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TR IB U NAL DE JU S TIÇ A DE S ÃO P AU LO

■ COMISSÃO DO 190º CONCURSO D E P ROVAS E


TÍTULOS PA RA I NG RESSO NA MAG IS TRATURA

190º CONCURSO DE PROVAS E TÍTULOS PARA INGRESSO NA MAGISTRATURA


- “abordagem esperada” nas respostas da Prova Escrita Discursiva
(dissertação e questões objetivas)

A Desembargadora MARIA DE LOURDES RACHID VAZ DE ALMEIDA, Presidente da


Comissão do 190º Concurso de Provas e Títulos para Ingresso na Magistratura de São
Paulo, no uso de suas atribuições, divulga os espelhos de resposta (“abordagem
esperada”) da Prova Escrita Discursiva (dissertação e questões objetivas), realizada em
18/06/2023.

PRIMEIRA PROVA ESCRITA (dissertação e questões)

DISSERTAÇÃO

Disserte sobre o tema “Controle da Administração Pública”.


No desenvolvimento da dissertação, o candidato deverá discorrer sobre os itens
abaixo, de acordo com a ordem proposta.
a. Conceito e abrangência. Controle interno e externo. Prévio, concomitante e posterior.
Legalidade e mérito.

b. Controle administrativo. Recursos administrativos: modalidades e efeitos.


c. Controle legislativo. Controle político. Controle financeiro.

d. Controle judicial. Unidade de jurisdição. Abrangência e limites. Judicialização das políticas


públicas. Meios de controle.

Abordagem esperada:

a. Poder de fiscalização e correção que sobre a Administração Pública exercem os


órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo (0,2). Objetivo é garantir a
conformidade de sua atuação com a lei e os princípios que lhe são impostos pelo
ordenamento jurídico (0,2). Autotutela, exercida sobre a administração direta (Súmulas
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346 e 473, do STF) e a tutela, exercida sobre a administração indireta. (0,2) Interno, em
cada Poder (arts. 70 e 74 da CF (0,1)) ou externo (art. 71 da CF (0,1)). Prévio é preventivo,
antes da edição de ato. Concomitante é simultâneo à atuação administrativa, na
fiscalização de obras ou desenvolvimento de processos administrativos (0,1). Posterior se
efetiva sobre atos já praticados, para confirmá-los ou revê-los. (0,1) Legalidade verifica a
conformidade com a lei e os princípios + moralidade. (0,1) Mérito envolve conveniência e
oportunidade. (0,1)

b. Poder de fiscalização e correção que a Administração Pública exerce sobre sua


própria atuação, (0,2) sob os aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa própria ou
mediante provocação. (0,2) Os recursos administrativos fundamentam-se no direito de
petição, no contraditório e na ampla defesa (CF, art. 5º, XXXIV, a e IV). (0,1) Exemplos: a
representação, a reclamação administrativa, o pedido de reconsideração, os recursos
hierárquicos próprios e impróprios e a revisão. (0,1) Efeito suspensivo ou devolutivo, este
normal a todos os recursos e que devolve o exame da matéria à autoridade competente
para decidir. (0,1) O efeito suspensivo é o que suspende os efeitos do ato até a decisão do
recurso e só existe quando previsto em lei. (0,1)

c. Tem previsão e limites na Constituição Federal para garantia do princípio da


separação dos poderes. (0,1) Incide sobre os órgãos do Poder Executivo, as entidades da
administração indireta e o Poder Judiciário, quando exerça função administrativa. (0,1)
Controle político tem por objetivo a proteção dos superiores interesses do Estado, e
abrange aspectos de legalidade e de mérito, nas hipóteses expressamente previstas na
CF. (0,1) Exemplos: a possibilidade de apuração de irregularidades por meio das
Comissões Parlamentares de Inquérito, competência exclusiva do Congresso Nacional
para autorizar ou aprovar atos do Executivo ou de sustar atos normativos que exorbitem
seu poder regulamentar ou os limites de delegação legislativa, assim como o de
convocação de Ministros de Estado para prestar informações. (0,1) O controle financeiro
é o relacionado com a fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial da
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administração direta e indireta, ou de qualquer pessoa física ou jurídica que utilize,


arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens ou valores públicos. (0,2) Está
disciplinado nos arts. 70 a 75 da CF e abrange aspectos de legalidade, legitimidade,
economicidade, aplicação de subvenções e renúncia de receitas. (0,1) É exercido pelo
Poder Legislativo como o auxílio dos Tribunais de Contas. (0,1)

d. O Controle judicial constitui um dos fundamentos do Estado de Direito,


juntamente com o princípio da legalidade, porque sujeita a Administração Pública ao
controle por órgão dotado de garantias de imparcialidade que permitem apreciar e
invalidar os atos ilícitos por ela praticados. (0,2) A CF, no art. 5º, XXXV, confere ao Poder
Judiciário o monopólio da função jurisdicional, de apreciar, com força de coisa julgada, a
lesão ou a ameaça de lesão a direitos individuais e coletivos. (0,1) O exame pelo Poder
Judiciário abrange atos de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais ou
bilaterais, vinculados ou discricionários, (0,1) mas sempre sobre o aspecto da legalidade
(o que inclui a moralidade). (0,2) Os atos discricionários estão sujeitos a apreciação
judicial desde que esta não invada os aspectos de conveniência e oportunidade,
reservados a apreciação subjetiva da Administração Pública e que configuram o mérito
administrativo. (0,1) O juiz não pode substituir pela sua a vontade do administrador, nos
casos em que a lei possibilite a este opção válida. (0,1) Não há invasão de mérito na
apreciação dos motivos/juridicidade e não só legalidade. (0,1) Questão relevante é a da
possibilidade ou não de interferência do Poder Judiciário em políticas públicas, quanto
aos seus aspectos de discricionariedade legislativa ou administrativa, em face do
ajuizamento de ações coletivas ou individuais que configuram a chamada judicialização
das políticas públicas. A matéria impõe a discussão sobre o cumprimento de metas
constitucionais, planejamento e destinação orçamentária de recursos públicos e a
aplicabilidade do princípio da reserva do possível. (0,2) Quanto aos meios de controle,
além dos remédios constitucionais (habeas corpus, habeas data, mandado de segurança
individual e coletivo, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública), a
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impugnação dos atos da Administração Pública é possível por todos os tipos de ações,
com fundamento no art. 5º, XXXV, da CF. (0,1)

PROVA ESCRITA – QUESTÃO 1

No pedido de recuperação judicial da empresa têxtil SampTex, Lorelai Marlin foi


nomeada como administradora judicial. Considerando tais fatos, responda com base na
Lei no 11.101/2005, transcrevendo o teor das regras cabíveis.
a) O processo arbitral promovido pela SampTex em face da contratante “Cibus.com” está em
fase de instauração em uma câmara brasileira de mediação e arbitragem. Considerando o
início do processamento da recuperação judicial, Lorelai poderá contar com a suspensão
da arbitragem? Justifique.
b) Uma credora da empresa recuperanda sustenta que a natureza do seu crédito é
extraconcursal, mas SampTex entende que não, tendo ambas concordado em buscar
resolver essa controvérsia em uma mediação. Considerando que tal meio consensual pode
versar sobre todo o conflito ou parte dele, explique qual deve ser a postura de Lorelai em
relação à adoção de meios alternativos de solução de conflitos referentes à recuperação
judicial e a viabilidade de que as partes utilizem mediação para dirimir a referida disputa.

Abordagem esperada:

a) Nota – até 0,75.


