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C O M P O RTA M E N T O
ORGANIZACIONAL
FERRAMENTAS DE DIAGNÓSTICO E DE GESTÃO
CDU 159.9:331
Origem
A organização escolhe os seus valores desde os alvores da sua existência,
desde o momento mesmo da sua fundação. Freqüentemente, os valores prece-
dem a existência mesma da organização. A razão é simples, já que, como afir-
ma Nietzsche, “os valores caracterizam a vontade de existir e de se afirmar de
uma coletividade”. Assim, por meio dos valores, a organização expressa as
suas metas e se afirma como diferente na sociedade e no mercado. Dessa for-
ma, para a organização os valores constituem um elemento fundamental e
necessário para dar identidade coletiva a um grupo de pessoas e colocá-las a
trabalhar em torno de ideais comuns, permitindo e favorecendo o máximo de
desenvolvimento do talento individual. Para a escolha dos seus valores e da
prioridade dada aos mesmos, a organização inspira-se nos valores da socieda-
de e nos valores dos seus membros, particularmente dos fundadores e daque-
les com maior poder de influência. Como afirma Claude (2003, p. 105): “Os
valores organizacionais enraízam-se naquilo que a empresa acredita, naquilo
que constitui a sua força, a sua diferenciação, a sua vontade de se afirmar
como uma coletividade e de perdurar enquanto tal. Se a empresa deve-se reter
uma única categoria, seria certamente esta”.
Os valores da organização só existem efetivamente na mente dos seus
membros. É importante que este aspecto fique claro. Cada um dos trabalhado-
res constitui um ponto fundamental para que os valores da organização sejam
efetivos. Se o trabalhador não subordina os seus valores pessoais aos valores
coletivos da empresa, estes ficarão no nível de uma declaração de intenções. A
aceitação e a ratificação por parte dos trabalhadores são essenciais para a
existência efetiva dos valores organizacionais, isto é, enquanto princípios que
dinamizam e influenciam a vida organizacional. A aceitação e a ratificação
dos valores da organização por parte do empregado, bem como a subordina-
ção dos seus valores aos organizacionais não implicam o sacrifício dos seus
valores pessoais, mas o mero reconhecimento da prioridade dos interesses
coletivos sobre os individuais.
Conceito
O que são os valores organizacionais? Quais são as suas dimensões fun-
damentais? As seguintes características descrevem os elementos mais relevan-
tes deste conceito.
Medidas do comportamento organizacional 311
1. Os valores são formas de conhecer a realidade organizacional.
Este conhecimento pode ter sido adquirido coletivamente ou ter
sido transmitido aos outros por algum dos membros da organiza-
ção (fundador, gestores, colaboradores). Por exemplo, se em uma
organização, no decorrer do tempo, a produtividade individual se
revela como um elemento mais positivo para a produção organizacio-
nal global e para a satisfação dos empregados do que a pontualida-
de, muito provavelmente esta organização considerará a produtivi-
dade individual como um fator importante no trabalho, transfor-
mando-a em um valor prioritário. Assim, os valores expressam o
aprendizado organizacional cumulativo, a experiência adquirida.
Esta dimensão cognitiva dos valores revela a filosofia fundamental
da organização sobre o que é bom e desejável para a mesma.
2. Os valores organizacionais funcionam como necessidades que de-
terminam o comportamento orientado a um fim. A importância
que uma organização atribui a certos valores pode influenciar a quan-
tidade de esforço que os seus membros investem na emissão de de-
terminados comportamentos, bem como a sua persistência na exe-
cução dos mesmos. Assim, se uma determinada organização valori-
za a criatividade, esta prioridade axiológica determinará a decisão e
os esforços dos trabalhadores para apresentar comportamentos de
inovação e criatividade, bem como a sua persistência através do
tempo na emissão destes comportamentos. Os valores expressam
metas e interesses da organização enquanto coletividade de interes-
ses e motivações dos seus membros.
