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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – FACULDADE DE

EDUCAÇÃO

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

JULIA RUIZ GOMES FERREIRA

RESENHA UNIDADE I – ANTROPOLOGIA

BELO HORIZONTE
2022
1. O IMPACTO DO CONCEITO DE HOMEM NO CONCEITO DE CULTURA

As grandes navegações ampliaram - literalmente e figuramente - o horizonte do


humano europeu e impactaram fortemente o olhar do homem sob o mundo. Inicia-se
neste novo contexto histórico racionalista-iluminista um grande desafio: definir o
conceito humano. É neste momento de crise identitária que várias ciências tentam
encontrar algo sólido, e assim, nasce também a antropologia.
O desafio entra-se exatamente no consenso em como se definiria tal conceito. A
diversidade humana já se expressa nos diferentes olhares e tentativas de se explicar o
comum, chegando assim a primeira generalização humana possível: o geral é a
diversidade. Assim, a perspectiva positivista empírica de criação de uma lei ou previsão,
de um postulado livre de influências externa, é inútil na pesquisa sobre um objeto
diversificado e imprevisível, que sofre tais influências externas.

“Meu ponto de vista é [...] que não existam generalizações que


possam ser feitas sobre o homem como homem, além da que
ele é um animal muito variado, ou de que o estudo da cultura
nada tem a contribuir para a descoberta de tais generalizações.
Minha opinião é que tais generalizações não podem ser
descobertas através de uma pesquisa baconiana.” (p.30, o
impacto do conceito de cultura sobre o conceito de homem).

Ao tentar estratificar o homem em camadas biológicas, sociais, psicológicas,


e culturais, descobrimos se não, que a tentativa de generalização e separação excluir-se-
ia em sua ação grande diversidade. Não seria exatamente essa diversidade a base
humana? Logo, nem o aspecto biológico de alimentação pode ser generalizado, pois o
estudo da cultura nos mostra que os hábitos alimentares vão além de um mero consumo
calórico, e sim tangencia inúmeros outros objetivos, signos e formas. Assim, a
antropologia evidencia dentro de toda generalização, uma gama de diversidade tão
grande que a generalização inicial chega a se tornar absurda.
Outrossim, a perspectiva estratigráfica não é defendida por Geertz pois o
conceito de homem é indissociável do conceito de cultura, pois um não existe sem o
outro, e ambos evoluíram em sintonia. Dessa forma, não se deve separá-los para
compreender o conceito de homem, pois é na sintonia que se encontra o conceito.
Assim, a biologia nos traz a possibilidade de falarmos, de sermos humanos, mas é só
com a cultura que essa possibilidade se materializa.

“Como nosso sistema nervoso central [...] cresceu, em sua


maior parte, com integração com a cultura ele é incapaz de
dirigir nosso comportamento [...] sem a orientação fornecida
por sistemas de símbolos significantes. [...] Somando tudo isso,
nós somos animais incompletos e inacabados que nos
completamos e acabamos através da cultura” (GEERTZ, p.35-
36)

Assim, a antropologia vai transpassando as perspectivas empíricas,


estratigráficas e evolucionistas e se modificando até um relativismo cultural, e assim,
modificando também a concepção de cultura. GEERTZ (p.33) ao dizer que “A cultura, a
totalidade acumulada de padrões culturais, não é apenas um ornamento da existência
humana, mas uma condição essencial para ela – a principal base de sua especificidade.”,
compreende que a cultura não é um mero acessório humano e sim ingrediente
fundamental para sua própria formação. O objeto de estudo real da antropologia passa a
ser o modo diverso que a espécie acontece – e, para estudá-lo, é fundamental que a
antropologia pesquise a partir da observação participante para compreender os
significados dos padrões culturais.

