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Juliana Valentini

Lidiane de Carvalho Alves


(ORG.)

Cᴏʀᴘᴏs ᴅɪssɪᴅᴇɴᴛᴇs
As ᴍᴜʟʜᴇʀᴇs ɴᴀ ʜɪsᴛóʀɪᴀ ᴅᴏ Bʀᴀsɪʟ

COLETÂNEA
Pequenos Historiadores
O choro das oprimidas. Imagem produzida por Matheus Roberto Dapper, membro da equipe, em 02/06/2022.

RESUMO
Este material didático foi elaborado por estudantes dos cursos técnicos de nível médio do
campus de Capanema do Instituto Federal do Paraná, vinculados ao projeto ensino "Análise
de fontes no ensino de História do Brasil" e ao projeto de extensão “Bicentenário da
Independência do Brasil e sobre as lutas das mulheres no Brasil”. Por meio destas produções,
os participantes concorreram na etapa final da 14º Olimpíada Nacional de História do Brasil,
edição de 2022. As análises produzidas pelos estudantes tratam das lutas e resistências das
mulheres a partir de uma abordagem histórica das condições desvantajosas que as mulheres
enfrentaram no passado e enfrentam até os dias atuais. Ademais, esta ferramenta didática
busca problematizar os preconceitos enfrentados no processo de escolarização ou no ambiente
de trabalho e às lutas e conquistas advindas da organização e das resistências. Assim como
buscam dar visibilidade aos movimentos, as formas pelas quais as mulheres se organizaram e
lutam por igualdade em suas práticas cotidianas, atuando como sujeitos de sua própria
história. Convidamos todas, todos e todes a nos acompanhar nessa reflexão.
Sumário

1 TRANSCENDER PARA COMPREENDER 3


1.1 DEBATENDO O TEMA 5
2 DESIGUALDADES DE GÊNERO AO LONGO DA HISTÓRIA DO BRASIL 6
3 UMA HISTÓRIA DE LUTAS E CONQUISTAS DO MOVIMENTO FEMINISTA 9
4 GÊNERO, RAÇA E CLASSE: MITO DA BELEZA E SUA INFLUÊNCIA NA
REPRESENTATIVIDADE DAS MULHERES 11
5 AS LUTAS PELO ACESSO DEMOCRÁTICO AO ENSINO NO BRASIL 13
5.1 DEBATENDO O TEMA 16
6 AS MÍDIAS DIGITAIS COMO INSTRUMENTO DE COMBATE AO MACHISMO
16
quê?" é o que você me pergunta. A resposta é
1 TRANSCENDER PARA simples: um crime de ódio. Sua personagem
COMPREENDER é uma mulher transexual. O que ocorreu com
ela, acontece quase que diariamente pelo
Equipe ‘CPI da história’, formada pelos
Brasil. Você considera isso justo? Essa
estudantes: Erica dos Santos, Matheus Dapper
e Rhayssa Dylbas dos Santos, sob orientação pergunta eu lhe ajudo a responder. Não, não
de Juliana Valentini.
é. Mesmo assim, nosso país é o que mais
mata pessoas transexuais no mundo.
Assim, dá-se início a nossa viagem
ao passado, para apresentar a você o
contexto histórico em que viviam as
mulheres trans e travestis.
Antes da vinda dos europeus para a
América, alguns povos nativos, como os
astecas e povos norte-americanos
acreditavam haver 4 gêneros, não somente
os tradicionais - feminino e masculino.
Esses pensamentos foram repreendidos e
exterminados pelos colonizadores por
considerarem atos impuros e imorais.
Dessa forma, o pontapé inicial foi dado
para a criação de vários preconceitos
presentes até hoje.
Queem é a próxima?Imagem produzida por Matheus Avançando um pouco mais no tempo,
Roberto Dapper, membro da equipe, em 02/06/2022. apresento-lhe a época da ditadura. É de
conhecimento geral que o golpe de 1964
implementou uma ditadura que perseguiu
Imagine, caro leitor, uma
artistas, escritores, políticos, gays, lésbicas,
personagem. Ela tem a cor de pele, cabelo e
transexuais e qualquer um que atentasse
olhos do jeito que você desejar. Pense nessa
contra “a moral e os bons costumes”. Isso
mulher andando pela rua, trabalhando e
não foi diferente com sujeitos que
vivendo normalmente, sendo feliz. Um dia,
denunciavam, por meio de seu trabalho, a
porém, é agredida. Dor, lágrimas, sangue,
opressão sofrida pela comunidade
hematomas, uma vida quase encerrada. "Por

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LGBTQIA+. Esse grupo viveu com medo de Elizabeth II, em 1968, essa segregação se
diferentes tipos de tortura, registros indicam intensificou. Nesse contexto, o delegado
que ao sair de casa, portava giletes com o Wilson Richetti, em vários noticiários,
intuito de se cortar se fosse capturado; evidenciou o seu objetivo de “higienizar” a
considerando que naquele momento os cidade, comandando a “Operação Tarântula”
policiais teriam medo de se "contaminar'' e a “Operação Arrastão”, que visavam a
com o sangue dele. Isso não parece verdade, retirada de travestis e mulheres trans do
certo? A história é manchada por sangue centro de São Paulo.
inocente, opiniões distintas e dor; em O século XXI chegou e com ele
contraponto, a luta e a resistência permitiram algumas mudanças. Em 29 de janeiro de
avanços, ainda que poucos, para a construção 2004, foi instituído o Dia da Visibilidade
de uma narrativa mais justa. Trans - grande conquista para a comunidade.
Além disso, ocorreram alguns fatos que
devem ser ressaltados, como por exemplo, a
aceitação do nome social; a autorização para
que pessoas trans mudassem o nome e o
gênero direto no cartório, sem precisar obter
autorização judicial; ainda, nas eleições de
2018, houve mais de 50 candidaturas trans
para o legislativo federal; no mesmo ano, o
Conselho Federal de Psicologia estabeleceu
novas normas para a eliminação da transfobia

