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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
09/02/2023
O art. 13º do TUE refere o TJUE como uma instituição – no quadro do funcionamento da União,
corresponde a um órgão que tem um relevo decisivo na condução do exercício das
competências da União, distinguindo-se de órgãos que têm um papel secundário ou de controlo,
apoio, consulta ou de desempenho de funções específicas – ex.: comitê das regiões, comité
económico e social, que tem função consultiva).
Temos depois também outros órgãos instrumentais que assessoram as instituições – no art.
240º do TUE temos o COREPER, que reúne representantes a nível diplomático dos Estados e que
prepara as decisões do Conselho de Ministros. Temos ainda um conjunto de organismos dotados
de personalidade jurídica que têm funções específicas: No TUE encontramos o Banco Europeu
de Investimento (que dá apoio financeiro através de empréstimos para projetos públicos e
privados do interesse da UE e que, pela sua credibilidade, consegue financiar-se nos mercados
em condições altamente favoráveis, pelo seu ranking). Por fim, é de referir um conjunto imenso
de agências, com missões específicas e competências diversas, mas que na sua generalidade
têm autonomia jurídica.
Entre este núcleo central de instituições encontramos o TJUE, que é composto por duas
jurisdições:
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segunda apreciação em relação a uma decisão de um tribunal, o direito a ver a sua causa
reapreciada numa segunda instância – é esse duplo grau de jurisdição que se considera
fundamental como um direito dos particulares que não estava assegurado quando era
só o TJ a avaliar a instância.
Este conjunto formará um sistema que tem de ser considerado como completo e, de algum
modo, coerente, no sentido de que tem de haver uma articulação entre as competências do TJ
e as competências dos tribunais nacionais, feita com base no princípio das competências de
atribuição.
O tribunal de justiça da UE, quer enquanto instituição, quer enquanto as suas duas jurisdições,
está delimitado no âmbito das competências pelo princípio da atribuição, tal como a própria
UE – está previsto no art. 19º §1 TUE que lhe compete garantir a salvaguarda do direito da
União, garantir a interpretação e a aplicação do DUE, mas apenas nas competências que lhe
estão atribuídas, portanto, naquelas matérias e nas condições que o tratado prevê.
Em todas as outras situações em que o DUE seja convocado para regular um litígio, a
competência será em princípio dos tribunais nacionais, exceto se for da competência de um
outro tribunal (por exemplo, se for da competência de um tribunal de Estado terceiro).
Ex.: com a saída do Reino Unido da UE, o TJ continua a ter competências face ao Reino Unido,
por causa das regras do seu tratado de saída, em algumas matérias – pode haver situações
no espaço do Reino Unido ou envolvendo seus nacionais que ainda continuem a estar
abrangidos pela competência do Tribunal, transitoriamente.
O DUE também poderá ser objeto de aplicação por tribunais de estados terceiros,
internacionais, e isso terá a ver com as regras de conflitos e as regras de determinação do foro
competente.
O primeiro parágrafo do art. 19º do TUE faz referência ao TJUE e o segundo parágrafo diz que
os Estados-Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela
jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União – isto é a decorrência lógica
do princípio da atribuição, ou seja, em princípio, em todas as situações em que não tenha sido
atribuída pelos tratados competência ao TJUE, cabe aos Estados-Membros ter no âmbito do seu
sistema jurídico as vias, as competências processuais necessárias para garantir a efetivação do
DUE. Isso significa que os tribunais comuns de DUE são os tribunais nacionais, em tudo o que
não estiver especialmente atribuído ao tribunal de justiça.
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Tal não significa, no entanto, que os Estados estejam obrigados a criar vias de recurso especiais
– significa que os Estados estão obrigados a assegurar, através das suas vias normais previstas
no Direito interno, que também o DUE integra essas competências, não têm de criar tipos de
processos ou tribunais especiais para esse efeito (apesar de o poderem fazer). Isto pode,
contudo, reconduzir a situações em que o princípio da tutela efetiva não é totalmente efetiva
assim – há situações em que pode um particular não encontrar uma via de recurso nem junto
do TJ, por não haver atribuição, nem junto do tribunal nacional, porque o sistema nacional não
prevê vias de recurso que possam tutelar aquela situação. Encontrar-nos-emos perante uma
situação em que a tutela jurisdicional efetiva não é, na verdade efetiva.
Qual é a resposta que tem sido dada? Se isso acontecer, temos uma situação de eventual
incumprimento do Estado, mas continua a ser competência do Estado, o TJ não admite que isso
seja fundamento para alargar a sua competência sem base no tratado.
A jurisprudência do TJUE tem modelado as atribuições dadas pelo Tratado, referidas em geral
no art. 19º. Em grande medida, as competências do Tribunal não se determinam apenas pelo
seu elenco de competências materiais, mas também pelos condicionalismos processuais, os
condicionalismos relacionados com os pressupostos processuais. Para que alguém possa aceder
a um tribunal, é necessário que disponha de personalidade jurídica, capacidade jurídica e
capacidade judiciária (determinados pelo direito nacional), e isto também se verifica para o DUE
e para o acesso ao TJ. Há ainda o pressuposto da legitimidade processual e do interesse em agir
– em relação a estes dois, cabe ao DUE determiná-los.
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O Parlamento Europeu, embora reconheça que o tratado não prevê a sua legitimidade, não
se opõe verdadeiramente e admite que, apesar de não estar prevista, o PE devia ter
legitimidade processual junto do TJ.
É aqui neste acórdão que o TJ diz que a CEE é uma comunidade de Direito – os Tratados são
uma Carta Constitucional e, numa comunidade de Direito com uma Carta Constitucional, não
é admissível que qualquer ato jurídico que tenha efeitos jurídicos vinculativos externos (junto
de entidades externas) não seja passível de controlo judicial. Portanto, admitiu a legitimidade
processual passiva do Parlamento Europeu, e depois passou à decisão.
Releva o modo como o tribunal acaba por modelar, através da jurisprudência, aquilo que é
o alcance das competências próprias e, por essa via, o do próprio sistema de tutela do
Direito.
Ex.: Caso UPA
Neste caso, o TJ veio fazer uma interpretação literal do art. 263º, não admitindo que um
particular pudesse impugnar um ato do qual não fosse destinatário ou lhe dissesse direta e
individualmente respeito, como se ele fosse destinatário. Esta expressão serve para atos que
não são dirigidos àquela pessoa, mas que a afetam como se fossem – diz diretamente respeito
porque aquele ato é aplicável de per si, sem necessidade de qualquer ato de execução e diz
individualmente respeito porque a sua modelação, o seu regime jurídico, está modelado pelas
características individuais daquela entidade, e de nenhuma outra.
Estas características reunidas permitiriam que se impugnasse um ato do qual não se é
destinatário, mas não se reunindo estas características não. Estas características nunca se
reúnem, por exemplo, em diretivas, porque se dirigem a Estados.
Aqui, o tribunal fez exatamente o contrário do que tinha feito no caso anterior, limitando-se
estritamente à letra da lei. Também no Caso Jego René o tribunal de primeira instância, à
época, não tinha feito isto. Na primeira instância tinha sido admitido que atos que afetem
diretamente, mesmo que não digam individualmente respeito (porque se podem referir a
uma categoria genérica de pessoas), mas que os afetem diretamente deveriam poder ser
impugnados. O tribunal de 1ª instância faz uma interpretação extensiva, porventura corretiva,
mas em recurso TJ reverteu essa decisão e no caso UPA reafirmou a interpretação literal.
Ex.: Caso Rosneft – sanções à Rússia por causa da Ucrânia, 2014
Estava em causa a aplicação de sanções e o facto de os seus destinatários deverem poder
impugnar essas decisões.
O grande problema tem a ver com uma limitação, que encontramos no Tratado de Lisboa: os
atos adotados no âmbito da PESC não estão sujeitos à jurisdição do TJ e, nessa medida, não
podem ser objeto de contencioso de anulação. Há, contudo, uma exceção prevista pelo
Tratado, que diz respeito a atos que afetem diretamente particulares (indivíduos ou empresas).
O art. 275º admite que atos adotados no âmbito da PESC, quando dirigidos a particulares ou
que os afetem diretamente, podem ser objeto de impugnação. Em geral, não podem – por
exemplo, um Estado não pode interpor um recurso de anulação de um ato da PESC.
Uma das questões que se suscitava era o facto de, se o tratado admite o recurso de anulação,
não diz nada sobre a possibilidade de um tribunal nacional fazer reenvio sobre a interpretação
de determinado ato da PESC, e a doutrina divide-se desde o início sobre esta questão.
Em concreto, isto pode ser especialmente sensível se falarmos de reenvio para apreciação da
validade, porque se o tribunal não tem competência em sede de anulação, isto será um
obstáculo a que possa pronunciar-se sobre a validade em sede de reenvio.
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O que o tribunal veio a admitir daquela jurisprudência foi que, efetivamente, como não está
proibido, o reenvio sobre atos da PESC é possível e, dessa forma, faz uma interpretação do
tratado que é lata, porque o princípio da atribuição de competências funciona ao contrário – o
que não está previsto não é possível.
Observamos uma oscilação da jurisprudência: tanto em tido momentos em que faz uma
interpretação extensiva ou até corretiva do Tratado, alargando as competências do Tribunal,
como tem tido uma interpretação eventualmente declarativa ou até restritiva, não
reconhecendo uma competência mais ampla – não há um regime fixo.
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tribunais nacionais, porque os tribunais nacionais, que agora perante questões de aplicação
do DUE têm ao seu dispor o mecanismo do reenvio para o Tribunal, depois ficariam
articulados também nesta matéria com o TEDH e, por essa via, esta articulação estritamente
bilateral era posta em causa pelo tribunal.
O art. 344º do TFUE prevê que os Estados-Membros se comprometem a não recorrer a
quaisquer outros meios de resolução de litígios sobre os Tratados que não aqueles que os
tratados preveem, e o Tribunal utilizou também esta disposição para dizer que o recurso que
resultaria daquele acordo para o TEDH punha em causa esta exclusividade prevista pelo art.
344º.
Daqui resulta que este sistema, que envolve as competências do TJ e dos tribunais nacionais, é
um sistema fechado, autossustentado, que não admite que haja uma abertura à participação
de outros tribunais ou entidades. O Tribunal entende que qualquer coisa que ponha em causa
estes mecanismos estabelecidos nessa rede, qualquer coisa que os perturbe, põe em causa o
sistema judicial e a autonomia do DUE.
A doutrina, face a este parecer, acusou o TJ de ser contrário a um Estado de Direito, ao não
admitir essa adesão – iria criar um sistema jurídico que seria autopoiético, que não admitiria
escrutínios externos. Qualquer tribunal nacional de qualquer um dos Estados-Membros do
Conselho da Europa pode ter as suas decisões escrutinadas pelo TEDH, para obter a condenação
do Estado por não ter assegurado o respeito pela CEDH e eventualmente o ressarcimento de
danos, contudo, o TJ, dada a especial natureza do sistema jurídico da UE não admitiu que isto
seria possível naqueles termos.
Esta é a matéria que está na base do nosso estudo – vamos estudar o sistema judicial da União
Europeia, centrando-nos essencialmente no TJ, sem nunca deixar de ter presente esta
articulação com a rede de tribunais nacionais, e o modo como eles se articulam o TJ e aplicam o
DUE.
Para o fazer, vamos abordar o tema do contencioso da União Europeia, tendo em conta esta
realidade multifacetada, uma instituição com duas jurisdições, múltiplos tribunais nacionais (e
quando falamos em tribunais nacionais falamos em sistemas judiciais nacionais, porque
englobamos toda a estrutura orgânica judicial nacional).
Poderíamos também abordar um critério funcional, que, para além do anterior, traz os tribunais
nacionais para este âmbito do contencioso, porque se eles são os tribunais comuns do DUE,
então há também, em tudo o que diz respeito ao seu funcionamento, relevância nesse quadro.
O TUE não diz que os tribunais nacionais são os tribunais comuns, mas faz referência aos
tribunais nacionais de forma implícita no §2 do artigo 19.º, mas depois a referência que lhes
faz é apenas feita expressamente no art. 267.º, a propósito do reenvio prejudicial. Quem veio
esclarecer que os tribunais nacionais são os tribunais comuns foi o advogado geral das
conclusões no processo “Treta Pak” e depois TJ retomou essa função em alguns acórdãos.
O artigo 274.º do TFUE dizem que os tribunais nacionais não veem as suas competências
prejudicadas pelo facto de haver competências atribuídas ao TJ, com condições, isto é, isto não
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pode significar duplicação de julgamentos, significa sim que a mesma situação pode ser objeto
de dois enquadramentos jurídicos diferentes, pelo que pode ser submetida também a uma
apreciação a nível nacional, independentemente de ter sido apreciada a nível europeu.
Ex.: Edith Cresson, comissária europeia francesa, depois de deixar as funções na comissão, foi
objeto de julgamento no TJ por desrespeitar o estatuto de comissária, sendo que, depois, a
nível nacional, ela também foi objeto, por factos idênticos, de outro julgamento, mas o
enquadramento não era o mesmo.
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Neste ponto de vista, vamos estudar aquelas que são as vias processuais próprias de tutela do
DUE junto do TJUE, porque a nível nacional não há vias processuais específicas.
Estamos perante uma instituição multilingue – todas as línguas oficiais são línguas oficiais do
TJUE, artigos 36.º e 40.º RPTJ. Os acórdãos são prolatados na língua do processo, mas todas as
línguas podem ser línguas de processo. O reenvio, que vem do tribunal nacional, tem sempre
como língua do processo a língua do tribunal nacional. Apesar disto, a língua de trabalho do TJ
é o francês.
16/02/2023
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Também se pode ver a classificação ECLI: UE (European Case Law Identifier), designação
europeia para todos os Tribunais. Toda a jurisprudência na UE passou a ter este registo, que
permite aceder a todos os processos, acórdãos e outras peças processuais.
No TJ Temos uma figura específica, o Advogado-Geral, referido ao longo dos tratados (artigo
19.º, n.º 2, § 1 TUE; artigo 252.º, § 1 TFUE). É inspirado numa entidade francesa que participa
nas suas instâncias jurisdicionais que o Comissário do Governo. Tem uma função idêntica a este
Comissário e aproxima-se de uma figura que se conhece de alguns sistemas judiciais na América
do Sul, o Amicus Curiae, uma personalidade que está num Tribunal para apoiar a decisão, de
acordo com o Direito.
Por sua vez, o AG, porque não está condicionado pela decisão, faz uma análise com maior
liberdade. É bastante mais frequente (apesar de variar consoante o AG) fazer uma análise
doutrinal, comparada e muitas vezes mais ousada (defende posições de iure condendo), e isso
é muito importante porque permite perceber que as questões ali colocadas podem, porventura,
ter implicações diversas – é importante para construir um Direito para o Futuro. O AG
obviamente aprecia o Direito vigente mas pronuncia-se frequentemente sobre ele, apontando
as suas limitações e sugerindo outras soluções ou desenvolvimentos, e isso pode por vezes vir a
ter impacto.
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Qual é a Função do AG? Segundo o art. 252º do TFUE, apresentar publicamente, com toda a
imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos
do ETJUE, requeiram a sua intervenção (artigo 20.º, § 4 e 5; artigo 23.º-A, § 2 ETJUE).
Quando é que é chamado a intervir? Essa é uma decisão do próprio Tribunal. Nem em todas as
causas o AG tem de intervir, cabe ao Tribunal determinar quais as causas em que ele é chamado
a intervir. Habitualmente, a sua intervenção tem lugar no TJ, tirando os casos em que já tenha
havido uma consolidação da jurisprudência – uma questão tratada, cuja solução não seja de
todo complexa.
Com a saída do Reino Unido, isto foi alterado: há agora 5 AG que permanentemente são
indicados pelos Estados maiores, e os restantes 6 são indicados rotativamente pelos restantes
Estados.
Entre os AG, o Tribunal nomeia o primeiro AG, anualmente, que tem uma função supra-pares.
A sua importância é distribuir entre os AG os processos em que eles vão apresentar conclusões.
Além dos Juízes e dos AG, o tribunal tem um secretário (art. 10º a 12º Estatuto; art. 18º a 21º
RPTJ) – é a cabeça da secretaria do Tribunal. Tem alguma importância, porque cabe-lhe dirigir
os serviços efetivamente e acaba por ter funções como a manutenção do registo e as
notificações processuais. É um papel autónomo, ele gere com autonomia estes trâmites.
O TJ e TG têm competências distintas, mas se um articulado der entrada no Tribunal errado, isto
não leva a que haja ineptidão, à partida, o que sucede é que aquele articulado é reencaminhado
para outro tribunal pelo secretário – o ato é aproveitado.
É ainda de referir a figura do Relator-adjunto (art. 13.º Estatuto; art. 17.º RPTJ) – ao juiz relator
cabe preparar a proposta de acórdão que depois será objeto de deliberação entre si e os outros
juízes parte da secção. Qualquer juiz pode ser relator e quem determina quem é o relator é
quem preside à secção ou o presidente do Tribunal. Neste ponto de vista, podemos colocar
questões quanto à independência e isenção do Tribunal, mas confia-se aqui na isenção dos
magistrados e do presidente. O relator-adjunto tem um papel de apoio em relação ao relator
principal.
O mandato dos magistrados é de 6 anos, sendo que há substituição parcial a cada 3 anos (art.
253.º TFUE; art. 9.º Estatuto), e pode ser renovado, através de nomeação como foi a primeira.
O mandato pode cessar por renúncia, morte ou incumprimento das condições/deveres,
podendo ainda ter a ver com a idoneidade. Essa substituição pelo desrespeito das condições ou
deveres de magistrado terá de ser objeto de decisão unânime pelo Tribunal (art. 5º a 8º do
Estatuto).
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Art. 4º, art. 18.º; art. 17.º, n.º 5 Estatuto (§ a nacionalidade – art. 18.º, n.º 4 Estatuto) – Há um
regime de incompatibilidades para assegurar a imparcialidade, por suspeições e impedimentos,
seja porque tenham tido em momento anterior uma relação com o objeto ou com as partes num
processo, que deverá ser suscitado pelo próprio, que se deverá declarar impedido de participar
no âmbito daquele processo, como pode haver também uma suspeição suscitada pelas partes
ou outro membro do Tribunal. A condição é precisamente não haver nenhuma ligação ao litígio
ou às partes nele envolvidas.
O Presidente e o Vice-Presidente são eleitos pelos próprios juízes e o seu mandato é de 3 anos
(artigo 9.º-A Estatuto; art. 8.º RPTJ). As suas atribuições encontram-se nos artigos 9.º e 10.º
RPTJ. As suas funções de competência jurisdicional que tem o presidente estão contempladas
no art. 39º do Estatuto e são de diversa natureza: possibilidade de suspensão da instância por
algum fundamento, mas também a aplicação de medidas provisórias – uma decisão de caráter
jurisdicional com importância relativamente elevada, não sendo uma função meramente
organizacional ou funcional, mas sim uma função jurisdicional própria de um magistrado no
exercício da função jurisdicional, cabe nas funções do Presidente, tal como dispõe o Estatuto.
As competências do Presidente podem exercidas, sempre que por ele assim determinado, pelos
presidentes das secções.
Quais os requisitos para se ser Magistrado e Advogado-Geral? Encontram-se nos artigos 19º
TUE e 253º TFUE. Quer o juiz quer o AG indicados pelos Estados não têm de ser da nacionalidade
do Estado que os indicou, não há condição de nacionalidade, mas efetivamente tem de ser uma
personalidade que seja um jurista de reconhecido mérito que esteja habilitado a conseguir
desempenhar a nível nacional funções jurisdicionais ao mais elevado nível, ou seja, que esteja
habilitado a poder ser juiz nos Tribunais superiores desse Estado. Não tem de ser magistrado de
carreira, pode ser um outro jurista com uma atividade de qualquer natureza, mas tem de, a nível
nacional, ter as habilitações necessárias para ser Magistrado num Tribunal superior.
Como são nomeados? Art. 253º a 255º TFUE. Durante muito tempo, a nomeação era feita, a
partir das indicações dos Governos nacionais, por uma decisão dos representantes dos Estados
reunidos no Conselho. Não é uma fonte direta de DUE, mas cria efeitos jurídicos no quadro da
União, desde logo, este efeito tem a ver com a composição do Tribunal, mas sobretudo tem a
ver com a forma da decisão, porque não obedece às formas de deliberação previstas pelo
Tratado para o Conselho. Uma decisão do Conselho obedece às formas de deliberação da
maioria simples, maioria qualificada e unanimidade, de acordo com o art. 238º. Aqui, contudo,
esta decisão é consensual, não é votada.
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No entanto, agora este sistema não é assim estritamente. A decisão cabe na mesma aos
representantes dos Governos reunidos Conselho, de modo consensual, mas essa decisão é
tomada a partir da indicação dos Governos nacionais, havendo uma espécie de triagem
intermédia feita por um comité – Comité 255, previsto no artigo 255.º do TFUE. Este comité é
formado por antigos membros do Tribunal que vão apreciar os curriculum das personalidades
indicadas e podem mesmo fazer entrevistas para aferir da sua idoneidade (relativamente ao
respeito pelas condições de independência, isenção e imparcialidade) e mérito, tendo em conta
experiência profissional, habilitações académicas.
Este parecer tem sempre de ter lugar – quando existe indicação por parte dos Governos
nacionais, ela vai com curriculum da personalidade e que é remetido aos membros do Comité,
que o vão apreciar e dar um parecer. Este parecer é levado aos membros do Conselho que irão
decidir (este parecer não é vinculativo, portanto os representantes dos Governos podem
afastar-se do parecer e até nomear alguém que foi objeto de um parecer negativo). Este parecer
é solicitado na primeira nomeação ou na renovação do mandato. Até hoje nunca houve nenhum
parecer negativo quanto a renovações. Este comité é formado por 7 membros.
• Em Grande Secção (art. 16º §3 e art. 17º §3 do Estatuto), formada por 15 juízes e que
tem sempre na sua formação o Presidente e o Vice-presidente e 3 presidentes de
secções, que fazem parte necessariamente da grande secção. Os restantes membros
integram a grande secção de acordo com uma decisão quando os processos são
remetidos para ela.
Assim: Grande Secção = Presidente + Vice-Presidente + 3 Presidentes das Secções de 5
Juízes + 10 juízes
Quando é que a grande secção é chamada para acompanhar um determinado processo?
É chamada a intervir sempre que um Estado-Membro ou Instituição da União que seja
parte na instância o solicite. Em princípio, não tem competências específicas, mas pode
ser chamada para qualquer tipo de processo nestas condições. Tem um quórum de 11
juízes e tem de estar sempre presente número ímpar de juízes.
• Temos ainda o Tribunal Pleno (art. 16.º, n.º 4 e 5 do Estatuto), que só funciona com
base numa solicitação (em aplicação do n.2 do art. 228°, art. 245°, art. 247° ou do n.6
do art. 286° do TFUE) ou quando o próprio Tribunal decida nesse sentido,
nomeadamente quando as causas tenham uma importância excecional, depois de
ouvido o AG.
São da competência do Tribunal Pleno o levantamento da imunidade de um membro
do Tribunal, a destituição do Provedor, de um Comissário ou de um membro do
Tribunal de Contas (art. 3º do Estatuto) – são estes os fundamentos que têm lugar
sempre no Tribunal Pleno. O seu quórum é de 17 juízes, art. 17º, §4 do Estatuto.
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O Presidente preside ao Tribunal Pleno e à Grande Secção. As secções são presididas por um juiz
da secção, que seja eleito por mandato de 3 anos na secção de 5 juízes, ou de 1 ano, na secção
de 3 juízes. As deliberações são confidenciais – art. 35º do Estatuto.
O TG rege-se por atos comuns, desde logo pelos Tratados, nomeadamente no art. 19º do TUE,
que constitui a previsão fundamental nesta matéria, no art. 13º do TUE e nos artigos 251º e
seguintes do TFUE, onde encontramos as competências e os vários tipos de vias processuais –
estes atos são relevantes quer para o TJ, quer para o TG. Temos outro ato relevante, que é direito
primário, o Estatuto do Tribunal de Justiça, que contém regras que valem para o TJ e outras que
valem também para o TG (protocolo III anexo aos Tratados).
Depois temos atos distintos de cada um deles, cada um dos tribunais tem o seu próprio
regulamento do processo, que são regulamentos orgânicos relacionados com o funcionamento
de cada um dos tribunais, e são muito semelhantes – há uma coincidência tendencial entre as
disposições dos dois regulamentos do processo, mas depois há especificidades. O Regulamento
do Tribunal Geral (RTG) é mais atual, adequado, já o Regulamento do Tribunal de Justiça (RTJ)
padece do facto de ser um tribunal instituído há mais tempo e por isso há um conjunto de
elementos que se encontram apenas no RTG e não no RTJ.
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uma especialização das secções, para que sejam sempre os mesmos magistrados, aproveitando
a sua experiência, a tratar questões com caráter muito especializado.
Quanto às formações, são em grande medida coincidentes com o TJ. A grande diferença entre
os dois é possibilidade do TG decidir em juiz singular (o processo ser atribuído a um juiz singular,
que pode decidir individualmente) e aí decisão não é por acórdão, mas por despacho.
As secções são de 3 ou 5 juízes. Temos também aqui o Plenário e uma Grande Secção.
As secções, por sua vez, têm formações internas. Quando falamos em secções de 3 ou 5 juízes,
a secção como tal não tem 3 ou 5 juízes, tendo antes, por exemplo, 7 ou 8 juízes, e depois tem
formações internas que cruzam os juízes e é nesse quadro que se vai fazer essa especialização
de acordo com as matérias.
Que competências é que o Tratado prevê como competências do TG? Art. 256º n.1 do TFUE;
art. 51º do Estatuto.
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A professora não concorda com isto, em grande medida devido ao longo tempo que
demoram os reenvios e pela possibilidade de haver interpretações diferenciadas – isto
é grave do ponto de vista da certeza e da unidade, podendo pôr em xeque a
credibilidade do próprio TJ. A revisão do Estatuto implica sempre a unanimidade dos
Estados-Membros e ratificação interna por parte dos parlamentos iniciais.
Este não é um processo de partes, não é um processo contencioso e, como tal, não tem um
pedido de um sujeito contra outro. Nesse sentido não se faz com uma petição inicial e não há
contestação – faz-se sim através de um requerimento do tribunal nacional para o TJ, colocando
questões para que o Tribunal se pronuncie – o reenvio prejudicial é efetivamente prejudicial.
Com isto, não se quer dizer que não haja questões de facto, mas as questões de facto para o
processo prejudicial são questões de Direito, porque este processo destina-se a obter uma
pronúncia sobre a interpretação ou sobre a validade do Direito. Assim, o seu objeto são apenas
questões de Direito, sendo que há questões de facto que, elas próprias, podem ser questões de
Direito. Quais são essas questões de facto? Têm a ver, desde logo, com a eventual
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compatibilidade do Direito da UE com o Direito nacional, ou com a aplicação que é feita a nível
nacional.
Portanto, não são objeto deste processo os factos da controvérsia nacional, apesar da
importância do seu conhecimento – o objeto do processo será a interpretação do DUE e depois
a relação com a aplicação que é feita a nível nacional e a articulação com o Direito nacional.
Isto significa que o reenvio não é um recurso, não é uma intervenção que tenha lugar na
sequencia de uma decisão do Tribunal Nacional, é um excerto que tem lugar no processo
principal do Tribunal Nacional. É um mecanismo de diálogo porque o TJ não se vai substituir ao
TN nas suas competências, vai sim, a partir da informação transmitida pelo Tribunal Nacional,
apoiá-lo, esclarecendo as questões por ele colocadas.
Ou seja, o juiz nacional fica vinculado pela pronúncia do TJ. A decisão de reenvio através de
acórdão do TJ não é um parecer ou uma consulta, ela é vinculativa para o Tribunal Nacional. O
Tribunal Nacional, no exercício da sua competência de aplicação do Direito da UE tem de o
aplicar respeitando a orientação presente na decisão do TJ. É um diálogo estruturado, não é
uma mera opinião do TJ.
Ex.: Imaginemos uma situação em que o juiz nacional tinha dúvidas sobre a validade de um
regulamento e coloca a questão ao TJ, que vem declarar que o regulamento é válido. O juiz
nacional, mesmo que não concorde e continue a achar que o regulamento é inválido, não pode
deixar de o aplicar, isto é, não pode afastar aquela pronúncia do TJ. Se o fizer, está a haver um
incumprimento da parte do Estado através deste comportamento.
Há reenvios obrigatórios, mas não há uma entidade que tenha uma competência para assegurar
que essa obrigatoriedade ocorre, é sempre uma decisão do juiz. Se o juiz nacional que estaria
obrigado a fazer o reenvio não o faz, este comportamento constitui uma violação do Tratado
imputável ao Estado, que pode sofrer consequências de dois tipos:
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De qualquer modo, é sempre uma decisão própria do magistrado, e estas consequências não
têm lugar no processo – se o juiz que estava obrigado a fazer o reenvio não o faz, o processo erá
o seu termo, haverá decisão, a decisão transitará em julgado e não vai acontecer nada naquela
decisão, ela vai consolidar-se. Ora, depois, podem verificar-se as referidas consequências.
Alguém que tenha sofrido um dano pode exigir a responsabilidade do Estado, o ressarcimento
desse dano, ou, se isto for algo que se possa considerar um incumprimento sistemático (como
já aconteceu com a França, que foi acionada pela Comissão Europeia).
Isto significa que o TJ não se deve pronunciar sobre a aplicação, e habitualmente não o faz –
normalmente interpreta, por exemplo, um conceito, e depois diz que cabe ao Tribunal Nacional
saber e determinar se, naquela situação, aquele conceito com aquele sentido deverá ser
aplicado. Dá uma interpretação em abstrato, que depois caberá ao Tribunal Nacional
Concretizar.
No entanto, é verdade que, muitas vezes, há alguma fluidez, em que o TJ se pronuncia sobre o
Direito interno de modo indireto ou sobre essa aplicação, com formulações hipotéticas – não
dizendo diretamente como deve ser resolvida a questão, mas sendo a situação configurada do
modo como está a ser configurada no Tribunal Nacional, daí resultará uma determinada
consequência jurídica. Ao Tribunal Nacional caberá validar aquela relação.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
jurídicos, vinculativos, que produzem efeitos junto de terceiros, de particulares em geral, que
não podem ser objeto de um processo de anulação por esses particulares (só a Comissão ou os
Estados podem recorrer à sua anulação) – há aqui este limite.
O reenvio é efetivamente sucedâneo, porque num litígio a nível nacional, em que aquele ato de
que o particular não pôde requerer a anulação seja relevante para a solução do litígio, o
particular pode alegar junto do Tribunal Nacional que o ato não é válido ou que padece de um
vício que afeta a sua validade e, por esta via, o Tribunal coloca a questão ao TJ, que vai fazer
essa avaliação e controlo. É certo que daqui não vai resultar a anulação do ato, mas vai resultar
a sua anulação para o particular, se o Tribunal lhe der razão.
É isso que se quer dizer quando se refere essa função supletiva em relação ao recurso de
anulação, ao contencioso de legalidade e que, efetivamente, é muito relevante, por causa destas
limitações, porque em grande medida é o que resta ao particular na maioria das vezes (vincular
o Direito, esperar que haja uma decisão de sancionamento para impugnar a decisão de
sancionamento invocando a invalidade do ato que está na sua base).
