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FORTES, A., et al.

REVISITANDO UM CLÁSSICO DA HISTÓRIA SOCIAL:


A ESTRUTURA NARRATIVA DE A FORMAÇÃO DA
CLASSE OPERÁRIA INGLESA

ALEXANDRE FORTES1
AMANDA MOREIRA DA SILVA2

1- Professor do Departamento de História e Economia e do Programa de Pós-Graduação em História - UFRRJ.


2- Aluna de graduação da UFRRJ e Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC-
CNPq).

RESUMO: FORTES, A., SILVA, da A. M. Revisitando um clássico da história social: A estrutura narrativa
de A Formação da Classe Operária Inglesa. Revista Universidade Rural: Série Ciências Humanas, Seropédica,
RJ: EDUR, v. 29, n 2, p. 01-24, jul.-dez., 2007. Este artigo apresenta uma descrição panorâmica dos temas analisados
no livro A formação da classe operária inglesa, do historiador inglês Edward Palmer Thompson (1924-1993) e tece
alguns comentários sobre a relação entre a estrutura narrativa da obra e a renovação conceitual da história social
desencadeada pelo autor a partir daquele trabalho, que se transformou imediatamente em um clássico da história
social imediatamente após o lançamento da edição original inglesa de 1963.

ABSTRACT: FORTES, A., SILVA, da A. M. Revisitando um clássico da história social: A estrutura


narrativa de A Formação da Classe Operária Inglesa. Revista Universidade Rural: Série Ciências Humanas,
Seropédica, RJ: EDUR, v. 29, n 2, p. 01-24, jul.-dez., 2007. This article presents an overview of the issues analyzed
in English historian Edward Palmer Thompson´s (1924-1993) book The Making of the English Working Class and
draw some commentaries regarding the relationship between the book´s narrative structure and the conceptual renewing
in social history unleashed by the author since the 1963 release of the original English printing of that work, which
immediately became a social history classic.

INTRODUÇÃO Ele se constitui num dos produtos


gerados a partir de projeto de iniciação
Esse artigo apresenta uma descrição científica desenvolvido desde 2006 com apoio
panorâmica dos temas analisados no livro A de bolsa do PIBIC (CNPq-UFRRJ). Foi
formação da classe operária inglesa 1, do elaborado tendo como principais bases, de um
historiador inglês Edward Palmer Thompson lado, o estudo sistemático desenvolvido há
(1924-1993) e tece alguns comentários sobre vários anos pelo primeiro autor (orientador)
a relação entre a estrutura narrativa da obra e sobre a obra de Thompson, que gerou diversas
a renovação conceituação da história social publicações anteriores, individuais2 ou em co-
desencadeada pelo autor a partir daquele autoria3, e, de outro, o minucioso fichamento
trabalho, que se tranformou imediatamente em dos três volumes da edição brasileira de A
um clássico da história social imediatamente formação elaborado pela segunda autora
após o lançamento da edição original inglesa (orientanda).
de 1963.

Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p. 01-24, 2007.
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A relevância deste trabalho está VOLUME I - A ÁRVORE DA


vinculada à análise, feita em trabalhos LIBERDADE6
anteriores do primeiro autor sobre o tema, de
que aspectos importantes do debate teórico- “A Formação da classe operária”
metodológico desenvolvido por Thompson em articula a análise de vários processos
A formação passam muitas vezes condicionantes da ação humana. No prefácio,
despercebidos numa primeira leitura devido à o autor já traz grandes contribuições para o
alta densidade empírica e até mesmo ao tom entendimento do conceito de classe, ao
apaixonado e envolvente da obra: diferenciar “classes” como um termo
“Ao mesmo tempo, se atende descritivo das subdivisões existentes entre os
plenamente às exigências do trabalhadores, de “classe” entendida como um
rigor acadêmico (a ponto de fenômeno mais geral. O autor também
tornar-se um dos trabalhos explicita a diferença entre “experiência de
historiográficos mais citados do classe”, que é “determinada pelas relações de
século XX), seu tom literário e produção que os homens se encontram, e a
sua narrativa heterodoxa “consciência de classe” que, diferentemente
cativam até mesmo os leitores da anterior, é determinada por valores
nada familiarizados com o culturais.
cipoal de personagens, fatos e Thompson critica as formas de
processos peculiarmente definição de classe mais comumente utilizadas
ingleses com o qual Thompson por várias escolas teóricas até então e diz que
pouco a pouco constrói sua teia. “a classe é uma relação, e não uma coisa”,
Na verdade, é necessário sendo definida pelos próprios homens
embrenhar-se junto com o autor enquanto vivem a história. Portanto, a intenção
nessa especificidade para, do livro é oferecer uma contribuição para
pouco a pouco, identificar os compreender a classe como uma formação
elementos que tornaram esse social e cultural.
trabalho objeto de interesse
universal.”4 Na primeira parte do livro, o autor
trata das tradições populares do século XVIII
Ao apresentar detalhadamente o na Inglaterra, que tiveram forte contribuição
relato thompsoniano nas próximas seções, para a agitação jacobina nos anos 1790. No
damos continuidade ao exercício de primeiro capítulo, trata das sociedades de
identificação dos fios condutores da narrativa correspondência inglesas, em especial da
de A formação, apresentado de forma mais Sociedade Londrina de Correspondência
sintética e analítica em trabalho anterior.5 A (SLC), descrevendo como se deu seu
proposta aqui, portanto, não é apresentar surgimento. Esta sociedade de perfil “radical
alguma contribuição inovadora ao debate popular” tinha como lema “um número
teórico sobre o livro, seu papel na definição ilimitado de membros” e tinha como objetivo
dos rumos sociais a partir da década de 1960 discutir a Reforma Parlamentar, demonstrando
e sua atualidade, o que realizamos em alguma claramente o seu caráter democrático. O
medida nos trabalhos acima citados, mas sim número de membros de fato logo aumenta, a
oferecer uma primeira versão de um SLC expande-se entre as mais diversas
instrumento didático que possa ser útil para categorias de trabalhadores e inicia-se
os interessados num estudo sistemático e paralelamente a repressão a seus precursores
aprofundado da obra de Thompson. e a mobilização desencadeada pela sociedade
parece dispersar-se. A SLC embora pela sua
composição social pudesse ser definida como
uma sociedade de caráter “radical popular”,

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segundo Thompson, tinha “a natureza de uma atitudes que compõe a matéria-prima do


‘organização operária’”: movimento de 1790 a 1850.” (p.31)
“Eis o trabalhador como A dissidência acaba se tornando algo
secretário. Eis a baixa distanciado e de pouca atração popular, devido
subscrição semanal. Eis o ao seu caráter intelectual para a grande massa
entrecruzamento de temas pobre. Batistas e Metodistas buscavam uma
políticos e econômicos – ‘a maior aproximação com os pobres, e os
dureza dos tempos’ e ‘a metodistas foram os primeiros a chegarem até
Reforma Parlamentar’. Eis a eles. Wesley1313 “ vinha com a mensagem
função da reunião, tanto como abrangente: “A única coisa a fazer é salvar
ocasião social quanto centro almas” (p.37). Apesar do conservadorismo
para a atividade política. Eis a empedernido do seu fundador, o metodismo,
atenção realista para a da forma como foi pregado e vivido por muitos
formalidade de procedimentos. de seus grupos de base “conseguiu combinar
Eis, acima de tudo, a nas proporções exatas democracia e
determinação de propagar disciplina, doutrina e emotividade” e ainda
opiniões e de organizar os “facilitou a admissão a essas sociedades,
adeptos, contida na diretriz: que derrubando todas as barreiras das doutrinas
o número de nossos Membros sectárias.” (p.38).
seja ilimitado. Segundo Thompson existem várias
Hoje poderíamos passar por tal interpretações da contribuição do metodismo
norma como se fosse lugar para o movimento operário. Pois se de um lado
comum: no entanto, é um dos ofereceu uma base inicial para os organizadores
eixos onde gira a história. radicais e sindicalistas, oferecendo
Significa o término de qualquer autoconfiança e capacidade de organização, por
noção de exclusividade, de outro, é fácil re conhecer o caráter reacionário
política como reserva de uma e subserviente do wesleyanismo oficial. A
elite hereditária ou de um grupo lealdade perante ao rei e a adesão à constituição
proprietário.”7 eram bases do wesleyanismo, e, segundo
O segundo capítulo mostra as Halévy14, citado por Thompson, “o metodismo
influências da dissidência religiosa e sua impediu a revolução na Inglaterra nos anos
contribuição para o movimento operário e sua 1790.” (p.42)
organização. Segundo Thompson, a Depois da morte de Wesley, fundador do
dissidência, entendida aqui como as várias metodismo, houve um ascenso democrático
seitas religiosas desvinculadas da Igreja influenciado pelo jacobinismo que teve os
Anglicana, trabalhava pelas liberdades civis e “Direitos do homem” como tendência.
religiosas. Alguns de seus ramos, influenciados “É impossível oferecer um
por ideais Iluministas, combinavam o resumo fácil da tradição
“radicalismo adormecido” e a hostilidade em dissidente, que foi um dos
relação ao Estado, com a forma democrática elementos precipitados pela
de organização. Isto se evidenciava mais entre agitação jacobina inglesa. É a
os quacres e os batistas. O “radicalismo sua diversidade que desafia
adormecido” é encontrado num texto de forte qualquer generalização, e é ela
influência para o movimento operário inglês, a sua mais importante caracterís-
o “Progresso do peregrino”. Este texto somado tica. Na complexi-dade de seitas
a “Direitos do homem” de Tom Paine foram concorrentes e capelas divididas
de grande contribuição8. “Bunyan9 e Paine10, temos o viveiro para as variantes
com Cobbett11 e Owen12, foram os que mais da cultura operária do século
contribuíram para o conjunto de idéias e 19.” (p.52).

