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Filosofia 11º -Ensaio Filosófico

Afonso Caldas nº1 | Bárbara Rosinha nº4 | Inês Silva nº10 | Pedro Ventura nº20 | Rita Lourenço nº21

Será que a inutilidade pode realmente ser útil?

-O problema da inutilidade procura descobrir se as ações inúteis podem ter uma verdadeira
utilidade ou não. Este problema é relevante na medida em que, a tentativa de o responder
ajuda-nos a compreender melhor se as ações que realizamos no nosso dia a dia são de facto
úteis ou se estamos a desperdiçar o nosso temo com coisas inúteis.

Antes de mais, para responder a esta questão, iremos considerar que a utilidade é a
capacidade que as ações têm de proporcionar ao ser humano uma ajuda prática ou até mesmo
uma sensação de bem-estar e satisfação, que contribui para um objetivo final ou para o bem
comum. Sendo esta definição uma adaptação mais moderada da compreendida por Jeremy
Bentham e John Stuart Mill na sua teoria utilitarista. Já por inutilidade entende-se a ausência de
utilidade.

-Neste ensaio pretende-se defender a tese de que a inutilidade pode sim, ser útil e demonstrar
como e em que contextos esta ideia se verifica.

Em resposta a este problema, comecemos então por dividir as ações úteis em dois tipos:

As primeiras, são as ações intrinsecamente úteis, isto é, ações que são úteis em si mesmas
logo, úteis independentemente do seu agente: Ações como estudar, trabalhar, comer ou beber
água e outras ações biologicamente necessárias são ações intrinsecamente úteis uma vez que
são úteis para qualquer indivíduo.

Já as segundas, são as ações relativamente úteis, isto é, que sem um contexto não podem
ser globalmente classificadas como úteis, e que são geralmente consideradas inúteis, mas que
podem acabar por ter uma utilidade quando realizadas por um determinado agente.

Para suportar esta ideia iremos utilizar o «Argumento da subjetividade da utilidade das
ações » que consiste no seguinte: Partindo da ideia de que a utilidade de uma ação é a sua
capacidade de proporcionar prazer ou uma ajuda prática, uma ação amplamente considerada
inútil pode tornar-se útil quando realizada por um indivíduo que possa torná-la pratica ou
usufruir da mesma. Por este motivo, a utilidade de uma determinada ação pode ser
considerada subjetiva, uma vez que varia de pessoa para pessoa. Considerem o seguinte
exemplo:

O ato de assistir um jogo de futebol é, por si só, inútil, uma vez que não apresenta
propriamente uma utilidade prática nem pode ser considerado uma fonte de bem-estar para
todos os indivíduos. Contudo, se considerarmos que o agente é um jogador de futebol ou
simplesmente um entusiasta pelo desporto, a ação de assistir ao jogo pode tornar-se útil: O
jogador de futebol poderá aprender algo com o visionamento do jogo e aplicar o que aprendeu
nos seus próprios jogos. Deste modo, o ato de assistir ao jogo ganha uma utilidade prática para
este individuo. Neste mesmo sentido, mas de modo diferente, quando um adepto de futebol
assiste ao jogo esta ação proporciona-lhe bem-estar. Sendo assim, em ambos os casos, o
visionamento do jogo poderia ser considerado um ato relativamente útil.

Por outro lado, para uma pessoa que não joga nem aprecia futebol, a mera ação de assistir ao
jogo seria completamente inútil.

Concluindo, para que fique claro, o que se pretende neste argumento não é demonstrar que a
utilidade é um conceito aberto, pelo contrário! A utilidade é um conceito bem definido. O que
aqui se defende é que algumas ações, que quando fora de contexto aparentam não apresentar
qualquer utilidade, podem tornar-se úteis quando realizadas por um determinado agente que
possa usufruir das mesmas.

