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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 381.746 - PR (2001/0156051-3)

RELATOR : MINISTRO FRANCIULLI NETTO


RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR : JAQUELINE MAGGIONI PIAZZA E OUTROS
RECORRIDO : MARIANO ROSSA ROGENSKI E COMPANHIA LTDA
ADVOGADO : OSNI CARLOS RAULIK E OUTRO
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO.


CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE
ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS. TAXA
SELIC. ILEGALIDADE. JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS A
PARTIR DE JANEIRO DE 1996.

Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a


aplicação da Taxa SELIC em tributos, sem precisa
determinação de sua exteriorização quântica, escusado
obtemperar que mortalmente feridos se quedam os princípios
tributários da legalidade, da anterioridade e da segurança
jurídica.

Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da Administração,


além desses princípios, fica também vergastado o princípio da
indelegabilidade de competência tributária. Se todo tributo deve
ser definido por lei, não há esquecer que sua quantificação
monetária ou a mera readaptação de seu valor, bem como os
juros, devem ser, também, previstos por lei.

"A utilização da taxa SELIC como índice de apuração


dos juros legais não é juridicamente segura, porque impede o
prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque seu
uso será inviável sempre que se calcularem somente juros ou
somente correção monetária; é incompatível com a regra do
art. 591 do novo Código Civil, que permite apenas a
capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível com o
art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem juros reais
superiores a 12% (doze por cento) ao ano" (Enunciado 20,
aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).

Consoante já ficou assentado no julgamento, por esta


Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o subscritor deste,
julgado em 3.9.2002, a declaração de inconstitucionalidade da
lei instituidora de um tributo altera a natureza jurídica dessa
prestação pecuniária, que, retirada do âmbito tributário, passa a
ser de indébito para com o Poder Público, e não de indébito
tributário.

É inaplicável aos pedidos de compensação/restituição de


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tributos declarados inconstitucionais o § 1º do artigo 167 do
Código Tributário Nacional e, da mesma forma, a Súmula n.
188 desta egrégia Corte, uma vez que o indébito em questão já
não mais possui índole tributária.

Se na repetição de indébito referente a recolhimentos


relativos a tributos válidos os juros moratórios são de 1% ao
mês, seria completamente desarrazoado aplicar àqueles
fulminados pela inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz
de macular qualquer ato normativo no Estado de Direito, a taxa
do artigo 1.062 do Código Civil, sob pena de se premiar o
descumprimento da Constituição em matéria tributária com
uma taxa de juros menor.

Nada obstante os juros moratórios devam ser fixados


desde os recolhimentos indevidos, in casu, eles somente o
foram a partir de janeiro de 1996, por meio da aplicação da
indigitada Taxa SELIC pela Corte de origem. Na ausência de
recurso da contribuinte, então, este deverá ser o dies a quo
para a sua incidência.

Recurso especial provido em parte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as


acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça, por maioria, dar parcial provimento ao recurso, nos
termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Vencidas, em parte, as Sras.
Ministras Laurita Vaz e Eliana Calmon. Os Srs. Ministros Paulo Medina e
Francisco Peçanha Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 08 de outubro de 2002(Data do Julgamento).

MINISTRO FRANCIULLI NETTO, Relator

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RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto pelo Instituto Nacional


do Seguro Social, com fundamento na alínea "a", do inciso III, do artigo 105
da constituição da República, contra v. acórdão proferido pelo egrégio
Tribunal Federal da 4ª Região que decidiu, dentre outras questões, que sobre
os créditos decorrentes do recolhimento indevido da contribuição sobre o
Pro labore, "a partir de janeiro de 1996, por força do artigo 39, § 4º da Lei nº
9.250/95, incidem sobre o indébito juros da taxa SELIC, ficando revogado o
art. 167, parágrafo único do CTN" (fl. 158).

Alega a autarquia recorrente, em seu recurso especial, ofensa


aos artigos 167, parágrafo único, do CTN, e 39, § 4º, da Lei n. 9.250/95.
Nesse sentido, sustenta que não deve incidir a Taxa SELIC a pagamentos
efetuados antes do advento da Lei n. 9.250/95, e que, se admitida a
incidência da aludida Taxa para a compensação ou restituição de tributos
recolhidos antes de 01.01.96, sua aplicação é cabível somente após o
trânsito em julgado da decisão (fls. 160/165).

