Você está na página 1de 12

INTENSIVO I

Cleber Masson
Direito Penal
Aula 03
ROTEIRO DE AULA

Temas: Princípios do Direito Penal (continuação) e Evolução Doutrinária do Direito Penal

10.3. Divisões: fragmentariedade e subsidiariedade

O princípio da intervenção mínima se divide em fragmentariedade e subsidiariedade.

10.3.1. Princípio da fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal


De acordo com esse princípio, o Direito Penal é a última etapa, é a última fase, é o último grau de
proteção do bem jurídico.

Atenção: nem tudo o que é ilícito, é ilícito perante o Direito Penal. Entretanto, tudo o que é ilícito
para o Direito Penal, também é ilícito perante os demais ramos do direito.
Exemplo: o crime de peculato sempre será ato de improbidade administrativa, mas nem todo ato de
improbidade administrativa constituirá crime diante do Direito Penal.
O professor faz uma analogia, indicando que, em uma noite estrelada, o céu escuro representa a
ilicitude em geral e as estrelas são os ilícitos penais. Assim, apenas aqueles fragmentos (estrelas)
interessam ao Direito Penal. Ex.: A faz sua declaração de imposto de renda, declara tudo
corretamente, mas deixa de pagar o tributo apurado, não pagando a DARF. Ele praticou um ilícito
tributário, mas não um ilícito penal.

✓ Os ilícitos penais nem sempre foram ilícitos penais.

Exemplo: o furto nem sempre foi crime. Houve uma época em que os institutos do Direito Civil
eram suficientes para proteger a propriedade e a posse e coibir determinadas condutas. Quando o
direito civil não foi mais capaz de coibir esses ataques ao patrimônio, o Direito Penal foi chamado.

Fragmentariedade às avessas:

A fragmentariedade às avessas representa a existência de um crime que, posteriormente, torna-se


desnecessário ao ordenamento jurídico. Assim, com a evolução do tempo, o fato deixa de ter
relevância para o Direito Penal.
A fragmentariedade às avessas se manifesta através da abolitio criminis.
Exemplo: crime de adultério. Em determinado momento, percebeu-se que não havia nenhuma ação
penal para apurar o crime de adultério. Desta forma, concluiu-se que outro ramo do direito, o civil,
dava conta de proteger o jurídico antes protegido pelo artigo 240 do CP, através do divórcio, ação de
alimentos, etc.

Atenção: o princípio da fragmentariedade se manifesta no plano abstrato, ou seja, tem como


destinatário o legislador.

10.3.2. Princípio da subsidiariedade – é um soldado de reserva. Ele somente deve ser utilizado
quando não houver meio menos lesivo para a proteção do bem jurídico.
O Direito Penal é a “ultima ratio” (último recurso), é o “executor de reserva”. Isso porque ele é
muito invasivo e pode causar estragos na vida de uma pessoa.
Exemplo: crime de estelionato (art. 171 do CP).

O professor destaca que, no caso concreto, esse crime nem sempre é necessário. No fórum criminal
da Barra Funda, por exemplo, mais de 80% dos inquéritos policiais que apuram estelionatos são
arquivados, pois o Direito Civil acaba resolvendo a questão. E se o direito penal pode ser deixado de
lado, é muito melhor, porque ele é muito invasivo, deixa marcas profundas.

Atenção: Esse princípio se manifesta no plano concreto, isto é, tem como destinatário o operador
do direito.
Observação:
Essa divisão (fragmentariedade no plano abstrato e subsidiariedade no plano concreto) foi criada na
Alemanha e desenvolvida na Espanha. No Brasil, a jurisprudência aplica tais princípios.

Cuidado: Na doutrina, entretanto, existem alguns poucos autores que invertem os conceitos,
colocando a fragmentariedade no plano concreto e a subsidiariedade no plano abstrato.

