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Sobre as

relações entre os enfermeiros


e os médicos

OURY Podemos começar definindo de


um lado o estatuto social
do médico, do entermeiro, e, naturalmente, do
doente diante do qual os
dois se veem; e, do outro, dizendo enfermeiro
que o fica "imobilizado"
entre o médico e o doente, e até
que tudo é "imobilizado" num sistem
que são o hospital e os estatutos sociais isso é coisa bem sabida. Mas é
preciso recordá-lo ao começar a definir as relações
entre o médico e o
enfermeiro, com todos os
compromissos místicos que isso comporta.
FÉLLX Parece-me que sempre se tem interesse em
de entrar
começar, an-
tes detalhes dessas relações, situando-os de uma
nos
maneira
não geral, mas em seu
conjunto. Mesmo que já se tenha feito isso, é a
partir daií que se compreende direito o que ocorre exatamente. Se,
por
exemplo, considero as relações entre e patrões empregados operários
e
numa fabrica, é preciso partir de dois dados fundamentais, que são: o
que é uma fábrica? O que é um patrão? que é um explorado? De
igual forma, em nosso caso, é preciso começar perguntando: o que é
um médico? O que é um doente?

OURY Isso é, de fato, muito


importante. Há entre o médico e o en-
fermeiro uma relaço mistificada, no sentido de
que o médico representa
mais uma casta do que uma classe. Ainda o e o que médico enfermeiro
estejam do mesmo lado da barreira, no interior dessa barreira há uma
casta, a casta dos médicos, assim como há o mundo dos enfermeiros,
que
cOstuma ser mais sadio.

FÉLIx- E preciso ir mais longe. O


médico continua a ser- mesma
tendo de atender a outras
exigências burocráticas ou capitalistas o supor
*Relato de uma discussão travada La Borde
em
com Jean Oury, em setembro de 1955.
Psicanálise e Transversalidade
Sobre as relações entre os enfermeims e médcos
22

e, enquanto tal, refiete a ideologia como mágica, e, do outro, o corpo de cnfermeiros O que marca esss
te e o responsável pela mistificação, sobre certa relação, imagos é uma espécie de inumanidade, uma maneira de cristalizar cada
classe. A mistificação incide propriamente
desua homem do doente.Acho
fundada em certa concepção do mundo, do e
um em seu lugar, encarregando-se o médico de todo lado espiritual. o
às classes, mas
e.o enfermeiro, da disciplina e coisas do genero. Pode-se faiar da reiação
tocante
o problema não deve ser tão marginal no
que entre o médico e a
aparentes entre médicos e entermeiros como se ela resumise a atutude da sociedade
totalmente fundamental. Se há diferenças
entre a polícia diante da transcendencia, a maneira como a sociedade reage, o modo
parece-me que são
do tipo que distingue
administração,
mas, na verdade, é bem como divide o trabalho, como evita o problema ou foge dele. para não
e a justiça, entre as boas obras e os presídios;
tipo de relações, de enxergar o problema da loucura e da singularidade.
se trata, de um mesmo