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A dissidência pode ser vista como “Os últimos anos do século 18


uma tradição intelectual, de onde saíram presencia-ram um esforço
muitas idéias e homens originais e de grande desesperado do povo para
contribuição. reimpor a economia moral mais
O terceiro capítulo, “As Fortalezas de antiga, em detrimento da
Satanás”, leva este nome para denominar os economia livre de mercado.”
“pobres de cristo” do final do século 18: (p.71).
pecadores penitentes, assassinos, bêbados, Thompson destaca que nesta época a
ladrões, etc. Thompson comenta que era fácil multidão londrina tinha um ânimo
a identificação de grande parte da população revolucionário e estavam descobrindo novas
pobre com essa caracterização presente nas formas de organização.
obras evangelizadoras, pois qualquer pessoa No capítulo quatro, Thompson inicia
sem emprego e propriedade teria de se manter descrevendo os conflitos eleitorais e a
por meios ilícitos. participação dos radicais que ao se elegerem
Na época da Revolução Francesa davam início a tradição da “Londres Radical”.
houve uma atmosfera de pânico, o que Em distritos como Westminster, os candidatos
ocasionou o despertar das classes mais radicais na disputa eleitoral tendiam a
trabalhadoras, trazendo preocupações às vencer esmagadoramente. “Essa alteração
classes altas. Isso fez com que pessoas de posse está relacionada com as noções populares de
vissem a necessidade de conter a turbulência ‘indepêndencia’, ‘patriotismo’ e ‘direito de
de forma a pôr em ordem a situação dos nascimento’ do inglês.” (p.84). Além disso,
pobres. A nobreza se via atemorizada pela tudo estava permeado pela retórica da
multidão faminta e pela forte adesão popular liberdade, que deixou de ser exclusiva do
aos “Direitos do homem” de Tom Paine. “A discurso dos nobres e passou a fazer parte do
mensagem para os pobres trabalhadores era dos radicais. O “inglês livre de nascimento”
simples, e foi resumida por Burke15, no ano reivindicava poucos direitos, ele próprio se
de fome de 1795: ‘Paciência, trabalho, sentia um individualista protegido pela
sobriedade, frugalidade e religião é o que se constituição. Thompson destaca que havia uma
deve recomendar a eles; tudo o mais é pura total hostilidade em relação ao aumento dos
fraude’.” (p.59). As formas de repressão aos poderes de qualquer autoridade centralizada.
crimes contra a propriedade eram duras: A liberdade em relação a ingerências do Estado
“Punia-se com a morte não só o pequeno e a crença na igualdade de ricos e pobres
roubo, mas as formas primitivas de rebelião perante a lei constituíam uma fonte de
industrial.” (p.63) verdadeira satisfação popular. Essa ideologia
Em 1795, quando a fome e a escassez alimentou reivindicações de direitos positivos
tomaram conta da Europa, a tradição popular muito amplas.
se une as idéias jacobinas. O descontentamento Os reformadores radicais baseavam
popular não se dava ainda principalmente em suas reivindicações na razão, na consciência
relação aos salários, mas sim ao preço do pão. e no interesse próprio. Essas idéias sofriam
Os motins foram generalizados em torno dos grande resistência por parte de muitos ingleses
alimentos e vinham legitimados por uma do século 18, que possuíam um forte ideal
economia moral16 mais antiga, que considerava constitucionalista. A Revolução Francesa
imoral o aumento do preço dos alimentos para trouxe uma nova constituição, redigida à luz
se aproveitar das necessidades do povo. As da razão, e ao atacá-la, Burke em “Reflexões
noções de barganha direta não permitiam que sobre a Revolução Francesa” (1790) 17 ,
a mente popular aceitasse as leis da oferta e deslocou pela primeira vez o campo do debate
da procura, segundo as quais a escassez para fora do terreno dos argumentos
necessariamente levaria ao aumento de preços. constitucionais. Foi em reação a Burke que
Paine escreveu “Os Direitos do homem”,

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considerado um texto fundador do movimento dois novos temas: as injustiças econômicas e


operário inglês. Ao contrário do texto de soluções sociais, e, novas formas de
Burke, neste texto Paine fala pelos governados organização e comunicação. A linguagem da
e oferece uma definição de classes, a dos que reuniões anteriormente se restringia à
pagam impostos e a dos que vivem deles, além Reforma Parlamentar: ‘Agora é claramente
de fazer uma severa crítica à Constituição. As expressa a intenção de derrubar o governo
idéias de Paine levaram-no a várias propostas do país’.” (p.147). Iniciam-se cisões na SLC
para cortar os custos do governo, e isto deu e formam-se novas sociedades. A questão
uma nova disposição à agitação reformista. “social” passa a ocupar cada vez mais o
“O que Paine deu ao povo inglês primeiro plano, e é neste contexto que aparece
foi uma nova retórica de outra influência que ganhava novos adeptos.
igualitarismo radical, que afetou Thomas Spence18, que trouxe as idéias não só
as reações mais profundas do de reforma parlamentar, mas também a de
‘inglês livre de nascimento’ e expropriação de terras dos aristocratas e
penetrou nas atitudes formação de cooperativas. Haviam também
subpolíticas do operariado outras correntes como a de Place 19, que
urbano.” (p.102) considerava a educação política entre os
Segundo Thompson, esse otimismo e trabalhadores como a principal função das
esse radicalismo reproduziram-se sociedades operária. E, Binns 20 que
repetidamente no movimento operário do representava outra corrente, lutava pela
século 19. Mas é importante ressaltar que essa derrubada da Monarquia e implementação da
doutrina de Paine foi feita para agitação nas República.
sociedades de correspondência e não desafiou Neste período a SLC cresceu
os direitos de propriedade dos ricos. E em rapidamente saindo de seu círculo restrito e
termos de democracia, ele pretendia nivelar passando a chegar aos trabalhadores
privilégios hereditários, mas não visou o assalariados. As sociedades cindidas também
nivelamento econômico. Isso não altera o fato prosperavam e em torno delas cresciam outros
de que, na memória dos trabalhadores, o que grupos com ideais republicanos. Segundo
prevaleceu foi que Paine viera “plantar a Thompson, o clima de miséria assolava a
árvore da liberdade”. Inglaterra, o que acabou ocasionando várias
Após fazer esta exposição, no último rebeliões e motins com questionamentos de
capítulo do primeiro volume de A formação, classe. A miséria era atribuída à corrupção
Thompson segue analisando esta noção de parlamentar e havia fortes ataques ao rei. Tais
liberdade e as agitações por uma democracia motins foram atribuídos à SLC. A tentativa de
inglesa que, embora tenham sido inspirados propagação da SLC se deu na forma de
pelos acontecimentos de 1789 na França, reconstruir uma organização nacional, e para
possuíam suas peculiaridades. Em 1792, o isso foram enviados delegados para as
aumento dos seguidores das idéias de Tom províncias. Mas essa correspondência com as
Paine, insatisfeitos com a constituição inglesa províncias se deu de forma superficial e a
cresce significativamente e a profundidade da sociedade de Londres entra numa fase de
agitação democrática na Inglaterra vem desintegração.
perturbar a “paz” do país. Em contrapartida, Outra sociedade de correspondência
magistrados e cléricos promoviam discursos de grande influência foi a “Sociedade de
condenando Paine e formavam-se sociedades Sheffield21”, que, como a SLC teve processo
da pequena nobreza, visando preservar a semelhante de formação e também cresceu
“Gloriosa Constituição da Velha Inglaterra”. aceleradamente. Era um centro ideal para a
O rei inicia uma nova era repressiva. As agitação jacobina e tinha tradição de
sociedades populares, porém, embora independência democrática. Tinha como
enfraquecidas, resistem, e acabam por adquirir objetivo mostrar ao povo a razão e o motivo

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de todos os seus sofrimentos. Além disso os VOLUME II - “A MALDIÇÃO DE


membros “levavam as doutrinas de Paine ao ADÃO”23
seu limite: democracia absoluta, oposição
total e radical à monarquia e aristocracia, ao No segundo volume de A formação,
Estado e aos impostos.” (p.172-173). Outras Thompson expõe como a classe operária se
idéias que se incorporavam como uma nova forma no período da Revolução Industrial,
corrente política foram aquelas levantadas por abordando questões como as condições de
Thelwall22 em “Os Direitos da Natureza” onde vida dos trabalhadores, a religião, o uso do
se dedicou a analisar o “Sistema Feudal” e a tempo livre, reinterpretando historicamente o
“Origem e Distribuição da Propriedade”. período e trazendo valiosas contribuições.
“Thelwall levou o jacobinismo às margens do No primeiro capítulo, o autor realiza
revolucionarismo.” (p.176) Em relação a SLC, uma análise de como se dava a exploração dos
os revolucionários estavam ligados ao nome trabalhadores e a conseqüente agitação
de Spence e ao seu “socialismo agrário”, que popular, o advento das fábricas, da energia do
questionava a aristocracia hereditária e a vapor e da indústria algodoeira. Thompson
propriedade privada da terra. Spence tinha ressalta que todos os relatos clássicos sobre
uma definição de classe mais clara do que a as condições da Revolução Industrial, estão
oferecida por Tom Paine e ainda levantava a baseados na indústria do algodão, e diz que
causa da libertação sexual. esta indústria foi certamente a pioneira na
A perseguição e a repressão fizeram Revolução Industrial, sendo a tecelagem o
com que houvesse uma desilusão dos modelo proeminente para o sistema fabril.
intelectuais jacobinos e acarretaram uma Porém, “a ênfase excessiva sobre o caráter
separação entre estes e os trabalhadores, o que inovador das tecelagens pode levar ao
provocou uma desorganização. Mas ainda menosprezo da continuidade das tradições
assim os trabalhadores lutaram para manter políticas e culturais na formação das
algum tipo de organização ilegal, mesmo assim comunidades da classe operária”(p.16). E,
sem ter uma liderança nacional. Os jacobinos ainda faz uma crítica a Engels24 quando este
plebeus, isolados, foram obrigados a se diz que os operários são os “filhos
organizarem de forma independente ou primogênitos da Revolução Industrial”.
clandestina com uma forte orientação “à O autor destaca a grande diversidade
esquerda”. Com o passar do tempo as de ofícios e ocupações dos trabalhadores,
sociedades de correspondência fracassam e assim como as diferenças existentes no seio
verifica-se que “as sociedades populares eram da classe trabalhadora no período de 1790 a
frágeis demais e por demais inexperientes 1830, e diz que esta preocupação é necessária
para executar, por elas mesmas, seja a para entender a formação da “classe operária”
reforma ou a revolução.” (p.196). Contudo, no período. Esta formação se deu, em primeiro
os efeitos das sociedades eram grandes, lugar, no crescimento da consciência de classe
induziam homens à leitura, ensinava-os a entre estes diversos grupos de trabalhadores
pensar criticamente e isso descreve os contra o interesse de outras classes, e, em
primeiros estágios da auto-educação política segundo lugar, no crescimento das formas
de uma classe. E as crises revolucionárias correspondentes de organização política e
populares surgem da junção das injustiças industrial. Enfim, tanto o contexto político
sofridas pela maioria com a articulação da quanto a máquina a vapor tiveram influência
minoria politicamente consciente. decisiva sobre a formação da consciência e
das instituições da classe operária. “O fazer-
se da classe operária é um fato tanto da
história política e cultural quanto da
econômica. Ela não foi gerada
espontaneamente pelo sistema fabril.” (p.17)