11. Princípio da insignificância (criminalidade de bagatela)

11.1. Introdução e finalidade

O princípio da insignificância remonta ao Direito Romano. Ele surge com o brocardo “de minimus
non curat praetor”, isto é, os pretores (juízes e tribunais) não se ocupam do que é mínimo.
✓ No Direito Romano, esse princípio tinha a aplicabilidade restrita ao direito privado.

Somente na década de 1970, este princípio foi trazido para o Direito Penal por Claus Roxin, que a
desenvolvoeu “funcionalismo penal”.
Roxin afirma que o Direito Penal não deve se ocupar de condutas mínimas, ou seja, não deve se
ocupar de condutas incapazes de lesar ou de colocar em perigo o bem jurídico penalmente tutelado.

Finalidade do princípio da insignificância:


O STF afirma que o princípio da insignificância tem a finalidade de efetuar uma interpretação
restritiva da lei penal. Isso porque a lei penal é muito ampla, ela abarca todas as condutas que se
encaixem no tipo penal. Mas algumas condutas são irrelevantes, embora se encaixem no tipo, e o
princípio da insignificância vem para reduzir essa abrangência.
Exemplo: a garrafa de água é uma coisa alheia móvel, ou seja, em tese, a conduta de subtrair esta
garrafa poderia ser encaixada no crime do art. 155 do CP, que é uma norma ampla que engloba a
subtração de qualquer coisa alheia móvel. A partir da aplicação do princípio da insignificância, há
uma limitação da interpretação do dispositivo legal e considera-se não criminosa a conduta praticada,
porque insignificante.
✓ O princípio da insignificância vem para limitar o alcance da norma, nunca para aumentá-lo.

11.2 Natureza jurídica do princípio da insignificância


Segundo Pontes de Miranda, natureza jurídica é o grupo, categoria ou classe a que pertence
determinado instituto do direito.
Exemplo: a natureza jurídica da coação moral irresistível é de causa de exclusão da culpabilidade.
O princípio da insignificância é uma causa supralegal de exclusão da tipicidade. Assim, quando
incide o princípio da insignificância, o fato é atípico.

Modernamente, a tipicidade é chamada de tipicidade penal (= tipicidade formal + tipicidade


material).
a) Tipicidade formal: é o juízo de adequação entre o fato praticado na vida real e o modelo de crime
descrito na lei penal. Ex.: subtrair uma garrafa de água. A conduta se encaixa no modelo de crime
descrito na lei.
b) Tipicidade material: é a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.
Exemplo: subtrair uma garrafa de água. Não há lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Essa
conduta não tem tipicidade material.
✓ No princípio da insignificância existe tipicidade formal, porém falta a tipicidade material.

11.3. Requisitos: objetivos e subjetivos


Atenção: Para se aplicar o princípio da insignificância, não basta que a coisa tenha um valor
irrisório. O princípio da insignificância depende de requisitos objetivos e subjetivos.
✓ Os requisitos objetivos são aqueles ligados ao fato praticado pelo agente. Os requisitos subjetivos,
por sua vez, são aqueles ligados tanto ao agente quanto à vítima.

11.3.1. Requisitos objetivos


São quatro os requisitos objetivos:
a) Mínima ofensividade da conduta;
b) Ausência de periculosidade social da ação;
c) Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e
d) Inexpressividade da lesão jurídica.

Recurso mnemônico: MARI


Atenção: nos julgados do STF que versam sobre o tema, todos esses requisitos são citados, mas não
há definição de cada um deles, de modo taxativo. Isso porque, o princípio da insignificância é
medida de política criminal. A política criminal é a aplicação da lei de acordo com os anseios da
sociedade. É o filtro entre a letra da lei e os anseios da sociedade. Então, a não taxatividade dos
requisitos permite ao julgador aplicar ou não o princípio da insignificância ao caso concreto.
Todos os requisitos objetivos são bastante próximos e se ligam ao funcionalismo penal, ou seja,
refletem a flexibilidade do Direito Penal. Tais requisitos devem ser aplicados no caso concreto.