de um mesmo suporte que


mesma imagem
do problema. Ou se vai
uma definição, uma
mesma

ou de exigências
de benevolência, ou OURY E de fato preciso situar
falar de exigências psicológicas
no plano histórico, e ao mesmo
o que me parece tempo no transcendente, as relações entre aquilo a que se dá o nome de
em seu sentido pleno,
então se vai colocar o problema
divis o do trabalho e, do outro,
a
loucura, de loucos, e a sociedade. Seria tedioso refazer mais uma vez o
de um lado, a uma singular
remeter,
normalidade. histórico do modo como a sociedade encara os loucos.Vamos nos limitar
uma "anomalia" da
ao que sucede hoje:a sociedade delega a certas
pessoas a tarefa de corviver
determinado para o médico é o de com os loucos, o que cria uma espécie de barreira humana, barreiras de
OURY E evidente que o papel
Estado o incumbe da função de cabeças, de braços e pernas, para se proteger dos loucos. Que os loucos
defensor das instituiçoes do Estado. O
sem intervir em
sua estrutura arrebentem
fazer respeitar o regulamento do hospital
se comoo quiserem, desde que a sociedade fique
tranquila.
economico-social. Esse seu papel implica obrigatoriamente
que ele se Eéforçoso que, nessa espécie de barreira que faz parte da
sociedade,se
faça respeitar, a fim de que apresentese aos enfermos própria imagem
a achem implicadas todas as suas lutas.
respeito, da honra. Há por conseguinte
do
uma espécie de pantomima
sociedade em que trabalha FÉLIX Além
representativa, dado que é a imagem mesma da disso, essa barreira condiciona o quadro de doenças.
o entermeiro. E um fatoinegável, sobretudo nos hospitais psiquiátricos,
investido pelo Estado, e que este último, ao mesmo OURY Por isso falei
aquilo a que se dá o nome de loucos, no
que o médico é
minimo apoio; e se tomar consciência disso o mné- sentido de que essa ou aquela doença existe porque a barreira a en-
tempo, não lhe dá o
e detestado
dico fica numa situaço bem difícil: desprezado pelo Estado cerra. No fundo, as nosologias existem tão-somente para encerrar os
de várias soluções: a de se loucos. Elas são registradas nos livros como se fossem uma coleção
pelo enfermeiro. Ele tem, portanto, diante si,
então a solução ditatorial, horrível, ou ainda de borboletas. Um livro de
psiquiatria não passa disso: quais as carac-
apagar completamente ou
a solução paternalista, todas
elas soluções que respeitam a estrutura na teristicas das borboletas, qual sua classificação... para conservá-los (os
ele vive enfermeiros. doentes mentais) é preciso mergulhá-los em formol: para observá-los,
qual com os
mantè-los em cômodos de janelas hermeticamente fechadas...E vai-
FÉLIX O importante na relação entre médicos e enfermeiros é, -Se longe: agora é necessário ocupá-los, pô-los a operar máquinas,
mais
sobretudo, sua implicação na relação curadores-doentes. Há uma espé- dar-lhes ferramentas, mas tudo isso dá na mesma. Por conseguinte, há
uma espécie de dialética entre as
cie de cisão na maneira como os auxiliares do curador são
apresentados pessoas que vão desempenhar a função
dos tipos que se de loucos e aquelas que terão o papel de vigiar os loucos. e tudo isso
aos médicos. Têm-se de um lado as imagos médicas,

médicos sentida numa sociedade fechada.


apresentam de quando em quando, sendo a ação dos
Psicanálisec Transversalidade
24 Sobre as relaçoes entre os eniermeirose o medicos

fenômeno da loucura
FELIX Acho que podemos considerar o
-

OURY Sim, justo porque essa noção de contrato pernite ver a


a loucura
c o m o u m fenômeno contemporâneo.
E perceptivel que confusão que as pessoas fazem com tanta facilidade entre a alienação
cada vez mais
intervem hoje como fenômeno social,
tendo um papel social e a alienação mental. Elas não são a mesma coisa, e querer confun-
sociedade, mais e mais
universal
cultural, cada vez nmais integrado à dir uma com a outra e uma nova mistificação destinada a fabricar ainda
antropológica. E algo
com que con- outras nesse contexto. Isso se traduz em dizer, por exemplo, em outro
nas preocupações, uma função
administrativas, e o fato de nos plano: "Não é mais um louco; é um doente". Ora. isso é pura estupidez.
Vivemos na forma de dificuldades
uma herança
do século XIX, uma louco...
colocarmos hoje o problema é é claro que é um

para encerrar os
inercia burocrática, um velho estilo da burgues1a
outra maneira: Porque se começa
loucos mas por que quer agir de
se FÉLIX Cumpre distinguir entre as diferentes modalidades de
loucura é um fenomeno
essencial justamente a nossa alienação no complexo hospitalar. Existe com efeito uma interação
a perceber que a
necessário rever os velhos arcabou-
sociedade contemporânea, sendo bastante complicada entre modalidades de alienação. Costumamos
médicos e enfermeiros, ocupar-nos mais particularmente do doente alienado da sociedade. O
Fos de pensamento,
as antigas relações entre