Sem contra-razões (fl. 166v).

É o relatório.

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EMENTA

RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO.


CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE
ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS. TAXA
SELIC. ILEGALIDADE. JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS A
PARTIR DE JANEIRO DE 1996.

Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a


aplicação da Taxa SELIC em tributos, sem precisa
determinação de sua exteriorização quântica, escusado
obtemperar que mortalmente feridos se quedam os princípios
tributários da legalidade, da anterioridade e da segurança
jurídica.

Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da Administração,


além desses princípios, fica também vergastado o princípio da
indelegabilidade de competência tributária. Se todo tributo deve
ser definido por lei, não há esquecer que sua quantificação
monetária ou a mera readaptação de seu valor, bem como os
juros, devem ser, também, previstos por lei.

"A utilização da taxa SELIC como índice de apuração


dos juros legais não é juridicamente segura, porque impede o
prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque seu
uso será inviável sempre que se calcularem somente juros ou
somente correção monetária; é incompatível com a regra do
art. 591 do novo Código Civil, que permite apenas a
capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível com o
art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem juros reais

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superiores a 12% (doze por cento) ao ano" (Enunciado 20,
aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).

Consoante já ficou assentado no julgamento, por esta


Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o subscritor deste,
julgado em 3.9.2002, a declaração de inconstitucionalidade da
lei instituidora de um tributo altera a natureza jurídica dessa
prestação pecuniária, que, retirada do âmbito tributário, passa a
ser de indébito para com o Poder Público, e não de indébito
tributário.

É inaplicável aos pedidos de compensação/restituição de


tributos declarados inconstitucionais o § 1º do artigo 167 do
Código Tributário Nacional e, da mesma forma, a Súmula n.
188 desta egrégia Corte, uma vez que o indébito em questão já
não mais possui índole tributária.

Se na repetição de indébito referente a recolhimentos


relativos a tributos válidos os juros moratórios são de 1% ao
mês, seria completamente desarrazoado aplicar àqueles
fulminados pela inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz
de macular qualquer ato normativo no Estado de Direito, a taxa
do artigo 1.062 do Código Civil, sob pena de se premiar o
descumprimento da Constituição em matéria tributária com
uma taxa de juros menor.

Nada obstante os juros moratórios devam ser fixados


desde os recolhimentos indevidos, in casu, eles somente o
foram a partir de janeiro de 1996, por meio da aplicação da
indigitada Taxa SELIC pela Corte de origem. Na ausência de
recurso da contribuinte, então, este deverá ser o dies a quo
para a sua incidência.
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Recurso especial provido em parte.

VOTO

EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO (Relator):

Na espécie, sustenta o INSS que não deve incidir a Taxa


SELIC a pagamentos efetuados antes do advento da Lei n. 9.250/96, e, por
outro lado, que, se admitida a incidência da aludida Taxa para a
compensação ou restituição de tributos recolhidos antes de 01.01.96, sua
aplicação é cabível somente após o trânsito em julgado da decisão.

No que tange à aplicação da Taxa SELIC, impõe-se


reconhecer, embora por outros fundamentos, que razão assiste ao
recorrente em pleitear seu afastamento, pois entende este signatário que a
Taxa SELIC para fins tributários é, a um tempo, inconstitucional e ilegal.
Como não há pronunciamento de mérito da Corte Especial deste egrégio
Tribunal que, em decisão relativamente recente, não conheceu da argüição
de inconstitucionalidade correspectiva (cf. Incidente de Inconstitucionalidade
no Resp n. 215.881/PR), permanecendo a mácula também na esfera
infraconstitucional, nada está a empecer seja essa indigitada Taxa proscrita
do sistema e substituída pelos juros previstos no Código Tributário (artigo
161, § 1º, do CTN).