Há parte da doutrina que defende que deveria ser criado uma espécie de recurso de amparo –
quando estivessem em causa direitos fundamentais, poder haver sempre um recurso de
anulação com base no amparo da tutela de Direitos Fundamentais, independentemente da
natureza do ato.
Assim, a função supletiva permite ter uma via complementar ao recurso de anulação, que é
sobretudo importante para os particulares, porque efetivamente eles têm uma legitimidade mt
restrita para aceder à tutela do TJ e, por esta via, têm uma outra hipótese.
Questão Prejudicial
A questão prejudicial tem de dizer sempre respeito ao DUE, mas é algo que será definido pelo
Tribunal Nacional, que tem uma soberania sobre isso. Portanto, cabe ao juiz nacional formular
a questão com inteira liberdade. Isto não significa, no entanto, que o TJ não possa ter um papel
modelador e, nomeadamente, o TJ já reformulou questões de modo a torná-las efetivamente
úteis, quando entendeu que o juiz nacional não as tinha formulado devidamente, não tinha sido
suficientemente claro. Em princípio, ele vai ater-se e acompanhar o pedido nacional. Por vezes,
a questão prejudicial inclui também questões com natureza subsidiária, o tribunal faz uma
primeira questão e depois faz uma segunda, cuja resposta depende da resposta dada à primeira.
A questão tem de ser pertinente, relevante para solução do litígio que está perante o juiz
nacional. Isto quer dizer que não podem os Tribunais Nacionais colocar questões meramente
hipotéticas, abstratas, tem de haver uma relação com o objeto do litígio. O TJ não vai contrariar
o juiz nacional, a não ser que se aperceba que a questão não é efetivamente pertinente – há
uma presunção de pertinência pelo simples facto de ser apresentada, mas última palavra cabe
ao TJ, que pode, através da informação que chega a si no processo, perceber que a questão não
tem relação com litígio, ou até que não existe litígio (ex.: Caso Foglia Novello, em que o Tribunal
concluiu que não havia litígio entre as partes e que elas tinham simulado um litígio entre si, para
colocarem questões junto do Tribunal Nacional e obterem uma resposta do TJ).
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O reenvio também não tem por objeto a interpretação do direito nacional, embora o TJ
também tenha muitas vezes de a fazer. O TJ, quando se pronuncia sobre a interpretação do
direito nacional, pronuncia-se sempre sobre 2 formas:
O TJ nunca se pronuncia diretamente sobre validade do direito nacional, mas sempre por uma
via hipotética ou formulada pelo próprio Tribunal Nacional.
A questão tem de ter informação suficiente para que o Tribunal se possa pronunciar. Se não for
suficiente, se o TJ precisar de informação suplementar para se poder pronunciar, então solicita
ao Tribunal nacional mais informações, mas se o Tribunal nacional não lha der e o TJ entender
que não ter condições para responder à questão, aí não se pronunciará.
Pode haver questões complementares, em situações mais complexas, inovadoras. Aí, o juiz
nacional coloca determinadas questões, o TJ responde, juiz nacional vai receber essa resposta e
utilizá-la e a resposta pode suscitar novas questões, caso em que o juiz nacional se pode dirigir
uma segunda vez ao TJ, colocando questões complementares.
O fundamento da invalidade pode ser outro, o que nunca pode ser é o tribunal superior
entender que essa questão não se justifica, não é legítimo. Não pode haver controlo por parte
do tribunal superior sobre a pertinência da questão prejudicial, esse controlo, além do próprio
tribunal na sua autodeterminação, só cabe ao TJ. Se um tribunal o fizer, está a fazê-lo em
violação do Tratado, está a usurpar uma função que é sua.
23/02/2023
Em princípio, cabe ao Tribunal Nacional que faz o reenvio o exclusivo da definição das questões
e da determinação da sua pertinência, da sua utilidade para o processo. Isso significa que haverá
uma presunção de pertinência a partir do momento em que as questões são colocadas, que
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
pode, no entanto, ser afastada pelo próprio Tribunal de Justiça, se este puder concluir, a partir
da informação que recolhe com o próprio reenvio pelo TN, que a questão não é pertinente, seja
porque o litígio é fictício, seja porque as questões colocadas não são úteis para o caso que está
a correr no TN, ou seja ainda porque as questões são simplesmente hipotéticas (estando a
decorrer um caso que é real, são colocadas questões de direito hipotéticas e não relacionadas
com o caso em apreço).
Se o Tribunal de Justiça concluir que está perante alguma destas situações, nomeadamente nas
questões que poderão não estar devidamente formuladas, o próprio tribunal pode reformulá-
las – perante as questões nacionais, o Tribunal, apercebendo-se de que o modo como elas estão
formuladas ou de que os pontos mencionados não são adequados, ele pode reformular a
questão de modo a que ela possa ser útil para o juiz nacional.
O que efetivamente não pode acontecer? Se é verdade que a decisão de efetuar o reenvio pode
ser objeto de recurso a nível interno, e isso pode vir a impossibilitar que processos de reenvio
possam correr junto do Tribunal de Justiça, dando lugar a cessação do processo junto do TJ, a
verdade é que o fundamento desse recurso não pode incidir sobre a pertinência da questão
(apesar de poder ter a ver com outros aspetos, relacionados com o próprio processo a nível
nacional). Essa avaliação cabe tão só, em primeiro lugar, ao juiz que faz o reenvio e, em segundo
lugar, ao Tribunal de Justiça, não podendo vir um outro Tribunal ou outro juiz nacional avocar
essa competência, substituindo-se quer ao juiz que fez este reenvio quer ao TJ.
É possível que haja sucessivas questões prejudiciais colocadas no mesmo processo (apesar de
não ser frequente) – depois de colocar determinadas questões, o juiz nacional volta a colocar
questões complementares porque entende, por exemplo, que a reposta não foi suficientemente
esclarecedora, ou eventualmente surgiram novos elementos no decurso do processo nacional
que vieram levantar novas dúvidas, e isso é possível. Não há uma limitação quanto às questões
colocadas pelo juiz nacional e, em última instância, caberá ao TJ decidir se as questões são
fundamentadas ou não, não ficando obrigado a respondê-las se não as considerar pertinentes.
1. Interpretação
Há uma diferença fundamental no âmbito normativo, que é muito mais vasto na interpretação
– as questões respeitantes à interpretação, à determinação do sentido do enunciado normativo
podem incidir sobre qualquer tipo de ato jurídico, podendo incidir sobre:
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
elaborados pelo próprio Tribunal). Todas essas fontes podem ser objeto de reenvio para
determinar sentido e o alcance dessa mesma norma.
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europeu para alem da própria UE, não há dúvidas sobre o alcance genérico da
competência do TJ.
No entanto, temos outro tipo de acordos, acordos mistos, o que significa que incidem
sobre matérias nas quais a União não tem competência exclusiva, podendo ser acordos
sobre competências partilhadas (e nesse caso são acordos que ficam fora do âmbito
determinado no art 3º nº2 do TFUE, que determina que, verificadas as condições
previstas, mesmo em matérias que sejam de competência partilhada (nos domínios do
art. 4º), só a UE tem competência externa exclusiva – princípio da preempção).
A jurisprudência do Tribunal, até ao Tratado de Lisboa, foi resolvendo esta questão,
porque poderíamos admitir que, num acordo internacional que abrange matéria que é
competência partilhada, de acordo com o art. 4º, mas na qual a UE já adotou legislação,
ainda que os Estados mantenham competências porque a União não legislou
globalmente, podíamos admitir que tivessem que intervir simultaneamente a União
Europeia e os Estados, nomeadamente porque os Estados continuariam a manter
legitimidade no âmbito que não estava amplamente objeto da União Europeia.
O que jurisprudência do Tribunal veio a fazer ao longo do tempo e o art. 3º n.2 faz é
estabelecer um conjunto de condições em que isto não é assim: apesar de a UE não ter
coberto um determinado setor globalmente e, por isso, os Estados ainda manterem
competências, só a União poderá adotar ou entrar em acordos internacionais naquela
matéria, de modo a precaver riscos futuros (o próprio ato interno de legislação da
União prevê isso mesmo) ou porque isso é necessário para assegurar coerência e
impedir que, no futuro, a União Europeia fique de alguma forma impedida de adotar
legislação.
Estas razões justificam que, mesmo em matérias que são competência partilhada em
que a UE não esgotou totalmente o exercício da competência num determinado
domínio e os EM ainda mantêm a competência nesse domínio, num quadro externo,
nas relações com terceiros, só a União será competente, portanto os Estados não
poderão exercer essa competência – aqui temos uma situação de competência
exclusiva da UE apenas em matéria externa.
Se não existisse o art. 3º n.2, poderíamos estar em situações de um acordos mistos –
em situações de competências partilhadas em que não se verifiquem esses requisitos
do art. 3º n.2 ou em situações em que um acordo internacional abrange
simultaneamente competência que são da União e competências próprias dos Estados-
Membros, que não foram atribuídas à UE, então esse acordo internacional que tem
esse âmbito alargado tem necessariamente de ser celebrado simultaneamente pela
União Europeia e pelos Estados-Membros.
Nessa situação (que não é assim tão frequente, porque, por causa do art. 3º n.2 a UE
acaba por ter, em grande medida, uma elevada competência exclusiva na esfera
externa, bem para além das competências exclusivas na esfera interna), se for o caso
de se tratar de um acordo que não cai no âmbito do art. 3º n.2 ou de um acordo que
envolva simultaneamente matérias que são da competência própria dos Estados, então
aí teremos necessariamente um acordo misto – isto significa que, do lado externo,
estará um Estado ou Organização Internacional e, do lado europeu, teremos a União e
os Estados-Membros. O acordo só será validamente celebrado se todos participarem,
se todos forem parte.
Neste caso, a interpretação a que pode ser chamado o TJ em sede de reenvio só incidirá
sobre a parte que diz respeito às competências da União Europeia, não ao restante –
portanto, não àquilo que diz respeito à parte terceira, ao(s) parceiro(s) externo(s), nem
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àquilo que diz respeito à competências próprias dos Estados-Membros, porque se não
isso seria interpretar direito interno dos Estados.
Por vezes, para que não se levantem controvérsias e dificuldades, o Conselho decide
que o acordo será misto, mesmo que pudesse incidir sobre matérias que seriam da
União, há uma decisão política de que também os Estados participarão.
Devemos ter sempre presente que a competência do Tribunal se limita àquilo que diz respeito
ás competências da União Europeia, não àquilo que é próprio da competência dos Estados. Da
mesma forma, o TJ não interpreta o acordo com eficácia extraterritorial, isto é, não
interpretando os compromissos assumidos pelo parceiro externo.
O TJ pode ser chamado a interpretar os seus próprios acórdãos, a sua jurisprudência – é possível
que um tribunal, entendendo que há uma jurisprudência anterior do TJ que é relevante e que
considera ambígua, queira ver esclarecida a sua dúvida.
2. Validade do DUE
Os tratados estão isentos de qualquer apreciação de validade, mas há uma situação em especial
que tem a ver com o facto de a revisão ordinária dos tratados se fazer ela própria através de um
tratado, que obedece às mesmas regras. O Tratado de Lisboa vem prever uma outra forma de
revisão simplificada, no art. 42º, que tem lugar através de aprovação do Conselho Europeu e
que não pode incidir sobre todas as matérias, mas apenas sobre a parte III do TFUE –
essencialmente sobre as políticas comuns, desde o mercado interno, passando pelas restantes
políticas como a concorrência, mas não pode incidir sobre PESC, cidadania da União, disposições
fundamentais, etc.
Nas restantes matérias pode haver uma revisão simplificada, que passa por um acordo por
unanimidade no Conselho Europeu, não tendo lugar uma negociação diplomática. É uma forma
de revisão interna, por ser mais simples, mas ainda assim está sujeita a um procedimento de
aprovação ou ratificação interna dos Estados, de acordo com os requisitos constitucionais –
não basta a aprovação pelo Conselho Europeu, é necessário que seja aprovada, por exemplo,
pelo Parlamento nacional, não é totalmente interna, tem esta segunda dimensão, que pode ser
variável consoante a própria Constituição.
A sua Constituição pode determinar que esta revisão seja sujeita a um processo simplificado de
aprovação. Na nossa Constituição, os acordos bastam-se com a aprovação pelo Governo ou pela
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
AR, não estão sujeitos a ratificação pelo Presidente da República; se for um tratado solene, já
está sujeito a ratificação pelo PR – isto é uma questão exclusivamente interna.
Esta decisão de revisão simplificada está sujeita a uma apreciação por parte do TJ e, portanto,
pode também ser sujeita a um reenvio para a apreciação, pronúncia, sobre respetiva validade,
porque pode efetivamente ser inválida, pode não ter respeitado as regras previstas no art. 48º
e, nesse sentido, pode ser objeto também do reenvio para apreciação da validade – foi o que
aconteceu no caso Pringle.
Se a questão da validade disser respeito a um ato dirigido a um particular, não é legítimo que,
num litígio nacional, essa mesma questão seja colocada, porque ela já podia ter sido objeto de
impugnação junto do TJ.
Outra questão que foi duvidosa: quando falamos de validade do ato, o art. 263º do TFUE
determina que os recursos de anulação só podem ter por objeto atos que produzam efeitos
jurídicos vinculativos externos quando falamos de particulares. A questão que se coloca é que,
dado que o art. 267º não diz o que diz o art. 263º (que faz esta referência aos atos que produzam
efeitos vinculativos), então, visto que o art. 267º não restringe, será de admitir que se coloquem
questões sobre a validade de atos que não são atos com efeitos jurídicos vinculativos. Qual a
importância disto, visto que não trazem efeitos jurídicos obrigatórios?
Pode ser relevante porque, apesar de não ter efeitos jurídicos obrigatórios, não são destituídos
de relevo jurídico, desde logo, podem ter um caráter interlocutório e, portanto, pode ter
interesse perceber e ter um esclarecimento sobre a respetiva regularidade, ainda que esses atos
sejam preparatórios de outros, esses sim os atos jurídicos vinculativos.
Por outro lado, não deixam de se levantar questões jurídicas que são importantes de serem
esclarecidas pois, mesmo que não tenham efeitos jurídicos vinculativos, podem ser atos
relevantes para a interpretação de outros atos e, por essa razão, pode ser importante
determinar se eles efetivamente são regulares, conformes ao Direito, porque se não o forem,
não poderão ser utilizados nomeadamente como parâmetros de interpretação, por exemplo.
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Ex.: quando falamos numa resolução, é um ato que não é vinculativo, mas que apresenta uma
determinada tomada de posição ou orientação e, se esse ato padecer de um vício, não tiver
sido objeto de uma deliberação conforme, isso será importante, porque obviamente não
poderá ser analisado como um elemento de interpretação para uma apreciação de um outro
ato, de uma determinada posição que se lhe tenha seguido.
Nos atos convencionais, para além do acordo, temos um outro ato – o acordo tem de ser, antes
da respetiva celebração, objeto de decisão interna da competência do Conselho.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Para o TJ, “órgão jurisdicional” será qualquer entidade, órgão, a quem cabe dizer o Direito, a
resolução de litígios de acordo com o Direito, e distingue-se do conceito reconhecido no nosso
sistema jurídico de Tribunal. São órgãos jurisdicionais, além dos Tribunais, por exemplo os
Tribunais Arbitrais ou os quadros de arbitragem. Este conceito não é necessariamente aquele
que encontramos reconhecido pelo TJ.
De facto, este conceito reconduz-se aos conceitos de órgão judicial ou tribunal, ainda que haja
algumas nuances. Este conceito tem sido objeto de reiteração, ainda que em alguma situações
o TJ tenha tido alguma flexibilidade.
1. Tem de ser um órgão com origem legal, tem de ser criado por lei anterior ao litígio e
ao exercício das respetivas competências;
2. Tem de ser permanente e ter jurisdição obrigatória – não pode ser um órgão ad hoc,
criado para uma determinada situação temporária e tem de ter jurisdição obrigatória,
no sentido em que não podem as partes num litígio eximir-se à sua jurisdição;
3. O processo tem de respeitar o contraditório – não pode ser um órgão com uma
natureza inquisitorial, mas tem de ser um órgão no qual a apreciação da causa feita seja
com a participação das partes em situação de tendencial igualdade, no sentido de
poderem apresentar argumentos, provas, etc.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
5. Terá de ser um órgão que decida de acordo com direto estrito, de acordo com as
normas e não de acordo com equidade (julgar segundo o “direito estrito”).
Por outro lado, estas questões também se colocaram quanto a ordens profissionais,
nomeadamente porque estas por vezes têm também competências de tipo jurisdicional – têm
órgãos a quem cabe aplicar o Direito e com competência de tipo contencioso. O TJ tem excluído,
em princípio, as ordens profissionais, mas tem admitido situações em que um órgão de uma
ordem profissional possa desempenhar uma função de tipo jurisdicional, em que a competência
exercida se reconduz aos critérios referidos e, verificando-se esses critérios, o importante não
será o estatuto do órgão, mas sim efetivamente a natureza da sua competência e os termos em
que as exerce.
O mesmo se poderá dizer quanto a órgãos da Administração Pública com funções de tipo
jurisdicional – acontece, por exemplo, com a Autoridade Tributária, que tem funções de
natureza contenciosa. Isto vale igualmente quanto a entidades reguladoras. O TJ não tem uma
jurisprudência que seja absolutamente clara quanto a estas situações ambíguas.
Fundamentalmente, e desde que seja um estatuto determinado por lei, cumpridos os requisitos
apontados, o Tribunal não considera determinante que se trate ou não de uma entidade com
um estatuto formal de natureza administrativa.
Relativamente aos quadros de arbitragem, em princípio e à luz destes critérios, os árbitros não
são órgãos jurisdicionais, desde logo porque a arbitragem é sempre facultativa, e a competência
dos árbitros do Tribunal Arbitral é determinada pelas próprias partes, que lhe atribuem a
competência no litígio ou de modo ad hoc (pó-litígio) ou no próprio contrato, não
correspondendo em princípio aos requisitos necessários. Quanto a julgar segundo acordo
estrito, isso dependerá do próprio acordo de arbitragem. À partida excluiremos a arbitragem
deste conceito de órgão jurisdicional, mas o TJ já admitiu que há determinado regimes de
arbitragem que se poderão incluir no conceito de órgão jurisdicional, e fez isso em particular no
caso português, nomeadamente no âmbito das competências de arbitragem no Direito
Administrativo – nestes casos, ele poderá fazer reenvio para o TJ. Admite-se que quadros de
resolução de litígios em arbitragem possam incluir-se no conceito de órgão jurisdicional, o que
significa que aquela composição arbitral pode fazer reenvios prejudiciais para o TJ – tem de ser
criado por lei e, em certa medida, a sua jurisdição tem de ser obrigatória, na medida em que o
particular pode fazer essa escolha e a outra parte, se ela for feita, não a pode recusar.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
“Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional
de um dos Estados-Membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa
questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal que sobre ela se pronuncie.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um
órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto
no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal.”
Quando no terceiro parágrafo se diz “recurso”, refere-se ao recurso ordinário, e não os recursos
extraordinários como o recurso de revisão de sentença – desde que haja ou não recurso
ordinário, falamos de recurso para reforma da decisão.
A outra questão, ainda no terceiro parágrafo, tem a ver com o que significa esta não existência
de recurso: aqui podemos ter duas orientações:
Se utilizássemos apenas um critério orgânico, estes tribunais não estariam obrigados a fazer
reenvio, porque organicamente não pertenciam à pirâmide judiciária. Contudo, se utilizarmos
um critério material, aí essa apreciação far-se-á no caso concreto, e podemos concluir que
mesmo num processo que não tenha alçada para recorrer para um tribunal de segunda
instância, já se verifica situação de não ser passível de recurso, e por isso esse reenvio para esse
tribunal vai ser obrigatório.
Há argumento a favor do critério orgânico – admitir o critério material seria admitir que o TJ
pudesse ser inundado de questões prejudicais com menor importância, menos significativa.
Por outro lado, habitualmente estes limites são limites que têm na sua base o valor pecuniário
da causa, e isso seria, de alguma forma, condicionar a importância do Direito a aspetos
meramente pecuniários ou financeiros, o que não será legítimo – há inclusive acórdãos muito
relevantes no quadro do Direito da UE cujo valor para efeitos da alçada do processo era
insignificante.
Ex.: Um dos casos mais conhecidos é o caso Costa ENEL, que surge como um caso de não
pagamento de uma fatura da luz e o valor, de um ponto de vista atualizado, era quase de 1€,
era insignificante, e o caso é fundamental para o Direito da União e para a afirmação do seu
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
valor – segue um critério material e não um critério orgânico, porque a importância das
questões não pode depender do valor da causa para efeitos de recurso.
Nessas condições, o TJ veio a admitir que tal poderá ser relevante mas, de alguma forma, veio a
considerar que, se em abstrato se admite o recurso, então, em principio, o tribunal a quo não
estará obrigado a fazer o reenvio, mesmo que haja condições para isso. Sempre que Tribunal de
Justiça entende que o Tribunal a quem cabe fazer essa apreciação deverá ter em conta, nessas
condições, a questão respeitante ao reenvio e ao Direito da UE e, portanto, se há dúvidas sobre
a interpretação do DUE, então isso deverá ser considerado para admitir o recurso, porque
dessa forma irá garantir-se que ainda há possibilidade de reenvio, porque se isso não for tido
em conta já será de pensar que o Tribunal a quo será obrigado a fazer o reenvio – é isso que
resulta desta orientação do TJ.
A própria decisão de reenvio pode ser objeto de recurso, ela própria, e isso afetará o processo
de reenvio se a decisão objeto de recurso vier a ser anulada, que não poderá continuar.
Recebendo o TJ a informação que a decisão de efetuar reenvio foi objeto de recurso e anulada,
há uma extinção oficiosa do próprio processo de reenvio, mas, ainda assim, o que o Tribunal de
Justiça veio dizer foi que tal é legitimo, mas não se pode admitir que esse recurso diga respeito
à pertinência da questão, pode ter outros fundamentos, mas a pertinência da questão não, pois
esta caberá em primeira linha ao juiz nacional que faz o reenvio e em segunda linha ao TJ, num
ponto de vista de controlo.
O que vimos acontecer é uma jurisprudência corretiva do TJ, em parte condicionada pelas
reticências dos tribunais nacionais.
Esta jurisprudência que consagrou a teoria do ato aclarado e a teoria do ato claro tem relevo
em relação ao reenvio que seria obrigatório, isto é, em relação a questões colocadas em
processos em que não haveria recuso e por isso o reenvio seria obrigatório.
Caso Da Costa
No caso “Da Costa”, nos anos 60, a questão que se suscitou tinha a ver com o facto de já ter
havido jurisprudência do Tribunal sobre as questões a colocar, a dúvida que se colocava já
tinha sido objeto de apreciação por parte do Tribunal.
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O TJ entendeu que, se já tiver havido uma apreciação pelo Tribunal na interpretação daquelas
disposições, obviamente que, mesmo que não haja recurso daquela decisão, não faz sentido
obrigar o Tribunal a fazer reenvio, porque ele tem essa jurisprudência anterior para se
orientar na sua decisão, e pode utilizá-la sem fazer reenvio. Ele poderá fazê-lo na mesma,
pode querer esclarecimentos suplementares, ou até entender que ainda há algo mais que
queira ver esclarecido, mas não é obrigado a fazer o reenvio, ao contrário do que resultaria
da aplicação do art. 267º. A teoria do ato aclarado veio excluir a obrigação que seria, em
abstrato, aqui imposta pelo Tratado.
O Tribunal de Justiça veio ainda produzir outra jurisprudência corretiva, no caso Foto-Frost –
aqui a questão não está dependente da obrigatoriedade de acordo com o Tratado, mas sim
exatamente o contrário.
As Teorias do Ato Claro e do Ato Aclarado vêm limitar a obrigatoriedade do reenvio, admitindo
que reenvios que seriam obrigatórios já não o são, seja porque já foi esclarecido em
jurisprudência anterior o sentido da norma, ou porque o sentido da norma é evidente. Na
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Isto aconteceu nas situações em que o juiz, perante uma norma comunitária, se incline para o
entendimento de que ela não é valida, pelo que isto só vale para reenvio de validade, para
normas de direito secundário. Se ao juiz, num caso em que seja relevante uma norma de um
regulamento ou de uma diretiva, lhe parecer, interpretando essa disposição ou olhando para o
procedimento de decisão, que há um vicio que afeta validade da norma, se este juiz fosse de um
Tribunal de cujas decisões há recurso, ele em princípio não estaria obrigado a fazer reenvio, mas
o Tribunal de Justiça não admitiu isso e entendeu que, seja qual for o tribunal em que a questão
se coloque, se se levantar uma questão sobre a validade de uma norma de DUE e se o juiz se
inclinar para a pertinência dessa questão, entendendo que efetivamente há fundamento para
considerar que ela não é valida, ele não poderá deixar de a aplicar sem antes fazer o reenvio,
mesmo que das suas decisões ainda haja recurso.
Se o TJ se pronunciar pela invalidade, o juiz nacional não está obrigado a aplicar aquela norma.
Se, por outro lado, o TJ não encontrar fundamento de invalidade, o juiz nacional terá de aplicar
essa norma, porque o acórdão de reenvio é obrigatório para o tribunal. Isto é também uma
interpretação corretiva, aplicando-se mesmo que haja ainda a possibilidade de recurso.
Jurisprudência Zuckerfabrik
Nesta jurisprudência, o TJ admitiu que o que o Tribunal Nacional pode fazer é aplicar, em sede
provisória, a suspensão da aplicação do ato. Se considera que há um fundamento de
invalidade, é certo que não pode decidir sem fazer o reenvio, mas pode fazê-lo e, entretanto,
suspender a aplicação do ato comunitário que ele suspeita que padece de uma invalidade
ou pode também realizar a suspensão do ato nacional que aplica o ato comunitário –
falamos, por exemplo, de regulamentos que são depois objeto de execução por um ato
normativo ou por um ato individual nacional.
O TJ admitiu que os tribunais nacionais possam, em sede de medidas provisórias, não aplicar
provisoriamente, não efetivar provisoriamente o DUE até que o TJ se pronuncie sobre a
validade da norma comunitária. Se o TJ se pronunciar no sentido da validade, a medida
provisória tem de cessar, a decisão confirma a aplicação do Direito da União. Se o TJ se
pronunciar pela invalidade, então o Tribunal nacional, em decisão definitiva, vai desaplicar o
UE, tornando definitiva também a medida provisória de suspensão.
01/03/2023
Revisões:
Relativamente a quando deve ou não o reenvio ser obrigatório, o Tribunal de Justiça apresentou
uma orientação no sentido de ser o critério material que deve ser respeitado, do litígio concreto
– assim, o reenvio será obrigatório, independentemente da posição hierárquica da questão
orgânica pelo tribunal nacional, sempre que na decisão em concreto não haja recurso ordinário.
Pode um tribunal de primeira instância ser obrigado a fazer o reenvio se não houver recurso de
apelação e, à luz desta perspetiva, o reenvio será obrigatório.
Depois, numa outra perspetiva, temos já não uma simples interpretação do art. 267º, mas sim
jurisprudência corretiva do TJ relativamente à previsão do art. 267º.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
A Teoria do Ato Aclarado não é jurisprudência corretiva, podemos considerar que faz uma
interpretação até declarativa, quanto muito extensiva, e coloca-se na situação em que estamos
perante um processo no qual não há recurso ordinário e que, de acordo com a letra do art. 267º,
seria obrigatório o reenvio. Nestes casos, o TJ admitiu muito cedo que, se aquela questão já
tiver sido antes objeto de interpretação pelo TJ, o tribunal nacional não é obrigado a fazer o
reenvio, mesmo que não haja recurso – é uma interpretação lógica, não se justifica impor ao
tribunal nacional que coloque questões já esclarecidas anteriormente, desde que considere que
esse esclarecimento é suficiente.
Isto dispensa o reenvio obrigatório, mas não limita essa faculdade de o fazer, seja porque
entende que a apreciação feita anteriormente não é a adequada, seja pela necessidade de haver
um esclarecimento complementar. Se o TJ considerar que não há mais nada a esclarecer, limita-
se a remeter por despacho para o acórdão anterior, de forma simplificada.
Por sua vez, a Teoria do Ato Claro já consubstancia jurisprudência corretiva. Os tribunais
entendiam que, apesar de não haver recurso das suas decisões, tinham todas as condições para
interpretar de forma correta, porque a disposição em causa era clara.
O TJ admitiu que isto era correto, mas em acrescento deu a interpretação sobre o que era um
ato claro, procurando condicionar a jurisprudência dos tribunais nacionais – veio dizer que este
é um conceito indeterminado que tem de ser preenchido à luz do sistema jurídico da UE e das
suas especificidades, que passam pelo facto de ele ser um sistema multinacional, em que todos
os atos jurídicos vinculativos (nomeadamente de alcance geral) fazem fé em todas as línguas
oficiais. Isso significa que é necessário assegurar que o conceito enunciado que é objeto de
interpretação é efetivamente claro à luz deste quadro plurilinguístico, porque pode aparentar
ser claro numa determinada língua, mas haver uma complexidade maior que só se consegue
compreender quando se faz uma análise comparada com outras línguas, e só será claro se tiver
um único sentido – isto será excecional.
Podemos admitir que esta exigência é cada vez mais difícil de cumprir pelos juízes nacionais,
mas na perspetiva do tribunal isso é um fator que reduz o alcance da Teoria do Ato Claro e,
assim, obriga a uma maior cautela da parte dos juízes para assegurar a uniformidade do Direito
da UE. O que esta perspetiva veio traduzir é que o ato é claro quando a interpretação é evidente,
não é passível de uma outra interpretação.
São as situações que digam respeito ao reenvio sobre a validade e em que o juiz nacional se
inclina na sua apreciação para a invalidade da norma, para uma desconformidade da norma
com os requisitos de validade à luz do Direito da União. Se for um regulamento, pode padecer
de qualquer um dos vícios referidos no art. 263º do TFUE (pode ser um vício de forma, um desvio
de poder, pode ser uma violação do direito superior) – se o juiz nacional, olhando para o ato e
interpretando a disposição, tem um entendimento preliminar de que há de facto ali razões
fundamentadas para considerar que há uma invalidade, se se tratasse de um tribunal de cuja
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
decisão ainda houvesse recurso ordinário, ele não seria em princípio obrigado a fazer o reenvio,
em princípio não aplicaria a norma e depois, havendo recurso, quando chegasse a um tribunal
do qual já não houvesse recurso, a questão teria de ser colocada obrigatoriamente ao TJ.
Contudo, o TJ entende que não pode ser assim, por razões relacionadas essencialmente com a
certeza jurídica e também com a unidade na aplicação do Direito, desde logo porque isto
deixaria, de certa forma, alguma incerteza a pairar, dado que temos um sistema descentralizado
com centenas de tribunais a poderem ser chamados a aplicar esta disposição, e o risco seria que
aquilo que era uma orientação num tribunal num determinado Estado podia não ser
acompanhada num outro Estado – teríamos uma situação em que os destinatários da norma
ficariam em dúvida sobre se deveriam ou não respeitar, sabendo que havia um tribunal num
determinado lugar que tinha recusado a aplicação daquela norma. Isto criaria uma situação de
incerteza que seria iníqua nos seus resultados, porque levaria à aplicação diferenciada do
Direito.
