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Sebenta de

FINANÇAS PÚBLICAS
Autora: Cristina Pinto

Disciplina do 4º ano do Curso de Direito


Faculdade de Direito
Universidade Nacional Timor Lorosa’e

Docente: Estevão Fernandes Sanches

Díli, dezembro de 2021


Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
Docente: Estevão Fernandes
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Índice

Capítulos Págs.

1. INTRODUÇÃO ÀS FINANÇAS PÚBLICAS 04


1.1. Noção de Finanças Públicas. A atividade financeira do Estado. A diferença entre 04
Finanças Públicas e Finanças Privadas.
1.2. Conceito e fontes de Direito Financeiro. O direito financeiro no ordenamento jurídico 10
timorense.

2. PATRIMÓNIO PÚBLICO 13
2.1. Noção e principais classificações de Património Público 13
2.2. Importância e funções do Património Público 16
2.3. Principais características da gestão patrimonial 17
2.4. O regime timorense de aquisição, gestão e alienação dos bens móveis do Estado. Breve 18
referência à situação da gestão dos imóveis do Estado em Timor-Leste.

3. O ORÇAMENTO DO ESTADO 20
3.1. Noção e funções do Orçamento do Estado 20
3.2. Princípios Orçamentais. Noção, limitações e sua aplicação atual. 23
3.2.1. Princípio da Anualidade. Orçamento de gerência e orçamento de exercício. As 23
despesas plurianuais e o período complementar.
3.2.2. Princípio da Plenitude: as regras da unidade e a da universalidade. O fenómeno 26
da desorçamentação.
3.2.3. Princípio da Discriminação Orçamental: as regras da especificação, da não 28
compensação e da não consignação. A autonomia financeira e a consignação de
receitas.
3.2.4. Princípio da Publicidade 31
3.2.5. O Equilíbrio Orçamental. Conceito e critérios de equilíbrio orçamental 32
3.2.5.1. Equilíbrio orçamental em sentido amplo 32
3.2.5.2. Equilíbrio «ex ante» e «ex post» 32
3.2.5.3. Equilíbrio formal e equilíbrio substancial 33
3.2.5.4. Critérios de Equilíbrio Substancial 34
3.2.5.4.1. Critério dos Rendimentos Normais 34
3.2.5.4.2. Critério do Activo da Tesouraria 35
3.2.5.4.3. Critério do Orçamento Ordinário 36
3.2.5.4.4. Critério do Orçamento de Capital 38
3.2.5.5. O Equilíbrio Orçamental em Timor-Leste 39
3.2.5.6. Equilíbrio Orçamental. Conclusões. 42

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3.2.6. A Equidade Intergeracional 43

Índice

Capítulos Págs.

3. O ORÇAMENTO DO ESTADO (cont.)


3.3. O Processo Orçamental em Timor-Leste. Fases do processo orçamental. 45
3.3.1. A Preparação do Orçamento. Os métodos de avaliação das despesas e das receitas 45
3.3.2. A Aprovação do Orçamento. Os efeitos da não aprovação do orçamento. 47
3.3.3. A Execução do Orçamento. O regime das alterações orçamentais 48
3.3.4. O Controlo do Orçamento. A fiscalização política e a fiscalização jurisdicional. 50

4. AS DESPESAS PÚBLICAS 56
4.1. Noção de despesas públicas 56
4.2. Classificações e principais tipologias de despesas públicas 56
4.3. Efeitos económicos das despesas públicas. O efeito multiplicador, o efeito acelerador e 58
o efeito propulsor
4.4. Evolução das despesas públicas 64
4.5. Classificação das despesas públicas em Timor-Leste 68

5. AS RECEITAS PÚBLICAS 70
5.1. Noção e principais modalidades de Receitas Públicas. 70
5.2. Fundamentos e princípios das Receitas Tributárias. A diferença entre imposto e taxa. 72
5.3. Receitas do Crédito Público 76
5.3.1. Noção e funções do Crédito Público. Tipos de Empréstimos Públicos. 76
A taxa de juro.
5.3.2. A Dívida Pública. Espécies e operações da dívida 81
5.3.3. Os efeitos do Crédito Público 83
5.4. Principais receitas públicas de Timor-Leste e sua importância no OGE 88

6. POLÍTICAS FINANCEIRAS 87
6.1. Noções e tipos de Políticas Financeiras 87
6.2. Políticas de Estabilização. Política anti-ciclíca e política anti-inflacionista 88
6.3. Políticas de Redistribuição e de Desenvolvimento Económico 92

LEGISLAÇÃO e BILIOGRAFIA 97

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1. INTRODUÇÃO ÀS FINANÇAS PÚBLICAS

1.1. Noção de Finanças Públicas. A actividade financeira do Estado. A diferença entre


Finanças Públicas e Finanças Privadas.

A expressão Finanças Públicas pode ser utilizada em três acepções (sentidos) diferentes:

a) Em sentido orgânico, significa o conjunto dos órgãos e serviços do Estado e de outros entes
públicos a quem compete gerir os recursos económicos e financeiros destinados à satisfação
das necessidades sociais;

b) Em sentido objectivo, designa a actividade através da qual o Estado afecta recursos ou bens
económicos e financeiros à satisfação das necessidades colectivas;

c) Em sentido subjectivo, enquanto disciplina que estuda as leis que regem a actividade
financeira do Estado.

Do ponto de vista orgânico, a actividade financeira do Estado é uma actividade complexa que não é
exclusiva do Governo central, abrangendo antes um conjunto heterogéneo de entes públicos, que
incluem os órgãos e serviços da Administração Pública central, local, organismos autónomos,
empresas públicas e outros entes públicos.

Neste capítulo, iremos abordar o conceito de Finanças Públicas sobretudo no seu sentido objectivo,
isto é, enquanto actividade económico-financeira do Estado que se destina a adquirir e a
utilizar recursos financeiros na produção de bens e na prestação de serviços tendo em vista a
satisfação de necessidades das populações: necessidades de educação, de saúde, de segurança, de
justiça, etc.

‘’As Finanças Públicas designam a actividade económica de um ente público tendente


a afectar bens à satisfação das necessidades que lhe estão confiadas”1.

Deste ponto de vista o fenómeno financeiro representa antes de mais as relações económicas que se
estabelecem entre os particulares (indivíduos, empresas e outras instituições), por um lado, e o Estado,
por outro. Por outras palavras, abarca as funções e as actividades que o poder público se propõe

1
SOUSA FRANCO, Antonio L. de, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Almedina, Coimbra, 1987, pág.3

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desenvolver na sociedade e a forma como as pessoas, os grupos e as classes sociais se situam perante
o poder, suportando e beneficiando das respectivas despesas.

Existem fundamentalmente três tipos de relações entre o Estado (o poder político) e a actividade
económica, entendida como o processo de satisfação de necessidades humanas através da afectação
de bens materiais a finalidades alternativas (individuais ou sociais, privadas, públicas ou comunitárias):

• A ordenação económica;

• A intervenção económica;

• A actuação económica.

Compete ao poder político definir os quadros gerais em que a actividade económica deve
desenvolver-se. Através da Constituição, das leis e dos regulamentos, o Estado define as regras que
devem presidir à actividade económica em geral, influenciando e condicionando a actuação dos
agentes económicos. A isto chama-se ordenação económica. A regulação da actividade económica
será mais ou menos vincada consoante a doutrina ou política socioeconómica seguida pelo Estado:
abstencionista, liberal, socialista, comunista, etc.

Por outro lado, o Estado pode querer modificar o comportamento dos sujeitos económicos,
produtores ou consumidores, alterando concretamente aquilo que seria a sua actividade livre e normal.
Por exemplo, numa situação de escassez de um bem alimentar essencial, o Estado pode impor aos
sujeitos económicos um preço máximo ou, ao invés, numa situação de excesso de produção de
determinado produto, o Estado pode fixar quotas de produção. É o que se chama intervenção
económica.

Finalmente, o Estado pode ele próprio actuar como sujeito económico, sendo ele que de forma
exclusiva ou não produz bens e presta serviços destinados a satisfazer as necessidades sociais. É o que
se chama a actuação económica do Estado. Há serviços que só o Estado presta, as chamadas
funções de soberania como a administração da justiça ou a defesa e a segurança interna. Mas há outros
serviços que o Estado, por razões diversas, pode entender chamar a si: correios e telecomunicações,
rádio e televisão, fornecimento de energia, etc. O Estado ao fornecer estes serviços comporta-se como
um agente económico produtor, quer seja em regime de monopólio (em que o Estado é o único
produtor ou fornecedor), quer seja em regime concorrencial (em que o Estado e outros agentes
económicos são produtores ou fornecedores). Há uma natureza intrinsecamente económica nesta
actividade de produção de bens ou serviços.

Quais são então as necessidades que incumbe ao Estado satisfazer? Todas as necessidades dos
indivíduos ou apenas algumas delas?

Muitas das necessidades são satisfeitas pelos próprios indivíduos, são as chamadas necessidades de
satisfação activa que exigem uma certa actividade por parte do consumidor. Por exemplo, a

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necessidade de alimentação. Uma pessoa para se alimentar, tem de procurar os alimentos, isto é,
desenvolver uma actividade para os consumir; não chega que os alimentos existam é preciso procurá-
los e consumi-los, designadamente pagando o respectivo preço. Neste tipo de necessidades vigora o
princípio da exclusão, o que significa que se o produtor ou vendedor dos bens exige um preço pela
sua utilização ou consumo, o preço exclui os indivíduos que não querem ou não podem pagar esse
preço.

Existem, porém, outras necessidades que se satisfazem pela mera existência dos bens,
independentemente da procura, ou seja, a satisfação deste tipo de necessidades não exige qualquer
actividade por parte do consumidor. São as chamadas necessidades de satisfação passiva. Por
exemplo, o Estado ao assegurar a existência das Forças Armadas ou da Polícia, satisfaz as necessidades
de defesa do país e de segurança das populações. Desde que este serviço exista, todos os cidadãos
beneficiam dele. A característica destes bens é, pois, a de serem por todos utilizáveis,
independentemente de qualquer procura e a sua utilização por um dado cidadão não exclui a
possibilidade de outro a utilizar. A passividade no consumo traduz-se na impossibilidade de exclusão.

As necessidades de satisfação passiva são, pois, necessidades públicas, já que a produção dos
respectivos bens são asseguradas por entidades públicas, enquanto que as necessidades de satisfação
activa são necessidades individuais, porquanto satisfeitas por acção dos próprios indivíduos,
podendo ou não ser satisfeitas pelo Estado.

O Estado surge assim, em primeiro lugar, como fornecedor dos bens públicos por natureza ou
bens colectivos. Trata-se de bens que satisfazem necessidades indivisíveis, não exclusivas e
independentes da procura, isto é, proporcionam uma satisfação passiva não sendo possível privar
ninguém da sua satisfação. É do caso do funcionamento dos órgãos de soberania, serviços legislativos,
administração da justiça, defesa nacional e segurança interna, etc. Dificilmente estes bens poderiam
ser oferecidos no mercado por um agente económico privado; trata-se de funções de soberania que
só o Estado pode criar, sustentar e oferecer munido do seu poder de autoridade e numa lógica de puro
interesse público. Só o Estado tem meios e instrumentos (dispõe de autoridade para impor regras de
utilização e para assegurar o seu financiamento) que permitem satisfazer tais necessidades colectivas:
o Estado gere, no interesse de todos, bens de utilização colectiva que as entidades privadas não podem
fornecer.

Mas como pode o Estado custear as despesas com as necessidades de satisfação passiva ou
necessidades públicas?

O Estado tem o poder de cobrar receitas coactivas, isto é, tem o poder de impor aos cidadãos e aos
agentes económicos o pagamento de receitas obrigatórias, (como é o caso dos impostos que
representam uma das principais receitas do Estado) para as afectar às despesas públicas em geral e,
portanto, à satisfação das necessidades colectivas.

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Mas o Estado não satisfaz apenas necessidades colectivas; existem também necessidades de natureza
individual que o Estado decide assegurar: ou por opção política ou porque o mercado não as consegue
satisfazer. Trata-se de necessidades que são simultaneamente colectivas e individuais. Veja-se o caso
da educação. As escolas e universidades satisfazem a necessidade colectiva de instrução e ensino das
populações, mas satisfazem também as necessidades individuais de quem em concreto frequenta os
estabelecimentos de ensino.

Trata-se aqui de bens mistos ou semipúblicos, que o Estado entende assegurar de forma que sejam
produzidos nas condições julgadas convenientes. Nestes casos, o Estado pode fornecer estes serviços
de graça ou entender exigir um preço às pessoas que individualmente os utilizam, sendo que o preço
é normalmente inferior ao custo de produção do bem. Assim, sendo as receitas inferiores às despesas,
a diferença é coberta por outros recursos obtidos coactivamente (ex. impostos).

Noutros casos, porém, pode ser necessário assegurar a produção de determinada bem ainda que a
preço igual ou superior ao custo, mas inferior ao que resultaria do normal funcionamento do mercado,
isto é, inferior ao preço que resultaria se os bens fossem vendidos por empresas privadas. Neste caso,
as despesas com este serviço são asseguradas pelas receitas da venda, isto é, pelo preço cobrado aos
indivíduos que utilizam o bem ou serviço. Exemplo: serviços de correios.

Em resumo, o Estado pode produzir ou assegurar três tipos de bens:

a) Bens públicos a que correspondem necessidades colectivas ou necessidades de satisfação


passiva, satisfeitas pela mera existência de bens independentemente da procura, financiados
por receitas obtidas coactivamente;

b) Bens semipúblicos que satisfazem simultaneamente necessidades colectivas e necessidades


individuais, podendo ser gratuitos ou a preço inferior ao custo e, portanto, financiados total
ou parcialmente por receitas coactivas;

c) Bens semipúblicos que satisfazem simultaneamente necessidades colectivas e necessidades


individuais, a preço igual ou superior ao custo, mas inferior ao preço que resultaria se a oferta
fosse assegurada por empresas privadas, financiados pelas receitas de venda.

“Aqui temos em breve palavras a explicação das finanças públicas: O Estado pretende que sejam satisfeitas
determinadas necessidades colectivas; para tanto propõe-se produzir os bens; mas a produção
de bens implica despesas; o Estado precisa, portanto, de obter receitas para cobrir essas
despesas, isto é, precisa de dinheiro, de meios de financiamento”2.

O objecto das finanças públicas reside assim, no estudo da aquisição e utilização dos meios
financeiros (dinheiro e crédito) pelas entidades públicas. Os principais meios de financiamento

2
TEIXEIRA RIBEIRO, José Joaquim, Lições de Finanças Públicas, 5ª edição, Coimbra Editora, pág. 28

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do Estado são os impostos, os preços e os empréstimos. Esta matéria será melhor desenvolvida no
capítulo respeitante às receitas públicas.

A escolha das necessidades colectivas a satisfazer pelo Estado é uma decisão de carácter
eminentemente político, que obedece a diferentes critérios, variáveis de época para época, consoante
a conjuntura económico e social e os vários interesses em presença. É igualmente uma decisão política
a escolha dos meios de financiamento.

Tendencialmente, podemos dizer que sempre que a satisfação das necessidades colectivas ou
individuais exija a renúncia a todo ou parte do lucro, o Estado tem de intervir para assegurar a
produção dos bens ou a prestação dos serviços, seja directamente (produzindo ele próprio), seja
contratando outras entidades para o efeito (pagando a empresas para produzirem), já que a natureza
das empresas privadas não se compadece com a renúncia ao lucro.

Quais então as principais diferenças entre Finanças Públicas e Finanças Privadas?

As entidades públicas, assim como as empresas privadas, produzem bens e têm despesas. A diferença
reside essencialmente na finalidade da actividade financeira e nos meios de financiamento.

Vimos já que a essência da actividade financeira do Estado reside na satisfação de necessidades


colectivas. Muito embora o Estado deva racionalizar os recursos que tem ao seu dispor, isto é, deva
empregá-los da melhor forma possível, procurando obter o máximo de utilidades com o mínimo de
gastos possível, o objectivo da sua actividade não é o lucro, mas sim a produção de bens públicos e
semipúblicos que visam a satisfação de necessidades sociais.

Enquanto que na economia privada, os agentes económicos actuam livremente com base em relações
contratuais e segundo critérios predominantemente individuais, a economia pública pressupõe a
existência de um poder político organizado, dotado de poderes impositivos para determinar quais
as despesas que irão ser realizadas e quais as receitas que irão ser cobradas.

Por outro lado, os meios de financiamento de uma empresa, seja dinheiro proveniente dos sócios ou
dinheiro obtido através de empréstimos, são recuperados através da venda dos bens. E a actividade
financeira privada é gerida de modo a obter a máxima receita e a minimizar os custos, isto é, visa-se
essencialmente o lucro, com base numa relação comercial de troca, em que ao preço corresponde
sempre uma contraprestação específica.

Ora se é verdade que o Estado também pode cobrar preços pela utilização de determinados bens, o
facto é que o seu principal meio de financiamento são os impostos, e estes são um meio de
financiamento exclusivo do Estado. Isto é, muito embora o financiamento do Estado também se
possa realizar através de relações de troca, a verdade é que a maioria dos recursos públicos provêm da
cobrança de impostos e os impostos não resultam de uma relação de troca, mas sim de uma

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imposição; trata-se de receitas impostas coactivamente pelo Estado a que não corresponde uma
contraprestação específica, destinando-se antes a suportar as despesas públicas em geral.

Uma outra diferença entre finanças públicas e finanças privadas reside no facto de, no caso do Estado,
não serem as receitas que determinam as despesas, ao contrário do que acontece nas empresas
privadas. Na actividade privada, as despesas são determinadas pelas receitas; se as receitas forem
inferiores às despesas a empresa vai à falência.

Nas finanças públicas isso não acontece: o Estado pode cobrar receitas na medida das despesas que
se propõe realizar. É claro que isto tem limites, uma vez que as receitas públicas não têm uma
elasticidade infinita: o agravamento dos impostos só é possível na medida e até ao limite em que pode
ser suportado e aceite pelos contribuintes. Portanto, o Estado determina as receitas e as despesas
em função das finalidades que pretende prosseguir e tendo em atenção os efeitos e as consequências
que o nível das receitas e das despesas tem na economia do país.

Em resumo:

a) As finanças privadas visam o lucro, enquanto que as finanças públicas visam a satisfação de
necessidades colectivas;

b) As finanças privadas assentam em relações de troca com base em critérios predominantemente


individuais, enquanto que as finanças públicas pressupõem a existência de um poder político
organizado com poder impositivo para determinar despesas e receitas assente em critérios de
interesse público;

c) Nas finanças privadas são as receitas que determinam as despesas; nas finanças públicas o nível
de receitas e de despesas é determinado em função dos fins que o Estado se propõe atingir,
dependendo de um conjunto de opções de carácter político que variam consoante a conjuntura
política, económica e social;

d) Nas finanças privadas, ao preço corresponde sempre uma contraprestação específica; embora
nas finanças públicas também possam existir relações de troca, a verdade é que a maioria dos
recursos públicos provêm da cobrança de receitas coactivas que não resultam de uma relação
de troca, mas sim de uma imposição a que não corresponde uma contraprestação específica,
destinando-se antes a suportar as despesas públicas em geral;

e) As receitas de venda são o meio de financiamento das empresas privadas, enquanto que os
impostos são o principal meio de financiamento do Estado, exclusivo deste.

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1.2. Conceito e fontes de Direito Financeiro. O direito financeiro no ordenamento jurídico


timorense.

Vimos já que a actividade financeira visa a satisfação das necessidades colectivas, concretizando-se
através da cobrança de receitas e da realização de despesas. Tal actividade dá origem a um conjunto
de relações complexas entre o Estado e os particulares, e entre as instituições públicas entre si, sujeitas
a normas jurídicas. As normas que regulam a obtenção, a gestão e o dispêndio (gasto) dos
dinheiros públicos constituem o direito financeiro.

Direito Financeiro é, pois, o ramo do direito que regula a actividade financeira do Estado. O
Direito Financeiro é composto pelo conjunto das normas jurídicas que regulam o exercício do poder
político em matéria financeira, quer do ponto de vista da organização e funcionamento interno da
Administração financeira do Estado e das demais entidades públicas, quer no que respeita às relações
financeiras entre o Estado e outras entidades, nomeadamente os particulares.

A título meramente exemplificativo, o direito financeiro inclui as normas relativas à competência para
a aprovação, execução e fiscalização do orçamento, as normas de gestão do património do Estado e
as normas relativas à obtenção de receitas públicas. Neste último aspecto (o Direito das Receitas), o
direito financeiro é marcado pela preocupação de proteger os particulares quanto a possíveis abusos
do Estado quer no domínio dos impostos (a obrigatoriedade da criação de impostos por lei e a regra
da não retroactividade dos impostos constituem exemplos), quer no domínio do crédito público
(normas que pretendem evitar o endividamento excessivo do Estado).

O Direito Financeiro abrange assim:

a) Direito Constitucional Financeiro – princípios fundamentais de organização e exercício do


poder político em matéria financeira e da estrutura e actividade financeira do Estado;

b) Direito da Administração Financeira – normas de direito administrativo que regulam a


organização interna da administração financeira;

c) Direito Patrimonial – normas relativas à aquisição, gestão e alienação do Património do


Estado;

d) Direito Orçamental – conjunto de normas que estabelece o regime de preparação, aprovação,


execução e controlo do orçamento, incluindo normas de contabilidade pública e de realização
das despesas públicas, de que constituem exemplo a Lei de Enquadramento Orçamental (em

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Timor-Leste, a Lei do Orçamento e Gestão Financeira), a Lei que aprova anualmente o


Orçamento Geral do Estado, os decretos-lei e as normas de execução orçamental;

e) Direito das Receitas – inclui o Direito Fiscal e o Direito Tributário constituído pelo regime
jurídico dos impostos e das receitas tributárias em geral3, e o Direito do Crédito Público
composto pelo conjunto de normas jurídicas que regula as operações de crédito a praticar pelo
Estado;

f) Direito Processual Financeiro – regula a organização e funcionamento processual da


Administração e dos tribunais financeiros (tribunais fiscais e de contas).

As fontes de direito financeiras são pois:

a) A Constituição;

b) A Lei em sentido lato (abrangendo leis e decretos-lei);

c) Os regulamentos;

d) Os tratados e convenções internacionais.

A Constituição da República Democrática de Timor-Leste (RDTL) estabelece os princípios


fundamentais relativos à organização e exercício do poder político em matéria financeira,
designadamente no que respeita a:

- Competência legislativa em matéria de política fiscal e regime orçamental (artigo 95. o, n.o 2,
alíneas p) e q);

- Criação de impostos e taxas (artigo 144.o );

- Preparação, aprovação, execução e fiscalização orçamental (artigo 95.o ,n.o 3, alíneas d) e e),
artigo 115.o, n.o 1, alínea d), artigo 129.o, n.o. 3, e artigo 145.o, n.os. 1 e 3).

Tal como na maioria dos países de matriz civilista, também em Timor-Leste as leis e decretos-lei são
as principais fontes de Direito Financeiro. Pese embora o quadro legal timorense seja relativamente
recente e esteja ainda longe de estar completo, foram já aprovadas leis importantes no âmbito do

3
O Direito Tributário distingue-se do Direito Fiscal na medida em que o primeiro regula a aquisição de taxas e de
impostos (tributos em geral) e o segundo é constituído pelo conjunto de normas jurídicas respeitantes à incidência,
lançamento e cobrança de impostos.

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Direito Financeiro de que são exemplo: a lei do fundo petrolífero (2005), a lei tributária (2008), a lei
do orçamento e gestão financeira (2009), a lei da Câmara de Contas do Tribunal Superior,
Administrativo, Fiscal e de Contas (2011), o regime da dívida pública (2011), o decreto-lei que define
os princípios gerais de gestão e alienação de bens móveis do Estado (2011).

Em matéria de execução orçamental, em Timor-Leste não existem os chamados decretos-lei de execução


orçamental que determinam anualmente as regras a que fica sujeita a execução orçamental do respectivo
ano económico (ou ano fiscal como também se designa em Timor-Leste). De modo que, neste campo,
temos as regras de execução orçamental constantes do título V da Lei do orçamento e gestão
financeira, as regras que anualmente são incorporadas na lei que aprova o Orçamento Geral do Estado
da RDTL e as circulares do Ministério das Finanças contendo directivas sobre a execução orçamental
a seguir no respectivo ano económico.

No que respeita a Acordos e Tratados Internacionais, estes podem versar sobre matérias aduaneiras,
regras sobre concorrência internacional, combate à fraude e evasão fiscal, etc.

A título de exemplo, Timor-Leste é desde 2003 membro da Organização Mundial das Alfândegas e
assinou recentemente com Portugal uma Convenção para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão
fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento.

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2. PATRIMÓNIO PÚBLICO

2.1. Noção e principais classificações de Património Público

“O património do Estado é constituído pelos bens susceptíveis de satisfazerem necessidades


económicas de que o Estado é titular e pelas responsabilidades que sobre eles impendem: ele
tem sempre um activo (bens) e um passivo (responsabilidades)”.4

O activo patrimonial é composto por todos os bens do activo (sejam bens materiais ou imateriais,
isto é, direitos sobre bens ou direitos de crédito) de que o Estado é titular e que sejam susceptíveis de
avaliação pecuniária; o passivo patrimonial é constituído por todas as responsabilidades ou
obrigações que recaiam sobre o Estado e que sejam também susceptíveis de avaliação pecuniária.

Em termos de classificações, podemos distinguir entre:

a) Património bruto e património líquido

O património bruto é constituído pelas posições jurídicas activas susceptíveis de avaliação


pecuniária de que o Estado é titular (bens, direitos sobre bens e direitos de crédito). O
património líquido é o excedente em valor (diferença) entre a situação activa e a situação
passiva.

b) Património real e património financeiro

O património real é constituído pelas coisas (móveis e imóveis) e pelos direitos sobre as coisas;
o património financeiro é constituído pelo dinheiro, pelos activos monetário-financeiros e
pelos créditos e débitos do Estado.

O património financeiro inclui o Tesouro e a Dívida Pública. O tesouro é o património


monetário; a dívida pública é uma parcela do passivo patrimonial (operações financeiras não-
monetárias).

4
SOUSA FRANCO, António L. de, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Almedina, Coimbra, 1987, pg. 277.

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c) Património geral e patrimónios especiais

Esta distinção baseia-se no regime jurídico a que está sujeito o património do Estado. O
património geral é constituído por todos os elementos do activo e do passivo patrimonial que
não tenham um regime especial, regulando-se pelo regime geral; os patrimónios especiais são
aqueles que estão sujeitos a um regime próprio (especial).