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E ainda destaca, enriquecer no decorrer de uma única geração


“As mutáveis relação de – tudo contribui para a transparência do
produção e as condições de processo de exploração e para a coesão social
trabalho mutável da Revolução e cultural do explorado.” (p.22).
Industrial não foram impostas E, assim conclui:
sobre um material bruto, mas “podemos agora constatar
sobre ingleses livres – livres parte d a na ture za
como Paine os legou ou como verdadeiramente catastrófica
os metodistas os moldaram [...]. da Revolução Industrial e
A classe operária formou a si algumas das razões pelas quais
própria tanto quanto foi a classe operária se formou
formada” (p.17) n e st e s a n o s. O po v o f o i
Esta nova análise da classe operária submetido, simultaneamente, à
contrapõe-se às clássicas versões e assegura intensificação de duas formas
um campo de batalha acadêmico. O autor intoleráveis de relação: a
destaca como esse debate se dá a partir da exploração econômica e a
situação do trabalhador industrial, afirmando opressão política.” (p.23)
as duas visões existentes: uma clássica A partir daí, Thompson descreve
ortodoxia catastrófica, de conflitos e opressão paulatinamente a brutalidade nas condições de
de classe; e uma nova ortodoxia trabalho advindas da máquina a vapor e as
anticatastrófica que se distingue mais injustiças sofridas pelos trabalhadores com as
claramente por sua cautela empírica. Para o mudanças ocorridas no caráter da exploração
autor, os estudos desta nova ortodoxia capitalista, tais como: a ascensão de uma classe
enriqueceram o conhecimento histórico e de mestres, a distância entre os mestres e os
revisa aspectos importantes da escola clássica, outros homens, a perda de status de alguns
porém: setores, a redução de trabalhador à
“Os sucessores dos grandes dependência dos instrumentos de produção do
empiristas exibem com mestre, a parcialidade da lei e todos os fatores
demasiada freqüência uma que reduziram o homem ao status de
complacência moral, uma “instrumento”.
estreiteza de referência e uma Todos estes fatores levaram a intensas
familiaridade insuficiente com insatisfações e os primeiros anos da década
os movimentos reais da de 1830 foram marcados por agitações que
população trabalhadora desse levantaram questões que iam além de melhores
período.” (p.19). salários.
Reafirmando que “o que representou, “Só é possível escrever a
em princípio, uma modificação valiosa, se história da agitação popular
converteu, através de estágios imperceptíveis, destes anos através de um
em novas generalizações (raramente e sf orç o de i magi naç ão
sustentadas pelas evidências) e das suficiente para compreender
generalizações se passou a uma atitude c o mo o ‘o f i c i al t e c e l ã o’
normativa.” (p.19) interpretou as evidências25. Ele
Retomando ao processo de se referiu aos ‘patrões’, não
exploração, o autor afirma que: c o m o u m a g re g a d o d e
“O empreendimento em larga escala, o indivíduos, mas como uma
sistema fabril, com sua nova disciplina, as classe. Como tal, eles lhe
comunidades fabris – onde o industrial não negaram direitos políticos.”
só se enriquecia com o trabalho de sua “mão- (p.32).
de-obra”, como também se podia vê-lo

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Nota-se que os trabalhadores não redefinição da natureza da propriedade


conspiravam em torno deste ou daquele fato agrária, os cercamentos, que representaram
em particular, mas da relação essencial de claramente um caso de roubo de classe,
exploração a qual estavam submetidos. segundo palavras do autor.
O autor encerra este primeiro capítulo “A distinção que parecia
do segundo volume ingressando no debate ‘bastante clara’ de acordo com
sobre se o padrão de vida subiu ou decaiu no as relações de propriedade
período. Notamos que alguns trabalhos capitalistas, significava uma
enfatizam a depreciação e ignoram as ruptura na e strutura
melhorias, outros enxergam apenas as tradicional dos costumes e dos
melhorias no período. Entre pessimistas e d i re i t o s d o s a l d e õ e s : a
otimistas, Thompson destaca: violência social dos
“o Dr. Hobsbawm não registrou c e rc a m e n t o s c o n s t i t u i u
qualquer melhoria perceptível precisamente na imposição
no padrão de vida até a metade total e drástica das definições
da década de 1840; por sua vez, de propriedade capitalista
o professor Ashton notou uma sobre as vilas (...). Na verdade,
atmosfera econômica ‘mais os cercamentos representaram
estimulante’ após 1821.” (p.34) o ponto culminante de um longo
Após analisar exaustivamente os processo secular em que as
argumentos de ambos os lados, Thompson relações consuetudinárias dos
conclui “em meio século de acelerado homens com os meios de
desenvolvimento industrial, o padrão de vida produção agrícolas foram
permanecia ao nível de subsistência para corroídas.” (p.46)
grandes grupos de trabalhadores, ainda que A perda das terras comunais acarretou
indeterminados.” (p.35). E acrescenta: uma profunda sensação de destituição para os
“Durante o período de 1790 a pobres, e com isso observou-se violentos
1840 houve uma ligeira processos contra os cercamentos. Os motins,
melhoria dos padrões materiais a destruição de cercas, as cartas ameaçadoras
médios. No mesmo período, e os incêndios foram cada vez mais comuns.
observou-se a intensificação da Esses motins acabaram se dando entre os
exploração, maior insegurança trabalhadores rurais e urbanos, ocorrendo um
e aumento da miséria humana.” autêntico movimento de destruição de
(p.38) máquinas, que estavam comprovadamente
Nos três capítulos seguintes, o autor provocando o desemprego dos trabalhadores.
irá analisar três grupos de trabalhadores e as E, embora nunca tivesse ocorrido uma agitação
mudanças trazidas às suas vidas pela nacional coerente, os protestos no meio rural
Revolução Industrial: dos trabalhadores rurais, sempre giravam em torno do direito à terra e
dos artesãos urbanos e dos tecelões artesanais. alimentava um ódio especial ao clero que
Começando pelos trabalhadores agrícolas, que consumia dízimos.
entre 1790 e 1830 era o maior grupo de A seguir, o Thompson desloca-se para
trabalhadores dentre todos os setores. O autor o meio urbano. O segundo grupo a ser
analisa minuciosamente as diferentes formas analisado são os artesãos. O autor inicia a
de trabalho nas fazendas, diferenciando-as e análise deste grupo ressaltando as diferenças
investigando uma a uma, pois considera que a entre as várias categorias, que eram muito
ocorrência das diferentes injustiças poderia ser significativas e importantes para a
considerada de uma forma completamente compreensão, devido à não-homogeneização
distinta em diferentes épocas e regiões. Além que torna até mesmo difícil a análise do padrão
disso, ressalta o fato mais importante: a de vida entre estes trabalhadores.

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Superficialmente, eles poderiam ser degradação econômica, o desaparecimento do


classificados como: mestres, artesãos orgulho pelo ofício foram fatores que
autônomos e trabalhadores não qualificados. combinaram as injustiças reais sofridas e as
Porém dentre estes haviam enormes diferenças condições de vida idealizadas pelos artesãos.
e classificações internas, cabendo várias Tudo isto, somado à aspiração por
subdivisões, além das mudanças em termos “independência” destes trabalhadores, marcou
morais e intelectuais geradas pela perda de a história do radicalismo da classe operária
status de muitas ocupações em função das em sua primeira fase.
transformações no processo e no mercado de “Este fato ajuda-nos a explicar
trabalho, enquanto em outros casos surgia uma o repentino apoio ao owenismo,
verdadeira aristocracia de trabalhadores no final da década de 1820 –
especializados. as tradições sindicais e o anseio
Outro ponto de destaque refere-se às pela independência fundiram-
organizações sindicais. Thompson afirma que se na idéia do controle social
estas organizações tinham os artesãos como a sobre seus próprios meios de
maioria de seus membros, sendo entre eles que vida: uma independência
os movimentos religiosos e educacionais coletiva.” (p.107-108)
floresceram e o owenismo criou as mais O último grupo a ser analisado pelo
profundas raízes, além disso, analisa a autor são os tecelões. E neste, como nos outros
influência deste grupo sobre o radicalismo casos, Thompson também diferencia os
político, nos anos pós-guerra. Assim como diversos tipos de trabalhadores inseridos neste
abordado anteriormente no caso da agricultura, ofício, bem como as diferenças nas diversas
o subemprego crônico também era o principal regiões do país. Este grupo, embora em alguns
problema nas cidades. aspectos e em momentos específicos tenha
“Há evidências sugerindo que sido beneficiado, também sofreu uma perda
a situação se deteriorou entre sistemática de status. Em alguns casos, o status
as décadas de 1820 e 1830, até do mestre caía ao nível dos seus oficiais; já os
a de 1840 (...) a proporção de oficiais conquistaram uma certa independência
trabalhadores cronicamente em relação ao mestre quando as fábricas
subempregados crescia começaram a contratá-los. Referindo-se à
desfavoravelmente em relação primeira fase da Revolução Industrial, na
aos plenamente empregados. virada do século XVIII para o XIX, quando a
(p.91) mecanização tinha atingido em grande escala
“Podemos af irmar com a fiação, mas ainda não a tecelagem,
segurança que o artesão sentia Thompson comenta “Essa foi a ‘idade de
que seu status e seu padrão de ouro’ para o oficial tecelão, tanto no setor de
vida estavam ameaçados ou se lã quanto no de algodão.” (p.123)
deteriorando, entre 1815 e Contudo, esta prosperidade gerada
1840. As inovações técnicas e pelo incremento da produção mecanizada de
a superabundância de mão-de- fios acaba dissimulando uma significativa
obra barata debilitaram sua perda de status. Entre 1788 e 1803, anos de
posição. Ele não possuía relativa prosperidade, o artesão e o oficial-
direitos políticos, e o Estado tecelão acabam convertendo-se todos no
procurava destruir seus genérico “tecelão manual”, o que gerou uma
sindicatos, mesmo que por diminuição significativa dos salários desta
simples capricho.” (p.106-107) categoria. Uma enorme quantidade de mão-
A radicalização política dos artesãos de-obra excedente, semi-empregada e
se deu com base nas injustiças sofridas por indefesa, contribuía para o rebaixamento dos
estes trabalhadores. A perda de prestígio, a próprios salários. Houve, portanto, duas fases