Por outro lado, o Tribunal utiliza também uma argumentação formal, relacionada com as
competências atribuídas ao TJ. De acordo com as atribuições do TJ, resultantes do art. 19º do
TUE e 263º do TFUE, o controlo da legalidade/constitucionalidade do DUE é uma competência
que o Tratado prevê para o TJUE, que se traduz depois no recurso de anulação ou de omissão,
porque cabe-lhe a ele julgar, através dessa via contenciosa, os recursos interpostos por Estados,
Instituições ou pelos particulares, cujo pedido é a anulação de um ato com base na violação do
Direito que seria aplicável.
O TJ entende que, tendo esta atribuição sido colocada para si no Tratado, isso implicará que não
pode haver outros tribunais a fazer esse controlo de validade, mesmo que seja apenas com um
alcance concreto. A declaração de invalidade por parte do TJ com fundamento no art. 263º tem
um alcance geral, dela resultará a expurgação daquele ato do ordenamento jurídico; no caso de
uma declaração idêntica por um tribunal nacional, ela nunca poderia ter esse alcance, podendo
apenas ter efeitos no caso concreto.
Contudo, o TJ entende que tal não é admissível – não tendo o Tratado previsto essa competência
expressamente para os tribunais nacionais, mas sim para o TJ, entendo que não pode o art. 267º
ser a base para o controlo da legalidade de modo autónomo, obrigando então os tribunais
nacionais, mesmo em relação a tribunais de cuja decisão haja recurso, independentemente do
critério (orgânico ou material) que se utilize, quando tiverem a intenção de considerar que a
disposição do DUE é inválida, só o poderem fazer depois de terem feito o reenvio para o TJ e
obviamente o Tribunal de Justiça ter sustentado essa interpretação, dando acolhimento a algum
fundamento de invalidade, se isso não acontecer, o tribunal nacional não o poderá fazer.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
será a suspensão da aplicação do ato comunitário cuja validade está em questão e sobre o qual
foi feito o reenvio.
As condições para esta suspensão são as seguintes:
1. Esta suspensão tem de ter lugar na sequência do reenvio;
2. Fumus boni iuris – tem de haver uma situação de previsível cobertura jurídica
relativamente a essa validade, uma previsibilidade de que o Direito de algum modo
aponta nesse sentido da invalidade do ato
3. Tem de haver um prejuízo sério e dificilmente revertível no caso de não ser suspensão
a validade do ato – para este efeito, prejuízo sério não é um prejuízo pecuniário, tem de
ser um prejuízo que diga respeito à consolidação de uma situação jurídica que, mesmo
depois da declaração de invalidade, não poderia ser revertida.
Se se tratar apenas de prejuízo monetário, em principio isso não é considerado prejuízo
que possa ser fundamento para esta suspensão, porque o prejuízo monetário poderá
ser ressarcido. No entanto, pode o Tribunal admitir que esse prejuízo, embora seja
pecuniário, é já elemento suficiente, se acarretar uma situação que afete
definitivamente a entidade em causa (imaginemos que leva à falência da empresa –
poderia ser revertido com ressarcimento em momento posterior, mas o facto de a
empresa ter de suportar o encargo naquele momento pode causar uma situação
definitiva de insolvência, e aqui o tribunal deve ponderar esta situação, porque o
prejuízo já não é meramente pecuniário).
Estes são os interesses que têm de ser ponderados pelo juiz quando decide provisoriamente a
suspensão da aplicação de um ato comunitário sobre o qual se levantam sérias dúvidas de
validade. Ele poderá ser objeto dessa suspensão até que o TJ se pronuncie sobre a questão. A
suspensão do ato é sempre no caso concreto e é decidida pelo juiz nacional.
Toda esta situação poderá ter uma outra apreciação noutro plano, mas já não será, em principio,
pelo recurso contencioso do art. 263º, porque este tem um prazo de dois meses após a
publicação ou notificação – quando falamos de questões que se colocam nos tribunais nacionais,
a realidade fáctica implica que já se tenham ultrapassado os dois meses. Contudo, a questão
pode vir a ser suscitada também no TJ de modo direto através da exceção, um processo especial
num outro quadro.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O facto é que o TJ veio esclarecer a sua orientação no acórdão 416/17, que dizia respeito à
França – o Conselho de Estado francês neste caso não faz reenvio, utilizando a justificação do
ato claro, mas a Comissão Europeia vem entender que esta utilização é errada, porque faz uma
aplicação do Direito contrária à própria jurisprudência anterior do TJ na matéria. O Conselho de
Estado francês não entendia a posição da Comissão, o que seria mais uma razão para fazer o
reenvio, porque não havia clareza nenhuma no ato – assim, estava obrigado, de acordo com o
art. 267º, a fazer o reenvio e fazendo-o, poderia ter de afastar a sua interpretação. Não o faz,
fazendo antes uma interpretação diversa, errónea à luz da jurisprudência do TJ, aplica o DUE de
modo errado.
Pela primeira vez, a Comissão europeia entende uma ação por incumprimento contra a França
com base na errada aplicação do DUE e em desrespeito da obrigação de reenvio do tribunal
francês – é a primeira vez que a comissão tomou esta iniciativa, e o TJ vem a declarar que o
comportamento e decisões dos tribunais que constituam uma violação do DUE, constituem um
incumprimento do Estado, e daí podem decorrer duas consequências:
O Estado pode impor a um Tribunal Nacional que faça um reenvio, por vias indiretas, porque se
um Estado não pode diretamente obrigar um juiz a fazer o reenvio, pode depois censurá-lo, na
medida em que esse juiz está a fazer uma aplicação errada do Direito, então o Estado pode ter
aí um fundamento para acionar a responsabilidade dos juízes que não fazem o reenvio que aqui
também envolve o Direito da UE.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O tribunal superior não tem legitimidade para se pronunciar sobre a pertinência da questão para
a solução do caso, porque essa apreciação cabe em primeiro lugar ao tribunal nacional que faz
o reenvio e há uma presunção de pertinência que só pode ser afastada pelo TJ e que não pode
ser afastada em sede de recurso interno.
Se houver um recurso da decisão de reenvio, o que ocorre no processo a nível interno? Por causa
desse recurso em relação à decisão de reenvio, ele deverá ser suspenso, e desse recurso não
pode resultar a obrigação do tribunal que fez o reenvio de retomar o processo principal para
avançar em direção à decisão final, porque dessa forma estaria a pôr em causa a própria
pronuncia do TJ.
Quando há um recurso sobre a decisão de reenvio, o processo de reenvio não para, este recurso
não pode ter um efeito suspensivo sobre o reenvio, o reenvio vai continuar até que o tribunal
superior decida. Caso o tribunal superior decida no sentido de que a decisão de reenvio não é
válida, então aí sim terá incidência sobe o processo de reenvio, que se deverá extinguir, mas
não pode ter esse efeito imediato. Por outro lado, ainda que a decisão do tribunal superior em
matéria desse recurso seja no sentido de que aquela decisão sobre o reenvio é inválida, isso não
pode impedir nem limitar de modo algum a faculdade de o tribunal inferior fazer novo reenvio
– essa decisão pode incidir sobre aquele despacho de reenvio, mas não pode ter um alcance
para além daquele mesmo despacho, não pode impedir o tribunal inferior de, depois da decisão
de recurso, fazer novamente o reenvio. Se isso acontecer, temos uma situação em que estaria a
ser posta a faculdade que todos os juízes têm de fazer o reenvio, como acontece no processo
C-564/19.
Se a legislação processual interna nessa matéria tiver esse alcance, decidindo sobre um
despacho que fez o reenvio e impedindo o juiz de novamente fazer o reenvio daquele processo,
então essa legislação é contrária ao art. 267º e, de acordo com o primado do Direito da União
Europeia, não deverá ser aplicada, devendo o juiz nacional desconsiderá-la. Temos ainda
situações complexas e difíceis, como por exemplo legislação nacional que prevê que se o juiz
fizer novamente este reenvio, terá um processo disciplinar – esse é o quadro de alguns dos
Estados-Membros, em que esta via é utilizada para condicionar os juízes.
Neste momento, as maiores dificuldades são, de facto, neste quadro, o modo como se procura
condicionar os juízes nacionais a não fazer o reenvio.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
02/03/2023
Esta ação por incumprimento tem a ver com o respeito das obrigações resultantes do Direito
da União Europeia. Os Estados-Membros podem ser objeto de uma ação por incumprimento.
No art. 19º, faz-se referência a esta competência em particular, mas esta via contenciosa cabe
na alínea c), “demais casos previstos nos tratados”, e destes demais casos só vamos estudar o
regime comum, previsto nos artigos 258º a 260º do TFUE.
Este é o regime comum, em que um Estado pode ser réu numa ação junto do Tribunal de
Justiça, e que pode ser intentada de acordo com o art. 258º, pela Comissão Europeia, ou por
outro Estado-Membro, nos termos do art. 259º.
• Art. 114º n.9 – atos adotados pelos Estados alegadamente violadores de normas de
harmonização do mercado interno; os Estados podem em determinadas circunstâncias
adotar medidas que consideram fundamentais para salvaguardar determinados
interesses gerais (de proteção da saúde, por exemplo), e que são restritivas do mercado
interno (porque, por exemplo, impedem a comercialização de produtos fabricados
noutros Estados-Membros). Prevê-se todo um regime de reação a essas medidas e o n.9
prevê um regime especial para o acionamento do Tribunal numa ação contra o Estado
no TJ.
• Art. 126º n.10 – afasta a ação por incumprimento; este artigo regula o regime aplicável
aos Estados por défices excessivos, no quadro dos critérios macroeconómicos de
estabilidade (este regime foi suspenso no quadro da pandemia e assim continuará até
2024). O n.10 determina que não se aplica o regime da ação por incumprimento, há
um regime próprio, que aliás até pode levar à aplicação de uma sanção pecuniária, o
desrespeito dos défices excessivos não fica sujeito à ação por incumprimento prevista
no art. 258º e 259º, mas sim ao regime especial que este artigo prevê.
• Art. 348º – diz respeito a medidas que o tratado admite, respeitantes à segurança
interna, nacional, relacionadas com restrições à circulação de determinado tipo de
produtos ou serviços, que têm a ver com a defesa do Estado. Nos artigos 346º e 347º
encontramos um conjunto de regras específicas para estes setores e um regime de
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
controlo especial, que tem lugar no Conselho, entre pares, dada a especial sensibilidade
destas matérias. Se um Estado considera que outro Estado utiliza abusivamente estas
cláusulas (que lhe permitem, por exemplo, restringir a circulação de um tipo de veículos
blindados), então esse Estado não vai recorrer à ação por incumprimento, mas vai
utilizar o mecanismo específico de controlo, que passa sobretudo por um diálogo do
Conselho.
Tratam-se de situações de alegado incumprimento mas que têm uma resposta distinta, que
afasta o Tribunal de Justiça.
Objeto e fundamento
Diz o art. 258º diz, no 1º parágrafo:
“Se a Comissão considerar que um Estado-Membro não cumpriu qualquer das obrigações que
lhe incumbem por força dos Tratados, formulará um parecer fundamentado sobre o assunto,
após ter dado a esse Estado oportunidade de apresentar as suas observações.”
O artigo faz referência aos Tratados, mas como acontece na generalidade destas situações, esta
expressão não se refere só aos Tratados, mas significa sim Direito da União Europeia que seja
aplicável – o objeto da ação por incumprimento é qualquer alegada violação do Direito da União
Europeia imputável a um Estado-Membro.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Não há causas de exclusão de ilicitude, não há qualquer justificação possível, a não ser que o
próprio DUE o permita – por exemplo, quando falamos de restrições ao comércio entre os
Estados-Membros, o art. 36º do TFUE prevê que há justificações que legitimam restrições, por
exemplo para salvaguardar a saúde das pessoas, plantas e animais, a saúde pública, etc. Aí, é o
próprio DUE que admite derrogações justificadas.
Nesses casos, o que é que acontece? Imaginemos que um Estado é acionado – ele pode
defender-se, dizendo que adotaram uma medida tendo em conta a necessidade de salvaguardar
esses objetivos, e aí isso é aceite, mas não quaisquer outras razões.
O art. 258º só refere a parte final da ação por incumprimento – essas referências apontam para
duas fases na ação por incumprimento:
1. Fase pré-contenciosa
a. Notificação para cumprir;
b. Parecer fundamentado
2. Fase contenciosa – a ação junto do tribunal (“a comissão pode intentar a ação por
incumprimento junto do tribunal”)
1. Fase pré-contenciosa
A fase pré-contenciosa tem dois momentos. Um primeiro momento no qual a comissão deu ao
Estado a oportunidade para apresentar observações, que se designa por notificação para
cumprir, e que é o ato que dá início à fase pré-contenciosa.
Aqui, a comissão vai apresentar ao Estado a matéria de facto e a matéria jurídica que entende
que está em causa naquela ação do Estado – imaginemos no caso da não-transposição de uma
diretiva, se o Estado não transpôs a diretiva, a Comissão Europeia vai dizer que decorreu o prazo
de transposição e o Estado não a notificou, esta é a matéria de facto. Depois, vai dar o
enquadramento jurídico, esta falta de notificação constitui uma violação do Direito da União,
desde logo do seu art. 288º TFUE e art. 4º n.3 TUE.
Nesta notificação, a Comissão determina um prazo razoável para que o Estado venha apresentar
observações, que é variável, mas frequentemente é de dois meses. Nesse prazo, o Estado
apresentará as suas observações, podendo contrariar a Comissão ou até não responder de todo.
A Comissão recebe essas observações e depois, se entender que as suas dúvidas e que as
alegações que tinha feito na notificação não foram respondidas deviamente, poderá formular
um parecer fundamentado. Este é o ato principal em todo este processo até ao TJ e assenta na
notificação para cumprir, e tendencialmente é-lhe correspondente, podendo até concretizá-la
mais, nomeadamente definir melhor os factos imputados ao Estado e também o Direito que
alegadamente por ele é violado.
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Este parecer fundamentado, ainda assim, vai dar ao Estado a oportunidade de se conformar
com o Direito. Não serve para o Estado apresentar observações, mas recorta a situação, imputa
a violação de determinadas normas e dá ao Estado um prazo para que este se conforme com a
situação, transmitindo à Comissão o que fez para se conformar (revogando ou adotando
legislação, por exemplo). Cabe à Comissão Europeia determinar livremente o prazo que dá ao
Estado para corrigir a situação, sendo o prazo mais frequente de dois meses.
2. Fase Contenciosa
Se o Estado nada fizer ou tomar medidas insuficientes, então a Comissão pode intentar a ação
por incumprimento, através de uma petição, dando entrada no Tribunal de Justiça (e não no
TG).
Este é o recorte que resulta do art. 258º, mas há mais antes disto. Antes da fase pré-contenciosa,
temos uma espécie de fase “pré-pré-contenciosa”, uma fase informal, administrativa, em que
há troca de informações entre a Comissão e o Estado.
Esta fase pré-pré-contenciosa tem lugar porque a Comissão terá informação de que há uma
violação, e essa deteção pode resultar da falta de comunicação que um Estado estava obrigado
a fazer, quando falamos da transposição de diretivas, mas se falamos de outro tipo de violações,
muitas vezes a informação da Comissão resulta de fontes diversas, os seus serviços
quotidianamente acompanham aquilo que se passa nos Estados e podem detetar a partir daí
situações contrárias ao DUE. A Comissão também recebe denúncias, qualquer pessoa pode,
junto da Comissão, apresentar uma denúncia através de um formulário, informando que num
determinado Estado se verifica uma situação da responsabilidade desse Estado que é contrária
ao DUE.
É a partir dessa informação que os serviços da Comissão vão fazer uma averiguação e tendo esta
informação (que pode vir por canais oficiais ou oficiosos), eles até 2007 dirigiam-se aos serviços
do Estado, questionando sobre essa situação em causa, e os serviços do Estado vão
respondendo, criando-se um diálogo.
Esta fase tinha como objetivo a Comissão Europeia apurar melhor a informação, porque, nas
respostas do Estado, a Comissão ia reunindo informação complementar que depois permitia
perceber melhor se haveria ou não violação e que violação existiria. Contudo, o principal
objetivo era resolver a situação sem que se chegasse a uma via contenciosa. Esperava-se que
nesta fase pré-pré-contenciosa a situação se resolvesse e não se chegasse à situação de
notificação para cumprir.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Entretanto, foi introduzida alguma formalização de modo a permitir agilizar esta fase. Começou
com um projeto-piloto, a que aderiram alguns Estados, que consiste numa plataforma que não
serve só para as Ações por Incumprimento, mas também para todo um outro conjunto de
articulação, nomeadamente para particulares se queixarem a respeito do próprio
funcionamento da União Europeia (O SOLVIT é uma outra rede para apresentação de denuncias,
queixas, que funciona não só articulando a Comissão Europeia mas também as próprias
administrações dos Estados, fazendo chegar a estas denúncias, queixas que se espera que
possam ser resolvidas logo).
Por estas vias tem-se conseguido solucionar alguns problemas, uns mais importantes, outros
menos e o modo de fazer chegar as informações é atualmente muito mais ágil. Não há obrigação
absoluta de utilizar o formulário previsto na plataforma, pode fazer-se chegar a informação à
Comissão Europeia através de outra via. Aqui não há denuncias anónimas.
Há aqui uma fase de diálogo ao longo do tempo que pode culminar ou não numa notificação
para cumprir que dá início à fase pré-contenciosa, e passamos então a ter um processo formal,
no qual a Comissão tem uma absoluta discricionariedade. Portanto, a Comissão notifica o
Estado, que responde ou não; o que vai acontecer a seguir está inteiramente na disposição da
comissão. Em princípio haverá um parecer fundamentado, mas não tem de haver, a Comissão
tem um poder de discrição acerca disso. Há um parecer fundamentado e é dado um prazo ao
Estado para se conformar com o Direito – se o Estado não o faz, a Comissão pode intentar a ação
por incumprimento, mas não tem a obrigação de o fazer, o poder é discricionário absoluto, ou
seja, é insindicável.
Ex.: vamos imaginar que alguém faz uma denúncia e a Comissão trata a denuncia, concluindo
que há uma violação imputável ao Estado, mas verificou-se uma tragédia e a Comissão entende
que deverá ter isso em consideração, não avançando com a ação por incumprimento. Se a
Comissão entender que não é oportuno, conveniente, por qualquer razão, avançar com a ação
por incumprimento, não tem de o fazer, não está obrigada a fazê-lo, e quem fez a denúncia
nada pode fazer. Esta inação da CE não é uma omissão juridicamente relevante, não pode o
particular que fez a denúncia acionar depois a Comissão através de um recurso por omissão,
pretendendo que ela seja condenada por não ter avançado com a ação por incumprimento. A
Comissão tem um puro juízo de oportunidade, não tendo de fundamentar a sua decisão.
Ainda quanto à notificação, ela depois condiciona o parecer. O parecer pode reforçar a
notificação, mas não se pode alargar a questões que a notificação não continha. Se é imputada
ao Estado a não implementação de uma diretiva, não pode depois a Comissão no parecer dizer
que também não implementou uma outra diretiva, tendo de cingir-se àquela diretiva que foi
integrada na notificação para cumprir. Mas imaginemos que a Comissão deteta outras violações
a partir do diálogo que ainda se estabelece depois da notificação para cumprir. Nesses casos, a
Comissão pode apresentar uma notificação complementar, onde alarga o âmbito da primeira,
e isso já permite depois que o parecer fundamentado que se segue tenha um âmbito mais lato
do que tinha a primeira notificação.
Isto é relevante porque, no final, dará lugar a um único processo. Sem a notificação
complementar, o parecer fundamentado ficaria limitado pela primeira e a ação teria de ser
limitada.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Deve ser claro e preciso e deve conter um pedido formal para que o Direito que a Comissão
entende que está a ser infringido deva ser acatado, convidando o Estado a adotar as medidas
necessárias, em regra no prazo de dois meses.
Pode haver um parecer fundamentado complementar. Em que situações? Vamos imaginar que
o Estado adotou algumas medidas naquele prazo de dois meses, mas não as adotou todas e a
Comissão considera que continua a haver uma insuficiência – aqui pode haver um novo parecer
fundamentado que adapte a situação, que reconhece que houve avanços, mas que eles não são
ainda suficientes.
A ação tem de ser basear nos mesmos fundamentos que o parecer fundamentado se baseou.
Ex.: Imagine-se que há uma violação do artigo 36.º do TFUE – não pode a Comissão depois
pretender que Estado seja condenado por violação do artigo 101.º se não o referiu também no
parecer fundamentado. Não pode vir invocar novos fundamentos, exceto no que diz respeito a
argumentos novos (relacionados com as condições a que se reconduz essa violação). Este
procedimento pré-contencioso é uma garantia essencial não apenas para a proteção dos
direitos do Estado-Membro em causa, mas igualmente para assegurar que o eventual processo
contencioso terá por objeto um litígio claramente definido.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
08/03/2023
Fases processuais:
1. Fase pré-pré-contenciosa – informal, não segue regras, a Comissão pode agir ex officio
ou a partir de uma queixa
2. Fase pré-contenciosa/administrativa – notificação para cumprir seguida de parecer
fundamentado
3. Fase contenciosa – art. 260º n.1, ação declarativa condenatória, declara o
incumprimento
Neste quadro, os Estados têm os seus direitos, incluído um direito de defesa, no entanto, estão
sujeitos ao princípio da cooperação leal, têm o dever, ao longo das fases contenciosas (pré-
contenciosa e pré-pré contenciosa) de transmitir com lealdade à Comissão Europeia as
informações que lhe são solicitadas e que são relevantes para o processo, até porque, em
grande medida, muita da informação relevante não pode ser acedida pela Comissão sem a
colaboração dos Estados, porque não dispõe de meios nem pode recorrer a outras autoridades
para exigir que essa informação seja prestada. A Comissão não pode, por si, por exemplo fazer
buscas nas instalações dos Estados, não pode aceder a registos do Estado que não sejam
públicos se que este os disponibilize, não podem usar expedientes dilatórios, não podem reter
informação.
O Estado não se pode defender relativamente a elementos que ele tinha a obrigação de
disponibilizar e não disponibilizou, ao longo desta fase pré-contenciosa, que serve também para
procurar apurar todos os elementos necessários para a devida apreciação da situação.
A notificação para cumprir delimita o objeto, mas não fecha os factos relevantes para esse
objeto, admitindo-se que, no parecer fundamentado, a Comissão possa apresentar novos
factos, desde que relacionados com o mesmo objeto. Tem de haver sempre uma relação com
factos previamente definidos, esta fase pré-contenciosa não serve para criar um outro objeto
para além do que estava já na notificação para cumprir.
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O prazo habitual para cumprir é habitualmente de dois meses, mas pode não ser (ex.: caso do
banco do Grupo Champalimaud, em que o prazo foi de dois dias porque a situação era clara). Há
casos em que se pode alargar ou prorrogar este prazo. Aqui há ainda alguma informalidade,
porque estas regras não têm nenhuma previsão legal, correspondem apenas à prática mais
comum, e a sua determinação cabe à Comissão. O Tribunal, em última instância na ação, pode
fiscalizar isso, nomeadamente ao abrigo do direito do Estado a defender-se – o Tribunal vai
apreciar se efetivamente aquele prazo seria suficiente à luz das capacidades do Estado, da
complexidade da questão, etc. Va avaliar se aquele prazo foi suficiente para que o Estado se
defendesse. Por definição, os Estados têm ao seu dispor todos os mecanismos e instrumentos
possíveis para poder responderem responder rapidamente, mas pode haver situações-limite em
que isso não é possível.
Pode haver uma notificação para cumprir complementar e, nesse caso, pode haver parecer
fundamentado complementar, mas não necessariamente, dependendo do momento em que
surge a notificação complementar:
• Contudo, pode acontecer que tenha havido uma notificação para cumprir, um parecer
fundamentado e, ainda assim, a Comissão encontre depois outras questões e venha a
apresentar a segunda notificação para cumprir. Se já tiver sido adotado um parecer
fundamentado, a sequência da segunda notificação é o segundo parecer
fundamentado.
Pode haver duas notificações para cumprir que culminem num só parecer fundamentado ou que
deem lugar a um segundo parecer fundamentado, se a segunda notificação para cumprir já tiver
lugar depois do primeiro parecer fundamentado. O que não pode acontecer é haver um segundo
parecer fundamentado sem ter havido uma segunda notificação.
Pode haver mais do que uma notificação para cumprir num processo pré-contencioso que dê
lugar a um só parecer fundamentado, pode haver várias notificações para cumprir que
necessariamente obriguem a mais do que um parecer fundamentado, se a segunda notificação
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
para cumprir não estava integrada no primeiro (e em princípio não estaria se, do ponto de vista
temporal, ela não é anterior).
Esta fase pré-contenciosa é bastante flexível, não tendo um procedimento rigoroso. No final, o
parecer fundamentado (e que pode ser múltiplo) irá delimitar o objeto do litígio. O novo
parecer fundamentado incluirá não só novos elementos de facto, como também novos
fundamentos, porque o parecer fundamentado delimita o objeto da ação, quer relativamente
aos factos, quer relativamente aos fundamentos. A Comissão não pode apresentar fundamentos
para ação que não estivessem no parecer fundamentado.
Por isso, se a Comissão deteta, num qualquer momento, que há outros fundamentos, ainda que
substancialmente se trate do mesmo domínio, então ela necessariamente tem de apresentar
um parecer fundamentado complementar para incluir esses fundamentos, sob pena de não o
poder fazer na ação – se o fizesse, aquele fundamento iria decair.
Por exemplo, se se trata de adotar legislação, não cabe à Comissão dizer ao Estado que medidas
deve adotar internamente para implementar uma diretiva e o Estado não se pode defender
dizendo que a Comissão não deu indicações do que deveria fazer. O Estado deve ter essa
capacidade para saber que atos terá de adotar para se conformar com o Direito da União.
Quanto à fase contenciosa, temos uma ação de tipo declarativo condenatório que declara o
incumprimento e, se declara incumprimento, condena o Estado a corrigir a situação de
incumprimento. O Tribunal não indica ao Estado que medidas deve adotar e claramente não se
substitui ao Estado – não se trata ação em que Tribunal pudesse, ele próprio, substituir-se ao
Estado e executar o próprio Direito e medidas.
No que toca ao prazo para intentar a ação, ele não está previsto. A Comissão não tem obrigação
de intentar a ação, mesmo que conclua no parecer fundamentado que há violação. Se tiver dado
um prazo ao Estado para corrigir situação e ele não o faz ou fá-lo indevidamente, essa é uma
outra situação em que pode haver um parecer fundamentado complementar. Imaginemos uma
situação em que a Comissão dá dois meses ao Estado para corrigir a situação e, nesse prazo, o
Estado corrige algumas coisas, comunicando à Comissão, mas esta entende que ainda não é
suficiente – aí também pode haver um segundo parecer fundamentado, que vai corrigir o
anterior.
Ora, se o Estado nada faz ou toma medidas insuficientes, nesse caso a Comissão não tem
obrigação de intentar a ação, é um puro juízo de oportunidade. Se aquela situação foi
despoletada por uma denúncia, isso não permite ao denunciante procurar responsabilizar a
Comissão ou interpor recurso de omissão (baseado numa obrigação que a Comissão tivesse de
adotar o ato). A CE dispõe de inteira liberdade em relação a esta ação.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
A Comissão pode intentar a ação no prazo que entender. O Tribunal declarou que a Comissão
não tem um prazo definido, mas será de admitir que haja uma apreciação sobre se a demora
da Comissão põe em causa os direitos de defesa do Estado. O Tribunal admitiu poder considerar
que houve uma demora excessiva caso esta implique que o Estado não disponha já da
possibilidade de se defender devidamente por causa desse longo período. Dificilmente isto será
considerado, porque falamos de situações de incumprimento do Estado que tem elementos
factuais, mas que se reconduzem sempre a um desrespeito do Direito, pelo que não há perda
de realidades fácticas que sejam relevantes, como poderia ocorrer noutras situações. Em que
medida é que um Estado fica de algum modo diminuído nos seus direitos de defesa por ter
decorrido muito tempo? Quando estamos a falar de elementos que estão num domínio próprio
do Estado, que não são elementos de facto e que não possam simplesmente desaparecer.
O que pode suceder, sim, é haver consolidação de situações jurídicas, que depois o Estado tem
dificuldade em reverter – imaginemos que o incumprimento por atribuição de benefícios ou
apoios contrários ao Direito da UE, o Estado depois não os consegue reverter, porque,
entretanto, a possibilidade de acionar os beneficiários prescreveu, ou porque pode haver aqui
uma situação de usucapião. Em qualquer uma destas situações, percebemos que o Estado pode
estar incapacitado no momento da ação, sendo condenado a cumprir o acórdão, porque já não
o pode fazer, mas isso não atenta os seus direitos de defesa, porque o Estado sabia desde o
parecer fundamentado que devia ter implementado essas medidas e, se não o fez, isso deve-se
à sua própria displicência.
A norma nacional que implementa erradamente disposições de DUE integra o objeto no âmbito
dos factos, é uma situação jurídica que constitui um facto para este efeito, porque será objeto
de prova. Não é questão controvertida, a questão controvertida é o facto de a lei ser reguladora
de Direito da União; a lei em si, o seu conteúdo, o facto de estar ou não em vigor, são questões
de facto sujeitas a prova.
Podemos estar também a falar de uma medida operacional ou material do Estado, e esta é
também matéria de facto.
Quais são as questões de Direito? Correspondem a saber em que medida aqueles factos, sejam
situações materiais ou jurídicas, são contrários ao Direito da União, aos fundamentos
47
Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
invocados, que terão de ser sempre uma norma jurídica que integra a ordem jurídica da união,
seja norma de Direito Internacional ou uma norma primária ou secundária da União, que seja
relevante, aplicável e que alegadamente não terá sido respeitada.
O que é que a Comissão não pode trazer de novo? Tem de se limitar ao que está no parecer
fundamentado, às questões de factos e aos fundamentos, não podendo trazer novos.
Não pode trazer novos comportamentos inadimplentes, mas tal não ocorre quando a Comissão
ilustra com exemplos esses comportamentos inadimplentes. O comportamento inadimplente
pode ser invocado pela Comissão como um não cumprimento pelo Estado de determinados
requisitos, por exemplo através dos registos, nos casos de ultrapassagem dos limites de emissão
de poluentes atmosféricos. Os registos das emissões de poluentes são os elementos de facto
quanto à violação do Direito da União Europeia, e neste caso a Comissão tem de apresentar
elementos que comprovem que estes registos foram ultrapassados – imaginemos que apresenta
determinados registos de 3 anos diferentes e depois vem já na ação apresentar outros registos
mais recentes, que são exemplos ilustrativos que confirmam os mesmos factos. Aqui não há um
alargamento do objeto, um exemplo ilustrativo não se traduz no alargamento dos factos que
foram delimitados no parecer fundamentado.
Imaginemos uma situação em que a Comissão dava um prazo de 2 meses, que terminou a 20 de
dezembro de 2021, a Comissão teria de ter em conta para o incumprimento este prazo quando
apresenta ação. Chegando ao fim do prazo, verificavam-se os factos e a situação de
incumprimento mantinha-se – este é o momento relevante, porque o Estado pode vir defender-
se dizendo que em abril de 2022 corrigiu a situação e, por isso, a ação tinha-se tornado inútil.