necessidade que tem a sociedade moderna


a fim deresponder a essa que me parece fundamental é que a doença é alienante enquanto tal.
fenômeno da loucura; é justo o que
de uma melhor compreensão do e que ao mesmo tempo o doente é alienado da sociedade porque é
compreender os
podemos considerar uma perspectiva progressista: internado. Mas também é muito interessante considerar o fenómeno
métodos de educação
loucos, sair do racismo, do colonialismo, da alienação do enfermeiro no estabelecimento hospitalar e de suas
com

diferentes etc. condiçoes de trabalho, bem como o do médico, muito mal situado
no âmbito da administração; e, por fim, a alienação da empresa. da
OURY 1sso não está muito claro. Nesse enquadranmento dos loucos, pessoa moral do hospital em seu conjunto, com respeito ao Estado.
pode-se dizer que há uma "visão do exterior", uma "visão do interior", uma conjugação de modalidades de
Existe, portanto, alienação que
além de uma "visão da parte dos loucos". O exemplo da visão exte- tem uma evidente repercussão na própria alienação da loucura: e
rior tradicional é a ideia de que, quanto maior a instrução que se tem, é desse ângulo que se deve poder considerar todos os aspectos do
quanto maior a frequência à escola, tanto maior a compreensão que se
problema.
tem do louco; logo, tem-se de ser médico. Em contrapartida, num nível
inferior da escala, o enfermeiro, em princípio deseducado, nada pode OURY E interessante situar o
problema como problema de epo-
compreender. Há um racionalismo da sociedade que é muito mais uma
ca; em vez de substituir relações racionais de sujeito com objeto e de
racionalização da má-fé, da maldade. A visão do interior são as relações objeto com sujeito, estudam-se relações antropológicas. O que dizenmos
com os loucos nos contatos cotidianos, desde que se tenha rompido com
aqui, por exemplo, não faz o menor sentido para pessoas que viveram
um "contrato" com o tradicional. Pode-se então dizer, em certo sentido, ha cem anos, ou mesmo que vivem hoje, num contexto tradicional. Há
que saber o que e estar em contato com os loucos é ao mesmo tempo
um salto
dado, como aquele de que acabamos de falar, o do roupi-
a ser
ser progressista.
mento do contrato: o de substituir relaçòes administrativas racionais de
Sujeito a objeto por relações existenciais de pessoa a pessoa; a noçio de
FELIX Seria até considerar que a tomada de consciencia
possível alienação só faz sentido no plano antropológico. Tenho a impresio de
com relação a esse "contrato com o tradicional" e a decisão de
rompê-lo quue a alienação marxista é antes de tudo antropológica; seria ridiculo se
constituem condição de
a um acesso
fenomenológico à loucura. fosse uma alienação de objeto. O que nos interessa é a noção basal de
Psicanálise e Transversalidade
26 Sobre as relaçoes eritre os entermeios e os médico

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enfermeiro e o médico Temos de
relaçao de pessoa a pessoa: unma relação entre o
OURY chegar dizer que o problema das relaçöes entre
a

enfermeiro
relação entre um funcionário
e
nao e semelhante a uma asmédicos e os enfermeiros é um falso problema. Não existe um médico
Falo das
um pouco mais complexo. nem 14m enfermeiro, mas pessoas
um tuncionário médico, mas algo que estão com os loucos, pessoas
entre pessoas; é justo
que
relações entre papéis para diferenciá-la da relação se encontram la, mas nao se acham presentes, mistificadas em seu mito.
ou do médico, que
eles ocultem
E as únicas relações verdadeiras que tem entre si deveriam ser as
a0 desempenhar esses papéis, do louco relações
a relação entre pessoas. E isso
constitui forçosamente algo que reage à técnicas competencias especificas para curar os loucos, loucos
de
de tudo, quais são responsáveis e de que são constituintes.
pelos
o esquizofrënico, apesar
nosologia: sob seu "papel" de louco,
tem relações de pessoa a pessoa.
mas ninguém sabe realmente FELIX- Poderíamos assumir uma posição
Todos podem aceitar o que se disse aqui, paradoxal e nos
perguntar
existem num contexto relações fundamentais com os loucos: são enfermeiros. Ora.
como e onde apreender essas relações que não quem tem os

devido espécie
a uma de falha, de fenda enfermeiros são em sua maioria alienados inaptos para trabalho
dado. Se existem, é por infiltração, Os e o

é a existëncia própria, pessoal. afetivo de aproximação e de compreensão dos loucos. Hi uma corrente
no contexto tradicional, algo
que
modernista que gostaria de transtormar os enfermeiros em
pequenos
de médicos, quando o que estaria mais em questão é a transformação dos
FéLIx A perspectiva central é, portanto, desaparecimento o

como de estereótipos: fazer o


louco que médicos para que eles ao menos alcancem o
certo número de papéis, bem nível dos enfermeiros no
o médico ou o enfermeiro fazem
a fim de chegar a uma promoção de tocante ao contato com os doentes. Os enfermeiros não só deveriam
automaticamente em PPF" de vocés como preferência na admissão.
ter acesso ao
relações humanas que não mais desemboquem alguma coisa
do como o estágio probatório para entrar no Partido Bolchevique, que, se
papeis, em estereótipos, mas em relações fundamentais, relações
tipo metafisico que desta vez façam aparecer as alienações mais radicais não me engano, era de seis meses
para operários e funcionários e bem
e fundamentais na loucura ou na neurose. Acho que é a partir dai que mais longo para os intelectuais.
se precisa conceber todas as especificações técnicas, as proposições de
atendimento ou de socioterapia, situá-las adequadamente nessa perspec- OURY Evidentemente, os próprios termos enfermeiro e médico
tiva que podemos chamar de perspectiva "Tempos Modernos", porque, são parte desse contrato que dissemos que deveriamos romper.
com

uma vez que se veja claramente o que não se deve fazer, os perigos de Senti no entanto alguma resistência, da parte dos mais destacados
um atendimento, se ele deve estar voltado para a produtividade, para a membros do citado PPEjustamente quando solicitei que pessoas não
readaptação ou para a relação social, se vai trabalhar para a ciência, para médicas fizessem parte dele. Portanto, trata-se de algo bem arraiga-
a Psicologia ou para curar o doente. Porque não deve perder de vista a do, mesmo nos melhores dentre eles. Eles dizem: "Em que isso vai
ideia de uma pessoa constituinte, constituída na raiz de uma linguagem, se transformar? Vai degenerar ete.". E é justo nesse ponto que está
uma pessoa que, em vez de se perder em relações sociais e situações o problema: é preciso que haja médicos ai, porque são eles que tèm
médicas estereotipadas, deve se reconstituir no mundo, com um míni- mais a aprender lá
dentro. No fundo precisamos estudar uma espécie
mo de normalidade em termos de linguagem e de comportamento. E de manifesto de todo o grupo de imbecis que são médicos por
acaso
nessas circunstâncias que se poderá manifestar de fato a anormalidade entermeiros por acaso, psicólogos por acaso, que estão por acaso em
de base do sujeito, ou, se se preferir, é então que os Contato com os loucos.
problemas vão se
mostrar de modo mais
flagrante. E assim que entendo o que voce disse
agora mesmo: "Trata-se na verdade de loucos!"
UO PPE era um projeto humoristico de fundação de um "partido psuquiätricofrances
Psicanálhse e Transversalidade
28 Sobre as relaçoes entre os enterimeiros e os médico%

FÉLIx - Sim, há uma questão de fato: ser "eu, tu numa situação


29
zombeteiramente que, aqui, os cronicos
nós., e os doentes são as
somos
estranha, honestamente ou sem vocação.. pessoas que passam, por maior que seja o
periodo durante o qual ficam
aqui. Dizendo isso, revertemos os valores; antes
era o louco
OURY Não damos a mínima para a existència ou não de vocação;
fica". Essa reversão está ligada a um movimento "aquele que
geral da
psiquiatria
o importante é estar lá. Se formos honestos, analisaremos por que estamos advindo da descoberta de metodos de choque.
porque o choque puro,
lá, o que fazemos lá etc., ou então nem começaremos. Mas, voltando o choque absoluto, é o chute no
traseiro que faz o
de observações sobre o sujeito sair de onde
a0 preocupa: seria interessante dispor
que nos está e o manda para outro lugar. E
preciso, falando sério, que ele
num texto. Nós não passe.
comportamento de cada hospital, como imagens e que isso sirva para
alguma cOIsa; pouco importa a estranheza
temos condições de fazer isso, porque nos falta experiencia. que isso
causa nos alienistas alienantes...