Os patrimónios especiais podem ser:

Patrimónios de gestão – em que a gestão é confiada a uma determinada entidade em virtude da


sua estreita ligação com uma função material ou tarefa particular do Estado (exemplos:
património militar a cargo das autoridades militares, património cultural)

Patrimónios de afectação – determinados juridicamente pela existência de um regime próprio


(exemplo: o Estado enquanto herdeiro legítimo tem relativamente à herança os mesmos
direitos e obrigações de qualquer outro herdeiro, pelo que a herança responde pelos
respectivos encargos e, assim, os bens constituem um património especial enquanto estiver
pendente o inventário5).

d) Património duradouro e património não duradouro

São considerados património duradouro os bens que, em condições normais, permanecem na


titularidade do Estado por mais de um ano (por mais de um período orçamental); o património
não duradouro é constituído pelos bens que ingressam no património do Estado e que aí não
permanecem para além do período anual (orçamental), quer porque se trata de bens
consumíveis (exemplo: papel), quer porque sairão do património do Estado a curto prazo
(exemplo: dinheiro).

No património não duradouro, assume especial importância o património da tesouraria que é


constituído pelos meios líquidos monetários a curto prazo de que o Estado é titular (activo) e
pelo conjunto das responsabilidades (passivo) a curto prazo que impendem sobre o Estado.
O património monetário do Tesouro está sujeito a regras de gestão e contabilização diferentes
das do património duradouro do Estado, e está intimamente ligado à gestão orçamental.

A distinção entre património duradouro e não duradouro é ainda relevante para efeitos das
regras de inventariação dos bens do Estado.

5
Artigo 1999º. e 2012º e seguintes do Código Civil de Timor-Leste.

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e) Património mobiliário e património imobiliário

O património mobiliário é constituído pelos direitos sobre bens móveis; o património


imobiliário é constituído pelos direitos sobre bens imóveis.

São bens ou coisas imóveis as identificadas no artigo 195º. do Código Civil de Timor-Leste e
móveis todas as outras6.

f) Património dominial e património obrigacional (ou creditício)

O património dominial é constituído pelos bens do domínio público e do domínio privado do


Estado, abarcando assim os direitos sobre as coisas (direitos reais) e correspondentes situações
passivas.

O património obrigacional ou creditício é constituído pelos direitos pecuniários que o Estado


detém e as correspondentes obrigações: direitos de crédito e outros direitos equivalentes com
conteúdo patrimonial e imaterial, participações do Estado em empresas (públicas e privadas,
nacionais ou estrangeiras), saldos de tesouraria do Estado, obrigações financeiras que
impendem sobre o Estado de que constituem exemplo as que respeitam à dívida pública.

A noção de património dominial abarca, como vimos, os bens do domínio público e os bens
do domínio privado do Estado. Vejamos então em que consistem estes bens.

O domínio público é constituído pelas coisas e direitos sobre elas submetidas por lei ao
domínio público do Estado e subtraídas ao comércio jurídico-privado devido à sua importante
utilidade colectiva7.

Trata-se de bens que, devido ao elevado interesse público que revestem, são inalienáveis,
impenhoráveis, não oneráveis e inexpropriáveis; são propriedade do Estado, destinando-se a
ser utilizados pelos serviços públicos, pelo público em geral ou por particulares autorizados.
É o caso dos chamados bens do domínio público natural (domínio marítimo, espaço aéreo,

6
Artigo 195º (Coisas imóveis). 1. São coisas imóveis: a) Os prédios rústicos e urbanos; b) As águas; c) As árvores, os
arbustos e os frutos naturais, enquanto estiverem ligados ao solo; d) Os direitos inerentes aos imóveis mencionados
nas alíneas anteriores; e) As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos.
2. Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham
autonomia económica, e por prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam
de logradouro. 3. É parte integrante toda a coisa móvel ligada materialmente ao prédio com carácter de
permanência. Artigo 196º (Coisas móveis). 1. São móveis todas as coisas não compreendidas no Artigo anterior.
7
Artigo 193º. do Código Civil: 1. Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas. 2. Consideram-
se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como as que se
encontram no domínio público e as que são, por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual.

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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minas, nascentes de água, etc.) e bens do domínio público artificial (estradas, pontes,
aeroportos, portos, redes de distribuição de energia, museus, bens militares, etc.).

Em regra, apenas as pessoas colectivas de base territorial dispõem de domínio público (Estado
e Autarquias Locais).

O domínio privado do Estado é constituído pelos restantes bens (não sujeitos ao regime do
domínio público) que o Estado adquire em condições análogas às do direito privado. Trata-se
de bens que embora sejam também propriedade do Estado não são essenciais à sua actividade
e, por isso, não são sujeitos ao regime do domínio público: são livremente adquiridos, são
alienáveis, penhoráveis e expropriáveis.

g) Património do Estado (stricto sensu) e património da Tesouraria

O património do Estado em sentido estrito inclui os bens do património duradouro e não


duradouro que não se integram no património da tesouraria; só aqui existe gestão patrimonial no
sentido estrito do termo.

O património da tesouraria é constituído pelos meios monetários do Estado: meios de liquidez


a curto prazo de que o Estado é titular (activo) que respondem pela totalidade das
responsabilidades a curto prazo que impendem sobre o mesmo (passivo).

2.2. Importância e funções do Património Público

Através do Património Público o Estado prossegue funções de natureza social, económica e


financeira.

O património do Estado serve para prestar utilidades aos cidadãos e, por essa via, satisfazer as
necessidades sociais. Essa utilização pode ser feita de forma directa, indirecta ou através dos serviços
públicos.

A utilização directa do património público pelos cidadãos é um dos modos de prestação de


utilidades. Essa utilização pode ser livre e gratuita (as pessoas utilizam as ruas, as pontes, os parques
públicos, as praias, etc.) ou onerosa (por vezes a utilização do património público está sujeita ao
pagamento de uma taxa ou de um preço (ex. pagamento de taxas de portagens por utilização de uma
auto-estrada).

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O património público pode ser também utilizado de forma indirecta. Quando o Estado, por via do
património, prossegue finalidades de política económica, por exemplo, apoiando o crescimento
económico ou a redistribuição de riqueza, ou defendendo o equilíbrio ecológico e o ambiente, fala-se
de utilização indirecta.

Os serviços públicos são outra forma de utilização do património do Estado. Os serviços públicos
enquanto organizações permanentes de pessoas e bens exercem a sua actividade em benefício da
comunidade, isto é, através da sua actuação prestam utilidades de carácter público, sejam serviços
judiciais, administrativos, policiais, etc.

Finalmente, o património tem ainda uma função financeira na medida em que serve para
proporcionar rendimentos ao próprio Estado (rendas, participações em empresas, etc.).

2.3. Principais características da gestão patrimonial

Todas as entidades públicas podem, em princípio, dispor de um património, cuja gestão difere
consoante exista ou não autonomia patrimonial e varia em função das diferentes modalidades de
supervisão e tutela.

A gestão patrimonial do Estado caracteriza-se por ser, em regra, uma gestão centralizada a cargo de
um Instituto ou Direcção do Património, normalmente integrada na estrutura orgânica do Ministério
das Finanças, que tem poderes de administração geral do património, poderes de supervisão e
coordenação da gestão patrimonial atribuída a outras entidades públicas e poderes de fiscalização
sobre entidades com autonomia patrimonial.

No entanto, existem também os organismos autónomos, isto é, as entidades públicas que gozam de
autonomia administrativa e financeira e que, em princípio, gerem livremente o seu património próprio
e administram os bens do domínio público afectos à sua actividade. A autonomia patrimonial
consiste no poder de gerir o património próprio, alienando, onerando ou aumentado o seu activo e
alterando o passivo, embora esteja sujeita a diferentes modalidades de controlo ou tutela do Estado.

Os principais documentos de gestão patrimonial são o inventário e o balanço. Os bens do Estado


(bens do domínio público e bens do domínio privado) estão sujeitos a inventário que consiste no
registo ou cadastro do bem (designação e tipo de bem, valor, data de aquisição, número de anos vida
útil ou utilização esperada, data de alienação ou abate, etc.). Em regra, são inventariáveis os bens de
carácter duradouro (isto é, os bens cuja vida útil seja superior a um ano) e que tenham um valor
pecuniário mínimo que justifique a sua inventariação. A situação patrimonial do Estado é retratada no

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balanço, que se traduz na avaliação de todos os elementos do activo e do passivo do Estado num
determinado momento.

2.4. O regime timorense de aquisição, gestão e alienação dos bens móveis do Estado. Breve
referência à situação da gestão dos imóveis do Estado em Timor-Leste.

No âmbito da gestão patrimonial do Estado, há a salientar a aprovação em Timor-Leste do Decreto-


Lei que define os princípios gerais de aquisição, gestão e alienação dos bens móveis do Estado
(Decreto-Lei no. 32/2011, de 27 de Julho). Vejamos alguns aspectos essenciais deste regime.

Este diploma estabelece o regime aplicável ao património mobiliário do Estado, exceptuando do


seu âmbito de aplicação:

a) O património financeiro do Estado;

b) O património cultural;

c) O património arquivístico;

d) Os bens de natureza militar.

A gestão dos bens do Estado está centralizada na Direcção do Património do Estado, podendo ser
descentralizada nos vários Ministérios e instituições do Estado. Compete à Direcção do Património
do Estado afectar e disponibilizar os bens móveis sob sua administração, promover a sua avaliação
para efeitos de alienação (venda) sempre que se conclua que não são necessários, e o seu abate quando
já não estejam em condições de serem utilizados.

O decreto-lei prevê duas formas de aquisição de bens móveis pelo Estado:

a) A aquisição onerosa de bens (aplicando-se neste caso o regime do aprovisionamento e dos


contratos públicos, pelo que os bens móveis podem ser adquiridos pelos Ministérios até ao
limite da sua competência que é actualmente de 1 milhão de dólares, sendo a partir desse valor
da competência da Comissão Nacional de Aprovisionamento);

b) As doações (de valor superior a 500 dólares e que não tenham carácter pessoal), cuja aceitação
é da competência dos dirigentes máximos dos serviços, sem prejuízo da sua comunicação à
Direcção do Património do Estado.

Quanto à alienação de bens móveis, que necessita de ser autorizada pelo Ministro das Finanças, a lei
prevê quatro tipos de procedimentos:

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a) Hasta Pública – consiste na alienação de bens através de licitação presencial, a cargo da


Comissão dos Leilões;

b) Concurso Público – da competência da Direcção do Património do Estado, é aberto a


qualquer interessado e realiza-se através de propostas apresentadas em carta fechada pelos
candidatos;

c) Concurso Interno – limitado aos funcionários e agentes do Estado, podendo ser limitado ao
órgão ao qual o bem pertence ou a todos os órgãos da Administração Pública (escolha que é
da competência da Comissão dos Leilões, sendo o concurso dirigido pela Direcção do
Património);

d) Negociação directa – aplica-se em casos excepcionais, devidamente fundamentados pela


Direcção do Património, mediante autorização do Primeiro-Ministro, quando se presuma que
das outras formas de alienação não resulte melhor preço, no caso de ausência de interessados
ou quando não tenha sido possível alienar os bens por qualquer uma das outras formas.

O Estado pode ainda, por razões de interesse público, devidamente fundamentadas e mediante
despacho do Primeiro-Ministro, após parecer da Direcção do Património do Estado, autorizar a
doação de bens móveis, nomeadamente a instituições de solidariedade social ou outras que se revelem
de significativo interesse para o benefício social.

Quanto ao património imobiliário do Estado, não existe verdadeiramente um regime de aquisição,


gestão e alienação dos bens imóveis do Estado.

Subsiste a Lei 1/2003, de 10 de Março (regime jurídico dos bens imóveis) que, na essência, pretendeu:
atribuir ao domínio privado do Estado todo o património de que o Estado português era proprietário
em 7 de Dezembro de 1975, bem como os bens que por lei ou negócio jurídico sejam por ele
adquiridos; regular e punir a apropriação e ocupação ilegítimas do património do Estado e dos
particulares; criar as condições para iniciar um cadastro predial que servisse de base ao futuro registo
dos títulos de propriedade; e regular o processo de despejo administrativo de bens imóveis do Estado
da competência do Ministério da Justiça.

Este diploma revelou-se, porém, insuficiente para resolver a complexa situação vivida em Timor-Leste
de ocupações sucessivas de terras e de indefinição da titularidade dos bens imóveis (públicos e
privados), pelo que se encontra actualmente em discussão o chamado Pacote de Leis de Terras que, inclui,
entre outros diplomas, o Regime Especial para a definição da titularidade de bens imóveis (conhecido
por Lei de Terras), a Lei das Expropriações e os Regimes Jurídicos dos bens do Domínio Público e
Privado do Estado.

3. O ORÇAMENTO DO ESTADO

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3.1. Noção e funções do Orçamento do Estado

Tal como o orçamento de qualquer particular, o orçamento do Estado é uma previsão de receitas e
despesas: orçar significa prever ou estimar receitas e despesas por referência a um determinado
período de tempo.

Esta definição encerra em si dois elementos – a previsão e a limitação no tempo – que são
características de qualquer orçamento, seja público ou privado. O orçamento é sempre uma previsão
para o futuro e o futuro é incerto e tanto mais incerto quanto mais distante for. Daí a necessidade de
limitar o orçamento a um determinado período de tempo.

A estes elementos há, no entanto, que acrescentar outros elementos característicos do orçamento
estadual, e que são a autorização para efectuar despesas e cobrar impostos dada pelas assembleias
representativas do povo (os parlamentos) ao Governo (poder executivo) e a limitação dos poderes
do Governo e da Administração Pública no que respeita à execução orçamental.

Esta autorização dada pelo povo, através dos seus representantes eleitos, ao poder executivo para
efectuar despesas e cobrar receitas, surge pela primeira vez em Inglaterra com o Bill of Rights (1689)
onde se consagrou definitivamente o princípio de que os impostos têm de ser autorizados pelos
representantes de quem os irá pagar. Por sua vez, começou-se a discutir e a votar anualmente uma
parte das despesas (as despesas militares), processo que progressivamente se alargou a todas as
despesas públicas (1837). Em Portugal, o princípio de autorização e fixação anual de receitas e despesas
públicas foi consagrado com a primeira Constituição (1822). Em Timor-Leste, enquanto país
independente, este princípio foi consagrado na Constituição aprovada pela Assembleia Constituinte
em 22 de Março de 2002.

Podemos então definir o Orçamento do Estado como “uma previsão, em regra anual, das
despesas a realizar pelo Estado e dos processos de as cobrir, incorporando a autorização
concedida à Administração Financeira para cobrar receitas e realizar despesas e limitando os
poderes financeiros da Administração em cada ano." 8

Partindo da definição acima, podemos identificar três elementos caracterizadores do orçamento do


Estado:

a) O elemento económico – previsão de receitas e despesas (plano financeiro);

b) O elemento político – autorização política para a execução desse plano financeiro;

8
SOUSA FRANCO, António L. de, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Almedina, Coimbra, 1987, pg. 308.

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c) O elemento jurídico – instrumento através do qual se limitam os poderes dos órgãos da


Administração Financeira.

Destes elementos decorrem as três funções principais do orçamento: funções económicas, funções
políticas e funções jurídicas.

O orçamento do Estado tem, em primeiro plano, funções económicas:

a) Permite uma gestão mais racional e eficiente dos dinheiros públicos ao concretizar uma relação
entre receitas e despesas procurando proporcionar o máximo de bem-estar (utilidades) com um
mínimo de gasto – racionalidade económica;

b) Constitui um quadro de políticas financeiras que permite conhecer a política económica e social
global do Estado, isto é, permite aferir da articulação entre o plano financeiro e o plano económico
e social do Estado – eficácia da política financeira.

O orçamento do Estado tem também uma função política que visa, por um lado, a garantia dos
direitos fundamentais dos cidadãos e, por outro lado, o equilíbrio de poderes.

A génese da teoria do orçamento está intimamente ligada aos princípios liberais de protecção dos
particulares contra o crescimento estadual e os excessos de estatismo. Através da disciplina orçamental
assegura-se que a propriedade privada e os rendimentos só são tributados para cobrir as despesas
públicas mediante autorização dos representantes dos titulares desses rendimentos.

Por outro lado, o mecanismo de autorização política atribui um importante papel ao Parlamento de
controlo da execução orçamental realizada pelo Governo, garantindo assim o equilíbrio de poderes
entre estes órgãos de soberania.

Finalmente, o orçamento tem também funções jurídicas, que são uma decorrência do seu elemento
político, e que se traduzem no conjunto de normas que regulam o exercício dos poderes da
Administração Financeira e definem os concretos limites da acção financeira em cada ano económico,
limitando o gasto concreto dos dinheiros públicos e a cobrança de receitas – Eficácia jurídica do
orçamento. Aqui se incluem as normas de execução orçamental e de contabilidade pública.

A este respeito cumpre assinalar que o orçamento das despesas tem uma natureza e alcance jurídico
diferente do orçamento das receitas. O orçamento das receitas constitui uma verdadeira previsão
na medida em que, dependendo das circunstâncias em concreto, a cobrança pode ir além ou ficar
aquém do montante global estimado (isto é, pode ser superior ou inferior ao montante previsto).

No orçamento das despesas isso não acontece: o montante inscrito a título de despesa constitui o
tecto máximo que os serviços públicos poderão gastar, ou seja, os serviços públicos podem gastar
menos do que montante previsto, mas não podem gastar mais. Pelo que, verificando-se a necessidade
de realizar mais despesa do que o montante autorizado, terá de haver uma nova autorização política
(aprovação de um orçamento rectificativo).

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O orçamento traduz assim o quadro geral de toda a actividade financeira do Estado, na medida em
que através dele se regula e controla a utilização que é dada aos dinheiros públicos.

Mas vimos já que a actividade financeira do Estado não se limita ao orçamento, existindo zonas que
escapam à disciplina orçamental e que são fundamentalmente as operações patrimoniais (stricto sensu)
e as operações do Tesouro.

As operações que o Estado pratica em relação aos seus bens ou às responsabilidades que os oneram
são operações patrimoniais que não estão sujeitas ao regime do orçamento, muito embora tenham
reflexos importantes sobre a gestão orçamental: se o Estado vende um bem, essa venda vai gerar uma
receita que deve ser inscrita no período orçamental correspondente. Por seu lado, as operações de
tesouraria, apesar de estarem também intimamente relacionadas com a execução do orçamento,
decorrem à margem deste.

O orçamento do Estado distingue-se:

a) Da Conta do Estado (ou Conta Geral do Estado)

O Orçamento é uma previsão de quanto se irá gastar e quanto se irá receber (no futuro), enquanto
que a Conta é o registo das receitas cobradas e das despesas pagas (no passado) é, portanto, um
registo “ex post” da execução orçamental.

b) Do Balanço do Estado

O Balanço traduz a situação patrimonial do Estado num determinado momento, reflectindo a


avaliação de todos os elementos do activo e do passivo patrimonial. Ora, no orçamento apenas se
inscrevem de um lado, as receitas e, do outro, as despesas, sendo que este consiste numa estimativa
para o futuro, enquanto que o balanço retrata a situação patrimonial do Estado numa determinada
data (presente ou passada).

c) E dos Planos Económicos

Os planos económicos consistem num conjunto de programas e projectos de investimento


relativos a toda a economia, e não apenas à actividade (financeira) do Estado, cuja vigência pode
ser anual ou plurianual.

3.2. Princípios orçamentais. Noção, limitações e sua aplicação actual.

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Existe um conjunto de princípios ou regras orçamentais através das quais se procura assegurar que as
funções do orçamento não sejam frustradas. Estes princípios, que sintetizam o regime jurídico do
orçamento, são seis: Princípio da Anualidade; Princípio da Plenitude; Princípio da Discriminação
Orçamental; Princípio da Publicidade; Princípio do Equilíbrio Orçamental; e Princípio da Equidade
Intergeracional.

Em Timor-Leste, estes princípios estão consagrados na Constituição e na Lei do Orçamento e Gestão


Financeira (LOGF) - Lei no. 13/2009, de 21 de Outubro.

Analisamos de seguida, cada um desses princípios, quer quanto ao seu significado, quer quanto às
respectivas limitações, desvios, excepções e seu alcance actual.

3.2.1. Princípio da Anualidade. Orçamento de gerência e orçamento de exercício. As despesas


plurianuais e o período complementar.

Uma das regras clássicas do orçamento é a regra da Anualidade que significa que o orçamento tem
uma vigência (validade) anual:

• Votação anual do orçamento pelo Parlamento;

• Execução anual do orçamento pelo Governo.

Como já dissemos anteriormente, sendo o orçamento uma previsão de receitas e despesas para o
futuro, é necessário limitar essa previsão a um determinado período de tempo de modo a reduzir,
dentro do possível, a incerteza e a imprevisibilidade.

Ora, o ano tem-se revelado como o período de tempo natural e adequado para os cálculos económico-
financeiros, quer seja no âmbito nas finanças privadas, quer no âmbito das finanças públicas.

Por outro lado, a regra da anualidade justifica-se também pela necessidade de assegurar que o controlo
efectuado pelo Parlamento sobre a gestão orçamental seja feito com regularidade e num período de
tempo que não permita frustrar os fundamentos da autorização política ou, pelo menos, diminua os
riscos de tal acontecer. Isto é, a fiscalização do orçamento, quer política (pelo Parlamento), quer
jurisdicional (pelos Tribunais de Contas), deve ser realizada com regularidade e em tempo de modo a
não perder o seu efeito útil.

A anualidade não implica, porém, coincidência com o ano civil, isto é, o ano económico ou financeiro
pode ser diferente do ano civil. No caso de Timor-Leste, até 2007 vigorou o período orçamental de 1

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de Julho a 30 de Junho, passando a partir de 2008 a ser coincidente com o ano civil (1 de Janeiro a 31
de Dezembro) – artigo 3º., no. 6, da LOGF.

Portanto, no orçamento inscrevem-se as receitas e despesas relativas ao período financeiro. Mas quais
receitas e quais despesas? As que efetivamente serão cobradas e realizadas? Ou as receitas e despesas
inerentes a créditos e débitos do Estado, isto é, as que nascem com a constituição dos respetivos
direitos e obrigações?

Esta questão leva-nos à distinção entre orçamento de gerência e orçamento de exercício.

No orçamento de gerência prevêem-se as receitas que o Estado vai cobrar e as despesas que irá
pagar no período financeiro. A inscrição das receitas e despesas faz-se, portanto, por referência ao
momento da cobrança e do pagamento (fase terminal do processo da despesa e receita).

No orçamento de exercício a inscrição das receitas e das despesas é feita por referência ao momento
do surgimento dos créditos e débitos a favor e contra o Estado no período financeiro (fase inicial do
nascimento dos créditos e dívidas).

Isto é, no orçamento de gerência inscrevem-se as receitas e as despesas a cobrar e a realizar


efetivamente durante o ano económico, independentemente do momento em que juridicamente
hajam nascido, enquanto que no orçamento de exercício se inscrevem os créditos e os débitos
surgidos no período, independentemente do momento em que se virão a concretizar.

Tomemos como exemplo:

Prevê-se que o Estado assine em 2014 um contrato de empreitada (de obras públicas) para a
construção de uma estrada que custará 150 milhões de dólares, que será construída em 3 anos (2014 a
2016) e cujos pagamentos serão efetuados em parcelas de 50 milhões de dólares por ano. Qual a despesa
a inscrever no orçamento de 2014?

Tratando-se de um orçamento de exercício, a despesa a inscrever será de 150 milhões de dólares, já


que esta corresponde à dívida (total) para o Estado que nasce no momento de assinatura do contrato.
Tratando-se de um orçamento de gerência, a despesa a inscrever no orçamento de 2014 será apenas
de 50 milhões de dólares, que é o montante que efetivamente se estima pagar no ano.

Os dois sistemas orçamentais não são, portanto, coincidentes, apresentando um e outro vantagens e
desvantagens. O orçamento de exercício permite-nos aferir sobre a real situação financeira do Estado,
já que regista o montante total das dívidas e dos créditos que irão surgir contra e a favor do Estado;
mas como nem todos os créditos serão cobrados, nem todas as dívidas serão pagas no ano, o sistema
de exercício não nos permite ter uma ideia da situação da tesouraria do Estado. O orçamento de
gerência tem essa vantagem, ou seja, ao prever apenas as receitas que irão ser cobradas e as despesas
que irão ser realizadas no ano, permite à Administração financeira ter um maior controlo sobre o

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Tesouro Público, de modo a que não falte dinheiro quando os pagamentos excedam as cobranças e,
inversamente, não haja excesso de liquidez quando as cobranças superam os pagamentos.

Por outro lado, o orçamento de exercício exige uma organização e contabilização mais complexa e
trabalhosa, do que o orçamento de gerência (ou de caixa), sendo esta uma das razões que levam os
Estados a optar pelo orçamento de gerência, como é o caso de Timor-Leste.

De qualquer modo, do ponto da informação financeira, o ideal seria a conjugação dos dois sistemas,
o que aliás já se vai tentando nalguns países, como é o caso de Portugal, em que a chamada contabilidade
de caixa é complementada pela chamada contabilidade de compromissos.

Uma das limitações ao princípio da anualidade reside no facto de, nas economias modernas, haver
necessidade de programar certas atividades de forma plurianual. A programação plurianual
económico-financeira (ex. programas e projetos de investimento) é, hoje, uma realidade incontornável.
Fala-se, por isso, numa discrepância entre a anualidade orçamental e as despesas plurianuais que,
verdadeiramente, só existe quando o orçamento é de gerência.

De qualquer modo, os Estados modernos souberam compatibilizar a regra da anualidade com o


planeamento plurianual: a anualidade fornece um período adequado para a execução e controlo
orçamental e o planeamento plurianual permite enquadrar as acções anuais numa perspectiva de médio
e longo prazo.