A utilização da Taxa SELIC como remuneração de títulos é


perfeitamente legal, pois toca ao BACEN e ao Tesouro Nacional ditar as
regras sobre os títulos públicos e sua remuneração. Nesse ponto, nada há
de ilegal ou inconstitucional. A balda exsurge quando se transplantou a Taxa
SELIC, sem lei, para o terreno tributário.

Para que a Taxa SELIC pudesse ser albergada para fins


tributários, havia imperiosa necessidade de lei estabelecendo os critérios

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para sua exteriorização, por ser notório e agora até vetusto o princípio de que
o contribuinte deve de antemão saber como será apurado o quantum
debeatur da obrigação tributária. É mera falácia a assertiva de que a
incidência da Taxa SELIC não é defesa em lei, por não implicar majoração
da base de cálculo do tributo ou da alíquota.

A Taxa SELIC ora tem a conotação de juros moratórios, ora de


remuneratórios, a par de neutralizar os efeitos da inflação, constituindo-se
em correção monetária por vias oblíquas. Tanto a correção monetária como
os juros, em matéria tributária, devem ser estipulados em lei, sem olvidar
que os juros remuneratórios visam a remunerar o próprio capital ou o valor
principal. A Taxa SELIC cria a anômala figura de tributo rentável. Os títulos
podem gerar renda; os tributos, per se, não.

A doutrina e a jurisprudência já definiram e conceituaram juros


e correção monetária. A Taxa SELIC não é juro, pura e simplesmente. Não é
também genuinamente correção monetária. Cuida-se de um instituto jurídico
ainda não definido. Do ponto de vista jurídico-tributário essa taxa vem sendo
aplicada como u'a mescla de juro moratório, remuneratório e compensatório,
a par de procurar neutralizar os efeitos da inflação monetária.

Ora, a inflexão de correção monetária, para obrigações


tributárias, sempre se deu ex-vi legis, como é de fácil demonstração, cujo
escopo é o de, única e exclusivamente, manter igual poder liberatório da
moeda; mera cláusula de readaptação para debelar os efeitos corrosivos da
inflação.

De outra parte, o artigo 161, § 1º, do CTN, com força de lei


complementar, diz que os juros serão de 1%, se a lei não dispuser em
contrário. A lei ordinária não criou a Taxa SELIC, mas tão-somente
estabeleceu seu uso, contrariando a lei complementar, pois, esta só
autorizou juros diversos de 1%, se lei estatuir em contrário.

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Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a aplicação da
Taxa SELIC em tributos, sem precisa determinação de sua exteriorização
quântica, escusado obtemperar que mortalmente feridos se quedam os
princípios tributários da legalidade, da anterioridade e da segurança jurídica.

Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da Administração, além


desses princípios, fica também vergastado o princípio da indelegabilidade de
competência tributária. Se todo tributo deve ser definido por lei, não há
esquecer que sua quantificação monetária ou a mera readaptação de seu
valor, bem como os juros, devem ser, também, previstos por lei.

Nessa vereda, uma vez aplicada a Taxa SELIC, sem lei


específica a respeito, ficará vulnerado o princípio insculpido no artigo 9º,
inciso I, do Código Tributário Nacional, já que, repita-se mais uma vez, não é
possível exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.

A correção monetária e os juros, fora das hipóteses de


negócio jurídico, sentença judicial e ato ilícito, além das indenizatórias, uma e
outros, só permitem aplicação, desde que haja lei nesse sentido. Se assim é
de modo geral, com muito maior razão deve ser no campo do Direito
Tributário, preso ao princípio da legalidade e da tipicidade.

O Código Tributário Nacional não veda a mera atualização do


tributo, desde que o critério atualizador esteja previsto em lei, o mesmo
ocorrendo com os juros de mora, que devem ater-se à taxa de 1% (um por
cento) ao mês. A lei ordinária pode estabelecer juros iguais ou inferiores a
esse limite; nunca superiores a 1% ao mês.

É certo que o legislador tem plena liberdade de usar dos


critérios de conveniência e oportunidade na concepção dos valores
axiológicos, ontológicos e teleológicos da lei. Mas, a despeito da
discricionariedade existente nesse campo, não há como não acadrimar o
conteúdo substancial da lei ao sistema jurídico do País, maxime no Estado
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Democrático de Direito.