FÉLIX Acho que mesmo assim podemos, se quisermos uma ilus- FELIX Portanto, resumindo, é preciso
expor as possibilidades con
tração desse gênero, exemplo Saint-Alban,
dar o de rigor, chamar ou, a
cretas de detonar os papéis cristalizados entre médicos e
entermeiros numa
a atenção para a completa transformação dos enfernmeiros aqui mesmo. equipe, na qual existem naturalnmente trabalhos diferentes, mas trabalhos
Damos-lhes o nome de"monitores" e não fazemos distinções. Como se que acabam por contribuir para uma espécie de unidade do ambiente de
reconhecem os enfermeiros em La Borde? trabalho, no qual todos são diferenciados, não em função de seu estatuto,
do dinheiro que entra em seu bolso nem de seu
prestigio. tendo
mas em
OURY Pode-se dizer que, aqui, basta ser enfermeiro diplomado vista uma repartição de tarefas feita a
partir de considerações estritamente
para ser praticamente expulso da casa;" é uma coisa muito estranha; o técnicas, práticas, com o
objetivo de criar uma atmosfera de tratamento.
mesmo acomtece com os médicos: basta dizer "sou psicólogo, médico etc" de socialização dos doentes.
para ser incluído no Index. Pode-se dizer que apresentamos uma equipe
técnica que amadurece o tempo inteiro, cada qual se especializando em OURY Exato. E necessário distinguir dois problemas: a maneira
seu camp0; e não só em seu
campo, próprio grupo,
mas no plano num como se
pode pôr isso prática, que requer uma revisio geral da admi-
em

de, digamos, "sintalidade" (personalidade). São importantes essas relações nistração, e, do outro lado, aquilo que já foi posto priica quadro
em no

de sintalidade do grupo. Há nele pessoas que se fixam como as plantas tradicional. Tudo o que acabamos de dizer nio passa de specie de uma

herbáceas no vaso, enquanto outras, que são os doentes, passam. Dizemos introdução; talvez devessemos apresentar problema de base: para que
o

serve isso?
Que utilidade tem curar, criar o PPF? Não seria isso mera
imbecilidade, uma espécie de reunião de jovenzinhos impetuosos? Na
2 Trata-se do hospital de Saint-Alban, localizado bem na extremidade da região administrativa de
onde teve qualidade de psiquiatras. já somos considerados jovenzinhos inpetuosos
Lozère, inicioa
corrente de renovação da psiquiatria na França. Sob a liderança do
doutor François Tosqueles revolucionário catalão refugiado na França, inúmeras gerações de por todos os senhores experientes: impetuosos jovens que se eunem.
una excepcional experiència de transformação de um
psiquiatras realizaram hospital tradicional.
Da luta contra a fome em 1941, da transformação material do hospital, até a aplicação de técnicas
uma coisa verdadeiramente adorível! Claro que eles nos estimulam, awim
psicanaliticas na instituição, passando pela aplicação das teorias de Herman Simon acerea da er- Como estimulam a todos, a começar pelos escoteiros, Imas..
goterapia, a organização da vida social, a fundação do primeiro "clube terapéutico", a elaboração
de uma politica local de setor, uma nova abordagem do problema da criança
psicótica e pela
de etc., não há hoje um só dominio na ordem do dia que não tenha sido FÉLIx Os outros já tèm de nós a imagem de um grupo dotado
formação enfermeiros
explorado em Saint-Alban.
de certa particularidade, mas a coisa não para por ai. E preciso aind.a
3
Na época,a
Seguridade Social ainda não exigia o respeito à manutenção de uma porcentagem
de enfermeiros diplonmados em instituições oficiais na composição do corpo de funcionários dos quue o PPE tenha uma posição original no plano da politica psiquiitr ica.

