta súmula aplica o princípio da função social, limitando a autonomia privada. Ou
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seja, a hipoteca firmada entre a construtora e o banco, não pode recair sobre o imóvel do promitente
comprador (que já pagou ou que financiou o imóvel, não importa), ainda que este o permita ao assinar o
contrato (que é de adesão) porque isso afrontaria a função social, o direito à moradia, a dignidade da pessoa
humana, dentre outros princípios constitucionais. É uma cláusula presente em todos os contratos com
construtoras, mas é uma cláusula nula, e este entendimento foi sumulado.
A função social é a última trincheira para evitar este tipo de abuso. Aliás, a última não, a penúltima, já que
temos também o Princípio da boa-fé objetiva.
Quanto ao Princípio da boa fé objetiva, podemos encontrar uma primeira fonte história deste princípio no
Direito Romano, que ao tratar da idéia de bona fides, nos dá uma idéia de comportamento individual ético.
O Direito Romano foi absorvido e reconstruído pelo Direito Alemão. Assim, quem consagrou o que hoje nós
entendemos por boa-fé objetiva foi o Código Civil Alemão (BGB), em seu § 242.
Ele consagra uma expressão que em sua tradução literal não significa Princípio da boa-fé, mas na tradução
feita pela doutrina quer isso significar: “Treu und glauben”. Significaria semanticamente a noção de lealdade,
crença e confiança.
O devedor está obrigado a realizar a prestação de acordo com a boa-fé objetiva. Este dispositivo transforma
a boa-fé numa regra objetiva a ser seguida na relação negocial.
O direito brasileiro, tradicionalmente, só se preocupava com a boa fé subjetiva, que era individual (o nosso
direito sempre primou pela visão individualista).
A boa-fé objetiva, por sua vez, consiste em uma cláusula geral de natureza principiológica, regulada no art.
422, CC, de conteúdo ético e exigibilidade jurídica. A boa-fé objetiva não está dentro do agente, mas sim fora
dele. É uma regra objetiva de conduta.
☺art. 422, CC: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
A doutrina critica duramente este art., porque segundo este art., o princípio deve ser observado na
conclusão e na execução do contrato. Isso é verdade, o princípio deve sim ser observado na conclusão e na
execução do contrato. Mas, interpretando o art. 422, CC, a doutrina, a exemplo do prof. Antônio Junqueira
da USP, observa que a boa-fé deve ser observada também nas fases pré e pós-contratual.
Inclusive há julgados no sentido de que a ruptura do noivado (que precede o casamento, entendendo-se
este como contrato), pode gerar a quebra da boa-fé objetiva.
Lembra-nos o prof. Rogério Donini que a boa-fé objetiva deve ser observada também na fase pós-contratual,
ou seja, ainda que o contrato já esteja consumado. Por ex.: depois que um sócio se retira de uma sociedade,
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ao ser contratado por uma empresa concorrente, não pode utilizar-se de informações da outra, sob pena de
caracterizar quebra da relação contratual já consumada.
A maior obra em língua portuguesa sobre o tema é a de Antônio Menezes Cordeiro, da Ed. Almedina.
Baseando-nos neste autor, podemos destacar na boa-fé objetiva uma função interpretativa (a boa-fé orienta
a interpretação do contrato, do negócio jurídico, inclusive para suprir lacunas), e também tem uma função
constitutiva de deveres anexos. É esta a função que queremos ora destacar.
Os portugueses se referem a esses deveres como deveres de proteção. A expressão usada no Direito
Alemão, que desenvolveu a tese, é Nebenpflichten (que quer significar deveres colaterais). São, pois,
deveres que decorrem da boa-fé objetiva. Este princípio então normatiza deveres anexos colaterais a serem
observados em todo e qualquer contrato.
Segundo o Direito Civil, o contrato gera um dever jurídico principal de dar, de fazer e de não fazer. Veio o
Direito Constitucional e afirmou que além desses deveres de dar, fazer e não fazer, existem também deveres
implícitos, de conteúdo ético e exigibilidade jurídica, em todo contrato. Tais deveres decorrem do Princípio
da boa-fé. O contrato não precisa mencioná-los, são deveres implícitos. E esses deveres são tão jurídicos
quanto o dever principal de dar, fazer e não fazer. Ex.: dever de assistência, dever de sigilo e de
confidencialidade, dever de informação.
Pergunta: qual é a conseqüência jurídica do descumprimento dos deveres anexos de proteção decorrentes
da boa-fé objetiva? É a chamada violação positiva do contrato. Sua conseqüência é a responsabilidade civil
objetiva do infrator, segundo consagrou enunciado da 1ª JDC.
Assim, em face do conteúdo ético envolvido, o En. 24 da 1ª JDC firmou a idéia de que, em havendo
descumprimento de deveres de proteção (violação positiva do contrato), a conseqüência é a
responsabilidade objetiva do devedor. Ou seja, não se analisa culpa na quebra desses deveres.
Pergunta: o que são “figuras parcelares”, “funções reativas” ou “desdobramentos” da boa-fé objetiva?
São conceitos intimamente ligados à boa-fé objetiva. Há quem diga inclusive que se tratam de sub-princípios
da boa-fé objetiva.
- a “Cláusula de Stoppel”
- o “Tu quoque”
142
AULA: 13/06/2010
- Cláusula de Stoppel;
- Tu quoque
Também chamado de teoria de atos próprios. Para aprofundar obra de Adelmiro Resende.
A regra proibitiva do “venire” visa a impedir comportamento contraditório, ou seja, segundo Menezes
Cordeiro, visa a impedir que uma mesma pessoa ao longo do tempo adote comportamentos incompatíveis
violando os princípios da boa-fé e da confiança. Vide art. 330.
OBS: No material de apoio, temos farta jurisprudência sobre o tema, a exemplo do Resp. 95439/SP, Resp
605687/AM e Resp. 953389/SP).
OBS: vale lembrar, todavia, advertência feita por Adelmiro Resende, no sentido de não se aplicar a regra
proibitiva do “venire” se o segundo comportamento for justificado (este comportamento é uma questão de
hermenêutica).
OBS: No Direito Internacional, é comum a regra proibitiva do “venire”, nas relações entre os Estados,
receber a roupagem de cláusula de Stoppel.
- Tu quoque: expressão utilizada por Julio Cesar (Até tu Brutus!) – o instituto do tu quoque,
intimamente ligado aos princípios da boa-fé e da confiança, visa impedir o ineditismo na relação
jurídica em franco prejuízo a uma das partes. É uma defesa contra o comportamento surpresa.
OBS: a exceção de contrato não cumprido (exception non adimpleti cantractus), regulada nos arts.
476 e 477, consiste em uma defesa direta de mérito oposta pela parte que, colhida de surpresa (tu
quoque) tem a sua prestação exigida sem que a parte adversa houvesse previamente cumprido a sua
obrigação.
OBS: Se a primeira prestação for cumprida de forma defeituosa a exceção poderá ser oposta sob o
título de excepctio non rite admpleti contractus.
OBS: denomina-se cláusula solve et repete aquela que traduz uma exceção à defesa indireta de
mérito vista acima, uma vez que, caso estipulada, a parte cobrada deverá cumprir a sua prestação
mesmo que a parte adversa não haja previamente cumprido a sua. Ex: licitação: administração ao
143
paga, obrigacao de continuar cumprindo o contrato mesmo sem o pagamento do ente publico (por
até 90 dias).
Regras que aplicam o “venire” (exemplos): art. 330, CC, art. 180, CC,
No STJ, já existe aplicação do “venire” (Ag. Rg. no Resp. 396.489/PR, Resp. 95.539/SP).
Obs.: no direito internacional, o “venire” é consagrado por meio da denominada “Cláusula de Stoppel”.
Quando se quer dizer que o Estado não pode agir de forma contraditória, se diz que ele não pode violar esta
Cláusula de Stoppel.
Um último conceito importante a se destacar aqui é o “Tu quoque”. Este conceito, em verdade, é uma
partícula de uma frase muito famosa dita por Júlio César: “Tu quoque Brutus fili mii!”, que significa “Até tu
Brutus”.
Ele é um decorrente da boa-fé objetiva que visa a impedir que uma das partes na relação negocial
surpreenda a outra, colocando-a em situação injusta de desvantagem, e impede isso para que não haja
quebra de confiança. É um desdobramento do Princípio da boa-fé, e visa evitar o elemento surpresa. Ex.: a
exceptio non adimpleti contractus, ou seja, a exceção de contrato não cumprido.
Trata-se de uma defesa indireta de mérito que a parte demandada opõe justificando o seu direito de não
cumprir a prestação pactuada, enquanto o demandante não adimplir a sua obrigação.
art. 476, CC: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode
exigir o implemento da do outro”. Se o exigir, a parte exigida pode opor a exceção do contrato não
cumprido.
E se a parte que exige tiver cumprido a sua prestação de maneira defeituosa? Quando a primeira prestação é
cumprida de forma imperfeita, o réu (demandado) pode sim se defender alegando a exceção, mas esta
exceção tem um outro nome: exceptio non rite adimpleti contractus.
A cláusula Solve et repete ressalva a exceção de contrato não cumprido, uma vez que, se convencionada, o
contratante estará renunciando à defesa, podendo ser compelido a pagar, independentemente do
cumprimento da primeira prestação.
É uma cláusula muito comum na Lei 8.666/90, quando esta diz que o Estado pode suspender o pagamento e
o licitante tem obrigação de continuar o contrato por até 90 dias.
VÍCIO REDIBITÓRIO:
144
- Conceito: vício redibitório é o defeito oculto que diminui o valor da coisa ou prejudica a sua utilização, em
virtude de um contrato comutativo (contrato de prestações certas estabelecidas preço e coisa). OBS: vício
aparente não é redibitório.
Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou
defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.
Doação onerosa são as doações com encargo. Ex: Doação de uma fazenda com encargo de fazer uma capela
na vila.
OBS: não há previsibilidade na lei de possibilidade de vício redibitório em se tratando de hasta pública.
OBS: erro X vicio redibitório: o erro, vicio invalidante do negócio, é subjetivo, uma vez que se encontra
encerrado na dimensão psicológica do próprio agente; já o vício redibitório nada tem a ver com o
subjetivismo do agente, uma vez que é objetivo por se situar na própria coisa, oportunizando a propositura
de uma das ações edilícias (redibitória ou quanti minoris)
Não confundir erro e vício redibitório! O erro é um vício psicológico que atua na vontade do declarante,
invalidando o negócio; diferentemente, o vício redibitório é exterior à vontade do agente, incidindo na coisa
e desafiando as ações edilícias (Arts. 442 e 443), em favor do adquirente.
As ações edilícias são previstas em alternatividade. Isso significa que a pessoa propõe uma ação ou outra.
Não se pode cumular pedidos porque a incompatibilidade é lógica. Ou se propõe a ação redibitória, ou se
propõe a ação quanti minoris (estimatória).
A ação redibitória pretende o desfazimento do contrato e a restituição do preço. Na ação quanti minoris, o
adquirente fica com a coisa defeituosa, mas pede um desconto no preço. Cabre responsabilidade civil
(perdas e danos) em favor do comprador? Se o vendedor sabia do defeito ele deve pagar perdas e danos.
À luz do Princípio da boa-fé objetiva e do dever de informação, nos termos do art. 443, se o alienante
conhecia o vício ou defeito deverá indenizar.
OBS: o sistema de garantia do adquirente da coisa com vício de qualidade, no CDC, é mais amplo e benéfico,
valendo lembrar que, na relação de consumo, os prazos legais de garantia (por vício ou redibitório), a teor do
artigo 26 do CDC, é de 30 ou 90 dias. Já no âmbito do CC/02, em havendo vicio redibitório, o adquirente
deverá propor a ação redibitória ou a ação quanti minoris (ação estimatória) – arts 442 e 443.
Pergunta: O alienante, em alguns casos, tem que obrigatoriamente saber do defeito oculto, como no caso,
por exemplo, de um carro usado, que logo após a sua alienação, apresenta defeito? Neste caso seria vício
redibitório? Este defeito pode decorrer do carro ser usado e não do defeito oculto, muitas vezes
desconhecido pelo antigo dono?
R: Vide art. 443. Alienante sabia: devolve preço + perdas e danos / Alienante não sabia: preço + despesas do
contrato. Este artigo procura punir a má-fé. OBS: nos termos desta artigo, se o alienante não sabia do
defeito, dissolvido o contrato, apenas restituíra o preço e as despesas correspondentes; mas, se, atuando de
má-fé, sabia do defeito, restituíra o preço + perdas e danos. Nessa linha é razoável o entendimento no
sentido de se pleitear maior abatimento em sede de ação quanti minoris.
145
Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e
danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato.
- Questão: quais são os prazos de garantia para a propositura das ações edilícias?
Tais prazos decadenciais, para propositura da ação redibitória ou quanti minoris estão previstos no art. 445
do CC (necessário memorização)
O prazo não é prescricional. São prazos decadenciais. O prazo é decadencial, eis que trata-se de direitos
potestativos. O prazo é de 30 dias se a coisa for móvel e de 1 ano se o bem for imóvel, contado da entrega
efetiva. Se o adquirente já estava na posse, o Código afirma que o prazo conta-se da alienação, reduzido à
metade.
Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de
trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava
na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.
§ 1º Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do
momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de
bens móveis; e de um ano, para os imóveis.
§ 2º Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos serão os estabelecidos
em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais, aplicando-se o disposto no parágrafo
antecedente se não houver regras disciplinando a matéria .
Os prazos caem pela metade se estiver na posse pois o adquirente já conhecia o bem. Ex: Pablo alugou
imóvel de Fred, Pablo esta no imóvel há 6 meses. Pablo adquire o imóvel de B. O prazo para ação edilícia
reduz a metade.
Esta segunda parte do art. 445, caput, CC, merece crítica quando estabelece perda de metade do prazo se o
adquirente já estava na posse do bem. Seria mais recomendável que se referisse à posse em tempo
razoável, para evitar interpretação no sentido de que um ou dois dias de posse resultasse em perda tão
considerável. Em uma hermenêutica razoável, em face da segunda parte do art. em tela, aponta no sentido
de que a perda da metade do prazo somente haverá se o adquirente estivesse na posse da coisa por tempo
razoável.
Pergunta: este entendimento, esta hermenêutica de prazo razoável na posse já é aceita pela jurisprudência?
(Pesquisar).
Obs.: No CDC, o tratamento dos prazos decadenciais de 30 ou 90 dias é feita pelo art. 26. é o prazo para vício
de qualidade.
É importante lembrar que o art. 27, CDC trata do prazo prescricional de 5 anos para reclamar pelo fato do
produto ou serviço (acidente de consumo).
Pergunta: O que ocorre com o prazo legal no caso de prazo convencionado? O prazo correr junto, ou o
prazo de garantia convencional tem que acabar para iniciar o legal?
R: o CDC não resolve o problema e não diz uma vírgula sobre isto.
146
OBS: o art. 446 de possível aplicação supletiva na relação de consumo, estabelece que o prazo legal não
corre na Constancia da garantia contratual; mas, em respeito à boa-fé objetiva, surgindo o defeito, o
adquirente deverá comunicar em 30 dias sob pena de perder a proteção legal.
Durante o tempo em que corre o prazo decadencial legal para reclamar por vício, um eventual prazo
decadencial convencional teria o condão de paralisá-lo? Nos termos do art. 446, para favorecer o adquirente
ou consumidor, enquanto corre prazo decadencial convencional de garantia, os prazos legais estão
paralisados. Todavia, o adquirente ou consumidor, à luz da boa-fé, surgindo o defeito, deve comunicá-lo, sob
pena de perder o seu direito.
Art. 446, CC: Não correrão os prazos do artigo antecedente na constância de cláusula de garantia;
mas o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu
descobrimento, sob pena de decadência.
Vide julgado sobre este assunto a seguir. Para o professor é uma decisão polêmica: vale anotar em conclusão
que o STJ julgando o Ag Rj no Resp. 639193/DF admitiu que a CEF, mero agente de financiamento da casa
própria, fosse ré em ação redibitória promovida pelo mutuário.
6) EVICÇÃO
CONCEITO: a evicção traduz a perda da posse e propriedade da coisa alienada, em virtude de um ato judicial
e administrativo que reconhece direito anterior de outrem.
A previsão legal da evicção, a partir do art. 447, CC, traduz uma garantia típica dos contratos onerosos,
translativos da posse e da propriedade, operando-se quando o adquirente vem a perder a coisa alienada, em
virtude do reconhecimento judicial ou administrativo do direito anterior de outrem.
A evicção vai se configurar quando 3 figuras se encontrarem: o alienante, o adquirente que perde a coisa
que lhe foi transferida (chamado evicto), e o terceiro que reivindica a coisa (evictor).
- alienante:
O evicto perde a coisa para o terceiro (evictor) e busca do alienante o ressarcimento pelos seus danos em
uma denunciação à lide.
Art. 447, CC: “Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia
ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública”.
Questão: Se a aquisição se deu em hasta pública (leilão – móvel / praça – imóvel), quem responderá pelo
risco da evicção?
147
Ex: Bradesco (credor do executado) X Freddie (devedor executado) bem arrematado em hasta pública por
Pablo terceiro reivindicado.
OBS: em caso de a evicção se operar em face de bem arrematado em hasta pública, é razoável o
entendimento de que o devedor executado responderá pela evicção operada, e, se for insolvente a
responsabilidade recairia no próprio credor exeqüente, por haver recebido indevidamente o preço pago.
Em primeiro plano, o devedor executado responde pelo risco da evicção em hasta pública, havendo o
entendimento na doutrina no sentido de, responsabilizar o credor do executado caso o devedor executado
seja insolvente.
Obs.: há, porém, uma doutrina ainda mais radical e ousada – Araken de Assis, a partir do pensamento de
Castro Villar, e na mesma linha Fred Didier Jr., entendem que o Estado poderá responder também pela
evicção.
O professor não concorda, todavia, com respeitável doutrina que visualiza, em último plano a
responsabilidade do próprio Estado por haver permitido a hasta pública (Arakin de Assis, Castro Villar e Fred
Didier Jr.). O prof. não concorda com este posicionamento, pois não visualiza causalidade imputada ao
Estado. Segundo ele seria um superdimensionamento, já que não há norma específica no sistema brasileiro
que permita tal responsabilização.
Pergunta: que direitos cabem ao adquirente evicto? Que direitos assistem ao evicto?
A adquiriu um apartamento e perdeu por evicção. Que direitos você tem contra o alienante?
Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além da restituição integral do preço
ou das quantias que pagou:
II - à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que diretamente resultarem da
evicção;
Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do valor da coisa, na época em que se
evenceu, e proporcional ao desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.
A garantia da evicção, nos termos do art. 448, CC, pode ser reforçada diminuída ou excluída.
Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade
pela evicção.
O Código Civil brasileiro, em seu art. 448, admite que a garantia da evicção pode ser reforçada, diminuída ou
até mesmo excluída.
Pergunta: não seria semelhante a uma cláusula de não indenizar, abusiva em caso de relação de consumo?
148
A exclusão da garantia da evicção que, em nosso sentir (na relação de consumo é abusiva), na relação civil
em geral é admitida em dois níveis:
Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou
litigiosa.
Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a evicção, se esta se der, tem
direito o evicto a receber o preço que pagou pela coisa evicta, se não soube do risco da
evicção, ou, dele informado, não o assumiu.
Questão: Qual é o tratamento jurídico dado à cláusula que exclui a garantia da evicção?
A exclusão da garantia da evicção pode ser de duas ordens: legal ou convencional. A exclusão legal não deixa
muitas margens a dúvidas - Art. 457, CC (“Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a
coisa era alheia ou litigiosa” – a própria lei exclui a garantia).
A garantia da evicção poderá também ser excluída convencionalmente, mas o art. 449 que estabelece alguns
temperamentos visando a mitigar o rigor da norma.
Crítica: Não basta no contrato constar a cláusula que exclui a garantia da evicção, uma vez que se esta se
der, o evicto terá pelo menos direito de receber de volta o que pagou. No entanto, caso, além da cláusula
constar a referência de que o risco foi assumido, não haverá direito a nada.
7) ARRAS
a) confirmatórias; ou
b) penitenciais.
Conceito: trata-se de uma disposição convencional pela qual uma das partes entrega
à outra bem móvel (em geral dinheiro) em garantia da obrigação pactuada.
→ Arras confirmatórias:
149
As arras confirmatórias, quando prestadas, marcam o início da execução do contrato,
firmando a obrigação pactuada, de maneira a não permitir direito de arrependimento.
“Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a título de
arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução,
ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da
principal”.
“Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por
desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá
quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o
equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, juros e honorários de advogado”.
Quem recebe as arras se não cumpre a obrigação, devolve as arras mais a parte
equivalente.
Obs.: e se o prejuízo da parte inocente for superior ao valor do sinal dado, haveria
direito à indenização suplementar? Sim.
150
Assim, o CC admite sim a indenização suplementar, valendo as arras como taxa
mínima.
→ Arras penitenciais:
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8) EXTINÇÃO DO CONTRATO
- por resolução
- resilição
- rescisão
8.1) RESOLUÇÃO
A resolução traduz forma de dissolução contratual em caso de inadimplemento (art. 474 e 475 do CC/02).
Art. 474, CC: A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação
judicial.
Art. 475: A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir
exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.
Havendo cláusula resolutiva expressa, a resolução do contrato opera-se de forma automática, razão pela
qual a sua estipulação é de grande utilidade processual.
Obs.: a cláusula resolutiva expressa, nos termos do art. 474, CC, quando prevista é de grande utilidade e
economicidade, uma vez que, em caso de inadimplemento, a resolução é automática.
Quando se prevê no contrato esta cláusula resolutiva expressa, a grande vantagem é que, em havendo
inadimplemento, a resolução do contrato é automática, ou seja, independe de interpelação judicial, não
precisa sequer comunicar a outra parte.
Quando a cláusula não é prevista, a parte credora tem de interpelar o inadimplente, comunicando-o que o
contrato será resolvido.
Obs.: nos contratos com consumidor (ex.: contrato de seguro), ainda que prevista a cláusula resolutiva
expressa, por conta da sua vulnerabilidade, é recomendável a comunicação da dissolução do contrato, para
evitar argüição de invalidade. Ou seja, esta regra pode receber abrandamentos na seara do consumidor.
8.2) RESCISÃO
A palavra rescisão costumeiramente é usada no mesmo sentido de resolução, mas, vale observar, que a
doutrina clássica, a exemplo de Serpa Lopes e Orlando Gomes, amparada na doutrina de Francesco
Messineo, sustentava que o termo rescisão tecnicamente significaria invalidação de um contrato viciado
pela lesão (vicio do NJ).
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A palavra “rescisão”, no direito brasileiro, pode ter 2 sentidos, a depender da doutrina perfilhada.
Num sentido clássico, tradicional no Brasil, por influência do jurista italiano Francesco Messineo, Orlando
Gomes e Serpa Lopes, dentre outros, entendem que rescisão tem o sentido específico de invalidação do
contrato por lesão (e alguns autores até a estendem para o estado de perigo). O contrato com lesão então
poderia ser rescindido, invalidado. Mas não é comum utilizá-la neste sentido (quando há lesão se fala em
nulidade do contrato e não em rescisão).
Há, porém, um entendimento no Brasil de que a palavra rescisão pode ser empregada no mesmo sentido de
resolução. É como a palavra é utilizada geralmente.
8.3) RESILIÇÃO
A resilição, que tanto pode ser bilateral (art. 472) como unilateral (art. 473), traduz, quando possível,
especialmente nos contratos de atividade (como a prestação de serviço), a dissolução do contrato por
simples manifestação de vontade.
Na resilição, o desfazimento do contrato opera-se por simples manifestação de vontade, mediante denúncia,
independentemente de inadimplemento contratual.
A denúncia é o ato jurídico que opera a resilição unilateral. Quando se exerce o direito de resilição unilateral,
está se denunciando o contrato.
A resilição bilateral está no art. 472, CC, e a unilateral está no art. 473, CC.
Art. 472. O distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato.
Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera
mediante denúncia notificada à outra parte.
Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos
consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido
prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos.
153
VIII – DIREITOS REAIS
1) INTRODUÇÃO
Até o início do séc. XX, preferia-se a expressão “Direito das coisas”. Hodiernamente, a expressão mais
utilizada é Direitos reais.
Conceito: Os direitos reais ou direito das coisas traduzem o conjunto de normas reguladoras das relações
jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem, segundo uma finalidade social.
A relação real é vertical. O direito das coisas disciplina direitos que decorrem da relação real: servidão,
direito de superfície, etc.
O prof. Arruda Alvim aponta importantes características da relação real (dos direitos reais), exemplos:
(complementar o estudo com a apostila do material de apoio)
- legalidade ou tipicidade: os direitos reais estão na lei, não se pode criar direitos reais pros
contratos;
- publicidade: os direitos reais são públicos, mormente os imóveis, para os quais há um sistema de
registro;
2) POSSE:
Existem outras, mas estas são as mais importantes, pois servem de raiz para o estudo da posse.
Essas duas teorias têm base no direito romano. Sua base é, pois, a mesma. Assim, em alguns pontos elas se
tocam.
O direito alemão absorve o direito romano no final do séc. XIX, e os alemães se tornam os grandes teóricos
do direito.
154
Para Savigny a posse consistiria no poder exercido sobre a coisa, com a intenção de tê-la para si. Para tanto,
Savigny decompôs a posse em dois elementos: Animus (a intenção de ter a coisa para si) e corpus (o poder
material ou físico pela coisa).
A sua idéia era lógica e simples: ele entendia que a posse era decomposta em dois elementos – corpus e
animus. Vale dizer, só haveria posse quando estes dois elementos estivessem unidos. Corpus seria o poder
material, o contato sobre a coisa, e o animus a intenção de tê-la para si.