De modo que, à semelhança do que acontece na maioria dos países, também em Timor-Leste, a LOGF
procura enquadrar o orçamento (anual) numa perspectiva plurianual, prevendo a existência de
programas, projectos ou actividades plurianuais, cuja programação financeira deverá ser incluída, a
título informativo, no orçamento, sendo inscrita (e autorizada) apenas a verba que efectivamente se
prevê gastar no respectivo ano financeiro:

«Artigo 3º.
Anualidade
1- O Orçamento do Estado é anual.
2- A elaboração do orçamento a que se refere o número anterior deve ser enquadrada na perspectiva
plurianual que for determinada pelas exigências da estabilidade financeira.
3- O orçamento do Estado pode integrar programas, medidas e projectos ou actividades que impliquem
encargos plurianuais, os quais evidenciam a despesa total prevista para cada um e, com carácter
indicativo, de pelo menos, dois anos seguintes.
4- (…)
5- (…)
6- O ano financeiro coincide com o ano civil.
7-Todas as dotações orçamentais para um ano fiscal caducam após 31 de Dezembro desse ano financeiro.»

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A regra da anualidade implica ainda que todas as dotações orçamentais caducam no final do ano
financeiro, neste caso, a 31 de Dezembro. Ou seja, a autorização parlamentar para cobrar receitas e
realizar despesas, que se inicia a 1 de Janeiro vigora até 31 de Dezembro.

No entanto, há a referir a existência do chamado período complementar que vem permitir à


Administração financeira processar pagamentos e cobrar receitas para além de 31 de Dezembro,
durante um período que pode variar (não ultrapassando normalmente os dois primeiros meses do ano
seguinte). Trata-se, na verdade, de um período (adicional) que é autorizado, não pelo Parlamento, mas
sim pelo Governo, já que resulta de uma decisão do poder executivo (em regra incluído no decreto-
lei de execução orçamental, como acontece em Portugal, mas nem sempre, como acontece em Timor-
Leste).

Neste sentido, podemos considerar que o período complementar constitui um desvio ou excepção
ao princípio da anualidade, na sua dupla vertente de autorização anual do Parlamento e de execução
anual pelo Governo e Administração Pública dentro do ano financeiro fixado por lei.

3.2.2. Princípio da Plenitude: as regras da unidade e da universalidade. O fenómeno da


desorçamentação.

O princípio da plenitude encontra-se consagrado no artigo 4º da LOGF que tem como epígrafe
Unidade e universalidade:

«Artigo 4º.
Unidade e universalidade
O Orçamento do Estado é unitário e compreende todas as receitas e despesas dos serviços do Estado
que não disponham de autonomia administrativa e financeira e dos serviços e fundos autónomos.»

O princípio da Plenitude pode traduzir-se na seguinte frase: «Um só orçamento e tudo no


orçamento», ou seja, significa por um lado que o orçamento é único (unidade) e, por outro lado, que
todas as receitas e todas as despesas do Estado devem ser inscritas no orçamento (universalidade).

Os fundamentos do princípio da plenitude são vários. Em primeiro lugar, permite saber qual o
montante total das despesas do Estado e se o montante das receitas é suficiente para as cobrir. A
inclusão de todas as receitas e despesas num único documento facilita a formulação de políticas globais
de natureza económica, social e financeira e uma execução mais precisa, rigorosa e eficiente,
promovendo a racionalidade económica e a eficácia da política financeira.

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Em segundo lugar, é necessário assegurar o controlo político da actividade financeira, evitando a


existência de massas de receitas e de despesas que escapem ao controlo orçamental, quer na fase de
previsão, quer na fase de execução, quer ainda na fase de prestação de contas.

Por outro lado, a existência de um só orçamento que inclua todas as despesas e receitas públicas, dota-
o de maior clareza, tornando-o mais simples e acessível para o público em geral. A transparência e a
clareza financeira são também uma condição essencial para assegurar uma fiscalização orçamental
eficaz por parte dos órgãos competentes (no caso de Timor-Leste, Parlamento Nacional e Câmara de
Contas).

Ora, em Timor-Leste, como acontece aliás noutros países, o princípio da Plenitude tem uma
abrangência limitada, apenas se aplicando aos serviços integrados (que não disponham de
autonomia administrativa e financeira) e aos serviços e fundos autónomos e deixando de fora, por
exemplo, as autarquias locais e o sector público empresarial do Estado.

Se é verdade que por agora esta realidade tem pouca expressão em Timor-Leste, no futuro a referida
limitação (isto é, a não aplicação do princípio da plenitude aos municípios e às empresas públicas)
deverá ser compensada pela aplicação efectiva de regras que não dispensem os restantes organismos
de apresentarem as suas receitas e despesas de forma unitária e transparente, de modo a assegurar um
adequado controlo orçamental.

As limitações ao princípio da Plenitude decorrem, já se vê, da complexidade crescente da actividade


financeira do Estado que abrange um conjunto heterogéneo de entidades públicas e das necessidades
das administrações modernas. Fala-se, por isso, no fenómeno da desorçamentação para designar a
saída do orçamento do Estado e da disciplina orçamental de crescentes massas de dinheiros públicos.

Cada vez mais importantes volumes de fundos públicos escapam à disciplina orçamental, quer no que
respeita à previsão, quer no respeita à execução e controlo orçamental. É o que acontece nos casos
em que existem processos próprios de elaboração e aprovação de orçamentos privativos e/ou
independentes do Orçamento Geral do Estado, formas autónomas de cobrança de receitas e de
realização de despesas e seu controlo, regras próprias de contabilidade e até de responsabilidade dos
gestores. É o caso das Autarquias Locais e das empresas públicas.

Certo é que o Estado tem procurado ainda assim, exercer algum controlo sobre estes dinheiros
públicos, quer procurando inscrever no Orçamento do Estado elementos informativos sobre os
orçamentos das entidades autónomas ou independentes, quer atribuindo competência aos Tribunais
de Contas para fiscalizar a legalidade das despesas públicas das referidas entidades.

A este respeito é de salientar que a legislação timorense consagra já dois aspectos importantes:

a) O princípio de que as regras orçamentais constantes da LOGF se aplicam aos orçamentos das
autarquias locais (artigo 2º., no. 3, LOGF);

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
Docente: Estevão Fernandes
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b) O princípio de que os orçamentos das autarquias locais (municípios), as empresas públicas e outras
entidades de natureza pública ou privada que recebam financiamento do Estado, estão sujeitas ao
controlo jurisdicional da Câmara de Contas do Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de
Contas (artigo 3º da Lei 9/2011, de 17/8).

3.2.3. Princípio da Discriminação Orçamental: as regras da especificação, da não


compensação e da não consignação. A autonomia financeira e a consignação de receitas.

O princípio da discriminação orçamental respeita à forma como são inscritas no orçamento as receitas
e as despesas e à forma como se efectivam, traduzindo-se em três regras: a especificação (artigos 145º,
no. 2, da Constituição da RDTL e 7º. da LOGF); a não compensação (artigo 5º da LOGF); e a não
consignação (artigo 6º. da LOGF).

A regra da especificação dita que as despesas e receitas inscritas no orçamento devam ser
suficientemente discriminadas, de modo a evitar a existência de dotações ou fundos secretos, o
que significa que não podem ser inscritas apenas pelo seu montante global, antes necessitando de ser
especificadas adequadamente, ou seja, classificadas por espécies, agrupamentos e rubricas de despesa
e de receita.

A discriminação das receitas e das despesas aplica-se quer na fase de preparação do orçamento, quer
na fase de execução e apresentação de contas, através das classificações orgânica, económica e
funcional. No capítulo dedicado às despesas e receitas públicas veremos em que consistem estas
classificações.

No entanto, a especificação não pode ser levada ao extremo, sob pena de limitar a possibilidade dos
órgãos e serviços se adaptarem às circunstâncias concretas na fase de execução e, portanto, prejudicar
o funcionamento normal dos serviços. Por essa razão, a discriminação ou especificação das receitas e
despesas deve ser suficiente para cumprir os objectivos de clareza, veracidade, racionalidade e
efectivo controlo orçamental, mas deve ser também de execução razoável e possível.

«Artigo 7º.
Especificação
1- O Orçamento do Estado deve especificar suficientemente as receitas nele previstas e as despesas nele
fixadas.

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2- São nulos os créditos orçamentais que possibilitem a existência de dotações para utilização confidencial
ou para fundos secretos.
3- No orçamento do Ministério das Finanças é inscrita uma dotação de contingência destinada a fazer
face a despesas não previsíveis e inadiáveis.»
O nível de especificação exigido é, aliás, diferente consoante se trate de serviços integrados (sem
autonomia administrativa e financeira) ou de organismos e fundos autónomos. No primeiro caso, a
especificação é feita por agrupamentos de despesas divididos em títulos e capítulos, podendo estes
dividir-se em um ou mais níveis de desagregação, conforme se revele necessário para garantir uma
adequada especificação das despesas (artigo 26º LOGF). No segundo caso, apenas se exige as receitas
globais e as despesas globais (artigo 27º LOGF).

Uma excepção à regra da especificação orçamental prende-se com as despesas que, pela sua natureza,
são imprevisíveis e, no entanto, inadiáveis. Trata-se de situações cuja ocorrência não é possível
prever, mas que se acontecerem implicam a realização de despesas a que o Estado tem de atender,
muitas vezes com carácter de urgência. É o que acontece, por exemplo, numa situação de calamidade
pública (provocada por cheias, tremores de terra, etc.). Para fazer face a estes casos de impossibilidade
de previsão, inscreve-se no orçamento uma dotação ou fundo provisional, que em Timor-Leste se
designa dotação de contingência (artigo 7º., no. 3, da LOGF).

Passemos agora à análise da regra da não compensação, também designada por regra do orçamento
bruto. Esta regra significa que as receitas e despesas devem ser inscritas no Orçamento do
Estado de forma bruta e não líquida. Ou seja, não devem ser deduzidas às receitas quaisquer
despesas realizadas com a sua cobrança; nem às despesas descontadas receitas que tenham sido
originadas pela sua realização. Esta regra dota de maior clareza o orçamento e permite um efectivo
controlo da execução orçamental.

A regra da não compensação está prevista no artigo 5º da LOGF:

«Artigo 5º.
Não compensação
1- Todas as receitas são previstas pela importância integral em que foram avaliadas, sem dedução alguma
para encargos de cobrança ou de qualquer outra natureza, excepto quando previsto por lei.
2- Todas as despesas são inscritas pela sua importância integral, sem dedução de qualquer espécie.»

Finalmente, a regra da não consignação dita que todas as receitas servem para cobrir todas as
despesas, isto é, não podem afectar-se quaisquer receitas à cobertura de determinadas

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despesas. Esta regra permite ao Tesouro (que centraliza a gestão das receitas e das despesas) uma
gestão mais racional dos meios monetários do Estado.

No entanto, existem inúmeras excepções à regra da não consignação, nomeadamente as que


decorrem de situações de autonomia financeira, em que as receitas de determinados organismos são
afectadas à cobertura das suas despesas, e também as situações em que certas despesas só podem ser
efectuadas se forem cobradas as receitas que as vão suportar – consignação de receitas (em sentido
estrito).

Existem fundamentalmente três tipos de autonomia:

a) Serviços dependentes (sem autonomia), que não têm autonomia administrativa e por isso
não podem praticar actos definitivos e executórios, entre os quais se inclui a autorização de
despesas e pagamentos;

b) Serviços com autonomia administrativa, que podem praticar actos de gestão definitivos e
executórios, entre os quais autorizar despesas e pagamentos mas dentro dos limites dos
créditos inscritos no Orçamento do Estado;

c) Serviços com autonomia administrativa e financeira, que praticam actos de gestão


definitivos e executórios, dispõem de receitas e orçamento próprios e autorizam as suas
despesas e pagamentos e, em regra, gozam também de autonomia patrimonial.

Só neste último caso, de autonomia administrativa e financeira, existe (ou pode existir) consignação
de receitas.

A consignação de receitas tem diversas explicações. O Estado pode entender, por diferentes razões,
ser necessária a consignação de receitas, nomeadamente quando:

a) A cobertura de certas despesas deva estar sempre garantida, mesmo quando, por falta de
recursos, se sacrifiquem outras despesas. É o que acontece, por exemplo, com a consignação
de receitas ao pagamento de empréstimos (pagamento de juros e amortização de capital),
muitas vezes exigida pelos credores (isto é, por quem empresta dinheiro);

b) Seja necessário limitar certas despesas ao montante de certas receitas, isto é, as despesas só se
realizam na medida em que existam receitas para as cobrir. É o que acontece, por exemplo,
quando a manutenção e conservação das auto-estradas é financiada através das receitas (taxas)
cobradas aos utentes que as utilizam;

c) O Estado entende que a melhor forma de assegurar uma gestão mais eficiente, eficaz e
desburocratizada de determinada actividade pública, é dotar certos organismos de autonomia
financeira, organismos estes que dispõem de receitas e orçamento próprios;

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d) Ou ainda, por outras razões, como por exemplo, no caso de subsídios ou donativos de
particulares (indivíduos ou organizações) que, por imposição destes, devam ser afectados à
realização de determinadas despesas.

Em qualquer dos casos, a consignação de receitas tem de estar prevista em lei ou resultar de contrato.
É o que prevê o no. 2 do artigo 6º. da LOGF:

«Artigo 6º.
Não consignação
1- Não pode afectar-se o produto de quaisquer receitas à cobertura de determinadas despesas.

2- Exceptuam-se do disposto no número anterior as receitas que correspondam a subsídios, donativos ou legados
de particulares que, por vontade destes, devam ser afectados à cobertura de determinadas despesas, bem como as
que por razão especial sejam afectas a determinadas despesas por expressa estatuição legal ou contratual».

3.2.4. Princípio da Publicidade

A regra da publicidade decorre, no plano jurídico, do facto do Orçamento do Estado ser aprovado
por lei e, portanto, a lei tem de ser objecto de publicação no Jornal Oficial (Jornal da República) sob
pena de ineficácia jurídica. Tal exigência de eficácia jurídica encontra-se expressa no artigo 5º. da Lei
no. 1/2002, de 7 de Agosto (publicação dos actos).

De outro ponto de vista, a publicidade é necessária quer para a Administração Pública que precisa de
conhecer o conteúdo e limites da autorização orçamental, quer para o público em geral que assim pode
conhecer e controlar a acção governativa.

3.2.5. O Equilíbrio Orçamental. Conceito e critérios de equilíbrio orçamental.

O equilíbrio orçamental é o mais importante princípio orçamental e também o mais complexo.


Traduz-se numa verdadeira exigência substancial quanto ao conteúdo do Orçamento do Estado.

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Existem vários critérios para se determinar se o Orçamento do Estado está equilibrado ou


desequilibrado do ponto de vista financeiro. Tais critérios, variam de país para país consoante a opção
tomada por cada um. Mas, de uma forma geral, as teorias do equilíbrio orçamental baseadas numa
perspectiva meramente formal foram abandonadas e deram lugar a critérios que procuram definir o
equilíbrio orçamental numa perspectiva substancial, isto é, tendo em conta o conteúdo concreto do
orçamento determinado por uma relação entre certo tipo de receitas e certo tipo de despesas.

3.2.5.1. Equilíbrio orçamental em sentido amplo

Numa primeira aproximação, equilíbrio orçamental significa que o orçamento deve ser elaborado para
que todas as despesas nele previstas sejam efectivamente cobertas por receitas nele inscritas, ou seja,
pressupõe, no mínimo, a igualdade entre receitas e despesas.

Em sentido amplo, há equilíbrio orçamental em situações de superávit e de equilíbrio


aritmético; há desequilíbrio orçamental em situações de défice:

a) Superávit – as receitas excedem as despesas;

b) Equilíbrio aritmético – as receitas são iguais às despesas;

c) Défice – as receitas são insuficientes (inferiores) às despesas.

3.2.5.2. Equilíbrio «ex ante» e «ex post»

O equilíbrio orçamental pode também ser analisado numa perspectiva «ex ante» ou «ex post», quer
dizer, anterior ou posterior à execução orçamental.

O equilíbrio «ex ante» é o equilíbrio da previsão orçamental (do Orçamento); o equilíbrio «ex
post» é o equilíbrio da execução orçamental (da Conta). Pode acontecer que haja equilíbrio entre
receitas e despesas na fase de previsão orçamental (e, em sentido amplo, nesta fase há sempre equilíbrio
orçamental), mas depois de executado o orçamento se venha a verificar um desequilíbrio entre receitas
e despesas.

3.2.5.3. Equilíbrio formal e equilíbrio substancial

O princípio do equilíbrio orçamental aparece no século XIX, como um princípio formal de igualdade
contabilística entre receitas e despesas. Este equilíbrio formal foi sendo abandonado em virtude do

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aumento da intervenção do Estado, sobretudo após a 2ª. Guerra Mundial, e substituído por um
princípio mais económico, mais substancial.

Em sentido formal, equilíbrio significa uma situação contabilística de igualdade entre as receitas
e as despesas.

O equilíbrio formal, traduzido numa estrita igualdade entre receitas e despesas, significava que não
deviam existir défices orçamentais, nem excedentes de receitas. Este princípio baseava-se na ideia de
uma intervenção mínima do Estado, em que os impostos só deviam ser criados na estrita medida do
necessário para cobrir as despesas, e em que as situações de défice deviam ser a todo o custo evitadas
porque o recurso a empréstimos agravava a situação financeira do Estado e a criação de moeda
agravava a inflação.

Acresce dizer que, do ponto de vista formal, a exigência de equilíbrio é fácil de atingir, porque não se
fazendo qualquer discriminação quanto ao tipo de receitas, incluem-se todas elas e, portanto, também
o crédito público. Ou seja, em sentido formal, há sempre equilíbrio.

Em sentido substancial, o equilíbrio refere-se a uma relação mais complexa entre receitas e despesas.
Como vimos não é possível conceber um orçamento com receitas inferiores às despesas, ou seja, do
ponto de vista formal, o orçamento nunca é deficitário. Contudo, fala-se frequentemente em défice
do orçamento, mesmo quando as receitas são iguais ou superiores às despesas. Porque razão? Porque
o equilíbrio orçamental não se define pelo equilíbrio entre todas as receitas e todas as despesas, mas
sim pelo equilíbrio entre certas receitas e certas despesas.

Trata-se de determinar uma relação concreta entre certo tipo de receitas e certo tipo de despesas. Em
sentido substancial, só existe equilíbrio orçamental quando certas receitas são suficientes para
cobrir certas despesas.

Nas administrações modernas, é o equilíbrio substancial que está em causa, e este procura responder
à seguinte questão: em que condições o Estado pode recorrer às receitas do crédito público,
sem entrar em situação de desequilíbrio?

3.2.5.4. Critérios de Equilíbrio Substancial

O equilíbrio substancial determina-se, portanto, por uma relação concreta entre certo tipo de receitas
e certo tipo de despesas. Os diferentes critérios de equilíbrio substancial procuram definir os tipos de
receitas e de despesas a partir dos quais se determina o equilíbrio e as condições em que o Estado
pode recorrer a receitas do crédito público sem violar o equilíbrio orçamental.

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Existem, fundamentalmente, quatro critérios: critério dos rendimentos normais, critério do activo de
tesouraria, critério do orçamento ordinário e critério do orçamento de capital.

3.2.5.4.1. Critério dos Rendimentos Normais

Este critério considerava que havia equilíbrio orçamental quando os rendimentos normais
cobrissem todas as despesas.

Eram considerados rendimentos (ou receitas) normais, as receitas tributárias (exemplo: impostos) e as
receitas geradas pelo património (incluindo as resultantes da sua alienação); eram considerados
rendimentos não normais as receitas creditícias (receitas do crédito público, como por exemplo os
empréstimos).

De acordo com este critério, há equilíbrio orçamental quando:

Receitas Normais = >Todas as Despesas

A ideia subjacente a este critério era a de limitar o recurso ao crédito pelo Estado, caso em que o
orçamento estaria desequilibrado. Era entendido que quando o Estado recorria aos mercados
financeiros estava a perturbar o normal funcionamento da economia, desviando recursos do sector
privado (produtivo) para o sector público (improdutivo).

O recurso a empréstimos e, portanto, o défice orçamental, só era admitido em situações


excepcionais, como por exemplo, guerra ou calamidade pública. Nas restantes situações de
dificuldade financeira, era preferível o agravamento dos impostos ao agravamento da dívida pública.

Embora este critério seja, no plano teórico, claro e rigoroso, na prática caiu em desuso dadas as
dificuldades em obter orçamentos equilibrados sem recurso ao crédito. O desequilíbrio era a situação
normal.

3.2.5.4.2. Critério do Activo da Tesouraria

O critério do activo da tesouraria atende à situação do património da tesouraria, entendendo-se que


há desequilíbrio sempre que o orçamento de despesa diminua o património monetário do
Estado.

Este critério assenta na distinção entre receitas e despesas efectivas e não efectivas e, por isso, é
também designado por critério do orçamento efectivo:

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- Receita efectiva é a aquela que representa um efectivo aumento do património de tesouraria;


receita não efectiva é aquela que provoca simultaneamente um aumento e uma diminuição
no património monetário do Estado;

- Despesa efectiva é aquela que representa uma efectiva diminuição do património da


tesouraria; despesa não efectiva é aquele que provoca simultaneamente uma diminuição e
um acréscimo de montante idêntico no património monetário (a redução do património
monetário é compensada por uma anulação de posições passivas).

De acordo com esta distinção:

- os impostos são uma receita efectiva;

- os empréstimos são uma receita não efectiva, porque a contracção de um empréstimo provoca
um aumento da tesouraria, mas implica também a inscrição de despesa para pagamento do
serviço da dívida (amortização do capital emprestado mais os juros);

- praticamente todas as despesas do Estado são despesas efectivas (pois resultam numa
diminuição do património monetário do Estado);

- apenas os reembolsos (pagamentos) dos empréstimos são considerados despesas não efectivas
(porque apesar de provocarem uma diminuição na tesouraria do Estado, essa diminuição é
compensada pela redução do valor da dívida).

Para existir equilíbrio, as despesas efectivas (que provocam uma diminuição no património
monetário) só podem ser financiadas por receitas efectivas (que provocam um aumento no
mesmo património); e as despesas não efectivas podem ser financiadas por receitas efectivas e
por receitas não efectivas.

Ou seja, para existir equilíbrio é necessário que:

RE => DE

Portanto, de acordo com este critério, só é possível manter o equilíbrio orçamental quando o
empréstimo se destina ao pagamento de outro empréstimo anteriormente contraído. Se o
empréstimo de destinar, por exemplo, à compra de um edifício ou à construção de uma estrada, há
desequilíbrio porque apesar de aumentar o património real do Estado, diminui o património
monetário (Tesouro).

A adopção deste critério, implica que quase todas as despesas tenham de ser cobertas pelas receitas
(efectivas) que têm um maior peso no orçamento (ou seja, na maioria dos países, os impostos). Pelo

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que o equilíbrio é dado pela igualdade entre as despesas totais e os impostos, o que limita as
despesas públicas ao montante das receitas que o Estado consegue cobrar. Ao se defender que
o melhor orçamento é o orçamento mais pequeno, está-se a limitar as despesas que criam valor
(despesas de investimento).

Na prática, este critério limita a realização de despesas de investimento, e não se coaduna, por isso,
com as exigências actuais. Hoje, muitos países recorrem a empréstimos para realizar investimentos,
quer em infra-estruturas, quer de outra natureza. Pelo que este critério tendo limitações de carácter
prático, evoluiu para um conceito que permitisse cobrir com empréstimos parte das despesas públicas.

3.2.5.4.3. Critério do Orçamento Ordinário

Este critério assenta na distinção entre receitas e despesas ordinárias e extraordinárias.

Segundo um dos critérios mais comuns, são despesas e receitas ordinárias as que se repetem
(anualmente) em todos os orçamentos, ainda que o seu montante varie; são despesas e receitas
extraordinárias aquelas que, dada a sua natureza, não necessitam de ser realizadas ou cobradas
todos os anos.

O que está em causa é a repetição ou não em todos os orçamentos, e não a variação do quantitativo
da despesa ou da receita. O conceito de despesas ordinárias (que se repetem anualmente ainda que o
seu montante varie), não se confunde pois com:

- as despesas certas, que são as despesas que mantêm de ano para ano um montante relativamente
aproximado;

- as despesas variáveis, aquelas cujo valor varia significativamente de ano para ano;

- as despesas recorrentes, que se repetem regularmente de tantos em tantos anos (mas não todos os
anos).

Tanto as despesas certas como as variáveis podem ser ordinárias ou extraordinárias; as recorrentes são
extraordinárias por não se repetirem todos os anos.

De acordo com este critério, há equilíbrio quando as despesas ordinárias são cobertas por receitas
ordinárias; e as despesas extraordinárias são cobertas pelo excedente das receitas ordinárias
e/ou por receitas extraordinárias.

Portanto, há equilíbrio orçamental quando:

RO => DO

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Este critério apresenta, porém, algumas limitações de carácter prático.

O critério do orçamento ordinário parece simples e claro, mas também é relativamente elástico e
pouco rigoroso, permitindo que seja discutível e manipulada a classificação de muitas despesas e
receitas como ordinárias ou como extraordinárias.

Por exemplo, em muitos países o recurso a empréstimos repete-se de orçamento para orçamento, o
que levaria a considerar (segundo este critério) as receitas do crédito público como receitas ordinárias
e, portanto, por esta via atingir-se um aparente equilíbrio orçamental.

Por outro lado, além do critério mais comum de distinção entre receitas e despesas ordinárias e
extraordinárias (com base na repetição qualitativa todos os anos), existem outros critérios de distinção,
como por exemplo, aquele que considera que as receitas e despesas ordinárias são aquelas cuja
prestação da respectiva utilidade se esgota no período financeiro, e as extraordinárias quando a
utilidade que proporcionam se prolonga no tempo (para além do período anual).

De acordo com esta distinção, por exemplo, as despesas com o pessoal são despesas ordinárias, visto
que apenas asseguram o funcionamento dos serviços nesse ano e não nos anos seguintes, enquanto
que a despesa com a construção de um estrada é uma despesa extraordinária porque cria uma utilidade
não só para os cidadãos presentes como para as gerações vindouras. Assim, haverá equilíbrio se a
geração existente num determinado ano pagar as despesas cuja utilidade se esgota nesse ano e as
gerações que lhe sucederem pagarem as despesas cuja utilidade perdure durante os anos seguintes. Se
no primeiro caso, o pagamento se traduz na cobrança de receitas (ordinárias) que se repetem todos os
anos (exemplo impostos); no segundo caso, o pagamento das despesas ao longo dos anos só pode
conseguir-se através de receitas extraordinárias (empréstimos), assim se distribuem os encargos de
juros e amortizações pela geração actual e gerações futuras. Contudo, na prática, esta distribuição de
encargos pelas gerações nem sempre resulta, como veremos mais adiante, numa distribuição equitativa
de utilidades e benefícios.