11.3.2. Requisitos subjetivos


Há requisitos subjetivos ligados ao agente e há requisitos subjetivos ligados à vítima.

a) Condições pessoais do agente: são três as situações que ficam evidenciadas nesse requisito:

a.1) Reincidente:
Em regra, o princípio da insignificância só é aplicado ao réu primário.
Questão: É possível aplicar o princípio da insignificância ao reincidente?
* No STF, prevalece o entendimento de que não se aplica o princípio da insignificância ao
reincidente. Isso porque o princípio da insignificância é medida de política criminal.
Ressalve-se que o STF já admitiu o princípio da insignificância para o reincidente genérico. Assim,
no STF, a regra é que não se aplica este princípio para o reincidente específico, mas tal princípio já
pôde ser aplicado ao reincidente genérico.
* Por outro lado, no STJ prevalece o entendimento de que é possível a aplicação do princípio da
insignificância ao reincidente.
A reincidência é agravante genérica. As agravantes incidem na segunda fase de aplicação da pena.
Assim sendo, de acordo com o entendimento do STJ, a reincidência não tem relação com a tipicidade
penal. Em suma: o fundamento utilizado é que este princípio exclui a tipicidade, ou seja, torna o fato
atípico. Assim, se o fato é atípico, é atípico para o réu primário e para o réu reincidente.

a.2) Criminoso habitual:


Criminoso habitual é aquele que faz da prática de crimes o seu meio de vida.
Neste caso, é pacífico no STF e STJ que não é possível aplicar o princípio da insignificância ao
criminoso habitual.
a.3) Militares:
No caso dos militares, o entendimento predominante no STF é de que não é possível aplicar o
princípio da insignificância. Isso porque os militares são regidos pela hierarquia e pela disciplina.
Além disso, o militar transmite uma sensação de segurança pública e ele não pode se aproveitar da
autoridade do cargo para praticar crimes.

b) Condições da vítima

b.1) Extensão do dano: é necessário analisar a extensão do dano (moral ou material).


Exemplo: subtração de máquina de costura que, apesar de ser velha, era o instrumento de trabalho de
uma senhora e gerava renda para a sua família.
b.2) Valor sentimental do bem: o Direito Penal moderno não pode se importar apenas com o valor
financeiro do bem, devendo tutelar também o valor afetivo das coisas.
O exemplo dado de bem com valor sentimental é o furto de “disco de ouro” do programa do
Chacrinha (HC 107.15 – Informativo 639).
✓ O STF decidiu que não se aplica o princípio da insignificância no furto de “disco de ouro”.

11.4. Aplicabilidade e inaplicabilidade


Regra geral:
Os exemplos de princípio da insignificância geralmente são referentes ao furto ou demais crimes
patrimoniais. Entretanto, a regra geral é a aplicabilidade do princípio da insignificância para todo
crime que com ele seja compatível, e não apenas aos crimes patrimoniais.
Exemplo: descaminho, crimes ambientais e tributários.
Questão: há um limite para a aplicação do princípio da insignificância nos casos de furto? Não há
um limite definido. Entretanto, o professor destaca que, geralmente, o valor gira em torno de até 20%
do salário mínimo.

Exceções:
É necessário ressaltar que alguns crimes são totalmente incompatíveis com este princípio.
Exemplo: crimes contra a vida, crimes sexuais, roubo e demais crimes praticados com violência à
pessoa ou grave ameaça, tráfico de drogas.
Sobre este princípio, há duas súmulas importantes:
Súmula 589, STJ: “É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais
praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas”.
Súmula 599, STJ: “O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração
pública”
✓ No caso da Súmula 599 do STJ, o fundamento é a moralidade, a probidade e a ética especial que
devem regular a atuação dos agentes públicos.