A segunda teoria, teoria objetiva de Ihering, para esta segunda teoria não exigiria a decomposição em dois
elementos. Objetivamente, se o sujeito exerce poderes de proprietário, comportando-se como se assim o
fosse e imprimindo destinação econômica à coisa, será considerado possuidor. Ou seja, não é necessário
provar que houve corpus e animus. O comportamento do possuidor, exercendo poderes de proprietário já
serve para chegarmos à noção objetiva de posse.
Assim:
Para Savigny, o conceito de posse seria decomposto em animus (a intenção de ter a coisa para si) e corpus (a
apreensão física da coisa). Ihering, por sua vez, de maneira mais objetiva, afirma que o corpus pode ser um
elemento implícito, de maneira que a posse seria apenas a exteriorização da propriedade, ou seja, possuidor
seria aquele que objetivamente se comportasse como um proprietário.
Segundo a prof. Mariana Santiago, a Teoria de Savigny influenciou especialmente França, Portugal, Itália e
Espanha. Já a Teoria de Ihering influenciou especialmente Alemanha, Suíça, China e México.
O nosso CC, após a reconstrução dessas Teorias pela doutrina sociológica, não adotou nem uma teoria e
nem outra, especificamente, apesar da base principal do nosso código ser a teoria de Ihering.
O CC brasileiro, em seu art. 1.196, abraça a teoria objetiva de Ihering reconstruída com base no Princípio da
Função Social. Ou seja, ela não é pura, mas recebe uma influencia sociológica.
OBS: Analisando o art. 1.196 do CC/02, em cotejo com nosso sistema constitucional, podemos concluir que a
matriz do direito brasileiro adota a teoria objetiva de Ihering reconstruída na perspectiva sociológica
(Saleilles/Hernades Gil), em face da necessária incidência do princípio da função social.
Art. 1.196, CC: Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de
algum dos poderes inerentes à propriedade.
Obs.: a doutrina de Savigny, posto sem influência tão profunda como a de Ihering em nosso código, interfere
em alguns importantes pontos, a exemplo da exigência do animus domini para usucapião da propriedade.
Segundo o professor Moreira Alves, em seu monumental tratado da posse, a quem diga que a posse seria
um direito real (na linha de pensamento de Ihering e Teixeira de Freitas), a quem diga ainda que a posse
seria ao mesmo tempo fato e direito (Savigny), mas melhor é o entendimento no sentido de que a posse é
uma situação de fato protegida pelo ordenamento e constitutiva de direitos reais.
155
Segundo o Min. Moreira Alves, em seu “Tratado dedicado à posse”, publicado pela Ed. Forense, haveria
basicamente duas correntes:
A) a primeira afirma que a posse seria um direito, um direito em si (direito subjetivo, direito real);
Ihering defendia este pensamento;
B) a segunda teoria afirma que a posse é um fato tutelado pelo Direito (Ordenamento Jurídico).
Essas são as teorias básicas, mas Savigny segue uma terceira linha, segundo a qual posse seria fato + direito.
Quanto à posse ler os arts. do CC/02, especialmente o 1205 (quem pode adquirir posse) e 1223 (modos de
perda da posse).
Perguntas:
- Qual é a diferença entre jus possidendi e jus possessionis? R: jus posidendi consiste no direito à posse
derivada de um título. Já o jus possessionis, por sua vez, caracteriza o direito resultante do exercício da
posse.
- O que é posse de direitos? R: na linha do direito alemão (par. 90 do ???BQB???) Menezes Cordeiro na
Monumental obra “A Posse: Perspectivas Dogmáticas Atuais” afirma que a posse só surge no âmbito das
coisas corpóreas, podendo ser aplicada em outras áreas apenas em situações excepcionais (no Brasil, é
exemplo da excepcional situação da posse de um direito o enunciado da súmula 193 do STJ.
- Fâmulo da posse: também chamado de servo ou gestor da posse, trata-se do mero detentor da coisa,
aquele que conserva a posse em nome de outrem ( ☺art. 1.198, CC). Obs.: há no STJ entendimento no
sentido de que ocupação de área pública é mera detenção ( ☺Resp. 489.732/DF).
- Constituto possessório: ele vem, em geral, corporificado na chamada “cláusula constituti”. Trata-se da
operação jurídica que altera a titularidade da posse, de maneira que aquele que possuía em nome próprio
passa a possuir em nome alheio.
- Traditio brevi manu: é o contrário do constituto possessório, ou seja, opera-se quando aquele que possuía
em nome alheio passa a possuir em nome próprio.
- Patrimônio de afetação: é questão que toca ao tema da alienação fiduciária. Segundo o prof. Hercules
Aghiarian, este “sistema de direito real de garantia” vincula um conjunto de bens ao empreendimento
realizado pelo incorporador, visando a garantir maior segurança jurídica de possuidores e proprietários no
mercado imobiliário (a lei que disciplinou o patrimônio de afetação no Brasil foi a Lei 10.931/04).
156
2.4) POSSE DE DIREITOS:
Nos tempos de Ruy Barbosa, a tese era defendida por conta da ausência de previsão do mandado de
segurança. Como não existia o MS, ou o advogado utilizava-se do HC, ou lançava Mao de uma tese arrojada,
afirmando que o sujeito era possuidor do direito (ex.: do direito de ser matriculado na escola – e ai então se
faria uma reintegração na posse do direito de ser matriculado).
Menezes Cordeiro, em sua obra “A Posse: perspectivas dogmáticas atuais”, corretamente, afirma que a
posse só surge no domínio das coisas corpóreas, podendo ser aplicada em outros campos apenas em
situações justificáveis.
Na mesma linha, o código alemão diz que só os objetos corpóreos são coisas no sentido jurídico.
Obs.: podemos apontar uma situação excepcional de posse de direitos na Súm. 193, STJ: “O direito de uso de
linha telefônica pode ser adquirido por usucapião”.
Quanto ao exercício, a posse pode ser direta ou indireta. ☺art. 1.197, CC.
Posse direta é aquela em que o possuidor tem contato material com a coisa; já na indireta, o possuidor,
embora materialmente afastado da coisa, exerce poderes de proprietário (ex.: o locatário é o possuidor
direto, o locador é o possuidor indireto).
Obs.: o que é composse? A composse traduz o exercício simultâneo da posse, podendo ser pro diviso ou pro
indiviso. Ou seja, ela existe quando mais de uma pessoa titulariza a posse sobre a mesma coisa. Se os
possuidores pretenderem dividir a posse entre eles, para melhor utilizar as áreas, a composse será pro
diviso; se eles não fizerem esta divisão, de maneira que todos possuam indiferentemente toda a área, a
composse será pro indiviso. ☺art. 1.199, CC.
Nos termos do art. 1.200, CC, a posse pode ser justa ou injusta.
É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária, e é injusta a posse que derivar de violência,
clandestinidade ou precariedade.
A posse que se exerce a partir do momento em que cessa a violência, a posse que dela derivou é ainda posse
injusta. E, ainda que passado ano e dia, a posse continua sendo injusta. Esse prazo de ano e dia é apenas
157
para se verificar se a posse é nova ou velha, para efeitos de direito à liminar na possessória, e não tem nada
a ver com a posse ser justa, não transforma a posse injusta em posse justa. O direito à liminar só existirá se a
agressão à posse datar de menos de ano e dia.
Obs.: qual é a diferença entre a posse precária lícita e a precariedade como vício da posse?
A concessão de uma posse precária, a título de favor é perfeitamente lícita, a exemplo do que se dá no
comodato; no entanto, no momento em que, reclamada a devolução da coisa, o possuidor em quebra de
confiança recusar-se a efetivá-la, atuando como se ele fosse o proprietário (interversão da posse), surge o
vício da precariedade exercendo-se a partir dali posse injusta. ☺En. 237, 3ª JDC – no momento em que o
sujeito se recusar a devolver a coisa, ele passa a ter o direito de usucapir o bem.
Obs.: Nos inventários, o herdeiro que esteja possuindo imóvel a título de favor, quando notificado a devolvê-
lo, caso não o faça, passa a exercer posse injusta, podendo até mesmo usucapir o bem.
A posse é de boa-fé quando o possuidor ignora o vício que macula a sua posse (haverá em seu favor
presunção relativa de boa-fé caso detenha justo título); já o possuidor de má-fé tem ciência do vício que
macula a sua posse.
“É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa”.
Tradicionalmente, a doutrina brasileira costumava apontar que justo título seria o título hábil à transferência
da posse e da propriedade, embora portador de vício. Ex.: um formal de partilha viciado, uma escritura
pública registrada viciada, etc.
Em uma perspectiva social da posse, nos termos do En. 303, da 4ª JDC, não se deve dar intelecção formal ao
conceito de justo título, reclamando a análise do caso concreto (até mesmo um recibo poderia caracterizar
justo título).
Questão: toda posse injusta obrigatoriamente é de má-fé? Pode haver posse justa de má-fé?
Em geral, a posse justa é também de boa-fé. Mas há casos em uma posse injusta é de boa-fé e em que a
posse justa é de má-fé. Esses dois critérios partem de premissas diferenciadas. Uma análise é objetiva, outra
é subjetiva, psicológica.
Excepcionalmente, pois, podemos ter posse injusta e de boa-fé, como também podemos ter uma posse justa
e de má-fé.
“Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida”.
158
Ex.: (A) violentamente ocupou uma fazenda alheia e seu neto, de boa-fé, recebe por herança esta posse. A
posse continua sendo injusta, mas o herdeiro está de boa-fé.
Ex.: contrato de locação celebrado entre o locador e o inquilino locatário; é caso de posse justa (não
violenta, não clandestina e não precária). Mas o inquilino está no imóvel com intenção de usucapi-lo. Esta
posse é justa mas é de má-fé.
O jus possidendi é o direito à posse, derivada de um título (ex.: posse que deriva do título da propriedade –
escritura pública). O jus possessionis, por sua vez, é o direito de posse, independentemente de título,
permitindo inclusive proteção possessória (decorre do fato da posse).
No CC quem pode adquirir a posse (art. 1.205) e os modos de perda da posse (art. 1.223).
Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem, ao
qual se refere o art. 1.196.
Fruto é uma utilidade renovável que a coisa principal gera e cuja percepção não diminui a sua substância
(frutas, vaca, bens manufaturados por uma fábrica, aluguel, juro, etc.). Todavia, os produtos são utilidades
que não se renovam, cuja percepção diminui a substância da coisa principal, ou seja, ele se esgota (ex.:
petróleo, ouro, etc.).
As regras no que tange aos frutos estão previstas explicitamente nos arts. 1.214 a 1.216, CC:
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de
deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com
antecipação.
Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis
reputam-se percebidos dia por dia.
Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que,
por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas
da produção e custeio.
159
No que tange aos produtos, existem duas linhas de raciocínio (hermenêutica): uma mais literal – o CC diz que
o produto pertence ao proprietário, assim, o possuidor deverá restituí-los ao verdadeiro proprietário, esteja
ou não de boa-fé (☺art. 1.232) – e uma outra linha, numa perspectiva sócio-econômica da posse, que
privilegia mais a eticidade, em respeito à boa-fé do possuidor, este não poderá ser constrangido a restituir os
produtos extraídos até o dia em que tomou ciência do vício que macula a sua posse.
B) Benfeitorias realizadas:
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como,
quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e
poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o
direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
O possuidor de má-fé, pelas benfeitorias necessárias, não tem direito, pois, de retenção.
Obs.: o art. 35, da Lei de Inquilinato (Lei 8.245/91), ao regular benfeitorias, estabelece a possibilidade de o
próprio contrato trazer regramento específico, inclusive cláusula de renúncia, afastando as normas legais:
“Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário,
ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis (...)”.
Súm. 335, STJ (de 2007) – estabelece que nos contratos de locação é válida a cláusula de renúncia à
indenização das benfeitorias e ao direito de retenção.
Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa.
Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo
se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.
Nos termos do art. 1.217, o possuidor de boa-fé somente responderá pela perda ou deterioração da coisa
quando houver atuado com culpa ou dolo. Dar causa significa atuar com culpa ou dolo.
O possuidor de má-fé responde pela perda ou deterioração da coisa, quer tenha atuado com culpa, com dolo
ou até mesmo com força maior, salvo se provar que de igual modo se teriam dado estando a coisa na posse
do proprietário.
No caso deste art. 1.218, há quem afirme, inclusive, que a responsabilidade do possuidor de má-fé é
objetiva.
160
D) Usucapião:
3) PROPRIEDADE:
3.1) CONCEITO:
Trata-se de um direito real complexo, definido no art. 1.228, CC, e compreensivo das faculdades reais de
usar, gozar e fruir, dispor e reivindicar a coisa, segundo a sua função social.
Quando reunidos todos esses poderes, temos a propriedade plena. Mas nada impede que se retire algumas
dessas faculdades para se formar um outro direito de propriedade (ex.: usufruto, servidão, uso, etc.).
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do
poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas
e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem
como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam
animados pela intenção de prejudicar outrem.