Em resumo, a classificação entre despesas e receitas ordinárias e extraordinárias, varia consoante o


critério que se adopte e, mesmo com base no mesmo critério, é passível de diferentes interpretações.
Assim, o equilíbrio do orçamento ordinário e a escolha dos meios de financiamento de muitas despesas
(entre impostos e empréstimos) varia consoante o Governo classifique as despesas de ordinárias ou
extraordinárias.

3.2.5.4.4. Critério do Orçamento de Capital

Este critério assenta na distinção entre receitas e despesas correntes e de capital:

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- Receitas e despesas de capital são aquelas que alteram a situação activa ou passiva do
património duradouro do Estado;

- Receitas e as despesas correntes são aquelas que não diminuem nem aumentam o valor do
património duradouro do Estado, apenas afectam o património não duradouro.

Exemplos: os impostos são receitas correntes; o pagamento de salários aos funcionários é despesa
corrente; o custo de construção de um edifício público é uma despesa de capital; a venda de um edifício
público gera uma receita de capital; a contracção de um empréstimo público é uma receita de capital
(porque representa a assumpção de uma dívida de médio/longo prazo para o Estado).

De acordo com este critério, que assenta na distinção entre orçamento corrente e orçamento de capital,
para que haja equilíbrio é necessário que as despesas correntes sejam cobertas por receitas
correntes; as despesas de capital podem ser cobertas por receitas de capital ou pelo excedente
das receitas correntes. Há desequilíbrio quando as despesas correntes são financiadas por receitas
de capital.

Portanto, há equilíbrio orçamental quando:

RC => DC

De acordo com este critério, justifica-se o recurso ao crédito se os empréstimos servirem para
pagar bens duradouros, isto é, bens cuja vida útil (ou utilidade) se prolonga por mais de um período
financeiro.

Mas, para além da distinção baseada no património duradouro do Estado, existem outros critérios de
distinção entre receitas e despesas correntes e de capital, nomeadamente aquele que se baseia na
origem da receita ou da despesa. De acordo com este critério, são receitas correntes aquelas que têm
origem no rendimento (e, portanto, representam uma subtracção ao consumo dos particulares), e
despesas correntes, as despesas em consumo. Portanto, se houver equilíbrio entre receitas e despesas
correntes, o aumento do consumo público é igual à diminuição do consumo privado. Neste caso, a
actividade financeira não afectará o nível global de consumo.

Por sua vez, são consideradas receitas extraordinárias as que provêem do aforro (poupança) e as
despesas extraordinárias concretizam-se em poupança ou em investimento. Portanto, se houver
equilíbrio do orçamento de capital, não será afectado o nível global do aforro.

O equilíbrio do orçamento passou, portanto, a ser definido em função dos efeitos das finanças sobre
o consumo e a poupança: se se pretender incentivar o consumo privado aliviam-se as receitas
correntes (impostos); se se pretender incentivar o investimento público justifica-se o recurso ao
crédito.

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O critério do orçamento de capital, tem a vantagem da classificação entre despesas correntes e de


capital ser menos elástica do que a anterior (despesas ordinárias e extraordinárias), e portanto, presta-
se menos a equilíbrios artificiais.

No entanto, o critério do orçamento de capital tem também uma limitação. O critério apresenta uma
certa rigidez na defesa do equilíbrio financeiro, ao relacioná-lo apenas com o acréscimo ou a
diminuição do património (duradouro) do Estado. Privilegia o investimento (despesas) em bens
materiais duradouros, relativamente aos investimentos em bens imateriais (educação, investigação
científica, etc.) que tendem a ser financiados por receitas correntes.

3.2.5.5. O Equilíbrio Orçamental em Timor-Leste

Em Timor-Leste, a regra do equilíbrio orçamental está consagrada no artigo 8º da LOGF:

«Artigo 8º.
Equilíbrio
O Orçamento do Estado deve prever os recursos necessários para cobrir todas as despesas.»

Esta formulação é, porém, vaga, não nos permitindo saber qual o critério de equilíbrio orçamental a
seguir. Portanto, há que interpretar o princípio do equilíbrio orçamental, tendo em conta, por um lado,
a classificação económica de receitas e despesas existente em Timor-Leste e, por outro lado, as
disposições jurídicas que regulam o recurso ao crédito público (Lei da Dívida Pública) e a utilização
do Fundo Petrolífero (Lei do Fundo Petrolífero).

Atendendo à classificação económica das receitas e das despesas públicas, verifica-se que a mesma
distingue entre receitas e despesas correntes (por vezes incorrectamente designadas de despesas
recorrentes) e receitas e despesas de capital. Portanto, deste ponto de vista, o critério do equilíbrio
orçamental é o critério do orçamento de capital.

Mas é, sobretudo, à luz da Lei 13/2011, de 28 de Setembro (regime da dívida pública) que se deve
interpretar o princípio do equilíbrio orçamental consagrado no artigo 8º da LOGF, pois vimos já que
o equilíbrio substancial procura definir em que condições o Estado pode recorrer às receitas do crédito
público sem violar o equilíbrio orçamental.

Ora, o preâmbulo e o artigo 2º da Lei da Dívida Pública respondem a esta questão.

A lei define os princípios e regras que devem presidir à constituição e emissão de dívida pública, tendo
em conta os seguintes objectivos:

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a) Evitar o recurso ao endividamento para o financiamento da despesa corrente;

b) Privilegiar o investimento estratégico que promova o desenvolvimento do País;

c) Assegurar uma gestão eficiente e equilibrada da dívida numa perspectiva de médio e longo
prazo (equilíbrio das contas públicas a médio e longo prazo);

d) Prevenir a concentração temporal dos encargos, assegurando uma distribuição equilibrada dos
encargos pelos vários orçamentos anuais de modo a evitar uma excessiva concentração
temporal do serviço da dívida;

e) Assegurar a não exposição a riscos excessivos, procurando designadamente minimizar os


encargos directos e indirectos da dívida;

f) Garantir a disponibilização do financiamento necessário em cada período orçamental;

g) E promover um funcionamento equilibrado e eficiente dos mercados financeiros.

A lei é clara (artigo 2º, nos. 1 e 3):

∙ O Estado pode recorrer às receitas do crédito público para financiar a construção de infra-
estruturas estratégicas para o desenvolvimento do País;

∙ O custo da dívida pública não pode ser superior ao retorno económico do investimento
público, competindo ao Ministro das Finanças efectuar os estudos e análises necessários.

Parece resultar claro que o critério do equilíbrio orçamental aqui presente é o critério do orçamento
de capital, uma vez que o recurso a receitas de crédito público só é possível quando se destina a
financiar despesas de capital, isto é, bens duradouros e, ainda assim, com limitações: é necessário que
esses bens sejam considerados estratégicos para o desenvolvimento do país.

Portanto, haverá equilíbrio orçamental em Timor-Leste quando:

∙ As receitas correntes sejam suficientes para financiar as despesas correntes (RC => DC);

∙ As despesas de capital sejam financiadas pelos excedentes das receitas correntes (se não
foram consideradas estratégicas) ou por receitas do crédito público (se forem consideradas
despesas estratégicas para o desenvolvimento do País).

Acontece que em Timor-Leste as receitas correntes representam uma percentagem ainda muito
reduzida do total das despesas correntes, pelo que, na prática, até à data, a quase totalidade das despesas
correntes e a totalidade das despesas de capital têm sido financiadas pelas receitas petrolíferas (que são
receitas de capital).

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Docente: Estevão Fernandes
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Atendendo, portanto, ao critério do orçamento de capital, o orçamento de Timor-Leste é claramente


deficitário. Este desequilíbrio orçamental só é justificável na medida em que o País, sendo ainda
jovem e tendo uma estrutura produtiva e de rendimentos ainda muito incipiente, não consegue gerar
receitas correntes que permitam financiar as despesas correntes.

É certo que a Lei do Fundo Petrolífero (Lei 9/2005 de 3 de Agosto alterada pela Lei 12/2011 de 28
de Setembro), permite efectuar transferências do Fundo Petrolífero para o Orçamento do
Estado tendo em vista a cobertura das despesas públicas. Essas transferências estão sujeitas a um
limite: em cada ano, não podem ser superiores ao rendimento sustentável estimado9 (artigo 9º.). Mas,
ao contrário do que acontece no regime da dívida pública, a lei do fundo petrolífero não estabelece
qualquer limitação quanto ao tipo de despesas que é possível financiar através das receitas
petrolíferas.

Ora, as receitas petrolíferas não são ilimitadas, devendo ser canalizadas para investimentos produtivos,
que criem valor na sociedade, que criem emprego e que potenciem o crescimento e desenvolvimento
económico e social, caso contrário corre-se o risco de, a longo prazo, por um lado, essas receitas se
esgotarem e, por outro lado, o país não atingir um grau de desenvolvimento que permita gerar outro
tipo de receitas (exemplo impostos) suficientes para cobrir, pelo menos, as despesas públicas
correntes.

Sendo Timor-Leste, um país relativamente jovem, com uma estrutura produtiva e económica ainda
frágil, o Estado não tem outra alternativa senão recorrer às receitas petrolíferas para financiar as
despesas públicas. Mas à medida que o país se for desenvolvendo haverá que alterar o actual quadro
de financiamento das despesas do Estado, de modo a assegurar o equilíbrio orçamental a médio e
longo prazo e um crescimento e desenvolvimento sustentado.

3.2.5.6. Equilíbrio Orçamental. Conclusões.

A economia financeira moderna é uma economia de integração entre a actividade financeira


pública e a economia global, entre o sector público e o sector privado. O equilíbrio financeiro do
sector público deve, pois, integrar-se no equilíbrio financeiro geral da economia do país.

A opção por um ou outro critério (substancial) do equilíbrio orçamental, depende assim dos
objectivos de política económica que o Estado pretenda prosseguir. Por exemplo, se o objectivo é
o de combater a inflação, é preferível o equilíbrio do orçamento efectivo (critério do activo de

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Rendimento Sustentável Estimado é o valor máximo que pode ser retirado do Fundo Petrolífero, para um
determinado ano financeiro, cujo montante seja tal que deixe no Fundo recursos suficientes para que um valor igual
(real) possa ser, ad eternum, objecto de apropriação nos anos financeiros seguintes, calculado de acordo com a
fórmula que consta da lei.

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
Docente: Estevão Fernandes
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tesouraria), uma vez que este critério limita as despesas de investimento e favorece as despesas
correntes (de consumo), provocando tendencialmente um aumento da procura global e, por essa via,
o controlo dos preços.

Se o Estado pretende promover o crescimento económico, então é desejável que opte pelo critério do
orçamento de capital, que privilegia o investimento público em bens de carácter duradouro, criando
assim valor e riqueza a médio e longo prazo e potenciando a criação de emprego.

Uma vez que o critério do equilíbrio é definido por lei, para evitar que a lei tenha de ser alterada com
frequência, é desejável que se opte pelos objectivos de carácter mais duradouro, mais permanente.

Por outro lado, vimos que a evolução das teorias do equilíbrio orçamental veio colocar o problema na
questão fundamental de saber as condições em que o Estado pode recorrer a empréstimos para
financiar despesas, sem violar o equilíbrio.

Dado que nas economias modernas há uma forte interligação entre o sector financeiro e a economia,
pode ser necessário recorrer a empréstimos para combater situações de depressão económica ou para
promover uma política de crescimento e desenvolvimento económicos. Neste quadro, é aceitável a
existência de desequilíbrios orçamentais transitórios.

Ou seja, o equilíbrio orçamental só se justifica na medida em que não prejudique (ou agrave) as
condições de realização dos objectivos gerais da política económica. O desequilíbrio financeiro
pode ser, em certas circunstâncias, desejável, enquanto potenciador do desenvolvimento sócio-
económico do País.

Na medida em que as acções do Estado não se traduzam em meros consumos, o recurso a


empréstimos é, em princípio, legítimo: se o Estado pretende investir em bens de capital pode
recorrer a empréstimos para financiar esse investimentos.

Por outro lado, sabe-se que o défice orçamental pode agravar as tendências inflacionistas (em
particular nos países subdesenvolvidos com maior propensão para a inflação) e, quando persistente, é
de difícil correcção.

Os cortes drásticos na despesa e as reduções de impostos permitem obter a curto prazo um efectivo
equilíbrio orçamental, e têm o objectivo de reduzir a dimensão e o papel do sector público, deixando
espaço à iniciativa e ao investimento privado, ao mesmo tempo que reduzem as tendências
inflacionistas.

Em conclusão:

Não se pode negar que o défice orçamental pode ter um efeito reactivador na conjuntura
económica e também justificar-se para prosseguir objectivos de redistribuição da riqueza, de
promoção social e de desenvolvimento.

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Mas também é verdade que o desenvolvimento e o crescimento sustentado dificilmente são


compatíveis com uma política de constantes défices orçamentais. A indisciplina (desequilíbrio)
orçamental persistente (défices de elevado valor e prolongados no tempo) é de difícil correcção,
pois vão-se acumulando actividades e compromissos financeiros que não podem cessar de repente.

O equilíbrio deixou de ser hoje exigido como uma condição universal de um orçamento perfeito. Mas
há que ter presente que o equilíbrio orçamental é um factor de rigor na gestão financeira, em
particular na óptica das políticas a longo prazo: excedentes nos orçamentos correntes representam
poupanças geradas pelo sector público que podem ser aplicados em investimentos produtivos,
constituindo uma forma aconselhável de acumulação de capital e de investimento.

Com excepção das teorias clássicas extremamente rígidas quanto à possibilidade de recurso ao crédito,
o equilíbrio orçamental (na sua formulação mais moderna) possibilita uma gestão mais racional
da dívida pública (o crédito público não pode ser utilizado para pagar despesas supérfluas), o
estímulo da economia e constitui ainda uma medida de política anti-inflaccionista.

3.2.6. A Equidade Intergeracional

O princípio da equidade intergeracional encontra-se consagrado no artigo 9º. da LOGF:

«O Orçamento do Estado subordina-se ao princípio da equidade na distribuição de benefícios e custos entre gerações».

Este princípio, de formulação mais recente do que as regras clássicas do orçamento, pode ser olhado
como uma decorrência do princípio do equilíbrio orçamental.

A equidade intergeracional reside na ideia de que muitas das despesas que o Estado tem de realizar,
em particular aquelas que maior peso representam na despesa global (como o investimento público,
os encargos com a dívida pública ou as despesas com a segurança social), não possam ou não devam
ser geridas apenas ano a ano, devendo antes ter-se uma perspectiva da sua evolução num horizonte
temporal mais alargado, designadamente o custo que tais despesas de carácter plurianual terá para as
gerações vindouras.

E não só o custo, mas também os benefícios. Isto é, os compromissos e encargos que hoje o Estado
assume deverão traduzir-se numa distribuição equitativa (justa) de custos e benefícios entre as
gerações, sob pena de, no futuro, as novas gerações terem de suportar os custos com as opções hoje
tomadas e de não virem a usufruir dos correspondentes benefícios.

Nalguns países, este princípio foi claramente violado, por exemplo, no que respeita aos benefícios e
custos com os sistemas de segurança social (reformas). Quando foram concebidos, os sistemas de
segurança social baseavam-se numa determinada estrutura etária da população que se veio a alterar

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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profundamente: nos países desenvolvidos as taxas de natalidade têm vindo a decrescer, provocando
uma diminuição na população activa (trabalhadores), e a esperança média de vida tem vindo a
aumentar o que provoca o aumento da população inactiva (idosos). Assim, há cada vez menos pessoas
(activas) a suportar os custos com as reformas da população inactiva. Esta situação, que nalguns países
representa o quase colapso financeiro do sistema de segurança social, levou o poder político a tomar
medidas drásticas, como por exemplo, a redução do montante das reformas e o aumento do limite de
idade para passagem à reforma. É fácil perceber que as gerações actuais, que estão a suportar os custos
com este sistema não vão, no futuro, usufruir dos mesmos benefícios de reforma que usufruíram as
gerações passadas.

A programação plurianual, nas só das despesas mas também dos benefícios, é, por isso, de enorme
importância para garantir a médio e longo prazo uma distribuição equitativa de custos e benefícios
entre as gerações.

Neste aspecto, a informação plurianual que, de acordo com a LOGF, deve constar do orçamento de
Timor-Leste (pelo menos os dois anos seguintes ao período orçamental) é claramente insuficiente para
assegurar o princípio da equidade intergeracional.

Quando hoje o Estado assume compromissos e toma decisões que têm repercussões financeiras a
longo prazo, deve ter o cuidado de previamente realizar estudos técnicos rigorosos e projecções
orçamentais adequadas, de modo a garantir uma repartição justa dos encargos e benefícios pelas
gerações actuais e futuras.

3.3. O Processo Orçamental em Timor-Leste. Fases do processo orçamental.

3.3.1. A Preparação do Orçamento. Os métodos de avaliação das despesas e das receitas.

Compete ao Governo preparar o Plano e o Orçamento Geral do Estado (artigo 115º, no. 1, alínea d),
e artigo 145º, no. 1, da CRDTL). O Plano consiste no planeamento anual das actividades que o
Governo se propõe realizar; o orçamento é a expressão financeira desse plano (plano financeiro).

A iniciativa legislativa em termos da proposta de lei do orçamento é, portanto, da competência do


Governo (artigo 115º, alínea d).

A elaboração do Orçamento do Estado obedece aos princípios e regras consagrados na Constituição


e na LOGF e tem a estrutura e o conteúdo previstos nos artigos 22º e 23º da LOGF. A lei do
orçamento é composta por um articulado (conjunto de normas jurídicas) e, no mínimo, por três tabelas

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orçamentais: receitas, dotações orçamentais (despesas) e orçamentos dos organismos autónomos


(artigos 24º, 25º e 28º LOGF).

O processo de elaboração do orçamento inicia-se com uma Circular do Ministério das Finanças
dirigida a todos os órgãos e serviços do Estado, contendo instruções e tabelas auxiliares de preparação
do orçamento, os plafonds orçamentais atribuídos a cada Ministério, bem como o prazo para submissão
das propostas de orçamento.

O Ministério das Finanças recebe as propostas de orçamento de todos os órgãos e serviços, insere e
trabalha os dados e prepara recomendações, incluindo propostas de ajustamento ou de cortes. As
propostas dos vários órgãos e serviços são discutidas no Comité de Revisão Orçamental, normalmente
presidido pelo Primeiro-Ministro.

O Ministério das Finanças elabora a proposta global do Orçamento do Estado e remete-a a Conselho
de Ministros para aprovação, juntamente com a proposta de lei. Depois de aprovada em Conselho de
Ministros, a proposta de lei de orçamento é enviada, até ao dia 15 de Outubro, ao Parlamento Nacional
para aprovação (artigo 30º LOGF).

A preparação do orçamento implica estimar ou calcular receitas e despesas. Quais são os principais
métodos de avaliação de receitas e de despesas?

Quanto às despesas, temos o método da avaliação directa. Cada órgão e serviço do Estado elabora
a proposta de orçamento das despesas, com base nos custos das actividades que pretende realizar no
ano financeiro e dentro dos limites que hajam sido comunicados superiormente. Este método baseia-
se na experiência prática da Administração, calculando as suas despesas com base na experiência dos
anos anteriores e tendo em conta as opções para o ano financeiro.

Acontece que, muitos serviços, em vez de fazerem uma avaliação directa daquilo que julgam realmente
ser necessário gastar no próximo ano, baseiam-se no orçamento do ano anterior (em curso), fazendo
uma revisão das verbas, aumentando-as. Trata-se de um sistema que tende a gerar despesas supérfluas
e, por isso, a aumentar desnecessariamente o orçamento.

Quanto à previsão das receitas, estas são, em regra, calculadas pelo Ministério das Finanças, através
de um dos seguintes métodos: avaliação directa; método do penúltimo exercício; método do
penúltimo exercício corrigido; método do rendimento médio.

Se as receitas são novas ou vão ser cobradas em circunstâncias diferentes daquelas que foram nos anos
anteriores, não é possível calcular o seu montante com base no histórico (passado). Nestes, casos há
que avaliar as receitas segundo o método de avaliação directa. Este método aplica-se, portanto, às

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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receitas novas e àquelas que, em virtude de alterações do seu regime, devam produzir rendimento
diferente do rendimento dos anos anteriores.

Contudo, na generalidade dos casos, os dados históricos sobre a cobrança das várias receitas fornecem
elementos suficientes para se fazer uma avaliação automática das mesmas.

Assim, relativamente às receitas pouco variáveis (estáveis), a sua previsão é feita com base nos dados
de execução do penúltimo exercício (último ano de que existem dados completos de execução
orçamental), isto é, orçamenta-se o mesmo montante que se verificou no penúltimo ano.

O método do penúltimo exercício pressupõe que as receitas se mantêm inalteradas. Ora, pode haver
factores dos quais as receitas dependem que se alteraram (por exemplo, o rendimento). Neste caso, há
que introduzir um coeficiente de aumento ou diminuição das receitas – método do penúltimo
exercício corrigido. Este método utiliza-se para as receitas pouco variáveis, mas com tendência para
aumentar ou decrescer.

Acontece, porém, que o aumento do rendimento não é contínuo, isto é, pode subir num ano e
decrescer no outro. Assim, se se calcularem as receitas com base num ano que foi de crescimento,
obtêm-se previsões exageradas para o ano seguinte que se prevê de depressão; assim como se
avaliarem receitas num ano de depressão obtêm-se previsões deficientes se o próximo ano for de
prosperidade. Nestes casos, é preferível utilizar o método do rendimento médio que considerada a
média das cobranças de receitas nos últimos 3 ou 5 anos. O método do rendimento médio utiliza-se
para calcular as receitas variáveis ou para as receitas com tendência para uma variação irregular mas
com certa estabilidade durante períodos longos.

3.3.2. A Aprovação do Orçamento. Os efeitos da não aprovação do orçamento.

Compete ao Parlamento Nacional aprovar a lei do Orçamento do Estado (artigo 95º, no. 3, alínea d) e
artigo 145º, no. 1, da CRDTL).

A tramitação relativa à discussão e aprovação do Orçamento do Estado no Parlamento Nacional está


prevista nos artigos 162º a 170º do Regimento do Parlamento Nacional (publicado no Jornal da
República, Série I, no. 40, de 11 de Novembro de 2009).

Recebida a proposta de lei do orçamento, a mesma é distribuída a todas as bancadas parlamentares e


a todas as comissões parlamentares especializadas, para elaboração de parecer que deve ser enviado à
Comissão de Economia e Finanças no prazo de 15 dias. Recebidos os pareceres das comissões
especializadas, a Comissão de Economia e Finanças elabora e remete ao Plenário, no prazo de 20 dias,
o relatório e parecer fundamentado sobre a proposta de lei do orçamento, o qual deve considerar a

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situação económica e financeira do país, os impactos do orçamento na economia e recomendações ao


Governo.

O plenário procede à discussão e votação na generalidade, com a duração máxima de 3 dias, seguindo-
se a discussão e votação na especialidade, com a duração máxima de 10 dias e, no final, a votação final
global.

Após a aprovação, a Comissão de Economia e Finanças procede à redacção final da lei e envia ao
Presidente da República para promulgação e publicação.

O Presidente da República pode (artigo 85º CRDTL):


a) Promulgar a lei;
b) Exercer o direito de veto (no prazo de 30 dias);
c) Requerer a fiscalização da constitucionalidade.

Se o Presidente da República exercer o direito de veto (não promulgar a lei), o Parlamento Nacional
pode confirmar o voto por maioria absoluta de 2/3 dos deputados presentes (desde que superior à
maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções) (artigo 88º no. 3 CRDTL).

E se o orçamento não for aprovado? Quais são os efeitos da não aprovação ou da aprovação tardia
do orçamento? São, fundamentalmente, efeitos políticos e efeitos financeiros.

Se a lei do orçamento não for aprovada (ou porque não foi aprovada pelo Parlamento ou porque foi
vetada pelo Presidente), isso implica, em regra, demissão do Governo (porque sem orçamento não
tem condições para governar) e dissolução do Parlamento Nacional (artigo 86º alíneas f) e g) da
CRDTL).

No caso do Orçamento do Estado não entrar em vigor no início do ano financeiro (ou porque não
foi aprovado ou porque foi aprovado tardiamente), vigora o regime duodecimal. Isto é, de forma a
assegurar a continuidade da actividade do Governo e da Administração Pública, os vários órgãos e
serviços podem efectuar despesa até 1/12 das dotações orçamentais previstas na lei do orçamento do
ano anterior (artigo 31º. LOGF).

Este regime vigora até que a nova lei do orçamento entre em vigor e restringe-se, em regra, às despesas
de funcionamento dos órgãos ou serviços. Isto é, só podem ser praticados actos de gestão corrente,
ficando vedados os actos de gestão extraordinária que impliquem a assumpção de novas despesas
(ainda não aprovadas) como, por exemplo, a celebração de novos contratos.

3.3.3. A Execução do Orçamento. O regime das alterações orçamentais.

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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Após a entrada em vigor de lei do orçamento, inicia-se então a execução do orçamento, ou seja, a
cobrança das receitas e o pagamento das despesas. A execução do orçamento do Estado é da
competência do Governo (artigo 115º, no. 1, alínea d) da CRDTL).

A execução orçamental só pode iniciar-se após o Aviso de Autorização de Despesa emitido pelo
Ministério das Finanças para todos os órgãos e serviços do Estado (artigo 36º LOGF).

No plano jurídico, a execução do orçamento traduz-se no respeito pela legalidade, isto é, todos os
actos (financeiros) praticados pelo Governo e pela Administração têm de respeitar a lei do orçamento,
os orçamentos dos órgãos e serviços e as restantes leis que regulam o funcionamento da
Administração, nomeadamente as normas que regem a realização das despesas e a aquisição de bens
e serviços (regime do aprovisionamento).

Da legalidade decorre a tipicidade orçamental, ou seja, não existem receitas nem despesas que não
estejam previstas no orçamento. Mas a tipicidade tem uma natureza diferente, consoante se trate do
orçamento das receitas ou do orçamento das despesas. Nas receitas é uma tipicidade qualitativa,
ou seja, as receitas estão limitadas às espécies (tipos) previstas no orçamento, mas não ao montante
estimado. O montante de receitas previsto no orçamento não é vinculativo (a cobrança pode ser
superior ou inferior ao montante orçado). Nas despesas há uma tipicidade quantitativa, isto é, as
despesas não podem exceder o montante máximo previsto no orçamento (montante global, montante
por cada serviço, por cada agrupamento de despesa, etc.), para além de terem de respeitar também as
espécies de despesa previstas.