Não, Lorelai não poderá contar com a suspensão da arbitragem. O art. 6º, § 9º da
Lei n. 11.101/2005 dispõe que o processamento da recuperação judicial ou a decretação
da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de
arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral.

b) Nota– até 0,75


0,35 - Segundo a Lei de Falência e Recuperação Judicial, compete ao administrador
judicial, sob a fiscalização do juiz e do Comitê de credores, além de outros deveres que tal
Lei lhe impõe, estimular, sempre que possível, a conciliação, a mediação e outros
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métodos alternativos de solução de conflitos relacionados à recuperação judicial e à


falência, respeitados os direitos de terceiros, na forma do § 3º do art. 3º do Código de
Processo Civil (Lei n. 11.101/2005, art. 22, I , j).
0,40 - Apesar de tal dispositivo, no caso há norma específica, sendo a mediação
inviável por conta do art. 20-B § 2º da Lei n. 11.101/2005: são vedadas a conciliação e a
mediação sobre a natureza jurídica e a classificação de créditos, bem como sobre critérios
de votação em assembleia-geral de credores.

PROVA ESCRITA – QUESTÃO 2

Em relação ao ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL, discorra sobre os seguintes


pontos, não se limitando ao texto da lei, e colocando suas considerações, entendimentos e
críticas sobre as questões:
a) Conceito, requisitos e hipóteses de cabimento.
b) Retroatividade, ou não aos processos em andamento antes de sua vigência.
c) Diferenciação em relação à transação penal e suspensão condicional do processo.
d) Iniciativa do acordo – recusa do Ministério Público – discordância do juiz com o benefício.
e) Formalização, cumprimento e descumprimento – consequências.

Abordagem esperada:

a) CONCEITO, REQUISITOS E HIPÓTESES DE CABIMENTO

CONCEITO (nota 0,1): Inovação trazida pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime),
negócio realizado entre o Ministério Público e o investigado para evitar que seja oferecida
a denúncia e a instauração do processo penal. É um ajuste escrito, firmado entre o
Promotor de Justiça e o autor do crime, este assistido por advogado, onde o autor do
crime concorde em cumprir algumas obrigações para se livrar da pena corporal prevista
para o delito. O ANPP está previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal.
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REQUISITOS (NOTA 0,1): Pena mínima cominada ao crime seja inferior a 4 (quatro)
anos, considerando-se eventuais causas de aumento e diminuição de pena (por exemplo
eventuais qualificadoras do crime ou sua redução em caso de tentativa). Deve o agente
confessar formalmente a prática do crime, sendo que não cabe o benefício nos casos de
violência doméstica ou contra a mulher. É também necessário que o agente seja primário
e não tenha sido beneficiado, nos 5 (cinco) anos anteriores com o mesmo acordo,
transação penal ou suspensão condicional do processo.

HIPÓTESES DE CABIMENTO (NOTA 0,1): É cabível para qualquer crime, desde que
não praticados com violência ou grave ameaça contra a pessoa, mas é imprescindível que
ele seja necessário e suficiente à reprovação da conduta e prevenção do crime

b) RETROATIVIDADE, OU NÃO, AOS PROCESSOS EM ANDAMENTO ANTES DE


SUA VIGÊNCIA. (NOTA 0,3)

A questão relativa à retroatividade do benefício aos fatos anteriores à sua vigência


ainda é controversa na doutrina e jurisprudência. Tratando-se de acordo pré-processual,
não seria cabível após o oferecimento da denúncia, uma vez que o processo já estaria em
andamento e não haveria a possibilidade de sua retroatividade. Ocorre que existem
precedentes do STJ e do STF que apontam em outra direção. Para o STJ é possível a
proposta do acordo, ainda que o fato seja anterior à vigência do ANPP, mas que a
denúncia não tenha sido recebida (HC 628.647 e HC 191.464). Para o STF há precedente
admitindo o ANPP mesmo depois de recebida a denúncia (2ª Turma, Ag em HC nº
215.396/SC, julgado em 10/03/2023, rel. Ministro Edson Fachin, v.u.). Anota-se que o
candidato deve pontuar o seu entendimento sobre essa discussão.
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c) DIFERENCIAÇÃO EM RELAÇÃO À TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO


CONDICIONAL DO PROCESSO. (NOTA 0,3)