Contudo, o que é relevante para a ação por incumprimento é o final do prazo dado no parecer
fundamentado.
Que consequências pode ter? Em primeiro lugar, desde logo a revelação de que o Estado não
cumpriu suas obrigações, e daí podem advir consequências que tenham a ver com danos
sofridos por alguém por força dessa violação, irregularidade – imaginemos que há um particular
que beneficiaria do cumprimento do Direito da União e por causa do Estado não o pôde fazer,
com esta declaração, tem possibilidade de intentar uma ação de responsabilidade contra o
Estado.
A Comissão pode desistir – mais uma vez, a Comissão tem uma larga margem de apreciação
desta matéria. Pode a Comissão entender que, tendo a situação sido regularizada e que não há
consequências, pode desistir simplesmente da ação, total ou parcialmente. Imagine-se que há
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
uma correção parcial da situação, a CE pode desistir parcialmente da ação. Isto está na descrição
da Comissão.
A CE não pode alargar os fundamentos, mas pode pormenorizar os fundamentos que já tinha
invocado anteriormente. Vamos imaginar que um dos fundamentos é que há uma violação da
não discriminação em razão da nacionalidade. A Comissão Europeia pode vir a pormenorizar
esse fundamento, nomeadamente trazendo um conjunto de argumentos suplementares que
comprovam essa discriminação, não pode é trazer um novo fundamento. Pode dizer que há
discriminação, mas não pode depois da petição, depois do Parecer Fundamentado, introduzir
um novo fundamento como a restrição ao comércio. Pode, contudo, precisar com outros
argumentos que não tinha apresentado anteriormente o alcance da discriminação que tinha
lugar, desde que se mantenha nesse âmbito. Estes elementos ou são elementos de facto
conexos que clarificam os factos, ilustram os factos ou são argumentos jurídicos que reforçam
os fundamentos já presentes.
Não se admitem presunções ou ficções. Aqui fala-se de presunções ou ficções legais, mas há
presunção judicial, pois o juiz pode tirar ilações que sejam razoáveis de um facto para concluir a
verificação de outro.
Ex.: se se comprova que num determinado dia choveu, pode razoavelmente presumir-se que o
piso numa estrada estava molhado e isso pode ser relevante no quadro de um acidente – isto é
uma presunção judicial, razoável, que qualquer julgador fará. Se houvesse uma presunção de
incumprimento resultante de qualquer facto determinado, se ela fosse absoluta, o Estado não
poderia afastá-la e não teria de ser aprovada pela comissão. Se a presunção fosse relativa, ela
beneficiava a Comissão, que não tinha o ónus de fazer prova daquele facto, ainda que pudesse
ser afastada mediante contraprova.
É verdade que a Comissão terá de fazer prova de todos os factos que invoca, mas, no entanto,
também é verdade que se pode encontrar numa situação muito condicionada em relação a
determinados factos, porque está dependente, na recolha de prova, da colaboração dos
Estados-Membros.
Se há elementos que devam ser provados pela Comissão, mas em relação aos quais ela esteja
dependente da colaboração dos Estados, o Tribunal pode apreciar essa situação e, do ponto de
vista da exigência da prova, ter conta essa ausência da colaboração do Estado que não forneceu
à Comissão esses mesmos elementos, como está obrigado a fazer à luz do princípio da
cooperação leal.
Eventualmente, o Tribunal faz uma leitura razoável relativamente a isto no caso C-398/14:
“quando a Comissão tenha fornecido elementos suficientes que revelem que as disposições
nacionais que transpõem uma diretiva não são corretamente aplicadas, na prática, no território
do Estado-Membro demandado, incumbe a este contestar de modo substancial e
pormenorizado os elementos assim apresentados e as consequências que daí decorrem”.
Isto significa que não se pode exigir que a Comissão apresente um conjunto de elementos que
seja, em absoluto, exaustivo, porque poderemos estar a falar de uma prova diabólica,
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
demasiado exigível. Imaginemos que a Comissão apresenta elementos que comprovam que
houve comportamentos inadimplentes, mas porventura limitados, e o Estado invoca que a
Comissão deveria invocar que não houve comportamentos cumpridores – isto é uma prova
negativa, muito dificilmente possível para a CE e o Tribunal pondera aqui razoavelmente o que
será de exigir.
Não é eliminar em absoluto qualquer possibilidade, dúvida possível, mas simplesmente exige
da parte da Comissão que sustente suficientemente os factos imputados ao Estado e não
necessariamente que comprove em absoluto a plenitude dos comportamentos do Estado que
sejam relevantes.
De acordo com o art. 260º n.1, “se o Tribunal de Justiça da União Europeia declarar verificado
que um Estado-Membro não cumpriu qualquer das obrigações que lhe incumbem por força dos
Tratados, esse Estado deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão do Tribunal”.
O TJ também não dá indicações ao Estado daquilo que ele deve fazer para cumprir o acórdão,
limita-se a declarar que, de acordo com os factos provados, se verifica um incumprimento.
Passamos para a possibilidade que constitui uma segunda ação por incumprimento – art. 258º
n.2 e 260º TFUE. Se o Estado não adotou legislação ou medidas tendentes a corrigir a situação
e a conformar-se com o acórdão, então a Comissão pode intentar uma segunda ação, nos termos
do art. 260 n.2. Esta ação é simplificada e já tem uma natureza sancionatória, podendo ter
também natureza compulsória.
O objeto desta segunda ação é o incumprimento do acórdão, da decisão na primeira ação para
incumprimento. Nesta segunda ação, a Comissão requer a condenação do Estado, mais uma
vez, e, portanto, ela não deixa de ter dimensão condenatória (e a condenação é pelo facto de,
ao não ter feito nada para se conformar com o acórdão, o Estado está a violar o Direito da União
Europeia), mas pode ter essa dimensão sancionatória e compulsória. Este regime não estava
previsto originalmente, antes só estava prevista a possibilidade de uma segunda ação
condenatória – o que sucedeu algumas vezes foi o facto de os Estados serem sucessivamente
condenados sem que daí resultasse qualquer consequência, então introduziu-se esta natureza
sancionatória.
Este sancionamento pode ser através de uma sanção pecuniária fixa, determinada pela
gravidade dotada à violação do Estado e pela extensão do incumprimento, que é determinada
a partir do primeiro acórdão. A determinação da sanção pecuniária fixa, de acordo com o art.
260º n.2, faz-se a partir da data do acórdão, portanto a extensão temporal que é importante
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
para a determinação dessa quantia é a partir desse momento. Para a determinação da gravidade
da situação, o tribunal considerou admitir-se um juízo de proporcionalidade e que pudesse ser
tida em conta a situação interna do Estado, nomeadamente circunstâncias especiais do ponto
de vista financeiro. Ainda assim, falamos de circunstâncias que têm de ser necessariamente
objetivas, de alguma forma “alheias” ao funcionamento do Estado propriamente. Isto é,
circunstâncias de natureza política não são consideradas relevantes.
• Uma sanção pecuniária fixa, que assenta na gravidade da violação e na sua extensão
temporal;
• Pode ser também uma sanção compulsória, que visa instar o Estado a corrigir a situação
e a colocar-se em situação de cumprimento. A sanção compulsória é calculada
diariamente: é um montante que o Tribunal fixa diariamente e que será pago por cada
dia que incumprimento se mantenha. Esta sanção compulsória só é calculada a partir
da data da prolação do segundo acórdão e só faz sentido se a situação de
incumprimento se mantiver.
Imaginemos que, entretanto, nesta segunda ação o Estado corrigiu situação e vem dizer
na fase final que já adotou essa legislação. O Estado poderá ser condenado na sanção
pecuniária fixa porque existiu uma situação de incumprimento com a gravidade
determinada ao longo do tempo até àquela correção, mas já não poderá ser condenado
na sanção compulsória porque já não se verifica o incumprimento. Se o Tribunal concluir
que efetivamente o Estado já corrigiu a situação, condená-lo-á na sanção pecuniária
fixa, mas não na sanção pecuniária compulsória. Se ele corrigiu até à data do acórdão,
então começa a contabilizar o montante diário até que ele informe a comissão de que
efetivamente corrigiu.
No âmbito desta ação do art. 260º n.2, o Tribunal tem plena jurisdição, não estando
condicionado pelo pedido da Comissão nesta matéria. Portanto, ele aprecia com toda liberdade
a gravidade a situação e cabe-lhe determinar o período temporal no qual considera ter havido
essa violação (isto não é igual ao que sucede no art. 260º n.3, em que o Tribunal está limitado
pelo pedido da Comissão).
09/03/2023
No art. 260º n.2 encontramos o regime comum para o incumprimento de um acórdão que
condenou um Estado por incumprimento, mas, ainda assim, grande parte dos incumprimentos
diz respeito simplesmente à não comunicação da transposição de diretivas – os Estados,
decorrido o prazo de transposição de uma diretiva, têm obrigação de comunicar à Comissão as
medidas de transposição da diretiva, enviando para a CE a legislação interna que, no seu
entendimento, foi adotada ou até que já vigorava e que corresponde aos objetivos da diretiva,
porque os Estados não são obrigados a adotar legislação nova, podem entender que o regime
que a diretiva pretende que seja instituído já vigora no seu ordenamento jurídico. Há que
recordar, de acordo com o art. 288º, que a diretiva estabelece uma obrigação de resultado, mas
dá liberdade de meios e de forma – se o Estado entender que a sua legislação já é adequada
para alcançar o resultado, nem estará obrigado a adotar legislação interna, mas isto é
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Sucede que é frequente que os Estados se atrasem e, por isso, entendeu-se que, como muitas
vezes o incumprimento diz respeito apenas a esse atraso, é possível fazer um escrutínio
acelerado – o que prevê o art. 260º n.3 é o regime especial da ação por incumprimento, quando
ela tenha por objeto apenas a ausência de comunicação de medidas de transposição da
diretiva.
Este regime, de alguma forma, faz uma junção entre a primeira e a segunda ação por
incumprimento. Relativamente ao procedimento, quando o incumprimento imputado ao Estado
é a ausência de implementação de uma diretiva porque o Estado não comunicou essas medidas,
ele é muito semelhante, tem uma fase pré-pré-contenciosa e pré-contenciosa idênticas, que
permitirão ao Estado, durante aquele tempo, fazer a transposição (e é isso que se espera que
aconteça, para que depois não seja necessária a ação).
Caso tal não aconteça efetivamente, a Comissão pode logo na primeira ação por incumprimento
(que aqui vai ser única) requerer ao Tribunal a condenação do Estado ao pagamento de uma
quantia pecuniária fixa e/ou compulsória. Ao contrário das outras situações de incumprimento
(onde se inclui, por exemplo, a errata transposição), nesta situação em que o incumprimento se
traduz na ausência de transposição, na não adoção de legislação para a transposição, então aqui
logo numa única ação, ela é simultaneamente declarativa condenatória, mas é também uma
ação sancionatória e/ou compulsória. A Comissão pode logo requerer que o Estado,
comprovando-se em juízo que não implementou a diretiva, seja condenado pelo Tribunal numa
sanção fixa e/ou compulsória, somente se se mantiver o incumprimento.
Enquanto que no n.2 o Tribunal dispõe de plena jurisdição relativamente à sanção, tem pleno
poder para determinar o montante da sanção, no caso do art. 260º n.3 não, está condicionado
pelo pedido da Comissão – não pode o Tribunal condenar o Estado para além daquele que foi o
pedido da Comissão. A data que conta para determinar o espaço temporal de incumprimento e
a sanção pecuniária compulsória é a data da transposição da diretiva (é uma diferença
relativamente ao regime comum). Os critérios são idênticos: a sanção irá ser determinada de
acordo com a gravidade e o período temporal durante o qual se estendeu o incumprimento.
As sanções são recursos próprios da UE, sendo o meio para depois ela ser paga. Os Estados e a
União têm uma conta corrente, com débitos e créditos recíprocos, onde são registados os
valores que os Estados têm de compromisso para com a União Europeia, do ponto de vista das
contribuições (como é o caso de parte do IVA, impostos aduaneiros, contribuições diretas que
dependem do produto nacional do Estado, etc.) e, em contrapartida, os Estados também têm
recursos que lhes são devidos pela UE, nomeadamente fundos que são por eles distribuídos. Os
recursos que respeitam às sanções entram nestes registos.
Regimes Especiais
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O art. 259º prevê que um Estado-Membro pode intentar uma ação contra outro Estado-
Membro, sendo que o fundamento é igual – nenhum Estado-Membro tem necessariamente de
sofrer uma lesão nos seus direitos ou nos direitos dos seus nacionais para acionar outro Estado,
isso não é um pressuposto.
Não tem de haver aqui do ponto de vista do Estado um interesse processual, ele pode fazê-lo
simplesmente no interesse do Direito – contudo, na prática isto não acontece, os Estados não
acionam outros Estado a não ser que tenham um especial interesse. São poucos os casos, mas
têm vindo a ser cada vez mais, há mais casos de ações intentadas por um Estado contra outro
Estado nos últimos dez anos do que em todos os anos anteriores, e isto tem a ver com a
existência de um número muito maior de Estados, com orientações políticas e ações mais
diversas. Está a haver também, recentemente, uma certa tendência mais nacionalista, que leva
a que os Estados adotem medidas tendencialmente mais protecionistas dos seus interesses.
Por outro lado, a Comissão Europeia, dado o maior volume de questões, também terá de ser
mais seletiva em relação aos incumprimentos dos Estados, dando mais importância às situações
que entende serem mais relevantes para o interesse comum. Temos visto situações em que a
Comissão, tendo oportunidade de se pronunciar sobre uma situação, não deu andamento à ação
ou não entendeu que ela era contrária ao DUE e, por isso, temos um Estado a avançar.
Em relação ao regime previsto no art. 259º, a fase contenciosa tem características idênticas. É
claro que as partes são diferentes e, por isso, os intervenientes processuais também terão
algumas diferenças, mas as maiores diferenças encontram-se na fase pré-contenciosa.
Quando um Estado entende que outro Estado não respeita o DUE, ele deverá dirigir-se à
Comissão para que ela aprecie a questão e possa pronunciar-se sobre ela, no prazo de três
meses depois de ter analisado a questão e notificado o Estado visado. Não é uma notificação
para cumprir, porque a queixa vem de outro Estado, mas é um ofício ao Estado para ele
apresentar observações relativamente à queixa apresentada pelo outro Estado. A queixa pode
ser puramente informal e muito sucinta, mas depois o Estado queixoso e o Estado visado terão
ambos a oportunidade de apresentar observações (escritas e orais).
Tal como na fase pré-contenciosa do art. 258º, o objetivo fundamental desta fase pré-
contenciosa é que se alcance uma solução, que aquela situação deixe de ser controvertida, que
o Estado ou esclareça a situação e consiga convencer que não há efetivamente um
incumprimento ou reconheça que ele existe e corrija a situação – se isso acontecer, não faz
sentido que a ação prossiga.
O que também poderá acontecer é a Comissão, perante esta queixa e após esta troca de
observações, ela mesma assumir aquela ação, e aí passamos a guiar-nos pelo art. 258º. A
comissão apresentará um parecer fundamentado, no qual pode concluir que efetivamente há
violação do DUE ou não – a partir daí, pode a Comissão assumir essa tarefa e avançar ela própria
com a ação por incumprimento, mas pode não o fazer, e se não o fizer no prazo de 3 meses,
então o Estado queixoso pode avançar para a fase contenciosa, pode intentar a ação por
incumprimento junto do Tribunal.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
3. Art. 126º n.10 – exclusão do controlo dos défices excessivos dos EM através da ação por
incumprimento
É um regime que não está sujeito a apreciação do Tribunal, tudo o que diga respeito ao controlo
de défices excessivos, ele é de natureza jurídico-política, feita no Conselho em articulação com
a Comissão, conjugado com propostas da CE.
Está relacionado com medidas nacionais que são legítimas da parte dos Estados para proteção
da segurança nacional e, aqui, também o regime é idêntico. Há um regime de controlo
politicamente feito em conjunto entre os pares no próprio Conselho e, depois, há a possibilidade
de recurso ao TJ, mas sem fase pré-contenciosa, porque já houve esse trabalho de diálogo e
troca de informações e observações no quadro do Conselho.
16/03/2023
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Contencioso de Validade
• Recurso de anulação
• Recurso por omissão – replica o próprio processo de anulação com adaptações, tendo
em conta que o que está em causa é a ausência de um ato jurídico
• Exceção de ilegalidade – tem um regime diferente, que tem lugar quando o ato jurídico
já não é passível de anulação, porque já decorreu esse prazo. Ainda assim, pode ser
invocada como exceção num outro processo, por exemplo de responsabilidade
contratual, ou noutro quadro, como numa ação de incumprimento
1. Recurso de Anulação
A primeira disposição fundamental nesta matéria é o art. 47º da CDF, ainda que este
contencioso não seja uma via processual exclusivamente vocacionada para assegurar esse
direito de acesso a uma tutela jurisdicional efetiva, a um tribunal e a um processo judicial
equitativo, porque este contencioso não está apenas à disposição dos particulares. A Carta dos
Direitos Fundamentais prevê um conjunto de direitos e princípios que se destinam
maioritariamente à esfera dos particulares, mas o contencioso de anulação tem um âmbito de
aplicação mais vasto.
Para além do art. 19º (que prevê as competências do TJ), é relevante o art. 263º do TFUE, onde
estão estabelecidos os elementos fundamentais do recurso de anulação – onde são indicados
os seus fundamentos e onde está estabelecido o quadro determinante relativo à legitimidade
processual dos sujeitos de Direito.
Há um regime especial previsto para os atos da PESC, referido no art. 275º §2 do TFUE. Os atos
da PESC estão isentos do controlo da validade, exceto nas condições previstas no art. 275º §2.
De acordo com este regime, quando esses atos afetem diretamente particulares, estes poderão
utilizar a via processual do art. 263º, se houver efetivamente um dos fundamentos ai previstos
para requererem e obterem do Tribunal (se o recurso tiver acolhimento) a anulação desse
mesmo ato, total ou parcialmente.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
dos dois tribunais não está definida com base nas fontes de Direito em causa. Contudo, há
exceções que, por sua vez, têm exceções que levam a que se aplique o regime geral. As exceções
são limitadas, há partes que saem da própria exceção e caem no regime geral.
Os recursos realizam-se contra o Réu, que é sempre o autor do ato que é objeto de
recurso, seja ele o Parlamento, o Conselho, ou o Parlamento e o Conselho (quando se
trate de atos legislativos, que são aprovados pelos dois). Se o recurso é de um
regulamento que é um ato legislativo então podemos deduzir que autores são o
Parlamento e o Conselho, logo a competência não é do Tribunal Geral, mas sim do
Tribunal de Justiça.
o Atos de execução adotados com base no art. 291 n. º2. Como vimos, podemos
ter um contencioso de legalidade em que o regulamento de execução não
respeite o regulamento de base ou quando o regulamento delegado não
respeita também o regulamento de base – neste caso, ainda que seja um
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Na prática, aqui isto não tem grande efeito, porque os Tribunais comunicam oficiosamente si –
se o secretário do TG receber um recurso que não está dirigido ao Tribunal correto, ele próprio
remete oficiosamente para o devido Tribunal, não é isso que dá lugar a qualquer consequência
processual. É o próprio regulamento que prevê este dever de remessa.
Prazo de Impugnação
O prazo de impugnação é de 2 meses nos termos do art. 263º. Este prazo é de ordem pública e
é um prazo perentório (art. 62.º RPTG), não podendo ser modificado. Há prazos, que são de tipo
processual, que o próprio Tribunal pode modificar, pode prorrogar o prazo se considerar que há
razões válidas que o justifique, mas isso não é possível aqui. Há situações em que se admite que
possa haver uma justificação para um atraso em relação a este prazo:
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
remete para aquilo que é o ato e o momento em que efetivamente entra na esfera do
próprio visado.
• Situações de caso fortuito – são situações que estão alheias e que são determinantes
da própria parte.
Ex.: Imaginem-se que sistema é hackeado e deixa de funcionar – seria um caso fortuito,
alheio à capacidade da parte.
• Casos de força maior, como previsto no próprio Regulamento do processo. Em qualquer
uma destas duas últimas situações o tribunal é muito rigoroso.
Ex.: uma situação catastrófica como um terramoto, à semelhança do que aconteceu na
Turquia (quando a situação extrema tenha tido uma influência no processo).
→ As decisões sem destinatários (art. 297º n.2 TFUE). As decisões são atos
híbridos, tanto podendo ter destinatário como não os ter – as decisões da PESC,
exceto aquelas que aplicam medidas a entidades particulares, não têm
destinatários.
• Os atos que não são obrigatoriamente publicados, são notificados e, nesse caso, o prazo
de 2 meses conta-se a partir do momento da notificação ao recorrente.
Ex: diretivas e decisões com destinatário (artigo 297.º, n.2, §3 TFUE), atos sujeitos a
notificação.
Se nestes casos a notificação não ocorrer, eles não produzem efeitos para os
destinatários enquanto esta não ocorrer.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Aquele prazo de 2 meses não é o único prazo. Temos ainda aplicação de um prazo de 14 dias
(aplicável apenas para os atos publicados) de acordo com artigo 45.º do ETJUE, artigo 50.º RPTJ
e art. 59.º do RPTG, ao qual acrescem mais 10 dias de dilação de distância, este já aplicável a
todos os atos (artigo 51º do RPTJ e art. 60.º do RPTG). Estes últimos prazos atualmente já não
fazem sentido, porque é tudo tratado por meios eletrónicos (estavam relacionados com o envio
por correio e, por isso, havia um conjunto de prazos suplementares para acautelar a distância
relativamente ao Tribunal).
A contagem é feita por esta ordem: 2 meses + 14 dias + 10 dias. Se o prazo termina num dia não
útil, passa para o primeiro dia útil seguinte, mas não nestas contagens intercalares, aqui a soma
é contínua. São relevantes para este efeito os artigos 49º RPTJ e 58º RPTG.
Atos Impugnáveis
Relativamente impugnabilidade dos atos, nem todos os atos são impugnáveis – o próprio artigo
263º esclarece isto.
São impugnáveis todos os atos jurídicos emanados das instituições e de outros órgãos e
organismos da União produtores de efeitos jurídicos vinculativos em relação a terceiros (art.
263º §1 TFUE). Este é o critério e isto é relevante porque o ato pode ter a designação de
declaração, comunicação, o que importa é o conteúdo do ato – à partida, olhando para aquele
ato, para aquela declaração, podemos presumir que ele não produzirá efeitos jurídicos
vinculativos, mas temos de ver o conteúdo do ato para concluir se será ou não suscetível de
impugnação.
De acordo com o que é a forma do ato e de acordo com os efeitos que tipicamente cada
categoria de ato produz, vamos ver os atos que cabem naquela categoria de atos que produzem
efeitos vinculativos para terceiros, caso efetivamente correspondam à sua natureza formal:
• Atos legislativos – a natureza dos atos legislativos da União Europeia é uma natureza
formal. São atos legislativos, independentemente da categoria de ato, aqueles que
forem adotados de acordo com o processo legislativo.
Ex: regulamentos, decisão, diretiva. Qualquer deste tipo de atos pode ser um ato
legislativo
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
dois atos são indissociáveis) os fundamentos possam estar presentes no próprio acordo
internacional. Há controlo preventivo porque uma coisa a decisão padecer de um vício,
e aí a decisão é objeto de anulação, mas quando falamos do acordo internacional, o
Tribunal pode declarar que ele não é conforme ao Direito, mas isso não vai produzir a
expurgação daquele acordo e não vai ter como efeito a desvinculação da União. A
consequência é sim a não produção de efeitos do acordo na ordem internacional, no
Ordenamento Jurídico da União, e isso é grave porque a União estaria em
incumprimento perante terceiros.
• Atos do Parlamento Europeu, do Conselho Europeu e de órgãos e organismos da União
Europeia com efeitos jurídicos para com terceiros – devemos avaliá-los
casuisticamente para determinar se têm ou não efeitos para com terceiros, olhando
para o ato e para o seu conteúdo, porque, à partida, um ato do Parlamento Europeu
que não é um ato legislativo não produzirá efeitos para com terceiros, exceto no que é
a relação com o destinatário do ato.
• Atos híbridos na parte que é fonte de DUE – temos situações de atos híbridos quando
há decisões do Conselho e, simultaneamente, também do conjunto dos representantes
dos Governos. Neste ato, a parte que é anulada diz respeito à que é decisão do
Conselho, que é competência da União. A parte que é decisão dos representantes dos
Governos dos Estados não pode ser objeto de anulação, porque estas decisões não
estão sujeitas à competência do TJUE. O Tribunal veio ainda esclarecer que atos do
Eurogrupo não podem ser objeto de impugnação, porque não é um órgão da União, mas
sim uma formação do Conselho que reúne os representantes dos Governos que fazem
parte do Euro. Contudo, as decisões do Eurogrupo são sempre decisões intercalares ou
decisões de Conselho – se o Eurogrupo adota determinada posição, ou está a agir
enquanto Conselho, ou então aquela decisão é um ato intercalar de um ato futuro que
a há de ser um ato do Conselho.
• Atos que sejam atos definitivos – isto vale sobretudo quando falamos de atos
individuais (não de atos legislativos) de caráter administrativo, isto porque podemos ter
atos que são confirmativos ou de mera confirmação, e até atos que são intercalares no
quadro de um determinado procedimento administrativo, mas isto também vale para o
procedimento legislativo (também não pode ser objeto de impugnação atos no decurso
do procedimento legislativo).
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Os fundamentos que podem ser utilizados neste recurso estão invocados no art. 263º:
a. Incompetência;
b. Violação de formalidades essenciais;
c. Violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação;
d. Desvio de poder.
a. Incompetência
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Têm de ser formalidades essenciais relativamente ao ato jurídico e não simples irregularidades,
que não se reflitam verdadeiramente na validade do ato. Se estivermos a falar, por exemplo, do
respeito pelas prerrogativas de um órgão chamado a dar um parecer, é uma formalidade
essencial, cujo desrespeito se reflete na nulidade, mas pode ser uma simples irregularidade
relativamente a aspetos menores que não se reflita necessariamente numa nulidade.
Aqui estamos a falar do chamado bloco de normatividade. Cabe tudo nesse conceito de violação
do Tratado, seja a violação de normas do Tratado, seja a violação do Direito Internacional, os
erros de interpretação, os erros sobre pressupostos de factos na base da decisão jurídica.
Quando falamos num erro relativo aos pressupostos de facto, há que ter alguma cautela,
porque o recurso de anulação é um contencioso objetivo e assente na legalidade e não na
oportunidade – isto tem a ver também com o respeito pelas próprias competências dos órgãos
e, no que tem a ver com essa avaliação das escolhas do regime jurídico em causa, das opções de
natureza político-económica, social, etc., o Tribunal tem de ser necessariamente contido,
porque não pode substituir a sua apreciação à apreciação do órgão competente. Referimo-nos
a matérias que tenham a ver com o que de algum modo diz respeito à solução económica ou
político-económica ou político-social, exceto quando haja um manifesto erro, um erro grosseiro
na apreciação dos factos que estão pressupostos.
Vamos imaginar que a legislação invoca determinados dados estatísticos que justificam uma
opção política para determinada solução normativa – o Tribunal não deverá substituir-se na
escolha politica, mas poderá apreciar se os fundamentos, aqueles dados estatísticos, são ou não
verosímeis, reais, essa apreciação pode ser feita, mas não pode apreciar a escolha, porque isso
seria o Tribunal substituir o seu juízo ao juízo do legislador nacional – isso corresponderia a uma
violação do princípio da separação de poderes, porque não cabe aos Tribunais governar. O
Tribuna não pode apreciar juízos de oportunidade ou de escolhas de natureza política, vai
limitar-se a verificar se as regras processuais foram respeitadas e se a avaliação respeitou aquilo
que é o due course, aquilo que deveria ser avaliado, se a fundamentação é adequada e suficiente
e em relação à exatidão dos factos que estão na base dessa decisão, limitando-se ao erro de
Direito ou então manifesto erro na apreciação desses factos.
d. Desvio de poder
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
22/03/2023
Quanto à legitimidade ativa, ela levanta mais problemas: no art. 263º encontramos 3 categorias
de entidades que podem recorrer:
Ou seja, têm de ser atos impugnáveis, mas estes recorrentes não têm de ser nem destinatários
do ato nem têm de demonstrar qualquer interesse em agir – a sua legitimidade é no interesse
do Direito. Mesmo que se sejam destinados a outros ou que sejam de alcance geral, esses atos
podem ser objeto de recurso por qualquer Estado-Membro, por exemplo.
Esta é uma categoria introduzida pelo tratado de Maastricht e onde estão incluídos o Tribunal
de Contas, o Banco Central Europeu e o Comité das Regiões, tendo em conta prerrogativas de
que dispõem nomeadamente no quadro da subsidiariedade.
Estes podem recorrer de atos quando haja um interesse em agir na sua parte. Não são
necessariamente atos que lhes são destinados, podem ser atos com um alcance geral,
destinados a outrem, mas em que as suas prerrogativas possam ter sido alegadamente afetadas,
porque haveria um direito de participação no procedimento ou porque de alguma forma se cria
uma situação jurídica com esse ato que afeta as suas competências ou os seus poderes.
Estas instituições têm de provar que foram afetados por algum elemento do procedimento ou
por alguma disposição do ato que efetivamente está a pôr em causa as suas competências – ex.:
imaginemos que num procedimento eles deveriam ter sido consultados e não foram. Contudo,
há aqui habitualmente uma complexidade maior, a intervenção de órgãos como, por exemplo,
o Comité das Regiões, está dependente do procedimento, da base jurídica, e é por aí que muitas
das vezes a afetação tem lugar. Se, na proposta, for escolhida uma base jurídica em que não se
prevê a consulta do Comité das Regiões, mas ele entende que o ato deveria ter sido adotado
com apoio numa outra base jurídica na qual se previa a consulta do Comité das Regiões, temos
uma situação na qual está configurada esta afetação das suas prerrogativas. A escolha da base
jurídica correta ou incorreta vai afetar as prerrogativas do Comité da Regiões na sua
possibilidade de poder/dever ser consultado nesse procedimento.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
de natureza substantiva, mas também com a consequência que essa escolha tem para a
possibilidade de intervenção a título consecutivo, por exemplo, do Comité das Regiões. Aqui
sim, não é um esquecimento, mas uma opção, que pode estar ou não justificada.
Só podem impugnar:
Estes recorrentes são recorrentes que não podem desde logo recorrer de atos dirigidos a outros
nem de atos de alcance geral.
São recorrentes ordinários as pessoas singulares ou coletivas – cabem aqui indivíduos, pessoas
coletivas (seja natureza comercial, civil, fundacional), mas cabem também entidades
intraestatais, como autarquias, regiões, estados federados de Estados-Membros. Todas essas
entidades são recorrentes ordinários.
Para alem destes, incluem-se aqui aqueles que são sujeitos de Direito Internacional:
Organizações Internacionais, Estados terceiros, qualquer entidade no plano internacional que
tenha depois determinadas condições, como a personalidade e capacidade judiciária. Nesta
categoria cabem aqui tanto sujeitos de direito público como de direito privado, bem como todas
as entidades que não sejam Estados-Membros ou instituições da União.