Nessa perspectiva, podemos perceber e do preconceito; em 2019, com a nova

que a violência sempre esteve presente no edição do CID (11), a transexualidade é

corpo social, pois, indivíduos, principalmente excluída da categoria de transtornos mentais.

os com grande influência e poder, negavam e Essas adequações deveriam entrar em vigor

repudiavam tudo o que era diferente. Um até 1° de janeiro de 2022. Foram muitas as

exemplo disso ocorreu nas décadas de 1960, realizações dignas de menção, mas será que

1970 e 1980, período em que a polícia são suficientes para comemorar?

militar, principalmente a de São Paulo, O Brasil é o país que mais mata

tentava “limpar” a cidade da presença de indivíduos transexuais no mundo. Nos dados

pessoas transgêneros e travestis, isolando-as das violência contra pessoas trans, fornecidos

nas periferias. Com a vinda da Rainha pela maioria dos veículos de informação e

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coleta de dados, não há especificação de
gênero, isto é, se são mulheres ou homens Por fim, caro espectador, quero lhe
trans. Dessa maneira, já há uma deixar uma mensagem: transcenda-se! Ajude
generalização da comunidade e não deveria nos movimentos e na resistência. Os dados
ser assim. Os direitos previstos na são alarmantes, a transformação é necessária
constituição são para todos os brasileiros, não para que haja a construção de uma sociedade
só para alguns. O sangue das mulheres mais justa para todas as pessoas, não somente
transexuais brasileiras mancha a história cada para um grupo seleto. Eleve-se além dos
vez mais: são corpos injustiçados, que não preconceitos e mantenha a mente aberta.
conseguiram ajuda, são muitas Dandaras e Obrigada pela sua atenção.
Alices, porém nem todas são reconhecidas.
Sim, todos os avanços são dignos de
1.1 DEBATENDO O TEMA
reconhecimento; contudo, é necessário
lembrar o quão difícil é o acesso para as
mulheres trans, seja no que diz respeito à Ao longo da história, as pessoas que
possuíam identidade de gênero e
educação, ao mercado de trabalho, à saúde, orientação sexual diferente do padrão
entre outros. Elas são vítimas de violências sempre foram criminalizadas. Isso só mudou,
recentemente, a partir dos anos 2000, ao
diárias e a mudança é lenta. São anos lutando menos no Brasil.
por poucos avanços e a dor prevalece a cada
Lembrando que a identidade de
soco, tiro, tapa recebidos por uma mulher gênero diz respeito ao modo como o
transexual. indivíduo se percebe em relação ao
seu gênero. Já a orientação sexual, refere-se
ao desejo afetivo, sexual e romântico ou não
que uma pessoa tem pela outra.

A violência e a hostilidade estiveram


presentes em todos os cenários
possíveis para as mulheres
transexuais e travestis, mas na
contemporaneidade houveram avanços que
têm contribuído na redução das
desigualdades. Mesmo assim, a luta continua.

A luta das mulheres transexuais e


travestis esteve marcada pelas
especificidades do contexto histórico.
Imagem: TRANScenda-se. Imagem produzida por Apesar das produções recentes sobre o tema,
é necessário vozificar aqueles os
Matheus Roberto Dapper, membro da equipe, em
silenciamentos produzidos pela história
02/06/2022. oficial.
reconhecimento das mesmas. Além de
O Brasil é o país que mais mata
transpassarem inúmeros obstáculos sociais,
pessoas trans no mundo. Isso
demonstra que a luta é constante, haja que estão em menor intensidade presentes na
vista que, desde a colonização até hoje são
vida do homem, foram descreditadas e
oprimidos. #TRANScendase #lgbtqia
diminuídas pela sociedade patriarcal.
Referências
As mulheres ainda enfrentam
inúmeros obstáculos para alcançarem seus
DE SEGURANÇA PÚBLICA, Anuário Brasileiro.
Disponível em: https://forumseguranca. org. br/wp- objetivos e serem devidamente creditadas,
content/uploads/2021/07/anuario-2021-completo-v6-
bx. Pdf. Acesso em, v. 24, 2021.
por isso, serão discutidas as origens dessa
OLIVEIRA, Claudia Freitas. A homossexualidade desigualdade de gênero no Brasil.
feminina na história do Brasil: do esforço de
construção de um objeto histórico ao desdobramento É importante pontuar que os povos
na construção da cidadania. Disponível
em:<https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/20169/1/ indígenas, em sua cultura originária,
2015_art_cfoliveira%281%29.pdf>. Acesso em: 31
mai. 2022. enxergavam a mulher como companheira e
OLIVEIRA, Francine. Eram os Indígenas
trangêneros?. Disponível
atribuíam igual valor ao trabalho de ambos os
em:<https://outraspalavras.net/outrasmidias/eram-os- gêneros, logo não viam motivos para o lapso
indigenas-transgeneros/>. Acesso em: 02 jun. 2022.
SMITH, Andreza do Socorro Pantoja de Oliveira. de oportunidades e igualdade que o europeu
Direitos Humanos de Grupos Diferenciados.
Disponível gerava para as mulheres.
em:<file:///C:/Users/rhays/Downloads/Livro Direitos
Humanos trans.pdf>. Acesso em: 31 mai. 2022. Os colonizadores, por sua vez,
buscavam explorar a nova colônia, incluindo
a população nativa, cada um tinha um papel a
2 DESIGUALDADES DE
cumprir e a função da mulher era direcionada
GÊNERO AO LONGO DA
HISTÓRIA DO BRASIL para a procriação. Basta lembrar que as
mulheres da elite eram afastadas de qualquer
Equipe ‘Juntos, Nunca Sós, formada pelos
estudantes: Milena Rodrigues Silva, Eduardo possibilidade de estudo e casavam-se muito
Czekalski e Eduardo José Kleinhans cedo, por volta dos 15 anos já eram, na
Fernandes Mattos, sob orientação de Juliana
Valentini. maioria das vezes, forçadas a se casar e
serem mães. Sobre as mulheres escravizadas,
Ao longo da história da humanidade,
sejam africanas ou indígenas, pesavam além
as mulheres realizaram extraordinários feitos
das opressões de uma sociedade patriarcal, a
que contribuíram de forma crucial para a
exploração do trabalho nas atividades
construção da sociedade atual. No entanto,
produtivas e as violências sexuais.
muitas dessas conquistas foram silenciadas
Diferentes mulheres faziam parte da
ao longo do tempo, devido ao não
colônia, todas em condições sociais

