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Dizem que, em razão de o Brasil ter tido uma das maiores inflações do mundo,
durante um longo período, os profissionais e os acadêmicos brasileiros
desenvolveram o melhor sistema de correção monetária de balanço do mundo.
No âmbito da implantação do Plano Real, que combateu de maneira eficaz a
gigantesca inflação da época, principalmente por anular a chamada inércia
inflacionária, não houve opção diferente de extinguir a correção monetária de
balanço. Acontece que a situação econômico-financeira das empresas continuou
sujeita aos impactos da inflação, motivo pelo qual, como contrapartida à extinção
da correção monetária de balanço, a legislação tributária passou a assegurar a
dedutibilidade, ao menos de forma limitada, da despesa relativa a juros sobre o
capital próprio.
1
Empresa de varejo.
2
Indústria.
3
Empresa de tecnologia (prestação de serviço).
correspondente era expressamente excluído do cálculo do limite de
dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio pela lei tributária. Os itens
passíveis de correção monetária do lado direito do balanço patrimonial (ativo
permanente) estava garantido, por meio da reavaliação; porém, o mesmo não
aconteceria com o lado direito do balanço (patrimônio líquido). Para reequilibrar
essa situação, a legislação tributária previu a possibilidade de dedução dos juros
sobre o capital próprio, ainda que de maneira limitada.
Note-se que a remuneração dos juros sobre o capital próprio não tem a natureza
jurídica de um benefício fiscal. Trata-se de um procedimento destinado a reduzir
o impacto da inflação nas demonstrações contábeis, e, por decorrência, no
resultado, das empresas brasileiras. Sua natureza jurídica é, no âmbito do direito
contábil, o registro do impacto inflacionário sobre a situação econômico-
financeira da empresa.
Por conta disso, a inclusão da remuneração dos juros sobre o capital próprio no
relatório sobre Erosão da Base de Cálculo e Transferência de Lucros (conhecido
pela expressão inglesa Base Erosion and Profit Shifting – BEPS), elaborado pela
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, entre as
operações controladas, é absolutamente indevida. A previsão de dedutibilidade
da “despesa financeira” representativa dos juros sobre o capital próprio não se
enquadra como medida sujeita ao combate da competitividade fiscal
internacional, simplesmente porque não é capaz de gerar desvio de comércio ou
de sede de empresa que atue no âmbito global. Considerando o direito tributário
internacional, a discussão que existe com relação aos juros sobre o capital
próprio reside na classificação para efeito de aplicação dos acordos de dupla
tributação, o que não é o foco deste texto.
Do ponto de vista da legislação tributária nacional, esse pagamento representa
uma despesa financeira dedutível do lucro real e da base de cálculo da
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL (respeitados os limites
legais), estando sujeito ao Imposto de Renda Retido na Fonte – IRRF. Tendo em
vista que o destinatário da remuneração do capital próprio são os sócios, a lei
estabeleceu que eventual pagamento a esse título seria imputado aos dividendos
mínimos obrigatórios. De qualquer maneira, o registro dessa despesa financeira,
de modo a reequilibrar o impacto inflacionário nas demonstrações contábeis das
empresas, não exige, necessariamente, o seu pagamento aos sócios, podendo o
respectivo valor ser mantido no caixa corporativo.
Atualmente, em razão da crise econômica pela qual passamos – e diria mais, pelo
embate ideológico pelo qual passamos –, a revogação da dedutibilidade da
despesa financeira relativa aos juros sobre o capital próprio tem sido apontada
como meio de aumento da arrecadação tributária. E o argumento que tem sido
utilizado para defender essa medida é o equívoco de considerar tal dedutibilidade
como um benefício fiscal. A função social dessa despesa é, em verdade,
reequilibrar a situação econômico-financeira das empresas, diante dos impactos
da atualização monetária.