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Nota da autora
Olá, querida leitora! É um prazer tê-la em mais uma história. Saiba que você não encontrará
qualquer forma de violência contra as mulheres. Embora a relação de Vincenzo e Beatrice não
seja consensual no início, não haverá nenhum tipo de relação sexual forçada ou agressões físicas
entre eles.

Casanso com o Don da mafia – A filha perdida é um romance dark que contém gatilhos para
violência física, verbal, abuso psicológico, torturas e morte. Se você é sensível a qualquer um
desses temas, por favor, não leia este livro.

Com carinho,
Adri luna
Sumario

Sumário
Prólogo
01
02
03
04
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Epílogo
Agradecimentos
Copyright © 2023 Adri Luna
Revisão: Mariana Santana
Diagramação: Adri Luna
Leitora beta: Leticia Ribas

Livro registrado na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em junho de 2023.


Recife – Pernambuco, Brasil, 2023.

Todos os direitos reservados. Informamos que todos os direitos desta obra são reservados e
protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte ou personagens deste livro, sem a
autorização prévia da autora por escrito e registrada, poderá ser reproduzido ou transmitido, seja
em quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou
quaisquer outros.
Esta é uma obra fictícia, quaisquer semelhanças com pessoas reais vivas ou mortas é mera
coincidência.

CONTATO:

E-mail: adrianalunagaldino@gmail.com
Instagram: @autoraadriluna
Para a querida Maria Adelaide. Vincenzo Ferrari é todo seu, aproveite esse mocinho sem alma e
coração.

Esta obra é dedicada para todos aqueles que acreditam no poder do amor e vivem intensamente
cada momento. Que as palavras aqui presentes possam tocar suas almas e inspirar a viver com
paixão, entrega e amor. Que vocês encontrem em suas vidas alguém que os ame com a mesma
intensidade, tornando cada dia mais especial e pleno. O amor é o que nos faz sentir vivos!
Prólogo
Vincenzo Ferrari

Eu tinha apenas oito anos quando jurei que nunca me renderia ao amor e que serviria
exclusivamente para Cosa Nostra. Fui criado para ser o Don, treinado para ser temido e
doutrinado para ser o anjo da morte. Nunca fui uma criança normal.
Anna Moretti foi a mulher que me fez ir contra a minha promessa. Amei-a com toda minha
alma até seu último suspiro. Ela não tinha parentes na máfia, era alheia a tudo o que eu vivia. Era
o meu Norte e os meus segundos de paz.
Dois anos, este foi o tempo em que a tive ao meu lado, resistindo ao meu pai, que nunca
aceitou o nosso relacionamento. “Um Don não ama, ele se casa e tem herdeiros. Se casa com
uma das nossas e se fortalece”, essas sempre foram as palavras do meu pai.
Um Don não tem sentimentos. Ele serve a máfia acima de tudo e as mulheres servem para
cuidar da casa e nos dar herdeiros. A mulher de um mafioso nunca questiona, apenas obedece ao
seu marido. Ela tem que ser submissa, ou certamente não viverá por muito tempo.
Mas a vida reservou uma surpresa para mim. Anna não havia morrido por inteira, o seu
coração batia no peito de outra mulher. E esse coração me pertence.
01
O coração carrega memórias

Vincenzo Ferrari

Não é tão comum nevar em Florença, mas, naquela noite, meu carro derrapou pela estrada
coberta de gelo. Um dos soldados dirigiu igual a um louco pelas estradas. Anna estava perto de
dar à luz ao nosso primeiro filho. Ela estava perdendo muito sangue após cair das escadas de
casa e desacordada, pois havia batido forte a cabeça durante a queda.
— Vai ficar tudo bem, eu prometo a você — falei enquanto a acariciava e apertava o seu
corpo contra o meu.
Entrei no hospital com ela nos meus braços gritando e implorando por socorro e para que a
salvassem.
— Senhor, precisa ficar. Faremos o possível para salvar a sua esposa e o seu filho.
— Salve-a. Eu a quero viva. — Eu quis gritar, mas a minha voz saiu fraca como um
sussurro.
— Vincenzo, a minha neta virá ao mundo? — A voz do meu pai ecoou, me fazendo
transbordar em ódio.
— Foi você? — vociferei, partindo para cima dele.
— Do que me acusa? — Olhou-me com cinismo.
— Você sabe! Como ela caiu da escada? — indaguei entredentes.
— As pessoas tropeçam o tempo todo, Vincenzo. Ainda mais com a barriga imensa como a
dela. Não queira atribuir a culpa a mim, um velho senhor que já dormia no momento da queda.
A minha boca tremeu de ódio. Ele estava mentindo e sendo sarcástico.
Ele se sentou, enquanto eu olhava o relógio impaciente, vendo o ponteiro dar duas voltas
completas, e eu não tinha notícias da Anna.
— Sente-se e espere, Vincenzo. Andar de um lado para o outro não vai fazer as horas
passarem mais rápido — pronunciou com uma tranquilidade irritante.
— O que faz aqui? — indaguei, irado.
— Estou aqui para te apoiar, é para isso que serve a família.
— Me deixe em paz! Veio torcer pela morte dela e da minha filha?
— Da criança? De forma nenhuma, é a minha herdeira. Garanto-lhe, Vincenzo, mesmo
sendo uma garota, nos trará algum benefício.
Eu estava prestes a me agarrar a sua camisa e lhe socar até perder as forças, mas o médico
surgiu no corredor.
— Como ela está? A minha esposa, como ela está? — indaguei, ansioso pela resposta.
Os seus olhos foram até o meu pai e voltaram para mim.
— Sentimos muito, mas sua esposa não resistiu. Tivemos complicações, morte cerebral.
Sinto muito, nenhuma das duas resistiu — falou com pesar. Os ombros rígidos e a tensão em seu
olhar eram algo incomum para alguém acostumado a dar esse tipo de notícia. A não ser que ele
estivesse sentindo remorso por isso.
— Eu não acredito. Anna estava com uma ótima saúde! — gritei.
— Sinto muito, senhor. Fizemos tudo o que foi possível — respondeu com a voz
embargada.
— Mentira! Onde ela está? Quero vê-la — exigi.
— O senhor a verá assim que o corpo for liberado — respondeu.
— Você sabe com quem está falando? — indaguei, agarrando a gola da sua camisa.
— Largue-o, Vincenzo! Você está chamando a atenção das pessoas. — Ouvi a voz fria do
meu pai, cheia de reprovação.
— Foi você quem a matou, seu filho da puta! Maldito! — Larguei o médico e virei-me em
direção ao meu pai, encarando-o com muita raiva.
— Não! Foi você quem a matou com a sua teimosia, Vincenzo — tornou a falar, irritado,
admitindo a culpa de uma forma que nem mesmo ele percebeu. Parti para cima dele, mas fui
contido pelos soldados.
— Onde ela está? Minha esposa e minha filha? — perguntei, soltando-me dos soldados
que ainda me seguravam.
— Estamos preparando o corpo, senhor.
— Exijo vê-las agora! — Encarei o médico com todo ódio que havia dentro de mim. Os
olhos dele se voltaram para o meu pai outra vez, que assentiu com a cabeça como se ele
mandasse naquele lugar.
Andei até a sala como um homem sentenciado à morte, enxugando as lágrimas com pressa.
Clamei a Deus para que Ele a fizesse voltar a viver. O meu único elo com a vida acabou de me
deixar.
Entrei na sala fria onde ela estava deitada sobre uma maca de inox, eu não estava
preparado para isso, eu conseguiria matar um exército a sangue frio, vendo-os agonizar, e ainda
iria rir de suas expressões de dor, mas ali deitada estava a minha única razão de viver. O meu
coração doeu e cada passo que dei foi para me levar a uma vida amarga e sem vida.
— Anna? Meu amor… — Alisei o seu rosto gélido. — Levanta-se, Anna! — ordenei como
se ela estivesse sendo teimosa. Olhei para trás, procurando pelo médico, que me olhava a uma
distância que ele considerava segura.
— Ela morreu, senhor — disse, como se repetir isso fosse me confortar.
Apertei os olhos, encarando-o. Ele tremia e a sua testa suava.
— O que está me escondendo? — Aproximei-me lentamente. Precisava de uma resposta.
Ele deu um passo para trás, mas as suas pernas perderam as forças, obrigando-o a se apoiar
na mesa ao seu lado.
— A sua esposa morreu, senhor — repetiu, engolindo em seco.
— Você já disse. Mas quero saber exatamente o que aconteceu. Eu me recuso a isso. Não
aceito! Não posso viver sem ela! — gritei, irado, derrubando tudo à minha frente.
— Pare já com isso, Vincenzo — A voz autoritária e irritada do meu pai ecoou na sala. —
Levem-no daqui! — O grande Don Ferrari ordenou e, no minuto seguinte, fui imobilizado por
vários soldados e jogado no chão. Tentei me livrar, mas não tive força. Então, senti uma dor.
Uma picada. Recebi uma injeção no pescoço, que provavelmente era um tranquilizante, e fui
abatido em poucos segundos.

***

Acordei com meu pai sentado na poltrona, em frente à minha cama, tentei me pôr de pé,
mas o meu corpo ainda não me obedecia por conta da alta dose de calmante que tinha na injeção.
Estava cego de raiva, queria vingança pela vida da Anna.
— A sua esposa morreu, Vincenzo. Aceite.
Eu o encarei com ódio e quis me levantar para arrancar a sua cabeça.
— Você a matou! — afirmei entredentes.
— Eu não fiz isso. A gravidez da sua esposa já tinha certo risco, como você mesmo sabe.
Ela tinha problemas que a impediam de gerar um filho. Esqueceu que ela sofreu um aborto? Ela
morreu tentando gerar uma criança.
— Ela morreu porque alguém a matou, ela foi assassinada naquele hospital, onde você
ouviu falar de alguém ter morte cerebral tentando dar à luz a uma criança? — cuspi as palavras
com ódio.
— Vincenzo, raciocine. Se eu tivesse de matá-la, teria feito isso no dia em que me desafiou
e casou-se com ela.
— Eu vou descobrir a verdade, pai. E eu juro que mato e corto em pedaços quem quer que
tenha as tirado de mim.
O meu pai me encarou com frieza. Ele pouco se importou com as minhas ameaças. No
fundo, ainda me via como um homem fraco que pronunciava meia dúzia de palavras vazias.
— Não me olhe assim. Se alegre, eu te deixei um presente.
— Um presente? — Eu não desviei os meus olhos do dele.
— A sua futura esposa precisava de um coração, e eu dei o da Anna para ela. Ela é jovem,
bonita e lhe dará herdeiros. E o principal, ao lado dela, terá controle sobre os maiores grupos
empresariais da Itália e isso significa poder e muito dinheiro — ele falou com satisfação.
Em um impulso, me sentei na cama, ficando de frente para ele, quando o meu corpo me
obedeceu.
— Você deu o coração da Anna? — perguntei, incrédulo.
— Sim. — Sorriu. — É um presente para você. O coração carrega memórias.
— Seu fodido — disse entredentes. — Eu vou te matar! — gritei, colocando-me de pé. Ele
riu com deboche, levantando-se também.
— Já estou velho e perto de morrer, não se dê ao trabalho.
— Quem é a mulher? — perguntei a fim de me vingar dela e de toda sua família. Mas é,
claro, isso seria depois que me livrasse dele.
— Você saberá no momento exato. Ela é linda e nunca foi tocada, assim como deve ser a
mulher de um Don — falou, pronto para sair do quarto.
02
As noites costumam transformar homens comuns em predadores

Beatrice Marino

Florença. Cinco anos depois…

Depois de longos anos na Rússia, enfim retornei para a Itália. Não era como se eu não
gostasse do clima de Moscou, mas estava morrendo de saudade do meu país.
A minha mãe é russa e meu papà, italiano. Nasci na Itália, assim como o meu irmão.
Minha mãe veio morar aqui depois de conhecer o meu papà em uma viagem aos Estados Unidos
e logo se casaram. Poucos sabem dessa nossa mistura, a minha mãe viveu muitos anos nos
Estados Unidos e não possui sotaque russo. Meu papà diz que devemos manter isso em segredo.
Para todos os efeitos, somos italianos puros! Ele diz que é uma questão política. Nunca entendi.
Não frequentei a escola ou tive amigos, um problema cardíaco de nascença me deixa frágil.
Vivi sempre sob a ameaça de que, a qualquer momento, o meu coração poderia parar de
funcionar. Milagrosamente, quando fiz catorze anos, depois de uma vida na fila de espera, surgiu
uma doadora compatível. A esperança de vida longa estava surgindo. Nunca me esquecerei que o
ano em que julgaram ser meu último foi o mesmo em que recebi milhares de dias a mais.
Dias após o transplante, o meu papà surtou. Era para todos estarmos felizes, mas ele não
estava. Em uma noite, me acordou aos prantos, estava apavorado. Disse que eu precisava ir para
Rússia, que faria uma plástica no local da cicatriz e ninguém, sob hipótese nenhuma, deveria
saber que eu era uma transplantada. Eu nunca perguntei o porquê, apenas o obedeci. E assim vivi
por muito tempo como uma italiana pura e de coração saudável desde o nascimento.
— Trice? — A voz doce e fina da minha pipoquinha me despertou de uma preguiça que
me deixou deitada na cama, mesmo depois de horas acordada.
— Sim, minha princesa. — Virei-me para ela com um lindo sorriso para vê-la saltar na
cama.
Giulia nasceu no mesmo dia em que recebi o transplante, há cinco anos. A mãe dela foi a
minha doadora. Meu papà a adotou assim que soube que a garotinha tinha ficado órfã e que não
tinha ninguém por ela. A nossa ligação sempre foi incrível. Sei que esse coração sempre bateu
por ela.
— Você me prometeu que iríamos fazer um passeio. — Ela pulava animada no colchão.
— Sim, iremos, onde você quer ir?
— Ao parque Trice — disse sem delongas.
— Iremos ao parque, então.
Levantei-me para tomar os meus remédios dos quais fiquei totalmente dependente. Eles
eram os responsáveis por evitar que o meu corpo rejeitasse o novo órgão, eu os tomo
diariamente, sem pular um dia sequer.
Giulia me esperou no quarto enquanto tomei um banho para descermos para tomar café da
manhã.
— Aonde vocês vão tão arrumadas? — indagou o meu papà, já sentado à mesa e lendo o
seu jornal. Eu senti falta de vê-lo assim todos os dias.
— Ao parque, eu prometi a Giulia que a levaria.
— Tomem cuidado e não demorem.
— Tudo bem, papà, não vamos demorar.
Nos sentamos e comemos, ela estava eufórica, comeu apressada e logo se pôs de pé, me
apressando. Giulia ainda não conhecia a Itália, então olhava para tudo com admiração e me fez ir
a vários parques até mostrar sinais de cansaço e pedir para retornar para casa.
No início de noite, Antonella e Giovani vieram me visitar, eles eram os meus únicos
amigos, o papà deles trabalhava como diretor na empresa do meu papà, e ele sempre os trazia
aqui para passar o dia comigo.
— Garota, que saudade de você. — Antonella me abraçou forte assim que desci as escadas.
Giovani me olhou de longe e acenou tímido, as coisas estavam estranhas entre nós desde que ele
se declarou pelo telefone, costumávamos ficar horas conversando por mensagens e ligações.
— E você não vem me abraçar? — indaguei de braços abertos, e ele se aproximou ainda
tímido.
— Como você está? Senti sua falta. — Sua voz saiu baixa como um sussurro tímido.
— Giovani, não seja assim, somos amigos certo? — indaguei, dando uma leve batida em
seu ombro.
Eu costumava sonhar com o Giovani quando criança, eu o achava lindo e educado, mas
muita coisa mudou depois do transplante, era como se outra pessoa vivesse em mim, eu havia
mudado os hábitos e até adquirido novas habilidades que eu nunca tive contato. Pintar foi uma
delas, bastavam alguns minutos sozinha para que eu estivesse agarrada a uma tela ou até mesmo
rabiscando em um caderno de desenho.
— O que acha de fugir hoje e comemorar a sua volta em uma boate? — ela sussurrou, me
encarando com um olhar travesso.
— Como vamos conseguir? — indaguei, considerando impossível tal fuga.
— Tio, Beatrice pode ir dormir na minha casa hoje, vamos fazer a noite do pijama? —
perguntou com uma voz fofa e doce, o meu papà sorriu e assentiu com a cabeça.
— Mas os seguranças vão junto — nos lembrou.
— Tudo bem! — disse saltitante.
Estávamos no carro quando ela planejou toda a fuga, iríamos à boate no carro do Giovani e
voltaríamos antes que notassem a nossa falta. Eu nunca havia ido a uma boate, então, eu estava
bem animada com a ideia.
— Você é uma prisioneira agora? — Giovani perguntou, sorrindo depois de vários
quilômetros em silêncio.
— Quase isso! — confirmei, sorrindo de volta.
— Seu papà está cada dia mais possessivo. — Ele mostrou uma careta engraçada enquanto
pronunciava as palavras.
— Tenho pena do homem que resolver pedir a sua mão em casamento — brincou
Antonella, olhando de soslaio para Giovani.
— Não fale besteiras — ele disse, a repreendendo. — Chegamos, subam e armem tudo
para a fuga de vocês, eu espero vocês nos fundos.
— O nosso pai tem que achar que fomos dormir Trice, ele preza pelo emprego dele e não
vai querer ver o seu pai bravo.

***

Não foi fácil enganar o pai da Antonella e os meus seguranças, mas nós conseguimos e
encontramos Giovani nos fundos como combinado.
— É a sua primeira vez em uma boate, certo? — indagou como se não soubesse,
esperando que eu respondesse o oposto do que ele acreditava.
— Sim, você sabe disso. — Ele sorriu, me olhando pelo retrovisor. Ele gostava quando eu
afirmava o quanto ele me conhecia.
— Sim, eu sei, eu só queria ter certeza de que eu seria o primeiro a te levar a lugares
diferentes e ter experiências novas.
— É sério que vocês vão ficar de flerte? — Antonella torceu os lábios, revirando os olhos,
nós gargalhamos.
Ele estacionou em frente à boate, e nós duas descemos enquanto ele foi estacionar o carro.
— Você está nervosa? — indagou, tocando na minha mão suada.
— Um pouco. — Eu estava muito nervosa, eu nunca havia saído à noite nem para tomar
um sorvete na esquina.
— Trice, você não precisa viver como uma doente, você está bem agora, vamos começar a
viver, ok?
Giovani nos alcançou e nós entramos na boate, olhando tudo com muita atenção. O lugar
era imenso com uma atmosfera dark e sombria, e o cheiro de álcool invadiu as minhas narinas,
em seguida, o cheiro de cigarro me fez tossir várias vezes, eu dei voltas sem sair do lugar.
— Vai ficar tonta desse jeito — zombou Antonella.
— Que incrível! — foi a única coisa que consegui pronunciar. Uma sensação de liberdade
me invadiu e, em poucos segundos, o meu cérebro ignorou por completo o cheiro de cigarro que
tanto me incomodou e as luzes e a música foram as únicas coisas que eu consegui focar.
— Vem, vamos dançar! — Antonella me puxou para o meio da pista de dança.
Observei Giovani me olhando de longe, seus olhos sequer piscavam.
— Estou com sede, vou comprar algo para beber — falei, e ela balança positivamente a
cabeça.
— Quer que eu vá com você até o bar? — indagou ainda em movimentos dançantes.
— Posso fazer isso sozinha, não demoro — gritei, tentando soar mais alto que o som
estridente.
O bar não era distante, mas precisei vencer um mar de pessoas que se moviam feito loucas
até chegar ao local, e certamente precisaria de vários copos de água após o esforço que precisei
fazer para conseguir tal feito.
— O que uma garotinha faz em um lugar de adultos? — Olhei rápido para o lado de onde
vinha a voz.
Ele tinha um sorriso assimétrico assustador, o seu olhar era desconcertante e o seu intuito
foi de me deixar desconcertada.
— Não vejo por que isso é da sua conta — falei, virando as costas.
— Tens razão, bella ragazza, isso não é da minha conta. — Ele pegou uma mecha do meu
cabelo, a levando até as narinas.
Eu puxei os meus cabelos rapidamente.
— Cuidado, as noites costumam transformar homens comuns em predadores de carne
nova, porém, não se preocupe, este não é meu caso, já que não sou um homem comum. — Ele
acariciou o meu rosto, me deixando atônita, sem nenhuma reação diante de tanta ousadia.
— Não te dei permissão para tocar em mim — protestei.
— Não preciso de autorização para nada.
— Beatrice, vem. — Antonella me puxou apressada. — O que fazia com aquele homem?
Está doida? Ele tem cara de mafioso — falou, me levando para longe do homem e perto de
Giovani na pista de dança.
03
A herdeira do grupo Marino

Vincenzo Ferrari

Eu não tinha nada para fazer naquela noite, então, fiquei vendo a bella ragazza[1] a dançar,
ela era linda, cabelos compridos tão claros quantos os seus olhos verdes, um jeito sexy, uma boca
carnuda, seios fartos, e um corpo deliciosamente esculpido, mas não passa de uma garotinha
cheirando a leite. Continuei salivando por ela, que dançava sem notar a quantidade de lobos
famintos a olhando com desejo.
Eu tinha me tornado um homem pouco acessível depois que Anna foi morta. A minha
promessa voltou a valer, eu serviria a máfia, teria os herdeiros que eles tanto querem e, o
principal, eu me casaria para ter mais poder, e eu já selecionei algumas possíveis escolhidas.
— Você se agradou da ragazza? — Mattia, meu primo e consigliere da máfia, falou ao se
aproximar.
— Isso não é da sua conta.
— Vai ficar só olhando? — ele tornou a falar.
— Por que está preocupado? Cuide da sua vida.
Me afastei e voltei a olhar para a garota, algo nela chamou a minha atenção, ela se afastou
dos amigos, e eu a segui com um caçador que não tira os olhos da presa.
Ela parou em frente a um quadro imenso que não combina em nada com a boate, ele ficava
entre os banheiros, Anna o pintou. A garota olhava atentamente e só não o tocou por estar alto,
mas o seu dedo o contornou no ar, e eu me lembrei da minha falecida esposa, que costumava
pintar as nuvens ou as paisagens de forma imaginária com o dedo indicador apontado para o alto.
— Continua olhando a ragazza?
— Qual o seu problema, tirou o dia para torrar minha paciência — murmurei, irritado.
— Nunca te vi olhando tão concentrado para uma mulher que não fosse a… — desistiu de
falar —, deixa para lá.
— Preciso me casar, não preciso? — pronunciei, sério.
— Com uma mulher e não uma piccola ragazza[2], sem falar que não é uma das nossas. —
falou, me lembrando do dever de um Don em se fortalecer com conexões.
— Só estava me distraindo, primo, meu objetivo principal é encontrar o coração de Anna
— falei, e ele torceu o nariz.
— A filha do associado têxtil chegou à Itália depois de passar um tempo fora, tudo indica
que, no dia, ela não estava no país, não tem como ser ela — disse, dando notícias do caso que
havia dado ordens para ele investigar. Eu estava investigando todas as herdeiras dos associados.
— E Francesco? — Eu vinha procurando pelo consigliere do meu pai há anos, mas ele
havia sumido, evaporado, ele, sim, teria respostas para me dar, já que o meu pai estava morto e
enterrado.
— Não temos notícias dele, Don, o filho da puta sumiu no mundo, isso se também não
estiver morto, a família dele vive uma vida miserável.
— Já disse quero que se empenhem mais e me deem a porra do nome — gritei, esse
assunto sempre me deixava nervoso.
— Estamos tentando, Don.
— Tentar não é suficiente. Consiga!
— São muitos associados, na época, o tio realizava negócios com pessoas que nem
sabemos quem são — tentou se justificar.
— Vocês são inúteis — sibilei, enraivecido.
— Não vamos mais falar sobre isso hoje, olha lá a ragazza, é bem gostosa, não acha? —
perguntou, tentando mudar o meu foco do assunto
— É como você disse, é apenas uma garotinha — falei, me afastando, mas fui seguido por
ele. — O que você quer me seguindo? — O prendi contra a parede, o segurando pela gola da
camisa.
— Calmati, calmati[3]— O libertei, e ele soltou o ar dos pulmões, se recompondo.
— Parla presto[4] — ordenei.
— Estamos com um problema lá em cima, acreditamos que seja um espião russo.
— Vocês não conseguem resolver nada — pronunciei, subindo até o meu escritório.
Entrei na sala irritado.
— Então é você que está me fazendo trabalhar no meu dia de folga? — indaguei com
ironia.
O pobre miserável já estava mole de tanto apanhar e logo atrás uma mulher estava presa
pelas mãos em uma cadeira.
— Eu já disse tudo que sei, agora larguem-na, ela é italiana, não tem nada a ver com esse
assunto — suplicou.
Andei até a mulher, a levantando da cadeira pelos cabelos.
— Se importa com ela? — perguntei, puxando seu cabelo para trás, a fazendo gritar.
— Já disse, ela não tem nada a ver com isso — ele tornou a falar, mais desesperado que
antes.
— Comece a dizer o que interessa em vez de implorar pela vida dessa vadia. Troquem eles
de lugar — ordenei aos soldados. — Podem começar! — Autorizei a sessão de tortura,
começando por um saco na cabeça, eu gostava de vê-los buscando pelo ar, desesperados.
— Ela não tem nada a ver com isso — o homem gritou em desespero.
— A vida dela está em suas mãos. — Dei leves batidas no seu rosto.
— Vou falar! Eu vou falar! Parem! — gritou quando a mulher já estava sem forças.
— O Andrei quer o seu associado da indústria têxtil, por isso me mandou aqui — falou, se
referindo ao líder da máfia russa.
— O Marino? — Inclinei a cabeça para o lado, o estudando.
— Ele mesmo, a sua filha passou um longo período na Rússia, o Andrei se interessou pela
menina, mas não só por ela ser linda, e, sim, pelo poder que ele teria se unindo em matrimônio
com ela.
— Compreendo, irei visitar o mio amico[5].
O grupo Marino é o grupo têxtil mais importante em muitas partes do mundo, meu pai
sempre teve negócios com eles, são nossos associados há anos.
— Senhor, agora nos deixe ir — tornou a implorar.
— Nossos cachorros estão com fome, e não temos bastante carne aqui — falei, saindo do
meu escritório, ouvindo os gritos de desespero em seguida, o que é música para os meus ouvidos.

***

No dia seguinte, fui pessoalmente até o grupo Marino, tirar satisfações com Antônio
Marino e subi sem ser anunciado.
— Não se dê ao trabalho — falei, impedindo a secretaria de anunciar minha visita.
— Bom dia, senhor Marino!
Ele me olhou assustado, como quem vê um fantasma.
— Don, se deu o trabalho de vir até a minha empresa? Deveria ter me chamado e eu iria ao
seu encontro. — A sua voz saiu trêmula, era quase uma confissão de culpa.
— Eu estava com saudades do café que vocês servem aqui na sua empresa! — ironizei. —
Você sabe que eu gosto de visitar as pessoas que agem pelas minhas costas, não sabe? —
Dedilhei a mesa, o encarando.
— Eu nunca agiria pelas suas costas, Don.
Espalmei a mesa com força, os seus olhos se arregalaram apavorados.
— Qual seu assunto com os russos — questionei, exigindo a resposta.
— Com os russos? — quis saber e suspirou como se tivesse ficado aliviado com o assunto
que vim tratar.
— Sim, com os russos — confirmei, encarando-o e percebendo que ele tinha mais a falar
além de um acordo com os russos.
— Não tenho nada com a Rússia, sou fiel ao meu país, eu os sirvo há muito tempo, eu
nunca iria traí-los. — Sua testa brilhava de tanto suor. Ele me escondia algo, seu nervosismo o
entregou.
— Sabe o que acontece com quem nos trai? — indaguei enquanto mexia nos objetos sobre
a sua mesa, e ali estava em um porta-retratos, a garota que chamou a atenção de Andrei e, por
incrível que pareça, também chamou a minha.
— Quem são? — perguntei, curioso, reconhecendo a garota que estava na boate na noite
passada.
— Meus filhos! — respondeu, tirando o objeto da minha mão, visivelmente com medo de
que eu fizesse algo aos seus filhos.
Dei um sorriso malicioso.
— Qual a idade da sua filha? — perguntei, interessado.
— Ainda é uma menina, Don, tem apenas dezenove anos — ele enfatizou bem a idade para
não despertar em mim interesse por ela.
— O que a sua filha fazia na Rússia? — Ele levantou os olhos e me encarou assustado.
— Intercâmbio — respondeu sem pensar muito.
— Andrei a conheceu. Me diga como? — Inclinei o meu corpo em sua direção.
— Não sei do que está falando, não sei nada sobre Andrei. Eu nunca entregaria a minha
filha à máfia nenhuma, nunca tivemos tal acordo.
— Sabe que hoje você é o nosso principal associado, o grupo Marino é forte, seria uma
honra se eu escolhesse sua filha para ser minha esposa. — Ele me olhou apavorado, deixando
claro que isso não é de seu agrado, como acabou de dizer.
— Ela é apenas uma garota, não é alguém que possa domar fácil, as filhas da máfia são
criadas para servi-los, deve existir muitas opções que lhe acrescentariam status — falou,
tentando tirar de mim qualquer mínimo interesse na garota.
— Se eu a escolher, faça por onde ela ser obediente e, assim, ela terá uma vida longa,
nunca é tarde para educar os filhos, senhor Antônio. — Dei alguns passos para trás, me afastando
dele, que tinha uma expressão lamentável.
— Por favor, deve haver outras mais interessantes, minha filha estuda e tem um futuro
brilhante pela frente — implorou. — Posso lhe dar o que quiser, o quanto quiser — pronunciou
com desespero, prestes a se ajoelhar aos meus pés.
— Não acha que sou uma boa opção para sua filha? — indaguei, o erguendo pelos ombros
antes que os seus joelhos alcançassem o chão.
— Minha filha é apenas uma garota, deveria pensar em alguém mais madura — insistiu,
me irritando.
Esmurrei a mesa, o que o fez sobressaltar assustado.
— Deixarei uma coisa clara, não costumo perdoar traidores, qualquer ligação que tenha
com a Rússia, encerre, lhe darei um desconto porque é elegível para ser meu sogro. — Virei as
costas, saindo da sala.
— Me entreguem um relatório sobre a herdeira do grupo Marino — ordenei por mensagem
de voz ao meu primo Mattia quando estava a caminho do carro.
04
De malas prontas para fugir

Vincenzo Ferrari

— O que achou dela, Mattia? — perguntei com as informações de Beatrice em minhas


mãos.
— Quem diria que a garotinha da boate seria a filha do Marino. Você tem outra maneira de
controlá-lo? — perguntou.
— Não! Essa seria, de fato, a maneira mais eficaz.
— Traga a garota e case-se com ela. O grupo Marino é um dos mais importantes em
diversos países, isso vai nos manter no topo da indústria, e ele não negará a lavagem de dinheiro,
pois teremos a filha dele de refém — falou, me aconselhando.
— Você tem razão, vá até a casa da garota e a leve à médica, preciso saber se ainda é
virgem e se tem uma boa saúde para gerar filhos.
Ela não estava na minha lista, eu tinha várias opções que estariam prontas para o
matrimônio, garotas que foram educadas para ser a mulher do Don. É uma honra ter uma filha
casada comigo, eu sou um homem temido, poderoso e tenho o controle da Itália, a atitude do
Marino me deixou de orgulho ferido e bem irritado.

***

Beatrice Marino

Acordei com os gritos histéricos do meu irmão, que entrou no meu quarto como um
furacão.
— Beatrice, onde você esteve na noite que fugiu dos seguranças? — ele perguntou,
furioso.
— Eu fui a uma festa com Antonella e Giovani, se eu pedisse, não teriam me autorizado —
justifiquei antes que ele me questionasse sobre.
— Beatrice, você chamou atenção de alguém que não deveria, você precisa voltar para a
Rússia — meu irmão falou aos gritos.
— Sobre o que está falando?
— Don Vincenzo Ferrari — vociferou —, aquele sádico filho de uma figa. — Ele ficou
andando em círculos pelo quarto e, além de tonta, eu estava ficando amedrontada.
— Nunca! — meu papà exclamou aos berros, entrando no quarto.
Luigi é seis anos mais velho do que eu e sempre foi muito protetor, ele sempre foi capaz de
fazer tudo por mim e, para ele ter ficado assim tão nervoso, eu já sabia que o assunto era muito
sério.
— Ele esteve ontem na empresa, me acusando de traidor, e cogitou se casar com Beatrice
— meu papà pronunciou as palavras em desespero, e eu agradeci que a minha mãe tivesse
resolvido ficar na Rússia por mais um tempo, pelo estado em que eles estavam ela teria
certamente tido um enfarto.
— Ele deu certeza? — Luigi perguntou, angustiado. — Eu ouvi boatos de que ele a viu na
boate, ele gostou dela. Droga! — Ele chutou a cadeira da minha escrivaninha.
— Não, mas, pela cara que ele olhou para a foto, ele vai escolhê-la e sem falar que ele
soube que cogitamos entrar no mercado russo e nos juntarmos ao seu avô. — Eles ficaram
conversando entre si, ignorando totalmente a minha presença.
— Caralho! Não temos opção, ele matará todo mundo e ainda levará a Beatrice. — O meu
irmão andou todo o quarto novamente, sem tirar as mãos da cabeça.
— Beatrice, você não vai à faculdade hoje.
— Mas hoje é o meu primeiro dia de aula — argumentei de pé, ao lado da cama, mas ele
me ignorou, e eles voltaram a falar como se eu não estivesse no quarto.
— Temos que dar um jeito de livrar a sua irmã do Don.
— Acha que, mesmo com a cirurgia plástica, ele pode descobrir sobre o transplante? —
Luigi perguntou com muita preocupação.
— O que tem o meu transplante, que mal há se ele souber? — A minha pergunta pareceu
sem lógica depois que parei e analisei, porque eu me preocupei com essa resposta, tendo um
homem que havia deixado o meu irmão apavorado.
— Eu temo que isso aconteça. Aquele velho figlio di puttana[6] me enganou, disse que iria
me ajudar, eu não sabia que faria aquela atrocidade — eles falavam, me ignorando.
— Ele vai nos matar e transformar a vida de Beatrice em um inferno.
— Oi? Eu estou aqui, bem aqui e ouvindo tudo, vocês estão me deixando apavorada. —
Acenei com os braços levantados.
— Vamos mandá-la para longe, Beatrice — disse o meu irmão.
— Antes que Beatrice cruzasse o continente, estaríamos todos mortos — o meu papà
pronunciou com um suspiro derrotado.
Eu fiquei apavorada e corri para os braços do meu irmão.
— Me ajuda, fratello[7] — implorei, desesperada.
— Trice, eu tentarei te livrar desse homem. Vamos te mandar para outro país, mas, caso
ele consiga nos alcançar, nunca fale do seu transplante de coração, nós mudaremos as
embalagens dos seus remédios, nunca deixe que ele descubra, a plástica ficou perfeita, é
impossível ele saber, exceto se você contar a ele.
— O que acontece se ele descobrir? — O meu tom foi de curiosidade e medo.
— Ele pode querer matar a todos nós.
Arregalei os olhos, engolindo seco, eu lutei muito pela minha vida para morrer nas mãos
de um homem que eu nem conheço.
— O que eu faço? — questionei.
— Arrume as coisas, comprarei uma passagem para você ir embora.
O meu papà ficou parado, olhando o nada como se estivesse em choque, e o meu irmão
andou apressado pelo meu closet, recolhendo as minhas roupas, e as jogou na mala sem o
mínimo de organização.
Descemos em seguida, meu irmão pediu que arrumasse o carro para que eu fosse embora
naquele mesmo instante. Eu não queria deixá-los novamente.
— Signore[8], eles estão aqui, escondam as malas da senhorita. — Um dos guarda-costas
entrou apressado, falando.
A porta foi aberta de repente e um homem alto, de olhar debochado, entrou.
— Luigi, o Don mandou levar a sua irmã ao médico, precisamos fazer alguns exames,
antes da decisão final.
Me agarrei aos braços do meu fratello.
— Mattia, sente-se, vamos tomar uns drinques — o meu papà falou, indo até ele e o
guiando pelo ombro para que ele deixasse a sala.
Ele se desvencilhou dos braços do meu papà e andou diretamente para a mala por trás do
sofá.
— Pretendia o que com isso, Marino? — Ele abriu a mala e jogou tudo no chão.
— Eu voltei do intercâmbio há dois dias, separei essas roupas para as empregadas… —
Antes que eu terminasse de falar, ele virou-se para mim com um olhar furioso e bateu no meu
rosto. Caí no chão, enquanto o meu irmão partiu para cima dele, mas foi contido pelo meu papà,
que o puxou pelo braço.
— Tem muito a aprender, ragazza. Quando homens estão conversando, as mulheres não se
metem. Não educou bem a sua bambina,[9] Marino? — O seu tom foi de deboche, mas o seu
olhar era furioso.
Luigi o encarou com ódio, ele trincou os dentes e cerrou os punhos.
— Vamos, não pegue nada, vá apenas com a roupa do corpo. — Ele se agarrou ao meu
braço, me puxando para a saída.
— Por que a pressa? — Luigi questionou entredentes.
— Foi ela quem o Don escolheu, e ela irá agora, caso pensem em querer mandá-la embora
novamente. Terei que informar ao Don o que aconteceu aqui, já que a ordem era para levá-la
apenas para fazer exames. Vamos, anda logo! — Ele me empurrou em direção à porta.
— Mattia, vamos conversar, peça que Don venha aqui e a leve depois dos exames e do
pedido — o meu papà implorou, mas ele não lhe deu ouvidos, qualquer ação parecia inútil.
Fui jogada no carro e segui em silêncio e com a cabeça baixa encostada na porta todo o
caminho, grudei o máximo que pude nela, tentando me manter distante do homem que me bateu
e me arrastou como um cão que ele puxou pela coleira. Levei a minha mão algumas vezes ao
meu rosto, a minha pele ainda queimava pelo tapa.
Levantei a cabeça assim que o carro parou e encarei a mansão três vezes maior do que a
dos meus pais. O lugar era de uma beleza indiscutível, o verde do jardim com pontos coloridos
pelas flores formava uma bela pintura como em uma tela em branco.
Fui arrastada para fora do carro e levada para dentro da casa como um animal, meus olhos
se arregalaram diante de tanto luxo, mas logo minha atenção se voltou para aquele homem
parado ao pé da escada que levava aos tantos outros andares da casa. Ele tinha semblante escuro
e uma aura negra. Embora ele fosse fisicamente atraente, seus cabelos tinham um corte baixo, e a
sua barba, bem-feita, seus olhos verdes eram lindos, mas refletiam escuridão e agonia.
— Por que a trouxe? Essa não foi a ordem que eu dei — falou com uma voz tempestuosa,
e senti as mãos do homem que ainda me segurava pelo braço tremer.
— Ela estava de malas prontas para fugir — ele abriu a boca para justificar.
— Solte a garota — ordenou com um tom autoritário, baixando por completo o ego inflado
desse monstro que apertava o meu braço, como se quisesse arrancá-lo.
— Levem a garota para um quarto e peçam para a médica vir até aqui amanhã cedo —
falou frio, sem olhar nos meus olhos.
Fui levada por outros homens que me conduziram pelas escadas. Meu coração disparou e
eu olhei para trás quando me dei conta que ele foi o homem do bar que zombou de mim no bar
da boate.
05
Ela é só uma menina