A execução implica ainda o cabimento orçamental (que em Timor-Leste se designa de


compromisso). O cabimento orçamental traduz-se na verificação de que os encargos e respectivos
pagamentos cabem nas dotações orçamentais, isto é, nenhum encargo pode ser assumido ou nenhum
pagamento pode ser realizado sem que haja verba suficiente prevista em rubrica orçamental própria.

A execução orçamental obedece ainda ao princípio de economicidade, ou seja, os recursos devem


ser utilizados o mais racionalmente possível (racionalidade económica), procurando-se, em cada gasto
público, a melhor relação custo-benefício.

A execução orçamental de cada órgão e serviço está limitada, como se disse, ao montante das
respectivas dotações orçamentais. No entanto, a lei introduziu alguma flexibilidade na gestão
orçamental dos órgãos e serviços, ao possibilitar a realização de transferências ou alterações
orçamentais da competência do Governo (artigo 38º LOGF).

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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Assim, no âmbito do orçamento de cada órgão ou serviço integrado (de cada Ministério), é possível
efectuar alterações orçamentais até ao limite de 20% da dotação orçamental a partir da qual o montante
é transferido, mediante autorização do Ministro das Finanças.

A este respeito é de referir que a redacção do artigo 38º da LOGF não é clara, podendo originar
diferentes interpretações: a dotação orçamental a considerar para efeitos do cálculo dos 20% é a
dotação da categoria de despesa (por exemplo Bens e Serviços) ou é a dotação da rubrica (por exemplo
material de escritório) a partir da qual o montante é transferido? A interpretação do Ministério das
Finanças tem sido a primeira, ou seja, o limite dos 20% é aferido pela dotação orçamental da categoria
de despesa.

De acordo com a LOGF, o Governo é competente para:

a) No âmbito do orçamento de cada Ministério ou Secretaria de Estado, efectuar alterações


orçamentais até ao limite de 20% da dotação orçamental a partir da qual o montante é
transferido;

b) Efectuar alterações orçamentais entre diferentes capítulos, ou seja, entre Direcções do mesmo
Ministério.

São proibidas as transferências/alterações orçamentais:

a) Da categoria de salários e vencimentos para qualquer outra categoria orçamental;

b) Da categoria de capital de desenvolvimento para qualquer outra categoria orçamental;

c) Entre Ministérios (de um Ministério para outro).

No caso das alterações orçamentais implicarem um aumento global da despesa para o ano financeiro
em curso ou, ainda que não se traduzam num aumento da despesa, mas impliquem alterações entre
categorias ou capítulos para as quais o Governo não tem competência, é necessário apresentar uma
nova proposta de lei (lei de alteração orçamental ou orçamento rectificativo) cuja competência para
aprovação é do Parlamento Nacional (artigos 34º e 35º LOGF).

3.3.4. O Controlo do Orçamento. A fiscalização política e a fiscalização jurisdicional

O controlo orçamental tem dois fundamentos principais. Por um lado, assegurar que a actividade
financeira do Governo é realizada dentro dos limites aprovados pela lei do orçamento (controlo jurídico-

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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político) e, por outro, evitar os desperdícios e a má utilização dos dinheiros públicos (controlo económico-
financeiro).

Podemos distinguir diferentes tipos de controlo ou fiscalização. Se o controlo tem como finalidade
verificar os actos praticados pelas entidades públicas para prevenir ou corrigir erros ou irregularidades
de execução orçamental e ajustá-la aos objectivos, fala-se de fiscalização; se tem como objectivo
detectar erros, irregularidades ou ilegalidades tendo em vista o apuramento de responsabilidades de
quem os pratica, fala-se de responsabilização.

A fiscalização pode incidir sobre o Orçamento ou sobre a Conta, isto é, realizar-se durante a execução
do orçamento (prévia ou concomitante) ou depois do orçamento executado e apresentadas as Contas
do Estado (posterior ou sucessiva).

Do lado das receitas importa sobretudo apurar se a Administração financeira cumpriu a sua obrigação
de cobrar as espécies de receitas previstas na lei do orçamento (tipicidade qualitativa). Do lado das
despesas importa saber se os vários órgãos e serviços cumpriram a sua obrigação quanto às espécies
de despesas previstas no orçamento e se não ultrapassaram os respectivos montantes (tipicidade
quantitativa). Por isso, é particularmente importante a fiscalização orçamental do lado das despesas: é
preciso impedir que se assumam encargos ou se façam pagamentos que não caibam nas respectivas
dotações orçamentais.

Do ponto de vista da entidade encarregue da fiscalização, pode distinguir-se entre fiscalização


administrativa (de competência de um organismo integrado na Administração Pública, normalmente
no Ministério das Finanças), fiscalização jurisdicional (Tribunal de Contas) e fiscalização política
(Parlamento). Nesta perspectiva distingue-se o controlo interno (realizado por entidade integrada na
Administração) do controlo externo (efectuado por entidades externas e independentes face ao
Governo).

A fiscalização consiste, pois, em verificar:

a) Se cada uma das receitas e cada uma das despesas está prevista no orçamento em termos de
espécies (tipicidade qualitativa);

b) Se cada uma das despesas cabe na respectiva dotação orçamental (cabimento) (tipicidade
quantitativa);

c) Se a cobrança das receitas e a realização das despesas obedece aos restantes requisitos legais
(legalidade) (exemplos: se a entidade que aprovou era a entidade competente; se seguiu o
procedimento de aquisição correcto; etc.);

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Sebenta de FINANÇAS PÚBLICAS (autora: Cristina Pinto)
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d) E se a despesa foi realizada com economia, eficiência e eficácia (economicidade), procurando-


se a melhor relação custo-benefício.

Para efeitos de controlo, é obrigatória a existência de um sistema de contabilidade orçamental que,


com base na classificação de receitas e de despesas adoptada, permita registar e controlar os gastos do
Estado (artigo 43º LOGF).

Além disso, o Governo está obrigado a elaborar relatórios trimestrais de execução do orçamento, bem
como o relatório final do orçamento ou Conta Geral do Estado (artigos 44º e 45º LOGF). Os
relatórios de execução orçamental e a Conta do Estado são enviados ao Parlamento nacional e à
Câmara de Contas para efeitos de controlo e fiscalização.

Em Timor-Leste o controlo administrativo (interno) é assegurado, em primeiro plano, por cada


órgão ou serviço competente e, num segundo plano, pelo Ministério das Finanças. Cada órgão e
serviço tem a responsabilidade de verificar a disponibilidade das verbas antes de realizar uma despesa
ou assumir qualquer encargo; todas as despesas e pagamentos têm de ser autorizados pela entidade
competente no âmbito da cada Ministério ou Secretaria de Estado.

O Ministério das Finanças (MF) tem também um papel fundamental no controlo das despesas dos
órgãos e serviços que não possuindo autonomia financeira processam as suas despesas e pagamentos
através do MF. Ou seja, para além da autorização da entidade competente do respectivo Ministério, o
Ministério das Finanças verifica as despesas que lhe chegam para serem processadas e autoriza-as (ou
não).

Nos termos da Constituição da RDTL, o controlo externo das Contas do Estado compete ao
Parlamento Nacional e ao Tribunal Superior Administrativo Fiscal e de Contas (artigo 95º no. 3 alínea
e)artigo 129º no. 3 e 145º no. 3).

O controlo exercido pelo Parlamento Nacional é um controlo político. O Parlamento exerce o


controlo periódico da execução do orçamento através da análise e discussão dos relatórios trimestrais
e da Conta Geral do Estado, podendo chamar os membros do Governo para prestarem
esclarecimentos e explicações. As consequências que daí poderão advir são consequências políticas:
por exemplo, a demissão do Governo ou a apresentação e votação de uma moção de censura ao
Governo.

No que respeita ao controlo exercido pela Câmara de Contas (Lei 9/2011, de 17 de Agosto10), trata-
se de um controlo jurisdicional, que se traduz materialmente numa fiscalização jurídica e numa

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A Câmara de Contas funciona transitoriamente junto do Tribunal de Recurso, enquanto não for criado o Tribunal
Superior Administrativo, Fiscal e de Contas.

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fiscalização económico-financeira, isto é, no controlo da legalidade e no controlo da racionalidade e


da economicidade dos gastos públicos.

A Câmara de Contas tem jurisdição em território nacional e no estrangeiro em relação a serviços,


organismos ou representações da RDTL no estrangeiro, tendo como principais competências em
matéria de controlo das finanças públicas:

a) Fiscalizar a regularidade e a legalidade das contas públicas (das receitas e das despesas);

b) Apreciar a boa ou má gestão financeira;

c) Apurar responsabilidades pela prática de infracções financeiras.

Estão sujeitas à jurisdição e ao controlo financeiro da Câmara de Contas:

a) O Estado e todos seus órgãos e serviços, tenham ou não autonomia financeira (incluindo
institutos públicos, serviços e fundos autónomos, fundos especiais, etc.);

b) Os municípios e as suas associações;

c) As empresas públicas;

d) As Sociedades e as Associações públicas ou mistas desde que financiadas maioritariamente por


entidades públicas ou sujeitas ao seu controlo de gestão;

e) As empresas concessionárias de gestão de empresas públicas, de sociedades de capitais públicos


ou sociedades mistas controladas por entidades públicas, bem como as empresas
concessionárias de serviços públicos e de obras públicas;

f) Fundações de direito privado e entidades de qualquer natureza que recebam dinheiros públicos,
relativamente à utilização desses dinheiros.

A lei prevê três modalidades de controlo financeiro: fiscalização prévia, fiscalização concomitante e
fiscalização sucessiva.

A fiscalização prévia («a priori» ou «ex-ante») tem como finalidade verificar se os actos, contratos e
outros instrumentos geradores de despesa ou de responsabilidades financeiras, estão conformes às leis
em vigor e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria (cabimento
orçamental).

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A fiscalização prévia exerce-se através do visto prévio, também designado de declaração de conformidade.
Trata-se de um requisito prévio, uma vez que os contratos e outros actos geradores de despesa só
produzem efeitos (jurídicos e financeiros) após o visto.

Estão sujeitos a visto prévio:

a) Os actos de que resulte aumento da dívida pública ou que modifiquem as condições gerais dos
empréstimos;
b) Os contratos (ou minutas de contratos) de valor superior a USD 500.000,00 (quinhentos mil
dólares);
c) Os contratos adicionais aos contratos visados.

A fiscalização concomitante traduz-se no controlo dos procedimentos que estejam ainda em curso,
ou seja, trata-se de acções de fiscalização e controlo realizadas no decurso da execução orçamental
(antes de encerradas as contas).

A fiscalização concomitante efectiva-se através de realização de auditorias:

a) Aos procedimentos e actos administrativos que impliquem despesas de pessoal, aos contratos
não sujeitos a visto prévio, bem como à execução de contratos visados;
b) À actividade financeira em geral exercida antes do encerramento da respectiva gerência (da
Conta).

A fiscalização sucessiva («a posteriori» ou «ex-post») traduz-se no controlo das contas públicas de
exercícios anteriores (já encerrados). E efectiva-se através da:

a) Realização de auditorias de qualquer tipo ou natureza, incluindo auditorias de desempenho;


b) Verificação das contas dos organismos obrigados à sua apresentação.

Estão obrigados a prestar contas todos os órgãos e serviços do Estado, incluindo os órgãos de
soberania, os serviços com autonomia financeira e os serviços e fundos autónomos.

Das várias acções de fiscalização sucessiva, destaca-se o relatório e parecer sobre a Conta Geral do
Estado que aprecia a Conta nos seus vários domínios (das receitas, das despesas, da tesouraria, do
recurso ao crédito público e ao património) e emite um juízo sobre a legalidade e a correcção financeira
das operações realizadas, podendo ainda pronunciar-se sobre a eficiência e a eficácia da gestão
financeira, a fiabilidade dos sistema de controlo interno ou formular recomendações ao Parlamento
Nacional ou ao Governo com vista à correcção de deficiências detectadas.

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Assim, no que respeita à dívida pública, a Câmara de Contas deve verificar se foram observados os
limites de endividamento e as demais condições estabelecidas na lei e verificar as operações financeiras
relativas à gestão da dívida pública (amortizações de capital e pagamento de juros). No que respeita ao
Fundo Petrolífero, a Câmara de Contas deve verificar se foi observado o limite do Rendimento
Sustentável Estimado previsto na lei e as demais condições de utilização das receitas petrolíferas.

O relatório e parecer sobre a Conta do Estado deve ser apresentado ao Parlamento até ao final do ano
seguinte àquele a que respeita a Conta. Trata-se, portanto, de uma fiscalização após a execução do
orçamento e depois de encerradas as contas.

A Câmara de Contas tem ainda competência para apurar responsabilidades pela prática de
infracções financeiras e aplicar as respectivas sanções. A lei prevê dois tipos de responsabilidades
financeiras:

a) Responsabilidade financeira reintegratória, a mais gravosa, aplicável nos casos de


desaparecimento ou desvio de dinheiros ou outros valores públicos, pagamentos indevidos ou
ilegais, e ainda no caso de não arrecadação dolosa ou culposa de receitas;

b) Responsabilidade financeira sancionatória, aplicável em situações de violação de normas


jurídicas sobre a elaboração, execução, gestão e controlo orçamental, incluindo a falta
injustificada de envio de documentos ou informações à Câmara de Contas ou o não
acatamento reiterado e injustificado das Recomendações por ela exaradas.

A responsabilidade financeira reintegratória dá lugar à condenação do(s) agente(s) responsável na


reposição das quantias correspondentes (aos montantes desaparecidos, desviados ou pagos
indevidamente ou ilegalmente, ou às receitas não liquidadas, não cobradas ou não entregues por prática
com dolo ou culpa grave), acrescida de juros de mora.

A responsabilidade financeira sancionatória dá lugar à condenação do(s) agente(s) responsável no


pagamento de multa, de acordo com os limites mínimo e máximo estabelecido na lei, e tendo em
conta a gravidade do facto, o grau de culpa do agente, o montante dos valores públicos lesados ou em
risco, o nível hierárquico dos responsáveis e a sua situação económica, a existência de antecedentes, o
grau de acatamento de eventuais Recomendações da Câmara.

A Câmara de Contas não tem competência em matéria criminal: caso haja evidência de factos
constitutivos de responsabilidade financeira que possam indiciar a prática de crime, a Câmara de
Contas remete o processo ao Ministério Público para instrução do respectivo processo-crime.

Todas as acções de fiscalização e casos sujeitos à apreciação da Câmara de Contas, obedecem ao


princípio do contraditório (arto. 11º.), isto é, os serviços ou organismos auditados ou fiscalizados

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pela Câmara de Contas e os respectivos responsáveis são ouvidos antes da Câmara de Contas formular
o seu juízo público de apreciação ou decisão de condenação.

4. AS DESPESAS PÚBLICAS

4.1. Noção de despesas públicas

As despesas públicas concretizam a finalidade da actividade financeira do Estado, ou seja, a satisfação


de necessidades. Despesa pública é, pois, todo o gasto de dinheiro ou de bens por parte de entes
públicos na criação ou na aquisição de utilidades susceptíveis de satisfazerem necessidades
públicas.

A noção de despesas públicas contém três elementos essenciais:

a) O tipo de operação – afectação de recursos públicos a uma determinada finalidade (os


recursos podem ser bens ou dinheiro, sendo a forma mais comum o gasto de dinheiro);

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b) O sujeito da operação – o sujeito da operação é uma entidade pública (Estado ou outro ente
público dotado de poderes de autoridade);

c) A finalidade da operação – a despesa pública destina-se a satisfazer necessidades públicas


(de carácter colectivo ou individual).

A noção de despesas públicas abrange assim realidades distintas, como por exemplo, o pagamento de
salários a funcionários públicos, o custo de construção de um edifício público ou de uma estrada, a
amortização de um empréstimo contraído pelo Estado ou o pagamento de um subsídio a um particular
ou a uma empresa.

4.2. Classificações e principais tipologias de despesas públicas

As despesas públicas podem ser classificadas do ponto de vista orgânico, funcional e económico.

A classificação orgânica é aquela que agrupa as despesas públicas pelos vários órgãos e serviços do
Estado: Ministérios, Secretarias de Estado, Direcções, Organismos autónomos, etc.

A classificação funcional é aquela que distingue as despesas de acordo com a sua finalidade ou
função: funções de soberania, defesa e segurança, funções sociais, etc.

A classificação económica distingue os vários tipos de despesa em função da sua natureza


económica e dos seus efeitos na economia.

No capítulo dedicado aos critérios substanciais de equilíbrio orçamental, vimos já que as despesas
públicas se podem classificar em: despesas efectivas e não efectivas (segundo os efeitos da despesa no
património monetário do Estado); despesas ordinárias e extraordinárias (com base na repetição qualitativa
da despesa) e despesas correntes e de capital (consoante os efeitos da despesa se repercutem no património
duradouro ou não duradouro do Estado).

Neste capítulo interessa-nos, sobretudo, distinguir as despesas públicas de acordo com os seus efeitos
económicos. E, nesta perspectiva, existem fundamentalmente, as seguintes tipologias:

a) Despesas de investimento e despesas de funcionamento. Esta distinção baseia-se no


critério de formação de capital técnico do Estado. São despesas de investimento aquelas que
contribuem para a formação de capital técnico do Estado, enquanto que as despesas de
funcionamento são os gastos necessários ao normal funcionamento da máquina
administrativa. Assim, por exemplo, o investimento em capital humano (educação e formação)
é considerado uma despesa de investimento.

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b) Despesas em bens e serviços (despesas-compra) e despesas de transferência (despesas-


transferência). Esta distinção baseia-se no critério da criação de rendimento e de utilidade. As
despesas que se traduzem na compra de bens e serviços criam rendimentos, isto é, contribuem
para o rendimento nacional no período em que são realizadas, visto que se traduzem no
pagamento do preço aos respectivos fornecedores. Quando o Estado compra, isto é, paga um
determinado preço pela aquisição de um bem ou serviço, a esse preço corresponde uma
contrapartida directa de uma utilidade (criação de utilidades através do bem ou serviço).
Exemplos: pagamento de salários aos funcionários, aquisição de equipamentos, despesas com
obras públicas, etc.
No caso das transferências não há verdadeiramente criação de rendimento, mas sim uma
transferência ou redistribuição dos rendimentos: os recursos são transferidos do Estado para
outras entidades (públicas ou privadas) ou para os particulares, sem que haja uma contrapartida
directa de utilidade. Exemplos: subsídio de desemprego, bolsa de estudos.

Dentro das despesas com bens e serviços (despesas-compra) podemos distinguir as despesas de
consumo, correspondentes às despesas correntes, isto é, gastos com o funcionamento dos
serviços da Administração e as despesas de investimento público, ou seja, despesas em bens
de capital. As despesas-consumo tendem a ser regulares ou pouco variáveis, mas são de difícil
compressão num período curto de tempo, enquanto que as despesas de investimento são
susceptíveis de variações significativas, consoante as opções de política económica.

As despesas de transferência podem ser classificadas em transferências de capital e


transferências de rendimento, consoante alterem ou não o património duradouro do
Estado. Por exemplo, um subsídio do Estado ao investimento numa empresa pública é uma
transferência de capital; enquanto que uma bolsa de estudo é uma transferência de rendimento
(neste caso, transfere-se o rendimento do Estado para um particular).

As transferências podem ainda classificar-se em directas e indirectas, de acordo com o


critério de criação directa ou não de rendimento. No primeiro caso, as transferências implicam
um aumento directo do rendimento disponível (exemplo: subsídio de desemprego); no
segundo caso, há apenas um benefício indirecto traduzido num aumento de possibilidades de
consumo (exemplo: subsídios a preços).

As transferências podem ainda distinguir-se consoante os beneficiários a que se destinam:


entre transferências internas e transferências para o exterior. No caso das transferências
internas, temos: transferências para o sector público; transferências para o sector privado -
para unidades produtivas (empresas); transferências para o sector privado - para entidades não
lucrativas; transferências para particulares.

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c) Do ponto de vista da produtividade, as despesas distinguem-se em despesas produtivas (ou


simplesmente produtivas) e despesas reprodutivas (ou duplamente produtivas). O Estado ao realizar
despesas produz ou adquire bens ou serviços com vista à satisfação das necessidades
colectivas, isto é, cria utilidades para as populações. Neste sentido, as despesas públicas são
produtivas porque criam utilidades. Exemplo: a segurança resulta da existência da polícia. Mas
há despesas que, além de criarem utilidades imediatas, contribuem também para criar ou
aumentar a capacidade produtora do país, isto é, geram utilidades para o futuro. São por isso
duplamente produtivas ou reprodutivas. Exemplos: despesas em bens de investimento como
investigação e desenvolvimento, educação e formação, redes viárias, etc.

4.3. Efeitos económicos das despesas públicas. O efeito multiplicador, o efeito acelerador e o
efeito propulsor.

Com base nas tipologias de despesa referidas no capítulo anterior, concluiu-se que entre os principais
efeitos económicos das despesas públicas está a criação de riqueza, que se traduz quer na criação e
redistribuição de rendimentos, quer no aumento da capacidade produtiva do país.

Assim, serão diferentes os efeitos na economia do país, consoante o Estado canalizar os recursos
públicos para despesas-compra ou para despesas-transferência ou consoante privilegiar as despesas produtivas
ou as despesas reprodutivas. Assim como não é indiferente destinar os dinheiros públicos à aquisição de
bens de consumo ou ao investimento em bens de capital ou destiná-los a finalidades sociais ou a
finalidades militares.

Os efeitos económicos das despesas públicas são, pois, fundamentalmente:

a) Satisfação das necessidades públicas - criação de utilidades para satisfação das


necessidades das populações;

b) Criação e redistribuição de rendimentos – através dos pagamentos a funcionários,


fornecedores, empreiteiros de obras públicas, subsídios a particulares e empresas, etc.;

c) Aumento da capacidade produtora do país – designadamente através da formação de


capital técnico e do investimento em obras públicas, investigação e desenvolvimento, educação
e formação dos recursos humanos nacionais, etc.

d) Alteração da repartição do rendimento nacional – a despesa pública gera fluxos sucessivos


de novas despesas (de consumo e de investimento), com recurso provenientes dos
contribuintes, e tem, em princípio, efeitos expansionistas.

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Despesa Pública e Rendimento Nacional

Receitas
Públicas Satisfação
necessidades
Riqueza
(rendimento e
património)
Despesas Públicas
(despesa-compra,
consumo/investimento e
Tributação
despesa-transferência)

Aforro/Poupança

Rendimento
Consumo (pagamento salários,
fornecedores,
subsídios, etc.)

Os efeitos das despesas públicas no rendimento nacional podem ser medidos através dos seguintes
instrumentos de análise:

- O multiplicador: mede o aumento do rendimento nacional em função da despesa (despesa


pública de consumo ou de investimento);

- O acelerador: mede o aumento do investimento em função das despesas (iniciais) de consumo;

- O propulsor (ou oscilador): instrumento de análise que consiste na combinação dos dois anteriores.

O efeito multiplicador inicialmente formulado por Keynes foi posteriormente desenvolvido por
outros autores. O multiplicador mede o aumento do rendimento nacional que é imputável à realização
de uma despesa ou investimento.

A ideia-base é a de que a realização de uma despesa em determinado período produz um


aumento do rendimento nacional nesse período e esse aumento de rendimento origina mais
despesa e assim sucessivamente, tendo portanto um efeito multiplicador (do rendimento) nos
períodos seguintes.

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Ou seja, o rendimento nacional aumenta em consequência da realização (aumento) de qualquer


despesa (seja ela pública ou privada, de consumo ou de investimento), pois qualquer aumento de
despesa de um sujeito económico (público ou privado) gera aumento de rendimento de outro ou
outros sujeitos económicos e este aumento de rendimento origina mais despesas, e assim
sucessivamente. Portanto, diz-se que a despesa pública tem um efeito multiplicador porque o
aumento da despesa origina um aumento mais que proporcional do rendimento nacional.

O efeito multiplicador da despesa no rendimento nacional depende de muitos factores entre os quais
a propensão marginal ao consumo (relação entre o aumento do consumo e o aumento do
rendimento). O rendimento disponível (rendimento líquido depois de pagos os impostos) pode ser
canalizado para a poupança (aforro) ou para o consumo. A tendência é: quando o rendimento
aumenta, o consumo tende a aumentar. Logo, o efeito multiplicador da despesa no rendimento
nacional será tanto maior quanto maior for a propensão da população para consumir, uma vez
que o consumo (despesa em bens de consumo ou de investimento) vai gerar novos rendimentos.

Assim, o efeito multiplicador das despesas públicas será tanto maior quanto maior for a
propensão marginal para o consumo da população, e tanto menor quanto menor for a propensão
para o consumo.

Em resumo:

- o aumento da despesa pública num determinado período gera um acréscimo do rendimento


nacional nesse período,

- o qual vai gerar um aumento do consumo no período seguinte, em função da propensão marginal
ao consumo,

- que, por sua vez, vai gerar novo aumento do rendimento e assim sucessivamente.

Exemplo prático:

No período 1, regista-se um aumento da despesa de 100, esse aumento vai gerar um aumento do
rendimento de 100. Considerando que a pmc é de 0.8, o aumento da despesa do Estado (100) no
primeiro período, vai determinar um aumento do consumo no segundo período (de 80). O aumento
do consumo traduz-se num novo aumento do rendimento nacional em 80. Por sua vez, parte do
aumento desse rendimento (80), vai ser consumido em 64 no período seguinte (caso a pmc se mantenha
inalterada) e, assim, sucessivamente, até o efeito se esbater.
Aqui temos um exemplo, de como uma despesa inicial do Estado se vai multiplicar em rendimentos
nos períodos seguintes, em função da propensão ao consumo.

Períodos Despesa Consumo RN


(acumulado)

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1 100 - 100
2 80 180
3 64 244
4 51,2 295,2
… … …
20 1,44 494,23

Os estudos indicam que a longo prazo (décadas) a propensão marginal ao consumo (pmc) tende a ser
constante ou pouco variável, ainda que o rendimento aumente. No curto prazo, a pmc tende a variar:
quando o rendimento aumenta há tendência para que aumente o consumo; mas quando o rendimento
decresce embora haja também tendência para diminuir o consumo, verifica-se que esta tendência não
é tão acentuada (isto explica-se em parte porque as famílias vão tentar manter o nível de vida que
tinham anteriormente).