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diferentes, e ainda assim, todas igualmente currículo dos garotos, o ensino de prendas
definidas como ferramentas de procriação, o domésticas.
que por vezes ocorria à força, já que não Não só as alunas foram afetadas pela
existiam leis que asseguravam o direito de Lei de 1827, como também as professoras, já
uma mulher dominar seu próprio corpo. que, enquanto dos homens era exigido apenas
O Império do Brasil trouxe, sem que não possuíssem nenhuma “nota de
dúvida, novos ares à nação. Entre as várias regularidade na conduta”, às professoras era
mudanças, deve-se destacar que durante o exigida “reconhecida honestidade e bom
século XIX o saber ler e escrever, mesmo comportamento público”, ou seja: não apenas
sendo privilégio de poucos e se tornam a capacidade de lecionar era levada em
atributos importantes para demonstrar consideração para a contratação, mas
distinção social e aptidão para participar de também a opinião pública sobre a mulher em
uma sociedade moderna, o que logo gerou questão, o que basicamente tornava
debates sobre o que se deveria ou não ensinar obrigatório que, para ser contratada, a mulher
para as mulheres. cumprisse o papel social para ela
determinado naquela época, definido por
uma visão predominantemente masculina.
As diferenças entre homens e
mulheres nas relações de trabalho ainda
persistem. Podemos observar, por exemplo,
que a remuneração de uma mulher é, no
Brasil, em média 22% mais baixa em relação
aos homens. Essa desigualdade também pode
ser observada na distribuição das
Fonte: “Um passado que se faz presente”, 2022.
Colagem digital produzida pela equipe. oportunidades por gênero. Para os homens,
ocupar um lugar como trabalhador,
A Lei Geral do Ensino de 1827, foi a
influenciador ou contribuidor social
primeira lei educacional do Brasil, e
reconhecido sempre foi algo natural, pois a
determinava currículos diferentes para
sociedade tradicional colocava isso como seu
meninos e meninas, tendo sua unificação
papel, todavia, as mulheres tiveram que lutar
apenas em 1854. A grade curricular das
para conquistar esse direito já que a visão
garotas era menor e previa, além de um
tradicional do que é “feminino” não é apenas
ensino reduzido de matemática em relação ao
uma construção histórica, mas também

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filosófica, jurídica, médica, psicológica e Referências
pedagógica.
As mulheres foram tradicionalmente ARILDA, Ines Miranda Ribeiro. MULHERES E
EDUCAÇÃO NO BRASIL-COLÔNIA: HISTÓRIAS
educadas para serem mães e esposas ENTRECRUZADAS,2020. Disponível em:
https://abre.ai/eyTC. Acesso em: 01/06/2022.
"perfeitas", sem sair da zona de trabalho DOMINGUES, Joelza. A mulher e a educação pública
no Brasil Império. Ensinar História,2021. Disponível
doméstico e familiar, mas é possível romper em:https://abre.ai/eyTH. Acesso em: 01/06/2022.
com essa definição incrustada em nossa COLLING, Ana M. Tempos diferentes, discursos
iguais, a construção do corpo feminino na história.
sociedade e possibilitar, por meio da luta por Universidade Federal da Grande Dourados, Editora
UFGD, publicado em 1 janeiro de 2014.
leis e normas, o equilíbrio da situação e
propiciem a mulher outros espaços de 3 UMA HISTÓRIA DE LUTAS E
atuação no mercado de trabalho. CONQUISTAS DO
Entre muitas batalhas travadas pelas MOVIMENTO FEMINISTA
mulheres, uma das que visa trazer mais
Equipe ‘Legião da História’, formada pelas
igualdade ao mercado de trabalho é o direito estudantes: Nathali Vitória Masba Rodrigues,
à licença maternidade, que apesar de ser uma Joana Fuhr e Gemima Santos, , sob orientação
de Juliana Valentini.
conquista, ainda atribui o papel de criar o
filho unicamente à mãe, já que a licença Os caminhos percorridos pelas
paternidade se tornou alvo de discussões mulheres para a conquista de seus direitos, as
apenas tardiamente. lutas e as mobilizações estiveram
Enquanto as histórias das mulheres entrelaçados ao longo da história e mostram
forem invisibilizadas e silenciadas, um pouco da organização dos movimentos
descreditadas ou diminuídas pela sociedade, feministas na conquista de igualdade de
as lutas por igualdade de gênero devem gênero, na emancipação feminina e na
continuar. É necessário que seja feito um libertação dos padrões patriarcais.
trabalho histórico que proponha ações No Brasil, as lutas contra as imposições
concretas para viabilizar a entrada da mulher das estruturas de controle patriarcais fizeram-
no mercado de trabalho e que ampare se presentes desde a colonização, mesmo que
jurídica, pedagógica e socialmente a mulher. esse fato, muitas vezes, seja esquecido, assim
Também, que permita e incentive reflexões como as figuras que marcaram esse cenário,
filosóficas que busquem questionar a atual Nísia Floresta é um exemplo. Mesmo com
estrutura patriarcal da sociedade, tornando início no período colonial, os movimentos
possível combatê-la e modificá-la. não renderam conquistas imediatas para as
mulheres, sejam elas escravizadas, livres,

