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MÁQUINAS

ELÉTRICAS I

Vinícius Novicki Obadowski


Motor CA: campo
magnético girante
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar as características construtivas de uma bobina.


„„ Definir campo magnético.
„„ Descrever o campo magnético girante.

Introdução
As aplicações das máquinas elétricas são encontradas em bombas, ele-
vadores condominiais, esteiras transportadas, escadas rolantes e uma
infinidade de aplicações. A invenção dos motores elétricos, tanto de
corrente contínua (CC) como de corrente alternada (CA), permitiu ao
homem galgar novos horizontes, aprimorando processos industriais
e a produtividade em geral. Toda essa evolução foi possível graças à
percepção da interação entre os campos elétricos e magnéticos, cujo
resultado é a produção de uma força mecânica. Com base nesse simples
fundamento, o projeto dos primeiros motores foi possível.
Ao longo deste capítulo, você verá conceitos básicos referentes ao
campo magnético que fundamentarão seu estudo para plena compreen-
são de como os motores funcionam internamente.
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Características construtivas de uma bobina


Construtivamente, uma bobina pode ser um fio condutor arranjado em um
formato de circular. A Figura 1, a seguir, apresenta um simples fio de cobre
arranjado em formato circular, servindo como uma representação simbólica
de uma bobina. Neste exemplo visual, você pode perceber que há um conjunto
de espiras que compõe a bobina em si. É muito importante que você se atente
a essa diferenciação.

Figura 1. Fio de cobre arranjado como uma espira.


Fonte: Pixel Enforcer/Shutterstock.com.

Além disso, quando se fala em máquina elétrica, seja ela um motor ou


gerador, você ouvirá mais frequentemente o termo enrolamento para se
referir ao conjunto de bobinas que está assentado nas ranhuras do estator das
máquinas, conforme Figura 2. Normalmente, você escutará a palavra bobina
relacionada ao contexto de manutenção corretiva das máquinas quando o
profissional especializado efetuará uma rebobinagem do motor/gerador. Essa
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diferenciação entre espira, bobina e enrolamento é importante ser evidenciada


antes dos detalhes construtivos, para que você tenha noção adequada da no-
menclatura mais frequentemente adotada na indústria. Naturalmente, podem
existir pequenas diferenças em função de locais e regiões nos termos, porém
você, como engenheiro, deve estar atento ao significado formal de cada um,
pois muitas situações podem referir-se a um dos componentes.

Figura 2. Eletricista fazendo a “rebobinagem” do estator de um motor elétrico.


Fonte: Parmna/Shutterstock.com.

Em termos de características de construção, uma bobina deve ser com-


posta por um número determinado de espiras pelo projetista da máquina, em
que as espiras (e a bobina como um todo) são compostas por fio de material
condutor elétrico. As propriedades de condução apresentam grande relevância
na determinação da resistência do estator, parâmetro que será utilizado na
estimativa de perdas da máquina e de dissipação térmica que ocorrerá durante
seu funcionamento.
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O material mais comum para fios condutores é o cobre. Isso decorre de sua alta capa-
cidade de condução. Porém, a adoção de um material depende de fatores que vão
além de suas propriedades elétricas — por exemplo, o alumínio pode ser adotado em
função de sua aplicação. Mais detalhes podem ser obtidos junto a Condutores... ([20--?]).

Outro ponto que merece destaque é a isolação utilizada no fio, pois, em uma
bobina, normalmente são empregados fios com isolação entre eles, a fim de
evitar curtos entre os enrolamentos da máquina e sua carcaça (que tipicamente
também é condutora de eletricidade). Complementarmente, a qualidade dessa
isolação é fator determinante para procedimentos de manutenção.

Embora as características físicas do fio condutor sejam relevantes para determinação


da bobina, outros tipos de informações, como o passo das bobinas em um estator
ou a técnica de enrolamento delas no estator ou no rotor, apresentam mais relevân-
cia quando avaliadas do ponto de vista de construção da máquina elétrica (RAJINI;
NAGARAJAN, 2018).

