Neste item Freud sublinha a importância de diferenciar, nos
quadros patológicos, sintomas de inibições, já que há moléstias em que determinadas funções estão inibidas, sem necessariamente haver a presença de processos patológicos sintomáticos. Daí a importância de se considerar as inibições também como sintomas. Por exemplo, deve-se considerar uma pessoa completamente inibida em sua capacidade de trabalhar e produzir coisas com sentido para ela como gravemente adoentada. Nesse aspecto, descreve-se como inibições as situações nas quais alguma função normal do eu está restrita e inibida, não podendo realizar-se plenamente. São funções normais do eu alimentar-se, dormir, locomover-se, produzir (“trabalhar”) e sentir prazer sexual. São exemplos da inibição da função sexual pessoas que estão completamente impossibilitadas de experimentar prazer sexual (impotência psíquica) e/ou de levar a cabo a relação sexual, exceto por meios muito tortuosos e complicados. Por exemplo, o fetichista que só consegue chegar ao êxtase sexual impondo ao objeto determinadas condições (um tipo de sapato, cabelo, vestimenta, etc.). Outros exemplos de inibidos sexualmente são os homens que não conseguem ter ereção ou ejaculam muito rapidamente. O papel da ansiedade em todos os casos de inibições é sempre evidente. Por exemplo, a jovem anoréxica sente-se terrivelmente ansiosa quando diante de um prato de comida, e por isso desiste de comer. O inibido na capacidade de trabalhar experimenta uma terrível ansiedade antes de começar qualquer tarefa produtiva e por isso desiste dela; o inibido na capacidade de locomover-se, antes de sair de casa; e o insone, a cada vez que começa chegar a noite. E o inibido sexualmente, ante à cada vez que será convocado ao sexo. E assim por diante. Basta que a ideia de realizar tal ato para que a pessoa experimente repulsa e ansiedade, algo que explica, por exemplo, muitos atos obsessivos que antecedem a tarefa temida. Por exemplo, o inibido em sua capacidade produtiva que precisa arrumar milimetricamente todos os objetos da mesa, antes de “começar” a trabalhar. Para compreender bem a diferença entre inibições e sintomas, cita-se uma aplicação disso na função da locomoção. Uma pessoa com sintomas histéricos, terá seu aparelho locomotor paralisado, não conseguindo de forma alguma caminhar. Ao passo que uma pessoa inibida, conseguirá caminhar, mas sentirá desânimo e indisposição à fazê-lo, sentindo enorme ansiedade quando sair à rua, por exemplo. Na inibição da função do trabalho, muito comum nos pacientes atuais, observa-se desde a perda completa do prazer em produzir coisas, até o sentimento de se ser incapaz de realizá-lo bem, passando também por estados físicos de fadiga, tontura ou enjôo ao realizá-lo, obrigando-o a desistir do mesmo. Novamente evidencia-se a diferença entre inibições e sintomas, já que enquanto nas inibições, a pessoa perde a vontade de realizar a tarefa, nos sintomas, a pessoa quererá conscientemente fazê-lo, mas não conseguirá, por impedimentos orgânicos (se for histérico), ou por rituais obsessivos intermináveis (se for obsessiva). Deve-se considerar em todo caso de inibição o valor simbólico da função que o ego está impedido de fazer, mais especificamente, com o significado inconscientemente erótico de tal função. Por exemplo, descobriu-se em um jovem completamente paralisado em sua capacidade de produzir que ele interpretava qualquer avanço nesse sentido como um ato tripudiador contra o pai, que ele claramente desprezava. Daí que se proibia qualquer ato criativo para não experimentar remorso e culpa. Há também em todo caso de inibição o elemento da autopunição envolvido. A pessoa não se permite realizar coisas, por exemplo, ter sucesso profissional ou prazer sexual, porque seu superego a proíbe de fazê-lo. Inibições mais generalizadas das funções do ego (o que se vê, por exemplo, nos estados depressivos graves) explicam-se por uma redução geral da energia do ego, que deve estar sendo gasta em alguma função específica, que pode ser elaborar um grande luto ou suprimir e manter sob controle algum afeto muito poderoso. Freud cita o exemplo de um paciente que sentia uma fadiga paralisante, que durava alguns dias, logo depois que algo acontecia que evidentemente deveria tê-lo enfurecido. Explicava-se a fadiga geral pelo enorme gasto energético que ele tinha que dispender para manter sob controle e “na rédea curta” a fúria incontrolável que ele havia experimentado. Concluindo, a inibição recai sobre o ego, e ocorre dentro dele, ao passo que o sintoma se lança contra o ego, e a despeito dele.