Vincenzo Ferrari

— Você esqueceu quem dá as ordens, Mattia? — O deboche correu pelas minhas palavras
e meus ouvidos ansiaram pela resposta.
— O papà e o irmão iriam mandá-la embora. — Ele tornou a se justificar.
— A pergunta não foi essa, Mattia. — Inclinei o meu corpo para ele, que desviou o olhar.
— Claro que não esqueci, Don, é você quem dá as ordens — ele pronunciou contrariado,
contendo a raiva, ele é extremamente insolente e preciso lembrá-lo sempre quem é o Don.
— E por que caralhos a menina está aqui na minha casa se a minha ordem foi comunicar a
minha decisão e levá-la ao médico? — indaguei em um tom calmo, e é a minha “calma” que
mais assusta quem quer que resolvesse tirar a minha paciência.
— Me desculpe, Don, não farei mais nada desse tipo.
— Acho bom que seja assim, Mattia, somos primos, seria uma pena ter que punir você. Vá
embora!
Antes mesmo que ele cruzasse a saída da sala, um dos soldados entrou.
— Senhor, o Marino está aqui, no seu jardim.
Respirei fundo, tentando mais uma vez conter a minha raiva.
— Que porra ele quer a essa hora da manhã na minha casa. — Saí para recebê-lo no
jardim.
— Don, me deixe ver a minha irmã — implorou, se aproximando.
Levantei a mão, e ele parou no caminho, entendendo que não queria que ele prosseguisse
com os seus passos.
— O que te faz pensar que pode vir até a minha casa sem ser convidado?
— Como ela está, Don? — indagou, sem considerar o que havia acabado de perguntar.
— Volte para casa e aguarde ser convidado, lhe garanto que terá uma recepção melhor que
essa da próxima vez. — Virei as costas.
— Seu filho da puta! — Eu estava prestes a entrar em casa quando as palavras suicidas do
meu futuro cunhado me fizeram recuar.
— Que porra está fazendo, Luigi? Está querendo que eu te mate?
— Ela é só uma menina.
— Ah… bonito da sua parte, veio proteger a irmã, mas, de certa forma, me sinto ofendido,
qualquer um gostaria de unir-se a minha família. — Dei de ombros, o encarando.
— Ela é uma menina, Don — tornou a falar.
— Cortem a língua dele, acho que é o mínimo que a minha mãe merece. Puta? — falei,
virando as costas e ouvindo os seus gritos.
— Beatrice, Beatrice!
— Parem — ordenei, retornando para ele, que se debatia nas mãos dos soldados.
— Dessa vez deixarei passar, Luigi — falei, dando leves tapas em seu rosto. — Mas não
volte aqui sem ser convidado.
Fiz sinal com as mãos para o colocarem para fora e tornei a virar, indo em direção à
mansão.
— Espera. — Seu tom de voz foi uma súplica e, mesmo que eu nada sentisse em relação ao
seu desespero, parei no meio do caminho e retornei.
— Espero que diga algo útil, estou perdendo a pouca paciência que tenho — alertei.
— Entregue essa mochila a Beatrice, são algumas coisas dela e fotos para que ela se sinta
melhor, mesmo longe da família.
Acenei com a cabeça e um soldado pegou a mochila das suas mãos.
Subi até o quarto da minha futura esposa e a vi sentada no canto da parede, em posição
fetal, ela abraçava as pernas com tanta força que todo seu braço ficou vermelho.
Beatrice era uma garota linda, o cheiro da sua inocência me excitava, o tom verde dos seus
olhos estava na cor de verde-musgo e as suas mechas loiras caíam pelo ombro. Os meus olhos
percorrem a sua boca carnuda, e eu me excitei quando ela se pôs de pé, assustada, cruzando os
braços sobre os seus peitos firmes. Ela parecia ter sido moldada pelo mais devasso dos anjos,
pois a garota é pura luxúria.
— Olhe para mim — ordenei em um tom firme, e ela obedeceu, mesmo que todo seu corpo
tremesse e ela mal pudesse se manter de pé.
— O seu irmão trouxe isso. — Joguei a mochila sobre a cama
— A minha mochila. — Ela andou apressada para pegar da mão do meu soldado.
Levantei a mão, a impedindo de prosseguir, e ela parou de imediato.
— Jogue o conteúdo na cama — ordenei ao soldado sem sair do meu lugar.
Os seus olhos se arregalaram, e a pupila dilatou, o que me deixou desconfiado sobre o
conteúdo da mochila.
— Mais que porra é essa, você é doente? — indaguei, furioso, quando os fracos de
remédio caíram sobre a cama. A última coisa que eu queria era uma esposa doente.
— Sã-o pa-ra dor-mi-r. — Suas mãos tremiam e ela gaguejou, tentando pronunciar as
palavras.
— Insônia? Não é de se admirar, considerando que é uma garota mimada e não faça nada
da vida, deve ter muita energia para ser gasta. Prometo que lhe ajudarei com esse problema e
dormirá as noites feito uma pedra de tanta exaustão.
Os seus lábios tremeram de medo e as lágrimas caíam pelo seu rosto.
Terei que resolver essa questão, afinal, não quero uma garota choramingando enquanto
trepa comigo. Ela está aqui para três finalidades, manter o pai dela na rédea, me dá herdeiros e
me deixar satisfeito, embora esse último ponto, duvido que ela conseguirá.
— Amanhã a médica virá avaliar se você ainda serve para se casar comigo — falei,
virando as costas e a deixando sozinha no quarto.
Saí de lá e fui direto para a casa em anexo onde mantenho duas mulheres que tirei dos
bordéis da família, eu as escolhi a dedo para me servirem.
— Mio Signore? — Alessia falou, vindo se esfregar em mim como uma cadela no cio.
— Onde está Carina?
— Ela ainda dorme, Don.
— Ajoelha — ordenei, passando o dedo polegar em sua boca.
Ela obedeceu de imediato, abri a minha calça, colocando o meu pau ereto para fora e
introduzi tudo em sua boca, enrolando minha mão em seus cabelos, ditando:
— Isso, chupa gostoso, vadia, vai! Isso… — Aumentei a velocidade, fodendo com força,
seu rosto ficou vermelho, causado pelo engasgo que meu pau fazia, chegando até a sua garganta.
— Vou gozar, bebe tudo! — ordenei. — Gostosa — falei depois que ela engoliu toda a porra.
Vesti a minha calça e me sentei no sofá.
— Não quero vocês circulando pela mansão, estão proibidas de entrar na casa.
— Por quê? — Alessia sempre foi atrevida.
— Isso não é da sua conta. Só obedeça às minhas ordens e avise à outra.
Voltei para a mansão e me sentei na varanda do meu quarto, estava condenado a essa
merda de vida, e levarei aquela infeliz comigo, embora me casar não estivesse nos meus planos
antes de encontrar a mulher que guarda o coração de Anna, a única mulher que amei.
06
Tire a roupa e deite-se

Beatrice Marino

Acordei com batidas fortes na porta e me sobressaltei da cama, assustada.


— Abra agora! — ele gritava.
Não cheguei a tempo para atender as suas ordens, em poucos segundos, ouvi o barulho de
várias chaves e a porta estava aberta. O homem que me trouxe entrou por ela e estava com um ar
furioso.
— Não a tranque novamente, aqui não é a sua casa, se o Don quisesse te visitar à noite? —
indagou, furioso.
Eu nada falei e torci o lábio, esperando que ele cansasse de tantas reclamações.
— Signore, me deixe a sós com a ragazza, preciso fazer os exames.
— Estou aqui no corredor, chame se precisar de algo.
Ela fechou a porta logo depois que ele saiu, mas não a trancou, conforme as ordens dadas.
— Então, você é a bella ragazza que se casará com o Don? — Ela sorriu simpática. —
Tome o seu banho e retorne, vou lhe esperar para os exames.
Expulsei o ar dos pulmões com força e andei em direção ao banheiro, ela parecia uma boa
pessoa, se ela notasse algo sobre o meu coração, ou sobre os remédios, iria suplicar que ela não
falasse nada.
Retornei do banho, me sentei na cama e esperei que ela me dissesse o que fazer.
— Tire a roupa e deite-se, quero ver se ainda é virgem, embora eu não duvide que seja,
será um exame rápido, talvez sinta um leve desconforto, mas não irá doer — me assegurou.
Eu estava nervosa, mas facilitei para ela e fiz tudo que me pediu sem protestar.
— Pronto já, terminamos, vou colher só um pouco do seu sangue. O seu futuro marido
quer ter filho. — Forçou um sorriso.
— Eu espero que eu não possa gerá-los — sibilei, virando o rosto para encarar o nada.
— Beatrice, esse é o seu nome certo?
— Sim, é o meu nome.
— Olha bem nos meus olhos. — Olhei de imediato. — Eu vou diariamente consultar
mulheres casadas com integrantes da máfia, eu poderia dizer que sou a médica oficial delas,
então escuta o meu conselho, não o deixe zangado — ela sussurrou com receio que fosse ouvida
pelo homem do outro lado da porta.
— Por que está me dizendo isso?
— Você é jovem, uma piccola ragazza, não quero ter que voltar aqui e cuidar de uma
garota machucada.
Deixei que uma lágrima escapasse dos meus olhos.
— Bom, preciso que me entregue uma amostra do remédio que toma para dormir. — Ela
se levantou, indo direto à mesa de apoio e colocando as cápsulas de amostra em um saquinho.
— Não precisa, são para dormir. — Atravessei a cama e puxei a embalagem da sua mão.
— Beatrice, me entregue, se é apenas isso, não tem por que temer.
Me sentei na cama em lágrimas, apavorada, eu senti que o meu coração pararia naquele
momento.
— O que tem para me contar?
— Nada. — Entreguei a embalagem em sua mão. — Me ajude — implorei.
— Para que eles servem? — indagou, apertando os olhos, os examinando.
— Não posso contar. — Minha voz saiu embargada.
— Não vou poder te ajudar se você não me contar — advertiu. — Precisamos confiar uma
na outra, certo?
Torci os lábios e expirei com força, eu não tinha alternativas, ela descobriria de qualquer
forma.
— Tenho problema cardíaco — disse, omitido a principal informação.
Ela arregalou os olhos como se eu tivesse dito algo grave, colocou a mão na minha boca.
— Tudo bem, não fale mais sobre isso, ok?
Ela se levantou, recolheu tudo e deu uma leve batida na porta para anunciar a sua saída.
Me joguei na cama e lamento a minha falta de sorte de ter parado nessa situação.

***

Vincenzo Ferrari

Eu tomava o meu café da manhã enquanto aguardava a médica descer. Ela veio na minha
direção e ficou de pé na minha frente.
— A garota é virgem — afirmou, me trazendo satisfação.
— Faça exames de fertilidade e, sobre os remédios, me traga um laudo do laboratório.
— Será feito, Don — disse prontamente.
— Tem algo para me contar? — indaguei diante da sua expressão, ela estava visivelmente
segurando o choro. — Ainda não se acostumou com o nosso mundo, doutora? — Sorri.
— Não é isso, signore — justificou com a voz embargada.
— Saia! — ordenei, voltando a dar atenção ao meu café com leite que esfriava.
— Obrigada! — disse, virando as costas.
— Cheguei a tempo para o café da manhã? — A voz animada não poderia ser de outro a
não ser do meu fratello, Lorenzo, que havia acabado de voltar de uma missão dada a ele. —
Querido primo — ele disse, indo em direção a Mattia, que desviou do abraço.
— Não me venha com abraços — resmungou.
— Aquele carro era da Nina? — indagou com um sorriso ébrio de luxúria.
— Sim, era a doutora, veio examinar a minha noiva.
— Noiva? Foram apenas alguns dias fora. Quem é ela? — perguntou como o intrometido
de sempre.
— Fez o que ordenei — quis saber, mudando para o assunto que realmente me interessava.
— Já foi feito, Don — disse, sem me surpreender com a sua eficiência, ele não foi
escolhido para ser o subchefe apenas por ser o meu irmão, ele era competente, embora vivesse de
forma que eu julgava ser despretensioso.
— Perfeito!
— E aqui está a prova. — Entregou o telefone, me mostrando vídeos.
Gritos, choros e palavras desesperadas clamando pela vida, eu amava esse som.
— Todos mortos, conforme solicitado. Tudo virou cinza e eu fiz questão de triturar cada
osso e assoprar os restos mortais para o inferno. — Gargalhou.
Olhei satisfeito. Ninguém ousava me desafiar, poderia se considerar extinto da terra, eu
caçaria cada um de seus descendentes, e assim como farei com ela, queimarei a todos, e só ela
ficará ao meu lado, até a última batida do coração que me pertence.
07
Ele é um demônio

Beatrice Marino

Os dias foram passando e eu me sentia em um presídio. As minhas refeições eram feitas no


quarto e eu não tinha autorização para descer ou circular pela casa, mas a porta precisava estar
sempre aberta caso o Don resolvesse vir até mim, o que, graça a Deus, não aconteceu. Eu olhava
as fotos da minha pipoquinha e sentia uma dor enorme no peito, eu não tinha acesso ao telefone,
o que me ajudaria a aliviar a dor que se instalou em meu peito.
— Aqui está a sua comida. — A empregada de sempre entrou, pôs a bandeja sobre a mesa
e arrumou os alimentos nela em seguida.
Eu nunca puxei assunto, e ela também nunca falou nada além de “aqui está a sua comida”.
— Olá, buongiorno[10]. — Forcei um sorriso, tentando mostrar simpatia.
— Aqui, está tudo pronto, bom apetite. — Virou as costas, indo em direção à porta.
— Você pode me ajudar com algo? — indaguei, e ela parou no meio do caminho, virando-
se para mim.
— Sim? O que seria? — Encarei-a pensativa, mas não o suficiente para que notasse que eu
não sabia o que pedir.
— Pode me ajudar a escovar os meus cabelos, sinto que tem muitos nós, a minha mãe
costumava me ajudar quando isso acontecia. — Dei de ombros.
Ela expulsou o ar dos pulmões com uma expressão insatisfeita.
— Sente-se, vou ajudá-la com isso.
Me sentei e fiquei observando-a pelo reflexo do espelho, ela não parecia uma pessoa ruim,
talvez só mal-humorada.
— Faz dias que estou presa aqui, me sinto sozinha às vezes, e sinto mais falta ainda de ter
alguém para conversar.
— Não temos autorização para conservar com a senhorita.
— Ah…. Então é isso. — Suspirei, aliviada. — Achei que você não gostasse de mim. —
Vi um sorriso discreto surgir em seus lábios.
— Me desculpe, não queria lhe passar essa impressão. Mas o Don não costuma perdoar
erros e nos pune severamente pelas nossas falhas.
Meu corpo paralisou.
— Eu não queria te assustar, mas aquele homem é o próprio diabo. — Ela levou a mão à
boca e me encarou assustada. — Tirei todos os nós, senhorita.
Ela colocou a escova sobre a penteadeira e saiu do quarto apressada.
— Sério? Eu nem tinha notado — murmurei para mim em voz alta, apenas pensar havia se
tornado chato e, depois de uns dias, eu já estava conversando comigo em frente ao espelho.

***

— Beatrice, vista-se adequadamente e desça, o Don a espera na sala principal da mansão.


— Eu não pude ver a dona da voz, ela pronunciou do outro lado da porta e, em seguida, ouvi
passos apressados se afastando.
Levantei-me e peguei o primeiro vestido dentre tantos outros que havia no closet. Embora
a clausura estivesse me enlouquecendo, descer e encará-lo parecia ainda pior. Um frio atravessou
a minha espinha.
Saí do quarto com medo, não sabia se estava fazendo algo errado, mas um homem parado
ao pé da escada me olhou acenando positivamente, me encorajando a continuar e, de lá do alto,
eu já podia vê-lo sentado em uma poltrona com um ar presunçoso.
— Me siga! — ordenou, pondo-se de pé assim que desci o último degrau.
Eu o fiz sem retrucar, senti que as minhas pernas recusavam a me obedecer em alguns
momentos e os meus joelhos se inclinavam para frente, como quem foi acometido por uma
fraqueza.
Ele entrou em uma sala imensa, tinha alguns livros em uma estante no canto por trás de
uma imensa mesa de vidro, mas não era uma biblioteca, parecia uma sala de reuniões, pois a
mesa tinha vários blocos de papéis distribuídos em frente a vários acentos.
— Parabéns, nos casaremos em alguns dias — ele disse, inclinado para frente com as mãos
sobre a mesa, ele não sorriu, ou demonstrou qualquer satisfação, e continuou falando: —, sente-
se, lhe apresentarei algumas regras de boa convivência nesta casa. Para começar, fale alguma
coisa, você me parecia bem destemida na boate — zombou
— Estou lhe ouvindo, signore — sussurrei assim que me sentei, seguindo as suas ordens.
— Ótimo, ouça com atenção. As regras dessa casa devem ser respeitadas, e eu detesto ter
que disciplinar as pessoas pelos seus péssimos comportamentos. — Um tom de deboche pode ser
notado em sua voz, acompanhado de um sorriso sádico, era nítido que ele gostava de causar
pânico e terror nas pessoas.
Ele levantou-se e andou lentamente em minha direção, parando ao meu lado por alguns
segundos, me encarando sem dizer uma palavra, virou-se, abriu um gaveteiro atrás de mim e
retornou com o meu celular nas mãos. Virou o aparelho para mim, o desbloqueando por leitura
facial.
— As senhas foram desativadas, não quero senhas no seu celular, pode usá-lo durante o
dia, à noite, entregue a um dos meus soldados para que ele o coloque neste móvel atrás de você.
Você pode circular pela casa, mas não vá à casa em anexo e nem ao jardim próximo a ela. Não
saia de casa sem que eu autorize, aliás, você não tem autorização para sair de casa.
— Mas eu… — Ele me impediu de continuar colocando o dedo indicador sobre os meus
lábios.
— E, para o seu bem, nunca me questione. — Ele se afastou de mim, tombou a cabeça para
o lado, apertou os olhos e fez sinal com o dedo para que eu levantasse.
— Devo sair? — indaguei, confusa, me pondo de pé.
— Vá até à porta e volte — disse, quase se sentado sobre a mesa.
Fiz conforme ele ordenou e, quando me virei, vi um homem salivar me olhando, tomado
pela luxúria.
— Apenas isso, faça o que quiser, conheça a casa, saia.
— Senhor, a minha faculdade — tomei coragem para falar o que eu tentei minutos antes.
— Apenas saia — disse de costas para mim, mas com um tom irritado.
Saí apressada da sala, encontrando com a médica no corredor, ela sorriu gentil para mim.
— Beatrice. — Acenou.
Andei até ela cabisbaixa.
— Já sei que sou fértil, e a minha saúde é de uma leoa — ironizei.
— Se ele descobrir a minha mentira, eu morro no mesmo dia que você. Vamos até o jardim
— disse, andando na frente, e eu a segui.
Ela sentou-se em um banco lateral da mansão, ela conhecia bem o local.
— Vem muito aqui? — indaguei.
— Sim, eu costumo atender os soldados e as mulheres do Don.
Arregalei os olhos, quantas mulheres ele tinha?
— Mulheres? — indaguei, confusa.
Ela arregalou os olhos também por ter falado algo que talvez não devesse, mas logo soltou
o ar dos pulmões.
— Não falo de esposa, só existiu uma, e ela faleceu. O seu futuro marido é viúvo.
— No mínimo, ele a matou. — Não era para ter pronunciado alto, mas, como eu disse, eu
vinha perdendo o costume de falar em pensamentos.
— Não, ele não a matou, pode soar estranho, mas ele a amava muito, dizem que ele era
outro homem quando ela ainda vivia, mas que o Don, seu pai, não aceitava a relação dos dois.
Vincenzo acredita piamente que o pai a matou e foi por isso que fez o que fez.
— O que ele fez? — perguntei, curiosa.
Ela olhou para os lados e sussurrou:
— Dizem que ele queimou o pai vivo, mas antes ele o esquartejou e tocou fogo com o pai
ainda consciente.
Engoli seco, que tipo de pessoa faria isso?
— Ele é um demônio — sibilei.
— E o pai era o próprio diabo, dizem que ele gargalhou enquanto o fogo tomou o seu
corpo e amaldiçoou o próprio filho. Ele disse que o filho estava condenado a ser o anjo da morte
sem vida, com a alma cedida ao diabo, e que ele seria o instrumento do mal.
Cada pelo do meu corpo se eriçou, e um frio atravessou a minha espinha.
— Então, me conta, você tinha namorado? — ela voltou a falar com um ar tranquilo e leve.
— Não, eu nunca tive.
— Sinto pena de você, Beatrice, nós, mulheres, sonhamos tanto com a nossa primeira vez e
somos dadas e tomadas à força por homens que não sabem que nós também sentimos orgasmos.
Um conselho, abra as pernas, feche os olhos e se imagine em um campo florido que, em
segundos, tudo acaba, ouvi dizer que é sempre assim rápido, porém, nem sempre indolor.
— Nós? — indaguei, confusa.
— Prazer, Nina, em breve seremos cunhadas, estou prometida ao Lorenzo, o irmão, mas
novo do Don, ele é o subchefe, eu sou filha da máfia, nasci para servi-los. — Suspirou em
derrota, se levantando do banco. — E uma coisa, Beatrice, não o deixa descobrir sobre o seu
coração, as pílulas são ótimas para dormir. — Piscou os olhos, indo em direção à saída.
08
Os meus lábios não sentiram outros desde que Anna me deixou

Vincenzo Ferrari

Eu estava em um lugar escuro e silencioso. De repente, ouvi uma voz doce e familiar
chamando meu nome. Eu me virei e vi uma figura se aproximando lentamente. Era ela,
sorrindo graciosamente para mim. Eu tentei tocá-la, mas minhas mãos passaram direto por
seu corpo. Ela olhou para mim com ternura e disse:
— Você me encontrou? — Confuso, eu perguntei onde estávamos.
— Onde? Eu só escuto a sua voz — retruquei.
— Eu sabia que me encontraria, a nossa pipoquinha é linda e você precisa conhecê-la.
De repente, acordei assustado, com o corpo molhado de suor. Eu não pude acreditar que
tudo não passava de um sonho, era desesperador ouvi-la e não poder vê-la e tocá-la.
— Eu a encontrei? E como assim a nossa… — Tentei lembrar o nome que ela havia
chamado a nossa filha, mas fugiu da minha mente.

***

Desci e encontrei Lorenzo concentrado na janela da sala, ele nunca fica quieto por mais de
um minuto. Me aproximei sem que ele me notasse para checar o que prendia a sua atenção.
Beatrice tinha os pés na piscina, as suas mãos estavam viradas para trás e o seu rosto apontava
para o alto, me afastei e limpei a garganta, e ele virou-se assustado.
— Don. — Olhou-me desconcertado.
— Já tomou café da manhã? — indaguei, sentado à mesa.
— Ainda não, esperei por você.
— O que olhava com tanta atenção pela janela?
— Pela janela? — Mordeu o lábio. — Eu estava perdido em meus pensamentos.
— Viu a minha noiva? Preciso que ela se arrume, vamos até a casa dos pais dela informar
a data do casamento. Planejo fazer uma grande festa, quero que seja comentada por todos, enfim
vou me casar.
— Parece que o faz pela primeira vez — ele disse, desdenhoso.
— E daí que não é a primeira vez, dessa vez é diferente, são negócios, e bons negócios —
enfatizei.
— Eu não a conhecia, quem é?
— É uma Marino.
A sua boca se transformou em um O.
— Eu nunca a vi pela Itália.
— E para que queria vê-la?
— Por nada, Don, só foi um comentário genérico. — Deu de ombros.
Após alguns minutos, ela cruzou a porta, baixou a cabeça, desviando o olhar, e caminhou
em direção à escada.
— Beatrice, sente-se e coma — ordenei. Ela virou imediatamente, contradizendo o que
meu sogro havia dito, ela é bem obediente para uma menina que nunca viveu em meio à máfia.
— Coma alguma coisa e se arrume, vamos visitar os seus pais. Já os informei da visita, eles estão
nos esperando.
Ela abriu um sorriso pela primeira vez desde que a vi, e acredite, ela conseguia ficar ainda
mais linda.
— Sim, eu vou me arrumar — ela falou com as duas mãos sobre o peito, como quem
segura o coração que está prestes a explodir, e não demorou a levantar-se da cadeira e correr até
o quarto.
— Ela é uma piccola ragazza. — Ele riu. — Vai satisfazer você? Claro que vai. —
Mordeu o lábio respondendo a própria pergunta.
— Primeiro de tudo, ela é apenas cinco anos mais nova que você e, segundo ponto, devo
esquecer que é o meu irmão e mandar cortar os seus olhos fora por ousar olhar a minha noiva
com desrespeito?
— Nunca faria isso, Don — pronunciou, nervoso.
— Perfeito!
Beatrice desceu saltitante poucos minutos depois, com um vestido curto e fino, eu não
sentia ciúmes dela, mas eu me sentia incomodado pelos olhares de desrespeitos que eram
lançados para ela quando achavam que eu não estava olhando.
— Suba e vista algo mais composto — ordenei.
Ela parou no meio da escada e se olhou com os braços entreabertos.
— Não tem nada diferente disto.
— Não tem? — indaguei.
— Não. — Deu de ombros.
Olhei para Lorenzo, que me conhecia tão bem quanto a mim mesmo.
— Assim que estiver de volta, o responsável estará à sua disposição.
— Não demoro a voltar. Vamos, Beatrice.
Ela se colocou ao meu lado com uma boa garota, e me parecia que não teria problemas
quanto a isso. O carro estava pronto à nossa espera e, como imaginei, os olhares disfarçados para
ela me causariam desconforto.
— Vista isso. — Coloquei meu sobretudo sobre os seus ombros, e ela o vestiu sem
objeção.
O caminho até a mansão Marino foi curto e senti que, se demorasse um pouco mais, ela
entraria em crise de ansiedade no carro.
— Chegamos — pronunciou com euforia.
— Sim, chegamos.
— Minha bonequinha. — A mãe dela correu em sua direção e checou o seu corpo de uma
forma nada discreta.
— Acha que estou espancando a sua filha? — indaguei.
Ela lançou um olhar frio antes de responder.
— Claro que não, Don. — Arrastou as palavras, visivelmente contrariada.
— Mas o seu consigliere, eu já não sei, ele teve a petulância de bater na minha irmã dentro
da nossa casa.
Apertei os olhos e virei para encarar Beatrice.
— Eu estava com saudades. — Ela andou apressada, abraçando o irmão ignorando o
comentário feito por ele.
— Venham, entrem.
Logo mais à frente, parado na porta, estava o Marino, ele apoiou as mãos dentro do bolso e
nos aguardou.
— Bom, serei breve — disse, assim que entrei na mansão.
— Por que a pressa? Trata-se da minha irmã, temos o mínimo de direito sobre negociar
temos.
— Negociar termos? — Um sorriso debochado nasceu em meus lábios.
— Chega, Luigi. Vamos os três para o escritório, conversaremos entre homens — disse o
meu sogro.
Eu os acompanhei, mais por curiosidade do que viria dali. Quem ditava as regras e
determinava os termos era eu.
— Bom, Don, a minha filha estava prestes a iniciar a faculdade de arquitetura — ele
começa a falar assim que entramos.
— Aonde quer chegar, não faça rodeios.
— Deixa-a ir à faculdade — implorou.
— Não vejo aonde isso vai me beneficiar.
— Podemos entrar em vários acordos, diga-me tudo o que quer.
— É apenas isso que querem de mim? — Eu mantinha as mãos no bolso os estudando.
Eles se entreolharam e voltaram a me encarar.
— Tenho uma caçula, apenas cinco anos, ela é muito apegada a Beatrice, permita que elas
se vejam e que ela passe um final de semana com a irmãzinha.
— Terei que pensar a respeito, resolvam as questões do casamento, quero que seja breve
em sete dias.
— Tão rápido? — Luigi indagou com insatisfação.
— Sim, quanto antes melhor. Enviarei umas coordenadas, preciso que adulterem alguns
documentos, veremos o quanto vocês estão interessados nos benefícios que a Beatrice pode
obter.
— Claro, faremos o que o senhor pedir — disse Antônio.
— Obrigado, meu sogro.
Virei de costas e saí do escritório, indo à procura de Beatrice, ouvi risadas de criança vindo
do jardim, segui o som, atravessando os imensos corredores ornamentados com vários quadros
até chegar à porta que dava nos fundos. Vi Beatrice, rolando no chão com a tal criança.
— Trice, esse é o seu noivo? — indagou, eufórica, notando a minha presença e vindo em
minha direção.
— Espera, Giulia. — Ela correu atrás da criança, tentando contê-la
Ela levantou o dedo indicador e apontou para mim de forma audaciosa.
— Cuide bem da minha irmã e a traga para me visitar, você entendeu? — pronunciou as
últimas palavras com as mãos na cintura, ela era audaz, eu não poderia negar. — Você tem cara
de mal, mas gostei de você.
Me abaixei, ficando na sua altura, com o meu cenho franzido.
— O que disse?
— Senhor, perdoe-a, é só uma criança. — Beatrice a pegou no colo a fim de tirá-la
rapidamente da minha presença.
A imagem da criança não saiu da minha mente, algo nela me chamou atenção, me fazendo
perder o foco por alguns minutos do que eu estava fazendo ali, Beatrice entrou na mansão com a
mãe e a criança e eu as segui.
— Beatrice, pegue algumas roupas para você.
— Certo, farei agora mesmo. — Ela subiu apressada e desceu em poucos minutos,
arrastando uma imensa mala.
— Filha, se cuide, ligue sempre que possível. — A minha futura sogra me lançou um olhar
rancoroso e virou as costas, parando ao lado do marido.
— Até o casamento, então. — Dei de ombros, indo em direção ao carro.
— Don, pode me esperar só por um minuto, preciso pegar algo, não irei demorar.
Ela correu, entrando num quartinho próximo à área da piscina. Olhei o relógio algumas
vezes. Sete minutos, este era o tempo exato que eu a esperei até ir até ela contrariado e
impaciente.
— O que é tudo isso? — indaguei para mim. O meu coração acelerou com tantos quadros e
telas espalhados pelo quarto, na verdade, se tratava de um ateliê.
A observei sem ser notado, ela recolheu alguns cadernos de desenho que estavam sobre a
mesa e os guardou em uma mochila.
Ela tropeçou e sua mão tocou a tinta vermelha que, em poucos segundos, marcou o seu
rosto em uma listra quando ela tentou tirar as mechas que caíam pelos seus olhos. Ela sorriu de si
mesma, sorriso que me foi apresentado hoje pela manhã. Quando me notou, os seus olhos me
encaram de uma forma que só Anna fazia.
— Me desculpe, eu demorei — ela disse, levando a mão melada de tinta ao cabelo e o meu
coração parou por alguns segundos. Eu senti vontade de lhe jogar contra a parede e beijar a sua
boca. Os meus lábios não sentiram outros desde que Anna me deixou.
09
Ela não é italiana

Beatrice Marino

Vincenzo voltou todo o caminho em silêncio, não era como se ele conversasse comigo,
mas ele sempre estava no telefone, passando ordens do tipo: “mate” “prenda” “corte”, mas as
coisas pareciam estar pelo avesso naquele fim de tarde. Ele estava pensativo e de cenho franzido,
encarando a estrada que corria pela janela, e eu me peguei agarrada ao seu sobretudo, me
sentindo estranhamente aconchegada com o seu cheiro.
Ele desceu do carro sem sequer olhar para trás, subiu as poucas escadas que levam até o
interior da mansão, sumindo através da porta. Eu entrei em seguida e fui direto para o quarto, o
cheiro do sobretudo dele me deixou brevemente nostálgica, eu o larguei em um canto qualquer,
mas o cheiro ficou espalhado pelo meu corpo, uma depressão invadiu o meu ser, me trazendo um
misto de sentimentos. Percebi que as lágrimas corriam pelo meu rosto, e eu estava em soluços.
Levantei-me apressada, lavei o rosto e desci com um caderno de desenhos nas mãos.
Sentei-me embaixo de uma árvore, abrindo o caderno em meu colo, eu ansiava poder desenhar
essa paisagem e, de acordo com a imagem na folha em branco, eu sentia o meu coração bater
mais forte. No fundo do horizonte, eu podia ver vinhedos, eu senti vontade ir até lá.
— Olá, está tudo bem por aí? — indaguei para mim mesma com as duas mãos
pressionando o peito.
Tudo era estranhamente familiar, o cheiro da grama e os traços que acabei de fazer. Eu
havia vivido isso?
— Você desenha bem, o meu irmão já viu isso? — Virei-me assustada e o dono da voz
sarcástica logo surgiu atrás da árvore, onde eu estava sentada.
— Não tenho direito de desenhar?
— Não sou eu quem dito os seus direitos e deveres, por mim, pode rabiscar as paredes se
quiser. — Deu de ombro com desdém.
— Então, por que se intromete?
— Que língua afiada. Você já experimentou usá-la contra o Don? — Gargalhou.
Levantei-me apressada, limpando a bunda que ficou repleta de areia e andei apressada.
— Se eu fosse você, não iria até os vinhedos, logo escurecerá.
Franzi o nariz e andei sentido ao vinhedo, existia uma casa não muito longe de onde eu
estava, e eu caminhei até ela.
— Me perdoe, Don, eu não tive a intenção. — Os gritos de dor ecoavam pelo local.
Arregalei os olhos, reconhecendo a voz do Mattia.
— Do que não teve a intenção?
— De agir como se fosse o senhor — respondeu com desespero.
— A mão direita, Mattia. — O tom era de ordem.
— Por favor, Don, eu sou o seu primo. — A súplica veio acompanhada de um grito de dor
que causou um frio na minha espinha.
Em um impulso, eu andei em direção à casa e, em seguida, resolvi retornar para o pinheiro
onde estive sentada uns minutos atrás.
— Beatrice. — Enterrei os meus passos e olhei para trás quando a voz me chamou. — Não
se meta nisso, você nada pode fazer para ajudar ou sei lá o que tinha em mente. Ele não se
importa com ninguém, é apenas para reafirmar o seu poder, Mattia fez algo que não lhe foi
ordenado — disse Lorenzo.
Puxei o ar com força para os pulmões e corri até a mansão, eu senti os meus joelhos treme
e fui incapaz de subir; minutos depois, ouvi passos vindo em direção à imensa sala que Vincenzo
chama de escritório. Me escondi na sala da frente, eu pretendia ir para o meu quarto assim que
possível, mas retornei quando vi uma mulher ruiva e de corpo deslumbrante se aproximar e me
deixar curiosa sobre quem era ela.

***

Vincenzo Ferrari

Eu limpava as minhas mãos cobertas pelo sangue de Mattia, como ele ousou bater nela? A
raiva me consumiu, eu me concentrei em considerar que toda a minha ira era devido à sua
audácia ou estupidez em achar que pode agir como se pudesse prever as minhas ordens. Se
Beatrice precisasse ser disciplinada, eu deveria fazer, seriam as minhas mãos a pesar sobre ela.
Voltei para a mansão e me afundei na poltrona do meu escritório. Eu queria me concentrar
em outra coisa, mas eu continuava lembrando do olhar que Beatrice lançou para mim, eu
consegui ver a Anna com perfeição em sua expressão. Balancei a cabeça negativamente,
tentando afastar os pensamentos da minha cabeça. Ouvi baterem à porta.
— Posso entrar? — indagou Lorenzo, colocando a cabeça na porta entreaberta.
— Entra.
— Mattia ficará um bom tempo sem poder trabalhar, poderia ter se vingado em outras
partes do corpo ou jogado água quente em apenas uma das mãos — disse, se servindo uma
bebida.
— Não me importo, ele precisa voltar ao lugar dele. Tenho notado presunção em suas
atitudes. É um mau que não pode crescer, preciso podá-lo a tempo, antes que os seus galhos
invadam o meu espaço.
— Enfim, terei que fazer o trabalho dele por alguns dias — se lamentou.
— E o Francesco? Quem me o trouxer, vou lhe dar um cargo alto na máfia, vários
benefícios, e alguns milhões na conta.
Ele se sentou, me encarando com os olhos esbugalhados.
— Um alto cargo? — Estreitou os olhos, me analisando.
— Não se preocupe, não será o seu.
— Deveria desistir disso, Vincenzo — pronunciou o meu nome, o que não acontece com
frequência. — O que fará com uma garota que teve a infelicidade de receber o coração da Anna?
— Ela pode ter sido vítima das circunstâncias, mas a sua família concordou. O meu pai
sabia o que estava fazendo, e todos sabem que tudo tem um preço.
— E o que fará depois que a encontrar? Vai estar casado e com filhos, o que considera
fazer?
— Que tipo de pergunta é essa? — Sorri com escárnio. — Beatrice é só uma peça de no
meu tabuleiro de xadrez, eu a movo para onde eu quiser, a hora que eu quiser, conforme as
minhas necessidades.
— Mio Signore. — Olhei para a porta de onde vinha a voz e Lorenzo também se virou.
— O que faz aqui? Lhe dei ordens para não vir — rosnei para Carina, que estava parada na
porta.
— Vou deixar vocês sozinhos — disse Lorenzo, saindo do escritório.
— Mio Signore. — Se aproximou, montando em mim.
— Saia! — Levantei irado e a arrastei pelo braço, atravessando a sala.
— Tive notícias do Francesco — pronunciou com urgência, e eu soltei o seu braço já roxo,
marcado pelos meus dedos.
— O que soube? — indaguei com a mesma urgência.
— Sei o quanto é generoso com quem lhe mostra eficiência.
Ela colou a mão em meu pau, e o apalpou.
— Me foda! — sussurrou, exalando luxúria, e esse cheiro é incrível.
Joguei o seu corpo sobre a mesa, deixando sua bunda bem empinada para mim, ela estava
de vestido e sem calcinha. Acariciei o seu clitóris e enfiei dois dedos em seguida.
— Eu te dei ordens para não vir a essa casa, Carina. — Bati com força em sua bunda,
deixando os meus dedos marcados.
— Me bate, preciso de um corretivo — disse, gemendo como uma cadela no cio.
Abri minha calça e deixei o meu pau duro como uma pedra aparecer. Segurei seus cabelos
enquanto eu penetrava com força, aproveitando como ela estava molhada e quente. Conforme
aumentava a força das estocadas, puxei ainda mais seus cabelos. De repente, tive uma visão de
Beatrice completamente nua na outra ponta da mesa com um ar virginal, abrindo as pernas e me
chamando para fodê-la. Lambi os lábios, sentindo o tesão me consumir até o limite. Com uma
mão apertando seu pescoço, puxei a ruiva de pernas longas e a coloquei de joelhos, fodendo sua
boca com vigor e assistindo às suas lágrimas escorrendo dos olhos. Finalmente, cheguei ao
clímax dentro de sua boca.
— Delícia — gemi. — Engole tudo, deixa limpinho, isso, isso.
A soltei no chão, arrumei a minha calça e me sentei atrás da minha escrivaninha.
— Diga o que sabe e como conseguiu a afirmação.
— Uma amiga, que, por acaso, conheceu o Francesco, ela trabalhava na boate onde o seu
pai costumava ir, ela disse que Francesco estava sendo ameaçado por saber muitas coisas do seu
pai, ele está escondido na Sicília.
— Acha que está me dizendo algo que eu já não sei? — Espalmei a mesa com força.
— Mas o que você não sabe, Don, é que a garota é russa.
Apertei os olhos e gargalhei em seguida.
— Russa? Que cacete você pensa que está falando? O meu pai disse que ela se casaria
comigo.
— Mas o que o senhor não sabe Don é que ela não é italiana de sangue-puro e que os
russos têm olho nela, o seu pai queria muito mais do que poder.
— Como sabe de tudo isso? — Olhei desconfiado.
— O seu pai disse em uma transa coletiva, eles falavam sobre isso, o seu pai e o antigo
consigliere, ela ouviu.
— Quem é ela? Eu a quero aqui, agora — ordenei.
— Infelizmente ela foi encontrada morta hoje pela manhã, depois que me contou tudo pelo
telefone.
— Foram muitos anos, por que não me contou sobre ela? — Levantei-me irado, indo em
sua direção, apertei o seu pescoço com ódio.
— Ela nunca me disse que conhecia o seu pai — pronunciou rouca e com dificuldade, a
soltei, empurrando-a para o chão.
— Me passe o endereço dela. — Ela anotou com urgência enquanto a sua outra mão
acariciava o pescoço. — Lorenzo — gritei da porta.
— Sim? — Ele surgiu na sala em poucos segundos.
— Vasculhe esse endereço e, quanto a Carina, mostre a ela como sou intolerante à
desobediência.
Ela arregalou os olhos, se ajoelhando aos meus pés.
— Mi signore, tenha piedade — implorou.
— Sinto muito, Carina, mas eu lhe dei uma ordem, e ordem deve ser seguida. Não quero
vê-la novamente, Lorenzo.
— Não! Não! Mi signore, me perdoe.
Subi e entrei no quarto de Beatrice, que dormia tranquila, caminhei até o seu caderno de
desenho aberto sobre a mesa e me assustei, vendo o que ela havia rabiscado. Rasguei a folha e
fui apressado até o quarto anexo ao meu, onde mantenho tudo do jeito que Anna deixou, eu tinha
vários quadros dela pendurados nas paredes do quarto, olhei fixo para imagem do vinhedo que
ela desenhou sentada embaixo do pinheiro.
— Como isso é possível? — indaguei para mim. — Não viaje, Vincenzo, a paisagem é
linda e o pinheiro proporciona uma bela sombra. Joguei o papel em cima da mesa, coloquei o
quadro no lugar e desci para a sala. — Quero que coloque os quadros da Anna nas paredes
novamente — ordenei a um empregado.
Ele me olhou surpreso, mas assentiu com a cabeça. De todos os quadros que a Anna
pintou, só um estava exposto na boate, se tratava de uma dançarina que ela desenhou em um
momento em que me acompanhou ao local para uns compromissos. Lembro de ela ter vindo com
o quadro pronto e dizendo:
— Amore mio, deixe a pintura no salão, ficou linda.
E mesmo que não combinasse em nada com a decoração do local, eu sempre fazia o que
ela me pedia.
10
Estou ansioso pela lua de mel