§ 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou
utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.
§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa
área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas,
e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo
juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago
o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Obs.: §2º – ato abusivo: na verdade foi um equívoco do legislador esta exigência de prova da intenção de
prejudicar. Vale mencionar que este dispositivo, ao disciplinar o abuso da propriedade (ato emulativo),
afastando-se da adequada diretriz do art. 187, exige a demonstração de dolo específico no cometimento do
abuso. O abuso do direito ocorre, na verdade, quando o seu titular desvirtua seu uso.
161
3.2) CARACTERÍSTICAS DA PROPRIEDADE:
- é um direito perpétuo: não acaba pelo seu não uso, transfere de pai para filho;
- é elástica: pois as suas faculdades podem ser destacadas para formar outros direitos reais, reconsolidando-
se a posteriori. Ex.: constituição de usufruto.
Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e
profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam
realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em
impedi-las.
Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os
potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis
especiais.
Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego
imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial, obedecido o
disposto em lei especial.
A doutrina da função social desenvolveu-se especialmente no Séc. XX, por conta da obra de Leon Duguit,
reforçado pela obra de Pietro Perlingieri. Foram eles que desenvolveram o que nós entendemos hoje por
função social da propriedade.
A primeira Constituição que se preocupou em trabalhar a perspectiva da função social da propriedade foi a
Constituição de Weimar, em 1919.
A nossa CR/88 consagra esse Princípio da Função Social especialmente em seu art. 5º, XXIII – e o faz logo
após consagrar o direito da propriedade.
Numa dimensão ativa, a função social impõe que o proprietário realize determinados atos de valorização do
bem. E, numa perspectiva passiva, o proprietário deve se abster de determinados atos (ex.: poluição das
águas).
162
Portanto, este é um princípio limitativo da propriedade. O proprietário só exerce o seu direito de forma
constitucional se respeita estes imites.
AULA: 18/06/2010
CONCEITO:
Segundo o professor Santiago Dantas, os direitos de vizinhança visa regular conflitos de concorrência entre
os vizinhos. Trata-se do conjunto de regras que disciplina a convivência harmônica entre os vizinhos, tendo
em vista harmonia social.
Tais direitos de vizinha podem ser entendidos como obrigações propet rem, na medida em que adrem a
coisa, não importando quem seja o proprietário ou possuidor.
No material de apoio encontramos o roteiro com o rol dos direitos de vizinhança e os seus artigos
correspondentes, sendo que em sala abordaremos os mais importantes para concurso:
b) passagem forçada
c) direito de construir
A) USO DA PROPRIEDADE:
O CC/02 brasileiro, em seu artigo 1277, traz dispositivos que regulam o uso da propriedade, segundo a
finalidade social do imóvel. Caso o proprietário ou possuidor exerça os seus direitos de forma abusiva,
poderá ser civilmente responsabilizado.
OBS: não é razoável solucionar-se o conflito entre vizinhos segundo a prioridade da construção (teoria da
preocupação), mas sim segundo a própria localização do prédio e o zoneamento urbano, à luz do interesse
social (parágrafo único do art. 1277 do CC/02).
Significa o exercício da propriedade em desconformidade com seus fins, nos termos dos arts. 1.277 e ss, CC,
gerando ao proprietário prejudicado direito à indenização por danos materiais e morais, sem prejuízo da
tutela específica cabível.
Antigamente existia a teoria da pré-ocupação, ou seja, tinha primazia no uso normal aquele que primeiro
ocupou a área (ex.: casa de shows e hospital). Mas esta teoria não prevalece mais. Atualmente se deve usar
da razoabilidade e do Princípio da função social.
163
O que é ação de dano infecto ou iminente? R: trata-se da demanda proposta com base no artigo 1280 do
CC/02, com propósito de salvaguardar o proprietário ou possuidor que esteja ameaçado pela ruína do prédio
vizinho.
B) PASSAGEM FORÇADA
- Conceito: É o direito que assiste ao dono do prédio encravado de reclamar do vizinho que lhe dê passagem
mediante indenização.
O legislador aqui pretendeu imprimir a função social da propriedade, permitindo que o proprietário possa
explorar sua terra, e escoar sua produção.
Passagem forçada nãos e confunde com servidão: passagem forçada decorre da lei, é um direito de
vizinhança; e a servidão, diferentemente, é um direito real na coisa alheia, em geral constituído, é criada por
contrato, e que não pressupõe necessariamente que o imóvel esteja encravado.
Este direito deve ser exercido sobre o imóvel que mais facilmente puder garantir a passagem (§1º).
Obs.: Nos termos dos §§ 2º e 3º, do art. 1.285, se o encravamento decorrer de alienação parcial, o
adquirente deverá dar a passagem. Ou seja, se o proprietário vendeu parte do seu imóvel e, em função
disso, ficou preso, sem passagem, terá, obrigatoriamente, que pedir a passagem ao adquirente, não
podendo pedi-lo aos outros vizinhos.
Questão: E se a passagem existir, mas é inóspita, não permitindo o escoamento da produção de forma
adequada? O proprietário teria o direito de pedir uma passagem melhor? A doutrina tem se inclinado para
responder a esta pergunta positivamente. Desde Carvalho Santos, chegando ao En. 88, da 1ª JDC, e também
na linha do Resp. 316.336/MS, considera-se encravado também o imóvel, em uma perspectiva social, aquele
que tem acesso ruim. Desde Carvalho Santos, a doutrina já aponta no sentido de que o encravamento do
imóvel é conceito relativo: se existir uma passagem inadequada ou inóspita, o proprietário tem o direito de
exigir nova passagem forçada (ver em. 88 da 1ª JDC e Resp. 316.336/MS).
C) DIREITO DE CONSTRUIR
“O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver salvo o direito dos vizinhos e
os regulamentos administrativos”.
Súm. 120, STF: admite abertura a menos de 1,5 m, desde que se utilize vidro translúcido.
É também possível abrir a menos de 1,5 m vãos para passagem de luz e ar, nos termos do §2º, do art. 1.301,
CC.
164
Obs.: vale lembrar que na zona rural não se pode construir a menos de 3 metros (art. 1.303).
A lei faz estas proibições quanto a abertura de janelas a menos de 1,5 m, em se tratando de visão frontal.
Questão: mas o que dizer das aberturas com visão oblíqua, indireta? Há autores, como Luiz Edson Facchin,
que, citando Orlando Gomes, diz que a lei proíbe a visão direta, não proibindo a visão oblíqua. Mas o STF
havia editado a Súm. 414 proibindo também a visão oblíqua, com a qual o prof. concorda. Ocorre que esta
Súm. está prejudicada, já que o CC, em seu art. 1.301, §1º, cuidou da matéria, admitindo a abertura no limite
mínimo de 75 cm.
OBS: as pequenas aberturas para luz e ar podem ser abertas a menos de metro e meio se respeitarem as
dimensões do parágrafo 2º do artigo 1301 do CC/02.
OBS: o parágrafo 1º do art. 1301 do CC/02, ao regular abertura e janela que permite mera visão oblíqua ou
indireta, aparentemente, entra em rota de colisão com a súmula 414 do STF.
Verificando o proprietário (possuidor) que o seu vizinho está realizando uma abertura ou obra irregular,
poderá embargá-la por meio de uma ação de nunciação de obra nova; se, todavia, a obra já foi concluída,
abre-se o prazo decadencial de ano e dia para a propositura de ação demolitória (1302 do CC/02) e (RESP
311.507/AL). O STJ julgando o Resp. 851.013/RS admitiu a conversibilidade entre os procedimentos de
nunciação de obra nova e demolitória.
165
IX – DIREITO DE FAMÍLIA
1) INTRODUÇÃO:
- a chamada família monoparental (formada por qualquer um dos pais e sua prole).
A família, em nossa Constituição, está explicitamente expressa no casamento, na união estável e no núcleo
monoparental.
Até o Séc. XX, a única forma reconhecida de família era o casamento (em 1917 entra em vigor o CC/16).
Nessa época a Igreja era a grande legitimadora da família. O casamento se traduzia na família e pela família.
O casamento foi, passo a passo, deixando de ser a única modalidade de família, uma vez que se passou a
reconhecer outras formas de arranjos familiares. O que mais contribuiu para isso foi o divórcio.
O direito brasileiro passou então a experimentar outras espécies de entidades familiares – e não há
hierarquia mais entre elas.
Segundo Paulo Lobo, o art. 226, CR, na mesma linha do jurista Luiz Roberto Barroso, consagra um sistema
aberto e inclusivo, no conceito de família.
Dizer que a Constituição consagrou um sistema aberto significa que para além desses 3 núcleos consagrados,
outros arranjos também tem dignidade constitucional, já que nossa Constituição não é discriminatória – a
exemplo da união homoafetiva.
- Resumindo:
O CC/16, refletindo à sua época, consagrava o casamento, por influencia da igreja, como o único standard
legitimador do conceito de família. As profundas mudanças sócio-econômicas e culturais ocorridas ao longo
do sec. XX forçaram este sistema (Guilherme de Oliveira). Com a promulgação da CF/88 a noção de família
experimentaria profunda mudança, na medida em que, além do casamento, reconheceram-se também a
união estável e o núcleo monoparental.
OBS: Corrente doutrinária mais progressista (Maria Berenice Dias, Paulo Lobo, Cristiano Chaves, Giselda
Hironaka, Luis Edson Fakin) aponta no sentido de que a CF/88 adotou um sistema de família aberto, inclusivo
e não discriminatório (Luiz Roberto Barroso), admitindo assim, outras formas de arranjos familiares não
previstas expressamente na norma a exemplo da união homoafetiva.
166
1.2) CONCEITO:
Já houve na doutrina quem afirma-se ser a família uma pessoa jurídica (Savatier, Mazeaudi, Carbonnier), mas
prevalece o entendimento (Dabin) no sentido de que a família não tem personalidade jurídica. Trata-se de
um ente despersonalizado, base da sociedade cujo núcleo é moldado pelo vinculo da sócio-afetividade,
sendo integrado por pessoas vinculadas pelo sangue ou não.
Família não é um conceito técnico, mas sim afetivo. E aqui não se pretende esgotá-lo, mas pode-se dizer que
família é um ente despersonalizado, base da sociedade, moldado pelo vínculo da afetividade, não cabendo
ao Estado apriorísticamente defini-la, mas sim protegê-la.
Ele significa que o Estado não pode interferir coercitivamente na tessitura familiar. Ex. de aplicação:
planejamento familiar.
O conceito de família possui 3 características básicas. O conceito de família atual, moderno é um conceito
sócioafetivo, eudemonista e anaparental
- Eudemonista: a função social da família é criar a ambiência propícia para que cada um dos seus membros
possa, à luz da dignidade humana, realizar-se como pessoa, buscando a sua felicidade. Eudemonismo:
corrente filosófica que afirmava que todos nós temos que buscar a felicidade. O caráter eudemonista da
família, conectado com a sua função social, visa a permitir que os seus integrantes realizem-se enquanto
indivíduos, na busca da sua felicidade pessoal.
- Anaparentalidade: uma família pode ser anaparental, ou seja, pode ser composta por pessoas que não
guardem tecnicamente vínculo parental entre si. A anaparentalidade traz a idéia de que podem integrar a
noção de família pessoas que não guardem estrito vínculo técnico de parentesco (ver art. 5º inc. I da Lei
Maria da Penha).
QUESTÃO DE CONCURSO: O que é princípio da intervenção mínima do Direito de Família? R: Este princípio
consagra a regra segunda a qual o Estado, ao regular o Direito de Família, não pode invadir ou sufocar a
esfera privada do núcleo familiar. O Estado não pode proibir forma de família. Outra aplicação deste
princípio está no art. 1513, 1564 par. 2º do CC/02 (Planejamento familiar).
2) CASAMENTO:
2.1) INTRODUÇÃO:
167
Classicamente, dizia Lafaiete Rodrigues Pereira, “o casamento era uma união eterna, com promessa
recíproca de fidelidade”.
Este conceito, no entanto, está superado. Sob o prisma jurídico, o casamento não traduz mais esta
promessa, ele não se notabiliza mais pela indissolubilidade.
As nossas Constituições antigas consagraram em seu corpo o Princípio da indissolubilidade. Mas desde 1977
o casamento não é mais indissolúvel, porque a partir daí o nosso sistema admitiu o divórcio.
Segundo Van Welter, o casamento traduz a união do homem e da mulher, com objetivo de constituição de
família, formando uma comunidade de existência, notabilizada pela solenidade.
As normas do casamento são normas de ordem pública, com grande carda de coercitividade. Por isso se fala
que o casamento é uma união formal.
“O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos
cônjuges”.
Conceito: na linha do art. 1511 do CC/02, o casamento traduz a união do homem e da mulher, formalmente
constituída, firmando uma plena comunhão de vida, na perspectiva da socioafetividade e da igualdade de
direitos. O casamento é um vínculo formal, já a união estável é fática.
OBS: o que se entende por esponsais? R: trata-se da promessa de casamento, popularmente conhecida
como noivado, período anterior ao matrimônio em que é firmado o compromisso o compromisso do ato
nupcial.