Parte II
Neste item Freud revê em parte a ideia de que o ego é
impotente diante das forças do id, na formação do sintoma. Lembramos que sintoma, em psicanálise, corresponde à uma formação derivada do fracasso da repressão. Ou, dito de outra forma, uma satisfação substitutiva do id e/ou do superego, de algum impulso instintual que se furtou à repressão. Exemplo: a fobia de sair à rua do pequeno Hans servia inconscientemente ao propósito de satisfazer seu desejo de não ter que se separar de sua mãe. Os vômitos histéricos de Dora representavam para ela inconscientemente a confirmação de sua gravidez do senhor K e também a punição, por parte de seu superego, por ter caído em tentação. Voltando ao item, Freud explica nele que o ego, ao contrário do que se pensava antes, não é tão fraco diante das forças do id, bastando lançar um sinal de desprazer para iniciar o processo de repressão, desprazer este que é experimentado pelo ego como ansiedade. Em termos metapsicológicos, o ego retira a catexia da ideia a ser reprimida e transforma esta energia em ansiedade. Importante compreender neste aspecto que não é a repressão que cria de maneira original o estado de ansiedade. Ao contrário. A ansiedade faz parte do arsenal filogenético mais primitivo dos homens, o ego só precisando acionar estas memórias traumáticas ou medos filogenéticos para poder atuar sobre o id. Nesse aspecto, o estado de ansiedade compartilhado mais primitivamente por todos os seres humanos é o trauma do nascimento, estando na base de muitos outros estados de ansiedade experimentados pelos homens posteriormente. Conclui-se até aqui algo fundamental para a compreensão da teoria e da clínica, a saber, que é em nome de se evitar estados de ansiedade insuportáveis que o ego se vale do mecanismo da repressão primeva, sendo que as repressões futuras só se somarão àquela e corresponderão ao primeiro modelo. Exemplo: uma criancinha experimenta um estado de ansiedade intensa e insuportável quando fica raivosa e sente o perigo de seu descontrole pulsional. Seu ego, antevendo o risco, reprimirá tal afeto, a criança se tornando cada vez mais bem comportada e artificial em suas relações. Adulta, não precisará mais chegar ao estado de temor inicial de temer perder o controle sobre suas pulsões, que experimentou quando pequeno, já que agora, pequenos sinais de ansiedade, farão seu papel no sentido de reforçar a repressão a cada vez que se anunciar um risco nesse sentido. Finalizando, Freud critica os autores que fizeram de sua assertiva anterior, da submissão do ego às forças do id, uma espécie de “manual para a vida”, o que só obscurece a realidade dos fatos, muito mais complicada que isso. Pois, conforme se viu, o ego não é nem passivo nem inerte às forças do id, demonstrando todo seu poder e força, por exemplo, no mecanismo da repressão.
Parte III
Freud inicia observando que é preciso compreender bem a
complexidade que existe na relação entre o ego e id / superego, sendo errôneo considerá-los coisas opostas entre si. O ego nada mais é do que uma parte organizada do id, decorrida de uma tendência integradora, e mostra-se forte quando não se dissocia deste. Já quando há uma verdadeira barreira entre ambos, o ego se fragiliza. É o que se observa, por exemplo, nos pacientes muito defendidos em relação aos seus próprios inconscientes por meio de dissociações, intelectualizações e racionalizações, por exemplo. O que torna seus egos terrivelmente frágeis e empobrecidos, já que é o contato com o id que enriquece e dá colorido emocional às experiências. Já na repressão, que não consiste num bloqueio completo do contato com o id, mas tão somente na retirada de uma ideia perturbadora da consciência, o id mostra toda sua força em relação ao ego, pois tal ideia continua a existir, com força ainda maior do que antes, e a impor todos os seus efeitos deletérios ao ego. Por exemplo, quando o pequeno Hans reprime seu medo de ser castrado pelo pai, retirando- a da consciência, ela continua a crescer em seu inconsciente, e a manifestar seus efeitos secundários em sua vida desperta. Por exemplo, a produzir o medo projetado de ser mordido pelo cavalo:
O processo mental que se transformou em um
sintoma devido à repressão mantém agora sua existência fora da organização do ego e independentemente dele.