Beatrice Marino

Abri os olhos, alarmada, assim que ele deixou o meu quarto, o meu coração batia forte, eu
podia senti-lo querendo sair pela boca. Ele iria matá-la. Dei voltas no quarto, eu precisava fazer
alguma coisa, não, você não precisa, Beatrice. Pensei que eu poderia ser a próxima, ela falou de
uma mulher com duas nacionalidades, ela disse com todas as letras.
Coloquei o meu casaco sobre o vestido e desci, a sala estava vazia e não encontrei
obstáculos. Ele certamente a levaria para casa que vi mais cedo em meio aos vinhedos, e eu corri
até lá, sem saber ao certo o que eu estava fazendo.
— Lorenzo, eu imploro, fale com o Don.
— Para de falar, Carina — ele gritou.
Ouvi os soluços vindos da mulher, que continuava implorando.
— Não, Lorenzo, você não é igual a ele, Lorenzo, por favor. Eu vou sumir, eu juro, vou
sumir.
— Sinto muito, Carina.
Ele a puxou para fora da casa. Ela estava toda amarrada e ele jogava gasolina nela, que
continuou as súplicas.
— Lorenzo, deixe-a ir. — Me joguei em sua frente, recebendo um banho do líquido que
ele jogava nela.
— Está louca, Beatrice? Saia!
O seu telefone tocou, e eu usei o tempo para tentar tirar as cordas que a amarrava.
— Vá embora! — Congelei, a ouvindo.
— Estou tentando te ajudar.
— Ele vai matar você também — Uma dor tomou o meu peito, eu senti como se estivesse
sendo pisoteado.
— Mesmo assim ajudarei você.
— Beatrice, chega! — Lorenzo voltou a sua atenção a mim com fúria. — Ele ouviu a sua
voz e está vindo para cá.
Eu senti o pavor tomar conta de cada centímetro do meu corpo, mas eu já estava envolvida
em tudo isso e julguei ser impossível recuar.
— Problemas para executar as minhas ordens, Lorenzo? — A sua voz ecoou calma e
tranquila.
Eu perdi o controle nas mãos que tremiam enquanto encarava os olhos amedrontados da
mulher na minha frente.
— Beatrice está confusa, mas já está de saída. — Lorenzo me puxou pelo braço.
Ele sacou a arma e, sem tempo de súplicas, atirou contra a cabeça de Carina, que caiu
morta em seus pés.
— Rápido e sem tortura, você pode me agradecer na próxima vida — ele disse de forma
doentia, alisando o rosto da mulher que tinha uma poça de sangue crescendo embaixo dela.
Eu queria gritar, mas a voz não saiu e percebi que eu estava paralisada pelo medo.
— Minha querida noiva, quer partir tão cedo? Confesso que isso me deixa desapontado,
estou ansioso pela lua de mel.
Eu estava sentada no chão, e ele abaixou-se, ficando na altura dos meus olhos.
— Venha, vou te levar para casa. — A sua voz soou sem emoção.
— Não toque em mim — gritei, me arrastando pelo chão sem forçar para me colocar de pé.
— Não tire a minha paciência, Beatrice. — A sua voz reverberou e me esforcei para
levantar, buscando forças onde nem imaginei que tinha.
Corri sem saber exatamente o que estava fazendo, eu não poderia correr uma vida toda
dele.
— Fique parada bem aí, Beatrice. — Eu não tinha a intenção de obedecê-lo, mas não pude
dizer o mesmo das minhas pernas, que paralisaram com o comando, e eu caí de cara no chão
depois de perder o equilíbrio.
Ouvi os seus passos apressados em minha direção e fechei os olhos para o que viria em
seguida.
— Droga! — murmurou, me pegando nos braços e me jogando em seus ombros como se
eu fosse um saco de batatas.
Entramos na mansão, e ele subiu as escadas comigo ainda em seus ombros, me jogando na
banheira, eu não havia notado nada mais além do forte cheiro de gasolina, o meu corpo ainda
tinha sangue escorrendo por várias partes.
— Tire o vestido. — Olhei assustada, cruzando os braços no peito.
— Não!
Ele abaixou e arrancou o vestido em um único puxão e o jogou no lixo em seguida. Com a
ajuda da mangueira do chuveiro, ele me molhou, e eu, completamente envergonhada, tentava
cobrir as minhas partes que tinha apenas as roupas íntimas.
— Você precisa entender uma coisa, Beatrice — ele se abaixou, ficando de joelho do meu
lado. — Eu mando aqui, eu mando em você, e eu odeio ser contrariado. Tome um banho e
durma, não quero mais ouvir barulho seu hoje.
Deitei-me na água que ainda era rasa na banheira, me agarrei às minhas pernas e chorei
desejando acordar desse pesadelo.
***

O sol fraco, porém, irritante entrou pelas janelas que não possuíam cortinas grossas. Abri
os olhos de má vontade e fui sem coragem tomar um banho. A água gelada acordou a minha pele
de forma cruel, mas, ainda assim, o resto parecia estar morto.
Me troquei e desci. O meu futuro marido estava de pé de frente para uma das imensas
janelas da sala, ele falava ao telefone em um inglês, cheio de sotaque, eu não tinha a intenção de
prestar atenção, mas ele disse em um inglês perfeito como um nativo desta vez: “me caso
amanhã”.
Amanhã? — gritei em minha mente, encarando os seus ombros largos.
— Buongiorno. — Lorenzo surgiu na sala com o seu sorriso fácil pendurado nos lábios.
Fingi não ter ouvido e sentei-me à mesa, eu vinha adquirindo uma audácia, acreditava ser
pelo ambiente que me obrigava a todo instante me pôr em alerta.
— Beatrice, hoje você irá receber um estilista com alguns modelos de vestido. —
Vincenzo se aproximou, se sentando na ponta da mesa como um chefe.
— Por que a pressa? — Me fiz de desentendida.
— Nos casaremos amanhã.
— Pensei ter escutado que o casamento seria em sete dias.
— Mudei de ideia, para que esperar.
Eu levantei o rosto para encará-lo e ainda queria entender como os seus olhos podiam fazer
o meu coração disparar como se eu estivesse apaixonada. Nunca! Balancei a cabeça, afastando
de uma vez esses pensamentos insanos e sem lógica.
— Está tudo pronto para o casamento e os seus sogros já foram avisados. — Paralisei
quando ouvi a voz de Mattia, ele parou ao meu lado, mas não me direcionou o olhar. Contive o
grito horror que considerou sair quando vi a sua mão coberta por bolhas causadas por
queimaduras.
— Perfeito, Mattia, e sobre a questão dos fundos da mansão, cuide para que não me cause
problemas, se for um problema, elimine, sem fumaça.
Fui tomada pela curiosidade, o que tem nos fundos da mansão?
— Bom… Vamos, Mattia, ainda temos o assunto do Francesco para tratar — disse
Lorenzo, se levantando da mesa e nos deixando a sós.
— Como se sente? — indagou, mas não parecia se importar com a resposta.
Encolhi os ombros e voltei a minha atenção ao pote de geleia que eu tentava abrir usando
toda a minha força. Ele se levantou, parou do meu lado, girou a tampa usando apenas três dedos
e retornou ao seu lugar.
— Não tem nada a falar sobre o casamento?
— Não. — Se eu falasse, seria certamente morta.
— Perfeito.
O meu telefone tocou sobre a mesa, fazia um bom tempo que Giovani não me ligava, ele
parecia inconformado com a notícia repentina do casamento. Eu não podia dizer a eles quem de
fato era Vincenzo, embora fosse como se tivesse um letreiro preso na testa dele dizendo: sou
mafioso.
— Por que não atende? — indagou, vendo a minha hesitação.
— Me dê licença. — Levantei-me lentamente, esperando ordens para que eu ficasse e
atendesse ali onde eu estava, mas ele não o fez e parecia não prestar atenção nos meus atos.
Andei até a janela mais próxima da mesa e atendi.
— Giovani?
Ele ficou em silêncio por uns segundos. Parecia chorar.
— Vai mesmo se casar, Trice? — indagou com a voz embargada.
O meu coração quebrou-se em vários pedaços, eu costumava ter sentimentos por ele, e se
hoje eu não me sentia romanticamente atraída por ele, a culpa foi desse coração que fez todos os
meus gostos se tornarem secundários.
— Sinto muito. — Eu não tinha muito o que dizer.
— Espero que não se importe se eu não for ao seu casamento.
— De forma nenhuma, eu até prefiro que seja assim — disse em um tom abatido.
Olhei para trás e lá estava o homem que me acorrentou sem precisar de correntes, que me
arrastaria a um altar e a uma vida infeliz.
— Vou desligar. — Encerrei rápido a ligação, incapaz de continuar segurando as lágrimas.
Continuei de costas tentando conter os tremores que partiam dos meus pulmões já sem
força de conter o grito peso e as lágrimas ardiam em meus olhos.
— Notícia ruim? — Sobressaltei me assustando com a sua voz sussurrada em meu ouvido.
— A notícia ruim está parada ao meu lado — respondi, destemida, esperando a sua reação
descontente.
— Consigo ler os seus olhos, Beatrice. Eu sou ótimo em lê-los.
— Então consegue enxergar o quão destroçada está a minha alma.
— A sua alma? — A sua sobrancelha se arqueou e ele me encarou, fazendo gesto para que
eu continuasse a falar.
— Nunca ouviu falar que os olhos são o espelho da alma?
A sua boa ensaiou um sorriso e ele girou os pés, parando de frente a mim, usando o dedo
indicador para levantar o meu queixo, me fazendo encará-lo.
— O que vê nos meus? — indagou com escárnio.
— Nada! — respondi sem hesitar.
— Nada? — Sorriu perigosamente sexy.
— Você não possui alma.
Ele mordeu o lábio e, envolvido em uma aura de mistério e perigo, me respondeu:
— Você tem toda razão, Beatrice. Já faz um bom tempo que eu oferecia a minha alma ao
diabo e você está destinada a viver esse inferno comigo.
11
É o que nos espera, uma morte cruel

Vincenzo Ferrari

— O que te aborrece tanto nesse celular? — Lorenzo entrou no escritório sem bater.
— Quem é? — Arrastei o aparelho de Beatrice pela mesa.
— Como eu poderia saber? — Deu de ombros, se jogando na poltrona com o aparelho nas
mãos. — Devo descobrir? Giovani — leu o nome dele, seguido de um coração.
— Faça, quero saber quem é.
— Ciúmes do garoto? — zombou.
— Ciúmes? — Cruzei as pernas sobre a mesa, me recostando na cadeira. — Não.
Curiosidade.
Beatrice chorou por ele, o garoto não era um qualquer. Eu tinha coisas mais importantes do
que está procurando saber sobre a vida de um rapazote, mas, ainda assim, fui tomado por um
estranho desejo de ir a fundo nesse assunto.
Ele arrastou o telefone de volta pela mesa.
— Amanhã te darei todas as informações. Vi que mandou colocar os quadros da Anna de
volta nas paredes — falou, mudando de assunto.
— Sim, colocarei de volta. Por quê?
— Por nada, só achei estranho que, no momento em que deseja casar-se novamente, você
espalhe os quadros dela pela casa, ainda mais sendo a Beatrice uma artista tão boa.
Arqueei as sobrancelhas, analisando-o.
— Como sabe?
— Eu a peguei desenhando o vinhedo com tanta tenacidade que me lembrou a minha
cunhada.
Tirei os pés da mesa, endireitando a postura.
— Você também notou? — indaguei um tanto surpreso.
— O quê? Que ela desperta em você o mesmo interesse que você teve pela Anna ou que
ela tem atitudes e comportamentos bem parecidos? — O seu tom foi de zombaria.
— Não seja ridículo. — Levantei-me, saindo da sala com pensamento em ir até o quarto de
Beatrice.
Hesitei entrar, encarando a maçaneta, e me enfureci comigo mesmo por comparar a minha
Anna, eu certamente a fiz revirar no caixão de ciúmes e rancor por tal pensamento. O meu
coração é dela e nunca mais será de outra. Parei no corredor e me escorei no parapeito da escada,
os quadros de Anna aos poucos voltavam a dar vida a essa casa. Voltei a olhar para a porta do
quarto de Beatrice e então entendi a necessidade que senti em trazer a Anna de volta para essa
casa.

***

— Já vai, ainda está cedo? — Alessia sussurrou manhosa ao meu ouvido.


— Tenha um bom dia, Alessia. — Levantei-me e retornei para casa, depois de uma noite
aliviando meus piores instintos.
— Traindo a noiva nas vésperas do casamento? — Lorenzo gargalhou, me encontrando no
caminho de volta para a mansão.
— E você, aonde estava indo? Já sei, comer o que me pertence.
— Precisamos trazer mais, agora que Carina se foi, ela era a minha favorita.
— Apenas vá a um bordel.
Ele gargalhou.

***

Beatrice Marino

Já era manhã, mas o dia estava lúgubre, embora agora, dentro de mim, dissesse estar tudo
bem, eu ainda sentia um tormento na alma gritando que eu estava em perigo e devesse fugir.
Após um banho demorado e quase sem ânimo para encarar a vida que me aguardava depois do
sim nesse fim de tarde.
— Signora. — As batidas leves na porta do quarto me trouxeram a minha dura realidade.
— Sim? — indaguei sem abri-la.
— O estilista está aqui — a funcionária informou, abrindo a porta desta vez.
— Buongiorno. — O homem de roupas espalhafatosas e um andar engraçado entrou no
quarto. — Você está péssima, o seu maquiador vai ter muito trabalho com você hoje.
Forcei um sorriso, tentando ser simpática e fingir que ele não sabia o que estava
acontecendo aqui.
— Esse é o seu vestido de noiva. — Ele colocou o vestido sobre o sofá e inclinou a cabeça,
me analisando. — Você é mais magra do que imaginei que seria olhando pela foto, mas tem uma
bela cauda e um farto par de seios fartos. Isso é bom.
Eu ri da forma que ele pronunciou as palavras.
— Ele é lindo, pode ajustar o quanto considerar ser mais apropriado.
— Que noiva desanimada. Ânimo. — Ele bateu palma e parecia que ele havia realizado
uma mágica onde fez surgir vários funcionários enchendo o quarto de flores e todos os aparatos
para me deixar pronta para o casamento.
O café da manhã foi servido no meu quarto, uma mesa imensa com frutas, pães, geleias,
sucos, café e chás.
— Você é uma ragazza de sorte, fisgou o Don. Todos vão te olhar com inveja hoje e não
só pela sua nova posição que muitos cobiçam, mas por conta disso aqui.
Ele abriu um estojo de veludo. As joias eram magníficas, mas não preenchiam o vazio que
eu sentia.
Quanto mais as horas passavam, mais mortificada eu me sentia, embora algo dentro de
mim ainda fazia meu coração palpitar e a minha mente traíra me trazendo imagens daquele
sorriso e aquele olhar que estranhamente me atraem. Eu não fazia ideia de onde vinha isso, a
minha razão gritava insanavelmente “fuja”.
— Magnifica! — disse o estilista, fechando os últimos botões do meu vestido de noiva. —
São pedras preciosas — falou, se referindo aos botões. — Amanhã você verá os empregados
brigando para limpar o quarto da noite de núpcias, eles sabem que os noivos tendem a arrancar o
vestido e os botões se espalham por todas as partes.
— Você está me deixando nervosa.
— Rainha, sinta-se privilegiada de ter aquele homem todo para você.
Eu senti a minha garganta fechar, eu busquei o ar com urgência e necessidade.
— Preciso dar uma volta, preciso respirar. — Andei apressada, abrindo a porta e deixando
aquele quarto até perceber que não era ele que me sufocava e, sim, tudo, a casa, a situação, o
casamento. Me deparei com um mar de quadros, e as imagens me assombraram, eu sonhava com
elas quase todas as noites, eu as pintei em diversas telas espalhadas pelo meu ateliê.
Eu senti a minha mente girar e girar…. Como isso é possível? O meu coração acelerou, eu
pressionava o peito, sentindo uma dor fina, as lágrimas já não podiam ser contidas.
— Preciso sair daqui. — Levantei a barra do vestido que se arrastava pelo chão, tirei os
sapatos e saí pelos fundos da mansão.
As pessoas estavam entretidas com a ornamentação em frente à propriedade, enquanto eu
buscava um pouco de sentido em tudo que eu estava vivendo. Até que a casa mediana, escondida
entre pinheiros, me chamou atenção, me aproximei. Seria esse o lugar proibido?
— Olá! — Enterrei os meus passos, e virei para trás, meu cenho franziu, afinal, quem é a
mulher de pele clara e olhos cor de meu que agora sorri para mim.
— Quem é você? — indaguei, curiosa.
Ela sorriu com diabrura.
— Alessia, muito prazer. — Estendeu uma das mãos desocupadas, já que carregava
consigo uma cesta de frutas colhidas na propriedade.
Dei passos para trás, apertando os olhos, analisando-a
— Eu moro nessa casa, o que faz aqui? Achei que fosse proibida de vir. O Don deve ter te
dado ordens para não vir, assim como me deu ordens de não me aproximar da mansão. — Ela
andava até a casa, e eu a segui.
— E por que você mora aqui?
Ela sorriu novamente, me encarando com um olhar penoso.
— Volte para o seu casamento, Beatrice, e não se preocupe tanto com a lua de mel, eu
deixei o Don bem satisfeito ontem à noite.
Então é isso, era aqui que a Carina vivia, elas servem ao Don na cama.
— Não me olhe assim, Beatrice, eu também não posso sair dessa propriedade, assim como
você. Daqui só saímos mortas. Foi assim com a Anna, tadinha. — Ela suspirou lamentando.
— Tadinha por quê?
— Ela foi morta, Beatrice, e teve o coração arrancado.
As suas palavras me atingiram como uma bala, e eu caí sentada no chão.
— Coração arrancado? — indaguei para mim, mas o fiz em voz alta.
— É o que nos espera, uma morte cruel, se tivermos sorte, será como a Carina. — Deu de
ombros e virou as costas, me deixando sozinha estarrecida no chão.
12
Não farei nada que não queira

Vincenzo Ferrari

Tudo estava pronto, mas Beatrice ainda não havia descido, eu olhava para o relógio
impaciente. Esse ambiente.
— Onde está a minha irmã? — Luigi se aproximou, perguntando.
— Nunca ouviu falar que o noivo não pode ver a noiva antes do casamento? Estou igual a
você, esperando que ela desça — pronunciei, furioso.
Olhei ao redor e a movimentação entre os meus soldados estava estranha.
— Qual o problema? — indaguei, me aproximando.
— A senhorita tentou fugir.
Mordi os lábios, contendo a raiva.
— Onde ela está?
— Na casa do vinhedo.
— Chame o Lorenzo e o Mattia, informem o que está acontecendo e cuidem para as
pessoas perceberem, vou levá-la de volta pelos fundos.
Apressei os passos, assim que fiquei longe da visão dos convidados. Entrei na casa com
muito ódio.
— Não se aproxime — exigiu.
Olhei para ela com toda fúria e ódio que parecia que poderia matá-la a qualquer momento.
— Faz ideia do que está fazendo, Beatrice?
Caminhei até a figura pequena encolhida no canto da parede. Ela estava coberta de terra, o
vestido branco estava imundo.
— Quando você pretende me matar, depois que eu assinar os documentos e você ter
direitos sobre a empresa da minha família?
— Matar você não estava nos meus planos, mas acabo de considerar isso. — Me abaixei,
ficando na altura dos seus olhos. — Você acabou de me deixar furioso, Beatrice. — Levantei-
me, a puxando pelo braço. — Se você ousar gritar, eu acabo com cada um da sua família e,
quanto a você, posso te jogar em um bordel qualquer ou usar como isca para algum trabalho.
As suas pernas fraquejaram e com a força com a qual eu a puxava, acabei arrastando-a pelo
chão por alguns centímetros até pegá-la no braço, a colocando sobre o meu ombro. Ela parecia
morta em meus braços, não se movia e sequer fazia ruídos.
— Se recompõe, coloca outro vestido e desça rápido — disse entredentes.
— O que aconteceu com você, saiu deste quarto uma rainha? — indagou o estilista.
— E acho bom que você refaça tudo em menos de trinta minutos — falei, saindo do
quarto.
— Don, eu fico, quando ela estiver pronta, desço com ela — disse Lorenzo, me
encontrando no corredor.
— Certo, vou descer.
— O que aconteceu com a minha irmã, Vincenzo? — Interrompi os meus passos, virando
para encará-lo, deixando transparecer o ódio que eu estava sentindo.
— A sua irmã está bem, Luigi, você está me irritando ainda mais do que ela, se é que isso é
possível.
— Don… — Se interrompeu, hesitante.
— Seja breve, Luigi.
— Não tire a pureza da minha irmã — Os seus olhos estavam cheios de lágrimas e sua
expressão era lastimável.
— O que espera que eu faça? Devo cobri-la de cera e deixar a escultura enfeitando a sala?
Cacete! Luigi, você está me irritando.
— Não a force — suplicou.
— Eu prometo a você que farei a pequena Beatriz gemer enlouquecida e pedir por mais,
satisfeito?
— A noiva chegou! — Ouvi o anúncio de Lorenzo e virei para vê-la. — Que porra é essa?
— Se contenha, era o único que tinha — disse Lorenzo, que se aproximou de mim com
urgência.
— Foi você? — Cerrei os punhos.
Ele engoliu seco, confirmando. Os meus olhos percorreram por cada centímetro dela, o
vestido de Anna lhe caiu perfeitamente, subi os olhos e não vi mais a Beatriz na minha frente.
Anna caminhava em minha direção, e o seu ar triste me incomodou, ele sempre sorria ao meu
lado. Eu estava hipnotizado. Era incapaz de desviar os olhos.
— Estou aqui, satisfeito? — O seu olhar gélido me atravessou completamente.
Senti os meus joelhos tremerem, uma sensação que eu não sentia há muito tempo.
— Muito. — Alisei o seu rosto saindo da minha pose de durão.
— Então vamos terminar logo com isso.
— Terminar? Isso é só o começo.

***

Beatrice recebeu os cumprimentos com a mesma animação de quem acaba de ficar viúva.
A mãe e a irmã não vieram, eu considerei isso uma afronta, mas eu estava encantado demais para
criar caso nesse momento.
— Beatrice, vamos dançar — Ela me olhou um tanto surpresa, eu também estava, mas eu a
abracei e ouvi, senti a Anna ali comigo, o seu coração batia como no dia do nosso casamento. Eu
estava delirando e eu nem o álcool pude culpar, já que não pus uma gota na boca. — Acho que
está na hora de subir. A festa acabou para nós, ragazza.
Ela levantou os olhos e me encarou amedrontada. Subimos sem nos despedir, eu não queria
encarar a expressão enlutada do meu sogro e meu cunhado. Entrei e fechei a porta atrás de mim.
— Não farei nada que não queira, Beatrice. — Seu olhar parecia de alívio, porém, eu ainda
não havia terminado de falar. — Tire a roupa e se deite.
— Me disse que não faria nada que eu não quisesse — disse com um tom desapontado.
— Exatamente, Beatrice, me peça para parar e eu farei — falei, a agarrando e abrindo o
vestido em um único puxão, e todos os botões se espalharam pelo chão.
— Pare! — gritou, abusando do benefício concedido.
— Shi… — Pressionei os seus lábios com o meu dedo polegar, o seu corpo tremia. Desviei
os meus olhos da sua boca que me convidavam de forma insana para um beijo.
Pressionei a minha mão entre o seu peito, eu estava conectado a ela, me senti seguro para ir
além, fazer tudo sem culpa, sem remorso, era como se Anna estivesse ali dentro, me dizendo
estar tudo bem e que eu poderia fazer.
— Não vou machucar você — sussurrei. — Relaxe. — Voltei a encarar os seus lábios. Era
eu quem precisava relaxar. — Eu quero muito te beijar. — Pressionei novamente os seus lábios
com o meu dedo polegar. Sentei-me na cama, colocando-a em meu colo, sua pele estava gelada,
eu sentia o medo que exalava dos seus poros.
— Anna, eu sei que está aí, e que me diz que posso fazer — Ela me encarou confusa.
Eu a deitei na cama com delicadeza, pus a mão entre a sua escapular e desci até os seus
seios, abaixei a alça do sutiã e passei a língua pelo bico dos seus seios que estavam duros. As
minhas mãos exploram o seu corpo em cada centímetro, parando em suas coxas e fincando os
meus dedos nelas, subi até a sua virilha. Afastei a calcinha encharcada, e pressionei o seu clitóris.
Ela arqueou as costas, e dos seus lábios escapou um gemido tímido.
— Isso, gostosa! — Tirei a sua calcinha e volto a minha atenção para ela, trançando um
caminho com a minha língua. Levantei os olhos para analisá-la, os seus dedos procuraram os
meus cabelos, e eu subo, chegando até os seus peitos, que ela oferece arqueando o corpo. Uma
das minhas mãos descem e passam a estimular o seu clitóris, a sua intimidade estava encharcada,
quente, e ela completamente excitada apertando com força o lençol. Abandonei os seus peitos e
voltei a encarar a sua boca convidativa, e que estava me deixando louco.
— Vincenzo — gemeu, excitada, gritando o meu nome.
— Isso, chame pelo meu nome, eu te autorizo a fazê-lo. — A penetrei com um dos meus
dedos, um gemido de dor e prazer escapou da sua boca, boca essa que eu não consegui resistir,
enfiei a minha língua nela e mordi os seus lábios. Que delícia! A minha língua buscou a dela
com desespero e dependência.
Me agarrei as suas coxas, a puxando para mais perto do meu pau sedento por ela. Abri a
calça e coloquei o meu pau lambuzado e pulsando de desejo. Encostei na sua entrada e entrei
lentamente, sentindo a sua boceta apertada e encharcada. Urrei dentro dela.
— Que delícia! Gotosa para cacete. — Levei as minhas mãos aos seus cabelos e os puxei
para trás, suguei os seus peitos e entrei de uma vez, rompendo a sua virgindade. Abafei o grito
com mais um beijo, ela cravou as unhas em minhas costas, parei por um minuto esperando que a
dor cessasse e senti ela rebolando no meu pau pedindo por mais. — Isso, rebola, rebola mais
rápido. — Ela obedeceu, enlouquecida de prazer. Senti o seu corpo estremecer e ela gritou,
gemendo gostoso durante um orgasmo.
— Ai! Ah! — ela gemia ainda rebolando no meu pau.
— Eu vou gozar dentro de você, vou te encher de porra e depois vou te foder de novo e de
novo. Essa noite não teremos descanso, minha ragazza. — Eu a penetrei com mais força e a sua
expressão de prazer me deixou enlouquecido. Explodi dentro dela.
Caí ofegante ao seu lado, a camisa que eu ainda usava estava colada no meu corpo suado.
Eu havia acabado de fazer algo que eu não fazia há muito tempo. Eu e Beatrice fizemos amor.
13
Foi só sexo, Beatrice

Beatrice Marino

Acordei sentindo o meu corpo doer, mas, ainda assim, eu estava feliz, sentindo uma paz
estranha no meu coração. Eu me sentia na minha casa, ao lado do homem certo, e isso era
estranho e esquisito.
Ouvi baterem na porta.
— Buongiorno — Nina fala, colocando a cabeça entre a porta aberta.
— Entre. — Minha voz saiu animada, e ela apertou os olhos, me analisando.
— Hum… A noite foi boa? — ela indagou como quem não entende o que estava
acontecendo.
— Foi! — Senti o meu rosto queimar de vergonha. — Ele gosta de mim, eu senti isso —
disse com um tom romântico.
Ela mordeu o lábio inferior e me lançou um olhar preocupado.
— Você se apaixonou assim tão rápido?
Dei de ombros, me sentava no sofá ao lado dela.
— Você é doce, ingênua. Foi só sexo, Beatrice, eu duvido muito que ele sinta algo por
você. — Seus lábios se transformaram em uma linha dura.
— Ele me tratou bem. — Mordi o lábio, continuando um sorriso bobo. — E foi incrível.
— Fico feliz por você. Confesso que estive preocupada com a sua noite de núpcias, eu,
normalmente, vou até a casa das recém-casadas para lhes receitar remédios para machucados e
analgésicos.
— Me espere um minuto, tomarei um banho e desceremos para comer alguma coisa no
jardim.
Tomei um banho rápido, me troquei e descemos até o jardim. Fiquei desapontada de saber
que Vincenzo não estava em casa e que havia saído sem falar comigo, afinal, somos recém-
casados, eu esperei poder, no mínimo, acordar com ele ao meu lado.
— Precisa colocar os pés no chão e parar de sonhar — disse, constatando o meu
desapontamento.
— Eu não sei o que deu em mim, eu só o odeio e, de repente, ele se aproxima, eu o quero.
— Juro que achei que ele surtaria assim que te vi entrar com o vestido que a Anna se casou
com ele.
— Como assim? — indaguei, confusa.
— Aquele vestido, Anna usou quando eles se casaram.
— Anna?
Ouvimos uma gargalhada e nos viramos para olhar de quem se tratava.
— Oi, querida noiva, agora que o meu irmão se casou, podemos marcar o nosso
casamento. Estou ansioso.
Ela revirou os olhos, e eu fiquei confusa que tipo de relação existia ali. Eles não pareciam
se odiar. Lorenzo estava longe de ser um homem grosso, que gostava de bater em mulheres, e
Nina parecia ser dona de si.
— Eu sei que a ideia do vestido veio de você, Lorenzo.
Ela sorriu com deboche.
— Ela havia estragado o vestido, o que queria que eu fizesse? Só arrumei uma solução. —
Deu de ombros.
Aos poucos, a ficha ia caindo, ele delirou, ele me chamou de Anna, foi puro delírio.
— Onde ele está agora? — indaguei.
— Resolvendo umas questões. Não espere muito dele, Beatrice.
— Sim, eu sei. — A minha luz se apagou. Toda aquela animação que acordou comigo
escorreu junto a uma lágrima teimosa que percorreu a minha bochecha e que aparei rapidamente
com a mão. — Vou subir e deixar vocês sozinhos.
Me joguei na cama, me enfiando entre os travesseiros.
— O vestido era dela, por isso que ele me olhou com tanta ternura. Burra! Você é burra,
Beatrice, ficou toda comovida com a forma que ele te tocou. — Corri para o banheiro e molhei o
rosto e a nuca, tentando conter o calor que meu deu só de pensar na noite passada.
— Senhora, colocaremos as suas coisas no quarto do Don. — Ouvi uma das funcionárias
comunicar.
— Foi ordem dele? — indaguei, saindo do banheiro e me sentando na cama, aguardando a
resposta.
— Sim, foram ordens do Don.
Um sorriso bobo e cheio de esperança surgiu novamente.
— Certo, então leve tudo.

***

Vincenzo Ferrari

— Don, já encontraram o caminhão — disse um dos meus soldados.


— Perfeito! E Mattia, onde está?
— Ele ficou, disse que vai levar um dos suspeitos para o galpão.
— Certo, então vou primeiro.
Eu já tinha visto de tudo, mas nunca ouvi falar de caminhão sumir no meio da estrada,
ainda mais cheio de armas que são minhas. A pessoa que tenha planejado isso terá uma morte
terrível.
Cheguei em casa e fui direto para o escritório.
— Descobriu alguma coisa? — Lorenzo perguntou, entrando no escritório.
— Mattia foi atrás das pistas dos suspeitos.
— Ótimo. Fiz o que pediu, fiquei de babá da sua esposa. Nina veio aqui, deve ter
examinado ela, não sei.
— E sobre a mulher, a amiga da Carina?
— Não tinha nada lá, procure as filhas de todos os associados com descendência russa.
— Certo, realizarei o levantamento. — Ele foi até a gaveta e jogou um envelope sobre a
mesa.
— Sobre que se trata?
— Giovani de Lucca. Esse é o nome do namoradinho da sua esposa.
— Saia, me deixe sozinho.
Peguei o envelope, abri e joguei o conteúdo sobre a mesa.
— Ele não é ninguém importante — disse, jogando as fotos e as informações de lado.
— Don? — Olhei para a porta, de onde veio a voz.
Beatrice colocou a cabeça pela porta entreaberta.
— O que você quer? — indaguei com frieza.
Ela entrou, caminhou em minha direção e parou ao meu lado, me encarando tímida, e se
inclinou. Estava prestes a me beijar.
— Não é hora para isso. — Levantei-me, tentando evitar o beijo.
— Fiz algo de errado?
— Não, mas estou trabalhando — respondi, ficando de costas para ela.
— Claro, me desculpe. — Ouvi os seus passos em direção à porta. — Eu esperei acordar e
te encontrar na cama — disse, enterrando os passos.
— Eu trabalho, Beatrice, não posso ficar até meio-dia na cama. — Virei-me para encará-la.
Ela mordia os lábios e batia o pé direito contra o chão. — Mas alguma coisa? — indaguei,
percebendo que ela hesitava falar.
— Sobre ontem? — Ela desviou olhar e baixou a cabeça. — Voc… — Calou-se. — O
senhor… deixa para lá. — Ela tornou a andar em direção à porta.
— Somos casados, Beatrice — comecei a falar, ela parou, mas sem virar para mim. —
Mandei colocar as suas coisas no meu quarto, dormiremos juntos, acordar nem sempre será
possível, eu acordo muito cedo. Você foi esplêndida na noite passada, então, não se preocupe
repetiremos e é apenas isso.
— Apenas isso? — Virou-se com os olhos marejados de lágrimas.
— Não posso te oferecer mais do que isso.
— Serei apenas eu?
Apertei os olhos, analisando-a.
— Que pergunta é essa?
— A mulher da casa dos fundos.
— Foi até lá? — Encurtei a distância entre nós.
Esperei que ela dissesse que não, que não havia descumprido as minhas ordens.
— A Carina morava lá também?
Sorri sem humor. Zerei a distância entre nós e puxei-a pela cintura, a minha outra mão se
enrolou em suas mechas loiras e eu encarei os seus olhos verdes, que agora tinham a cor de uma
esmeralda.
— Você não deve questionar o seu marido sobre esses assuntos, Beatrice. — Fechei os
olhos, me perdendo em seu cheiro adocicado.
— Pretende mantê-la lá?
— Sim. — Eu queria dizer que só ela me bastava e que eu não pretendia tocar em mais em
nenhuma outra, mas não disse. — E isso não vai mudar nada entre mim e você. Na nossa cama.
— Eu sempre ouvi falar que os homens da máfia respeitavam as suas mulheres —
pronunciou, me desafiando.
— Do que reclama, Beatrice? — Toda aquela cobrança havia me deixado de pau duro.
Levei as mechas dos seus cabelos para um lado do pescoço, deixando o outro lado à mostra e não
resisti levando a minha boca até ele, o seu corpo estremeceu com o toque da língua.
— O que está fazendo? — murmurou.
— Você não sabe? — indaguei com malícia.
Levantei-a pela cintura, sentando-a sobre a mesa, me coloquei entre as suas pernas, as
minhas mãos subiram lentamente traçando um caminho pelos seus braços, apertei os seus peitos
ainda por cima do vestido e mordi o bico duro. Ela arqueou o corpo e gemeu abrindo as pernas.
— Foi isso que você veio reivindicar, Beatrice? — quis saber, afogando os meus dedos em
suas coxas. Afastei a sua calcinha, que estava encharcada, e usei quatro dedos para sentir bem a
sua boceta molhada e quente. Penetrei um dos meus dedos e trouxe até a minha boca. —
Deliciosa!
— Me beija! — implorou.
— Sim, mas em outros lábios. — Me coloquei de joelhos em sua frente, apoiando as suas
pernas sobre os meus ombros, beijei a sua boceta, a fodendo com a minha língua, e a penetrei
com um dos meus dedos. — Goze para mim — ordenei, a fodendo com força com dois dedos, e
foi instantâneo, ela agarrou-se aos meus cabelos, rebolando e pressionando a minha boca contra a
sua boceta deliciosa. — Isso, goze. — O seu corpo tremeu, e eu me coloquei de pé, abrindo a
minha calça. Coloquei o meu pau duro e melado de prazer, entrei nela sem aviso e a fodi com
força, puxando-a pela cintura para intensificar as estocadas.
— Vincenzo… — gemeu o meu nome e colocou os seus braços em volta do meu pescoço.
Ela lambeu os meus lábios e mais uma vez eu fui incapaz de resistir a sua boca deliciosa. A
minha língua encontrou a dela com voracidade, os meus movimentos dentro dela ganharam mais
intensidade e eu explodi em um orgasmo que me fez perder as forças. Me escorei na mesa,
ofegante e suado, e mais uma vez fui incapaz de cumprir a promessa de nunca mais beijar outra
boca.
14
A minha pipoquinha

Beatrice Marino

Não me lembro a hora exata em que adormeci, mas sei que esperei por Vincenzo até o
limite do meu cansaço, olhei para o seu lado na cama, e estava intacto. Ele não dormiu aqui.
Uma tristeza invadiu cada pedacinho de mim e instalou no meu coração, que parecia estar
sendo pisoteado, e ele estava.
— Como é idiota, Beatrice, como pode se apaixonar assim, tão rápido? Estúpida!
O meu telefone vibrou sobre a mesa, era uma ligação da minha casa.
— Alô?
— Filha? — A voz embargada da minha mãe deixou o meu coração ainda mais
destroçado.
A minha voz sumiu, eu não tive forças para responder, e ela continuou:
— Venha nos ver. Sei que terá que pedir autorização ao seu marido, mas faça o possível
para vir.
Era difícil para ela admitir isso em voz alta, dizer que eu precisava de autorização de um
homem para visitar os meus pais, certamente estava acabando com ela.
— Eu irei — garanti.
— Venha o mais rápido que conseguir. — Meu coração parou por alguns segundos, algo
estava errado.
— Mãe, por que não veio ao casamento?
— Filha, estou com problemas aqui em casa, e ele chama por você o tempo todo.
— Mãe, é a minha pipoquinha? — indaguei, percebendo que as lágrimas corriam pelo meu
rosto e eu estava prestes a soluçar.
— Trice… Ela está doente.
Eu sempre senti que o meu coração batia valente por ela. Ela não é a minha filha, mas o
meu coração é completamente dela.
— Estarei aí em alguns minutos. — Desliguei o telefone e corri para o banheiro, tomei um
banho rápido, me troquei e desci para procurar por Vincenzo.
— Aonde vai com tanta pressa? — Mattia estava sentado na sala quando passei correndo
por ele.
— Viu o Don?
— Qual a urgência?
— Preciso ir até a casa dos meus pais.
— Sinto muito, mas terá que esperar, o Don precisou sair.
— Pode tentar contato com ele? Preciso muito ir agora.
— Claro, farei isso por você.
Ele pegou o telefone e digitou.
— Deixe-me falar — pedi.
Ele me mostrou a sua mão aberta, me pedindo para esperar.
— Don, a sua esposa precisa visitar a família, e gostaria de lhe pedir autorização. — Ele
encerrou a ligação e pôs o telefone no bolso. — Ele não voltará tão cedo, mas disponibilizou um
soldado para levar você até a sua família.
— Jura? — indaguei, incrédula, mas não questionei. — Obrigada. — Corri até o jardim
com ele em meu encalço.
— Leve a senhora até a casa da família dela, o Don autorizou.
Ele acenou positivamente com a cabeça e abriu a porta para mim.