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na decadência dos tecelões manuais: a crescente deterioração. A estética, as


primeira, com o aparecimento do tear moradias, o saneamento e a densidade
mecânico, que ocasiona a redução dos salários, demográfica foram fatores preocupantes. As
mesmo que de forma psicológica. A segunda, piores condições foram observadas nas
quando o tear mecânico substituiu cidades que se expandiram mais
efetivamente a produção manual, continuando repentinamente durante a Revolução
a diminuição salarial. Observa-se que a Industrial.
questão salarial passa a ser o alvo da principal “Nessa época, os trabalhadores
reivindicação dos tecelões, após sucessivas estavam virtualmente
reduções, reivindicavam a legalização do segregados em seus redutos
salário mínimo. “A deterioração das fétidos e as classes médias
condições de vida dos tecelões era atribuída demostraram sua verdadeira
diretamente ao ‘abominável sistema de opinião sobre as cidades
redução de salários’.” (p.137) industriais, afastando-se delas
Todos estes fatores causavam imensa tanto quando o transporte
indignação, e as manifestações das eqüestre lhes permitisse.” (...)
comunidades têxteis acabam se aliando ao “Certamente, uma taxa de
movimento cartista. O apego dos tecelões ao crescimento populacional sem
igualitarismo social superava até mesmo o dos precedentes e a concentração
artesãos urbanos. “Os tecelões perceberam nas áreas industriais criariam
claramente que ‘o capital e a propriedade sérios problemas em qualquer
estão protegidos, enquanto o seu trabalho é sociedade, mas, principalmente
abandonado ao acaso’.” (p.155). Com isso numa que se fundamentasse na
percebemos a clareza na distinção entre capital obtenção de lucro e na
e trabalho, estabelecendo assim uma hostilidade ao planejamento.
consciência de classe efetiva entre os Podemos considerá-las como
trabalhadores. problemas inerentes à
Após expor a experiência de mudança industrialização, agravadas
de vida destes três grupos de trabalhadores, o pela tendência predatória do
autor discute outros elementos não menos laissez-faire capitalista.”
importantes para entender as mudanças no (p.188-189)
padrão de vida da população. No capítulo 5, Em relação a outras questões, como
inicia expondo como se dava o consumo de saúde e mortalidade, as dificuldades
artigos básicos (alimentação, moradia e interpretativas tornam-se ainda maiores. O
vestuário), além da questão da saúde e da autor afirma que menos de 10% dos habitantes
mortalidade, essenciais para se entender o das grandes cidades gozavam de perfeitas
período. “Durante a Revolução Industrial, o condições de saúde, e aponta as condições
preço do pão (e da farinha de aveia) era o subumanas dos trabalhadores nas fábricas.
principal índice para avaliar o padrão de Embora haja quem sustente que houve
vida, na opinião do povo.”. Do mesmo modo, declínio da mortalidade infantil e aumento da
“a carne certamente serve como um sensível expectativa de vida, estes casos se aplicam as
indicador dos padrões materiais, pois seu classes médias e à aristocracia operária, não
consumo seria um dos primeiros a crescer podendo ser aplicada à classe trabalhadora em
quando houvesse qualquer aumento real dos geral. Além disso, o autor ainda analisa a
salários.” (p.181) questão do trabalho infantil, afirmando que
Em relação ao meio urbano na época “houve uma intensificação drástica da
da Revolução Industrial, podemos constatar exploração do trabalho das crianças entre
segundo apontamentos do autor, que o 1780 e 1840.” (p.202). O autor expõe ponto
ambiente urbano realmente passou por uma a ponto este episódio vergonhoso da história.

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No capítulo 6, Thompson retoma a punhado de extravagantes, destacando que


discussão religiosa, principalmente no que Southcott conseguiu vários seguidores e
tange a influência do metodismo sobre a classe ocasionou grandes estragos no campo
trabalhadora. No princípio do século XIX, o metodista. Porém, “os metodistas,
metodismo obteve grande êxito em servir naturalmente, levavam muitas vantagens
simultaneamente como religião da burguesia sobre os Southcottianos: organização estável,
industrial (apesar de compartilhar este terreno dinheiro e atitude tolerante das autoridades.”
com outras seitas heterodoxas) e de amplos (p.273). O alastramento do metodismo
setores do proletariado. O que nos faz observa, ocorreu simultaneamente ao do
compreender o duplo serviço da Igreja Radicalismo, do Cartismo27 e do Metodismo.
metodista. “As doutrinas autoritárias do metodismo
Para o proletariado, num período de alimentaram, às vezes, antíteses libertárias.”
excepcional miséria, o metodismo foi um (p.278)
“Novo Remédio para a pobreza” e era um fator No último capítulo, finalmente, o
fundamental para manter a disciplina do autor examina alguns dos elementos das
trabalho. E isto era de grande importância para comunidades da nova classe operária, a
o patrão- manufatureiro da Revolução questão da disciplina fabril e do moralismo é
Industrial que estava obcecado por estes mais uma vez destacada. Porém, o autor
problemas disciplinares do capitalismo ressalta que o processo de imposição da
industrial. disciplina social não deixou de encontrar
“O sistema fabril requer a resistências. As autoridades temiam que as
transformação da natureza formas de lazer e as relações pessoais de uma
humana, e os ‘paroxismos de forma geral pudessem ser um ponto de partida
trabalho do artesão ou do para a insurreição. Com isso, houve várias
trabalhador externo devem ser tentativas de repressão a estes espaços. À
metodizados até que o homem medida que se percebiam as perdas, ocorre um
se adapte à disciplina imposta sentimento de orgulho e o crescimento da
pela máquina.” (p.239). autoconsciência dos trabalhadores.
Thompson analisa brevemente as “Tratava-se de uma resistência
questões da teologia e afirma que consciente ao desaparecimento
“a teologia metodista, em de um antigo modo de vida,
virtude do seu oportunismo freqüentemente associada ao
inescrupuloso, estava mais bem radicalismo político. Nesta
preparada do que qualquer mudança, a perda do tempo
outra para servir de religião a livre e a repressão ao desejo de
um proletariado que não tinha se divertir tiveram tanta
qualquer razão para se sentir importância quanto a simples
‘eleito’, em função da sua perda física dos direitos
experiência social.” (p.240). comunais e dos locais para
A religião dava aos mais humildes e recreio.” (p.300)
incultos a esperança de atingir a graça e, neste Para retratar o crescimento da
respeito, o metodismo abriu suas portas à consciência da classe operária, o autor faz uma
classe operária. descrição das sociedades de auxílio mútuo, que
Outra influência importante foi o contribuíram fortemente para a criação de
milenarismo de Joanna Southcott 26, que sindicatos. Estas sociedades traziam
profetizava nada mais que um apocalíptico fim concepções sobre o “homem social” e
do mundo. Analisando os motivos de seu apelo fundiram os princípios da caridade cristã, da
para os pobres do período, Thompson salienta “fraternidade”, da tradição metodista e os
que eles não podem ser deescartados como um conceitos sociais do socialismo owenista.

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“Os valores coletivistas eram O que houve entre 1802 e 1806


defendidos conscientemente, certamente contribuiu para aflorar o
sendo propagados na teoria sentimento patriótico popular, levando antigos
política, no cerimonial dos jacobinos a se tornarem patriotas dispostos a
sindicatos e na retórica moral. denunciar Napoleão. E foi desta forma que
Esta autoconsciência coletiva, surgiu o novo radicalismo.
associada a teorias, “O radicalismo, à medida que
instituições, normas avançava o século 19, viria a
d i s c i p l i n a re s e v a l o re s abranger diversas tendências.
comunitários correspondentes, Em 1807, ele sugere o tom e a
é o que distingue a classe coragem do movimento
operária do século XIX da aplicável a qualquer outra
plebe do século XVIII.” (p.317) doutrina. Indicava uma
Com o passar do tempo, argumenta o oposição inflexível ao governo,
autor, pode-se constatar que houve um desprezo pela fraqueza dos
crescente enfraquecimento da influência das Whigs29; oposição a restrições
igrejas, e, o metodismo vai cedendo espaço das liberdades políticas;
ao owenismo e outros movimentos seculares. exposição aberta da corrupção
As classes trabalhadoras estavam se afastando e do ‘sistema Pitt 30’, e apoio
cada vez mais das seitas religiosas. A chegada geral à Reforma Parlamentar.
dos irlandeses, que trouxeram um Havia pouco consenso sobre
revolucionarismo mais primitivo, também foi questões sociais e econômicas e,
um importante fator, pois se fundiu com o embora o radicalismo mais
radicalismo político inglês, o que se coerente fosse o do populacho
concretizou no movimento cartista. E nesse londrino, era suficientemente
contexto há a formação de uma nova classe amplo para incluir,
operária, mais amadurecida politicamente. ocasionalmente, a insatisfação
Para que isto acontecesse, os vários fatores dos industriais ou pequenos
levantados pelo autor neste segundo volume fidalgos.” (p.26)
da obra foram de suma importância. No pós-guerra, o radicalismo se
expressava principalmente pelos pequenos
VOLUME III – “A FORÇA DOS mestres artesãos e comerciantes:
TRABALHADORES”28 “O grau de radicalismo desses
grupos foi um fator importante
No terceiro volume se dá a na vida política do pós guerra,
finalização de A formação. No primeiro e teve uma influência sobre uma
capítulo, Thompson faz um relato histórico do parcela das liberdades inglesas
radicalismo popular, comentando as que se revelou um estorvo
dificuldades encontradas isso, devido à contínuo para as autoridades.”
censura aos movimentos e manifestações (p.28).
durante o período da guerra. Partindo desta Até 1815,
premissa, o autor descreve os motins e a “o radicalismo se manteve
insatisfação dos trabalhadores geradas no como um movimento defensivo,
período, decorrentes principalmente da crise um movimento de protesto
econômica na Inglaterra, devido ao bloqueio oralmente articulado, apoiado
continental de Napoleão, que acarretou ao país p o r u m a m p l o
alto índice de desemprego, forte estagnação descontentamento popular. Não
industrial e um grande aumento dos preços dos era ainda uma força de
alimentos. ataque.” (p.30).

