Você está na página 1de 6

Nº. 1.0680.11.

000207-7/003
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. FUNDAMENTOS DA SENTENÇA.
IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. PRESSUPOSTO DE
ADMISSIBILIDADE RECURSAL. AUSÊNCIA. PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE. OFENSA. CONHECIMENTO DO RECURSO.
IMPOSSIBILIDADE.
1. Consoante o princípio da dialeticidade, incumbe ao recorrente
atacar objetivamente os fundamentos que embasam a decisão
recorrida, apresentando os motivos que justificam a alteração do
julgado.
2. Na hipótese em que as razões recursais deixem de combater,
ainda que sucintamente, os argumentos que respaldam o
posicionamento adotado pelo sentenciante, não há como se
conhecer do recurso.

APELAÇÃO CÍVEL Nº. 1.0680.11.000207-7/003 - COMARCA DE


TAIOBEIRAS - APELANTE(S): ESPÓLIO DE JOVITA RÊGO
ESPÓLIO DE, REPDO P/ INVTE GILBERTO ALMEIDA -
APELADO(A)(S): MARIA ANELY DE OLIVEIRA E LUCAS, BENÍCIO
FERNANDES COUTO E OUTRO(A)(S).

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.
Trata-se de ação anulatória de retificação de área ajuizada
pelo Espólio de Jovita Rêgo, em desfavor de Benício Fernandes
Couto.
O Juízo da vara única da comarca de Taiobeiras, na sentença
de ordem n. 15, extinguiu o feito, sem resolução do mérito, com
fundamento na norma do art. 485, III, do CPC, ao fundamento de
que o Autor não promoveu os atos e as diligências que lhe
incumbiam, abandonado a causa por mais de 30 (trinta) dias.
Insurgindo-se contra o teor da sentença, o Autor interpôs
recurso de apelação. Contudo, a tese sustentada na petição
recursal (ordem n. 18) se dissocia, por completo, do teor da
sentença (ordem n. 15).
Observo que o feito foi extinto, sem resolução do mérito, por
abandono de causa, com fundamento na norma do art. 485, III, do

Fl. 1/6
Nº. 1.0680.11.000207-7/003
CPC, ao passo que no recurso de apelação, as razões recursais se
referem ao mérito da questão.

Contudo, para que fosse evitada futura e eventual arguição


de nulidade, determinei, com fundamento na norma do art. 10 do
CPC, que se procedesse à intimação do Apelante, para que se
manifestasse sobre a questão - impossibilidade de conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade -, concedendo-lhe,
para tanto, o prazo de 05 (cinco) dias.
Apesar de devidamente intimado, o Apelante não se
manifestou sobre a questão, conforme certificado nos autos
eletrônicos.
Pois bem. Consoante o princípio da dialeticidade, incumbe ao
recorrente atacar, objetivamente, os fundamentos que embasam a
decisão recorrida, apresentando os motivos que justificam sua
alteração.
Assim, o recurso deve, por óbvio, apresentar pertinência
temática com a decisão recorrida, sob pena de não ser conhecido.
No caso em estudo, é evidente a violação ao referido
princípio, tendo em vista que o Apelante, em suas razões recursais,
lançou mão de argumentos completamente dissociados daqueles
adotados na fundamentação da sentença.
Observo que a sentença extinguiu o feito, sem resolução do
mérito, com fundamento na norma do art. 485, III, do CPC, ou seja,
por abandono de causa, ao passo que, no recurso de apelação, a
tese esposada pelo Apelante é atinente ao mérito da questão,
fazendo-se considerações sobre a alegada incorreção do
georreferenciamento do imóvel matriculado sob o n. 4.820 do fólio
imobiliário local.
Assim, constato que há um óbice intransponível, de ordem
processual, impedindo o conhecimento do recurso de apelação,

Fl. 2/6
Nº. 1.0680.11.000207-7/003
consistente no fato de que o referido recurso não se presta a
combater a sentença.
A propósito, colaciono a norma do artigo 1.010 do CPC/15,
verbis:

Art. 1.010. A apelação, interposta por petição


dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:
I - os nomes e a qualificação das partes;
II - a exposição do fato e do direito;
III - as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade;
IV - o pedido de nova decisão. (grifei e destaquei)