estabelecimentos.
Psicanálise e Transversalidade
30 entre os enfermeiros e os médicos
Sobre as relações
necessidade se faz sentir
Vem à existència política psiquiátrica cuja
uma
aquilo que faz falta nos grupos de esquerda e nos grupos
comunistas da
estalinistas não tëm politica; eles se sentido do PPF pois
precisamente porque os psiquiatras
ser uma psi-
perspectiva psiquiátrica. Esse é o único verdadeiro
alinhanm com a tradição em vez de buscar o que poderia uma franco-maçonaria nos hospitais.
do contrário ele apenas iria criar
o PPF não deve faz-lo
quiatria progressista. Acho que, se deve chocar, Trata-se de uma política que só vai ter de fato
sentido à medida que situar

por seu caráter de grupo de jovenzinhos


impetuosos, mas pelo fato de os problemas psiquiâtricos numa plataforma que não existe atualmente.
numa perspectiva nmarxista-exi_-
ter a responsabilidade de desenvolver, diferenças fundamentais entre a psiquiatria burguesa e a psiquiatria
Não há
de formar a
tencialista-sei-lá-o-que, uma teoria e uma prática capazes dos atuais movimentos de esquerda.A psiquiatria
estalinista é, no tocante

jovem psiquiatria. a seus conceitos


fundamentais, alinhada exatamente com a psiquiatria
marxista com a da loucura,
burguesa. Não se deve confundir a alienação
OURY Ëdelicado dizer coisas disparatadas como
essa,fico cansado ao contrário do que fazem os estalinistas, devendo-se antes retomar o
só de ouvir, que os psiquiatras estalinistas näo têm poliítica etc. Isso não conjunto das contribuições de Marx e de Freud.A compreensão profunda
é verdade: há excelentes psiquiatras estalinistas que témjustamente uma do marxismo e do freudismo impede semelhante confusão.

politica bastante séria, embora não siga nosso caminho, mas bastante séria
do ponto de vista de renovação das atuais bases da psiquiatria. Claro que
OURY Estudar as relações entre enfermeiros e médicos ou as
é dificil admitir psiquiatras filiados a um partido, isso é um problema, no relações entre grupos terapëuticos e loucos, requer estudar antes de
sentido de uma espécie de traição, de fuga. tudo a relação entre o grupo e a sociedade. E isso que torna necessário

introduzir desde o começo aquilo que chamamos de dimensão trans-


a

FELIX Acho que podemos compararisso como movimento Frei- cendental do louco.
net, no qual havia stalinistas que aplicavam os melhores nmétodos atuais
do ponto de vista pedagógico, e que tiveram de deixá-lo por exigência Há diferentes estabelecer: polo metafisico:
FELDX posições a um

do Partido. Parece evidente que, se tivesse sido um movimento bem um polo político, no sentido de uma estratgia contra a administração,
avançado, o movimento Freinet teria tido posições mais claras do ponto contra os grupos sociais constituídos; e um
polo elaboração teórica
de
de vista politico que teriam permitido aos comunistas que faziam parte a
partir de grandes autores; de um lado o
polo Lacan, se você preferir, e
dele não serem obrigados sair. E dos mestres comunistas
a o
conjunto do outro, o polo Tosquelles, que já é mais político.
teria estado envolvido. O mesmo acontece com os
psiquiatras comunistas
os
que tem uma boa posição sâão minoritários, e mesmo alguém como OURY É complicado envolver nomes nisso. Trata-se de consoli-
Le Guillant' está longe de fazer
poder e dizer o que quiser. Não só por dar uma dada ordem, o que é uma coisa dificil, porque parece excluir
causa do estado atual da administração também por
como causa da ati- radicalmente certas posições políticas; é uma espécie de consolidação
tude dos psiquiatras estalinistas. Cada um fazer que puder é uma coisa, o da posição do grupo pela via negativa (grupo é uma palavra melhor do
mas uma verdadeira política é algo bem diferente, é ter uma
perspectiva que partido). Exclui-se um tipo porque ele não "religioso B°"- nio
coerente; duvido que sejam muitos os
psiquiatras que tenham uma, e tem, por exemplo, a visão universal inspirada de Lacan, ou entio o
que seja não somente marxista completa do ponto de vista de
mas
seu pressuposto político do lado Tosquelles... Mas não acredito que se posa
campo de trabalho. Seja como for, trabalho que fazemos é precisanmente
o definir o grupo como trotskista, anarquista, sabe-se lá o què. Acabamos

