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Produção Editorial
Louzada, Thais;
As Consequências de Amar Você
1. Ed. Virtual — Increasy Editora — 2021
1. Literatura Brasileira. 2. Romance I. Título
CDD. B869.3
— Sei que já disse isso mil vezes, mas essa casa é a minha preferida em
todo o mundo. — Ela deitou no cobertor que havia estendido no gramado.
Revirei os olhos, sorrindo.
— Como se você conhecesse o mundo inteiro... — Deitei ao seu lado.
— Tudo bem. — Ela jogou as mãos para o alto. — Eu não conheço o
mundo inteiro, mas sem dúvida conseguir juntar as pessoas que amamos no
lugar mais perfeito que existe não é fácil — concluiu.
Apoiei o corpo sobre os cotovelos com um sorriso no rosto. — É... você
está certa. — murmurei observando à nossa volta. — E a melhor parte é que
sempre teremos esse lugar para compartilhar histórias.
Ela imitou minha posição.
— Amém para isso — disse, e tocou meu ombro com o seu. — Agora e
sempre?
Sorri.
— Agora e sempre.
— Tem bastante tempo que não vem aqui, não é mesmo? — A voz de
Ana me tirou de minhas lembranças.
Pisquei e movi a cabeça discretamente, na esperança tola da ação me
fazer esquecer. Derrotada, desliguei o motor do carro enquanto observava as
suntuosas janelas que decoravam a estrutura da casa.
— É... tem bastante tempo — respondi baixinho.
Eu sabia exatamente quanto tempo, só optei por não dizer.
Ana abriu a porta do carro quase no mesmo instante em que uma linda
mulher de cabelos castanhos e olhos verdes abriu a porta da casa.
— Elas chegaram! — animada, nossa mãe repetia. Pouco depois meu pai
surgiu sorrindo ao seu lado, e foi impossível não ser contagiada a ponto de
deixar surgir um sorriso em meus lábios também.
Sabe quando encontramos um casal na faixa etária próxima aos
cinquenta anos em um restaurante que são tão perfeitos juntos que chegamos
a nos questionar se não é gravação de comercial ou filme romântico? Meus
pais são exatamente assim. Amorosos, amigos, companheiros de vida, que
acreditam, que juntos, são capazes de enfrentar qualquer adversidade que
surgir pelo caminho. Ana correu em direção aos dois e abraçou nossa mãe.
Sem pressa saí do carro, tentando controlar as emoções que surgiram dentro
de mim antes de me aproximar.
— Beatriz — minha mãe me abraçou forte —, seja bem-vinda — disse,
e beijou meu rosto como se estivesse sem me ver há um século.
— Obrigada. Também estava com saudades, mãe — confessei antes de
desfazer o abraço, e meu pai, parecendo um urso, enlaçou Ana e eu ao
mesmo tempo.
— Fizeram boa viagem?
— Sim, pai. A viagem foi ótima, mas ficar sentada o dia inteiro
aguardando Tris sair do trabalho nem tanto — a chata reclamou.
Revirei os olhos.
— Dá um tempo, Ana Clara.
— O importante é que vocês estão aqui — minha mãe cortou a possível
briga entre nós com um sorriso nos lábios e sua voz doce.
— Exato — meu pai emendou. — Vamos entrar porque existe uma mesa
posta nos aguardando. — Ele abraçou Ana, direcionando-a para dentro da
casa. Minha mãe seguiu, e eu fique para trás, me dando um tempo para
absorver toda aquela familiaridade. O cheiro, a disposição dos móveis, o
arranjo de lírios sobre a mesa do hall. Tendo consciência de que estava
apenas começando, respirei fundo e dei o primeiro passo em direção a uma
vida que havia deixado para trás.
Não dava para negar que chegar à casa dos pais e encontrar tudo
quentinho e pronto para comer era uma delícia, e totalmente diferente da
minha realidade: ser salva por comida congelada e ter o micro-ondas como
auxiliar de cozinha. Isso sem falar no meu catálogo superorganizado de
cardápios delivery, que era de dar inveja a qualquer um.
— Então, Beatriz, como está o trabalho? Tem se alimentado direito?
Estou achando você tão magrinha — ela quis saber, enquanto colocava no
meu prato um pouco de tudo que havia sobre a mesa.
— Mãe, por favor, já chega. — Peguei o prato de volta, impedindo que
continuasse a me servir. — Estou comendo o suficiente, acredite. E sobre o
trabalhado, está indo muito bem. — Levei um pedaço de quiche à boca, na
esperança de não precisar falar mais.
Ela assentiu e pegou o copo de chá gelado à sua frente.
— E o Miguel? — indagou, levando o copo à boca.
Tossi e quase engasguei.
— Nós terminamos — soltei a frase e esperei por mais indagações.
Meu pai e Ana me olharam e não fizeram nenhum comentário, mas
duvido muito que minha mãe faria o mesmo. Porque foi naquele instante que
percebi que não conversávamos há semanas e, por isso, me preparei para as
reclamações de sempre: “Beatriz, você deveria ser mais presente. Deveria
compartilhar as novidades sobre sua vida. Nós sentimos muito a sua falta”.
Eu conhecia o discurso de cor.
Com cuidado, minha mãe depositou o copo de volta sobre a mesa, me
olhou com ternura e segurou minha mão.
— Sinto muito, minha filha. — Apertou carinhosamente. — Saiba que
tudo o que seu pai e eu mais desejamos é a sua felicidade e a de Ana. — Ela
soltou a minha mão, e mudou de assunto sem tecer mais nenhum comentário.
Meu queixo quase bateu na mesa.
Meus pais não conviveram com Miguel, não existia vínculo, só foi uma
grata surpresa perceber que o assunto não se tornou a porta de entrada para
uma série de questionamentos sobre a minha vida, algo que lutava
arduamente para evitar.
Passava da meia noite quando meu pai e eu fomos buscar as malas no
carro. Assim que retornamos, me despedi e fui para o meu antigo quarto. Ao
abrir a porta, descobri que tudo estava exatamente igual: as paredes pintadas
de lilás, a cama de casal branca com dossel, a penteadeira com os porta-
retratos em cima, cada detalhe no seu devido lugar. Tive a sensação de que o
tempo não havia passado. E eram muitas lembranças de um passado que nem
sempre era agradável recordar.
Instintivamente, toquei na pequena linha, quase imperceptível, em meu
braço.
Respirei fundo e, cansada do longo dia, tirei apenas a roupa de dormir e
a nécessaire da mala, acreditando que após um banho e uma bela noite de
sono, tudo ficaria melhor.
Um barulho.
Um grito.
Deixei o controle do videogame cair no chão e corri em direção ao som.
Atravessei a casa e, ao passar pela porta da cozinha, encontrei Tris caída no
gramado, chorando e segurando o joelho sem esconder a dor.
Corri ainda mais.
— O que foi? — Eu me ajoelhei ao seu lado.
Sangue foi a primeira coisa que vi em seu joelho e braço, junto aos
arranhões e machucados em sua pele tão clara.
— O que você fez, Tris? — murmurei.
Ela soluçou e puxou o ar.
— Subi na árvore e caí de lá — respondeu, entre choros e mais soluços,
apontando para um galho bem acima da nossa cabeça. Era alto o suficiente
para ela entender que nunca, nunca deveria ter tentado subir.
— Tris, quantas vezes a sua mãe já disse que você não pode subir nessa
árvore? — Assustado, enxuguei com o dedo as lágrimas que caíam por suas
bochechas redondinhas e rosadas.
— Mas você sobe! E o Arthur também! — argumentou, chorosa.
Tirei sua mão de cima do machucado e tentei esticar sua perna, mas ela
reclamou de dor no mesmo instante.
— Você não pode fazer tudo que nós fazemos — alertei, mesmo sabendo
que já não adiantava muito.
— Posso, sim. Só porque sou menina você diz que não posso.
Coloquei-a no colo e a levantei.
— Além de você ser menina, só tem seis anos — comentei com ternura.
— Mas eu faço sete esse ano! — retrucou, irritada entre soluços.
— Todo mundo vai fazer aniversário esse ano, Tris. Tudo bem.
Desculpa, você tem quase sete, mas me promete uma coisa?
Parei no meio do jardim, ainda com ela no colo.
Tris me olhou, curiosa.
Seu rosto ainda estava vermelho do choro e a sua franja quase cobria os
olhos. Ela parecia uma boneca, igual às muitas que tem em seu quarto.
— O quê?
— Que você só vai subir na árvore se eu estiver embaixo para segurar
você.
Ela ficou calada por um instante e seus olhos ficaram arregalados, e
depois sorriu.
— Você vai me salvar, igual a um super-herói?
Assenti.
— Vou, Tris, vou ser o seu super-herói, mas só se me prometer que não
vai subir na árvore sem me avisar antes.
— Eu prometo.
Seguimos para dentro de casa.
— Theo?
— Humm.
— Você pode ser o meu príncipe encantado também?
Sorri.
— Sim. Posso ser o seu príncipe encantado também.
arecia inacreditável, mas existia um quarto de hóspedes pronto e
aguardando aquele homem na casa. Pelo visto tudo e todos estavam
preparados para Theo, menos eu.
Na primeira oportunidade que tive, saí da sala. O que foi fácil já que a
minha interação nas conversas era nula. Não que minha mãe e Patrícia não
fossem pessoas adoráveis, de forma alguma, eu só sentia que o mundo no
qual elas viviam não era mais o meu. Festas, eventos sociais, pessoas
importantes... nada daquilo fazia mais parte de mim.
Entediada, peguei o meu notebook no quarto e segui para a biblioteca,
que normalmente só era utilizada pelo meu pai, o que fazia do lugar um
esconderijo perfeito. Assim eu poderia trabalhar em paz e evitar reclamações
da Ana, já que eu havia prometido não trabalhar nos próximos dias, e, em
menos de 24 horas, já estava quebrando a promessa. Mas, como aquela era
uma das únicas que podia quebrar, decidi me dar ao luxo.
Sentei na poltrona e dediquei um tempo para responder e-mails, acessar
o blog, ler e responder comentários dos visitantes. Era gratificante e, de certa
forma, uma maneira de me aproximar das pessoas, sendo protegida por uma
tela.
Longe, porém perto.
Funcionava para o estilo de vida que escolhi ter.
Duas horas e meia depois, não havia mais pendência que me obrigasse a
trabalhar. Sem ter o que fazer, abri uma página em branco do editor de texto e
fixei o olhar no cursor. Eu apenas contava a quantidade de vezes que cursor
piscava na tela. 1, 2, 3, 4... e minha mente insistia em vagar em direção ao
passado que eu tanto lutava para esquecer.
*
— Você sabe que é péssima nesse jogo, não é? — comentou, enquanto
eu abafava os meus resmungos com uma almofada.
— Tem que apertar muitos botões ao mesmo tempo! — reclamei. — É
humanamente impossível.
Ela riu.
— Sério que como desculpa vai querer insinuar que não sou humana!?
Apontei para a televisão que repassava a abertura do jogo tocando uma
música irritante.
— Desisto! Eu odeio videogame! Acho melhor assistirmos a um filme,
seriado ou qualquer coisa.
Ela deu de ombros.
— Foi você que pediu que te ensinasse. Ninguém está te obrigando a
gostar ou aprender, Tris.
Irritada, cruzei os braços encarando a abertura que havia recomeçado e
me desafiando a tentar de novo.
— Mas, se eu não aprender a jogar essa droga, nós vamos perder para
eles —resmunguei.
Rindo, ela me abraçou.
— Não se preocupe. Se eles estiverem ganhando e não forem gentis ao
ponto de nos deixarem reverter à situação, nós podemos trapacear.
Eu a encarei, o sorriso em seu rosto brilhava tanto quanto os olhos.
— Uau... seu sobrenome deveria ser honestidade, sabia?
Ela deu de ombros.
— Acredite, de um jeito ou de outro, as histórias sempre terminam com
um final feliz.
*
— Aí está você!
A porta do escritório abriu de uma só vez batendo de encontro à parede,
me fazendo pular da cadeira e me puxando de volta para a realidade. Vovô
Augusto caminhava em minha direção depois de quase ter me matado de
susto.
— Oi, tudo bem com o senhor? — quis saber ao vê-lo apertando algo
nas mãos.
— Não, minha boneca. Estou com um problema sério aqui. — Ele se
aproximou da mesa e colocou sobre o meu notebook um iPhone do último
modelo. — Acho que a internet não está funcionando. Meu Face não abre.
Não consigo mandar zapzap, colocar foto no Instagram. Estou isolado do
mundo. — Cruzou os braços, revoltado, enrugando a testa. — Dá um jeito
nisso para o seu avô.
Um pouco assustada ao perceber que meu avô era mais ativo nas redes
sociais do que eu, peguei o aparelho, acessei o ícone de configurações e fiz as
mudanças para o Wi-Fi da casa, depois o devolvi.
— Aqui está, tudo funcionando direitinho.
Ele me agradeceu com um grande sorriso, me deu as costas e saiu do
escritório. Fiquei rindo sozinha enquanto ele se afastava, e só depois baixei a
cabeça.
— Ah, boneca! — chamou, e levantei a cabeça novamente. — Não fique
escondida aqui dentro por muito tempo, a vida está acontecendo lá fora.
Então, ele piscou para mim e saiu.
Fiquei sorrindo sozinha antes de voltar a atenção para a página que
continuava em branco à minha frente. Foco. Eu precisava trabalhar minha
mente para manter sempre o foco. O que era lindo na teoria, mas que, na
prática, parecia impossível. E, no fundo, sabia que estava desperdiçando o
meu tempo por completo. E o motivo? Meu pensamento estava no homem
que ressurgiu em nossas vidas. Theo era a única coisa que ocupava a minha
mente. O seu nome apareceu no meio das poucas frases que digitei, mesmo
não tendo nenhuma ligação com o assunto.
Tirei as mãos do teclado, apoiei os cotovelos na mesa e juntei as mãos
próximas à minha boca. Por quê? Depois de tantos anos, por quê? Meus
olhos continuavam fixos na tela como se resposta fosse surgir digitada num
passe de mágica.
Duas batidas na porta me trouxeram à realidade e, quando vi, Theo
estava entrando na biblioteca. Eu não confessaria para ninguém, mas meu
coração disparou.
— Legal aqui, hein? Eu não lembrava desse lugar. — Ele sentou no sofá
de couro marrom à minha frente, e apoiou um dos braços sobre o encosto.
— É porque meu pai usa a biblioteca como escritório e nós não tínhamos
autorização para entrar. Fora que, pelo que me lembro, manter contato com
os livros nunca foi o seu forte quando éramos crianças — provoquei com um
pequeno sorriso no canto da boca.
Theo observava a linda estante de madeira rústica repleta de livros que
ia do chão ao teto. Não era nada comparada com a biblioteca do castelo de A
Bela e a Fera, mas dava para ter orgulho também.
— Não era mesmo. Sempre preferi esportes e atividades ao ar livre —
disse, parecendo não ter tomado o meu comentário como um insulto.
Limpei a garganta.
— Posso ajudá-lo? — Projetei o meu corpo para frente e cruzei os
dedos, apoiando a mão sobre o teclado. Postura profissional, Beatriz.
Mantenha a postura.
— Não. Só estava andando pela casa — comentou, ajeitando a bainha da
calça jeans despretensiosamente, como se houvesse algo errado. E eu podia
afirmar, com toda a certeza do mundo, que não tinha nada de errado com
aquela calça. Ela era perfeita da cintura até a bainha e muito bem ajustada ao
corpo igualmente perfeito que envolvia.
Droga, de onde veio esse pensamento?
Balancei a cabeça, tentando apagar o meu comentário mental.
— Então pode continuar no seu tour, Theo. Assim me deixa trabalhar
em paz — disse, me obrigando a voltar o olhar para a tela do computador.
Com o canto dos olhos, vi quando um discreto sorriso surgiu em seu
rosto.
— Você não está conseguindo escrever nada — afirmou em tom suave.
— Quem disse? Eu estava desenvolvendo um ótimo texto, até ser
interrompida por você — soltei sem olhar para ele, pois sabia que, se fizesse,
haveria uma grande chance de ser pega na minha própria mentira.
Ele inclinou o corpo apoiando os cotovelos nos joelhos e me encarou.
— Fiquei parado na porta por quase cinco minutos antes de bater e você
olhava para tela como se estivesse com a cabeça em outro mundo. — Ele
levantou. — De qualquer forma, estão nos aguardando para almoçar —
chamou, já me dando as costas.
Sabendo que ele não iria ver, mostrei a língua, fazendo cara feia.
Sete dias.
Fechei o notebook com força.
Eu só precisava aguentar e conviver com ele por sete dias. E se, por
acaso, Theo decidisse atormentar o meu juízo, eu seria obrigada a transformar
os dias daquele homem num inferno na Terra.
Levantei da cadeira, abracei o aparelho contra o peito e saí rumo ao meu
quarto. Segura de que conseguiria sobreviver, deixei o material de trabalho
sobre a cama, abri o armário, peguei um cardigan e segui para o nosso
primeiro evento do dia. Enquanto caminhava, vestia o casaco como uma
armadura, como se estivesse me preparando para a guerra.
inalmente! Onde estava?
Ana apontou o lugar ao seu lado no banco de madeira assim que desci o
último degrau que dava acesso ao jardim. O sol brilhava e, mesmo sem muita
força para nos aquecer, deixava tudo ao nosso redor mais belo. Todos se
encontravam em volta da grande mesa preparada no gramado. A mesma
comportava confortavelmente dez pessoas. Quatro em cada lado em um
banco largo de madeira com futons, e dois bancos individuais nas cabeceiras.
Sentei-me ao lado da Ana e de frente para Theo.
— Trabalhando — disse, pegando uma taça com água e a levando à
boca. Eu já sabia o que viria a seguir, por isso nem me abalei.
Ana soltou o garfo no prato.
— Poxa, você prometeu!
Apoiei a taça de volta na mesa, sem pressa.
— Ana Clara, não vou trabalhar o tempo todo, mas em alguns momentos
sim — respondi, séria, e nossa conversa chamou atenção dos demais.
— Não se preocupe, Ana — Theo pegou a travessa que Patrícia lhe
entregava —, sua irmã não vai ficar muito tempo grudada naquele notebook
— completou despretensiosamente enquanto se servia, mas com aqueles
malditos olhos azuis presos aos meus.
Por que ele tinha que ser tão insuportavelmente gato e irritante de se
conviver? Precisei fazer um esforço sobrenatural para não cair no jogo do
sujeito.
— Ah, é mesmo? — quis sabe enquanto decidia o que iria comer, sem
encará-lo. — Vai me proibir? — deixei a perguntar no ar, sem nem me dar ao
trabalho de olhar em sua direção.
— Nunca.... — A palavra surgiu tão suavemente que me fez levantar o
olhar, então ele continuou: — Quem sou eu para proibi-la de algo. —
Levantou a taça de água e levou à boca, mas antes abriu um sorriso sexy, que
deveria ser proibido.
Ferrada. Eu estava completamente ferrada.
Alguém precisava me dizer com urgência desde quando Theo tinha
ficado sexy daquele jeito. Bonito? Sim. Ele sempre foi e era esperado que
continuasse a ser. Dos cabelos castanho-escuros, passando pelos olhos azuis,
nariz perfeitamente desenhado até chegar ao maxilar másculo bem marcado.
Ele poderia ser o queridinho de Hollywood. Agora, sexy? Aí já era demais.
Era um absurdo, uma audácia, ele ter melhorado a bela fisionomia que Deus
havia lhe dado se enfiando dentro de uma academia, crescendo músculos e
adicionando aquela áurea sensual que poucos homens conseguem ter sem
parecer forçado.
Eu não estava preparada para tudo aquilo.
Respirei fundo tentando aceitar que, pelos próximos dias, seria obrigada
a conviver com a beleza daquele homem. No entanto... algo precisava ser
feito a respeito da atitude e prepotência do rapaz.
Eu não lembrava daquele lado do Theo. Se bem que também não
lembrava dos bíceps enormes e das pernas torneadas que estavam escondidas
naquele jeans caro e todo rasgado. Pelo visto, eu havia perdido parte da
memória.
— Patrícia, marquei o brunch com as nossas amigas para depois de
amanhã — minha mãe comentou, me tirando de meus devaneios.
— Que ótimo! Assim, ficaremos sabendo de tudo o que aconteceu nessa
cidade nos últimos meses em apenas duas horas. — Patrícia riu.
— Tris, pode me passar o açúcar? — Theo esticou a mão em minha
direção enquanto prestava atenção em algo que meu pai dizia.
Ahhh Claro...
— Me passa o chá gelado, adoço para você. — Estendi a mão com um
sorriso angelical nos lábios. Dividindo sua atenção entre mim e meu pai,
Theo concordou e me entregou sua taça, sem nem ao menos me olhar. Ao
meu lado, Ana conversava com Patrícia e minha mãe voltava sua atenção
para Rosa, que se aproximava com mais uma travessa fumegando. Perfeito.
Adocei o chá gelado de Theo, mexi e devolvi em seguida. Ele me agradeceu e
continuei a comer em silêncio. Segundos depois, Theo cuspiu tudo em cima
do vovô Augusto, que estava ao seu lado, e todos na mesa se assustaram.
— Meu filho, você está bem? — Patrícia parecia genuinamente
preocupada.
Meu avô, pegou o guardanapo e enxugou o rosto enquanto Theo estava
quase se engasgando por conta do chá gelado e, muito provável, da vergonha.
Minha mãe rapidamente se levantou, pegou um segundo guardanapo de
pano e entregou a Theo, que olhava para mim como se quisesse me matar.
Ignorei e continuei comendo.
— Querido, você está bem? — Minha mãe dava tapinhas em suas
costas.
Levantei a cabeça e olhei para Theo, me juntando assim aos demais.
— Estou ótimo! — respondeu entre dentes. — O chá é que ainda está
um pouco amargo — completou, ainda me encarando.
— Se quiser, posso colocar mais açúcar — ofereci com um sorriso nos
lábios.
— Obrigado. Não é necessário — respondeu, entre dentes mais uma vez.
O almoço continuou após a comoção, mas, por dentro, fiz uma dancinha
da vitória.
Logo após a sobremesa, todos levantaram e cada um foi para um canto
da casa. Meu pai e meu avô foram assistir a um jogo de futebol na TV. Minha
mãe e Patrícia decidiram podar as flores do jardim, e Ana mal notou quando
passei ao seu lado porque estava agarrada ao celular, sabe se lá com quem,
distribuindo sorrisinhos.
A tarde estava agradável e tão convidativa que me deixei levar
caminhando sem rumo pelo jardim. E, ao me afastar cada vez mais da casa,
percebi que nada havia mudado por ali. Sorri por um instante, e corri em
direção a uma árvore enorme com troncos robustos e coberta de folhas
amarronzadas, que sempre estivera por ali. Institivamente, puxei as duas
cordas espessas e me sentei na tábua de madeira envernizada. Dei impulso
com os pés, fechei os olhos, e soltei o corpo, balançando para frente e para
trás no lugar que sempre fora o meu refúgio particular para tudo na vida.
— Tris, por que está aqui sozinha? Você está chorando? — Theo parou
ao lado do balanço.
— O Pluto morreu — murmurei, enxugando as lágrimas. — Meu
cachorro morreu.
— Ah, princesa, sinto muito, vem aqui. — Ele passou os braços pelo
meu corpo e me puxou de encontro ao seu. — Ele já estava ficando velho.
Estava muito cansado.
— Ele não estava tão velho assim! Ele tinha treze anos! Eu tenho doze
anos! — argumentei tomada pela dor.
Theo me afastou o suficiente para olhar em meus olhos.
— Sabe que não é a mesma coisa. O vovô Augusto explicou várias vezes
desde de que Pluto ficou doente. — Enxugou minhas lágrimas que caíam.
— Eu sei — respirei fundo e soltei o ar —, mas dói porque eu o amo.
— E você vai continuar amando, mas agora ele está no céu dos
cachorros e vai cuidar de você de lá. — Ele beijou a minha testa. — E eu
prometo cuidar de você daqui.
Uma lágrima escorreu pelo meu rosto enquanto a cena desaparecia bem
diante dos meus olhos. Eu a enxuguei rapidamente, mesmo não tendo
ninguém por perto para testemunhar. Muitos anos já haviam se passado, mas
lembrava daquele dia como se fosse ontem. O dia que perdi meu cachorro,
meu primeiro melhor amigo. Meu companheiro de todas as horas, protetor e
caçador de monstros invisíveis, que dormia todas as noites ao lado da minha
cama. Ele foi parte fundamental da minha infância feliz e nós vivemos
grandes aventuras juntos, até ele partir... E, quando se foi, o lugar de melhor
amigo já estava sendo ocupado por outro alguém, mas que, no final, também
perdi.
Eu os perdi porque a vida acontece. Porque ela nos permite sorrir,
sermos felizes, só para depois nos surpreender e partir nosso coração além do
irreparável. Com o passar dos anos, aprendi que a vida não permite que tudo
seja perfeito, ela nos concede momentos, apenas alguns momentos felizes, só
que, no final, ela me tirou muito mais do que eu podia imaginar, me deixando
sozinha.
uem chega aos 23 anos e ainda faz brincadeiras infantis como
trocar açúcar por sal? Beatriz. Só para me mostrar que pode e me colocar de
volta devido lugar. Sua brincadeira — que por alguma razão todos não
perceberam ou preferiram fingir não perceber — foi como se ela tivesse me
derrubando da cadeira, me fazendo cair de bunda no chão, só para ficar me
olhando de cima com um pequeno sorriso nos lábios. Em poucos segundos, a
mulher conseguiu me fazer ter vontade de rir de sua cara de boa menina ao
tentar disfarçar o que tinha feito, e desejar dar a volta na mesa e arrancá-la
daquele banco, jogá-la por cima do meu ombro, levá-la para o meu quarto e...
— Theo! Você ouviu o que disse? — O questionamento de Sérgio me
arrancou do sonho vívido que estava tendo com a filha dele.
Girei o corpo em sua direção.
— Não, desculpa. Estava distraído. — Passei a mão nos cabelos, como
se o ato fosse afastar Tris dos meus pensamentos e tudo mais o que gostaria
de fazer com ela. Nós estávamos na biblioteca há mais de meia hora, e eu
sabia que era questão de tempo até que tocasse no assunto Piccolli. — Mas se
estava relacionado ao conteúdo dessas pastas, sabe que não tenho interesse.
— Theo — ele inclinou o corpo para frente e apoiou os cotovelos nos
joelhos —, esses são os relatórios da última auditoria. Acho que deve dar
uma olhada — disse em tom amistoso.
Irritado, levantei do sofá e caminhei até a janela.
— Estou aqui apenas por alguns dias, Sérgio. Não quero me envolver
nisso.
— Eu sei, mas sabe tão bem quanto eu que a questão agora não é só essa
— ele emendou.
Fiz o possível para ignorar o comentário e foquei minha atenção no
jardim à frente. O gramado impecável, as jardineiras cobertas de flores e
plantas bem cuidadas, e as árvores que pareciam ter sido estrategicamente
plantadas, e então avistei o balanço preso a maior delas. E, mesmo distante,
tive absoluta certeza de que era Tris movimentando aquelas cordas.
— Podemos conversar sobre isso em um outro momento? — sugeri com
os olhos fixos na garota do balanço.
— Claro, temos tempo — respondeu de imediato.
Não. Não era verdade, porque se existia algo com o qual eu estava
lutando contra era o tempo. Sem dizer nada, saí da biblioteca e segui em
direção à única pessoa com quem realmente queria estar.
Com passos silenciosos, me aproximei a tempo de ver Tris levantando a
mão e passando o dedo próximo aos olhos. Seus ombros subiram e desceram
como se estivesse se esforçando para que o ar preenchesse seus pulmões.
— Então o saleiro estava ao lado do açucareiro e você não percebeu? —
Peguei as cordas, e Tris reagiu assumindo uma postura rígida, como se
estivesse tentando se proteger de mim, ou quem sabe do mundo.
— Foi um erro comum que qualquer pessoa poderia cometer — disse
baixo, com pequeno sorriso no canto da boca, e se inclinou para pegar
impulso e, com isso, acabou fazendo seu corpo se aproximar ainda mais do
meu.
Continuei a empurrá-la tocando de leve em suas costas. Eu conseguia
sentir o calor do seu corpo, só para segundos depois senti-lo escapar das
minhas mãos. Era como alternar verão e inverno, de novo e de novo.
Eu sabia que não deveria pegar as minhas fichas e apostar naquele jogo
com Tris. Porque, por mais tentador que fosse, era um jogo perigoso, que
tinha tudo para dar errado no final.
Muitas histórias.
Muito passado.
Muitos estragos.