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pobres ou da elite. Foi apenas no século XIX restringindo a aritmética apenas às quatro
que lutas para a conquista de direitos operações associadas ao ler e ao escrever.
passaram a compor, ainda que timidamente, Romper com essa visão de associar a mulher
o cenário nacional. ao espaço doméstico ainda é uma conquista
As luzes do pensamento iluminista, que que está por vir.
brilhavam na Europa e refletiam na América, Ao mesmo tempo em que conquistas
não iluminaram as mulheres. Grande parte foram sendo incorporadas na realidade das
dos pensadores dessa corrente negava a mulheres ao longo do último século, as
necessidade de escolarização para mulheres, vertentes que discutem sobre os direitos, os
bem como para a classe trabalhadora. papéis e os comportamentos femininos não
Os temas que impulsionaram a abertura são convergentes, pelo contrário.
foram os da educação de meninas que, apesar As diferentes concepções ideológicas
das vozes que se levantavam reivindicando a interpretaram de modo distinto as relações
escolaridade e um currículo igual para entre homens e mulheres. Na vertente
meninos e meninas, pouco foram ouvidas. As conservadora que está presente no Brasil
leis educacionais sofreram poucas alterações, desde a colonização, o foco é o sexismo
apesar de permitirem a criação de escolas nas como desigualdade natural, defende-se como
regiões em que os presidentes de província não-feminista, já que naturaliza processos
‘julgassem necessárias’. sociais, nega a existência de desigualdade, já
A sociedade excludente que foi que nessa corrente de pensamento as
semeada, regada e cultivada ao longo dos mulheres são naturalmente inferiores aos
séculos adentra ao século XX em avançado homens. As concepções Liberais foram
estado de desigualdade, jurídica, social, ganhando diferentes formas com o passar do
cultural e política. Basta lembrar que em tempo; ao longo do século XX, os postulados
1920, o analfabetismo atingia 65% da de liberdade, igualdade e fraternidade foram
população e que esse critério era pré- sendo estendidos para as mulheres, mas
requisito para a participação política – permanecem situados no plano
controlada pela classe dominante por meio exclusivamente formal. Bastaria, portanto,
do voto de cabresto. qualificar a mão de obra feminina e oferecer-
Há um século, os currículos escolares lhe oportunidades de trabalho para eliminar a
das poucas escolas para meninas estavam inferioridade social da mulher. Essa visão se
direcionados para prendas domésticas, limita às especificidades do próprio
excluindo as noções de geometria e capitalismo e ainda que o feminismo liberal

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possa alargar os espaços de atuação das SAFFIOTI, Heleieth. O poder do macho. São
Paulo: Moderna. Coleção Polêmica, 1987.
mulheres, a sua inserção social será sempre
SAFFIOTI, Heleieth. Rearticulando Gênero e
limitada. classe social. In: BRUSCHINI, Cristina e
COSTA, Albertina de O. (orgs.). Uma
O feminismo socialista é uma corrente
questão de gênero, Rosa dos Tempos; São
de pensamento bastante ampla e, assim como Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1992.
as anteriores, possui diferentes abordagens.
Mas, de modo geral, tenta de lidar, 4 GÊNERO, RAÇA E CLASSE:
MITO DA BELEZA E SUA
simultaneamente, com as contradições da
INFLUÊNCIA NA
sociedade patriarcal racista-capitalista, REPRESENTATIVIDADE DAS
buscando assim, não negligenciar os MULHERES
antagonismos fundamentais que respondem Eqquipe ‘Bruxas da Madrugada’ formada
pela opressão de mulheres, minorias étnicas e pelas estudantes: Maria Fernanda Labonde,
Maria Rita Sott Zanelatto e Letícia Aparecida
pobres. Há também o feminismo marxista, Davis Locatelli.
pautado na questão das classes sociais, ou
seja, envolve a relação de gênero com A construção de uma sociedade na qual
discussões sociais, de classe e trabalho, o homem ocupa posição de destaque
direcionando o motivo dos problemas ao perpassou diferentes momentos da história.
apoderamento da opressão de gênero que o No caso do Brasil, ao retomaremos o período
capitalismo desenvolve, contribui e usufrui. de dominação do império português, em que
Nessa perspectiva, o feminismo não as mulheres, quando da elite, estavam
trata de uma guerra contra os homens, como reclusas ao ambiente doméstico, sob controle
propagandas conservadoras buscam divulgar. do pai e posteriormente do marido. As
Ao contrário, a ideia consiste exatamente na escravas por sua vez eram submetidas a
humanização do homem e das mulheres, explorações produtivas, sexuais e de
independente das características étnicas. trabalho. Esse lugar de subalternidade em
Desse modo, essa vertente apresenta como que foram colocadas, apesar de haver
horizonte firmar o compromisso com a causa resistências, persistiu inclusive após a
da humanização, da igualdade social, da independência.
liberdade e a verdadeira democracia. A construção gradual de espaços de
liderança masculina, instaurou-se de modo
Referências que os homens, exercendo autoridade moral,
religiosa, econômica e social, passaram a
ditar e impor todas as regras e valores.