Por óbvio que o recurso interposto contra a sentença deveria,


obrigatoriamente, rechaçar os fundamentos nela esposados, o que
não ocorreu na espécie dos autos.
Conforme estabelece a norma do acima transcrito art. 1.010,
II, III e IV, do CPC, “a apelação, interposta por petição dirigida ao
juízo de primeiro grau, conterá a exposição do fato e do direito; as
razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade, bem
como o pedido de nova decisão”, pressupostos não atendidos na
espécie.
Destarte, não se teve atendida, in casu, a obrigação da parte
Apelante no sentido de apresentar, na petição recursal,
argumentação capaz de contrapor, diretamente, os fundamentos da
sentença atacada, o que impede o regular processamento do
recurso.
Segundo o princípio da dialeticidade, a parte recorrente deve
indicar os fatos e fundamentos que justificam a alteração da decisão
recorrida, atacando objetivamente as razões que sustentam o
posicionamento judicial adotado.
Sobre o tema Nelson Nery Júnior assim esclarece:

“De acordo com este princípio, exige-se que todo


recurso seja formulado por meio de petição pela

Fl. 3/6
Nº. 1.0680.11.000207-7/003
qual a parte não apenas manifeste sua
inconformidade com o ato judicial impugnado, mas,
também e necessariamente, indique os motivos de
fato e de direito pelos quais requer o novo
julgamento da questão nele cogitada.” (NERY
JÚNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos, 6ª
edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013).

No escólio de José Carlos Barbosa Moreira, alusivo ao


CPC/73, mas que pode ser estendido ao atual diploma processual,
"todo recurso necessita de fundamentação, o que significa que o
recorrente deve indicar os motivos pelos quais impugna a decisão,
ou, em outras palavras, o(s) erro (s) que a seu ver ela contém.
Fundamentar recurso nada mais é, em regra, que criticar a decisão
recorrida" ("Comentários ao Código de Processo Civil", vol. V, p.
287).
A propósito, colaciono os seguintes precedentes deste TJMG:

“APELAÇÃO CÍVEL. PRINCÍPIO DA


DIALETICIDADE. VIOLAÇÃO. NÃO
CONHECIMENTO DO RECURSO. - A parte
recorrente possui o ônus de impugnar
especificamente os fundamentos da sentença
atacada, declinando as razões de seu
inconformismo, sob pena de não conhecimento
do recurso por violação ao princípio da
dialeticidade, nos termos do art. 932, III,
CPC/15.” (TJMG – Apelação Cível n.
1.0000.19.135177-4/001, Rel. Des. Pedro
Bernardes de Oliveira, DJe 08/07/2020). (grifei)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER- PRESSUPOSTOS DE
ADMISSIBILIDADE - AUSÊNCIA- PEDIDOS
DISSOCIADOS DAS RAZÕES RECURSAIS -
PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE -
INOBSERVÂNCIA - NÃO CONHECIMENTO. Não
deve ser conhecido o recurso quando
verificado que das razões recursais não
decorrem logicamente os pedidos e que estes
não se referem ao que foi decidido, em total
inobservância ao princípio da dialeticidade.”
(TJMG – Apelação Cível n. 1.0000.21.022370-

Fl. 4/6
Nº. 1.0680.11.000207-7/003
7/001, Rel. Des. Amorim Siquira, 16/04/2021).
(grifei)

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA -


SEGURO DE VEÍCULO - ENDOSSO - AUSÊNCIA
DE PROVA - PEDIDO IMPROCEDENTE -
RAZÕES DE RECURSO - IMPERTINÊNCIA E
ASSIMETRIA - INEXISTÊNCIA DE
FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO -
INOBSERVÂNCIA DO ART. 514, II DO CPC -
INADMISSIBILIDADE. O recurso deve impugnar
de maneira pertinente e simétrica a decisão
objurgada, sob pena de afronta ao princípio da
dialeticidade. (...).” (TJMG - Processo: Apelação
Cível nº. 1.0024.11.226647-3/001; Rel. Des.
Manoel dos Reis Morais; DJe 30.09.16)

Por fim, recordo que a norma do art. 932, III, do CPC,


estabelece que “incumbe ao relator não conhecer de recurso
inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado
especificamente os fundamentos da decisão recorrida.” (grifei)

DISPOSITIVO

Com tais considerações, NÃO CONHEÇO DO RECURSO,


com fundamento na norma do art. 932, III, do CPC.
Afasto a aplicação da norma do § 11 do art. 85 do CPC,
tendo em vista que inexistentes os pressupostos cumulativos
estabelecidos pelo STJ para sua fixação, notadamente em razão da
ausência de fixação da verba em 1º grau de jurisdição (vide AgInt no
AREsp n. 1.661.808/SP).
Suspensas as custas recursais, em razão da gratuidade
concedida ao Apelante (doc. de ordem n. 24).
Publique-se. Intime-se.
Belo Horizonte, 16 de janeiro de 2023.

DES. LEONARDO DE FARIA BERALDO


Relator

Fl. 5/6
Nº. 1.0680.11.000207-7/003

Fl. 6/6

Você também pode gostar