Além dos fundamentos invocados neste voto, podem ser


colacionados inúmeros outros, os quais não convém, no presente momento,
repetir (veja-se, a esse respeito, o artigo "Da Inconstitucionalidade da Taxa
Selic para fins Tributários", in "Revista Tributária e de Finanças Públicas",
São Paulo, Ed. RT, ano 8, n. 33, julho-agosto 2000, p. 59/89; "Revista
Dialética de Direito Tributário", São Paulo, Dialética, n. 58, 2000, p. 7/30 e
"Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça", Brasília, Ed. Brasília
Jurídica, ano 2, n. 14, 2000, p. 15/48).

É oportuno registrar, por último, o enunciado 20, aprovado na


Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do
Conselho da Justiça Federal, no período de 11 a 13 de setembro de 2002,
sob a coordenação científica do Ministro Ruy Rosado, que, a respeito do
artigo 406 do novo Código Civil, assim dispõe:

"A utilização da taxa SELIC como índice de


apuração dos juros legais não é juridicamente segura, porque
impede o prévio conhecimento dos juros; não é operacional,
porque seu uso será inviável sempre que se calcularem
somente juros ou somente correção monetária; é incompatível
com a regra do art. 591 do novo Código Civil, que permite
apenas a capitalização anual dos juros, e pode ser
incompatível com o art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se
resultarem juros reais superiores a 12% (doze por cento) ao
ano".

Quanto ao tema dos juros de mora, este signatário, em


diversos julgados, já adotou o posicionamento de que somente têm
incidência a partir do trânsito em julgado da sentença, nos termos do artigo
167, § 1º, do Código Tributário Nacional e da Súmula n. 188 do Superior
Tribunal de Justiça.
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A ínclita Ministra Eliana Calmon, relatora do Recurso Especial


nº 423.234-DF, cujo julgamento ainda está em curso, adotou posicionamento
diverso, para determinar a incidência dos juros de mora desde o
recolhimento indevido, aos seguintes fundamentos:

"(...) No gênero repetição de indébito, pode-se


necessitar de uma sentença condenatória que reconheça e
declare o pagamento 'a maior', ao tempo em que condene a
Fazenda a restituir o que sobejou do seu verdadeiro crédito.
Na espécie, tem-se, então, sentença condenatória de efeito ex
nunc, o que torna doutrinária e cientificamente perfeita a regra
do art. 167, § 1º do CTN.

Entretanto, há espécie de repetição na qual se


certificou adredemente a existência do plus, como por
exemplo nas hipóteses em que é um determinado tributo
reconhecido como inconstitucional.

Quando tal ocorre, não é necessária uma


condenação mas, sim, mero acertamento do quantum devido.

Nestas hipóteses, o Fisco cuida para que se faça


a compensação e, como tal, a lei que defere e disciplina a
compensação, independentemente de sentença condenatória,
pode fugir do rigor formal do art. 167 do CTN, eis que se trata
de uma restituição específica".

No caso dos autos, a repetição de indébito contra o Poder


Público decorre da declaração de inconstitucionalidade da contribuição
previdenciária, pela Excelsa Corte, por ocasião do julgamento, em 12.05.94,
do Recurso Extraordinário n. 166.772-9/RS, publicado no DJU de 16.12.94 e
com trânsito em julgado em 09.02.95, que reconheceu a
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inconstitucionalidade das expressões "autônomos e administradores", e,
posteriormente, da expressão "avulsos", por ocasião do julgamento, em
15.09.94, do Recurso Extraordinário n. 177.296-4/RS, publicado no DJU de
09.12.94 e com trânsito em julgado em 02.02.95.

Ora, consoante já ficou assentado no julgamento, por esta


Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o subscritor deste, julgado em
3.9.2002, a declaração de inconstitucionalidade da lei instituidora de um
tributo altera a natureza jurídica dessa prestação pecuniária, que, retirada do
âmbito tributário, passa a ser de indébito para com o Poder Público, e não de
indébito tributário. Com efeito, aquela lei declarada inconstitucional
desaparece do mundo jurídico, como se nunca tivesse existido.