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Neste período não havia “o jacobinismo tornara-se inerente às


nenhuma ligação do único órgão comunidades operárias exatamente no mesmo
radical regular, o comitê de momento em que perdera qualquer centro
Westminster 31 , com os nacional e a maior parte do seu apoio de
movimentos operários nos classe média.” (p.61). Desta forma, segundo
centros da Revolução Industrial o autor, o tronco em que se enxertou o
e com o apoio do movimento jacobinismo foi o sindicato ilegal. Essa
Luddista. ilegalidade dos sindicatos levada pelas Leis
No capítulo seguinte, o autor resgata de Associação33, que proibia qualquer forma
a tradição clandestina das organizações de associação que visasse alguma reforma
operárias e do próprio movimento Luddista. política, acabou enfrentando um paradoxo,
Esta clandestinidade se dava devido à pois os grandes avanços do sindicalismo se
proibição de reuniões e de qualquer forma de registraram justamente nos anos de vigência
correspondência organizada instauradas pelas destas leis. “As Leis de Associação eram a
leis de Pitt. Após expirar o prazo destas leis, causa, não só de clandestinidade e
rapidamente as reuniões públicas começavam desmandos, como também das greves e do
a ser convocadas numa série de lugares muito próprio sindicalismo.” (p.85)
distantes entre si. O que fez com que esta Finalmente, tais leis foram revogadas,
legalidade fosse bastante efêmera, levando o e Place foi imortalizado na história do
governo a redecretar a lei contra reuniões sindicalismo, por ter sido o principal artífice
sediciosas e a suspensão do habeas corpus. dessa revogação. Ele defendeu o fim das Leis
Assim, a agitação tornou-se mais uma vez por ofenderem a boa economia política e por
clandestina. A partir daí, o autor resgata alguns se indignar com qualquer repressão aos
agitadores que atuaram nesta época e afirma: trabalhadores.
“Havia nitidamente alguma “Os argume ntos mais
organização clandestina em convincentes para a revogação
andamento, procurando levar a das Leis de Associação tinham
um canal revolucionário os sido, em primeiro lugar, a sua
descontentes com a alta dos constante ineficácia para
preços e a escassez dos impedir o crescimento do
alimentos. Disso há provas em sindicalismo e, em segundo
demasia, e de demasiadas lugar, o predomínio da ação
fontes independentes, para que sindical violenta, agudizada
se possa sustentar a ficção com luddismo.” (p.88)
histórica aceita de que a O autor resgata a figura dos aparadores
‘sedição’ só existiu na de tecido, definindo-os como precursores do
imaginação de ministros, movimento, e aqueles que mais se aproximavam
magistrados e espiões.” (p.40) da imagem popular dos luddistas,
O governo precisava manter uma principalmente pelo fato destes estarem em
legislação repressiva, que impedisse a conflito direto contra as máquinas que eles
organização popular de alcance nacional. sabiam que iriam substituí-los. Os aparadores:
Deste modo, “ a clandestinidade novamente “tinham clara consciência de
se revelou, e desta vez sob a forma de um que seu status se tornara instável
violento conflito industrial – o movimento frente às máquinas que
luddista32.” (p.47) poderiam transformá-los, quase
Thompson afirma que a tradição que da noite para o dia, de uma
ilegal, de 1800 a 1820 nunca teve um centro, elite em ‘uma categoria de
e essa descentralização levou a uma maior homens desnecessária à
aderência da classe operária. Nesse contexto, manufatura’.” (p.91).

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Porém, em 1806, o caso dos por um arrazoado unilateral que


aparadores quase se diluiu dentro das exagera até o absurdo a
reclamações e reivindicações generalizadas estupidez, o rancor e o papel
dos trabalhadores. provocador das autoridades, ou
“A ameaça da carda mecânica por uma falta acadêmica da
era apenas um elemento dentro imaginação que compartimenta-
de uma reviravolta generalizada liza e desconsidera todo o peso
contra os grandes patrões, que da tradição popular.” (p.152)
vinham rompendo com os Com o passar do tempo o luddismo
costumes dos trabalhadores e passou das reivindicações dos aparadores para
destruindo um modo de vida metas revolucionárias mais gerais.
estabelecido.” (p.96) “Pode-se sugerir que, em maio
Thompson afirma que o luddismo de 1818, luddismo tanto em
subsiste na mentalidade popular como um caso Lancashire 34 como em
estranho e espontâneo de trabalhadores Yorkshire 35 tinha, em larga
manuais analfabetos, resistindo cegamente às medida, cedido lugar à
máquinas, portanto, sustenta que: organização revolucionária, que
“o caráter do luddismo não foi vinha efetuando contatos
o de um protesto cego ou de um através de exilados irlandeses e
motim por alimentos (...) velhos jacobinos, com muitos
Também pouco basta descrever centros (...) onde não ocorreu
o luddismo como uma forma de nenhuma revolta luddista.”
sindicalismo ‘primitivo’ (...) Os (p.175)
homens que organizaram, Finalizando esta discussão, o autor
protegeram ou fecharam os destaca características essenciais do luddismo,
olhos ao luddismo estavam sugerindo que:
longe de ser primitivos. Eram “surgindo ao cabo de 20 anos
espertos e jocosos; ao lado dos de silenciamento quase
artesãos londrinos, alguns completo de publicações e
deles estavam entre os reuniões públicas, os luddistas
elementos com maior clareza de não conheciam nenhuma
idéias e expressão das ‘classes liderança nacional em que
industriosas’.” (p.113) pudessem confiar, nenhuma
Embora tenha sido originado em política nacional com que
queixas trabalhistas específicas, o luddismo foi pudessem identificar sua
um movimento que contribuiu decisivamente agitação. Portanto, ele sempre
para objetivos revolucionários ulteriores. A foi mais forte a nível de
partir deste ponto, o autor descreve o comunidade local e com maior
movimento luddista nas diferentes cidades, coesão quando envolvido em
assim como as diferentes intensidades das ações industriais limitadas.”
reivindicações, até sua última fase, em 1817, (p.178).
onde o movimento estava diretamente ligado O que não descartava objetivos
à política. Critica ainda as fontes tradicionais maiores e metas ulteriores provenientes em
e a visão tradicional do luddismo que grande medida destes movimentos
subestima o seu caráter insurrecional e o atribui insurrecionais locais que evidenciava os
a uma revolta cega e espontânea, afirmando símbolos de exploração do sistema fabril. O
que: autor analisa o luddismo valorizando as
“essas concepções acerca do atitudes dos trabalhadores. “Pode-se ver o
Luddismo só podem se sustentar luddismo como uma manifestação de uma

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cultura operária com maior independência e Peterloo37 em 1819, que, segundo ele, foi o
complexidade do que qualquer outra vivida resultado de uma agitação “constitucionalista”
pelo século 18.” (p.179) extraordinariamente poderosa, de caráter
A seguir, o autor discute a “era operário, dentro de um contexto
heróica do radicalismo popular”, após 1815, potencialmente revolucionário.
cujo ponto mais alto da propaganda radical “O ano de 1819 foi um ensaio
foi a Reforma Parlamentar: para 1832. Em ambos, era
“O radicalismo foi uma retórica possível uma revolução (...)
libertária generalizada, uma porque o governo estava
luta contínua entre o povo e a isolado e existiam profundas
Câmara dos Comuns não divergências dentro da classe
reformada, onde se lançava à dominante. E em 1819 os
frente um problema após o reformadores apareceram com
outro.” (p.182). uma força maior do que jamais
Porém, este radicalismo pós-guerra ocorrera antes, porque se
pode ser visto não tanto como um movimento apresentaram no papel de
de uma minoria organizada, e sim como a constitucionalistas.” (p.258).
reação das comunidades de trabalhadores, para “Os direitos reivindicados pelos
as quais a única solução para as injustiças era reformadores em 1819 eram o
um parlamento reformado que acabasse com de organização política,
qualquer tipo de privilégios. Thompson afirma liberdade de imprensa e
que “a nível nacional, o radicalismo nunca liberdade de reunião pública;
conheceu a autodisciplina de uma além deles, o direito de voto.
organização política.” (p.204). O que acaba Podemos tomá-lo por ordem.
levando o movimento a ter lideranças Quanto ao primeiro, a classe
individuais, levando isto a uma forte operária britânica já se tornara
personalização, vista em Cobbett e Hunt36, – como persistiria por 100 anos
grandes líderes radicais, cujas idiossincrasias – talvez a classe operária mais
são enfatizados pelo autor como uma evidência associável da Europa. É
da debilidade organizativa do movimento. formidável a facilidade com
“Todo radic al era um que os trabalhadores ingleses
protestador político; todo líder formavam sociedades no início
reconhecia-se individualista, do século XIX.” (p.259-260)
sem dever respeito a nenhuma Além disso, o autor ainda
autoridade além do seu próprio resgata a discussão a respeito da
juízo e consciência pessoal.” imprensa destacando a
(p.209). importância dos jornais e
O autor enfatiza esse problema da periódicos:
personalização por considerá-lo primordial “que irradiavam o radicalismo
para entender a desordem do radicalismo pós- de Londres até as províncias,
guerra, na qual havia um incentivo crescente cujos editores, publicadores,
às ações individuais e uma crítica profunda às l i v re i ro s , v e n d e d o re s
organizações, propagada por tais líderes. ambulantes e até pregadores de
Thompson destaca que em 1817, o cartazes estiveram na frente do
luddismo estava desacreditado, e de 1817 até combate pela liberdade de
o período cartista, a principal tradição operária imprensa entre 1817 e 1822.”
foi a que explorava todos os meios de agitação (p.264).
e protesto, sem uma preparação insurrecional O efeito da imprensa radical
ativa. Partindo daí, expõe o massacre de representou um fenômeno que atingia amplos