Há que se diferenciar, portanto, na clínica, 1) situações onde
a repressão de algum conteúdo perturbador produziu um sintoma, frente ao qual o ego, ora buscará uma conciliação (“tenho medo de cavalos porque um dia vi um mordendo meu amigo”), ora, algum tipo de ganho secundário (“que pena que não posso sair por causa da minha doença. Assim não preciso ir à escola ou me afastar da minha mãe”); 2) situações onde o ego onipotentemente se sobrepôs ao id, bloqueando qualquer tipo de contato com ele. Nestas últimas encontram-se os pacientes do tipo falso self, fronteiriços e aqueles com algum tipo de distúrbio de caráter, que não apresentam uma sintomatologia específica. O ego busca agregar os sintomas psiconeuróticos a si mesmo adaptando-se muito prontamente a eles, inclusive utilizando a perda de capacidades que os mesmos trazem ao seu próprio benefício, seja para fugir de uma demanda externa ou para fugir à alguma exigência por parte do seu superego. Será, portanto, com alguma surpresa que o terapeuta perceberá que quando for tentar ajudar o ego do paciente a livrar-se do sintoma, enfrentará enorme resistência por parte dele e uma série de subterfúgios contra isso. Os sintomas trazem, além destas vantagens óbvias, satisfações narcísicas ao paciente. Por exemplo, através de seus rituais de limpeza ou retidão moral, um obsessivo se orgulhará por ser mais limpo ou correto que todos os outros homens. E um paranoico alimentará seus agudos dotes perceptivos e imaginativos através de seus delírios, estímulo que não poderia encontrar em nenhuma outra parte. De outro lado, o ego continua a manter o reprimido na rédea curta, porque ele continua fazendo exigências em termos de satisfação, o que faz o ego acionar o sinal de desprazer (ansiedade) quando isso acontece. No item a seguir Freud investigará como o mecanismo da ansiedade acionado pelo ego operou em duas fobias infantis, a do pequeno Hans e a do homem dos lobos.
Parte IV
Investigando com mais cuidado o relato de Hans, Freud
observa que seu medo não era de cavalo, mas de ser mordido por um, medo que na construção do sintoma foi desaparecendo, restando só o “medo de cavalo” e a ansiedade quando via um. Freud hipotetiza que a produção deste sintoma deve ter tido, na ocasião, algo a ver com a fase de desenvolvimento na qual o menino estava, a saber, na fase edipiana, que corresponde ao desejo ciumento pela mãe e à ambivalência com o pai. Explica ele que é bastante comum em casos de ambivalência, o paciente reprimir um aspecto do conflito e intensificar o outro, o que se vê bastante na relação entre pessoas de uma mesma família. Mecanismo que se nomeia por formação reativa. A menina tem uma relação muito ambivalente com a mãe e então reprime o ódio por esta, intensificando o amor. Observa-se a presença do ódio recalcado pelo exagero e intensidade desproporcional do sentimento amoroso e do apego, por exemplo. Em um de meus pacientes, cuja ambivalência com o pai foi muito intensa na infância, ele se lembra de ter se tornado excessivamente apegado a ele, ao mesmo tempo que tinha muito medo que seu carro caísse da ponte, a cada vez que o pai passava nela, donde se vê a presença do ódio deslocado. Mas, no caso de Hans, Freud explica que não foi isso o que aconteceu, dando ele outro destino, que não o da formação reativa à sua ambivalência. Isso porque não o vemos excessivamente apegado ao pai. Freud explica que o caso só se justifica como uma neurose na medida em que Hans deslocou o medo que sentia de seu pai, por seus impulsos edipianos, para um cavalo. Daí Hans ter recorrido ao deslocamento para lidar com sua ambivalência e medo do pai. O deslocamento bastante comum que crianças fazem do medo do pai a determinados animais explica-se pela fase totêmica na qual ela está, onde ainda não exagera as diferenças, como faz o adulto, entre os animais e os seres humanos. Para ela, o homem adulto que ela teme, assemelha-se muito a determinados animais, fortes e de atributos invejáveis, contra o qual elas costumam ser advertidas por serem muito perigosos. Tal totemismo infantil é o que explica, por exemplo, a presença de tantos animais com características humanóides nos contos de fadas, por exemplo. Analisando o homem dos lobos, Freud amplia e corrobora sua ideia de que, em todas estas fobias infantis, o aspecto oral presente no temor das crianças, de serem mordidas, comidas e devoradas corresponde ao fato de que as experiências orais têm um papel prevalente na vida das crianças pequenas, e em suas formas de manifestar amor, ódio, satisfação, desagrado, etc. Assim, para uma criança pequena, a fantasia de devorar ou engolir alguém pode significar a expressão do quanto ela a/o ama. Da mesma forma que a fantasia de ser devorado ou engolido por esta pessoa. Daí que a tradução dos temores de Hans e do Homem dos Lobos de ser, respectivamente, comido e devorado pelo pai deve-se traduzir por algo assim, na criança:
Sabe, eu amo tanto o meu papai, que gostaria muito
de ser devorado ou mordido por ele, já que é isso que eu imagino que ele faz com mamãe quando estão sozinhos no quarto.