Segurei as cordas do balanço e o fiz parar no alto. As costas de Tris
grudaram em meu peito e aproximei o rosto de seus cabelos. O aroma suave
de lavanda que vinha dos seus cabelos me atingiu como um maldito feitiço.
— Então me diga: devo esperar pegadinhas do tipo a semana toda? —
sussurrei em seu ouvido, fazendo com que meus lábios tocassem em sua
orelha.
Senti seu corpo responder na hora. A mudança da cadência de sua
respiração e seus lábios entreabertos por conta da surpresa, não tiveram
palavras de imediato para mim. Porque eu ainda a afetava. E foi assim que
surgiu a porra de uma ponta de esperança dentro em mim. Surgiu a porra de
um novo e se na minha vida. E se Tris sentisse por mim ao menos um terço
da atração que eu sentia por ela?
Ela girou o pescoço o suficiente para que aqueles olhos verdes se
prendessem aos meus.
— Se deixar de ser prepotente... pode ser que eu pare — comentou
baixinho.
Pensei em soltar as cordas e deixar que o balanço voltasse a se
movimentar, mas não consegui. Minhas mãos não responderam à ordem,
porque eu estava sentindo o calor do seu corpo e não queria abrir mão
daquilo. Continuei segurando Tris suspensa no ar.
— Continua atrevida e desafiadora, hein? — provoquei a garota que
subia escondida em árvores só para provar para todos que também podia.
Os olhos de Tris se prenderam ao pequeno sorriso que eu sustentava nos
lábios.
— Acredite, não sou mais a mesma garota, Theo — respondeu levantado
o olhar e me encarando de novo. — As pessoas mudam.
Sabia que dizer que nada havia mudado seria uma grande mentira, sem
dizer errado e utópico. Mas, por um instante, desejei acreditar que era
verdade. Talvez porque fosse um pouco mais fácil continuar de onde
havíamos parado, do que encarar a realidade atual da minha vida. Soltei as
mãos da corda, deixando o balanço voltar a se movimentar, e continuei a
empurrá-la no mesmo ritmo de antes, mas permitindo o silêncio nos proteger
do que poderia vir pela frente.
— Theo — sua voz me tirou de meus pensamentos —, você se lembra
do Pluto?
— Como iria esquecer, ele destruiu um dos meus tênis preferidos.
Ela sorriu, e ganhei meu dia.
— Se não tivesse o péssimo hábito de largar o tênis em qualquer lugar,
ele não teria destruído — comentou, parecendo se divertir com a lembrança.
Interrompi os movimentos do balanço. Dessa vez num ponto mais alto,
colando as suas costas no meu peito. Só porque estava gostando cada vez
mais de brincar com o perigo.
— Como sempre, defendendo todas as travessuras do seu melhor amigo?
— provoquei, e dessa vez deixei meus lábios correrem da sua orelha até a
bochecha.
Não. Eu não estava jogando limpo e sabia. Mas, como era bom sentir
aquele perfume. Tris fechou os olhos e senti sua pele esquentado perto da
minha.
Perto demais. Rápido demais.
— Ele sempre mereceu que o defendesse — disse baixinho, inclinando o
corpo para frente, tentando se afastar de mim, então lhe dei o espaço que
havia pedido.
— Eu lembro de encontrar você bem aqui quando ele morreu —
comentei em baixo tom, quase como se não quisesse que Tris ouvisse.
Ela assentiu, demonstrando que lembrava, e me perguntei se Tris ainda
se lembrava de absolutamente tudo entre nós.
— Já tem tanto tempo, mas sinto como se tivesse sido ontem — disse
baixinho olhando para as montanhas à nossa frente, como se estivesse
pensando alto. — Foi um dos dias mais triste que já tive. Pluto foi o primeiro
amigo que perdi, e nunca tinha imaginado a dor que sentimos até aquele
instante... — Tris se calou por um instante e depois suspirou. — Mal sabia eu
que podia doer ainda mais — completou no mesmo tom, perdida em suas
lembranças sem esconder a tristeza em sua voz.
Engoli a seco.
Sabia que aquele era um caminho perigoso, e eu não estava pronto. E,
pelo que percebi, nem ela, pois parecia fazer o possível para não chorar. No
fundo, esperava que Tris conseguisse, porque seu choro sempre fez com que
me sentisse impotente, como se aquilo fosse umas das minhas kryptonitas
pessoais.
Soltei o balanço e fui para a sua frente, para que pudesse me ver.
— Você ainda tem amigos — comentei com leveza.
Ela desviou o olhar para observar a paisagem.
— Tinha me esquecido o quanto isso aqui é lindo — murmurou,
mudando de assunto, e preferi não insistir.
— É... — Sentei na grama ao seu lado. — Esse lugar sempre me trouxe
paz — comentei enquanto observávamos as montanhas verdes que tocavam o
céu azul.
Tris se balançou suavemente com a ajuda dos pés, e suspirou.
— Paz... Uma palavra tão pequena que significa algo que nem sempre
conseguimos ter, não é mesmo? — disse baixinho, e assenti pela verdade que
nós dois parecíamos compartilhar. — Porque nem sempre é fácil acalmar a
tempestade que vive dentro de nós — completou num sussurro, e me calei,
deixando que a beleza da natureza preenchesse o silêncio entre nós.
ssisti ao pôr do sol ao lado do Theo, até que ele recebeu uma
ligação e se afastou para atender, me deixando só. A iluminação do jardim foi
sendo acionada conforme a escuridão tomava conta de tudo à minha volta.
Existia uma melancolia no ar, e eu não conseguia evitá-la. Quando o frio se
tornou incômodo, voltei para casa. E logo soube que meus pais e Patrícia
haviam saído para encontro regado a queijos e vinhos com alguns amigos. Eu
mal pude acreditar que o casal que perturbava minha mente dizendo que eu
nunca passava tempo com a família havia me abandonado na primeira noite.
Sem ter o que fazer me vi tirando todas as roupas da mala para arrumar
no armário. Como a porta do quarto estava aberta, percebi que Ana passava
de um lado a outro no corredor, falando ao celular. Minutos depois, surgiu
arrumada, enquanto eu vestia um moletom antigo, e meu cabelo já tivera dias
melhores.
— Tris — Ana encostou-se ao batente da porta —, me empresta o seu
carro?
Seu pedido veio de forma despretensiosa e inesperada. Sem olhar para
ela, peguei a jaqueta de couro e pendurei no armário.
— Por que não pega o da mãe? — quis saber ao tirar um dos vestidos da
mala e abrir sobre a cama.
Ana soltou um longo suspiro.
— Porque o carro da mãe é enorme e as vagas aqui são pequenas.
Minhas mãos pararam sobre o tecido delicado ao ouvir a resposta, e um
frio desceu na minha espinha. Tadinho do meu carro, seria severamente
castigado nas mãos daquela garota.
— Então — estendi o corpo, deixando de lado por um instante o que
fazia — você quer que eu empreste o meu carro para você, que aparentemente
comprou a carteira de habilitação? — Arqueei as sobrancelhas.
— Tris, por favor. Eu não dirijo mal! Eu juro! Por favooorrrr. — Ana
juntava as mãos próximas ao peito, e seu olhar era digno de filhote de gato
que se perdeu da família.
Engoli em seco e respirei fundo.
— Tudo bem, te empresto o meu carro, mas com algumas condições —
disse, enquanto buscava a bolsa.
— Sabia que isso não viria de graça — resmungou, cruzando os braços.
Ignorei o comentário, assim como ignorei o comprimento da saia e o
fato da maquiagem fazer com que parecesse bem mais velha.
— Primeira condição é — levantei o dedo dando ênfase — que não
coloque nem uma gota sequer de álcool na boca. Então, cuidado até com
quem for beijar! Segunda — levantei mais um dedo —, que o meu carro volte
sem um amassado! E terceira — completei com outro —, se for demorar
muito, você vai me ligar avisando.
— Prometo.
— Ana Clara, estou falando sério!
— Meu Deus, já disse que prometo! O que mais você quer?
— Se eu tivesse nesse momento uma bíblia por perto, faria você jurar
com a mão sobre ela — falei rapidamente.
Ana revirou os olhos e esticou o braço com a palma da mão para cima, e
eu, morrendo de medo, entreguei as chaves. Ela me abraçou, me deu um beijo
e saiu feliz da vida. A partir daquele instante, o silêncio tomou conta da casa,
e cheguei a me sentir como se estivesse no meu tranquilo apartamento.
Terminei a minha tarefa com as roupas, tomei um banho, vesti uma calça de
pijama e uma camisa fina de mangas compridas, e depois de uma hora estava
cansada do tal silêncio.
Entediada, peguei um livro e fui para a sala de estar. Decidida a sentar
na poltrona, que geralmente era a preferida de papai e, assim que me
aproximei dela, dei de cara com Theo, deitado no sofá. E mesmo depois de
passar o dia ao seu lado, juro por Deus, que não estava preparar para aquela
visão.
— O que você está fazendo aqui? — Minha voz saiu levemente
irritadiça.
Ele me olhou de cima a baixo, colocou as mãos atrás da cabeça, e se
ajeitou melhor no sofá.
— Estou hospedado aqui, não sei se lembra.
Meus olhos decidiram me trair e buscaram cada músculo que aparecia
ter sido desenhado a mão naquele braço, que, devido à posição, ficaram
muito evidentes. Para completar o meu sofrimento, a sua camisa havia subido
alguns centímetros, me dando um pequeno spoiler do quanto seu abdômen
era perfeito.
Engoli em seco.
— É, estou sabendo. Mas como todos saíram, achei que também tivesse.
— Sentei na poltrona ao lado de onde Theo estava confortavelmente deitado,
querendo manter uma distância um pouquinho mais segura daquele corpo
perfeito.
— Hoje não — respondeu olhando para a televisão.
Abri o livro com a intenção de começar a ler. E digo “intenção” com
ênfase, porque precisava ser honesta comigo mesma, como iria me concentrar
em uma leitura daquele jeito? Com Theo bem ali. Li o primeiro parágrafo,
duas vezes. Depois virei a página, depois fechei o livro e li a contracapa,
depois voltei para o primeiro capítulo.
— O que está assistindo? — perguntei, assumindo a derrota no quesito
leitura.
— Um filme que começou tem uns vinte minutos. — Ele levantou a
cabeça para olhar. — Quer assistir comigo?
Fechei o livro de novo e o coloquei sobre as pernas.
— Que tipo de filme?
— É um filme de investigação. Tem um suspense. Parece ser bom —
disse, depois deitou a cabeça de novo e sua atenção voltou para a televisão.
Pensei por alguns segundos, levantei da poltrona e fui até aonde Theo
estava. Pelo visto eu gostava de viver perigosamente.
— Vai, senta aí. Vou assistir ao filme com você — informei sem grande
animação.
Theo sentou, me dando um lugar ao seu lado. Eu me joguei no sofá e
cruzei as pernas no acento fofo. O aquecedor da sala estava ligado, mas nem
era necessário. Afinal, ao meu lado havia um aquecedor natural de quase um
e noventa de altura, usando uma calça de moletom e camiseta, que conseguia
muito bem manter ele, a mim e provavelmente a sala toda aquecida.
OK, Beatriz, aparentemente, você passou parte da vida com a
reencarnação de um deus grego ao seu lado e não percebeu.
Obriguei-me a manter os olhos presos na televisão, tentando me
concentrar no filme e ignorar que o braço do Theo tocava o meu toda vez que
ele se mexia, que minha perna estava levemente apoiada na dele, e que eu
estava a poucos minutos de me assumir viciada em seu perfume, ou talvez
aquele fosse seu cheiro natural.
Com o passar do tempo, o filme finalmente foi me envolvendo ao ponto
de que mal conseguia piscar. Assim que a cena do filme mudou, inclinei o
corpo para frente. A música ditava o suspense enquanto o professor
universitário entrava na biblioteca tarde da noite com sua pasta em uma das
mãos. De repente, uma de suas alunas atravessou a sua frente. Ele a segurou e
cortou a garganta da garota com uma faca enorme. O sangue espirrava
daquela abertura vermelha e nojenta.
Gritei, cobri os olhos com as duas mãos e escondi o rosto no peito do
Theo. E ele começou a gargalhar enquanto me abraçava e fazia carinho na
minha cabeça.
Sim, gargalhar! E a raiva tomou conta de mim.
— Seu idiota! Sabe que odeio esse tipo de filme! — disse, dando socos
inúteis no bíceps do Theo.
— Calma, mulher! Não é real. Para de me bater! — Theo ria e tentava
segurar a minha mão.
Quando me acalmei ele a soltou.
Cruzei os braços, emburrada.
— Você é horrível — falei entre dentes.
— Tris, não acredito que ainda tem medo desse tipo de filme —
comentou rindo.
— Não tenho medo! Só não acho graça nenhuma em ficar levando susto
— respondi, olhando para o outro lado da sala porque, na televisão, as cenas
nojentas continuavam sem dar trégua.
— Então, nada tem a ver com o fato de depois ter que dormir no escuro?
— quis saber, sem conseguir parar de rir.
Olhei para Theo de cima a baixo, e levantei as sobrancelhas.
— Claro que não! Tenho 23 anos e moro sozinha! Pelo amor de Deus!
Não tenho medo de nada! — disse, segura, antes de virar a cara novamente.
— Só de filmes de terror — sussurrou a provocação no meu ouvido, e
meu coração resolveu dar o ar da graça. Eu não estava gostando de como o
meu próprio corpo começava a me trair. Porque talvez não fosse só de filmes
de terror que estivesse com medo.
— Me dá o controle! Não vamos mais assistir a essa porcaria! — Joguei
meu corpo sobre o de Theo e estiquei a mão para pegar o controle que estava
do outro lado do sofá e... Minha Nossa Senhora! Pelo visto, Theo não sofria
mesmo de aversão a aulas de musculação.
— Mas eu quero saber como termina! — ele se queixou, apontando para
a televisão.
— Só lamento! — disse, lutando para ignorar o quanto o meu corpo
pareceu gostar do contato com o dele.
— Tris, é sério. — Ele virou na minha direção e apoiou o braço na parte
superior do sofá próximo à minha cabeça. — O filme é bom ― comentou,
enquanto alguns fios de cabelo caíam em sua testa.
Talvez ele devesse passar a máquina porque aquilo era irritante e
charmoso na mesma proporção.
— Não!
Comecei a passar rapidamente pelos canais, procurando outra coisa para
assistir, qualquer coisa estava valendo.
— Eu deixo o abajur do seu quarto aceso, se assistir ao filme comigo —
argumentou com doçura, colocando uma mecha dos meus cabelos atrás da
minha orelha, e eu usei toda a minha força e concentração para ignorar o
toque dos seus dedos em minha pele e continuar trocando de canal. Não
posso. Não vou olhar para ele. Eu não vou deixar que os olhos azuis ganhem
dessa vez.
— Rá rá! Hilário — retruquei, me sentindo vitoriosa por não ter olhado.
Encontrei um filme que estava começando. Titanic.
— Ahh... — Suspirei baixinho e sorri.
— Pelo amor de Deus, me diga que está brincando — ele demandou,
olhando para a televisão.
— Claro que não! — Dei o maior sorriso da noite. — Não vejo esse
filme há anos! Acho que essa é a oportunidade perfeita! — completei, me
divertindo com sua cara de espanto.
— Perfeita para me torturar — comentou com ironia.
— Imagina! Vai ser ótimo! — Dei um tapinha encorajador em sua
perna, e me ajeitei melhor no sofá satisfeita com a maldade que fiz.
Theo soltou o ar lentamente e se ajeitou no sofá, e começamos a assistir
sem que ele reclamasse. Depois de quase uma hora, minha cabeça estava
apoiada em seu ombro. Meus olhos ficaram cada vez mais pesados e não me
lembro nem de ter visto a cena do iceberg. Acabei dormindo. Afundei antes
do Titanic.
Senti quando ele me pegou no colo e, por instinto, meus braços
envolveram seu pescoço. Acomodei a cabeça em seu ombro e senti o cheiro
de Theo. Era uma mistura perfeita de perfume madeirado e Theo. Era novo e,
de certa forma, ao mesmo tempo familiar e nostálgico. Não demorou para que
eu sentisse o conforto da minha cama e, sem abrir os olhos, me ajeitei no
travesseiro e virei de lado pouco antes de sentir a coberta sendo colocada
sobre mim. Eu sabia que ele estava ali, e queria abrir os olhos, mas não
conseguia. Quando tentei, recebi um carinho na cabeça, de forma ritmada,
uma brincadeira com os fios do meu cabelo, fazendo com que fosse
impossível não me entregar ao sono. Senti um leve beijo na minha testa.
— Boa noite, princesa.
oi um dia muito, muito estranho.
Parado à porta entreaberta, fiquei observando Tris dormir. Porra, não foi
preciso nem 24 horas para perceber que Tris tinha tudo, tudo para ser o
problema que eu não precisava na minha vida no momento. Eu já tinha
bastante, e zero estrutura para adicionar relacionamento à lista. Até alguns
meses, minha vida estava focada apenas em conseguir a promoção no
trabalho que me colocaria passos à frente de me tornar sócio de umas das
cinco melhores empresas de consultoria de Londres, antes de completar 30
anos. Seria um enorme feito, que me garantiria o carimbo final para nunca
mais voltar para o Brasil. Mas, como a vida gosta de foder com os nossos
planos, algumas bombas foram jogas sobre mim. E a pressão vinha me
enlouquecendo um dia de cada vez. Ao ponto de ironicamente eu me
encontrar de volta ao Brasil, em um sábado à noite, na casa dos Schimidt,
assistindo a um filme com Tris ao meu lado. Infelizmente nós não éramos
mais melhores amigos, porque más escolhas têm mesmo o poder de destruir
tudo.
Fechei a porta do quarto de Tris e segui para o meu. Acendi a luz e
arremessei meu corpo na cama. Mesmo cansado, sabia que não dormiria
facilmente. Esfreguei o rosto com as duas mãos e resmunguei sozinho,
incomodado com a rapidez com que ela me afetou. Eu não contava com
aquilo. E, mais, sabia que, se permitisse que aqueles sentimentos voltassem à
tona, estaria em um caminho sem volta.
Suspirei e apoiei as mãos cruzadas atrás da nuca, olhando para o teto.
Quando minha atenção voltou para o móvel ao pé da cama, avistei uma pasta
vermelha ao lado do meu notebook. Sem opção, peguei tudo, abri o notebook
e acessei o pen drive que haviam deixado, junto com uma infinidade de
relatórios do último trimestre. A empresa mostrava bons resultados, mesmo
diante da crise que o país estava enfrentando. Eu lia atentamente as primeiras
páginas enquanto estendia a mão para pegar o notebook, quando ouvi me
chamarem.
— Theo?
Com o susto, deixei as folhas caírem sobre a cama e voltei minha
atenção para a porta.
— Oi.
Minha mãe entrou no quarto sem pedir autorização. O contato do salto
da bota com o chão quebrava o silêncio.
— O que você está fazendo? — quis saber, parando ao meu lado e
pegando as folhas soltas. — Theo...
Eu sabia com exatidão o discurso que sairia de sua boca.
— Só estou lendo — justifiquei de imediato, sem esconder o cansaço.
— Mas, por quê? Por que razão decidiu se envolver com esses assuntos
logo agora?
— Não é nada demais, mãe. Só estou matando tempo até pegar no sono.
E o que você está fazendo aqui? Não deveria estar em um jantar ou algo
assim?
Sua expressão se transformou, e me senti como se ainda fosse uma
criança e tivesse sido pego fazendo algo errado, deixando-a decepcionada.
Ela apertou a pequena bolsa que carregava com força.
— Não mude de assunto!
Levantei as mãos em rendição.
— Só fiz uma pergunta. — Eu me calei por um breve instante. — Na
verdade, duas.
— Você me prometeu. Por que não pode cumprir uma simples
promessa? — murmurou, decepcionada.
Levantei da cama deixando tudo para trás, e segurei suas mãos, fazendo
com que olhasse em meus olhos.
— Sim, estou aqui para passarmos alguns dias juntos, mas você não
estava em casa. E, falando a verdade, só estivemos juntos no almoço. Então,
que diferença faz?
— Faz muita! — retrucou de imediato.
— Mãe — calei-me por um instante —, por que não me contou que a
Beatriz estaria aqui?
Ela me olhou como se a pergunta mais absurda do mundo tivesse
acabado de sair da minha boca.
— Eu contei! E não mude de assunto!
Desconfortável por saber que ela estava mentindo, esfreguei as mãos na
calça de moletom como se o ato milagrosamente fizesse tudo ficar melhor.
— Não, a senhora não contou. E algo me diz que não estou mudando de
assunto. — respondi baixo, com todo o cuidado do mundo para não parecer
grosseiro.
Até porque, se a senhora tivesse feito isso, eu teria me preparado, e não
sido pego de surpresa.
Ela franziu a testa e seu olhar ficou distante.
— Que estranho. Achei que tivesse contado — murmurou mais para si
do que para mim, e depois seus olhos se prenderam aos meus. — De qualquer
forma, vocês sempre foram amigos. Fizeram parte da vida um do outro. Qual
é o problema em se reencontrarem?
Ela ficou me observando com atenção, aguardando uma resposta
plausível. O único problema é que eu não tinha como fornecer.
— Não é um problema a Tris estar aqui, mas também não será nenhuma
solução. Reencontrá-la é totalmente indiferente para mim, e preciso que saiba
disso.
Ela sorriu pela primeira vez desde que entrou no meu quarto.
— Ah, filho. Eu te amo mais que tudo nessa vida, mas você é um
péssimo mentiroso.
— Olha só quem fala! E não estou mentindo! — retruquei.
O sorriso se manteve em seu rosto.
— Sim, está. Porque você é qualquer coisa, menos indiferente àquela
garota —comentou com ternura.
E, por um segundo, odiei o fato de alguém me conhecer tão bem.
Por um instante me preocupei com a possibilidade de a minha mãe não
ser a única capaz de enxergar verdades que eu deveria esconder.
Soltei suas mãos e respirei fundo.
— Tudo bem. — Exausto, juntei os papéis sem me importar se estavam
na ordem certa e os coloquei de volta na pasta. — Desisto. Está feliz agora?
— Muito.
Nós ficamos ali, frente a frente. Existia uma tensão no ar entre nós, o
que não era algo que estávamos acostumados a vivenciar. Eu sabia que, no
fundo, a minha mãe estava irritada pelo mesmo motivo que eu, porque na
vida há poucas coisas que podemos controlar e é frustrante ser obrigado a
assumir tal fato.
Eu me aproximei e segurei seu rosto entre as mãos com cuidado.
— Sabe que não consigo ignorar tudo que vem acontecendo
simplesmente porque pediu, não é? Não foi porque concordei em passar
alguns dias aqui, nessa cidade, nessa casa, perto de pessoas que já saíram da
minha vida há séculos, e isso inclui a Beatriz, que vou esquecer a realidade
que estou vivendo.
— Você vai ter que tentar — disse baixinho, cobrindo as minhas mãos
com as dela, me fazendo encarar aqueles olhos azuis, que eram os originas
dos meus. — Theo, preciso que tente ignorar, porque o jeito com que estamos
atravessando os dias, os últimos meses, não é assim que se vive, filho. Sei
que um peso enorme vem sendo colocado sobre seus ombros, e parte disso é
culpa minha, mas não quero que se perca pelo caminho. Por favor, não
esqueça a diferença entre estar vivo e estar vivendo.
E aquela foi a minha vez de ignorar o que ouvi, ou ao menos tentar.
Sabia que ela estava certa, mas eu estava lutando todos os dias três batalhas
diferentes e, mais que isso, estava ficando cansado e desapontado com a
ausência de resultados positivos. Era como nadar em mar aberto agitado e
não sair do lugar.
— Por favor, nós precisamos conversar sobre as nossas opções — pedi
baixinho, segurando sua mão.
Ela sorriu e beijou meu rosto com carinho.
— Nós teremos tempo para isso.
Eu a conhecia tão bem que sabia que sua resposta seria aquela. A ideia
era postergar ao máximo. Ela não queria tocar em tantas feridas que estavam
abertas e, para falar a verdade, nem eu. Mas, a nossa maior diferença era que
o meu lado racional aprendeu a falar mais alto há anos, e da minha mãe, nem
tanto.
Ela voltou seu olhar para a cama.
— Foi o Sérgio que deixou isso aqui, não foi?
Deixei que o silêncio respondesse por mim. Não gostaria de fomentar
uma briga. Fora que ela sabia que tinha sido Sérgio, e mais, sabia que não se
tratava de um único assunto apenas.
— Filho, preciso que esqueça tudo. Ao menos por alguns dias. — Ela
tocou no meu rosto com leveza. — Eu sei que lhe fará bem.
Ri sem vontade.
Isso porque eu não conseguia ver como ficar ali, deixando a minha vida
de lado e fingindo que no céu existia a porra de um arco-íris e que unicórnios
corriam pelo jardim, iria me fazer bem.
— Ei — sua voz me trouxe de volta —, encare isso como férias! Eu
quero vê-lo sorrir novamente, filho. Sorrir de verdade, e não com ar de ironia.
Então, deixe de lado o seu notebook, não abra e-mails, não atenda ligações,
não fique buscando por soluções que...
Assenti, engolindo todos as razões para não concordar com aquele
absurdo que me pediu.
— Não precisa pedir novamente. — Dei um beijo em sua testa. —
Agora vá descansar que o dia foi longo, para nós dois.
Ela abriu um lindo sorriso.
— Tudo bem. Até amanhã. — E me deu um beijo no rosto. — Te amo,
filho.
Minha mãe saiu do quarto e fechou a porta, me deixando ali, sozinho,
sabendo que no fundo não conseguiria cumprir aquela promessa fielmente.
— Eu também te amo, mãe.
uente. Meu corpo parecia pegar fogo. Espreguicei-me ao mesmo
tempo em que tirava dois edredons que me cobriam. Suando, buscava
compreender por que tinha decidido tentar me matar de desidratação durante
a madrugada, e foi quando meus olhos recaíram sobre o abajur ao lado da
cama, estava aceso. Theo. Com um pequeno sorriso nos lábios, apaguei a luz
e saí da cama, bem-disposta. Corri até o banheiro, lavei o rosto, escovei os
dentes e me deixei apresentável. Pelo horário, sabia que conseguiria tomar
café da manhã com os demais. Entrei na sala de jantar e dei bom dia a todos
enquanto contornava a mesa e sentava ao lado de Theo.
— Bom dia — ele respondeu quase em um sussurro. E me ajeitei na
cadeira e Ana que me olhou sorrindo, e pisquei para ela em resposta.
— Como foi a noite de vocês? — perguntei aos meus pais e à Patrícia,
antes de me servir. Eu sabia que fariam a mesma pergunta de volta, mas o
que de emocionante poderia acontecer quando não se faz nada? Se bem que o
nada de ontem teve lá seu grau de emoção.
— Foi ótima. Nós encontramos...
Antes que a minha mãe tivesse a oportunidade de entrar nos detalhes,
nossa atenção foi direcionada à chegada triunfal do vovô.
— Bom dia, adorável família. — Vovô Augusto sorria com a sua
postura ereta e visual inusitado, que incluía um suéter em um tom de verde de
gosto duvidoso. Ele cumprimentou cada um antes de sentar ao lado de minha
mãe e beijar sua mão, como de costume.
— O senhor acordou tarde hoje — minha mãe comentou, enquanto
passava geleia em uma fatia de pão artesanal, e o vovô se ajeitava na cadeira.
— Eu fui dormir tarde. Muito tarde — respondeu, sem esconder uma
certa felicidade e bom humor. Ele pegou sua xícara e serviu o café. — Mas
não se preocupe, o motorista me levou — concluiu antes de tomar.
— O senhor saiu e não comentou com ninguém?! — Meu pai deixou o
jornal sobre a mesa e o encarou. Meu pai falava com o vovô Augusto da
mesma forma que costumava falar comigo quando eu saía escondida, e a
lembrança me fez encolher na cadeira. Eu tive um pequeno período de
rebeldia na adolescência, então conhecia muito bem a ira do senhor Sérgio
Schimidt.
Sem se abalar, vovô escolhia o que iria comer.
— Sim. Fui me encontrar com a Francisca e nós saímos — respondeu
com naturalidade, sem dar muita importância para o meu pai.
— E quem é Francisca? — intercalei o olhar entre minha mãe, meu pai e
Ana.
— Francisca é — vovô moveu a mão no ar lentamente — uma amiga.
Aceitei sua resposta, sem continuar a questioná-lo, porque se tinha uma
coisa que havia aprendido com o tempo era que, se fizesse muitas perguntas
para o vovô Augusto, corria o risco de não gostar da resposta.
— Que amiga é essa que não conhecemos? — Ana insistiu, antes de a
colher com cereal chegar à boca.