3. Os valores organizacionais são elementos estruturantes da em-
presa, constituindo padrões coletivos que orientam o trabalho e o
cotidiano na organização e aos quais devem-se subordinar os va-
lores pessoais dos membros organizacionais. Esta subordinação,
porém, não significa negação dos valores dos empregados, mas
orientação do comportamento organizacional a partir dos valores
organizacionais. Para garantir a convivência produtiva e maximizar
o potencial, a eficiência e o funcionamento sadio dos seus recur-
sos humanos, a organização precisa criar, por meio dos seus valo-
res, um ambiente que atenda às aspirações fundamentais do ser
humano de se realizar e de ser feliz. Os valores organizacionais,
enquanto padrões coletivos, constituem um compromisso entre os
interesses da empresa como coletividade e as expectativas e moti-
vações dos empregados. Dessa forma, eles não expressam exclusi-
vamente interesses e motivações do fundador ou dos dirigentes e
312 Mirlene Maria Matias Siqueira & cols.
Estratégias de identificação
Como identificar os valores de uma organização? Três estratégias encon-
tram-se descritas na literatura. A primeira consiste em identificar os valores da
organização a partir dos valores individuais dos seus membros (Sego, Hui e
Law, 1997). Esta abordagem é uma aplicação direta da forma de estudar os
valores de uma sociedade. Assim, por exemplo, a identificação dos valores da
sociedade brasileira pode ser realizada a partir dos valores de uma amostra
representativa de brasileiros. Da mesma forma, os valores de uma organiza-
ção poderiam ser identificados levantando os valores pessoais dos membros
desta organização ou de uma amostra significativa dos mesmos. Obviamente,
a análise não seria realizada ao nível individual, mas ao nível grupal. Esta
abordagem, contudo, não representa adequadamente certos valores específi-
cos da organização. Nesta categoria encontram-se, por exemplo, valores rela-
cionados com lucro e produtividade que são fundamentais para a organização
e que podem ser subestimados ao nível dos valores pessoais dos membros da
organização. Além disso, como freqüentemente existem incongruências entre
os valores pessoais dos empregados e os valores organizacionais, o resultado
obtido por meio desta abordagem pode não expressar de forma adequada os
valores da organização.
Uma segunda estratégia avalia os valores a partir de documentos oficiais
da empresa (relatórios anuais, estatutos, discursos, revistas internas...). Por
meio de análise de conteúdo, identificam-se nos textos selecionados os valores
Medidas do comportamento organizacional 313
organizacionais mais relevantes no discurso oficial. Recentemente, Kabanoff e
Daly (2000), utilizando esta abordagem, desenvolveram uma tipologia de va-
lores organizacionais composta por duas dimensões: a estrutura e o processo
da organização. Estas duas dimensões dão origem a quatro tipos: elite, lide-
rança, meritocrática e participativa. A quase totalidade dos estudos publica-
dos sobre os valores organizacionais é proveniente da análise de documentos
da organização. Esta abordagem é adequada particularmente para identificar
os valores proclamados pela organização. Freqüentemente, porém, existe in-
congruência entre os valores apresentados em documentos oficiais ou repre-
sentativos da empresa e os que são realmente praticados na organização. Os
valores enfatizados em textos oficiais da empresa podem não ser compartilha-
dos pelos membros da organização.
A terceira abordagem, desenvolvida particularmente no Brasil (Oliveira
e Tamayo, 2004; Tamayo, 1996; Tamayo e Gondim, 1996; Tamayo, Mendes e
Paz, 2000), consiste em utilizar a percepção dos trabalhadores para avaliar os
valores da organização. No discurso cotidiano dos empregados podem ser
observadas, freqüentemente, análises diretas dos valores da sua organização
ou alusões indiretas aos mesmos. Os empregados têm uma visão relativamen-
te clara dos valores que predominam na sua organização. Esta abordagem
estuda os valores organizacionais e a sua hierarquia de acordo com a repre-
sentação mental que os empregados têm do sistema axiológico da empresa.