E, se no momento, prevalece mais o ódio sobre o amor:
Sabe, eu tenho tanto medo que papai me coma ou
devore meu pipi, porque imagino que ele sabe o que tenho vontade de fazer com mamãe, e ele deve ficar muito bravo com isso… Comparando em ambos os casos, o destino que este terno impulso passivo em relação ao pai sofreu nos dois meninos, Freud diz que, em Hans, a repressão foi suficientemente exitosa em reprimir todos os seus principais impulsos do conflito edipiano, mas sobretudo, o erotismo passivo com pai, o que aponta, segundo ele, para a preponderância nele de um complexo de édipo positivo. Já no homem dos lobos, seu complexo positivo tendo sofrido um grave abalo por causa de uma sedução sofrida pela irmã, esta mesma muito masculinizada, seu lado feminino tornou-se muito acentuado, não conseguindo, com o mesmo êxito que Hans, reprimir seu erotismo passivo dirigido ao pai. De outro lado, o que explica, no fim das contas, resultados muito parecidos em termos da fobia é, segundo Freud, a presença do temor da castração em ambos os casos. Hans encontra motivação suficiente para abdicar de seu ódio pelo pai em nome de manter seu órgão viril, ao passo que o jovem russo, seu desejo passivo não foi capaz de subsistir à sua revolta masculina. Daí Freud concluir que, em ambos, o motivador da repressão, tanto da hostilidade contra o pai como do erotismo passivo para com ele, foi o medo da castração, o que lhe permite uma nova leitura de muitas fobias infantis, a saber, a ansiedade sentida em fobias a animais é o medo de castração do ego. E que é para evitá-la que o ego lança mão da repressão.
Parte V
Freud inicia explicando que é difícil estabelecer uma
equivalência entre a fobia e a histeria, no que se refere ao papel da ansiedade na formação dos sintomas, porque, na histeria, ao contrário do que ocorre na fobia, o papel da ansiedade, tanto na formação do sintoma quanto em seu resultado final, é praticamente inexistente. Os histéricos padecem de males físicos (contraturas, desmaios, dores, alucinações) e fora de seu campo sintomático são pessoas absolutamente livres de qualquer traço de ansiedade, ao contrário dos fóbicos e dos neuróticos obsessivos. Como se, neles, toda a ansiedade se expressasse unicamente nos sintomas motores, e depois desaparecesse. Um exemplo é um paciente que manifesta através de suas convulsões uma explosão de afetos, permanecendo calmo e completamente indiferente logo depois. Ou outro que, para se livrar da excitação de uma percepção real perturbadora, descarrega-a através de uma alucinação, ficando livre de qualquer ansiedade após isso. O modelo para pensarmos as formações sintomáticas histéricas clássicas são as manifestações neurovegetativas do corpo como descarga de afetos, o que também ocorre nos animais. O cachorrinho abana o rabo quando está feliz e late quando está excitado. Nosso coração dispara quando sentimos medo; ou “frio na barriga” quando estamos apreensivos com algo que está para acontecer. Mas o campo de fenômenos dos sintomas histéricos é tão complexo, e tão pouco capaz de lançar luz sobre o papel da ansiedade na formação do sintoma, que Freud sugere abandoná-lo, e substituí-lo pelas neuroses obsessivas, muito mais promissoras nesse aspecto. A observação dos sintomas obsessivos revela de forma inegável que as forças repressoras estão constantemente perdendo terreno sobre os impulsos edipianos reprimidos. Ressalta-se, a propósito, que todas as três neuroses - fobia, histeria e neurose obsessiva - lutam contra os impulsos eróticos edipianos, com a diferença de que, na neurose obsessiva, pelo fato das tendências genitais serem constitutivamente fracas na pessoa, comparativamente aos fóbicos e aos histéricos, ela sofrerá uma regressão à fase sádico-anal do desenvolvimento. Tal