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Restou às mulheres o papel de esposas e Assim, com o mito da inferioridade
mantedoras do lar, adquiridas como feminina, argumentos contrários à
propriedades por meio do casamento. Na emancipação das mulheres tendem a voltar
Inglaterra Vitoriana, por exemplo, eram em outros momentos históricos, quando
leiloadas em espaços públicos. novos “direitos” passam a ser reivindicados,
tem-se, tal como a partir dos anos 60 quando
se defende o direito feminino de exercer
atividades profissionais e assumir cargos de
chefia. Tais funções foram conquistadas
devido à luta constante, que suplantou os
argumentos que se opunham ao exercício
dessas atividades lideradas pelas mulheres,
que adquiriram espaço no mercado de
trabalho apesar dessa tentativa de controle
social imposta pelo patriarcado.
Fonte: “Uma luta de milhares”, 2022. Colagem digital
produzida pela equipe. Constata-se então, uma crescente
inserção da mulher no mercado de trabalho.
Contudo, novas pressões decorrentes do
Durante o século XIX e início do
avanço do capitalismo, instalam-se na
século XX, ganharam força inúmeros
atualidade. Vemos, na atualidade um padrão
movimentos que defendiam ideais de
de modelo magra, esculpida, levemente
emancipação feminina. Este período foi
malhada e saudável, tomando o lugar da feliz
marcado por muitas transformações sociais
dona de casa como padrão de feminilidade
que trouxeram questionamentos sobre a
próspera. Enquanto as mulheres se
participação da mulher na nova estrutura
libertavam do confinamento ao espaço
social. Observa-se, por exemplo, as
doméstico, pela dependência econômica no
discussões ocorridas durante a elaboração da
casamento, sua nova busca por
primeira constituição republicana brasileira,
independência encontrou um problema
em 1891. O Deputado Barbosa Lima
subliminar: o mito da beleza.
defendia que “a participação da mulher na
O atual arsenal do mito consiste na
vida pública abalaria os alicerces da família”.
divulgação de milhões de imagens do ideal
Amparados nesse argumento, a assembleia
feminino em voga. Ele é altamente imposto e
debateu e vetou a implementação do voto
difundido pela indústria da moda, que reforça
feminino.

11
padrões sobre os corpos e mentes das impedem a mulher de chegar a sua efetiva
mulheres. Na atual sociedade consumista, a emancipação, acabou promovendo a exclusão
indústria “beauty” e as redes sociais são das mulheres negras dessa luta, visto que
responsáveis por narrativas e discursos que enquanto a mulher branca busca o fim do
constroem o corpo e a beleza ideal, que padrão imposto sobre o seu corpo, as
consiste em: mulheres brancas, magras e que mulheres negras nem sequer foram inseridas
aludem à eterna juventude, instrumento de dentro desses ideais de beleza, tendo
inclusão/exclusão em diversas esferas da vida inclusive seu corpo ligado a práticas de
social. preconceito como “feio” e “sujo”, heranças
Nesse contexto, mulheres negras são do passado escravocrata a qual foram
duplamente afetadas, uma vez que não lidam sujeitas.
apenas com esse padrão estético, mas A história demonstra todo esse passado
também com o racismo enraizado nele. Se a marcado por estigmatização e inferiorização
mulher negra era vista e representada no da mulher. Apesar disso, é imprescindível
período escravocrata à mercê dos desejos que atualmente haja o reconhecimento da
sexuais de seus patrões dentro de um luta feminista que se alicerça no combate ao
hipersexualismo constante, hoje enfrenta racismo, às classes e aos preconceitos de
consequências históricas de um processo gênero, que buscam não só essa
brutal de negação de sua beleza. desconstrução negativa relacionada aos
A mídia hegemônica contribui com a corpos negros, como também a emancipação
divulgação de imagens, que em sua grande da mulher negra na sociedade através da
maioria, exibe "meninas da televisão” superação do machismo e racismo enraizados
brancas, de cabelos lisos e olhos claros. na estrutura capitalista da sociedade
Assim, os meios de comunicação sugerem brasileira.
aos seus espectadores qual o lugar da mulher
negra e de sua estética: o lugar de minoria, Referências
desvalor e dos papéis secundários nas
novelas. "E desde cedo as meninas negras COSTA, Ana Luísa Saraiva. Padrões de
beleza e racismo na construção da identidade
aprendem que a beleza tem cor, formato e
de mulheres negras. UFMA, 2018,
textura". Disponível em:
https://monografias.ufma.br/jspui/handle/123
Desse modo, o movimento feminista,
456789/2327. Acesso em 04/06/2022.
que durante séculos lutou contra essas formas WOLF, N. O Mito da Beleza: como as
imagens de beleza são usadas contra as
de repressão doméstica e estética que
mulheres. Rio de Janeiro: Rocco, 1992.

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CARNEIRO, Anni de Novais; FERREIRA, O sistema binário de gênero foi uma
Silvia Lúcia. Padrões de beleza, raça e classe:
das perspectivas herdadas no processo de
Representações e elementos identitários de
mulheres negras da Periferia de Salvador - colonização, o qual excluiu qualquer outra
BA. UFRPE, 2014.
forma de identificação para além do feminino
PINHEIRO, Bárbara Carine Soares; ROSA,
Katemari; CONCEIÇÃO, Sueli. "Linda e e masculino e, simultaneamente,
preta": Discutindo questões químicas, físicas,
subalternizou a posição da mulher em relação
biológicas e sociais da maquiagem em pele
negra. Disponível em: ao homem. A seguir será apresentada como
http://conexoes.ifce.edu.br/index.php/conexo
tal visão de mundo, desenvolveu
es/article/view/1759. Acesso em 04/06/2022.
preconceitos e limitou o acesso ao ensino
democrático no Brasil. Inicialmente, a
5 AS LUTAS PELO ACESSO educação feminina foi inserida em quadros
DEMOCRÁTICO AO ENSINO
da América Portuguesa, a qual teve suas
NO BRASIL
primeiras instituições pedagógicas fundadas
Equipe ‘Bruxas do século XXI’, composta por pelos jesuítas e destinadas exclusivamente
Taynara Gabrieli dos Santos, Eduarda
Carvalho Back e Tiffany Hryciuk Gonçalves. aos homens. Porém, é importante ressaltar
que tal segregação de gênero não era algo
No decorrer da história das presente entre as comunidades nativas, e que
civilizações, os sistemas sociais marcados houve um pedido negado em 1561, por uma
pela desigualdade entre as classes também instrução igualitária partido da indígena
construíram concepções sobre os papéis de Madalena Caramuru. Posteriormente, houve
gênero, os quais procuraram estabelecer a fundação de conventos e recolhimentos,
padrões de comportamentos para os geralmente direcionados às meninas da elite,
indivíduos em convívio comum de um ambos ligados a um ensino moral, religioso e
determinado tempo e espaço. Dessa forma, recluso.
para compreender como são estruturadas Com a chegada da família real no
essas atribuições de cunho determinista no século XIX, foi necessário investir nos
contexto brasileiro, as quais promovem primeiros cursos superiores. No entanto,
desarmonia a partir do aspecto gênero, é manteve-se a lógica de que os estudos para as
necessário assumir a influência exercida pela mulheres deveriam apenas suprir as
colonização portuguesa. Ou seja, como as necessidades da gestão doméstica do lar.
relações sociais e culturais eurocêntricas Todavia, houve resistência a essa visão
foram impostas ao “Novo Mundo” e deixam patriarcal, como o Colégio Augusto, no Rio
suas marcas até o presente. de Janeiro (1838), fundado por Nísia

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Floresta, pioneira na defesa da emancipação correspondeu a 26,8%, em ambas as
das mulheres, nele ofereceu o estudo de situações a região do nordeste liderou a
diferentes áreas da ciência. Já no século XX, pesquisa, enquadrando respectivamente
devido a constantes lutas, o papel social da 22,4% e 39,6% de sua população feminina.
mulher ganhou novas perspectivas, uma vez Nesse mesmo sentido, a diferença de acesso
que obtiveram, por exemplo, o direito ao à instrução para as mulheres interioranas é
voto em 1932. Paralelo a esses cenários, o gritante, pois as taxas de analfabetismo das
longo período de ordem escravocrata no brasileiras em área urbanas foi de 9,9%,
Brasil, unido à falta de amparo posterior à enquanto em áreas rurais 27%, o mesmo
ação abolicionista, desencadeou grandes abismo se estende em relação ao
obstáculos à toda população negra que analfabetismo funcional, zonas urbanas
perduram até os dias de hoje. 22,9% e em zonas rurais 51,2%. A
De modo que, a partir de 1970 desproporção entre a alfabetização dos
começou a ser organizado o feminismo homens de 15 anos ou mais (6,9%) para as
negro, vertente que surge em resposta ao mulheres pretas ou pardas (8,9%) desvela
negligenciamento sofrido pelas mulheres essa desigualdade de gênero e geográfica. O
integrantes desse grupo nos debates analfabetismo no Brasil possui classe social,
feministas em geral. Destarte, é necessário cor e gênero, assim como está distribuído de
situar as diretrizes históricas para modo variado pelo território nacional.
compreender a situação presente do grau de
escolaridade das brasileiras. Ademais, os
mecanismos da exploração capitalista
perpassam outras determinações além do
gênero, como a condição de classe e o
racismo. Por isso, é imprescindível também
articular a problemática das desigualdades
econômicas, do racismo e da opressão,
porque estão umbilicalmente ligadas.

No ano de 2001, a taxa total de analfabetismo


em mulheres acima de 15 anos era de 12,3%,
enquanto a de analfabetismo funcional

14
Fonte: Vida Maria - Educação para as 5.1 DEBATENDO O TEMA
Mulheres. Colagem feita pela equipe, a partir
Preparamos a postagem a fim de situar as
do curta-metragem "Vida Maria" produzido
lutas por uma educação democrática no
por Márcio Ramos em 2006. Brasil, as quais ainda se fazem presentes. E
no decorrer do texto, trouxemos figuras
Dialogando com esses dados, o curta- históricas que contribuíram no processo,
como a Madalena Caramuru, a primeira
metragem “Vida Maria”, reflete a condição mulher alfabetizada do país!
de esquecimento e de abandono escolar que
Outra mulher abordada foi a Nísia
muitas gerações vêm sofrendo, devido a Floresta, pioneira na defesa do
ensino científico para meninos e
vulnerabilidade social- você pode conferir
meninas, em seu livro "Direitos das
uma adaptação dessa narrativa na imagem mulheres e injustiça dos homens", publicado
em 1832, teceu severas críticas à educação
inicial do blog. Hodiernamente, as mulheres
patriarcal e desigual oferecida em seu tempo.
representam a maioria no ensino superior e
Atualmente, as brasileiras estão
de acordo com os dados do IDH do ano de presentes em maioria no ensino
2018, estudam por mais tempo que os superior, e para nossa infelicidade, o
nível de escolaridade ainda não
homens, mas tamanho esforço não reflete influencia proporcionalmente no mercado
proporcionalmente no mercado do trabalho, trabalhista, visto que as mulheres têm renda
41,5% menor em relação aos homens.
visto a obtenção de uma renda 41,5% menor. Ademais, bruxinhos do século XXI,
Esse panorama é importante por ajudar vocês sabiam que no Brasil da virada
do milênio, o analfabetismo feminino
a desmistificar a ilusão de uma democracia em áreas interioranas foi de 27%,
no país que considera a garantia da vida, da enquanto em urbanas foi de 9,9%? Tal
cenário evidencia a desigualdade geográfica
segurança e da dignidade humana como recaída sobre as mulheres, além das questões
prioridade. Uma democracia efetiva só pode de gênero.
existir em função da simetria, da igualdade Logo, como superar narrativas
entre todos, quer se trate de trabalhadores misóginas e arcaicas ainda tão
presentes no país? Será possível
manuais ou intelectuais, de homens ou deixar a bagagem determinista pesada para
mulheres, de brancos ou negros, o que, trás e avançar em progresso mais levemente?
Se você gostou do tema da postagem, visite o
efetivamente, está distante da realidade, blog o quanto antes! #acessoaeducação
especialmente quando essas desigualdades #mulheresnaescola

fomentam a exploração capitalista. Referências


PILETTI, Claudino e Nelson. História da
Educação: de Confúcio a Paulo Freire.
Disponível em https://abre.ai/eyPW. Acesso
em 03/06/2022.

15
SILVA, Maria Beatriz. Educação Feminina e Essa desigualdade se manifesta na
educação masculina no Brasil Colonial.
história das mulheres, que foi e ainda é
Disponível em https://abre.ai/eyPS. Acesso
em 02/06/2022. marcada pela existência de violências físicas
FENEA. Uma carta como marco da
e psicológicas usadas como “ferramenta”
alfabetização feminina. Disponível em
https://abre.ai/eyPP. Acesso 03/06/2022. para a imposição de comportamentos sociais,
MULHERES DE LUTA. As mulheres e o
modos de vida e dependência sobre a mulher.
acesso à educação no Brasil. Disponível em
https://abre.ai/eyOa. Acesso 03/06/2022. Os reflexos sobre o mercado de trabalho
POLITIZE. Feminismo Negro no Brasil,
institui, segundo Saffioti (1992), “certos
pautas e conquistas. Disponível em
https://abre.ai/eyPZ. Acesso 02/06/2022. trabalhos femininos e, constantemente, certos
WESTIN, Ricardo. Lei escolar do Império.
outros, embora reduzidos de prestígios”.
Disponível em https://abre.ai/eyOe. Acesso
02/06/2022. Enquanto isso, para o "homenzinho" fica
G1. Mulheres estudam mais no Brasil, mas
muito mais fácil, pois não precisa se
têm renda 41,5% menor que homens, diz
ONU. Disponível em https://abre.ai/eyPH. preocupar com questões domésticas. Isso é
Acesso 03/06/2022. IBGE. Síntese de
cultural: construído socialmente, por
Indicadores Sociais 2002. Disponível em
https://abre.ai/eyPR. Acesso 04/06/2022. instituições sociais que se aproveitaram disso
no passado e que são perpetuadas no
presente.
6 AS MÍDIAS DIGITAIS COMO
INSTRUMENTO DE Além disso, quando a mulher consegue
COMBATE AO MACHISMO ascender no mercado encontra um ambiente
hostil, marcado por assédios e pelo
Equipe ‘Geração Fanta Laranja’, composta
por Eduarda Copetti Batistela, Maria Clara machismo presente nos locais de trabalho.
Turra Gregorini e Laôni André Carvalho Recentemente, uma funcionária acusou o
Cavalheiro Moreira.
presidente da CBF (Confederação Brasileira
As raízes históricas do patriarcado de Futebol) à época, hoje afastado devido ao
encontraram ambiente ideal para a ocorrido, Rogério Caboclo, de ter proferido-
germinação com a criação da propriedade lhe ameaças. A vítima, inclusive, gravou uma
privada e das relações monogâmicas, que fala de Caboclo, o qual perguntou se ela “se
permitiram o domínio do homem sobre a masturba”. Casos como esse não são
mulher através de violência física e raridades: segundo pesquisa do Instituto
psicológica. A sobrevivência dessa estrutura Locomotiva em 2020, 7 em cada 10 mulheres
social vigora até o presente e mantém vivas já receberam cantadas inconvenientes. Além
as barreiras para a construção de uma disso, mulheres sofrem três vezes mais
sociedade igualitária. assédio sexual do que homens nas empresas,