Outro ponto importante que deve ser conhecido é que as bobinas são os
componentes indispensáveis de motores elétricos, podendo estar tanto no
estator como no rotor da máquina. O estator é a parte “estática” da máquina,
fixa à carcaça (Figura 3), enquanto que o rotor é o nome dado ao eixo do
motor. Coloquialmente, o rotor do motor de indução é também chamado de
induzido, pois nele surgem tensões induzidas oriundas do campo magnético,
o qual será abordado também mais à frente.
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Campo magnético
Conforme apontado na introdução deste capítulo, a interação do campo elé-
trico e do magnético produz força. Se você considerar a questão do motor
e da aplicação de força mecânica ao eixo, perceberá que há a produção de
torque. Porém, para que você possa definir o fenômeno, não basta que saiba
conceitualmente o que ocorre, devendo ser capaz, também, de calcular o
campo magnético para, assim, ter a percepção da influência do magnetismo
na produção de conjugado no eixo.
A lei de Ampère, equação (1), define a produção de um campo magnético.

∮ H ∙ dl = Ilíq (1)

onde H é a intensidade de campo magnético produzida pela corrente líquida


Ilíq, e dl é um elemento diferencial de comprimento ao longo da superfície de
integração. Em unidades do Sistema Internacional, a corrente é dada em ampè-
res (A), e H , em ampères-espira por metro (Aesp ∙ m–1). A fim de exemplificar
como essa equação pode ser aplicada, considere o núcleo ferromagnético
simples apresentado na Figura 3.

i


N espiras

Área de seção
reta A
ln

Comprimento do caminho
médio do núcleo ln

Figura 3. Núcleo ferromagnético simples (estator sendo rebobinado).


Fonte: Chapan (2013).
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Embora seja um núcleo ideal, muito distinto de um motor CA, ele se presta
perfeitamente para explicar o conceito, pois, como você pode perceber, há
um conjunto de N espiras (uma bobina) enrolado em um núcleo ferromag-
nético. Supondo que não há espaços de ar entre as espiras e o núcleo, todo o
campo magnético produzido pela corrente (i) ficará contido nesse núcleo. No
exemplo, o caminho de integração é o comprimento médio do núcleo, que
vale ln, e a corrente líquida envolvida por esse caminho é Ni. Resolvendo a
equação (2), tem-se:

Hln = Ni (2)

Na equação (2), H é o módulo do vetor intensidade de campo magnético,


seus sentido e direção são obtidos por meio da regra da mão esquerda, con-
forme a Figura 4, a seguir.

Figura 4. Aplicação da regra da mão esquerda para uma bobina. O polegar indica o sentido
do polo norte do eletroímã.
Fonte: Emre Terim/Shutterstock.

Portanto, isolando H na equação (2), obtém-se:

Ni (3)
H=
ln
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Lembre-se, também, de que, na equação (1), há um produto escalar do vetor intensidade


de campo magnético e do vetor diferencial de comprimento. Considerando o caminho
adotado para o núcleo, percebe-se que, em todo o momento, os dois apresentam a
mesma direção e o mesmo sentido. Logo, seu produto é apenas o da magnitude deles.

Outro ponto de vista, apresentado por Chapman (2013), é que o campo


magnético H pode ser entendido como o “esforço” que uma corrente faz para
estabelecer um campo magnético em certo meio. Sugerindo que a intensidade
de campo depende de características do material em que ele se encontra, leva-
-nos a deduzir a presença de um vetor densidade de campo magnético B.

B = μH (4)

onde μ é a permeabilidade magnética do material, isto é, o parâmetro que


indica o quão fácil é ou não estabelecer um campo magnético em um dado
material.

A recíproca dessa equação também é verdadeira! Se um conjunto de espiras for


submetido a um campo magnético, surgirá, naquela bobina, uma corrente elétrica.
Esse é o princípio eletromagnético do transformador de corrente alternada. Mais
detalhes podem ser obtidos nas referências Bim (2009), Chapman (2013) e Umans (2014).