Estas entidades devem dispor de capacidade jurídica e/ou judiciária interna ou internacional e
tem de demonstrar sempre interesse em agir. Além da personalidade, capacidade e
legitimidade, tem de haver interesse em agir, tem de haver uma afetação do ato que é objeto
de recurso da sua própria esfera jurídica que seja atual, que se verifique na data da interposição
do recurso. O recurso de anulação deverá produzir consequência jurídicas, a anulação do ato,
que beneficiem o seu autor, apurado ao momento da interposição do recurso do ato – “atos
que produzam efeitos jurídicos obrigatórios suscetíveis de afetar os seus interesses, alterando
de forma caracterizada a sua situação jurídica”.
Esta fórmula teve alguma evolução, mas ainda assim continua a ser muito restritiva. A fórmula
original não continha a parte de simples afetação direta de atos regulamentares, mas este
preceito está precisado no Tribunal de Justiça desde a década de 60, e o TJ não tem evoluído em
relação a isso – isto é algo muito criticável pela doutrina, por Advogados Gerais e pelo próprio
Tribunal Geral, que teve a ousadia de ir mais além e ter uma interpretação mais flexível neste
âmbito, não exigindo a afetação individual e bastando-se com afetação direta, mas que o TJ
imediatamente coartou em sede de recurso. É na sequência desta jurisprudência controversa
que vem a ser alterado este regime, de modo a introduzir-se a última forma relativa aos atos
regulamentares que afetem diretamente e não tem de afetar individualmente.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Desde logo, o princípio da legalidade, isto é, o Tribunal de Justiça faz uma interpretação literal
(e nela se mantém) do que está previsto no art. 263º do TFUE, mas sabemos que, noutras
ocasiões, o TJ teve interpretações bem mais flexíveis, admitindo que a fórmula do 263º podia
ser objeto de interpretação extensiva quando não até corretiva, mas neste ponto mantém-se
rigoroso.
Uma outra justificação que também é dada encontra-se no artigo 19º do TUE, porque este tem
uma cláusula na qual prevê as competências do TJ que, apesar de ter uma cláusula aberta,
remete para os Tratados, e tem uma parte na qual diz que cabe aos Estados-Membros assegurar
vias de recursos necessárias para garantir o cumprimento do Tratado, a efetivação do Direito da
União Europeia. É com base nesta fórmula, que o TJ diz que, se há situações em que um
particular não encontra tutela jurídica no quadro do TUE ou do TFUE, caberá aos Estados criar
internamente essas vias de recurso, o particular poderá utilizar as vias de recurso nacionais.
A questão é que o próprio TJ admite que os Estados não estão obrigados a criar vias de recurso
especiais e terá de ser sempre através de um enquadramento nas vias de recurso comuns que
os Estados-Membros dispõem no quadro do seu ordenamento jurídico. Não há uma obrigação
para o Estado de criar uma via de recurso quando, eventualmente, o tribunal nacional recuse
conhecer uma determinada situação, continua a haver situações em que não há meio processual
ao dispor de um particular para tutelar a sua esfera jurídica, porque se trata de uma questão
que diz respeito à alegada invalidade de um ato da União que não cabe nos requisitos que
referimos e, por isso, não pode ser objeto de recurso de anulação junto do TJ, mas que também
não pode ser objeto de recurso junto dos tribunais nacionais, porque estes não têm
competências para anular atos da UE.
Portanto, esta possibilidade está sempre dependente de um qualquer ato nacional ou de uma
situação jurídica complementar que possa ser objeto de tutela jurisdicional por parte dos
tribunais nacionais, e isso pode exigir, por exemplo, que um particular viole um direito para ser
objeto de uma decisão de uma autoridade nacional a sancionar essa violação, de modo a que
ele depois recorra dela junto do Tribunal nacional e aí vai invocar enquanto exceção a ilegalidade
do ato da União Europeia que está na base da decisão da sua norma, numa via de defesa
excecional e não diretamente com vista à anulação do ato.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
vista da definição das regras, quer depois da sua aplicação e execução, está
plenamente estabelecido no ato em causa.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
processo de adoção. Não são atos legislativos aqueles que estabeleçam as bases de um
determinado regime, de uma matéria, mas antes os adotados de acordo com o processo
legislativo, de acordo com as bases jurídicas dos tratados.
Portanto, esta natureza nada nos diz sobre o conteúdo do regime jurídico, se ele é
efetivamente mais genérico, lato, ou mais concreto, limitado. Neste caso em que
estejamos perante um ato ou regulamento adotado de acordo com o processo
legislativo (que corresponde à maioria dos atos), um particular só poderá impugnar
esse ato se esses os afetarem direta e individualmente, não se bastando com a
afetação direta. Para a afetação direta, terá de ser um ato regulamentar (pode até ser
uma decisão, uma diretiva), um ato de segundo grau, adotado com base noutro ato que
constitui a base jurídica dele. O Tribunal de Justiça esclarece esta interpretação no caso
Inuit e diz que esta afetação direta dos atos regulamentares significa que o ato é auto-
exequível, portanto que exige apenas atos materiais ou operacionais de execução ou
atos que, ainda que sejam jurídicos, são atos vinculados, é a simples decisão da
autoridade de fazer aplicar aquele ato naquela situação concreta, com um conteúdo
jurídico próprio.
Mesmo no quadro da União Europeia, o Tribunal acaba já por estar bastante condicionado
porque o TUE e o TFUE já são Tratados bastante programáticos, orientando as políticas de uma
forma que não fazem a maioria das constituições (que são bastante mais limitadas). O Tratado
tem opções de política sobretudo económica perfeitamente orientadas, no sentido de
liberdades de comércio e circulação e, portanto, já há aqui um grande condicionamento do
legislador, há uma vinculação muito elevada do legislador – por exemplo, a Política Agrícola
Comum foi definida no Tratado num determinado momento histórico e, porventura, hoje não
será mais adequada e, por isso, há quem entenda que tratado deva ser revisto para expurgar
estas orientações políticas, deixando-as às maiorias do Conselho e do Parlamento.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Relativamente à decisão do recurso de anulação, ela faz-se por acórdão, mas pode ser por
despacho nas situações previstas no art. 181º do RPTJ, se se concluir que, logo no momento
preliminar do processo, o recurso é manifestamente inadmissível ou manifestamente
improcedente e aí pode decidir-se por decisão mais sumária.
Isto significa que não é admissível novo recurso entre as mesmas partes, com o mesmo objeto
e o mesmo fundamento. O ato anulado é expurgado da ordem jurídica, deixando de vigorar e
produzir quaisquer efeitos jurídicos. Portanto, tem efeitos erga omnes e ex tunc, reportando-
se a momento em que o ato iniciou a sua vigência.
Contudo, pode haver subsistência de efeitos, uma limitação destes efeitos do art. 264º. Pode
haver uma continuação, no sentido de que vale apenas para futuro (ex nunc – não produz efeitos
em momento anterior à prolação do acórdão), ou então podem apenas subsistir efeitos parciais,
e caberá ao Tribunal decidir quais os efeitos que se devem manter.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Quais são eles? Atos do Conselho que adotem medidas restritivas dirigidas a particulares, que
habitualmente vêm associadas a um quadro de sanções aplicadas pela União Europeia a
entidades internacionais que a UE entenda que estão a agir contra o Direito Internacional ou
que estejam a pôr em causa princípios fundamentais do Direito Internacional.
Esta alteração vem na lógica dos recursos interpostos por personalidades relativamente a
decisões no quadro do combate ao terrorismo e no qual, curiosamente, a União Europeia
estava a cumprir decisões do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Após 2001, o CSNU
adotou um conjunto de decisões sancionatórias que impunham aos Estados que adotassem
medidas restritivas relativamente a um conjunto de personalidades que este considerava que
contribuíam de modo ativo ou através do apoio para o terrorismo a nível internacional. Foi
criado um Comité que vai avaliando em permanência que personalidades, empresas, etc., que
diretamente estão relacionadas com atividades terroristas ou apoiam (financeiramente ou de
outras formas) o terrorismo. Esse Comité vai produzindo e prolificando uma listagem de
personalidades e o Conselho de Segurança vai adotar decisões nas quais determina se aquelas
entidades devem ou não ser objeto de medidas restritivas (como o congelamento de fundos,
de bens, restrições de circulação).
É na sequência disto que, no quadro europeu, tendo em conta que há um conjunto de
matérias que são competência da União Europeia e não dos Estados (nomeadamente
respeitantes à circulação de pessoas dentro do espaço da União), coube à União adotar um
conjunto de decisões no âmbito da PESC e já no TFUE que instituíam essas medidas restritivas.
No caso das decisões no âmbito da PESC, não se previa competência para o TJ poder julgar da
validade destes atos e o que sucede foi que tivemos algumas entidades coletivas e indivíduos
que estavam incluídas naquela lista das Nações Unidas, foram incluídas em atos da União
Europeia e, posteriormente, foram objeto dessas medidas restritivas – essas entidades
recorreram ao TJUE e, num primeiro momento, o Tribunal Geral veio dizer que estes atos no
âmbito de PESC não podem ser objeto de controlo. Mais, mesmo aqueles que tinham sido
objeto de decisão no quadro da Comunidade Europeia não podiam ser objeto de controlo
naquele caso por parte daquelas entidades, porque elas não tinham legitimidade processual,
dado que não eram afetadas direta e individualmente.
Há jurisprudência que vem evoluir nesse sentido, para qual contribui muito o Professor
Poiares Maduro, que disse que na União Europeia não podia haver atos que afetem
particulares, restringindo a sua esfera jurídica e as suas liberdades, que não sejam sujeitos a
um controlo jurisdicional, nomeadamente para assegurar que eles tiveram garantidos
direitos de defesa em particular, porque estamos a falar de união de direto.
Estamos a falar de decisões no âmbito da PESC que afetavam particulares, sendo que, no
âmbito da PESC não se previam que essas personalidades ou entidades pudessem participar
no procedimento para contrariar aquela decisão, de alguma forma – não se previa uma
audiência previa, como seria devido no quadro da adoção de medidas restritivas a entidades.
Portanto, elas não podiam apresentar fundamentos, argumentos, factos que contrariassem
aquilo que era o entendimento e orientação que deveria ser seguida. A Comissão Europeia
tenta argumentar que está apenas a aplicar medidas do Conselho de Segurança e a cumprir
apenas o Direito Internacional, dado que as decisões do Conselho de Segurança são
obrigatórias.
O Dr. Poiares Maduro disse que, no quadro da Nações Unidas, e porque esta não são uma
união de Direito, aquelas decisões não previam que as entidades visadas se pudessem
defender e pudessem porventura apresentar provas que aquela alegação de que apoiavam o
terrorismo não era verdadeira. Como nas Nações Unidas isso não estava previsto, este
defendia que não poderíamos na União Europeia aplicar cegamente essas decisões sem dar
oportunidade a essas entidades visada de alguma forma contrariar e defender-se.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
É nesse quadro que o TJ vem admitir que, não estando assegurado no quadro internacional
um regime que salvaguarde os direitos de defesa de entidades particulares, no quadro da UE
não podíamos ter situações em que esses particulares não têm qualquer tutela, não têm
quadro prévio administrativo, porque a União limitava-se a aplicar as medidas do Conselho
de Segurança, e depois não têm acesso a um Tribunal para poderem contrariar essas mesmas
alegações. O Tribunal de Justiça, no entanto, admitindo esta situação, veio defrontar-se com
aquele limite de que não há meios processuais a que possa recorrer o particular, porque não
é um ato que lhe seja dirigido particularmente, ou que o afete direta e individualmente.
Com aquela terceira possibilidade introduzida pelo Tratado de Lisboa e com esta possibilidade
do art. 275º em relação aos atos da PESC, veio admitir-se que particulares que sejam objeto de
medidas restritivas, no quadro do TFUE (atos que lhes sejam dirigidos, atos que os afetem direta
e individualmente ou atos que os afetem direta e individualmente e não necessitem de medidas
de execução), possam impugnar esse atos e no quadro da PESC podem impugnar também,
precisamente por remissão ao art. 263º por parte do art. 275º.
O que o art. 275º diz é que o Tribunal de Justiça é competente para apreciar a legalidade dos
atos da PESC que constituam medidas restritivas que afetem qualquer uma das entidades que
têm legitimidade no quadro do art. 263º §4. Isto significa que particulares que tenham
legitimidade nos termos do art. 263º §4 também têm legitimidade para impugnar nas mesmas
condições atos da PESC que sejam adotados pelo Conselho, impondo medidas restritivas a esses
particulares.
Nesta mesma disposição prevê-se também a legitimidade do Comité da Regiões nas mesmas
condições. Para além das condições previstas no art. 263º (em que o Comité das Regiões já é
um recorrente semi-privilegiado), pode também impugnar atos legislativos com fundamento
no princípio da subsidiariedade, no quadro dos quais ele devia ter sido ou foi consultado – é um
fundamento específico para além do do art. 263º. Não é um fundamento para a defesa das suas
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Qualquer pessoa singular ou coletiva pode recorrer ao Tribunal, nos termos dos parágrafos
anteriores, para acusar uma das instituições, órgãos ou organismos da União de não lhe ter
dirigido um ato que não seja recomendação ou parecer.”
Temos aqui, por um lado, esta indicação de quais são as instituições que estão obrigadas a agir
e que, caso não adotem um ato que é devido, podem ser objeto de recurso por omissão, podem
ser réus. Por outro lado, temos a indicação de quem pode agir do ponto de vista ativo, aqueles
que podem interpor recurso por omissão – vemos que são as instituições da União, mas podem
ser também os Estados-Membros e ainda, nos termos do último parágrafo, pessoas singulares
ou coletivas, que correspondem à mesmas que se preveem no art. 263º, este caso, para exigirem
a prática de um ato que lhes devia ser dirigido.
Qual é o fundamento?
Tem de haver uma omissão da obrigação de adotar um ato que legalmente era devido. Por
isso, não vale para aquelas situações respeitantes à ação por incumprimento, em que a
Comissão decide não avançar para a fase contenciosa ou não faz um parecer fundamentado em
relação a um Estado.
Está sempre em causa uma ação positiva, será sempre para adotar um ato e não para revogar
ato que se considere ilegal, não é o sucedâneo do recurso de anulação – não tem por objeto a
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
anulação de um ato vigente que podia ter sido objeto de recurso de anulação. Não tendo aquele
sujeito interposto recurso para anulação, o objeto não se pode basear num requerimento à
entidade autora que ela própria revogue esse ato.
Quando se fala em haver novos factos substanciais, isso já tem a ver com o recurso de anulação
em que é adotado um outro ato – aí sim, pode haver uma modificação do pedido, tendo em
conta esse incidente, essa alteração das circunstâncias. Num recurso de anulação em que se
requer a anulação de um ato da Comissão e ela vem depois modificar esse ato, pode haver uma
alteração do pedido que se traduza num pedido relativamente a um ato que se quer que seja
revogado, mais uma vez, mas no quadro dessa alteração, mas não num quadro autónomo.
Tal como na ação por incumprimento, este recurso tem duas fases: uma fase administrativa e
uma fase contenciosa, devendo haver coincidência entre ambas. Aquilo que é pedido na fase
administrativa tem de se manter na fase contenciosa.
Fase administrativa
A fase administrativa começa com um convite para agir – art. 265º §2. Há aqui alguma
semelhança com a ação por incumprimento, em que também a Comissão adota uma notificação
para cumprir, que não é propriamente um convite ao Estado para agir, mas substancialmente
tem natureza próxima.
Este convite para agir terá de ser oficial (não é informal), que deve ser preciso, claro, indicando
à entidade convidada (Parlamento Europeu, Conselho Europeu, Conselho, Comissão ou o Banco
Central Europeu) qual é o ato que é requerido, o ato que se entende que devia ter sido adotado,
o seu fundamento jurídico e esta indicação de que a não adoção daquele ato se traduz numa
omissão de um ato devido, contrária ao DUE.
É isto que depois vai delimitar o próprio objeto do litígio – aquilo que depois pode vir ser pedido
na petição é exatamente o mesmo, tem de ser o mesmo ato com mesmo fundamento. Se assim
não for, a consequência é a exceção de inadmissibilidade.
O convite deverá ser respondido no prazo de 2 meses. A partir de que momento deverá dirigir-
se a uma destas instituições o convite? Deverá ser a partir do momento em que ato era devido,
a partir do momento em que a instituição deveria ter adotado esse ato, mas não há prazo
definido, o art. 265º não prevê nenhum prazo. Contudo, para que haja obrigação de agir, tem
de haver um momento anterior em que esse ato devia ter tido lugar. Isso tem de estar definido
de alguma forma, ou porque o Tratado o prevê ou porque há um ato anterior que determina o
prazo no qual aquela instituição estava obrigada a adotar uma determinada decisão.
Isto é relevante porque, embora não haja um prazo para convidar instituição agir, o Tribunal já
admitiu que o convite pode ser tardio, pode ser feito em momento posterior, quando já
decorreu um prazo muito elevado e já será abusivo vir fazer esse pedido. Isto será sempre
casuístico, não há nenhum critério em abstrato para se considerar que o convite dirigido à
instituição para produzir ou adotar um ato devido já é extemporâneo, já vem num momento
demasiado tardio. Contudo, obviamente, haverá sempre um momento a partir do qual o ato
seria devido, e será este prazo excessivo contado a partir desse prazo, na medida em que isso
seja também exigível ao autor do convite, nomeadamente porque ele tem conhecimento de
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
factos e desse momento em que a prática do ato era devida. Se ele teve conhecimento dos
factos que obrigam a instituição a adotar um ato, então não há um prazo determinado para ele
dirigir o convite, mas admite-se que haverá prazo razoável e adequado que, se for excedido,
poderá ser considerado excessivo e abusivo e, depois, não dará lugar a acolhimento necessário
por parte da instituição.
De acordo com o art. 265º §2, a instituição em causa deverá reagir no prazo de 2 meses. Caso
adote o ato requerido, não há lugar ao recurso por omissão. Se adota outra medida ou se se
recusa expressamente a adotar um ato, então aqui não há lugar a recurso por omissão, mas
pode haver um recurso de anulação do ato adotado que não é o ato requerido e também, no
caso da recusa, da decisão de recusar de adotar o ato. Deixa de ser possível o recurso por
omissão porque, na realidade, já não há uma omissão, a instituição agiu, mas não o fez de acordo
com o pedido efetuado, mas esta ação pode ser fundamento de recurso de anulação, seja por
adoção de um ato distinto, seja da decisão de recusa de adotar o ato. Esta recusa é dirigida ao
particular, que poderá, com esse fundamento, interpor o recurso de anulação. Aqui têm de ser
cumpridos os requisitos do art. 263º.
Se não houver uma reação, se a entidade em causa se mantiver numa situação de abstenção,
então será possível o recurso por omissão. A ausência de reação consiste na ausência ou da
recusa, ou de um ato definitivo ainda que diverso, ou do ato requerido. A adoção de atos que
não constituem atos definitivos, que não constitui um daqueles atos que são impugnáveis e que
produzem efeitos vinculativos na esfera de terceiros, então nesse caso continua a existir uma
omissão (se for realizado um estudo ou uma análise, isto não elimina a situação de omissão,
porque o ato devido continua a ser devido).
O requerente pode interpor recurso por omissão e tem 2 meses para o fazer. O recurso de
anulação deve ser feito nos termos do art. 263º no prazo de 2 meses, a que podem acrescer a
dilação da distância e outros prazos, como o de 14 dias.
Fase contenciosa
Quem tem legitimidade ativa?
O autor do ato tem de ser a mesma entidade que dirigiu o convite para agir, não pode haver
uma substituição em relação a essa personalidade.
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A existência de obrigação de agir é uma questão de mérito – não é uma questão processual,
relativa à admissibilidade do recurso. É de referir a obrigação da Comissão de adotar um ato
delegado e a omissão de um dever de pronúncia através de um ato dirigido ao recorrente, nos
casos de um particular, desde que não seja um parecer ou uma recomendação, porque estes
não são atos impugnáveis, e não podem ser também atos que possam ser exigidos e depois a
partir dos quais possa haver recurso por omissão. Isto dá-se na sequência de uma denúncia de
uma concentração de empresas não notificada ou em matéria de auxílios de Estado, por
exemplo.
Há algumas especificidades mais complexas, já foi admitido que podia ser exigido um ato
interlocutório obrigatório no procedimento conducente à adoção de um ato definitivo e
vinculativo. Neste sentido, pode um particular exigir que uma daquelas instituições adote o ato
interlocutório necessário, no quadro de um procedimento, para a adoção de um ato definitivo
posterior, que seria esse ato definitivo depois coberto pela categoria de atos impugnáveis.
A adoção do ato põe termo à omissão, pelo que se o ato for adotado, a ação torna-se
inadmissível e perde o objeto, portanto o recurso extinguir-se-á. Se a adoção do ato tiver lugar
antes ainda da interposição do recurso junto do Tribunal, o recurso será inadmissível. Isto é se
ato for adotado depois do prazo dado pelo convite, mas antes da interposição de recurso, aí a
ação será inadmissível, temos uma exceção; se a adoção do ato tiver lugar no curso do processo
num momento posterior, quando o recurso já foi admitido (estamos no curso da pendência
processual), o recurso perderá seu objeto e extinguir-se-á também, se a instituição que é ré no
caso tiver adotado um ato, entretanto – o processo vai extinguir-se também por decisão do
Tribunal.
De acordo com o art. 266º, se o Tribunal declarar que, efetivamente, o ato era devido e a
instituição estava obrigada a adotá-lo, o acórdão condena essa instituição à sua adoção e ela
tem a obrigação de adotar esse ato. Se não o fizer, temos uma omissão e a possibilidade de essa
instituição vir a ser objeto de novo recurso de anulação.
Efetivamente, não pode o Tribunal substituir-se à instituição e ele próprio adotar esse ato,
produzindo o ato devido e superando essa situação jurídica, ou seja, produzindo os efeitos
jurídicos que o ato produziria no caso – tem de haver sempre um ato da instituição a seguir, é
uma situação semelhante àquela que acontece com os Estados, o Tribunal condena o Estado na
adoção do ato, mas não se substitui a ele, cabe sempre ao réu a adoção do ato que é devido
(que corresponde ao ato que foi requerido desde a fase inicial).
Essa situação de omissão pode causar prejuízos e por isso temos, paralelamente, uma tutela
compensatória, nomeadamente através da ação de responsabilidade (no caso,
extracontratual).
O Tribunal, nos termos do art. 266º, pode adotar medidas injuntivas, como por exemplo dar um
prazo para adotar o ato. Contudo, a consequência última de o próprio Tribunal se substituir à
instituição ou sancionar pecuniariamente já não acontece. Imaginemos uma situação com a
Comissão em que este comportamento acontecesse – há outras vias, por exemplo, como a
Comissão não estaria a cumprir as suas obrigações, o Parlamento Europeu teria aí possibilidade
de aprovar uma moção de censura, que faria cair a Comissão. No entanto, as instituições devem
respeitar o Tribunal, porque é isso que dá força às suas próprias competências.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
23/03/2023
Está prevista no art. 277.º do TFUE e possibilita que, num processo que tem como objeto
principal algo diferente (poderá ser um recurso de anulação, uma ação de responsabilidade,
uma pronuncia de uma ação por incumprimento, etc.), seja levantado pela parte um incidente
de ilegalidade, uma defesa por via de exceção, alegando a ilegalidade de um ato jurídico da
União Europeia, que não é o ato que é objeto de recurso de anulação, no caso de um recurso
de anulação (este seria o ato de base daquele ato jurídico que é objeto do recurso de anulação
e que depois transmite a sua irregularidade, o seu vício, para o ato de execução ou ato delegado)
ou, se estivermos falar no quadro da responsabilidade, aí poderá ser o ato que está em causa
no âmbito da ação de responsabilidade. Numa impugnação de um ato, suscita-se a questão
incidental da ilegalidade de outro que constitui a sua base jurídica.
Esta via, este expediente pode ocorrer quer junto do Tribunal de Justiça, quer a nível nacional,
junto de um Tribunal nacional – não vamos falar de termos e condições do quadro nacional,
pois isso dependerá do próprio quadro nacional, os Tribunais nacionais também são
competentes para poderem pronunciar-se no respeito pelas suas respetivas competências.
Que limites têm os Tribunais nacionais quando, no quadro do processo no Tribunal nacional, é
invocada a exceção de ilegalidade? Os Tribunais nacionais não podem declarar a invalidade sem
colocarem a questão ao Tribunal de Justiça (foi o que retiramos da jurisprudência Foto-Frost
no caso do reenvio). Imaginemos no quadro de um litígio contratual entre duas partes, que pode
ter na sua base uma violação do contrato com apoio no Código Civil ou Comercial e depois haver
ali também relevância de uma disposição do Direito da União, que pode ser invocada a título
excecional, e também invocada a respetiva ilegalidade.
Aqui, é importante ter presente que os Tribunais nacionais não se podem pronunciar sobre a
validade, no sentido de considerarem que aquela disposição é inválida, sem fazerem reenvio
prejudicial, mesmo que seja um Tribunal de cuja decisão caiba recurso. O que podem fazer é
adotar medidas provisórias. Se efetivamente se inclinarem para a invalidade e, enquanto o
reenvio decorre, podem aplicar medidas provisórias para acautelar situação no período em que
o TJ aprecia o reenvio.
Esta exceção pode ser invocada por qualquer uma das partes no processo que tenha interesse
nisso, para a tutela da sua posição e interesse jurídico. – Isto inclui os privilegiados que podiam
ter impugnado através do recurso de anulação?
Há um princípio que determina que uma parte não pode invocar uma exceção de ilegalidade
relativa a um ato do qual podia ter recorrido. Se a parte podia ter recorrido no prazo de 2
meses, através do recurso de anulação, e não fez, não poderá em princípio invocar a exceção
de ilegalidade num outro processo, quando tinha aquela via direta para o fazer – isto vale para
os particulares e, por isso, a exceção de ilegalidade tendencialmente vale para atos normativos,
que são aqueles de que eles não podem recorrer.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Dos atos que lhe são dirigidos, a empresa que é objeto de uma decisão diretamente pode
recorrer dessa decisão e está precludida a possibilidade de usar esta exceção de ilegalidade
noutra ação posteriormente, quando a podia ter usado naquela situação – esta é um dos casos
em que não vale a exceção de ilegalidade. A parte destinatária do ato em causa não pode
invocar a sua ilegalidade quando deixou correr o prazo para recurso de anulação e não o
interpôs. O mesmo vale para os Estados – o Estado objeto de decisão do Conselho ou da
Comissão também não pode invocar a exceção de ilegalidade se não recorreu desse mesmo ato
que lhe era dirigido.
Em princípio, isto não deveria ser permitido, contudo, o Tribunal não tem tido jurisprudência
uniforme, e será de defender que, se a parte que pretende invocar essa exceção tinha a
faculdade de recorrer do ato e não o fez, então a exceção de ilegalidade não deve ser admitida.
No entanto, o Tribunal já admitiu, em situações particularmente graves, exceções de ilegalidade
invocadas pelos recorrentes privilegiados, quando o vício é de tal forma grave que corresponde
à inexistência do ato – isto pode acontecer quando há falta de competências da União Europeia.
Esta tipologia de vícios não está perfeitamente definida no Direito da União, as categorias que
conhecemos do direito interno não têm um desenvolvimento ou uma definição no DUE, não há
uma orientação consensual nessa matéria.
Se a regra fosse a mesma para os particulares e para os recorrentes privilegiados, isso significaria
que estes últimos nunca poderiam invocar a exceção de ilegalidade, porque eles podem recorrer
de qualquer ato, restariam apenas os recorrentes semi-privilegiados, ou institucionalmente
interessados, que só podem recorrer de certos atos e prerrogativas, e os recorrentes ordinários.
Contudo, o Tribunal já admitiu exceções de ilegalidade invocadas por recorrentes privilegiados,
portanto não há jurisprudência uniforme nesta matéria.
A exceção de ilegalidade funciona sobretudo como uma válvula de escape para as limitações
que têm os recorrentes ordinários, que não podem interpor recurso de anulação de um
conjunto significativo de atos jurídicos, dadas as condições restritivas que se prevê o acesso ao
TJ, no quadro do recurso de anulação ou do recurso por omissão.
Os fundamentos são idênticos aos do art. 263º. No recurso de anulação a exceção de ilegalidade
está associada a uma relação entre o ato que é objeto de recurso de anulação (uma decisão,
um regulamento de execução, um regulamento delegado) e o ato base – para se invocar esta
exceção de ilegalidade do regulamento base, é preciso que haja efetivamente uma relação entre
um e outro, que o regulamento objeto do recurso de anulação seja um regulamento de execução
do regulamento base, cuja ilegalidade está aqui a ser posta em causa. De outro modo, não há
uma ilegalidade relevante, se estamos a falar de fontes de direito que não têm uma relação
entre si, aquele vício não transitaria para o ato que está a ser objeto de recurso de anulação.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Quanto aos seus efeitos, eles produzem-se apenas inter partes, com a determinação da
respetiva inaplicabilidade. No entanto, a Comissão Europeia deverá iniciar, se for declarada a
ilegalidade de determinado ato, o processo de revogação ou modificação do ato, porque essa é
obrigação da CE enquanto guardiã dos tratados. Nessa medida, se num processo o Tribunal
declara que a disposição ou a diretiva é inválida, e se isto foi levantado por uma exceção de
ilegalidade, obviamente daí não vai resultar a expurgação do ato do ordenamento jurídico (como
resulta do recurso de anulação), ela vai garantir que ele não se aplica naquele caso em concreto,
mas a Comissão deverá eliminar aquela disposição de acordo com uma revisão do ato ou mesmo
com um processo para a sua substituição, se a exceção de ilegalidade afetar todo o ato jurídico.
Só depois de decorrido esse processo é que efetivamente o ato cessa a sua vigência, até lá
mantém-se em vigor apesar da declaração de ilegalidade.
Isto pode ser mais um argumento a favor do reenvio obrigatório no quadro da validade, porque
aqui podemos ter declarações de invalidade casuísticas, cuja solução erga omnes demora
tempo, porque está dependente de processo decisório que é sempre muito demorado, apesar
de poder ser agilizado, e obviamente que, com o reenvio obrigatório, isso permitirá ao Tribunal
de Justiça assegurar-se de que não há uma aplicação continua desse ato pelos Tribunais
nacionais que, porventura, não se tenham apercebido dessa situação em particular.
Atos impugnáveis
Quais os atos cuja invalidade pode ser invocada? Atos de alcance geral de instituições, órgãos
ou organismos – não podem ser atos dirigidos a particulares ou a Estados-Membros (porque
eles deveriam ter recorrido deles).
