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Fund. Ant. Soc.

O conceito de cultura e seus


antecedentes

Prof. L.F.
O que é Cultura?
Pensando...
Em uma aula de Sociologia, o professor, ao entrar em sala, encontrou um grupo de alunos numa
calorosa discussão sobre cultura. Aproveitando o interesse pelo tema, organizou um debate no
qual ficaram evidenciadas várias formas de entender o que é cultura. Entre elas, destacaram-se:
• Cultura é a leitura de muitos livros;
• é estudar bastante,
• é o saber lidar com muita coisa;
• Quando uma pessoa é bem educada a gente diz: Que culta! Então, cultura é uma boa educação,
é tratar bem as pessoas, é escrever e falar corretamente;
• A cultura é aquilo que a gente sabe, é aquilo que a gente faz. Portanto, todas as pessoas têm
cultura;
• Marcos não tem muita cultura, porque só cursou as séries inicias do ensino fundamental;
• Cultura é aquilo que faz a gente ser superior ao outro, que faz a gente subir na vida.
Pensando...

Na perspectiva da antropológica, qual a afirmação que melhor expressa a visão


antropológica do que é cultura?
Qual a importância desse conceito, sistematizado por Edward Tylor, para o
entendimento da vida social?
I - O conceito de cultura
• O conceito de cultura é uma preocupação intensa atualmente em diversas
áreas do pensamento humano, no entanto a Antropologia é a área por
excelência de debate sobre esta questão.
• O primeiro antropólogo a sistematizar o conceito de cultura foi Edward Tylor
que, formulou a seguinte definição: “cultura é todo complexo que inclui
conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e quaisquer outras
capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na condição de membro da
sociedade.”
• Desde sempre os homens se preocuparam em entender por que outros
homens possuíam hábitos alimentares, formas de se vestir, de formarem
famílias ou de acessarem o sagrado de maneiras diferentes das suas. A essa
multiplicidade de formas de vida dá-se o nome de diversidade cultural.
I - O conceito de cultura

• Contudo, foi a partir da descoberta do “Novo Mundo”, nos séculos XV e XVI,


que os europeus se depararam com modos de vida completamente distintos
dos seus e passaram a elaborar mais intensamente interpretações sobre esses
povos e seus costumes.
• É fundamental lembrarmos que o impacto e a estranheza se deram dos dois
lados. Os grupos não europeus se espantavam com o ser diferente que
chegava até eles desembarcando em suas praias e tomando posse de seu
território. Existem relatos de povos que após a morte de um europeu em
combate, colocavam seu corpo dentro de um rio e esperavam sua
decomposição para ver se eram pessoas como eles.
• A diferença é que não temos contato com esses relatos dos povos não
europeus para conhecermos a visão que eles tinham dos brancos.
II - O olhar eurocêntrico sobre a cultura

• Mas de onde surge a preocupação com o tema da cultura? Vamos posicionar


nosso olhar. Toda construção científica nasce na Europa. A reflexão teórico-
científica sobre a humanidade se iniciou neste ambiente e nesta perspectiva.
Logo, a noção de ser humano de referência para todas as Ciências Humanas e
Sociais é a do homem europeu e da sociedade europeia.
• No entanto, a partir dos esforços de conquista de outros continentes, os
europeus “encontraram-se” com “seres” diferentes o suficiente para causarem
estranhamento, mas “parecidos” o suficiente para produzirem o seguinte
incômodo: serão estes seres, “humanos”?
II - O olhar eurocêntrico sobre a cultura

• A relação com agrupamentos humanos de localidades até então desconhecidas


como as que hoje denominamos África, América e Austrália, fizeram com que os
europeus se questionassem sobre as características peculiares ao humano e as
razões de tanta diferença entre os componentes de uma mesma espécie. O
movimento pré-científico, que dominou o campo da diversidade cultural até o
século XVIII, é aquele que oscilava entre conceber o “diferente” ora como
humano ora como não humano, provido ou desprovido de alma, bom ou mal
selvagem etc.
II - O olhar eurocêntrico sobre a cultura

• Na ótica do “mal selvagem”, estes “humanos” eram vistos como perigosos, mais
próximos aos animais, brutos, imbuídos de uma sexualidade descontrolada,
primitivos, com uma inteligência restrita, iludidos pela magia; enfim, seres
limitados que precisavam ser “civilizados” pela cultura europeia. Assim entramos
no século XIX. Os antropólogos estudam culturas “exóticas” buscando descrever
seus hábitos, costumes e sua forma de ver o mundo (cosmovisão). No entanto,
eles não iam ao campo, não eram os antropólogos que experimentavam
diretamente o dia a dia dos grupos “selvagens”.
II - O olhar eurocêntrico sobre a cultura