regressão da libido é que dará todo o tom da doença. Primeiro, um superego mais cruel e atormentador. Segundo, o erotismo travestido e satisfeito através da agressividade e violência. O ponto de fixação da doença é o início da puberdade (fim da latência), no momento em que o púbere lutará contra a tentação da masturbação, agora muito mais assustadora porque acompanhada de fantasias claramente incestuosas. É o que explica a presença dos intermináveis cerimoniais que serão tão comuns na vida dos adolescentes, o que deve ser interpretado como tentativas de driblar e amortecer o desejo, ao mesmo tempo que, mediante a repetição interminável dos gestos, acabará levá-los a satisfazer o impulso erótico secundariamente. Vestir e desvestir roupas, ficar horas no banheiro, procrastinar, andar de um lado para o outro, desperdiçar tempo, criar rituais engenhosos para ir dormir, tudo isso representando derivados da mesma situação. Neste caso, a luta contra as tendências eróticas será feita, na adolescência, mediante o estandarte de princípios morais e éticos, o que explica a hipermoralidade dos jovens e o quão sujeitos ficam os adolescentes a todo tipo de adesão à seitas e militâncias, o que lhes serve muito bem para livrar-se do sentimento de culpa inconsciente, já que o mal está no outro.
Parte VI
Freud conclui no item anterior que as lutas defensivas que o
ego lança mão para fazer frente, na neurose obsessiva, ao id e ao superego, são bastante engenhosas e demonstram a que ponto ele está implicado na tarefa, ao contrário do que se vê, por exemplo, na histeria. Assim, na neurose obsessiva o ego se apegará à realidade e à seu excessivo “senso de consciência” como formas de defesa, e lançará mão de todas suas faculdades intelectuais com o mesmo propósito, principalmente porque, nestes casos, o próprio pensar fica fortemente erotizado. Neste item, Freud elucidará dois mecanismos de defesa amplamente usados pelo ego do neurótico obsessivo para fins de se proteger da angústia. A primeira é desfazer o que foi feito e a segunda é isolar. A técnica de desfazer o que foi feito remonta, segundo Freud, à uma crença animista e mágica de que é possível, com um gesto, por exemplo, dissipar algo como um sopro. É o que se vê, por exemplo, quando o mágico sopra as mãos e faz algo simplesmente desaparecer. Nos sintomas bifásicos clássicos, isso pode aparecer, por exemplo, na situação em que uma ação é cancelada por uma segunda, de modo que é como se nenhuma ação tivesse ocorrido. Um exemplo disso é o doente “Homem dos ratos”, que colocava uma pedra no caminho, para que sua amada sofresse um acidente, e logo em seguida, a retirava, para salvá-la de sua intenção anterior, anulando magicamente o primeiro ato através do segundo, fazendo isso interminavelmente. Encontra-se uma expressão disso na normalidade quando alguém deixa de prestar atenção a um evento ou às suas consequências, ao passo que o neurótico será mais radical, fazendo como se o próprio passado ou a ação nunca tivesse existido, por meio de alguma ação motora. Nesse aspecto, diz Freud, ficar repetindo e refazendo algo incessantemente pode muito bem significar o intento de fazer desaparecer esta mesma coisa, ou fazer com que ela nunca tenha existido. A segunda técnica designada isolamento também é bastante peculiar à neurose obsessiva. Um exemplo desta técnica é o paciente, assim que lhe ocorreu algo desagradável ou fez algo significativo para sua doença (por exemplo, tocar o nariz), deve interpor um intervalo durante o qual nada deve acontecer, ele não podendo perceber ou fazer nada. Freud explica que tal isolamento motor destina-se a assegurar uma interrupção da ligação entre dois pensamento, algo como: depois de eu pensar nisso, não devo de forma alguma, pensar naquilo. Encontra-se o protótipo não patológico da técnica de isolar no ato da concentração, quando a pessoa busca isolar o conteúdo sobre o qual precisa pensar de tudo aquilo que é irrelevante ou mesmo contraditório. Isso explica porque o pensamento dito “racional” tem uma tendência à obsessividade e ao excesso de pragmatismo, afastando quaisquer elementos contraditórios que perturbem sua lógica, premissa que deve ser abandonada numa sessão de psicanálise. O neurótico obsessivo tem tremenda dificuldade em associar livremente porque seu ego não é capaz de relaxar, dado o conflito perene entre seu ego e se id. Enquanto pensa, deve deixar muita coisa afastada, que ameaça se intrometer em seus pensamentos. Assim, ele não deve relaxar, mas estar constantemente preparado para uma luta. Observa-se a atuação do mecanismo de isolamento nas sessões com o paciente organizando suas ideias, não permitindo que umas “contaminem” as outras, evitando determinadas palavras ou ser tocado por determinadas emoções, por exemplo. Freud explica que o mecanismo a ser evitado na prática de isolar é o tabu de tocar. Na medida em que o toque pode contagiar e fazer eclodir emoções perigosas e incontroláveis, de desejo e impulso de destruição:
Visto que a neurose obsessiva começa por perseguir
o toque erótico e, depois, após ter-se verificado a regressão, passa a evitar o toque erótico sob o disfarce da agressividade, depreende-se que nada é tão fortemente proibido nessa doença como o tocar….
Finalizando, Freud termina afirmando novamente que o
motivador subjacente às três formas de adoecimento psiconeurótico (fobia, neurose obsessiva e histeria) é repressão das tendências incestuosas, com vistas à evitar a castração, embora ele não saiba explicar muito bem como isso operaria nas mulheres, já que, nelas, não se pode falar precisamente em uma angústia de castração.
Parte VII
Freud retoma a produção de uma fobia infantil de animais,
tomando como exemplos o pequeno Hans e o Homem dos Lobos. A criança está atormentada com algum desejo erótico pelo genitor, que pode ser o pai ou a mãe. O ego emite sinais de ansiedade e força o id a reprimir tal desejo, de modo a evitar a castração. O desejo é então recalcado, enquanto que o medo da castração é deslocado para outro objeto, com a vantagem óbvia de que, primeiro, se pode preservar a boa relação com o pai e, segundo, que o medo passa a ficar restrito àquela situação específica (encontrar o cavalo na rua, por exemplo). E assim se dá a produção de um medo fóbico, com vistas a evitar a emergência da ansiedade provocada pelo despertar de algum desejo edipiano na criança, que leva o ego à recalcá-lo. Daí ser o medo o temor de algo específico com vistas a se proteger de uma ansiedade inespecífica e difusa. Ressalta-se que, como se verá no item VIII, há modalidades de ansiedade que antecedem as experiências triangulares edipianas da criança, e datam dos medos primitivos do infans (criança que ainda não fala) de ver-se separado da mãe e jogado à própria sorte. Na clínica, cada sintoma de medo / ansiedade do paciente deriva de uma vivência, cabendo ao terapeuta investigar se se trata de experiências de medos muito precoces (antes que a criança atinja um estado de integração) ou pertencente às relações triádicas do período edipiano. Uma pista para diferenciá-las é a presença de maior ou menor simbolismo nelas, e se se trata de um medo específico (fobia ou medo realístico) ou ansiedade difusa . Cita-se o exemplo de um menininho que desenvolveu fobia por gravatas, devido à uma viagem do pai durante a qual foi levado para a cama da mãe, ocasião na qual sonhou estar sendo sufocado por uma gravata (a mesma que o pai usava), sonho que foi interpretado como seu temor de que o pai lhe sufocasse por ter ido dormir com a mãe. No adulto, as causas etiológicas das fobias são bastante mais complicadas e difíceis de se interpretar, havendo a necessidade de diferenciá-las de medos realísticos, por exemplo, alguém que se angustia ao andar de avião ou de ser assaltado, embora mesmo nesses casos, por vezes seja possível encontrar o significado simbólico por detrás. Encontra-se o paralelo entre as fobias e as neuroses obsessivas, no que se refere à ansiedade, no fato de que, nas primeiras, o que se teme é a castração pelo pai, e no segundo, a perda da proteção do superego e do olhar malvado dos outros, sendo ambos referendados à figura paterna, que para a criança pequenina, tem sempre uma aura ameaçadora, onipresente e poderosa. Sintetizando, a ansiedade é uma reação fisiológica difusa e difícil de explicar que pode ou não se alocar no medo a um perigo específico, que pode ser real ou fantasiado. Nas psiconeuroses - histeria, fobia e neurose obsessiva, a ansiedade é, respectivamente, a reação de medo ao perigo de 1) perda do amor objetal; 2) castração; 3) abandono do superego, todas elas referendadas à algum tipo de perda/separação temida pela criança. Isso leva Freud a concluir que o estado de medo aumenta paulatinamente com o crescimento da criancinha, na medida em que vai cada vez mais se percebendo cada vez mais necessitada daqueles dos quais depende, a começar por sua mãe. Assim disse Thomas Hobbes: “quando eu nasci, minha mãe deu à luz a mim e a meu irmão gêmeo, o medo”. Parte VIII
Neste item Freud tenta precisar melhor a ansiedade. Diz ele
que ela é um afeto de caráter desprazeroso em que são prevalentes os processos de descarga motora em se vê aceleração dos batimentos cardíacos, respiração, aumento da sudorese e intensa sensação de morte iminente. Tem a função biológica de ser um sinal a um estado de perigo iminente, aprendido em situação prévia. Exemplo, se na primeira vez em que fui dar uma aula, fiquei ansiosa, posso aprender que, preparando-me mais ou me tornando mais experiente, minha ansiedade pode ser controlada, e servir para eu não ir despreparada ou ficar excessivamente tranquila. A ansiedade é nula no ato de nascimento porque a criança não tem a menor consciência de sua extrema vulnerabilidade, e aumenta com o seu crescimento, porque vai se dando conta disso. Freud relaciona o protótipo de todas as experiências de ansiedade futuras ao temor que a criancinha de colo experimenta ao experimentar a falta do ser amado, que lhe provê as necessidades fundamentais. É o que experimenta, por exemplo, a criancinha que é deixada sozinha muito tempo pela mãe, está no escuro ou é apresentada a algum estranho. Assim, vê-se em pessoas com ataques de angústia frequentemente a presença do medo excessivo da solidão e da morte, bem como o apego excessivo aos seres amados. Outra forma de formular isso é que, o estado avassalador de ansiedade ocorre a cada vez que a pessoa se sentir à mercê de tensões internas insuportáveis geradas pela perda / afastamento / separação do bom objeto, cuja constância e presença não pôde ser suficientemente sentida na primeiríssima infância. Na relação mãe-criancinha pequena, a ansiedade automática disparada mediante à invasão das excitações internas, tornar-se-á ansiedade sinal, fazendo-a chorar e emitir sinais de ajuda a cada vez que qualquer princípio de desorganização se avizinhe novamente. O avanço da criança em seu desenvolvimento fará seus temores e objetos de ansiedade mudarem ao longo da vida, embora seu fundo será sempre o mesmo: medo de separar-se da mãe, medo de separar-se do pênis, anseio de reunir-se de novo à mãe através do pênis (espécie de cordão umbilical que liga o homem ao corpo da mulher), medo do superego e medo de ser expulso da horda, medo da morte como medo de ser destacado ou expulso da vida.
Parte IX
Em poucas palavras, produz-se uma neurose para
defender-se de um perigo instintual que a pessoa experimenta internamente. Este pode ser um instinto agressivo ou sexual porventura exacerbado, o medo do superego (ansiedade social ou moral) ou, na criança, o medo de deixar de ser amado e de perder o pênis, por exemplo. Exemplo, um paciente cujo impulso assassino era muito exacerbado produziu uma neurose obsessiva cujos sintomas eram uma excessiva escrupulosidade e correção moral, além de um sentimento de permanente falsidade na relação com os outros e perda completa de sua espontaneidade. Outro paciente, em cuja infância o medo do pai lhe cortar o pênis por competir com ele era enorme, na vida adulta, temia pegar uma doença venérea e o pênis lhe cair. Diferencia-se uma pessoa neurótica de outra não neurótica pelas reações exageradas aos perigos em questão que a primeira tem, frente os quais ela criará uma série de medidas para evitar. Medo excessivo de ficar sozinho, de não ser aprovado pelos outros, de animais inofensivos ou fazer coisas banais como trabalhar, comer, dormir, se relacionar com as pessoas, ir à festas ou viajar. Da infância à latência, tais medos instintivos serão naturais, já que a criança ainda é frágil para lidar com suas pulsões, embora ela os vá superando e vencendo à medida que cresce. Assim, espera-se que a criancinha pequena tenha medo de perder o amor dos pais, do escuro ou de ficar com estranhos; a criança da fase edipiana, medo extremo do pai e o púbere, uma excessiva consciência social, donde se vê o medo do superego projetado, embora todos estes medos deixem de ser normais num adulto saudável. Da mesma forma é natural que uma menininha de quatro anos chore copiosamente porque sua boneca quebrou; de seis, porque sua governanta a reprovou; aos dezesseis, porque o namorado a deixou; e aos vinte e cinco, porque lhe morreu o filho. Mas não é natural encontrar isso numa pessoa dita madura, o que só pode se explicar pela perpetuação de uma doença neurótica nele:
Embora seja capaz de dominar os estímulos e embora
esteja suficientemente crescido para satisfazer a maior parte de suas necessidades por si mesmo, ele (o neurótico) se comporta como se as antigas situações de perigo ainda existissem (...)
Parte X
Freud termina o último item indagando-se porque algumas
pessoas se tornam neuróticas na vida adulta e porque nelas o afeto de medo e ansiedade, contrariando todo o movimento da vida, toma um papel tão relevante em suas vidas, paralisando-as por completo. Indagado de outra forma: já que os perigos são o destino comum da humanidade, porque algumas pessoas são capazes de sujeitar o medo às elaborações normais da mente e outras não. Encontra-se na psicanálise duas tentativas de responder a isso: a de Adler e a de Otto Rank. O primeiro diz que aqueles que fracassam nesta tarefa são vítimas de alguma inferioridade orgânica, tese que não se prova correta, por exemplo, a se considerar que muitos neuróticos são pessoas não só sem nenhuma inferioridade orgânica, mas pessoas bem dotadas organicamente. O segundo busca explicar a reação extrema de ansiedade encontrada nos neuróticos como sendo uma reação excessivamente intensa ao trauma do nascimento, dadas as condições difíceis nas quais algumas crianças chegam ao mundo, trauma que precisaria ser ab-reagido para levar à cura. Ora, sua proposta clínica mostra-se incorreta na medida em que sabemos o quanto a ab-reação é absolutamente ineficaz na cura dos neuróticos, eles podendo ficar décadas a fio desfiando seu fio de queixumes sem melhorar um pouco sequer. Até o momento não se descobriu uma substância química que cure neuroses. Tudo o que a psicanálise pode dizer sobre esta questão ainda é modesta, a saber, que o estabelecimento de uma doença neurótica dependerá das relações quantitativas - entre a força do ego e do id - onde entrarão em conta três fatores determinantes: um biológico, um filogenético e outro psicológico. O biológico corresponde ao fato de que a cria humana é forçada, muito mais cedo do que estaria apta, a diferenciar-se entre um ego e um id, o que a torna particularmente propícia às neuroses, cuja repressão precoce dos impulsos propicia, por exemplo, a compulsão a repetir. Outro fator biológico favorecedor de neuroses é a necessidade da criança humana de ser amada e protegida, buscas que tenderão a acompanhar o adulto pelo resto da vida. O outro fator, filogenético, corresponde ao hiato que existe no desenvolvimento sexual da espécie humana, já que a sexualidade reemergente do púbere tende a ser cooptada pela sua sexualidade infantil. Esta seria a etiologia mais direta das neuroses. O fator psicológico corresponde ao fato de que o ego é obrigado a resguardar-se dos impulsos instintuais reprimindo-os, graças aos perigos e proibições da realidade. Por exemplo, uma pessoa com fortes impulsos violentos, caso não os reprima, pode ser demitida, destruir seu casamento e suas amizades e, no pior dos cenários, se tornar um assassino.
A Importância Da Atuação Do Fisioterapeuta No Parto Vaginal em Primigestas e Multíparas - Sup - A Href '# - ftn1' Name ' - Ftnref1' - (1) - A - Sup - PDF