A principal diferenciação entre o Acordo de Não Persecução Penal e a Transação


Penal e a Suspensão Condicional do Processo, é que, embora exista um acordo proposto
pelo Ministério Público, na primeira há efetivo cumprimento de uma pena e, no segundo,
na verdade o processo já se encontra em andamento, pois houve a sua instauração,
inclusive com o oferecimento e recebimento da denúncia. No ANPP, ao contrário, tudo
acontece em fase pré-processual, antes mesmo do Ministério Público oferecer a denúncia
contra o investigado, de sorte que o processo sequer chega a ser instaurado. Existem,
também, diferenças em relação às condições para a existência dos acordos com relação
às penas e sua possibilidade.

d) INICIATIVA DO ACORDO – RECUSA DO MINISTÉRIO PÚBLICO –


DISCORDÂNCIA DO JUIZ COM O BENEFÍCIO

INICIATIVA DO ACORDO (nota 0,1): A princípio, o ANPP tem início a partir de


provocação do próprio autor do delito, que através de seu advogado, postula a
formalização do acordo, de sorte que o Ministério Público, a quem cabe exclusivamente a
competência para a propositura do acordo, não podendo o Juiz, ainda que entenda que o
caso comporta o benefício, determinar que o titular da ação penal oferte a proposta (RHC
161251, do STJ).

RECUSA DO MINISTÉRIO PÚBLICO (nota 0,1): Havendo recusa injustificada pelo


Ministério Público, ou seja, se não for manifestamente incabível o acordo e se o
investigado não concordar, poderá solicitar que os autos sejam encaminhados ao Chefe
do Ministério Público, no caso o Procurador Geral, nos termos do que dispõe o art. 28 do
Código de Processo Penal, sem que o juiz possa, nessa fase, interferir na vontade das
partes, na medida em que se trata de acordo de vontades entre os dois envolvidos.
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DISCORDÂNCIA DO JUIZ COM O BENEFÍCIO (nota 0,1): Se o juiz considerar que as


condições propostas são inadequadas, poderá determinar que o Ministério Público
adeque e reformule a proposta, sendo que, se a situação persistir, haverá recusa à
homologação e os autos serão devolvidos ao Ministério Público para que, se for o caso, a
denúncia seja oferecida ou que a investigação prossiga.

e) FORMALIZAÇÃO, CUMPRIMENTO E DESCUMPRIMENTO - CONSEQUÊNCIAS


FORMALIZAÇÃO (nota 0,1): Por escrito, firmado pelo Ministério Público,
investigado e seu advogado, a ser homologado em audiência designada para ser ouvido o
agente, que deve confirmar a sua voluntariedade, e ser verificada a legalidade das
cláusulas do acordo. Homologado o acordo, o Ministério Público deve proceder à sua
execução junto ao juízo da execução penal.

CUMPRIMENTO E DESCUMPRIMENTO (nota 0,1): Em sendo cumprido


integralmente o acordado, o Ministério Público comunica ao juízo onde homologado, que
julgara extinta a punibilidade do investigado. Descumprido o acordo de uma, algumas ou
de todas as condições estabelecidas voluntariamente pelo investigado, isso acarretará a
retomada do feito, podendo o Ministério Público, da mesma forma, oferecer denúncia ou
requerer a continuidade das investigações.

CONSEQUÊNCIAS (nota 0,1): Extinta a punibilidade, o investigado não poderá ser


processado, nem condenado pelo delito praticado, ainda que a vítima não aceite esse
fato, embora deva ser cientificada do ato. O cumprimento do acordo não acarretará
qualquer outra consequência para o agente, já que sua existência não deverá constar de
qualquer anotação nas certidões criminais, salvo, no entanto, para impedir novo
benefício. Descumprido o acordo, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo da
homologação, para sua rescisão e oferecer denúncia ou requerer a continuidade das
investigações.
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PROVA ESCRITA – QUESTÃO 3

Considerando a vulnerabilidade do consumidor e o tempo como valor jurídico,


explique a teoria do desvio produtivo.