Tampouco se aplica o artigo 165 do CTN às hipóteses de


pagamentos efetuados com base em lei declarada inconstitucional. Com
efeito, o pedido de restituição se fundamenta na declaração de
inconstitucionalidade; e não na cobrança ou pagamento espontâneo de
tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária
aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador
efetivamente ocorrido (artigo 165, I, do CTN); nem no erro na edificação do
sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do
montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento
relativo ao pagamento (artigo 165, II, do CTN); nem por reforma, anulação,
revogação ou rescisão de decisão contraditória (artigo 165, III, do CTN).

Na linha desse raciocínio, pois, forçoso concluir que é


inaplicável aos pedidos de compensação/restituição de tributos declarados
inconstitucionais também o § 1º do artigo 167 do Código Tribunal e, da
mesma forma, a Súmula n. 188 desta egrégia Corte, uma vez que o indébito
em questão já não mais possui índole tributária.

É oportuno registrar que tais considerações não são óbice à


aplicação do percentual de 1% ao mês a título de juros compensatórios,
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previsto no artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, em lugar daquele
fixado no Código Civil, que se poderia, à primeira vista, entender como
adequado.

Conquanto seja certo que tributo julgado inconstitucional não


seja realmente tributo, a declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo
Tribunal Federal não elide a presunção de constitucionalidade da norma.
Cabia ao contribuinte, assim, enquanto não existia pronunciamento definitivo
do Pretório Excelso, o dever de cumprir a determinação nela contida.

Assim, "a lei, enquanto não declarada pelos tribunais


incompatível com a constituição, é lei – não se presume lei – é para todos os
efeitos. Submete ao seu império todas as relações jurídicas a que visa a
disciplinar". Sendo a lei obrigatória, por natureza e por definição, não seria
possível facilitar a quem quer que fôsse furtar-se a obedecer-lhes os
preceitos sob o pretexto de que a considera contrária à Carta Política. A lei,
enquanto não declarada inoperante, não se presume válida: ela é válida,
eficaz e obrigatória" (Lúcio Bittencourt in "O contrôle jurisdicional da
constitucionalidade das leis", Rio de Janeiro: Forense, 1968, p. 95/96).

Ora, se na repetição de indébito referente a recolhimentos


relativos a tributos válidos, os juros moratórios são de 1% ao mês, seria
completamente desarrazoado aplicar àqueles fulminados pela
inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz de macular qualquer ato
normativo no Estado de Direito, a taxa do artigo 1.062 do Código Civil, sob
pena de se premiar o descumprimento da Constituição em matéria tributária
com uma taxa de juros menor.

Nunca é demais lembrar que a invocação do princípio da


razoabilidade não implica atribuir uma solução contrária à lei, mas apenas
permite, diante de determinadas situações fáticas, procurar a solução mais
lógica, a partir de uma argumentação jurídica aceitável, exigível pela
racionalidade, que seja, ao mesmo tempo, técnica e moderada. Esse deve
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ser o empenho constante dos integrantes desta Corte, aos quais compete a
interpretação e uniformização do direito federal infraconstitucional, atendendo
às peculiaridades de cada caso, sem privilegiar a voracidade arrecadatória
do Fisco.

Deve ficar consignado, por fim, que, nada obstante os juros


moratórios devam ser fixados desde os recolhimentos indevidos, in casu,
eles somente o foram a partir de janeiro de 1996, por meio da aplicação da
indigitada Taxa SELIC pela Corte de origem. Na ausência de recurso da
contribuinte, então, este deverá ser o dies a quo para a sua incidência.

Diante do exposto, dou provimento em parte ao recurso em


relação ao pedido de exclusão da Taxa SELIC, mas garantindo a aplicação
dos juros de mora de 1% ao mês a partir de janeiro de 1996 e correção
monetária.

É como voto.