Agora que já definimos quais são os dois tipos de ações úteis é importante que nos
debrucemos sobre as “relativamente úteis” pois estas são aquelas que realmente importam
para a nossa tese, uma vez que são as tais coisas geralmente vistas como “inúteis” que por
trás têm uma grande utilidade:

Para suportar esta ideia apoiamo-nos no Argumento da necessidade pelo “inútil”.

Muitas vezes as ações que titulámos de relativamente úteis são erradamente tomadas por
inúteis, uma vez que não aparentam ter qualquer utilidade evidente.

Contudo, esta ideia é completamente incorreta. A maior parte dos indivíduos procura este tipo
de atividades “relativamente úteis” de forma espontânea, por exemplo quando sentimos
vontade de ver um filme ou até mesmo quando estamos a caminhar na rua e a nossa atenção
é subitamente captada pela arquitetura de um determinado edifício. A beleza de um edifício não
apresenta qualquer utilidade aparente, contudo qualquer pessoa, preferiria habitar num bairro
com vivendas novas e espaços verdes do que numa rua fechada e repleta de edifícios iguais
de cor acinzentada e sem qualquer beleza estética, portanto é correto afirmar que em geral
sentimos uma necessidade pelas coisas que aparentam ser inúteis, pois são estas mesmas
coisas que dão sabor à vida, e assim podemos considerar que o prazer é um bem essencial
para sermos felizes, sendo que, ser feliz pode ser considerado, tal como afirmava Aristóteles, a
finalidade da vida humana.

Em síntese, segundo este argumento existem duas razões pelas quais poderíamos considerar
úteis as ações que não apresentam uma utilidade específica. Primeiramente porque nos
proporcionam prazer e felicidade, que são considerados bens essenciais à vida, e em segundo
lugar porque as procuramos inconscientemente o que prova que necessitamos delas, logo se
estão a suprir uma necessidade, então são indubitavelmente úteis.

Para além dos exemplos até agora apresentados, até mesmo a simples escolha de não praticar
nenhuma ação, ao ficar parado apenas a pensar até chegar ao ponto de sentir tédio pode ser
considera uma ação útil. Mas como?

Tendo em conta que ninguém gosta de se sentir entediado sabemos desde já, que esta ação
não proporciona propriamente prazer ou bem-estar ao agente, então para ser de alguma forma
útil terá de revelar uma utilidade prática. Mas como é possível que o tédio possa de algum
modo ter uma utilidade prática? Para explicar esta ideia apoiamo-nos no argumento do
tédio a favor da inutilidade.

Antes de mais, o que é o tédio? A verdade é que não existe uma definição que consiga explicar
em concreto o que é este estado emocional tão complexo, mas de uma forma vaga pode ser
definido como aquilo que sentimos quando o nosso cérebro não se sente estimulado por nada
ao nosso redor num determinado momento.

Reparem que, nestes momentos em que sentimos tédio temos tendência para começar a
divagar não intencionalmente, quase como se esse vaguear cerebral fosse um mecanismo de
defesa natural contra o tédio. No início deste processo de divagação ocorrem-nos as coisas
mais urgentes da nossa vida, sejam elas coisas positivas, ou negativas, e à medida que
continuamos a divagar tocamos em tópicos e ideias cada vez mais distantes daquilo que
estamos a viver nesse instante.

Onde queremos chegar com este argumento é que todo este exercício mental tem um papel
importante: À medida que o pensamento se afasta do presente, vamos formando planos e
estratégias para o futuro e aprendendo com os erros do passado. Parte do propósito deste
pensamento é deixar que as nossas ideias morram em vez de nós: deparamo-nos com uma
situação e pensamos em formas de agir até que uma delas aparenta ser uma boa ideia,
descartando pelo caminho as que podem correr mal.
De certa forma, ser inútil ao ponto de sentir tédio serve de manutenção mental para reorganizar
as nossas ideias e saber o como agir em situações futuras, então este argumento demonstra
mais uma vez que algo que aparenta não ter utilidade pode ser de facto útil e neste caso até
intrinsecamente útil, uma vez que esta evolução mental com origem no tédio pode ter uma
utilidade prática para qualquer indivíduo racional que passe pelo processo.