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setores da população, fazendo com que todos naquele estendeu o voto às classes médias e a
lessem e discutissem política e compar- alguns extratos superiores dos mestres
tilhassem dos mesmos descontenta-mentos e artesãos, forjando uma nova aliança entre esses
desafios. e a burguesia inglesa, que se tornava cada vez
No último capítulo do livro, o autor mais influente. Esta aliança era galvanizada
analisa como se deu a formação da consciência pela ideologia de defesa do livre mercado e
de classe entre os trabalhadores, pela concepção de mundo utilitarista.
contextualizando todos os fatores que O movimento operário, porém, como
influenciaram esse processo, sendo que, dentre sinal da constituição de uma identidade
eles, talvez o mais importante tenha sido o própria, gerava também seus próprios
owenismo. Resgatando os momentos jornalistas, que já vinham amadurecendo para
históricos dos anos de 1820, Thompson afirma o futuro movimento cartista: “o que devemos
que esta década é considerada calma em observar é o grau em que a luta pelas
comparação à década radical antecedente e a liberdades de imprensa teve uma influência
década cartista subsequente. Mas é nesse formadora fundamental para o movimento
período que é possível falar da formação de que se modelava.” (p.323-324). O autor
uma nova consciência de classe entre os descreve os meios repressivos a estes
trabalhadores. movimentos da imprensa militante sofridos
“Esses anos calmos foram os pelos jornaleiros que iam presos por vender
anos de luta de Richard panfletos e poemas sediciosos. E ressalta que
Carlile 38 pela liberdade de “na retórica da democracia do
imprensa; do aumento da força século 20, esses homens e
sindical e da revogação das mulheres foram, em sua
Leis de Associação; do maioria, esquecidos por serem
c re s c i m e n t o d o l i v re impudentes, vulgares,
pensamento, da experiência excessivamente entusiastas ou
c o o pe r a t i v a e d a t e o r i a fanáticos.” (p.327)
owenista.” (p.303) Os reformadores tinham confiança
O radicalismo destes anos foi total na proliferação dos panfletos, e
permeado por uma cultura intelectual, que consideravam os jornaleiros como as molas
somada à experiência própria, ajudaria os propulsoras da Reforma. A propaganda teve
trabalhadores a formarem um quadro essencial importância para a expansão da
fundamentalmente político de organização. organização radical, desde as cidades grandes
“De 1830 em diante, veio a e regiões industriais até os pequenos burgos e
amadurecer uma consciência cidades- mercados. Posteriormente, nos anos
de classe, no sentido marxista de 1832 e nos tempos cartistas, observa-se a
tradicional, mais claramente proliferação dos núcleos radicais formados
definida com a qual os pelos próprios artesãos locais.
trabalhadores estavam cientes Thompson, mais uma vez, destaca
de prosseguir por conta própria William Cobbett como uma figura importante,
em lutas antigas e novas.” atribuindo a ele a criação da cultura intelectual
(p.304) radical, pelo fato de ter oferecido as idéias e
Dessa forma, constituíra-se um os argumentos mais originais que acabaram
público leitor da imprensa radical. Mas o ano por unir num mesmo discurso diversos setores
de 1832 revelou que existiam de fato dois dos trabalhadores, extraindo um consenso
públicos radicais: o de classe média e o de radical da diversidade das injustiças e
classe operária. Após intensa mobilização na interesses. Essa influência poderia ter alguns
qual os trabalhadores tiveram um papel aspectos negativos:
fundamental, a Reforma Parlamentar obtida

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“Cobbett, de fato, ajudou a incomparavelmente superiores às desfrutadas


criar e alimentar o pelos trabalhadores em outros lugares. Depois
antiintelectualismo e passa a ser atribuído a Owen o papel de pai do
oportunismo teórico socialismo. Owen propunha-se a colocar os
(disfarçado de empirismo pobres em “Aldeias de Cooperação”, ou vilas
‘prático’) que se conservavam de unidade e cooperação mútua, onde:
como uma importante “depois de um subsídio de
característica do movimento capital a partir dos impostos –
trabalhista britânico.” (p.353) eles poderiam pagar por conta
Mas no entender de Thompson, a própria, e se tornariam ‘úteis’,
contribuição positiva acabou sendo muito mais ‘industriosos’, ‘racionais’,
importante: autodisciplinados e também
“Cobbett contribuiu mais do moderados.” (p.383).
que qualquer outro escritor Apesar de reconhecer a grandeza do
para impedir que os radicais e papel histórico de Owen, Thompson não o
cartistas se convertessem nas poupa de críticas:
vivandeiras dos utilitaristas39 “Mesmo que Owen estivesse de
ou da Liga Contra a Lei do profunda boa- fé (como alguns
Trigo40. Alimentou a cultura de radicais se dispunham a
uma classe, cujos erros sentia, conceder), e realmente
mas cujas soluções não consternado com a miséria do
conseguiu entender.” (p.361) povo, seu plano, se fosse
Além de Cobbett, outros pensadores assumido pelo governo,
originais também vieram a moldar a certamente se orientaria nesse
consciência política de classe após 1832. rumo.” (p.383).
Dentre eles, Carlile, Wade 41 e Gast 42. O “Por mais admirável que Owen
primeiro tomou uma parte das idéias de Paine fosse como pessoa, era um
(a doutrina dos direitos individuais) e pensador absurdo e, ainda que
negligenciou outras, levando o ultra- tivesse a coragem dos
individualismo a um limite extremo, tendo excêntricos, era um líder
aversão a sindicatos, sociedades e clubes político nocivo. (...) Por seus
políticos. Isso influenciou outros pensadores, textos não passa o mínimo
que encaravam a situação de forma senso dos processos dialéticos
semelhante. de transformação social, de
Após analisar todos estes ‘prática revolucionadora’.”
acontecimentos influenciadores, Thompson (p.388)
finalmente chega à grande influência do Mas é importante destacar que
owenismo no amoldamento subjetivo da Owen tinha profunda clareza do
consciência dos trabalhadores. Estando já papel parasitário do capitalista
largamente difundidas as teorias de e que o trabalho manual é fonte
contestação ao capital, visto como parasitário de toda a riqueza. O
do trabalho, Owen oferece pela primeira vez fundamental para Thompson,
um caminho para tentar a superação desta porém, era que o owenismo foi
situação. A origem do owenismo baseia-se na muito além do seu inspirador:
tradição paternalista, com a sua fábrica “A imprecisão do pensamento
exemplar instalada em New Lanark, Escócia de Owen, tornou possível a
atendendo plenamente ao conceito capitalista coexistência de diferentes
de disciplina no trabalho enquanto, por outro tendências intelectuais dentro
lado, oferecia condições de vida do movimento. E devemos mais

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uma vez insistir que o owenismo período a chave mais prática para o poder
era mais saudável e mais forte político.
em termos intelectuais do que No contexto dos anos owenistas
o pensamento do seu mestre.” e cartistas, a reivindicação do
(p.399). direito de voto implicava
Quando o owenismo vem como um também em outras
meio de unir os trabalhadores organizados do reivindicações: uma nova
país num movimento comum é que a história forma de os trabalhadores
do owenismo e do sindicalismo geral devem tentarem alcançar o controle
ser tomadas em conjunto. Embora Thompson social sobre suas condições de
reconheça o owenismo como a primeira das vida e de trabalho. (p.435)
grandes doutrinas sociais que veio a prender a Para Thompson, o pensamento
imaginação das massas, ressaltou também sua político desses anos leva a entender a história
viciosa fraqueza: o fato de não mexer nos do sindicalismo geral e aos primeiros anos do
direitos de propriedade. cartismo, nas quais o internacionalismo,
“O que era irracional no herança jacobina, fazia-se presente. Assim,
owenismo (ou ‘utópico’, em sua com a emergência desta nova autoconsciência
acepção pejorativa usual) era coletiva, a formação da classe operária, que
a impaciência da propaganda, tomava para si o papel de protagonista das
a fé na multiplicação da razão lutas pela democracia e pela justiça social,
através de palestras e folhetos, representava o grande ganho da revolução
a atenção inadequada aos industrial.
meios. Sobretudo, havia a
evasão fatal de Owen frente as CONCLUSÃO
realidades do poder político, e
sua tentativa de se desviar da É possível traçar aqui um paralelo
questão dos direitos de entre a nossa visão sobre a contribuição para
propriedade. O socialismo a renovação da história social dada por
cooperativo pretendia remover Thompson em A formação e a análise da obra
o capitalismo, de forma indolor de Michelet feita por Edmund Wilson. Para o
e sem nenhum embate, por grande ensaísta norte-americano, o historiador
exemplo, pela educação e pelo francês, na sua busca por uma forma de
seu crescimento dentro do integrar à construção da sua narrativa a
próprio capitalismo, a partir de reflexão sobre os grandes problemas de
suas aldeias, oficinas e lojas.” filosofia da história apontados pioneiramente
(p.409) pelo italiano Giambaptista Vico, deparava-se
Neste ponto da exposição, Thompson com dois problemas fundamentais:
conclui o livro, já tendo identificado todas as Um deles era a tarefa enervante
formas e influências que culminaram na da qual já o ouvimos queixar-
formação da classe operária inglesa, presente se em suas cartas: fundir
e atuante no seu fazer-se. Examinada a materiais díspares, indicar as
configuração cultural única que permite dizer inter-relações das formas
que, no início da década de 1830, a classe diversas de atividades humanas.
operária já estava constituída, o autor volta a O outro era o de recapturar, por
analisar o movimento político de uma forma assim dizer, a forma e a cor
geral, passando a dar destaque à questão do peculiares de um momento
voto que, segundo ele, foi o ponto de hi st ór ico t al como o
convergência das agitações que ocorreram de experimentaram os homens que
1832 ao cartismo, representava naquele nele viveram – voltar ao

