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ESTUDO DA ESTABILIDADE FÍSICA DE SUSPENSÃO DE ALBENDAZOL NO

CONTEXTO FORMATIVO DA UNIDADE CURRICULAR FARMACOTÉCNICA

Camila Benevenuto Mauri1, Élida da Silva Timóteo1, Francisca Janiclecia


Rezende Cordeiro1, Gabriel Mendes da Cunha1, Alice Cristina Morgado Cassa1,
Janaina Cecília Oliveira Villanova1

¹Laboratório de Produção Farmacêutica, Departamento de Farmácia e Nutrição/CCENS - Campus de


Alegre, Universidade Federal do Espírito Santo - UFES, Av. Alto Universitário, sem número,
29.500-000 - Guararema, Alegre/ES – Brasil
camilabevenuto15@hotmail.com; elidasilvatimoteo123@outlook.com; franrcordeiro1@gmail.com;
gabrielmcunhaufes@gmail.com; alicecriscassa@gmail.com; pharmacotecnica@yahoo.com.br

Resumo - O presente trabalho foi proposto como ferramenta avaliativa da disciplina Farmacotécnica
II, ministrada para o curso de Farmácia do CCENS/UFES, empregando a metodologia Aprendizagem
Baseada em Problema. Para tal, a formulação de uma suspensão foi proposta e a mesma teve
parâmetros físico-químicos avaliados nos tempos 0, 1, 2, 7, 14 e 30 dias. Finalizado este período, os
resultados foram discutidos e confrontados com as bases teóricas do conteúdo ministrado. A partir
dos dados relatados, os estudantes concluíram que a formulação não apresentou estabilidade
adequada, requerendo redensenvolvimento farmacotécnico. A metodologia de aprendizagem se
mostrou eficaz para a finalidade pretendida, sugerindo que o conteúdo foi adequadamente
apreendido, possibilitando a formação de habilidades específicas, de forma crítica e reflexiva.

Palavras Chave: ensino de farmacotécnica, suspensão, estabilidade física.


Área de Conhecimento: Ciências da Saúde/Farmácia.

Introdução

A avaliação formativa dos conteúdos de farmacotécnica deve considerar as atividades


práticas das unidades curriculares relacionas à produção de medicamentos, essenciais para a
formação de habilidades relacionadas ao preparo de formulações em pequena e grande escala.
Suspensão é uma forma farmacêutica líquida, destinada à administração de fármacos insolúveis ou
parcialmente solúveis nos veículos, requerendo avaliação de parâmetros físicos importantes para sua
estabilidade (PIMPLE et al., 2017; YARNYKH et al., 2017). Segundo Allen, Ansel e Popovich (2013),
suspensão é uma forma farmacêutica que apresenta duas fases: externa, dispersante ou contínua
(líquida) e interna, dispersa ou descontínua (sólida). A estabilidade física das suspensões se
relaciona à uniformidade de dose, uma vez que a preparação deve permanecer floculada, com
distribuição homogênea de aglomerados frouxos no veículo, entre o período de agitação e a retirada
da quantidade desejada do frasco (AULTON, 2005). Ainda, não deve ocorrer a formação de
aglomerado rígido no fundo do frasco e não deve apresentar crescimento de cristais. Por fim, espera-
se que as suspensões possuam características organolépticas (aspecto, cor, odor e sabor) elegantes
e que favoreçam a aceitação do paciente (SINKO, 2008; ALLEN; ANSEL; POPOVICH, 2013).
Como forma de avaliar o conhecimento adquirido na unidade curricular acerca do conteúdo
“Suspensões” e como forma de desenvolver raciocínio crítico e habilidades relativas ao preparo da
forma farmacêutica em estudo, o presente trabalho foi proposto. A metodologia empregada foi a
Aprendizagem Baseada em Problema (Problem-Based Learning - PBL). Para o estudo, o albendazol
(ABZ) foi escolhido como fármaco modelo, uma vez que é insolúvel em água e deve ser administrado
em doses elevadas. O ABZ é anti-helmíntico benzimidazólico, incluído na lista de fármacos essenciais
pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O fármaco se apresenta como pó cristalino branco ou
quase branco, quase inodoro e untuoso ao tato (BRASIL, 2020). Uma suspensão reconstituída foi
preparada com o ABZ na concentração de 40 mg/mL, empregando dispersão de carboximetilcelulose
sódica (CMA-Na) a 1% p/v como veículo. Os parâmetros de estabilidade física avaliados foram
aspecto, pH, volume de sedimento formado e tempo de redispersão. A viscosidade do veículo foi
estudada. Por fim, os resultados foram discutidos e correlacionados com a estabilidade física das