Por outro lado, o consumo não depende apenas do rendimento disponível, mas também de outros
factores como a riqueza (valores pecuniários e património), o nível de preços e as expectativas sobre
as previsões de rendimentos futuros. Por exemplo, se o nível de preços aumenta, os bens tornam-se
mais caros e, ainda que se mantenha o rendimento disponível, o consumo diminui (com o mesmo
dinheiro, compra-se menos); se o nível de preços descer dá-se o fenómeno contrário. Do mesmo
modo, se existir uma expectativa forte de que os salários vão aumentar, a tendência é para se gastar
mais no presente. Portanto, quando o rendimento aumenta, o consumo aumenta, desde que se
mantenham estáveis os outros factores.

O multiplicador de Keynes tem, pois, algumas limitações:


- é estático (porque não considera as variações da propensão marginal ao consumo e a influência
de outros factores no consumo);
- é global e indiscriminado (porque não tem em conta a estrutura e o tipo de despesas; por
exemplo o efeito multiplicador das despesas-compra é maior do que o das despesas-
transferência);
- a sua utilização é adequada para países desenvolvidos em situação de subemprego ou
desemprego.

Os autores pós-keynesianos desenvolveram o conceito do multiplicador integrando novos elementos


de análise mais dinâmicos e adequados à realidade (multiplicadores sequenciais e periódicos, sectoriais
e regionais).

O efeito acelerador mede o aumento do investimento originado por despesas (iniciais) de consumo,
ou seja, relaciona o aumento do consumo com o aumento de investimento dele resultante.

O mecanismo da aceleração traduz-se no seguinte: o investimento (em bens de produção ou bens


de capital) aumenta em consequência do aumento inicial da procura de bens (finais) de
consumo, mas não em consequência de sucessivos aumentos iguais posteriores. Daí a designação de

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aceleração: o investimento é acelerado pelo aumento inicial da procura, depois disso tende a
desacelerar.

Com base no exemplo abaixo, verifica-se que o investimento acelera (não propriamente em função da
procura de bens de consumo em termos de quantidades) mas em função da taxa de variação do
consumo, aumentando em consequência do incremento inicial da procura e diminuindo em
função da manutenção ou redução do consumo.

Exemplo prático:

Uma fábrica tem 100 máquinas instaladas com as quais consegue produzir no máximo 300 unidades.
Supondo que a duração média (vida útil) das máquinas é de 10 anos, a empresa terá de investir todos
os anos 1/10 do valor do equipamento (investimento de substituição/reposição efectuado através das
amortizações). No período seguinte, regista-se um aumento da procura de 10%: mais 30 unidades que
implicam a aquisição de mais 10 máquinas. O investimento neste período aumenta 100%. No período
seguinte, regista-se um novo aumento da procura em 30 unidades (que representa agora 9% de
aumento), sendo necessário adquirir mais 10 máquinas: o investimento desacelera. No período 4 há
um novo aumento da procura de 4%, ou seja, 14,4 unidades a produzir a mais que levam à aquisição
de mais 5 máquinas. O investimento neste período diminui em relação aos períodos anteriores (o
investimento é já negativo). Verifica-se, portanto, que apesar do consumo ter continuado a aumentar
em termos de quantidades procuradas, o investimento foi regredindo em função da diminuição da
taxa de variação do consumo.

Períodos Equipamentos Procura Investimento (nr.


equipamentos)
(nr. máquinas) (unidades)

1 100 300 10

2 110 330 (+10%) 10+10=20 (100%)

3 120 360 (+9%) 10+10=20 (0%)

4 125 374,4 (+4%) 10+5=15 (-25%)

O efeito acelerador tem as seguintes limitações:

- Só funciona quando as técnicas de produção e a produtividade dos equipamentos se mantêm


inalteradas;

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- Só funciona quando há plena utilização dos equipamentos (o efeito de aceleração não funciona
se os equipamentos poderem produzir mais, neste caso, não se compra mais equipamento para
responder ao consumo adicional, mas sim melhora-se a utilização dos mesmos);

- O aumento do investimento não depende apenas do aumento do consumo, mas também de


outros factores como a taxa de juro e as expectativas que os investidores têm quanto ao carácter
mais ou menos duradouro do aumento da procura. Se o aumento for considerado provisório
ou pontual haverá tendência para intensificar a utilização de equipamento existente em vez de
realizar novos investimentos. Se o investidor tiver que recorrer a um empréstimo para investir,
só o fará se a taxa de juro for inferior ao retorno esperado do investimento.

Vimos, portanto, que o efeito multiplicador indica que o aumento da despesa (de consumo ou de
investimento) origina um aumento do rendimento nacional, que por sua vez origina um aumento de
consumo e assim sucessivamente; e que o acelerador indica que um aumento inicial de consumo
origina um aumento do investimento.

Na realidade, os dois efeitos não são estanques, isto é, o aumento da despesa provoca um aumento do
rendimento, do consumo e do investimento. Por isso, o efeito propulsor (ou oscilador) conjuga os
dois mecanismos. Ou seja, um aumento inicial da despesa ou do investimento provoca
aumentos de consumo e estes aumentos de consumo provocam investimentos (investimentos
induzidos) e assim sucessivamente.

Estes efeitos tanto resultam das despesas realizadas pelos particulares, como das despesas realizadas
pelo Estado, isto é, tanto resulta do investimento e consumo privados, como das despesas-compra
realizadas pelo Estado (despesas de consumo e despesas de investimento): todas as despesas do Estado
se podem multiplicar em consumo.

É preciso notar que o efeito propulsor das despesas públicas não significa um aumento do rendimento
nacional, do consumo e do investimento equivalente ao aumento da despesa. O efeito propulsão das
despesas públicas depende dos meios de financiamento do Estado:

- As despesas públicas financiadas com impostos substituem as despesas privadas de consumo


ou de investimento. Isto é, se os impostos (que são obrigatórios) são pagos pelos rendimentos
correntes dos particulares, a parte que vai para os impostos implica uma diminuição no
consumo e no aforro privado. Se a poupança diminui há menos dinheiro disponível nos bancos
o que provoca uma subida na taxa de juro e, em consequência, uma diminuição do
investimento privado. Neste caso, o efeito propulsão é diminuto.

- Se as despesas públicas são financiadas por empréstimos contraídos junto do público


(emissão de dívida pública, títulos do tesouro, etc.), aumenta a procura destes fundos públicos,
o que faz também subir as taxas de juro e diminuir o investimento. Mas sendo estes

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empréstimos voluntários, não provocam uma diminuição tão grande no consumo e no


investimento privado (como no primeiro caso, dos impostos que são obrigatórios), pelo que o
efeito propulsão é reduzido (mas não diminuto).

- Se as despesas públicas são financiadas por empréstimos contraídos junto dos bancos, o
efeito é diferente consoante o recurso ao crédito pelo Estado prejudique ou não a concessão
de empréstimos a particulares. Se não prejudicar, as despesas públicas vão implicar um
aumento equivalente das despesas totais (de consumo e de investimento) – efeito propulsão
elevado; caso contrário, as despesas não vão ter um efeito equivalente no consumo e no
investimento.

4.4. Evolução das despesas públicas

A despesa pública é, do ponto de vista macro-económico, uma parcela da despesa nacional (ou do
rendimento nacional). A despesa nacional abrange a despesa efectuada pelos indivíduos, famílias e
outros sujeitos privados não produtivos, pelos Estado e entidades públicas e pelas empresas e outras
entidades produtivas.

A despesa nacional ou produto nacional bruto (PNB) é dado pela seguinte fórmula:

PNB = C + I + DP + (E-I)

Em que:
C - Consumo privado (total das despesas não produtivas realizadas pelos indivíduos, famílias e outros sujeitos
privados)
I - Investimento privado (despesas privadas de investimento e de funcionamento das empresas);
DP - Despesa pública (despesas realizadas pelo Estado e sector público, de consumo, de investimento ou de
transferência)
E - Exportações (operações do país para o exterior)
I - Importações (operações do exterior para o país)

Nas sociedades modernas, as despesas públicas apresentam uma tendência para aumentar e,
portanto, para ter um peso maior no PNB. Não existe uma explicação única para este fenómeno.
Entre os factores que contribuem para o aumento das despesas públicas, contam-se:

- As correntes doutrinárias, políticas ou ideológicas - os conservadores ou liberais tendem


a gastar menos, enquanto que os progressistas ou socialistas tendem a gastar mais;

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- O desenvolvimento e expansão da actividade pública - quer seja na produção de novos


bens e serviços, quer no aperfeiçoamento de bens ou serviços que o Estado já fornece;

- A inflação, ou seja, o aumento do nível geral de preços – na verdade para se falar em aumento
real da despesa pública, tem de se corrigir o efeito da inflação;

- O aumento da população - as despesas públicas tendem a ter uma relação directa com o
número de habitantes; ora se o número de habitantes aumenta é necessário produzir mais bens,
nomeadamente semipúblicos: escolas, hospitais, etc., sem que isso signifique uma expansão da
actividade do Estado (a novos sectores), isto é, as despesas aumentam para fazer face a um
aumento do número de habitantes. Contudo, se analisarmos a capitação das despesas públicas
por habitante, a verdade é que muitas vezes as despesas aumentam mais do proporcionalmente
ao número de habitantes, ou seja, cada habitante passa a custar mais do que custava no passado,
o que pode denunciar uma certa ineficiência do Estado. Haverá portanto um aumento real das
despesas públicas se houver um aumento da capitação (despesa pública por habitante);

- O aumento do rendimento nacional - assiste-se também ao aumento da despesa pública


relacionado com o aumento do rendimento ou da despesa nacional (PNB). Não se pode falar
em aumento real se o aumento das despesas públicas apenas acompanhou o crescimento do
PNB (isto é, cresceu na mesma proporção). Mas também aqui as despesas públicas apresentam
uma tendência para aumentar mais do que proporcionalmente ao crescimento do rendimento
nacional e, passam, portanto a representar uma maior % no PNB (neste caso, há aumento real).

A que se deve este aumento das despesas públicas em maior proporção do que o aumento das despesas
privadas?

A lei de Wagner (lei do aumento das despesas públicas)11, é uma teoria que procura explicar porque razão
existe uma tendência para o aumento crescente das despesas públicas, especialmente a longo prazo.

Wagner aponta dois factores:

a) A expansão intensiva das actividades do Estado. Verifica-se uma expansão intensiva quando
o Estado melhora e desenvolve actividades que já vinha exercendo (ensino, investigação
científica, defesa, etc.);

b) A expansão extensiva das actividades do Estado. Fala-se em expansão extensiva quando o


Estado inicia novas actividades (intervenção em sectores da economia, criação de sistemas de
segurança social, subsídios de redistribuição de rendimentos, etc.).

E porque razão o Estado expande as suas actividades a um tal ritmo?

11
Adolfo Wagner, financista alemão. Traité de la Science des Finances, 1909.

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Wagner considerou que a industrialização que ocorreu nos vários países originou uma intervenção
crescente do Estado, quer para apoiar as necessidades de financiamento das indústrias, quer para
organizar e fazer face às novas necessidades sociais, culturais, etc.

Outros autores como Peacock e Wiseman12, destacam os chamados efeito-deslocação e efeito-apreciação que
ocorrem aquando das perturbações ou conflitos sociais:

a) As perturbações sociais (guerras, alterações políticas, conflitos sociais, etc.) provocam


geralmente o aumento das despesas públicas e o Estado tende a aproveitar estas alturas para
aumentar a carga tributária; as despesas deslocam-se para um nível alto – é o efeito-
deslocação. Ora, quando a perturbação social cessa, as despesas não diminuem para o nível
que tinham anteriormente;

b) Por outro lado, durante as perturbações sociais as populações tornam-se mais conscientes das
necessidades que o Estado ainda não satisfaz e assim o Estado tende a satisfazer as carências
e as necessidades reclamadas pelos cidadãos, aumentando a despesa - é o efeito-apreciação.
Posteriormente, é difícil retirar os benefícios entretanto concedidos aos cidadãos.

Mas se as despesas públicas aumentam tanto, valerá a pena mantê-las? A resposta não pode deixar de
ser afirmativa. É que, como vimos anteriormente, as despesas públicas têm efeitos económicos
importantes: além de satisfazerem as necessidades públicas, criam rendimento e geram fluxos
sucessivos de novas despesas, de consumo e de investimento.

E existirá um limite para as despesas públicas, a partir do qual não continuará a ser possível o seu
crescimento? Ou podem subir indefinidamente?

Teoricamente é impossível determinar esse limite, isso depende de muitos factores e depende,
sobretudo, da dimensão do sector público e das funções que lhe cabem. Sempre se dirá, no entanto,
que não será saudável para a economia de um país que as despesas públicas representem 100% da
despesa nacional, sinal de que a economia estaria integralmente estatizada e de que não haveria espaço
para a iniciativa privada. Contudo, este juízo é um juízo político (não científico), que se prende com a
opção entre um Estado com um papel mínimo ou um Estado com uma intervenção alargada na
economia do País, enquanto garante da satisfação das necessidades públicas.

É possível, no entanto, definir algumas categorias de despesas cujo aumento pode e deve ser limitado:

a) Despesas de funcionamento com a máquina administrativa. Um dos grandes esforços da


Administração moderna é melhorar a produtividade do sector público, tendo em vista reduzir
os custos, e combater os desperdícios, procurando uma Administração mais eficiente e eficaz;

12
Peacock e Wiseman, The Growth of Public Expenditure in the United Kingdom, 2a. edição, 1967.

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b) As transferências improdutivas que retiram fundos a sectores produtivos, destinando-os a


sectores cuja utilidade económica é mais baixa13;

c) As substituições de gastos em que o Estado se substitui a empresas ou outras entidades


privadas, com um gasto geralmente mais elevado do que aquele que o sector privado teria.

Em resumo, a questão do limite das despesas do Estado relaciona-se, em primeiro plano, com a opção
entre ter um Estado com maior ou menor intervenção nos vários sectores da sociedade e, num
segundo plano, com o nível de receitas que o Estado consegue obter (capacidade de financiamento).

As receitas públicas não têm uma elasticidade infinita. As receitas tributárias só podem aumentar até
ao nível que for suportado pelos contribuintes, sob pena de terem efeitos nocivos no rendimento e na
economia nacional. Do mesmo modo, o financiamento do Estado através de outros meios (como por
exemplo o recurso ao crédito público), também não é ilimitado, dependendo de inúmeros factores
como o dinheiro disponível nos mercados financeiros, a taxa de juro (preço do dinheiro) e as garantias
que o próprio Estado é capaz de assegurar aos credores.

A recente crise da Dívida Soberana, particularmente sentida nos países do sul da Europa, vem
demonstrar isso mesmo. A expansão contínua da actividade do Estado provocou um aumento
crescente das despesas públicas, que o actual nível de receitas já não consegue suportar, provocando
um acentuado défice público. Daí as medidas de cortes drásticos nas despesas públicas e o
agravamento dos impostos.

4.5. Classificação das despesas públicas em Timor-Leste

A classificação das receitas e das despesas públicas utilizada em Timor-Leste, nomeadamente para
efeitos de contabilidade orçamental e apresentação de Contas Públicas, é ainda incipiente, isto é, pouco
trabalhada do ponto de vista conceptual.

Na verdade, não existe um plano oficial de contabilidade pública aprovado, mas sim um mero
classificador que se limita a listar os agrupamentos e rubricas das receitas e das despesas, sendo
completamente omisso quanto aos critérios que devem presidir à sua classificação e ao conteúdo de
cada categoria, espécie ou rubrica de despesa.

13
Porém, esta questão é muito discutível. Se é verdade que, do ponto de vista estritamente económico, as
transferências improdutivas não criam valor; do ponto de vista social elas podem ser muito úteis no combate a
situações de pobreza extrema, desemprego generalizado, etc.

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Acresce dizer que o referido classificador tem sofrido alterações de ano para ano, não estando ainda
devidamente estabilizado, o que gera alguma falta de rigor e problemas de fiabilidade e
comparabilidade dos dados orçamentais.

De qualquer modo, a classificação existente agrupa as despesas públicas com base no critério orgânico,
na natureza (económica) das despesas e também tendo em conta a sua repartição geográfica (distrito,
sub-distrito e suco).

Na classificação orgânica, existem três níveis de desagregação da despesa: órgãos de soberania e


Ministérios, Secretarias de Estado e Divisões (correspondentes às Direcções Nacionais no caso dos
Ministérios).

No que respeita à classificação económica, as despesas públicas distinguem-se entre despesas correntes
e despesas de capital.

Nas despesas correntes (indevidamente designadas de recorrentes), existem quatro categorias de


despesa:

∙ Salários e Vencimentos – inclui salários, complementos e subsídios de natureza salarial e


pagamento de horas extraordinárias;

∙ Bens e Serviços – inclui as rubricas de viagens locais e ao estrangeiro, formação profissional


e seminários, encargos de instalação (água, electricidade e comunicações), rendas de
propriedades, combustíveis para veículos, manutenção de veículos, seguros, material de
escritório, bens consumíveis (ex. rações, artigos médicos, material escolar), combustível para
geradores, manutenção de equipamentos e edifícios, outras despesas (ex. recepções oficiais,
encargos bancários, serviços de correio, subscrições, contribuições para sucos), assistência
técnica (serviços profissionais), serviços de tradução e outros serviços diversos (serviços de
catering, limpeza, informática, fotocópias, etc.);

∙ Transferências correntes – transferências para particulares e transferências para organismos


públicos;

∙ Capital menor – que inclui as despesas com a compra de veículos, equipamento de


informática, equipamento de segurança, equipamento de comunicações, equipamentos
diversos (ex. ar condicionado, equipamentos eléctricos, médicos), mobiliário, outro
equipamento de escritório, geradores, equipamentos de água.

Nas despesas de capital, existem duas categorias de despesa:

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∙ Capital de Desenvolvimento – despesas com a aquisição e construção de edifícios e infra-


estruturas (estradas, pontes, infra-estruturas de agua, saneamento, electricidade e
telecomunicações, etc.) e outros equipamentos de capital que não sejam classificáveis como
capital menor;

∙ Transferências de capital – todas as que não possam ser classificadas de transferências


correntes por provocarem uma alteração do património duradouro do Estado.

5. AS RECEITAS PÚBLICAS

5.1. Noção e principais modalidades de Receitas Públicas

A realização das despesas públicas pressupõe que o Estado tem recursos para as financiar, ou seja,
receitas.

Receita pública é qualquer recurso obtido num dado período financeiro através do qual o
sujeito público cobre as despesas públicas que estão a seu cargo.

Na noção de receita pública é possível distinguir três elementos:

a) O tipo de operação – atribuição definitiva (pelo menos no período orçamental) de uma soma
em numerário (ou bem equivalente);

b) O sujeito destinatário da operação – feita em benefício de um sujeito público ou equiparado;

c) A finalidade da operação – tem a finalidade de servir para a cobertura das despesas públicas.

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O regime comum das receitas públicas decorre dos princípios e regras orçamentais já abordados
no capítulo do Orçamento do Estado (OE), pelo que aqui apenas se relembram alguns dos mais
importantes:
- O princípio da legalidade, segundo o qual as receitas devem ser criadas e reguladas por lei;
- O princípio da anualidade do qual decorre a necessidade de autorização anual sem a qual não
podem ser cobradas receitas;
- A regra da tipicidade qualitativa, segundo a qual só podem ser cobradas as espécies de receitas
previstas no OE;
- A regra de que as receitas têm de estar integralmente previstas no OE, sem dedução de qualquer
encargo;
- O princípio da não consignação das receitas a despesas específicas.

No capítulo dedicado às teorias do equilíbrio orçamental, vimos já três das principais classificações
de receitas públicas:

- Receitas ordinárias e extraordinárias (distinção baseada na repetição qualitativa da despesa);

- Receitas correntes e receitas de capital (consoante aumentem o património não duradouro ou


duradouro do Estado);

- Receitas efectivas e não efectivas (consoante aumentem o património monetário do Estado ou


produzam simultaneamente um aumento e uma diminuição na tesouraria do Estado).

Existem ainda outras classificações, nomeadamente:

- Receitas coercivas e não coercivas. As receitas coercivas são aquelas cuja obrigatoriedade
resulta da lei (ex. impostos, empréstimos forçados); as receitas não coercivas, não decorrem de
obrigações «ex-lege», mas sim, em regra, de contratos (ex. receitas patrimoniais e receitas
creditícias);

- Receitas originárias e receitas derivadas. As receitas originárias resultam de uma actividade


directa do Estado, enquanto que as receitas derivadas resultam de uma participação pública na
riqueza gerada por outras entidades.

Os principais tipos ou modalidades de receitas públicas são:

a) As receitas tributárias (impostos e taxas) que constituem, na maioria dos países, a parcela
mais relevante das receitas públicas.

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b) As receitas patrimoniais são as que resultam da administração ou da exploração da


propriedade do Estado e da disposição ou alienação de elementos do seu activo (exemplos:
receitas de explorações industriais ou comerciais, como a indústria petrolífera, rendas de
imóveis, juros no caso de empréstimos concedidos pelo Estado, rendimentos e dividendos de
acções e obrigações detidas pelo Estado, preço de venda de bens duradouros e não
duradouros);

c) As receitas creditícias são as originadas pela contracção de empréstimos pelo Estado e têm
vindo a ter um peso cada vez maior no financiamento das despesas públicas, originando
simultaneamente o endividamento público.

e) As transferências (sejam correntes ou de capital) que consistem em atribuições unilaterais de


valores de particulares ou entidades para o Estado, por imposição legal (ex. multas e outras
penalidades como consequência da prática de actos ilícitos ou ilegais), por acordo ou por outro
acto voluntário (doação, legado, etc.).

5.2. Fundamentos e princípios das Receitas Tributárias. A diferença entre imposto e a taxa.

As receitas tributárias baseiam-se num dever genérico de cobertura dos encargos públicos que
recai potencialmente sobre todos os cidadãos e, em concreto, sobre aqueles que tenham uma
determinada capacidade de riqueza (os contribuintes).

Ou seja, as receitas tributárias representam uma forma de organizar a participação dos cidadãos
na cobertura das necessidades públicas (finalidade financeira), e de prosseguir fins de política
económica e social (finalidades extra-financeiras).

A tributação baseia-se nos seguintes princípios:

a) Princípio da igualdade tributária, segundo o qual todos os cidadãos estão adstritos ao


pagamento de impostos. Em concreto este princípio traduz-se na igualdade horizontal, isto é, os
indivíduos nas mesmas condições devem pagar o mesmo e na igualdade vertical, ou seja, os
indivíduos em condições diferentes devem pagar diferentes impostos na medida da diferença;

b) Princípio do benefício, segundo o qual cada um deve ser tributado consoante o benefício
que aufere dos serviços públicos. Este princípio está presente, em especial, no caso das taxas,

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ou seja, os cidadãos que recorrem a determinados serviços públicos pagam as respectivas taxas,
os cidadãos que não recorrem ou não utilizam esses serviços não pagam;

c) Princípio da capacidade de pagar, segundo o qual os que têm a mesma capacidade de pagar
devem pagar o mesmo (igualdade horizontal), e os que têm diferente capacidade devem pagar
diferente (igualdade vertical). A capacidade de pagar é aferida pelo rendimento e património de
cada contribuinte;

d) Princípio da isenção do mínimo de existência, o que significa que os cidadãos que não têm
mais do que um rendimento mínimo para subsistirem, devem ficar isentos do pagamento de
tributos.

As receitas tributárias (ou tributos) caracterizam-se por:

a) Serem coercivas, coactivas ou obrigatórias (receitas não voluntárias), pois resultam de uma
imposição ou obrigatoriedade «ex-lege» do Estado aos particulares e entidades sujeitas à sua
autoridade, e não de um contrato, acordo bilateral ou de outro comportamento livre das partes.
Esta característica permite distinguir as receitas tributárias dos preços, porquanto as primeiras
resultam de uma imposição legal, enquanto que os preços resultam de um acordo entre as
partes;

b) Terem como função o financiamento dos encargos públicos, ou seja, é através das receitas
tributárias que se organiza a participação dos cidadãos e das outras entidades sujeitas ao poder
do Estado nas despesas públicas. Esta característica permite distinguir as receitas tributárias
das multas e outras penalidades, que apesar de serem também receitas não voluntárias, têm como
finalidade punir os cidadãos que cometem um acto ilícito ou ilegal.

As principais modalidades de receitas tributárias são o imposto e a taxa.

O imposto é uma prestação pecuniária, definitiva e unilateral, imposta por lei aos particulares,
a favor de entidades que exerçam funções públicas com vista à cobertura dos encargos
públicos.

Na noção de imposto, podemos encontrar os seguintes elementos:

1) Prestação pecuniária - em dinheiro ou equivalente a dinheiro. Em teoria, o imposto é uma


prestação patrimonial que pode ser prestada em dinheiro ou em espécie, mas actualmente já
não existe pagamento de impostos em espécie (isto é, em bens);

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2) Prestação definitiva - o imposto constitui uma receita definitiva para o Estado, o que significa
que o imposto devido não é susceptível de restituição ou de reembolso;

3) Prestação unilateral - não existe uma contrapartida específica e individualizada, apenas uma
contrapartida de carácter genérico de garantia de funcionamento dos serviços públicos e de
satisfação de necessidades colectivas;

4) Prestação coactiva- a obrigação tributária é imposta por lei (obrigação legal), não dependendo
da vontade das partes nem de qualquer vínculo anterior;

5) Prestação a favor de entidades que exercem funções públicas – o sujeito activo do imposto é
o Estado, pessoa colectiva pública ou entidade que exerça funções públicas;

6) Prestação que visa a satisfação de fins públicos – isto é, a cobertura dos encargos públicos
(finalidade financeira) e a satisfação das necessidades colectivas económicas, sociais, culturais,
etc. (finalidades extra-financeiras);

7) Prestação que não tem função sancionatória nem compensatória - não representa uma reacção
da ordem jurídica à prática de um facto ilícito como acontece com as multas e coimas, nem
tem natureza compensatória como acontece com os juros de mora ou as indemnizações.

Como se distingue o imposto da taxa?

A taxa é uma prestação pecuniária, definitiva, imposta por lei aos particulares, a favor de
entidades que exerçam funções públicas com vista à cobertura dos encargos públicos, que
resulta de uma relação concreta entre o cidadão e um bem ou serviço público.

Ou seja, a taxa distingue-se do imposto por não ser unilateral.