• Eram enviados viajantes, pessoas comuns que eram deslocadas para essas
“tribos” e ali ficavam por um certo tempo, registrando tudo que viam e ouviam,
a fim de entregar este material aos antropólogos que aí sim analisavam estes
relatos, desenvolvendo suas teorias sobre as diferentes culturas. Esta é a
denominada “antropologia de gabinete”.
III – A prática etnográfica

• Na segunda metade do século XIX esta “metodologia” foi questionada; afinal,


como falar sobre uma cultura que nunca se viu? Como descrever eventos que
nunca se vivenciou?
• Assim cunhou-se a prática etnográfica que é a metodologia característica da
Antropologia até os dias de hoje: o próprio antropólogo vai ao campo, entra no
grupo, vivencia esta cultura diferente, deixa-se fazer parte deste dia a dia,
registra esta vivência, retorna para sua própria cultura e finaliza seu trabalho
de escrita que é o registro final desta experiência.
III – A prática etnográfica

• Segundo François Laplantine, em Aprender Antropologia, a prática etnográfica


consiste em “impregnar-se dos temas de uma sociedade, de seus ideais, de
suas angústias. O etnógrafo é aquele que deve ser capaz de viver nele mesmo
a tendência principal da cultura que estuda”.
IV – Diferenças

• No entanto, não é nada fácil vivenciar uma outra cultura diferente da nossa. Por
quê? Não sentimos nossa cultura como uma construção específica de hábitos e
costumes: pensamos que nossos hábitos e nossa forma de ver o mundo devem
ser os mesmos para todos! Naturalizamos nossos costumes e achamos o do
outro “diferente”. Diferente de quê? Qual é o padrão “normal” segundo o qual
analisamos o “diferente”?
IV – Diferenças

Geralmente estabelecemos a nossa cultura como o padrão, a norma. Assim tudo


que é diferente é concebido como estranho e mesmo errado. Tal postura é o que
denominamos etnocentrismo.
V - Etnocentrismo

• Segundo Everardo Rocha, em O que é Etnocentrismo, trata-se da “visão do


mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os
outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos,
nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto
como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como
sentimentos de estranheza, medo, hostilidade etc. “.
• Everardo Rocha, nos alerta, ao analisar o etnocentrismo, para a questão do
choque cultural.
“Moda”
https://youtu.be/W0NosW_DgkM
V - Etnocentrismo
Como ele afirma, “de um lado conhecemos o "nosso" grupo, que come igual, veste
igual, gosta de coisas parecidas, conhece problemas do mesmo tipo, acredita nos
mesmos deuses, casa igual, mora no mesmo estilo, distribui o poder da mesma
forma, empresta à vida significados em comum e procede, por muitas maneiras,
semelhantemente. Aí, então, de repente nos deparamos com um "outro", o grupo
do "diferente" que, às vezes, nem sequer faz coisas como as nossas ou quando as
faz é de forma tal que não reconhecemos como possíveis. E mais grave ainda, este
“outro" também sobrevive à sua maneira, gosta dela, também está no mundo e
ainda que diferente, também existe.
VI - Relativismo cultural
• É a postura, privilegiada pela Antropologia contemporânea, de buscar
compreender a lógica da vida do outro.

• Roberto da Matta, no texto “você tem cultura?” demonstra que “essa é a


experiência antropológica, buscar compreender a lógica da vida do outro. Antes
de cogitar se “aceitamos” ou não esta outra forma de ver o mundo, a
Antropologia nos convida a compreendê-la e verificar que ao seu jeito, uma
outra vida é vivida segundo outros modelos de pensamento e de costumes. O
fato de que o homem vê o mundo através de sua cultura tem como
consequência a propensão em considerar o seu modo de vida como o mais
correto e o mais natural.
VI - Relativismo cultural
• O conceito de cultura, assim, permite uma perspectiva mais consciente de nós
mesmos. Precisamente diz que não há homens sem cultura, e permite comparar
culturas e configurações culturais como entidades iguais, deixando de
estabelecer hierarquias em que inevitavelmente existiriam sociedades
“superiores e inferiores”.

• Cada sociedade humana conhecida é um espelho onde nossa própria existência


se reflete.” (Roberto da Matta)
Leia o texto abaixo e responda

Atualmente, é comum ver negros trajando vestimentas com inspirações africanas


ou usando cabelos estilo rastafári, sem que sejam considerados como exóticos ou
atrasados. Em épocas passadas, tal prática era condenada por grande parte da
sociedade.

É correto, portanto, afirmar, do ponto de vista antropológico, que a cultura é algo


estático? Justifique sua resposta.

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