✓ O professor afirma que a Súmula 599 do STJ causa polêmica, pois, no caso do descaminho (art.
334 do CP), embora seja crime tributário, trata-se, em última análise, de crime contra a
Administração Pública. Cabe destacar que o STF e o STJ firmaram entendimento, com base na Lei
10.522/2001 e nas Portarias nº 75 e 130 do Ministério da Fazenda, de que, até R$ 20.000,00, o crime
de descaminho é insignificante.
✓ Atenção: cuidado com a Súmula 599 do STJ! O STF, em situações excepcionalíssimas, já admitiu
o princípio da insignificância em crimes contra a Administração Pública.
Exemplo: subtração de rádio velho inservível da repartição que havia sido jogado no lixo.

11.5. Princípio da insignificância e acordo de não persecução penal

O acordo de não persecução penal foi criado por resolução do CNMP. Atualmente, o acordo de não
persecução penal foi colocado na lei de maneira muito próxima ao que consta na resolução do
CNMP. Trata-se da inserção feita pela Lei nº. 13.964/19 - Pacote Anticrime.
Trata-se de negócio jurídico formalizado por escrito e firmado pelo Ministério Público, pelo
investigado e por seu defensor, cabível nas infrações penais praticadas sem violência ou grave
ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, obrigatoriamente homologado em audiência
pelo juízo competente.
CPP, art. 28-A, § 2º: “O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:
(...) II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta
criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas”.
Atenção: o art. 28-A, §2º do CPP informa que o acordo de não persecução penal não se aplica ao
criminoso habitual, exceto se as infrações pretéritas forem insignificantes.
O professor destaca que, se as infrações pretéritas são insignificantes, os fatos são atípicos e não há
crime.

11.6. Valoração pela autoridade policial


Em regra, quem aplica o princípio da insignificância é o juiz.
Questão: É possível que a autoridade policial aplique o princípio da insignificância?
Em relação a este questionamento, há duas correntes:
1ª) Não.
O STJ afirmou que essa função é exclusiva do Poder Judiciário (HC 154.949 – Informativo 441).
“A Turma concedeu parcialmente a ordem de habeas corpus a paciente condenado pelos delitos de
furto e resistência, reconhecendo a aplicabilidade do princípio da insignificância somente em relação
à conduta enquadrada no art. 155, caput, do CP (subtração de dois sacos de cimento de 50 kg,
avaliados em R$ 45). Asseverou-se, no entanto, ser impossível acolher o argumento de que a referida
declaração de atipicidade teria o condão de descaracterizar a legalidade da ordem de prisão em
flagrante, ato a cuja execução o apenado se opôs de forma violenta. Segundo o Min. Relator, no
momento em que toma conhecimento de um delito, surge para a autoridade policial o dever legal de
agir e efetuar o ato prisional. O juízo acerca da incidência do princípio da insignificância é realizado
apenas em momento posterior pelo Poder Judiciário, de acordo com as circunstâncias atinentes ao
caso concreto. Logo, configurada a conduta típica descrita no art. 329 do CP, não há de se falar em
consequente absolvição nesse ponto, mormente pelo fato de que ambos os delitos imputados ao
paciente são autônomos e tutelam bens jurídicos diversos” (STJ. HC 154.949/MG. Rel. Min. Felix
Fischer. DJ 03/08/2010).

2ª) Sim.
A autoridade policial pode aplicar no princípio da insignificância desde que o faça de forma
fundamentada.
Os que entendem ser possível, defendem que a natureza jurídica do princípio da insignificância
possibilita tal aplicação, já que o fato é atípico.

11.7. Insignificância imprópria ou bagatela imprópria

Exemplo de insignificância imprópria: ocorrência de furto simples. Instaura-se ação penal contra o
agente e, por algum motivo, essa ação fica 4 anos em trâmite e, após esse período, há a audiência de
instrução e julgamento.
O juiz constata que a pena não terá nenhuma função social no caso concreto, pois o furto foi um fato
isolado e o agente, no período de 4 anos, não cometeu mais nenhum “deslize”. Assim, o juiz deixa de
condenar o agente em razão da desnecessidade da pena.