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FORTES, A., et al. 19

passado como se fosse presente, diversificadas e não raro


e ver o mundo sem ter uma visão contraditórias, pouco a pouco
definida do futuro ainda constroem uma nova cultura,
inexistente.43 estabelecem sua presença
coletiva e diferenciada como um
A busca obstinada por enfrentar esses desafios
novo divisor de águas no cenário
leva ao desenvolvimento de um estilo pessoal
nacional de uma potência
inconfundível:
capitalista hegemônica e legam
Michelet manipula seus temas, abandonando-
à posteridade valores políticos
os e retomando-os periodicamente, como se
revolucionários de impacto
trançasse uma corda [...] Porém, a imagem de
duradouro.45
uma corda sendo trançada é grosseira demais.
Não há imagem, exceto a própria vida, que Esperamos que este breve exercício
exprima [sua] inteligência penetrante e contribua para introduzir novos leitores ao
extrema perícia de exposição [...]44 estudo de A formação, uma obra que, pela sua
densidade e riqueza, continua a dar margem a
Do mesmo modo, conforme já
uma grande diversidade de leituras sobre um
apontamos em trabalho anterior, é fundamental
amplo leque de temas que continuam a se
identificar a complexidade com que os vários
constituir em objetos centrais de reflexão da
tópicos presentes à narrativa construída por
história social.
Thompson são analisados em sua
particularidade para, posteriormente, voltarem
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
a ser tecidos em todo articulado. A
contribuição teórica no autor, portanto,
dificilmente pode ser identificada em um ou BUNYAN, J. e L. E. Hazelbaker. The pilgrim’s
outro trecho de síntese ou de polêmica progress in modern English. North
historiográfica, mas se encontra Brunswick, NJ: Bridge-Logos Publishers.
principalmente na seleção de materiais e na 1998. Xxii.
forma como eles são articulados entre si.
Acompanhar os fios com os quais Thompson BURKE, E. Reflexões sobre a revolução em
tece a sua narrativa permite compreender que França. Brasília: Editora da Unb. 1982
a sua contribuição inovadora para a análise
dos processos de formação de classe não pode BURKE, E. e J. G. A. Pocock. Reflections on
ser resumida à repetição de fórmulas the Revolution in France. Indianapolis, Ind.:
descontextualizadas, tais como “a classe esteve Hackett Pub. Co. 1987. lvii.
presente ao seu próprio fazer-se”:
A formação perm anece ENGELS, F. A situação da classe
instigante, entre outros motivos, trabalhadora na Inglaterra. São Paulo:
por não oferecer uma teoria das Global. 1985
classes sociais, e por não
apresentar os trabalhadores Fortes, A. O direito na obra de E. P. Thompson.
como sujeitos predestinados da História Social, v.2, p.89-111. 1995.
redenção da humanidade. Mas
sim por oferecer uma narrativa ______. “Miríades por toda a eternidade”: a
na qual seres humanos atualidade de E. P. Thompson. Tempo Social,
explorados e oprimidos por v.18, n.1, junho de 2006, p.197-215. 2006.
forças econômicas e políticas
avassaladoras vivenciam a FORTES, A., A. L. Negro, et al. As
destruição do seu modo de vida peculiaridades de E. P. Thompson. In: (Ed.). As
e dos seus valores e, por vias peculiaridades dos Ingleses e outros textos.

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Revisitando um clássico...
20

3
Campinas: Editora da Unicamp, 2001. As (Fortes, Negro et al., 2001)
4
peculiaridades de E. P. Thompson., p.11-45 (Fortes, 2006) p. 198.
5
Halévy, E. A history of the English people in (Fortes, 2006) pp. 203-208.
6
1815. London ; New York: Ark Paperbacks. Quando não indicado diferentemente, todas
1987. xxix as citações desta seção se referem a
(Thompson, 1987b).
7
PAINE, T. Os direitos do homem : uma (Thompson, 1987b), pp. 19-20.
8
resposta ao ataque do Sr. Burke a Revolução Para edições relativamente recentes dos dois
Francesa. Petrópolis, RJ: Vozes. 1989 livros mencionados em inglês, cf: (Bunyan e
Hazelbaker, 1998); (Paine e Philp, 1995). Em
PAINE, T. e M. Philp. Rights of man ; português, há uma versão on-line do primeiro,
Common sense ; and other political writings. d i s p o n í v e l e m : h t t p : / /
Oxford ; New York: Oxford University Press. www.librosportugues.org/706C67726D3131/
1995. xxxiii (The World’s classics) a publicação mais recente do segundo é (Paine,
1989).
9
THOMPSON, E. P. A formação da classe “John Bunyan (28 de Novembro de 1628 –
operária inglesa. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 31 de Agosto de 1688, Londres), foi um
1987a escritor cristão e um pregador nascido em
Harrowden, Elstow, Inglaterra. Foi o autor de
______. A formação da classe operária The Pilgrim’s Progress (O Peregrino),
inglesa, Volume I “A árvore da liberdade”. provavelmente a alegoria cristã mais
Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1987b. conhecida que alguma vez foi publicada.”
Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/John_Bunyan
10
______. A formação da classe operária Thomas Paine (29 de Janeiro de 1737,
inglesa, Volume II “A maldição de Adão”. Rio Thetford, Inglaterra - 8 de Junho de 1809,
de Janeiro: Paz e Terra. 1987c. Nova Iorque, Estados Unidos). Pensador e
líder político republicano britânico que
______. A formação da classe operária participou de forma ativa dos movimentos de
inglesa, Volume III “A força dos Independência dos Estados Unidos e da
trabalhadores”. Rio de Janeiro: Paz e Terra. Revolução Francesa.
11
1987d. “William Cobbett (9 de março de 1763 – 18
de junho de 1835) foi um político radical,
______. A economia moral da multidão inglesa agricultor e prolífico jornalista. Nasceu em
no século XVIII. In. Costumes em comum - Farnham, Surrey. Acreditava que a reforma do
Estudos sobre a cultura popular tradicional. parlamento e a abolição do burgos podres
São Paulo: Companhia das Letras, 2005a. (Nota do Tradutor: distritos controlados pela
pp.150-202 aristocracia que elegiam parlamentares com
votações insignificantes) ajudariam a
______. A economia moral revisitada. In: solucionar a situação de pobreza dos
Costumes em comum - Estudos sobre a cultura trabalhadores rurais”. Tradução baseada
popular tradicional. São Paulo: Companhia e m : h t t p : / / e n . w i k i p e d i a . or g / w i k i /
das Letras, 2005b. pp.203-266 William_Cobbet.
12
“Robert Owen (14 de maio de 1771 - 17 e
Wilson, E. Rumo à Estação Finlândia. São novembro de 1858) foi um reformador social
Paulo: Companhia das Letras. 1987 galês, e um filósofo socialista libertário. É
considerado o pai do movimento cooperativo.”
(Endnotes) Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/Robert_Owen
1
(Thompson, 1987a) Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/John_wesley
2
(Fortes, 1995; 2006) A edição mais recente da obra mencionada por

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Thompson é: (Halévy, 1987) 15 “Edmund e Tradução baseada em: http://en.wikipedia.org/


(Dublin, 12 de janeiro de 1729 — wiki/Francis_Place
20
Beaconsfield, 9 de julho de 1797) foi um John Binns, líder jacobino inglês, foi preso
filósofo e político anglo-irlandês. Advogado, sem julgamento no Castelo de Gloucester
dedicou-se primeiramente a escritos durante a agitação popular de 1792.
21
filosóficos dos quais destaca-se An Inquiry Cidade industrial do condado inglês de
into the Origin of Our Ideas of the Sublime South Yorkshire, especializada em cutelaria
and the Beautiful (“Investigação filosófica desde tempos medievais. O declínio de
sobre a origem de nossas idéias do Sublime e Sheffield como pólo metalúrgico no final do
do Belo”) (1757)”. Cf: http://pt.wikipedia.org/ século XX foi retratado de forma bem-
wiki/Edmund_burke . Burke é considerado o humorada no filme Ou tudo ou nada (título
pai fundador do conservadorismo moderno. original: Full Monty), do diretor britânico
16
Thompson viria a desenvolver de forma mais Peter Cattaneo (1997), sobre um grupo de ex-
aprofundada o conceito de “economia moral” operários que organiza e protagoniza um show
em obras posteriores. Em português, ver: de strip-tease.
22
(Thompson, 2005a; b). “John Thelwall (1764-1834) foi um orador
17
Para uma versão recente em inglês, ver: e escritor radical britânico. Publicou um
(Burke e Pocock, 1987). Em português: volume de poesias, Poems on Various
(Burke, 1982). Subjects, em 1787, e The Peripatetic; or,
18
“Thomas Spence (21 de junho de 1750 – 8 Sketches of the Heart, of Nature and Society;
de setembro de 1814) foi um democrata radical in a Series of Politico-Sentimental Journals
e advogado da propriedade comum da terra. em 1793. De 1795 a 1796, publicou The
Nasceu em Newcastle-on-Tyne, Inglaterra, Tribune, um periódico que consistia
filho de um sapateiro e fazedro de redes basicamente das suas próprias palestras
escocês. Uma disputa relacionada aos direitos políticas. Ajudou a formar a Sociedade
sobre terras comunais em Newcastle o impeliu Londrina de Correspondência. Em 1794, foi
ao estudo da questão agrária. Suas propostas julgado por traição junto com seus
não eram pela nacionalização da terra, mas companheiros radicais John Horne Tooke e
pelo estabelecimento de paróquias Thomas Hardy, embora todos os três tenha
comunitárias auto-contidas, nas quais um sido inocentados. Autoridades governamentais
aluguel pago à paróquia (que seria investida que o consideravam o homem mais perigoso
com propriedade absoluta das terras) seria o da Grã-Bretanha continuaram a persegui-lo
único tipo de imposto a ser pago.” Tradução mesmo após a sua libertação.” Tradução
baseada em: http://en.wikipedia.org/wiki/
baseada em: http://en.wikipedia.org/wiki/
John_Thelwall
Thomas_Spence 19 “Francis Place (3 de 23
Quando não indicado diferentemente, todas
novembro de 1771 – 1º de janeiro de 1854) as citações desta seção se referem a
foi um reformador social inglês. Trabalhou (Thompson, 1987c)
como um alfaiate, mas encontrou tempo para 24
Thompson refere-se a (Engels, 1985)
ser um pi on eir o defen s or d os 25
Thompson refere-se a um documento
ant icon cepciona is e o ra dica l do iní cio publicado pela imprensa operária da época,
do sécul o XIX, que se torn ou am igo e denominado “O discurso do Oficial Tecelão”,
foi a poi ado por mui tas fi gur as que reproduz integralmente no seu livro.
influentes, incluindo Joseph Hume, Sir 26
“Joanna Southcott (ou Southcote) (abril,
Fr a nci s Bur det t , e Jer emy Ben th a m . 1750 – 27 de dezembro de 1814), era uma
Publ i cou se u l i vr o m a i s i n fl uen t e e auto-declarada profetiza religiosa. Nasceu em
choca n te, Ill ustrati ons and Proofs of Gittisham, Devon, England. Seu pai era um
t h e Pri n c i pl e s o f Po p u l a t io n , em agricultor e ela própria foi, por tempo
1822.” considerável uma empregada doméstica em