— É só uma amiga. Nós saímos, às vezes, e na noite passada fomos a
um motel — respondeu tranquilamente, como se estivesse nos contando que
os dois passaram a noite jogando bingo. E, mais, como se fosse o tipo normal
e apropriado de conversa para um café da manhã em família.
Pelo visto, minha irmã não havia aprendido a mesma lição que eu.
Meu pai cuspiu o café.
Minha mãe pálida, arregalou os olhos.
Ana tossiu parecendo engasgada, e os demais que estavam conosco à
mesa pareciam não respirar. E, juro, juro mesmo, dava para ouvir os
passarinhos cantando lá fora em alto e bom tom, tamanho era o silêncio.
Levantei o meu copo em direção ao Theo, com os olhos fixos no vovô.
— Pode colocar vodca no meu suco de laranja? — pedi baixinho, e ele
se aproximou de mim.
— Se tivesse forças para levantar da cadeira, juro que pegava a garrafa
para nós dois — respondeu no mesmo tom, falando no meu ouvido.
O som do guardanapo de pano batendo na mesa cortou o silêncio.
— Pai! Pelo amor de Deus! — meu pai gritou.
Vovô Augusto nos observava, parecendo genuinamente confuso.
— O que foi, meu filho? Qual é o problema? — Vovô se debruçou sobre
a mesa. — Vocês sabiam que tem um novo motel no início da cidade? Os
quartos são ótimos. Bem decorados, e tem até aquelas cadeiras eróticas
legais, e o espelho do teto é...
Vovô Augusto não calava a boca, e eu estava a poucos minutos de saber
sobre a vida sexual de um octogenário e provavelmente destruir a minha
saúde mental para todo o sempre.
Juntei as mãos cobrindo o rosto e fechando os olhos.
— Vovô, pelo amor que tem por nós, pare! Pare de falar agora! Apenas
pare! — implorei, e fiz uma oração silenciosa e especial para que Deus me
ajudasse naquele pedido.
Vovô balançou os ombros e concordou, um pouco contrariado em ter de
mudar de assunto. E o café da manhã seguiu sem novos assuntos impactantes.
Conversamos sobre coisas mais toleráveis para o horário, e que não fossem
desencadear um ataque cardíaco em ninguém. E depois Ana ainda me
questiona por que faço o possível para fugir dos encontros de família. Por
mais que esse não seja o único motivo, era inegável que fazia parte do top 5.
— Tris — minha mãe chamou ganhando minha atenção —, pode me
fazer um favor?
— Claro.
— A senhora Freitas está nos aguardando para a degustação dos doces
no fim da manhã, mas marquei com a organizadora da festa no mesmo
horário, tem como ir e fazer uma seleção dos que mais gostou?
— Posso sim — respondi e continuei comendo. — Que ir comigo, Ana?
Ela limpou a garganta e ficou inquieta na cadeira.
— Poxa... não vai dar. A Laura chegou e está com o meu vestido para a
festa. Vou encontrá-la para provar — explicou rapidamente.
— Tudo bem. Mande um oi pra Laura por mim.
— Theo pode ir com você! — Patrícia sugeriu de imediato, e dava para
ver o brilho em seus olhos. E eu? Me segurei para não revirar os meus.
Claro, alguém tinha que dar a ideia. E foi quando percebi que talvez
sugestões como aquela poderiam se tornar recorrentes durante a semana.
Todos pareciam aguardar o que eu diria, como se eu tivesse muitas opções.
Então o óbvio veio a seguir: convidei e ele aceitou.
Saí do café dos horrores direto para o meu quarto, me certificando de
trancar a porta. Deus, onde tinha me metido? Já me sentindo exausta sem que
o dia tivesse chegado a metade, suspirei. Escolhi uma roupa e, com toda a
preguiça do mundo, entrei no banheiro. Com as mãos apoiadas na bancada,
me encarei no espelho, e quase podia ler “Salve-me, por favor” escrito em
minha testa. Quarenta minutos depois, eu estava de banho tomado, vestida,
com as olheiras devidamente escondidas, batom nos lábios e pronta para
enfrentar o que viesse pela frente.
Ao me aproximar do hall de entrada, avistei Theo, que me aguardava
enquanto digitava o que parecia ser uma mensagem no celular. Ridiculamente
gostoso, vestia sua marca registrada para a semana: calça jeans, suéter gola V
e botas pretas. Seus cabelos castanho-escuros ainda molhados, e um tanto
quanto bagunçados, completavam aquele visual.
Não que eu estivesse reclamando. Deus, claro que não! Afinal, se Theo
desse um curso chamando “Como deixar seus cabelos iguais aos meus”,
garanto que teríamos turmas lotadas e fila de espera para as próximas.
Ele levantou o olhar assim que o som da minha bota fez contato com o
piso de madeira. Eu não estava vestindo nada de muito elaborado, além da
bota de couro marrom e calça jeans escura, uma camiseta de mangas
compridas branca, justa ao corpo, e com um decote que destacava meus seios.
Decote este que foi a primeira coisa que ele pareceu reparar. Homens.
— Vamos? — Levantei a sobrancelha, chamando sua atenção.
Theo balançou a cabeça, como se a minha pergunta o tivesse trazido de
volta à Terra, e limpou a garganta.
— Claro — disse, abrindo a porta de entrada da casa e permitindo que
fosse à sua frente. Passei por ele segurando firme minha bolsa e jaqueta de
encontro ao corpo, como se fosse uma barreira nos distanciando. Ele apertou
o botão do controle, abrindo as portas do carro, e entramos. Sentei ao seu
lado, no banco de carona e, em um gesto automático, coloquei a jaqueta no
banco de trás.
— Coloque o cinto — Theo mandou, antes mesmo de fechar a porta.
Por um segundo, o meu coração apertou, mas logo me recompus e, sem
dizer nada, puxei o cinto de segurança e o travei. Então, ele girou a chave na
ignição e colocou o carro em movimento. A manhã de céu claro e sol
combinava bem com a música que tocava no rádio. Leve, despretensiosa e
agradável.
— Então... aparentemente nem você aguenta assistir ao Titanic.
Seu comentário se sobrepôs à música que eu cantarolava baixinho, me
pegando de surpresa. Mordi o lábio inferior para não sorrir.
— É um excelente filme. Só estava muito cansada — argumentei,
observando a rua pela janela do carro.
— Deve ser excelente só na primeira vez, Tris. Porque você dormiu
rapidinho. — Ele riu, e fui obrigada a acompanhá-lo.
E aí veio o silêncio. O silêncio que eu deveria ter deixado perpetuar, mas
a minha necessidade de confirmar algo que já sabia falou mais alto.
— Você me levou para cama — falei calmamente.
Theo molhou os lábios com a língua, e eu acompanhei com os olhos o
movimento, que parecia acontecer em câmera lenta, então ele assentiu, com
as mãos firmes ao volante.
— Nunca a deixaria dormir desconfortável no sofá. — Ele me olhou
discretamente. — Fora que quando está dormindo é mais fácil ser gentil com
você — completou e sorriu.
Eu me controlei para não dar a ele o sorriso que passou a surgir
naturalmente em meu rosto, e virei a cabeça para a minha janela.
— Obrigada — murmurei, sem ter certeza se ele tinha conseguido ouvir.
Parada em frente às grandes janelas envidraçadas que foram
transformadas em vitrine de gostosuras, eu aguardava Theo que estacionava o
carro. A confeitaria havia crescido nos últimos anos e tinha se tornado uma
referência na região. Era tanta coisa para absorver que em alguns momentos
se tornava difícil até mesmo respirar.
2 Eu tenho uma sensação, que hoje à noite vai ser uma boa, boa noite.
la não é minha. Ela não é minha. Ela não é minha.
Repetia aquelas palavras mentalmente, como se fosse o meu novo
mantra, enquanto descia os degraus da varanda. Tive uma das piores noites
da minha vida depois da discussão no estacionamento. Não era minha
intenção levantar a voz para a Beatriz, mas ela conseguiu me fazer perder a
cabeça, me desestruturar por completo. Foi como se toda a raiva que existia
em mim tivesse sido canalizada diretamente para ela. Todas as palavras que
saíram da minha boca foram ríspidas e carregadas de ironia. Eu a machuquei
porque ela havia me machucado, e no final me senti um merda, mas o estrago
estava feito.
Passei a madrugada pensando no quanto estava sendo estúpido ao
imaginar que poderia conquistá-la daquela vez. Era uma perda de tempo. A
imagem de Tris sendo abraçada por Rodrigo me fez ter o pior Flashback de
todos os tempos. Porque era um abraço íntimo, e presenciei vários como
aquele no passado, o que acabou fazendo com que sentisse que os últimos
dias que passei ao lado de Tris tivessem sido uma brincadeira fútil e sem
futuro, e não estava ali para ser usado por ninguém. Com isso, senti raiva por
ter me hospedado naquela casa e me permitido reviver algo que me fez tão
mal, e estava cansando de me sentir sobrecarregado daquele sentimento o
tempo todo.
Raiva do meu pai.
Raiva de ter visto Tris nos braços do Rodrigo.
Raiva da Tris por ter me seguido até o estacionamento.
Raiva de mim, pela dor que sei que causei.
Eu amava aquela garota, e não precisei de cinco minutos para destruir o
que havíamos conquistado nos últimos dias.
Caminhei pelo gramado, e ainda distante acionei o controle e abri a porta
do carro.
— Qual foi a merda que você fez ontem à noite? — A voz de Arthur
surgiu atrás de mim.
— Obrigado pelas palavras gentis — comentei com ironia, e nem me dei
ao trabalho de olhar para trás, porque sabia que ele viria ao meu encontro.
Arthur parou ao meu lado de braços cruzados.
— Não é difícil deduzir que fez alguma merda pela cara de choro com
que a Tris voltou para mesa ontem, e pela sua cara de culpado hoje. Além do
mais, também vi Tris e Rodrigo conversando no bar.
Fechei a porta e encostei na lateral do carro, ao seu lado, incomodado
por que sabia que falaria algo que iria doer em mim.
— Não consigo. Não posso lidar com a presença da Tris na minha vida
hoje. Eu sabia que ela poderia ser um problema no dia em que cheguei nessa
casa. Ela está perdida, não sabe o que quer, e a minha paciência não é mais
como era antes. O que eu fiz foi só mais uma prova disso — confessei sem
esconder o cansaço.
— Theo, não me venha com essa! Vocês dois estão perdidos na vida por
motivos diferentes — argumentou, e depois veio o silêncio. — Nós sabemos
os seus motivos, e os de Tris... Porra, às vezes sinto como se fosse o único
que tivesse presenciado de verdade o que aconteceu! — comentou, irritado.
— Talvez ela queira o Rodrigo, porque com ele é mais fácil.
Arthur riu.
— Você é cego?! — quis saber. Eu não respondi, então ele resmungou
alto. —
— Tris não quer o Rodrigo, nunca quis. Ela o ama tanto quanto ama a
mim ou Pedro, não como o homem dela. Não para ela — completou como se
estivesse dizendo o óbvio.
Antes que pudesse responder, o meu celular vibrou no bolso. Peguei e li
o nome que apareceu no visor, depois mostrei para Arthur, sem atender a
ligação.
— Essa é a porra da minha realidade agora. Meu pai me ligando todo
santo dia, e eu ignorando noventa e nove por cento do tempo. Eu tenho que
tomar uma decisão, para que ele marque uma reunião com o conselho da
empresa sobre o assunto. Tenho que decidir se vou jogar fora a carreira que
venho construindo sozinho, da qual me orgulho, para assumir algo que não
sei nem se desejo. E esse nem é o maior dos meus problemas hoje — disse,
sem esconder minha irritação.
Meu amigo ficou quieto, apenas me ouvindo, então continuei:
— Estou cansado, Arthur — confessei, sabendo que entenderia. — E tão
fodido que... pedi a Tris por uma chance ontem.
Arthur respirou fundo.
— Sei que está cansado, estressado. Sei que o Fernando não está
facilitando a situação com a pressão que vem fazendo, e sabe que pode contar
comigo para o que precisar. Agora, em relação a Tris. Não se esqueça de que
as segundas chances precisam de mais paciência, justamente porque existem
muitas memórias.
— Toda vez que me aproximo demais, ela se afasta — desabafei.
— Theo, essa atitude não é exclusivamente com você. Tris se afastou da
própria família. Ela nem sabia que estou namorando a irmã dela! Qual é, a
quem estamos tentando enganar? Ela não é a mesma pessoa há anos! E só o
fato de ter vindo aqui...
— Eu sei — emendei.
Tudo o que sabíamos permaneceu no ar, não dito por um instante, e fez
com que me sentisse desconfortável na minha própria pele.
— Tris não está lutando contra você, e sim contra ela mesma. ― Arthur
comentou com suavidade, quebrando o silêncio, e continuou: ― Sei que
talvez, aos seus olhos, esse não seja o melhor momento da sua vida para
reencontrá-la, mas às vezes as melhores coisas na vida surgem em meio a
algo doloroso, sofrido, caótico, e quando não conseguimos enxergar uma
saída. Porque no final, a grande verdade é que você precisa da Tris, tanto
quando ela precisa de você.
Eu me calei.
Porque Arthur estava certo, mesmo que eu não admitisse em voz alta.
— Vou visitar um terreno aqui na cidade. Sérgio me contou que meu pai
comprou a área e está planejando construir um condomínio de luxo. Não
devo demorar — comentei, mudando completamente de assunto, sem
esconder o cansaço.
Eu vinha há semanas me questionado como me sentia em assumir o
legado da minha família, e, com aquela atitude, estava dando um passo na
direção.
Arthur assentiu.
— Isso, vá esfriar a cabeça. Nos vemos mais tarde. — Ele desencostou
do carro e deu alguns passos em direção a casa, então parou e virou para
mim: — Ah, só mais uma coisa: cuidado com a Andressa. Viu o que ela
perguntou ontem. Sabemos que isso não vai acabar bem — alertou com um
leve tom de humor no final da frase.
Revirei os olhos e abri a porta do carro.
— Claro, porque sou o homem mais social do mundo, e vou permitir
uma grande aproximação — comentei com ironia, fazendo Arthur rir.
Entrei no carro com a certeza de que me ausentar por uma hora ou duas
era o melhor a fazer. Eu precisava mesmo esfriar a cabeça, porque o dia
estava só começando e, pelo que Ana comentou, seria desafiador para mim
ter como certa a presença de Tris e Rodrigo no mesmo ambiente por um dia
inteiro.
a janela da biblioteca, observei Theo sair de carro. Isso depois de
ele ter delimitado bem a nossa relação em seu discurso. O que não consegui
compreender foi por que doeu tanto em mim ouvir que não faríamos parte da
vida um do outro quando a semana chegasse ao fim. Afinal, em muitos
momentos eu fui a primeira a afastá-lo, justamente por saber que o
distanciamento entre nós era a coisa certa a fazer. Não importava quão
divertido estavam sendo aqueles dias perto de todos.
Suspirando, me joguei no sofá. Diversão. Eu nem lembrava qual tinha
sido a última vez que fiz algo que me deixou verdadeiramente feliz. Eu tinha
transformado nos últimos anos a minha vida em algo chato e monótono, e o
pior foi perceber que estava sempre sozinha. Depois quase uma hora fui
tirada dos meus pensamentos pelo barulho do motor de um carro. Levantei e
avistei Rodrigo saindo do SUV com a Laura e a Andressa. Logo depois o
carro do Pedro surgiu. Acompanhei os quatro se aproximando da casa,
Andressa ria ao lado dos meus amigos, e tentei afastar a sensação estranha
que tinha em relação à garota. Sabendo que não poderia me esconder para
sempre, fui para o quarto e troquei de roupa, colocando um biquíni por baixo
da camiseta e da calça legging preta.
Quando cheguei à área de lazer, encontrei Ana, Laura, Andressa e Pedro,
conversando nas espreguiçadeiras, e, no bar, Rodrigo pegava algumas
bebidas.
— Oi. — Apoiei os braços no balcão do bar de frente para o Rodrigo.
— Oi, linda. Tudo bem? — Ele me deu um beijo no rosto.
— Tudo ótimo — disse, forçando um sorriso, e meu olhar voltou para o
grupo, que, afastado de nós, se divertia, agora sentados na borda da piscina
com os pés na água.
— Tem certeza? — insistiu, debruçando-se sobre a bancada, se
aproximando de mim, e balancei a cabeça em afirmativo, quase como o robô
que me tornei.
Então, fui surpreendia quando Theo surgiu com Joana ao seu lado. Eles
estavam sorrindo, mas assim que Theo me viu com Rodrigo, o sorriso
desapareceu do seu rosto. Eles foram ao encontro dos nossos amigos,
ignorando Rodrigo e eu.
— Já conversou com ele sobre ontem? — Rodrigo chamou minha
atenção, e virei o corpo para poder olhar em seus olhos.
— Sim, hoje pela manhã. Nós chegamos a um ótimo acordo. Iremos
coexistir nessa casa sabendo que quando a semana acabar não continuaremos
na vida um do outro — comentei, buscando Theo com o canto dos olhos só
para encontrá-lo sentando em uma das espreguiçadeiras, com Andressa ao
seu lado.
— Se a minha opinião vale de alguma coisa, vejo que fizeram um
acordo de merda — ele comentou.
— Por que está insistindo nesse assunto? — quis saber, sem conseguir
esconder quão confusa e irritada estava.
Rodrigo pegou uma cerveja e girou a tampinha com um pequeno sorriso
no rosto, como se já não fosse lindo, sério.
— Porque vi vocês dois juntos na boate, se beijando. E você nunca foi
comigo como é com ele. Nunca me olhou como olha para o Theo — Rodrigo
comentou, e desviei o olhar, envergonhada. Ele tocou no meu queixo fazendo
com que o encarasse. — Não estou comentando para deixá-la desconfortável,
Tris. O que tivemos já acabou. Só estou te provando que eu sei que o acordo
que fizeram é um acordo de merda — disse com suavidade, olhando nos
meus olhos e com o rosto muito próximo ao meu, e não consegui responder.
— Ai, Rodrigo! Vem aqui! Você precisa ouvir essa! — Pedro gritou,
interrompendo a nossa conversa.
Sem dizer mais nada, Rodrigo beijou minha testa, pegou algumas
garrafas de cerveja e seguiu em direção ao Pedro e aos demais, me deixando
sozinha observando de longe todos interagirem. Por mais que tentasse evitar,
meus olhos procuraram pelo Theo só para encontrá-lo com Andressa tocando
seu braço.
Incomodada com a cena, fui para a cozinha. Se ficasse lá, acabaria
arrancando aquela garota de perto do Theo pelos cabelos. Era assustador
perceber que todo o meu autocontrole parecia ter sido jogado pela janela do
carro no exato instante em que passei pelos portões daquela casa. Eu não
estava mais conseguindo esconder ou fingir as emoções, que borbulhavam
dentro de mim.
— Tris! Ainda bem que chegou — Joana gritou assim que coloquei os
pés na cozinha. — Leva essa bandeja e coloque na mesa para o pessoal —
disse, já me entregando, e assim me obrigando a voltar para onde havia
acabado de sair.
Eu arrumei todos os petiscos sobre a mesa e decorei em volta com os
pequenos arranjos de flores, objetos decorativos e guardanapos. Quando
terminei, levantei o olhar só para encontrar Theo me observando, mas ele
rapidamente desviou o olhar dando atenção para Pedro, Laura e Andressa, e
sua atitude doeu. Porque me senti invisível, ignorada, sem importância.
Tentando não demonstrar, dei as costas e me afastei, dizendo a mim mesma
que o melhor era ter raiva dele, e da garota que não saía do seu lado.
— Pode me explicar por que razão Ana é amiga dessa Andressa?! —
Entrei na cozinha reclamando, sem esconder a desaprovação, fazendo Joana
me olhar parecendo confusa.
— Desculpa, mas de onde veio essa revolta toda? — quis saber, abrindo
a geladeira e pegando uma cerveja.
— Não gosto dela — retruquei, segurando a embalagem enorme de
batata frita que estava na mesa. — Andressa parece falsa com esses
sorrisinhos constantes, fica perguntando sobre nossas vidas, tocando no Theo
o tempo todo e... — resmunguei enquanto apertava o saco com as duas mãos.
— Ok — Joana me interrompeu, rindo. — Já entendi o real motivo pelo
qual não gosta da garota, não precisa transformar o salgadinho em farofa —
comentou com humor, e tirou delicadamente a embalagem das minhas mãos.
— Não — emendei apontando em sua direção. — Não ouse insinuar que
estou com ciúme — ameacei.
Joana me olhou levantando as sobrancelhas, como se fosse resposta o
bastante.
— Não tem nada a ver com ciúme, e sim com observação de
comportamento e preocupação em relação às amizades da minha irmã! —
afirmei me defendendo, então uma sombra de sorriso surgiu em seus lábios.
Revirei os olhos, jogando as mãos para o alto e resmungando, e saí da
cozinha. Ela não conseguia enxerga o meu ponto de vista. Não adiantava
ficar e insistir. Irritada, sentei em um dos sofás de vime da varanda, abracei
as pernas e apoiei o queixo nos joelhos. Meus olhos se fixaram no lindo
jardim florido do qual minha mãe tanto se orgulhava de cuidar.
— O que está acontecendo com você? — Joana parou ao meu lado,
recostando-se na parede.
Suspirei, ainda irritada.
Como poderia explicar, de um jeito que fizesse sentido, algo que nunca
contei a ninguém?
— Estou aqui faz alguns dias, e ainda não consegui decidir se foi uma
boa ideia ter vindo — admiti, sem fazer contato visual, porque sabia que
meus olhos iriam me entregar. Sabia que Joana conseguiria ver com clareza a
tristeza que havia habitada dentro de mim.
Ela se sentou ao meu lado e cruzou as pernas sobre a almofada.
— Não acha que talvez esteja na hora de parar de se insolar do mundo?
Quem sabe conversar com alguém sobre o que tanto parece te incomodar.
— Não — disse com suavidade. — Existem coisas que prefiro deixar
enterradas dentro de mim — completei, buscando o meu balanço preferido
com olhar.
— Fingir que algo não existe ou aconteceu, não resolve a questão, Tris.
Muitas vezes os fantasmas só desaparecem por completo quando os
enfrentamos — comentou com carinho e tocou na minha mão, fazendo com
que a olhasse. — Se decidir conversar com alguém, saiba que estou aqui —
completou, fazendo com que surgisse um pequeno sorriso em meus lábios.
Aquelas eram palavras de uma amiga, uma irmã mais velha que se
importava comigo, e mesmo que eu não fosse abrir a caixa de pandora que
existia escondida em mim, significou muito sentir que eu poderia ter uma
amiga.
Um ronco alto de motor chamou nossa atenção, interrompendo o nosso
momento. Segundos depois, uma moto vermelha atravessou o portão e parou
diante de nós. O homem que pilotava desligou o motor e tirou o capacete em
seguida.
— Arthur! — disse seu nome sem esconder a surpresa, levantando do
sofá.
Ele sorriu.
— Sexy para cacete isso, hein? — Joana comentou, acompanhando
meus passos em direção ao meu amigo.
E eu sorri, deixando assim para trás a conversa pesada que estamos
tendo.
u fugi.
Na primeira oportunidade que tive, saí de perto de Andressa e de suas
insistentes tentativas de se insinuar para mim a cada chance que tinha. Estava
sendo um inferno ficar ao lado dos meus amigos, tendo aquela garota por
perto. Como se já não bastasse ter que ver Rodrigo e Tris tão envolvidos em
uma conversa, que fazia parecer que os dois estavam vivendo em mundo
particular só deles. Porque, por mais que Arthur tenha me dado um puta
discurso sobre o assunto, não era uma cena agradável de assistir.
Segui pelo corredor da área de lazer que desembocava na cozinha,
imaginando que encontraria Tris, mas não havia ninguém. Continuei até o
hall de entrada e, quando olhei para o jardim, meu sangue gelou.
— Beatriz, o que você pensa que está fazendo? — esbravejei, descendo
os degraus da varanda o mais rápido que pude, seguindo em direção a Tris,
Arthur e Joana.
— Vou aprender a pilotar — comentou, animada, sentada no banco da
moto e com os pés apoiados nas pedaleiras. — Veja, é uma Ducati! — Ela
apontou para o nome escrito na lateral.
— É uma moto de mil cilindradas! — esbravejei parando próximo aos
três, não permitindo que ela continuasse a falar. — Você perdeu
completamente o juízo, Arthur?! Beatriz não pode subir nisso — disse, com
vontade de matar o meu amigo com as próprias mãos, pela primeira vez na
vida.
— Ei. Calma aí. A chave está comigo. — Arthur levantou a mão, me
mostrando a porra da chave.
— Mas ela vai acabar querendo que a ensine e, pela sua cara, vejo que
concordaria com essa loucura — rebati, e sentia como se estivesse quase
gritando.
— Pare de falar como se eu não estivesse aqui, ou fosse incapaz de
tomar as minhas próprias decisões! — Tris esbravejou e levantou do banco,
apoiando os pés na pedaleira, ficando da minha altura e me encarando. —
Qual é o seu problema? Eu quero aprender e Arthur vai me ensinar, sim! —
disse, enfurecida.
— Isso — apontei para a moto — não é brinquedo.
— Eu sei! — ela gritou.
— Você não pode! É pesada demais para você, vai acabar se
machucando — esbravejei.
— Claro que eu posso! Você mesmo me disse que sou livre para tomar
minhas próprias decisões. Livre para fazer o que eu quiser, com quem eu
quiser — ela emendou, cruzando os braços, me encarando visivelmente
magoada, enquanto usava as minhas palavras contra mim.
Arthur e Joana, ao nosso lado, permaneciam calados, e a tensão era
palpável.
— Não quando é algo que pode colocar a sua vida em risco. Arthur, me
dê a chave — exigi, ele a jogou na minha direção, e eu a peguei no ar. — Se
quiser dar uma volta de moto, eu levo você. Mas não vou deixar Arthur lhe
ensinar a pilotar uma desse porte — disse a ela, olhando em seus olhos.
— Tris... talvez seja melhor começar com uma menor — Joana
comentou, se aproximando e se posicionado entre nós dois.
— Eu posso trazer outra moto, assim nós poderemos te ensinar com
mais segurança — Arthur sugeriu, e me olhou em seguida. Eu não sabia se
ele estava buscando convencer a Tris de desistir, ou me acalmar, evitando
assim que eu a tirasse dali à força.
A mulher mais teimosa do mundo, que adorava dificultar a minha vida,
continuava sem desviar o olhar do meu. Eu sabia que ela estava enfurecida,
mas nem fodendo iria permitir que a vida da garota que amo corresse risco.
— Está bem! — ela esbravejou e, com ajuda do Arthur, desceu da moto,
e eu respirei aliviado. Então, ela levantou o dedo em minha direção. — Mas
não se atreva a dar um sorrisinho por ter conseguido o que queria. Nem
unzinho — completou parando à minha frente por um instante, então nos deu
as costas e voltou para a casa pisando forte, nos deixando para trás.
— Cara... você está ressignificando algumas palavras como possessivo,
superprotetor, ciumento, mandão... E não é no bom sentido — Arthur
comentou ao meu lado, enquanto eu observava Tris desaparecer porta a
dentro.
Eu sabia que ele estava certo, mas aquela cena me fez perder a cabeça.
Porque, por um instante, me vi atormentado com a possibilidade de perdê-la,
e não suportaria correr tamanho risco.
Era como se todo o restante da minha vida estivesse de pernas para o ar,
e a Tris fosse a minha chance de gravidade, a única coisa que pudesse me
ajudar a manter os pés no chão. Só que, infelizmente, na dinâmica que
sempre existiu entre nós, era eu que ocupava o papel de pessoa forte. Eu era o
garoto que a protegia de tudo e de todos. Que enxugava suas lágrimas, que
corria quando ouvia seus gritos e choro. Tris sempre foi a minha princesa em
apuros, e fiz questão de crescer tratando ela como tal. Por esse motivo,
muitas vezes era devastador perceber que todas aquelas lembranças pareciam
existir somente nas minhas memórias.
— Se o seu objetivo é conquistá-la — a voz da Joana me arrancou dos
pensamentos, me trazendo para o momento presente —, acho melhor
repensar a sua estratégia — disse em tom de advertência, me olhando nos
olhos.
— Eu sei. — Limpei a garganta ruidosamente, sem esconder o
desconforto. — Eu não pensei. Só enlouqueci quando vi a cena. Peço
desculpas por isso — disse com sinceridade, sabendo que Tris estava furiosa,
e que eu havia acabado de criar mais um abismo entre nós.
— Só pra deixar uma coisa bem clara aqui, Theo — Arthur cruzou os
braços —, você me conhece o bastante para saber que eu nunca faria nada
estúpido para colocá-la em risco.
— Eu sei.
— Então, por que razão decidiu fazer mais essa idiotice? Já não basta a
que fez ontem à noite? — Arthur emendou, e seu tom acusatório foi um soco
silencioso na minha cara.
— Não precisa me lembrar — resmunguei.
— Querido, ela não tem mais cinco anos — Joana comentou cruzando
os braços. — E isso aqui não é uma árvore da qual pode ficar embaixo por
horas tomando conta para Tris não cair — completou, arqueando as
sobrancelhas ao me dar aquele conselho, bronca, esporro, ou quem sabe um
pouco de cada.
— Não, Joana. É muito pior. Porque durante anos Tris contou comigo
para pegá-la. Ela queria que eu estivesse lá. E agora... nem tenho certeza se
me quer por perto — disse com pesar ao chegar àquela conclusão.
Arthur segurou forte em meu braço, me obrigando a encará-lo.
— Já te disse que não poderia estar mais errado. Então, faça o correto e
pare de ignorar a porra do elefante branco do passado que existe entre vocês
dois! Porque de todas as merdas que estão acontecendo na sua vida, essa você
pode resolver, aqui, agora. E, mais que isso, é sua chance de ter finalmente
quem sempre quis — disse, sem fazer questão de esconder a irritação.
A expressão de Joana deixava claro o seu não entendimento do que
Arthur havia dito.
— O que você quis dizer com... — Joana começou a formular uma frase,
mas antes que tivesse tempo de completar, Arthur pegou o celular no bolso.
— É melhor nós entrarmos. Ana já me ligou duas vezes, e não atendi
com todo esse drama aqui fora. — Ele colocou o aparelho de volta no bolso e
nos encarou. — Vamos, antes que tenhamos mais uma mulher da família
Schimidt gritando e dando ataque hoje. — Ele passou por nós e eu entreguei
a chave da moto.
Eu sabia o que ele tinha acabado de fazer. Mais uma vez estava
protegendo um segredo que não podia continuar enterrado, e fazendo isso por
pedido meu. Porque não cabia a ele dizer em voz alta.
unca imaginei que fosse desejar estrangular uma pessoa usando as
minhas próprias mãos, mas, naquele instante, eu odiava o Theo o bastante
para fazer isso.
Ele me tratou como se eu fosse uma criança, e por mais que estivesse
certo, não tinha o direto de me proibir de fazer algo. Eu estava fervendo de
raiva, por todos os motivos. Ele me magoou com palavras, então me pediu
desculpa e disse friamente que não existia nenhum tipo de relação entre nós
quando tentei conversar. Depois, deu atenção a sonsa da Andressa e, para
completar, me proibiu de aprender a andar de moto aos gritos!
Entrei na cozinha lutando para me calmar e não colocar o desejo de
apertar seu pescoço em prática. De longe, conseguia ouvir as vozes das
meninas, assim como as risadas de Rodrigo e Pedro. Abri a geladeira, peguei
uma cerveja, encostei na bancada e tomei um grande gole do líquido gelado,
de olhos fechados. Eu tinha imaginado algo diferente para aquela semana.
Algo um pouco mais tranquilo, menos desafiador.
Ouvi os passos de alguém se aproximando.
— Oi! — A voz da insuportável da Andressa me obrigou a abrir os
olhos.
— Oi — respondi, olhando para a garrafa em minha mão.
— Você viu o Theo? — perguntou se debruçando na bancada, e faltou
pouco para que seus seios pulassem do minúsculo biquíni que usava. Na parte
de baixo, o short curto não melhorava a situação.
A garota tinha perdido totalmente a noção do perigo falando comigo
justamente quando eu estava a ponto de explodir.
Eu olhei para ela de cima a baixo.
— Você não está com frio não? — perguntei com ironia.
— Nem um pouco. Só quero saber se viu o Theo — disse, me encarando
de jeito provocativo, como se eu precisasse de mais alguma coisa para me
irritar.
— Olha só — coloquei a garrafa sobre a bancada, e a encarei —, ainda
não percebeu que o Theo não quer nada com você?
Andressa arqueou as sobrancelhas e sorriu.
— Ele não quer? Tem certeza?
— Tenho. Fica longe dele — ameacei.
— Qual é o seu problema, Beatriz? — Ela cruzou os braços, como se
fosse a própria dona do mundo. — Desde que chegou parece que a cada dia
quer um diferente, escolhe de uma vez! Volta para o Rodrigo ou pega logo o
Pedro, e deixa o Theo para mim. Porque sei muito bem fazer ele me querer.
— Seu tom era carregado de malícia, e então ela abriu um sorrisinho irônico.
— Saia da minha casa agora! — gritei apontando para a porta, e ela riu.
Todos apareceram quase que ao mesmo tempo. Pedro, Rodrigo, Laura e
Ana vieram da área de lazer. Pouco depois, Theo, Arthur e Joana surgiram do
hall de entrada. Eles pareciam não compreender o que estava havendo, mas
ninguém disse uma palavra.
— Você não pode fazer isso. — Ela sorriu, me encarando.
— Tanto posso que estou fazendo — emendei, dando dois passos e me
colocando ainda mais próxima dela.
— Tris, o que está acontecendo aqui? — Ana veio para o meu lado.
— Não acredito que essa garota seja uma boa companhia pra você —
comentei, encarando Andressa.
Andressa deu outra gargalhada.
— Ahh, eu não sou “boa companhia” para a sua irmã porque quero o
Theo? Engraçado isso porque quem anda agindo como uma piranha nos
últimos dias é você, queridinha.
Sem pensar fui para cima da Andressa levantando a mão, e ela veio ao
meu encontro, e tudo aconteceu muito rápido.
Pedro segurou Andressa.
Arthur se colocou à frente de Ana.
Theo me segurou pela cintura e girou, me obrigando a ficar de frente
para ele e de costas para Andressa.
Levantei a cabeça aos poucos, e meus olhos correram por seu peito,
pescoço, boca até que me deparei com um par de olhos azuis semicerrados.
Rapidamente ele passou a mão pelo meu corpo e me colocou em seu ombro.
Pega de surpresa, gritei.
— Theo, me solta! Me coloca no chão agora! — eu gritava e esperneava
enquanto ele me tirava da cozinha, sob o olhar de todos.
— Não! — esbravejou e continuou andando pela casa comigo de cabeça
para baixo, e agindo como se o meu peso não fosse nada.
— Me solta, Theo, estou falando sério! — gritei de novo, e dei um soco
inútil em suas costas, quando ele começou a subir os degraus da escada.
— Já disse que não! — repetiu, enquanto segurava as minhas pernas
com firmeza, impedindo que continuasse me debatendo.
Dei um tapa em sua bunda.
Ele fez o mesmo comigo em resposta.
De repente nós paramos, ele abriu uma porta e em seguida fui
arremessada sobre uma cama.
— Agora pode me dizer que porra foi aquela na cozinha?! —
esbravejou, batendo a porta com força.
— Aquela garota é uma ridícula e estava falando o que não devia, o que
não sabe! — respondi aos gritos, ajoelhada na cama... dele. Em um dos
quartos de hóspedes que já estava sendo dominado pelo cheio do seu
perfume.
— E você ia avançar nela por isso?!
— Sim! Você não sabe quem ela é!
— Sei exatamente quem ela é, e o que estava tentando fazer! Você acha
que sou idiota? — emendou gritando, gesticulado à minha frente.
— Ela passou a maior parte do tempo se jogando em cima de você! —
comentei aos gritos, ao ficar de pé na cama, ciente de que a casa inteira
possivelmente estava conseguindo ouvir nossa discussão. Mas, não me
importava porque eu estava cansada de viver escondendo tudo.
— Eu sei! Eu estava lá! E daí? — Theo gritou de volta.
— E daí que ela é uma oferecida! — gritei, irritada, e bati o pé no
colchão.
Eu estava com tanta raiva que havia me tornado o tipo de garota que
batia com o pé quando está brava e fazia cena de ciúme. Eu não estava mais
me reconhecendo. Quem era aquela nova Beatriz Schimidt? Porque
definitivamente não era eu.
— Já disse que estava lá, Beatriz, eu sei disso!
— Você estava gostando?! É isso o que está me dizendo? — falei alto.
Theo cruzou os braços e ficou me olhando. — Por que você está me olhando
desse jeito?! — emendei no mesmo tom.
— Que jeito? — quis saber, mais calmo.
— Como se eu fosse uma bomba relógio a ponto de explodir na sua
frente! — gritei para ele, gesticulando com os braços.
— Porque é exatamente isso que está parecendo. Se eu estivesse
interessado na Andressa estaria com ela, e não aqui com você. Não existe
motivo para essa cena de ciúme — respondeu em um tom mais próximo ao
seu normal.
— Não estou com ciúme! Não tenho ciúme de você! — afirmei aos
gritos, completamente irritada, mas nem eu conseguia acreditar naquelas
palavras.
— Ah, não? Então me diz o porquê disso tudo? — ele emendou, olhando
diretamente em meus olhos, e não consegui responder.
Porque eu estava mentindo, e muito mal. Tentando enganar mais a mim
mesma do que ao Theo, porque me sentia fervilhando por dentro de ciúme.
Tinha sentido ciúmes de todas as mulheres que demostraram qualquer tipo de
interesse nele desde o primeiro dia que o reencontrei. Só não queria que ele
soubesse.
— Quer saber, Theo, sai daqui. — Dei as costas, ainda de pé sobre a
cama.
O silêncio prevaleceu, e esperei ouvir a porta bater me indicando que
estava só.
— Beatriz, você vai me deixar maluco... — Sua voz surgiu quase em um
sussurro. — Pelo amor de Deus, decide o que quer. Digo que te quero, você
me rejeita. Outra mulher demonstra interesse e você faz isso. Porra, minha
vida já está fodida o bastante para ter você me enlouquecendo — confessou
baixinho, e girei o corpo a tempo de vê-lo passando a mão pelos cabelos com
os olhos fechados.
— Não, Theo. É a sua presença nessa casa que vai deixar maluca —
confessei, irritada, ao perceber como me sentia perto dele.
Pisando forte, desci da cama, parando à sua frente apenas para empurrá-
lo para fora do meu caminho, mas Theo agiu rápido e, sem que percebesse
como, eu estava em seus braços e sua boca devorava a minha, e eu
correspondi. Ele me ergueu pelo quadril e me imprensou contra a parede,
minhas pernas envolveram sua cintura, e em segundos eu estava sendo
esmagada no melhor sentido possível por aquele homem. Theo me beijava
com tanta intensidade que eu não conseguia respirar. Era como se aquele
fosse o nosso primeiro, ou quem sabe o último beijo, sempre tomando um
pouco de mim para si. Seus dedos apertavam meu quadril a cada investida da
sua língua em minha boca, e eu o trazia mais para perto, puxando seu cabelo,
como se não estivéssemos próximos o bastante. Eu estava completamente
sem ar quando seus lábios se afastaram dos meus, apenas o suficiente para
que tocassem meu pescoço, fazendo o meu coração disparar um pouco mais.
— Pare de tentar lutar contra nós — sussurrou, ofegante, e beijou em
uma lenta tortura meu pescoço, enquanto tirava minhas pernas com cuidado
de sua cintura até que meus pés tocaram de volta ao chão. — E decide de
uma vez o que quer — pediu baixinho no meu ouvido, e antes de se afastar
me beijou de novo, com suavidade.
Meus lábios estavam formigando, e eu, tendo dificuldade de me manter
de pé sozinha e de respirar ao mesmo tempo, que dirá compreender o que
havia acabado de acontecer.
— Está tudo bem aqui? — A voz da minha mãe surgiu na porta do
quarto.
Theo se afastou.
— Está tudo bem sim, Marina — respondeu por nós, sem tirar os olhos
de mim antes de sair do quarto, me deixando para trás.
E pela primeira vez tive vontade de dizer a verdade à minha mãe. Que
não, nada estava bem. Que eu estava confusa, com medo. Que não conseguia
lidar com a certeza que havia surgido dentro de mim. Não estava
conseguindo lidar com o fato de assumir para mim mesma que eu amava o
Theo.
— Filha, o que aconteceu aqui? — quis saber, assim que Theo fechou a
porta.
Sentei na cama sem saber por onde começar. Porque o que aconteceu foi
que minha vida virou de cabeça para baixo desde que pisei naquela casa. O
que aconteceu foi que todos os muros que construí estavam caindo pouco a
pouco. Tijolo a tijolo.
— Não sei, mãe — disse baixinho, apoiando os cotovelos no joelho e
escondendo o meu rosto com as mãos.
— Beatriz, eu nunca vi você brigar ou gritar dessa maneira com alguém!
— me reprendeu, e se calou por um instante. — O motivo da briga foi mesmo
o Theo? — quis saber, sem esconder a desaprovação. Sem dúvida a Ana
contou tudo.
Assenti.
— Olha, eu não sei o que está acontecendo entre vocês dois, mas hoje
tudo pareceu fora de controle. Ele carregando você no ombro pela casa
porque estava brigando com Andressa, depois a discussão que nós ouvimos
de longe, e quando entro no quarto vejo vocês se beijando.
— Mãe...
— Não! Vocês não estão agindo de maneira normal. Se não quiser me
contar o que está havendo com você vou respeitar, mas a última coisa que o
Theo precisa é desse tipo de descontrole da sua parte — afirmou, brava,
parecendo falar por impulso, e eu fiquei sem compreender.
— Mãe, o que quer dizer com isso?
Ela respirou fundo, inquieta à minha frente, e rapidamente percebi uma
leve mudança em sua expressão.
— Theo precisa de uma amiga, precisa de você — afirmou, e então se
calou. — Estou ultrapassando uma linha que havia sido delimitada ao dizer
isso, mas precisava perguntar ao Theo sobre Patrícia — comentou em tom de
voz mais suave, e eu não gostei da sensação estranha que tive.
— O que está acontecendo, mãe? — quis saber, sem esconder a
preocupação. Porque senti que poderia ser algo ruim.
— O que está acontecendo é que às vezes precisamos deixar o nosso
mundo de lado por um tempo, e abraçar com força o de outro alguém —
disse baixinho, tocando meu rosto com carinho, e colocou alguns fios de
cabelo atrás da minha orelha. — Agora vá e procure o Theo.
Sem perguntar mais nada, levantei e saí do quarto correndo. Passei pela
Joana no corredor, que me disse algo que não compreendi e segui para a
cozinha apenas para encontrá-la vazia. Fui apressada até a piscina, mas Theo
também não estava lá. Depois de alguns minutos procurando
desesperadamente pela casa, corri para o jardim e caminhei em várias
direções sem saber o que pensar, até encontrá-lo sentando na grama ao lado
do meu balanço. Suas pernas estavam dobradas e os braços apoiados sobre
elas. Com uma garrafa de cerveja na mão, ele observava as montanhas verdes
à frente.
uvi passos se aproximando, mas não virei para ver quem era. Não
me importava. Eu queria ficar sozinho. Precisava me acalmar para lidar com
o que estava acontecendo na minha vida, ou iria enlouquecer no processo.
De cabeça baixa, continuei brincando com a garrafa em minha mão.
— O que está acontecendo com a Patrícia? — A voz da Tris surgiu
suave, e logo pude ver seus pés surgirem ao meu lado.
Sem conseguir levantar o olhar, passei a língua nos lábios, como uma
preparação para as palavras que precisaria pronunciar em voz alta, e respirei
fundo.
— Ela está doente. Tumor no cérebro e... o prognóstico não é dos
melhores — disse baixinho, soltando todo o ar dos meus pulmões, e me calei.
Deixei que o silêncio completasse que aquilo significava que existia uma
grande chance da minha mãe não sobreviver.
— Ai, meu Deus, Theo. — Seu sussurro foi carregado de surpresa,
tristeza e dor.
Meu olhar se prendeu nas montanhas à frente, na calma do verde
constante, me recursando a encará-la por medo de encontrar o pesar pela
notícia em seu olhar. Eu não suportaria recebê-lo de Tris, porque nunca fui de
me vitimizar na vida. Eu era o oposto, àquele que lutava, que segurava o meu
mundo e o das outras pessoas. Eu era aquele que fazia os problemas
desaparecer, e não o que os criava.
— Theo — ela sussurrou e se abaixou à minha frente, apoiando as mãos
nas minhas pernas —, por que não me contou? — quis saber, tentando fazer
com que olhasse em seus olhos.
E, quando finalmente fiz, os encontrei cheios de lágrimas, e aquilo
acabou comigo.
Como. Toda. Maldita. Vez.
— Minha mãe pediu segredo total. Não tive como negar — confessei
com tristeza.
Também não podia negar que me sentia um pouco mais aliviado por
finalmente alguém ter pensado em mim, no meio de tudo o que estava
acontecendo. Porque, independentemente das brigas ou de qualquer situação
de gato e rato que estivesse acontecendo entre nós, ela era minha amiga.
Sempre foi e muitas vezes é só disso que precisamos.
— Como ficou sabendo? — quis saber, soltando todo o ar dos pulmões
na esperança de colocar parte da pressão, da raiva e da angústia que estava
sentindo, para fora do meu peito.
— Minha mãe disse que eu deveria te perguntar. — Tris sentou ao meu
lado. — Só queria entender por que você não me contou algo tão... — Ela
deixou a frase em aberto enquanto passava a mão nos meus cabelos, como se
seu toque tivesse o poder de fazer tudo ficar um pouco melhor.
— Tris, nós não nos víamos há anos. Como eu poderia chegar para você
e perguntar; e aí como vai a vida? Ah, esqueci de comentar, minha mãe está
com um tumor no cérebro e, devido à localização, os médicos não estão
aconselhando cirurgia, e disseram que mesmo fazendo químio e radioterapia,
ela não deve ter mais que um ano e pouco de vida — despejei tudo olhando
em seus olhos, sabendo que ela estava a ponto de chorar.
— Theo. Eu... eu sinto muito. Sinto muito — murmurou, chorosa,
deixando uma lágrima cair.
Larguei a garrafa no chão, no mesmo instante, e a coloquei em meu
colo. Tris passou os braços pelo meu pescoço e escondeu o rosto, se
permitindo chorar por alguns minutos, dividindo a dor que eu estava
sentindo. Chorando parte do que não me permitia chorar na frente de
ninguém, deixei, porque foi a primeira vez desde que soube do diagnóstico
que me permiti sentir a dor, o pesar do que a doença significava.
— O que posso fazer por vocês? — Sua voz saiu abafada de encontro ao
meu corpo.
O seu carinho e o apoio era tudo que eu desesperadamente precisava e
nem havia percebido. Só de estar ali, em meus braços, Tris já estava me
dando força para continuar a lutar, mesmo sem saber se faria diferença no
final.
— Vocês já estão fazendo. Seus pais são amigos incríveis, sabia? —
comentei, e ela levantou a cabeça olhando nos meus olhos. — Quando fiquei
sabendo da doença — continuei —, eu quis que a minha mãe ficasse comigo
em Londres, que fizesse o tratamento lá. Mas, ela preferiu voltar para o Brasil
e fazer o tratamento aqui, tendo os amigos por perto — expliquei, enquanto
enxugava, com o polegar, as lágrimas que continuavam a cair pelo seu rosto.
— Vou ficar ao lado de vocês para o que precisarem — disse, cheia de
segurança, enquanto assentia afirmativamente.
Beijei sua testa.
Porque em pouco minutos vi diante de mim a Tris com quem cresci,
com quem convivi boa parte da minha vida, vi a minha amiga. Uma mulher
que, além de briguenta, atrevida, e de temperando forte, era também doce,
decidida, amorosa e empática.
— Minha mãe foi enfática ao dizer que eu não poderia contar nada para
você. Insistindo que essa semana era para ser uma grande diversão, e que não
queria ver lágrimas ou tristeza — comentei, apoiando a minha testa na sua.
Tris se afastou de mim, o suficiente para olhar em meus olhos.
— Era sobre isso que estavam conversando na varanda no outro dia? —
quis saber, desconfiada.
Assenti.
Porque não esconderia mais nada. Se aquela era nossa primeira
oportunidade de uma conversa sincera, não iria desperdiçá-la.
— E o seu pai? — continuou questionando.
— Ele sabe — emendei, e Tris ficou me olhando. — Você quer mesmo
ouvir tudo o que aconteceu?
Ela assentiu, e se acomodou melhor no meu colo.
— Minha mãe descobriu a doença há cinco meses, mas só contou para a
Marina e para o Sérgio. Ela levou dois meses para me contar. Caramba, Tris,
meu mundo caiu. Meus pais haviam se separado havia um ano, e a minha
mãe mal estava se reconstruindo do impacto do divórcio quando soubemos da
doença. Eu fiquei revoltado. Primeiro com Deus, por permitir que ela ficasse
doente, e depois com o meu pai por ter sido um marido de merda no final.
Então, fiquei revoltado com a minha mãe, por ter demorado meses para me
contar — contei com tristeza, enquanto Tris apertava a minha mão com mais
força.
— Ela não sabia como — ela disse, como se estivesse me mostrando o
absurdo que eu tinha acabado de falar. Aquilo, de alguma forma, me fez dar
um pequeno sorriso.
— Eu sei — disse, e beijei sua testa, de novo. — Depois, liguei para o
meu pai e despejei o que estava acontecendo com a minha mãe, sem prepará-
lo antes. Como se ele fosse o grande e único culpado de tudo. Quando meu
pai se recuperou do susto, me disse que faríamos absolutamente tudo por ela.
Disse que minha mãe teria os melhores médicos, tratamentos, que
buscaríamos o melhor cirurgião do mundo se preciso fosse, e que ela ficaria
curada. A melhor assistência do mundo nós iriamos prover. — O tom da
minha voz foi diminuído a cada frase pronunciada.
Tris apoiou a cabeça em meu ombro e entrelaçou nossos dedos. Ficamos
em silêncio por um instante.
— Pelo visto é isso que se ganha depois de ser traída: um câncer e um
ex-marido rico com peso na consciência querendo comprar seu perdão. Como
se a minha mãe já não tivesse dinheiro suficiente — completei com ironia e
tristeza, pensando alto.
— Theo, não diga isso. — Ela levantou a cabeça para olhar em meus
olhos. — Não julgue o Fernando desse jeito. Eles se amaram no passado, e
não é por que a relação acabou de um jeito ruim que ele não iria se preocupar
com a vida da Patrícia. Seu pai nunca se sentiria feliz ao ver sua mãe sofrer
— comentou com delicadeza, tocando em meu peito.
— Honestamente, não me importo com ele. Só com a minha mãe —
respondi olhando em seus olhos, e Tris assentiu.
Sabia que ela não estava defendendo o que meu pai fez, mas não era o
momento de tentar me fazer vê-lo de outra maneira, a não ser como o canalha
que estava comendo uma das executivas da empresa e traindo a minha mãe.
— O que vai fazer? — ela quis saber, e contei a verdade.
Que deixaria a minha vida atual para trás e voltaria para o Brasil para
cuidar da minha mãe, e aos poucos me preparar para assumir a presidência da
empresa da minha família, porque não seria algo que aconteceria do dia para
a noite.
Segurei seu rosto com as duas mãos, fazendo com que me olhasse.
— Tris, mas se em algum momento eu tiver que escolher entre assumir a
empresa, ou encontrar uma forma de salvar a minha mãe. Bom... digamos
que, foda-se o legado da família — confessei, e ela assentiu.
— Entendo, mas sei que vai conseguir. Ainda mais tendo o apoio total
do Fernando — disse, confiante, colocando a mão sobre a minha.
Fechei os olhos e respirei fundo, lutando para não explodir e acabar
sendo um babaca com ela, porque Tris não sabia de toda a história.
— Fui eu que flagrei o meu pai transando com uma das executivas da
empresa na sala dele — contei, o que, até aquele momento, só meu pai e eu
sabíamos.
Tris fechou os olhos na mesma hora, percebendo que talvez fosse levar
muito tempo até surgir alguma chance de haver um bom entendimento entre
meu pai e eu.
— Ele não importa agora, só a Patrícia — repetiu a minha frase, e eu
sorri.
— Eu quero tanto conseguir curá-la, Tris. Quero tanto conseguir
enxergar uma luz no fim desse túnel — confessei baixinho, sem esconder
toda a minha tristeza.
Tris envolveu os braços no meu pescoço e escondeu o rosto em meu
corpo. Eu a acomodei no meu colo e a abracei forte, recebendo parte da sua
força junto com carinho.
Meu coração ainda estava apertado, mas ao dividir a história, contar tudo
para Beatriz, fez com que eu me sentisse um pouco mais leve, e me fez
acreditar que as coisas poderiam ficar um pouco mais fáceis para mim.
Minha mãe estava morrendo, aquilo era um fato. E me destruía por
dentro saber que eu ainda não tinha conseguido encontrar uma forma de
salvá-la.
Não falamos mais nada por muito tempo, e quando Tris levantou a
cabeça e me olhou com tristeza, enxuguei suas lágrimas e ficamos
observando o entardecer juntos.
Eu não a tirei do meu colo, e nem ela tentou se afastar de mim. Tris
reagiu como se aquele lugar pertencesse a ela.
O vento fazia com que o balanço ao nosso lado se movesse para frente e
para trás, repetidas vezes, dando uma sensação agridoce ao momento que
estava vivendo, mas ao mesmo tempo a certeza de que aquele era exatamente
o lugar em que eu deveria estar.
irei de lado na cama pela centésima vez, sem conseguir dormir.
Com tantos acontecimentos, a minha cabeça parecia não desacelerar. Em
menos de uma semana, fui bombardeada por todos os tipos de informações,
tanto da minha família quantos dos amigos, e me sentia emocionalmente
exausta. A notícia da doença da Patrícia tinha caído sobre mim como a maior
delas, e havia me devastado. Repassei os momentos que conversamos e toda
a história de vida que compartilhamos até ali. Ela é amiga da minha mãe
desde que nasci, e eu a amo. Por mais que desejasse conversar e dar todo o
meu apoio, ainda não me sentia forte o bastante para não desabar em lágrimas
à sua frente, e Patrícia precisava do meu apoio, e não de ser a pessoa a
confortar.
Deus, o que eu tinha feito da minha vida ao me afastar de todos que
amava? Ao vendar meus olhos para tudo, passei a não saber de coisas
simples; como que minha irmã estava namorando um dos meus melhores
amigos. Nem tinha percebido o quanto minha mãe estava abatida com a
doença da melhor amiga, e que meu pai estava trabalhando mais tempo de
casa para apoiá-la. Deus, como eu não havia reparado que, mesmo com toda
sua energia, vovô estava mais envelhecido, e como havia magoado Rodrigo
ao sumir sem dar nenhuma explicação. E para completar tudo, doeu ouvir
Theo contar sobre a doença da mãe com lágrimas nos olhos, sabendo que não
estive ao seu lado quando recebeu a notícia.
Verifiquei a hora no celular. Passava da meia-noite. Sabendo que dormir
não seria uma possibilidade, levantei. Eu precisava espairecer de alguma
forma. Suspirei pegando o biquíni, me troquei, vesti o roupão por cima,
agarrei uma toalha limpa e saí do quarto.
Sem fazer barulho, atravessei a casa com o destino definido em mente.
Apertei o interruptor e alguns spots em volta da piscina se acenderam, sorri.
Sempre achei linda a piscina iluminada daquela forma, com apenas algumas
luzes direcionadas para água. Eu tinha visto aquilo em uma foto, numa das
muitas revistas de decoração da minha mãe, e mostrei ao meu pai. Eu tinha
uns 16 anos na época, e disse que deveríamos ter uma piscina chique e sexy.
Sorri com as minhas lembranças ao deixar a toalha na espreguiçadeira e
desamarrar o roupão, imersa em um silêncio que não lembrava em nada com
o dia intenso que tivemos.
— Tris — uma voz murmurou.
Virei na direção.
— Meu Deus, que susto, Theo! — comentei, levando a mão ao peito,
sentindo que estava disparado.
— Desculpa — disse baixinho, se aproximando lentamente. — Entrei na
cozinha e vi quando a luz acendeu — explicou, parado a pouco mais de um
metro de mim.
— Não consigo dormir — confessei, apertando os ombros tensos e
doloridos.
— Nem eu — comentou baixinho, enquanto seus olhos percorriam
suavemente meu corpo, e depois o silêncio veio. — Posso me juntar a você?
— Apontou para a piscina.
Olhei para a água, depois para Theo, e assenti.
— Claro.