Ministro FRANCIULLI NETTO, Relator

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VOTO-VENCIDO (Em Parte)

EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ: Sra. Ministra-Presidente, fico


vencida no que diz respeito à taxa SELIC, que deve ser aplicada a partir de 1º de janeiro de 1996,
consoante o art. 39, § 4º da Lei 9.250/95 e recentes precedentes da Primeira Seção desta Corte,
in verbis:
"TAXA SELIC. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. ATUALIZAÇÃO.
COISA JULGADA.
A Seção, por maioria, entendeu que, no caso, se aplica a taxa Selic
ao precatório complementar sem ofensa à coisa julgada. Destarte, aplicável,
à hipótese, a lei de correção monetária vigente à época da atualização do
débito, inexistindo o bis in idem. Outrossim, vedada a cumulação com outro
índice de correção monetária ou de juros, descabendo a aplicação de juros
na forma do art. 167 do CTN. Precedentes citados: REsp 434.618-RS, DJ
9/8/2002, e REsp 308.506-RS, DJ 25/6/2001." (REsp 443.237/RS, rel. Min.
Eliana Calmon, 1ª Seção, julgado em 25/09/2002, conforme Informativo de
Jurisprudência do STJ n.º 148)

"Processo Civil. Tributário. Compensação. Embargos de


Divergência (arts. 496, VIII, e 546, I, CPC). Juros. Taxa SELIC. CTN, art.
161, § 1º.
1. "Juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês (art. 161, § 1º,
do CTN), com a incidência a partir do trânsito em julgado (art. 167,
parágrafo único, do CTN) até 31/12/94, com aplicação dos juros pela taxa
SELIC só a partir da instituição da Lei nº 9.250/95, ou seja, 01/01/1995" -
EREsp 193.453- SC, Primeira Seção, Rel. Min. José Delgado.
2. Precedentes.
3. Embargos acolhidos. (EREsp 199059/SP, rel. Min. MILTON LUIZ
PEREIRA, 1ª Seção, DJ de 30/09/2002).

"TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -


ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS - COMPENSAÇÃO -
REPETIÇÃO DE INDÉBITO - JUROS DE MORA - APLICAÇÃO DA TAXA
SELIC - TERMO INICIAL - LEI Nº 9.250/95.
- Estabelece o parágrafo 4º do artigo 39 da Lei nº 9.250/95 que:"A
partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será
acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de
Liquidação e de Custódia – SELIC para títulos federais, acumulada
mensalmente, calculados a partir do pagamento indevido ou a maior até o
mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao
mês em que estiver sendo efetuada.
- A taxa SELIC representa a taxa de juros reais e a taxa de inflação
no período considerado e não pode ser aplicada, cumulativamente, com
outros índices de reajustamento.
- Na repetição do indébito, os juros SELIC são contados a partir da
data da entrada em vigor da lei que determinou a sua incidência do campo
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tributário (art. 39, parágrafo 4º, da lei 9.250/95).Precedentes
jurisprudenciais.
- Recurso improvido." (REsp 392.283/RS, rel. Min. LUIZ FUX, 1ª
Turma, DJ de 29/04/2002).

É o voto.

MINISTRA LAURITA VAZ

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Superior Tribunal de Justiça

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2001/0156051-3 RESP 381746 / PR

Número Origem: 9970060022848

PAUTA: 03/10/2002 JULGADO: 08/10/2002

Relator
Exmo. Sr. Ministro FRANCIULLI NETTO
Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOSÉ EDUARDO DE SANTANA
Secretária
Bela. BÁRDIA TUPY VIEIRA FONSECA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR : JAQUELINE MAGGIONI PIAZZA E OUTROS
RECORRIDO : MARIANO ROSSA ROGENSKI E COMPANHIA LTDA
ADVOGADO : OSNI CARLOS RAULIK E OUTRO

ASSUNTO: Tributário - Contribuição - Social

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr.
Ministro-Relator. Vencidas, em parte, as Sras. Ministras Laurita Vaz e Eliana Calmon."
Os Srs. Ministros Paulo Medina e Francisco Peçanha Martins votaram com o Sr.
Ministro Relator.

O referido é verdade. Dou fé.


Brasília, 08 de outubro de 2002

BÁRDIA TUPY VIEIRA FONSECA


Secretária

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