4O psiquiatra Louis Le Guillant ocupou


importantes cargos de
de falar que é preciso ser, digamos, progresista, ou seja, ter rompideo o

direção de
hospitais psiquiátricos sentido. Até
na
França e teve
grande influência na área. N.T. contrato com as estruturas tradicionais que já perderam o
Psicanáhse c Transversalidade
32 Sobre as relaçòes entre os entetmeri e on médic os

mesmo nossa linguagem vai incompreensível


se tornar
absolutamente
imagem e o reffexo de um objeto reduzido. Criam-se intermináveis
nessas estruturas
e para aqueles que fazem de
para os que permanecem tratados sobre a imagem para depois perceber que ela nào tem a menor
acrescentam gentilmente que ainda
conta que nos entendem, mas que
falar
importancia. O mesmo ocorre com os psiquiatras, que suo de certo
assim deveríamos colocar gravata e começar
uma corretamente a

de originalidade; não devemos ter modo colecionadorex de imagens colecionadores de borbolctas, cles
o francés.Trata-se de uma dimensão
mudar.." colecionaram falsas borboletas que eles mesmos chamaram de loucos, e
medo, mas dizer: "E como é, e não há por que
eu
que eles sequer queriam chamar de loucos, mas de "doentes".

FELIX- Há uma coisa que deveria especificar um grupo de militantes FELIX Cumpre redefinir o objeto da psiquiatria, no mesmo sen-
no domínio psiquiátrico, o fato de estarem engajados na luta social, e
tido em que Politzer tentou redefinir o objeto da Psicologia, de uma
ver a possibilidade
claro, mas igualmente o serem loucos o bastante para Psicologia concreta.
de estar com loucos; ora, há pessoas nunma excelente posiçao no plano

politico que não tém mínima condiço de fazer parte desse grupo. E
a
OURY Poderíamos chamá-lo de grupo da psiquiatria concreta.
eXiste, por outro lado, essa dimensão kierkegaardiana do "religioso B".
Temos ainda de tomar uma posição a respeito dessI grande
FÉLLX
OURY Esta é uma dimensão fundamental no sentido de ser preciso
primeiro passar pela loucura, ter digerido a loucura; é preciso ser louco farsaque éa Psicologia Social, a microsociologia, Moreno e todos eses
assumido, ser nmais louco que os loucos. Essa noção de loucura transcen
tipos que caem justamenteno mesmo circuito mistificado do pequeno
dental é negada de maneira absoluta por certos grupos políticos: "iso é
grupo. Nosso questionamento do estatuto social do hospital deve ser
distinguido, do ponto de vista ideológico, de muitas posiçòes.
um coisismo (materialismo vulgar) ridículo, um desvio do pensamento
de Marx" etc.
OURY Questionar o hospital é algo que deve precisamente de-
finir um grupo que se interessa pelo problema de sua natureza e 1 suas
FÉLIX A
partir do momento em que se percebe essa dimensão relaçoes com a sociedade. E
preciso usar esse grupo cono terrarnenta.
metafisica, principal perigo que se está exposto é ser identificado com
o a
não comno instrumento de pesquisa. Ele ter necessariannente repercus-
os
partidários do idealismo com classe que defende tradicionalmente
e a
soes sobre pesquisa. Mas é necessário
oidealisnmo. Esse
a
apresenti-lo. en pruneiro lugir.
problema coloca para a corrente "Tempos
mesmo se
como ferramenta.
Modernos": pessoal o
esforça para manter uma dimensão nmetafisica
se

minima e
1955
permanecer ao mesmo tempo no interior do movimento
progressista, que é tradicionalmente materialista.

OURY No final das


contas, demos um monte de voltas para não
falar das relações enfermeiros-médicos. E
à medida que as
preciso primeiro definir o louco,
relações enfermeiros-médicos só se definem se houver
loucos. E preciso por
conseguinte fazer loucos, porque os loucos somos
nós que fabricanmos. Como se
fabricam loucos? Podemos
processo com a teoria das comparar o
innagens, podemos dizer, dissenmos, que unia 5 G.
POLITZER. autor da obra eseneial Citu des fundamcnts da Paslyia a ulgtu t dr

hilhse. Piracicaba: UNIMEP 1998.

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