Esses parâmetros são importantes para que você conheça como se esta-
belece o campo magnético em qualquer material ferromagnético. As máqui-
nas elétricas utilizam esse princípio para seu funcionamento, extrapolando
o exemplo do núcleo simples apresentado na Figura 3. Considerando uma
máquina corretamente bobinada, ao alimentarmos com corrente alternada,
surgirá um campo magnético no centro do motor. E esse campo interagirá
com o rotor da máquina. Se o rotor da máquina for de imãs permanentes,
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ele tentará alinhar-se, isto é, girar até que as linhas de campo do rotor e do
estator alinhem-se. Contudo, para que o motor mantenha o giro, é necessário
que um dos campos magnéticos esteja em movimento. Caso contrário, após
se alinharem, o rotor simplesmente pararia.
A próxima seção discutirá essa particularidade dos motores CA com maiores
detalhes.

Campo magnético girante


A definição de campo girante pode parecer confusa à primeira vista, porém,
conforme apontado no final da seção anterior, nada mais é que uma condição
fundamental para que o giro dos motores aconteça. Para abordar essa expli-
cação de uma forma mais simples, basta que você imagine dois imãs: eles
se repelem quando polos iguais são aproximados e se aproximam no caso de
polos distintos.
Essencialmente, uma máquina elétrica faz a mesma coisa. Para tornar essa
visualização simples, considere um rotor composto por imãs permanentes,
isto é, um rotor em que o polo norte e o polo sul são fisicamente estabele-
cidos e, portanto, imutáveis. Se produzirmos pelo estator — artificialmente
— um campo magnético, como na descrição feita na seção anterior, sob o
rotor, ele se deslocará de forma a se alinhar ao campo magnético artificial.
Obviamente, em um dado momento, o rotor se alinhará de fato ao campo e
cessará seu movimento quando ocorrer esse alinhamento. Porém, se o campo
magnético artificial produzido pelo estator deslocar-se, o rotor continuará
com seu movimento.
Daí surge o conceito de campo girante. Para que o rotor gire, é necessário
que ele busque permanentemente o alinhamento com o campo magnético
artificial produzido pelo estator. Na prática, esse alinhamento nunca acontece
— caso contrário, o rotor pararia seu movimento.
Essa explicação mais simples aplica-se a quaisquer máquinas elétricas,
tanto as de corrente contínua como as de alternada. Porém, para esse tipo de
máquina, é necessário que o projetista desenvolva meios que façam com que
o campo magnético artificial “gire” — caso contrário, a máquina teria uma
aplicação bastante restrita.
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Existem máquinas elétricas que utilizam a ideia de empregar essa capacidade de


alinhamento para realizar tarefas específicas, como as de posicionamento preciso.
O conceito para a rotação nessas aplicações é que o controle do motor aguarda o
alinhamento do rotor ao campo artificial imposto pelo estator e pare com o movimento.
Mais detalhes sobre esse tipo de máquina podem ser obtidos no apêndice do livro
de Chapman (2013).

Dada a explicação do porquê da importância do campo girante para uma


máquina elétrica, você deve compreender a fundamentação matemática para
um campo girante em máquina CA.

Neste capítulo, o foco é dado apenas às máquinas de corrente alternada e a como o


campo girante é estabelecido nelas. As máquinas de corrente contínua usam o mesmo
conceito, porém a rotação do giro é feita de forma distinta e bastante particular.

Retomando as equações da seção anterior sobre campo magnético, você


sabe que a intensidade de campo magnético é uma função da corrente, do
número de espiras e do diferencial de comprimento do caminho de integração.
Tem conhecimento, também, de que, para um motor CA, o comprimento do
caminho de integração é um valor constante, bem como do número de espiras
— somente a corrente elétrica é que varia no tempo. Logo, pode-se dizer que,
um motor com enrolamentos de N espiras, submetidos a correntes trifásicas
equilibradas – equações (5), (6) e (7) – apresenta um campo magnético dado
pelas equações (8), (9) e (10).
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Iaa´ = Imsen(ωt) (5)


