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SEMINÁRIO IV

Clepsidra
Camilo Pessanha

Fernando Santos e Gabriel Golart


Camilo
Pessanha:
Vida & Obra
Cronologia
Nasce em 7 de setembro de 1867
Em 1885, primeiro poema “Lúbrica”
Em 1887, primeiro poema publicado, “Madrigal”, e os
primeiros contos e crônicas em jornais
Entre 1893 e 1894 é aprovado para lecionar em
Macau e se transfere para lá
Em 1916, a revista Centauro publica 15 poemas seus
Em 1920, a publicação de Clepsidra
Morre em 1º de março de 1926
Aos 16 anos de idade,
em Lamego.
O período em Macau

Com Wenceslau de Moraes, em Hong Kong, 1895 Camilo Pessanha e João Vasco, em Macau, por volta de 1900
O período em Macau

Grupo fundador do Instituto de Macau, na Gruta de Camões, 1921

Na Chácara do Leitão, 1921 Em traje de mandarim, 1894-1896


O período em Macau
Em Portugal
“No ambiente português ainda esfumaçado de
décadence, o vulto de Pessanha era confuso e
atraente. Tratava-se de uma figura misteriosa, um
exilado voluntário no Extremo Oriente, suspostamente
em razões de obscuras desgraças pessoais ou
familiares; um gênio sem obra publicada que,
desdenhoso da glória, comporia versos magistrais
apenas para si mesmo ou para poucos eleitos.”

Paulo Franchetti

Carlos Amaro, Lúcio Santos e Camilo Pessanha


Fernando Pessoa
sobre Camilo Pessanha
“O terceiro ensinou a sentir veladamente; descobriu-nos a verdade de
que para ser poeta não é mister trazer o coração nas mãos, senão que
basta trazer nelas os simples sonhos dele.
Estas palavras que não são nada bastam para apresentar a obra do
enorme poeta Camilo Pessanha. O mais, que tudo, é Camilo Pessanha.”
Simbolismo
“E o simbolismo pode ser definido como uma tentativa,
através de meios cuidadosamente estudados — uma
complicada associação de ideias, representada por
uma miscelânea de metáforas —, de comunicar
percepções pessoais e únicas.”

Edmund Wilson, O castelo de Axel

A aparição (Gustave Moreau, 1876)


Simbolismo
“O período do simbolismo, sem que isso signifique que
não tenha havido grandes poetas simbolistas em
outras línguas (basta recordar ao simbolismo russo, o
alemão ou o hispano-americano), foi essencialmente
francês. Vai de Baudelaire a Mallarmé, Verlaine,
Rimbaud e Laforgue, e destes a Claudel e Valéry.”

Octavio Paz, Os filhos do barro

Charles Baudelaire por Félix Nadar (ca. 1855)


Clepsidra

Do grego κλεψύδρα
(klepsydra), retomado no
Latim clepsydra.

Sua formação vem de duas


palavras gregas, κλέπτειν
(kleptein), «ocultar, roubar», e
ὕδωρ, ὕδατος (hydôr,
hydatos), «água».
A entrevista de
Ana Castro Osório
— Foi V. Exª. que o forçou a publicar, não é verdade?
— Sim, fui eu. De há muito conheço Camilo Pessanha. É um verdadeiro
poeta e um verdadeiro sonhador. Mas é também um tímido e um
misantropo. Camilo Pessanha nunca escreveu um só dos seus versos.
Compõe-se nas suas horas de inspiração, e guarda-os na memória. Só
consente em dizê-los às pessoas de mais intimidade. Há tempos, tendo
eu ouvido alguém recitar versos seus, deturpando-os e truncando-os
sem piedade, pensei que era absolutamente necessário reunir num
volume algumas das suas melhores poesias. Então, sem dizer ao poeta
os meus planos, pedi-lhe que fosse ditando versos seus, pois queria
guardá-los num caderno. Camilo Pessanha ditou-me algumas belas
poesias. E foi assim que nasceu a Clepsidra.
O primeiro volume de versos de Camilo Pessanha, publicado em 1920
por Ana de Castro Osório.
VII Chorae arcadas
IX Na cadeia os bandidos presos
X Depois da lucta e depois da conquista
XI Se andava no jardim +
XII Voz debil que passas
XIII Passou o outmno já, já torna o frio + Manuscrito com indicação da sequência, datado de 1916, hoje
XIV Desce em folhêdos tenros a colina + depositado na Biblioteca Nacional de Portugal.
XV Singra o navio. Sob a agua clara +
XVI Quem polluiu, quem rasgou os meus lençoes de linho +
XVII Imagens que passais pela retina +
[1]

Eu vi a luz em um país perdido.