Apesar desta teoria ser bastante bem estruturada surgem ao de cima duas principais objeções
que podem ser apresentadas pela tese oposta à nossa que defende que a inutilidade é de
facto totalmente inútil.

A primeira objeção advoga que a definição de ação relativamente útil é demasiado lata. Ao
afirmarmos que algo é útil, se proporciona prazer, então estamos a concordar que o uso de
drogas recreativas ou consumo de bebidas alcoólicas pode ser útil porque estas proporcionam
uma sensação de bem-estar temporária ao agente. Todavia, na realidade, estas ações não são
recomendadas pela maioria dos profissionais de saúde na medida em que não podem, de
nenhum modo, ser consideradas úteis para o agente que as realiza até porque põe em risco a
saúde do mesmo.

Em acréscimo, ações como o bullying em que o agente se sente melhor à custa do bem-estar
de outro indivíduo também não podem ser consideradas úteis mesmo que o agente sinta
prazer ao realizá-las, assim esta teoria é demasiado abrangente, uma vez que considera como
úteis, ações que priorizam o prazer do agente em troco da sua saúde ou do bem-estar de
outros indivíduos. Algo que é completamente inaceitável na nossa realidade.

A Segunda objeção critica o facto de a definição de utilidade apresentada pela nossa tese, ser
em parte redundante e pouco clara, uma vez que, uma das condições suficientes para algo ser
considerado útil é ter uma utilidade prática e assim estamos a definir o conceito de útil
recorrendo ao conceito de utilidade. Se o conceito de útil depende do conceito de utilidade e
vice-versa e nenhum dos dois é devidamente explicado então esta definição de utilidade é
insuficiente e não tem finalidade.

Para responder à primeira objeção à nossa teoria, iremos moldar a definição de arte escolhida
no início do ensaio de modo a remover do ramo das ações úteis, as ações prejudiciais à saúde
do indivíduo, bem como as ações que prejudiquem outros indivíduos. Assim passamos a
considerar que algo é útil apenas se tem a capacidade de proporcionar ao ser humano uma
ajuda prática ou até mesmo uma sensação de bem-estar e satisfação, que contribui para um
objetivo final ou para o bem comum, sem prejudicar a saúde do agente ou o bem-estar de
outros indivíduos, uma vez que a saúde é tal como a felicidade um bem primário e estes não
deve ser abdicados em função de qualquer outro bem, para além disso uma ação útil também
não pode provocar mal a outro indivíduo uma vez que a liberdade de um agente acaba quando
interfere com a liberdade de outro.

Respondendo agora à segunda objeção, iremos clarificar o que se entende por utilidade
prática: Podemos dizer que uma ação tem uma utilidade prática, ou que proporciona uma ajuda
prática. quando essa ação é bem-sucedida ao cumprir uma determinada função que lhe foi
atribuída em primeiro lugar, num determinado contexto e assim a nossa definição de utilidade
deixa de ser circular.

-Para concluir, apesar de ser um pouco controverso, até mesmo em termos éticos, afirmar que
a inutilidade pode ser útil, com a moldagem da definição de utilidade para uma versão mais
restrita conseguimos, excluir os maus hábitos e os atos que prejudicam outros indivíduos do
ramo das ações relativamente úteis tornando a nossa definição mais plausível e aumentando a
sua afinidade à realidade.

Assim, após todas as considerações podemos concluir que a utilidade da inutilidade existe, e
que a nossa tese se destaca na medida em que nos permite compreender a importância que as
ações por vezes consideradas em erro como inúteis têm para a existência humana, até porque
é esta mesma importância que damos às “ações inúteis” que nos torna realmente humanos e
nos distingue das restantes espécies que habitam o nosso planeta.

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