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Revisitando um clássico...
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Exeter. Ela era originalmente uma metodista, humana, já eram normais. Mas foi em 1811,
mas por volta de 1792, tornando-se persuadida na Inglaterra, que o movimento estourou,
de que possuía dons sobrenaturais, ela ganhando uma dimensão significativa. O nome
escreveu e ditou profecias em rima e então se deriva de Ned Ludd, um dos líderes do
anunciou como a mulher descrita no livro da movimento. Os luditas chamaram muita
Revelação — Na versão da Bíblia do Rei atenção pelos seus atos. Invadiram fábricas e
James (utilizada pela Igreja Anglicana), destruíram máquinas, que, segundo os luditas,
Revelação 12:1-6. Traduzido de: http:// por serem mais eficientes que os homens,
en.wikipedia.org/wiki/Joanna_Southcott tiravam seus trabalhos, requerendo, contudo,
27
“O cartismo caracteriza-se como um duras horas de jornada de trabalho. Os luditas
movimento social inglês que se iniciou na ficaram lembrados como ‘os quebradores de
década de 30 do século XIX tendo como base máquinas’. [...] Para o historiador Eric J.
a carta escrita pelo radical William Lovett, Hobsbawm, o ludismo ‘era uma mera técnica
intitulada Carta do Povo, e enviada ao de sindicalismo no período que precedeu a
Parlamento Inglês. Naquele documento revolução industrial e as suas primeiras fases
percebem-se as seguintes exigências: Sufrágio ’. Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ludismo Há
universal masculino(o direito de todos os certo consenso na historiografia de que Ned
homens ao voto); Voto secreto através da Ludd (também chamado “General Ludd” ou
cédula; Eleição anual; Igualdade entre os “King Ludd”) é na verdade uma figura
direitos eleitorais; Participação de lendária, cujas supostas “ordens” eram
representantes da classe operária no utilizada como uma justificativa simbólica
parlamento; Remuneração aos parlamentares.” para os atos de revolta praticados. Thompson
Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cartismo foi um dos historiadores que contribuiu para
28
Quando não indicado diferentemente, todas desmontar uma imagem caricatural dos
as citações desta seção se referem a ludistas como rebeldes irracionais,
(Thompson, 1987d) demonstrando como o movimento construir
29
“O Whig Party era o partido que reunia as uma estrutura nacional, articulou a ação direta
tendências liberais no Reino Unido, e com a tentativa de pressão sobre o parlamento
contrapunha-se ao Thory Party, de linha e organizou treinamentos militares
conservadora.” Cf: http://pt.wikipedia.org/ extremamente elaborados para grande número
wiki/Whigs de ativistas engajados nas suas atividades
30
“William Pitt, o Velho, 1º conde de Chatham, clandestinas.
33
estadista britânico, ministro da Guerra durante “A Lei de Associação de 1799, entitulado
a guerra dos Sete Anos, quando conduziu seu An Act to prevent Unlawful Combinations of
país à vitória sobre a França, e primeiro- Workmen, proibia os sindicatos e a negociação
ministro (1766-1768).” Cf: http:// coletiva pelos trabalhadores britânicos. Um ato
p t . wi k i p e d i a . o r g / wi k i / adicional foi aprovado em 1800. [...]
William_Pitt%2C_1%C2%B0_Conde_de_Chatham Coletivamente, esses atos se tornaram
31
“Cidade de Westminster (em inglês,City of conhecidos como Combination Laws (Leis de
Westminster) é um borough ou distrito da Associação).Os de 1799 e 1800 foram
Grande Londres situada ao oeste do distrito aprovados sob o governo de William Pitt, o
City of London (ou simplesmente a City) ou jovem, como uma respsota à atividade
Cidade de Londres e ao norte do rio Tâmisa”. jacobina e ao medo de que os trabalhadores
Cf: http://pt.wikipedia.org/wiki/Westminster fossem à greve durante uma guerra para forçar
32
“Luddismo é o nome do movimento que se o governo a atender às suas demandas. A
insurgiu contra as profundas alterações legislação levou as organizações trabalhistas
trazidas pela chamada ‘Revolução Industrial’. para a clandestinidade. Simpatias pelas
As reclamações contra as máquinas e a sua reivindicações dos trabalhadores levaram à
substituição em relação à mão-de-obra rejeição dos atos em 1824. O lobby liderado

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FORTES, A., et al. 23

pelo alfaiate radical Francis Place 1832) e John Stuart Mill (1806-1873) . Baseia-
desempenhou um papel importante nisso. se na idéia de que seria possível calcular a
Todavia, em resposta a uma sér ie de greves moralidade de um ato não em função de
que se seguiram, a Lei de Associação de 1825 princípios ou valores intrínsecos, mas sim
foi aprovada, permitindo os sindicatos mas tendo como base as suas conseqüências sobre
restringido severamente as suas atividades.” o bem-estar do maior número de pessoas. De
Traduzido a partir de: http://en.wikipedia.org/ fundamentação supostamente racionalista, a
wiki/Combination_acts filosofia utilitarista serviu para justificar as
34
Condado do noroeste da Inglaterra. conseqüências sociais negativas das políticas
35
Condado do nordeste da Inglaterra. de livre mercado e a imposição de controle
36
“Henry ‘O orador’ Hunt (6 de novembro de s disciplinares sobre os trabalhadores e os
1773 – 15 de fevereiro de 1835) foi um orador pobres em geral durante a revolução industrial
e agitador radical britânico lembrado como um a partir do que os seus defensores
pioneiro do radicalismo de operário e uma consideravam ser o benefício superior para a
importante influência no posterior movimento coletividade nacional que adviria do
cartista. Ele defendeu a reforma parlamentar crescimento econômico.
40
e denunciou as Leis do Trigo. Hunt foi levado “A Liga Contra as Leis do Trigo foi, de fato,
à política radical inicialmente durante as a retomada da Associação Contra as Leis do
Guerras Napoleônicas, tornando-se um Trigo, criada em Londres em 1836 mas que
apoiador de Francis Burdett. Seu talento para não obteve ampla popularidade. A Liga Contra
falar em publico foi notado na política eleitoral as Leis do Trigo foi fundada em Manchester,
de Bristol, onde ele denunciou a complacência 1838, e Richard Cobden and e Bright foram
tanto de Whigs quanto de Tories, e proclamou- as duas principais figures do movimento,
se um defensor do radicalismo democrático. enquanto George Wilson, o president da Liga,
Foi graças ao seu talento particular que um estava encarregado das tarefas
novo programa político para além da estreita administrativas. O objetivo da Liga era a
política cotidiana progrediu aceleradamente abolição das Leis do Trigo (o que foi obtido
nos anos difíceis que se seguiram à conclusão em 1846). Depois que esse objetivo foi
da guerra com a França.” Traduzido de: http:/ alcançado, a Liga desafiou as práticas
/ en .wik ip ed i a. or g/ wi ki / protecionistas na Grã-Bretanha. O objetivo era
Henry_Hunt_%28politician%29. estabelecer uma economia de livre-mercado
37
“O Massacre de Peterloo de 16 de agosto pleno [...].”Traduzido de: http://
de 1819 foi o resultado de uma carga de en.wikipedia.org/wiki/Anti-
cavalaria contra a multidão em uma reunião Corn_Law_League
41
pública em St Peter’s Fields, Manchester, John Wade, ex-oficial classificador de lã,
Inglaterra. Também é chamado de Massacre organizador operário e editor de periódicos
de Manchester ou, às vezes, Batalha de como Gorgon (1818-1819). Segundo
Peterloo. Onze pessoas foram mortas e mais Thompson, Wade destacou-se como
de 500 ficaram feridas, incluindo muitas investigador das condições de vida e trabalho
mulheres e crianças”. Traduzido de: http:// da classe trabalhadora no período.
42
en.wikipedia.org/wiki/Peterloo_Massacre “John Gast (1772-1837) era um construtor
38
“Richard Carlile (9 de dezembro de 1790 – de navios por ofício que trabalhou no Estaleiro
10 de fevereiro de 1843) foi um importante Deptford, no sudeste de Londres (embora eles
agitador pelo estabelecimento do sufrágio estivesse também associado com a vizinha
universal e pela liberdade de imprensa no Rotherhithe, onde ele viveu por um certo
Reino Unido.” Traduzido de: http:// tempo), e um sindicalista pioneiro. Tendo
en.wikipedia.org/wiki/Richard_Carlile tentado fundar sem sucesso uma organização
39
Concepção filosófica elaborada por trabalhista durante a década de 1790, ele
pensadores como Jeremy Bentham (1748- ajudou a organizar a ‘Hearts of Oak Benefit

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24

Society‘ (Sociedade Beneficente Corações de


Carvalho) durante a greve dos estaleiros de
1802 e advogou pelos direitos dos
trabalhadores em panfletos radicais como
Calumny Defeated, or A Complete Vindication
of the Conduct of the Working Shipwrights,
during the late Disputes with their Employers
(‘A Calúnia Derrotada, ou uma Defesa
Completa da Conduta dos Trabalhadores em
Estaleiros durante as últimas Disputas com
seus Empregadores’) (1802). Tendo se
envolvido com esforços regionais para
construer sindicatos (notavelmente o
Metropolitan Trades Committee - Comitê
Metropolitano dos Ofícios), em 1822 Gast
formou um ‘Committee of the Useful Classes’
(‘Comitê das Classes Úteis’), às vezes descrito
como um pioneiro conselho nacional de
ofícios, e em 1824 ele foi o primeiro secretário
da ‘Thames Shipwrights Provident Union’
(‘União de Previdência dos Trabalhadores em
Estaleiros do Tâmisa’). Gast também
promoveu a organização inter-sindical ‘The
Philanthropic Hercules’ (‘O Hércules
Filantrópico’)”. Traduzido de: http://
en.wikipedia.org/wiki/John_Gast43 (Wilson,
1987), p. 24.
44
(Wilson, 1987), p. 26.
45
(Fortes, 2006), p. 208.

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