O princípio da bagatela imprópria funciona como causa supralegal de extinção da punibilidade.


O fundamento para aplicação deste princípio está no art. 59, caput, do Código Penal:
CP, art. 59: “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade
do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da
vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

12. Princípio da proibição do “bis in idem” (ne bis in idem)


Este princípio ressalta que o Direito Penal não admite a dupla punição pelo mesmo fato.
Está previsto no art. 8º, 4, Pacto de São José da Costa Rica:
Art. 8º, 4, do Pacto de São José da Costa Rica: “O acusado absolvido por sentença transitada em
julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos”.
✓ O Pacto de São José da Costa Rica foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo
Decreto nº 678/1992.

Súmula 241, STJ: “ A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e,
simultaneamente, como circunstância judicial”.
✓ Observação: a circunstância judicial citada na súmula é o mau antecedente.

Para entender a Súmula 241 do STJ, imagine o caso em que o agente tem uma única condenação
definitiva. Se essa condenação definitiva caracterizou reincidência, ela não pode, ao mesmo tempo,
ser usada como circunstância judicial desfavorável (mau antecedente), pois isso caracterizaria bis in
idem.
Entretanto, se o agente possui duas (ou mais) condenações definitivas, a primeira delas será usada
como reincidência (agravante genérica) e as demais podem ser usadas como maus antecedentes.

EVOLUÇÃO DOUTRINÁRIA DO DIREITO PENAL

1. Funcionalismo penal
1.1. Introdução
Funcionalismo penal é um movimento doutrinário que surge na Alemanha na década de 1970 e,
posteriormente, irradia seus efeitos pelo mundo todo. Este movimento se propõe a discutir qual é a
função do Direito Penal na sociedade.
✓ Não há um único funcionalismo penal, mas diversos. O professor ressalta que não há um conceito
exato do funcionalismo penal, pois cada estudioso tem um modo de pensar diverso sobre esse
assunto.
✓ Quando a prova não fizer diferenciação sobre a qual funcionalismo ela se refere, deve ser tomado
como base o funcionalismo de Claus Roxin.

1.2. Características fundamentais do funcionalismo penal


Apesar de haver vários funcionalismos, é possível traçar algumas características uniformes:
a) Proteção do bem jurídico: o Direito Penal só é legítimo na exata medida em que protege o bem
jurídico.
b) Flexibilidade na aplicação do Direito Penal: os operadores do direito penal têm uma margem
para aplicar ou deixar de aplicar a lei. O funcionalismo afirma que a lei é mero ponto de partida, que
não engessa, não vincula a atuação do aplicador do direito.
Essa característica se relaciona com a primeira e significa que o Direito Penal deve ser usado de
modo mais flexível.
c) Prevalência do jurista sobre o legislador: de acordo com o funcionalismo, o jurista possui um
papel mais importante de que o legislador no Direito Penal. A lei não tira do jurista, no caso
concreto, a liberdade de ação.

O funcionalismo pode ser verificado, por exemplo, no princípio da insignificância, já que há casos
em que o bem jurídico não está em perigo, não sofre lesão de modo expressivo. Assim, neste caso, a
lei não precisa ser aplicada a qualquer custo, há uma ponderação feita pelo jurista.

1.3. Espécies
Há duas espécies principais:

Funcionalismo moderado, dualista ou de política criminal ou racional teleológico (Claus


Roxin):

* Este funcionalismo é considerado moderado por defender que o Direito Penal tem limites: aqueles
impostos pelo próprio Direito Penal, pelos demais ramos do Direito e também pela sociedade.
* Roxin afirma que o funcionalismo é dualista, pois convive em harmonia com outros ramos do
direito.
* Por fim, o funcionalismo de Roxin é de política criminal, ou seja, é mais um instrumento a serviço
da sociedade. Assim sendo, o Direito Penal é aplicado em sintonia com os anseios da coletividade a
que ele se destina.
* É também denominado de racional, pois é Direito Penal guiado pela razão e pelo equilíbrio. É
teleológico porque possui uma finalidade: ajudar a sociedade a enfrentar os seus problemas.