Por um lado, o Tribunal de Justiça entendeu que um Estado não podia invocar a exceção de
ilegalidade, porque podia ter recorrido do ato, portanto não poderá usar esta via de defesa
depois. No entanto, só o poderia fazer se o ato em causa enfermasse de vícios particularmente
graves e manifestos, a ponto de poder ser qualificado de ato inexistente. Este é um argumento
que a professora não considera sólido, porque se o ato enfermava de vícios graves e
particularmente evidentes, é razão acrescida para ter sido objeto de recurso de anulação, pois
seria, à partida, evidente para o Estado-Membro que havia uma invalidade que deveria ter sido
objeto de recurso de anulação. De qualquer modo, no acórdão C-620/16, 89, o Tribunal
entendeu que assim se verificava. Isto não está perfeitamente clarificado, tendo em conta esta
jurisprudência.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Não há qualquer clarificação, até hoje, de quais são os vícios que acarretam inexistência no
quadro da União Europeia – não há qualquer consenso doutrinal ou jurisprudencial nesta
matéria, não conseguimos retirar daqui quais serão esse vícios, porque essa classificação não
está contida em tratados ou qualquer outro ato e na doutrina também não há consenso, porque
no quadro do Direito da União Europeia temos ordenamentos jurídicos muito distintos, com
escolas de pensamento jurídico muito diferentes também, e essa diversidade dificulta conceitos
desta natureza, porque nem todos os ordenamentos jurídicos os reconhecem, e mesmo quando
os conhecem não lhes dão o mesmo alcance. Portanto, é necessário que seja próprio Tribunal
da UE a elaborá-los de modo autónomo, e até hoje isso não aconteceu. Exige-se aqui cautela.
Se o particular, para impugnar um ato junto do Tribunal de Justiça, só o pode fazer se for direta
e individualmente afetado por um ato de alcance geral, no quadro nacional isto é uma invalidade
que pode surgir a outro propósito, podendo ter que ver com um ato verdadeiramente de
alcance geral.
Se se tratar de um ato que tenha aplicabilidade direta, como acontece com os regulamentos, e
que não necessite de um ato nacional para a respetiva aplicação, os particulares vêm-se na
situação ingrata de ter de desrespeitar o DUE e, desrespeitando o regulamento, por exemplo,
aí poderão ser objeto de uma sanção a nível nacional, porque as autoridades nacionais têm o
dever de fazer respeitar o Direito da União, e quando essa decisão que sanciona violação do
Direito da União Europeia lhe for dirigida, o particular impugna essa decisão e o seu fundamento
poderá não ter nada a ver com a decisão em si, mas pode simplesmente invocar a ilegalidade
do regulamento que está na base daquela decisão. Aqui os particulares não têm de justificar
que são individualmente afetados, porque a decisão enferma de um vício do regulamento que
ela aplica.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
A exceção de ilegalidade pode ser invocada no quadro de um processo nacional, mas está
sempre ligada, caso venha a ter cabimento, a um reenvio para o Tribunal de Justiça. De outro
modo, não poderia ter acolhimento, porque violaria a jurisprudência Foto-Frost.
No quadro nacional, a questão de validade é sempre uma questão de exceção, nunca pode ser
outra coisa, porque nunca pode ser esse o objeto. No quadro nacional, nunca pode ser um ato
da união europeia objeto de recurso, a invalidade do ato nunca é o objeto da ação nacional,
porque os tribunais nacionais não têm competência para declarar e decidir sobre a validade dos
atos da União. O objeto terá de ser sempre qualquer outro que envolva a aplicação de Direito
da União, e em que uma das partes se há de defender, porventura, invocando a invalidade dessa
disposição. A questão pode não ser a invalidade, mas por exemplo a interpretação do, o objeto
da controvérsia não tem de ser a invalidade do ato, mas pode surgir no quadro dessa
controvérsia uma questão em torno da ilegalidade do ato.
O Contencioso da Responsabilidade
Nesta matéria, as competências do Tribunal de Justiça são competências que podem ser de tipo
administrativo, nomeadamente no quadro da responsabilidade extracontratual da União
Europeia, como também podem ser de tipo civil-administrativo, em relação à responsabilidade
contratual da União, e ainda as podemos equiparar a contencioso de tipo cível, no quadro da
responsabilidade contratual.
Aqui, quando falamos de responsabilidade contratual, o autor e reu será o sujeito jurídico que
é a União Europeia, ainda que ela vá estar presente em juízo através da representação. A
legitimidade ativa, quando não for da outra parte, há de ser sempre da União, mas
representada pela instituição parte no contrato que, em nome da União, o celebrou. A
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
legitimidade passiva cabe à União Europeia (enquanto réu ou parte, se o autor for a própria
União), representada pelas instituições a que se imputa o facto lesivo; ao BCE (art. 340º §3 TFUE)
ou a outra parte na ação.
Responsabilidade Contratual
Quais os requisitos da responsabilidade contratual?
O objetivo desta ação tem natureza compensatória – o pedido é que a parte que terá
alegadamente provocado o dano faça o seu ressarcimento, não é uma ação meramente
reconstitutiva (imaginemos uma situação no direito interno em que o Tribunal se pode substituir
à parte e executa a obrigação – aqui o Tribunal não faz isso). No entanto, pode trazer consigo
um pedido de injunção, para que ela faça ou deixe de fazer algo, mas não pode substituir-se o
Tribunal a ela. Não pode ele próprio reconstituir a situação jurídica devida.
A nível de obrigações, elas resultam dos contratos e da lei aplicável, não há nenhuma
especificidade do Direito europeu nesta matéria. Obviamente, são aplicáveis os princípios gerais
de Direito, em relação às obrigações em geral que tem qualquer parte num contrato, como o
princípio da boa-fé, e que são comuns aos Estados. O Tribunal faz valer esses princípios, mas
não temos aplicação do Direito da União, exceto na medida em que ele é relevante enquanto
lei competente, sendo que temos normas de DUE que integram os ordenamentos jurídicos dos
Estados. Não é a aplicação do Regulamento enquanto Direito da União, mas a aplicação do
regulamento que é direito da União mas também Direito vigente no ordenamento jurídico que
é a lei do contrato.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
A ação é intentada contra a instituição, órgão ou organismo a quem se imputava o facto lesivo
(legitimidade passiva).
(O TJUE já foi réu numa ação de responsabilidade extracontratual por demora processual.)
Esta ação pode ser autónoma ou um pedido paralelo a um recurso de anulação (este é muitas
vezes cumulativo com o recurso de anulação) – quando se interpõe o recurso de anulação, em
simultâneo, além deste, pede-se também a responsabilidade extracontratual da Comissão
Europeia, por exemplo, se for o autor do ato, desde que se cumpra os requisitos. Muitas vezes,
esta responsabilidade extracontratual não é autonomizada do ponto de vista processual, não é
objeto de um recurso autónomo, de uma ação autónoma, mas surge no quadro de um recurso
de anulação ou de uma ação por incumprimento. Pode surgir associada a outra via processual,
que será a via principal, da qual o pedido da responsabilidade estará em grande medida
dependente – se o recurso de anulação não tiver provimento, se não houver anulação,
dificilmente haverá responsabilidade extracontratual da União.
Quanto aos requisitos da responsabilidade extracontratual, estes são semelhantes aos que o
Tribunal elaborou para a responsabilidade extracontratual dos Estados.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Está sujeito a prescrição – 5 anos a partir dos factos danoso e não do ato na origem do dano
(art. 46º ETJUE). Decorridos esses cinco anos, a União Europeia não mais é responsável.
Também pode haver responsabilidade por facto lícito, ainda que em circunstâncias normativas
limitadas. Pode ter a ver com determinadas circunstâncias, particularmente de natureza
operacional – no quadro da PESC, temos missões de segurança da União no exterior, que estão
a exercer um mandato lícito, mas pode haver a prática de atos que provoquem danos a terceiros,
como utilização e destruição de bens, e aí podemos ter uma situação de responsabilidade pela
prática de factos lícitos. Podemos equacionar situações como por exemplo fiscalização da
Comissão Europeia no exercício das suas competências que provoquem danos a terceiros – o
acesso a determinados documentos, que pode gerar problemas relativamente a ativos e, ainda
que o ato seja licito, pode equacionar-se a possibilidade de ressarcir danos resultantes desse
comportamento que não é contrário ao Direito, mas produziu uma lesão na esfera jurídica de
terceiros.
82
Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
29/03/2023
A União Europeia harmoniza estas regras porque isso é fundamental no mercado interno. Nesta
matéria há normas, como a diretiva 89/109/CEE, que estabelecem um quadro legislativo base
quanto à composição de produtos vendidos para estarem em contacto com produtos para
consumo humano e quanto ao procedimento para haver uma atualização, ao longo do tempo,
dessas regras. Esta diretiva previa um parecer do comité científico da alimentação humana
quanto às decisões da Comissão Europeia relativamente à inclusão e exclusão de uma lista de
produtos que podem ser aditados ou não a estas mercadorias. Este parecer não é
necessariamente vinculativo, mas as instituições normalmente não se afastam de pareceres
científicos.
Neste caso, o parecer não era conclusivo, no sentido de haver provas de que o aditivo em
questão tivesse efeitos nocivos, mas não quer dizer que, passado algum tempo, não haja
investigação que demonstre que esses tais efeitos nocivos se produzam, e, por vezes, até na
mesma altura pode haver posições contraditórias – em 2000, a utilização do triclosan podia ser
aceite.
O recurso foi introduzido a 7 de junho de 2010. O prazo são 2 meses, pelo que, para interpor
recurso, as empresas terão um prazo que começa a contar desde a publicação da decisão, logo
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
dois meses (art. 263º) + 14 dias + 10 dias, no máximo, porque sendo uma decisão dirigida a todos
os Estados-Membros, é um ato publicado. O recurso foi interposto com base no art. 263º.
Sabendo que é decisão dirigida aos Estados-Membros, podem aquelas duas empresas interpor
este recurso? Este ato não lhes é dirigido e, por isso, não podem recorrer enquanto
destinatárias. Temos de ver, caso seja um ato dirigido a outrem ou de natureza legislativa, se as
afeta diretamente e individualmente, ou, sendo ato regulamentar, se as afeta diretamente
(não necessitando de afetação individual) e não necessita de medidas de execução (esta última
possibilidade entrou em vigor no Tratado de Lisboa).
Quanto à admissibilidade, dispõe o ponto 17 e ss. Por razões de economia processual, o Tribunal
começa por aferir se o ato é regulamentar e se há afetação direta. Sobre a natureza do ato, rege
o ponto 21 e ss. A Comissão tem competência de execução de atos legislativos e este traduz-se
num poder regulamentar, num poder de adotar atos de alcance geral que complementam o ato
legislativo de base. A decisão da Comissão Europeia tem natureza regulamentar, tendo sido
adotada de acordo com o regime de comitologia, sendo atos de execução e tendo alcance geral,
é ato regulamentar.
A decisão recorrida tem alcance geral, na medida em que se aplica a situações determinadas
objetivamente e produz efeitos jurídicos para uma categoria de pessoas prevista de modo geral
e abstrato. A consequência direta da não inscrição na lista positiva e da retirada da lista
provisória é, portanto, a de o triclosan já não poder ser objeto de comercialização na União, a
partir de 1 de Novembro de 2011. A decisão recorrida aplica-se, assim, a todas as pessoas
singulares ou coletivas cuja atividade consista em produzir e/ou comercializar o triclosan, bem
como objetos e materiais que o contenham. Daí resulta que há que considerar que a decisão
recorrida constitui um ato regulamentar na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.
Sendo ato regulamentar, não temos de apurar se afeta individualmente aquelas entidades,
tendo apenas de afetar diretamente. Ser um ato regulamentar não quer dizer que afete
diretamente, é regulamentar porque aplica regime genérico.
Quanto à afetação direta: pontos 26 e ss. Uma vez que, como se esclareceu na audiência, as
recorrentes compram triclosan e utilizam-no para fabricar um produto com propriedades
antibacterianas e antimicrobianas, que é seguidamente revendido para ser utilizado no fabrico
de materiais e objetos de matéria plástica destinados a entrar em contacto com géneros
alimentícios, a decisão recorrida produz diretamente efeitos na sua situação jurídica.
Acresce que a decisão recorrida não deixa nenhum poder de apreciação aos Estados-Membros,
que são os seus destinatários e, por isso, estão encarregados da sua aplicação. É certo que
resulta do artigo 2º dessa decisão que a comercialização dos materiais e objetos com triclosan
pode prosseguir até 1 de novembro de 2011, sem prejuízo da lei nacional, o que significa que os
Estados-Membros têm a possibilidade de proibir a comercialização desses materiais e objetos
antes dessa data. Contudo, embora os Estados-Membros disponham de um certo poder de
apreciação quanto à data em que pretendem proibir a comercialização do triclosan, a aplicação
da proibição é automática e obrigatória a partir de 1 de novembro de 2011. Além disso, há que
observar que o período transitório previsto no artigo 2º da decisão recorrida tem por objetivo
facilitar a aplicação da medida de não inscrição do triclosan na lista positiva, de modo que tem
natureza acessória face a essa medida.
Assim, a nova introdução do conceito de afetação direta nessa disposição não pode, em
qualquer caso, ser objeto de uma interpretação mais restritiva que o conceito de afetação
direta, tal como surgia no artigo 230º, quarto parágrafo, CE. Uma vez que ficou assente, no
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
n. 30, supra, que a decisão recorrida diz diretamente respeito às recorrentes, na aceção do
conceito de afetação direta tal como constava do artigo 230º, quarto parágrafo, CE, há que
considerar que a decisão recorrida também o faz na aceção do conceito de afetação direta, tal
como introduzido no artigo 263º, quarto parágrafo, TFUE.
Quanto à questão de saber se a decisão recorrida contém ou não medidas de execução: nem a
não inscrição na lista positiva nem a retirada da lista provisória necessitam de medidas de
execução por parte dos Estados-Membros. A decisão de não inscrição teve como consequência
imediata a retirada da lista provisória e a proibição da comercialização do triclosan, sem que
seja necessário os Estados-Membros adotarem qualquer medida de execução. A própria medida
transitória, ao permitir prolongar a possibilidade de comercialização do triclosan até 1 de
Novembro de 2011, não necessita de medidas de execução pelos Estados-Membros, visto a
intervenção destes para antecipar o termo previsto em 1 de Novembro de 2011 ser puramente
facultativa e, sendo assim, não há intervenção substantiva dos Estados-Membros. Não há
medidas de execução, apena escolha do momento que proibição vai produzir efeito
pleno/completo. Embora, nesse caso, a medida transitória possa dar origem a medidas de
execução pelos Estados-Membros, há que repetir que essa medida transitória se destina a
facilitar a aplicação da decisão recorrida, na medida em que tem o efeito de proibir a
comercialização do triclosan, de modo que as pessoas singulares ou coletivas afetadas por essa
proibição possam tomar as suas disposições. É, portanto, acessória face ao objeto principal da
decisão recorrida, que é a proibição da comercialização do triclosan, que, a partir de 1 de
novembro de 2011, será aplicável sem necessidade de medidas de execução.
Daí resulta que a decisão constitui um ato regulamentar que diz diretamente respeito às
recorrentes e não necessita de medidas de execução, pelo que improcede a exceção alegada
pela Comissão, sem que seja necessário analisar a eventual afetação individual das
recorrentes.
Esta decisão do tribunal fundamenta legitimidade das recorrentes no 4º parágrafo do 263.º, por
ser ato regulamentar que lhes afeta diretamente que não necessita de medidas de execução.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
adotados de acordo com o art. 290º ou 291º (atos delegados e atos de execução). Só estes,
segundo o Tribunal, é que cabem nesse 4º parágrafo que diz respeito a atos regulamentares.
Encontra-se aqui uma justificação literal, porque a expressão não é “regulamento”, mas sim
“atos regulamentares” e depois é feita a analise dos próprios trabalhos preparatórios. É
relevante a natureza do ato e não a sua categoria formal.
Como é que particulares poderão invocar a ilegalidade de normas de Direito da União Europeia
quando atos de execução são nacionais? Através de exceção de ilegalidade. Se execução for das
instituições da UE é através do art. 290º ou 291º, aí preenchidas condições irá impugnar ato de
execução da União.
Imaginemos no caso anterior em que há atos de base que por si só estabelecem a proibição e
não havia atualização nem nada a regulamentar. Isto não exige nenhum ato de Estados-
Membros apenas atos operacionais ou atos jurídicos vinculados como fiscalização por exemplo.
Se não existisse esta necessidade de modificações, não precisaria de nenhum ato de execução
da UE e, por isso, a legislação seria só por si executável. Se era um ato legislativo, para que o
particular o pudesse impugnar ficava sujeito às duas condições: afetação direta e individual.
30/03/2023
O art. 266º determina que, na sequência de anulação pelo Tribunal, as instituições da UE têm a
obrigação de adotar todas medidas necessárias para cumprir essa mesma anulação, para retirar
as consequências da anulação. Se o ato foi anulado, qual a ação que se exige da Comissão
Europeia neste caso? Será pagar aquilo que decisão tinha suspendido, mas isto é algo que o
Tribunal não pode condenar a fazer. As instituições competentes têm a obrigação de retirar essa
consequência e agora em conformidade para fazer cumprir aquilo que determina a decisão do
Tribunal.
Imagine-se que a Comissão não o faz voluntariamente – que meio resta à Espanha para obter
esse resultado? O recurso por omissão. A Espanha tem de dirigir um convite à Comissão para
adotar a decisão de pagar os fundos e esperar-se-á que ela o faça, mas se não o fizer, Espanha
tem ao dispor a possibilidade de interpor recurso por omissão.
Quanto à questão dos juros: Espanha deveria, para além do pedido de anulação daquela decisão,
enxertado um pedido de responsabilidade extracontratual da Comissão Europeia. A ação de
responsabilidade pode ser autónoma, mas também pode surgir enxertada numa ação de
recurso de anulação.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Temos um problema com Marrocos, em que há uma dimensão relativa ao acesso às águas
territoriais e à ZEE pelo reino de Marrocos no quadro de uma cooperação no âmbito das pescas.
O Tratado prevê a competência exclusiva da União na gestão dos recursos da política de pescas,
o que significa que os Estados-Membros não tem competência, por exemplo, para estabelecer
quadros de cooperação com Estados terceiros para poderem colocar navios seus a pescar nas
águas de Estados terceiros – essa é competência da UE, ela celebra esses acordos e depois
internamente, através de ato interno, vai dividir as quotas que foram acordadas com Estados
terceiros entre os Estados-Membros.
É na sequência de um acordo com esta natureza e depois de um ato da União Europeia que faz
esta distribuição interna de volumes de recursos piscícolas entre Estados-Membros que vamos
ver esta entidade, a Frente Polisário, a procurar impugnar, através do recurso de anulação,
vários atos (o acordo internacional, a decisão de celebração desse acordo e o regulamento que
faz a repartição desses volumes através das quotas entre os EM).
Quem pode ser recorrente? Temos aqui um acordo internacional, porque este não é um ato da
União em exclusivo, é uma fonte de Direito Internacional que o TJ não pode anular porque não
é ato da autoria de nenhuma das suas instituições, dado que é celebrado pela União e por
Estados terceiros. Estes são celebrados na sequência de uma decisão do Conselho que
determina que a União pode e vai assumir esse compromisso, e é esta decisão que acaba por
dar a possibilidade ao Tribunal de fazer a apreciação deste acordo – uma das alegações aqui é
que o Tribunal não pode fazer este recurso, pois vem incidir sobre matérias que estão no Tratado
e, como este não pode ser impugnado, o recurso não é admissível. Contudo, o Tribunal vem
dizer que, como o Tratado é indissociável da decisão de o celebrar, nessa medida o Tratado pode
ser objeto de apreciação. Porém, a anulação será formalmente da decisão de celebração, que
leva consigo não a anulação do Tratado, mas a impossibilidade de produção de efeitos na ordem
jurídica da União Europeia desse Tratado Internacional – isto causa um problema do ponto de
vista jurídico, porque a União está vinculada internacionalmente com obrigações e direitos e ão
os pode cumprir, porque no seu ordenamento jurídico não os pode fazer valer.
No caso, esta entidade tem personalidade e capacidade judiciaria? O art. 263º fala em pessoas
singulares ou coletivas. Não há dúvida que um Estado é um sujeito com personalidade jurídica
internacional, mas a Frente Polisário terá? Ela não tem um estatuto formal reconhecido nem
pela União Europeia nem pelo reino de Marrocos, não tem personalidade jurídica aí e por isso a
questão vai ser julgada no plano do Direito Internacional, que a remete para o quadro das
Nações Unidas – aí, o reconhecimento que tem sido dado a essa entidade é de movimento de
libertação nacional, no quadro do princípio de autodeterminação dos povos. Estes movimentos
de libertação nacional são sujeitos de Direito Internacional e têm personalidade jurídica, ainda
que limitada, nomeadamente no âmbito do quadro de ações como representantes daquele
povo.
Isto ainda relevaria capacidade judiciária, que lhes é reconhecida em quadros paralelos como
processo de autodeterminação. Nas Nações Unidas, quando a questão do Saara Ocidental está
a ser tratada, esta entidade é entendida como representante e tendo capacidade para
representar esses povos. É nesse quadro que o Tribunal acaba por entender que está preenchido
este pressuposto da personalidade judiciária e também depois a legitimidade.
Quanto ao interesse, também se levanta essa questão: há afetação do povo que ela representa
e por isso age não em seu interesse próprio, mas interesse do povo que ela representa, logo há
um interesse processual aqui presente, relacionado com o facto de, se o acordo internacional e
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Este tipo de decisões são atos que não têm destinatário – é uma decisão sem destinatário. Uma
das questões levantadas é que a decisão não produz efeitos externos, pois é uma decisão em
que a União decide celebrar o acordo internacional e, como tal, não pode produzir efeitos
jurídicos externos, pelo que não pode ser recorrível. É um ato da UE para própria UE, não é
dirigido aos Estados-Membros nem a ninguém em particular. O Tribunal vai ter uma leitura
diferente, dizendo que a decisão, como é indissociável do acordo internacional, vai produzir
efeitos jurídicos externos, porque vai ser essa decisão que vai fazer com que o acordo
internacional possa ser celebrado.
Temos aqui um regulamento também que procede a essa distribuição. Este regulamento é um
ato com alcance geral e, por isso, levanta-se o problema de saber se afeta a Frente Polisário
individualmente, visto que ela não é destinatária. Não é um ato que seja dirigido à Frente, é de
alcance geral, e por isso terá de afetar diretamente e individualmente.
Quanto à decisão, é óbvio que não é um ato regulamentar. Se o acordo internacional está depois
sujeito a um regulamento que depois o vai operacionalizar, poderíamos pensar se ele afetaria
diretamente ou se não haverá medidas de execução. Este acordo internacional precisará de
medidas de execução. Há ou não afetação direta aqui? Se temos medidas de execução
poderíamos pensar que não haveria afetação direta, seria depois o regulamento que procederia
à distribuição. Aparentemente, o acordo internacional por si só não afetaria diretamente, mas
a afetação é uma afetação jurídica – é verdade que, para operacionalizar esses efeitos, são
necessários depois também atos jurídicos, no caso europeu através do regulamento, e depois
também seriam necessários atos internos. A afetação direta é a afetação jurídica no destinatário
em causa, e o Tribunal entende que basta o acordo internacional para afetar juridicamente, pois
é este que estabelece o regime jurídico do acesso a essas águas, e aqueles que tem na sua esfera
jurídica essas águas são desde logo afetados por esse acordo por si, sem precisar para isso das
medidas de execução. Mesmo que não houvesse regulamento, o acordo internacional só por si
estabeleceu o regime jurídico que modificou a situação jurídica daquelas águas. Não há
necessidade de um ato complementar que venha efetivamente dar substância jurídica aquele
acordo, simplesmente basta essa operacionalização jurídica ou material.
O regulamento também tem de ser apreciado quanto à afetação direta, mas também é
necessária afetação individual. A afetação individual é a que decorre de características
específicas, intrínsecas daquele sujeito e que condiciona aquele regime que não pode ser
genericamente comum a outros sujeitos possíveis. No caso, o Tribunal vem concluir que há
afetação individual porque, em relação àquele espaço e ao regime que resulta do acordo
internacional para aquele espaço, ele tem uma identidade que é a única que pode ter sido
pensada e ter de estar presente no regime que veio a ser instituído. Na prática, o controlo desse
território estava sobre Marrocos e não sobre domínio da Frente Polisário e, por isso, o Tribunal
poderia dizer que aqui não haveria afetação individual, mas o Tribunal não foi exigente a esse
ponto. A afetação individual significa que aquela entidade é afetada como se fosse ela própria a
destinatária do ato, apesarar de não o ser – esta numa posição idêntica à da destinatária. Aqui,
formalmente, a entidade que podia ser destinatária era Marrocos, porque só Marrocos celebrou
o acordo e só o país poderá celebrar o acordo com efetividade, porque a Frente Polisário não
tem o domínio daquele território. Só Marrocos pode dar efetivação a esse acordo internacional,
mas tudo isto foi ignorado pelo Tribunal.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O Tribunal veio a concluir pela anulação, limitando os efeitos do acórdão até que ele fosse
substituído por outra solução jurídica, que passaria por envolver o representante daquele povo
para fazer valer os seus interesses de modo a não criar um vazio jurídico. Quer a Comissão
Europeia quer o Conselho têm obrigação de agir, de adotar as ações necessárias para cumprir o
acórdão do Tribunal, nos termos do art. 266º.
13/04/2023
O Direito da União não tem uma doutrina sólida, longa e muito menos uniforme. Pelo facto de
ser uma realidade diversa, multi-jurisdicional, há uma realidade doutrinária que é também ela
menos sólida e, por isso, temos aqui todo um conjunto de questões muito discutidas e apuradas
nos ordenamentos internos, em que participam escolhas de Direito, mas que no quadro da
União, isto é muito menos relevante. O Tribunal tem um poder de decisão que é mais amplo,
não estando tão constrangido por um sistema jurídico dos EM que o ultrapassa. Está presente
uma ideia de pragmatismo, de orientação por quadro de objetividade, mas em que há
efetivamente uma deferência ao juízo dos magistrados do Tribunal, que é mais elevado o que o
que conhecemos no quadro dos sistemas românico-continentais.
Pressupostos Processuais
Falamos aqui de um sistema jurídico que, pelo facto de ser mais plural, obviamente não tem
uma dimensão de rigor dogmático, mas há de facto algumas regras e pressupostos processuais.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
1. Competência do Tribunal
2. Personalidade Jurídica
3. Personalidade Judiciária
4. Capacidade Judiciária
É a suscetibilidade de estar por si em juízo, não ter de estar representado. Mias uma vez, aqui
não há regras próprias de DUE, é regulado pelo direito nacional ou internacional.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
5. Legitimidade Processual
6. Interesse em agir
Vemos uma necessidade ou utilidade de demanda, à luz das pretensões apresentadas. Aqui
temos uma limitação do relevo deste pressuposto, porque percebemos que há processos em
que o interesse em agir é irrelevante, pois não tem de ser justificado – os EM podem recorrer
de qualquer ato de que não são destinatários, não tendo de provar o seu interesse em agir, e o
mesmo se diga em relação ao Parlamento Europeu e ao Conselho. A relevância deste
pressuposto é limitada, mas é importante quando falamos, por exemplo, dos particulares.
7. Representação
A representação por advogado é obrigatória. Não falamos da representação da parte que não
tem capacidade, mas sim da representação em juízo por representante legal, que no caso é
obrigatória. Pode não ser necessariamente uma representação por advogado, na medida em
que se podem incluir também os professores de Direito, quando o ordenamento jurídico
nacional lhes reconheça capacidade para serem representantes em juízo. Não há qualquer
situação em que se possa ser a própria representação, mesmo os Estados e as instituições
também têm de ser representadas, apesar de estas poderem ser representadas por um agente
seu, que será um funcionário.
As Instituições são sempre representadas por agentes que integram os seus serviços jurídicos,
mas que não têm de ser advogados, podendo ser juristas. Quando falamos dos Estados, é
frequente eles associarem um agente com um advogado que lhe dão apoio, ficando à escolha
da parte (sendo que na audiência apenas um intervirá).
A representação tem de ser feita através de forma legal, tendo de haver mandato, que há de
ser uma procuração com os poderes necessários para poder intervir em juízo, e a sua falta é
sanável – em que prazo? Cabe ao Tribunal fixar o prazo, em concreto ao Secretário do Tribunal,
que dá à parte um prazo razoável para regularizar a situação. Se for apresentado, a situação fica
sanada e o processo prossegue; se não for sanado, a instância extingue-se.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
representação é sempre escolhida. Se forem particulares, eles podem pedir apoio judiciário, mas
não há representação oficiosa, o apoio será financeiro para custear as despesas em que
incorram em relação ao advogado que tem mandatário a nível particular. As observações que
podem ser apresentadas pelas partes no processo nacional no qual foi feito reenvio podem ser
por advogado oficioso, a sua representação far-se-á pelo advogado que tiver a nível nacional –
aí aplica-se o regime nacional e não de DUE.
Princípios Processuais
1. Direito de acesso ao Tribunal/Princípio da tutela jurisdicional efetiva
Traduz-se no direito de ação, direito de defesa e direito de apoio judiciário (cobre as despesas
necessárias e razoáveis). Consiste na realização de um processo equitativo e independente, bem
como a imparcialidade do Tribunal.
Não há uma regra quanto às despesas necessárias e razoáveis, o Tribunal irá apreciar quanto
aos recibos apresentados (inclusive, o próprio Tribunal tem despesas). Os processos no TJ são
gratuitos para todos, não havendo taxas de justiça aplicáveis. No entanto, há despesas que o
próprio Tribunal e as partes fazem e que depois são imputáveis às partes. Em princípio, quem
perde paga, mas não necessariamente, pois pode haver despesas vexatórias, em que uma das
partes fez a outra incorrer (mesmo ganhando) e por isso tem de as suportar. Depois, temos
regras que afirmam que os Estados e as Instituições podem ter de suportar as suas próprias
despesas, quando intervêm em processos e não são parte deles.
2. Princípio da igualdade
Traduz-se, desde logo, no princípio do contraditório. Todas as alegações são objeto de uma
possibilidade de pronuncia que deve ser paritária/idêntica entre as partes, portanto todas as
questões são objeto de contraditório. Neste sentido, se uma parte alega um facto, a outra
poderá contraditá-lo; se depois há numa resposta a alegação de outro facto, podemos ter réplica
e depois tréplica e até articulados supervenientes, para que as partes possam pronunciar-se
sobre todos os factos e questões controvertidas relevantes.
Há, contudo, limites ao contraditório – no reenvio, por exemplo, as partes a nível nacional têm
oportunidade de apresentar observações, mas não há resposta às observações da outra parte.
Os Estados e as Instituições também têm direito de apresentar observações, mas não há depois
continuação do contraditório, porque o reenvio não é um processo de partes, não é um processo
contencioso (este dá-se a nível nacional, se for o caso). O reenvio é um processo cujo objetivo é
determinar um direito, não diz respeito à situação jurídica ou os factos presentes nessa violação
contenciosa.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
3. Igualdade de armas
Isto reflete-se nos articulados, sendo que falamos de ações e processos que não o reenvio. Em
princípio, os articulados são dois para cada parte: petição e contestação, réplica e tréplica (estas
últimas duas só se dão se o Tribunal entender necessário, não são articulados necessariamente
normais). Será de esperar que se o réu apresenta exceção na contestação ou reconvenção (o
que raramente acontece), obviamente que é razoável que seja possível a réplica, porque é a
única forma de poder responder a essa exceção ou pedido reconvencional, será de admitir que
o Tribunal o faça.