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suspensões, a fim de avaliar a necessidade de adequações na formulação proposta, com base nos
conhecimentos apreendidos na unidade curricular acerca do tema.

Metodologia

O trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Produção Farmacêutica do Centro de Ciências


Exatas, Naturais e da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo - UFES, campus de Alegre
(Alegre, Espírito Santo, Brasil). Os alunos matriculados na unidade curricular “Farmacotécnica II”
foram divididos em grupos e, para cada um, foi apresentada uma fórmula farmacêutica de uma
suspensão a ser manipulada e submetida aos ensaios requeridos. Ao final da parte experimental,
cada grupo discutiu seus resultados e formulou conclusões e intervenções, que foram apresentadas e
discutidas em uma Sessão Científica pública. A partir dos resultados e discussões, avaliou-se a
necessidade ou não de ajustes na formulação. A composição qualitativa e quantitativa da suspensão
utilizada no presente trabalho é dada na Tabela 1.

Tabela 1- Descrição qualitativa e quantitativa da formulação da suspensão

Componentes Quantidade (% p/p) Função farmacotécnica


Albendazol 4,0 -
EDTA dissódico 0,10 Complexante
Metilparabeno (Nipagin®) 0,05 Conservante
Proprilparabeno (Nipasol®) 0,15 Conservante
Metabissulfito de sódio 0,10 Quelante
Propilenoglicol 10,0 Umectante
Glicerina 20,0 Co-solvente
Polissorbato 80 2,0 Tersoativo
Sorbitol solução a 70% (p/v) 10,0 Educorante
Sacarina sódica 0,15 Educorante
Flavorizante de laranja qs Flavorizante
Ácido cítrico qs pH 5,5 Acidificante
Água purificada 10,0 Solvente
CMC-Na [dispersão a 1% (p/v)] qsp 100,0 Veículo
Fonte: Os autores (2020).

Procedimento do preparo
Para o preparo do veículo, todos os componentes foram previamente pesados em balança
analítica (Marte, modelo AY220). O EDTA, o metabissulfito de sódio e a sacarina foram solubilizados
um a um em béquer de vidro, juntamente com água purificada. Em outro béquer foram solubilizados
os conservantes (metilparabeno e propilparabeno) em propilenoglicol, sob ligeiro aquecimento (Nova
Ética, modelo 208D). Ambas as soluções foram transferidas para um cálice de vidro ao qual foi
adicionado o polissorbato 80 e a glicerina. O volume foi completado para 100 mL com a dispersão de
CMC-Na e o flavorizante de laranja foi adicionado. O ABZ foi incorporado no veículo por levigação em
gral e o pH foi ajustado para 5,5.

Análise da viscosidade veículo


A viscosidade do veículo foi avaliada antes da incorporação do ABZ, empregando
viscosímetro rotacional digital Brookfield (modelo DV2T), empregando adaptador de pequenas
amostras, sensor 31, e velocidade de 65 rpm (torque entre 10 e 90%). As medidas foram feitas em
temperatura ambiente.