Ibb´ = Imsen(ωt – 120º) (6)
Icc´ = Imsen(ωt – 240º) (7)
N
Baa´ = I ∠0º = Bmsen (ωt)∠0ºt (8)
ln aa´
N
Bbb´ = I ∠120º = Bmsen (ωt – 120º)∠120º (9)
ln bb´
N
Bcc´ = I ∠120º = Bmsen (ωt – 240º)∠240º (10)
ln cc´

É importante que você perceba que cada um dos campos, Baa´, Bbb´ e Bcc´,
apresenta um ângulo próprio além da defasagem imposta pela corrente elé-
trica. Esse valor de ângulo deve-se em função da regra da mão direita, que
diz respeito a uma corrente elétrica em uma bobina, que produz um campo
no sentido indicado pelo polegar.
Na Figura 5a, há a representação completa com todas as fases das bobinas
e dos vetores de campo magnético, enquanto que, na Figura 5b, são mostrados
detalhes apenas do campo gerado pela fase a, de forma a representar a regra
da mão direita.

a´ a´
y

Hbb´
c b c b
Bbb´(t) Haa´(t)
x x
Baa´(t) Haa´(t)
Bcc´(t)
Hcc´(t)
b´ c´ b´ c´

a a

(a) (b)

Figura 5. (a) Estator trifásico simplificado com indicação das bobinas onde entram e saem
as correntes de cada fase, e vetores intensidade e densidade de campos magnéticos.
(b) Representação apenas da intensidade de campo magnético produzido pela bobina da fase a.
Fonte: Chapman (2013, p. 161).
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Com base na Figura 5, é possível identificar que há três campos simultâneos


sob o rotor, e cada um deles tem uma direção distinta. Logo, é necessário
estimar o campo magnético líquido, que nada mais é do que a soma dos três
campos apresentados pelas equações (8), (9) e (10).

Blíq(t) = Baa´(t) + Bbb´(t) + Bcc´(t) (11)

Blíq(t) = Bmsenωt∠0º + Bmsen(ωt – 120º)∠120º + Bmsen(ωt – 240º)∠240º (12)

A partir da equação (12), utilizando as regras para fatores e identidades


trigonométricas, é possível demonstrar que o campo magnético líquido para
uma máquina trifásica equilibrada é dado pela equação (13).
→ →
Blíq(t) = 1,5Bm [sen(ωt) i – cos(ωt) j ] (13)

→ →
onde i e j são vetores unitários na direção do eixo x e do eixo y,
respectivamente.
Com essa equação final, percebe-se que o valor do módulo do campo
magnético independe do valor de ωt e que o ângulo final do vetor, sim, varia
com o tempo.
Com isso, você pôde, ao longo deste capítulo, aprender mais sobre caracte-
rísticas das bobinas, o campo magnético produzido por elas quando percorridas
por uma corrente elétrica e o conceito de campo girante, fundamental para
entendimento de como as máquinas elétricas CA funcionam.

BIM, E. Máquinas elétricas e acionamento. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. 455 p.


CHAPMAN, S. J. Fundamentos de máquinas elétricas. 5. ed. Porto Alegre: AMGH; Book-
man, 2013. 700 p.
CONDUTORES de baixa tensão. In: Eletrotécnica geral. [S. l.: S. n.], [20--?]. p. 201–214.
Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=78807%0A%0A.
Acesso em: 15 mar. 2019.
RAJINI, V.; NAGARAJAN, N. V. Electrical machine design. Chennai: Pearson India, 2018. 648 p.
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UMANS, S. D. Máquinas elétricas de Fitzgerald e Kingsley. 7. ed. Porto Alegre: AMGH;


Bookman, 2014. 728 p.

Leituras recomendadas
INSTALAÇÕES Industriais - Aula 03 - Motores CC e CA. [S. l.: S. n.], 2018. 1 vídeo (27
min 45 s). Publicado pelo canal UNIVESP. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=KZTmeBxk1dY. Acesso em: 15 mar. 2019.
KUNDUR, P. Power system stability and control. New York: McGraw-Hill, 1994. 1176 p.

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