4. Princípio da legalidade
5. Princípio do dispositivo
Está desde logo presente no facto de o Tribunal não agir ex officio, o TJ tem de ser acionado por
quem pretende defender os seus direitos, não há uma intervenção oficial do Tribunal a título
nenhum. Desse ponto de vista, a intervenção do Tribunal está sempre na disposição das partes.
6. Princípio do inquisitório
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
de dirigir injunções aos Estados, para que possam apresentar informações ao processo, ao
Tribunal. Contudo, há aqui limites maiores dos que têm os tribunais nacionais.
7. Princípio da cooperação
Tem a ver com a cooperação entre as partes e com o Tribunal no âmbito do processo que
corresponde ao que se chama de boa-fé processual, e traduz-se na obrigação de as partes
colaborarem com o Tribunal do ponto de vista do modo como apresentem as suas posições,
interesses junto do Tribunal, no processo – o modo como redigem articulados, no modo como
tempestivamente respondem às questões colocadas e as solicitações do Tribunal e na obrigação
que têm de levar ao processo as informações necessárias e elementos que tenham na sua posse
que sejam relevante para o apuramento das questões que estavam em julgamento.
Não se conhece no âmbito do processo a figura da litigância de má-fé que existe no nosso direito
interno, mas se figura não é conhecida não quer dizer que não possa haver situações em que
Tribunal não possa, de algum modo, reagir. Por exemplo, se o Tribunal solicita a uma das partes
que apresente no processo um conjunto de elementos que tenha e ela não o faz, o Tribunal não
tem os poderes que podem ter os Tribunais Nacionais, nomeadamente o de obrigar a parte a
fazê-lo, sob pena de haver consequências, mas aqui o Tribunal pode registar que a parte não
colaborou e isso pode é ter consequências quanto ao modo como a prova será apreciada.
Quem alega o facto tem de o provar, exceto se beneficiar de alguma presunção em relação à
prova daquele facto. A prova está sujeita à livre apreciação, mas obviamente aplicar-se-á aqui
também o princípio geral que pode advir das regras de prova que conhecemos dos Estados-
Membros. Há determinado tipo de atos que fazem prova plena, que são atos autênticos ou
autenticados – esta mesma lógica aplica-se no Direito da União, mas não da mesma forma como
se aplica no direito português.
A nossa lei determina que há documentos que têm valor probatório absoluto, isto não pode ser
afastado pelo juiz – no direito português isto está regulado, mas no DUE não temos isto. No
Direito da União não temos regras que determinem que um documento tem algum valor
probatório, mas ainda assim depreende-se que a lógica e o regime europeu acompanham o
regime nacional. É óbvio que a apreciação que os juízes podem fazer de documentos seguirá
também o que no direito nacional ocorrerá – isto é, se estivermos a falar de uma escritura
celebrada perante o notário de um EM, obviamente que o juiz da UE deverá retirar as mesmas
consequências que resultam da lei nacional em relação ao valor daquele documento.
Temos ainda neste ponto o princípio da imediação: para valerem, todas as provas têm de ser
carreadas para o processo tempestivamente. A imediação tem a ver com a apreciação do
Tribunal, seja pela disponibilidade elementos de prova de natureza material, seja pela imediação
que é a presença junto do juiz de elementos de prova pessoal (pericial ou testemunhal) – essa
prova far-se-á no processo junto do juiz, tendencialmente por audiência.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
9. Princípio de publicidade
As audiências em princípio são públicas, mas podem não o ser; são abertas, mas não se entra
livremente no TJ, este estabelecimento não é aberto ao público, tendo de ser solicitada a
entrada previamente. O Tribunal pode determinar que audiências não sejam públicas, seja por
razões de privacidade das partes, seja por razões indicadas nos artigos 109º, 110º e 118º do
Regulamento do Processo do Tribunal Geral (RPTG) e do art. 79º do Regulamento do Processo
do Tribunal de Justiça (RPTJ), que dizem respeito a questões de segurança dos EM e da EU.
Neste momento, as audiências do Tribunal são gravadas e transmitidas publicamente.
O acórdão tem sempre de ser fundamentado, bem como os articulados, ainda que estes o
possam ser de modo sucinto. Nos articulados, além dos factos e do pedido, há a obrigação de
apresentar fundamentos, com fundamentos normativos e argumentos.
A regra é que a língua do processo é determinada pelo demandante, em princípio, mas este
princípio conhece exceções: desde logo porque se estivermos a falar de uma situação em que o
demandante é a Comissão Europeia e o demandado é um Estado, a língua é a do Estado, porque
as instituições demandam em qualquer língua. Se for um processo de reenvio, a língua é a do
processo nacional, embora também possa ser utilizada outra, se isso for solicitado ao Tribunal.
Se o TJ está a julgar em recurso de uma decisão do TG, a língua é a que foi utilizada no TG.
Seja qual for a língua do processo, quando os Estados intervêm utilizam sempre sua própria
língua – apresentam observações na sua própria língua e depois são traduzidas pelo Tribunal
para a língua do processo.
Quando falamos de língua do Estado, se o Estado demandante tiver mais do que uma língua,
pode escolher qual delas quer utilizar, mas se for o Estado demandado, é o demandante que
escolhe qual das línguas a utilizar.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O Tribunal traduz os documentos do processo para todas as línguas oficiais, porque todos os
EM têm o direito de intervir em todos processos e oficialmente o Tribunal faz traduções, mas a
verdade é que a língua do processo determinará qual a língua que terá de ser utilizada nos
articulados e documentos que sejam apresentados no processo e depois o acórdão também fará
fé na língua do processo, ainda que depois seja traduzida noutras línguas.
Os anexos não são habitualmente traduzidos – estamos a falar de documentos que são
relevantes para o processo, mas não são articulados do processo. A audiência de alegações
segue o regime linguístico da língua do processo, mas os representantes dos EM podem falar na
língua do Estado. Contudo, isto não significa que magistrados falem na língua do processo, sendo
que as audiências têm sempre tradução simultânea e permanente.
Quanto à anonimização (que é algo recente), esta deverá ser requerida em princípio nas ações
e recursos. Não se encontra prevista nos regulamentos, foi introduzida na sequência do RGPD.
Pode ser requerida e será deferida se o Tribunal entender que se justificam as razões para essa
anonimização e só faz sentido quando falamos da proteção de dados pessoais, mas pode haver
situações relacionadas com a anonimização de empresas, relativas a segredos comerciais. Nos
processos de reenvio, a anonimização será feita em articulação com o tribunal nacional, este
tem a obrigação, quando se trate de indivíduos no processo principal, de ele próprio sugerir a
anonimização ao Tribunal de Justiça – não é o TJ que vai decidir nessa matéria, mas antes o
tribunal nacional.
Custos do processo
O processo é gratuito (sem taxas ou emolumentos, mas acrescentando-lhe as despesas). A regra
geral aplicável é que a parte que perde suporta suas despesas e as despesas de parte contrária
(honorários, despesas de testemunhas, despesa da própria parte) e também despesas de
intervenientes.
O Tribunal tem aqui uma margem de apreciação, porque, se uma parte fez incorrer o Tribunal
em despesas excessivas e injustificadas, mesmo que ganhe, podem-lhe ser imputadas essas
despesas. A mesma coisa acontece se uma parte fez a outra incorrer em despesas vexatórias e
injustificadas.
Despesas dos intervenientes – em princípio, a parte que perde paga as despesas também dos
intervenientes no processo, mas os Estados e as Instituições, quando são intervenientes, pagam
sempre as suas próprias despesas, elas não são suportadas pelas outras partes.
A assistência judiciária pode ser solicitada, seja para suportar honorários, seja para suportar
despesas. Se for no quadro do reenvio, cabe ao tribunal nacional determinar essa assistência
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
judiciária – se lhes concedeu assistência judiciaria no processo nacional, deverá mantê-la para
poderem participar no processo junto do TJ. No reenvio, as despesas são também decididas pelo
tribunal nacional.
A assistência judiciária segue fórmula genérica: as partes podem ter assistência judiciária na
medida em que sua situação económica o justifique, e têm de apresentar elementos que
comprovem que sua situação económica não lhes permite suportar as despesas que importa o
processo. Teremos aqui um regime com uma grande latitude de apreciação, mas que remete
em grande medida para o regime nacional. É possível ter uma assistência judiciaria no processo
no tribunal de justiça, mesmo que no processo nacional não se preenchessem essas condições,
isto é, embora se tenham de trazer argumentos que comprovem essa situação de incapacidade,
as regras nacionais não se aplicam estritamente no quadro do processo do Tribunal de Justiça.
A assistência judiciaria tem de ser pedida no máximo no primeiro articulado que apresenta – o
autor na petição, o réu com a contestação. Contudo, ela pode ser requerida antes e, nesse caso,
ela suspende prazo de propositura de ação. Imagine-se o caso de alguém que só estaria
disposto a avançar para Tribunal se tiver a garantia de que vai ter assistência judiciária.
1. Fase escrita
2. Medidas de organização do processo – finda a fase escrita o presidente do Tribunal ou
o presidente da Secção vai determinar o andamento seguinte do processo, por exemplo
se tem ou não lugar fase oral e quais as medidas de instrução necessárias, determinadas
– vai haver ou não audição de testemunhas, de peritos, que elementos é necessário
ainda recolher, etc.
3. Instrução
4. Fase oral – nem sempre tem lugar
5. O processo termina por acórdão, parecer, despacho ou decisão – a decisão tem a ver
essencialmente com o que são medidas interlocutórias, por exemplo a decisão relativa
às despesas ou à assistência judiciária; no parecer falamos no quadro do art. 218º,
relativamente a acórdãos ou projetos de acórdãos internacionais; no restante, o
Tribunal delibera por acórdão ou por despacho fundamentado, por exemplo quando há
uma decisão de inadmissibilidade, quando não se pronuncie sobre o mérito (quando se
pronuncie sobre pressupostos processuais) ou quando, pronunciando-se sobre o
mérito, as questões controvertidas sejam questões que já estejam solidificadas, com
jurisprudência anterior em que o Tribunal pode decidir de modo mais simplificado por
despacho fundamentado. Há também decisões interlocutórias tomadas por despacho,
mas o despacho como decisão final do processo surge com frequência no reenvio, em
que não tem questões controvertidas do ponto de vista litigioso, mas apenas do ponto
de vista do Direito.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Estas fases podem ser objeto de adaptação, seja por exemplo no caso do reenvio, em que temos
estas fases, mas podemos não ter instrução porque não há prova fazer; no reenvio também a
fase escrita é diferente porque não temos articulados de partes.
Independentemente desta divisão de fases, podemos ter uma adaptação necessária quando
tenhamos uma tramitação acelerada, nomeadamente quando se exija que o Tribunal decida
com maior celeridade, e esta pode justificar que não haja fase oral, por exemplo, que a fase
escrita seja simplificada, e os prazos são reduzidos na tramitação acelerada, os prazos para a
apresentação de articulados são reduzidos. A mesma coisa, mas com mais rigor, vê-se na
tramitação urgente – esta só tem lugar no reenvio, podendo ocorrer em situações em que, no
processo nacional, haja por exemplo pessoas detidas e por necessidade de não prolongar sua
detenção é requerido pelo tribunal ou, não sendo requerido, pode ser oficiosamente
determinado pelo TJ que o processo tenha uma tramitação urgente. Nestes casos podemos ter
uma unificação dessas fases.
1. Fase escrita
Começa pela petição ou requerimento – a propósito dos recursos, podemos falar também de
requerimento no recuso de anulação.
De acordo com o RPTJ, a designação do Juiz Relator é feita pelo Presidente do Tribunal o mais
rapidamente possível depois da entrada da petição e ainda antes da atribuição do processo a
uma Secção. No Tribunal Geral não é assim – a petição, depois de dar entrada, é distribuída a
uma secção e só depois é nomeado o Juiz Relator. No TJ, o relator é nomeado antes de atribuição
do processo a uma secção, no TG é nomeado já depois dessa atribuição e, em princípio, será
atribuído a um Juiz dessa secção.
Segue-se a contestação e a esta pode seguir-se ou não a réplica e a tréplica, podendo ainda
haver atos distintos.
Quais são estes atos distintos? São nomeadamente observações – quando falamos do reenvio,
aqui não há petição nem contestação, o reenvio começa com uma notificação do tribunal
nacional a enviar para o TJ as questões e todos os elementos do processo para que o TJ possa
responder e o TJ notifica as partes no processo principal, todas as instituições e os Estados-
Membros, para que estes possam apresentar observações. No reenvio não temos outros
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Ainda na fase escrita temos o relatório preliminar do Juiz Relator, onde ele se vai pronunciar
sumariamente sobre o objeto do litígio, sobre os factos, com sugestões sobre as medidas de
organização do processo (o que deverá ser feito de seguida). No TJ, vai ainda pronunciar-se
sobre a atribuição do processo a uma Secção, sobre a conveniência da atribuição do processo à
Grande Secção ou ao Pleno (em vez de ser a uma secção de 3 ou 5 juízes), por exemplo. No TG
não é assim, a remessa e formação de julgamento apenas vale no TJ. O facto de termos a
formação de julgamento determinada no TG não significa que o Juiz Relator não se possa
pronunciar sobre isso, pois o Juiz Relator pode pronunciar-se sobre a conveniência de atribuir
aquele processo a uma outra Secção (por exemplo uma Secção Alargada), e isso depois pode
dar lugar a remessa do processo.
• “Os articulados devem ser claros, concisos, com frases curtas e simples (n.º 10)”
• “A argumentação das partes deve figurar no seu articulado ou nas suas observações,
e não nos eventuais anexos que, geralmente, não são traduzidos (n.º 10)”
Quanto à apresentação dos articulados, desde 2018 que toda apresentação dos articulados tem
lugar através da plataforma eletrónica e-curia. Aquilo que são as regras quanto à apresentação
que se encontra nos regulamentos não se deixam de manter, porque o RPTG determina a
obrigação de utilizar o e-curia, mas RPTJ não obriga a isso, pelo que se podem continuar a utilizar
as formas tradicionais de apresentação dos articulados (envio por correio, por fax e
representação presencial).
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Na apresentação dos articulados é necessário fornecer 5 cópias para o Tribunal e mais uma para
cada parte no processo, com exceção do reenvio. Sendo feita a representação através do e-
curia, nada disto é obrigatório. Como não é obrigatório, de acordo com o RPTJ, se as partes
utilizarem as vias tradicionais, tem de apresentar aquelas 5 copias. O regime especial para as
consiste no facto de elas estarem obrigadas a apresentar os seus articulados traduzidos em
todas línguas oficiais.
Comunicações e Notificações
TG – e-curia, artigos 56º-A, 57º n.1 RPTG e 72º RPTG; Decisão do TG de 11 de julho de 2018
relativa à entrega e à notificação de atos processuais através da aplicação e-Curia
Fase escrita- petição /requerimento (recurso) – art. 21º ETJUE; artigos 57º, 120º a 122º RPTJ;
art. 76º RPTG; ponto B.1 Disposições práticas de execução do RPTG (n.ºs 112 a 122); “Guia
prático – Petição”, do TG.
Elementos a constar:
• Identificação do Demandado;
• Objeto do litígio, com indicação dos factos essenciais e dos fundamentos de direito.
Condições para fundamentos novos – art. 127.º, n.º 1 RPTJ; art. 84.º RPTG.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
• Conclusões e pedido (incluindo sobre as despesas) – não pode haver novos pedidos,
exceto se derivarem de factos ou fundamentos supervenientes (v.g. ato alterado).
Há uma obrigação de fazer um pedido sobre as despesas – as despesas são imputadas à
parte que perde, mas só se a parte que ganha o pedir, se não o fizer cada um suporta as
suas despesas. Não há uma impugnação que resulte simplesmente de ter perdido a
causa, é sempre fundamental no pedido fazer um pedido também para as despesas.
• Assinatura do Representante
Terá de ser assinado pelo representante, sendo que quando é pelo e-curia a assinatura
é eletrónica e está registada na própria plataforma.
A falta de algum destes elementos pode ser regularizada. Quando falamos do recurso de
anulação, é obrigatória a apresentação, junto com a petição, de cópia do ato que é impugnado.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Mas não só – por exemplo, se for um Estado-Membro a impugnar um regulamento, ele poderá
juntar também o regulamento e isso vai em anexo. Se esse anexo não for apresentado, deverá
ser depois ser regularizado.
No recurso por omissão, a parte tem de ter convidado a Instituição a agir, e esse convite
também deve vir em anexo. Devem também ser anexados os documentos de representação
(procuração) e, se estivermos no âmbito de responsabilidade contratual, o
compromisso/cláusula compromissória que atribui a competência ao TJ para apreciação do
litígio.
A falta destes elementos traduz-se numa ineptidão total ou parcial, que pode ser corrigida e
pode haver um articulado de adaptação. Imaginemos um recurso interposto de um ato que foi,
entretanto, revogado – desde logo, pode, se ainda não estivermos na fase da contestação, ainda
pode ter lugar um articulado que venha alterar a petição para substituir o ato anterior que foi
revogado pelo novo ato. Para isso, há um prazo de dois meses para o fazer, em relação ao
segundo ato.
Quanto aos anexos, estes são o ato cuja anulação é requerida, convite para agir, documento de
representação, podendo ser ainda anexados outros documentos (nomeadamente elementos de
prova). Os anexos não são traduzidos. Quando temos anexos, tem de ser apresentada uma
relação com esses anexos, há um índice de anexos e estes devem ser numerados.
Quanto à dimensão, o limite dos anexos é de 30 páginas no TJ, mas se for um processo de
tramitação urgente este limite pode ser reduzido (seja um caso de reenvio ou de tramitação
acelerada); no TG, é de 50 páginas, ou 30 páginas no caso do contencioso de funcionários.
O RPTJ prevê o domicílio processual da parte – deixa de ser relevante, apesar de estar previsto,
mas o RPTG determina a obrigação de usar o e-curia. Como o RPTJ não prevê essa obrigação,
prevê o domicílio processual da parte, mas que não tem relevo prático na medida em que se
utiliza o sistema e-curia. De acordo com esta disposição, as partes tinham de nomear um
Representante Legal e este tinha de indicar ao Tribunal um domicílio profissional no
Luxemburgo. Quando era um Estado, ele indicava a sua representação diplomática como
domicílio processual e as notificações do Tribunal eram feitas para lá. Quando era um particular,
teria que indicar habitualmente o escritório de um advogado lá. Atualmente, nada disto tem
relevância, porque todas comunicações e notificações são feita por via do e-curia.
O demandado pode fazer uma defesa por impugnação, por exceção e já foi admitida
reconvenção em matéria de compensação de créditos.
A defesa por exceção será a invocação de factos que impedem a apreciação do pedido do autor:
ou são exceções dilatória relacionadas com pressupostos processuais ou exceções perentórias,
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A inadmissibilidade pode ser apresentada como o pedido do réu para que o Tribunal declare,
com base numa exceção, a inadmissibilidade da ação ou do pedido (se for exceção perentória).
Esta defesa pode ser feita na contestação ou em requerimento separado. Deverá ser feita em
requerimento separado se o réu pretender que o Tribunal se pronuncie logo sobre essa questão,
sem entrar no mérito. Contudo, o Tribunal tem a liberdade de não o fazer, isto é, o Tribunal
pode decidir só se pronunciar a final, juntamente com o mérito, no acórdão final ou no
despacho. Fá-lo-á logo e será por despacho fundamentado ou poe fazê-lo no final do processo,
juntamente com a apreciação do mérito.
Como é que o réu sabe quem é o seu advogado e se está registado no e-curia? Pode, se
estivermos a falar de recurso, porque no recurso o processo veio já do Tribunal Geral, e por isso
já há a possibilidade de utilizar o e-curia, o que não é possível numa ação inicial, em principio.
O prazo de 2 meses pode ser prorrogado se houver razões justificadas e, nesse caso, o Tribunal
pode autorizar essa prorrogação. As situações seriam as mesmas faladas a propósito da
prorrogação excecional dos 2 meses no recurso na petição (situações de força maior, catástrofe,
ou quando haja um incidente que impeça a notificação e que seja da responsabilidade de
terceiros).
Se não houver contestação, a consequência, que tem de ser requerida, é que que o Tribunal
pode julgar desde logo os pedidos como procedentes, temos uma situação em que não temos
a tramitação normal – se não há contestação obviamente depois não haverá réplica e tréplica.
Contudo, isto não significa que será dado provimento ao que esteja a ser pedido. Aquilo que
pudesse ser provado por confissão poderá ser dado como provado nesta circunstância,
porventura, mas outros elementos não poderão ser dados como provados simplesmente
porque não foram contestadas, essa decisão não está assegurada por essa via. Se for solicitado
pelo autor, o Tribunal pode julgar procedentes os pedidos e temos então um acórdão à revelia,
que pode dar lugar depois a um processo especial de oposição, que pode surgir posteriormente
– o condenado à revelia pode posteriormente vir ao Tribunal opor-se a essa decisão na qual terá
sido condenado.
19/04/2023
Réplica e Tréplica
A réplica e a tréplica são articulados normais do processo, mas só têm entrada quando o Tribunal
entenda que são necessários, tem de haver uma decisão do Tribunal no sentido de os admitir e,
sem essa decisão, não são automaticamente admitidos. Eles têm um objetivo central, que
poderá ser responder às exceções invocadas pelo réu ou até em relação à reconvenção – têm
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
um propósito de defesa da outra parte. Aqui, prevê-se que eles podem ter um sentido que não
é o mais comum, ou seja, podem servir para clarificar os factos que já tenham sido traduzidos
ao processo nos articulados anteriores (há uma diferença face ao nosso direito interno) – tem
uma função de completar os articulados anteriores. Se, por um lado, falamos de articulados que
não têm lugar sem que o Tribunal os admita, por outro lado permite-se uma maior amplitude
sob aquilo que pode incidir.
A Réplica e a Tréplica têm lugar num prazo que é definido, quando admitidos, e o Presidente,
nessa decisão, pode dar orientações às partes sobre que aspetos pode incidir a Réplica e a
Tréplica, que aspetos devem as partes clarificar – temos uma intervenção processual mais
relevante.
Apesar de não poderem ser apresentados fundamentos novos, a verdade é que pode haver
alguma modificação, que tem a ver com os desenvolvimentos que tiveram lugar no processo
presente – ex.: pode mesmo haver uma restrição do âmbito do pedido se, inicialmente, numa
ação por incumprimento o fundamento da ação era a não apresentação da diretiva, pode
converter-se numa implementação errada da diretiva; temos aqui consequências já diversas, a
não implementação da diretiva permite à Comissão requerer logo na ação inicial a condenação
numa sanção pecuniária. Tratando se de uma modificação em que há apenas errada
implementação, tal terá uma incidência no pedido da ação. O Estado deixa de poder ser
condenado desde logo na sanção pecuniária, porque essa só é aplicável na ausência de
implementação e não na errada implementação.
O oferecimento de provas só pode ter lugar se houver uma justificação do atraso – art. 128.º
RPTJ; art. 85.º RPTG.
Pode haver lugar a articulado superveniente, que assumirá a forma de requerimento para
circunstâncias excecionais.
A ação poe terminar imediatamente aqui na fase escrita se for manifestamente procedente, ou
seja, um despacho fundamentado pode considerar que estão reunidos já os elementos
necessários para a decisão e, portanto, decidir no sentido do provimento do pedido – deste
modo, não haverá fase oral.
Esta fase que é uma fase intercalar (corresponderá em alguma medida ao nosso saneamento do
processo) e, nesta organização do processo, pode-se concluir que é desnecessária a fase oral.
Começa com o relatório preliminar do Juiz Relator, no qual ele tem como obrigação apresentar
as medidas de organização do processo e de instrução que entende que devem ser realizadas,
104
Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
e isso pode passar, por exemplo, por dirigir às partes questões para que elas apresentem
elementos ao processo, trata-se de um impulso do próprio Tribunal – é uma característica de
inquisitório.
As diligências de instrução podem passar por tudo aquilo que é a apresentação, de acordo com
o princípio da imediação, do que seja indispensável para comprovar os factos. Terá lugar em
princípio numa audiência de instrução, que pode ou não coincidir com a audiência de alegações
depois na fase oral. Esta instrução pode ter lugar não necessariamente numa audiência do
Tribunal, mas sim junto dos tribunais nacionais (para a audiência de testemunhas ou de medidas
de instrução que passem por exames num determinado local).
As provas estão referidas no art. 64º RPTJ e art. 91º RPTG – são coincidentes e consistem no
depoimento de parte, prova testemunhal, prova pericial, inspeção e documentos (art. 57º, n.4
RPTJ). Podem ser apresentadas na petição ou na contestação ou posteriormente, com
justificação do atraso, na réplica ou na tréplica. Excecionalmente, podem ser apresentadas após
o encerramento da fase oral, em que já estamos na fase da decisão – nomeadamente se se
tratar de elementos de que só se tem conhecimento posteriormente.
No caso do TG, a previsão não é essa – se o artigo 128º do RPTJ prevê a possibilidade de haver
excecionalmente a dedução de prova mesmo após o encerramento da fase oral, já no RPTG
prevê-se que a prova só se dá até à audiência de alegações na fase oral.
As testemunhas podem ser ouvidas nos Estados-membros através de carta rogatória. É ainda
de referir o perjúrio das testemunhas.
O princípio do contraditório obriga a que as partes tenham ambas conhecimento das provas
produzidas pelas outras partes. Quando se trate de prova produzida após petição ou
contestação, a outra parte tem o direito de se pronunciar (por exemplo, o autor na réplica pode
responder à prova apresentada na contestação) – quando a prova seja produzida finda a fase
dos articulados, estamos perante um caso em que há lugar a articulado superveniente, porque
é dado um prazo à parte contrária para poder organizar a prova produzida pela outra parte e
para se pronunciar sobre ela.
A Decisão 2016/2387 do Tribunal Geral veio regular uma situação relacionada com a
necessidade de assegurar a confidencialidade de alguns elementos de prova, nomeadamente
quando estejam em causa razões de segurança da ordem pública dos Estados-Membros ou da
própria União Europeia. Nestes casos, os elementos de prova não são transmitidos à outra parte,
são confidenciais; é o próprio Tribunal que vai retirar do documento aquilo que são os elementos
sobre os quais a outra parte se deverá pronunciar, sem o transmitir na totalidade, permitindo
assim à parte pronunciar-se sobre os aspetos que em particular têm incidência sobre o litígio,
mas sem fornecer um elemento de prova mais extenso e que contém mais informação do que
a necessária. É o Tribunal que vai tratar a informação de modo a que a outra parte possa na
mesma pronunciar-se, mas sem dar a conhecer a informação direta.
105
Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
2. Fase oral
Reconduz se a uma audiência de alegações, que pode ser subsequente a uma audiência de
instrução, mas a instrução pode ter lugar num momento anterior. A fase oral pode ser
encerrada, mas haver elementos superveniente que obriguem à sua reabertura.
Um dos incidentes que temos na instância é a apensação de processos, que pode ter lugar
também na fase oral. Os processos devem ser da mesma natureza e têm de ter um objeto
semelhante. Ser da mesma natureza significa que não se pode apensar um processo de reenvio
com um recurso de anulação, por exemplo. Também só há apensação no mesmo Tribunal, até
porque podemos ter um processo com o mesmo objeto e com o mesmo pedido a entrara no
Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça – pensemos na anulação de um ato pedida por um
particular, que dá entrada no TG, e na anulação do mesmo ato pedida por um Estado-Membro,
que dá entrada no TJ.
A fase oral é dirigida pelo Presidente da Secção e é, em princípio, pública, de acordo com o art.
79º do RPTJ a contrario – este faz referência às situações em que ela não é pública, sobretudo
por razões de segurança e também relacionado com a proteção das pessoas (ex.: que envolvam
menores ou que envolvam dimensões da vida privada e particularmente sensíveis).
Devemos referir a audiência de alegações, art. 76º RPTJ – vemos no TJ uma organização vertical
da audiência, onde o Tribunal é mais interventivo, com orientações prévias muito definidas,
nomeadamente quer quanto à gestão do tempo, quer quanto ao que os representantes das
partes vão dizer. Esta audiência pode não ter lugar se o Tribunal entender que não é necessária
e tem o objetivo de contribuir para uma melhor compreensão do processo e das suas questões
principais, independentemente da apresentação, pelas partes ou pelos interessados, de um
pedido expresso.
Esta audiência não tem um objetivo de criar convocação nos magistrados, mas de esclarecer
questões que necessitem desse esclarecimento e que podem ter a ver com controvérsias
jurídicas. Não serve para apresentar um resumo da prova produzida ou assumir uma posição de
defesa do cliente, mas objetivamente para permitir que o processo tenha os elementos
fundamentais para poder decidir.
Falamos de alegações que devem ser realizadas em 15 minutos, repartidos entre todos, e as
partes devem previamente combinar-se e organizar-se para não serem redundantes, há uma
maior organização do que aquilo que acontece nos processos em Tribunal. As partes até podem
escolher não intervir e, sendo várias partes, pode apenas o representante de uma delas utilizar
aquele tempo. As partes têm ainda um direito de replicar as alegações da parte contrária –
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
depois dos 15 minutos há uma 2º ronda para cada representante replicar alguma questão
suscitada ou controversa.
Acórdão/despacho
Quer o acórdão quer o despacho incidem sobre o pedido ou uma decisão que pode não recair
sobre o pedido, porque não chega ao mérito (incide apenas sobre questões de admissibilidade,
são exceções) e tanto um como o outro incidem sobre questões processuais. Contudo, se as
questões de admissibilidade forem válidas e, portanto, se houver de facto fundamentos de
inadmissibilidade, a decisão pode ser apenas por despacho e não por acórdão. Também quanto
ao mérito pode haver despacho fundamentado, se as questões substantivas não suscitarem
dificuldades e em que se limitam a convocar jurisprudência anterior.
• Requisitos e conteúdo – art. 36º ETJUE; arts. 87º e 89º RPTJ; arts. 117º e 119º RPTG
• São proferidos em audiência pública, mas as partes podem não estar na audiência
A força executiva (art. 280.º TFU) decorre da força obrigatória e não tem o mesmo alcance que
esta.
O acórdão ou o despacho tem uma força obrigatória, desde logo inter partes (não existe um
regime de precedente). Contudo, importa recordar que podem ter efeitos com alcance geral:
107
Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Tendo força obrigatória, as partes estão obrigadas a cumprir o disposto do acórdão (no dia de
prolação do acórdão, tendo por base a possibilidade de recurso das decisões do TG). O acórdão
é proferido em audiência publica sendo que as partes podem não estar em audiência.
Há lugar a retificação quando, por exemplo, há uma omissão de pronúncia, ou seja, quando o
Tribunal porventura não se pronuncia sobre um dos pedidos que era efetuado, e aqui podem as
partes pedir ao Tribunal que venha retificar (se houver erros gramaticais, lapsos, contradições
ou obscuridades). Pode haver também um pedido de interpretação.
1. Podemos ter uma situação de deserção da instância, em que o réu é notificado, mas
num determinado momento do processo deixa de aparecer – isto tem consequências,
como proferir-se a decisão independentemente de haver articulados em que ele não
participou.
2. Ou ainda uma situação de revelia em que o réu não é notificado (ou em que a
notificação não produz efeitos) – a parte contrária pode solicitar que o Tribunal decida
e o processo será adaptado, nomeadamente excluindo a fase oral.