Para Roxin, é o Direito Penal que tem que se adaptar à sociedade. Ele está a serviço da sociedade,
para que ela resolva seus problemas

b) Funcionalismo radical, monista ou sistêmico: Günther Jakobs

* Ele e o criador do direito penal do inimigo.


É considerado radical, porque o Direito Penal, segundo Jakobs o direito penal só deve respeitar os
limites que lhe são impostos pelo próprio Direito Penal.
* É monista, pois o Direito Penal tem um sistema próprio de regras e valores que independe dos
demais, que não dialoga com os demais ramos do direito.
* É sistêmico, pois o Direito Penal é um sistema autônomo, autorreferente e autopoiético.
- é autônomo porque o direito penal dita suas próprias regras.
- é autorreferente porque todos os seus conceitos e definições são encontradas nele próprio, no
próprio direito penal.
- é autopoiético porque o direito penal se renova por conta própria. Ao perceber que há institutos
ultrapassados, o direito penal descarta. Se precisar criar novos institutos, ele faz por conta própria.

Jakobs se baseia muito na teoria dos sistemas de Luhmann.

b.1) autônomo: tem existência independente dos demais.


b.2) autorreferente: todos os conceitos e definições de que o Direito Penal precisa são encontrados no
próprio Direito Penal.
b.3) autopoiético: o Direito Penal se renova por conta própria.
Jakobs defende que a função do Direito Penal é a proteção da norma penal. O papel do Direito Penal
é punir e aplicar a norma penal de forma severa e reiterada. O Direito Penal só adquire autoridade
quando, dentro do seu âmbito de validade, a norma penal é aplicada de forma severa e reiterada. Para
Jakobs, é a sociedade que tem que se adaptar ao Direito Penal.

2. Direito de Intervenção
O direito de intervenção ou intervencionista é uma proposta do penalista alemão Winfried Hassemer,
que defende que o Direito Penal está sobrecarregado e, portanto, tem pouca ou nenhuma utilidade
prática. Assim, este estudioso propõe a diminuição do alcance do Direito Penal.

- Hassemer afirma que muitas condutas levadas para o Direito Penal não deveriam estar nesse ramo
do direito. Assim como se busca resolver tudo através do Direito Penal, ele acaba não conseguindo
resolver nada. Ele propõe que parte do que está no Direito Penal seja levada para um novo ramo do
direito, pode ser transferido para o “Direito de Intervenção”, que não tem natureza penal e é aplicado
pela Administração Pública.
- Hassemer pretende reduzir o alcance do direito penal.
- Segundo ele, devem ficar no Direito Penal apenas o núcleo fundamental, ou seja, os crimes de dano
e de perigo concreto contra bens jurídicos individuais (núcleo fundamental do Direito Penal). Já os
crimes de perigo abstrato e crimes em geral contra bens jurídicos difusos e coletivos perdem a
natureza de Direito Penal e vão para o Direito de Intervenção.
Em suma:
✓ O Direito de Intervenção não tem natureza penal e, portanto, não é aplicado pelo Poder Judiciário,
mas sim pela Administração Pública.
✓ O Direito de Intervenção se parece com o chamado “Direito Administrativo Sancionador”.
Ex.: uma empresa que está jogando dejetos poluidores em um rio. O Direito penal não sabe enfrentar
isso. Ele vai investigar, essa investigação será longa, e, até lá, o rio já está morto, sem peixes,
pessoas prejudicadas, etc. Seria mais fácil a Administração Pública agir por conta própria, por
exemplo, caçando licenças, interditando a empresa, aplicando multa, etc. Isso seria muito mais
eficaz, e o direito de intervenção faria muito melhor que o Direito Penal.

Você também pode gostar