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Robson Oliveira

METODOLOGIA
FILOSÓFICA

Rio de Janeiro
2024
ÍNDICE

PROGRAMA DE METODOLOGIA FILOSÓFICA..................................4


OBJETIVO........................................................................................................4
EMENTA..........................................................................................................4
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO...........................................................................4
BIBLIOGRAFIA BÁSICA....................................................................................5
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR.....................................................................6
INTRODUÇÃO...............................................................................................7
O QUE É MÉTODO?........................................................................................10
EXCURSO....................................................................................................12
DISTINÇÃO ENTRE MÉTODO MATERIAL E MÉTODO FORMAL......................14
CONDIÇÕES DA VERDADE.............................................................................17
VERDADE, O QUE É?...................................................................................17
NATUREZA DO ERRO..................................................................................20
CRITÉRIO DE VERDADE..............................................................................24
APROFUNDANDO A METODOLOGIA..................................................28
POR QUE LER TEXTOS FILOSÓFICOS?.............................................................29
TIPOS DE LEITURA........................................................................................30
RASTROS DE LEITURA...................................................................................30
VIA ANALÍTICA - RESOLUTIO.......................................................................31
VIA SINTÉTICA - COMPOSITIO.......................................................................31
CRÍTICAS AO MÉTODO...........................................................................32
VIRTUDES DO MÉTODO.................................................................................32
LIMITES DO MÉTODO....................................................................................32
TIPOLOGIA TEXTUAL EM FILOSOFIA...............................................33
ÍNDICE ONOMÁSTICO.............................................................................37

2
3
PROGRAMA DE METODOLOGIA
FILOSÓFICA

Objetivo
O curso levará o aluno a compreender e utilizar o método de
pesquisa filosófico, aprofundando suas virtudes e revelando seus
limites, além de orientar no aperfeiçoamento das técnicas de
estudo que facilitam a apreensão, armazenamento e resgate dos
conteúdos das disciplinas filosóficas.

Ementa
Introdução: O que é Método; Distinção entre Método Formal e
Método Material; Condições da Verdade. Aprofundando a
Metodologia: Por que ler textos filosóficos; Tipos de Leitura;
Rastros de Leitura; Via Analítica - Resolutio; Via Sintética -
Compositio. Críticas ao Método: Virtudes do Método; Limites
do Método.

Conteúdo Programático
1. Introdução
a. O que é Método?
b. Distinção entre Método Formal e Método Material
c. Condições da Verdade
i. Verdade, o que é?
ii. Natureza do Erro

4
iii. Critério de Verdade
2. Aprofundando o Método
a. Por que ler textos filosóficos?
i. Relação necessária
ii. Relação original
iii. Relação difícil
b. Tipos de Leitura
i. Dinâmica
ii. Aprofundada
c. Rastros de Leitura
i. Fichamentos
ii. Vocabulário Filosófico
d. Via Analítica - Resolutio
e. Via Sintética - Compositio
3. Críticas ao Método
a. Virtudes do Método
i. Método evita apaixonados
ii. Método explicita o processo
iii. Método é remédio contra falácias
b. Limites do Método
i. Método não é regra
ii. Método não é universal

Bibliografia Básica
FOLSCHEID, Dominique; WUNENBURGER, Jean-Jacques.
Metodologia Filosófica. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

5
HÜHNE, Leda Miranda (org.). Metodologia Científica: caderno de
textose técnicos. Rio de Janeiro: Agir, 1995.
JOLIVET, Régis. Curso de Filosofia. Rio de Janeiro: Agir, 1972.

Bibliografia Complementar
CERVO, Amado Luiz; BERVIAN, Pedro Alcinio. Metodologia
Científica. São Paulo: Prentice Hall, 2002.
REY, Luís. Planejar e redigir trabalhos científicos. São Paulo: Edgard
Blücher, 1998.
SALLES, S. S. Análise e Síntese em Tomás de Aquino. Petrópolis: UCP,
2009.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico.
São Paulo: Cortez, 2002.

6
INTRODUÇÃO

“Serva ordinem et ordo servabit te”1.

A História da Filosofia é testemunha da incrível capacidade humana de


produzir relatos díspares sobre o mundo: houve um tempo em que o discurso
predominante sobre o real era maximamente físico, dando lugar tempos depois
a abordagens preponderantemente metafísicas ou outras, mais radicalmente
contrárias, ideais; de outro modo, interpretações empiristas deram lugar a
discursos psicologistas – muitas vezes a partir das mesmas premissas;
ultimamente é possível encontrar escolas que “ensinam”, contra todos os
alarmes ditados pelo bom senso e para arrepio da lógica mais básica,
relativismo e ceticismo. Onde está o cético que seja capaz de ensinar (sic!)
algo a alguém!?

1
Versão de adágio grego. Encontramos referências em Orácio, Agostinho de Hipona e
Bento de Núrcia: “Preserva a ordem e a ordem te preservará”.

7
Do mesmo modo, a história do pensamento já testemunhou períodos
em que a forma de transmissão do conhecimento era mais importante que o
conteúdo transmitido2. Nestes momentos específicos, o interesse da filosofia
limitava-se a entender as regras do raciocínio correto, sem se ocupar com o
conteúdo veritativo do raciocínio. O mais importante era o modo de produzir
discursos atraentes, mas sem a necessidade destes discursos serem
verdadeiros. O retor representa concretamente aquele que se ocupa mais com
o discurso que com o conteúdo do discurso. Outros momentos foram
marcados pela preponderância do valor epistêmico a ser comunicado sobre a
forma por meio do qual esse conteúdo era veiculado 3. Nesta etapa da história
do pensamento, o conteúdo a ser comunicado era infinitamente mais
importante que o modo como ele era apresentado. O espectador não era
valorizado na recepção dos conteúdos comunicados. Pois bem, o “modo” de
apresentação destes conteúdos epistêmicos; o “modo” de produção de
discursos convincentes; o “modo” de averiguação da conveniência de certos
discursos tratam todos do mesmo tema.

Este tema é objeto de algumas ciências: da retórica, da literatura e,


dentre elas, também da Metodologia. Se durante um tempo, o importante era a
concordância das regras do pensamento consigo mesmo, desconsiderando o
valor veritativo do discurso; em outro momento, urgia a conveniência entre
pensamento e objeto estudado, a despeito da apresentação mesma do relato. A
2
Um personagem histórico que é um exemplo do predomínio da forma sobre o conteúdo é
o sofista Protágoras, eternizado por secundar valores metafísicos (sobre o ser e o não ser)
em nome da centralidade do homem.
3
Aqui pode-se citar outra biografia, cuja história representa o predomínio do conteúdo
sobre a forma: Heidegger. Em nome de boas ideias criam-se doutrinas esotéricas, as quais
não se compreendem sem uma iniciação à linguagem ou, em alguns casos, até mesmo à
biografia.

8
lição que a história deixa a todos é a impossibilidade da separação completa
entre a forma e o conteúdo do conhecimento. Antes, a escolha do modo de
apresentação do conhecimento indica já que aspecto do conteúdo pretende-se
destacar; e a natureza do conhecimento transmitido dá indicações sobre o
melhor modo de propagação dos seus conteúdos específicos. Para ciências
naturais, é de se esperar a utilização de experimentos e induções; para ciências
do espírito, deseja-se argumentos racionais, mais distantes da empiria.

Neste momento inicial, portanto, é conveniente que se defina a


disciplina denominada Metodologia. Por esta razão, a definição que decorre da
etimologia da palavra e a definição real da disciplina serão apresentadas
brevemente a seguir.

9
O QUE É MÉTODO?

1-Definição Etimológica: de origem grega, o termo Mevqodo"


(Meqav, ovdov") quer dizer caminho, itinerário “em direção a”. A palavra
logia, também grega, significa palavra, discurso, conhecimento, ciência.
Portanto, a análise da palavra Metodologia (Mevqodo" + logia) revela que ela
é a disciplina que pesquisa o melhor caminho que leva ao conhecimento, o
guia excelente para o saber.

2-Definição Real: No entanto, há uma abordagem mais precisa desta


área do saber humano. Por Metodologia entende-se a disciplina que se
empenha em pesquisar as vias ótimas para alcançar determinado objetivo, com
menor gasto e maior produtividade, à luz da razão. Ora, sendo a Metodologia
em questão também Filosófica – o que não ocorre ordinariamente, mas
acontece aqui eventualmente por causa desta empreitada – essa disciplina
utilizará de instrumentos que distinguirão suas pesquisas daquelas realizadas
por outras abordagens metodológicas, realizadas pelas ciências individuais.
Além disso, a reflexão da Metodologia Filosófica possui um caráter mais
universal que as reflexões das disciplinas particulares, pois, como veremos, o
objeto desta disciplina é também mais universal. Por se tratar de uma
disciplina que não se apoia em princípios estranhos a si, e porque seus
princípios visam à ação, a Metodologia encontra-se no rol das ciências
práticas da filosofia.

10
Divisão da Filosofia:
1- Divisão Sistemática ou Teorética.
a - [Pura]
1.1- Disciplinas especulativas: a busca do saber pelo saber.
Metafísica ou Ontologia: estudo do ente.
Cosmologia Filosófica: estudo do mundo.
Psicologia Filosófica: estudo da alma.
Teodicéia ou Teologia Natural: estudo de Deus.
Gnosiologia: estudo do conhecimento humano.
Antropologia Filosófica: estudo do homem.
1.2- Disciplinas Práticas: o saber para agir.
Lógica: estudo dos atos próprios da razão (verdade).
Lógica Formal
Metodologia Formal
Lógica Material
Metodologia Material
Ética: ciência normativa do comportamento humano
(bem).
Estética: estudo do belo artístico (belo).
b - [Aplicada] Aqui surgem as “Filosofias de”:
1.1 - Filosofia da Educação; Filosofia do Direito; Filosofia
da Religião; Filosofia da Matemática; Filosofia
Política; Filosofia da História; Filosofia da
Linguagem; Filosofia da Ciência dentre outras.

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EXCURSO

Além do estudo racional acerca do melhor caminho para a verdade, a


reflexão ocidental reconhece, porém, que há uma razão natural, a qual busca
a verdade quase que instintivamente, meio que às apalpadelas. Já Aristóteles
afirmava que o homem tende naturalmente ao conhecimento 4. E esta
inclinação é sinal da existência de uma faculdade que a antecede e estimula.
A esta “razão”, que a todos impulsiona ao conhecimento, dá-se o nome de
“Bom Senso” ou “Senso Comum”. Alguns filósofos dedicaram reflexões
sobre o assunto. Uma das mais célebres é a de Renée Descartes, que deixou
páginas inspiradas, em seu livro Discurso do Método. Tratando da
naturalidade do “Senso Comum” afirma o filósofo francês:

O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois


cada qual pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os
que são difíceis de contentar em qualquer outra coisa não
costumam desejar tê-lo mais do que o têm. E não é
verossímil que todos se enganem a tal respeito5.

E em outro lugar, desta vez analisando quais são os motivos que


fundamentam a diversidade de opiniões sobre um mesmo assunto, sustenta o
Cartesius:

O que se denomina o bom senso ou a razão, é


naturalmente igual em todos os homens; e, destarte, que a
diversidade de nossas opiniões não provém do fato de
serem uns mais racionais do que outros, mas somente de
conduzirmos nossos pensamentos por vias diversas e não
considerarmos as mesmas coisas6.

4
ARISTÓTELES. Metafísica, 980a 1.
5
DESCARTES, Renée. Discurso do Método. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 37.
6
Id. Ibid. p. 37.

12
Por causa da naturalidade deste princípio, sua sustentação não resiste
às críticas que a ele podem ser levantadas, nem é tão evidente que consiga
resistir às falácias e sofismas que um interlocutor e o próprio problema
podem incitar. Por isso, mesmo reconhecendo o valor e importância do
“Senso Comum”, Descartes sustenta que o mais importante na busca do
conhecimento é o caminho (ovdov"), a via a ser tomada quando se utiliza o
pensamento. Esta preferência já indica bastante bem o espírito que anima a
filosofia de Descartes:

Não é suficiente ter o espírito bom, o principal é aplicá-lo


bem. As maiores almas são capazes dos maiores vícios,
tanto quanto das maiores virtudes, e os que só andam
muito lentamente podem avançar muito mais, se seguirem
sempre o caminho reto, do que aqueles que correm e dele
se distanciam7.

Tão ou mais importante que ter “Bom Senso”, tão ou mais importante
que usar o “Bom Senso” nas decisões cotidianas, é o modo de utilização da
razão humana. Segundo este autor, o método utilizado para tomar tais
decisões e utilizar o “Bom Senso” é imprescindível. E mais: em alguns
momentos e problemas, por mais que o talento e o “Bom Senso” sejam
abundantes, o método sobrepuja e eleva a razão a patamares que, sozinho, o
“Senso Comum” não alcançaria. É o caso, por exemplo, das Provas da
Existência de Deus, que só com muito custo o Senso Comum obteria, mas
com Método e orientação, ele rapidamente reconhece e acede.

7
Id. Ibid. p. 37.

13
DISTINÇÃO ENTRE MÉTODO MATERIAL E MÉTODO FORMAL

Importa agora distinguir o método que auxilia na busca do


conhecimento filosófico do método que favorece a apresentação material deste
conhecimento. Embora muito semelhantes – pois são elementos da Lógica –
estes dois discursos distinguem-se muito claramente.

A Lógica é uma ciência que trata das regras de conveniência e


ordenamento do pensamento humano, seja formal, seja materialmente. Suas
conclusões objetivam evitar os erros produzidos pela razão, erros na forma e
na matéria do raciocínio. Neste sentido, a Lógica se subdivide em uma
disciplina, que é fundamentalmente formal, e em outra, material. Enquanto
trata das relações de necessidade existentes entre a simples apreensão, o juízo
e o raciocínio; ou entre o conceito, a proposição e o argumento, a Lógica é
Formal ou Menor. Enfim, as questões de que se ocupa a Lógica acontecem no
interior do intelecto, gerando o que chamamos de Lógica Formal (Menor).
Trata-se de deslindar as regras de adequação do pensamento consigo mesmo.

Numa primeira abordagem, destacam-se os atos e os frutos da razão


humana, ponto inicial de compreensão da lógica e, portanto, do modo como se
produzem os conceitos utilizados nas ciências.

14
ATO FRUTO

Simples Apreensão → Conceito

Juízo → Proposição

Raciocínio → Argumento

No entanto, a Lógica possui também uma parte que é material.


Justamente aquilo que dará conteúdo à estrutura formal constituída. Sobre este
ponto de vista, a Lógica se ocupa das partes componentes do discurso e que
precisa se adequar ao objeto estudado. Este tipo de reflexão gera o que
chamamos Lógica Material (Maior).

A cada elemento da Atenção: Há também algumas distinções


Lógica corresponde um modo concernentes às Metodologias Científica e
Filosófica. Veremo-las adiante. Todavia,
de abordagem metodológica.
importa apontar para um aspecto fundamental.
Há, portanto, uma
O Método utilizado pelas ciências particulares é
metodologia referente à
o dedutivo-experimental, no que fazem bastante
Lógica Formal e outra bem, visto que suas ciências tratam de objetos
concernente à Material. físicos e suas conclusões só podem ser físicas.
Ambas se distinguem pelo Na Filosofia não é bem assim: o método
utilizado pode até ser o Dedutivo-Experimental,
objeto a que se orientam: a
mas em algum momento ele deverá transformar-
Metodologia Formal ocupa-se
se em Método Racional, em algum ponto da
de objetos que estruturam a
conclusão dever-se-á sair da seara do
argumentação; a Metodologia experimento e aventurar-se nas paragens do
Material trata antes de objetos pensamento, através de abstrações, deduções e

15
que constituem a expressão deste mesmo conteúdo, das mesmas
argumentações, depois de terminados todos os tratamentos formais a estas
informações. Portanto, toda metodologia material supõe alguma abordagem
formal, mas nem toda metodologia formal se apoia em ferramentas materiais.

16
CONDIÇÕES DA VERDADE

Se a Lógica Formal se ocupa da correção dos atos próprios da razão, a


Metodologia Material (que é uma parte da Lógica Material) trata de averiguar
se estes atos, além de corretos, são verdadeiros. E uma condição para que o
raciocínio seja materialmente verdadeiro é que ele obedeça a regras gerais e
particulares de toda ciência. As regras gerais são dadas pela Metodologia
Filosófica; as regras especiais, pelas Metodologias das Ciências Particulares.
Para alcançar este intuito, há algumas condições que precisam ser satisfeitas.
Uma delas é, sem dúvida, definir o que é verdade; outra é analisar as
características do erro; e, finalmente, distinguir o verdadeiro do falso.

VERDADE, O QUE É?

Certo dia, conversando com seus amigos, Sócrates é inquirido sobre a


natureza da virtude: “O que é a virtude?”, pergunta o amigo Mênon 8. Sócrates
se diz surpreso pela pergunta, pois não se acha indicado para definir com
propriedade o que seja virtude e pergunta se o seu interlocutor tem algo a dizer
para ajudá-lo na resposta. É quando Mênon afirma ser bastante fácil definir o
que é virtude e então assevera que há virtudes de homens e de mulheres, de
velhos, de meninos e de meninas e ainda virtudes para cada ocasião particular.
Ironicamente Sócrates pergunta a Mênon se a simples enumeração dos
diversos tipos de abelhas diz exatamente o que lhes é peculiar ou se apenas
reforça a pergunta, qual seja: que característica é capaz de tornar indivíduos

8
PLATÃO. Mênon, 70a -72b.

17
tão diferentes entre si (no caso os muitos tipos de abelhas) e reuni-los em uma
unidade tal que todos sejam identificados como iguais? Enfim, a simples
enumeração dos tipos de virtude sequer se aproxima da questão maximamente
filosófica sobre a natureza da virtude. O mesmo acontece no afamado diálogo
Laques, onde o soldado homônimo, almejando responder a pergunta socrática
acerca da coragem, inicia por desfiar uma gama de atitudes corajosas. Sócrates
novamente adverte seu interlocutor que a mera citação de várias atitudes
corajosas não é apta para definir o que é a coragem. Pelo contrário, é
justamente o conhecimento do que é a coragem que proporciona a
identificação de atitudes as quais, ainda que sejam todas distintas umas das
outras, chamamo-las a todas corajosas.

Estas celebérrimas passagens filosóficas são muito esclarecedoras do


espírito que o filósofo possui quando leva a cabo uma pesquisa. Sem embargo,
o filósofo não pretende saber quais são os tipos de coragem, nem muito menos
quais sejam as atitudes corajosas – decerto, este conhecimento vago já o
sabemos (conhecimento proporcionado pelo “Senso Comum”). O filósofo
quer saber como se distinguem entre tantas atitudes virtuosas, a coragem, e
entre tantas ações diferentes, as corajosas. Enfim, o filósofo quer saber o que é
a coragem, a fim de que quando esbarrar-se com uma atitude diferente poder
exclamar: eis uma ação corajosa!

É esta pergunta que interessa à Filosofia e que a satisfaz plenamente. O


que se tentará fazer aqui é aplicar a mesma reflexão filosófica ao conceito de
verdade. Portanto, a pergunta que orientará esta reflexão é “que é a verdade?”;
que é isto que todos entendemos quando dizemos “verdade”?

18
Antes de tudo, importa sublinhar que a verdade não é uma coisa, não é
um objeto. Há alguma confusão no que diz respeito ao uso do conceito de
verdade. De fato, existem muitos modos de se dizer a verdade. Detalharemos
dois deles. Há uma verdade que chamamos de ontológica e há, também, uma
verdade denominada lógica. Dizendo de outra maneira: há uma verdade que é
reconhecida na realidade e outra verdade que é proclamada pela inteligência.
Com efeito, dizemos muitas vezes “ouro verdadeiro”, “sentimento
verdadeiro”, “quadro genuíno”, “vinho original”; outras vezes dizemos “este
ouro é caro”, “aquele sentimento é vergonhoso”, “o quadro não é belo”, “este
vinho está saboroso”. E esses dois modos de descrever o que vemos dizem
respeito a dois tipos distintos de verdade.

Com efeito, a verdade pode dizer algo sobre a natureza da coisa e algo
sobre aspectos acidentais da coisa. A verdade ontológica afirma características
do objeto consigo mesmo; a verdade lógica assevera aspectos da inteligência
quando se adequa ao objeto.

VERDADE ONTOLÓGICA VERDADE LÓGICA

Adequação do objeto Adequação da inteligência ao


consigo mesmo objeto

Diante destes conhecimentos e com respeito ao reconhecimento da


inteligência a essas verdades, as posturas que se podem ter em relação são:

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1. A verdade pode estar desconhecida para a inteligência: é a
ignorância.
2. A verdade pode estar apenas possível para a inteligência: é a
dúvida.
3. A verdade pode ser apenas provável para a inteligência: é a
opinião.
4. A verdade é atingida com evidência pela inteligência: é a
certeza.
5. A verdade não é atingida pela inteligência: é o erro.

ESTADOS DE ESPÍRITO DIANTE DA VERDADE LÓGICA

1. IGNORÂNCIA 2. DÚVIDA

3. OPINIÃO 4. CERTEZA

5. ERRO

A Verdade Ontológica, portanto, não diz respeito ao modo como a


inteligência assimila o objeto, pois esta verdade decorre do fato de ser objeto.
A verdade ontológica advém de o objeto ser algo e não da apreensão que o
sujeito tem dele. Logo, quanto à Verdade Ontológica, ela só pode ser ignorada
ou certa. Resta-nos, então, a verdade lógica. Portanto, entenda-se por Verdade
a adequação da inteligência com a coisa inteligida.

NATUREZA DO ERRO

Se com respeito à verdade, pode-se falar de uma Verdade Ontológica


com certeza, com absoluta certeza também dizemos que não é possível um

20
Erro Ontológico ou um Ente que seja maximamente Falso. Ora, sendo assim, e
recordando que a verdade pode ser ontológica ou lógica, deve-se concluir que
o erro é sempre de ordem lógica.

Definimos anteriormente que a verdade é a conveniência entre a


inteligência e a realidade. Deste modo, podemos sustentar que o erro é a
desconformidade dos juízos racionais acerca da natureza dos objetos. Eis a
essência do erro: não adequar a inteligência aos objetos estudados.

Esta definição é suficiente para distinguir o erro de outras posturas


intelectuais. Por exemplo, o erro distingue-se da ignorância, visto que o
primeiro é a negação de algum aspecto da realidade enquanto a última é o
desconhecimento de algum aspecto do objeto, impossibilitando qualquer
pretensão de saber e, portanto, de ajuizar algo sobre o assunto. A ignorância e
o erro desconhecem a verdade, mas a primeira reconhece não possuir o tipo de
conhecimento necessário para ajuizar, pois não o possui; o que erra, pelo
contrário, nem sabe que erra, por isso sua situação é mais perigosa. A
mentira, no entanto, não é o mesmo que o erro, do ponto de vista moral. Se
em relação à inadequação da realidade com o pensamento, mentira e erro se
equivalem, do ponto de vista moral é grande a diferença. Quem erra afirma
algo equivocadamente acerca do real, mas com a interna convicção de que
está correto. O que mente, pelo contrário, sabe que seu juízo não convém ao
real, mas o mantém por razões utilitárias.

O erro também se distingue da dúvida, visto que esta se caracteriza


pela indecisão acerca de duas ou mais posições em si mesmas contraditórias,
isto é, asserções que não desmentem o objeto ou aspectos dele, mas que não

21
são totalmente compatíveis entre si. O erro, por natureza, é a inadequação de
algum aspecto do objeto estudado. Assim, podemos resumir:

ESTADOS DE ESPÍRITO DIANTE DA VERDADE

IGNORÂNCIA ≠ ERRO ≠ MENTIRA ≠ DÚVIDA


suspensão afirmação afirmação indecisão entre
de qualquer inconsciente consciente duas afirmações
afirmação contrária contrária possíveis, mas
ao objeto ao objeto contraditórias

Se o erro é uma ação do intelecto, visto que surge do ajuizamento da


inteligência sobre a realidade, quais seriam as causas do erro? É o que
veremos agora.

Como dissemos, a verdade é a conveniência entre o objeto e a


inteligência, de tal modo que a verdade atrai o homem naturalmente. Assim, é
necessário dizer que o erro repugna a inteligência humana com força oposta ao
modo como a verdade o atrai. Então, se é assim, por que se erra? As razões
são de dois tipos: há razões morais e razões lógicas.

Logicamente, erra-se porque a inteligência humana é imperfeita. O


modo humano de compreensão é de tal forma configurado pela dedução e pela
indução, que é muito simples acontecer algum engano ou equívoco durante o
processo de conhecimento. Além disso, o objeto da inteligência humana é a
Verdade, e em relação a esta, o intelecto humano está sempre em defasagem.
Com efeito, em relação ao que É, a inteligência humana fica muito aquém. Por

22
isso, pela imensidão da Verdade e pela dificuldade que nasce da própria
natureza da compreensão humana, a inteligência se equivoca. No entanto,
ainda que esse fato explique grande parte dos erros, a limitação da inteligência
humana não é razão suficiente para justificar os erros. E o motivo é simples: o
erro não adere à realidade como a verdade. Ora, o erro consiste em afirmar o
que não é, ou em negar o que é. Para que a inteligência aceite tais juízos,
influências externas à razão precisam estar ativas para que a inteligência se
satisfaça com ele. Eis os motivos morais.

Excetuando o caso de ignorância, que não é erro propriamente, mas


um caso de abstenção da verdade, há sempre motivos morais para a afirmação
judicativa entre objeto e sujeito. Entre eles estão a vaidade, a preguiça e o
interesse.

CAUSAS DOS ERROS

VAIDADE INTERESSE PREGUIÇA


estima dema- estima demasia- estima demasi-
siada pela da por outros ada pelas como-
própria opinião bens humanos didades

Com efeito, os erros são comuns por causa da elevada estima que
possuímos de nossa própria inteligência (vaidade); pelo cuidado demasiado
com nossos próprios negócios (interesse); ou pela ojeriza contumaz a qualquer
tipo de esforço (preguiça). De outro modo, produzimos erros porque não
buscamos a verdade com todo o esforço necessário; porque preferimos outros

23
bens humanos, mas inferiores à verdade, como a reputação, o descanso, o
dinheiro; porque preferimos nossas próprias opiniões em detrimento do que é.
Para identificarmos os muitos tipos de erro, importa que tenhamos um critério
de verdade aplicável e que revele de que modo a verdade pode ser alcançada.
É o ponto a seguir.

CRITÉRIO DE VERDADE

Chama-se de critério (crivnw) o instrumento utilizado para distinguir


um objeto de outro. O critério é a ferramenta que nos faz reconhecer o novo
episódio de algo já conhecido. Para distinguirmos, portanto, a verdade da
falsidade urge um critério objetivo, a fim de que não tomemos um discurso de
aparente verdade por um outro verdadeiro realmente.

Alguns critérios de verdade são a Autoridade Divina, o Consentimento


Universal, o Senso Comum, o Sentimento, Pragmatismo. Todos estes critérios
são falsos ou incompletos, seja pela ilogicidade de suas premissas, seja pela
parcialidade de suas proposições. Importa dizer, portanto, que o único critério
suficiente para garantir um fundamento sustentável para o encontro da verdade
e, portanto, para a constituição da Metodologia, é a Evidência.

Por Evidência entenda-se o “fulgor da verdade que arrebata o


assentimento”. É um resplandecer que atrai e solicita a adesão pelo simples
fato de ser o que é. A Evidência está fundada na naturalidade da verdade, que
atrai todo homem, de modo que a atração da verdade encontra seu objeto na
Evidência. Ela está fundada na plena clareza acerca da verdade, que aparece
ao espírito humano solicitando assentimento. Ao assentimento da razão à

24
evidência do objeto verdadeiro denomina-se certeza. Portanto, a certeza é o
fruto da evidência objetiva, é o estado de espírito que afirma ou nega sem
temor de enganar-se por razão da clareza do objeto contemplado.

ATO FRUTO

Evidência → Certeza

Como a certeza decorre da clareza da evidência, e enquanto a


evidência decorre da verdade do objeto, há tantas certezas quantas verdades
objetivas. Além disso, não só no tipo de certeza, mas também na intensidade
reconhecem-se graus na certeza.

Há três espécies de verdade. Portanto, há também três espécies de


evidência e certeza. Considere-se, no entanto, que a certeza, sendo um ato do
intelecto individual, pode ser inconstante mesmo quando confrontada à
verdade mais evidente. As verdades são a Metafísica, a Física e a Moral.

A Verdade Metafísica é aquela que repugna qualquer afirmação


contraditória. Por exemplo, o todo é maior que a parte; o simples é
indecomponível; dois objetos iguais a um terceiro são iguais entre si; o Ser é e
o Não-Ser não é. Estas verdades são apreendidas pela razão. Logo, a evidência
e a certeza que delas procedem chamam-se racionais ou metafísicas. A
Verdade Metafísica não admite qualquer dúvida a respeito de seu objeto. É

25
absurdo não admiti-la sem ferir os princípios básicos da racionalidade e,
portanto, sem abdicar daquilo que é próprio ao humano.

A Verdade Física, antes, admite a afirmação contrária. Portanto, a


evidência desta verdade e, consequentemente, sua certeza são menos
constrangedoras. Elas admitem contrariedade, o que significa sustentar que
são contingentes. Por exemplo, as estrelas iluminam; o ferro expande com
calor; todo objeto com massa tende ao centro da terra. Todas estas afirmações
decorrem da experiência e, por este motivo, podem ser contraditadas, ou, ao
menos, pensadas em contrário. Assim, a certeza baseada na evidência
empírica é menos forte que a metafísica.

A Verdade Moral não decorre de leis físicas e metafísicas, mas de


exigências morais. Estas normas estão baseadas na natureza racional e livre do
ser humano. Assim, por exemplo, diz-se que é justo esperar a recompensa do
bom e o castigo do mal; a felicidade é o desejo de todo homem; a verdade
precisa ser buscada incessantemente. A certeza decorrente deste tipo de
verdade, está claro, é mais frágil que a certeza metafísica e física. No entanto,
não significa que é menos importante ou menos reveladora do Ser. Esta
dificuldade só aponta para a delicadeza deste objeto de pesquisa e para a
importância de tratá-lo com dignidade.

Obviamente, os diversos tipos de certeza e evidência não podem ser


confundidos com o que comumente se entende por certeza ou evidência do
sujeito. Elas decorrem de uma análise do objeto e não de uma convicção
pessoal, baseada em opiniões ou paixões. É evidente que o sujeito pode
enganar-se quanto a suas certezas e evidências. No entanto, este tipo de

26
engano é facilmente corrigido, pois a verdade se impõe corrigindo-o.
Enquanto há empenho em buscar a verdade, essas certezas e evidências falsas
encontram rápida correção pela verdade.

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APROFUNDANDO A METODOLOGIA
Santo Tomás de Aquino é sempre um luminar a nos guiar. No que concerne à
Metodologia, o Doutor Angélico nos deixou um precioso relato de como se deve estudar.

Sobre o modo de estudar


De Modo Studendi

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Quia quaesisti a me, in Christo mihi charissime frater Já que me pediste, frei João - irmão, para mim,
Joannes, quomodo oportet incedere in thesauro caríssimo em Cristo -, que te indicasse o modo como
scientiae acquirendo, tale a me tibi super hoc traditur se deve proceder para ir adquirindo o tesouro do
consilium: ut per rivulos et non statim in mare, eligas conhecimento, devo dar-te a seguinte indicação: deves
introire, quia per facilia ad difficilia oportet devenire. optar pelos riachos e não por entrar imediatamente no
Huiusmodi est ergo monitio mea de vita tua: mar, pois o difícil deve ser atingido a partir do fácil. E,
1. Tardiloquum te esse iubeo, et tarde ad locutorium assim, eis o que te aconselho sobre como deve ser tua
accedentem. vida:
2. Conscientiae puritatem amplecti. 1. Exorto-te a ser tardo para falar e lento para ir ao
3. Orationi vacari non desinas. locutório.
4. Cellam frequenter diligas, si vis in cellam vinariam 2. Abraça a pureza de consciência.
introduci. 3. Não deixes de aplicar-te à oração.
5. Omnibus amabilem te exhibeas, vel exhibere 4. Ama frequentar tua cela, se queres ser conduzido à
studeas, sed nemini familiarem te multum ostendas; adega do vinho da sabedoria (Cant 2,4).
quia nimia familiaritas parit contemptum et 5. Mostra-te amável com todos, ou, pelo menos,
retardationis materiam a studio subministrat. esforça-te nesse sentido; mas, com ninguém permitas
6. Et de factis et verbis saecularium nullatenus te excesso de familiaridades, pois a excessiva
intromittas. familiaridade produz o desprezo e suscita ocasiões de
7. Discursum super omnia fugias. atraso no estudo.
8. Sanctorum et proborum virorum imitari vestigia non 6. Não te metas em questões e ditos mundanos.
omittas. 7. Evita, sobretudo, a dispersão intelectual.
9. Non respicias a quo audias, sed quidquid boni 8. Não descuides do seguimento do exemplo dos
dicatur, memoriae recommenda. homens santos e honrados.
10. Ea quae legis fac ut intelligas, de dubiis te 9. Não atentes a quem disse, mas ao que é dito com
certificans. razão e isto, confia-o à memória.
11. Et quidquid poteris, in armariolo mentis reponere 10. Faz por entender o que lês e por certificar-te do que
satage sicut cupiens vas implere. for duvidoso.
12. Altiora ne te quaeras. 11. Esforça-te por abastecer o depósito de tua mente,
13. Illius beati Dominici sequere vestigia, qui frondes, como quem anseia por encher o máximo possível um
flores et fructus, utiles ac mirabiles, in vinea Domini cântaro.
Sabaoth, dum vitam comitem habuit, protulit ac 12. Não busques o que está acima de teu alcance.
produxit. 13. Segue as pegadas daquele santo Domingos que,
Haec si sectatus fueris, ad id attingere poteris, quidquid enquanto teve vida, produziu folhas, flores e frutos na
affectas. Vale. vinha do Senhor dos exércitos.
Se seguires estes conselhos, poderás atingir o que
queres. Saudações.
Santo Tomás de Aquino indica ao confrade que se dedique, antes de
tudo, ao que é mais simples, visto que de posse do simples, alcançar-se-á mais
facilmente o que é composto. A metodologia ensina que o difícil deve ser
alcançado a partir do que é fácil. Assim, sob a iluminação do Doutor
Angélico, também tentar-se-á abordar o que é próprio do discurso da
metodologia filosófica, começando pelo que é mais facilmente compreensível.

POR QUE LER TEXTOS FILOSÓFICOS?

O contato com os textos filosóficos produz no leitor algo que é


fundamental para a prática da filosofia: o sentimento de proximidade. Não é
possível refletir sobre princípios filosóficos se o texto para o qual a razão se
dirige é um completo estranho. Deve haver um sentimento de proximidade,
que facilite a tarefa do leitor em relação ao texto. Esta proximidade não pode
transformar o texto em algo estático, algo “já conhecido”; antes, deve apontar
para o “já” e o “ainda não” da compreensão humana. O texto já não é um
completo estranho, mas ainda pode revelar algo surpreendente ao leitor. No
entanto, para que o texto filosófico produza este estranhamento salutar,
importa que o leitor se acautele de alguns elementos:

1) a leitura filosófica exige do estudante o contato necessário com


textos filosóficos. Isto é, qualquer tipo de simplificação dos textos
filosóficos só deve atuar como propedêutico ao contato direto
com os próprios textos, jamais os substitui. A experiência
fundamental com os textos dos filósofos não pode ter um
simulacro em textos resumidos ou explicativos, mas deve nascer
do trato difícil com o núcleo duro do pensamento de cada autor.
2) a leitura filosófica exige que o modo de abordagem dos textos
seja criativo, sem ser inventivo. Lembre-se sempre que o leitor
tem diante de si um texto, cujo sentido e finalidade existe antes
de sua abordagem e não a partir dela. A letra do texto filosófico
deve encontrar o sentido do texto com o qual se relaciona. O texto
jamais poderá ser diminuído à condição de pretexto para que o
leitor afirme o que deseja acerca do assunto, a revelia do sentido
original do texto. O sentido criativo que precisa estar no horizonte
de toda leitura, ocupa-se principalmente de adequar, ao tempo e
ao modo próprio do leitor, um sentido ordinariamente alcançável,
mas não disponível de modo imediato.

TIPOS DE LEITURA

A proximidade com o texto acontece por etapas. Pode-se favorecer a


abordagem praticando dois tipos de leitura distintos, cada um com seu modo
específico de abordagem e suas técnicas próprias.

Leitura Dinâmica: a leitura dinâmica é aquela que esquadrinha


rapidamente a estrutura do texto, avaliando do que trata o texto e
como é apresentado. É uma leitura razoavelmente rápida, o que
não significa que seja uma leitura descuidada. Com a leitura
dinâmica o que se busca é encontrar os nós do texto, não se
procura a resolução dos problemas.

Leitura Aprofundada: a leitura aprofundada, pelo contrário,


trata de compreender os pontos críticos do texto. Ocupa-se não
em encontrar os nós, mas em desfazer-lhes as dificuldades. A
leitura aprofundada é aquela que deixa pistas de compreensão
para o futuro do leitor. É feita sempre muito lentamente, com a
ajuda de papel e caneta, para assinalar e pesquisar os conceitos e
os momentos importantes na argumentação do pensamento sob o
qual se debruça. Tema, tese e argumentação.

RASTROS DE LEITURA

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Fichamento: é o instrumento utilizado para registrar os
conteúdos relevantes dos livros e/ou artigos lidos. É feito,
ordinariamente, destacando ideias importantes e extratos de textos
do autor acerca de algum tema. É utilíssimo no caso de se
retornar ao tema no futuro.

Vocabulário Filosófico: trata-se do instrumento de estudo que


registra conceitos importantes em fichário, com o intuito de
retornar a eles ou comparar-lhes com conceitos de autores
diferentes.

VIA ANALÍTICA - RESOLUTIO

Dois dos mais valorosos instrumentos de auxílio à leitura e,


portanto, importantes na metodologia de qualquer disciplina, são a
Análise e a Síntese. De modo particular, todas as ciências as praticam,
com suas especificidades. Por Análise, entende-se a prática de dividir o
objeto de pesquisa, indo do mais complexo ao mais simples; a Síntese,
por sua vez, é o processo de reunir o que foi disperso, indo no simples
ao mais complexo. Há, no entanto, dois tipos de análise e síntese:
aquelas que tratam de fatos e objetos; e aquelas que são racionais.

VIA SINTÉTICA - COMPOSITIO

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CRÍTICAS AO MÉTODO

“Ce n’est pás assez d’avoir l’esprit bon; le principal est de l’appliquer
bien”9.

Metodologia Filosófica é a ciência que pesquisa o modo de


abordagem propriamente filosófico na prática científica. É método, mas
não como os métodos antigos.

VIRTUDES DO MÉTODO

i. Método evita apaixonados


ii. Método explicita o processo
iii. Método é remédio contra falácias

LIMITES DO MÉTODO

i. Método não é regra


ii. Método não é universal

9
Renée Descartes: “Não basta ter bom espírito; o principal é aplicá-lo bem”

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TIPOLOGIA TEXTUAL EM FILOSOFIA

A História da Filosofia revelou alguns métodos em seu desenrolar-se.


Vamos a eles:

Método Maiêutico:

O método desenvolvido por Sócrates era um método


fundamentalmente filosófico. Perscrutava a causa remota do
saber, da justiça, da bondade e de todas as coisas tal como exigia
a filosofia. Com perguntas e respostas, mostrava que o
interlocutor, no fundo, ora já sabia o que perguntava; ora não
sabia o que respondia. A via socrática assemelhava-se mais a um
recordar que a um aprender ou ensinar. O nome deste método faz
menção à atividade da mãe do filósofo grego: parteira. Sem
embargo, o método filosófico praticado por Sócrates guardava
muitas aparências com o parto: ambos trazem à luz o que já
sempre esteve no interior da pessoa.

Fundamento: o princípio do método maiêutico é a


aceitação tácita de que conhecer é lembrar. Este ponto da doutrina
socrática, junto com outras teses metafísicas (pré-existência das
almas, por exemplo), sustenta o mito de que vivemos
anteriormente uma vida no Mundo das Idéias, onde conhecemos
as verdades eternas.

Crítica: não é fácil argumentar em favor da pré-existência


da alma e da sua transmigração. A crítica mais voraz é, portanto,
aquela que recai sobre a doutrina da duplicação dos mundos e da
pré-existência das almas. Não é necessário duplicar a realidade
para explicar a variedade de entes no mundo, como pensavam
Platão e Sócrates. A solução aristotélica da participação e da
potência é uma boa solução.

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Dúvida Metódica:

Renée Descartes foi quem desenvolveu este método


filosófico. O teor deste método é a exacerbação da dúvida a fim
de encontrar um ponto fixo indiscutível, onde o filósofo possa se
apoiar e consiga reconstruir todo o arcabouço de conhecimento
humano abalado pelas últimas descobertas de Copérnico.
Subentendida no processo cartesiano de busca da verdade está a
identificação termo a termo das características essenciais e as
características existenciais.

Fundamento: o método cartesiano tem como princípio


propulsor a identificação entre essência e existência. Tal
identificação faz com que se suspenda todo juízo quanto ao que
não se apresenta de modo essencial (os acidentes, por exemplo).
Daí que a sensibilidade seja sempre um problema para Descartes
e seus seguidores.

Crítica: o maior equívoco de Descartes foi identificar


essência e existência. Depois que o princípio está colocado, é
difícil não chegar ao mesmo ponto.

Método Dedutivo-Experimental:

O método dedutivo-experimental começa a ser elaborado


na Modernidade. Tem como características a introdução de
aspectos experimentais como fonte de conhecimento, além de
evitar induções. Daí sua constituição dedutiva e experimental.
Tais características acabam por revelar a direção que as pesquisas
filosófica e científica tomarão após a assunção deste método.

Fundamento: o controverso método dedutivo-


experimental tem como princípio fundamental a predominância
da experiência sobre as outras fontes de conhecimento. A
compreensão das questões científicas e filosóficas derivaria
necessariamente do conteúdo empírico que se pudesse alcançar
com o método dedutivo-experimental.

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Crítica: reduzir as inúmeras manifestações do real apenas
às acolhidas pela sensibilidade é no mínimo temeroso. Se o
método dedutivo-experimental possui validade absoluta, como
ficam as ciências que não têm tantos aspectos experimentais ou
dedutivos para refletir? Por exemplo, a História, a Psicologia, a
Estética?

De acordo com as observações históricas feitas até aqui, percebe-se que


qualquer Metodologia possui caracteres próprios, únicos, que revelam
aspectos positivos que favorecem o trabalho do pesquisador, além de pôr em
destaque alguns pontos negativos, inerentes à tarefa a ser realizada. Portanto, a
pesquisa nos mostra que nenhuma Metodologia pode ser absoluta. Pelo
contrário, o aspecto que definirá se a Metodologia utilizada será um método
indutivo ou dedutivo, genérico ou estudo de caso, é o objeto a ser pesquisado.
Do objeto de pesquisa é que brota as dicas do melhor tipo de método. Não se
pode cometer o equívoco de aplicar a objetos distintos (como Deus e
orquídeas, por exemplo) o mesmo tratamento metodológico.

Ora, isto nos leva à conclusão de que a cada objeto que se apresente,
uma nova Metodologia deverá ser aplicada a ele. A fonte de onde brotam as
metodologias até aqui estudadas é o objeto, não o intelecto do pesquisador.

O Método da Filosofia não é o dedutivo-experimental.


Todavia, também não é o maiêutico ou o cartesiano. O objeto
próprio da Filosofia exige que seu método seja híbrido, que
possua características próprias de várias Metodologias. Por
exemplo, a Metodologia Filosófica é fundamentalmente dedutiva
porque parte inexoravelmente da experiência humana para fundar
seu fundamento teórico. No entanto, de posse de seus princípios,
a Metodologia Filosófica se envereda por sendas mais profundas,
buscando não só compreender as aparências que nos assolam,
mas o fundamento das motivações da sensibilidade. Ora, este tipo
de tema não é alcançado pela metodologia dedutiva-experimental.

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ÍNDICE ONOMÁSTICO

A D H N
Aquino, Tomás de...10 Descartes, Renée.6, 7, Hipona, Agostinho de Núrcia, Bento de.......5
Aristóteles.................6 10 ..............................5
O
Orácio..............5

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