A taxa resulta de uma relação concreta do contribuinte (cidadão) com um bem ou serviço
público que gera uma receita pública e da qual resulta uma utilidade social objectiva para o cidadão:
satisfação individual, intencional e concreta. Há, portanto, uma contrapartida específica e
individualizada para o cidadão que paga a taxa.

Esta relação entre o cidadão e o bem ou serviço público pode ser:

- Relação com um determinado serviço público (ex. tribunais - custas judiciais; universidade
-propinas);

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- Utilização de um bem do domínio público (ex. taxa de portagem pela utilização de uma
auto-estrada);

- Remoção, por acto administrativo, de um obstáculo jurídico a um dado


comportamento de particulares (ex. licença para o exercício de determinada actividade
comercial ou industrial).

Em qualquer um dos casos a taxa pressupõe sempre uma contraprestação específica (contrapartida
ao pagamento da taxa), enquanto que no imposto não há contraprestação específica, apenas uma
contrapartida genérica, indirecta e não individualizável de satisfação de necessidades colectivas.

Quais os fundamentos e critérios de fixação das taxas? A fixação de taxas tem as seguintes finalidades:

- Facilitar ou dificultar o acesso aos serviços públicos, isto é, garantir o princípio do livre
acesso ao serviço ou, pelo contrário, desfavorecer o seu uso precipitado ou imoderado dos
serviços públicos - princípio da oportunidade e da conveniência;

Assim, quando o Estado pretende facilitar e promover o acesso e utilização dos serviços
públicos, o montante da taxa há-de ser baixo (taxas estimulantes). Se pelo contrário, se pretender
dificultar o acesso ou dissuadir o cidadão de um uso precipitado ou não moderado do serviço,
as taxas hão-de ter um valor elevado (taxas moderadoras).

- Garantir uma repartição justa dos encargos públicos - critério de justiça distributiva segundo
o qual os encargos públicos devem ser repartidos de forma justa pelos cidadãos. Daí que possa
haver, tal como nos impostos, isenções de taxas para os cidadãos cujos rendimentos são muito
baixos e, por isso, não podem pagar; e princípio do benefício segundo o qual cada um deve ser
tributado consoante o benefício que aufere dos serviços públicos e por isso devem pagar taxa
aqueles que beneficiam dos serviços públicos.

Como se distingue a taxa do preço?

A finalidade principal da taxa não é, pois, cobrir o custo do funcionamento dos serviços, mas sim
garantir uma repartição equitativa dos encargos públicos pelos cidadãos de acordo com
critérios de justiça, de oportunidade e de conveniência. Por esta razão as taxas são fixadas, em
regra, abaixo do custo do bem ou serviço prestado; e daí que haja isenções de taxas, mas não isenção
de preços.

Ou seja, a taxa não segue os critérios de cálculo económico que caracterizam a fixação dos
preços no funcionamento normal e livre dos mercados. No caso dos preços, o custo do produto a

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vender ou do serviço a prestar é considerado para efeitos da fixação do respectivo montante, ao qual
é acrescida uma margem de lucro.

Por outro lado, as taxas resultam de preços fixados autoritariamente pelo Estado, cujo montante é
geralmente inferior ao custo do serviço ou da produção do bem ou, quando muito, igual. Os preços
são negocialmente estabelecidos (base livre e contratual) e são superiores ao custo de produção do
bem ou da prestação do serviço.

Como se disse, em regra, o montante das taxas é inferior ao custo do bem ou serviço público prestado.
No entanto, pode acontecer também que o Estado aproveite a utilização necessária de certos serviços
para obter rendimentos que podem igualar ou até exceder o custo do serviço (ex. serviços de
fiscalização, registos obrigatórios). Neste caso, como o objectivo é mais o de obter receita do que o
da justa repartição dos encargos, a taxa aproxima-se do imposto (são as chamadas taxas fiscais) ou do
preço fixado em condições de mercado.

Em conclusão:

Um bem ou serviço prestado pelo Estado em condições de mercado é remunerado por um preço (não
por uma taxa).

Se o montante a pagar resultar de uma imposição legal (e não de um contrato negociado entre as
partes) e as condições gerais de utilização dos bens e serviços públicos estiverem definidas em termos
genéricos, então estamos perante uma taxa.

Como se distinguem as taxas das receitas patrimoniais?

As receitas patrimoniais resultam da venda de património do Estado ou da remuneração pela utilização


de bens patrimoniais, venda de produtos ou prestação de serviços de base patrimonial, prestados em
regime de mercado a preços contratualmente estabelecidos. Ao contrário, as taxas não resultam das
leis do mercado, mas sim de um montante fixado de forma autoritária pelo Estado, segundo critérios
de oportunidade e de justiça distributiva.

Ou seja, os bens patrimoniais geram produtos ou prestam serviços que, em regime de mercado, são
remunerados por preços. Esses preços podem ser os preços normais de mercado, em regime de
concorrência, ou os preços em regime de oligopólio ou de monopólio.

5.3. Receitas do Crédito Público

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5.3.1. Noção e funções do Crédito Público. Tipos de empréstimos públicos. A taxa de juro.

Numa relação creditícia podem encontrar-se duas posições: posição activa (credor) e posição passiva
(devedor).

Crédito público, em sentido estrito, abrange apenas as situações em que o ente público é titular da
posição passiva na relação de crédito; abrange, portanto, o crédito público contraído pelo
Estado (não o crédito concedido pelo Estado).

O que nos interessa neste capítulo, é o crédito e a dívida pública stricto sensu, ou seja, as situações em
que o Estado ou outra entidade pública é devedor em virtude de uma operação financeira pela qual
lhe foram prestados activos financeiros, devendo reembolsá-los e/ou pagar juros ou rendas durante
um determinado período de tempo.

Ou seja, crédito público stricto sensu corresponde apenas às situações em que existe uma transferência
efectiva de liquidez para o Estado ou outra entidade pública, o qual fica vinculado a um conjunto de
deveres de natureza financeira durante um período de tempo (crédito financeiro).

As principais funções do crédito público são:

a) Obtenção de recursos financeiros para suprir carências ocasionais da tesouraria do


Estado

No Orçamento do Estado prevêem-se sempre receitas suficientes para cobrir as despesas


(equilíbrio orçamental em sentido formal), mas no decorrer da execução orçamental a
efectivação das cobranças de receitas e dos pagamentos não é coincidente, ou seja, umas vezes
as receitas já cobradas podem exceder os pagamentos a efectuar, outras vezes, as receitas que
já entraram nos cofres do Estado são insuficientes para fazer face aos pagamentos que
entretanto se venceram. Neste último caso, dá-se uma situação pontual de falta de liquidez, e
para fazer face a essa situação o Estado pode recorrer a um empréstimo. Este empréstimo será
necessariamente de curto prazo uma vez que se destina a fazer face a uma situação transitória
de desequilíbrio na tesouraria (nos cofres do Estado), ou seja, deve ser pago no prazo de um
ano.

b) Obtenção de recursos financeiros para financiar o défice global do Orçamento do


Estado

Quando o Orçamento do Estado apresenta um défice, ou seja, quando o montante das receitas
que se estima cobrar não é suficiente para cobrir as despesas públicas a realizar, em regra é
através do recurso a empréstimos públicos que o Estado vai colmatar essa diferença. Vimos

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já, a propósito das teorias do equilíbrio orçamental, que as condições em que o Estado pode
recorrer a empréstimos sem entrar em situação de desequilíbrio varia consoante o critério
adoptado pela legislação do respectivo país. Normalmente, os empréstimos contraídos pelo
Estado para financiar o défice orçamental são empréstimos de médio e longo prazo, isto é,
que vão ser reembolsados ao longo de vários anos.

c) Forma de cumprimento de obrigações pecuniárias ou contratuais específicas

Por vezes o Estado pode também constituir-se devedor para ter uma contrapartida imediata
de obtenção de bens ou benefícios patrimoniais. Neste caso, os empréstimos poderão ser de
curto, médio ou longo prazo consoante o valor em causa e a finalidade específica do
empréstimo.

d) Esterilização do poder de compra

As três funções anteriores dos empréstimos públicos são funções eminentemente financeiras.
O Professor Teixeira Ribeiro14 acrescenta uma outra função de natureza económica, a
esterilização do poder de compra.
O Estado não recorre ao crédito apenas para financiar despesas públicas, também pode
recorrer ao crédito para limitar ou impedir as despesas privadas. É o que acontece quando a
inflação, ou seja, a subida de preços é imputável à pressão da procura (há mais procura do que
oferta no mercado o que provoca a subida dos preços). Com o objectivo de reduzir a procura
e de, por essa via, fazer baixar ou estabilizar os preços, o Estado pode contrair empréstimos,
ou junto dos bancos se souber que isso vai prejudicar o acesso ao crédito pelos particulares,
ou junto dos particulares e empresas, absorvendo assim parte do aforro dos particulares que
de outro modo seriam gastos (pelo menos em parte).
Como o objectivo destes empréstimos é a redução do poder de compra, o Estado não os pode
utilizar na cobertura das despesas públicas, pelo que a receita resultante do crédito público é
mantida em saldo até que seja reembolsada ao credor.
Como é difícil prever quando é que as circunstâncias económicas se vão alterar, normalmente
o Estado recorre a empréstimos de curto prazo. Caso as circunstâncias económicas se
mantenham as mesmas, chegado o termo do empréstimo o Estado substitui-o por outro(s)
empréstimo(s); se as circunstâncias se alteraram e aconselham uma política contrária (de
fomento do poder de compra), o Estado apenas liquida o empréstimo.

Os empréstimos contraídos pelo Estado podem ser classificados em:

14
TEIXEIRA RIBEIRO, José Joaquim Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, 5ª. edição refundida e actualizada,
Coimbra Editora, Abril 2011, pág. 187.

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∙ Empréstimos internos e empréstimos externos – critério do lugar

Consoante as operações financeiras sejam realizadas em território nacional ou no mercado


estrangeiro. Quando o Estado contrai um empréstimo interno dirige-se sobretudo aos capitalistas
(detentores do capital ou do dinheiro) residentes no país; assim como quando contrai um
empréstimo externo se dirige aos capitalistas residentes noutros países.

∙ Empréstimos perpétuos e temporários - critério da duração

Nos empréstimos temporários (os mais comuns), existe um prazo certo para o reembolso final
que põe termo ao empréstimo; enquanto que nos empréstimos perpétuos não se contrata a
restituição do capital, mas apenas o pagamento pelo Estado, durante um período indefinido, de
juros e/ou rendas.

Nos empréstimos perpétuos o Estado obriga-se a pagar um certo juro anual, mas não a proceder
ao reembolso do capital. Mas então qual o interesse para o credor de conceder um empréstimo
com estas características? É que os empréstimos perpétuos são sempre titulados – títulos de crédito
– e estes títulos são negociáveis em Bolsa. Vendendo e negociando os títulos os credores realizam
os seus créditos, isto é, são reembolsados do valor do capital, podendo até ganhar mais do que o
valor que emprestaram.

Os empréstimos pérpetuos podem ser


a) remíveis, quando o Estado fica com a faculdade de, querendo, efectuar o reembolso do
capital quando quiser;
b) irremíveis (não remíveis), quando o Estado não tem essa faculdade, ou seja, o Estado
suporta perpetuamente o ónus do juro, a menos que os credores aceitem convertem o
empréstimo em remível.

Os empréstimos temporários, isto é, aqueles em que o Estado está obrigado a reembolsar o capital
emprestado, podem ser de curto prazo ou de longo prazo, consoante sejam reembolsados no prazo
de um ano ou em prazo superior a um ano.

∙ Empréstimos voluntários e empréstimos forçados - critério da obrigatoriedade (coercividade)

A situação mais comum é a dos empréstimos voluntários, isto é, que resultam de um acto jurídico
bilateral, através do qual o Estado recebe fundos (capital), comprometendo-se a reembolsar e/ou
a pagar juros ou rendas ao credor. Os credores emprestam ou não conforme decidam, não sendo
obrigados a fazê-lo.

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Mas existem também os chamados empréstimos forçados em que o Estado, através de um acto
unilateral de autoridade, impõe um sacrifício aos particulares com a finalidade de custear encargos
públicos, comprometendo-se a reembolsar posteriormente os particulares. Porque são coactivos,
os empréstimos forçados aproximam-se do imposto; contudo imposto e empréstimo forçado
distinguem-se porque o imposto é uma prestação pecuniária definitiva, sem possibilidade de
reembolso, enquanto que o empréstimo forçado é reembolsável. O Estado pode obrigar os
particulares a emprestar dinheiro quando, por razões ponderosas, quer obter um empréstimo a um
juro mais baixo do que o juro do mercado ou quando os bancos se recusam a conceder
empréstimos ao Estado.

O empréstimo público é, pois, um contrato bilateral, de direito público, que se caracteriza pelos
seguintes elementos essenciais:

1) Direito ao reembolso do capital (credor) e dever de reembolsar (devedor) – o Estado obriga-se a reembolsar
o capital emprestado (excepção empréstimos perpétuos);

2) Direito a juros (credor) e dever de remunerar (devedor) – obrigação que recai sobre o Estado de pagar
juros ou rendas como remuneração pelo uso do capital emprestado. Os juros correspondem à
remuneração do uso do capital emprestado, enquanto que as rendas (mais altas do que os juros)
integram a remuneração do uso do capital e uma parcela da restituição do capital.

3) Prazo e outras condições essenciais do pagamento – Prazo de amortização de capital e pagamento de


juros, taxa de juro, diferimentos, etc.

Como vimos a situação mais comum é a de que os empréstimos sejam pagáveis em prestações
periódicas (anuais ou de outra periodicidade), correspondentes ao reembolso do capital e ao
pagamento dos juros (serviço da dívida).

O capital emprestado é remunerado através da taxa de juro, que tende a ser tanto maior quanto
mais duradouros forem os empréstimos públicos. A liquidez do capital emprestado, isto é, a
possibilidade do credor receber o dinheiro que emprestou, diminui à medida que aumenta a duração
do empréstimo; para compensar o risco (de falta de liquidez) o credor exige um juro mais elevado.

Assim, num empréstimo a curto prazo, por exemplo, de 90 dias, a liquidez do capital emprestado é
elevada pois no final dos 90 dias o credor tem de novo o dinheiro nas suas mãos, logo a taxa de juro
é baixa.

Se o empréstimo for de longo prazo, por exemplo, a 10 ou 20 anos, a liquidez do dinheiro emprestado
é menor, porque o credor não vai ser reembolsado rapidamente. É verdade que se o empréstimo for
titulado, o credor pode transaccionar os títulos, mas o valor da transacção depende da taxa de juro

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corrente, isto é, dependendo da subida ou descida da taxa de juro assim subirá ou descerá o valor
(cotação) do título no mercado financeiro. Em qualquer dos casos, existe um maior risco para o credor,
e para compensar o risco de eventuais perdas de valor, o credor exigirá uma remuneração (juro) mais
elevada em troca do capital emprestado ao Estado.

Um outro elemento determinante para a fixação da taxa de juro é o risco de não pagamento. Ora,
regra geral, o Estado oferece mais garantias de pagamento do que um devedor particular, porque o
pagamento da dívida pública está assegurado através das receitas oriundas dos contribuintes
(impostos), enquanto que nos particulares isso não acontece. Assim, a taxa de juro corrente no
mercado tende a ser mais alta para a generalidade dos empréstimos a privados do que para
os empréstimos contraídos pelo Estado em idênticas condições.

5.3.2. A Dívida Pública. Espécies e operações da dívida.

O Estado recorre a empréstimos para financiar as despesas públicas. Do crédito ou empréstimos


públicos resulta a dívida pública, isto é, o montante global que o Estado deve aos seus credores.

Dívida pública em sentido restrito é o conjunto das situações passivas de que o Estado é titular
em virtude do recurso ao crédito público.

Dos empréstimos internos resulta a dívida interna; e dos empréstimos externos resulta a dívida
externa. O ónus da dívida externa para o Estado é, em regra, maior do que o da dívida interna. Ou
seja, os encargos que resultam para o Estado são geralmente maiores no caso da dívida externa: os
encargos da dívida externa são satisfeitos em ouro ou em moeda estrangeira, enquanto que os da dívida
interna são pagos em moeda nacional; no mercado interno o Estado tem soberania para forçar a
redução do capital ou do juro, enquanto que perante os credores estrangeiros não goza desse poder
de autoridade e a sua margem de negociação é bastante mais reduzida.

O crédito de curto prazo dá origem à dívida flutuante, isto é, aquela cujo prazo de vencimento é
inferior a um ano (obrigações que devem ser liquidadas dentro do mesmo período orçamental ou no
período seguinte, mas dentro do prazo de um ano). O crédito de médio e longo prazo e os
empréstimos perpétuos dão origem à dívida fundada, isto é, aquela cujo prazo de reembolso se vence
a mais de um ano (obrigações assumidas num determinado período orçamental e que devem ser
liquidadas em período posterior superior a um ano).

A dívida pública pode ainda distinguir-se ainda entre:

Dívida principal e dívida acessória, sendo a primeira o conjunto das situações passivas de que o
Estado é titular devido a operações de crédito que foram praticadas no seu interesse principal, e a

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segunda o conjunto de situações passivas em que o Estado é sujeito acessório, como garante de outros
sujeitos públicos ou privados (o exemplo mais comum é o aval do Estado). Neste caso, o Estado
responde subsidiariamente pelas dívidas de outras entidades, isto é, compromete-se a reembolsar o
empréstimo como se fosse devedor principal ou a pagar caso o devedor não cumpra.

Dívida efectiva, em que o Estado é devedor perante uma outra entidade estranha ao sector público;
e dívida fictícia em que Estado é devedor perante outra entidade do sector público.

Como qualquer outro contrato, os empréstimos públicos estão sujeitos a factos modificativos que
diminuem ou extinguem a dívida deles resultantes.

Os factos modificativos da dívida pública, também designados por operações da dívida pública
são fundamentalmente os seguintes:

∙ Amortização
Em sentido estrito, amortização significa o pagamento das prestações do capital emprestado; em
sentido amplo abrange o reembolso do capital e o pagamento dos juros ou rendas. A amortização
produz a diminuição do montante da dívida.

∙ Remição
A remição é a amortização antecipada (antes do prazo), parcial ou total, da dívida pública. Se a
amortização for total extingue a dívida.

∙ Conversão
A conversão consiste na transformação de uma dívida em outra dívida emitida em condições
diferentes, entre o mesmo devedor e credores. Ou seja, consiste na alteração, por acordo ou por
imposição do devedor, das condições contratuais do empréstimo no decurso da sua vigência. Na
situação mais comum, a conversão visa tornar o empréstimo ou a dívida menos onerosa para o
Estado (por exemplo por efeito da descida da taxa de juro).

A conversão pode ser:


- Voluntária, quando o Estado propõe aos credores a troca do empréstimo/títulos por outro
empréstimo/títulos com juro menor, tendo os credores a faculdade de manterem a posição
anterior ou aderirem à nova posição,
- Facultativa, quando o Estado dá a opção (alternativa) aos credores de escolherem entre o
reembolso imediato do empréstimo/títulos que possuem ou a sua troca por outro
empréstimo/títulos com novas condições (menor juro);
- Forçada, quando o Estado, recorrendo ao seu poder de autoridade, impõe unilateralmente a
alteração das condições contratuais.

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∙ Outros factos modificativos da dívida


Como qualquer outro contrato e dependendo das condições contratuais acordadas, o empréstimo
e a dívida podem ainda ser objecto de anulação, prescrição, transmissão, perdão da dívida, etc. Existe
ainda a figura do repúdio. O repúdio é uma declaração política, que se baseia na negação da
legitimidade em relação ao Governo que contraiu a dívida, através da qual o Estado se declara
desvinculado das obrigações decorrentes do empréstimo público. Esta é uma situação rara, mas
de que existem alguns exemplos na história mundial: repúdio da dívida imperial russa quando os
sovietes chegaram ao poder; repúdio da dívida pública do Irão quando o governo revolucionário
tomou o poder.

5.3.3. Os efeitos do Crédito Público

De acordo com a teoria clássica, o recurso ao crédito pelo Estado era indesejável porque constituía
um factor perturbador do normal funcionamento da economia, expandindo os rendimentos e o
consumo público em detrimento dos rendimentos, consumo e poupança privados, isto é, canalizava
fundos para um sector improdutivo (público) em vez do sector produtivo (privado). Por outro lado,
era entendido que para satisfazer as necessidades da geração presente, o Estado iria onerar as gerações
futuras com aumentos de impostos para pagar as dívidas e correspondente redução de satisfações.

As teorias modernas vieram, no entanto, demonstrar que os efeitos dos empréstimos públicos podem,
em certas condições, ser benéficos para o país. Vimos já, por exemplo, que o recurso ao crédito pelo
Estado, desde que não prejudique o recurso ao crédito por parte dos particulares e das empresas, pode
ter um efeito-propulsor importante: as despesas públicas financiadas pelo crédito público vão originar
aumento do rendimento, do consumo e do investimento.

Num primeiro momento (da obtenção do crédito), os efeitos são directos para o Estado: o Estado
obtém receitas que permite financiar despesas públicas; dá-se uma transferência ou redistribuição de
recursos oriundos de outros sectores para o sector público. Em momento posterior (reembolso de
capital e pagamento de juros), dá-se o movimento inverso, isto é, dá-se a transferência ou
redistribuição dos recursos provenientes dos contribuintes para os credores do Estado (redistribuição
esta que vai beneficiar os mais ricos, os detentores do capital). No momento da contracção, o crédito
tem um efeito expansionista na economia do país; enquanto que no momento do reembolso pode
ter um efeito inverso, contraccionista. A não ser que as receitas do crédito público sejam canalizadas
para investimentos produtivos, dar-se-á necessariamente o efeito inverso.

Daí dizer-se que os empréstimos públicos não são um meio adequado de redistribuição equitativa dos
recursos pela população. No entanto, a situação é substancialmente diferente no caso da dívida externa
e da dívida interna.

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No caso da dívida interna, os recursos provenientes do crédito público são redistribuídos pelos
nacionais, pelas pessoas que vivem dentro do mesmo país. O Estado transfere, num primeiro
momento, rendimentos do sector privado para o público e deste para a população em geral e, num
segundo momento, transfere rendimentos dos contribuintes para os credores que também são
nacionais. Ou seja, os recursos são redistribuídos pela população do país, pelo que, em termos globais
de fluxo de dinheiro, não se perde, nem se ganha. Isto é, a dívida (interna) em si mesma não
constitui um ónus, nem para a geração presente, nem para as gerações futuras.

É claro que se considerarmos os efeitos do crédito público sobre o rendimento, o consumo e o


investimento na geração presente e nas gerações futuras, já a dívida interna pode constituir um ónus
para as ambas as gerações, dependendo em concreto das condições da dívida, especialmente da taxa
de juro, e do tipo de despesas que vão ser financiadas com as receitas do crédito público. Se o recurso
ao crédito público não implicar uma diminuição do investimento, o rendimento nacional não será
afectado nos anos seguintes. Mas, se a taxa de juro subir em consequência dos empréstimos públicos,
diminui o investimento privado e, em consequência, o rendimento do país será menor no futuro, a
não ser que o Estado utilize o crédito para investir em bens de capital que tenham tanta produtividade
como teria o investimento privado (neste caso, a diminuição do investimento privado é compensada
por um aumento do investimento público). Portanto, a dívida interna pode constituir um ónus
para as gerações futuras caso provoque a subida do juro e a redução do investimento privado.

Os efeitos da dívida são também diferentes em situação de pleno emprego e de desemprego.


No caso de pleno emprego, e se a taxa de juro se mantém, a dívida interna constitui um ónus para a
geração presente, porque não é possível aumentar a produção global: neste caso a produção de bens
públicos só se poderá fazer à custa da diminuição do consumo privado (diminuição da produção de
bens privados), ou seja, o efeito inflacionista das despesas públicas provoca uma redução do consumo.
Se houver desemprego, já a dívida não implica um ónus para a geração presente, porque a produção
de bens públicos pode aumentar sem prejuízo da produção de bens privados. Isto tudo, é claro,
dependendo da taxa de juro.

No caso da dívida externa, a situação é substancialmente diferente. No momento em que o


empréstimo é contraído, as receitas entram no país e vão beneficiar sobretudo a geração actual. No
momento do pagamento do empréstimo dá-se uma transferência dos recursos dos cidadãos nacionais
para os credores externos. Na realidade, são pois as gerações subsequentes que vão suportar os
encargos com o pagamento dos juros e das amortizações do capital. A dívida externa constitui
sempre um ónus para as gerações futuras.

Quanto aos limites da dívida pública hão-de aferir-se, sobretudo, pela capacidade das sucessivas
gerações para suportarem o ónus e os encargos dos juros e amortização da dívida. A capacidade
das gerações para pagar a dívida será tanto maior quanto maiores forem os seus rendimentos. Portanto,

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se o crédito público for aplicado em bens de consumo, em nada contribuirá para aumentar o
rendimento nacional futuro. Se pelo contrário, o crédito público for canalizado para investimentos
reprodutivos, as gerações futuras terão maiores rendimentos e, portanto, uma maior capacidade para
suportar os encargos da dívida, através do pagamento dos impostos.

5.4. Principais receitas públicas de Timor-Leste e sua importância no OGE

As contas públicas de Timor-Leste estruturam-se, ao nível das receitas, com base na origem dos
fundos:

∙ Receitas do OGE, subdividido em receitas gerais e receitas dos serviços e fundos autónomos;
∙ Trust Fund de Timor-Leste (Banco Mundial);
∙ Fundos Bilaterais;
∙ Fundos Multilaterais;
∙ Fundos Especiais (Fundo de Infra-Estruturas e Fundo de Desenvolvimento do Capital Humano);
∙ Fundo Petrolífero;
∙ Outros fundos.

Do ponto de vista económico, as receitas públicas distinguem-se entre receitas correntes e receitas de
capital, apresentando-se estruturadas em torno de três grandes agrupamentos de receita: Receitas
Petrolíferas, Receitas Não Petrolíferas e Receitas do Crédito Público.

No que respeita às Receitas Petrolíferas, estas são compostas por receitas tributárias (impostos e
taxas sobre a actividade petrolífera) e receitas de capital do Fundo Petrolífero (designadamente
rendimentos e juros do Fundo, portanto, receitas patrimoniais). São as receitas tributárias que
representam um peso maior nas receitas petrolíferas: em 2013 representarão cerca de 82,5% das
receitas petrolíferas totais que se estimam em 2.797,9 milhões de dólares.