Desde Clóvis Beviláqua, passando por Silvio Rodrigues e Orlando Gomes, é forte a corrente que sustenta ser
o casamento um contrato especial de direito de família.
Ademais, o tratamento que se dá a quem vai casar é “contraente”. Por fim, há mecanismos normativos para
se anular o casamento, como o existem para os demais negócios jurídicos. Por isso se diz que ele tem sim
natureza negocial.
São requisitos de existência do casamento – ou seja, para existir o casamento tem que conjugar 3 requisitos,
segundo a doutrina predominante no Brasil:
168
- diversidade de sexos;
A doutrina não costuma divergir muito sobre isso. Os pressupostos são os seguintes:
A) DIVERSIDADE DE SEXOS:
Se pesquisar a respeito disso será possível perceber que a doutrina é mais ou menos uniforme nesse
requisito. No Brasil, homem não se casa com homem. O direito brasileiro, diferentemente do português (☺
art. 1.628, Código de Portugal), não consagra uma regra específica que exija a diversidade sexual como
elemento de existência. Todavia, tal proibição é principiológica e decorre da interpretação sistemática do
próprio CC (arts. 1.514, 1.517 e 1.565).
Caio Mário dizia que não há no direito brasileiro uma norma que proíba homem casar com homem. O
Código de Portugal tem regra explícita. Se não temos norma específica, por que é proibido homem casar
com homem? Porque decorre do sistema. O casamento é um instituto formalizado, solene. A lei brasileira
regula solenemente o casamento. Quando a lei faz isso, ela estipula apenas o casamento do homem com a
mulher.
☺art. 1.514: “O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz,
a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados”.
Quando o CC regula união estável, ele dispõe que a união estável é uma convivência entre homem e mulher.
Grande parte da doutrina hoje (Maria Berenice) afirma que é possível união estável entre pessoas do mesmo
sexo. Por quê? Não imagine que casamento é igual à união estável. Eles têm a mesma dignidade
constitucional. Ademais, não há hierarquia entre casamento e união estável. Todavia, o casamento é
tipicamente forma. As normas jurídicas brasileiras quanto ao casamento são solenes.
O perigo de dizer que homem pode casar com homem é que dificilmente conseguiria habilitar essas duas
pessoas para casar. Para que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo fossem aprovado no Brasil
seria preciso que no Brasil ocorresse o que aconteceu na Espanha. A legislação espanhola foi modificada,
permitindo explicitamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Para a união estável é perfeitamente defensável no atual sistema a convivência entre pessoas do mesmo
sexo. Isso porque a união estável é um fato da vida, é informal.
169
B) CONSENTIMENTO:
É o momento em que o juiz pergunta se o sujeito aceita o outro como o seu cônjuge. Também é elemento
existencial do casamento. O silêncio também prejudica a realização do ato. O art. 1538, I, CC, estabelece que
a recusa do consentimento implica a suspensão do ato matrimonial.
Alguns autores colocam esse requisito apenas como celebração por autoridade competente. O prof. prefere
incluir a expressão “materialmente”. Se estiver diante de um casamento celebrado por uma autoridade que
não tem competência material (ex: juiz do trabalho celebra casamento), o casamento não existe. Imagine
um casamento celebrado por um delegado de polícia. Nesse caso, o casamento também será inexistente.
Situação diversa se dá na hipótese em que a competência é meramente relativa.
“Em se tratando de simples incompetência relativa, interpretando o art. 1.550, VI, CC, podemos concluir que
o casamento é meramente anulável.”
Ex: (A) é juiz de direito titular da comarca (A). (A) tem competência material para celebrar casamento.
Todavia, (A) é juiz substituto da comarca (B). (A) celebrou um casamento na comarca (B). Só que (A) não
sabia que uma semana antes, revogou-se o ato que o tornava substituto da comarca (B). Nesse caso, o
casamento será anulável.
Quando o casamento for celebrado por autoridade que não tenha competência é sempre anulável? Não.
Depende. Se faltar competência material, será caso de inexistência. Se faltar competência relativa, será caso
de anulabilidade.
Obs.: em se tratando de simples incompetência relativa, interpretando o art. 1.550, VI, podemos concluir
que o casamento é meramente anulável.
Obs.: à luz do Princípio da boa-fé, e com amparo na “Teoria da aparência”, o art. 1.554, CC reconhece o
casamento celebrado por quem não tinha competência legal para o ato, em respeito aos cônjuges inocentes.
Nos termos do art. 1.520, CC, por exceção, é admitida a união matrimonial de pessoas
que não atingiram a idade núbil em duas hipóteses:
170
1º) em caso de gravidez;
2º) para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal.
Embora o casamento não figure mais no rol de causas extintivas da punibilidade, por
conta da Lei 11.106/05, a manifestação concordante da vítima e do seu representante legal
podem ainda extinguir a punibilidade por perdão ou renúncia, o que justificaria a autorização
judicial para o matrimônio.
Aviso:
Alguns tema de Direito de Família integram a grade do Intensivo II ou do III, a
exemplo de: Separação, Divórcio, inclusive a Lei 11.441/07, bem como Alimentos.
☺ Material de apoio.
Impedimentos matrimoniais:
No CC/16 a matéria era tratada no art. 183. no mesmo art. tínhamos os chamados:
- impedimentos dirimentes absolutos (incisos I a VIII) – os mais graves;
- impedimentos dirimentes relativos (incisos IX a XII) – de gravidade média;
- impedimentos proibitivos ou impedientes (incisos XIII a XVI) – de menor gravidade.
Quando se violasse os impedimentos dirimentes absolutos, a conseqüência era
gravíssima: a nulidade absoluta. Tratava-se de matéria de ordem pública. Já a conseqüência
para a violação do impedimento relativo era o casamento ser considerado anulável. E,
finalmente, a violação de impedimento proibitivo, o casamento era válido, mas as partes
sofriam uma sanção patrimonial, que em geral era a aplicação do regime de separação
obrigatória de bens.
171
1) Impedimentos - art. 1.521:
172
3) Causas suspensivas – art. 1.523:
O casamento pode ser anulado por vício de vontade, na forma dos arts. 1.556 a 1.558,
CC.
Art. 1.556: O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por
parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do
outro.
O erro é vício que anula o casamento. É mais uma prova de que o casamento tem
natureza negocial.
Em que situações o erro essencial anula o casamento? ☺art. 1.557.
173
Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de coação, quando o
consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante
fundado temor de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra,
sua ou de seus familiares.
Casamento putativo:
É um casamento nulo ou anulável, que tem os seus efeitos jurídicos preservados, à luz
da teoria da aparência, em favor do cônjuge de boa-fé.
☺ art. 1.561:
Temas importantes:
Trata-se de uma expressão que traduz a agressão emocional ou afetiva sofrida pela
criança, que se submete a uma interferência forçada de um dos pais para que repudie o outro.
A matéria é tratada no Projeto de Lei 4053/08.
174
3) Promessa de casamento ou noivado – esponsais:
Deveres matrimoniais:
Obs.: a fidelidade, tratada como dever conjugal, é um valor jurídico preservado pelo
sistema que quando descumprido, além de justificar o descasamento, pode ainda, segundo
recente jurisprudência, autorizar a indenização por dano moral.
Obs.: a infidelidade virtual é aquela que se manifesta pelo meio eletrônico, por meio
de programas de comunicação instantânea ou site de relacionamentos.
175
Ocorre que, mesmo sendo um valor jurídico, a fidelidade não pode ser encarada como
um valor absoluto, à luz do Princípio da Intervenção Mínima, uma vez que é decisão do
casal, não cabendo ao Estado forçar os cônjuges a observá-la.
Trata-se de uma teoria que nasceu na psicologia. A prof. Noely Morais tem uma obra
sobre o tema.
O poliamorismo marca a relativização da fidelidade, traduzindo-se na múltipla
situação de afeto, em que os cônjuges ou companheiros, espontaneamente, admitem
relacionamentos paralelos com aceitação mútua.
AULA: 29/06/2010
É bem verdade, visto o avanço tecnológico, o reconhecimento feito pela doutrina de espaços virtuais para
constituição de relações afetivas eletrônicas: há quem reconheça a existência de “famílias virtuais”, a
exemplo do modelo propiciado pelo programa “second live”, que já justificou inclusive pedido de divórcio
em estado europeu (ver texto do Lorival Serejo).
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do
outro, exceto no regime da separação absoluta:
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura
meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem
economia separada.
Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges
a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la.
A autorização conjugal é exigida, nos termos do art. 1647 do CC/02, para a prática dos atos ali descritos,
ressalva a situação em que os cônjuges estejam submetidos ao regime de separação absoluta de bens.
176
E para a União Estável, cabe outorga uxória? R: o prof. entende que o CC/02 da uma interpretação restritiva,
ou seja, somente em caso de casamento.
OBS: A expressão “separação absoluta” deve ser entendida, segundo o prof. Nelson Nery, como separação
convencional de bens, dada a não incidência da súmula 377 do STF, posição esta recentemente confirmada
pelo STJ (RESP. 1.163.074/PA).
Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará
anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de
terminada a sociedade conjugal.
Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou
particular, autenticado.
OBS: A súmula 332 do STJ firmou o entendimento segundo o qual a fiança prestada sem autorização
conjugal é totalmente ineficaz.
As formas básicas de casamento são amplamente conhecidas: casamento civil (art. 1512) e casamento
religioso com efeitos civis (art. 1515).
Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de
selos, emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.
Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento
civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data
de sua celebração.
Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com
poderes especiais.
177
§ 2o O nubente que não estiver em iminente risco de vida poderá fazer-se representar no casamento
nuncupativo.
Obs.: o Tribunal de Justiça da Bahia, em pioneiro acórdão (MS 34.739-8/05), admitiu por maioria a
celebração de casamento em centro espírita Kardecista.
Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença
da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser
celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em linha
reta, ou, na colateral, até segundo grau.
Ver artigos seguintes sobre a forma como esse casamento será processado.
Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos nubentes, o presidente do ato irá celebrá-lo onde se
encontrar o impedido, sendo urgente, ainda que à noite, perante duas testemunhas que saibam ler e
escrever.
§ 2o O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no respectivo registro dentro em
cinco dias, perante duas testemunhas, ficando arquivado.
OBS: Qual é a religião autorizada no Brasil a chancelar o casamento? O que se entendem por autoridade
religiosa?
R: O Brasil é um estado laico, ou seja, não tem religião oficial, de maneira que, em tese, qualquer culto
ocorrente religiosa organizada poderá celebrar o matrimonio (inclusive a precedente do TJBA no que tange
ao casamento espírita kardecista – MS 34739-8/2005).
X) UNIÃO ESTÁVEL
178
X.1) HISTÓRICO
O direito brasileiro, sob nítida influência religiosa, em um primeiro momento, relegou a relação de
concubinato a um verdadeiro limbo jurídico.
O direito previdenciário foi pioneiro no tratamento jurídico protetivo da companheira, embora o nosso
direito civil permanecesse insensível a esta necessária mudança, a qual, na primeira parte do século XX já se
processava na Europa, especialmente na França. Paulatinamente, o direito privado brasileiro começa a ceder
para, em um primeiro momento, reconhecer um mero DIREITO À INDENIZAÇÃO POR SERVIÇOS DOMÉSTICOS
PRESTADOS, e, em um segundo momento, DIREITO À PARTILHA DO PATRIMÔNIO AMEALHADO PELA
SOCIEDADE DE FATO (Súmula 380 do STF).
Súmula nº 380 – comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua
dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.
Somente após a promulgação da CF/88 (art. 226), a união informal não matrimonializada (união estável)
receberia merecido tratamento do direito constitucional de família (posteriormente, duas leis de família
regulariam o tema (lei 8.971/94 e 9.278/96).
Foi a Constituição, em seu art. 226, §3º, que deu dignidade familiar à união estável, de maneira a reconhecer
aos companheiros direitos de família.
Foi aprovada a Lei 8.971/94, que num primeiro momento regulou a união estável.
Em seguida, o diploma mais recente é o Novo Código Civil, que disciplina a matéria a partir do art. 1.723.
A Constituição preferiu a expressão união estável ao invés de concubinato (que é expressão utilizada para
designar relação espúria entre amantes).
Obs.: nos termos do §1º do art. 1.723, pode-se concluir que pessoas casadas mas separadas de fato podem
formar união estável.
Hoje o conceito legal de união estável encontra-se a partir do art. 1723 do CC/02:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher,
configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de
constituição de família.
§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando
a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
179
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito
e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros
ao juiz e assento no Registro Civil.
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem
concubinato.
OBS: nos termos do parágrafo 1º do art. 1723, concluímos que a união estável poderá se constituir entre
pessoas desimpedidas (não art. 1521) e também entre pessoas casadas, desde que separadas de fato.
Para o reconhecimento da União Estável não se exige tempo mínimo de convivência, bem como também
não são indispensáveis prole comum e coabitação (súmula 382 do STF).