O acórdão proferido à revelia que condene o réu fica sujeito às seguintes situações:
• Se ele tem força executiva, a executoridade pode ser suspensa até que se consiga
notificar o réu; pode ainda ser sujeita a caução, para que o acórdão possa ser executado
• Estes acórdãos podem também ser sujeitos a um processo especial de oposição do
próprio condenado, que pode posteriormente reabrir o litígio através deste processo
de oposição.
Nem todos os acórdãos do TJ têm força executiva. Têm força executiva nos termos do art. 280º,
que remete para o art. 299º – têm força executiva os acórdãos do TJ que condenem uma parte
ao pagamento de uma quantia pecuniária e essa execução tem lugar junto dos tribunais dos
Estados-Membros. Embora tenha de haver uma espécie de autenticação da decisão da parte de
uma autoridade nacional, não tem de haver reconhecimento de sentença estrangeira. Esta
executoriedade das decisões do Tribunal está prevista no Tratado desde o início, mesmo sem o
Regime da Convenção de Bruxelas em matéria de cooperação judiciaria e civil.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Se o processo ou a petição for enviado erradamente para um dos Tribunais, oficiosamente ele é
transmitido para o outro Tribunal.
Existem outras situações distintas que tem a ver com a declinação de competência por parte do
TG ou do TJ – quer um quer outro podem determinar a sua competência, ou seja, o próprio
Tribunal entende que não é competente, numa situação em que se suscite efetivamente uma
dúvida sobre a competência do Tribunal. Essa situação de declinação de competência pode ser
feita pelos dois Tribunais e, em última instância, prevalece a decisão do TJ.
Podem haver coincidências – podemos ter processos diferentes em que não é o mesmo caso
porque não tem as mesmas partes, ainda que tenham um objeto idêntico, e neste caso pode
ocorrer uma situação de recurso de anulação– no caso do recurso de anulação podemos ter o
mesmo ato a ser objeto de recurso em dois processos em que a competência legitimamente é
dos dois Tribunais; temos um particular a recorrer de um ato, e aqui a competência é do Tribunal
Geral, mas esse mesmo regulamento pode ser objeto de anulação por parte de um Estado-
Membro ou Instituição, e nesse caso, a competência é do Tribunal de Justiça. Nesta situação de
coincidência, prevê-se que o TG deverá suspender a instância e aguardar pela decisão do TJ
sobre aquele mesmo objeto. A apreciação do recurso far-se-á no TJ e o processo no TG aguarda
até à decisão do TJ.
2. A caducidade
Falamos essencialmente da caducidade dos prazos e esta também é uma exceção – podemos,
por exemplo, falar da prescrição no âmbito da retração de responsabilidade. A caducidade é de
conhecimento oficioso, mas a prescrição deve ser invocada pela parte a quem aproveita;
As questões que incidam sobres estes aspetos podem ser suscitadas no articulado, ou seja,
podem por exemplo ser suscitadas pelo réu na sua contestação ou, se a parte pretender que o
Tribunal se pronuncie sobre elas de modo autónomo sem ser em conjunto com a pronuncia
sobre o mérito, deverá formular essas questões em requerimento autónomo (neste caso o
Tribunal vai necessariamente pronunciar-se sobre as questões de imediato, sem que o processo
na sua dimensão substantiva avance, sem guardar essa questão para a pronúncia conjunta com
o mérito). Para que tenha lugar essa pronúncia imediata, deve ser formulada num requerimento
autónomo, sendo que o Tribunal vai debruçar-se de modo autónomo essa questão. O Tribunal
pode reservar a sua decisão para o final, se assim o entender.
Trata-se de um processo dentro do processo – é um processo autónomo mais célere, sendo que
a parte é notificada para que se pronuncie, dentro de um prazo definido pelo Tribunal, sobre
essa exceção, e depois essa pronúncia tem lugar apenas um processo oral (uma audiência
especial para as partes se pronunciarem sobre essa questão de admissibilidade).
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Incidentes da instância:
O Tribunal pode a todo o momento dirigir questões às partes, o que levará a requerimentos ou
a atos das partes em resposta. Enquanto incidentes da instância que modificam o curso
processual destacam-se:
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Estes incidentes devem ser suscitados em requerimento separado, ou seja, mesmo que o sejam
no mesmo momento que os articulados, devem ser objeto de requerimento separado já que
serão objeto de uma decisão autónoma.
20/04/2023
Reenvio prejudicial
Devemos sempre relembrar que a matéria do reenvio trata-se sempre no Tribunal de Justiça.
O processo segue a mesma estrutura – tem uma fase escrita e eventualmente uma fase oral.
Não sendo o reenvio um processo de partes, não há um desvio ao contraditório, porque as
partes no processo principal junto do tribunal nacional já têm a possibilidade de participar; o
que não há efetivamente é uma participação idêntica numa ação ou recurso, porque aqueles
que eram partes no tribunal nacional não o são junto do TJ – o reenvio prejudicial tem como
atores principais o Tribunal de Justiça e o Tribunal Nacional.
Todos os intervenientes estão presentes para colaborar na missão do Tribunal de Justiça, que é
interpretar ou pronunciar-se sobre a validade do Direito da União Europeia. Podem apresentar
livremente as suas posições, mas não há uma lógica de controvérsia junto do TJ.
1. Fase escrita
Este pedido não tem formalismo especial: haverá um despacho e depois um ofício do
responsável do processo para o TJ, havendo algumas regras sugeridas pelo Tribunal de Justiça –
ou seja, se não forem respeitadas dai não advêm consequências necessárias, mas podem advir
se o modo de pedir for obscuro, não sendo possível ao Tribunal compreender os factos e aí
haverá uma recusa do Tribunal em pronunciar-se.
O que é indicado nas recomendações é que a redação deve ser clara e simples: o pedido não
deve exceder 10 páginas, ou seja, o magistrado deve procurar resumir as questões de facto, as
questões jurídicas, o Direito que ele considera relevante para o caso (europeu e nacional). As
questões de interpretação e de validade devem ser formuladas de modo autónomo, em pontos
distintos do ato que procede ao reenvio.
Atualmente, prevê-se a anonimização das pessoas singulares – quando o tribunal nacional envia
para o TJ, deve logo fazer a anonimização de acordo com as regras previstas.
Neste articulado, deve estar exposto o objeto do litígio, os factos, a legislação, jurisprudência
nacional relevante, as dúvidas sobre o DUE e o direito nacional aplicável. Pode o juiz nacional
indicar o seu ponto de vista, por exemplo a propósito do reenvio sob a validade. Quando se
trate da tramitação diferenciada/urgente de facto é exigível que o juiz nacional formule a sua
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
posição. O TJ tem de ter os elementos que sejam necessários e suficientes para poder
compreender as questões em causa, devendo o tribunal nacional fornecer esses mesmos
elementos.
Depois de chegar ao TJ, o processo segue o mesmo procedimento do processo comum. Este
pedido do tribunal nacional é objeto de registo pela Secretaria e deve ser notificado às partes
(trata-se de uma especialidade – nos recursos e ações diretas temos uma petição que é
notificada necessariamente ao réu). No restante acaba por ser semelhante: é notificado
também aos Estados-Membros, como qualquer processo; também a Comissão é notificada e,
tratando-se de questões sobre atos da União, devem ser notificadas as Instituições, Órgãos ou
Organismos que sejam autores do ato. Se se tratar dos Tratados, não existindo nenhum autor
em particular, temos necessariamente os Estados-Membros e a Comissão; se for um
regulamento ou uma decisão, serão notificados os seus autores.
Quem pode participar? Todos os que foram notificados: as partes no processo, os Estados-
Membros ou a CE. Esta participação pode fazer se em dois momentos:
As partes no processo junto do TJ devem estar sempre representadas, mas neste caso temos
uma especificidade: as observações/alegações das partes devem ser assinadas, mas não têm de
ser assinadas necessariamente pelo representante. O regime aplicável depende do direito
nacional: se no processo a nível nacional não for obrigatória a representação das partes (ex.:
processos em que as partes possam litigar por si próprios), também essa parte pode apresentar
as suas observações junto do TJ sem necessidade de representação. O reenvio, em grande
medida, é modelado pelo regime nacional.
Medidas de organização de processo – artigo 101º do RPTJ. Entre estas medidas pode participar
o tribunal nacional – o TJ pode solicitar que o tribunal nacional preste esclarecimentos
adicionais, tendo um prazo para responder.
Quanto aos pressupostos processuais, eles não existem, porque não há partes. Contudo, há
pressupostos que podem ser relevantes – as partes de que falamos são as partes do processo
principal, pelo que se no processo principal existir alguma vicissitude, isso reflete-se no processo
junto do TJ. Este regime é um regime de direito nacional, aquelas que são as partes no processo
nacional acabam por definir o processo junto do TJ. A única especificidade é a competência do
Tribunal, mas deste ponto de vista só falamos da competência relativa entre o TJ e o TG (mas
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Ainda assim, o juiz da União não deixa de ter algum poder, podendo em última instância apreciar
essa questão. Se se aperceber que a questão não é relevante, que não tem relação com o litígio
nacional ou que a questão nem sequer é sobre o Direito da União Europeia, então poderá decidir
que o pedido é inadmissível – trata-se da ausência de objeto de reenvio.
Cabe ao juiz nacional definir as questões, mas o TJ pode reformulá-las, ou seja, tendo presente
os elementos do processo (conhecendo o objeto e as questões), pode perceber como é que elas
são relevantes. O TJ pode entender que as questões relevantes não são propriamente as
colocadas pelo tribunal nacional, reformulando as questões para poder dar uma resposta
importante para o processo.
2. Fase oral
Embora o reenvio seja um processo entre o tribunal nacional e o Tribunal de Justiça, na fase oral
o processo assume uma feição muito próxima da do processo de partes – são as próprias partes,
através dos seus representantes, que poderão estar na audiência de alegações e, neste aspeto,
torna-se um processo de partes. Aqui a audiência tem um curso semelhante ao que vimos
anteriormente, podendo os vários participantes apresentar as suas alegações.
Fá-lo-á com que fundamento? Porque, por exemplo, houve um recurso sobre a decisão de
reenvio que anule essa decisão, e isso tenha como efeito que aquele reenvio não poderá
prosseguir – nestes casos, o tribunal nacional deverá retirar essa questão, porque ela deixa de
ter utilidade para o processo nacional. Contudo, o TJ só extingue o processo quando o tribunal
nacional o notifica disso mesmo, não o fazendo de modo espontâneo – podemos ter um recurso
a nível nacional sem que isso ponha em causa o processo do TJ.
Vamos imaginar que a questão prejudicial é colocada em vários processos nacionais – o que os
juízes nacionais deverão fazer nessa situação é apensar os processos para que não haja, a nível
do TJ, situações diferenciadas se, porventura, num processo temos uma extinção da questão e
noutro não temos. Deve ser assegurado que o regime é aplicável sem que haja algum tipo de
diferenciação.
A fase oral pode ou não ter lugar – se for entendido que não é necessária para o esclarecimento
dos factos ou questões jurídicas, a fase oral (que se reduz à audiência de alegações) pode não
ter lugar.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
O tribunal nacional deve informar o TJ sobre a continuação do processo nacional, sobre aquilo
que ocorreu depois do reenvio, em especial a decisão final, permitindo ao TJ perceber o curso
do processo para ver se se reflete ou não a pronuncia/acórdão/despacho de reenvio.
Tramitações Diferenciadas
➢ Tramitação Acelerada:
Pode ser aplicada nos processos de reenvio e nos recursos e ações. Há situações que exigem
uma intervenção mais breve, pelo que se veio prever a possibilidade de se vir a decidir pelo TJ
que determinado processo fosse sujeito a tramitação acelerada. A generalidade dos processos
do TJ pode ser submetida a tramitação acelerada.
• Reenvio
Para decretar o reenvio, é necessário que a natureza do processo exija o seu tratamento em
prazos curtos; devem também existir riscos elevados e eminentes para a saúde pública, por
exemplo. Se as razões forem reais e justificadas, é necessária uma resposta célere. Essa
tramitação acelerada, apesar de na essência manter o respeito quanto aos princípios
fundamentais de que falamos no início, representa na verdade algum atropelo (por exemplo, a
ausência de fase oral), ou seja, há um risco para um processo equitativo.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
(não inferior a 15 dias) e pode ser objeto de orientação pelo Presidente. Aquilo que deve ser
objeto das observações não fica na liberdade dos seus autores, porque o Presidente pode
orientá-las.
• Ações e Recursos
Aqui as especificidades incidem na fase5 escrita, na réplica e na tréplica, que em princípio não
terão lugar. Aqui, elas só têm lugar quando haja uma decisão nesse sentido (ao contrário do que
acontece na generalidade, em que terão lugar a menos que haja uma decisão contra isso).
Se um processo for submetido a tramitação acelerada, pode ter terceiros intervenientes, mas a
estes pode ser recusada a representação em articulado próprio para se pronunciarem sobre as
questões do processo.
No caso de um processo junto do TG, o prazo para a contestação é 1 mês (art. 154º n.1 RPTG);
em regra, não se admitem outros articulados além da petição e contestação (art. 154º n.3 RPTG)
Na fase oral, há alguma simplificação, mas não há nenhuma especificidade em particular. O que
sucede aqui é que a marcação da fase oral será mais célere, tendo em conta a tramitação
acelerada.
No TG, a decisão sobre a tramitação acelerada vai fixar a tramitação ulterior, nomeadamente
vai poder ser convencionada a apresentação dos fundamentos e argumentos, a apresentação
dos articulados e sua extensão – há um maior condicionamento. No TJ, isto não acontece.
➢ Tramitação Urgente
A Tramitação urgente imprime ao processo ainda uma aceleração maior. Na tramitação
acelerada um processo que demoraria 16 meses ficará concluído em cerca de 1 ano; já na
tramitação urgente, o processo fica decidido ao fim de cerca de 3 meses.
A tramitação urgente só se realiza nos reenvios prejudiciais e apenas em questões que digam
respeito ao espaço de liberdade, segurança e justiça (falamos essencialmente da liberdade de
circulação de pessoas, da emigração e do asilo, da cooperação judiciária civil e penal e da
cooperação policial). Estão em jogo interesses relacionados com direitos fundamentais das
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
pessoas – a sua detenção ou a sua liberdade, as condições familiares em que ela se encontra,
por exemplo, e que estão dependentes da pronúncia do Tribunal).
Se estamos a falar da cooperação judiciária penal, muitas das matérias têm a ver com o
mandado de detenção europeu – falamos de pessoas detidas e ninguém pode ser privado da
sua liberdade por tempo indeterminado (há limites). Isto não é compaginável com uma decisão
num prazo de 16 meses.
Os juízes nacionais, quando colocam as suas questões ao Tribunal de Justiça, não costumam dar
as suas opiniões sobre elas, mas nestes casos o juiz nacional deve auxiliar o TJ, apresentando a
sua posição com os argumentos que a suportam, porque isso auxiliará o Tribunal a decidir mais
rapidamente.
NOTA: para auxiliar o Tribunal de Justiça, este pode solicitar ao tribunal de um Estado-Membro
diferente do do reenvio que preste esclarecimentos – tal tem a ver sobretudo com as questões
respeitantes ao processo penal. No âmbito de um mandado europeu, muitas vezes coloca-se a
questão dessa pessoa ser sujeita a uma pena degradante. Sucede que esta possibilidade permite
ao TJ inquirir diretamente o tribunal, não aquele que fez o reenvio, mas o que solicitou o
mandado de detenção europeu, o demandante (sendo que o reenvio é habitualmente feito pela
autoridade judiciária que foi demandada). Ou seja, prevê-se a intervenção de um tribunal do
Estado-Membro para auxiliar o TJ.
A fase oral é imediatamente marcada, para rapidamente atempar e para que seja rapidamente
resolvida a situação. Quanto à fase escrita, pode acontecer que, como consequência processual,
ela seja omitida, pode não haver lugar a observações das partes – o Tribunal pode decidir que
irá responder simplesmente com os elementos trazidos pelo Tribunal Nacional, sem que haja
lugar à apresentação de observações.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Ainda assim, há um limite. Os particulares (pessoas singulares ou coletivas), mesmo que possam
ter um interesse específico num processo que envolva apenas Instituições, Estados-Membros
ou ambos, não podem intervir. Podem intervir nos processos que envolvam outros particulares.
A intervenção de terceiros tem como objeto suportar ou apoiar uma das partes, total ou
parcialmente, não tendo uma posição processual autónoma – tem alguma autonomia
processual, porque pode apresentar provas distintas, pode mesmo invocar exceções que não
tenham sido invocadas pelas partes, pode apresentar fundamentos diferentes do que
apresentou a parte apoia. Não pode, contudo, apontar para uma solução jurídica distinta,
requerer um pedido diferente daquele que apresentou a parte que apoia, tendo
necessariamente de se conformar com aquele pedido. Pode ficar aquém, mas não pode ir para
além do que aquilo que a parte que apoia trouxe ao processo
Quando o interveniente intervém, aceita o processo como está, o que significa que tudo o que
foi decidido antes está fixo, não pode ser objeto de qualquer reconsideração.
As ações são publicitadas, porque é precisamente a contar dessa publicitação que conta o prazo
de 6 semanas para algum potencial interessado poder intervir. Pode haver uma intervenção
posterior, se houver razões excecionais que justifiquem que não pôde ser apresentado nas 6
semanas posteriores à publicitação.
Mesmo nas situações excecionais, tal deve ocorrer antes da fase oral, caso contrário a mesma
não é possível. Se tiver lugar depois da fase escrita, mas ainda antes da fase oral, o interveniente
não irá apresentar nenhum articulado, mas não é verossímil que em 6 semanas a fase escrita
tenha terminado. De todo o modo, se isso acontecer, a intervenção terá lugar na audiência de
alegações.
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A decisão do Tribunal sobre essa admissão da intervenção deve ser posterior à decisão sobre a
exceção de inadmissibilidade. A exceção de inadmissibilidade pode ser apresentada nos
articulados iniciais ou separadamente – deve ser feita separadamente pelas partes, no mesmo
prazo que os articulados iniciais, quando pretendam que o Tribunal se pronuncie sobre a
inadmissibilidade antes de se pronunciar sobre o mérito, portanto antes da decisão final. Neste
caso, o Regulamento de Processo prevê que a decisão sobre a intervenção não deve ser tomada
antes da decisão de inadmissibilidade. Porquê? Não há utilidade em admitir um interveniente
para depois ser julgada a inadmissibilidade sem haver qualquer pronuncia sobre o pedido, sem
haver essa decisão final – esta é uma regra logica, que se justifica por razões de eficiência. Se a
exceção de inadmissibilidade não tiver tido provimento, nesse caso seguir-se-á a decisão sobre
a intervenção.
Falamos de uma medida que diretamente incide sobre o objeto do pedido e tem a ver, no
quadro do processo junto do TJ, com o recurso de anulação e, portanto, com a possibilidade
que o Tribunal terá de suspender a execução de um ato que é objeto do recurso de anulação.
Esta medida é autorizada pelo próprio Tratado, no art. 278º, sendo que o art. 279º faz uma
referência genérica a outras medidas provisórias que podem ter uma natureza diferente,
nomeadamente injuntiva.
O recurso de anulação não tem efeito suspensivo, ou seja, há uma presunção de validade dos
atos jurídicos que, até que seja declarada a respetiva invalidade pelo TJ, mantêm todos os seus
efeitos jurídicos – em princípio mantêm-se em vigor e produzem todos os efeitos jurídicos. Se
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esta é a regra, o que nos diz o artigo 278º é que pode o Tribunal suspender a produção de
efeitos destes atos.
Quem é que pode requerer? O demandante (o requerente não tem autonomia para fazer este
pedido). Esta decisão é do Presidente ou do Tribunal, tendo natureza provisória, o que significa
que a medida pode ser levantada quando as razões que a justificarem deixem de se verificar. A
suspensão pode ainda ser decretada temporariamente, quando se entender que não se mantêm
as razões que a justificaram ou pode ser à partida decretado que só produzira efeitos durante
um período limitado.
A decisão é adotada através de despacho fundamentado e ele não é recorrível – é uma decisão
definitiva do Tribunal de Justiça. Se for uma decisão do Tribunal Geral, ela já é recorrível para o
TJ.
O facto de ser indeferido um pedido de medida provisória não impede que possa ser feito um
outro pedido idêntico, mas tem de haver alguma razão que o possa justificar, tem de ser fundado
em novos factos, não podem ser utilizados os mesmos fundamentos que anteriormente.
Existem outras medidas de tipo injuntivo, como a suspensão da execução de atos nacionais,
que é importante sobretudo no âmbito das ações por incumprimento, em que o TJ pode
decretar que atos e medidas nacionais (que são certamente as que estejam em observação por
alegadamente se encontrarem contrárias ao DUE) devam ser suspensas até que o Tribunal se
pronuncie sobre a ação de incumprimento. Falamos de medidas de diferente natureza.
Enquanto a suspensão da execução do ato só pode ser requerida pelo demandante, as medidas
provisórias podem ser requeridas por qualquer parte do processo e elas incidirão sobre alguma
situação jurídica que esteja conexionada com o litígio em causa, mas que não é necessariamente
o objeto do litígio.
O art. 299º determina que essas decisões, esses atos, são atos que tem força executiva e que,
portanto, podem ser executados, mas essa execução pode ser suspensa, naturalmente, e tal
poderá ser objeto dessa decisão de suspensão.
Assim,
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
• Art. 39.º ETJUE – decisão do Presidente ou do Tribunal (art. 161.º, n.º 1 RPTJ – audição
do AG – art. 161., n.º 3 RPTJ); natureza provisória (arts. 162.º, n.º 4 e 163.º RPTJ; arts.
158.º, n.º 4 e 159.º RPTG), eventualmente temporária (art. 162.º, n.º 3 RPTJ)
o Através de Despacho fundamentado e não recorrível (art. 162.º, n.º 1 RPTJ; art.
158.º, n.º 1 RPTG – este despacho é recorrível para o TJ)
Em geral:
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17/05/2023
A Europa Digital
(Acompanhar os apontamentos com o PowerPoint disponibilizado)
Este domínio digital tem tido uma atenção particular da UE desde 2015. Num primeiro
momento, estava muito vocacionado para o mercado interno, tendo precisamente um quadro
de desenvolvimento de iniciativas que assegurassem o mercado único digital. Entretanto, há
uma abordagem mais global que se inicia em 2018 e que leva a Comissão Europeia a procurar
delinear estratégias gerais e setoriais em vários âmbitos nos quais há um impacto da revolução
digital.
Temos uma estratégia geral, que é a Estratégia Europeia Digital, em que a UE inicia a reflexão
das condições e dificuldades que se enfrentam – faz uma abordagem comparativa com as
principais “concorrentes” e conclui que tinha de desenvolver em vários quadrantes
(competências, estruturas, governação, negócios) iniciativas concretas, do ponto de vista
legislativo e de investimento financeiro, que depois vão dar origem à Bussola Digital – há
necessidade de iniciativas concretas que permitissem recuperar o tempo perdido e a posição de
inferioridade em que a Europa se encontrava.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
Por outro lado, há também efeitos perversos, que também se tornaram muito rapidamente
notórios pela via, por exemplo, da desinformação e manipulação, para além de práticas que já
existiam na realidade física, mas que são exponenciadas na realidade digital. Isto rapidamente
veio revelar que, para além dos riscos exponenciados, tem riscos muito particulares (do ponto
de vista da proteção de dados pessoais, por exemplo).
Centrando-nos em especial nos direitos sociais, o âmbito social da UE é muito limitado, não
temos uma política social comum, mas há um conjunto de políticas com traços comuns e
características próprias que efetivamente põem a enfase nessa integração comum dos cidadãos
num conjunto de garantias relativamente ao bem-estar e a determinados direitos, assegurados
nos Estados europeus desde a nascença até à morte (proteção de desemprego, de maternidade,
etc. passam por política pública nesta matéria).
Há, de facto, especificidades europeias, mas a verdade é que a UE não tem uma política comum,
cada estado tem as suas políticas. Encontramos depois um conjunto de ações de incentivo,
promoção, mas não são efetivamente um quadro comum nem têm coincidência legislativa.
Mesmo o exercício dos direitos associados ao espaço de liberdade está condicionado pela
existência de condições sociais próprias, que garantam que os indivíduos não são um encargo
para o Estado para onde se pretendem deslocar.
Desde os anos 90, as preocupações sociais passaram a estar presentes na agenda europeia, mas
com muitas condicionantes. Houve iniciativas do ponto de vista de soft law e um
desenvolvimento significativo é a adoção em 2017 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais – é uma
declaração de direitos e princípios com valor proclamatório (não é um ato jurídico obrigatório).
Esta declaração reúne acervos anteriores e apresenta um conjunto de princípios que são
orientações que devem ser promovidas pela UE na medida das suas competências e no quadro
dos EM na medida das suas competências também.
Na sua consequência, é adotado um plano de ação que foi associado ao Semestre Europeu, em
que há uma avaliação das instituições da União e também se fixam parâmetros relacionados
com as metas deste Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Os EM comprometem-se com
determinados parâmetros e depois é feita uma avaliação, a par do Semestre Europeu, sobre o
modo como agiram, as medidas adotadas e se atingiram aquilo a que se pretenderam ou não.
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Sebenta Teórica de DUE II da Comissão de Curso de quarto ano da FDUP – Sílvia Moreira e Mariana Cruz
No art. 20º desse pilar há o direito de acesso a serviços essenciais de boa qualidade, incluindo
comunicações digitais – é a base das iniciativas a nível nacional e no quadro europeu que
concretizam o direito de acesso ao espaço digital, e que leva a que os Estados prevejam uma
tarifa social para pessoas com capacidade financeira menor terem, por exemplo, acesso à
internet. Depois, afirma ainda que o espaço digital promove o direito à educação, formação e
aprendizagem ao longo da vida inclusivas e de qualidade e ainda o direito à saúde.
Quanto à saúde, a UE tem a iniciativa de criação de uma rede europeia de saúde, permitindo
cuidados de saúde em qualquer lugar no espaço da União. O espaço digital promove o acesso a
cuidados de saúde desde logo porque, se tivermos um registo eletrónico que seja interoperável
dos processos clínicos, isso significa que quando um cidadão está noutro EM, pode ter acesso a
serviços de saúde que possa necessitar em condições mais favoráveis, porque os médicos desse
outro EM podem ter acesso ao seu processo clínico. Um sistema interoperável que beneficie,
desde logo, de tradução automática, que torne aquela informação percetível noutros EM – isto
permite um melhor acesso a cuidados de saúde através do digital.
Está relacionado desde logo com a qualificação – o espaço digital deve ser qualificado como um
serviço essencial, logo há aqui um direito ou prestação do Estado em condições que têm de ser
equitativas, que não podem ser deixadas estritamente ao funcionamento das leis do mercado,
é exigível uma intervenção o Estado para assegurar que todos conseguem ter acesso (como
acontece com a água, eletricidade e gás).
Para tal, encontramos o art. 36º da CDF e o art. 14º do TFUE. Isto tem a função de convocar
uma intervenção pública a dois níveis:
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Há que ter especial atenção aos cidadãos com deficiência – a Convenção das Nações Unidas
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência contempla estas dificuldades, mas já na CDF tem
de se fazer uma interpretação extensiva do art. 26º.
Vejamos agora iniciativas que procuraram sedimentar a proclamação dos pilares num quadro
mais semelhante a uma bill of rights – a Declaração de Berlim de 2020 estabelece valores
fundamentais que devem estar enunciados e vinculam quer a UE quer os EM. Esse quadro de
valores sumariza-se numa frase só, “o espaço digital tem de recriar o espaço físico”. Os direitos
que se reconhecem e vigoram no espaço físico têm de ser reconhecidos e vigorar no espaço
digital.
É de salientar em particular a ideia de soberania digital, que desde aí vai fazer o seu caminho,
ainda que possa ter alcances diversos. A soberania do espaço territorial também incide sobre o
espaço digital e isto significa que os Estados têm no espaço digital a mesma soberania do espaço
real, levantando-se algumas dificuldades sobre o modo como a podem exercer, tendo em conta
que é um espaço de interligação à escala global.
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Neste quadro, o objetivo para 2030 é assegurar que a UE vai ter pelo menos 20 milhões de
especialistas em TIC, mas com uma referência ao equilíbrio de género, assegurando que haja
uma maior participação feminina. Isto será importante n só por uma questão de igualdade, mas
para combater problemas do espaço digital, nomeadamente a discriminação, que assenta
porventura na própria realidade de quem programa e domina a construção do sistema – se
houver mais mulheres, percebe-se que o modo como o sistema é construído não vai sofrer do
mesmo modo.
O Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (slide 21) obriga os Estados a
concretizar esses direitos.
A Declaração Europeia sobre os Direitos e Princípios Digitais para a Década Digital (slide 22)
tem pontos relevantes, mas não formula este acesso como um direito fundamental – não é
verdadeiramente uma bill of rights, mas sim um compromisso político, um programa de ação
seja para a UE, seja para os EM. O que podemos procurar fazer é ou rever a CDF para incluir esta
menção de modo direto, ou fazer uma interpretação de disposições da CDF que permita incluir
essa interpretação.
Esta Declaração Europeia tem como objetivo complementar o PEDS, mas pode ser alvo de várias
críticas porque, ao contrário do Pilar Europeu dos Direitos Sociais (que tem 20 pontos bastante
sucintos), é só por si um testamento, dividida em capítulos, que se subdividem em números de
grande densidade – as declarações de direitos e princípios serão tão melhores quanto mais
sucintas forem, porque se tornam mais compreensíveis e acessíveis e os seus exemplos serão
deixados para os documentos políticos. Aqui, essa densificação parece ter um efeito negativo.
Podemos criticar a redação da Declaração, que acaba por ser contraproducente, é algo
demasiado desenvolvido para ser efetivo.
O seu capítulo II fala de solidariedade e inclusão (como desenvolvido no slide 24), e o design for
all é uma regra de produção em geral que determina que qualquer produto deve ser passível de
utilização fácil por qualquer um, e é um pp que está na base da certificação que os produtos
têm. Quando é concebido qualquer produto, deve sê-lo de modo que a sua utilização seja fácil
por qualquer pessoa para a funcionalidade em causa, independentemente de competências
especiais.
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Relativamente à mobilidade, por exemplo, aquilo que são os registos digitais que todos
deixamos e a conjugação de todos esses dados são importantes, por exemplo, para organizar a
política de transportes ou de urbanismo. Isto é importante para o desenvolvimento de smart
cities, e tem haver com a utilização de dados produzidos pelas pessoas.
Foi objeto de particular atenção por causa da pandemia. Há neste âmbito uma diretiva de 2019
que especialmente versa sobre exigências para assegurar o equilíbrio entre a vida familiar e o
trabalho. No quadro português, há a agenda do trabalho digno.
Relativamente à gestão algorítmica da organização do trabalho (slide 32), ela vai entrando em
todos os setores, mesmo naqueles que não são atividades feitas no digital. Há alguns riscos que
se colocam e devem ser acautelados e que acabam por ser enquadrados no ponto 5 do PEDS.
Deve-se assegurar um tratamento justo e equitativo, que passa por saber como é feita a gestão
algorítmica e o direito, em último caso, a ter um controlo humano – isto não pode ser totalmente
automático, tem de ser transparente para o trabalhador quais os critérios utilizados e tem de
haver em última instância uma decisão humana.
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