Abordagem esperada:

1) Relação de consumo e os papéis esperados do produtor e do consumidor


(valor: até 0,3). Papel do produtor: proporcionar certas utilidades e incentivos por meio
do produto final = atendimento. Papel do consumidor: entregar certas utilidades e
incentivos por meio de seus recursos = pagamento.

2) Recursos produtivos escassos (valor: até 0,3): a) Competências: I)


conhecimentos; II) habilidades; e III) atitudes. b) Tempo (vital/existencial): tempo de vida
como bem finito, que se constitui em um bem econômico primordial valioso para cada
pessoa. Emprego do tempo do consumidor para resolver o problema de consumo e a
consequente perda de tempo de vida.

3) Pressupostos necessários para configuração da responsabilidade civil por


desvio produtivo do consumidor (valor: até 0,5): a) Problema de consumo criado pelo
fornecedor; b) Comportamento antijurídico do fornecedor por se eximir da sua
responsabilidade pelo problema; c) Desvio produtivo do consumidor – emprego de tempo
vital, adiamento ou supressão de suas atividades geralmente existenciais; d) Nexo de
causalidade entre o comportamento do fornecedor e o dano dele decorrente; e)
Classificação do dano: material, moral ou autônomo (extrapatrimonial de natureza
existencial).

4) Noção geral sobre o tema (até 0,4): a) Insuficiente (0,0); b) Regular (0,1); c)
Boa (0,2); d) Muito boa (0,3) e e) Excelente (0,4).
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PROVA ESCRITA – QUESTÃO 4

O banco “X” celebrou, em 22.09.2022, com o correntista Ticio Bruno Cacio Neto, um
contrato de financiamento de um veículo da marca “FORD”, com alienação fiduciária,
para pagamento em 50 parcelas mensais, com vencimento a partir de 10.11.2022. Não
realizados os pagamentos das parcelas vencidas em fevereiro e março de 2023, o
correntista do banco foi regularmente notificado para constituição em mora. O banco
ingressou com ação de busca e apreensão em 12.04.2023, com pedido de liminar. Indaga-
se:

a) Comprovada a mora, deve o juiz conceder a liminar de busca e apreensão?


b) Na ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente, é possível a purgação
da mora pelo pagamento somente das parcelas vencidas?
c) Como deve ser interpretado o art. 3 o, § 2 o do Decreto-Lei no 911/1969, alterado pela Lei no
10.931/2004, de acordo com a jurisprudência atual e dominante do Superior Tribunal de
Justiça?
d) Pode-se afirmar, nesse caso, que a purga da mora só é permitida quando já pagos pelo
menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado, nos moldes da Súmula 284 do
Superior Tribunal de Justiça?
e) Caso o réu tivesse quitado 95% do contrato, seria possível evitar a busca e apreensão
pela aplicação da teoria do adimplemento substancial do contrato?

Abordagem esperada:

a) Comprovada a mora, deve o juiz conceder a liminar de busca e apreensão?


Nota: até 0,30

A lei é expressa: “o proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada


a mora, na forma estabelecida pelo § 2º do art. 2º, ou o inadimplemento, requerer contra
o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será
concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário” [grifei]. Logo,
considerando que o correntista foi regularmente notificado, a liminar nesse caso deve ser
concedida, presentes os requisitos legais, sendo inaplicável o disposto no art. 300 do CPC.
Cuida-se de tutela da evidência com previsão em lei especial.
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b) Na ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente, é


possível a purgação da mora pelo pagamento somente das parcelas vencidas? Nota: até
0,30

A atual redação do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 não faculta ao devedor a


purgação da mora (parcelas vencidas) nas ações de busca e apreensão de bem alienado
fiduciariamente. Assim, somente se o devedor fiduciante pagar a integralidade da dívida,
no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar, ser-lhe-á restituído o bem, livre do
ônus da propriedade fiduciária. Com efeito, a entrega do bem livre do ônus da
propriedade fiduciária pressupõe pagamento integral do débito, incluindo as parcelas
vencidas, vincendas e encargos.

c) Como deve ser interpretado o art. 3ª, § 2º, do Decreto-lei n. 911/1969,


alterado pela Lei n. 10.931/2004, de acordo com a jurisprudência atual e dominante do
Superior Tribunal de Justiça? Nota: até 0,30

A purga da mora era admitida antes da alteração do art. 3º, § 2º, do Decreto-lei n.
911/1969 pela Lei n. 10.931/2004. Hoje a lei exige o pagamento integral da dívida. Nesse
sentido, a jurisprudência da Segunda Seção, firmada pela antiga sistemática dos recursos
repetitivos (artigo 543-C do CPC/1973), é no sentido de que, "nos contratos firmados na
vigência da Lei 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a
execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida -
entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob
pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária" (STJ,
REsp n. 1.418.593-MS, Segunda Seção, j. 14/05/2014, rel. Min. Luis Felipe Salomão). Em
outras palavras, em se tratando de contrato de alienação fiduciária firmado em
22/09/2022, ou seja, após a entrada em vigor da Lei n. 10.931/2004, rigorosamente não
se fala mais em “purgação da mora”. Para evitar a consolidação da propriedade em favor
do credor, o devedor deve depositar o valor da integralidade da dívida pendente
indicado na inicial, até 5 (cinco) dias da apreensão do veículo FORD, não bastando mero
depósito do valor relativo às parcelas vencidas.

d) Pode-se afirmar, nesse caso, que a purga da mora só é permitida quando já


pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado, nos moldes da Súmula
284 do Superior Tribunal de Justiça? Nota: até 0,30

Na vigência do art. 3º do Decreto-lei n. 911/1969, antes da alteração da Lei n.


10.931/2004, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 284, a saber: “A purga
da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo
menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado”. A súmula repetia basicamente a
previsão legal. Com a edição da Lei n. 10.931/2004 essa súmula ficou superada. Exige-se
agora o pagamento integral da dívida, independentemente de pagamento mínimo.
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e) Caso o réu tivesse quitado 95% do contrato, seria possível evitar a busca e
apreensão pela aplicação da teoria do adimplemento substancial do contrato? Nota: até
0,30

O entendimento atual afasta a aplicação da teoria do adimplemento substancial


diante da incompatibilidade com a legislação em vigor que exige o pagamento integral
da dívida para a restituição do bem ao réu da ação de busca e apreensão.

Vale dizer, “a teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo


impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima
parcela da obrigação. A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual.
Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo
algum pretende extinguir a relação contratual. Vale-se da ação de busca e apreensão com
o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se
utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar
cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele,
reputadas ínfimas). A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor
apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu
dever contratual, e não como objetivo imediato da ação. E, note-se que, mesmo nesse
caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo
compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. [...] A aplicação da teoria do
adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse
contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o
nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de
satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência,
aparta-se da boa-fé contratual propugnada. A propriedade fiduciária, concebida pelo
legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial
ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada
da teoria do adimplemento substancial” (STJ, REsp n. 1.622.555-MG, 2ª Seção, j.
22/02/2017, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).

De fato, a legislação em vigor, de um lado, não indica qualquer restrição à utilização


da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora; e, de outro, é expressa ao
exigir a quitação integral do débito como condição para que o bem alienado
fiduciariamente seja devolvido ao devedor. Desse modo, conclui-se que, para a
restituição do bem ao devedor livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a
dívida, ou seja, que pague substancialmente o débito. Exige-se, aqui, o pagamento
integral. Desse modo, sem o pagamento integral no prazo de cinco dias após o
cumprimento da liminar, por expressa imposição legal, “consolidar-se-ão a propriedade e
a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às
repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de
propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da
propriedade fiduciária” (art. 3º, § 1º, do Decreto-lei n. 911/1969, com a redação
determinada pela Lei n. 10.931/2004).

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