Súmula 382 – a vida em comum sob o mesmo teto, "more uxorio", não é indispensável à
caracterização do concubinato.
O reconhecimento da relação estável, além de deflagrar efeitos sucessórios, produz efeitos de família
equiparáveis aos do casamento, pessoais e patrimoniais (arts. 1724 e 1725). O direito em vigor estabelece
(art. 1725), salvo contrato escrito em contrário, o regime de comunhão parcial de bens entre os
companheiros.
OBS: denomina-se contrato de convivência (ver a obra de Francisco Cahali) a declaração negocial conjunta
firmada entre os companheiros que, a par de reconhecer a união estável entre eles, disciplina aspectos
patrimoniais da união, a exemplo do regime de bens.
Não se pode confundir o contrato de convivência (que regula efeitos patrimoniais da União Estável
reconhecida) com o denominado contrato de namoro pelo qual os declarantes pretendem exatamente o
contrário: declarar a instabilidade para afastar o regramento legal da união estável.
art. 1.724 - As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito
e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
180
O regime de bens aplicável à união estável é o de comunhão parcial, ressalvado o disposto em contrário em
contrato de convivência, nos termos do art. 1.725.
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Esse contrato de convivência é um contrato celebrado por pessoas que estão vivendo em união estável e
querem disciplinar os aspectos jurídicos patrimoniais dessa união estável. Pode-se nele discutir
administração de bens, regime de bens, alimentos, etc.
Obs.: o contrato de convivência, segundo Francisco Cahali, não substitui a necessidade de se lavrar contratos
próprios e se fazerem os registros específicos para eventual transferência de propriedade.
Obs.: Parcela da doutrina afirma que na eventual colidência de direitos entre um companheiro e terceiro de
boa fé, prevalecerá o interesse deste, cabendo ao prejudicado direito de regresso.
Trata-se de uma declaração formal lavrada em notas de tabelião, por meio da qual o casal afirma manter
simples relação de namoro para evitar as regras da união estável.
Se a união estável estiver configurada, o seu regramento que é de ordem pública não pode ser afastado.
IMPORTANTE: O STJ acaba de decidir (noticiário de 23/06/2010) que a separação obrigatória de bens aplica-
se a sexagenário que viveu em União Estável.
O STJ julgando o RESP 789.293/RJ não admitiu a tese da união estável putativa. A luz do art. 1727 a relação
de concubinato (entre pessoas impedidas), justificaria os direitos da amante? O que se entende por pole
amorimos?
FILIAÇÃO
(...)
- Reconhecimento voluntário:
181
OBS: ver no material de apoio o tratamento jurídico do reconhecimento de filho feito por absoluta ou
relativamente incapaz. O art. 1614 do CC/02 estabelece que o filho maior não pode ser reconhecido sem o
seu consentimento e o menor poderá impugnar o reconhecimento nos 4 anos que se seguirem à maioridade
ou à emancipação.
Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode
impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.
A lei brasileira da ao maior o não reconhecimento de sua paternidade. Porem o filho menor, que foi
reconhecido menor, ele pode impugnar esse reconhecimento (impugnar pressupõe um fundamento) de
paternidade no prazo decadencial de 4 anos após atingir a maioridade ou a emancipação.
OBS: o STJ julgando o Resp. 601.997/RS entendeu que este direito de impugnar o reconhecimento seria
imprescritível.
- legitimidade ativa para propor esta demanda: o alegado filho e o MP (legitimação extraordinária)
OBS: o STJ já decidiu (Ag. Rg no Ag 942.352/SP) que a pessoa adotada não é impedida de propor a
investigatória para reconhecer a sua verdade biológica. A despeito de tradicionalmente o nosso direito
reconhecer o caráter personalíssimo para a propositura da investigatória (art. 1606), o STJ já flexibilizou este
entendimento para permitir que os próprios netos possam diretamente investigar a relação avoenga (Resp
604.154/RS).
- legitimidade passiva: é do suposto pai ou, se a investigatória for post mortem, dos seus herdeiros.
OBS: em direito processual civil, já esta assentado na doutrina e na jurisprudência (Resp. 300.084/GO, Resp.
226.436/PR, Resp. 826.698/MS) que, ausente o exame de DNA e julgado o pedido na investigatória, a
sentença na transita e definitivo materialmente em julgado.
Já esta pacificado (Súmula 302 do STJ, lei 12.004/09) que a recusa injustificada ao exame de DNA gera uma
presunção relativa de paternidade. Emblemático é o Resp. 397.013/MG que disciplina a admissibilidade do
teste de DNA em confronto com as demais provas produzidas.
Conceituar ficada Resp. 557352/RO (conferir n. do julgado – acho que esta errado)
A súmula 277 do STJ estabelece que, julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são
devidos a partir da citação.
182
1º momento: vivia-se a fase da paternidade legal ou jurídica: o CC/16 e o direito da época firmaram uma
presunção, quase absoluta, de que o marido é presumidamente pai do filho da sua esposa.
2º momento: fase da paternidade biológica ou cientifica. Neste momento pai confundir-se-ia com genitor. A
ciência é que diria quem era o pai. Laudo afirma quem é o pai. Houve um endeusamento do exame de DNA.
Para o prof. é perigoso pois se confundiria a paternidade biológica com a paternidade afetiva. Um certo
autor disse para os juízes terem cuidados para não serem meros homologadores de exame de DNA.
Em 1979 João Batista Vilela já dizia da necessidade de desbiologizar o direito de família. Pois a paternidade
não pode se esgotar do vinculo genético e biológico.
3º momento (PATERNIDADE SÓCIA AFETIVA): esta fase é inspirada no principio da dignidade da pessoa
humana. Investigação de paternidade sócia afetiva. Esta teoria, admite o reconhecimento do vinculo filial,
independentemente da verdade biológica, se a relação de afeto estiver devidamente construída e
fundamentada ao longo de toda uma vida, como inclusive já admitiu o STJ consoante o noticiário de
19/11/2009 (Relator João Otavio Noronha).
PARENTESCO:
(09/01/09)
Parentesco Natural:
183
Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as
outras na relação de ascendentes e descendentes.
Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau,
as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.
Pode ser na linha reta, vinculando ascendentes e descendentes também pode ser
colateral, em que as pessoas não descendem umas das outras.
O parentesco na linha reta vai até o infinito, não há limite de graus.
No parentesco colateral, as pessoas descendem de um tronco comum.
Avô
I
Pai
I
X – irmão (2º grau)
I I
Filho Sobrinho (3º grau)
I
Neto
Traduz a relação que vincula um cônjuge ou companheiro aos parentes do outro. Pode
ser na linha reta ou colaterais.
☺art. 1.595:
Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo
vínculo da afinidade.
§ 1o O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e
aos irmãos do cônjuge ou companheiro.
§ 2o Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento
ou da união estável.
184
REGIME DE BENS:
185
Imposto o regime de separação obrigatória, caberia a mudança do regime de bens?
A princípio não, pois seria forma de burlar a lei. Mas há situações em que isso seria
defensável.
Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará,
quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.
Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por
qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a
termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por
escritura pública, nas demais escolhas.
O CC, nos arts. 1.659, VI, e 1.668, V, para a comunhão parcial ou universal,
estabelece que os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge não entram na meação.
Em uma posição inovadora, o STJ, em acórdão da lavra do Min. Rui Rosado de
Aguiar, afastando-se da dicção do CC, estabeleceu a inclusão de crédito trabalhista na
partilha de bens do casal – trata-se de jurisprudência contra legem (☺Resp. 421801/RS).
Nos termos do art. 1.661, é muito importante frisar que os bens cuja aquisição tiver
por título causa anterior ao casamento, não entram na comunhão (ex.: promessa de compra e
venda cumprida antes do casamento e escritura registrada após – não há direito à meação).
186
Mas se parte das parcelas foi paga no curso do casamento, o cônjuge terá o direito a
50% do valor proporcional às parcelas pagas, porque ai há a presunção do esforço comum
Obs.: vale lembrar que, nos termos do art. 1.829, I, CC, que a separação convencional
de bens admite (estranhamente) que o cônjuge sobrevivente concorra com os descendentes
do falecido em sua herança.
Neste regime, cada cônjuge possui patrimônio próprio, na forma dos arts. 1.672 e ss.,
cabendo, todavia, direito à meação do patrimônio adquirido pelo casal, a título oneroso, no
curso do casamento.
187
Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui
patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época
da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos
pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.
Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao
casar e os por ele adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento.
Parágrafo único. A administração desses bens é exclusiva de cada cônjuge,
que os poderá livremente alienar, se forem móveis.
O primeiro ímpeto que podemos ter é pensar que trata-se da mesma coisa da
comunhão parcial, mas isso não é verdade. Na participação final o que for adquirido a título
oneroso por um dos cônjuges é dele, mas o que foi adquirido pelo esforço comum do casal,
comprovadamente, é dividido.
Esse regime permite que cada cônjuge funcione com seu patrimônio pessoal, sendo
que é objeto de meação o que foi adquirido pelo casal, e a título oneroso.
Não devemos, pois, confundi-lo com a comunhão parcial, porquanto, além de serem
regimes distintos, com regras de cálculo próprias, na comunhão parcial, diferentemente da
participação final, entram na comunhão os bens adquiridos por apenas um dos cônjuges, a
título oneroso. Na participação final não! Nela, é como se fosse uma separação de bens, mas
há uma espécie de regra de compensação – uma espécie de meação para evitar que haja o
enriquecimento indevido de um em face do outro.
Esse regime não é de aplicação social prática no Brasil, por conta da sua dificuldade.
Há inúmeras indagações entorno dele. Por isso é pouco provável de ser cobrado em concurso
público.
☺arts. do código, acompanhados de doutrina.
Separação Convencional:
Obs.: Existe um paradoxo trazido pelo inciso I do art. 1.829, CC: o regime de
separação convencional de bens (que pressupõe independência patrimonial) dá ao cônjuge
sobrevivente o direito de concorrer com os descendentes do falecido na herança. É como se
houvesse uma separação durante a vida, e uma união após a morte.
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode,
sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;
III - prestar fiança ou aval;
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que
possam integrar futura meação.
188
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando
casarem ou estabelecerem economia separada.
Outorga uxória ou venha conjugal: esta referência feita pelo CC está em verdade
traduzindo separação convencional de bens. O CC quer dizer que não é necessária a
autorização do outro no regime da separação convencional. No regime de separação
obrigatória pode haver patrimônio comum e meação, na forma da Súm. 377, STF, e entoa há
interesse na outroga, para preservação do patrimônio comum. Isso não ocorre na separação
convencional, em que cada cônjuge tem completa independência.
Atenção: para se comprar um imóvel não é preciso a outorga, apenas para aliená-lo ou
gravá-lo de ônus real.
O aval é uma novidade.
Obs.: a Súm. 332, STJ estabelece que “a anulação da fiança prestada sem outorga
uxória implica a ineficácia total da garantia”.
Se forem realizados alguns desses atos previstos no art. 1.647, a conseqüência está
prevista nos arts. 1.648 e ss:
Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga,
quando um dos cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível
concedê-la.
Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária
(art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge
pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade
conjugal.
Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por
instrumento público, ou particular, autenticado.
Art. 1.650. A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem
consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo
cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.
189
GUARDA DE FILHOS:
A guarda de que trataremos aqui não é a prevista no ECA, mas sim aquela que deriva
do poder familiar (antigo “pátrio poder”). É um desdobramento desse poder familiar.
Ela traduz um conjunto de obrigações e direitos em face da criança ou adolescente, de
assistência material e moral
A grande mudança pela qual passou o nosso sistema foi justamente a abertura da
noção de guarda. Hoje o nosso código admite, além da guarda exclusiva, também a guarda
compartilhada ou conjunta (consagrada pela Lei 11.698/08)
Espécies:
E, além dessas duas modalidades expressamente previstas e regras pelo CC, existem,
na doutrina e no direito comparado, ainda, as chamadas:
c) guarda alternada
d) aninhamento ou nidação
Guarda alternada:
Aninhamento ou Nidação:
190
Ainda é a modalidade mais comum no Brasil.
Nesta, o pai ou a mãe, unilateralmente e por período indeterminado, exerce a função
de guardião, cabendo ao outro o direito de visitas.
O juiz não deve analisar a culpa ou com a condição financeira dos pais. Ele deve
analisar o interesse da criança, o que é melhor para ela.
Segundo Waldyr Grisard Filho, a mãe ou o pai, na guarda exclusiva, detém não
apenas a guarda material, mas também a guarda jurídica. Ou seja, caberá ao guardião
exclusivo adotar as medidas e tomar as decisões necessárias quanto a vida do seu filho.
191
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho,
será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.
§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de
convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do
Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de
equipe interdisciplinar.
§ 4o A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula
de guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de
prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas
de convivência com o filho.
§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai
ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a
natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as
relações de afinidade e afetividade.
O código brasileiro, recentemente modificado, admite que o juiz possa, mesmo não
havendo acordo, em sendo possível, determinar a guarda compartilhada.