***

Vincenzo Ferrari

— Mattia! O que faz aqui parado na porta? Venha, vou até o galpão, arrancaremos daquele
infeliz quem está por trás do roubo das armas.
— Claro, vamos agora mesmo, Don.
— Quem saiu? — indaguei.
— Não faço ideia, acredito que algum soldado foi resolver algum assunto pendente.
— Viu a Beatrice?
— Não a vi, ainda deve estar dormindo, nunca vejo a sua esposa antes das onze da manhã.
Ele tinha razão, cheguei a pensar em lhe dar atividades para que ela não se sentisse tão
entediada, mas depois pensei que ela já devesse viver dessa forma, sem muito o que fazer ao
longo do dia.
— A noite do nosso convidado foi animada? — indaguei a Mattia.
— Sim, me encarreguei disso pessoalmente.
— Buongiorno — falei com sarcasmo, entrando na casa do vinhedo.
O homem mantinha o ar petulante mesmo depois de passar a noite sendo torturado e não
ter sequer uma unha em suas mãos.
— Bastardo! — Cuspiu próximo aos meus pés.
— Devo confessar que você é bem forte, mas me diga o quanto a sua filha aguentaria? —
perguntei com as duas mãos no bolso da minha calça social.
— Não toque na minha família — disse entredentes.
— Não tocarei, é só me dizer o nome da pessoa que você está protegendo. Quem é? Quem
foi o desgraçado que ousou me roubar?
— Eu não sei, ele não aparece, eu sou só um subordinado.
— Se não falará devemos apenas arrancar a sua língua, o que acha? — Acenei com a
cabeça, dando ordens para que fosse feito.
— Espera! — gritou. — Eu ouvi um nome.
— Não venha com mentiras — Mattia gritou, indo na direção do homem. Eu o contive
com a mão em seu peito.
— Diga!
— Luigi — sibilou.
Eu gargalhei.
— Sabe quantos ‘Luigis’ existem no mundo? — Apertei o seu pescoço com ódio.
— Com quantos deles o Don tem uma dívida que ódio? Ele maquinou o roubo, contratou
homens, e todos eles têm algo contra ao Don. É mais que receber dinheiro, é vingança.
— Pegue a faca, Mattia — ordenei.
— Vai me matar porque eu disse a verdade?
— Vou matá-lo pela sua afronta e petulância. Você me odeia? Por isso que se juntou a
eles? Pois bem, começarei podando os galhos, até chegar à raiz e assim evitar que novos
cresçam.
Estalei os dedos, e os soldados ao redor ficaram prontos para cumprir as ordens.
— Cortem a língua dele, coloque em uma caixa com gelo e queimem o resto.
Mattia parecia feliz com o fim do homem que ele disse que traria, mas não o fez. Voltou de
mãos vazias.
— Don, irá procurar pelos outros? — indagou.
— Claro — respondi, sem entrar em detalhes.
Mattia, como meu consigliere, deveria ser o meu homem de total confiança, mas há muito
tempo que não me sinto assim. Luigi é alguém que preciso ficar de olho, eu não conheço a sua
capacidade, preciso fazer uma visita ao meu cunhado.
— Tragam o meu carro e me entreguem a caixa com o resto daquele pobre coitado.
— Onde planeja ir? — Mattia perguntou.
— Mattia, você está dispensado por hoje. Tire o dia e resolva os seus assuntos.
— Claro, Don.
— Para onde vamos, senhor?
— À casa dos meus sogros.
15
deixe-me levá-la comigo

Beatrice Marino

— Minha menina linda, como você está? — indagou minha mãe, vindo me abraçar assim
que o carro estacionou em frente à mansão.
Ela andou em círculo em volta de mim, me analisando dos pés à cabeça.
— Eu estou bem, mãe. Quero saber como está a Giulia.
— Ela vem tendo febre, ela sente a sua falta, Beatrice, vocês nunca ficaram separadas e
você sabe que algo especial liga vocês duas. — Ela colocou a mão em meu peito.
— Eu quero levá-la comigo — pronunciei em lágrimas.
— Eu deixaria que a levasse com você — disse, me abraçando, e nós duas choramos. —
Vamos entrar.
— Onde está Luigi e o papai?
— Já foram para a empresa, mas devem voltar para o almoço.
Subi até o meu antigo quarto, era lá que estava a minha pipoquinha linda, enrolada entre os
lençóis, abraçada a um travesseiro e vestindo com uma camiseta minha.
— Giulia — chamei-a.
Ela virou-se com um semblante caído e a boquinha rachada.
— Trice? — Uma lágrima solitária escorreu pela sua bochecha. — Me leva com você.
— Sim, eu levo você comigo. — A minha mãe me olhou preocupada, ela sabia que o meu
pai seria contra essa ideia.
— Você jura? — Sentei-me na cama, e ela se arrastou até mim e deitou a cabeça em meu
colo.
— Sim, vamos falar com o papai.
Alisei a sua pele quente, uma dor imensa atravessou a minha alma.
— Eu te amo, minha pequena.
— Beatrice? — Virei em direção de onde vinha a voz. O meu pai estava parado em frente
à porta e abriu os braços.
— Eu estava com saudades. — Me encolhi em seu abraço. — Por que não me disse que a
Giulia estava doente no dia do casamento?
— Você já tinha as suas preocupações. — Eu vi a dor em seus olhos e o quanto ele se
sentia impotente.
— Está tudo bem, eu estou bem como pode ver. — Girei em sua frente.
— E, por dentro, como você está? — O sorriso falso que pendurei quando o vi sumiu.
Eu não fazia ideia de como eu estava por dentro, eu me sentia confusa, Vincenzo estava
longe de ser o que eu havia sonhado para mim, mas ele, inexplicavelmente, fazia o meu coração
palpitar feliz apenas com um olhar.
— Estou bem, pai — afirmei sem muitos detalhes. — Vou convencer o Don a me deixar
levar a Giulia comigo.
Um sorriso amargo se formou em seus lábios e ele andou em direção a Giulia.
— Não posso negar, é o destino devolvendo as coisas para o seu devido lugar —
murmurou para si. — Convença-o e a leve com você, ela tem sofrido muito com saudades suas.
Eu não imaginei que ele aceitaria tão fácil, e parece que nem minha mãe acreditava
naquelas palavras.
— E a faculdade? — ele indagou.
— Não pensarei nisso por hora, sei que levará tempo até que o Don me veja como alguém
que ele pode confiar.
Mais uma vez vi a tristeza se instalar em seus olhos, é difícil, para mim, também admitir
que um homem que havia conhecido há poucos dias pudesse decidir sobre as áreas da minha
vida. Mas eu só tinha duas alternativas, lutar contra ele e o que o destino me traçou, ou mudar a
minha nova realidade. O Don precisava me amar.

***

Vincenzo Ferrari

— O que esse carro faz aqui? — perguntei para mim mesmo quando vi um dos meus
carros parado na porta.
— Senhor — o meu soldado disse, arrumando a postura.
— O que faz aqui? — Apertei os olhos, analisando-o.
— Vim trazer a senhora para visitar os pais.
— Quem deu ordens para ela vir? — indaguei entredentes.
— Mattia disse que o senhor havia autorizado — afirmou com a voz trêmula.
Cerrei o punho e entrei na mansão.
— Beatrice — entrei, chamando-a.
— Don? — Luigi vinha de outro cômodo e me encontrou na sala.
— Onde está a Beatrice?
— Eu ainda não a vi, acabei de chegar do escritório, ela deve estar vendo a Giulia lá em
cima.
Eu esqueci completamente o que eu havia ido fazer lá e subi atrás da Beatrice, como se a
sua desobediência fosse a coisa mais importante do que um milhão em armas que eu havia
perdido.
— Beatrice — esbravejei.
Ela era a única pessoa capaz de me tirar da minha postura calma e alterar a minha
expressão sempre inexpressiva.
— Don? — Ela se sobressaltou, virando-se para mim.
— Venha, vamos embora. — Eu não cumprimentei os meus sogros, parados próximos à
cama, foquei apenas em Beatrice.
— Precisamos conversar antes de ir. — Ela andou apressada na minha direção.
— Faremos isso em casa. — Puxei-a pelo braço, a arrastando para fora do quarto.
— Solte-a. — O grito fino e fraco fez com que eu paralisasse os meus passos.
Beatriz se desvencilhou dos meus braços e voltou para o quarto, se debruçando na cama
para acalentar a garotinha.
— Está tudo bem, minha pipoquinha. — Ela se agarrou a criança que chorava em seus
braços.
— Pipoquinha? — murmurei, tentando me recordar onde ouvi essa palavra.
— Não toque nela — a criança gritou com audácia.
— Don, a minha irmã está doente — Beatrice pronunciou como uma súplica.
O olhar da garota encontrou o meu e eu senti um muro enorme sendo destruído dentro de
mim, mas precisei me manter firme para não demonstrar fraqueza.
— Seja bem-vindo à nossa casa novamente, Don. — Luiza, a minha sogra, falou.
— Seja breve, Beatrice, e desça. — Virei as costas, saindo do quarto sem respondê-la.
— Don. — A ouvi me chamar, e paro no meio do corredor, virando-me para ela.
— Luiza, deixe que converso com ele. — O tom do meu sogro para ela foi de repreensão.
— Não, eu quero fazer isso — ela retrucou.
Eu perdi a minha mãe muito cedo, mas lembro do respeito que tinha por ela.
— Fale, eu estou ouvindo.
Luigi estava ao pé da escada, ele é esquentado, protetor, mas o pai dele era quem dominava
o lar, e ele apenas observava tudo, pronto para uma reação típica dele se fosse necessário.
— Giulia está muito doente, ela tem febre todos os dias, pois sente falta da irmã, a garota é
adotada, a mãe dela morreu e…
— Cala a boca, Luiza — Antônio a impediu de continuar.
Órfã? Lembrei da minha filha e de não ter tido a oportunidade de vê-la, mesmo que morta.
— Aonde quer chegar com isso?
— Don, meu marido, por favor, deixe-me levá-la comigo. — Beatrice saiu do quarto e veio
em minha direção, ela implorou, deixando que o joelho tocasse o chão.
— Levante-se — ordenei, sem baixar o meu olhar para vê-la implorar aos meus pés.
— Que merda! Você não está vendo o que está causando, você está destruindo a minha
família, a vida da minha irmã — Luigi, então, se pronunciou.
Ele tinha, sim, motivos para querer criar um exército contra mim, e tudo isso que
aconteceu foi de grande valia, eu precisava agir em silêncio e esperar o momento exato, quem
ousou armar contra mim não ficaria impune e teria um fim lento e doloroso.
— Trice… — A voz fraca da garotinha surgindo no corredor me impediu de ter uma
reação contra Luigi, eu sentia algo diferente quando a via. Culpa e remorso, logo identifiquei os
sentimentos, eu não pude ter a minha filha nos meus braços, e essa menina... estava nítido que
ela tinha a Beatrice como mãe.
— Traga a menina, Beatrice, vou estipular o prazo que ela poderá ficar em minha casa.
16
O que você acredita que sou, Beatrice?

Beatrice Marino

— Vai deixar a Giulia ir? — meu fratello perguntou ao meu pai, que confirmou com a
cabeça.
— Luigi, a Giulia ficará só alguns dias — respondi, pegando-a no colo. — Vou organizar a
bolsa dela.
Na volta, Vincenzo foi em outro carro, Giulia estava animada, aninhada em meu colo.
— Vou morar com você, Trice?
— Veremos. — Sorri para ela enquanto alisava os seus cabelos.
— Que casa linda! — Giulia saiu do carro, admirada com o local. A nossa casa é linda,
mas a vinícola ao redor da propriedade do Don é encantadora.
— Don? — o chamei assim que o carro estacionou.
— Acomode a criança que parece ter melhorado milagrosamente e depois venha me ver
em nosso quarto.
— Sim. — Peguei na mão de Giulia e caminhei logo atrás dele.
Ela ainda estava com febre, mas agora dava para ver a felicidade em seu rosto.
— Ele está bravo? — Giulia indagou.
— Um pouco.
Ela se soltou da minha mão e correu, puxando Vincenzo pelo terno.
— Gio, vem aqui! — sibilei.
— O que quer? — questionou com uma voz irritada.
Ela fez um gesto com o dedo indicador, chamando. Ele virou o rosto para o lado oposto,
deu um longo suspiro e se abaixou, ficando na altura dela, que o surpreendeu com um beijo no
rosto. Ele se levantou, arrumando a postura, sua expressão dura havia se desmanchado.
— A menina ainda está com febre, Beatrice, leve-a para o quarto e chame a médica.
— Nina? — indaguei.
— Isso, chame-a.
Ele entrou na casa e eu corri até a Giulia, pegando-a no colo.
— Trice, esses são os seus desenhos? — Ela olhou encantada para os quadros pendurados
nas paredes.
— Não, só são parecidos.
Entrei no meu antigo quarto e a deitei na cama. Liguei para Nina, e ela chegou tão rápido
que eu poderia jurar que ela já estava a caminho da mansão.
— Que menininha linda — disse, entrando no quarto. — O que essa garotinha linda tem,
vamos ver.
— Nina, vou te deixar com a Giulia um pouco, não demoro.
Eu não sabia o que estava deixando Vincenzo tão irritado, mas caminhei temerosa pelos
corredores e coloquei a cabeça na porta entreaberta.
— Entre — disse sem nem virar, como se tivesse conseguido ouvir os meus passos pelo
corredor até aqui.
— Desculpe a demora, eu-eu… — começo a falar, mas gaguejo, e não tive a oportunidade
de continuar porque ele me interrompeu.
— Quem lhe deu permissão para sair de casa? — indagou, irado.
Dei de ombros, confuso.
— Você — respondi sem hesitar.
— Eu? — Ele se aproximou e inclinou o corpo em minha direção.
— O Mattia, ele ligou na minha frente e disse que estava tudo bem.
— Mattia? Olha bem para mim, Beatrice. — Ele passou a mão pela minha nuca, trazendo-
me para perto e colando o seu rosto ao meu. — Eu, somente eu digo o que pode, ou não, e eu
faço isso pessoalmente, consegue me entender?
— Perfeitamente. — Ele me soltou bruscamente.
— Da próxima vez, me procure.
— Era urgente, e eu fui apenas à casa dos meus pais. Por que age como se eu fosse uma
prisioneira? — indaguei, demonstrando um pouco de irritação.
— Você acha que é livre? Acredita que tudo isso é um conto de fadas? Eu pareço um
príncipe para você? — Ele sorriu com sarcasmo.
Não pude conter a lágrima que teimou em cair dos meus olhos.
— Você acredita mesmo que eu me importo com contos de fadas ou com o que você é ou
deixa de ser? Sou humana, eu não sou um animal para você manter preso. — Vi que a minha
afronta não o alegrava, ele me encarava furioso. — Você é um vilão? — Sorri com ironia,
enxugando mais meia dúzia de lágrimas.
— O que você acredita que sou, Beatrice?
— O que sei, Don, é que um vilão só é vilão quando a história é contada por um herói,
talvez ele apareça e salve a donzela em perigo.
— Não me afronte, Beatrice — ele rosnou, irado, e fechou os dedos ao redor do meu braço
com força.
— Você não faz ideia da vida que levei. Eu vivi presa numa redoma de vidro. A menina
doente, que não podia sequer pegar um resfriado e, quando começo a viver, você vem e me
prende de novo. Eu queria dizer que estou odiando tudo isso, essa casa, você, mas não é assim
que eu me sinto, o meu coração acelera quando estou perto de você, e eu sinto que ele bate por
você todos os dias e a cada segundo da minha existência.
Ele afrouxou as mãos em volta do meu braço e apertou os olhos, me encarando confuso.
— É estranho, eu sei, mas eu sinto que esse coração te ama muito mais do que eu gostaria.
— Saia! — gritou. — Agora, Beatrice!
— Eu iria para o mais longe possível se você assim desejasse. — Eu queria que essas
palavras fossem verdade, mas não eram.
— Às vezes, os seus sonhos e projetos vão exigir de você muito mais do que só fazer o que
lhe dá prazer. Para chegar a certos objetivos, Beatrice, às vezes é necessário abdicar do descanso,
do lazer, das noites de sono ou até mesmo da companhia tranquila de alguém que durma ao seu
lado e lhe dê bom-dia no nascer do sol. São coisas necessárias para se alcançar o que deseja.
— Eu só desejo viver, e a vida requer tudo isso que você está disposto a abdicar.
— Sinto muito, mas agora essa é a sua vida também. Agora saia, vá cuidar da sua irmã.
Então era isso? Eu estava destinada a viver isso? Virei as costas, deixando-o sozinho no
quarto. Esse homem carrega consigo cicatrizes que eu não consigo ver, dores que eu não posso
sentir, mas, ainda assim, cada pulsar do meu coração grita que estou onde deveria estar, ele só
precisava descobrir isso.
17
Me perdoe, Anna, eu acho que estou prestes a amar novamente

Vincenzo Ferrari

Beatrice é, de longe, o que esperei que ela fosse, está longe de ser alguém que considerei
ignorar.
— Mas do que ela estava falando sobre uma saúde frágil? — indaguei para mim mesmo,
ainda confuso. Sei pouco sobre ela, e essa afirmação só me mostra o quanto estou interessado em
saber além do necessário.
Peguei o telefone e liguei para Mattia.
— Me encontre no escritório — disse assim que ele atendeu e desliguei antes que ele
pudesse me responder.
Desci, achando que iria esperar pela sua chegada, mas ele estava lá, de costas para a porta,
mexendo nos objetos sobre a minha mesa.
— Quem havia saído no carro no momento em que encontrei você na porta, Mattia?
— Por que me pergunta novamente se eu já respondi?
Me aproximo e ajusto o terno em seu corpo.
— Mattia, você é o meu conselheiro, meu primo, um homem a quem dei total confiança.
Admito que às vezes agi cruelmente, como no dia em que queimei as suas mãos com água
fervendo. — Ele puxou o ar com força e me encarou contendo a raiva. — Não quero ter que
arrancar sua língua por mentir descaradamente.
— Do que me acusa, Don? — Ele deu passos para trás, se afastando de mim.
— Beatrice me falou sobre uma ligação, sobre certa autorização para visitar a família.
— Confia mais na sua nova esposa do que em mim, que, como você mesmo disse, sou seu
conselheiro e homem de confiança.
— Certo, vamos convidar o soldado para essa conversa. — Ele arregalou os olhos.
— Vai me questionar em frente a um soldado?
— Não quero que haja brechas para desconfianças entre nós, primo.
Ouvi baterem na porta e permito a entrada.
— Pois não, Don — disse o soldado, entrando e baixando a cabeça em forma de respeito.
— Quem lhe autorizou levar a minha esposa à casa dos pais? — Ele levantou a cabeça e
olhou hesitante para Mattia, que não tinha nenhuma expressão.
— Fui informado que o senhor havia autorizado.
— Quem informou? — Ele voltou a direcionar o olhar para Mattia.
— Eu? Você resolve por si próprio que levará a senhora, e eu sou o culpado?
— Eu nunca faria nada por conta própria, senhor.
— Imagino que todos aqui tenham amor às suas vidas, saia — ordeno, e ele o faz
rapidamente.
— Que mal há em sua esposa visitar a família, Vincenzo?
Espalmei a mesa com fúria.
— Don Vincenzo, não esqueça que sou seu superior e que você me deve obediência,
respeito e lealdade.
— Giulia, Giulia. — Os gritos de Beatrice me fizeram sair apressado do escritório.
Subi as escadas tão rápido quanto pude.
— O que aconteceu? — perguntei, entrando alarmado no quarto, e me deparo com o olhar
espantado de Nina, me encarando como se eu fosse uma aberração.
— Ela estava pulando na cama, se desequilibrou e caiu, já viu a altura dessa cama? —
Nina indagou com um ar cômico.
Senti o meu coração se acalmar, vendo-a deitada com uma máscara de oxigênio. Essa
criança nem é nada minha, mas, ainda assim, estranhamente sinto carinho por ela. Me recompus,
arrumando a postura.
— Não grite mais dessa forma, Beatrice, eu pensei que… que… — Procurei as palavras.
— Que um assassino tivesse entrado nessa casa supersegura, cercada de homens armados,
e tivesse tentado contra a vida da garotinha — disse Lorenzo com deboche, entrando no quarto.
— Que menina fofa. — Ele se sentou na cama ao lado de Nina.
— Sim, ela é linda. — Beatrice sorriu, se desfazendo da expressão preocupada.
— Beatrice, me acompanhe. — Ela confirmou com a cabeça e me seguiu.
Caminhei para fora de casa e parei embaixo de um pinheiro próximo ao vinhedo.
— Esta casa é tão grande, o terreno é gigante — comecei a falar —, ainda assim, você se
sente aprisionada.
— Não posso percorrer por toda área, lembre-se que impôs limites — ela voltou a falar se
referindo a Alessia, e eu ignorei por completo a sua queixa sobre o assunto.
— Você vai estudar, disponibilizarei um motorista e dois seguranças. — Mudo de assunto,
indo direto ao ponto.
Ela abriu um lindo sorriso, eu queria dizer que não senti nada. Eu fingi não me importa
com ele.
— Não vai dizer nada? — indaguei, esperando mais da sua reação.
Ela caminhou apressada, zerando a distância entre nós, e envolveu a minha cintura com os
seus braços, me apertando com força. Os meus braços, até então esticados, levantaram-se
lentamente, a envolvendo dentro deles.
— Por que, Beatrice? — Era para ser um pensamento, mas pronunciei as palavras mais
alto do que deveria.
— O quê? — quis saber, confusa, levantando a cabeça para me encarar.
— Eu sinto vontade de te proteger, eu sinto vontade de ser Vincenzo Ferrari — respondi,
encarando os seus olhos e desejando a sua boca.
— Você iria rir de mim se eu disser que eu sinto vontade de te libertar de você mesmo.
Encarei os seus lábios por mais alguns segundos e soltei o ar com força dos pulmões.
“Me perdoe, Anna, eu acho que estou prestes a amar novamente”, pensei, encarando o
céu.
Um estrondo foi ouvido do céu e uma chuva caiu de repente.
Beatrice soltou-se de mim e colocou as duas mãos sobre a cabeça como se elas fossem
capazes de aparar a chuva.
— Don, vamos correr. — Ela correu em direção à mansão.
Corri tão rápido quanto ela e puxei-a pelo braço, trazendo-a para um abraço. Levantei seu
rosto delicadamente com o meu dedo indicador e encostei os meus lábios aos dela; minha língua
iniciou uma busca arrebatadora pela dela. Com minhas duas mãos emaranhadas entre as mechas
dos seus cabelos, pressionei o seu rosto contra o meu, as descendo em seguida, puxei o seu corpo
para mais perto e senti meu pau latejar de desejo por ela.
— Vem. — Puxei-a para dentro do vinhedo e, sem pensar em mais nada, voltei a beijá-la
com paixão e desejo.
Abaixei a alça do seu vestido e levei minha boca até os seus peitos duros e arrepiados.
— Você enlouqueceu, e se alguém nos ver? — indagou, cobrindo os peitos com seus
braços.
— Quem são os insanos que ficariam andando embaixo desse temporal? — Sorri como um
adolescente quando o seu rosto corou.
Tornei a puxá-la até entrarmos na vinícola, eu a tomaria ali entre os barris de vinhos. Seu
vestido branco estava transparente e totalmente colado ao seu corpo. Deitei-a no chão e levantei
o vestido, me coloquei entre as suas pernas e abri a minha calça, então, não demorei para colocar
o meu pau duro para fora.
— Don, nós vamos pegar um resfriado — disse, ofegante.
— Eu poderia morrer de espirrar amanhã, mas nada me faria parar o que estamos prestes a
começar agora.
A minha boca voltou a encontrar os seus peitos deliciosos, enterrei os meus dedos em suas
coxas abrindo bem as suas pernas e entrei sem nenhum aviso.
— Cacete de mulher deliciosa!
Ela gemeu alto e me deixou alucinado, louco de tesão. Tirei o meu paletó, jogando-o de
lado, e voltei a me concentrar naquela boceta deliciosamente apertada e molhada de prazer.
— Fica de quatro; — Ela fez prontamente, enrolei os seus cabelos em minha mão e a fodi
com força. Levei a minha mão até a sua boceta e passei a estimular a seu clítoris. — Beatrice, eu
não vou me segurar por mais tempo, mas quero que você goze para mim. — Intensifiquei o
estímulo até sentir o seu corpo estremecer e, assim, com estocadas mais fortes, explodi dentro
dela.
— Nossa! — Ela se jogou no chão, e eu sorri, satisfeito, vendo-a ofegante ainda se tocando
com o corpo implorando por mais.
18
Seguirei conforme as leis da Cosa Nostra

Vincenzo Ferrari

— Precisamos ir, a chuva já passou — disse depois de uma longa pausa deitado no chão ao
lado dela, que encarava o teto com um sorriso sapeca, uma menina linda e fofa.
Ela se levantou apressada, como quem atende às ordens do seu senhor. Peguei o meu
paletó que, mesmo ensopado, eu o arrumei sobre os seus ombros com a intenção de esconder o
seu corpo exposto pelo vestido molhado, deixando transparecer as suas curvas.
— Quando posso começar as aulas? — indagou, envolvendo o seu braço em volta do meu
e encaixando seus dedos entre os meus.
— Amanhã. — Andei com ela pendurada a mim como uma garotinha. Eu não estava mais
acostumado a isso.
— Não sei se poderei, tem a Giulia, quem cuidará dela?
— Temos empregados na casa, Beatrice, mas faça como achar melhor.
— Fico muito preocupada quando ela adoece. Mas ela tem uma saúde invejável, agradeço
a Deus por isso, ela tem uma infância normal.
Franzi o cenho e encarei-a novamente com curiosidade.
— Que tipo de doença você tinha, ou tem?
Ela mordeu o lábio e desviou o olhar.
— É algo que pode ser passado para os nossos filhos? — Meu tom foi além da
preocupação, eu estava irado, Nina tinha que ter me contado sobre qualquer problema que ela
tivesse.
— Não é nada importante, não irá acompanhar os nossos filhos.
Ela não queria falar sobre o assunto, mas eu estava realmente curioso.
— Beatrice, você sabia que uma doença hereditária seria algo que me faria desistir do
casamento. Você não queria se casar, por que esconderia algo desse tipo?
— Você não casaria comigo, mas, ainda assim, me manteria presa naquela casa dos fundos
como sua escrava sexual. — Deu de ombros. — Acredito que ser esposa é melhor do que aquilo.
Mordi o lábio, contrariado com a resposta, mas que foi bastante convincente.
— Que belo casal — disse Lorenzo assim que cruzamos a porta.
— Eu vou subir — disse, soltando a minha mão e andando apressada.
— Precisamos conversar, irmão.
Irmão, sempre que a conversa inicia assim, sei que ele tem algo pessoal a pedir.
— Diga — falei a caminho do meu quarto com ele em meu encalço.
— Mas antes, me diga, você está apaixonado?
— Pare de bobagens e diga logo o que quer — disse, tirando as roupas molhadas.
— Sério, olha só para você molhado, tomaram banho de chuva, há… melhor, você estava
fodendo com ela na chuva.
— Lorenzo, não fico questionando os locais e condições que você anda fodendo por aí,
seja breve, tenho assuntos mais importantes para tratar.
— Don, autorize o meu casamento, concordávamos que seria após o seu, eu estava até
deprimido, achando que o dia nunca chegaria, mas enfim ele chegou.
— Escolherei outra esposa para você.
— O quê? Eu não quero outra. Estou satisfeito com a Nina.
— Você está apaixonado.
— Que mal há nisso? — Ele deu de ombros, soltando o ar com força dos pulmões.
— Quem você escolheria caso precisasse escolher: Nina ou a Cosa Nostra.
— Para, Vincenzo, não venha com esse papinho. — Virou-se de costa, passando as mãos
nos cabelos.
— Precisamos deixar isso alinhado — falei, entrando no banheiro.
— Devo lhe fazer a mesma pergunta, irmão? — perguntou da porta do banheiro, que
deixei aberta.
— Do que está falando?
— Você sabe, eu vi os seus olhos para a Beatrice, você está apaixonado por ela, mas me
acusa de ter sentimentos quando você também os tem.
— Ainda assim, escolho a Cosa Nostra.
— Sério? Quero ver como será então, já que precisará eliminar o seu cunhado.
Desliguei o chuveiro e saí do box enxugando os meus cabelos.
— Do que está falando?
— As armas, as encontramos, e adivinha onde?
— Onde? — Parei tudo que fazia e lhe dei total atenção.
— Rússia. Espalhadas em vários galpões.
— E o que isso tem a ver com o Luigi?
— Tudo, o nome dele foi citado por tantos outros que foram pegos, a família da sua
querida gotinha tem ligações com a máfia russa.
— Eles são nossos associados há anos — disse, indo até o closet e pegando roupas.
— Há anos, sendo leve e traz.
— Lorenzo!
— O quê? Faça a sua escolha.
— Cacete! Lorenzo. Me respeite! Sou seu irmão mais velho e estou em um nível elevado
de hierarquia. Não venha falar comigo como se soubesse o que tem que ser feito, sou eu quem
comando essa família e essa organização há anos. — Eu o encarei pelo espelho depois de vestir a
calça e terminava de fechava os últimos botões da camisa.
— Esqueci completamente, irmão, que você assumiu esse posto após matar o nosso pai por
causa de uma mulher — disse com ironia.
— Vá se foder, Lorenzo. Você acredita que as coisas estariam melhores com ele vivo?
Nina? — Sorri de nervoso. — Ela já estaria morta e talvez enterrada, quanto à família dela?
Seriam escravos e você teria que aceitar ver a mulher que você queria como sogra tirando os
sapatos sujos do nosso pai e sendo estuprada na frente do homem que seria seu sogro. Então,
Lorenzo, não se casar com ela é pouco perto do que nosso pai faria.
— Que crime ela cometeu?
— Você encheu a boca para falar do meu cunhado, mas a sua noiva mentiu no diagnóstico
de Beatrice, ela tem uma doença que nasceu com ela.
— Mentiu? — Ele olhou confuso. — Ela não tinha motivos para mentir, que importância
tem a vida daquela garota.
— Pois é, caro irmão, que importância tem a vida daquela garota para a sua prometida?
Devemos perguntar a ela. — Ele me encarou com raiva, cerrando os punhos.
— Nina já trabalha para a máfia há anos, assim como o seu pai, que ainda nos serve como
médico cirurgião.
— Este assunto está encerrado, Lorenzo, investigarei os fatos, designarei outra pessoa para
fazer isso, não julgo que você será imparcial nessa questão.
— E quanto ao Luigi? — Ele cobrou a minha posição como uma forma de afrontar-me.
— Seguirei conforme as leis da Cosa Nostra.
Ele sorriu com satisfação.
— Devo preparar a pólvora então. Bum… — Fez gesto com as mãos, simulando uma
bomba explodindo.
O que eu faria de agora em diante estava me deixando nervoso, ansioso e o medo veio no
momento em que percebi que eu estava com medo do resultado das investigações.
19
Apenas imagine um doce

Beatrice Marino

Os dias passavam, e eu continuava dormindo sozinha, agora ele costumava me ignorar


durante o dia, ou saía bem cedo, ou simplesmente passava por mim como se eu não estivesse
presente. Nessa noite, resolvi procurar por ele na esperança de que estivesse dormindo em outro
quarto. Antes, passei no quanto de Giulia, a vi dormindo tranquila e desci sorrateira
— Aonde está indo, senhora? — indagou um dos soldados na porta da frente da mansão.
— Andar um pouco, estou sem sono —respondi sem parar, evitando assim novas
perguntas.
— Senhora, ande sempre para a parte da frente da propriedade — disse em voz alta assim
que fiquei à certa distância, indo para o lado oposto, o lado proibido.
Fiz-me de surda, ele não iria me impedir, descumprir as ordens do Don seria algo da minha
escolha. Conforme eu avançava nos passos, sentia um frio atravessar a minha espinha.
— Péssima ideia, Beatrice, péssima ideia — repreendi a mim mesma, fazendo menção de
retornar, mas ajoelhei-me na grama, sentindo meu coração sendo arrancado do meu peito.
Eu conseguia vê-lo da janela, debruçado no parapeito da varanda, sem camisa, enquanto
ela alisava as suas costas, as lágrimas percorriam pelo meu rosto.
— Idiota, é isso que você é, Beatrice. — Levantei-me, limpando a terra dos joelhos e
enxugando as lágrimas com rancor. — Erga-se, Beatrice, você até ontem nem tinha um coração
capaz de suportar fortes emoções, pelo menos agora você sabe o quão forte esse é.
Senti meu peito rasgando ao final da frase, meu coração parecia que estava sendo
pisoteado, e eu acreditei que minhas pernas seriam incapazes de ter forças para retornar.
— O Don deu ordens claras, tragam o Luigi Marino, coloquem ele na casa do vinhedo. —
Ouvi alguns soldados prestes a entrar no carro para cumprir as ordens.
O meu irmão, na casa do Vinhedo?
— O que vão fazer com o meu irmão? — indaguei aos gritos, andando na direção deles.
— Beatrice, o que faz aqui?
Virei-me, identificando a voz do meu cunhado.
— O que vão fazer com o meu irmão, Lorenzo? — perguntei com desespero.
— Volte para o seu quarto, o meu irmão não ficará feliz em saber que está andando por
essa parte da propriedade — pronunciou com frieza, virando as costas e se juntando aos outros
no carro.
— Lorenzo, Lorenzo… — Corri o quanto pude atrás do carro, uma fraqueza acometeu as
minhas pernas, e eu caí. Impotência foi o sentimento. O que o meu irmão teria feito para ser
levado até a casa onde Vincenzo executava quem passa por cima de suas ordens.
— O que faz aqui, Beatrice? — A voz do Don reverberou, e eu parti para cima dele de
punhos fechados.
— O que vai fazer com o meu irmão?

***

Vincenzo Ferrari

Eu a peguei pelo braço e atravessei o jardim, arrastando-a sem o mínimo de cuidado.


— Beatrice, você foi avisada de que não deveria ir até aquela parte da propriedade — disse
aos gritos assim que entramos no quarto.
— Fale o que fará com o meu irmão? O que ele te fez? — Ela me batia e gritava, me
desafiando.
— Me fale que ligação vocês têm com os russos? Você sabe algo sobre isso?
— Os russos? O que a Rússia tem a ver com tudo isso? — Ela parecia confusa. — Don, é
crime ter contato com algum russo? Isso afronta você de alguma maneira?
Sorrir com a sua pergunta.
— Beatrice, uma carga de armas foi roubada e isso envolve uma perda milionária, mas o
pior ainda estar por vir, essa carga foi encontrada nos galpões do Andrei.
— Andrei? — indagou, tentando puxar da memória.
— Não sabe quem é Andrei? Ouvi dizer que ele tinha interesse por você e passou um
tempo na Rússia, estou certo?
— Por favor, o meu irmão nada tem a ver com isso. Ajude-o.
— Eu te aconselho a não fazer isso, Beatrice — disse quando um dos seus joelhos tocaram
o chão. — Se você se ajoelhar, não posso garantir que o faça apenas para implorar. — A vi
hesitar, mas a sua vontade de implorar pelo irmão falou mais alto e o seu outro joelho alcançou o
chão, e eu sorri com satisfação. — Vejo que está disposta a fazer mais do que implorar. — No
meu tom de voz, havia sarcasmo.
— O que devo fazer? — A sua ingenuidade me comoveu, e eu abri a minha calça,
mostrando-lhe meu pau lambuzado pela minha excitação.
— Use a sua boca com sabedoria, e eu pensarei o posso fazer a respeito — Ela ainda
parecia não entender e isso só me fez perceber que ela é mais inocente do que julguei ser. — Me
chupe! — respondi sem delongas, colocando um dos meus dedos em sua boca.
Senti a sua língua passear pelo meu dedo, e eu já estava gemendo só de imaginar a sua
boca inexperiente me devorando. Ela pegou o meu pau com as duas mãos.
— Apenas imagine um doce — pronunciei quando a vi olhando sem saber o que faria. Ela
encontrou a sua língua vagarosamente no meu pau, eu tremi quando a senti, a sua inexperiência e
falta de jeito me excitavam mais do que se eu estivesse com a melhor profissional de boquetes.
— Assim? — indagou enquanto eu arqueava as costas entregue a sensação.
— Apenas faça como sabe — respondi, sentindo os movimentos da sua língua ganharem
ritmo. — Delicioso! — gemi.
Não me controlei e enrolei minha mão em seus cabelos para foder na sua boca deliciosa,
uma lágrima brilhou no canto dos seus olhos enquanto eu a fodia.
— Cacete! — urrei, sentindo que não iria demorar para gozar. Ela estava empenhada em
me chupar e usava a língua deliciosamente. Senti a excitação vindo e despejei na sua boca, que,
para minha surpresa, engoliu sem fazer cara feia. Levantei-a do chão, limpando os cantos da sua
boca.
— E agora, vai poder me ajudar? — quis saber, me mostrando a única razão para tanto
empenho.
— O que possivelmente o seu irmão fez é muito grave, não posso garantir nada, mas posso
jurar que, se ficar provado e ele for condenado, a sua morte será rápida e eu pouparei você e o
resto da sua família.
— Você disse… — Coloquei o dedo em seus lábios, a impedindo de continuar, e uma
lágrima de decepção caiu dos seus olhos.
— Eu odeio ser questionado, Beatrice.
20
Beatrice é uma espiã?

Beatrice Marino

Senti algo pressionar o meu peito, tentei respirar, tudo girava ao meu redor. Eu pressionava
o meu peito, tentando aliviar a dor que me sufocava.
— Vincenzo — tentei gritar, ele já havia alcançado a porta e a minha voz saiu baixa, fraca.
Por sorte, ele olhou-me antes de cruzar a saída.
— Beatrice? — Vi o desespero em seus olhos quando ele me alcançou, me segurando em
seus braços antes que eu caísse no chão.
— Vou morrer, chame a Nina — pronunciei com dificuldade.
— Liguem para a Nina — gritou para o soldado que ficava no corredor dos quartos. Ele
não hesitou em atender o meu pedido. — Você não vai morrer, não ficarei sozinho novamente.
Ele se importava comigo, e isso era contraditório às suas ações. Vincenzo desceu comigo
em seus braços; na propriedade, tinha uma sala de emergência onde os soldados feridos eram
atendidos, tudo muito bem equipado.
— Estou aqui, Don. — A voz de Nina me tranquilizou. — O que está sentindo, Beatrice?
— indagou.
— Falta de ar, dor, eu não sei. — A resposta veio de Vincenzo, que pronunciou as palavras
com angústia.

***

Vincenzo Ferrari

— Nina, ela desmaiou — pronunciei com desespero.


— Calma, calma, tire os sapatos, tire tudo, ela precisa respirar. Se acalma, Beatrice. — Ela
ligou o eletrocardiógrafo com rapidez. — Ela está infartando, me ajude, pegue desfibrilador.
— Como assim infartando?
— O coração está parando — ela me respondeu, mesmo sabendo que eu havia entendido o
que ela tinha dito.
— Beatrice, não faz isso comigo. — O som da máquina informando a parada cardíaca fez
o meu coração parar com o dela.
— Se afaste — exigiu, se aproximando com o desfibrilador. — Volte, Beatrice — pediu
com desespero.
— Você não vai me deixar, Beatrice — disse em um tom autoritário, exigindo que ela
voltasse, enquanto Nina tentava fazer o seu coração voltar a bater.
— Ela voltou. — A sua voz saiu com um suspiro aliviado.
Eu me sentei na poltrona, sentindo as minhas pernas fraquejarem. Eu senti medo de perdê-
la, o mesmo que senti no dia em que perdi a Anna.
— Já pode respirar, foi apenas um susto, ela ficará bem.
— Nina, qual o problema dela? — Ela virou-se de costas e dedilhou a mesa na sua frente.
O silêncio dela me deixou irado, eu quase perdi a Beatrice.
— Fale logo! O que você escondeu de mim?
— Um problema cardíaco. — Ela juntava os equipamentos com pressa, evitando me
encarar.
— Ela… pode morrer?
— Claro! — respondeu como se fosse óbvio. — Qualquer ser vivo pode morrer a qualquer
momento e, nos doentes, o risco é maior.
Levantei-me e caminhei até ela que permaneceu de costas.
— E por que não me falou sobre isso? — bradei em seu ouvido.
— Ela estava com medo de te contar. Eu senti pena dela — respondeu sem delongas.
— Certo. — As palavras saíram em um suspiro. Peguei o bisturi que estava na bandeja em
sua mão e arrastei sobre o alumínio, causando um som irritante. — O que mais você me esconde,
Nina?
— Nada, era apenas isso. — Ela deu vários passos para trás, e eu a puxei pelo braço,
encostando o bisturi em seu pescoço.
— Me fale sobre os remédios — ordenei.
Ela engoliu seco, desviando os olhos do meu.
— São para o coração, se ela deixar de tomar, vai embora mais cedo.
— Certo, e onde está a parte que eles serviam para dormir?
— Eu já disse tudo, Don.
A porta se abre, e Lorenzo me encara espantado e vem apressado em direção a Nina.
— Eu já trouxe o seu cunhado — disse, baixando a minha mão. Uma gota de sangue
escorreu pelo pescoço de Nina. Ela apoiou-se na mesa para não cair, todo o seu corpo tremia.
— Me acompanhe. — Joguei o bisturi de volta na bandeja.
Soquei a parede na saída.
— O que foi isso? Você estava com o bisturi no pescoço dela — A voz de Lorenzo
reverberou, me repreendendo.
— Ela mentiu, Lorenzo, Beatrice é cardíaca.
— E pelo que a culpa, pela mentira, ou pela quase morte da Beatrice?
Eu tentava controlar a minha raiva e sede por sangue. Eu respirava apressado e andava de
um lado para o outro, passando a mão nos cabelos diversas vezes.
— Ela terá que ser punida.
— A sua esposa também mentiu, se tiver que punir, deverá fazer com as duas — ele disse,
me desafiando.
Lorenzo sabia que estava começando a ter sentimentos por Beatrice e que eu iria querer
poupá-la, mas o pior ainda viria, ele estava a metros daqui e se chamava Luigi.
— Não existe punição melhor, Vincenzo, resolvemos esse assunto e descobriremos o que
eles têm com os russos, afinal. Ah… e caso você não saiba, a sua esposa estava espionando você
com a Alessia no momento em que ouviu sobre o irmão.
— Ela me viu com Alessia?
— Vocês estavam na varanda.
— Não aconteceu nada, eu estava apenas bebendo, não estou traindo a minha esposa —
afirmei.
— Diga isso ela e não para mim. — Ele sorriu com deboche.
Andei com preocupação até a casa do vinhedo, eu não poderia fechar os olhos para esse
problema.
— Don, por que me trouxe? — Luigi tinha o desespero nos olhos. Ele estava com os
braços amarrados atrás da cadeira.
— Luigi — Peguei uma cadeira e me sentei ao lado dele —, tudo leva a você.
— Tudo o quê? — Seu olhar confuso quase me convenceu, mas as provas eram evidentes.
— As armas, Luigi, como soube do carregamento? Qual a ligação da sua família com os
russos?
— Cacete! Você acha que eu faria alguma coisa tendo minhas duas irmãs aqui com você?
— Quer acabar comigo, Luigi, se acha capaz?
— Onde está a minha irmã? Ela está bem?
— Preocupe-se com você. O seu pai também está envolvido?
— Eu não sei do que está falando.
— Cacete, Beatrice é uma espiã? — A ideia surgiu na minha mente como um estalo.
— O quê? Nós nunca te oferecemos a Beatrice, foi você que a procurou e que a trouxe —
gritava. — Não machuque a minha irmã. Mate-me, faça o que quiser, mas não toque nas minhas
irmãs.
A minha respiração estava ofegante, eu não estava sendo racional. Saí da casa ouvindo os
gritos de clamor de Luigi pelas irmãs.
— Levem-no para o galpão central, deixe-o no mesmo lugar que os outros e façam ele
falar.
— Devemos torturá-lo?
— Sim, mas não lhe tirem nenhum pedaço.
— Faremos como ordena, senhor.
Retornei para casa e o choro distante de criança me chamou atenção, subo até o quarto que
era de Beatrice e encontro uma funcionária tentando acalmar Giulia.
— Qual o problema? — A mulher salta, se assustando.
— Nada, senhor, ela só está sentindo falta da irmã, mas farei ela se acalmar, não se
preocupe.
— Saia. — Ela arregalou os olhos e me olhou assustada, mas não teve coragem de
contestar.
— Eu quero a Trice — disse aos berros.
— A sua irmã não poderá vir agora, mas pode pedir o que deseja, e eu farei o possível para
atender ao seu pedido. — Sentei-me na poltrona, mantendo certa distância da cama.
— Me conte uma história.
— História? — Arqueei as sobrancelhas com um semblante pensativo.
A minha mãe morreu quando eu tinha a idade dela, mas eu não me recordo de histórias
infantis.
— Sim, Pinóquio. — Ela se aconchegou entre os travesseiros, esperando que eu
começasse.
— Bom… Pinóquio… — Peguei o celular, procurei pela história e iniciei a leitura.
— O senhor pode se deitar perto de mim? Eu tenho medo de dormir sozinha — pediu,
manhosa.
Me aproximei um tanto hesitante, a situação era desconcertante, eu nunca tive contato com
uma criança tão pequena, embora a porta oculta do meu quarto me leve a um imenso universo
infantil montado para a minha pequena que hoje teria a idade da Giulia.
Giulia começou a cantarolar uma canção que fez o meu coração parar por alguns segundos.
“…. Quero ter sempre você comigo
Hoje senti de verdade que
Não posso mais viver assim
Para mim você sempre é
o primeiro amor…”
Ela pronunciou o soneto de olhos fechados. Apertei os meus olhos, tentando conter as
lágrimas.
— Onde você ouviu essa música? — indaguei com os olhos ainda fechados, ouvindo Anna
cantá-la enquanto arrumava as roupas da nossa filha no closet.
— A Trice canta essa música para mim antes de dormir.
— E você gosta?
— Hum rum…. Eu gosto.
Senti as minhas mãos tremerem, eu queria alisar os seus cabelos, mas a única coisa que
consegui foi cantarolar alguns versos desafinado, lhe acompanhando na canção com a voz
embargada, engolindo a vontade de chorar.
— Anna, o que quer com isso? — indaguei, encarando o céu limpo e repleto de estrelas.
21
Acho que estou me apaixonando por você

Beatrice Marino

Acordei sentindo os olhos pesarem, a região do meu peito, dolorida, como quem levou
uma forte pancada. Nina dormia na cadeira com a mão sobre o meu braço e despertou com o
mínimo movimento que fiz.
— Como se sente?
— Dolorida, mas uma dor que se instalou na alma. — Chorei, esperando que o alívio se
instalasse dentro de mim, mas, a cada segundo que passava, eu ficava mais angustiada.
— O Don já sabe sobre o seu problema cardíaco.
— Você mentiu para ele — falei com preocupação.
— Sim, e isso não é nada bom. — Ela deu um longo suspiro e voltou a falar. — A plástica
foi muito bem-feita, mas olhando bem dá para notar — disse, tocando onde fica a minha cicatriz.
— Não conte a ninguém — implorei, já não cabia mais desmentir.
— Você não imagina o quanto isso é sério, Beatrice, se eu ficar calada, eu certamente
morrerei.
— Devo contar-lhe?
Ela andou de uma ponta a outra do quarto, eu não entendi o motivo de tanto medo em
contar a verdade a ele, que mal eu havia feito?
— Beatrice, você deveria fugir, peça ao seu pai que lhe ajude, eu estou arriscando a minha
vida e a vida da minha família te aconselhando isso, mas vejo você como uma amiga doce e
ingênua.
— E qual o problema em ele saber sobre o transplante? Que mal ele me faria? — Ela sorriu
com um ar preocupado.
— Então você não sabe?
— Do quê? O que eu deveria saber?
Ela mordeu os lábios e andava de um lado para o outro, me deixando tonta acompanhando
os seus passos.
— Por ora, Beatrice, se concentre em salvar o seu irmão, depois pensamos juntas sobre o
que fazer.
— Do que eu deveria temer, Nina? — implorei pela resposta.
— A fúria do diabo que cairá sobre você.
***
Vincenzo Ferrari

Alguns dias depois…

— Nina disse que deve ficar de repouso por mais alguns dias — disse, vendo-a querer
levantar.
— Preciso ir ao banheiro — respondeu, carrancuda. — Vai dormir aqui? — Seu tom era de
deboche.
— Vou — respondi, me sentando do meu lado da cama.
— Hum…
Os seus olhos estavam vermelhos e úmidos como alguém que havia chorado por um longo
tempo.
— O seu irmão está bem, ainda estou investigando.
Ela retornou do banheiro e se deitou de costas para mim em silêncio, me ignorando.
— Eu não sou um louco que sai matando as pessoas sem motivos, Beatrice.
Pude ouvi-la aspirar o nariz com força.
— Do que acusa o meu irmão? — indagou em meio aos soluços.
— Chega, Beatrice, já está quase amanhecendo, durma.
— Acredita que sou capaz de dormir? Não consegue ver as olheiras nos meus olhos?
— Deveria usar os seus remédios para dormir, acredito que serão úteis — pronunciei com
deboche.
— Deboche não combina com você, Don, mas talvez eu devesse usá-lo também. Deveria
considerar ir dormir com Alessia, como tem feito diariamente desde que nos casamos.
— Sente ciúmes?
— Sinto nojo, você fica com ela e depois vem tocar em mim.
— Não toco mais se não quiser.
Eu queria dizer a ela que não havia tocado da Alessia desde que ficamos pela primeira vez,
mas não achei que ela devesse ter essa informação.
— Prefiro dessa forma.
— Se me fará restrições, não reclame por não dormir na nossa cama.
— Não venha querer inverter e me culpar por algo que não começou por mim.
— Sinto muito. — Suspirei, derrotado, recostando minha cabeça no travesseiro.
— Resolvi que vou para a faculdade, espero que não tenha voltado na sua decisão.
— Faça como desejar.
— Se importa se eu montar um ateliê em alguma área da propriedade.
Senti um aperto no peito, lembrando-me do dia em que montei um para Anna.
— O que vai estudar?
— Artes.
Sorri sem humor, virando-me para o lado oposto a ela, passei longos minutos em silêncio e
ela também não disse mais nada.
— Beatrice, eu estou prestes a fazer a maior burrada da minha vida. — Sorri, quando
comecei a falar. — Acho que estou me apaixonando por você, mas estou com medo, medo de
estar confundindo as coisas, medo de estar vendo coisas que não existem. Eu queria renunciar a
tudo e ir embora com você para longe, para onde eu seja apenas Vincenzo, e se não for pedir
muito, eu queria levar a Giulia. — Tornei a sorrir sem humor e continuei com a voz embargada.
— Sou um filho da puta egoísta que estou vendo em vocês a família que perdi. — No final, eu já
havia me arrependido de tudo que eu havia dito, mas não tinha como voltar.
Esperei a resposta, mas o silêncio foi a única que recebi, até ouvi-la ressonar. Virei-me
para checar e suspirei com alívio. Ela não ouviu nada, mas eu me sentia aliviado por conseguir
falar.
Levantei-me e fui ao quarto da Giulia, me sentei na poltrona e fiquei vendo-a dormir.
— Você está louco, Vincenzo. — Recostei a cabeça na poltrona. — É impossível isso —
repetia para mim, vendo aquela criança dormir, eu tinha me acostumado com a rotina de vir vê-la
e conferir se ainda respirava. Fechei os olhos, e Beatrice me vem na mente. — Por que eu a
quero tanto?
“Um coração carregar memórias, Vincenzo”.
“O meu coração acelera quando estou perto de você, e eu sinto que ele bate por você,
todos os dias e a cada segundo da minha existência”.
— Não! É impossível.
Retornei para o quarto onde Beatrice dormia, desabotoei os botões da blusa que ela usava
para dormir e arrastei o meu dedo entre seus dois peitos.
— Se fosse o caso, Vincenzo, estaria aqui — afirmei para mim.
— O que está fazendo? — Ela acordou assustada, se cobrindo. — Por que está me tocando
enquanto eu durmo?
— Volte a dormir, Beatrice.
“ Russa, ela disse que a menina não é uma italiana pura”.
E se o coração da Anna esteve bem aqui? Saí do quarto e fui direto para o escritório.
— Não, Vincenzo, ela não tem nenhuma marca. Não viaje.
Peguei uma garrafa de uísque e bebi direto da garrafa, os pensamentos faziam minha
cabeça latejar. O que eu faria se esse meu delírio fosse real? Eu sempre achei que matar a todos e
mantê-la comigo seria uma solução, mas agora começo a pensar como eu iria ferir o coração que
carrega todo o amor que quero para mim.
22
Fique de quatro

Vincenzo Ferrari

Passei a noite bebendo e adormeci no escritório, quando voltei no quarto, Beatrice se


arrumava em frente ao espelho, ela havia passado maquiagem, o que não é habitual, e olhava
mais que o normal para o decote que, mesmo comportado, valorizava o seu busto.
— Aonde você vai?
Ela me encarou com indiferença antes de responder.
— Resolver a minha matrícula na faculdade.
— Ok, vou informar para que te deixem lá e esperem por você.
— Obrigada — disse, passando por mim, deixando marcado no ar o seu perfume doce e
viciante. Puxei-a pelo braço, a prendendo entre a parede e o meu corpo.
— Beatrice, mude o tom quando falar comigo, sorria na minha presença e, por último,
nunca aja como se eu não fosse ninguém, eu sou mais do que seu marido, eu sou o seu dono.
Venha direto para casa quando sair de lá. — Beijei a sua testa com suavidade e libertei-a dos
meus braços, ela pendurou um sorriso falso nos lábios.
— O senhor é muito gentil, meu marido. — Virou as costas, saindo do quarto, e a segui.
Ela entrou no carro e deu as coordenadas aos soldados que a acompanhariam.
— Levem a minha esposa para a faculdade, não a deixem sozinha, quero saber de cada
passo que ela der dentro da instituição — ordenei a um dos soldados.
— Entendido, senhor.
De longe, avistei Lorenzo e Nina, ela estava vindo com frequência devido à situação de
saúde de Beatrice.
— Lorenzo, me acompanha — pronunciei alto, e ele veio de imediato.
— Algum problema? — indagou, se aproximando.
— Notícias do Francesco? — perguntei, retornando para a mansão, e ele me seguiu.
— Não. — Sua voz saiu baixa.
— Vou fazer o que eu já deveria ter feito, buscar por ele pessoalmente.
— O que aconteceu? Tem alguma novidade?
— Tem um fator importante, eu o procuro por longos anos, eu estou furioso. Ele já deveria
estar aqui, não acha, Lorenzo? Quem é Francesco para nos fazer de idiotas? Me entregue as
últimas pistas dele, caçarei aquele miserável até no inferno. Prepare tudo, Lorenzo, você vai
comigo.

***

Beatrice Marino

— Trice? — de longe, Giovani gritou o meu nome.


Acenei sem sair do lugar. Ele andou apressado, vindo até mim, e me envolveu em um
abraço. Me afastei rapidamente quando encarei os olhares dos soldados um para o outro.
— O que foi? Quem são esses?
— Os meus seguranças, exigência do meu marido. — Forcei um sorriso.
Ele torceu o lábio e o mordeu em seguida.
— Você se casou muito de repente, eu acreditei que… — Calou-se.
— Que teríamos uma chance — completei.
Ele baixou a cabeça.
— Me desculpe — pedi com a voz embargada.
— Eu não tenho por que te desculpar, Trice, eu só preciso fazer o meu coração aceitar. —
Ele levou a mão ao rosto, aparando uma lágrima rapidamente.
— Trice? Amiga? — Antonella gritou do fundo do corredor e correu quase me derrubando
quando me abraçou.
— Eu também senti saudades — disse, tentando me livrar do abraço que quase me
sufocou.
— Vai começar a faculdade? — perguntou, enrolando seu braço ao meu.
— Sim, essa semana, eu começo.
— Hum…. Sabe quem escolheu uma cadeira em artes como matéria complementar? Olha
para mim que olho para ele. — Ela virou o rosto encarando Giovani, que ficou vermelho de
vergonha.
— Cala a boca, Antonella — Giovani disse em um tom repressor.
— Vá, vá embora, me deixe conversar com a minha amiga.
— Até logo, Giovani. — Acenei para ele, que abaixou a cabeça e seguiu para a sala.
— Agora me conta, como foi a noite de núpcias?
— Antonella! — quase gritei, sentindo as minhas bochechas esquentarem.
— Ah… para, me conta tudo. Como ele é, como foi?
Senti meu coração saltar lembrando daquela noite, mas a lembrança do meu irmão
sofrendo em um galpão qualquer me fez voltar a mim. O desespero da minha mãe ao telefone, eu
sequer pude vê-los.
— Me deixe ir, Antonella, nos falamos outra hora.
Fui até a reitoria da faculdade, regularizei a minha matrícula e voltei com pressa para o
carro.
— Me leve de volta! — ordenei com o olhar inexpressivo fixo no banco à minha frente.
Minutos depois, já estava de volta à minha prisão. A mansão estava calma, fora do normal,
até que ouvi as risadas de Giulia vindas da área da piscina, andei rápido até lá.
— Giulia? — chamei, acenando para ela.
Lorenzo sorriu com um ar debochado de sempre. Ele brincava com ela na piscina.
— Cunhada, deixe a menina aqui, ela está se divertindo.
— Sim, eu estou me divertindo — ela confirma.
— Vou subir então — comunico, virando as costas.
Entrei, varrendo o quarto com os meus olhos, mas nem sinal de Vincenzo. Suspirei
aliviada, eu não queria vê-lo. Tirei a roupa e entrei no banheiro, eu tinha planos de um banho
rápido, mas encarei a imensa banheira que eu nunca usei.
— Que mal há, Beatrice? — Dei de ombros. Preparei a banheira e entrei, fechando os
olhos e sentindo a água morta relaxar o meu corpo.
— É dessa forma que pretende me manter longe?
Abri os olhos, fazendo menção de sair da banheira. Ele levantou as duas mãos em
rendição.
— Não farei nada — garantiu com um tom malicioso — que não queria — completou a
frase que eu já conhecia.
As suas mãos se afundaram na água e senti a minha respiração perder o compasso quando
ela percorreu o meu pé, atravessando a minha coxa e chegando no meio das minhas pernas.
Tentei reprimir o gemido, mas o efeito foi o contrário, gritei quando ele tocou o meu ponto de
prazer, ele massageava com vontade.
— Enlouqueceu? — indaguei quando ele se deitou ao meu lado de roupa.
— Suponho que sim. — A sua língua lambeu os meus lábios, todo o meu corpo entrou em
combustão.
Tornei a gemer derrotada, incapaz de controlar o desejo que pulsava, implorando por ele.
Tombei a minha cabeça para trás, apertando os olhos.
— Que delícia! — gemi novamente e senti os movimentos cessaram.
— O que está fazendo? — protestei, vendo-o sair da banheira.
— Lembrei-me que a minha esposa sente ânsias quando eu a toco. — Sorriu com
satisfação.
Eu precisava arrancar aquele sorriso desprezível do seu rosto e fiz algo que nunca imaginei
que faria.
— Tem toda razão, meu marido. — Inclinei minha cabeça para trás, apoiei cada perna em
um lado da banheira, levei a minha mão até o meu clítoris e gemi, me tocando, e o fato de tê-lo
ali me olhando me deixou com mais vontade.
— Está louca? — indagou, eu abri os meus olhos e vê-lo salivar arrancou de mim o sorriso
de satisfação.
Gemi acelerando os movimentos, ele tirou as roupas com pressa e me levantou da banheira
com um único movimento da mão agarrada à minha nuca. Ele me beijou com desejo e paixão. O
seu dedo indicador fez um caminho no meio dos meus seios, ele o fez com calma como quem
procura algo, até que senti o seu polegar pressionar o bico do meu peito, ele agarrou cada um e
os levava a boca, os chupando com loucura.
— Fique de quatro — ordenou, inclinando o meu corpo, separou as minhas pernas com o
pé e me penetrou com força, estimulando o meu clítoris. — Você não precisa se masturbar,
Beatrice, você tem um homem que te deseja e é sedento por sexo. Agora goze no meu pau e grite
o meu nome. — E foi instantâneo. — Isso, isso… — Ele mordia o meu pescoço enquanto eu
gritava e gemia o seu nome.
23
Ele nos matará

Vincenzo Ferrari

Beatrice ainda dormia, eu já estava pronto para partir em busca de respostas. Sentei-me na
ponta da cama e lembrei da transa que tivemos ontem, a minha garotinha está crescendo e se
tornando uma mulher ousada e deliciosa.
— Buongiorno — falei, me levantando quando a vi abrindo os olhos com preguiça, mas
não esperei uma resposta calorosa, afinal, eu ainda tenho o irmão dela em péssimas condições no
meu galpão.
Ela me olhou com um sorriso forçado pendurado nos lábios.
— Acordou cedo — falei.
— Sim, vou para a faculdade.
— Sim, claro, havia esquecido, sobre o espaço que me pediu, fique à vontade para escolher
o melhor local.
— Vai viajar? — indagou, se levantando da cama e vendo a pequena mala no canto da
porta.
— Sim, vai sentir saudades?
— Nem imagina o quanto — desdenhou.
— Querida esposa, o que devo fazer com essa sua língua afiada? — A prendi em meus
braços.
— Não sei, mas você é bom em decepar partes de humanos.
— Beatrice, o que te faz acreditar que pode ser debochada comigo? Trepar gostoso não te
dá o direito de me afrontar. — Pressionei os seus lábios com o meu dedo polegar e já estava de
pau duro.
— Perdão, marido. Não quero acabar como a Carina ou a Anna.
Inclinei a cabeça para o lado, semicerrando os olhos.
— O que você disse? — indaguei com fúria com a mão em volta do seu pescoço.
— Mate-me e deixe que o meu irmão viva — pronunciou e uma lágrima escorreu pelo seu
rosto.
— Aguarde o meu retorno e não faça nada que vá se arrepender depois.

***
Beatrice Marino

A angústia vinha me sufocando, embora o meu corpo me traísse todas as vezes que ele se
aproximava, eu havia me decidido a me libertar e salvar o meu irmão. Me arrumo rápido e vou
para a faculdade, que é algo que definitivamente me completa.
Na chegada, observo de longe Giovani na entrada da faculdade.
— Acho melhor ir por outra entrada — disse para mim mesma, contornando o caminho.
— Trice… — Enterrei os meus passos e virei para ele com uma ruga no meio da testa.
— Giovani. — Pendurei um sorriso sem graça nos lábios.
— Está fugindo de mim? — Ele sorriu, passando a mão nos cabelos.
— Que ideia, claro que não.
— Eu nem dormi essa noite, sabia que te veria hoje e fiquei ansioso.
Olhei para trás e medi com os olhos a distância dos soldados que me vigiavam a mando do
meu marido carcereiro.
— Claro, entendi. — Me olhou entristecido. — Eles tão vigiando você, que porra!
Beatrice, você sempre sonhou em poder ser saudável para ser livre.
Os meus olhos se encheram de lágrimas, mas eu as segurei e sorri com amargura.
— Estou bem, Giovanni, pare de correr atrás de mim, estou casada.
— Só pararei no dia em que eu te ver sorrindo para ele da forma que você sempre sorriu
para mim.
— Pare já com isso, eles vão nos ouvir. — Andei apressada, tentando me livrar dele.
— E daí? O que ele faria com você? Sente medo dele?
— Não!
— Ele é mais velho que você, Beatrice, quantos anos exatamente? Onze anos?
— Isso não importa, agora vá. — Andei tão rápido quanto pude, me afastando dele, ele não
entendia, mas eu estava protegendo-o.
No final da aula, fui surpreendida com a minha mãe parada em frente à SUV que me
esperava em frente à faculdade.
— Mãe? — Larguei os livros no chão e corri para lhe abraçar.
— Filha, como você está? — Senti as lágrimas que caíam dos seus olhos molharem a
minha blusa.
— Ainda não sei onde o Luigi está — disse entre soluços.
— Só você pode ajudá-lo, Beatrice.
— Como? Aquele homem não se importa com ninguém.
— Faça ele se importar, Beatrice, deve haver uma forma de deixá-lo apaixonado.
— Não sei. — Parei pensativa. — Mãe, fora o seu sangue russo, o que mais temos a ver
com a Rússia? — Ela torceu o lábio e me encarou preocupada.
— O seu avô é um associado à máfia na Rússia.
— O vovô? Como eu nunca soube disso?
— Assim com seu pai, querida, não temos escolhas, ou nos curvamos, ou morremos.
— Ele nos matará. — Senti o meu sangue gelar. — Como as armas foram parar nos
galpões da Rússia?
— Eu não faço ideia, nem o seu pai, nem o seu irmão se metem nesse assunto.
— Deveríamos ter nos mudado para a Rússia, talvez eu não estivesse passando por isso. —
Revirei os olhos, suspirando derrotada em seguida.
— Andrei já teria feito o mesmo se você não estivesse casada com Vincenzo.
— Andrei… Andrei… — murmurei.
Eu já tinha o visto com o meu avô, mas nunca imaginei quem ele era de fato, e conforme
eu fui crescendo, notei seus olhares mudando em torno de mim.
— Faça o que eu disse, conquiste o seu marido — Seu tom foi de ordem, e eu desconhecia
a minha mãe, mas quem poderia julgar uma mulher desesperada para salvar o seu primogênito.
— Não é como se estivesse me mandando comprar pão na esquina, mas tentarei — disse,
entrando no carro.
Os soldados aguardavam a conversa de uma distância satisfatória e só se aproximaram
quando fechei o vidro do carro e minha mãe se afastou, seguindo o seu caminho.

***

Vincenzo Ferrari

Eu estava na Sicília, seguindo as pistas do Francesco, eu só voltaria quando tivesse


respostas, eu não viveria como um louco vendo a Anna em cada canto.
— Você já parou para pensar que sentido faz toda essa busca, Don — Lorenzo falou do
banco da frente do carro.
— Você tem uma hora para rastrear o paradeiro daquele infeliz.
— Farei conforme ordena, Don, embora eu considere tudo isso inútil, te fará sofrer ainda
mais, não percebe isso? Anna se foi, aceite.
— Ela não se foi, ela foi arrancada de mim, assassinada para que outra pudesse viver.
— E o que pretende, Vincenzo? Pare já com isso, não trará a Anna de volta.
— Ela vive dentro da outra, Lorenzo, ela está lá.
— Isso é doença, irmão.
— Uma hora, Lorenzo — resmunguei com o olhar inexpressivo fixo na paisagem que
passava pela janela.
Ele não fazia ideia, mas todo esse desespero se tornou maior, porque eu senti Anna perto
de mim.
— Chegamos, foi daqui que rastrearam as últimas ligações dele.
Encarei o local deserto, sem o mínimo de vestígios de civilização ou que algum humano
havia passado por lá, exceto o quadrado feito de madeira que estava a alguns metros, seria
impossível alguém viver aqui.
Desci do carro, tirando o lenço do bolso, tinha urubus rondando o quadrado de madeira
indicando que havia algo podre lá dentro.
— Abram a porta — ordenei.
— Cacete! — Lorenzo vira as costas, tampando o nariz.
— Maldito — cuspi as palavras com ódio. — Morto? — pronuncio inconformado, vendo-o
estirado no chão. — Maldição. Vasculhem tudo.
Saí do cubículo, tentando voltar a respirar e não pelo fedor insuportável que estava lá
dentro, mas porque a única pessoa que poderia me dizer toda a verdade estava morto.
24
Ser meio russa não é crime

Vincenzo Ferrari

— Isso deve ser um aviso de que você deveria esquecer esse assunto — Lorenzo falou
quando estávamos no caminho de volta para casa.
— Me entregue o gravador.
— O que fará com as poucas informações? — ele perguntou sobre o áudio do Francesco
que foi encontrado no local.
Encostei a cabeça no encosto do banco do carro e não lhe respondi, eu toquei cada
milímetro de pele de Beatrice, e não tem vestígios de um transplante. Mas eu continuava
considerando a questão.
— Desviei o caminho, me leve até o Luigi — ordenei ao motorista, que me atendeu
prontamente.
Quando o carro estacionou, desci do carro, e Lorenzo fez o mesmo.
— Volte, Lorenzo, tenho um assunto particular com o meu cunhado. — Uma ruga se
formou no meio de sua testa, mas ele não perguntou, abriu a porta do carro e tornou a se sentar,
mexendo no celular em seguida.
Luigi estava em uma cela confortável com uma cama e um banheiro, diferente das outras
onde tudo era realizado no chão. Sua aparência era lastimável e o mau cheiro era insuportável.
— Don. — Ele levantou os olhos para me encarar.
— Vim em paz, cunhado — Levantei minhas mãos, mostrando rendição.
Estalei os dedos e um dos soldados veio prontamente.
— Providenciem um banho e uma mesa farta em meu escritório, e ofereçam ao meu
cunhado. — O soldado saiu rapidamente para cumprir as minhas ordens. — Vamos conversar
quando seu odor estiver menos desagradável.
Eu estava recostado em minha cadeira com os pés sobre a mesa quando Luigi saiu do
banheiro.
— Sente-se melhor, cunhado? Um banho sempre me faz recarregar as energias.
— Quando vai me tirar daqui ou me matar de uma vez?
— Diga-me, Luigi, qual a ligação de vocês com os russos? — Tirei as pernas da mesa e me
levantei, caminhando até ele lentamente.
— Eu já lhe disse que não tenho nada a ver com o roubo dessas armas. Qualquer pessoa
pode ter elaborado isso, Andrei tem os motivos para querer lhe ver irritado.
— Quais? — Inclinei o corpo em sua direção.
— Poder, território. — Deu de ombros.
— Beatrice — disse em tom sugestivo.
Ele baixou a cabeça, puxando o ar com força.
— Me diga o que cacete tem entre a sua família e o Andrei.
— O que sente pela minha irmã? — Gargalhei com a pergunta.
— Acredita que sou capaz de ter sentimentos por alguém? — indaguei, e ele sorriu da
própria pergunta.
— Se quer tanto saber, a minha mãe é russa, m0,as sempre servimos ao nosso país e ao
senhor, meu cunhado.
Aquela informação me deixou mais confuso sobre Beatrice ser a garota que era meio russa
que o meu pai queria ao meu lado, mas como? Ela não tinha nenhuma marca.
— E as armas, Luigi?
— Não faço ideia — sibilou.
— Não vou insistir, Luigi. Levem ele de volta para a cela dele.
— Agora que sabe sobre a nossa nacionalidade, o que fará com a minha irmã? —
perguntou antes de sair do escritório.
— Ser meio russa não é crime, Luigi, contanto que vocês escolham servir a Itália.
Voltei para o carro em silêncio. Lorenzo me olhou pelo retrovisor, mas não fez perguntas.
Me tranquei no escritório assim que cheguei e voltei a ouvir o áudio do gravador que
encontraram no local onde Francesco foi encontrado morto.
“Don, o seu pai foi o culpado de tudo, ele planejou tudo sozinho, a família da garota não
sabia nada sobre a assassinato da Anna. Morrerei por saber dessa informação, eles me caçam
assim como você tem me caçado, eles querem me matar para que você não saiba quem é ela,
eles têm medo de que você queira machucar a garota. Droga! Eles me acharam…”
Jogo o gravador contra a parede de raiva, como ele pôde levar tiros antes de dizer o nome?
— Droga! Maldição. — Arrastei tudo que estava sobre a mesa em um único movimento
com o braço e o que sobrou, arremessei contra a parede.
Eu estava perto, muito perto.
— Você chegou? — Beatrice entrou na sala sem bater. — Nossa! — E se encolhe na porta,
olhando as coisas quebradas no chão e a minha expressão transtornada.
— Por que não bateu? — perguntei, ríspido.
— Desculpe, volto em outra hora. — Ela endireitou as pernas, apressada, virando-se para
sair da sala.
— Espera, Beatrice — Ela virou-se e me encarou assustada. — O que veio fazer aqui? —
perguntei, contendo o misto de sentimento dentro de mim.
— Eu só ouvi que você havia chegado.
— Cheguei, posso fazer algo por você?
Ela hesitou, balançando a perna em direção à saída, mas retornou andando na minha
direção, se pôs na ponta do pé e envolveu os seus braços no meu pescoço.
— Eu senti saudades — disse, encostando seus lábios nos meus.
Eu senti todo meu corpo se desarmar dentro do seu beijo, puxei-a para mais perto, colando
o seu corpo ao meu e retribuindo o seu beijo com paixão.

***

Beatrice Marino

Eu havia acordado decidida a ganhar o coração do Vincenzo, eu precisava fazê-lo me


amar, eu precisava salvar o meu irmão. Quando ouvi que ele havia chegado, corri para o
escritório sem me importar se a minha mudança de atitude causaria estranheza, eu só resolvi
fazer conforme a minha mãe havia me instruído. Entrei em uma sala com coisas destruídas pelo
chão e um homem que parecia estar com a alma quebrada.
— Precisa de alguma coisa, Beatrice? — indagou, se afastando após um beijo caloroso.
— Não. — Suspirei, sentindo o quanto seria difícil fazê-lo confiar em mim. Não será fácil
despertar sentimentos nesse homem.
— Então volte para o que estava fazendo — disse, virando as costas.
— Don, quando irá resolver as questões com o meu irmão. — Ele virou-se para me
encarar.
— Esse é o motivo da sua mudança de atitude? — Sorriu sem humor. — Não sou um
moleque, Beatrice, não vai me ludibriar com um rostinho de anjo e uma voz doce nos meus
ouvidos.
— Nunca foi a minha intenção, Don. Perguntei por que daqui o senhor é o único que sabe
da resposta.
— Ainda tenho dúvidas em relação ao seu irmão e desconfio até de você. Estive pensando:
será que a minha querida esposa não é uma espiã? — Ele inclinou o copo em minha direção.
— Deveria me devolver à minha família se acredita nisso. Se sou uma espiã, deveria me
manter longe dos seus assuntos.
Um lado de seus lábios se ergueu em um sorriso. Ele andou na minha direção e passou a
mão pela minha nuca, subindo os dedos pelos meus cabelos, os fechando com os fios entre eles.
— Acredita que eu devolveria você a sua família, Beatrice? — Ele contornou os meus
lábios de forma sexy e provocante. — É isso que você quer? — Puxou-me pela cintura e pude
sentir a sua ereção em meu abdômen.
— Não! — admiti, derrotada.
Um sorriso satisfeito estampou a sua face.
— Sabe o que farei com você se você ousar me trair? — Ele inclinou o meu corpo contra a
mesa e deu um tapa na minha bunda. Todo o meu corpo esquentou. — Castigarei você. — Ele
afastou as minhas pernas, levantou o meu vestido e afastou a calcinha em seguida. O meu rosto
estava sobre a mesa vazia e ele me segurava pelos cabelos. Senti o seu dedo me penetrar. Gemi.
— Entendeu, Beatrice? Você é minha.
— Sim, eu entendi.
— Agora vá, eu encontro você no nosso quarto em breve.
Me recompus e saí com as pernas trêmulas e derrotada. Eu ainda não tinha notícias sobre o
meu irmão e ainda não sabia como conseguir que ele o libertasse. Caminhei, batendo os pés e
com os olhos cheios de lágrimas.
— Cunhada, algum problema? — A voz de Lorenzo era sempre debochada e irritante, e eu
não estava com paciência para ele.
— Não! — respondi duramente, subindo a escada.
Ele acompanhou os meus passos.
— Isso não é uma lágrima? — zombou.
— O que quer? — Virei em sua direção, furiosa.
— Podemos conversar? — indagou com um sorriso. — Vincenzo foi ver o seu irmão hoje.
— Levantei os olhos, encarando-o com interesse. — Venha, vamos ao jardim dos fundos.
Ele andou na minha frente, e eu o segui.
— Como está o meu irmão? — indaguei assim que ele se sentou no banco que ficava em
frente a uma fonte.
— Venha, sente-se. — Puxei o ar com força para os meus pulmões e me sentei ao seu lado.
— O seu irmão está… — procurou as palavras — vivo.
— Isso é já sabia — pronunciei, desapontada, no fundo, esperava por mais informação.
— Mas o que você não sabe é que o meu irmão não costuma investigar muito sobre os
fatos, ele já deveria ter matado o seu irmão, e tendo você, com ele manteria o seu pai sob
controle, mesmo que ele quisesse vingar a morte do filho?
— Aonde quer chegar com tudo isso? — pergunto, confusa.
— O meu irmão decidiu se casar novamente depois de alguns anos, o que achei que nunca
aconteceria, ele já controlou vários associados apenas mantendo as suas filhas lá na casa onde
Alessia vive.
— Está tentando me dizer que eu sou diferente?
— Você se casou com ele e isso já é algo que pode ser considerado. Eu amo a Nina —
falou com um ar romântico, e eu fico sem entender o motivo da declaração repentina.
— E o que isso tem a ver comigo?
— Nada. Mas você vai me ajudar.
— Como? E por quê?
— Primeiro você precisa da minha ajuda, e te ajudando, você vai poder me ajudar.
— Seja claro — exigi sem paciência.
— Investigarei sobre as armas pessoalmente, provarei a inocência do seu irmão e vou te
ensinar como chegar ao coração do Vincenzo.
— Você acredita que ele tem coração? — Sorri desdenhosa.
— Não. — Ele se divertiu com a própria resposta. — Mas vamos ao que interessa, se o
meu irmão começar a fazer os seus gostos e caprichos, eu terei argumentos para solicitar o meu
casamento com a Nina.
— Poderia apenas fingir que não gosta dela, pois sei que esse é o problema, vocês não
podem amar.
— Estou pouco fodendo para isso tudo, eu faço o que me é ordenado e ponto. Você gosta
do meu irmão, eu já percebi como você olha para ele. É pegar ou largar, te ajudo com o seu
irmão, te ajudo com a Alessia e você me ajuda a ter a Nina.
— Fechado. — Eu estava firmando um contrato com o irmão do diabo, mas eu não tinha
alternativa.
25
Nós três

Vincenzo Ferrari

Alguns dias depois…

Eu estava na sala ao lado da que a mãe de Beatrice estava com a Giulia, ela não queria ir
embora, e eu não queria que ela fosse. Era estranho o apego que eu tinha pela menina, e eu
evitava demonstrá-lo.
— Mas, Giulia, você precisa voltar para casa, o marido da sua irmã já deve estar
incomodado.
— Pode deixá-la se ela quiser ficar — disse, entrando na sala.
Ela estava abaixada na altura da criança e se levantou para me encarar.
— Ela pode ficar? — indagou com um tom incrédulo. Ela poderia não saber, mas a minha
mente estava tão incrédula quanto ela.
— Sim, ela pode ficar, a sua presença não me incomoda. Todos os dias pela manhã, um
dos meus homens a leva para escola e espera por ela na porta. Depois tem uma funcionária que a
ajuda com as tarefas. No fim da tarde, é permitido que ela brinque pelo jardim, e ela costuma ter
noites tranquilas de sono.
Os seus olhos pairavam sobre a garota e, em seguida, se voltaram para mim.
— Se é dessa forma, pode ficar, Giulia.
— Mamãe. — Beatrice desce as escadas saltitando.
Vou até o escritório, convocando um dos seguranças que a acompanha na faculdade. Eu
ainda não havia parado para saber como funcionam as coisas por lá. Um deles chega em seguida.
— Sente-se. — Meu tom é de ordem.
— Claro, senhor.
— Então, como é a rotina da minha esposa na faculdade?
— Ela costuma chegar cedo, vai para uma sala com muitas telas e desenha, ela não
costuma manter contato com outros alunos, está sempre reservada com seu caderno de desenhos.
A sua sogra, às vezes, vai visitá-la e ela possui dois amigos que, às vezes, estão com ela.
— Amigos? — indaguei, curioso.
— Sim, trata-se desse rapaz, mas também há uma garota. — Ele colocou o telefone sobre a
mesa, mostrando a foto do Giovani e da garota.
— Como é as vezes que eles estão juntos?
— Ela sempre está sempre evitando falar com ele, mas ele…
— Ele? — perguntei quando ele parou de falar.
— Parece gostar da senhora.
— Entendi. — Tamborilei com os dedos sobre a mesa. — Tudo bem, pode sair.
Levanto-me com um semblante sereno e volto para a sala, a minha sogra já havia ido
embora e Beatrice desenhava em telas com a irmã no chão da sala. Eu as observei por alguns
minutos sem me pôr em seu campo de visão. A minha esposa vinha agindo de forma diferente,
ela continuou agindo como uma esposa feliz e devotada. Limpei a garganta, entrando na sala.
— Já vamos arrumar toda a bagunça — disse, nervosa, esfregando os pulsos em pingos de
tinta pelo chão.
— Não se preocupe, divirtam-se.
— Vem brincar comigo. — Giulia pegou a minha mão, me puxando para me juntar a elas.
— Giulia. — Beatrice puxa a sua mão, a repreendendo.
— O que eu posso fazer? — Sentei-me no chão ao seu lado e ela levantou-se, se sentando
no meu colo, e segurou a minha mão, se concentrando no meu dedo indicador, colocando-o
dentro do potinho de tinta e levando-o até a tela em branco na minha frente.
— Agora desenhe, eu, a Trice e você.
— Nós três? — indaguei.
— Sim, eu queria que a Trice fosse a minha mãe, e você, o meu pai.
Os meus olhos encontraram os de Beatrice, que estava vermelha de vergonha.
— Eu acho uma boa ideia. Você acha que o seu pai se importa, Beatrice? — Virei-me para
lhe encarar.
— Não se preocupe, ele também será o meu pai. — Ele deu de ombros, estendendo os
bracinhos com a palma das mãos apontadas para cima.
— Não vejo problemas em ser pai de uma garotinha fofa como você.
— Eba! — Ela saltou do meu colo aos pulos.