Receitas Petrolíferas estimadas para 2013

Receitas Petrolíferas Valor Peso


(milhões USD) (%)

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Receitas Tributárias 2.309,1 82,5%


Impostos sobre lucros petrolíferos 1.137,8
Impostos do Mar de Timor 318,4
Impostos sobre o Rendimento 395,6
Impostos sobre Lucros Adicionais 395,6
Outros Impostos e Taxas Petrolíferas 61,7
Receitas Patrimoniais 488,8 17,5%
Juros do Fundo Petrolífero 488,8
Total Receitas Petrolíferas 2.797,9 100%

No âmbito das Receitas Não Petrolíferas, temos fundamentalmente: as receitas tributárias (também
designadas de fiscais), ou seja, os impostos e taxas correntes como por exemplo o imposto sobre os
salários, o imposto sobre os serviços e as vendas e as taxas aduaneiras. No que respeita às receitas não
tributárias (não fiscais) são constituídas, na sua maioria, por preços de venda de bens e prestação de
serviços públicos (ex. serviço de correios, licenças e registos, rendas de propriedades, propinas da
universidade, emissão de vistos, passaportes e bilhetes de identidade, custas judiciais).

As receitas do crédito público, inexistentes até ao OGE de 2013, podem dividir-se entre crédito
interno e crédito externo.

As receitas petrolíferas constituem, pois, a mais importante receita pública de Timor-Leste.

Se analisarmos o Orçamento Geral de Estado (OGE) para 2013 que ascende ao montante de 1.647,5
milhões de dólares, verificamos que as receitas petrolíferas representam mais de 80% das receitas
públicas do OGE. Com efeito, à transferência do Fundo Petrolífero que representa 47,8% das receitas,
há que somar o montante inscrito a título de saldos transitados (40,7%), uma vez que estes saldos têm
origem, na sua esmagadora maioria, em receitas petrolíferas.

As receitas correntes (não petrolíferas) representam apenas 8,9% do total das receitas e os impostos
têm um peso ainda pouco significativo de 6,4%. Pela primeira vez, as despesas do Estado são
financiadas em 2,6% por receitas de crédito público.

OGE 2013 de Timor-Leste

Receitas Valor Peso


(milhões USD) (%)

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Receitas não petrolíferas 146,3 8,9%


- Impostos directos 41,8 2,5%
- Impostos indirectos 64,0 3,9%
- Outras receitas e taxas 14,8 0,9%
- Vendas de produtos 2,8 0.2%
- Juros da conta do Tesouro 0,1 0,0%
- Receitas próprias Serviços e F. Autónomos 22,8 1,4%

Transferência do Fundo Petrolífero 787,0 47,8%


Empréstimos públicos 43,6 2,6%
Saldos transitados 670,6 40,7%
- Saldo da conta do Tesouro 260,8 15,8%
- Saldo Fundo das Infra-Estruturas 401,3 24,4%
- Saldo Fundo Desenvolvimento do Capital Humano 8,5 0,5%

Total 1.647,5 100%

6. POLÍTICAS FINANCEIRAS

6.1. Noção e tipos de Políticas Financeiras

As políticas financeiras consistem em formas de actuação do Estado, usando os meios


financeiros de que dispõe, para prosseguir determinados objectivos económicos e sociais. Ou
seja, política financeira é a actividade do Estado que consiste na utilização dos instrumentos
financeiros para alcançar determinadas utilidades e finalidades económicas e sociais.

As políticas financeiras visam modificar as condições de vida de uma sociedade, pelas quais se
produzem e consomem recursos (política económica) e se repartem os benefícios da actividade
económica ou se satisfazem as necessidades sociais dos cidadãos (política social).

Essa intervenção pode ser global ou sectorial. Assim, as políticas financeiras globais incidem sobre
toda a economia através das variáveis gerais que permitem modificar a vida económica e social,
enquanto que as políticas sectoriais actuam sobre uma zona ou sector determinado da economia ou
da sociedade de forma selectiva.

Uma outra tipologia de políticas financeiras distingue-se entre políticas estruturais e políticas de
conjuntura (ou conjunturais). Os objectivos da política financeira podem consistir numa alteração da
estrutura económica do país (a longo prazo) ou numa modificação da conjuntura económica
(objectivos de curto prazo).

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As políticas estruturais actuam sobre elementos relativamente estáveis da sociedade e da economia


que só é possível alterar a longo prazo. Por exemplo, a demografia, a geografia, o clima, a repartição
da produção entre os grandes sectores ou a repartição do rendimento entre os factores de produção,
são elementos relativamente estáveis de uma sociedade, pouco susceptíveis de variar a curto prazo. As
políticas conjunturais actuam sobre o conjunto dos elementos que variam continuadamente ou a
curto prazo. Por exemplo, o emprego, o nível de preços ou a massa monetária, podem ter uma variação
significativa a curto prazo.

Assim, o combate ao desemprego ou o combate à inflação constituem exemplos de políticas de


conjuntura; as políticas de desenvolvimento económico ou as políticas de redistribuição constituem
exemplos de políticas estruturais.

As políticas financeiras podem ter três objectivos principais: a estabilização (objectivos conjunturais),
a redistribuição e o desenvolvimento económico (objectivos estruturais).

6.2. Políticas de Estabilização. Política anticiclíca e política anti-inflacionista

As políticas de estabilização têm como principais objectivos conjunturais:

a) Estabilizar o emprego, ou seja, combater o aumento do desemprego em fase de recessão ou


o forte desemprego característico da depressão15, reduzindo a taxa de desemprego ou evitando
que a mesma se agrave;

b) Estabilizar o nível de preços, ou seja, combater a variação considerável do nível de preços,


em particular, a inflação originada nas fases de prosperidade;

c) Estabilizar as relações com o exterior, podendo o objectivo ser o de alcançar um excedente


global nas relações económicas com o exterior, o de reduzir o défice ou manter o equilíbrio
das relações com o exterior.

O objectivo global da política de estabilização é, pois, o de conjugar elevados níveis de emprego dos
recursos produtivos, com uma estabilidade do nível geral de preços e com o equilíbrio das transacções
com o exterior.

15
A recessão é um abrandamento da actividade económica em expansão, enquanto que a depressão é uma redução
absoluta do nível de actividade económica; a depressão é mais intensa e tem efeitos económicos mais violentos do
que a recessão, originando altos níveis de desemprego.

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Para combater o desemprego e a inflação (aumento do nível geral dos preços), o Estado pode recorrer
a duas políticas de estabilização: a política anti-cíclica que visa estabilizar o emprego ou alcançar o
pleno emprego dos recursos produtivos e a política anti-inflacionista que visa estabilizar os preços.

Política anti-cíclica

As políticas anti-cíclicas são utilizadas pelos Governos para combater as situações de decréscimo do
rendimento nacional, da procura e do investimento, que geram desemprego, de modo a desencadear
uma nova fase de prosperidade e crescimento.

Em termos de emprego, a situação ideal é a do pleno emprego. Se há pleno emprego, a produção é


máxima e o rendimento nacional também. Mas, o pleno emprego não é a situação normal, o normal
é existir desemprego (a procura é inferior à oferta de trabalho). O desemprego pode ocorrer
fundamentalmente pelos seguintes motivos:

- Há desemprego quando chegam ao mercado de trabalho novos trabalhadores, verificando-se


um desequilíbrio temporário entre a oferta e a procura de trabalho, que se mantém até que o
mercado absorva os novos trabalhadores - desemprego friccional;

- Existe também o desemprego próprio de determinadas estações ou épocas do ano. Por


exemplo, na agricultura são necessários muitos trabalhadores na época das colheitas, mas
terminada a colheita surge o desemprego. É o que se chama desemprego sazonal;

- O desemprego pode também ser provocado por alterações na estrutura da economia do país,
como sejam a introdução de novas técnicas e tecnologias, o aumento da eficiência das empresas
ou a redução duradoura da procura. É o desemprego estrutural;

- A situação mais grave de desemprego é o desemprego cíclico, pois pode afectar um volume muito
grande de trabalhadores. A economia funciona por ciclos alternados de prosperidade e
depressão (ciclos económicos). Nas fases depressivas, diminui o rendimento nacional e, em
consequência, diminui o consumo e o investimento; o desemprego dispara e prolonga-se no
tempo enquanto durar a depressão.

As políticas anti-ciclícas combatem o desemprego fundamentalmente através do aumento das


despesas públicas da redução de impostos.

Uma forma directa de intervir é através do aumento das despesas-compra, especialmente aquelas
que não prejudiquem as despesas dos particulares, isto é, que não concorram com a iniciativa privada
(despesas não competitivas), que contribuam para reduzir o custo da produção e para aumentar a
eficiência do capital, incentivando o investimento. Exemplo: obras públicas (estradas, pontes, energia
eléctrica, etc.). O aumento das despesas públicas terá, neste caso, o efeito de alavancar o emprego.

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Mas o Estado tem também formas indirectas de promover o aumento da procura global,
designadamente através do aumento das despesas-transferência e da redução dos impostos. Por
exemplo, se houver aumento dos subsídios de desemprego, os beneficiários vão aumentar o seu
consumo e, portanto, aumenta a procura de bens. Se o Estado reduz os impostos, os particulares e as
empresas ficam com mais rendimento disponível, o que potencia o consumo e o investimento (desde
que a redução dos impostos seja vista como permanente e não temporária).

Portanto, o Estado pode seguir uma política expansionista através: do acréscimo das despesas-compra,
do aumento das despesas-transferência e da redução dos impostos. No entanto, o efeito multiplicador
das despesas-compra é maior do que o efeito multiplicador das despesas-transferência, pelo que se
devem privilegiar as primeiras. Por outro lado, o efeito-propulsor das despesas cobertas por impostos
é diminuto, pelo que o Estado pode ter de recorrer ao crédito público para obter um maior efeito
sobre o consumo e o investimento e, consequentemente, sobre o emprego.

É preciso notar também que os efeitos de uma política expansionista ou anticiclíca não são imediatos.
Primeiro, o Governo leva algum tempo a aperceber-se da situação, a decidir e a por em prática as
medidas adequadas. Segundo, os indivíduos só ao fim de algum tempo adaptam o consumo ao novo
nível de rendimento e, as empresas, só depois de aumentado o consumo (de forma permanente) vão
investir mais.

Por outro lado, vimos já que o aumento das despesas públicas em bens e serviços aumenta o
rendimento nacional, o consumo e o investimento, mas se houver capacidade para aumentar a oferta
(a produção), daí resultará aumento de emprego; se não houver capacidade de aumentar a oferta, o
efeito do aumento das despesas públicas resultará no aumento dos preços (inflação).

É de referir ainda que o efeito das políticas anti-ciclícas é auxiliado pelos chamados estabilizadores
automáticos financeiros, elementos económicos que contrariam os movimentos de expansão e de
contracção, e que são:

- O imposto sobre o rendimento

Um indivíduo tem um salário de 2000 e paga 200 de imposto (10%) e, numa fase depressiva,
o salário passa a ser de 1000 e paga 100 (10%) se o imposto é proporcional ou 50 (5%) se o
imposto é progressivo. Portanto, apesar do salário bruto ter diminuído 1000, o rendimento
disponível só diminuiu 900 (no 1º caso) ou 850 (no 2º. caso). Por outras palavras, apesar da
descida dos salários, no 1º caso, o rendimento disponível continuou a representar 90% do
salário bruto e, no segundo caso, aumentou para 95% do salário bruto.

O imposto sobre o rendimento contraria o movimento de contracção do rendimento (o efeito


será tanto maior quanto mais progressivo for o imposto).

- As receitas e as despesas da segurança social

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As receitas da segurança social (contribuições proporcionais aos salários pagos) baixam durante
a depressão quando o emprego diminui; e aumentam quando o emprego aumenta
(prosperidade). Por seu lado, as despesas da segurança social (ex. subsídios de desemprego),
sobem durante a depressão porque o desemprego aumenta, e diminuem na prosperidade
porque o emprego aumenta. Em fase de depressão, a segurança social é deficitária (porque há
mais despesas e menos receitas), enquanto que em fase próspera pode ser superavitária (há
mais receita do que despesa).

O sistema de segurança social também contraria o movimento de contracção: na fase de


depressão, aumentando as despesas de segurança social, aumenta o rendimento disponível
através, por exemplo, dos subsídios de desemprego.

Política anti-inflacionista

Quando se vencem as fases recessivas ou depressivas, entra-se numa nova fase de prosperidade: o
rendimento e a procura aumentam, o que faz aumentar a produção (a oferta) e, portanto, o emprego.
Ora, o aumento da produção tende a fazer-se a custos crescentes (os salários aumentam, trabalhadores
menos qualificados são empregados, etc.), até que a produção tende a atingir um nível em que já não
é possível produzir mais (pleno emprego). O aumento dos custos de produção e a impossibilidade de
aumentar mais a oferta, faz aumentar os preços (inflação) proporcionalmente ao aumento da procura
global. Com a inflação todos ou quase todos perdem, especialmente aqueles que têm rendimentos
fixos (pensionistas) ou pouco variáveis (trabalhadores).

A inflação é originada:

- pelo aumento da procura global (inflação-procura): há uma pressão da procura sobre a oferta
que provoca o aumento da oferta a custos crescentes e a correspondente subida do nível de
preços: nas fases de prosperidade há mais procura, aumenta a produção para responder ao
aumento da procura, sobem os custos de produção e, consequentemente, preços mais altos.
Portanto, o Estado para contrariar esta tendência inflacionista tem que procurar refrear
(diminuir) a procura, adoptando uma política inversa da adoptada contra o desemprego, uma
política contraccionista.

- pelo aumento autónomo dos custos de produção (inflação-custo): a inflação é provocada pelo
aumento autónomo dos custos, não em resultado de um aumento da procura global, mas
porque sobem os custos das matérias-primas (ex. subida do preço do petróleo em 1973 e 1979)
ou porque aumentam os salários, aumento este que é superior ao acréscimo da produtividade
dos trabalhadores. O aumento dos custos de produção é reflectido no aumento dos preços dos
produtos. As empresas passam a ter perdas ou menos lucros e, em consequência, reduzem a
produção e o nível de preços sobe.

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As medidas de política anti-inflacionista são, fundamentalmente, a diminuição das despesas


públicas e o aumento dos impostos.

Aumentando os impostos, diminui o rendimento disponível e, portanto, o consumo tende a diminuir.


Contudo, a redução do consumo não é imediata, porque a curto prazo as famílias tende a tentar manter
o nível de vida que tinham anteriormente (nomeadamente cortando no aforro).

A diminuição das despesas públicas também provoca uma diminuição do rendimento e, portanto, uma
tendência para a diminuição do consumo. No entanto, as despesas-transferência são de difícil corte porque
vão afectar muito desfavoravelmente os seus beneficiários, e as despesas-compra também, porque as
despesas de funcionamento dos serviços públicos são difíceis de comprimir especialmente a curto
prazo; e as despesas de investimento (obras públicas) se tiverem em curso não podem ser
interrompidas.

Se o consumo diminui, os preços descem em consequência da redução da procura: a procura


é menor do que a oferta, ou seja, há mais oferta de produtos do que procura, logo os preços diminuem.

De qualquer modo, o sucesso das políticas anti-inflacionistas tem um custo que é o desemprego. Se o
rendimento disponível e o consumo diminuem, os preços descem por consequência da redução da
procura; reduzindo-se a procura de bens, reduz-se também a produção e, portanto, começa-se a gerar
desemprego. Por outro lado, a redução do aumento do nível geral de preços não é, em regra,
acompanhada da correspondente redução do aumento do nível de custos (os salários tendem a manter-
se ou até a aumentar durante algum tempo por exigência dos trabalhadores). Este desfasamento
provoca a redução de lucros das empresas, que assim tendem a reduzir a produção fazendo aumentar
o desemprego.

Daqui se conclui que combater ao mesmo tempo a inflação e o desemprego é tarefa difícil. O Governo
tem, por isso, de optar entre menos inflação e mais desemprego ou menos desemprego e mais inflação.

À medida que aumenta o emprego e a economia se aproxima do pleno emprego, o aumento da procura
global reflecte-se cada vez mais no aumento dos preços, e cada vez menos no aumento da produção.
Deste modo, qualquer diminuição da procura vai fazer com que a inflação desça proporcionalmente
mais do que a produção e, portanto, do que o emprego. Ora, se é possível com uma pequena
diminuição da procura obter uma grande quebra na inflação, é natural que o Estado opte por uma
política contraccionista, mantendo ainda assim o emprego em níveis aceitáveis.

6.3. Políticas de Redistribuição e de Desenvolvimento Económico

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As políticas financeiras têm como principais objectivos estruturais a redistribuição da riqueza e o


desenvolvimento económico.

Política de redistribuição

As finanças públicas constituem o principal meio de redistribuição de rendimentos. O Estado


tributa (coactivamente) aos contribuintes uma parcela dos seus rendimentos e do seu património e
com os impostos cobrados concede subsídios ou produz bens e serviços que fornece de forma gratuita
ou a preço inferior ao custo. Parte dos rendimentos dos contribuintes são assim transferidos para os
beneficiários dos subsídios ou dos bens públicos ou semipúblicos.

A finalidade principal da política de redistribuição é, pois, a de transferir rendimentos dos


contribuintes mais abastados para os cidadãos mais pobres ou carenciados. Assim se combate
a injustiça resultante de grandes desigualdades de rendimentos, as situações de pobreza que podem ter
consequências sociais graves, e se promove a igualdade de oportunidades e a dignidade da pessoa
humana.

O objectivo da política de redistribuição é, pois, o de reduzir as desigualdades existentes entre as


diversas pessoas e grupos de uma sociedade no que respeita à distribuição da riqueza. A redistribuição
faz-se através dos impostos e de uma política de despesas que visa prestar utilidades (satisfações)
que revertem sobretudo a favor daqueles que, através dos mecanismos normais de mercado, as não
conseguiriam obter, totalmente ou ao mesmo nível. A redistribuição opera em termos de atribuição
de rendimentos mínimos e pela prestação de utilidades sociais, procurando-se assim corrigir as
assimetrias (desigualdades) de rendimentos.

O Estado, munido do seu poder de autoridade, tributa os grupos que têm maiores rendimentos
para afectar essas receitas aos mais desfavorecidos. O processo de redistribuição tem duas fases:

- Distribuição assimétrica das despesas públicas, fazendo pagar mais aqueles que mais têm,
através dos impostos;

- Prestação de utilidades sociais especialmente dirigidas àqueles que têm rendimentos menos
elevados e mais necessidades por satisfazer, quer através da atribuição directa de subsídios
(ex. subsídio de desemprego, rendimento mínimo garantido), quer através da prestação ou
fornecimento de bens públicos ou semi-públicos gratuitos ou a preço inferior ao custo (ex.
educação);

À concessão de subsídios chama-se também imposto negativo de rendimento. O imposto negativo é o


inverso do imposto positivo: o imposto positivo é pago ao Estado pelos contribuintes que têm
rendimentos superiores ao mínimo de existência; o imposto negativo é pago pelo Estado aos cidadãos

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que têm rendimentos inferiores ao mínimo de existência. O imposto negativo consiste numa prestação
pecuniária que será tanto maior quanto menor for o rendimento abaixo do mínimo de existência.

Importa no entanto saber quais os efeitos da redistribuição dos rendimentos na produção, na


poupança e no investimento. Ou seja, saber se a redistribuição prejudica ou não o crescimento e o
desenvolvimento económico.

A redistribuição tem de ser analisada no seu ponto de partida, isto é, quando o Estado cobra os
impostos e, no ponto de chegada, ou seja, quando o Estado redistribui os rendimentos. A tributação
dos rendimentos daqueles que mais têm (salários, juros e lucros) tende a desfavorecer o aforro
(poupança) e, por essa via, o investimento. Portanto, num primeiro momento, a redistribuição tem ou
pode ter efeitos prejudiciais sobre o crescimento e o desenvolvimento económico.

No seu ponto de chegada, ou seja, no momento da concessão de subsídios e de prestação de utilidades


e fornecimentos de bens públicos gratuitos ou a preço inferior ao custo aos titulares de pequenos
rendimentos, a redistribuição tem o efeito de aumentar o rendimento real dos beneficiários (quer
através dos subsídios, quer através dos serviços ou bens que não pagam). Mas os rendimentos
redistribuídos são gastos na totalidade ou quase em consumo, sendo portanto o aforro diminuto ou
nulo.

Por esta razão, o Estado para neutralizar os inconvenientes da redistribuição, deve fomentar uma
política que vise a formação de capital, quer no sector público, quer no sector privado.

O critério de apreciação dos sacrifícios a impor e dos benefícios a conceder aos cidadãos é sobretudo
um critério político, competindo ao poder político decidir em cada momento os sacrifícios a impor e
os benefícios a conceder.

Políticas de Crescimento e de Desenvolvimento Económico

O crescimento económico consiste na expansão da capacidade de produção do país, através de


investimentos constantes que, conjugados com o aumento da produção, asseguram um aumento real
do rendimento sem inflação e sem desemprego.

A política de crescimento é sobretudo uma política que visa o incremento do investimento, público
e privado. Através da programação de investimentos anuais visa-se manter um nível elevado de
investimento nacional ou aumentar a taxa de investimento quando ela é baixa, como acontece nos
países menos desenvolvidos. O crescimento económico é assegurado, sobretudo, das seguintes
formas:

- Estimular o investimento privado. Por exemplo, através da atribuição de benefícios fiscais


e de crédito às empresas, estimula-se a formação de capital pelas empresas privadas;

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- Formação pública de capital (investimento público). Além de investir nas áreas


tradicionais procurando manter uma máquina política, administrativa e judicial eficiente e
moderna, o Estado tem de investir também em infra-estruturas materiais, técnicas e culturais
e, para isso, tem de poupar e fazer poupar. O investimento público constitui também uma
forma de estimular o investimento privado, porque estimula a procura privada.

O desenvolvimento económico é mais complexo e leva à questão de saber porque existem países
ricos e países pobres. As situações de subdesenvolvimento resultam da escassez de capital (humano,
financeiro e produtivo) e de factores mais profundos relacionados com as condições sociais e culturais
da população. As causas do subdesenvolvimento são pois:

- inexistência de hábitos de poupança;

- níveis educacionais e culturais baixos;

- inexistência de técnicas evoluídas ou impossibilidade de aplicar essas técnicas;

- inexistência de desejo pela inovação económica e criação de riqueza;

- escassez de capital e de classes médias dinâmicas.

Os países subdesenvolvidos caracterizam-se por uma incapacidade de atingir ritmos de crescimento


que caracterizam os países desenvolvidos, pela insatisfação das necessidades sociais mínimas e pelo
aumento das distâncias económicas entre pobres e ricos.

O processo de desenvolvimento tem de actuar sobre as causas do subdesenvolvimento, sendo


insuficientes os meios estritamente financeiros. Nos países subdesenvolvidos não é suficiente
aumentar o investimento e a produção; isto tem de ser acompanhado da modificação das estruturas
sociais e dos hábitos e mentalidades. Ou seja, a intensificação da formação de capital (público e
privado) é apenas uma parte do problema; o desenvolvimento deve orientar-se no sentido de combater
estruturas sociais estagnadas e criar novos hábitos e processos sociais.

As finanças públicas são, por si só, insuficientes para atingir o desenvolvimento económico, podendo
no entanto auxiliar o processo de desenvolvimento, enquanto instrumento privilegiado da acção
política. Nos países subdesenvolvidos, as finanças públicas têm uma actuação de maior peso, ao
contrário do que acontece nas estruturas mais desenvolvidas em que o motor principal é o capital
privado. Na falta de capital privado e de classes médias dinâmicas, o Estado é o sujeito económico
que se encontra em melhores condições para prosseguir as finalidades do desenvolvimento
económico.

As políticas de desenvolvimento pressupõem uma actuação conjugada que vise:

- A generalização e melhoria da educação;

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- A intensificação das políticas sociais;

- A melhoria do nível cultural;

- A criação de técnicas e quadros dirigentes de certo nível;

- A criação de hábitos de participação na vida económica.

O Estado pode prosseguir fins de desenvolvimento económico, financiando despesas e procurando


mudar comportamentos, designadamente através de:

- Criação de infra-estruturas do país;

- Transformação das condições educacionais, culturais e técnicas e das estruturas sociais;

- Promoção da melhoria das condições sanitárias e de bem-estar mínimas, nomeadamente as


necessidades básicas de alimentação, alojamento e vestuário;

- Realização de actividades produtivas. Neste âmbito, o Estado opta por exercer uma actividade
produtiva alargada em particular nas actividades produtivas deficientes ou por estimular a
criação da iniciativa privada;

- Atribuição de benefícios e isenções fiscais como via para estimular a iniciativa e a actuação
económica dos particulares.

Em resumo, os objectivos de desenvolvimento económico conseguem-se através de uma acção


conjugada do Estado que passa pelo financiamento das despesas públicas (através dos impostos), pela
promoção do capital público e privado e, sobretudo, pela mudança de comportamentos actuando
sobre a melhoria das condições sociais, educacionais e culturais da população.

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LEGISLAÇÃO

Constituição da RDTL

Lei do Orçamento e Gestão Financeira (Lei no. 13/2009, de 21 de Outubro)

Lei que aprova a Orgânica da Câmara de Contas do Tribunal Superior, Administrativo, Fiscal e de
Contas (Lei no. 9/2011, de 17 de Agosto).

Lei do Fundo Petrolífero (Lei no. 9/2005, de 3 de Agosto e 1ª. Alteração Lei no. 12/2011 de 28 de
Setembro).

Regime da Dívida Pública (Lei no. 13/2011, de 28 de Setembro).

Lei Tributária (Lei no. 8/2008, de 30 de Junho)

Regime Jurídico dos Bens Imóveis (Lei 1/2003, de 10 de Março)

Decreto-Lei que define os princípios gerais de gestão e alienação dos bens móveis do Estado (Decreto-
Lei no. 32/2011, de 27 de Julho).

Regimento do Parlamento Nacional (publicado no Jornal da República, Série I, no.40, de 11 de


Novembro de 2009)

BIBLIOGRAFIA

SOUSA FRANCO, António, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Volumes I e II, 4ª. Edição,
Edições Almedina, Coimbra, 2012.

TEIXEIRA RIBEIRO, José Joaquim, Lições de Finanças Públicas, 5ª. Edição, Coimbra Editora, 2010.

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D´OLIVEIRA MARTINS, Guilherme, Guilherme Waldemar e Maria, A Lei de Enquadramento


Orçamental, Anotada e Comentada (2ª. Edição), Almedina.

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