Dei as costas e, apressada, segui para a escada da piscina, porque
imaginei que vê-lo tirar a roupa seria distração demais para mim, e já bastava
saber que estávamos sozinhos e que provavelmente ninguém apareceria
àquela hora. Desci os degraus com cuidado e mergulhei. Quando voltei à
superfície e abri os olhos, ele estava à minha frente. Lindo, com o peito à
mostra e os cabelos molhados e bagunçados, como se tivesse acabado de
passar a mão nos fios. Eu movimentava as pernas lentamente para me manter
flutuando, já que meus pés não alcançavam o fundo.
Theo me segurou pela cintura e me aproximou de seu corpo e, em
seguida, nos afastou suavemente, como se estivéssemos numa pequena
dança, sem música, só nossa. Com um leve sorriso no rosto, abri os braços
sobre a água e inclinei o corpo para trás, e, parecendo ler meus pensamentos,
Theo apoiou as duas mãos nas minhas costas para sustentar o meu corpo, me
deixando na horizontal sobre a água. Fechei os olhos e ficamos assim. Eu só
ouvia o som da minha respiração e do meu coração, que batia mais forte a
cada minuto. Senti o corpo de Theo se aproximar de mim quando,
delicadamente, me colocou na vertical de novo e me abraçou pela cintura.
— Não tinha ideia do quanto sentia a sua falta até te reencontrar — ele
sussurrou.
— Theo, eu... — A frase morreu em aberto, enquanto meus dedos
faziam uma trilha nos relevos dos músculos de seu peito, até chegar em seu
braço.
Havia tanta coisa que gostaria de dizer a ele. Tantas confissões a serem
feitas. E meu coração parecia saber porque lutava tentando sair do peito,
enquanto o meu corpo inteiro denunciava o quanto me sentia atraída por ele.
Era uma batalha inútil àquela altura tentar esconder, tentar enganar a nós
dois. Theo me puxou até meus seios colarem em seu peito, e seus lábios
percorreram o meu pescoço, quase queimando a minha pele.
— Por favor, não minta. Não minta dizendo que não sente a minha —
sussurrou em meu ouvido, me provocando, me seduzindo ainda mais.
— Não vou mentir. É claro que sinto sua falta — confessei baixinho,
fechando os olhos e com a respiração pesada enquanto inclinava levemente a
cabeça para trás, porque precisava de um segundo, um segundo longe de seu
feitiço para não perder completamente o controle sobre mim mesma. Mas,
com isso, meu pescoço e seios ficaram expostos, e quando olhei para Theo
novamente ele estava observando cada parte do meu corpo, como se eu fosse
tudo que mais desejava, e o sentimento era mútuo, mesmo que eu lutasse para
esconder, para negar, e vinha fazendo daquilo um trabalho de tempo integral.
Ele envolveu o meu corpo com um dos braços, me segurando tão forte,
que seus dedos pareciam tatuagem em minha pele. Enquanto a outra tocava
meu pescoço, sua boca passou a se aproximar da minha sem pressa, como se
estivesse aguardando qual seria a minha reação daquela vez, e foi quando
surpreendi a nós dois tomando a iniciava e o beijando vagarosamente,
acariciando sua língua, saboreando seu gosto, até que em poucos segundos
ele tomou o controle do beijo de um jeito delicioso, possessivo, e me vi mais
uma vez completamente entregue a nós.
Sem deixar de me beijar, ele caminhou comigo abraçada ao seu corpo,
como se eu fosse um coala, até chegarmos à borda da piscina. Então, fui
imprensada contra a parede de azulejos, que era exatamente onde eu tanto
desejava estar, em seus braços, sentindo suas mãos e boca pelo meu corpo.
Tudo o que vinha lutando para afastar e do que desesperadamente precisava.
Ele mordeu meu lábio inferior enquanto seus dedos desfaziam o laço do
biquíni em meu pescoço, e pouco depois a peça flutuava sobre a água. Ele
beijava o meu colo, meus seios, seguindo em uma lenta tortura descendo em
direção ao abdômen, enquanto me suspendia pouco a pouco, me tirando da
água para que pudesse continuar trilhando o caminho com seus beijos. E,
com cada um, ele parecia despertar, acender e incendiar um novo centímetro
do meu corpo. Era como se Theo o conhecesse melhor do que eu mesma, e
estivesse disposto a me provar o quanto realmente éramos perfeitos juntos.
— Tris... se quiser que eu pare precisa me dizer — disse baixinho, os
lábios próximos aos meus enquanto sua mão segurava minha nuca e seus
dedos se entrelaçavam nos fios do meu cabelo, como se ele estivesse lutando
para se controlar.
— Não quero que pare. — E como resposta cruzei os calcanhares em
torno de sua cintura, com mais força para não o deixar se afastar de mim.
Meus braços se fecharam de novo com o mesmo nível de posse em seu
pescoço e o sorriso que surgiu em seus lábios só foi mais uma prova do
quanto tudo era certo.
— Quero tanto você — sussurrou em meu ouvido, enquanto sua mão
subiu pela minha perna até o quadril, desfazendo o laço da parte de baixo do
meu biquíni, sem deixar de me beijar. Primeiro um lado, depois o outro. O
calor do seu corpo junto ao meu e a água morna da piscina me faziam suar.
Theo segurou meus cabelos me fazendo levantar a cabeça, e mordeu
levemente meu lábio inferior antes de tomar a minha boca possessivamente.
E, naquele momento, soube que nada mais me faria voltar atrás, não havia
motivos.
Eu era dele, tanto quanto ele era meu.
A língua de Theo invadia a minha boca com fervor, ao mesmo tempo,
meus dedos desapareciam entre seus cabelos. Meu coração batia em completo
descompasso, e meu corpo ansiava por mais.
Mais de seus toques. Mais de seu corpo. Mais de nós dois.
― Temos que sair daqui... ― ele disse, próximo aos meus lábios.
Afastei o corpo, confusa e ofegante, olhando em seus olhos. ― Quero você
na cama, onde possa beijar cada parte do seu corpo ― explicou em tom tão
seguro, tão sexy, que a única coisa que consegui fazer foi assentir.
Theo mordeu levemente o meu lábio inferior, antes da sua língua invadir
a minha boca de novo, e não demorou para que os meus gemidos surgissem.
Ele xingou baixinho e se afastou.
― Vamos ― disse, e começou a caminhar em direção à escada, comigo
grudada em seu peito.
— Theo, eu estou nua — comentei o óbvio, baixinho e escondendo o
meu rosto em seu pescoço.
Seus braços me apertaram ainda mais.
― Acredite, estou muito ciente disso ― sussurrou, e o meu corpo
arrepiou em resposta.
Theo saiu da piscina em toda a sua glória e perfeição, pegou a minha
toalha e envolveu na cintura, agarrou o meu roupão, voltou e parou perto da
escada, aguardando que eu saísse. Assim que parei ao seu lado, meu corpo
estremeceu, reagindo à diferença de temperatura.
— Aqui. — Ele me vestiu com o roupão, e me puxou para junto de si. —
Vamos.
Abraçados e com passadas cuidadosas, seguimos pela casa no escuro,
evitando ao máximo que fôssemos ouvidos. Quando finalmente chegamos ao
meu quarto, todo o cuidado que estávamos tendo foi esquecido. Theo me
puxou e esmagou sua boca de encontro a minha, sem ao menos se preocupar
em acender a luz. Sua língua invadiu a minha boca possessivamente, e um
gemido abafado surgiu em minha garganta enquanto eu envolvia os braços
em seu pescoço, o trazendo para mais perto de mim. Era como se
estivéssemos desesperados um pelo o outro, buscando, naqueles poucos
segundos, dissipar parte da tensão sexual que vinha crescendo entre nós. Ouvi
quando ele trancou a porta, mas o meu foco continuava no seu beijo
possessivo. Theo me abraçou forte, juntando seu corpo ao meu por completo,
enquanto me fazia caminhar de costas, nos levando para cama.
Quando senti a proximidade do colchão em minhas pernas, já estava
completamente sem ar. Theo roçou seus lábios nos meus com um pequeno
sorriso sensual e extremamente convencido, enquanto desfazia o nó que
mantinha o meu roupão fechado, e logo a peça felpuda foi ao chão, e, mais
uma vez, fiquei completamente nua na sua frente.
O abajur ao lado da cama era o único ponto de luz no quarto, mas era
mais que o suficiente para que pudéssemos nos observar. Ofegante, molhei os
lábios sentindo que estavam levemente inchados. Os olhos do Theo estavam
presos aos meus, seu cabelo úmido e extremamente bagunçado, por minha
culpa, e ele exalava um grau de sensualidade que eu nunca tinha visto antes.
A minha respiração ficava cada vez mais pesada, e o coração batendo tão
acelerado, que era como se estivesse correndo a maratona da minha vida.
Aquela que há anos desejava completar. Theo tocou o meu rosto com
delicadeza e seu beijo seguiu o mesmo o ritmo. Enquanto ele explorava a
minha boca sem pressa, minhas mãos faziam o mesmo com seu corpo, meus
dedos percorriam as cegas seu peito, os músculos do abdômen até que eu
encontrasse a boxer preta e começasse a tira-la do seu corpo. Ele me ajudou
com o trabalho, sem deixar de me beijar, e não demorei para sentir a maciez
do lençol em minhas costas.
Eu sentia o ar carregado de excitação e desejo que havia entre nós. Eu
não conseguia pensar em mais nada que não fosse Theo, e em como o meu
corpo parecia gritar pelo dele.
Ele se afastou de mim, ajoelhando-se na cama, e completamente
ofegante o vi me devorando com os olhos. Até que sua mão tocou o meu
rosto, e com suavidade contornou meus lábios, queixo, pescoço, descendo
para os seios, os contornando preguiçosamente. Era uma lenta e deliciosa
tortura.
— Tem ideia do quanto é linda? — disse baixinho e mordeu o lóbulo da
minha orelha, deitando sobre mim, mas apoiando o peso do corpo no braço.
Tomada pela necessidade de tê-lo, o puxei para beijá-lo. Theo aceitou de bom
grado os meus lábios, mas o beijo durou bem menos do que eu desejava. Ele
segurou as minhas mãos com delicadeza e tirou de seu rosto, e com a uma
sombra de um sorriso cheio de promessas não verbalizadas, seus lábios
percorreram o meu pescoço, enquanto ele juntava as minhas mãos a cima da
minha cabeça. ― Agora você vai ficar quietinha, porque eu quero te mostrar
quão linda você é... ― sussurrou o seu pedido/ordem, e logo seus lábios
começaram a trilhar o mesmo caminho que sua mão tinha feito há pouco.
Quando sua boca tocou meu seio, involuntariamente minhas costas
arquearem em sua direção, e eu tentei soltar minhas mãos, mas ele não
deixou e seguiu descendo lentamente pela minha barriga, passando pelo
umbigo e descendo, até que senti sua língua me saboreando como se eu fosse
sua sobremesa preferida. Minhas mãos seguraram seus cabelos, quando
tentava sem sucesso controlar os gemidos e a respiração, tomada pelas
sensações que ele provocava em mim. Quando ameacei me mover, não sei se
para fugir ou me aproximar mais, Theo segurou o meu quadril e o senti sorrir.
― Não terminei ― comentou baixo, em tom sensual, divertido e
levemente prepotente.
E se eu tivesse forças, ou lembrasse de como se pronunciava algo além
de seu nome, teria respondido a provocação. E não demorou para que eu
perdesse completamente o controle, como se os meus gemidos e a forma com
que o meu corpo respondia aos seus toques já não fossem indícios o bastante
de que eu estava totalmente entregue a ele.
― Quero você, Theo ― pedi baixinho, entre um gemido e outro,
enquanto tocava seus braços, tentando puxá-lo para mim, e logo a boca do
Theo encontrou a minha. Seu beijo passou a ser mais possessivo, dominador.
Minhas mãos subiram pelo seu pescoço, meus dedos desapareceram entre os
seus cabelos, enquanto juntava o meu corpo ao dele. Sua mão subia pela
perna, me atiçando mais, deixando um rastro de calor, até agarrar a minha
coxa para que me acomodasse entre elas. Era como se cada célula do meu
corpo estivesse ciente do seu toque, da sua respiração pesada de desejo, do
seu corpo. E eu o queria mais do que tudo. Queria naquele instante.
Entrelacei minhas pernas nas dele, o puxando para junto de mim, e mais uma
vez senti surgir o sorriso em seus lábios, ainda junto aos meus.
― Não estou com pressa.... ― disse com doçura, antes da ponta do seu
nariz percorrer um caminho pelo meu pescoço. ― E não me importaria de
ouvi-la dizendo novamente que me quer ― finalizou no mesmo tom, antes de
beijar a minha testa e seus olhos encontrarem os meus, enquanto continuava
me provocando esfregando levemente o seu corpo no meu.
Era como se ele estivesse esperando que eu entrasse em erupção como
algum vulcão do Havaí, mas eu já estava queimando de desejo, por dentro e
por fora. Impaciente, usei toda a minha força para girar nossos corpos na
cama, invertendo a posição. E parecendo ter gostado da impulsividade, Theo
permitiu que eu fizesse. Eu sentei em suas pernas no mesmo instante em que
ele sentou na cama, e sorrindo me segurou pelo quadril.
― Talvez eu deva assumir o controle ― disse, ofegante, sentido o
coração disparado, e sem conseguir esconder que estava a ponto de implorar
de novo.
Theo colocou alguns fios de cabelo atrás da minha orelha, depois me
levantou pelo quadril e me levou ao seu colo. Seus olhos não desviaram dos
meus, enquanto minhas mãos subiam pelos seus ombros até que estivéssemos
próximos o bastante para abraçá-lo.
― Eu não quero o controle, Tris.... ― sussurrou no meu ouvido. E, ao
senti-lo, um gemido baixinho saiu de meus lábios. ― Eu só quero você... ―
disse em devoção, no mesmo tom, enquanto nos tornávamos um só. Ele me
beijou, abafando nossos gemidos, enquanto voltava a atear fogo no meu
mundo, e me fazendo explodir em mil pedacinhos de prazer.
Eu a deixei dormindo, e pela segunda vez naquela madrugada estava no
meio da cozinha, sozinho, recordando as últimas horas como se fosse um
filme, e não algo real.
Nem nos meus sonhos mais loucos poderia imaginar que no mesmo dia
conseguiria brigar com a Beatriz, contar sobre a doença da minha mãe, viver
um dos momentos mais sexys que já tive com a mulher mais linda do mundo
na piscina e, no final, tê-la nua em meus braços.
Sorri ao lembrar de tudo.
De como fiquei hipnotizado ao vê-la com um biquíni que deixou pouco
trabalho a ser feito pela minha imaginação.
De como o seu corpo reagiu ao meu toque.
De como nos encaixamos perfeitamente.
De como junto a ela eu estava no meu paraíso particular.
Talvez aquele fosse o motivo pelo qual não era fácil para mim me
envolver com outras mulheres. Porque a referência que existia, a idealização
que eu havia criado e que tanto buscava, sem sucesso, em outras mulheres,
nunca seria preenchida.
E mesmo me sentindo próximo à insanidade com ela na piscina, valeu a
pena parar e esperar um pouco mais. Porque nós merecíamos e precisávamos
que fosse especial. Eu não podia nos roubar, não podia trapacear com a nossa
história.
— Está tudo bem? — A voz de Arthur cortou o silêncio.
Com o susto, girei o corpo em direção à porta.
— Porra! Seus pés não tocam no chão? — reclamei, e ele riu.
De calça de moletom, camiseta e os cabelos despenteados, ele sentou em
um dos bancos da ilha central.
— Eu flutuo, não caminho — disse, enquanto eu abria a geladeira e
pegava uma garrafa de água. — Me dê uma também.
Assenti.
— Bom saber que daria um excelente ladrão — resmunguei baixo, e
entreguei a garrafa a ele.
— Sou advogado. Prendo os maus elementos — comentou, abrindo a
garrafa.
Sentei ao seu lado, mesmo estando morrendo de vontade de voltar para o
quarto e deitar ao lado da mulher nua que me aguardava dormindo. Só de
pensar em Tris, um sorriso bobo surgiu em meu rosto.
— Conversou com ela? — Arthur quis saber, me puxando para a
realidade.
Engoli em seco.
— Sim. Contei sobre minha mãe, que estou voltando para casa, e que
vou assumir a Piccolli.
Arthur ficou me olhando fixamente, esperando que eu continuasse, mas
me calei.
— Isso é um ótimo começo, mas não é tudo — alertou.
— Eu sei.
— Tem certeza de que sabe? — retrucou com preocupação.
Mordi o lábio para não acabar dizendo que ele estava sendo um filho da
puta em estragar a madrugada perfeita que eu estava tendo. Me segurei para
não dizer que o importante era que Tris e eu estávamos juntos, e que tudo
ficaria bem.
Então, meus pensamentos voltaram para a minha mãe, e a voz de um dos
médicos nos dizendo que, no caso dela, a porcentagem de sucesso não era
animadora. E a tristeza voltou, porque talvez nem tudo seria perfeito no
futuro.
— Por favor, não conte a Ana, nem a ninguém sobre a minha mãe. Devo
isso a ela. Só de você e Tris já estarem sabendo... — Deixei a frase em aberto
e tomei um gole de água para ajudar a empurrar um incômodo nó que vivia
em minha garganta.
— Não se preocupe. Sabe que sou ótimo em guardar segredos — ele
emendou, em leve tom de recriminação sobre minhas escolhas.
Assenti e lhe dei um triste sorriso, deixando claro o meu entendimento
do que estava implícito na sua resposta.
— Acredito que agora será mais fácil conversar sobre isso também —
comentei enquanto brincava com a garrafa, passando de uma mão para a
outra na esperança de ser o suficiente para ele deixar o assunto de lado.
Arthur me deu uns tapinhas nas costas.
— Sei que vai! Só tente engatinhar antes de correr. Sabe como é, se
tratando de vocês dois... Parece que em segundos colocam tudo a perder —
comentou apontando para mim com a garrafa.
Levantei as sobrancelhas após o tapa na cara invisível que levei.
Será que Arthur sabia que eu estava ali porque não conseguia dormir por
ainda sentir o cheiro da Tris na minha pele, seu gosto em minha boca? Por
sentir toda a excitação, desejo e por querê-la mais e mais?
— Nossa, obrigado pelo papo motivacional — murmurei ao sair do
choque inicial com o seu comentário.
Arthur sorriu, marcando suas covinhas, e levantou as mãos.
— Só falando a verdade, meu amigo. E como quero muito ver vocês
dois juntos espero que não faça nenhuma merda no meio do caminho. — Ele
bateu com a sua garrafa na minha e senti um calafrio correr pela minha
espinha.
— Aí está você...
A doce voz de Ana flutuou cortando a tensão em mim. Ela se aproximou
de nós, esfregando os olhos e bocejando. Arthur sorriu como um grande
idiota apaixonado — não que pudesse criticá-lo —, e se ajeitou no banco,
dando espaço suficiente para que Ana se aproximasse. Ele a abraçou e a
colocou sentada em seu colo.
— Você deveria estar dormindo — comentou carinhosamente, e
sorrindo beijou a cabeça de Ana, que envolveu o pescoço de Arthur.
— Acordei e você não estava na cama — ela disse, e mesmo sem
parecer ser sua intenção, fez charminho.
Arthur sorriu e beijou sua testa, de novo.
— Vim me hidratar, sabe como é — provocou, e levou um soco fraco no
peito o que nos fez rir.
Arthur estava completamente apaixonado, o que me deixava feliz,
porque Ana merecia um homem bom, que a respeitasse, amasse e cuidasse
dela, e Arthur cumpria todos os quesitos da lista. Ela apoiou a cabeça no
ombro dele e bocejou e, na mesma hora, Arthur pegou a garrafa e segurou
Ana no colo.
— Meu amigo, preciso levar essa aqui de volta para cama antes que ela
durma toda torta aqui no meu colo — disse, rindo.
Ana bocejou novamente, já fechando os olhos.
— Gosto de dormir no seu colo — murmurou.
Nós rimos.
Arthur revirou os olhos como resposta, e acenei para os dois enquanto
saíam da cozinha.
Sorrindo, joguei a garrafa no lixo e voltei para o quarto de Tris, abrindo
a porta com cuidado, apenas para encontrá-la na mesma posição que eu a
havia deixado, dormindo nua e com uma expressão tão tranquila, que me fez
sentir como se não houvesse nada de errado no mundo. Como se não existisse
motivos para ter sido tão amargo nos últimos meses. Como se não houvesse
problemas para os quais não encontraríamos solução.
Deitei ao seu lado com cuidado. Tris suspirou e me abraçou por instinto,
apoiando a cabeça no meu peito e, pela primeira vez em meses, me senti
feliz. Era como se as peças do quebra-cabeça da minha vida começassem a se
encaixar.
A vida podia não ser perfeita, mas sem dúvida aquele era o único lugar
no mundo em que eu gostaria de estar.
cordei sentindo um peso enorme sobre meu corpo.
Quando abri os olhos encontrei os dedos de Theo entrelaçados aos meus,
e senti sua respiração no meu pescoço. Toda aquela parede de músculos, que
passei a conhecer tão bem, estava sobre mim. Não tinha como fingir que nada
havia acontecido entre nós, era impossível ignorar a noite inesquecível que
tivemos. Ao mesmo tempo, o aperto que sentia constantemente no peito veio
com uma pontada insuportável de dor, fazendo com que meus olhos
lacrimejassem. Tudo era intenso demais. Real demais.
Tentei me mover, e Theo me libertou dos seus braços virando para o
outro lado. Repetindo o que fiz na primeira noite que acordei ao seu lado, saí
da cama, fui para o banheiro, tomei um banho e voltei para o quarto, na ponta
dos pés para não o acordar. Com cuidado, peguei no armário uma calça jeans,
camiseta, tênis e um moletom. Me vesti sem fazer barulho, fazendo o
possível para sair sem que ele me visse.
As lembranças do passado me castigavam sem perdão. Desci a escada
correndo com a chave do carro em mãos, passei por Rosa e saí de casa. Segui
dirigindo pela cidade relembrando tudo, como se tivesse acontecido ontem,
até estacionar em uma rua tranquila que, com o tempo, aprendi a odiar. Então
caminhei sozinha, exatamente como fiz questão de ficar.
Fazia cinco anos e vinte dias dá última vez que estive ali, mas sabia o
caminho. Assim que me vi diante da lápide com o nome Daniela T. Costa, caí
de joelhos, sem conseguir controlar as lágrimas, repassando mentalmente
aquela noite, e todas as possibilidades usando o famoso e se...
E se eu tivesse ido...
E se eu não tivesse aberto a porta...
E se eu tivesse atendido sua ligação...
E se...
Te amo, irmã.
Agora e sempre.
entia os músculos reclamando de dor, mas não conseguia parar.
Estava focado e não ouvia nada além do som provado pelo impacto das
minhas mãos.
— Teremos algum evento do UFC no fim de semana e não fiquei
sabendo? — Arthur entrou sala de musculação que ele e Pedro construíram
na casa dos pais.
— Não! — resmunguei.
— Então, passar mais de quatro horas aqui dentro hoje foi porque... —
Arthur deixou a frase no ar esperando que eu a completasse, mas não fiz,
continuei socando o saco de areia, ignorando-o totalmente — você comeu
muito e está com medo de ter engordado? — sugeriu ironicamente.
Parei com os socos e olhei em sua direção.
— O que você quer?! — esbravejei.
Ele levantou as mãos e deu um passo para trás.
— Só vim conferir se ainda estava vivo.
Irritado, tirei as luvas e as joguei no chão. Arthur arremessou uma
garrafa de água mineral em minha direção, e a peguei no ar. O suor cobria o
meu corpo inteiro e estava visivelmente ofegante. A minha ideia era ficar
fisicamente exausto na esperança da mente cansar no processo e desacelerar.
— Está tentando quebrar algum recorde pessoal, irmão? — Arthur
cruzou os braços e se sentou em um dos aparelhos de musculação.
— Tentando não pensar.
— Então ela ainda não ligou? — quis saber enquanto eu terminava de
beber toda a água da garrafa de uma só vez.
Neguei com a cabeça.
— Já se passou mais de trinta e seis horas, Arthur. E se não tivesse
repetido mais de mil vezes que ela ainda está na cidade, não acreditaria.
Ele apoiou as mãos na perna, levantou e se aproximou de mim.
— Tris passou o dia com a Joana. Não sei se deveria ficar passando
informações, mas cheguei à conclusão de que pela quantidade de vezes que a
minha namorada já te ligou, é indiferente.
Irritado, apertei a garrafa com força.
— Então, por que a Beatriz ainda não entrou em contato?
— Se tivesse que tentar adivinhar o motivo, chutaria que tem a ver com
o fato de não saber como — disse, com tranquilidade.
— Não sabe como? — repeti suas palavras, e cruzando os braços. —
Desculpa, Arthur, mas a Tris soube me dar as costas e ir embora, duas vezes.
Quem sabe ir embora, tem que saber como voltar — comentei, sem esconder
que estava quase enlouquecendo por precisar me manter distante dela.
— Na teoria, sim — ele emendou. — Mas Tris nunca precisou, ou quis,
lutar por alguém. Nós sabemos que os relacionamentos que ela teve foram
mais por conveniência do que qualquer coisa. Porque o único cara que a Tris
realmente amou fez a besteira de namorar a melhor amiga dela! Por um bom
tempo diga-se de passagem. E quando o desgraçado caiu na real e foi se
declarar, quando finalmente teve a chance de tê-la em seus braços e em sua
cama, escolheu a pior noite possível, porque para a merda ficar completa, a
ex-namorada dele que era melhor amiga dela, morre! Porra, dá um tempo e
espera porque ela vai aprender a chegar até você! — ele terminou de falar,
quase aos gritos.
Arregalei os olhos.
— Vem ensaiando esse discurso há muito tempo? — quis saber com
humor.
— Não. Sou apenas ótimo em fazer resumo — respondeu no mesmo
tom, e foi a minha vez de baixar a guarda.
— Tudo bem, mensagem recebida. Preciso ser mais paciente.
Arthur assentiu.
— Paciência é uma arte difícil, mas acredito que seja capaz —
comentou, dando dois tapinhas nas minhas costas, depois limpou a mão suada
na toalha. — Acho que deve tomar um banho frio e sair um pouco. Vá beber
uma cerveja com Pedro, ou algo assim — sugeriu, antes de se afastar, me
fazendo rir pela primeira vez no dia.
— Estou tentando imaginar se terei a Beatriz de volta, e me manda sair
com seu irmão? Essa é uma das piores ideias que já teve na vida! — gritei,
vendo Arthur sair da sala.
No final, mesmo sem vontade, concordei em sair, e decidimos ir a um
bar que havia sido inaugurado a pouco tempo na cidade. Assim que Pedro
estacionou o carro, avistei um familiar SUV preto, metros à frente. Fuzilei o
meu amigo com os olhos e apontei para o carro do Rodrigo.
— O quê? Você disse que seria uma noite entre amigos para beber e
conversar. Arthur está com Ana então... — disse, mostrando seu ponto de
vista.
Não respondi, apenas revirei os olhos e saí do carro, deixando de lado a
resistência inicial à presença do Rodrigo, e seguimos para o bar. Quando
percebi, estávamos os três conversando sobre esportes, viagens, trabalho... e
me surpreendi com fato do quanto era fácil interagir com ele também. Perdi
as contas de quantas vezes fomos abordados por mulheres, mas, assim que
percebiam que não conseguiriam nada, acabavam indo embora.
— Pedro deve estar doente hoje — Rodrigo comentou, antes de levar o
copo à boca.
— E por que estou doente? — Pedro volto sua atenção para o amigo.
— Porque não está se agarrando naquele canto com nenhuma mulher —
Rodrigo comentou, apontando para uma área reservada.
— Rá-rá-rá. Tão engraçado você!
Poderia ser loucura minha, mas por um segundo senti como se Pedro
tivesse ficado sem graça com o comentário feito por Rodrigo. Então decidi
colocar mais lenha naquela fogueira.
— Quer saber do que mais? Ontem sugeri que ele saísse com alguma
mulher, mas o nosso amigo preferiu ficar em casa, vendo filme, comigo —
comentei, apontando para Pedro com a garrafa que estava em minha mão.
Rodrigo riu, e apoiou os cotovelos no bar.
— Olha... Se não o conhecesse bem, diria que o Pedro está apaixonado
— comentou baixo.
Pedro cuspiu boa parte da cerveja que estava em sua boca.
Rodrigo e eu o encaramos sem esconder o espanto.
— O quê?! — Pedro esbravejou.
— Quem é ela? — perguntei, direto.
Pedro revirou os olhos e bufou.
— Não existe ela nenhuma, porra! Eu só quis passar alguns dias com os
meus amigos. Não é porque não transei nas últimas semanas que tem algo
errado comigo — ele resmungou.
— Cara, se você não transou nas últimas semanas, definitivamente tem
algo muito errado com você — Rodrigo concluiu, e concordei.
— A última vez em que isso aconteceu você tinha o quê? Dezesseis
anos? — debochei dele.
— Rá-rá! Vocês dois, hoje, estão cômicos! — comentou, deixando a
cerveja sobre o balcão. — Vou ao banheiro e já volto — Pedro levantou,
resmungando sozinho, que não estava apaixonado merda nenhuma, e
acompanhei ele se afastar, rindo de sua reação.
— Theo, existe algo que gostaria de falar antes do Pedro voltar —
Rodrigo disse, chamando minha atenção, e eu apoiei os braços no balcão e o
encarei.
— Claro.
— Eu sei o que aconteceu entre você e Tris. Sei que dormiram juntos,
antes da Tris terminar comigo — ele afirmou, tranquilo, sem mudar o tom da
voz.
Pego de surpresa com a bomba que foi a mudança total da conversa,
fiquei sem reação e o silêncio permaneceu entre nós por mais do que deveria,
e a verdade provavelmente estava estampada em meu rosto.
Um pequeno sorriso surgiu no rosto do Rodrigo.
— Obrigado por não negar.
— Não faria isso — respondi honestamente.
Rodrigo assentiu.
— Sempre soube que existia algo diferente entre vocês. Eu estava
apaixonado pela Tris, mas não era burro ou cego — comentou, com leve
humor.
Atônico com a confissão, olhei à minha volta e depois voltei a encará-lo.
— Como você...
— Tris me contou — respondeu, antes que eu terminasse a frase. — Não
diretamente, mas quando deixou o recado na caixa postal terminando comigo,
ela me contou. No início da mensagem, eu só conseguia ouvir seu choro —
comentou, parecendo perdido em suas lembranças. — Depois, ela repetia,
atropelando as palavras, que precisávamos terminar, que não queria ter me
magoado e que tinha arruinado tudo. Tris me pedia desculpa, perdão. — Ele
inspirou profundamente, e então continuou: — Não foi difícil de entender
que ela não estava pedindo perdão por estar me magoando por terminar o
namoro, e sim, por algo que havia feito antes.
Ficamos em silêncio, olhando um para outro.
— Ela estava pedindo perdão por ter ido pra cama comigo — afirmei.
Rodrigo assentiu.
— Ver vocês se beijando na boate foi apenas a confirmação final. Sem
contar que você praticamente assumiu quando me encontrou a primeira vez,
porque me olhou como se tivesse se sentindo culpado, não muito diferente da
Tris.
— No meu caso era uma mistura de culpa e ciúme — emendei a
confissão, pegando a garrafa de cerveja sobre o balcão. — Porque sabia que
não tinha jogando limpo quando decidi ir atrás da Tris e confessar que a
amava, mas o que aconteceu depois não foi premeditado. Agi por impulso,
me joguei de cabeça naquela noite.
Rodrigo riu.
— Theo, não foi a descoberta do milênio, não é mesmo? Todo mundo
sabia! Eu sabia! Mas preferi me enganar na época acreditando que... —
Rodrigo balançou a cabeça em negativa. — Isso não importa mais. A verdade
é que sim, eu a amo. E nos últimos dias percebi que provavelmente sempre
amarei. Mas no final tudo gira em torno desse sentimento, não é? Porque a
amo o bastante para saber com quem ela deve ficar. Quem a fará feliz, e isso
me basta. Só estou contanto tudo isso porque quero que sabia que não existe
razão para que sinta ciúme de mim, ou tenha reações como teve no bar.
Porque a Tris não me quer, acredite. E atitudes como aquela só irão magoá-la.
E duvido que esse seja o seu desejo, porque não é o meu. Ela é sua, sempre
foi.
— Bom... isso ainda está sub judice, Rodrigo. Infelizmente, ainda está
sob judice — comentei baixo, levando a garrafa à boca.
toque do meu celular gritava ao lado da cama. Sem abrir os olhos
estiquei o braço e tateei procurando o aparelho. Resmungando, virei a tela
para ver quem era. Fantástico.
— Oi — disse com a voz rouca.
— Bom dia, Theo. Desculpa por ter te acordado. Não imaginei que
estivesse dormindo até a essa hora — meu pai disse educadamente.
Suspirei enquanto sentava na cama, a claridade invadia o quarto pela
cortina entreaberta. A noite com o Rodrigo e Pedro no bar terminou bem
mais tarde do que eu havia planejado, mas valeu muito a pena por ter me
proporcionado, ainda que de forma inesperada, a oportunidade de encerramos
aquele assunto por completo, com respeito e a verdade que Rodrigo e eu
merecíamos.
— Não tenho sido beneficiado com boas noites de sono — disse
honestamente, tendo consciência do meu tom de voz cansado.
— Compreendo. Estou ligando porque gostaria de saber se tem algo
programado para hoje, agora no fim da manhã.
Esfreguei os olhos, tentando despertar o suficiente para compreender o
que dizia.
— Você está aqui?
— Sim — ele emendou, e ficou calado do outro lado da linha por alguns
segundos, então pigarrou. — E gostaria de saber se há a possibilidade de
almoçarmos juntos.
Suspirei, me ajeitando melhor na cama, completamente desconfortável
com a conversa. Essa coisa de momento pai e filho nunca existiu muito entre
nós. Nem mesmo antes. Era como se não existisse aquela conexão básica de
amor entre nós, ou que ela tivesse se perdido em algum momento da minha
infância. E, depois de tê-lo visto com outra mulher, traindo a minha mãe, foi
como se a admiração e respeito que existia em mim tivesse se desfeito no ar,
tamanha a amplitude do peso que aquela traição teve.
— Olha só. Eu realmente não estou com disposição para almoçar com
você e a sua... — Deixei a frase em aberto tentando não ser ou parecer
grosseiro daquela vez. O que era algo inédito se levássemos em consideração
todas as últimas conversas que tivemos.
— Estou sozinho, Theo. Só estou pedindo uma hora ao seu lado, filho —
ele emendou.
Surpreso, me calei, e conseguia ouvir a respiração do meu pai do outro
lado aguardando a minha resposta. Eu não contava em vê-lo aquela semana.
Imaginei que eu teria tempo para me preparar melhor, e escolheria um lugar
mais profissional para esse encontro, algo como uma das salas de reunião da
empresa, mas eu não estava com energia nem mesmo para discutir.
— Claro. Podemos sim.
Ele soltou o ar.
— Ótimo. Vou enviar o nome do hotel em que estou hospedado por
mensagem, o restaurante daqui é excelente.
Revirei os olhos.
Claro que o restaurante é excelente, todo os lugares que você frequente
tem que ser, no mínimo, excelente.
Mordi minha língua e controlei a vontade imediata que tive de retrucar e
respirei fundo antes de responder.
— Tudo bem, nos encontramos daqui a pouco.
Finalizei a ligação e fiquei encarando o celular, me perguntando se a
conversa tinha sido mesmo real, ou se eu ainda estava dormindo e tendo um
sonho, ou pesadelo. Verifiquei a hora, e vi que já passava das 11 da manhã.
Eu finalmente havia tido a primeira noite de sono decente depois de dias.
Então, acessei a caixa de mensagens na esperança de encontrar alguma uma
palavra vinda de Beatriz, mas ela continuava em silêncio. Incomodado,
larguei o celular na cama. Porque, de uma forma ou de outra, iria encontrá-la
à noite. A festa era a desculpa que eu estava aguardando para voltar para a
casa dos Schimidt. Levantei e fui para o banho. Apressado, peguei uma
camiseta branca e calça jeans na bolsa de viagem que Arthur havia pego com
a minha mãe, e vesti. Calcei o All Star e, por sorte, o blazer preto estava na
bolsa.
Quando coloquei os pés na cozinha, dei de cara com o Pedro brigando
com a máquina de café expresso, enquanto Arthur digitava algo no celular.
— Bom dia. — Deixei o blazer no encosto da cadeira e o celular sobre a
mesa.
— Uau. — Pedro me olhou de cima a baixo. — Vejam só! Theo acordou
pronto para conquistar o mundo — comentou com uma cápsula de café na
mão, ainda tentando abrir o compartimento da cafeteira.
Tirei a cápsula da mão do Pedro sem gentileza, coloquei no lugar e
apertei o botão. Em segundos, o aroma de café estava à nossa volta.
— Primeiro você aprende como se faz café. Depois, quem sabe, ganha o
direto de me zoar — devolvi.
Pedro bufou.
— Essa máquina é nova! Por isso que eu não sei! — justificou, sem
esconder o leve tom de mágoa sobre sua falta de habilidade, antes de me dar
as costas e sentar à mesa.
Arthur colocou o iPhone sobre a mesa com força.
— Isso é tudo igual, Pedro. Você que não sabe fazer porra nenhuma
sozinho. Acha que a garota que trabalha no Starbucks é mágica, e fica igual
um idiota olhando para ela, enquanto prepara seu pedido.
— Ei! — Ele bateu forte na mesa. — O cardápio é enorme e ela sabe
fazer todos! Fora que ela é linda — retrucou.
— É claro que ela sabe fazer todos, seu idiota; ela trabalha lá! — Arthur
gritou, e eu fiquei ali, de pé entre os dois.
— Por mais que seja uma ideia tentadora ficar aqui ouvindo a discussão
totalmente sem importância de vocês, tenho que sair. Meu pai está na cidade
e quer almoçar comigo. — Assim que terminei a frase, a cozinha foi tomada
pelo mais absoluto silêncio.
— Uau. Deus não está dando uma trégua para você essa semana, hein?
— Pedro murmurou, solidário.
— Aparentemente, não — emendei, derrotado, antes de me despedir dos
dois e sair para encontrar o meu pai pela primeira vez depois de um ano e
meio.
Não foi exatamente uma surpresa descobrir que o meu pai, o
megaempresário Fernando Ferraz, estava hospedado no melhor hotel da
cidade. Atravessei o hall imponente e segui em direção ao restaurante, que
ganhara grande destaque graças ao estilo clássico e sua porta dupla
envidraçada. Sem demora o avistei sentado em uma área reservada, e parecia
me procurar. Assim que me viu e se levantou. Alto, de corpo atlético e
cabelos levemente grisalhos, estava impecável de calça escura e camisa social
clara. Era como se estivesse sempre pronto para uma videoconferência de
emergência, ou qualquer coisa relacionada a trabalho. Porque a vida dele
sempre foi focada só nisso. Trabalho.
Ele sorriu, e me deu um abraço desajeitado. Mesmo surpreso, não recuei.
— É muito bom ver você, filho — disse, antes de me soltar.
E me senti na obrigação de concordar, surpreso e assustado com a sua
demonstração de afeto, principalmente por ter sido feita em público. Meu pai
era zero sentimental comigo. Aprendi o que era dar e receber carinho com a
minha mãe. E nunca ouvi meu pai dizer um “eu te amo”. Sentei à sua frente
na mesa, e um garçom surgiu nos entregando os cardápios. Meu pai já estava
com uma taça de vinho à sua frente e, se eu não tivesse pulado o café da
manhã, teria pedido o mesmo, porque sem dúvida o momento pedia álcool.
— Eu não sabia que você viria — comentei ao abrir o cardápio.
Meu pai se aproximou da mesa.
— Marina e Sérgio me convidaram para a festa. Mas antes, é claro,
perguntaram se a Patrícia estaria de acordo com a minha presença.
Levantei as sobrancelhas, surpreso.
— Minha mãe sabia que você viria? — Minha voz deve ter saído um
pouco mais alta que o normal, devido a surpresa da informação.
Ele assentiu.
— Claro. Eu nunca faria algo se fosse desagradá-la — emendou de
imediato.
— Interessante o seu comentário — murmurei ironicamente, lendo as
sugestões do chefe para o dia.
— Theo — ele juntou as mãos sobre a mesa entrelaçando os dedos, e sua
postura me mostrava que ele estava ali para tratar de assuntos sérios —, sei
absolutamente tudo de errado que fiz com sua mãe. Tudo de errado que fiz
com a minha mulher.
Levantei o dedo, o encarando.
— Ex-mulher.
Ele assentiu.
— Sim. Com a minha ex-mulher — se corrigiu, como se a palavra não
fosse agradável para ele. — Sei principalmente que não terei como desfazer
toda a dor que a causei. Mas, isso não vai me impedir de tentar.
Fechei o cardápio calmamente e o coloquei sobre a mesma.
— É mesmo? E como pretende fazer isso exatamente? — quis saber, me
controlando para não falar alto e chamar atenção de todos à nossa volta. Era
óbvio que muitos ali sabiam quem nós éramos. Cidade pequena, um dos
empresários mais conhecidos do país, era só fazer as contas.
Meu pai ficou calado, e não recriminou a forma como me dirigi a ele. O
que era basicamente o que eu estava esperando que ele fizesse. Porque seria a
porta de entrada para toda uma discussão que viria depois.
— Eu terminei tudo com a...
Levantei a mão.
— Por favor, nem diga o nome.
Ele assentiu.
— Terminei o relacionamento em que estava, de forma completa e
definitiva, há alguns meses. Essa pessoa saiu da minha vida de todas as
maneiras, acredito que esteja compreendendo o quero dizer.
— Sim, claro. Você está me dizendo que terminou com a sua amante, e
que a demitiu da empresa também — retruquei.
— Theo — seu rosto não escondia o cansaço que o trabalho na empresa
exigia —, estou dizendo que terminei, e não sei se faz alguma diferença pra
você, mas a decisão profissional foi tomada muito antes. A pessoa não faz
parte do quadro de funcionários desde quando você nos viu juntos.
Eu não sabia. Ao menos ele teve o bom senso de tirar aquela mulher da
empresa, mas a verdade era que nada mudaria o que meu pai tinha feito.
— Eu vou voltar. Vou assumir a empresa — comuniquei, totalmente
seguro da minha decisão.
Fernando sorriu pela primeira vez.
— Fico feliz em ouvir isso, filho.
— Deixando claro que a minha prioridade será a minha mãe. Vou
trabalhar na empresa e aprender tudo o que puder, mas sempre pronto para
me ausentar quando for necessário.
— Não imaginava nada diferente — ele se apressou em dizer. — Estarei
ao seu lado pelo tempo que for preciso. Pelo tempo que me quiser por perto.
Quero deixar a presidência da empresa para você, mas só quando se sentir à
vontade para assumir sozinho.
— Sendo assim, concordo — finalizei o assunto e levei a taça de água à
boca, deixando o líquido limpar parte dos sentimentos ruim que ainda sentia
pelo que ele fez.
— Tem mais uma coisa... — ele começou a falar, mas antes de continuar
tomou um gole de vinho que fez a quantidade na taça chegar próxima a zero.
— Quero ajudá-la. Quero cuidar da sua mãe, junto com você.
E foi quando quase me engasguei e tive a impressão de que o inferno
havia congelado. Choque. Não havia outra palavra que pudesse descrever
minha expressão. Total e completo choque.
— Me desculpa, acho que não ouvi direto. Pode repetir?
— Quero estar presente na vida da sua mãe. Sei que não mereço perdão,
sei o que a fiz passar. Mas, se Patrícia permitir, quero ajudá-la de todas as
formas que puder. Seja para levá-la ao médico ou fazer um exame, ir ao
mercado comprar algo que queira, dirigir para ela. Sei lá, Theo, qualquer
coisa que ela precisar e eu puder fazer — disse, passando a mão nos cabelos,
parecendo nervoso.
— Resumindo, você quer ser o que nunca foi. Fazer tudo que nunca fez
— comentei, seco.
— Todos cometemos erros na vida, Theo. Eu cometi vários, uma
infinidade deles e não nego. Isso não quer dizer que eu não esteja cem por
cento empenhado no longo processo de me tornar um homem melhor — ele
devolveu de imediato.
Debrucei-me sobre a mesa, pasmo.
— Então, você está em busca de redenção. Mas, e a empresa? — Devia
estar escrito na minha cara que eu não estava reconhecendo o homem à
minha frente.
— Como disse, Patrícia é a prioridade — devolveu de imediato e se
calou, pensativo. — Ela é a nossa prioridade — finalizou seguro.
E foi quando me questionei se tinha acordado em um mundo paralelo.
Eu não conseguia acreditar. Porque a frase foi dita pelo homem que não fez
outra coisa na vida, além de colocar negócios à frente da família em sua
escala de prioridades. Seus olhos procuravam em meu rosto por sinais da
resposta que daria. Quem era aquele homem que estava à minha frente?
Porque definitivamente não era o meu pai.
— Essa resposta não deve vir de mim — disse rapidamente, desviando o
olhar.
— Eu sei. Só queria comunicar a minha intenção antes de conversar com
a sua mãe — emendou.
Mordi o lábio, desconfortável com o assunto.
— Não sei se gosto disso. Então, o máximo que posso dizer é que vou
respeitar a decisão dela.
Eu poderia ter dito que não acreditava que ele era capaz de qualquer ato
altruísta na vida. Não acreditava que tivesse mudado tanto a ponto de fazer de
outro ser humano sua prioridade, mas se minha mãe concordasse com o meu
pai iria lhe propor, eu estaria por perto para impedir que ele fizesse mal a ela
mais uma vez.
— É o máximo que posso pedir — disse, se dando por satisfeito.
Ótimo, porque era o máximo que poderia oferecer. Porque a verdade era
que a confiança que exista entre nós havia sido quebrada, e meu pai se
esforçou muito durante a vida para chegarmos a esse ponto. E seria
ingenuidade da parte dele, acreditar que algo tão valioso fosse ser recuperado
do dia para a noite, com uma simples conversa recheadas de promessas que
poderia muito bem ser vazias. Ele nunca ganharia o prêmio de pai do ano,
nem de marido, pelo seu retrospecto, mas se existe algo que aprendi nos
últimos dias, é que o único jeito de termos a chance de um futuro diferente é
enfrentando o passado, colocando todas as questões sobre a mesa, e
destruindo os fantasmas de uma vez por todas.
ris, vamos brincar?
A voz da Dani me chamou entre risos. Abri os olhos e estava no meu
quarto de infância. Levantei da pequena cama na qual dormia encolhida, e,
descalça, segui pelo corredor da casa. De repente, cenas da nossa infância
começaram a surgir como grandes quadros à minha frente. Dani e eu, ainda
crianças, correndo pelo jardim, disputando o balanço onde nos
intercalávamos entre empurrar e ser empurrada. Nós duas comendo doces
na confeitaria. Depois, estávamos sentadas ao lado da piscina rindo e
conversando sobre garotos. Jogando videogame, cantando no karaokê,
fazendo guerra de balões de água no jardim. Era como se eu estivesse
assentindo a um filme da história de nossas vidas. E, em um piscar de olhos,
a nossa festa de boas-vindas da faculdade, nós estávamos sorrindo,
dançando e bebendo tequila pela primeira vez, sempre juntas. E depois...
tudo ficou branco. Não havia mais histórias. Quando a névoa branca se
dissipou, vi Dani se divertindo sozinha distante de mim. O lugar era lindo,
ela dançava com outras pessoas em um vestido esvoaçante rosa-claro, e
rodopiava sorrindo.
Tudo era tão mágico que meus pés me levaram em direção à festa, para
perto da Dani. Então, ela me viu e sorriu.
— O que você está fazendo aqui? — perguntei baixinho, e quase não
reconheci minha voz.
Dani olhou à nossa volta e sorriu.
— Estou vivendo — disse com doçura, mas como se estivesse me
apontando o óbvio, depois tocou meu rosto com carinho. — Devia fazer o
mesmo, Tris.
*
Abri os olhos e percebi que um novo dia estava começando. Tudo
pareceu tão real que precisei de alguns segundos para processar que tinha
sido apenas um sonho, enquanto sentia uma lágrima escorregando pela minha
bochecha. Eu sentia terrivelmente a falta da Dani, mas, de alguma maneira, a
dor não parecia ser a mesma de dois dias atrás. Era como se algo estivesse
começando a mudar aos poucos dentro de mim. Talvez, no meu tempo,
conseguiria transformar a dor em saudade, com boas lembranças, e a
compreensão de que eu sempre a teria perto de mim. Porque a marca da nossa
amizade, do nosso amor de irmã, estava tatuada no meu corpo. Agora e
Sempre.
A carta permanecia no travesseiro ao meu lado, agora mais amassada do
que antes. Eu a peguei com cuidado, dobrei e guardei, como uma relíquia que
preservaria para sempre com carinho.
Sentada na cama, suspirei, observando à minha volta e relembrando
todos os acontecimentos da minha história que ali haviam sido escritos. Ao
mesmo tempo, ciente de que a razão inicial pela qual estava na cidade havia
chegado. Tentando evitar ser tomada pela ansiedade, levantei e segui para o
banho, permitindo que a água morna abraçasse o meu corpo com carinho, e
foi inevitável pensar no Theo, e na noite que passamos juntos. Estávamos
completando dois dias sem nos ver. Mais de quarenta e oito horas desde que
o deixei para trás naquela rua vazia, triste e solitária após confessar que o
amava. E ali, de olhos fechados, com água escorrendo pelo meu rosto, me
sentia vazia, como se nada tivesse graça, ou fizesse sentido sem a presença
dele. Como se parte do meu coração tivesse ficado com ele quando o meu
carro se afastou.
Passava das nove e meia da manhã, e a movimentação do lado de fora da
casa era intensa, devido ao evento da noite. Ouvi caminhões e vans
estacionando, enquanto eu escovava os cabelos e os prendia em um rabo de
cavalo alto, olhando o meu reflexo no espelho. Eu estava pálida e parecendo
um pouco sem brilho, sem vida. Talvez fosse pela enxurrada de informações
e emoções da semana, ou pela falta do Theo.
O barulho de um carro se aproximando me arrancou dos pensamentos, e
movida pela esperança de ser Theo, corri para a janela do quarto a tempo de
avistar Arthur estacionar. Sem pensar, saí correndo em direção à entrada
principal da casa, e encontrei ele e minha irmã na varanda conversando.
— Oi, bom dia. — Ana sorriu.
— Bom dia — respondi, apressada, e me aproximei de Arthur. — Theo
veio com você? — quis saber, procurando ver se tinha mais alguém no carro.
Arthur me olhou sem conseguir esconder que eu, certamente, não
gostaria da resposta.
— Não, linda, ele está na minha casa. Theo e Pedro saíram ontem.
Senti meu coração partir em mais um pedacinho porque Theo já estava
se divertindo, vivendo a própria vida. E eu não poderia culpá-lo por decidir
seguir em frente. Talvez eu tenha demorado demais para lidar com as minhas
próprias questões, para dar valor a nós dois.
— Pelo visto já me esqueceu — murmurei o meu pesar por ter demorado
demais a acreditar em nós dois.
— Tris, não fala assim. — Ana passou a mão no meu braço, tentando me
consolar.
— O cara continuou te amando por anos sem ao menos te ver. Acha
mesmo que te esqueceu, e está superbem em quarenta e oito horas? — Arthur
me recriminou de imediato.
— Vamos falar a verdade, Arthur. Ele não voltou — comentei com
lágrimas nos olhos, sem esconder a decepção. Sem esconder o quanto
desejava que Theo tivesse retornado, entrado no meu quarto de madrugada e
me abraçado até que eu dormisse, me dando a certeza de que está tudo bem.
Que ainda existia uma chance para nós dois.
Arthur respirou fundo.
— Tris, olha só... — Ele entregou, para Ana, um cabide coberto por uma
capa preta, que me pareceu ser um terno, e segurou a minha mão entre suas
mãos, me obrigando a olhar em seus olhos. — Theo só está lhe dando o que
pediu. Se acha que ele está feliz, não o conhece tão bem quanto achei que
você o conhecesse.
Concordei, balançando a cabeça.
— Sei que ele só está fazendo o que pedi, mas eu queria que ele tivesse
voltado. Queria que tivesse vindo atrás de mim — confessei, e Arthur riu.
— Sempre achei tão errado o que Theo fazia com você — ele comentou,
e a minha expressão de não entendimento deve ter ficado evidente, porque
Arthur continuou: — Ele passou tempo demais transformando você em uma
princesa. Te colocando em uma redoma perfeita de vidro quando éramos
novos, agora deu nisso. Você acha que é ele que deve vir até você, mais uma
vez. — Balançou a cabeça em negativa, com um pequeno sorriso no rosto e
beijou minha testa. — À noite estaremos aqui. — Piscou para mim e me
soltou.
Depois Arthur beijou Ana e seguiu para o seu carro. Minha irmã e eu
ficamos lado a lado vendo o carro se afastar. Talvez Arthur estivesse certo.
Eu não podia continuar permitindo que Theo fizesse tudo por mim, ele
precisava saber que não era só ele que lutaria por nós dois. Ana passou a mão
no meu braço, chamando a minha atenção, e eu olhei para ela, assustada.
— O que acha de um tratamento de beleza antes da festa? — Piscou e
sorriu.
Assenti sem animação, e ela segurou minhas mãos.
— Ei, Theo vai estar aqui! Então, por que não ficar linda, e provar que é
possível fazer um homem de vinte e seis anos ter um ataque cardíaco —
sugeriu, os olhos brilhando.
Revirei os olhos.
— Eu o amo. Não quero que ele morra — retruquei baixinho com leve
humor, enquanto era rebocada para dentro de casa, sem nem ao menos ter
certeza de que Ana havia percebido o peso e a importância daquele momento.
Tinha sido a primeira vez que assumia em voz alta para ela o meu sentimento
mais verdadeiro por Theo. O sentimento que sempre existiu dentro de mim, e
que lutei com tanta energia para sufocar. Mas ali, as palavras saíram dos
meus lábios com leveza e naturalidade, porque quando se diz algo tão
verdadeiro é assim, leve e sem esforço, vem com coração, nos mostrando o
que os olhos embaçados pela dor não nos permite enxergar.
Ainda tínhamos umas boas dez horas até a festa começar. A
movimentação de caixas, arranjos de flores, mesas e cadeiras no jardim
continuava, e como minha mãe havia contratado uma empresa de eventos,
ela, Patrícia e Joana decidiram passar o dia em um SPA. Claro que o convite
foi estendido a nós, mas, como recusei, Ana fez o mesmo para não me deixar
sozinha. Eu era uma pessoa de sorte por ter a irmã mais doce, compreensiva e
companheira do mundo que, ainda por cima, sem que eu soubesse, havia
contratado uma equipe de profissionais de beleza, que apareceram como num
passe de mágica, no melhor estilo fada madrinha. Durante horas conversamos
e rimos, o que ajudou que a minha ansiedade em relação ao Theo diminuísse.
Nós iríamos nos encontrar, e não adiantava sofrer por antecipação, palavras
da Ana, que tentei internalizar aos poucos.
Horas depois eu estava observando meu reflexo no espelho, vestindo
algo que não era exatamente o que havia pendurado no armário assim que
cheguei. Isso porque minha mãe, no dia anterior, tinha entrado no meu quarto
com uma caixa preta enorme nos braços dizendo que ficaria feliz se eu
escolhesse usar, na festa, algo que havia comprado para mim, e eu concordei
antes mesmo de abrir a caixa, porque depois de tudo que compartilhamos
naquela semana, nos aproximamos como nunca imaginei ser possível, e
queria deixá-la feliz.
— Uau! Tris, você está linda.
Ana apareceu na porta do meu quarto, e eu continuava admirando meu
presente através do reflexo no espelho. Um vestido off-white com mangas
longas e um decote absurdamente profundo na frente, repleto de pequenos
pontos de brilho. Ajustado ao meu corpo, ele abria em uma saia em forma de
A. Os detalhes eram incríveis e parecia ter sido feito para mim. Era perfeito
além das palavras. Um conto de fadas de tão perfeito. Com pouca maquiagem
no rosto e os cabelos presos em uma bela e volumosa trança lateral, não havia
nada a fazer. Além de arrematar a trança com a flor natural que estava em
minhas mãos.
Engoli o nó de emoção que se formou.
— Eu estou... — murmurei, ainda me olhando no espelho.
— Parecendo uma princesa — ela completou sorrindo, enquanto
caminhava em minha direção, e a acompanhei pelo espelho.
Seu vestido era lilás de um ombro só, delicado e esvoaçante. Ana estava
linda e, de certa forma, nossos vestidos combinavam em uma perfeita
harmonia. Ela optou com um coque alto no melhor estilo Audrey Hepburn,
deixando-a, elegante e mais adulta.
Girei o corpo com rapidez e segurei a sua mão.
— Ana, você está deslumbrante! — Ela abriu um enorme sorriso. —
Nossa, você está um mulherão... — comentei, percebendo naquele momento
o quanto a minha chatinha tinha mudado nos últimos anos, e eu não havia
percebido.
— Obrigada. — Ela abaixou levemente em reverência. — Então, vamos
ver o que está faltando agora... — Seus olhos corriam por meu vestido e
rosto. Levantei a mão mostrando a flor.
— Hmm.... As flores são lindas, mas tenho uma ideia. Me espera aqui —
comentou com um sorriso que iluminou seu rosto antes de sair apressada e
me deixar sozinha para trás sem entender nada.
Em menos de dois minutos, Ana estava de volta com algo nas mãos e
com um sorriso de quem estava aprontando no rosto.
— Que tal trocar a flor por isso. — Ela abriu a caixa de veludo vermelha
à minha frente. — É só uma ideia.
— Ana... — sussurrei, maravilhada, sentindo o peso da emoção e
nostalgia, enquanto observava a tiara que ela havia dado de presente quando
fiz 15 anos. A mesma tiara em que ela fez o vovô Augusto gastar uma
pequena fortuna, e a qual eu usei apenas uma noite. Tudo porque o Theo me
chama de princesa, e como dançamos juntos no meu aniversário de 15 anos,
minha irmãzinha, com 11 anos na época, achou que era necessário. Foi um
dos melhores presentes de aniversário que já ganhei, repleto de significados.
— Algo lindo assim merece sair da caixa de tempos em tempos. E
imaginei que hoje poderia ser um bom momento para usar de novo — ela
comentou, e piscou para mim, sorrindo.
Eu não conseguia parar de sorrir. Parecia a pessoa mais idiota, boba e
feliz do mundo. Ana encaixou na minha cabeça a delicada tiara coberta por
cristais, e os lindos pontos de luz se destacaram nos meus cabelos.
— Perfeita — disse, sem esconder o orgulho, e girou meu corpo para
que eu pudesse ver no espelho, e fiquei sem palavras.
— Você é incrível, sabia? — comentei, sem esconder o orgulho pela
mulher que ela havia se tornado.
— Eu sei! — concordou, convencida, me fazendo rir. — Só espero que
dessa vez você vá atrás da sua felicidade e do seu príncipe encantado —
sussurrou em meu ouvido e beijou me rosto.
Abracei minha irmã.
De verdade.
Com toda a força de amor que existia dentro de mim.
— Eu te amo tanto — disse baixinho em seu ouvido, e era algo que
devia ter feito todos os dias da minha vida, mesmo às vezes querendo
enforcá-la.
Porque era a verdade.
— Também te amo muito. — Ela saiu do meu abraço e me encarou,
séria. — Estou esperando o convite para ser a madrinha desse casamento! —
disse, as mãos na cintura no seu jeito mandona de sempre, e gargalhei de
verdade.
— Eu prometo que será madrinha desse casamento.
stá acontecendo uma festa lá fora, sabia? — Uma voz
feminina chamou minha atenção, fazendo com que meus olhos deixassem de
acompanhar os convidados que seguiam por um tapete vermelho em direção
às grandes tendas brancas do outro lado da janela. Patrícia descia as escadas
em um longo e lindo vestido cinza.
— Uau, você está linda — comentei, indo ao seu encontro para abraçá-
la, depois ela se afastou e segurou minhas mãos.
— Obrigada, querida. Mas, espero que tenha se olhado no espelho antes
de sair do quarto porque a mais bela, sem dúvida, é você. — Ela arrumou a
trança no meu ombro, depois o enfeite em minha cabeça, e sorriu. — Vamos?
— Seus olhos brilhavam e, por um instante, pensei que fosse chorar de
emoção.
Seguimos até os convidados de braços dados, eu não sabia por quanto
tempo minha mãe estava organizando tudo, mas fiquei encantada com o que
criaram no jardim da casa. Eram arranjos de flores brancas, velas, e árvores
cobertas por pequenas luzes por toda parte. Era tão mágico que parecia um
sonho. Assim que minha mãe nos viu chamou a Patrícia, que foi ao seu
encontro, me deixando sozinha entre tantas pessoas desconhecidas para mim.
Por sorte, avistei Joana e seu vestido preto, que contava com um decote
vertiginoso nas costas. E se existia uma pessoa que sabia explorar sua
sensualidade com classe, era ela.
— Tris, você está incrível. Amei o vestido! Sexy e romântico —
comentou, parecendo orgulhosa, enquanto sorria para mim.
— Veja só quem fala. Está querendo provocar um ataque cardíaco em
alguém hoje? — perguntei, observando suas costas nuas e a fazendo rir.
Ela passou a mão sobre a seda, orgulhosa.
— Vai que dou sorte de encontrar alguém interessante. Comprei como
investimento — comentou ao pegar duas taças de champanhe na bandeja que
passava por nós, e eu aceitei uma, sorrindo.
— Boa noite, senhoritas. — A voz masculina e sexy surgiu atrás de nós.
Joana e eu viramos juntas e encontramos Pedro e seu terno slim escuro,
camisa branca e uma gravata fina preta que faria qualquer modelo da Armani
chorar de depressão. Nosso queixo caiu e consegui ouvir Joana suspirando ao
meu lado, e Pedro rindo baixinho.
— Querido... — Joana correu os olhos sobre Pedro. — Você veio direto
das passarelas de Milão? — quis saber, nos fazendo rir.
— Oi, Pedro. — Sorrindo beijei seu rosto, ele pegou a minha mão e me
fez dar uma voltinha.
— Nossa, Tris, você está uma arraso! — comentou, e se afastou para me
observar melhor. Depois, se virou para Joana, e deu a mesma conferida. —
Como vocês ainda não estão rodeadas de homens?
— Também não sei — Joana emendou, parecendo perplexa, e levemente
revoltada, com o fato.
Revirei os olhos.
Eles eram loucos, mas eu os amava imensamente, porque a conversa
com Pedro e Joana era sempre leve e divertida, o que me ajudava a não
enlouquecer de ansiedade aguardando Theo chegar.
— Tris.... — Pedro apontou para um ponto distante trás de mim. —
Aquele ali não é o vovô Augusto? — E me virei para olhar.
— É ele mesmo — comentei ao ver meu avô se aproximar da tenda
principal, vestido com um elegante terno escuro e com um grande sorriso no
rosto.
— Quem é a mulher que está ao lado do papai? — Joana olhava
intrigada para a morena de vestido longo preto, que devia ter na faixa de uns
50 anos e que acabara de dar o braço para o vovô, sorrindo.
— Ai... Meu... Deus... — sussurrei, enquanto acompanhava com os
olhos o vovô de cabeça erguida e peito estufado acenando para algumas
pessoas com a mulher ao seu lado, como se estivesse na festa do Oscar, e
aguardando os flashes dos fotógrafos registrando o momento.
— Ai meu Deus, o quê? — Pedro me olhou sem entender.
— Tris... você conhece essa mulher? — Joana olhava para a direção do
vovô e depois para mim.
— Hmm — cobri a boca uma das mãos, não acreditando no que eu diria
a seguir —, acho que é a Francisca — comentei, com dificuldade para
absorver as palavras que tinham saído da minha boca, enquanto vovô
segurava a mulher pela cintura e fazia um carinho bem íntimo em seu rosto, o
que só comprovava ainda mais a minha teoria.
— Francisca?! A tal amiga de quem ele tanto fala? — O tom de voz de
Joana foi bem mais alto do que costumava usar, e nem a maquiagem
conseguiu esconder o fato que o sangue parecia ter desaparecido de seu rosto
por completo, graças a informação que dei.
De queixo caído, não tive outra opção que não fosse assentir.
— Gente, do que vocês estão falando? — Pedro quis saber, enquanto
observávamos o vovô cumprimentar minha mãe e Patrícia, e em sequência
parecia apresentar a Francisca às duas.
— Aquela mulher é a namorada do vovô — comentei apontando para o
mulherão de cabelos pretos e batom vermelho que beijava o rosto da minha
mãe, quanto o vovô Augusto vergonhosamente descia sua a mão pelas costas
até apoiá-las no quadril, e eu desejei não ter visto aquela cena.
Joana respirou fundo ao meu lado.
— Não pode ser. Isso é um completo pesadelo. Eu não tenho companhia
para a noite, e meu pai vem com uma mulher que tem uns trinta anos a menos
que ele, e ainda quase passando a mão na bunda dela como não houvesse
ninguém ao redor. — Joana pegou outra taça na bandeja do garçom que
passava por nós. — Para o mundo que eu quero descer... — resmungou e
voltou a beber.
Eu ri, porque não havia nada mais a se fazer.
— Se quiser posso ser seu acompanhante — Pedro disse para Joana com
a voz mais sensual do mundo, e nós duas o encaramos. Porque o sem-
vergonha estava dando aquele sorriso, que as mulheres se apaixonam em
menos de trinta segundos.
Intercalei o olhar entre Pedro e Joana, e percebi que ela estava cogitando
a proposta.
Respirei fundo, e toquei em seu braço com delicadeza.
— Se resolver aproveitar o convite, boa sorte com esse aí.
Deixei os dois conversando e me afastei, porque nos últimos dias eu
estava tendo acesso a informações pessoas demais para o meu gosto, em
relação aos relacionamentos da minha família. Dei minha cota por encerrada.
Se Joana estivesse a fim de embarcar naquela, eu não iria me meter. Fora que
se o meu avô tinha uma queda para ser papa anjo, imagino que, se tratando
de Joana, o fruto não devia ter caído muito distante da árvore.
Circulei pela festa por quase uma hora, completamente impaciente
porque Theo ainda não havia chegado. Segui caminhando pelo jardim, me
afastando da aglomeração, até encontrar uma das tendas de open bar. Peguei
uma taça de champanhe e, quando virei para continuar vagando, avistei Theo
e Arthur metros à minha frente. Meu coração literalmente parou por alguns
segundos. Então, virei o líquido de uma só vez na boca e devolvi a taça ao
barman. Não havia mais tempo a perder. Eu precisava agarrar a minha
chance, e falar tudo o que Theo merecia ouvir.
Precisava, ao menos uma vez na vida, não dar as costas e fugir de quem
eu mais amava. Eu me aproximei com passos receosos, parando a menos de
dois metros deles.
— Oi... — disse baixinho, e vi a postura de Theo mudar ao ouvir minha
voz, demostrando que tinha sido pego de surpresa.
Arthur sorriu para Theo, depois piscou para mim e seguiu caminhando
despretensiosamente com as mãos nos bolsos da calça em direção à tenda
principal, nos dando privacidade.
Theo virou em minha direção e fiquei sem ar. Ele parecia um deus grego
vestindo um terno azul-marinho, mas meu coração disparou de vez quando
seus olhos azuis se prenderam aos meus.
— Você está linda — disse em tom de adoração, enquanto seus olhos
pareciam absorver cada detalhe, do vestido em meu corpo até a cor do meu
batom, e percebi o exato instante em que seu olhar se prendeu ao que Ana
havia colocado na minha cabeça, e sem dúvida ele lembrou do único dia em
que a usei. — Tris... — sussurrou quando o seu olhar desceu da tiara para os
meus olhos.
Eu me aproximei e coloquei o dedo sobre os seus lábios.
— Não. Agora é a minha vez de falar, e você vai só ouvir por enquanto,
ok? — Ele moveu a cabeça de forma afirmativa, e eu tirei o dedo de seus
lábios respirando fundo, e olhei em seus olhos.
— Theo, quando a Dani morreu, meu mundo desabou. Depois do
enterro, quando voltei para casa, eu estava devastada, sentindo uma dor que
nunca imaginei existir. Mas você precisa saber que sim, eu peguei o celular
com a intenção de te ligar. Porque queria dizer que te amava, que eu estava
confusa e sofrendo, e que precisava de você ao meu lado. Mas, acabei
encontrando mensagens da Dani na caixa postal e... ela me perguntava onde
eu estava, se eu havia esquecido dela. Aquelas frases, na minha cabeça me
fizeram sentir tão culpada por tudo, que acreditei verdadeiramente que a
morte dela era o meu castigo por ter passado a noite com você. Como se ficar
com você fosse uma maldição.
Theo ameaçou abrir a boca para falar, e mais uma vez coloquei o dedo
sobre os seus lábios.
— Então, fiz a única coisa que consegui na época. Fugir. De você, da
cidade, dos nossos amigos, que me faziam tanto lembrar da Dani e de como
éramos felizes. Eu fugi de mim mesma, Theo — confessei, levando a mão ao
peito. — Quando o reencontrei, senti tanta raiva de você. Raiva de mim. Era
como se tudo que eu tinha feito tivesse sido em vão, porque na primeira vez
em que coloquei os pés nesse lugar, você reapareceu. Mas, agora sei por que
você está aqui, por que eu estou aqui. E sei principalmente o quanto essa
jornada foi importante, e necessária para nós dois, principalmente para mim.
Porque desde que entrei nessa casa, senti raiva, briguei, chorei, tive medo,
sorri, me diverti, compartilhei segredos, fui amada, amei e cresci. Fiz tudo
isso bem aqui, ao seu lado. Nos últimos sete dias fiz tudo que não me permiti
nos últimos anos. Todos os sentimentos e emoções que, de alguma forma,
aprendi a bloquear com o tempo. Theo, eu fui mais feliz em uma semana do
que nos últimos cinco anos.
Theo permanecia imóvel à minha frente, e prestava atenção a cada
palavra que saía da minha boca. E eu me agarrei a chance de fazê-lo me
conhecer por completo.
— Eu sei, que quando o deixei sozinho no meio daquela rua, você
também estava ferido e magoado, e peço perdão por isso. Sei que me disse
que não me esperaria para sempre, mas estou nutrindo a esperança de que
tenha me esperado só mais um pouquinho, só por mais dois dias, porque eu
desejo ficar ao seu lado para sempre — confessei, e dei mais um passo em
sua direção. — E se algum dia fui uma princesa foi porque você me fez ser
sua princesa, com suas atitudes, cuidados, sua força, sua habilidade de saber
sempre o que estou pensando, por me desafiar e, principalmente, por me
amar. Sou mais eu mesma ao seu lado do que sozinha. Sou uma pessoa
melhor, uma irmã melhor, uma filha melhor, uma amiga melhor. E a partir de
agora quero ser uma mulher melhor para você. Porque você inspira querer
ser. Porque essas são as consequências de amar você.
Sentia sua respiração ficando cada vez mais intensa. Seus olhos
demostravam o que sua boca não podia falar por conta do meu pedido de
apenas me ouvir.
— Ouvi da minha mãe, e da sua mãe, que tudo que elas mais desejam na
vida é ver a felicidade dos filhos. Eu descobri que a minha felicidade é ao seu
lado, só preciso saber se a sua ainda é ao meu. Preciso saber se ainda sou a
mulher da sua vida, tanto quanto você é o único homem da minha.
Eu não tive certeza se as últimas palavras haviam de fato saído da minha
boca, porque Theo me calou esmagando a minha boca com a dele, e eu estava
em casa. Porque ele era a minha pessoa no mundo. E eu só tinha a agradecer
por ter tido por perto pessoas tão maravilhosas, que nos amam ao ponto de
nos ajudar a corrigir erros do passado.
Ele me levantou, tirando meus pés do chão, enquanto sua língua invadia
de novo e de novo a minha boca possessivamente, demonstrando desejo,
saudade, amor, e um certo alívio, me deixando completamente sem ar. Me
fazendo gemer baixinho, ao ponto de me fazer esquecer que existiam outras
pessoas no mundo além de nós dois. Eu poderia ficar ali, em seus braços,
para sempre. Como se também não quisesse que o beijo chegasse ao fim, ele
roçou os lábios nos meus.
— Eu te amo. Sempre foi você, Tris — ele sussurrou em devoção e me
beijou, daquela vez com suavidade, enquanto uma sombra de sorriso tentava
surgir em meus lábios.
— Fico feliz de ouvir isso... — emendei no mesmo tom, de encontro aos
seus lábios, e subindo a mão pelo seu pescoço, fazendo com que meus dedos
desaparecerem entre seus cabelos. — Porque vai ter que me aturar para
sempre, porque eu te amo também — disse baixinho, daquela vez em seu
ouvido, e pude sentir seu sorriso antes de beijar meu pescoço.
— É tudo que mais quero. Tudo que sempre quis, pode acreditar.
E ali pude ver em seus olhos, e sentir no tom de sua voz, que os últimos
dois dias também não tinham sido fáceis para ele. Como se tivesse tido medo
de que eu fosse, mais uma vez, desistir de nós dois.
— Me perdoa por ter demorado tanto? — quis saber, enquanto meus
dedos contornavam os traços de seu rosto. Ele era ridiculamente lindo, por
dentro e por fora. Theo beijou a minha testa.
— Tudo aconteceu como deveria ser. O que importa é que escolhemos
um ao outro — disse com doçura, antes de me beijar de novo, sem pressa,
como se fosse algo que já havia decidido fazer o tempo todo a partir daquele
momento.
E Deus do céu, nunca imaginei que algum dia fosse me sentir daquele
jeito. Tão viva, tão inteira.
— Finalmente! — Arthur gritou vindo em nossa direção com duas taças
de champanhe nas mãos, ao seu lado Ana, dava gritinhos e batia palmas,
animada. Theo me colocou no chão e fiquei envergonhada pelo show que
tínhamos acabado de dar.
— Estou tão feliz! — Ana abraçou Theo e a mim ao mesmo tempo. —
Eu amo vocês.
— Agora temos mais um motivo para comemorar. — Pedro se
aproximava com uma bandeja com várias taças de champanhe cheias,
acompanhado por Rodrigo, Laura e Joana.
— Não sabia que mamãe tinha contratado um garçom mulherengo —
comentei pegando uma das taças, e todos fizeram o mesmo.
— Ahh, Veja só... — ele apertou minha bochecha — ela e essa língua
afiada. Que tal uma dancinha, só nós dois? — sugeriu, piscando para mim.
— Nem sonhando, Pedro! — Theo rosnou e me prendeu em seus braços,
fechando as mãos sobre a minha barriga. Apoiei as costas em seu peito e
revirei os olhos enquanto todos riam.
— Estou feliz por vocês. — Rodrigo levantou a taça em nossa direção,
Theo fez o mesmo.
— Agora a nossa noite está perfeita! — Laura sorriu, e deu um beijo no
meu rosto e no de Theo. Então segurou a mão do Pedro e da Ana. — Vamos
dançar! Precisamos comemorar! — disse, animada, e Pedro a puxou de volta
e a abraçou pela cintura, fazendo com que ela desse um gritinho.
— Calma aí, minha linda, vamos todos juntos — Pedro respondeu
extremamente carinhoso, sorrindo e quase me engasguei com o champanhe.
— Disfarça melhor... — Theo sussurrou no meu ouvido.
— Não. Vamos logo! — Laura reclamou, do seu um jeitinho meigo,
entrelaçando seus dedos aos de Pedro e o puxou. Ana concordou e levou
Arthur. Os quatro seguiram aos risos para a pista de dança nos deixando para
trás no meio do jardim todo iluminado com velas suspensas e flores brancas.
— Bom — Joana parou ao meu lado —, acho que perdi o meu
acompanhante antes de ter a chance de pensar se aceitaria ou não —
lamentou, com a taça já cobrindo sua boca. E eu sorri.
— Como assim? — Rodrigo parou ao lado de Joana, genuinamente
confuso.
Arregalei os olhos, implorando silenciosamente para que Joana não
explicasse, pois a chance do Pedro levar alguns socos estava aumento
exponencialmente a cada segundo.
— Não é nada. Besteira minha — ela disse enquanto passava a mão no
braço musculoso de Rodrigo, parecendo reparar pela primeira vez o quanto
ridiculamente lindo ele era.
— Bom, já que não tem acompanhante, quer dançar comigo? — Rodrigo
estendeu a mão para Joana, que não hesitou em aceitar o convite, e os dois
seguiram para o grande tablado montado como pista de dança.
— Hmm, Pedro e Laura? — comentei baixinho, quase sem acreditar, a
cabeça apoiada no peito de Theo.
— Não sei se está acontecendo alguma coisa entre eles, mas, quando
Rodrigo perceber, não dou cinco minutos para encontrarmos Pedro sangrando
no chão — Theo comentou, apoiando o queixo na minha cabeça, e eu ri.
— Não sei se Rodrigo vai perceber algo essa noite. Acho que estará
ocupado dando atenção à Joana — comentei, apontando para os dois na pista
dançando uma música lenta.
— Ela não é uns três ou quatro anos mais velha do que ele? — Theo
perguntou, sem ter certeza.
— Sim — confirmei, saindo de seus braços e o puxando para caminhar
junto comigo. — Mas, eu descobri hoje que ser papa anjo pode estar no DNA
de nossa família — completei, com humor.
Theo franziu a testa.
— O quê?
— Acredite, você vai descobrir durante à noite, mas nesse momento
tudo o que quero é ir para aquela pista — apontei em direção às luzes — e
dançar com você até não aguentar mais.
Ele sorriu.
— Princesa... não vai ser na pista de dança que vou te deixar cansada
hoje, e sabe disso — disse com o sorriso mais sensual do mundo estampado
na cara, e eu levei a mão ao meu peito teatralmente.
— Theo! Que horror!
Ele me puxou para seus braços.
— Vai me dizer que não é exatamente isso que quer? — sussurrou em
meu ouvindo, pretensioso demais para o seu próprio bem, antes dos seus
lábios tocarem o meu pescoço. E quase me derreti em suas mãos.
— Não direi nada por enquanto, porque a festa mal começou, e não
posso sumir com você... — devolvi, sem esconder a decepção por não poder
correr para o quarto com ele naquele segundo.
— Tem certeza de que não pode fugir? — provocou, enquanto sua mão
passeava pela lateral do meu corpo suavemente.
Resmunguei baixinho e ele sorriu.
— Eu te amo — confessei, antes de roçar meus lábios no dele.
— Sinto que esperei uma vida inteira para ouvir isso.
i.
Nunca pensei que uma palavra tão pequena fosse fazer com que meu
coração parasse por alguns segundos. Que um simples oi, que deveria ser
apenas o início de uma conversa, fosse se transformar no primeiro capítulo de
um novo livro na história da minha vida, nas nossas vidas.
Aguardei por torturantes dois dias, mas não para ouvir Tris dizer que me
amava, e sim que se perdoava, que estava se libertando da culpa, da dor, do
sofrimento que sentia e estava destruindo sua alma, sem que percebesse.
Esperei porque Tris precisava arrebentar, sozinha, as correntes que foram
postas em seus tornozelos por ela mesma. Porque precisava permitir se amar
primeiro. Ouvir que me amava foi o final, a última coisa, dentro de uma
jornada tão mais importante.
Mas, sim. Sentia como se tivesse esperado a vida inteira por aquelas
palavras.
Nossas atitudes não foram perfeitas em nenhum padrão. Cometemos
erros, fizemos escolhas erradas e, como resultado, ferimos outras pessoas e a
nós mesmos, cientes ou não. Mas não é assim que aprendemos,
amadurecemos e nos lapidamos nos tornando pessoas melhores? E foi ao
repassar mentalmente o que vivemos que percebi que Arthur estava certo; às
vezes as melhores coisas na vida surgem em meio a algo doloroso e sofrido.
Porque talvez não seja na perfeição que nossas vidas façam sentido, e sim no
caos.
De mãos dadas com mulher mais linda da festa, subi no tablado, me
juntando a tantos casais. Quando chegamos ao centro, Tris veio de encontro
ao meu corpo e, sorrindo, colocou a mão no meu peito, enquanto eu envolvia
seu corpo em meus braços e uma nova música lenta começava a tocar. A
nossa volta, encontrei sorrisos em rostos conhecidos. A felicidade dos nossos
amigos nos apoiou nos últimos dias, cada um ao seu jeito. E era possível
sentir o amor e torcida de cada um deles.
— Já disse que te amo hoje? — sussurrei ao seu ouvido, e Tris levantou
a cabeça com um sorriso no rosto.
— Sim, mas fique à vontade de repetir quantas vezes quiser —
comentou carinhosamente e me beijou com suavidade.
— E... já disse o quanto está transformando os meus sonhos em
realidade essa noite? Que é a mulher da minha vida? Que é a minha melhor
amiga, e que está incrivelmente deslumbrante e sexy nesse vestido?
Ela sorriu.
E não só com lábios, mas com os olhos, com alma.
Dançamos duas músicas até que Ana batesse com o dedinho no meu
ombro dizendo que estava na hora de trocar de par. E assim, Tris dançou com
Arthur, e eu com a Ana. O rodízio de casais continuou, e dancei com Laura,
Joana e com a minha mãe.
— Então, podemos dizer que conseguiu sorrir essa semana? — quis
saber, falando baixinho em meu ouvido, e dei uma gargalhada. Pela primeira
em muito tempo. Porque minha mãe, pelo que percebi, havia se tornando uma
mulher muito manipuladora, e digo no melhor sentido possível.
— Eu devia ter percebido que tinha suas impressões digitais por trás de
tudo isso — comentei com humor, e dei um beijo em sua testa.
Ela estava linda, e parecia feliz.
— Meu amor, quando um filho precisa de ajuda, nós mães, fazemos
absolutamente tudo que estiver ao nosso alcance — comentou, sorrindo.
— Percebi — disse, sem conseguir parar de sorrir.
Minha mãe apoiou dois dedos no meu queixo e levantou o meu rosto.
— Quero te ver feliz. Porque se estiver feliz, se o seu coração estiver
transbordado de amor e paz, tudo no nosso caminho dará certo. — Ela se
calou por um instante, mas seus olhos não desviaram dos meus. — E, se não
der, vamos todos ter a certeza de que lutamos e ficaremos bem — finalizou
antes de me dar um beijo.
— Eu te amo, mãe. E nunca deixarei de lutar com você.
— Eu sei que não — disse tocando no rosto com carinho, e olhou na
direção em que meu pai estava. De pé, sozinho, ele parecia aguardar por uma
oportunidade. — Fernando conversou comigo. Vou permitir que esteja
presente na minha vida. Espero que possam cuidar de mim juntos. Porque
quando não sabemos quanto tempo de vida temos, percebemos que é besteira
nos prender ao que aconteceu no passado — disse, voltando o olhar para
mim.
Calado, encarei meu pai, e mesmo não tendo certeza se daria certo, fiz a
única coisa que poderia fazer.
— Se é assim que quer, é assim que faremos. — Dei um beijo em sua
testa, e logo meu pai surgiu ao nosso lado.
— Me concede a próxima dança? — Ele estendeu a mão, aguardando se
minha mãe iria aceitar ou não.
Ela olhou para mim, beijou o meu rosto e piscou, antes de pegar na mão
do meu pai, e eu me afastei dos dois.
Minha mãe estava certa, seria muito injusto revirar o passado e trazer
sofrimentos à tona quando tudo que ela mais precisa é paz, amor e cuidado.
Caminhei entre os que dançavam até que meus olhos se fixaram em um
dos casais na pista. Beatriz e Rodrigo. Ele levantava a mão para que Tris
rodopiasse abaixo de seus braços sorrindo, e mesmo sabendo que era apenas
uma dança entre dois amigos, precisei respirar fundo para não deixar a porra
do ciúme tomar conta de mim. Levaria um tempo até que me adaptasse à
amizade dos dois. Mas começaria esse processo aguardando que eles
dançassem mais uma música.
u não imaginava que a vida poderia voltar a ser simples, leve e
linda. Que eu poderia voltar a sorrir e transbordar de felicidade. Se alguém
tivesse me dito que isso era algo possível há 10 dias atrás, eu diria que a
pessoa era louca. Porque eu só conseguia enxergar a vida nos tons
acinzentados, tudo era frio, triste e opaco. Eu acreditava que, aos olhos de
todos, eu não merecia ser feliz. Mas bastou que eu desse uma chance, um
passo em direção às pessoas que me amavam para que me provassem como
eu estava errada. Foi voltando para casa que meus pais, minha irmã, meus
amigos, familiares e o Theo, cada um ao seu modo, foram trazendo de volta
as cores para a minha vida, graças a esse laço que nos une chamado amor.
— Não importa o quanto insistimos em seguir por caminhos errados, em
algum momento seremos redirecionados ao correto — Rodrigo disse
baixinho no meu ouvido enquanto dançávamos.
Eu me afastei o suficiente para levantar a cabeça e buscar os seus olhos,
que rapidamente se prenderam aos meus.
— Você está bem com tudo isso? — quis saber, sem esconder a
preocupação com seus sentimentos ao me ver agora com o Theo.
Rodrigo deu um de seus sorrisos discretos e carregados de chame.
— Claro que sim, minha linda — ele disse com segurança, me afastou
delicadamente, levantou minha mão e me fez rodopiar à sua frente. Então, me
puxou de volta e avançamos na dança.
Assenti, e com um suspiro apoiei a cabeça em seu peito.
Não tive coragem de confessar a ele o que tinha acontecido entre Theo e
eu no passado porque sabia que não mudaria nada, então seria um segredo
que guardaria para sempre.
— Sabe que eu amo você, não é? — quis saber olhando em seus olhos.
Rodrigo sorriu, de novo, e piscou para mim. Ele deveria sorrir daquele
jeito mais vezes porque ficava ainda mais lindo.
— Também te amo, linda.
— Me promete uma coisa?
— Claro.
— Promete que não vai sair da minha vida, que não vamos nos afastar e
que sempre será meu amigo. Você sabe que não tenho muito amigos, e não
quero perder nenhum de vocês — confessei, sem esconder o amor e carinho
que sentia.
— Você não vai perder ninguém. — Ele beijou minha testa. — E se
Theo, algum dia, aprontar alguma coisa é só gritar que prometo meter a
porrada nele — completou com humor.
Eu ri alto e continuamos dançando até o fim da música.
— Posso interromper? — A voz surgiu de trás de mim.
Rodrigo e eu nos separamos.
Ele beijou minha testa mais uma vez e sorriu.
— Claro — respondeu segurando minha mão, me entregando para Theo.
— Obrigado pela dança, Tris. Estou feliz por vocês. — Ele colocou as mãos
no bolso da calça e se afastou de nós.
Delicadamente Theo me puxou para os seus braços e me envolveu. Nada
parecia tão certo quanto aquilo; eu nos braços dele. A voz de Ed Sheeran
cantando Kiss Me embalava os casais. Mas, para nós dois, era como se não
existisse ninguém à nossa volta. Sentia seus lábios em meu pescoço, e o meu
coração em paz pela primeira vez depois de muito tempo. Era como se tivesse
acabado de voltar para o meu lar, para o lugar de onde nunca deveria ter
saído. Todo o peso da dor e tristeza que sentia passou a não existir mais. A
saudade da Dani ficaria para sempre, mas ali eu estava cercada por pessoas
que tanto amava. Dançando, sorrindo em uma comemoração que relutei
enormemente em participar e nunca poderia imaginar que seria perfeita. O
aniversário de casamento de meus pais ganhou uma proporção ainda maior
nos mostrando o que é o amor e a busca pela felicidade.
Abracei Theo, fechando meus braços em seu pescoço e unindo nossos
corpos o máximo possível. Passei tempo demais sentido como se estivesse
me afogando em um mar de dor e tristeza, mas ali Theo era o meu bote salva-
vidas, sem o qual não queria mais viver. Amor é uma escolha, e eu havia
escolhido o meu desde muito novinha.
— Não vou a lugar algum nessa vida sem você — prometeu baixinho,
como se soubesse, mais uma vez, exatamente o que eu estava pensando.
Assenti com um sorriso discreto nos lábios permitindo que Theo
continuasse a me guiar em nossa dança.
A festa seguiu, e nós bebemos, comemos, conversamos, e nos
divertimos. E quando o dj nos informou que iria agitar a nossa noite ainda
mais, o vovô Augusto levantou da cadeira direto para pista, dançando ao som
das primeiras batidas de Uptown funk. Não sei se essa era bem a cena que
Ana tinha em mente quando sugeriu a música, mas ela acabou se rendendo e,
no final, ele nos chamou, então Ana, Laura, Joana e eu seguimos para a pista
e demos um show, especialmente para os meninos que ficaram da mesa nos
observando.
Passava das três e meia da manhã, e eu estava pronta para dar a festa
como encerrada. Sentada no colo do Theo apoiei a cabeça em seu ombro e,
parecendo ler meus pensamentos, ele se despediu de todos que estavam à
mesa e levantou da cadeira comigo no colo, me levou de volta para casa.
Quando chegamos no meu quarto, me colocou na cama e se afastou.
— Não vai tirar o meu vestido dessa vez? — quis saber, sem esconder o
desapontamento, e foi quando surgiu a sombra de um sorriso, carregado de
malicia, em seus lábios enquanto fechava a porta e vinha ao meu encontro.
— É claro que vou tirar esse seu vestido lindo — disse, passeando
lentamente os dedos pelo meu pescoço, depois pelo espaço entre meus seios
até o final do decote. — Aliás, ele é sexy para cacete.
Assenti com firmeza.
— Ele fez muito sucesso hoje — comentei, um sorriso nos lábios.
Theo me olhou com o canto dos olhos, talvez com um leve ciúme ou
desaprovação pelo meu comentário. Eu levantei da cama com dificuldade,
graças à volumosa saia, e sentei em seu colo, envolvendo as pernas em sua
cintura.
— Mais um motivo para arrancá-lo do seu corpo — disse, enquanto
descia preguiçosamente o zíper nas minhas costas. — Porém, preciso que
tenha um pouco de paciência comigo essa noite, e entenda que esperei o que
parece ter sido a vida inteira por esse momento — comentou baixinho, e senti
seus dedos tocando suavemente a minha nuca e descendo o relevo da minha
coluna, fazendo com que meu corpo todo arrepiasse de antecipação e desejo.
Minha respiração ficou mais pesada e meu olhar se prendeu ao dele.
— Theo, essa não é a nossa primeira vez... — comentei em um sussurro,
e foi quando o sorriso com um certo pesar surgiu em seus lábios.
— A questão é que de certa forma é a nossa primeira vez sim, Tris. É a
nossa primeira vez entregue verdadeiramente um ao outro. É a primeira vez
que posso dizer que te amo sabendo que você é minha, que você quer ser
minha, e esperei a vida toda por isso. Eu cuidei de você durante toda a nossa
infância, te amei do jeito mais puro e simples que podia te amar. Te beijei
quando éramos adolescentes sabendo no fundo meu coração que você era
para ser minha, mas simplesmente a vida não acontecia para nós dois
seguirmos por esse caminho. Fui o seu primeiro homem e não pude te amar o
quanto você merecia naquele instante. E quando tive você novamente nesse
quatro há alguns dias, no fundo estava o tempo todo com medo, porque por
mais que estivesse tentando criar o momento perfeito para nós dois, eu sabia
que estávamos ignorando algo muito importante, que moldou os últimos anos
de nossas vidas. Então, sinto que de certa forma nunca conseguimos viver
esse momento em sua totalidade. Por isso, peço que me perdoe se eu quiser
prolongá-lo ao máximo. Se eu quiser te beijar um pouco mais, te provocar em
pouco mais com meus toques. E, acredite, isso não será a coisa mais fácil do
mundo para mim, porque não tenho feito outra coisa nos últimos dias, na
verdade nos últimos anos, além de desejar sentir você. Eu te amo, e quero te
marcar do melhor jeito que puder para que nunca se questione sobre o quanto
é a mulher da minha vida.
Eu fiquei sem palavras. Eu nunca me senti tão importante, tão preciosa,
tão amada por alguém. Eu engoli toda a emoção que senti e tentei acalmar
meu coração.
— Então, essa será a nossa terceira primeira vez... — comentei com
doçura, passando a mão em sua cabeça fazendo meus dedos desaparecerem
em seus cabelos.
Ele assentiu, e um sorriso absurdamente sensual surgiu em seus lábios
me deixando sem ar. Theo era sexy demais para o próprio bem.
— Todas exatamente no mesmo quarto, na mesma cama, e te garanto
que essa será a melhor delas — disse beijando o meu ombro, e seus lábios
seguiram descendo pelo meu braço enquanto ele tirava o tecido do vestido,
revelando a minha pele pouco a pouco. Ele fez isso nos dois braços até que
eu ficasse completamente nua da cintura para cima. Theo parecia controlado
e seguro, e eu estava sentindo a minha pele em chamas e o desejando
desesperadamente. Seus olhos corriam por cada detalhe do meu corpo,
acompanhando a mão que desenhava a curva da minha cintura, meu abdômen
até o contorno dos meus seios.
— Você é tão linda, Tris. Tão perfeita — disse em devoção, levantando
da cama comigo no colo apenas para que pudesse me colocar novamente
deitada.
Meus olhos passeavam por cada detalhe de seu rosto enquanto meus
dedos os contornava. O rosto que eu tanto amava estava um pouco mais
velho, mais sério e ainda mais lindo. O rosto que nunca saiu da minha
memória, e que aparecia todas as vezes em que eu fechava os olhos.
— Eu te amo tanto — disse baixinho, olhando em seus olhos.
Theo sorriu.
— Valeu a pena esperar por nós dois — afirmou, antes de me beijar com
tanta intensidade que me roubou o ar. Sua língua invadia a minha boca
enquanto suas mãos trabalhavam em arrancar o vestido do meu corpo,
enquanto eu, ao mesmo tempo, buscava desabotoar sua camisa com o pouco
espaço que existia entre nós.
— Porra, o que falta de pano entre os seus seios, sobra na parta de baixo,
hein... — ele reclamou quando precisou se afastar por um instante.
Então meu vestido foi arremessado no chão.
E sua roupa tomou o mesmo destino em segundos.
Sorri.
— Ciumento, hein? — comentei com leve humor.
Ele segurou minhas mãos ao lado da minha cabeça.
— Não gosto que fiquem olhando e desejando o que é meu — se
defendeu, seguindo uma trilha de beijos começando nos meus lábios e
passando meus seios, abdômen, umbigo e lentamente, quase como uma
tortura, seguiu descendo pelo corpo enquanto segurava a minha perna com o
corpo me obrigando a ficar parada. Fazendo com que eu perdesse o ar e
qualquer possibilidade de raciocínio.
— Ah... o que... o que é seu? — repeti a frase com muita dificuldade.
Theo continuou a me torturar, jogando pela janela qualquer habilidade
minha em falar ou pensar, me mostrando que nossa terceira primeira vez seria
muito mais inesquecível, e que me marcaria para sempre.
— Sim. O que é meu.
u acordei com um sentimento novo e delicioso dentro de mim. Eu
estava genuinamente feliz, o que fez o meu coração preencher de amor e paz.
Sonolenta, abri olhos e recebi de presente o sorriso mais lindo do mundo de
bom dia. Theo estava deitado ao meu lado e fazia carinho nos meus cabelos.
E aquela era uma cena que não imaginei ser possível viver nem um milhão de
anos.
Sorri de volta.
— Bom dia — murmurei ao meu espreguiçar.
— Bom dia, princesa. — Ele beijou o meu nariz e boca.
— Você ficou me observando dormir? Isso é muito estranho... e um
tanto quanto assustador — resmunguei de olhos fechados, virando o corpo,
para que ficássemos frente a frente.
Theo riu baixinho e beijou minha testa, enquanto delicadamente fazia
com que minhas costas nuas voltassem a tocar o colchão.
— Sabe como é, foi irresistível. Porque foi a primeira vez que abri os
olhos e encontrei você ao meu lado na cama — sussurrou, todo sedutor no
meu ouvido, enquanto seu corpo pressionava o meu na cama.
Eu sorri, e não contive o pequeno gemido de aprovação pelo que fazia.
— Faz sentido — comentei, lutando para manter a coerência nas
palavras já que sua mão passeava despretensiosamente por um dos pontos
mais sensíveis do meu corpo.
— Me promete uma coisa? — quis saber, mantendo a mesma cadência
de voz, e sem deixar de beijar o pescoço e me torturar com seu toque. —
Promete que nunca mais vai sumir da minha cama?
Ele levantou a cabeça o suficiente para olhar nos meus olhos, me
permitindo perceber o quanto aqueles olhos azuis precisavam de reafirmação,
o que fez com que o meu coração ficasse apertado. E acho que é isso que
acontece quando amamos muito alguém, o medo de perder algo que parece
ser tão certo, tão perfeito, sempre existe. Mas nos últimos dias eu havia
aprendido que não devemos ter medo de algo que dá sentido e propósito à
nossa vida, e não compreender isso significa que renegamos a oportunidade
de ser feliz.
Sorri e rocei os meus lábios nos dele antes de responder.
—— Prometo não sumir da sua cama, da sua casa, da sua vida... —
sussurrei, e a sombra de um sorriso apareceu em seu rosto. Eu fiz o juramento
enquanto girava o corpo, invertendo a nossa posição na cama, e beijei
lentamente o seu pescoço, depois seu peito e cada músculo desenhado do
abdômen, explorando seu corpo sem pressa.
— Bom saber — disse, a respiração ficando cada vez mais pesada graças
às provocações que estava fazendo com a boca.
— Se bem que — comecei, levantando a cabeça repentinamente para
olhar em seus olhos — isso sempre pode mudar se eu estiver muito brava
contigo por não me deixar fazer algo que quero muito. Tipo aprender a
pilotar uma moto, talvez. Aí, vou desaparecer por horas e esquecer o celular
em casa de propósito, é claro. Só para torturá-lo lentamente, minuto a minuto
— sussurrei a provocação em seu ouvido.
Theo girou o corpo, e em um segundo eu estava com as costas de volta
no colchão e com o seu corpo sobre o meu, como se estivéssemos em um
tatame lutando.
— Ah, é?! São coisas do tipo que devo esperar na nossa relação? Sua
ideia é adotar como forma de tortura me deixar louco de preocupação? —
Theo me fazia perguntas enquanto me atacava fazendo cócegas
impiedosamente, e eu chorava de tanto rir, tentando agarrar as suas mãos.
— Theo, para! — gritei, entre uma gargalhada e outra.
— Não. Não vou parar. Você acabou de dizer que vai me deixar
preocupado por pura e simples maldade. Como se atreve? — cochichou no
meu ouvido, sem parar o ataque nem por um segundo.
Lágrimas rolavam pelo meu rosto e a minha barriga doía de tanto rir. Ele
parou quando me viu com dificuldade de respirar e enxugou as lágrimas,
dessa vez de alegria, que caíam pelo meu rosto.
Ainda com dificuldade para respirar, respondi:
— Tá bom! Prometo que nunca vou fugir ou desaparecer. Por motivo
algum. — Fiz um X com o dedo sobre o coração, e aquela era uma promessa
que eu não nunca iria quebrar.
— Melhor assim — emendou, orgulhoso de sua conquista, e me beijou
enquanto subia a mão pela minha perna, fazendo com que envolvesse sua
cintura encaixando o seu corpo no meu perfeitamente.
Theo tinha razão, nossa terceira primeira vez foi perfeita, e era incrível o
quanto natural e entregue era estarmos juntos. O quanto fazia total sentindo, e
eu sabia que nunca conseguiria explicar racionalmente a alguém algo que era
baseando totalmente em sentimentos, e que vinha das nossas almas. Era como
se sempre tivesse existido uma linha, um fio condutor entre Theo e eu nos
unindo, e nem mesmo nossos erros, nem mesmo a dor, o sofrimento e as
perdas tinham o poder de arrebentar. Sim, ele era a minha alma gêmea. E eu
nunca acreditei que tal coisa pudesse existir.
Ouvimos três batidas na porta.
— Vá embora — Theo resmungou, sem separar sua boca da minha. Ele
mordeu o meu lábio inferior antes de seguir beijando meu pescoço, enquanto
sua mão tomava um caminho bem mais ao sul do meu corpo nu, me
provocando ao ponto de que eu estava quase implorando por ele.
Mais três batidas, altas e insistentes, sugiram.
— Beatriz Albuquerque Schimidt e Theo Piccolli Ferraz, parem de
tentar me ignorar porque sei que estão aí, isso não é uma atitude muito
inteligente da parte de vocês. — A voz da Ana vinha abafada, levemente
irritadiça do outro lado porta, obviamente tendo o pior timing do mundo e
destruindo o nosso clima.
E eu tentava desesperadamente ignorar sua voz, enquanto me controlava
para não gemer vergonhosamente alto graças ao Theo, que continuava
empenhado em me torturar de prazer com sua mão entre as minhas pernas e
boca descendo pelo meu pescoço.
— Mamãe quer todos que dormiram aqui em casa sentados à mesa para
o café da manhã. Então, vou dar 15 minutos para que fiquem decentes e
saiam desse quarto. — A ordem da minha irmã interrompeu mais uma vez a
minha sequência dos pequenos gemidos de prazer.
— Juro por Deus que às vezes tenho vontade de esganar essa garota —
resmunguei, completamente frustrada.
— Eu ouvi isso! — ela gritou, parecendo magoada.
— Ótimo. Agora saia daí senão vai ouvir bem mais que isso! — gritei de
volta.
— Só 15 minutos, hein!? — ela gritou, então o silêncio voltou, indicado
que ela havia partido.
— Não é bem o que eu tinha mente, mas consigo fazer bastante coisa em
15 minutos... — Theo comentou, não sei se mais para ele do que para mim.
Então ele levantou da cama me levando junto —, mas é melhor otimizarmos
esse tempo te levando de uma vez para o chuveiro — concluiu, me pegando
no colo nua e me colocando sobre seu ombro de um jeito adoravelmente
troglodita de ser e que passei a conhecer nos últimos dias, e me levou
sorrindo para o banheiro até que meus pés tocaram o piso frio. Então, ele
girou a torneira do chuveiro.
— 15 minutos... — ele sussurrou em um tom rouco e sensual e me
beijou, e eu soube no mesmo instante que todo o seu lado troglodita
desapareceria e daria lugar ao homem deliciosamente sexy que me mostrava,
a cada vez que estávamos juntos, que conhecia o meu corpo melhor do que
eu, que fazia de tudo para demostrar que amava de todas as formas.
Infelizmente os maravilhosos minutos chegaram ao fim e fomos
obrigados a nos vestir, algo que há horas havíamos decidido abrir mão por
completo. Theo rapidamente foi ao quarto dele e vestiu uma roupa limpa,
voltando para o meu a tempo de me ajudar a fechar o zíper do vestido curto
florido que havia escolhido. E me pegando totalmente de surpresa ele me
imprensou contra a parede segurando pela cintura e beijando o meu pescoço.
— Após o café da manhã ― disse entre um beijo e outro ―, vamos
retornar para esse quarto, trancar a porta e só vou abrir novamente se a porra
dessa casa estiver em chamas — fez seu juramento sem esconder a revolta
com a interrupção.
Será que algum dia será o bastante? Será que algum dia vamos cansar de
desejar nos beijar, de nos tocar, de querer ouvir a voz um do outro? Eu não
conseguia imaginar algo assim acontecendo, era intenso e verdadeiro demais.
Eu sorri, concordando com a sua ideia antes de beijá-lo, e meus dedos
passearam lentamente pelo cós de sua calça jeans tocando levemente sua
pele, o provocando.
Algo que estava aprendendo a amar mais a cada minuto.
— Tem noção do quanto te quero de novo nesse exato instante? —
resmungou sua frustração, sua voz e seu corpo mostrando claramente o
quanto ele me queria.
— Só temos que esperar uma horinha ou duas — comentei baixinho,
colocando a mão por baixo da camiseta sentindo o calor da sua pele.
— Por mim não esperaria nem a porra de um minuto — devolveu de
imediato, me fazendo sorrir.
Não era uma de suas frases mais românticas, mas ainda assim, de certa
forma, foi. E eu gostava disso, Theo era ele mesmo comigo o tempo todo. Ele
tirou alguns fios de cabelo que esconderam parte do meu rosto, enquanto me
observava como se eu fosse a pessoa mais preciosa desse mundo.
— Vamos morar junto — ele disse sem hesitar, em tom total de
afirmação, não de pergunta.
Meus olhos se arregalaram, me impossibilitando esconder a surpresa e o
impacto da sua frase, mas ainda assim o sorriso não saiu do meu rosto.
— Tem certeza? Nós estamos juntos a menos de vinte e quatro horas,
Theo — pontuei a questão com leveza e sem deixar de sorrir.
Ele colocou uma mecha de cabelo atrás de minha orelha, e seu olhar era
tão carregado de carinho quanto seu gesto.
— Eu te amo e sou seu a vida inteira, princesa. Por qual motivo
deveríamos esperar? Eu não quero voltar para Londres nem para fazer a
minha mudança. O meu lugar é aqui, ao seu lado — disse baixinho, antes dos
seus lábios tocarem os meus.
Sabia que o meu sim tinha saído abafado, enquanto sua língua invadia a
minha boca, mas não me importei. Theo sabia que eu diria sim. Eu sabia que
diria sim. Então, interromper o beijo para falar três letras parecia ser
desperdício de tempo. E nós já havíamos perdido muito tempo. Theo me
levantou para que eu pudesse envolver sua cintura com as pernas e me
encostou de novo na parede, sem deixar de esmagar sua boca contra a minha.
Seu jeito, a sua mistura de atitudes carinhosas com as possessivas na hora
certa, me deixavam em êxtase e eu não conseguia parar de tocá-lo, beijá-lo,
desejá-lo. Eu amava aquela química tão perfeita que descobrimos existir entre
nós.
Três batidinhas na porta interromperam o nosso momento, de novo.
— Estão 12 minutos atrasados. — A voz da minha irmã surgiu irritada
do outro lado da porta, como se ela estivesse apenas passeando no corredor.
Sem interromper o beijo, resmunguei, enquanto Theo soltava um
xingamento abafado.
Então nos afastamos apenas o suficiente para que pudéssemos olhar nos
olhos um do outro.
— Talvez devêssemos passar uns dias bem longe das nossas famílias...
— sugeri, enquanto Theo me tirava de seu colo e ajudava para que ficasse
novamente em pé.
— Eu voto para ser algumas semanas, talvez meses — emendou, de um
jeito que me fez acreditar que ele era grato por ser filho único.
Suspirei ao imaginar como se seria passar meses sozinha com o Theo,
mas talvez eu não precisasse, afinal iríamos morar juntos e teríamos toda a
privacidade do mundo. E, por mais que as nossas famílias e amigos fossem
um pouco intrometidos e loucos, eu os amava. Cada um deles.
— Calma. Nós vamos morar juntos, então foca nisso — afirmei,
afastando seu corpo com delicadeza, colocando uma distância segura entre
nós. — Mas antes precisamos enfrentar esse café da manhã. E você sabe que
além da refeição mais importante do dia, é sem dúvida a que mais gera
polêmica na família Schimidt. Fora que mal posso esperar para saber o que
vovô Augusto vai dizer sobre sua noite com a Francisca. Porque quando
passei por ele na festa ouvi algo sobre ele ter lido a trilogia de cinquenta tons
de cinza recentemente, e algo me diz que ele pode estar cogitando a
possiblidade de tornar o Christian Grey da terceira idade — comentei, sem
me dar ao trabalhado de esconder a enorme preocupação com as possíveis
conversas.
— Que Deus nos proteja. Porque dizer que a vida do vovô Augusto é um
livro aberto seria o eufemismo do século... — murmurou derrotado.
Assenti.
— Acho que devemos deixar uma garrafa de vodca ao lado do suco de
laranja, só para garantir — comentei com humor.
— Definitivamente — finalizou me dando um beijo rápido e segurou
minha mão antes de abrir a porta.
Sim, sem dúvida precisaríamos de sorte para sobreviver àquela manhã.
Se bem que, ao lado de Theo, me sentia pronta para enfrentar o mundo.
Porque, pela primeira vez depois de muitos anos, eu estava me permitindo
viver, ser feliz, me perdoar e estar rodeada das pessoas que tanto me amavam.
Pessoas que estiveram dispostas a me resgatar e trazer de volta à vida, e eu
não poderia pedir por um presente melhor.
FIM
screver os agradecimentos desse livro é algo muito especial para
mim. Digo isso porque a história do Theo e da Tris ficou na minha vida
durante anos. Sendo imaginada, reescrita e editada. Houve um momento em
que cheguei a imaginar que nunca voltaria a ser lida por vocês, queridos
leitores.
Sei que, para alguns, a história não foi cem por cento uma novidade, já
que esteve no Wattpad há alguns anos. Com outro título, em uma versão bem
rústica, sem edição e com alguns “furos”, mas repleta de amor e carinho.
Tanto que alcançou a marca de quase 1 milhão de leituras. Ciente de que a
história merecia um cuidado maior, tirei da plataforma e a vida seguiu até
chegarmos aqui. E só posso dizer o quanto sou grata.
Grata a Deus, que é quem me dá força e esperança todos os dias. Grata a
minha família, que me incentiva e principalmente grata por ter conhecido
tantas pessoas incríveis através da história da Beatriz e do Theo.
Se não fosse por esse casal, eu não teria conhecido minhas primeiras
leitoras. E aqui fica o meu muito obrigada a todas que conheci através do
Wattpad. Vocês me fizeram acreditar que era possível a cada mensagem de
incentivo, a cada: Eu amei a história. Eu chorei em determinada cena. Eu
amo o Theo. Você vai escrever o livro do Pedro agora? Eu quero um livro do
Rodrigo. Sério, vocês são tão incríveis que mantiveram o nosso grupo do
WhatsApp ativo, mesmo quando eu não pude estar presente. Juliana Mayumi,
Jô Gomes, Prih Maia, Fernanda Rezende, Vanessa Roseto, Karen Cristina,
Adriana Barros e Bruna Priscila. Vocês estão aqui representando todas as
leitoras que me apoiam das formas mais diversas. Sou grata pelo carinho, e a
paciência que tiveram para esperar o meu momento de voltar.
Tudo que escrevi até aqui já seria motivo suficiente para que o livro do
Theo e a da Tris voltasse à vida, não é? Sim, é claro! Mas esses personagens
foram além e me deram outro superpresente, uma mulher incrível chamada
Guta Bauer (Increasy Consultoria Literária), que acreditou em mim ao ler a
história, e se tornou minha agente. Guta, obrigada por me ensinar tanto. Por
ter apontado meus erros e acertos, e ter se empenhado para extrair de mim o
melhor para o bem da história. Obrigada por me ajudar a evoluir um pouco a
cada dia. Quero aproveitar e agradecer a Grazi Reis, por ser sempre tão
querida e cuidadosa para deixar a história mais redondinha para vocês,
leitores.
Ainda falando da família Increasy, Alba Milena e Mari Dal Chico, deixo
aqui todo o meu carinho e admiração.
À minha amiga Ana Carolina Almeida, que ama ler os manuscritos das
minhas histórias, espalhando folhas A4 sobre a cama. Obrigada por acreditar
em mim todas às vezes que duvidei que conseguiria.
Clara Oliveira, você foi a minha primeira leitora, que, empolgada,
mergulhou de cabeça na minha ideia ao ler o rascunho do rascunho, quando
trabalhávamos juntas, e nunca esquecerei tuas palavras encorajadoras.
Clara Savelli, Giulia Cavalcante, Igrainne Marques, Aimee Oliveira,
Aione Simões e Deborah Strougo obrigada pelo apoio, vocês são
maravilhosas. Deborah, sou super grata a você por ter topado ler a história
assim que finalizamos, e por enviar áudios com comentários a cada avanço na
leitura.
Por último, mas não menos importante, a todos os leitores que
dedicaram seu tempo para conhecer a história da Tris e do Theo. Obrigada,
por terem embarcado comigo nessa jornada de amor, amizade, perda e cura.
é carioca, ariana, ama sentar nas cafeterias do Rio para
observar as pessoas e tentar imaginar como são suas vidas. Apaixonada por
livros, filmes e séries, não abre mão de histórias que a fazem suspirar, e
acredita que todo mundo merece ter um final feliz. Formada em
administração de empresa, viveu anos mergulhada no mundo das exatas, e no
final, se descobriu no mundo das humanas. Em 2016, se arriscou ao adentrar
em terras desconhecidas ao publicar o seu primeiro original no Wattpad.
Depois de dois anos afastada da escrita retornou com a novela As Surpresas
do Natal, lançado em formato e-book na Amazon em dezembro de 2020.
Thaís Louzada é autora agenciada pela Increasy Consultoria Literária.
Para mais informações sobre seus trabalhos entrar em contato com no
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Contents
1. Folha de Rosto
2. Ficha Catalográfica
3. Quote
4. Prólogo
5. Capítulo 1
6. Capítulo 2
7. Capítulo 3
8. Capítulo 4
9. Capítulo 5
10. Capítulo 6
11. Capítulo 7
12. Capítulo 8
13. Capítulo 9
14. Capítulo 10
15. Capítulo 11
16. Capítulo 12
17. Capítulo 13
18. Capítulo 14
19. Capítulo 15
20. Capítulo 16
21. Capítulo 17
22. Capítulo 18
23. Capítulo 19
24. Capítulo 20
25. Capítulo 21
26. Capítulo 22
27. Capítulo 23
28. Capítulo 24
29. Capítulo 25
30. Capítulo 26
31. Capítulo 27
32. Capítulo 28
33. Capítulo 29
34. Capítulo 30
35. Capítulo 31
36. Capítulo 32
37. Capítulo 33
38. Capítulo 34
39. Capítulo 35
40. Capítulo 36
41. Capítulo 37
42. Capítulo 38
43. Capítulo 39
44. Capítulo 40
45. Capítulo 41
46. Capítulo 42
47. Capítulo 43
48. Capítulo 44
49. Agradecimentos
50. Sobre a Autora
51. Redes Sociais
Landmarks
1. Cover
Table of Contents
Folha de Rosto
Ficha Catalográfica
Quote
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Agradecimentos
Sobre a Autora
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