***

— Don? — Beatrice falou surpresa, me vendo em frente ao carro que a leva para
faculdade.
— Surpresa? — indaguei, abrindo a porta para ela.
— Um pouco — admitiu.
— Vou levá-la à faculdade. — Entrei e me sentei ao lado dela, que me olhou confusa.
Em pouco tempo, a confusão deixou os seus olhos e ela arrastou a mão pelo banco do carro
até alcançar a minha mão. Se aproximou, passando o braço em volta do meu e apoiando a cabeça
em meu ombro.
— Bom, chegamos — ela disse, arrumando a postura.
De longe, eu vi o Giovani andando de um lado para o outro em frente à entrada da
faculdade. Beatrice saiu do carro, e eu fiz o mesmo e peguei em sua mão, entrelaçando os nossos
dedos.
— Bom dia, Trice. — Ele se aproximou como se eu não existisse.
— O-oi! — respondeu, gaguejando.
— Giovani, certo? — Estendi a mão para lhe cumprimentar.
— Sim. Você deve ser o marido dela — respondeu sem tirar as mãos do bolso, e eu devo
admitir que é um rapaz corajoso.
— Eu vou para a sala. Acho que você precisa ir para a sua também — ela disse para
Giovani.
— Vou logo em seguida.
Ela hesitou, nos olhando, respirou fundo e seguiu para a aula.
— Quer falar alguma coisa comigo? — Inclinei a cabeça, semicerrando os olhos,
analisando-o.
— Não, acho que devo ir para aula.
— Só um conselho, Giovani — ele, que já havia virado em direção à entrada, para e se vira
para me olhar novamente —, aproveite que eu não costumo aconselhar. Sei que gosta da minha
esposa, não estou aqui como um adolescente enciumado, estou aqui como um homem com
pouquíssima paciência e que odeia quando mexem no que é dele.
— Se acha dono dela? — indagou com ironia. — Conheço a Beatrice desde criança, os
seus medos, suas dúvidas, o seu filme favorito, a música que lhe faz sorrir e a que lhe faz chorar,
eu conheço tudo nela e posso afirmar que esse casamento não era o que ela queria.
Cerrei os punhos escondidos no bolso e forcei um sorriso.
— O conselho foi dado, Giovanni. Eu não costumo dar um segundo aviso. — Entrei no
carro e encostei a minha cabeça no banco.
As palavras dele me incomodaram e me fizeram pensar se eu queria conhecer a Beatrice
melhor. Não, Vincenzo, balancei a cabeça negativamente. Eu vinha me sentindo conectado e
interessado, e isso era algo assustador.
— Fique de olho e, se ele não seguir o conselho, leve-o para a casa do vinhedo para que ele
entenda melhor o recado — aviso a um dos seguranças antes de ordenar que o carro dê partida.
26
Estou apaixonado por você

Vincenzo Ferrari

Cheguei na mansão e vi Lorenzo sentado na sala, concentrado no caso do Luigi Marino.


— Está nisso novamente? — indaguei.
— Não foi ele, quem nos sabotou está entre nós — afirmou.
— De onde veio a certeza? — Sentei-me ao seu lado.
— Daqui! — Ele apontou para uma das nossas rotas no mapa aberto sobre a mesa. — Era
uma rota nova, só quem tinha acesso eram eu, você, Mattia e alguns líderes.
— E? — Dei de ombros, tentando entender aonde ele queria chegar.
— Foi exatamente nesse ponto que fomos saqueados, onde apenas nós sabíamos que não
“haveria tanta ameaça”. — Fez aspas com os dedos. — Não tínhamos uma quantidade
exorbitante de soldados lá, eles estavam concentrados nos pontos de maior ameaça.
— Mas o nome do Luigi foi citado por vários dos que prendemos.
— Alguém que sente raiva da família Marino fez com que você acreditasse nisso.
Entregaram as coordenadas ao Andrei, que você sabe muito bem que, mais do que armas, ele
quer matar você, e agora ele tem um incentivo maior além de território, ele quer a Beatrice e,
matando você, ele assume essa casa e tem a sua mulher.
Estremeci com a ideia de outro homem tocando-a.
— Ok. Digamos que seja exatamente dessa forma, quem está com o Andrei? — Eu tinha
minhas desconfianças, mas queria ouvir a opinião dele.
— Eu não confio no nosso tio. — Sorri quando ele disse o mesmo que eu estava pensando.
— O que faço com o Luigi? — Esfreguei o queixo pensativo.
— Vamos soltá-lo como um aviso e dizer para todos que o fizemos para dar corda para que
ele se enforque de uma vez, faremos os líderes acreditarem em informações falsas para ver quem
cai nelas primeiro. Quem tentou acusar os Marino fará novamente.
Como eu não havia pensado nisso antes?
— Libere o Luigi — ordenei, me levantando da mesa.
— Farei agora mesmo.
— Perfeito. — Caminhei em direção às escadas.
— Don. — Parei quando ele me chamou.
— Mas alguma coisa?
— Beatrice ficará feliz em saber que o irmão será solto. Notei que estão vivendo em lua de
mel e você quase não vai ver a Alessia. Não é uma queixa, eu estou amando ter toda aquela
máquina só para mim.
— Divirta-se — disse, voltando a caminhar em direção ao meu quarto.

***

Eu estava sentado na cama, olhando Beatrice pentear os cabelos em frente ao espelho, em


alguns momentos, nossos olhos se encontravam no reflexo.
— Algum problema? — indagou, virando-se na cadeira e olhando para mim.
— Nenhum. Mandei que soltasse o seu irmão hoje, amanhã ele estará de volta ao lar.
Ela ficou imóvel e, em seguida, abriu um largo sorriso, correndo na minha direção e se
jogando em meus braços.
— Obrigada, obrigada — pronunciou enquanto depositava beijos em meu rosto.
— Não foi por você. Lorenzo encontrou algumas evidências que mostram que ele não é
culpado — pronunciei, desdenhoso, mesmo que eu estivesse feliz em poder fazê-la feliz. Eu
adiaria aquela morte o quanto fosse preciso.
— Agradeço da mesma forma — disse, deitando a cabeça sobre o meu peito.
O cheiro dos seus cabelos era maravilhoso, tudo nela remetia à pureza e inocência.
— Não se aproxime muito do seu amigo. — Ela levantou a cabeça e me encarou.
— O Giovani? — Estreitou os olhos e me analisou.
— Você tem mais?
— Somos amigos há muitos anos. — Ela se deitou reta na cama, olhando para o teto.
— Trice. — Giulia entrou como um foguete pela porta que esquecemos de trancar.
— Giulia, você não pode entrar assim no quarto de adultos, precisa bater.
Ela pareceu não se importar com as reclamações da irmã e se jogou entre nós dois.
— Amanhã é feriado, Trice. — Ela saltava no colchão.
— Sim, o que tem de mais nisso? Volte para o seu quarto — ela pronunciou nervosa, me
olhando de soslaio.
— Devemos fazer uma viagem de dois ou três dias? — indaguei.
— Está falando sério? — Beatrice perguntou com um tom incrédulo.
— Eba! Vamos viajar — Giulia gritava animada pelo quarto.
— Iremos amanhã. — Dei de ombros.
A menina vibrava, e Beatrice me encarava feliz, e aquilo, de uma forma inexplicável, me
fez tão feliz que me senti completo, eu senti meu coração bater feliz e ousei sorrir de uma forma
tão sincera que senti doer o meu maxilar, que não se recordava mais desse movimento.

***

Beatrice Marino

No dia seguinte, Vincenzo parecia nem ter dormido, não que a sua aparência fosse de
cansaço, mas ele estava de pé, arrumando os cabelos em frente ao espelho com as malas prontas
no canto da porta.
— Passou a noite arrumando isso? — indaguei, sentada na cama.
— Não, acordei cedo, aliás, já viu a hora? — perguntou, me encarando pelo reflexo.
Arregalei os olhos, encarando o relógio sobre a mesa de apoio, já passavam das dez da
manhã e eu acreditei piamente que ainda eram seis horas.
— Levante-se, eu já arrumei a mochila da Giulia e pedi que a deixassem pronta.
Eu o olhei com tamanha satisfação, parecíamos um casal real e eu fiquei feliz pelo
momento.
— Estou indo agora mesmo.
Quando voltei do banho, senti o meu coração palpitar de alegria, Giulia e Vincenzo
brincavam no quarto. Eles corriam e ela gritava de euforia, uma lágrima de felicidade molhou o
meu rosto, eu nunca vi a Giulia tão feliz.
— O que faz aí parada, vamos… — ele disse assim que notou a minha presença.
— Já estou pronta, podemos ir.
Durante todo o caminho, Giulia conversava com Vincenzo, que lhe dava total atenção. Ele
parecia um menino ao lado dela, descontraído.
— Tio, me conta aquela história sobre a menina que roubou uma flor. — Vincenzo virou o
rosto para me encarar, e eu fingi que estava dando atenção à paisagem que passava pela janela.
— Posso contar em outro momento? — ele indagou, tímido.
— Hoje, na hora de dormir?
— Sim, posso fazer isso hoje.
Ela agarrou o braço em volta do dele, apoiou a cabeça, abriu a boca sonolenta e fechou os
olhos em seguida.
— É, parece que ela cansou — ele disse, me encarando.
— Eu não sabia que contava histórias infantis.
— Isso te deixa intrigada ou feliz?
— Mesmo que a Giulia não seja a minha filha, eu sinto como se fosse, não faz ideia do que
as lágrimas de garotinha fazem ao meu coração, e a magia que acontece quando ouço as suas
gargalhadas.
— Seria estranho se eu falasse que me sinto igual? Eu gosto muito dessa garotinha.
Aos poucos, o homem sem alma vinha revelando um coração que eu nem sabia que existia
e aquele brilho que nós humanos comuns temos quando estamos felizes podia ser visto com
facilidade nos dele.
— Não é estranho, a Giulia tem esse poder de nos deixar felizes como se essa fosse a sua
principal missão aqui na terra.
— Bom, chegamos — ele disse quando o carro entrou por um imenso portão de uma
mansão em Spiaggi di cala, no sul da Sardina. — Espero que a Giulia goste de praia.
— Ela ama — confirmei.
Ele saiu do carro e a pegou nos braços ainda adormecida, entramos juntos pela imensa
casa, tão grande quanto à que vivemos.
— A casa é imensa — disse, olhando tudo com muita atenção.
A mansão não tinha tantos soldados como as outras, e isso me causou estranheza.
— Aqui não tem tantos seguranças.
— Eles virão. Como não costumo vir, é o lugar menos propício a ataques de rivais, poucos
sabem da existência dessa casa.
Eu o segui pela casa até chegar a uma sala que não parecia ter paredes. A vista dava para o
lindo oceano de águas limpas e bem azul se unindo ao céu magnífico de um dia ensolarado. No
canto da sala, tinha um pequeno bar, assim como na nossa casa e, mais à frente, uma segunda
sala, que dessa vez não tinha paredes, ela se unia à área da piscina.
— Vou colocar a Giulia na cama.
— Vou com você — eu disse, seguindo-o.
Eu observei o carinho com que ele fazia tal ato, a colocando cuidadosamente embaixo das
cobertas e beijando o seu rosto em seguida.
— Por que me olha assim? — indagou
— Você será um ótimo pai — respondi.
— E o que tem a falar sobre ser o seu marido? — Me abraçou pela cintura, me deixando
confusa com tanto afeto. — Pare de me olhar como se eu não fosse humano.
— Desculpe, Don.
— Vincenzo, pode me chamar pelo meu nome. — Ele pegou a minha mão e me levou até a
área externa da casa.
— O lugar é lindo.
— Achei que nada te impressionasse, você tem tanto dinheiro quanto eu.
— Eu nunca visitei muitos lugares, os meus pais me tratavam como se eu fosse um
algodão-doce prestes a ser dissolvido na água e, por fim, aqui estou eu, com você. — Forcei um
sorriso.

***

Vincenzo Ferrari

Eu estava disposto a aproveitar a oportunidade e dizer a Beatrice como eu me sentia em


relação a ela. O meu coração estava quase saindo pela boca, era muito mais fácil assassinar toda
uma cidade do que eu me pôr nessa posição vulnerável. Os meus minutos em silêncio a deixaram
desconfortável, ela batia o pé no chão, nervosa, fingindo não prestar atenção em mim.
— Às vezes assumir é muito melhor que fugir uma vida toda — comecei a falar.
— Do que está falando? — Ele virou o corpo na minha direção.
— Eu e você. — Ela me encarou confusa. — Voltei a ser vulnerável, Beatrice. Você sabe o
que é ser vulnerável? — indaguei.
— Deixar a sua fraqueza exposta? — respondeu, dando de ombros como quem chuta uma
resposta.
— O que torna os seres humanos vulneráveis é a capacidade de sofrer. Por muitos anos, a
única coisa que me despertava dor e sofrimento era a partida precoce da Anna, mas ninguém
poderia machucá-la, ela não está mais entre nós. — Um nó se formou na minha garganta e minha
voz saiu arrastada.
— Aonde quer chegar com tudo isso?
— Você me deixa vulnerável, Beatrice. A vulnerabilidade é muito perigosa, mas nada é
pior do que desistir de você. — Eu estava me declarando para ela como um adolescente e ela me
olhava como se eu estivesse falando grego, eu esperei ouvir algo dela.
— Você está tentando me dizer que gosta de mim? — Mordi o lábio e sorri por sua
pergunta, eu estava rasgando o meu coração e mostrando o quanto eu me sentia incomodado por
voltar a amar.
— Eu estou dizendo que acho que estou apaixonado por você.
27
A filha dele

Beatrice Marino

Arregalei os meus olhos e o ar me faltou diante da declaração.


— Como assim, apaixonado? — Virei as costas, tentando esconder a minha cara de boba.
Ele puxou o meu braço, o trazendo e colando ao dele.
— Quer que eu repita? — indagou com a testa grudada à minha.
— Eu… — Ele me impediu de falar tomando os meus lábios com paixão.
— Você não faz ideia, mas foram exatos cinco anos sem beijar ninguém, para então me
viciar nos seus beijos.
Cinco anos?, indaguei para mim mesma, ainda envolvida em seus beijos que me tomavam
intensamente.

***

No dia seguinte, Vincenzo fez questão de nos levar para conhecer a praia e alguns pontos
turísticos. Giulia ficou radiante, ela andava entre nós, segurando em nossas mãos. Parecíamos
uma família.
— Já está escurecendo, deveríamos voltar — eu disse, observando Giulia bocejar.
— Sim, vamos voltar.
Eu apertava o peito, sentindo um incômodo, algo parecia errado.
— Algo errado? — Vincenzo perguntou, preocupado.
— Não! — afirmei sem um pingo de segurança.
Ele segurou a minha mão com firmeza e a levou até a boca, depositando um beijo.
— Tem algo errado, Don! — disse um dos soldados em tom de alerta.
— O quê?
— Estamos sendo seguidos e tem um drone nos acompanhando.
— Atire! — ele ordenou.
— Trice… — A voz de Giulia saiu assustada e notei que Vincenzo havia esquecido da
pequena ao seu lado.
— Esperem — ordenou. — Vou para o próximo carro e você leva a Giulia e a Beatrice
para casa.
— Não! — disparei apavorada, me agarrando ao seu braço.
— Beatrice, quem quer que seja, está atrás de mim. Siga em segurança com a Giulia —
sussurrou em meu ouvido.
Olhei para a minha irmã com um rostinho aflito, embora ela não tivesse muita percepção
das coisas, ela havia notado algo.
— Droga! — Um freio brusco fez os nossos corpos serem lançados alguns centímetros
para frente e voltando com tudo para trás por conta do cinto.
— Eles nos cercaram, devo reagir, Don?
A pergunta do soldado fez com que ele puxasse o ar com força.
— Beatrice, corra e se esconda com a Giulia assim que eu disser já. Encontro você em
seguida.
Minhas pernas tremiam, como eu iria conseguir correr?
— Seja corajosa, ok? — Balancei a cabeça em confirmação, mesmo que tudo dentro de
mim falasse que eu não conseguiria.
— Giulia, vamos brincar de se esconder, o que acha?
— Trice, o que está acontecendo? — Ela era muito esperta para ser enganada com
facilidade.
— Princesa, vá com a sua irmã. Agora, Beatrice — disse, abrindo a porta, saímos correndo
para a mata, que já estava escura, e me escondi atrás de umas árvores, agarrada a Giulia.
— Vamos cantar, Giulia, vamos cantar baixinho. — Em pouco tempo, já era possível ouvir
muitos tiros. — Não grita, vai ficar tudo bem — garanti, apertando-a com muita força contra o
meu corpo.
— O tio não vem? — ela indagou.
— Estamos esperando por ele.
Giulia chorava agarrada a mim com todas as suas forças, e eu só implorava para que tudo
isso acabasse.
— Beatrice. — O meu coração aliviou, ouvindo a voz de Vincenzo, que sussurrava.
— Aqui! — Levantei-me correndo até ele, o abraçando.
Ele me abraçou forte, esticando a mão para que Giulia fosse até ele.
— Vamos procurar um lugar para ficar até as coisas se acalmarem.
— Quem são eles? — indaguei.
— Russos.
— Que droga eles querem?
— Não precisam de muitos motivos, Beatrice.
Achamos uma cabana abandonada e entramos. Vincenzo esperaria que os soldados
viessem assim que possível.
— Droga! — ele exclamou, seguido de um gemido de dor, se despindo do sobretudo preto.
— Você foi atingido? — perguntei, alarmada, indo até ele quando vi o sangue encharcando
a camisa na altura do ombro.
— Foi de raspão, não se preocupe, acalme a Giulia.
Me sentei em uma cadeira velha de balanço, que deu uns estalos e rangia a cada balançada,
mas não se desmanchou, coloquei a Giulia em meu colo, acarinhando-a, o seu corpo tremia e sua
respiração estava acelerada.
— Eu sinto muito — disse Vincenzo enquanto olhava a movimentação fora da cabana.
— Ela dormiu — comuniquei.
Ele forrou o colchão velho com o sobretudo, pegou Giulia dos meus braços e a pôs na
cama.
— Como está se sentindo? Ainda tem muito sangue. — Me aproximei dele, passando a
mão pelo seu braço, e senti o seu corpo arder em fogo. — Você está com febre.
— Eu estou bem, Beatrice, não se preocupe.
— Sente-se, eu olho a janela, se eu vir algo, eu aviso.
— Descanse ao lado da Giulia.
— Você está suando, suas mãos tremem, não pode me ouvir pelo menos uma vez.
Ele estufou o peito, tentando manter a pose de durão, mas, em poucos minutos, se rendeu e
sentou-se no chão ao lado da cama onde Giulia dormia.
— Sente-se ao meu lado — ele pediu, batendo a mão no chão.
— Precisamos sair daqui, você precisa de cuidados — eu disse enquanto me sentava.
Ele passou o seu braço em volta de mim e alisou os meus cabelos.
— Eu não posso arriscar a sua vida e a de Giulia, são muitos homens, não sabemos se
existem mais. — Deitei a minha cabeça sobre o seu peito.
— Você tem razão, mas estou preocupada.
— Já passei por coisas piores, Beatrice.
Ficamos um tempo em silêncio, ainda era possível ouvir tiros vindos de longe.
— Como a Anna morreu? — indaguei sem esperar que ele me respondesse, mas ele o fez.
— Ela foi assassinada no dia em que teríamos a nossa filha.
— Ela estava grávida? — Levantei a cabeça para lhe encarar.
— Sim — confirmou com a voz embargada.
— Sinto muito.
— Eu também sinto, todos os dias. Mas a pessoa que a matou já foi para o inferno. Fiz
questão de enviá-la da pior maneira — pronunciou com satisfação. — Mas ela ainda está por aí,
vivendo dentro de alguém.
— Como? — Uma ruga se formou no meio das minhas sobrancelhas.
— Essa pessoa não deveria estar viva, ele deveria ter morrido, e não Anna — ele
pronunciou com ódio. — Onde está o seu coração de Anna? Por que não me encontrou ainda?
Arregalei os olhos, encarando-o, mas os seus olhos estavam fechados, ele suava muito.
— Você está delirando? — indaguei para mim mesma. O seu corpo estava quente.
Desabotoei a camisa e a abaixei, tentando enxergar o machucado que ele havia dito que havia
sido de raspão, mas não era o que parecia. — Precisamos ir embora daqui, você precisa de
cuidados.
Saí da cabana, tentando encontrar uma forma ou alguém que me ajudasse.
— Beatrice? Minha boneca linda — Meu corpo gelou. Me virei para trás, reconhecendo a
voz que chamava pelo meu nome de forma sexy e envolvente. — Surpresa? — Sorriu, andando
em minha direção.
Dei vários passos para trás, em sentido oposto ao da cabana.
— Nem mais um passo — ordenou. Enterrei os meus passos e tornei a olhá-lo. — Não está
feliz em me ver?
— Vê-lo aqui não era o que eu esperava. O que faz aqui?
— Vim buscar você, não parece óbvio? — Ele me lança um breve sorriso repleto de
mistério e perigo.
— Estou casada — disse, dando mais uns passos para trás.
— Sim, eu sei. Lamentei as circunstâncias, no fundo, eu gostaria de tê-la virgem, mas não
a dispenso por não ser. Eu a quero muito.
— Fez tudo isso para que eu fosse com você?
— O que eu fiz? Movi uma centena de homens de um país para outro como se fosse uma
excursão? — Se orgulhou de si mesmo.
— Me refiro ao confronto.
— Acertei um tiro no seu marido, ele está aí, na cabana?
— Andrei, nos deixe em paz — supliquei.
— Estou bem desapontado, Beatrice, movi tudo isso por você, os seus pais estão
apavorados, seu avô lamenta diariamente no meu ouvido. “Ele vai descobrir” Ele vai matá-la”.
— Do que está falando? — indaguei, confusa.
— Do coração, Beatrice. Esse que bate aí em você era da esposa dele. A sua família está
com medo de que ele descubra e mate a todos. Claro que eu o mataria antes. Vamos embora…
— Ele estendeu a mão, esperando que eu a pegasse.
— Como? O meu coração? — Me senti como alguém que foi acertado por um raio de um
bilhão de volts. Morta de fato, impossível viver depois de tal choque.
As pessoas costumavam dizer que o nosso coração carrega memórias e, embora eu sempre
soubesse que o cérebro é o único responsável pelos sentimentos, aqui estava o meu coração
acelerado e gritando para me afastar de Andrei e salvar a vida daquele homem lá dentro.
— Os seus pais deveriam ter contado a você sobre isso — ele falou, puxando a minha mão
e me arrastando para longe da cabana.
— Eu não posso ir. — Puxei a minha mão com toda força que eu ainda tinha.
Ele sorriu, passando a mão no queixo com um olhar inexpressivo.
— Se apaixonou por ele? — Tinha fúria na sua voz.
Sim, eu estava, e não foi nada que começou ontem ou hoje, e, sim, no dia em que esse
coração reconheceu o seu lar e encontrou a sua outra metade que vagava como um monstro sem
alma.
— Nem por ele, nem por você — cuspi a mentira de forma convincente.
Seu olhar furioso parecia querer me rasgar ao meio.
— Garantirei que viva, mas não porque me simpatizo com a sua atual postura, Beatrice. —
Aproximou, encurtando a distância entre nós, e pegou uma mecha dos meus cabelos, esfregando
os dedos pelos fios. — Um homem precisa de algo que o inspire a conquistar cada vez mais, iria
levá-la comigo, mas resolvi que ficar e instalar um novo comando será mais interessante. —
Jogou-me de lado, caí sentada no chão e me levantei apressada, o seguindo. Ele andou com
pressa para a cabana.
— Andrei! — gritei, me agarrando aos seus pés, que não pararam, me arrastando pela terra
que arranhava o meu corpo. — A Giulia, ela está na cabana, não, por favor — implorei.
— A filha dele? — perguntou, parando para me olhar de cima.
— Sim, a filha dele — confirmei como alguém que acaba de fazer uma descoberta
chocante. Eu havia tirado tudo dele.
28
Nada fica oculto para sempre

Beatrice Marino

Abri lentamente os meus olhos, a minha pele queimava, e eu me sentia tonta.


— Onde estou? — questionei com a voz alta, mesmo que eu não tivesse visto alguém no
quarto.
— Em um dos quartos da nossa casa. — Virei a cabeça rapidamente, me causando uma dor
fina em cima dos meus olhos.
Como eu havia chegado aqui? Ainda não estávamos em Florença, mas eu estava segura na
casa de praia.
— Vincenzo? — indaguei, preocupada, vendo o seu ombro enfaixado.
— Estou bem, Nina veio de Florença, mas claro que um médico local me atendeu antes. —
Ele caminhou em minha direção.
— Como cheguei aqui? — perguntei, confusa. — Eu estava com… — Calei-me.
— Com? — Fez um gesto com a mão, me incentivando a continuar.
— Não sei. — Calei-me com medo da sua reação diante da resposta.
— Ok. Você caiu e bateu a cabeça, você escorregou? — Estreitou os olhos e me analisou.
Passei a mão rapidamente pela cabeça, ela latejava próximo à nuca.
— Eu senti tanto medo — disse em lágrimas.
— Está tudo bem agora, você está segura. — Ele se sentou ao meu lado e limpava as
feridas espalhadas pelo meu corpo.
Aos poucos, a noite anterior voltava a minha mente. Eu ouvi fogos e Andrei exclamou
irritado: “Filhos da Puta! ” Acredito que era um sinal para ele recuar, os soldados de Vincenzo
apareceram em seguida, me desequilibrei e lembro de sentir a minha cabeça batendo contra algo,
uma pedra ou uma árvore, eu não tenho certeza.
— A Giulia? — indaguei.
— Está tudo bem, o pesadelo acabou. — Ele tinha um olhar inexpressivo e sua voz não
tinha emoção.
Me sentei apressada na cama, o abracei com força e chorei, tentando aliviar a culpa que eu
tinha dentro de mim.
— Me perdoa! — ele sussurrou em meu ouvido.
Era eu quem devia perdão a ele, eu não deveria estar viva, assim como ele havia me dito.
Gritei e permiti que as lágrimas corressem, eu queria aliviar a angústia, Anna foi assassinada, um
pedaço dela vive em mim. Eu nunca seria ela, mas eu poderia ser alguém que iria aliviar a dor
dele, ser a mãe da Giulia e, contanto que ele não descobrisse, eu estaria segura.
Ele se afastou do meu abraço para me encarar, enxugou as minhas lágrimas com o dedo
polegar e me beijou em seguida.
— Chamarei a Nina, para ela te examinar novamente. Voltamos para Florença hoje — ele
disse já de pé, caminhando para a saída do quarto.

***

Vincenzo Ferrari

— Desgraçados, filho da puta! — Esmurrei a parede com força assim que saí do quanto de
Beatrice, vê-la machucada daquela forma me deixou irado.
— Calma, Don, dessa forma, vai abrir os pontos novamente. — Olhei em direção de onde
vinha a voz. Nina me observava no final do corredor.
— Entre e examine-a novamente — ordenei.
— Claro. — Ela me lançou um breve sorriso enquanto caminhava pelo corredor e cruzou a
porta do quarto. Apenas mais uma que me odiava.
— Arrumem tudo, partiremos hoje — falei aos funcionários.
Eles ousaram machucar a minha esposa, eu devo mostrar-lhes que o diabo é bem mais
benevolente do que eu.
— Mattia, não toque em nenhum, eu mesmo farei as honras — disse em uma mensagem de
voz para o meu primo, que já estava com os homens capturados em um dos nossos galpões em
Florença.
— Don, já está tudo pronto, a menina voltou a dormir — disse Lorenzo, descendo as
escadas e me encontrando na sala.
— Andrei atirou em mim, ele veio pessoalmente e se aproveitou da minha viagem, sabia
que estaria com menos soldados que o habitual. Eram muitos, Lorenzo, ele trouxe uma centena
de homens com ele. — Esmurrei a mesa na minha frente, tentando aliviar a minha fúria.
— Calmati, você precisa parar de esmurrar as coisas, os seus pontos já abriram três vezes
de ontem para hoje.
— Calma? Como posso manter a calma, Lorenzo?
— Como sempre fez, esqueceu que esse sempre foi o seu trunfo? Serenidade.
— Agora tem a Beatrice e a Giulia — As palavras saíram rasgando a minha garganta.
— Se apaixonou? — Ele sorriu com satisfação.
— Não me venha com zombarias, Lorenzo, não estou com cabeça para os seus deboches.
— Ok, perdão. Acredita que Andrei já voltou para Rússia?
— Não, ele não mobilizaria tantos homens para voltar de mãos vazias.
— Permitiu que Mattia interrogasse os detidos? — ele indagou, e eu suspirei em derrota.
— Ele deveria ser meu conselheiro, um homem de confiança — pronunciei, inconformado.
— Mandarei preparar doze fogueiras arrumadas em círculos do jeito que você gosta, com
pólvoras no centro e um caminho até cada uma delas. — Sorriu, mudando de assunto.
— Vou resolver a nossa volta, quero partir ainda de manhã.

***

Beatrice Marino

Eu me agarrei às minhas próprias pernas, deixando as lágrimas livres e o soluço, me


impedindo de falar, Nina me olhava preocupada.
— Quero pensar que tudo isso é apenas um coração aflito por um trauma, se acostume,
essa é a vida ao lado de alguém que pertence à máfia.
— Desde quando você sabe, Nina? — A minha voz saiu partida pelos soluços.
— Depende do que você acredita que sei. — Deu de ombros, se recostando na cama quase
deitada ao meu lado.
— Sobre o coração da Anna. — Ela sentou-se rapidamente, me encarando como quem
acaba de ver uma assombração.
— Cale-se, Beatrice, o que quer que esteja tentando me contar, não me conte, não quero
saber.
— Eu não tenho ninguém, Nina, eu estou devastada.
— A sua cirurgia foi perfeita, eu já lhe disse, eu sou médica, obviamente notaria.
— Ele já procurou, ele suspeita de mim — falo, lembrando das vezes em que seus dedos
traçaram o caminho entre os meus seios.
— Anna foi assassinada, ela estava prestes a dar à luz, faz ideia do que isso significa,
Beatrice?
— Que eu deveria estar morta, e não ela — admiti em meio às lágrimas.
— Não, isso significa que você deve viver, é o mínimo que você pode fazer por ela.
— Eu tirei tudo dele, Nina, eu não mereço essa vida, eu não mereço o amor da Giulia — O
meu choro saiu como um grito de dentro de mim.
— Giulia? — Ela sentou-se ao meu lado, me olhando confusa.
— Ela é a filha da Anna com o Vincenzo.
— Cacete! Cacete! Pare já, eu não quero mais saber de nada. — Levantou-se apressada,
me deixando sozinha no quarto.

***

No caminho de volta, muitos carros nos escoltaram, Vincenzo me apertava contra o seu
corpo enquanto sua outra mão alisava as feridas espalhadas pelo meu corpo. Eu vi a culpa que
ele sentia em seus olhos, enquanto a minha estava oculta. Eu chorei baixinho, enxugando as
lágrimas que escorriam por baixo de uns óculos escuros, mas o meu peito estremecia. Eu
precisava ver os meus pais, eu precisava de respostas.
— Vincenzo, eu preciso ver os meus pais — disse assim que atravessamos a cidade e eu
pude ver a paisagem acolhedora de Florença.
— Pedirei que levem você lá, preciso resolver uns assuntos, mas irei lhe buscar assim que
possível.
— Agradeço — eu disse, e ele beijou o topo da minha cabeça. Será que ele podia sentir a
Anna dentro de mim?
Em um determinado ponto, Vincenzo foi para outro carro, eu e Giulia seguimos para a casa
dos meus pais. Luigi estava sentado no jardim quando eu cheguei, ele levantou a cabeça, andou
apressado em direção ao carro e me abraçou forte assim que saiu do veículo.
— Trice. — Ele me envolveu em seus braços fortes, e eu desabei dentro do seu abraço. —
O que aconteceu, irmã?
— Que bom que posso te sentir.
— Vamos entrar, você assustará a Giulia.
Uma das funcionárias da casa levou Giulia para tomar um banho e comer, e eu aproveitei a
oportunidade para conversar com os meus pais.
— O que aconteceu? — indagou o meu pai preocupado.
— Vocês foram cúmplices? — perguntei, e meu fratello levantou-se do sofá colocando as
mãos na cintura.
— Do que nos acusa, Beatrice?
— Desde quando sabem que o meu coração é o da Anna? — Eu sorri sem humor,
enxugando as lágrimas. — Claro que sempre souberam.
— Pare já, Beatrice! — O meu pai se levantou aborrecido e se pôs de pé na minha frente.
— Não somos assassinos, Beatrice e nem somos cúmplices, estávamos desesperados, você não
tinha muitos dias de vida, e o Don nos ofereceu ajuda. Claro, nós sabíamos que teria um preço,
eu daria o meu império por você — ele falou, exaltado. — Mas não venha nos acusar, tudo foi
armado na cabeça doente daquele sádico.
— Está me dizendo que não aceitaria se soubesse, aliás, pai, talvez a pergunta seja outra.
Estaria tudo bem se a pessoa assassinada fosse alguém comum?
— Não nos julgue, Beatrice — meu fratello falou dessa vez, enquanto a minha mãe
chorava.
— Ele vai me matar — afirmei. — Eu tirei tudo dele e sabe o que é pior, papà? É que eu o
amo e eu me sinto péssima por despertar sentimentos nele também.
— Do que está falando? Ele se declarou para você? — questionou a minha mamma, que
suspirou aliviada, e sentou-se ao meu lado, fazê-lo se apaixonar era parte do plano dela. — Você
está salva, Trice. Não precisamos mais nos preocupar — disse ela, soltando o ar dos pulmões
como se tivesse acabado de tirar um peso dos ombros.
— Mamma! — Meu tom foi repressor. — Uma pessoa foi morta.
— Mas você está viva, e eu quero que continue assim.
— Nada fica oculto para sempre e ele precisa saber sobre a Giulia.
O meu papà passou a mão pelos cabelos grisalhos, eu sei que ele ama a Giulia como filha
dele, e que isso está doendo.
— Papà. — Giulia agarrou-se às pernas do meu pai, que a levantou no ar e a abraçou
fortemente. Enquanto isso, a minha mãe me puxou para o canto da sala.
— Estou feliz, o seu marido está interessado em você, isso é bom, Beatrice.
— E em que parte você me conta que andaram pedindo ajuda ao Andrei? — Tirei o
sobretudo e mostrei os ferimentos que cobriam o meu corpo.
— Dio mio![11] — ela gritou, colocando a mão na boca.
Fechei o sobretudo ao redor do meu corpo mais uma vez.
— Ele veio pessoalmente da Rússia para me levar com ele. Se meu marido descobrir, será
considerado traição — respondi, balançando a cabeça negativamente.
— Andrei fez isso? — ela indagou.
— Mamma, o que te faz pensar que Andrei é diferente de Vincenzo? Darei ao meu marido
o que lhe foi tirado. Eu não sou a Anna, mas carrego um pedaço dela dentro de mim.
29
Beatrice, seja minha

Vincenzo Ferrari

O carro estacionou no galpão.