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segundo pesquisa divulgada pela CNN devido à pandemia do novo coronavírus
Brasil. houve um aumento no uso de mídias digitais,
as quais permitem que o usuário possa ver
Bertha Maria Júlia Lutz, em seu novo perfil no
Twitter, ressalta a importância dos jovens na luta por notícias em tempo real e tecer comentários
uma sociedade com mais igualdade.Imagem produzida
pelos membros da equipe em 01/06/2022. sobre essas notícias. Então, podemos usá-las
como meio para inibir atos machistas e
inconvenientes, atos que não podem nem
devem ser aceitos.
As mídias digitais permitem que você
possa ver notícias em tempo real e tecer
comentários sobre essas notícias, sem as
barreiras de espaço e tempo (LÉVY, 1999).
Então, podemos usá-las como forma de
reprimir atos machistas e inconvenientes,
atos que não podem nem devem ser aceitos.
Consequentemente, surge a questão da
liberdade de expressão e das fronteiras da
tolerância: o paradoxo da tolerância.
O paradoxo da tolerância consiste na
concepção de que a “intolerância ilimitada
leva ao desaparecimento da tolerância”
(POPPER, 1974, p.289). Segundo Karl
Popper, devemos ter o direito de reprimir a
A repercussão de casos de assédio com
intolerância, levando em consideração que,
pessoas do meio esportivo, artístico, cultural,
“enquanto pudermos contrapor a elas a
político - e outros - ganham bastante
argumentação racional e mantê-las
ressonância no presente, especialmente com
controladas pela opinião pública, a supressão
a popularização das mídias digitais que
seria por certo pouquíssimo sábia”
podem servir como meio para denunciar as
(POPPER, 1974, p.289). Uma maneira que
violências - física, psicológica, moral, sexual,
os participantes das grandes redes sociais
patrimonial.
digitais encontraram de intolerar o intolerante
Segundo pesquisa do Cetic.br em 2020
é o “cancelamento”.
e 2021, durante o período de quarentena

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Recentemente, ocorreram diversos que fazem serviços considerados “femininos”
casos de cancelamento: forma que grupos de pela sociedade patriarcal. Por isso, faz-se
pessoas encontraram de reprimir o que necessária a contínua luta por uma sociedade
consideram errado ou o que de fato é errado igualitária de facto, a qual pode ser divulgada
perante a lei. Um exemplo de cancelamento é e realizada nas redes sociais, agregando-se
do Nego do Borel. O cantor foi acusado de maior número de pessoas aos movimentos
agressão física e de ter dopado e estuprado a feministas e de resistência.
ex-esposa, Duda Reis. Os internautas Referências
prontamente se pronunciaram sobre o caso, BARRETO, E. Mulheres sofrem três vezes
mais assédio sexual nas empresas do que os
promovendo a queda do “hype” do artista, o
homens. CNN Brasil, 9 de nov. 2021.
qual perdeu muito público após as denúncias Disponível em: https://abre.ai/eyRV. Acesso
em: 04/06/2022.
e sua exposição nas redes.
CETIC.BR. Cresce o uso de internet durante
Um caso bem atual de mobilização do a pandemia e número de usuários no Brasil
chega a 152 milhões, é o que aponta pesquisa
público ocorreu após um comentário de Zé
do Cetic.br. Cetic.br, 2021. Disponível em:
Neto, da dupla Zé Neto e Cristiano, sobre https://abre.ai/eyRX. Acesso em: 04/06/2022.
INSTITUTO LOCOMOTIVA. Percepções
uma tatuagem de Anitta e sobre a utilização
sobre a violência e o assédio contra mulheres
da Lei Rouanet. A movimentação dos fãs da no trabalho. São Paulo: Instituto Locomotiva,
2020. Disponível em: https://abre.ai/eyRY.
cantora foi tanta que chegou a gerar
Acesso em: 04/06/2022.
investigação por parte do Ministério Público LÉVY, P. Cibercultura. tradução de Carlos
Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 1999.
sobre os shows de cantores sertanejos
POPPER, K. R. A sociedade aberta e seus
promovidos por prefeituras, demonstrando o inimigos. Tradução de Milton Amado. Belo
Horizonte: Editora Itatiaia; São Paulo:
impacto que tem uma hashtag ou algum
EDUSP, 1974. v.1. 56.
comentário na internet.
Portanto, é de extrema importância o
uso das mídias para a mobilização no
combate ao patriarcalismo e ao discurso de
ódio. Visto que é crescente o uso dessas
tecnologias, as denúncias de machismo,
assédio ou abuso sexual podem ser feitas em
tempo real. Ademais, as atitudes públicas de
crítica ou os exemplos de mulheres
independentes podem ser vistos nas redes a
todo momento, assim como casos de homens

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