192
UNIÃO HOMOAFETIVA:
Não há causa conhecida e específica para a homosexualidade. Não podemos dizer que
se trata de uma doença. A OMS já excluiu esta possibilidade.
Não devemos falar, pois, em “homosexualismo”, porque esta partícula final indica
patologia. Devemos falar em união homoafetiva.
Natureza:
193
UNIÃO ESTÁVEL:
Introdução:
Obs.: nos termos do §1º do art. 1.723, pode-se concluir que pessoas casadas mas
separadas de fato podem formar união estável.
Nos termos da legislação em vigor, para a configuração da união estável, não se exige
lapso de tempo mínimo, não se exige prole comum, nem convivência sob o mesmo teto (☺
Súm. 382, STF – não se exige convivência more uxorio).
Esses elementos, quando reunidos, reforçam a tese da união estável, mas nenhum
deles, por si só, pode configurar o instituto.
194
A chave hermenêutica para a sua configuração é o elemento teleológico do sistema
legal: é preciso que haja uma aparência de família, uma aparência de casamento,
diferentemente do que acontece no simples namoro.
A chave hermenêutica para o reconhecimento da união estável é o elemento
teleológico: o objetivo de constituição de família, revestindo-se de estabilidade e aparência
de casamentom (☺ Resp. 474.962/SP).
Esse contrato de convivência é um contrato celebrado por pessoas que estão vivendo
em união estável e querem disciplinar os aspectos jurídicos patrimoniais dessa união estável.
Pode-se nele discutir administração de bens, regime de bens, alimentos, etc.
Obs.: o contrato de convivência, segundo Francisco Cahali, não substitui a
necessidade de se lavrar contratos próprios e se fazerem os registros específicos para
eventual transferência de propriedade.
É muito raro as pessoas celebrarem contrato de convivência no Brasil.
195
União estável putativa:
196
FILIAÇÃO:
O Princípio diretivo do nosso estudo é o da igualdade entre os filhos, que vem tratado
no art. 227, §6º, CR.
Obs.: Só é possível reconhecer filho morto se ele deixou herdeiros, para evitar
reconhecimento interesseiro, inescrupuloso (visando herdar do filho).
Obs.: nos termos do art. 59, da LRP, é possível o reconhecimento por procurador com
poderes especiais.
O absolutamente incapaz pode registrar o filho sozinho ou precisa de representação?
A prof. Maria Berenice Dias, com total razão, afirma que o registro de filho de absolutamente
incapaz exige procedimento judicial, com intervenção do MP.
Já o relativamente incapaz (ex.: 17 anos), pode registrar o seu filho,
independentemente de assistência. Ele não está ali celebrando um negócio jurídico. Ele está
apenas reconhecendo um fato.
197
Os filhos maiores só podem ser reconhecidos com o seu consentimento. Os
reconhecidos menores, atingindo a maioridade, terão um prazo para impugnar a paternidade.
Nos termos do art. 1.614, o filho maior não pode ser reconhecido sem o seu
consentimento e o menor tem o prazo de 4 anos para impugnar o reconhecimento da filiação.
Obs.: o STJ, no Resp. 601.997/RS, afirmou que o prazo de 4 anos não deve ser
aplicado, pois seria imprescritível o direito de alterar o seu registro.
198
Filiação sócio-afetiva:
Num primeiro momento (início do Séc. XX), no Brasil a paternidade era jurídica – a
lei dizia quem é pai.
O novo código ainda estipula uma presunção, no art. 1597, mas trata-se de uma
presunção relativa, enquanto que antigamente existia uma presunção quase absoluta de que o
pai era o marido da mulher grávida.
Com a descoberta do exame do DNA, passamos, posteriormente, a viver no Brasil a
era da paternidade biológica ou científica.
Este exame afasta dúvidas, é importantíssimos. Mas os juízes não podem se tornar
meros homologadores do exame de DNA.
Existe uma grande diferença entre ser pai e ser genitor.
Ser pai é muito mais do que simplesmente gerar.
A teoria da filiação sócio-afetiva reconhece que o sistema jurídico pode admitir uma
filiação mesmo sem vínculo biológico.
Ela pretende o reconhecimento do vínculo filial construído ao longo do tempo.
É possível, inclusive, entrar com ação de investigação de paternidade sócio-afetiva. E
esta paternidade pode, inclusive, vencer a biológica.
199
DIREITO DAS SUCESSÕES
INTRODUÇÃO:
Conceito:
Sistemas Sucessórios:
200
Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e
o cônjuge.
O prof. entende que a legítima deveria ser preservada para herdeiros incapazes.
Espécies de Sucessão:
Logicamente, não será tratada da sucessão inter vivos. Será tratada a sucessão mortis
causa, a sucessão hereditária.
O direito brasileiro não quer que o patrimônio do falecido fique sem dono, sem
titular. Com a morte de A, ele deve ser sucedido, substituído. O direito das sucessões
disciplina essa sucessão de sujeitos.
Os artigos que cuidam dessa sucessão são o art. 1.786 e o art. 1.788, CC.
Art. 1.786. A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade.
201
Sempre que não se tiver o testamento ou esse for insuficiente, aplica-se a chamada
sucessão legítima.
Obs.: a prof. Maria Helena Diniz lembra-nos a diferença que há entre sucessão a título
universal e sucessão a título singular. No primeiro caso, o sucessor (herdeiro) recebe uma
fração ou a totalidade da herança; no segundo caso, o sucessor (legatário) recebe objeto
determinado.
E se não houver testamento? Como se chama a situação em que o sujeito morre sem
testamento? A pessoa morre ab intestato. Será necessário aplicar as regras da sucessão
legítima.
REGRA BÁSICA: Em direito das sucessões, nos termos do art. 1.787 do CC, a lei que
regula o direito à herança é a do tempo da morte. Ou seja, da sucessão, da morte.
202
A lei nova do inventário administrativo pode ser aplicada imediatamente? Essa lei é
de procedimento, logo, terá aplicação imediata. Porém, no que tange ao direito material da
herança, a lei vigente ao tempo da morte é a que rege a sucessão.
O STJ inclusive tem seguido a regra que estabelece que a lei que regula a sucessão é
a que está vigente ao tempo da morte. (REsp. 205.517/SP e REsp. 740.127/SC).
No que tange à competência para o inventário judicial, o art. 1.785, CC dispõe que a
sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido. Essa regra é para o inventário
judicial.
Princípio da Saisine:
No momento em que o nobre que foi senhor daquela terra morria, a herança subia
para o nobre superior. Os herdeiros tinham que pagar certo tributo para receber a herança
de volta.
Por ficção jurídica, o princípio da saisine, referido no art. 1.784, CC, estabelece a
regra segundo a qual aberta a sucessão, a herança transmite-se desde logo aos herdeiros
legítimos e testamentários.
Esse princípio é muito importante exatamente para não deixar a herança acéfala
(sem herdeiro).
203
Aceitação da Herança:
Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam
os herdeiros.
P.U. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse
da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao
condomínio.
Fica claro porque qualquer herdeiro pode proteger a herança. Por que, às vezes, um
dos herdeiros se acha o “rei da cocada”? Isso é justo? Não. Cada herdeiro está em pé de
igualdade em face do outro. Por isso que o STJ proferiu uma decisão acertadíssima quando
mandou o herdeiro que exerce posse exclusiva em um dos bens da herança pagar aluguel
aos outros herdeiros. É uma questão de justiça que serve para evitar o enriquecimento sem
causa.
É bom até notificar o herdeiro para que o ele não queira usucapir o bem
futuramente.
Atualmente, essa aceitação não tem tanta utilidade, uma vez que a herança é
automática e imediatamente transmitida. A aceitação é simplesmente um ato confirmatório
do recebimento da herança.
Essa aceitação é irrevogável, devendo ser pura e simples. Como assim? Significa que
não se pode aceitar a herança sob condição, por termo ou impondo encargos.
Essa aceitação poderá ser, nos termos dos artigos 1.805 e 1.807:
204
1. Expressa: Será feita por declaração escrita. É pouco comum.
205
P.U. Os chamados à sucessão do herdeiro falecido antes da aceitação, desde
que concordem em receber a segunda herança, poderão aceitar ou renunciar a
primeira.
Renúncia da Herança:
206
A renúncia é um ato formal abdicativo da herança, com eficácia retroativa (ex tunc),
que exclui o sucessor como se herdeiro nunca houvesse sido.
A renúncia, na forma do art. 1.806, CC, dada a sua gravidade, deverá sempre ser pura
e só se opera por instrumento público ou termo judicial, não admitindo revogação. Se quiser
renunciar a uma herança, deverá fazer de forma pura (sem condições, encargo ou termo).
E se a pessoa tiver sido vítima de coação? Não confunda o fato de ser irrevogável com
o fato de poder invalidar. A renúncia tecnicamente falando é um ato abdicativo. Então,
quando o herdeiro renuncia, ele renuncia em favor dos outros herdeiros.
Ex: A, por meio desse ato, renuncia a sua quota na herança em favor de sua mãe. É
muito comum acontecer isso. Quando ocorrer isso, fala-se em cessão hereditária. Ele não está
tecnicamente renunciando. Na essência, renúncia não é. Essa renúncia translativa é na
verdade uma aceitação e uma cessão. Nesse caso, há a bitributação.
Obs.: A cessão de direitos hereditários observa obrigatoriamente a forma pública, nos
termos do art. 1.793, CC.
Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o
co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1o Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de
direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita
anteriormente.
§ 2o É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre
qualquer bem da herança considerado singularmente.
§ 3o Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por
qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a
indivisibilidade.
Por que o herdeiro não pode ceder bem determinado da herança? Porque enquanto o
inventário estiver em curso, o herdeiro é titular de uma fração ideal. Pode ser que no final das
contas da partilha não sobre nada. É ineficaz a cessão pelo co-herdeiro do seu direito
hereditário sobre qualquer bem considerado singularmente. Trata-se de condomínio de coisa
indivisível.
A venda de bem específico deve ser feita mediante autorização judicial, a bem do
inventário. Ou seja, é necessário haver justa causa. Ex: o bem está se deteriorando.
Se quiser ceder a sua quota à pessoa estranha, é necessário dar preferência aos co-
herdeiros? Se a herança é condomínio de coisa indivisível, o direito de preferência existe.
207
bens. Por que parte da doutrina entende assim? Quem segue essa linha sustenta que o
direito à herança tem natureza imobiliária. No momento em que o herdeiro renunciante
renuncia sua quota à herança, é como se ele estivesse renunciando a um imóvel. Alguns
outros autores (Maria Helena Diniz) entendem que a autorização não é necessária, uma vez
que a herança é direito personalíssimo.
Ex: O cidadão soube que o tio dele morreu. O cidadão é o único herdeiro de uma
herança de 10 milhões. O sobrinho não queria aceitar a herança do tio. Ele estava devendo
800.000 reais a três bancos. Renunciando a herança, ele estaria prejudicando os seus
credores. Estes poderão opor a esse ato? O art. 1.813 do Código Civil estabelece que os
credores do renunciante podem opor-se à renúncia, visando à satisfação dos créditos, nos
seus respectivos limites. O credor pode pedir que o juiz suspenda os efeitos da renúncia
para que a dívida seja paga. No que tange ao remanescente, a renúncia terá os seus efeitos.
O legislador nem falou em concubina. No entanto, deve incluí-la. Não pode testar
para a amante. Exceção: Se o testador sem culpa sua, estiver separado de fato do seu
cônjuge há mais de 05 anos, ele poderá testar à sua concubina. Como analisar a culpa do
cidadão que está separado de fato? A culpa está sendo inutilizada.
208
A lei proíbe que se possam beneficiar aqueles impedidos de receber herança ou
legado.
Ex: O Código Civil diz que não pode ser herdeiro a testemunha do testamento. Não
poderá beneficiar o irmão dele, pois estaria, por via oblíqua, violando a lei. Esse irmão seria
interposta pessoa.
Ex: A é casado e vive com a sua esposa, mas tem uma amante. A não pode fazer um
testamento em favor de sua amante. A poderia testar o irmão da concubina? Também não
pode. Então, a concubina pede para beneficiar por testamento o filho deles. Nesse caso,
poderá testar em favor dele? Claro que pode.
No Código Civil, duas regras básicas cuidam dessa legitimidade para suceder.
Vejamos:
2. Art. 1.799, CC: Esse artigo complementa as pessoas que podem receber a herança
por testamento. O art. 1.799, por sua vez, complementa o rol dos legitimados a
suceder. Na sucessão testamentária, poderão também ser chamados:
a) Pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de
fundação. Não é técnico dizer que a fundação é beneficiada pelo testamento. Na
verdade, a fundação é criada por testamento. O que o legislador quer dizer é que,
quando se cria uma fundação, ela se beneficia da herança por via oblíqua.
b) Demais pessoas jurídicas.
c) Os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que
vivas estas ao abrir-se a sucessão. Filhos ainda não concebidos não são nascituros
e nem embriões. É prole eventual. Ex: A pode pegar o material fecundante e
deixar num banco de sêmen. A prepara o seu testamento e diz que 1/3 da sua
209
herança irá para esse filho que ainda será concebido por ela. A esposa de A
poderá ter esse filho mesmo após a morte de A? Sim. No direito brasileiro,
diferentemente de alguns países, não há prazo para que a mãe faça a
inseminação no banco de sêmen. A esposa pode fazer a qualquer tempo a
inseminação homóloga. Imagine que ela faça a inseminação 20 anos depois. O
inventário de A já acabou. Ele terá direito à herança? Para resolver esse
problema, o Código Civil estabelece uma regra.