2. CAMINHOS HISTÓRICOS NOS CHOQUES CULTURAIS

Porém, até chegar neste ponto de compreensão de homem e cultura, traça-se


uma triste perspectiva evolucionista histórica. Observa-se as novas culturas como
“primitivas”, localizando-as em um tempo histórico evolucionista único no qual elas
estariam no início, no passado. Transforma-se assim, diversidade cultural em
desigualdade histórica criando uma “hipótese de uma evolução, que [...] utilizamos para
hierarquizar sociedades contemporâneas afastadas no espaço” (p.8, raça e história)
Alicerçados em argumentos aparentemente científicos, mas politicamente
enviesados e construídos, cria-se o Darwinismo Social. Para esta teoria, haveria diversas
raças humanas, algumas (ou seja, eurocêntricas) superiores à outras, resultado de um
fenômeno evolutivo de seleção natural, e, portanto, a raça eurocêntrica - a mais
adaptável, forte e evoluída - dominaria sobre as outras.

“Mundo à fora, os crimes do imperialismo viriam a ser


tomados agora como prova de que o darwinismo social estava
certo. [...] As pessoas inóspitas iam perecer como resultado
disto e intervir para impedi-las de morrer era quase como que
intervir numa lei da natureza. [...] O darwinismo social havia
justificado as políticas genocidas nas colônias.” (t: 25:25-
34:42)

Porém as raças humanas não existem do ponto de vista biológico, somente


do ponto de vista social. Alicerçada no racismo, na ideia de progresso, tecnologia e
ciência, a cultura europeia usa da sua perspectiva destes conceitos para reproduzir uma
hierarquia. Vale pontuar que o progresso europeu é resultado de uma coalisão entre
culturas, não é um mérito portanto de apenas “uma raça” e que tem em sua composição
destruição e acumulação do capital, como pontua Claude Lévi-Strauss:

“[América] colecionando certos venenos ou estupefacientes em


função das espécies animais sobre as quais exerce uma ação
efetiva; finalmente, levando determinadas indústrias como a
tecelagem, a cerâmica e o trabalho dos metais preciosos ao
mais alto grau de perfeição” (LÉVI-STRAUSS, p.10)

Colocando-se no topo, a cultura europeia acredita que detêm a verdade


(perspectiva de equivalência) reivindicando um privilégio epistemológico de saber mais
e, desta forma, a sua dominação é justificada e mascarada com uma ideologia
salvacionista. Adota assim, além da perspectiva etnocêntrica, uma postura etnocida:
expansionista e de conversão a própria cultura.
Assim, a postura adotada pelos europeus significou um desequilíbrio nas
forças que geram a diversidade cultural. As sociedades e culturas humanas nunca estão
sozinhas, elas existem em conjunto e, portanto, desejam de se distinguir umas das
outras. Dessa forma, o contato com o outro atua como uma força centrifuga e gera
diversidade. Ao desejarem homogeneização cultural, os europeus intensificam as forças
centrifugas, diminuindo a diversidade e representando uma ameaça à própria espécie
humana, adicionando mais um impacto para a Era Antropoceno.

3. CONCLUSÃO

A antropologia deve grande importância histórica no que diz respeito à


compreensão do homem e da cultura, e neste percurso - de se criar como ciência e
responder o que é homem - analisar, dialogar e romper com muitas ideias. O consenso
ainda não se faz presente, mas já era de esperar que diversidade de pensamentos
ocorresse no Homem.
Tais perspectivas nos levam a analisar os nossos alunos com mais clareza, com
uma perspectiva integral de sua humanidade e individualidade. Esta unidade colocou
em xeque nossos olhares, e saímos com um outro olhar: que não há olhos certos ou
errados, há uma diversidade de olhares. Descobrimos novos significados e a
possibilidades de se olhar de diversas perspectivas.
Além disso, nos ajuda a pensar na relação da educação e a cultura, e que da
mesma forma que nossos alunos podem ser diversos, e que não há certo ou errado na
diversidade, o sistema educacional também pode ser diverso. O que em minha cultura e
meu olhar seja educação, não necessariamente, será educação para o outro.

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