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Desprescrição de medicamentos na atenção primária à saúde

 A desprescrição é definida como a retirada de um medicamento inadequado ou como o processo de análise da


medicação para mostrar e resolver o paradoxo por trás do regime terapêutico;
 As evidências em relação à eficacia da desprescrição são muito heterogêneas e
 Fatores que dificultam (barreiras) e que a favorecerem (facilitadores);
 Os estudos de intervenção revelam que a desprescrição reduz a terapêutica inadequada e o nível de
polimedicação, embora não se possa demonstrar com clareza que isso se traduz em resultados clinicamente
relevantes;
 O médico de família e comunidade ocupa um papel central para desprescrever medicamentos de forma segura
e correta.
Polimedicação

 é definida como o emprego de cinco ou mais fármacos de uso crônico por um paciente determinado; no
aspecto qualitativo, analisa-se uso de ao menos um medicamento considerado inadequado;
 Perfis -> pela expectativa de vida reduzida, pela baixa adesão terapêutica e pela alta possibilidade de
interações farmacológicas e de efeitos adversos -> Envelhecimento da população e aumento da incidência de
doenças crônicas;
 Segundo os dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, a multimorbidade está intimamente ligada à idade;
 As consequências da polimedicação são numerosas: por um lado, diminui a adesão terapêutica, aumenta a
incidência de efeitos adversos e a possibilidade de interações medicamentosas, com repercussão direta sobre o
estado de saúde das pessoas; por outro, aumenta o risco de hospitalização, diminui a qualidade de vida e supõe
maior morbimortalidade. Além disso, tem implicações médicolegais, éticas e econômicas que devem ser
levadas em conta;
 Estratégias -> 4 grupos -> 1) medidas que incidem na educação e na formação dos profissionais; 2) sistemas
informatizados orientados a ajudar na tomada de decisão; 3) intervenções baseadas na revisão
farmacoterapêutica; e 4) intervenções multidisciplinares ou multifacetadas.
O que é desprescrever ?

 processo de retirada de um medicamento inadequado, supervisionado por um profissional de saúde, com o


intuito de manejar a polimedicação e melhorar os resultados;
 O primeiro é a adequação terapêutica, que pode ser definida como parte da terapia do paciente, na qual,
mediante a indicação, a prescrição, a dispensação, a administração e o seguimento, o profissional pode obter
alguns resultados apropriados às condições e circunstâncias do próprio paciente e do conjunto da comunidade;
 O segundo refere-se à revisão da medicação, entendida como a sua avaliação estruturada, com objetivo de
otimizar o uso de medicamentos e melhorar os resultados em saúde;
 se fala de desprescrição, se descreve um processo singular e contínuo (prescrição-desprescrição) que
necessariamente deve ser adaptado a cada pessoa e circunstância;
 Desprescrever não é só retirar medicamentos que não são considerados adequados. Para a desprescrição, é
preciso fazer uma análise mais ou menos pormenorizada e padronizada, que, respeitando como eixo central a
idiossincrasia do paciente, tem como finalidade.
O que fazer?
Modelo teóricos de desprescrição
 Em primeira instância, do modelo teórico escolhido;
 A preocupação fundamental em torno do processo de desprescrição é a de decidir qual fármaco deve ser
retirado. Essa identificação dos medicamentos potencialmente inadequados (MPIs), por meio de listagens
(sistemas explícitos, com base em critérios), algoritmos e questionários (sistemas implícitos, com base em
juízos clínicos), definirá a evolução dos modelos de desprescrição durante esta primeira década. Após os
critérios de Beers e colaboradores;
 São necessários passos que facilitem e afianciem a desprescrição;
 É importante incluir o paciente na tomada de decisão de forma ativa, simétrica e transversal ao longo de todo
o processo. Deve-se também obter o histórico da relação que o paciente estabeleceu com a sua medicação;
 (retirada progressiva, mudanças adaptadas ao ritmo e às necessidades do paciente, priorização de fármacos
que serão desprescritos);
 fases: 1) elaborar uma lista de medicamentos; 2) identificar o fármaco a ser desprescrito; 3) planejar a
desprescrição; e 4) revisá-la.
Fases da desprescrição ( 5 passos)

 a desprescrição de medicamentos em atenção primária é feita de maneira flexível, intuitiva e implícita. As


etapas aqui descritas não são estanques nem sequenciais, mas sim um processo contínuo em que prescrição e
desprescrição estão juntas;
 Passo 1: Obtenção da história completa dos medicamentos. Devemos obter uma lista completa de todos os
medicamentos que o paciente usa. É necessário associar cada medicamento com sua dose, frequência,
formulação, via de administração, duração de uso e indicação clínica. Devem ser analisados os problemas de
saúde ativos e inativos e sua correspondência com os medicamentos prescritos -> reações alérgicas prévias,
efeitos adversos e, se possível, fármacos consumidos antes e seus efeitos -> fazer uma avaliação clínica dos
órgãos vitais (funções hepática, renal, cardíaca) -> temos de informar a(o) paciente/cuidador(a) sobre o
motivo para fazer a desprescrição, sobre os objetivos que buscamos e os previsíveis efeitos adversos que
podemos esperar. -> Habilidades cognitivas (o paciente tem capacidade de tomas os medicamentos) \ Estado
emocional (passando por alguma ansiedade que o impeça de tomar decisões) \ Crenças culturais (existem
algum impedimento religioso);
 Passo 2: Identificação dos medicamentos potencialmente inadequados -> anticolinérgicos, fármacos de
estreita margem terapêutica, psicotrópicos, fármacos sem indicação ou usados fora da ficha técnica (off-label);
-> Critérios de Beers e os STOPP;

 Passo 3: Determinação dos fármacos a serem desprescritos e as prioridades. A priori, nunca poderemos ter
certeza absoluta de que a retirada será benéfica e segura -> O mais urgente é rever a continuidade de
medicamentos que estejam produzindo efeitos adversos ou que possam causar danos -> É conveniente que a
retirada seja sequencial: não mais do que um fármaco em cada tentativa, com o intuito de relacionar
claramente a eventual recorrência de sintomas ou síndromes de retirada;
- Perguntas úteis para identificar os medicamentos que devem ser desprescritos -> Há alguma alternativa
farmacológica superior em relação ao seu perfil de benefícios-riscos-inconvenientes-custos?; Há duplicidade
(dos fármacos concomitantemente consumidos pertencentes à mesma classe terapêutica)?; É uma peça
necessária e clinicamente útil no regime terapêutico?.
 Passo 4: Planejamento e início. Muitos fármacos podem ser retirados de forma abrupta, mas outros não (p. ex.,
psicotrópicos e betabloqueadores). Existem três razões para reduzir as doses : prevenir síndromes de retirada,
detectar precocemente a recorrência de sintomas e para comodidade do paciente.;
 Passo 5: Seguimento, apoio e documentação. O objetivo do seguimento é múltiplo. Em primeiro lugar,
monitorar o surgimento de efeitos adversos (síndromes de retirada, recorrência da patologia) -> eficácia da
retirada estruturada costuma decair com o tempo -> É essencial um seguimento próximo (sobretudo no início,
quando costumam aparecer os problemas), manter uma atitude tipo “portas abertas”.
Prognóstico e possíveis complicações

 Síndrome de retirada -> Frequente em fármacos que agem sobre o sistema nervoso central (SNC) ->
antidepressivos inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS), que ocorrem aproximadamente uma
semana depois de tirar o fármaco, sendo leves e se resolvendo em 10 dias, ou com a retirada de
benzodiazepinas, que se associam com uma síndrome de abstinência muito mais grave, com confusão,
alucinações e convulsões;
 Efeito rebote. Seria a reaparição, após a suspensão brusca do fármaco, dos sintomas em intensidade maior à
apresentada previamente pelo paciente -> A interrupção de inibidores da bomba de próton (IBP) pode
produzir una hipersecreção ácida e o agravamento de sintomas gastrintestinais.
 Desmascaramento de interações -> As interações farmacocinéticas devem ser levadas em conta no momento
de retirar um fármaco;
 Reaparição de sintomas -> É importante não interpretar um efeito rebote como uma recorrência dos sintomas
da doença original.
Fatores que dependem do contexto cultural, social ou sanitário

 A falta de tempo e a sobrecarga laboral é uma das barreiras mais importantes;


 A desprescrição é uma tarefa multidisciplinar;
 O modelo de assistência à saúde tende à fragmentação por problemas, deixando de lado a concepção global da
pessoa e seu contexto social e familiar.
Fatores que dependem dos profissionais

 Estar sensibilizado quanto à prescrição adequada e aos perigos implicados na utilização de medicamentos
desnecessários facilita a revisão da medicação;
 Outra barreira importante à desprescrição é a resistência dos médicos para desprescrever um tratamento,
mesmo sabendo que é desnecessário, inútil ou prejudicial, provocando, assim, a sua renovação
indefinidamente. Esse comportamento é denominado “inércia sobreterapêutica”;
 A percepção de autoeficácia é importante no processo de desprescrição, pois, para realizá-la, não basta apenas
ter conhecimentos específicos (identificação e manejo de efeitos adversos, atualização em aspectos clínicos e
farmacoterapêuticos) e habilidades, mas também é importante dispor de informações e ferramentas para a
tomada de decisão, assim como experiência e intuição.
Fatores que dependem do relacionamento entre o profissional de saúde, o paciente e o cuidador

 A desprescrição é um processo realizado por pessoas que interagem em um âmbito relacional definido. O
relacionamento clínico incide de uma forma especial nas atitudes e comportamentos em torno da
desprescrição;
 É mais fácil cessar uma medicação crônica quando o relacionamento entre o médico de família e o paciente
foi desenvolvido durante anos e se baseia no respeito e na confiança mútua;
 Deixar de prescrever fármacos, ainda que sejam potencialmente não apropriados, às vezes pode ser
desagradável, e alguns médicos tendem a evitá-lo, a fim de salvaguardar o relacionamento clínico.
Fatores que dependem do paciente

 A atitude do paciente frente a desprescrição está determinada, em última instância, por sua percepção sobre o
medicamento e o sistema sanitário, influenciada, por sua vez, por suas vivências prévias e influências
externas;
 O primeiro aspecto dessa barreira para a desprescrição é que o paciente considera que a medicação é ainda
necessária ou benéfica, seja porque percebe suas vantagens (alívio sintomático, realização de objetivos
mensuráveis, como níveis de PA), seja por ter a esperança de que no futuro lhe será útil;
 O segundo aspecto importante é a visão do paciente sobre o processo de desprescrição;
 A desprescrição terá mais chances de ser aceita se for combinado previamente com o paciente a realização de
um teste antes da retirada definitiva, 9 ou a adoção de uma solução intermediária em casos de efeito rebote ou
resistências internas importantes (p. ex., reduzir a dose);
 A principal emoção que dificulta a desprescrição é o medo das consequências negativas advindas da
interrupção de um medicamento.

Papel do médico de família e comunidade


 Para realizar um processo de desprescrição, é necessário superar a visão farmacocentrista e biomédica do
fenômeno da polimedicação, situando o foco da atenção na pessoa e seu contexto familiar, comunitário e
social.

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