Obs.: Embora admita o Código Civil, no art. 1.597, III, a paternidade pos mortem a
qualquer tempo, para que este filho a ser concebido tenha também direito à
herança, deverá ser observado o parágrafo 4º do art. 1.800 do Código Civil.
210
AULA 12/08/2010
AULA PABLO STOLZE: INTENSIVO II: SOBRE A EMENDA CONSTITUCIONAL SOBRE O DIVÓRCIO.
1) SEPARAÇÃO JUDICIAL:
1.1) CONCEITO: a separação judicial, outrora denominada de desquite, prevista no art. 1571, III, do CC/02, é
medida de eficácia jurídica limitada, uma vez que, a par de dissolver a sociedade conjugal e certos deveres
matrimoniais (art. 1576), não rompe o vínculo matrimonial.
No sistema brasileiro, a doutrina especializada (Yussef Said Cahali, Pedro Sampaio) já reconhecia duas
espécies básicas de separação (consensual e litigiosa), mas em ambas exigiam-se critérios de ordem
cronológica ou culposa para efeito de obtenção da medida, não bastando o desamor.
Na separação amigável, cujo procedimento é disciplinado pelos artigos 1120 e seguintes do CPC, exigia-se
“mais de um ano de casamento válido” para se obter uma medida que apenas dissolvia a sociedade
conjugal.
OBS: vale lembrar que esta modalidade amigável de separação, a luz da lei 11.441/07, desde que não
houvesse filhos incapazes poderia ser feita no próprio tabelionato (separação/divorcio administrativo).
B) Separação litigiosa: se da por meio de um processo judicial e exige-se fundamentação dos casais.
B.1) por causa OBJETIVA (parágrafos do art. 1572): a denominada separação por causa objetiva, de
pouca aplicação prática, prescindia da análise da culpa, mas exigia um desses fundamentos:
211
OBS: vale lembrar que o art. 1557, inc. IV, admite a anulação do casamento, em caso de
doença mental grave ANTERIOR ao casamento não comunicada ao outro cônjuge.
B.2) por causa SUBJETIVA (caput do art. 1572): a separação judicial por causa subjetiva baseava-se
na exigência de demonstração da conduta culposa do outro cônjuge, traduzida em uma conduta
desonrosa ou violação de dever matrimonial, tornando insuportável a vida em comum. Vale dizer, a
demonstração da culpa do outro era fundamental, não apenas para se obter a separação, mas
também a condenação em efeitos colaterais, a exemplo dos alimentos (art. 1702 CC/02) e do uso do
nome (art. 1578 do CC/02).
Julgado do STJ Ministro Rui Rosado “teoria do desamor”. A despeito deste sistema anacrônico,
burocrático, e de eficácia social limitada, em que se exigia como regra na separação litigiosa a
demonstração da culpa do outro, a doutrina (Leonardo Moreira Alves, Marcelo Truzzi – ver revista
IBDFAM n. 34), bem como o STJ em emblemático julgado (RESP 467184/SP), passaram a admitir que
o desafeto é o único e suficiente argumento para se decretar a separação judicial.
2) DIVÓRCIO:
Segundo Concilio de Trento ocorrido no Sec. XV, o matrimonio passaria a ser por dogma da igreja católica
indissolúvel. No Brasil, desde a constituição de 34 até a de 67 a indissolubilidade do matrimonio era norma
constitucional. Somente em 1977, por meio da emenda n. 9, a constituição da época fora alterada, para se
permitir o divorcio no Brasil, que passaria a ser disciplinado pela famosa lei 6515/77.
OBS: a lei 6515, a despeito de consagrar o divórcio, não o facilitou na medida em que, como regra geral,
tratou-o como um desdobramento da separação judicial, e, foi somente a CF/88 que, no dispositivo
regulador da separação e do divorcio cuidaria de aprimorar o sistema por meio do divórcio direto. A partir
da EC 66/2010 (a PEC era chamada de PEC do amor), que, em seu objeto: baniu a separação judicial do
direito brasileiro (Maria Berenice Dias, Paulo Lobo, Rodrigo da Cunha Pereira) e suprimiu os prazos para o
divórcio, revogando diversos artigos do CC/02, inclusive o 1580 do CC/02, não há mais sentido em se
classificar o divórcio em direto e indireto (por conversão).
Manter-se o sistema da separação judicial é afrontar o princípio da vedação ao retrocesso desenvolvido por
Canotilho.
Vale acrescentar, em reforço ao adequado entendimento dos limites desta emenda, que, da parte final da
PEC original, fora suprimida a expressão na forma da lei, impedindo uma indevida atuação do legislador
ordinário, especialmente no que tange a disciplina da separação judicial.
Deve-se frisar haver desaparecido ainda o prazo de separação de fato de mais de 2 anos para o divórcio
direto, de forma que a (em geral alegórica) figura da “testemunha comprobatória do lapso” torna-se
finalmente desnecessária (inclusive para a escritura pública de divórcio administrativo). Em síntese, a partir
212
da nova emenda, o divórcio passa a ser simplesmente um direito potestativo não subordinado a critérios
temporais, passível de ser exercido em conjunto ou separadamente, pela via judicial ou administrativa.
Paulo Lobo, primeiro jurista brasileiro a escrever artigo sobre o tema, afirma com convicção, que um dos
principais efeitos da emenda, ao banir a separação do sistema, é impedir a indevida discussão da culpa para
efeitos colaterais do divórcio, a exemplo dos alimentos, conforme veremos na próxima aula.
A emenda cuida do divorcio eletrônico? R: A emenda 66/2010 não cuidou do denominado divórcio on-line,
objeto do projeto de lei do Senado 464/2008, que pretende a formulação do pedido de divórcio (já a luz da
nova emenda), desde que amigável e sem filhos incapazes, pela internet.
Pergunta 1: tendo em vista que a separação judicial foi abolida, as sentenças pendentes de averbação em
registro público, a sua averbação como separação ainda seria necessária? Ou se averbaria como divórcio?
3º) O novo divórcio e a guarda de filhos (já na perspectiva do atual tema alienação parental).
AULA 2: 25/08/2010
Vale lembrar que a separação de corpos é medida judicial que visa suspender o dever de coabitação,
determinando a saída de um dos cônjuges ou autorizando a saída do requerente.
Não houve a partir da promulgação da emenda alteração da conjuntura jurídica que justificasse a supressão
da separação de corpos em nosso sistema.
OBS: as medidas preventivas da Lei Maria da Penha pela mesma razão também não foram atingidas pela
emenda do divórcio.
213
OBS: A emenda do divórcio não alterou o sistema de guarda de filhos (artigos 1583 e 1584) que no dizer de
Perlingieri (Perfis de Direito Civil Constitucional), já tomava em conta o interesse existencial dos filhos e não
a culpa, para efeito de fixação da guarda.
No sistema atual o juiz verificará, fins de guarda, analisará aquele que tenha maior condição para o menor,
independentemente de culpa. A guarda deve ser deferida observando-se as dimensões moral e psicológica
de cada um dos pais sem a necessária vinculação com a culpa pelo fim do casamento, preferindo-se a
modalidade de guarda compartilhada.
OBS: REVISÃO GUARDA: conforme vimos na grade de intensivo I, temos fundamentalmente 4 modalidades
de guarda no direito de família: 1) Unilateral ou exclusiva; 2) Alternada; 3) Nidação ou aninhamento; 4)
Compartilhada ou conjunta. No CC somente estão previstas as guardas unilateral e a compartilhada. O fato
de as outras não estarem previstas no CC elas podem ser empregadas.
- Guarda unilateral: O pai ou a mãe exerce exclusivamente a guarda cabendo ao outro apenas direito de
visitas.
- Guarda alternada: o pai e a mãe revezam períodos exclusivos de guarda cabendo ao outro direito de visitas.
- Nidação ou aninhamento: na nidação, espécie pouco comum em nossa jurisprudência, mas ocorrente em
países Europeus, para evitar que a criança fique indo de uma casa para outra, ela permanece no mesmo
domicílio em que vivia o casal, revezando-se os pais e sua companhia. O juiz pode até estabelecer um
horário. A guarda compartilhada abrange este tipo de modalidade.
A partir da promulgação da emenda o divórcio torna-se mais facilitado no Brasil, exigindo-se redobrada
atenção quanto à SAP.
A expressão SAP deve-se Richard Gardner, que publicou estudo sobre o tema em 1985: trata-se de um
distúrbio da infância, que freqüentemente aparece nas disputas de custódia, em que um dos pais interfere
indevidamente na dimensão psíquica do filho para que repudie o outro.
Embora não exista ainda lei específica regulamentando e coibindo a prática, a jurisprudência tem reagido
(ver TJRS, AI, 7002.327.6330).
OBS: o PL 4053/2008 (numeração da CD) já aprovado no Senado Federal (PL 20/2010, numeração do SF)
regulamenta a matéria, estabelecendo sanções ao genitor alienador como advertência, multa, alteração da
guarda, a até mesmo suspensão do poder familiar.
214
3.4) EMENDA 66/10 E USO DO NOME:
A partir da EC 66/10 a regra natural e a perda do nome de casado a partir do divórcio, salvo estipulação em
contrário no acordo (divórcio consensual) ou se o juiz, em respeito aos direitos da personalidade e ao direito
constitucional à identidade, vislumbrar qualquer das hipóteses do artigo 1578.
Por economia processual, não há óbice (impedimento) em se cumular o pedido de divórcio com outros
pedidos atinentes a efeitos colaterais do descasamento: alimentos, guarda de filhos, uso do nome e partilha
de bens. O que o moderno direito de família sustenta, reforçado pela emenda 66/10, é o banimento da
discussão da culpa nesta seara. Em via própria outrossim, em sede de ação de responsabilidade civil, nada
impede seja a culpa discutida.
Com a supressão da separação judicial, artigos do CC/02 que já sofriam severa crítica doutrinária (enunciado
133 da 1ª Jornada) devem ser revistos (artigos 1702 e 1704 do CC/02).
A partir do momento em que a culpa, que já vinha sendo desconsiderada em decisões do TJRS, deixa de ser
um vetor de fixação da pensão alimentícia, resta claro que é o princípio da solidariedade familiar alicerçado
no binômio necessidade X capacidade que justifica e gradua a pensão alimentícia cabível.
Para efeito de partilha a culpa não é enfrentada, mas sim o regime de bens adotado pelo casal. Trata-se de
uma posição que já existia no próprio direito anterior.
OBS: vale lembrar que, nos termos do art. 1581, a partilha de bens não é “condicio sine qua nom” para o
divórcio.
OBS: o STJ já decidiu no Ag Rg no Ag 682.230/SP, não haver sentido da não comunicabilidade de bens após a
separação de fato do casal.
Nos termos do art. 1582 CC/02, não alterado pela EC 66, o pedido de divórcio somente competirá ao
cônjuge, mas se for incapaz ao seu curador ascendente ou irmão. Documentos: 1) certidão de casamento; 2)
certidão de nascimento de filhos; 3) títulos de propriedade, se houver partilha.
OBS: no divórcio litigioso a designação de audiência permanece necessária, mas, em sendo o pedido
conjunto e consensual, uma eventual audiência de tentativa de reconciliação ficará a cargo do juiz.
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Matéria de defesa do divórcio:
Em matéria de defesa, ressalvados efeitos colaterais (alimentos, guarda de filhos, partilha de bens), a
resistência do pedido de divorcio litigioso, em termos de mérito, é quase inexistente (nem o argumento do
prazo de separação de fato existe mais).
PERGUNTAS:
1) Qual é o estado civil das pessoas separadas judicialmente a partir da emenda do divórcio? R: Maria
Berenice Dias sustenta que a partir da emenda, com o fim da separação, as pessoas separadas judicialmente
estão automaticamente divorciadas. Discorda desta tese Paulo Lobo para quem o pedido de divórcio é
necessário, já sem a contagem de prazo.
R: é defensável a tese segundo a qual, para processos em curso, e por não se tratar de simples alteração de
pedido ou causa de pedir (art. 264 do CPC) uma vez que houve alteração do próprio sistema constitucional, o
juiz abra prazo para que o autor adapte o procedimento a nova emenda sob pena de extinção sem
julgamento de mérito.
Pergunta: Pablito, ampliando a pergunta sobre o que ocorrem com os processos atualmente em curso, e os
processos findos que as sentenças de separação ainda estão pendentes de averbação no registro público,
nos termos do art. 10, inc. I do CC/02?
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