— Don, as fogueiras já foram armadas — disse Mattia assim que desci do carro.
— Ok, onde eles estão? — indaguei, caminhando até o interior do galpão.
— Na ala superior, vou lhe acompanhar e ajudar com o interrogatório — Mattia respondeu,
me seguindo.
— Lorenzo, leve o Mattia para checar as fogueiras e as pólvoras — ordenei, eu queria
questionar os presos sozinho.
— Isso é serviço para os soldados — Mattia pronunciou, desdenhoso.
— E o seu serviço é garantir que tudo dê certo no momento da cremação.
Subi sozinho e caminhei pelo corredor, observando cada prisioneiro. Não era possível
identificar qual deles tinha uma patente alta na organização de Andrei, mas o olhar de cada um
indicava quem possuía informações valiosas. Geralmente, aqueles que estavam dispostos a
morrer pela causa tinham um olhar tranquilo e calmo. Eram eles que detinham as informações
mais importantes.
— Esse. — Apontei para um dos homens que me encarava com superioridade, eu
questionaria um a um, mas não me impedia de tentar encurtar o processo.
Um dos meus soldados leva-o para a sala de torturas e o prende na cadeira.
— Deveria me matar e encurtar todo esse trabalho, não tenho informações — disse,
cuspindo no chão em seguida.
— Matar? — Gargalhei. — Você acredita que é assim que as coisas funcionam aqui? Já
percebi que, como sempre, acertei, você tem algo a contar.
— Já disse, me mate.
— O que Andrei veio fazer na Itália? — indaguei.
Ele sorriu com deboche.
— Está defendendo quem te deixou aqui para morrer? — questionei. — Posso te oferecer
alguns benefícios caso resolva cooperar.
— Acredita que eu trairia o meu líder e o meu país?
Eu me encontrava em pé, ao lado de uma mesa repleta de objetos que eram utilizados para
tortura e, enquanto selecionava qual seria o primeiro a usar, eu brincava com eles.
— Você tem filhos? — quis saber.
— Que tipo de pergunta é essa? — Ele me olhou confuso.
— Eu não tenho, mas, se os tivesse, ficaria feliz em retornar para casa e vê-los sorrindo —
caminhei lentamente em sua direção —, é uma pena que não vai mais voltar e por escolha
própria, e, mesmo que volte, não poderá vê-los — pronunciei, cravando um objeto em seu olho.
Ele gritou, eu sentei-me e observei-o sofrer à distância.
— A sua esposa passou longos minutos com ele, considerou perguntar para ela? —
perguntou em meio a gritos de dor.
— Não envolva a minha esposa nisso.
— Como não envolver, viemos aqui para buscá-la.
Eu me mantive sereno, embora o ódio e os ciúmes me corroessem por dentro.
— Por que ele quer a minha esposa? — questionei.
— Vai se foder — ele gritou.
— Eu estou aqui para foder com você — Cravei uma faca em sua perna e girei. Ele gritou
e tentou soltar os braços presos à cadeira.
— O que ele quer com a minha esposa? — tornei a perguntar.
— Não faço ideia, mas imagino que seja pelo mesmo motivo que você. Obter poder e foder
gostoso.
— Vá se foder, seu filho da puta. — O esmurrei com tanta força que a cadeira virou. —
Onde ele está? Me diga — ordenei.
Ele gargalhou.
— Don? — Lorenzo entrou na sala.
— Coloquem esse filho da puta de ponta cabeça, amarrado com correntes, se ele não disser
a localização de Andrei, tire cada pedacinho dele, dedo por dedo, e coloque sal em seguida, se
ele morrer sem falar, será uma morte lenta.
Virei as costas e Lorenzo veio atrás de mim.
— Quanto aos outros? — ele indagou.
— Lorenzo, eles vieram atrás da Beatrice, descubra o que Andrei quer com ela.
— Acho que a pergunta correta é que ligação ela tem com ele.
— Cacete! — Dei uma pesada na grade de uma cela na minha frente. — Beatrice não tem
nada a ver com isso, entendeu, Lorenzo?
— Claro, eu nunca diria o contrário.
— Cuide desse assunto pessoalmente e, toda informação que tiver, passe apenas para mim.
— Sem problemas, Don. Quanto às fogueiras?
— Questione a todos, os que menos souberem ou os que não disserem nada de útil, queime
de forma que todos assistam pelas janelas.
— Certo.
Saí do galpão e fui direto para a casa dos meus sogros.
— Aqui, senhor — disse um dos soldados no carro, me entregando um pano úmido para
limpar as minhas mãos meladas de sangue.
— Siga para a casa dos meus sogros — ordeno ao motorista.
Quando cheguei à propriedade dos Marino, não vi ninguém no jardim além dos
seguranças.
— Devo anunciar a sua chegada, senhor?
— Avise a Beatrice que a espero no carro.
Eu precisava saber tudo sobre a família da Beatrice na Rússia, eu resolvi investigar
pessoalmente. Em poucos minutos, vi Beatrice vindo em direção ao carro sozinha, ela entrou, se
acomodando ao meu lado.
— Onde está a Giulia? — questionei.
— Vai passar essa noite aqui, você se importa? — ela indagou como se coubesse a mim a
decisão.
— De forma nenhuma, afinal, ela é a filha deles.
O meu motorista deu partida no carro.
— Onde você se machucou? — perguntou, roçando nos meus punhos.
— Em alguma mesa, você sabe. — Dei de ombros com um sorriso contido.
Os seus olhos estavam inchados de tanto chorar.
— Você ainda não me mostrou o ateliê — disse, mudando de assunto.
— Quer mesmo conhecer? — questionou, surpresa.
— Claro. Pare o carro em frente ao ateliê quando chegarmos à mansão — ordenei.
Eu estava ansioso para explorar mais as características únicas e interessantes da Beatrice,
mas, ao mesmo tempo, me sentia um pouco culpado por não estar mais tão focado em Anna.
Porém, não é que eu não a ame mais, é mais uma sensação de estar completo e capaz de ser feliz
novamente.
O meu motorista parou em frente ao pequeno vão próximo ao vinhedo, eu desci e a ajudei
a sair do carro em seguida.
— Bom, esse é o meu espaço — ela disse de braço abertos e um ar satisfeito.
— Pequeno, não acha? — indaguei, olhando ao redor para as telas amontoadas no canto e
apenas um cavalete coberto com um pano. — Posso ver? — perguntei, me aproximando.
— Prefiro que veja quando estiver pronto. — Ela se pôs na frente e suas bochechas
coraram.
— Me deixou curioso. — Puxei-a para mais perto do meu corpo e uni os meus lábios aos
dela. Eu estava completamente rendido, apaixonado e disposto a fazer qualquer coisa por ela. —
Como você se machucou, Beatrice? Com quem você encontrou na mata? Os soldados do
Andrei? — perguntei, implorando aos céus que ela falasse a verdade. Tudo o que eu mais
precisava era poder confiar nela naquele momento.
— Andrei foi até a cabana terminar o que começou com você, ele queria atirar mais, ele
queria te matar — ela disse, virando as costas para mim.
— Olhe nos meus olhos e me diga tudo. — Virei-a de volta.
— E se a verdade me distanciar de você? — Uma lágrima caiu dos seus olhos.
— Nem mesmo o meu compromisso com a máfia seria capaz de me afastar de você. Eu
passei tempo demais em relacionamentos superficiais, acreditando por anos que nunca mais
amaria alguém novamente. E agora estou aqui, dizendo coisas que achava que nunca mais diria.
A única coisa que pode nos separar agora são as verdades escondidas, Beatrice. Por favor, ajude-
me a confiar em você.
Ela baixou a cabeça, estava claro que ela tinha muito a dizer e que, por algum motivo, ela
não se sentia pronta para falar.
— Ande até ali. — Apontei até a mesa que ficava no meio da pequena sala.
Ela obedeceu sem questionar.
— Agora tire as roupas lentamente — ordenei e, quando os seus olhos arregalaram, eu
gargalhei.
Andei em direção a ela enquanto parecia estar imóvel, tentando compreender minhas
ações. Então, peguei uma das muitas telas amontoadas no chão e a coloquei em um cavalete.
— O que pretende? — ela indagou.
— Vou desenhar você.
Um sorriso tímido se formou em seus lábios.
— Nua?
— Não tem nada aí que eu já não tenha visto.
Eu me sentei e observei enquanto ela retirava cada peça de roupa cuidadosamente, sentindo
meu corpo se excitar com a expectativa do que viria a seguir. Queria tocar cada curva, explorar
cada textura e descobrir cada segmento de sua pele. Mas, por ora, eu me controlei, deixando-a
seguir seu ritmo enquanto me deliciava com cada momento. Tinha certeza de que valeria a pena
esperar.
— O que devo fazer agora? — indagou.
— Achei que estivesse acostumada a ter modelos humanos para aprimorar as suas técnicas
de pintura.
— Nunca um homem nu — respondeu, voltando a ficar corada.
Mordi meu lábio inferior e me aproximei dela, erguendo-a pela cintura e sentando-a sobre
a mesa. Ela se contorceu e arqueou as costas, abrindo as pernas e me dando uma visão
privilegiada. Deslizei um pincel sujo de tinta pelo seu corpo, fazendo-a gemer. Logo estávamos
ambos sem roupas, com a tinta espalhada pelo nosso corpo. Eu a beijava com loucura e gemi
quando a sua língua traçou um caminho pelo meu copo.
— Beatrice, seja minha — implorei.
— Eu já sou — sussurrou em meu ouvido.
Eu a coloquei por cima de mim, e ela se encaixou no meu pau e rebolou em seguida.
— Boceta gostosa — gemi, enquanto ela cavalgava no meu pau. Apertei os seus peitos e os
trouxe à minha boca, os dois, enlouquecido, os chupando. Os seus movimentos iam ganhando
mais ritmo, eu senti o seu corpo tremer e contemplei a sua expressão de prazer, o que me deixou
ainda mais excitado. — Cacete, que delícia! — urrei.
Ela saiu de cima de mim e voltou a traçar um caminho pelo meu copo com a sua língua até
chegar ao meu pau, eu gemia alto e segurava seus cabelos, enquanto ela continuava a me chupar,
alternando entre movimentos rápidos e profundos e lambidas suaves nas minhas bolas. Aquilo
era muito estimulante, e eu não aguentava mais segurar por muito tempo. Em um impulso, tirei
ela de cima de mim e a coloquei de quatro, já posicionando meu pau na entrada da sua boceta
ensopada. Gemi alto ao penetrar nela, sentindo seu corpo apertado e quente me envolver.
Comecei a estocar com força e ela gemia alto, pedindo mais. Apertei suas nádegas e a
puxei ainda mais para mim, aumentando a intensidade das estocadas. Ela estava tão excitada que
gozou novamente, contraindo seus músculos ao redor do meu pau e me levando ao ápice. Enchi
sua boceta com meu esperma enquanto gemia alto de prazer. Caímos exaustos no chão, ofegantes
e suados. Foi inesquecível.
30
Preciso saber tudo sobre a Beatrice

Beatrice Marino

Eu andava pela mansão quando avistei Alessia, sentada próximo a um lago.


— Buongiorno, senhora — ela diz, levantando-se rapidamente assim que notou a minha
aproximação.
Virei as costas e caminhei de volta para a mansão, a presença dela me incomodava, era
como se eu vivesse em um castelo de gelo, prestes a derreter com a chegada do verão. Entrei
apressada, atravessando a sala e indo direto para o meu quarto, e dou de cara com Vincenzo
saindo do banho.
— Qual o problema? — ele indagou depois de analisar a minha expressão.
— Nenhum — respondi, passando direto por ele, me puxou pelo braço e me abraçou pela
cintura.
— Se não falar, não terei como resolver — sussurrou em meu ouvido.
Mordi o lábio receosa.
— Ainda acredita que precisa da Alessia, aqui? — perguntei de cabeça baixa. Ele suspirou,
me soltando.
— Não, eu não preciso, irei resolver essa questão — disse, indo até o closet e voltando
com as roupas que iria vestir nas mãos. — Eu nunca a toquei depois que nos casamos, me sinto
satisfeito com você, a deixei apenas por não me importar com a presença dela, mas claro que isso
incomodaria você. — Ele se aproximou e me beijou suavemente nos lábios.
Eu vinha vivendo um sonho ao lado de Vincenzo, no entanto, era difícil não se deixar levar
pelo medo e pela insegurança. Eu sabia que, se ele soubesse sobre a Anna, as coisas poderiam
mudar entre nós, mas eu não conseguiria simplesmente esconder isso para sempre. Eu precisava
confrontar a situação de alguma forma.
— Aonde vai tão cedo? — indaguei.
— Ao galpão, os homens do Andrei ainda estão lá — ele respondeu, e eu me levantei, indo
até ele e o ajudando a abotoar a camisa.
Apenas o nome do Andrei já me causou certo desconforto. Eu sei que ele é obcecado por
mim e que meu avô o admirava profundamente. Mas, na época em que estive na Rússia, não
conseguia ver nada disso.
— Talvez você não precise viver em função disso — pronunciei, e ele sorriu como se eu
tivesse acabado de dizer a maior idiotice.
— Beatrice, não saia da mansão sozinha, de preferência, me aguarde, posso te acompanhar
onde você precisar ir — ele disse e beijou o topo da minha cabeça, cruzando a porta do nosso
quarto em seguida.
O meu telefone tocou sobre a mesa, eu desconhecia o número, mas, ainda assim, atendi.
— Trice — o homem disse do outro lado da linha, e eu tremi, reconhecendo a voz. — Não
desligue — ordenou Andrei.
Sentei-me na cama, sentindo o meu coração acelerar.
— Quando vou te buscar? — ele indagou, e a minha respiração ficou acelerada. — Saia
agora, o seu marido acabou de cruzar a esquina, eu lhe dei muita diversão. — Sorriu. — Ele
gosta de torturas.
— Por acaso não é isso que está fazendo comigo agora e se divertindo?
— Beatrice, eu te conheço tão bem. Quando lhe fiz mal? — A sua voz saía de forma sexy
e envolvente. — Já contou a ele o seu segredo? Estou curioso para saber o que ele fará.
Desliguei o telefone e o apertei em minhas mãos.
— Vincenzo vai me matar — pronunciei para mim mesma quando o telefone vibrou com
uma mensagem do Andrei.
“Venha comigo, cuidarei de você e da sua família”.

***

Vincenzo Ferrari

Eu havia passado dias monitorando as ligações de Beatrice e até então tudo o que havia
encontrado eram chamadas para sua amiga Antonella. Eu estava no escritório do galpão quando
algo inesperado aconteceu. Uma ligação de Andrei para ela chegou até o meu ouvido, e eu
rapidamente me concentrei na conversa.
— Filho da puta, eu vou matar você — pronunciei, ouvindo o meu inimigo falando como
se fosse íntimo da minha esposa.
Beatrice parecia ansiosa e nervosa do outro lado da linha, sua voz estava baixa e tremia um
pouco. Continuei ouvindo atentamente, tentando entender o teor da conversa. Andrei falou sobre
um segredo, que segredos ela teria com ele?
Depois de desligar, eu fiquei pensando no que deveria fazer, eu precisava de mais
informações, mas não sabia como confrontá-la.
Que segredo é esse, Beatrice?, indaguei em pensamento.
— Lorenzo — gritei, chamando-o, e ele entrou na sala rapidamente. Lembrei de alguém
que poderia ter informações importantes.
— Qual o problema?
— Ligue para a Nina, eu preciso falar com ela.
— Nina? O que quer com ela? — Ele estreitou os olhos, me analisando.
— Lorenzo, só faça o que mandei, não me questione.
— Quer que ela venha aqui? — perguntou, torcendo o nariz.
— Qual o problema?
— Tem muitos corpos espalhados, os presos gritam de dor dia e noite — respondeu baixo.
— Ela é médica, deve estar acostumada com esse cenário.
Ele me lançou um olhar insatisfeito e aproximou o telefone do ouvido, virando as costas
para mim.
— Nina, pode vir ao galpão, o Don precisa falar com você, vou te passar a localização —
ele disse com a voz arrastada. Quando se tratava da Nina, eu sabia que ele sempre ficaria no
meio, e isso não era bom.
— Perfeito, suba com ela assim que chegar — ordeno assim que ele encerrou a ligação.
Uma hora depois, ele entrou no escritório com ela.
— Saia, nos deixe sozinhos — ordenei.
Ela assentiu com a cabeça, e ele me encarou com preocupação, mas fez sem questionar.
— Estarei aqui fora — ele disse e a beijou no rosto antes de sair.
— O meu irmão parece gostar muito de você — eu disse, apontando para a cadeira na em
frente à mesa, e ela sentou-se.
— Fomos prometidos ainda novos, nos acostumados com a ideia de que teríamos um ao
outro — ela respondeu.
— Quer se casar com o meu irmão? — questionei.
— Casar-se com um mafioso nunca foi o sonho de uma mulher — ela contrapôs com a
afronta de sempre.
— Então, não está satisfeita? — Inclinei o meu corpo em direção a ela, apoiando as minhas
mãos sobre a mesa.
— O senhor sabe que eu não tenho alternativa, então me acostumei com a ideia, e veja que
ironia, me apaixonei pelo subchefe.
— Sabe o que eu tenho apreço por você, Nina? A sua sinceridade, e me pergunto o quanto
você é amiga da minha esposa.
— Só conversamos quando vou à mansão — ela respondeu.
— Ela confia em você? Confia, eu vejo o sorriso dela quando você chega.
— Aonde quer chegar com isso? — Uma ruga de preocupação se formou em sua testa.
— Preciso saber tudo sobre a Beatrice.
— Não seria mais fácil perguntar a ela? Ela demonstra sentimento pelo senhor, sei que está
disposta a se abrir.
— Estou monitorando o telefone da Beatrice e ouça isso. — Soltei a gravação.
— Eu não sei nada sobre isso — disse firme assim que a ligação de Andrei e Beatrice
encerra.
— Mas pode me ajudar a desvendar esse mistério. Pensa comigo, Nina, que segredo a
Beatrice teria que eu o marido dela não sabe, mas o meu maior inimigo sabe?
— Desculpa, Don, mas eu não sei.
— Descubra — ordenei.
— Ela não confia em mim a esse ponto — respondeu.
Eu vi a recusa dela e que não estava disposta a fazer o que eu estava mandando.
— Certo, pode sair — falei, arrumando a postura. — Não fale sobre nada disso com o
Lorenzo.
Ela se levantou, e notei a sua dificuldade em manter as pernas firmes.
— Diga ao seu pai que seu casamento acontecerá em breve — disse alto depois que ela
abriu a porta, eu queria que Lorenzo ouvisse
— Casamento? — Ele entrou na sala, passando por ela como uma bala.
— O Biachi, acaba de ficar viúvo, com a idade que tem, é certo que não arrumará um bom
casamento. — Dei de ombros.
— Não! Nunca entendeu, Vincenzo, eu esquecerei que sou seu irmão, entendeu? — Ele
veio até mim com fúria e teve a audácia de me segurar pelo colarinho.
— Pare, Lorenzo! — Sorri com satisfação quando ela veio contê-lo, notei a preocupação
dela com o meu irmão.
— Vou matar você, Vincenzo — ele gritou.
— Chega! — gritou para ele.
— O que é, o que ele quer com você, Nina, entregue a ele, vamos, faça o que tem que
fazer. — Foram poucas as vezes que vi o meu irmão desestabilizado, ele realmente gosta dela.
— Saia, Lorenzo, vou conversar com o Don, ficaram alguns assuntos pendentes.
— Não! Qual é o problema, Vincenzo? — ele questionou aos gritos.
— Apenas saia, não é assunto seu — eu disse, rígido.
— Eu lhe chamo se precisar — ela falou, mostrando um sorriso confiante para ele, que
saiu, mesmo contrariado.
Lorenzo me olhou firme antes de cruzar a portar e fechá-la em seguida.
— Farei o que me ordenou. Serei uma espiã e a melhor amiga de sua esposa, apesar de
saber que o senhor teria todas as respostas que precisa se demonstrasse a ela que também pode
ser um amigo de confiança.
Eu sabia que ela estava certa e decidi que tentaria obter as informações necessárias. No
entanto, eu precisava de outras opções, e Nina era uma delas.
31
Eu não tenho sentimentos

Vincenzo Ferrari
Cheguei em casa no final da tarde e ouvi Beatrice brincar com Giulia em nossos aposentos.
Fui até o quarto de hóspedes e tomei um banho demorado. Eu não podia confiar em ninguém, foi
assim a minha vida inteira com o meu pai, com os meus soldados ou com os meus líderes mais
próximos, mas eu necessitava confiar em Beatrice, a ideia de que eu me abrir para alguém que eu
não merecia estava acabando comigo. Me vesti rapidamente e fui encontrá-las.
Beatrice abriu um lindo sorriso quando me viu entrar, o seu semblante parecia um pouco
perturbado, mas, ainda assim, ela sorriu, trazendo uma calma inexplicável. Giulia saltou na cama
e correu para me abraçar.
— Como foi o seu dia? — indaguei, me sentando ao lado dela com a garotinha ainda em
meus braços.
Beatrice era única e especial, eu não queria acreditar que depois de tantos anos eu tinha
entregue os meus sentimentos para a pessoa errada. O que eu estava sentindo por ela era
assustador.
— Nada de diferente — ela respondeu, encostando a cabeça no meu ombro, e eu a abracei.
Ficamos assistindo ao filme de desenho que passava, e Giulia dormiu, eu a levei até o seu
quarto e velei o seu sono por alguns minutos, era prazeroso ouvi-la ressonar, e a sua expressão
tranquila me trazia paz.
— Don. — Um dos meus soldados vem até mim com um envelope nas mãos assim que sai
do quarto da Giulia.
— Do que se trata? — indaguei.
— Acabaram de entregar — ele disse, esticando a mão para me entregar, e eu identifiquei
o selo do pacote em sua mão.
Desci as escadas segurando firmemente o envelope com informações preciosas vindas da
Rússia. Meus pensamentos concentrados unicamente em investigar a família de Beatrice.
Cheguei ao escritório e me sentei em frente ao computador. Abri o envelope cuidadosamente e
comecei a analisar cada documento com atenção. As informações eram extremamente
importantes e precisas. Meu coração batia mais forte conforme eu avançava nas descobertas.
— Ela é uma espiã, Vincenzo — afirmei para mim mesmo depois de ver os documentos, o
avô dela é um associado importante de Andrei, Antônio Marino tinha a intenção de estreitar os
laços com a Rússia, foi assim que Beatrice chegou aqui.
Eu estava confuso, ela era doce e um tanto ingênua.
— Não, Vincenzo, ela não tem culpa de nada disso — disse, tentando me convencer das
minhas próprias palavras. Mas como acreditar nisso se hoje ela recebeu uma ligação dele, do
meu inimigo.
Eu sou implacável, eu não tenho sentimentos. Eu pensava, andando de um lado para o
outro no escritório.
— Vincenzo? — A porta se abriu, e eu recolhi os papéis sobre a mesa, os guardando na
gaveta. — Qual o problema? — A voz doce de Beatrice ecoou na sala, o cheiro de morango
invadiu as minhas narinas. Eu seria capaz de matar toda a sua família, mas ela não, eu não
conseguia me imaginar em um mundo onde ela não existisse.
— Achei que tinha ido dormir — eu disse, me aproximando.
— Eu estava esperando por você, pensei que você estava com a Giulia. — Ela passou os
braços em volta do meu pescoço, e eu cravei os meus olhos aos dela. O que você me esconde,
Beatrice?
— O que sente por mim? — perguntei como um moleque inseguro.
Ela mordeu os lábios e desviou os olhos antes de voltar a me encarar e então falar:
— Eu sinto que toda a minha existência tem um único intuito, que é amar você. É por isso
que eu ainda vivo, porque você precisa ser amado e porque você não poderia ficar sozinho.
As suas palavras fizeram os meus olhos se encherem de lágrimas, as últimas lágrimas
derramadas por mim foi há anos, sobre o túmulo da Anna.
— Então me mostre que posso confiar em você, me prove que nós dois valemos a pena.
Com quem se importa mais: comigo ou com a sua família?
— Que tipo de pergunta é essa? — ela indagou, se afastando, e eu a puxei de volta. Ela
ficou de costas para mim, e eu a prendi contra o meu corpo, envolvendo os meus braços em sua
cintura.
— Eu desejo construir uma família com você e poder contar com o seu colo confortável
nos dias exaustivos. Sinto que você é meu refúgio nesse inferno em que vivo, no entanto, as
minhas obrigações com a máfia me impedem de demonstrar qualquer tipo de fraqueza. Preciso
agir com rigidez para punir traidores, o que infelizmente pode envolver eliminar pessoas
próximas a mim. Quero saber se você está comigo?
Senti o seu corpo estremecer em volta dos meus braços.
— Por que está me dizendo essas coisas? — A sua voz saiu trêmula.
— Porque não posso dar tudo de mim a uma pessoa a quem não confio e que não está cem
por cento comigo.

Beatrice Marino

Virei-me em direção a ele, deslizando meus braços por sua nuca. No início, suas palavras
me deixaram intimidada, mas, depois de alguns segundos, percebi que ele não estava tentando
me assustar ou afastar. Na verdade, ele estava buscando uma conexão mais próxima e uma
sensação de proteção mútua.
— O que espera de mim, Vincenzo? — quis saber, sem desviar os meus olhos dos dele.
— Não está claro para você, Beatrice? Seja a minha esposa, não aquela que arrastei até o
altar, mas aquela que anda ao meu lado, que olha na mesma direção e com quem eu me deite
todas as noites e tenho um sono tranquilo depois de uma longa sessão de amor.
— Eu sinto medo! — admiti.
— Medo? — Ele ergueu o meu queixo, usando o dedo indicador.
— Você é um homem machucado e traumatizado. — Calei-me.
— Achei que daria outros adjetivos. — Ele sorriu.
— Um coração cheio de traumas é o mais perigoso, ele foi pisado, destruído e sagra, ele
tem o instinto de sobrevivência. Ele já sobreviveu a muitas coisas, nada mais lhe causa dor.
— E se eu disser que esqueço de tudo de ruim que eu vivi quando estou com você — ele
disse cheio de ternura, os seus lábios tocaram a minha nuca e toda a minha pele se arrepiou. Ele
tinha razão, eu lhe escondia algo, e eu sentia medo do que ele faria quando soubesse.
— Eu te amo! — com um sussurro carregado de emoção, declarei meu amor por ele.
Imediatamente, sua postura mudou, ele virou as costas e apoiou as mãos sobre a mesa. Sua
respiração se tornou rápida e ofegante, e pude sentir sua pulsação acelerada. — Não espero que
me diga nada de volta, está tudo bem. — Tentei acalmá-lo. Minhas mãos tremiam ao tocar seu
braço, temendo ter ultrapassado limites.
Ele virou-se rapidamente envolvendo as suas mãos na minha nuca e beijou de uma forma
arrebatadora, desceu as mãos e apertou os meus seios, levantou a minha blusa e, em um
movimento rápido, me sentou sobre a mesa do escritório. O seu braço se arrastou sobre a mesa e
todos os objetos foram ao chão, ele se posicionou entre as minhas pernas, colocando a sua ereção
para fora. Eu já estava tomada pelo prazer. Tirei a calcinha, e ele me penetrou violentamente,
cada movimento aumentava ainda mais o meu tesão, eu cravei as minhas unhas nas suas costas,
enquanto ele beijava o meu pescoço. Ele me segurava pela cintura com força, estocando mais e
mais fundo, eu gemia sem parar enquanto a mesa balançava devido à intensidade dos nossos
movimentos.
Em um momento de extrema excitação, eu cheguei ao ápice, e ele acompanhou logo
depois, gemendo alto e me enchendo com seu líquido quente.
Mesmo sem expressar palavras de amor em resposta, ele se deitou ao meu lado, ofegante e
sorridente, acariciando meu rosto com o dedo indicador. Ele me abraçou com força, e eu senti
seu coração batendo rápido. Ele apoiou o queixo na minha cabeça e beijou minha testa.
32
Nela, ninguém toca

Vincenzo Ferrari

— Qual o problema? — indagou Lorenzo, me encontrando na sala.


— Se eu te contasse, precisaria te matar. — Ele sorriu.
— Sério? — zombou.
— Já se livrou da Alessia, como eu mandei.
— Sim, comprei o apartamento no centro e coloquei alguns milhões na conta dela.
— Obrigado.
— Então é isso, enfim casado? — ele questionou, parando em frente à janela, olhando para
o jardim.
— Pergunte logo o que quer, Lorenzo? — Parei ao lado dele na janela.
— Quando vou poder me casar com a Nina?
— Não venha me amolar com essas perguntas agora, Lorenzo.
— Qual o seu problema com a Nina? Não foi você quem a escolheu para mim?
— Tudo tem a sua hora, você ainda não está pronto para esse casamento.
— Por quê? É o que você acha, Vincenzo, eu e ela estamos prontos. Que porra, você estava
ameaçando a minha noiva de casá-la com outro.
— Tive os meus motivos, e não foi uma ameaça — respondi, virando as costas para ele,
que me seguiu até o sofá.
— O que ela fez? — ele questionou com angústia. — Costumávamos ser amigos,
Vincenzo.
— Preciso que ela me ajude com algo, mas a sua noiva não parece querer colaborar muito,
ela precisou de um incentivo e é só isso.
— Deixe-me adivinhar, Beatrice. — Sorriu sem humor.
— Exatamente.
— Pare de terceirizar esse problema, Vincenzo.
— A Nina fará o que pedi. Estamos indo bem, inclusive amanhã ela se mudará para essa
casa, preciso que ela esteja mais próxima da minha esposa.
Ele suspirou, deixando transparecer a sua irritação.
— Ela não é um fantoche.
— Ela é o que eu quiser que ela seja, Lorenzo. Agora chega de me questionar, se a Nina
fizer o que eu ordenei, vocês se casam em dois meses.
— Está falando sério? — Ele me olhou animado.
— Sim. Estou trazendo-a para nossa casa, não a mandaria de volta para a casa dos pais
depois de viver sob o mesmo teto do noivo, exceto se ela falhar.
— Me diga o que precisa que a ajudarei.
— A tarefa é simples, ela precisa ser a melhor amiga da minha esposa.
— Amiga?
— Sim, e confidente.
— O que precisa saber? — ele indagou com uma ruga na testa.
— Se eu soubesse, não precisaria da Nina — falei como se fosse óbvio.
— Porra, Vincenzo, converse comigo — ele implorou.
— Certo, Lorenzo, eu vou te contar, mas, se você sonhar em usar isso contra mim, te juro
que esqueço que você é o meu irmão e te mato. Vem, vamos até o meu escritório.
Fui até a mesa e peguei todas as informações que eu tinha, não estava cogitando conversar
com Lorenzo sobre isso, mas, naquele momento, pensava que ele pode me ajudar.
— Olha isso. — Coloquei tudo sobre a mesa, e ele caminhou em minha direção.
— Que porra é essa? — ele indagou.
— Eu já sabia que a Beatrice é meio russa, o Luigi me confidenciou quando estava preso,
mas eu não fazia ideia de que o avô dela tinha negócios com o Andrei.
— Então o nosso carregamento de armas pode ter sido realmente ele? — ele se questionou
e andou apressado, revirando a sala e apalpando a mesa.
— Que merda está fazendo? — indaguei.
— Procurando por escutas, Beatrice pode ter colocado várias.
— Não, eu já procurei, não tem nada.
— E o que a Nina precisa descobrir? — questionou confuso.
— Sobre isso. — Soltei a gravação da conversa de Beatrice com Andrei.
— Isso é traição, devemos matar essa garota — ele falou com indignação.
— Não estou te mostrando tudo isso para que você arrume soluções, Lorenzo — retruquei,
irritado.
— Então o que vai fazer, se sentar e esperar que ela acabe com a nossa família? Quer ser
morto pelo Andrei e deixar que ele entre nessa casa e foda a sua esposa todas as noites? Porque é
isso que parece, Vincenzo, ela é uma puta do caralho e eles estão armando para ficar juntos.
— Eu durmo e acordo todos os dias ao lado daquela garota, eu nunca pregaria os meus
olhos ao lado de alguém que eu não confio.
— Confia? — Ele sorriu sem humor, passando a mão pelo queixo. — Se confiasse, não
estaria trazendo a Nina para ser a sua espiã.
— O que quer que esteja acontecendo, Lorenzo, eu vou descobrir, mas uma coisa eu sei, a
Beatrice nunca faria nada que me prejudicasse, o que ela está escondendo vai além da minha
rivalidade com o Andrei — pronunciei com um ar pensativo.
— Ela poderia ser a mulher que você procura, quem tem o coração da Anna, ela é
exatamente quem a Carina descreveu.
— Não, eu procurei pelas marcas, ela não é transplantada — afirmei com convicção.
— Então vamos esperar que a Nina nos diga o que ela esconde.
— Uma coisa é certa, Lorenzo, eu não hesitarei em queimar toda essa família se eles
ousaram armar contra mim.
— Até a Beatrice?
— Ela não! Nela, ninguém toca.

***

Beatrice Marino

Eu colocava a Giulia para dormir quando Vincenzo entrou no quarto, ele não tinha a
melhor expressão assim que chegou, mas ele sorriu quando nossos olhos se encontraram,
acalmando o meu coração que parecia se alimentar da sua felicidade e satisfação.
— Ela acabou de dormir, você chegou atrasado — disse-lhe, sorrindo.
— Acho que cheguei na hora certa. — Ele me levantou gentilmente pelo ombro e me
beijou de forma doce e singela.
Como a pessoa que me arrastou pelo jardim trajando um vestido de noiva se transformou
neste homem?
— Vamos, não faça barulho — eu disse, o puxando para fora do quarto.
— Adoro barulho, principalmente os que saem da sua boca quando estou dentro de você.
— Vincenzo! — falei com um tom repressor, me sentindo envergonhada.
— Alessia foi embora — ele disse assim que entramos no nosso quarto. E eu desejei que
ela ainda estivesse viva, não queria causar a morte de ninguém.
— Viva? — indaguei quando ele se sentou na nossa cama e ficou me olhando.
— Claro! — Ele sorriu, me abraçando, e caí sentada em seu colo. — Por que eu a mataria?
— Não sei, já te vi fazendo esse tipo de coisa. As pessoas dizem que matou o seu próprio
pai e de uma forma horrível.
Ele me senta na cama e fica de pé, mudando completamente a expressão.
— Desculpe — eu disse com a voz trêmula.
— Sim, você está certa, eu matei o meu pai, eu o cortei em vários pedaços e acredite, ele
ainda estava vivo e sorrindo — o seu corpo tremia e ele pronunciava com ódio. — Eu o queimei
ainda vivo — ele diz, confirmando o que eu já tinha ouvido falar.
— Não precisa falar mais, me desculpe.
— Eu quero falar — falou de costas para mim. — Já deveríamos ter tido conversas desse
tipo — ele disse ainda de costas, com as mãos apoiadas na penteadeira, mas eu podia ver o seu
rosto pelo reflexo do espelho. — Eu esbarrei com a Anna no estacionamento de uma loja de
conveniência, ele estava com a roupa e os cabelos sujos de tinta. Ela sempre estava suja de tinta.
— Ele sorriu com a lembrança. — Com pouco mais de um ano, estávamos esperando o nosso
primeiro filho e casados. O meu pai sempre odiou a ideia do casamento e, no dia em que a minha
filha viria ao mundo, ele as matou e doou o coração da Anna a uma mulher que ele julgou ser a
mulher perfeita para mim. Eu a cacei por anos, eu desejei a sua morte dia e noite, eu sonhei por
várias vezes matando cada um da sua família e isso se estenderia por gerações.
— E o que mudou? — indaguei, sentindo um nó se formar na minha garganta.
— Você chegou e eu senti que poderia ser feliz de novo — comentou, virando-se para mim
e se ajoelhando na minha frente. — Nunca me traia, Beatrice, não esconda nada de mim — ele
implorou, beijando os meus lábios, enquanto o meu corpo estremeceu de aflição.
33
Eu sinto ciúmes

Beatrice Marino

Mesmo que o meu instinto de sobrevivência sussurrasse em meus ouvidos, ordenando que
eu fugisse desse lugar, minha vontade de permanecer aqui mais um dia e mais um gritava tão alto
que eu mal era capaz de ouvir argumentos contrários.
Todos os dias sou despertada pelo delicioso perfume de Vincenzo, já que nunca consigo
acordar antes dele. O quarto é inundado com o aroma envolvente que somente ele sabe exalar.
— Você vai se atrasar para a faculdade se continuar sonhando acordada — ele diz bem-
humorado, vindo até mim e me beijando rápido nos lábios.
— Vou levantar-me agora mesmo — eu disse, saltando da cama e andando apressada para
o banheiro.
Tomo um banho rápido, me arrumo e desço.
— Nina? — indaguei, animada, vendo-a chegar, ela vinha me evitando há vários dias.
Ela acenou sem vontade, e eu reparei as malas ao lado dela.
— E essas malas? — perguntei, indo até ela.
— O Don me pediu que passasse uns dias aqui — ela respondeu, um tanto contrariada.
— Sério? — Não pude conter a felicidade, eu me sentia sozinha e, para mim, ela é uma
ótima amiga e, segundos depois, me senti egoísta quando notei a sua insatisfação nas suas
palavras.
— Vamos nos encontrar com mais frequência — disse ela, sorrindo genuinamente, o que
correspondia ao seu caráter. Depois, ela veio até mim e me abraçou.
— Eu estou indo à faculdade agora, mas, assim que eu voltar, eu te procuro — me
despedi.
Eu encontrei o motorista esperando por mim na entrada, enquanto Vincenzo já havia saído.
Ele tinha criado um hábito de sempre que possível levar Giulia para a escola. Ele se apegou a ela
de uma maneira impressionante, como se seu coração a reconhecesse. Eu, mais uma vez, senti
uma culpa avassaladora por esconder algo tão importante dele.
— Trice. — Ao ouvir a voz de Giovani, senti meu corpo congelar, mas sabia que precisava
parar de evitá-lo. Respirei fundo, forçando meu melhor sorriso, e me virei em sua direção.
— Olá! — falei ao me virar, e ele sorriu.
— Quando que as coisas ficaram estranhas entre nós? — ele indagou, se aproximando.
— Desculpa, ainda é estranho — sorri tímida, respondendo.
— Vamos voltar a ser amigos, Trice. Sinto falta de conversar com você. — O seu tom era
sofrido.
— Me desculpe, Giovani, eu tenho sido uma idiota com você. Mas, acredite, faço isso para
que você não crie mais esperança, estou feliz com meu marido.
— Se ele te faz feliz, devo me conformar ter perdido você, embora não seja fácil, eu
sempre achei que ficaríamos juntos, acho que até você acreditou nisso.
— Sim, eu acreditei piamente. — Sorri. — Mas as coisas só aconteceram. — Dei de
ombros.
— Posso lhe dá um abraço? — Eu não tive chance de resposta, ele zerou a distância entre
nós e me abraçou com força, eu senti o seu peito estremecer.
— O que é isso, Giovani? — Antonella se põe entre nós dois e me abraça. — Como vai,
amiga? — ela perguntou e voltou a encará-lo com reprovação. — Não esqueça do que o nosso
pai disse — ela volta a reprová-lo.
— O que o seu pai disse? — quis saber, curiosa.
— Beatrice, você sabe sobre o seu marido e esse amor platônico do meu irmão por você.
— Vincenzo nunca faria mal a Giovani — afirmei com convicção, e ela sorri com
deboche.
— Vamos mudar de assunto, Antonella, chega! — ele falou, irritado.
— Vamos para a sala, então. Você vem conosco, Trice? — Antonella perguntou, andando
em direção à entrada.
— Sim, eu vou.

***

Vincenzo Ferrari

Eu brincava com Giulia no jardim quando o carro que trazia Beatrice da faculdade
estacionou.
— Trice. — Ela correu animada para os braços da irmã, que se abaixou para agarrá-la.
— Como foi a aula? — indaguei, mesmo sabendo de cada passo que ela deu.
— Tudo igual — respondeu.
— Giulia, você precisa entrar e fazer a sua tarefa. — Ela não me questionava e seguia as
minhas ordens sem nenhuma objeção.
— Eu sou comportada e obediente? — Giulia indagou.
— Sim, você é — respondi, sem entender o motivo da pergunta.
— Então eu vou poder morar aqui para sempre? — ela indagou e os seus olhos brilharam
igual aos de um gato com fome.
— O seu pai ficará triste se você não voltar para casa.
Eu sequer pude ouvir a sua resposta, pois Antônio Marino havia acabado de chegar na
propriedade.
— Pai? — Beatrice me olhou, confusa.
— Eu o chamei.
— Minhas meninas — ele disse de braços abertos ainda ao lado do carro.
Giulia correu, se agarrando em suas pernas, ele a ergueu e lhe deu muitos beijos e abraçou
Beatrice com apenas um dos braços em seguida.
— Luigi não lhe acompanhou? — indaguei.
— Ele ficou para cuidar de algumas reuniões da empresa — ele respondeu com um tom
sério e me encarando como se eu fosse uma ameaça.
— Beatrice, leve a sua irmã para dentro, vou conversar com o senhor meu sogro.
Ela mordeu o lábio apreensiva, mas não contestou e entrou.
— No dia do casamento, acredito que o senhor não tenha tido oportunidade de conhecer
toda a propriedade, vamos dar uma volta. — Estiquei o braço, indicando a direção e caminhamos
lado a lado.
— Qual o motivo do convite? — ele perguntou sem delongas.
— O meu objetivo quando tomei a Beatrice como esposa foi para estreitar a nossa relação,
mas não nego que o grupo Marino tem feito a sua parte e que os negócios vão bem, não tivemos
um problema sequer.
— Então? — Deu de ombros e parou para me encarar.
— Continue caminhando, pararemos naquela casa mais à frente. — Aponto para a casa do
vinhedo.
Quando cruzamos a porta, ele olha tudo com espanto, o lugar não é nada acolhedor, com
correntes e objetos de tortura espalhados.
— Por que me trouxe aqui? — Ele se manteve firme, sem fraqueza na voz.
— Sente-se, no meu escritório, eu sinto que sempre sou ouvido por alguém, aqui estamos,
de fato, sozinhos.
— Não creio que me trouxe a esse tipo de lugar para preservar a nossa conversa. — Ele se
senta em uma poltrona próxima à janela, afrouxando a gravata, o suor escorria pela sua testa.
Me sentei na sua frente e observei os trabalhadores colherem as uvas por alguns segundos,
mas logo voltei a falar.
— Eu estou bastante satisfeito com o casamento, e não só em relação aos negócios,
Beatrice me faz feliz, eu realmente tenho sentimentos por ela. — Ele arregalou os olhos,
espantado com a minha declaração.
— Não fazia ideia que se sentia assim — pronunciou com surpresa.
— A sua filha disse que me ama, e eu também me sinto assim por ela. — Arrumei a minha
postura e apoiei os meus cotovelos sobre o joelho. — Mas tem um pequeno detalhe que está me
deixando incomodado.
— O que seria? — ele questionou.
— Eu domino toda a Itália, não tenho um inimigo que ousa brigar por território, sou
respeitado por todos os líderes rivais, embora eu precise ficar atento. Porém, hoje tenho um
imenso problema com Andrei Vasiliev.
Ele sorriu de nervoso, levantou-se da poltrona e caminhou até a janela.
— Por que está me falando sobre o Andrei?
— É simples, se a sua família acredita que fecharei os meus olhos para traições porque
tenho sentimentos pela Beatrice, vocês estão bem enganados. Eu os mataria sem nenhum
remorso, ela é minha esposa e ficará aqui comigo, feliz, ou não — comentei em um tom de
ameaça e, embora eu me importe com os sentimentos da minha esposa, eu preciso manter o
controle dos meus negócios.
— Não temos ligação com o Andrei — ele responde, andando para mais longe de mim.
— Eu disse ao Luigi que o fato de eles serem filhos de uma mulher russa não seria um
problema, mas os netos de um associado russo podem nos trazer algumas divergências — falei
com a mão em seu ombro.
— O que quer que eu faça?
— Me entregue a localização de Andrei aqui na Itália. Preciso matar o mal pela raiz.
— Eu não sei onde ele está.
— Onde ele conseguiu o número da Beatrice? Não acredito que tenha sido em um catálogo
telefônico. Que caralho! Estou sendo complacente com a sua família, eu queimei mais de quinze
homens que se abstiveram de me falar onde está aquele miserável. Ele teve a petulância de me
atacar enquanto eu fazia uma viagem com as suas filhas, ele machucou a Beatrice e colocou a
vida da Giulia em risco, eu estou irritado.
Ele engoliu em seco, permanecendo em silêncio.
— Eu realmente não sei onde ele está e lhe diria se soubesse.
— Você tem três dias. E precisamos resolver a questão parental — eu disse, me afastando.
— Não entendo o que quer dizer.
— O avô da minha esposa é um problema, infelizmente vamos precisar exterminar todos
os russos puro-sangue. Acredito que parte dos meus problemas acaba se o Luigi assumir as
empresas na Rússia.
— Está dizendo que vai matar todos os parentes da minha esposa?
— Agradeça a Beatrice por deixar que a sua esposa viva. A nossa conversa acabou, espero
que tenha entendido bem o teor do assunto e aja com total sabedoria, não se pode estar dos dois
lados, meu sogro.