Avaliação dos parâmetros de estabilidade física da suspensão


Para a realização das análises nos diferentes tempos, a suspensão foi aliquotada em
provetas graduadas com tampa e armazenadas em condições ambientais. As análises dos
parâmetros físicos da suspensão foram realizadas nos dias 0, 1 (T0), 2, 7 (T1), 14 (T2) e 30 (T03). As
determinações foram feitas três vezes e o resultado é dado como a média ± o desvio padrão.

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O aspecto do produto acabado foi avaliado a olho nu, sendo observados os parâmetros:
viscosidade aparente, presença de grumos, partículas em flutuação, formação de aglomerado rígido
“cake”, facilidade de redispersão, cor e odor.
O pH da suspensão foi medido com o auxílio de aparelho de pH digital de bancada (Digimed,
modelo DM22), mediante inserção direta do eletrodo na amostra.
O volume de sedimento formado foi medido diretamente na proveta, em mL, sem agitação. O
índice de sedimentação (F) foi calculado pela razão entre o volume final de sedimento (V f), observado
no dia da análise e o volume ocupado pela suspensão logo após o preparo (V0).
Para a determinação do tempo de redispersão, as amostras em repouso foram redispersas
mediante movimentos verticais de 180º. Com o auxílio de um cronômetro, o tempo para completa
redispersão foi anotado, bem como o número de giros necessários para a completa redispersão do
sistema.

Resultados

A fotografia com a imagem representativa da suspensão, após os 30 dias de avaliação, é


dada na Figura 1. Na Tabela 2 são dados os resultados obtidos nos ensaios realizados.

Figura 1 – Imagem representativa da suspensão após o término do processo de avaliação (30


dias).

Fonte: Os autores (2019).

Tabela 2 - Resultados dos parâmetros avaliados durante o período de estudo

Parâmetros T0 T1 T2 T3
pH 5,50 (±0,012) 5,81 (±0,012) 5,44 (±0,012) 5,31 (±0,00)
F 1 0,36 0,28 0,30
Número de giros 2 10 11 14
Fonte: Os autores (2019).

Discussão

O método da Aprendizagem Baseada em Problemas (Problem-Based Learning - PBL)


objetiva desenvolver no estudante, habilidades que o tornarão capaz de construir o aprendizado
conceitual, procedimental e atitudinal de dado tema, a partir de problemas propostos, expondo-o à
situações e condições próximas às que encontrarão no mercado de trabalho, motivando-o e
preparando-o para o mercado de trabalho (BOROCHOVICIUS; TORTELLA, 2014).
Um dos desafios para os farmacêuticos farmacotécnicos é delinear formas farmacêuticas
adequadas às necessidades terapêuticas de cada paciente, especialmente, suspensões (ALLEN,
2002; THOMPSON, 2013). Para o desenvolvimento de uma suspensão adequada, faz-se necessário
avaliar os parâmetros de estabilidade física da mesma antes da produção em pequena ou grande
escala. Neste cenário, desenvolver nos estudantes de graduação em Farmácia, as habilidades
necessárias para tal prática, é imprescindível.