Os valores compartilhados pelos membros da organização estão imbricados
nas práticas organizacionais e influenciam inevitavelmente o comportamento
de gestores e empregados. Para estudar os valores percebidos pelos emprega-
dos utilizam-se questionários previamente elaborados a partir de várias fon-
tes: análise de documentos de empresas, entrevistas com empregados de vári-
as organizações e modelos teóricos existentes na literatura ou elaborados pelo
próprio pesquisador (Oliveira e Tamayo, 2004; Tamayo, Mendes e Paz, 2000;
Tamayo e Gondim, 1996). Os valores da empresa e o seu conteúdo não são
definidos a priori, mas a partir da realidade da empresa e do que já existe na
literatura. Esta abordagem adota, portanto, uma perspectiva de integração
das informações provenientes da empresa e da literatura científica. Além dis-
so, os valores apresentados no questionário são avaliados pelos trabalhadores
por meio de uma escala de intensidade, de forma a expressar mais diretamen-
te a prioridade percebida para cada um dos valores analisados. Este método
permite identificar a importância acordada a cada um dos valores e determi-
nar o grau ou a intensidade de compartilhamento dos valores entre os mem-
bros da organização. Os questionários geralmente utilizados nesta abordagem
são constituídos por valores apresentando uma estrutura previamente ve-
rificada. Isto significa que os valores não são considerados isoladamente, mas
em conjuntos ou fatores. Cada um dos fatores avalia uma única dimensão
axiológica.
314 Mirlene Maria Matias Siqueira & cols.
Modelos teóricos
Um modelo é uma representação simplificada da realidade. Ele não se
limita a descrever, ele explicita relações estruturais entre os elementos do fe-
nômeno estudado. Assim, para estudar os valores organizacionais e, particu-
larmente, para elaborar instrumentos para a sua avaliação, a realidade axio-
lógica da organização geralmente é representada por meio de um modelo. A
adequação do modelo para representar o fenômeno estudado deve ser verificada
por meio de estratégias e procedimentos metodológicos apropriados. Os va-
lores organizacionais, como qualquer outra realidade, podem ser abordados
a partir de diversos modelos. Estes constituem diversas aproximações da
mesma realidade. A multiplicidade de modelos não é exclusiva ao estudo dos
valores organizacionais. Ela é comum em todas as ciências. Por exemplo, a
física estuda a luz a partir de vários modelos. O modelo corpuscular conside-
ra que a luz está composta por partículas diminutas, explicando assim por-
que os raios de luz passam através de uma porta entreaberta. Já o modelo
ondulatório considera que a luz é uma vibração, uma onda que se propaga
em linha reta. Qual dos dois modelos é verdadeiro? Para responder esta ques-
tão, Einstein propôs um novo modelo que postula que a luz é composta si-
multaneamente de partículas e de ondas... Devido à complexidade da reali-
dade esta pode ser explicada por modelos, cada um deles constituindo uma
aproximação do fenômeno a ser explicado. Um modelo nunca esgota a com-
plexidade do fenômeno estudado.
Na literatura internacional não se encontra praticamente nenhum mode-
lo para estudar e avaliar os valores organizacionais. A maioria das avaliações
dos valores organizacionais tem sido realizada a partir da análise de documen-
tos oficiais da empresa (relatórios anuais, estatutos, discursos, revistas inter-
nas...) sem hipóteses prévias, isto é, sem um modelo da forma como esses
valores estão estruturados. Às vezes, o pesquisador elabora um modelo a
posteriori para tentar integrar nele os resultados observados.
Dois modelos têm sido elaborados a priori para representar a estrutura
dos valores organizacionais: o modelo cultural e o modelo das motivações
pessoais. O modelo cultural dos valores organizacionais baseia-se no fato de
que toda organização é e possui uma cultura. Da mesma forma que as socieda-
des em geral, as organizações encontram exigências universais que têm que
ser satisfeitas para garantir a sua sobrevivência. Assim, elas enfrentam três
problemas fundamentais: