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Processo Diagnóstico em Fonoaudiologia –

A Importância da História Clínica

Autoria
Prof.ª M.ª Nívea Maria Símaro Gomes

Revisão
Esp. Laís Otero Fugaitti
OBJETIVO DA UNIDADE
• Discutir a importância da anamnese na história clínica do indivíduo.

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Introdução
Vamos iniciar nossa Unidade de Estudo trazendo informações sobre o pro-
cesso diagnóstico fonoaudiológico, ressaltando a importância da anamnese
nesse contexto. Vale salientar que essa temática é fundamental para a sua
prática profissional, pois possivelmente, durante sua carreira como profis-
sional de Fonoaudiologia, as questões relacionadas ao diagnóstico dos dis-
túrbios da comunicação farão parte do seu objeto de estudo e de sua rotina
clínica. Nessa perspectiva, discutiremos diferentes protocolos de anamnese
e sua importância no contexto clínico do diagnóstico fonoaudiológico.

Lembre-se de realizar anotações, mapas mentais e resumos, bem como ler e


assistir aos Materiais Complementares, pois eles ampliarão seu conhecimento e
sua curiosidade por essa área tão complexa e, ao mesmo tempo, tão interessante
que é a comunicação humana!

Conhecimento dos Diferentes


Procedimentos Utilizados
em um Processo Diagnóstico
Fonoaudiológico: Anamnese
Para compreendermos a anamnese como um procedimento que inau-
gura o processo diagnóstico em Fonoaudiologia, precisamos entender
que todos os procedimentos que envolvem a prática clínica nessa área
têm sua devida importância e formam um todo que passa a compor o
processo terapêutico.

A entrevista inicial na clínica fonoaudiológica, por seu caráter de importân-


cia, deve ser ponto de reflexão para cada profissional, uma vez que fun-
ciona como a porta de entrada do paciente no tratamento. É a partir dela
que o terapeuta consegue reunir dados para analisar e viabilizar sua deci-
são em face da problemática da linguagem que é apresentada, daí pensar-
mos que apenas uma anamnese em forma de questionário não poderá dar
conta de encadeamentos da história do paciente.

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Mas o que entendemos por anamnese?
Segundo o Dicionário Oxford Languages, trata-se de um subs-
tantivo feminino e tem como definição: “1. MEDICINA histórico
que vai desde os sintomas iniciais até o momento da observação
clínica, realizado com base nas lembranças do paciente. 2. lem-
brança pouco precisa; reminiscência, recordação” (ANAMNESE,
2023, n.p.).

Anamnese Fonoaudiológica
Vamos entender a anamnese fonoaudiológica no contexto da nossa profissão.

• A anamnese fonoaudiológica, também chamada de entrevista inicial, é


quando o paciente e/ou seus familiares irão ter o primeiro contato com
o fonoaudiólogo;

• É nesse momento que o profissional vai levantar as principais informações


sobre seu cliente e, simultaneamente, iniciar o vínculo entre terapeuta e
paciente. Durante o levantamento clínico, o profissional vai querer saber
o máximo possível sobre o cliente;

• Perguntas como: “Qual é a queixa que trouxe você aqui?”, “Tem alguma
doença atualmente ou já tratou de alguma?”, “Faz uso de algum medi-
camento?” e “Alguém da família tem algum problema semelhante?” são
bem comuns. Quanto mais detalhes forem passados ao fonoaudiólogo,
melhor será a anamnese;

• Quando a anamnese é bem-feita, possibilita que o profissional entenda


melhor o caso e saiba com mais precisão quais instrumentos serão ne-
cessários para avaliar o paciente. Do mesmo modo, auxilia nas hipóteses
diagnósticas e a identificar quando for necessário o encaminhamento
para exames complementares ou avaliação com outros especialistas;

• Sendo assim, é importante saber que a anamnese é um instrumento


essencial para que o fonoaudiólogo tenha êxito nas avaliações e, con-
sequentemente, no planejamento terapêutico do paciente em questão,
(PINTO; SCHIEFER; PERISSINOTO, 2018).

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Figura 1 – Anamnese entre profissional e paciente
Fonte: Getty Images
#ParaTodosVerem: foto de um ambiente clínico. Janelas ao fundo estão iluminando a sala. Há uma mesa
posicionada entre duas pessoas. No ambiente, a profissional, que é uma mulher branca, está sentada; ela
tem cabelos longos, castanhos e estão presos, usa um pijama hospitalar de azul, na mão direita segura uma
caneta e a esquerda está apoiada sob o queixo; tem o olhar fixo para a senhora enquanto faz anotações. À
sua frente, a paciente, idosa, usando camisa branca, está sentada em uma cadeira de rodas; ela tem cabelos
grisalhos e usa óculos. Fim da descrição.

Principais Protocolos de
Anamnese e seus Achados
para o Raciocínio Clínico nas
Diferentes Instâncias do
Diagnóstico
Durante muitos anos, as pessoas buscaram relacionar fatos com sintomas e sin-
tomas com o estado físico do paciente, criando assim, por meio de algumas con-
siderações/coincidências, novos padrões e conceitos sobre o ser humano e seu
corpo. No entanto, apenas nos últimos séculos a anamnese, somada ao exame
físico, foi valorizada na investigação diagnóstica.

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A palavra anamnese origina-se do grego: ana = trazer de volta, recor-
dar; mnese = memória; ou seja, anamnese significa trazer de volta, re-
cordar os fatos e eventos relacionados à doença e à pessoa doente. O
procedimento, adotado desde a Grécia clássica, era praticado com o
objetivo de aliviar o sofrimento das pessoas enfermas. Nesse tempo,
a determinação de uma doença era completamente empírica, basea-
da no conhecimento de seus sintomas.
– LOPES FILHO et al., 2013, p. 260

Classicamente, a anamnese engloba:

• Identificação do paciente: nome, idade, sexo, cor, estado civil, profissão


e residência;

• Queixa principal: Queixa e Duração (QD);

• História Pregressa da Moléstia Atual (HPMA): diz respeito a sintomas


ou sensações subjetivas de anormalidade somática ou psíquica e ao iní-
cio desses sintomas, até a data do procedimento;

• História clínica: levantamento geral e específico de aspectos relaciona-


dos à doença (datas, recorrências);

• Antecedentes pessoais e familiares;

• Hábitos de vida e condição socioeconômica/cultural do paciente;

• Aspectos da escolaridade; e

• Personalidade.

Cada um desses itens tem grande importância na compreensão das primeiras


informações, que poderão contextualizar o paciente e sua queixa. Identificar o
paciente, por exemplo, pode parecer banal aos olhos de quem lê, mas é muito
relevante. Quando o profissional se refere ao paciente pelo nome (e não pelo
número ou parentesco, como mãe ou pai), é possível criar uma situação amigável
e agradável. Dados como idade, cor, sexo e profissão também auxiliam a investi-
gação de possíveis doenças; o estado civil indica seus vínculos interpessoais; e o
endereço traz noções de distância e tempo percorrido.

Toda essa procura de informações pode ser administrada de várias formas,


sendo a mais tradicional a entrevista pessoal direta com o profissional, realizada
geralmente na primeira consulta.

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Segundo Perestrello (2010, p. 265), “a anamnese estabelece uma relação trans-
pessoal que tem por objetivo o diagnóstico do doente e não da doença”. Existe
uma relação íntima entre a observação dos acontecimentos relatados pelos en-
trevistados e a compreensão do seu significado, ou seja, o interpretativo e a as-
similação ou reflexão dos fatos caminham para o destino das condutas a serem
tomadas a partir da formulação das hipóteses.

Na clínica fonoaudiológica, a entrevista inicial vem se reestruturando por meio da prática


clínica, provocando a reflexão sobre sua forma e função. A partir desse momento, não
mais serão mencionados os termos doente ou doença. O foco da anamnese, para os te-
rapeutas, passa a ser, além do contato inicial, a intersecção do sujeito e de suas queixas.

No primeiro contato com os familiares e com a criança, deve-se principalmente


dar oportunidade para que a família fale, escutar o que ela tem a dizer, solucio-
nar dúvidas pendentes sobre o caso e realizar um contrato de trabalho. Outro
aspecto importante está relacionado ao contexto não verbal da entrevista, como
a qualidade da voz, postura e expressão facial, assim como do cenário e do con-
texto cultural da família/paciente e/ou qualquer destaque especial a esses itens.

Ehrlich (1989, p. 617) acredita que “esse momento deva atingir um equilíbrio entre calor
humano, objetividade clínica e suas intenções”. Os acompanhantes da criança trazem
expectativas variadas para essa primeira entrevista. Diante de um olhar clínico, é possí-
vel observar atitudes protetoras ou de negação do problema, propiciando uma melhor
forma de conduzir o trabalho e contribuindo para a coleta qualitativa dos dados.

Esse momento também procura trazer a família como parte da equipe, e não sim-
plesmente como fornecedora de informações sobre o desenvolvimento da crian-
ça. Os papéis já podem, então, ser definidos e suas responsabilidades também.
É pela história contada que se conhece a família, seus conceitos, o papel de cada
um, suas ansiedades e suas expectativas. Afinal, contar uma história é recons-
truí-la, anexando valores, emoções e lembranças. Por exemplo, a mesma história
pode ser contada de formas variadas por diferentes familiares e as versões serão
todas verdadeiras, na medida em que são contadas de lugares distintos.

Dessa forma, é importante que o terapeuta, a partir da anamnese, vá estabe-


lecendo uma relação de confiança e credibilidade com o paciente e sua família,
visto que isso possibilitará construir e descobrir os fundamentos da prática clíni-
ca, favorecendo o processo terapêutico.

O próximo passo é conhecer detalhadamente a criança, suas condições de nasci-


mento e seu desenvolvimento até aquele momento sob os aspectos físico, motor,
intelectual, emocional e social, além de qualquer intercorrência em seu crescimen-
to. Cada um desses itens tem relação entre si para a compreensão dos fatos e não

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­ ecessariamente devem seguir um padrão rígido. A estratégia de cada fonoaudiólo-
n
go deve ter sua própria característica que garanta o resultado almejado, pois o que
valoriza o trabalho é a análise dos dados. Isso promove as primeiras hipóteses que
implicam os encaminhamentos necessários. A investigação, nesse momento, deve
contar também com dados da história circunstancial, relatórios escolares (se houver),
exames realizados ou outros atendimentos especializados.

Sabe-se que o impacto de um diagnóstico implica uma série de preconceitos e,


portanto, pode gerar angústia aos familiares no momento da devolutiva. Dessa
forma, o amadurecimento dos dados depende do momento de cada indivíduo.

Assim, estabelecer um bom relacionamento leva a procedimentos pos-


teriores bem-sucedidos. Nesse sentido, a anamnese já é um momento
terapêutico. O profissional conta com informações qualitativas e coo-
peração para melhor conduzir seu trabalho; o paciente, por sua vez,
sente a confiança necessária para se engajar no processo terapêutico.
– LOPES FILHO et al., 2013, p. 265

Figura 2 – Anamnese entre profissional, mãe e bebê


Fonte: Getty Images
#ParaTodosVerem: foto de um ambiente clínico com o fundo branco. No ambiente, há a presença de uma
mulher branca, que está sentada. Ela tem cabelos longos, ruivos e estão soltos, usa uma blusa preta e
por cima, uma blusa de mangas longas na cor verde. Está sorrindo e segurando um bebê no colo. À sua
frente está uma profissional segurando uma prancha nas mãos, e mais à sua direita há um computador. A
profissional tem cabelos pretos e está interagindo com a mãe e o bebê. Fim da descrição.

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Reflita
Há indicação de somente um protocolo de anamnese? Qual o
roteiro mais indicado? Vamos partir de perguntas mais abran-
gentes sobre o desenvolvimento da criança ou de perguntas
mais específicas, em se tratando de anamnese infantil?

A entrevista ou anamnese caracteriza-se como um momento especial, tanto para


os que irão receber as informações como para quem as transmitirá. Geralmente,
recebem essas informações os pacientes, frequentemente acompanhados por
alguém do seu grupo familiar ou até mesmo por responsáveis legais. É sempre
um momento que se reveste de expectativas e ansiedades por parte de todos os
envolvidos, pois se trata da retomada do que ocorreu ao longo de sua história de
vida, de amenizar eventuais dúvidas, de integrar os dados coletados a partir de
diferentes fontes e facilitar o processo de tomada de decisão.

Sempre que possível, deve ser utilizada a mesma linguagem empregada pelo pa-
ciente e seus familiares. Sugere-se começar a coleta de informações apontando
os aspectos nos quais o paciente se mostra mais sadio e mais bem adaptado,
favorecendo o processo de interação entre ele e o terapeuta.

Sabemos que o raciocínio clínico é necessário em qualquer abordagem terapêu-


tica, não sendo diferente em relação à área da Fonoaudiologia. Ao realizar o pro-
cedimento de anamnese, mesmo a partir da aplicação de protocolos validados,
o terapeuta deverá ter em mente a importância do levantamento de hipóteses
diagnósticas, principalmente etiológicas, para a melhor compreensão do caso.

O que entendemos por hipótese diagnóstica etiológica?


Por definição, é a determinação da causa de uma doença. Portanto,
a hipótese diagnóstica etiológica diz respeito às possíveis causas que
levaram àquela condição patológica.

A seguir, apresentamos um roteiro de anamnese com perguntas sobre o desen-


volvimento da criança a partir da queixa da família.

1. Identificação:

• Queixa: QD;

• Motivo da consulta: quem encaminhou o paciente para o atendi-


mento fonoaudiológico;

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• Heredograma: é uma representação gráfica da história familiar, apre-
sentando os vínculos de parentesco e as características genéticas.

2. Dados sobre o problema ou História Pregressa da Queixa (HPQ) ou


História da Moléstia Atual (HMA): quando ocorreu o problema, quem
percebeu, quem procurou tratamento, quais foram as medidas;

3. Antecedentes pessoais:

• Gestação: como foi o período gestacional e se apresentou alguma inter-


corrência, realizou pré-natal e fez uso de medicamentos (se sim, quais?);

• Parto: com quantas semanas o bebê nasceu; se é pré-termo, a termo


ou pós-termo; qual foi o tipo de parto – normal, cesárea ou fórceps;

• Condições do recém-nascido (RN): se o bebê chorou ao nascer; peso;


altura; nota do Apgar; se precisou de incubadora e/ou sonda; se apre-
sentou icterícia; se fez banho de luz (fototerapia); se apresentou-se
cianótico (roxo ao nascimento); se recebeu alta hospitalar com a mãe.

4. Alimentação: anterior e atual: abordar os principais aspectos da ali-


mentação, desde a amamentação natural até a introdução de alimentos
líquidos, pastosos e sólidos, a preferência alimentar, consistência dos
alimentos e presença de engasgos, entre outros;

• Via alternativa de alimentação: se fez uso de sonda e, se sim, de


que tipo:

• Sonda Nasogástrica (sonda NG);

• Sonda Nasojejunal (sonda NJ);

• Sonda de Gastrostomia (sonda G);

• Sonda de Gastrostomia-Jejunostomia (sonda GJ);

• Sonda de Jejunostomia (sonda J);

5. Hábitos adquiridos: se fez uso de chupeta e até quando; se tem o hábi-


to de roer as unhas (onicofagia); se fez uso de mamadeira e até quando;

6. Dentição: quando erupcionaram os primeiros dentes e se vai ao dentis-


ta regularmente;

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7. Desenvolvimento:

• Motor: quando o bebê sustentou o pescoço, sentou-se sem apoio,


engatinhou e andou; se é uma criança ágil ou desastrada;

• Linguagem: quando o bebê balbuciou, quando iniciou as primeiras


palavras, se forma frases, se é compreendido pelas pessoas;

8. Audição e visão: Se o paciente refere queixas auditivas e/ou visuais, tem otites
de repetição, é atento aos sons reage quando chamado e faz uso de óculos;

9. Escolaridade: coletar dados do desenvolvimento escolar, do lugar em


que a criança se senta na sala de aula, se tem interesse pela escola, se
apresenta queixas escolares, queixas de desatenção e rendimento esco-
lar diminuído, entre outros;

10. Antecedentes patológicos: questionar sobre o estado de saúde geral


da criança e se faz uso de medicamentos;

11. Hereditariedade: questionar se há casos semelhantes ao da criança na


família;

12. Personalidade: como a criança lida com os desafios do dia a dia; se é


calma, nervosa ou agitada, entre outros;

13. Dinâmica e rotina de vida: se a família e a criança têm horários regu-


lares para as Atividades de Vida Diária (AVD), se há momentos de lazer;

14. Observações complementares: acrescentar, se necessário, dados de


exames complementares ou outras informações;

15. Responsável;

16. Data.

Saiba Mais
A literatura considera que a chamada gravidez “a termo” (entre
37 e 42 semanas) pode ser subdividida em três fases (MARIZ,
2021): o termo precoce (entre 37 e 38 semanas e seis dias), o
termo pleno (39 a 40 semanas e seis dias) e o termo tardio (41
a 42 semanas).

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Vídeo
Assista a seguir a um vídeo sobre os tipos de
sondas de alimentação, descritas no roteiro de
anamnese. Reflita sobre a importância de o fono-
audiólogo conhecer os diferentes tipos de sondas
de alimentação para uma adequada abordagem
ao questionar esse aspecto na anamnese.

Reflita
A avaliação começa na anamnese, contemplando queixa;
história pregressa individual e familiar; dados do pré, peri
e pós-natal; e detalhamento do desenvolvimento da lingua-
gem, neuropsicomotor, emocional e de aprendizagem. Como
as condições de nascimento do bebê podem contribuir para
o seu desenvolvimento integral? Qual a importância da escala
ou índice de Apgar para o desenvolvimento do bebê?

Escala ou Índice de Apgar, leva o nome de sua autora Dra. Virgínia


Apgar (1953). Consiste em uma medida padronizada da condição de
um recém-nascido; avalia cor, frequência cardíaca, reflexos, tônus
muscular e respiração. O recém-nascido é classificado em 0, 1 ou 2
em cada medida, para uma pontuação total de 10. Uma pontuação
aos cinco minutos de 7 a 10 – indica que o bebê está em uma con-
dição que vai de boa a excelente. Uma pontuação abaixo de 5 a 7
significa que o bebê precisa de auxílio para começar a respirar; uma
pontuação abaixo de 4 indica que precisa de medidas de reanimação
imediatas. Caso a ressuscitação seja b­ em-sucedida, elevando a pon-
tuação do bebê para 4 ou mais em dez minutos, provavelmente não
haverá danos no longo prazo. Dez, 15 e 20 minutos após o parto, pon-
tuações de 0 a 3 estão progressivamente associadas com paralisia
cerebral (deficiência muscular causada por dano cerebral pré-natal
ou durante o parto) ou outros problemas neurológicos.

A escala de Apgar é popular porque é fácil de lembrar e não exige


o uso de equipamentos médicos sofisticados, de modo que fornece
uma maneira rápida de avaliar a saúde do recém-nascido.
– PAPALIA; MARTORELL, p. 93, 2022

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É sabida e amplamente discutida na literatura a importância da realização de
uma anamnese bem-feita, com perguntas diretas e que possibilitem ao fonoau-
diólogo conhecer melhor o histórico de vida do paciente.

Nessa perspectiva, a Fonoaudiologia enquanto ciência, por meio do protocolo de


anamnese e do detalhamento da história clínica do paciente, buscará levantar
dados do desenvolvimento que possam estar influenciando em sua condição atual.
Explorar os aspectos da queixa e do que pode ter motivado a procura pelo fonoaudi-
ólogo e fazer o levantamento dos aspectos que antecederam a queixa, dos dados da
gestação e parto e das condições do RN, além dos dados gerais do desenvolvimen-
to da criança e das condições em que este ocorreu, poderá nortear o diagnóstico,
assim como contribuir para um planejamento terapêutico mais adequado.

Vídeo
1ª Consulta da Fono: Como é?
O que Esperar? Como se Preparar?
Assista a seguir a um vídeo sobre a importân-
cia da anamnese fonoaudiológica e reflita so-
bre a importância da anamnese no processo
diagnóstico fonoaudiológico.

Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)

O Guia norteador sobre a Classificação Internacional de Funcionalidade e


Incapacidade/CIF em Fonoaudiologia é um documento que registra uma
classificação estatística sobre funcionalidade humana, além da influên-
cia ambiental, dentro de um número manuseável de categorias. Segundo
a Resolução 54.21/2001, da Organização Mundial da Saúde [OMS], a CIF
visa atender “as necessidades de informação, notificação e pesquisa”. As
categorias da CIF foram agrupadas de forma a torná-la mais adequada
aos objetivos de estudos epidemiológicos gerais e para a avaliação de
assistência à saúde. A CIF é utilizada por profissionais da área da saúde
e de outras áreas com a finalidade de referenciar sua prática. No caso
específico da Fonoaudiologia, a CIF auxilia nas ações relacionadas com os
Distúrbios da Comunicação Humana.
– CONSELHO Federal de Fonoaudiologia, 2013, p. 1

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Visando responder às necessidades de se conhecer mais sobre as
consequências das doenças, em 1976 a OMS publicou a International
Classification of Impairment, Disabilities and Handicaps (ICIDH), em cará-
ter experimental. Esta foi traduzida para o Português como Classifi-
cação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens
(handicaps), a CIDID. […]

A versão em língua portuguesa foi traduzida pelo Centro Colaborador


da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classificações
Internacionais em Língua Portuguesa com o título de Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, CIF. […]

A CIF descreve a funcionalidade e a incapacidade relacionadas às


condições de saúde, identificando o que uma pessoa “pode ou não
pode fazer na sua vida diária”, tendo em vista as funções dos órgãos
ou sistemas e estruturas do corpo, assim como as limitações de ativi-
dades e da participação social no meio ambiente onde a pessoa vive.

Segundo a OMS, a CID-10 e a CIF são complementares: a informação


sobre o diagnóstico acrescido da funcionalidade fornece um quadro
mais amplo sobre a saúde do indivíduo ou populações. Por exemplo,
duas pessoas com a mesma doença podem ter diferentes níveis de
funcionalidade, e duas pessoas com o mesmo nível de funcionalida-
de não têm necessariamente a mesma condição de saúde.
– FARIAS; BUCHALLA, 2005, p. 189, grifo nosso

Glossário
CID-10: é a Classificação Internacional de Doenças, em sua dé-
cima revisão. Essa lista classifica doenças, sintomas e uma série
de ocorrências médicas em códigos que são usados para iden-
tificar e padronizar questões de saúde em nível mundial.

O termo do modelo da CIF é a funcionalidade, que cobre os com-


ponentes de funções e estruturas do corpo, atividade e participação
social. A funcionalidade é usada no aspecto positivo e o aspecto ne-
gativo corresponde à incapacidade. Segundo esse modelo, a incapa-
cidade é resultante da interação entre a disfunção apresentada pelo
indivíduo (seja orgânica e/ou da estrutura do corpo), a limitação de
suas atividades e a restrição na participação social, e dos fatores am-
bientais que podem atuar como facilitadores ou barreiras para o de-
sempenho dessas atividades e da participação.

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A CIF é baseada, portanto, numa abordagem biopsicossocial que
incorpora os componentes de saúde nos níveis corporais e sociais.
Assim, na avaliação de uma pessoa com deficiência, esse modelo
destaca-se do biomédico, baseado no diagnóstico etiológico da dis-
função, evoluindo para um modelo que incorpora as três dimensões:
a biomédica, a psicológica (dimensão individual) e a social. Nesse mo-
delo cada nível age sobre e sofre a ação dos demais, sendo todos
influenciados pelos fatores ambientais. A OMS pretende incorporar
também, no futuro, os fatores pessoais, importantes na forma de li-
dar com as condições limitantes. […]

No entanto, os conceitos apresentados na classificação introduzem um


novo paradigma para pensar e trabalhar a deficiência e a incapacidade:
elas não são apenas uma consequência das condições de saúde/doen-
ça, mas são determinadas também pelo contexto do meio ambiente
físico e social, pelas diferentes percepções culturais e atitudes em rela-
ção à deficiência, pela disponibilidade de serviços e de legislação. Dessa
forma, a classificação não constitui apenas um instrumento para me-
dir o estado funcional dos indivíduos. Além disso, ela permite avaliar as
condições de vida e fornecer subsídios para políticas de inclusão social.

Na área clínica, ela se propõe a servir de modelo de atendimento


multidisciplinar, devendo servir para as várias equipes e os vários
recursos de que dispõem os serviços, tais como médico, psicólogo,
terapeuta, assistente social etc.

Uma das vantagens apontadas para a adoção do modelo é a possibilidade


de uniformização de conceitos e, portanto, da utilização de uma linguagem
padrão que permita a comunicação entre pesquisadores, gestores, profis-
sionais de saúde, organizações da sociedade civil e usuários em geral.

Na Saúde Pública, tradicionalmente pouca atenção tem sido dada


às pessoas com deficiência. No entanto, ao lado de recentes engaja-
mentos por parte de organizações e de alguns governos, a publicação
do modelo da CIF fornece as bases para as políticas e disciplinas da
Saúde Pública em relação à população que apresenta deficiências.
Assim, uma das possibilidades de usos da CIF pode ser a contribuição
para responder a importantes questões de Saúde Pública, tais como:
qual é o estado de saúde das pessoas com deficiência comparadas
às demais; que necessidades e que tipos de intervenções são mais
adequadas para reduzir condições secundárias e promover a saúde
das pessoas com deficiências, entre outras.
– FARIAS; BUCHALLA, 2005, p. 189-192, grifo do original

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Diferentes Tipos de
Entrevistas – Estruturada e
Semiestruturada
Pode‐se conduzir a entrevista de forma diretiva e não diretiva, ou estruturada e
semiestruturada. Na primeira hipótese, as respostas objetivas vêm de perguntas
também objetivas e estão centradas nos interesses e necessidades do profissio-
nal. Já na segunda hipótese, há mudanças na forma, pois são feitas questões mais
amplas, deixando o paciente ou os responsáveis à vontade para suas próprias ob-
servações e permitindo maior aproximação do profissional. Na prática, as duas
formas de entrevista podem e devem coexistir, pois quando não há uma impo-
sição sequencial de questões ou tópicos, o paciente/responsável discorre sobre
o problema com base nas informações que já possui, e suas necessidades emer-
genciais surgem com mais facilidade. O paciente ou a família tem liberdade para
expor seus problemas reais, incluindo seus sentimentos em relação a eles. Cabe
ao profissional perceber o que é essencial entre informação, orientação e escuta.

A anamnese é sempre uma investigação para o melhor conhecimen-


to do paciente, além de um momento que estabelece relação entre
as partes. Assim, nada mais natural que transcorram perguntas e
respostas. Uma pergunta sempre induz ao diálogo e tem a finalida-
de de descobrir algo. Geralmente, provoca uma resposta, o que leva
também à reflexão, à expressão de sentimentos ou ponto de vista.
O principal objetivo de se fazer perguntas, em uma anamnese, é
centrar a conversação no paciente e o modo como essa pergunta
é feita faz muita diferença. Atrás de uma pergunta está o conheci-
mento teórico do profissional, seu estilo pessoal, expectativas, for-
ma de interação e vivência. Seu estado emocional também pode
influenciar na reação do paciente, bem como na interpretação de
suas respostas.
– LOPES FILHO et al., 2013, p. 262

Em relação aos tipos de perguntas em uma entrevista ou anamnese, existem


quatro tipos: 1) lineares; 2) circulares; 3) estratégicas; e 4) reflexivas.

1. As perguntas lineares são aquelas por meio das quais o profissio-


nal atua como investigador para determinar dados específicos. São
perguntas diretivas utilizadas geralmente para iniciar a entrevista.
Exemplo: Quem fez? Onde? Quando? Por quê?

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2. Nas perguntas circulares, o profissional comporta-se como explo-
rador e preocupa-se com a ocorrência e conexão dos fatos. São inte-
rativas e pressupõem atitudes neutras do terapeuta. Exemplo: O que
o seu marido faz quando você não escuta o que ele diz?

3. As perguntas estratégicas influenciam, de alguma forma, o pacien-


te/família. O profissional é um professor e supõe a dinâmica fami-
liar, baseada em uma hipótese já formulada. Podem inibir e provocar
uma ruptura na interação. Exemplo: Você olha diferente para seu fi-
lho quando ele quer se comunicar?

4. As perguntas reflexivas, como o próprio nome diz, procuram de-


sencadear reflexões. Nesse caso, o profissional é um guia e sua inten-
ção é facilitar a comunicação das partes. Exemplo: Em uma situação
de birra, seria diferente sua atitude, caso seu filho não apresentasse
uma alteração de fala e linguagem, por exemplo?

É importante estar atento, uma vez que os diferentes tipos de


perguntas, além da forma como são feitas, podem ter efeitos diversos
na conversação e conduzir a entrevista para novos caminhos. Não se
pode esquecer também de que o paciente/ família pode estar sob
efeito de um estresse emocional provocado por uma recente revela-
ção diagnóstica; ele pode interpretar de maneira errônea perguntas
ou sugestões. É um momento marcado pela emoção, principalmente
no que diz respeito à interação entre as partes. Vale estar atento ao
receber a família pela primeira vez, pois cada detalhe é importante,
desde a marcação da consulta, geralmente realizada pelo telefone,
até o acolhimento na chegada dessas pessoas ao consultório. A em-
patia e a sensibilidade são fundamentais, nesse momento. Durante
a entrevista, qualquer reação negativa do paciente não deve ser in-
terpretada como agressão ao profissional, mas, sim, como dificulda-
de em lidar com sentimentos latentes e muitas vezes reprimidos. As
perguntas e respostas formuladas tornam possível construir a ima-
gem do paciente e de sua família, mas as impressões verbais e não
verbais devem tão somente ajudar a compreender o problema.

A interpretação da resposta é uma tarefa difícil, pois o profissional


sofre influência do meio e de vivências pessoais, familiares e profis-
sionais. Então, vale ressaltar que diferentes sistemas humanos criam
diferentes significados aos olhos de quem ouve. “Ouvir uma história”
também significa recriar a sua própria. O maior cuidado que se deve
tomar é de não tentar fazer com que histórias contadas venham de
encontro às que o paciente já tem para si. Saber ouvir histórias e re-
fletir sobre declarações abordadas de uma forma global é necessário.

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Assim, caso determinada informação não coincida com a queixa ini-
cial, minimizar ou negar sua importância implica a quebra ou a ten-
tativa de aproximação desse paciente/família. […]

A entrevista, compreendida assim, deve fundamentalmente cons-


truir um caminho terapêutico, do qual o paciente/família participa
como interlocutor ativo no processo.

É fundamental conhecer não somente a história relacionada à


queixa, mas, também, quem são as pessoas envolvidas e quais suas
necessidades reais. Afinal, não é a queixa, a doença e seu informante
que chegam, mas a criança e sua família. “É preciso ultrapassar a
barreira da doença para se alcançar a complexidade constituinte
daquela pessoa. Porque é dela que o clínico vai tratar” (Millan, 1993).
– LOPES FILHO et al., 2013, p. 263-265

Figura 3 – Interação entre terapeuta e paciente


Fonte: Getty Images
#ParaTodosVerem: ilustração entre duas mentes humanas. Silhuetas da cabeça de duas pessoas, uma à esquerda
(na cor laranja) e outra à direita (na cor azul). Elas conversam entre si, estabelecendo uma relação interativa e de
comunicação. Fim da descrição.

Chegamos ao final da nossa Unidade. Você poderá, como futuro profissional de


Fonoaudiologia, por meio de uma anamnese bem-feita e com critérios, compre-
ender melhor os parâmetros que levam ao diagnóstico fonoaudiológico, contri-
buindo para uma intervenção fonoaudiológica mais assertiva.

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MATERIAL COMPLEMENTAR

Vídeos

Anamnese 360º, a Chave para o Atendimento em Fonoaudiologia


https://youtu.be/vV0s3Aucx8A

Como Fazer uma Boa Anmnese


https://youtu.be/VcN-JmzCmpg

Leituras

Fonoaudiologia nas Redes de Atenção


https://bit.ly/4668cEI

CID-10 Vol.1
https://bit.ly/3PDOl92
REFERÊNCIAS

ANAMNESE. In: DICIONÁRIO Oxford Languages. S. l.: Oxford Languages, 2023. Dispo-
nível em: <https://languages.oup.com/google-dictionary-pt/>. Acesso em: 13/06/2023.

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nacional de Funcionalidade e Incapacidade/CIF em Fonoaudiologia. Brasília: CFFa,
2013. Disponível em: < h t t p s : / / w w w . f o n o a u d i o l o g i a . o r g . b r / p u b l i c a c o e s / G U I A % 2 0 P R
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Editora, 2017. (e-book)

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