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Segundo a Farmacopeia Brasileira (2019), suspensões de albendazol devem apresentar pH
entre 4,5 a 5,5. No momento do preparo da suspensão, o pH da formulação foi ajustado para 5,5. No
T1, o valor anotado foi 5,81 e, nos demais tempos, 5,44 e 5,31. É possível que tenha ocorrido erro de
determinação no T1, uma vez que a alteração no pH foi pequena nos T2 e T3. Em um estudo
realizado por Yagoub, Abdoun e Seri (2013), os valores de pH observado para uma suspensão de pH
foram semelhantes aos observados no presente trabalho (T3 = 5,31) e em conformidade com a
especificação.
A partir de avaliação visual das amostras, observou-se que a suspensão obtida apresentou
coloração branco leitosa, sem formação de aglomerado rígido no fundo da proveta e sem a presença
de partículas flutuando. Ao verter o recipiente foi verificado um escoamento rápido e uniforme do
conteúdo, que apresentou viscosidade aparente média. Tais parâmetros se mantiveram inalterados
ao longo dos 30 dias de observação. Não foi observada a formação de sedimento após as primeiras
48 horas de repouso, sendo que o F obtido foi igual a 1. No entanto, o valor de F nos demais tempos
foi inferior a 0,4.
Sabe-se que quanto mais próximo de 1 este valor, maior a floculação do sistema, uma vez
que sugere a presença de aglomerados frouxos, que permanecem por maior tempo em suspensão no
meio. Valores de F mais próximos de 0 sugerem a ocorrência de aglomeração no fundo do frasco.
Nota-se, também, que no número de giros necessários para a redispersão no sistema aumentou,
indicando a necessidade de maior agitação para reconstituição da formulação (PIMPLE et al., 2017;
YARNYKH et al., 2017). Em formulações de suspensões consideradas ideais, as partículas sólidas
devem permanecer dispersas de maneira uniforme no veículo na forma de aglomerados frouxos
(flocos) e, quando em repouso, não deve haver a formação de agregado rígido, devendo a
redispersão ocorrer rapidamente, parâmetros que devem ser mantidos durante toda a vida útil do
produto (ALLEN, 2002; ALLEN; ANSEL; POPOVICH, 2013; THOMPSON, 2013).
Os resultados analisados indicam que, nas primeiras 48 horas de estudo, os parâmetros de
estabilidade física da suspensão de ABZ foram adequados. No entanto, estes não foram mantidos ao
longo do período estudado, indicando a necessidade de redesenvolvimento farmacotécnico da
formulação.

Conclusões
Após finalização da parte experimental, os estudantes do grupo concluíram que havia a
necessidade de ajustes na viscosidade meio e/ou no tamanho das partículas dispersas, uma vez que
estes parâmetros influenciam na formação de sistemas floculados e, portanto, na estabilidade das
suspensões.
A execução da atividade favoreceu o processo ensino-aprendizagem do conteúdo abordado,
contribuindo para o desenvolvimento de raciocínio crítico e de habilidades relacionadas ao preparo de
suspensões nos estudantes matriculados na unidade curricular Farmacotécnica II.

Referências

ALLEN, L. V. The art, science, and technology of pharmaceutical compounding. 2th ed.
Washington: APhA. 2002.

ALLEN, L. V.; ANSEL, H. C.; POPOVICH, N.G. Formas farmacêuticas e sistemas de liberação de
fármacos. 9ª ed., São Paulo: Artmed, 2013.

AULTON, M. E. Delineamento de formas farmacêuticas. 2ª ed., São Paulo: Artmed, 2005.

BOROCHOVICIUS, E.; TORTELLA, J. C. B. Aprendizagem Baseada em Problemas: um método de


ensino-aprendizagem e suas práticas educativas. Ensaio: avaliação e políticas públicas em
educação. v. 22, n. 83, p. 263-294, 2014.

BRASIL. Farmacopeia Brasileira. 6ª ed. Brasília: ANVISA. 2020.

PIMPLE, A. et al. Oral suspension: a review. Journal of Medical and Pharmaceutical, v. 4, n. 20, p.
49-52, 2017.

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X Encontro de Iniciação à Docência - Universidade do Vale do Paraíba.
SINKO, P. J. Martin: físico-farmácia e ciências farmacêuticas. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.

THOMPSON, J. E. A prática farmacêutica na manipulação de medicamentos. 3ª ed. Artmed:


Porto Alegre, 2013.

YAGOUB, Y. M. M.; SIHAM, A.; SERI, H. I. In-use stability studies of two veterinary medicinal
products: anbendazole and oxytetracycline. Assiut Veterinary Medical Journal, v. 5, p.11-15, 2013.

YARNYKH, T. G. et al. Pharmacopoeial aspects of suspensions preparation in pharmacy conditions.


Asian Journal of Pharmaceutics, v.11, n.4, p. 859-864, 2017.

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X Encontro de Iniciação à Docência - Universidade do Vale do Paraíba.

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