A minha alma é lânguida e inerme.
Oh! Quem pudesse deslizar sem ruído!
No chão sumir-se, como faz um verme...
[5]

Tenho sonhos cruéis: n’alma doente


Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...
[10]
Estátua

Desse lábio de mármore, discreto,


Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.
Il pleure dans mon coeur
Comme il pleut sur la ville.
[16]
VERLAINE

Meus olhos apagados,


Vede a água cair.
Das beiras dos telhados, Meus olhos, afogai-vos
Cair, sempre cair. Na vã tristeza ambiente.
Caí e derramai-vos
Das beiras dos telhados, Como a água morrente.
Cair, quase morrer...
Meus olhos apagados,
E cansados de ver.
[24]
Imagens que passais pela retina Sem vós o que são os meus olhos abertos?
Dos meus olhos, porque não vos fixais? - O espelho inútil, meus olhos pagãos!
Aridez de sucessivos desertos...
Que passais como a água cristalina
Por uma fonte para nunca mais!... Fica, sequer, sombra das minhas mãos,
Flexão casual de meus dedos incertos,
- Estranha sombra em movimentos vãos.
Ou para o lago escuro onde termina
Vosso curso, silente de juncais,
E o vago medo angustioso domina,
- Porque ides sem mim, não me levais?
[30]
Viola Chinesa
Ao longo da viola morosa Mas que cicatriz melindrosa
Vai adormecendo a parlenda, Há nele, que essa viola ofenda
Sem que, amadornado, eu atenda E faz que as asitas distenda
A lengalenga fastidiosa. Numa agitação dolorosa?

Sem que o meu coração se prenda, Ao longo da viola, morosa...


Enquanto, nasal, minuciosa,
Ao longo da viola morosa,
Vai adormecendo a parlenda.
[31]
Ao Longe os Barcos de Flores
Só, incessante, um som de flauta chora, E a orquestra? E os beijos? Tudo a noite, fora,
Viúva, grácil, na escuridão tranquila, Cauta, detém. Só modulada trila
– Perdida voz que de entre as mais se exila, A flauta flébil... Quem há-de remi-la?
– Festões de som dissimulando a hora Quem sabe a dor que sem razão deplora?

Na orgia, ao longe, que em clarões cintila Só, incessante, um som de flauta chora...
E os lábios, branca, do carmim desflora...
Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva, grácil, na escuridão tranquila.
[48]
Ó cores virtuais que jazeis subterrâneas, Cessai de cogitar, o abismo não sondeis.
‑ Fulgurações azuis, vermelhos de hemoptise,
Represados clarões, cromáticas vesânias ‑, Gemebundo arrulhar dos sonhos não sonhados,
No limbo onde esperais a luz que vos batize, Que toda a noite errais, doces almas penando,
E as asas lacerais na aresta dos telhados,
As pálpebras cerrai, ansiosas não veleis. E no vento expirais em um queixume brando,

Abortos que pendeis as frontes cor de cidra, Adormecei. Não suspireis. Não respireis.
Tão graves de cismar, nos bocais dos museus,
E escutando o correr da água na clepsidra,
Vagamente sorris, resignados e ateus,
Referências

Clepsidra: poemas de Camilo Pessanha / Organização, apresentação e notas


de Paulo Franchetti. - São Paulo: Atêlie Editorial, 2009.

O castelo de Axel: estudo sobre literatura imaginativa de 1870 a 1930 / Edmund Wilson ;
tradução José de Paulo Paes. - 2. ed. — São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

Os filhos do barro: do romantismo à vanguarda / Octavio Paz ; tradução Ari Roitman e


Paulina Wacht. — São Paulo: Cosac Naify, 2003.

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