Beatrice Marino

Eu olhava pela janela aflita e, quando o meu pai apontou no jardim, voltando do vinhedo,
senti um alívio no meu coração. Cruzei a porta rapidamente e fui em direção a eles.
— Pai, vai ficar para o almoço? — perguntei, me apoiando em seus braços.
— Será um prazer tê-lo para o almoço, meu sogro — Vincenzo afirmou com gentileza,
mas a expressão do meu pai é péssima, e eu sinto medo só de imaginar o tipo de conversa que
tiveram.
— Ficarei com gosto, filha — ele responde.
O almoço foi silencioso, apenas a Giulia nos fazia sorrir, ela estava em uma fase fofa e
falava pelos cotovelos. Vincenzo a olhava com admiração, e eu queria contar-lhe a verdade sobre
ela, mas sempre que eu pensava em abrir a minha boca, o meu medo me deixava paralisada.
Me despedi do meu pai, que me olhava aflito, meu coração ficou apertado em vê-lo
daquela forma.
— Existe algum problema? — indaguei a Vincenzo assim que ficamos sozinhos no nosso
quarto.
— Não — respondeu com um tom carinhoso.
— Eu não sou boba, Vincenzo, sei que tem algo, o meu pai estava com uma cara péssima.
O que tiver de fazer, faça comigo, não machuque a minha família — implorei, já em lágrimas.
— Beatrice, eu e você somos um só, eu sou a sua família. Muitas vezes precisamos ser
rígidos e fazer o que não queremos, mas lhe asseguro que você tem sido o único motivo para que
eu não tenha jogado uma bomba e destruído tudo que tem me atrapalhado.
— Do que está falando? — questionei, desesperada.
— Beatrice, não vamos estragar o nosso dia com questões de trabalho. Venha aqui, me
conte como foi na faculdade — ele falou, me abraçando e acariciando o meu rosto.
Eu lembrei do meu abraço com o Giovani e do que a Antonella falou.
— Eu tive uma conversa com o Giovani hoje, ele me deu um abraço. — Senti os seus
músculos endurecerem.
— Abraço? — Sorriu de nervoso, virando as costas.
— Todos nós temos passado, meu marido, você com a Anna, e eu com o Giovani.
A sua expressão mudou e eu vi a sua mão tremer.
— Você gosta dele? — A sua voz saiu rouca e partida.
— Não mais. Eu já disse que lhe amo.
— Mas gostava — afirmou com um tom enciumado.
— Sim.
— Mude de faculdade — ordenou.
— Não confia em mim?
— Eu sinto ciúmes — admitiu.
Um lado da minha boca se ergueu com descrição e eu o abracei, encontrando a minha
cabeça em seu peito. Aos poucos, as batidas do seu coração acelerado foram voltando ao normal.
— Eu só tenho olhos para você — declarei.
34
Vê bondade até no coração do diabo

Vincenzo Ferrari

— Giovani? — o chamei antes que ele entrasse na faculdade.


Ele olhou para os lados até que me viu encostado no carro e tive a impressão de que ele
correria, mas ele enterrou os passos e retornou, vindo em minha direção.
— Pois não? — indagou com peito estufado.
— Acabei de deixar a minha esposa, eu achei que sempre chegasse antes dela. Tem um
tempo livre?
— Diga o que quer — disse, dando alguns passos para trás quando me aproximei dele.
— Pelo visto você ouviu falar sobre mim, e não foram coisas boas — debochei.
— Sim, eu ouvi.
— Entre, vamos conversar em outro lugar.
Ele semicerrou os olhos, me estudando, mas aceitou entrar no carro e eu fiz em seguida.
— Podemos ir? — indago.
— Giovani? Sai daí agora — uma garota da idade da Beatrice batia no vidro e gritava.
— Antonella, não se meta — ele vozeou no carro.
— Vem, saia agora — ela ordenou com as duas mãos na cintura.
— Don, ela está chamando a atenção das pessoas — comentou um dos meus soldados que
estava sentado no banco da frente.
— Leve o carro — pediu o garoto, destemido, e o meu motorista me olhou pelo retrovisor.
— Você ouviu o garoto, leve o carro.
Paramos em um píer próximo à faculdade, eu desci primeiro, andei em direção à praia, e
ele me seguiu.
— Venho acompanhando as suas tentativas de aproximação com a minha esposa —
comecei falar assim que ele parou no meu lado.
— Eu e a Beatrice somos amigos, não existem tentativas, nós somos próximos.
— Acredita na amizade entre homens e mulheres? — indaguei, encarando-o.
— Acredito que a maldade está nos olhos de quem vê — ele respondeu, e eu sorri.
— Você tem razão. Certa vez Beatrice me falou que os olhos são o espelho da alma… —
Ele sorriu e começou a falar antes mesmo que eu terminasse de falar.
— O brilho nos olhos de uma pessoa pode revelar seus verdadeiros sentimentos e
pensamentos internos. Os olhos são um indicador da personalidade, emoções e características
pessoais de alguém. Ela me dizia isso o tempo todo para justificar as inúmeras chamadas de
vídeo. Mas você não acha que a voz também indica as suas emoções?
— Não, eu não acho. Nem todas as pessoas demonstram emoções.
— Seria esse o seu caso?
— Talvez. Eu não me importo com o que você é ou foi da Beatrice, mas eu não suporto
que outros homens a toquem, não sou de conversa, eu certamente te bateria até que você nunca
mais pudesse ver mulher nenhuma, mas eu faria a minha esposa infeliz. Como pode ver, ela me
devolveu uma alma.
— Está mandando me afastar dela?
— Sim, faça isso para o seu bem, eu não faço ideia até quando conseguirei manter o
controle.
— Eu falarei com ela até o dia em que diga que não quer ser a minha amiga, e digo mais,
se um dia ela acordar e perceber que dizer sim a você foi uma loucura, eu tentarei tê-la de novo e
de novo, porque eu a amo.
— Nem o diabo é capaz de tirá-la de mim e, se ele ousasse, eu reviraria todo o inferno e a
traria de volta. Ninguém tira de Vincenzo Ferrari o que lhe pertence.
— Ele está aqui! Eu os encontrei. — A voz era da Antonella novamente, me virei para
olhar e a vi correndo em nossa direção com a Beatrice.
Elas nos encaram assustadas, e a garota girou em torno do irmão.
— O que é isso? Pare, Antonella — ele falou, alterado, e ela suspirou tranquila.
— O que faz aqui, Beatrice? — perguntei, indo até ela, que ficou petrificada no ponto alto
do píer.
— Bom, a Antonella me arrastou, ela rastreou o telefone do Giovani e… — Coloquei o
dedo em seus lábios.
— E vieram checar se eu havia matado o garoto e jogado o corpo no mar? — questionei,
vendo a aflição passar pelos seus olhos.
— Vamos embora, Giovani. — Antonella o arrastava, indo em direção ao táxi que elas
tomaram para chegar até aqui.
— Vamos, entre no carro, Beatrice.
Voltamos em silêncio no carro, ela só falou quando cruzamos a porta da sala.
— Me desculpe — ela pede com as bochechas rosadas.
— Não se desculpe. Vocês chegaram bem na hora, eu estava prestes a matar o garoto, que
teve a audácia de dizer que te ama e jogar na minha cara o quanto vocês são íntimos — eu disse
com um tom furioso.
— Mas você não fez.
— Você é ingênua, Beatrice, vê bondade até no coração do diabo.
— Giovani está vivo, isso é bom.
— Pare de mostrar o quanto se importa com ele, Beatrice — rosnei, me afastando dela, que
tocava o meu braço.
— Sobre o que conversaram?
— Ouça bem o que vou dizer agora, Beatrice, você é minha e eu prezo por você, mas não
me afronte, não volte a ficar de conversas com aquele garoto, nem com nenhum outro homem
que não seja eu, entendeu? — ameacei com os dedos envolvidos em seu braço. Ela me encarou
com uma expressão de medo, eu estava sendo rude, eu estava sendo eu, não o homem que eu
tenho sido para ela.
Saí da sala, temendo que a nossa conversa chegasse em um rumo que eu não gostaria...

***

Beatrice Marino

— Você gosta desse rapaz? — A voz de Nina me despertou de um transe processado pela
minha mente.
— De quem? — indaguei, indo até ela, que estava sentada no sofá no canto da sala.
— Giovani?
— Claro que não — respondi com convicção.
— Vamos andar um pouco, o que acha? — ela perguntou, levantando-se.
Eu assenti com a cabeça e segui até o jardim onde caminhamos.
— Você já parou para pensar que talvez não seja você quem tem sentimentos pelo Don? —
ela perguntou séria, olhando o vinhedo a sua frente.
— Não, eu nunca pensei sobre isso — confessei.
— Eu me perguntaria sobre isso se eu estivesse no seu lugar — ela falou, voltando a andar,
e eu a segui.
Nos primeiros segundos, a pergunta não tinha nenhum nexo, mas, em minutos, eu já estava
me questionando o mesmo.
— Você tem uma história com o garoto, se ele desafia o Don, é porque acredita que algo aí
dentro de você está confuso.
— Eu amava o Giovani desde criança — admiti.
— Eu sabia! — Ela sorriu. — E descobriu que deixou de amar depois de receber o coração
da Anna — afirmou como alguém que faz uma grande descoberta.
Eu pensei um pouco e me dei conta que sim, foi exatamente assim.
— O que está tentando me dizer?
— Eu sou médica, Beatrice, estou apenas curiosa. Existem muitos questionamentos sobre
isso no meio científico, muitos acreditam que o coração carrega memórias. Eu vi os quadros que
você pintou, nossa! Se eu fechasse os meus olhos, eu acharia que estava tendo vários flashes dos
vídeos que eu já flagrei o Don assistindo.
— Vídeos da Anna? — indaguei.
— Sim, dezenas deles. Eu não sei quando esse homem ficou tão ruim, a expressão dele ao
lado dela era tão fofa quanto à do Lorenzo comigo.
— Onde estão os vídeos? — perguntei, curiosa.
— Não sei, talvez no quarto que era dele com a Anna.
— Existe esse quarto?
— Sim, existe. Ele fica ao lado do que você dorme com ele.
— O quarto ao lado é o quarto da Giulia.
— A porta foi fechada com uma parede, a nova porta está dentro do seu quarto, ninguém
entra ali. Algumas vezes ele pediu que limpasse o local, outro dia mandou que retirassem uns
quadros de lá.
— Eu nunca vi nenhuma porta lá.
— Nunca se preocupou em saber o que tem atrás das cortinas grossas, Beatrice?
— Não — admiti.
— Bom, deixa eu te falar uma coisa, eu sei que você amou a minha vinda para essa casa
— suspirou —, mas eu estou aqui para colher informações suas, informações que eu já sei.
Infelizmente. — Suspirou derrotada desta vez.
— Do que está falando?
— O Don desconfia de você e da sua família. Ele acredita que você esconde algo dele, e
acha que é traição ou algo do tipo, se ele descobre o verdadeiro segredo, eu temo pela sua vida e
a vida da sua família.
— Ele disse que não estava mais procurando a mulher com o coração da Anna.
— Não está procurando, mas não significa que ele não terá uma reação negativa quando a
encontrar.
— Por que está me dizendo tudo isso?
— Pois é, eu tenho me feito a mesma pergunta, por que diabos eu estou arriscando a minha
vida e a da minha família para te ajudar?
— Perdoe-me por está tornando a sua vida mais difícil — lamentei.
— Faça valer a pena, então, Beatrice, viva.
— Eu já estou, não estou? — perguntei, confusa.
— Vá para longe e prepare um exército para proteger você e a sua família. Acredite em
mim, vocês vão precisar.
— E a Giulia? — questionei, sentindo o meu coração apertar.
— Não se preocupe com a garota, o Don já é louco por ela e, quando souber que é a filha
dele com a Anna, ele vai idolatrá-la.
— Nina! — Lorenzo gritou, surgindo entre o vinhedo.
— Conversamos mais em outra hora — ela disse, se afastando e indo na direção dele.
35
Você mataria os parentes da Anna?

Beatrice Marino

As palavras de Nina ecoavam em minha mente, impedindo-me de dormir. Recordava a


expressão do meu pai ao sair daqui; Vincenzo certamente o intimidou de alguma forma.
Encarava, naquele momento, a imensa cortina vermelha que cobria a parede lateral do quarto.
— Não vá até lá, Beatrice — aconselhei a mim mesma. Mas era inútil, eu estava
determinada a entrar naquele quarto. Eu estava com ciúmes da Anna, afinal, o quanto Vincenzo
me ama?
— Já acordou? — ele indagou, saindo do banheiro e secando os cabelos com a toalha,
completamente nu.
— Vincenzo! — resmunguei quando ele se sentou ao meu lado e me abraçou, o meu corpo,
ainda quente, se arrepiou com o toque gelado do seu corpo molhado.
— Me desculpe por ontem, eu não queria assustar você.
O quanto eu gosto do Vincenzo? — pergunto a mim mesma. Putz! Eu estou confusa.
— Beatrice, não vai à faculdade hoje? — ele quis saber, se levantando e indo até o closet.
Eu ainda estava na cama e certamente me atrasaria.
— Acordei indisposta.
— O que está sentindo? — ele perguntou e o seu tom foi de preocupação.
— Nada, apenas preguiça. — Dei de ombros.
— Vou levar a Giulia à escola — ele falou, arrumando os cabelos em frente ao espelho.
— Você se apegou muito a Giulia. Às vezes parecemos ser os pais dela — eu disse, e ele
parou o que fazia para virar-se para mim e me encarar com um ar pensativo.
— Quando teremos um filho? — indagou, me surpreendendo, minha saliva desceu pela
garganta, engasgando-me, e me faz tossir descontroladamente. — Nós não usamos proteção,
deveríamos ter um bebê — ele comentou enquanto pegava uma garrafa de vidro e enchia um
copo d'água. — Beba — ele disse, entregando-me o copo.
A tosse diminui lentamente e eu o observo, perplexa. Ele ainda está me encarando,
esperando uma resposta.
— Pare de me olhar assim, eu não sei por que não estou grávida.
— Será que precisa ir ao médico?
— Não, somos recém-casados, as coisas não acontecem assim. — Eu me levantei da cama
ainda encarando as cortinas.
Ele suspirou, desapontado, e beijou a minha testa em seguida.
— Eu já volto — disse, cruzando a porta do nosso quarto.
Eu estava em pé, olhando fixamente para o tecido grosso que cobria a parede, riscando o
chão com o pé e torcendo os lábios.
— Não seja intrometida, Beatrice. — Pensei comigo mesma. Mas a curiosidade era forte
demais, o ciúme estava me consumindo, então, acabei puxando as cortinas, revelando a porta
oculta. — Você sempre esteve aqui? — perguntei à porta, como se ela pudesse me responder. —
É claro que está trancada, você pensou que seria fácil? — murmurei para mim mesma,
desapontada, mas rapidamente comecei a vasculhar as gavetas, procurando a chave.
— Procurando algo? — Vincenzo indagou ao retornar ao quarto.
Sobressaltei, assustada, e olhei apressada em direção às cortinas. Os seus olhos seguiram
os meus até a parede coberta e retornaram para mim.
Ele parecia entender o que eu buscava nas gavetas, mas não disse nada sobre o assunto.
— Eu vim apenas pegar o casaco que esqueci na cadeira — ele disse, caminhando até a
penteadeira e o pegando. — Volto em poucos minutos — tornou a falar, saindo do quarto.
Me joguei na cama, sentindo uma angústia sufocar o meu peito. A minha curiosidade não
seria sanada agora e o ciúme continuaria rasgando o meu ser. Eu queria ser amada por ele, mas
sentia medo de que isso ficasse confuso para ele também quando descobrisse sobre o coração.
Isso contando com a possibilidade que ele me perdoe.

***

Vincenzo ainda não havia voltado, estava demorando mais do que o normal, eu resolvi ir
para o ateliê e voltar a pintar. Eu vinha planejando revelar tudo a Vincenzo, eu estava disposta a
assumir as consequências por carregar o coração da Anna comigo.
— Senhora, a sua mãe está aqui, veio visitá-la — uma das funcionárias falou do outro lado
da porta.
— A minha mamma? — Saltei da cadeira e abri a porta. — Mamma? — questionei, vendo-
a parada ao lado da mulher.
— Filha — ela pronunciou angustiada, entrando no ateliê e fechando a porta em seguida.
— Aconteceu alguma coisa? — indaguei, apreensiva diante da sua expressão.
— O seu pai está em surtos, tentando achar o paradeiro do Andrei, o seu marido lhe deu
três dias para que ele lhe passasse a localização, agora nos restam dois.
— Mas por que ele designou o meu pai para essa tarefa? — perguntei, confusa.
— Porque ele já sabe sobre o seu avô e provavelmente nos responsabiliza pela vinda de
Andrei.
— Avise ao vovô que eu quero me encontrar com Andrei — proponho.
— Quer que ele te inclua na lista de mortos dele? — ela pronuncia com raiva.
— Como assim na lista de mortos?
— Ele vai matar a todos, Beatrice.
Sentei-me atônita. Era sobre isso que ele vinha me alertando?
— Estou falando dos seus avós, dos seus primos e tios, a mente doente dele já planejou
tudo — ela disse em lágrimas.
— Tudo o quê? — quis saber, angustiada.
— Ele quer que o Luigi assuma as empresas na Rússia depois que ele matar todos da nossa
família.
Eu estava em choque, mas não estava surpresa.
— Ele não faria isso — gritei essa mentira, tentando me convencer das minhas palavras.
— Ele vai fazer — ela afirmou em pé, olhando fixo através da janela. — Eu não sei o
quanto Andrei é diferente desse homem, mas ele não ameaça matar nenhum lado da nossa
família — ela disse com o rosto banhado por lágrimas.
— O que vamos fazer? — Levantei-me, indo até ela, que estava imóvel.
— Não sei. Não podemos confiar em Vincenzo. O que vai acontecer quando ele souber
sobre você? Penso nisso todos os dias e tremo de pavor.
— Diga logo o que quer, mãe — eu disse, já sabendo o que ela veio fazer aqui.
— Esqueça! — ela falou, enxugando as lágrimas e indo em direção à porta.
— Devo implorar pela nossa família?
— Tudo seria mais fácil se o seu marido não estivesse o tempo todo ameaçando a nossa
família. Primeiro foi o Luigi, agora os meus pais e meus irmãos, não podemos confiar nele,
Beatrice.
— Implorarei, mamma. Me ajoelharei uma, duas, três vezes. Farei o que for preciso.
— Não creio que o seu pai terá a localização do Andrei, você acredita que ele daria o
paradeiro dele? — perguntou com pesar.
— Ele matará a todos nós, mamma.
— A Giulia, ela nos ama, talvez ele considere não a magoar — comentou com esperança.
E andei apressada e a abracei, chorando em seguida.
— Vamos sair vivos dessa, filha — ela disse num abraço apertado.
Me despedi da minha mãe e continuei no ateliê, deitei-me sobre a mesa e olhei para o teto
como se estivesse vendo um filme da minha vida passar nele.

***

Vincenzo Ferrari
Voltei da escola e encontrei com a Nina no corredor dos quartos.
— Nina, temos novidades? — indaguei informalmente.
— Nada de relevante — ela disse, desviando os olhos. Onde eu estava com a cabeça
quando acreditei que ela pudesse me dizer o que preciso saber?
— Achei que o seu papel nesta casa estava claro.
— Sim, está, mas, ainda assim, não posso arrancar os segredos da sua esposa, ela tem
confidentes, a começar pela mãe, que veio aqui e passou um bom tempo com ela no ateliê.
— A minha sogra esteve aqui? — questionei, estranhando não ter sido informado por
nenhum dos meus soldados.
— Sim, esteve.
— Nina? — Lorenzo nos encontra e vem até a namorada.
— Vou deixar vocês dois sozinhos — comunico, indo até o ateliê onde Beatrice ainda
estava.
Quando entrei no local, em vez de encontrá-la pintando ou desenhando, ela estava deitada
sobre a mesa, encarando o teto com um olhar vazio.
— Posso? — indaguei, apontando para o espaço ao seu lado.
— Claro — ela respondeu, dando um pouco mais de espaço.
Me deitei ao lado dela, passando o braço pela sua cintura.
— O que está incomodando você? — perguntei, concluindo ser a porta do quarto, já que a
vi encarando as cortinas e vasculhando as gavetas.
— A minha mãe teve aqui hoje, ela está com medo de que você mate os meus avós e os
meus tios.
— Ela veio te trazer esse assunto? — questionei com insatisfação.
— Você não acha que eu deveria saber? — ela indaga, virando o corpo para me encarar.
— Não posso fazer nada sobre o assunto. Preciso reafirmar a minha liderança, o meu maior
inimigo está aqui no meu país, me afrontando, não posso fechar os olhos para os seus aliados.
— Eles são os meus avós e meus tios.
— Sinto muito — disse com pesar.
— Sente? — Ela levantou-se e sorriu sem humor.
— Eu não perdoo traição, Beatrice, e nem posso fechar os olhos para as ameaças como a
sua família. — Me sento na mesa, vendo-a andar de um lado para o outro.
— O quanto você gosta de mim? — ela indagou.
— Isso não tem nada a ver com o que eu sinto por você.
— Você acredita nisto que está dizendo? Você mataria os parentes da Anna? — A sua
pergunta me pegou de surpresa, a minha respiração acelerou. O silêncio tomou conta do local.
— O seu silêncio já me disse tudo — ela disse, indo em direção à porta.
— Eu não era o que sou hoje quando fui casado com a Anna — justifiquei-me antes que
ela deixasse o ateliê.
— Então a má sorte é minha de ter uma versão diferente do mesmo homem — ela disse,
virada para mim e segurando a porta aberta.
— Não foi isso que eu disse.
— Não, você só me disse que ela despertou em você um homem capaz de renunciar a tudo
para fazê-la feliz — ela disse antes de deixar o ateliê.
Eu não a segui, as suas palavras fizeram sentido na minha mente, mas eu não sou o apenas
o Vincenzo, eu sou o Don, e deixar de ser é o mesmo que assinar a minha certidão de óbito.
36
Amamos o mesmo homem, Anna

Beatrice Marino

Ao retornar ao quarto, as cortinas não despertaram mais a mesma sensação de antes. Agora
eu compreendia que aquele espaço era o lugar onde ele guardava todos os seus “tesouros”; onde
Anna parecia estar mais presente do que em mim, que tinha o seu coração bombeando o meu
sangue. Sentia-me furiosa, enciumada e diminuída.
Refletindo sobre como poderia ajudar minha família a obter a localização do Andrei,
percebi que isso era apenas a ponta do iceberg. Acreditei que, se conseguisse encontrar Andrei e
ajudá-lo, Vincenzo ficaria grato e reconsideraria seu plano terrível de carnificina. Então,
impulsivamente, peguei meu telefone e liguei para Andrei, sem me preocupar muito com as
possíveis consequências. No entanto, descobri que o número que ele havia usado anteriormente
já não funcionava.
— Claro que não iria pegar, só se ele fosse algum idiota — afirmei para mim mesma,
sentindo-me desapontada.
Ao ouvir as risadas vindas do jardim, levantei-me para verificar a fonte. Era agradável e
reconfortante ver Nina e Lorenzo juntos, apesar de toda a corrupção que é a máfia. Ela era
sortuda por ter alguém como ele ao seu lado.
— O que atrai tanto a atenção da minha amada esposa? — Vincenzo perguntou,
envolvendo minha cintura com seus braços.
— Eles parecem felizes — respondi, admirando o casal que estava se beijando e rindo.
— Sinto muito que você esteja infeliz agora. Você é a esposa do Don e, em breve, Nina
também aprenderá que há mais do que apenas beijos na vida. Temos obrigações e deveres,
Beatrice.
— Entendo — repliquei, afastando-me.
— Não, você não entende nem de longe tudo que sinto, Beatrice. Você não vive a metade
do que tenho que viver todos os dias.
— Foi escolha sua, Vincenzo.
— É nisso que você acredita? — Ele sorriu sem humor. — Eu nunca escolheria te
machucar ou ver a tristeza refletida em seus olhos.
Nada que ele me dissesse iria diminuir a minha angústia e a raiva que eu estava sentindo.

***

Testemunhei o pôr do sol e o nascer da lua, fiquei inquieta na cama, já que meu pai teria
que dar resposta ao Don no dia seguinte. Era crucial que eu descobrisse o paradeiro de Andrei e
informasse ao meu marido, porém, como obter informações estando aprisionada nesta casa?
Mattia vagava pelo jardim, mas o que ele estaria buscando?, perguntei-me em pensamento.
— Por que não se deita e dorme, Beatrice? — sugeriu Vincenzo com uma voz rouca de
sono.
— Já estou indo — respondi, me deitando ao lado dele.
Durante a noite inteira, não consegui dormir um minuto sequer e acabei me levantando
mais cedo do que o habitual. Saio do banheiro, enxugando os cabelos, e encontro meu marido
acordado. Vincenzo sentou-se na beira da cama, observando-me com atenção.
— A sua cara está péssima, você estava inquieta a noite toda.
— Desculpe se atrapalhei o seu sono — eu disse, me sentando em frente à penteadeira para
escovar os meus cabelos.
— Eu nunca durmo por completo, sou como um cão sempre em alerta — comentou,
caminhando e parando em pé atrás de mim. Ele acariciou a minha escápula nua, desceu as mãos
até os meus seios e pressionou o bico dos meus peitos entre os dedos. Me ergueu pelos ombros
delicadamente e me puxou pela cintura, colando o meu corpo ao dele.
— Você é importante para mim, Beatrice. Confesso que demorei a perceber isso, mas eu
me importo com você.
Eu resolvi ficar calada com meus pensamentos de insatisfação, então forcei um sorriso e
me afastei. Eu não estava me sentindo especial ou importante.
— O que está incomodando você? — ele perguntou, vindo em minha direção, voltando a
envolver os seus braços em volta da minha cintura e depositando um beijo em meu pescoço.
— Não tem nada — respondi, forçando um sorriso e me afastando dele.
Ele olhou para as cortinas.
— Venha — ele disse, puxando pela minha mão.
— Para onde? — questionei.
Ele puxou a cortina para o lado, foi até a roupa que ele havia usado no dia anterior e pegou
uma chave do bolso. Arregalei os meus olhos, ele realmente faria isso?
— Senti a sua curiosidade, sei que você quer saber o que tem atrás da porta — ele disse,
abrindo-a.
Eu não disse nada, apenas o segui.
— É apenas um quarto — falou de braços abertos depois de entrar nele.
Eu examinei minuciosamente cada elemento, do carpete às paredes, e meu olhar percorreu
o berço antes de fixar-se na imensa fotografia de Anna sorrindo, tirada durante a gravidez.
— Ela era linda — pronunciei com dor e lágrimas lavaram o meu rosto. — É tão injusto!
— eu disse em meio a soluços.
Com a mesma proporção em que eu queria o Vincenzo, eu não me sentia merecedora de
estar viva. Amamos o mesmo homem, Anna.
— Ei, está tudo bem. — Ele me abraçou forte, tentando me acalmar.
Ao percorrer o quarto, tocando em cada objeto, o meu peito tremia devido às lágrimas que
insistiam em cair.
— Não é apenas um quarto como você disse, é uma caixa de memórias dolorosas que você
guarda trancada ao lado do nosso quarto — eu disse, visualizando a Anna trocando a fralda da
Giulia sobre o trocador e depois colocando-a para dormir na poltrona ao lado do berço. Eu me
ajoelhei no chão, sentindo o meu peito rasgar de tanta dor.
— Beatrice? — ele pronunciou o meu nome e me encarou confuso.
— Esse lugar é depressivo e angustiante. — As minhas palavras não faziam sentido para
ele, mas eu sabia o que estava falando, eu estava me sentindo culpada.
— Eu nunca tentei me desligar disso, eu queria sentir que eu ainda as tinha. Mas eu me
machuco sempre que entro aqui. Ela foi assassinada, a minha filha nasceu morta por culpa
daquele verme e tem alguém por aí vivendo no lugar dela.
No lugar dela, essa é exatamente a palavra Vincenzo, literalmente no lugar dela, com a
filha dela e o marido dela, e ainda me sinto no direito de me sentir irada por não ter o amor que
ela um dia recebeu.
— Não posso pedir que tire tudo daqui, é o seu tempo, os seus sentimentos — disse, me
levantando e tentando me recompor.
— Obrigado! — agradeceu, me abraçando em seguida.
O abraço era para ser reconfortante, mas eu me sentia sufocada, sentia a minha cabeça
girar. Era para estamos bem, ele disse que gosta de mim, e eu o amo, mas ele ainda ama a Anna,
e ela está em mim, e ele ficaria sabendo disso mais cedo ou mais tarde.
37
Confissão

Beatrice Marino

O tempo se escoou rapidamente, e eu me encontrava apreensiva. Eu me encontrava


perambulando pelo jardim da propriedade, Vincenzo saiu cedo e ainda não havia retornado.
— Beatrice. — Virei-me para encarar a pessoa que me chamava.
— Mattia? — indaguei, estranhando a sua aproximação.
— Se distraindo com o vinhedo? — ele perguntou, encurtando a distância entre nós.
— Sim, não tenho muito o que fazer aqui — respondi, dando-lhe as costas.
— O Don ainda não voltou da casa dos seus pais? — quis saber com um sorriso
debochado.
— Ele foi à casa dos meus pais?
— Sim, ele foi, parece que o seu pai deve algo a ele — zombou.
— Meu pai não deve nada — retruquei.
— Vem, vou te mostrar algo no vinhedo — ele disse, abrindo caminho com o braço
esticado, me direcionando.
Eu não confiava nem um pouco nele, mas o que ele faria aqui, com a casa cercada com
tantos soldados?
— Que lugar é esse? — indaguei depois de ter entrado mais do que de costume no
vinhedo. — Onde está me levando?
— Você sabia que nós temos uma saída secreta? — perguntou sem parar de andar, e eu
continuei seguindo-o.
— Saída secreta? — deduzi, confusa.
— Sim, não é tão secreta, é onde os funcionários do vinhedo entram na propriedade.
— Não tem soldados aqui? — indaguei, vendo a passagem livre.
— Eu os dispensei por alguns minutos.
— Por quê? — quis saber, parando em frente à saída.
— Tem alguém te esperando do lado de fora. — Ele deu de ombros. — Não está curiosa?
— Eu não confio em você — pronunciei, dando alguns passos para trás. Ele enrolou os
dedos em volta do meu braço e me puxou para fora da propriedade.
Eu tentei me soltar, mas duas mãos fortes me agarraram por trás e a arrastaram para dentro
de uma van escura, que já estava me esperando. Gritei e lutei para me libertar, mas eles me
amarraram e amordaçaram rapidamente.
Uma voz masculina soou no fundo da van.
— Fique quieta e não faça barulho! Se você cooperar, ficará viva — disse o homem com
um sotaque russo.
Eu conseguia ouvir os batimentos acelerados do meu próprio coração enquanto a van
percorria várias ruas. Eu fiquei pensando em como poderia escapar, mas o medo tomou conta de
mim, e eu entreguei à minha própria impotência.
Quando a van finalmente parou, fui arrancada com brutalidade do veículo e levada para
dentro de uma casa em meio à densa floresta. Só então notei a presença de Andrei, sentado em
uma poltrona no extremo da vasta sala.
— Soltem-na — ele ordenou com um rosnado vindo em minha direção.
A sua ordem foi atendida prontamente, e eu tive os braços libertos. Passei a mão por onde
a corda me apertou.
— Por que apertaram tanto porra? — ele gritou, puxando os meus braços, alisando-os.
— Perdão, Don. — A voz do homem saiu trêmula.
Eu senti um frio na espinha, mas sabia que não podia deixar o pânico tomar conta de mim.
— Preciso que escreva uma carta para o seu marido, Beatrice — disse Andrei.
— Uma carta? — indaguei.
— Sim, de despedida.
— Não quero escrever essa carta.
— Mas vai, já imaginou se a Giulia encontra a mesma saída que você usou hoje para fugir
do seu marido?
— Não toque na Giulia — gritei.
— Baixe o tom, Beatrice, sou eu quem mando aqui. Sente-se e escreva a carta, o seu
marido precisa lê-la quando voltar da casa dos seus pais — ele disse e, em seguida, puxou a
cadeira para que eu me sentasse, arrastou uma folha de papel sobre a mesa e me entregou uma
caneta. Com as mãos tremendo, peguei o objeto de sua mão e posicionei sobre o papel. Eu sabia
que teria que agir rápido, mas também precisava manter a calma se eu quisesse encontrar uma
maneira de escapar desta situação. O meu coração batia acelerado enquanto eu escrevia a carta
de despedida.

***

Vincenzo Ferrari

— Preciso que entre em contato com os informantes lá na Rússia — eu disse a Lorenzo,


que estava ao meu lado no carro.
— Vai seguir com o planejado contra a família da Beatrice?
— Eu sou a família da Beatrice — afirmei com um tom aborrecido.
— Claro que é — ele confirma, virando o rosto para o lado oposto, e encara a estrada.
Chegamos na mansão e vou direto para o escritório com Lorenzo.
— O Antônio realmente não sabe nada sobre o Andrei — falou o meu irmão, fechando a
porta do escritório assim que entramos.
— Eu sempre soube que ele não sabia, mas tinha certeza de que ele saberia como
conseguir as respostas que eu preciso.
— Pelo que notei, a relação dele com o sogro está quebrada.
— Mas ainda são parentes — afirmo.
Ouvi a porta bater e autorizo a entrada.
— Signore, a menina Giulia chora sem parar e chama pela senhora Beatrice — disse a
funcionária.
— E por que não chama a Beatrice?
— Já a procuramos em todos os cantos, senhor. Ela não está em lugar algum.
— Como não está em lugar nenhum? — perguntei, saindo do escritório às pressas.
— Beatrice, Beatrice — chamei diversas vezes, e não obtive respostas. — Lorenzo,
procure comigo.
— Sim, farei isso — ele falou, indo para o lado oposto.
— Procurem a minha esposa agora! — ordenei aos soldados. — Ela tem que estar em
algum lugar, chequem as imagens das câmeras.
— Agora mesmo, Don.
Voltei para o interior da mansão e subi direto para o quarto de Giulia, que gritava pela
irmã.
— Giulia, está tudo bem, logo, logo a Beatrice vem ver você — disse, pegando-a no colo.
— Eu quero a Trice — ela gritava e chorava.
— Xi… se acalme, ela virá em breve.
Eu me acomodei na poltrona, e ela se aconchegou em meu colo, encostando a cabeça em
meu peito. Foi assim que comecei a cantarolar uma melodia, qualquer coisa que me veio à mente
para acalmá-la. Gradualmente, os gritos foram diminuindo até que finalmente ela se acalmou.
Continuei balançando a poltrona, indo e vindo, até que ela adormeceu. Coloquei-a na cama e
voltei a procurar por Beatrice.
— Isso estava no ateliê, Don — disse um dos soldados, me entregando uma folha de papel
dobrada dedicada a mim. Minhas mãos tremiam enquanto eu entrava no quarto e trancava a
porta. Sentando-me, abri a folha dobrada.
“Vincenzo, venho há muito tempo tentando contar-lhe algo que estava me sufocando, eu
nasci com um problema cardíaco grave. Os médicos me deram poucos anos de vida, mas, ainda
assim, lá estava eu correndo pelo jardim da minha casa, ouvindo os gritos do meu pai,
implorando que eu parasse e me comportasse. “Beatrice, pare de correr, o seu coração filha”,
dizia ele, me pegando no colo e me levando de volta para o interior da mansão. Aos treze anos,
a minha situação piorou, a fila de espera para um transplante de coração fazia volta em três
continentes. Foi um ano vendo os meus pais chorarem e falarem comigo em tom de despedida.
Eu morreria sem nem ao menos realizar o meu sonho de entrar na igreja vestida de branco com
imensos tapetes vermelhos estendidos pelo caminho. Mas, aos quatorze anos, algo que
achávamos impossível aconteceu, o meu papà entrou no meu quarto aos gritos: “surgiu um
doador, você viverá, filha”. Eu não fazia ideia do quanto a minha vida mudaria devido a um
órgão. O mundo que mudou de cor e eu passei a rabiscá-los em telas e colori-los conforme o
meu humor. E junto veio a Giulia, que havia ficado órfã. Em mim, bate o coração da mãe dela, e
eu sei que ela sente isso. Acredito que já tenha entendido tudo que estou dizendo. Sinto muito, eu
nunca aceitaria se soubesse que uma pessoa seria assassinada para que eu estivesse viva hoje.
Seja muito feliz. Seguirei com Andrei a partir de agora”.
Amassei o papel em minhas mãos e bati várias vezes contra o meu peito, eu estava prestes
a sufocar.
— Nina! Nina! — gritei como um louco pelos corredores.
— O que quer com a Nina? — Lorenzo perguntou, vindo correndo ao meu encontro.
— Quando lhe devo satisfações, Lorenzo? Nina, Nina.
— Está me chamando? — quis saber, ofegante depois de subir as escadas correndo.
— Onde está a Beatrice? — perguntei em um rosnado.
— Eu não sei — respondeu com a voz trêmula.
— Para que você está aqui, porra?
— Don, checamos as câmeras. A sua esposa andou até o vinhedo, e foi além das
plantações — disse um dos soldados.
— O que está tentando me dizer?
— Ela não retornou, Don — comentou, desviando os olhos.
— Como assim não voltou? Quem diabos estava fazendo a segurança naquele local?
Levem os responsáveis até o celeiro, eu quero saber como a Beatrice saiu dessa casa — ordenei
aos gritos.
— O Mattia caminhou com ela, Don.
— Mattia? — indaguei, incrédulo. — Onde ele está?
— Não o vimos mais na mansão
— Figlio di puttana. Encontrem-no vivo, cortarei cada pedacinho dele.
— Acredita que ele a sequestrou? — perguntou Lorenzo.
— Eu não sei. Nina, me acompanhe! — Andei na frente, indo até o escritório, e ela me
acompanhou. — Sente-se — ordenei assim que fechei a porta. Tirei o papel do bolso e o
coloquei sobre a mesa.
— Do que se trata? — ela perguntou.
— Uma carta de despedida, mas também uma confissão.
— Confissão? — estranhou, pegando o papel sobre a mesa, e o leu.
Eu queria checar a sua reação, e foi exatamente como imaginei.
— Você já sabia — afirmei.
— Do que exatamente? A carta não está clara.
— Quer mesmo que eu acredite que você não entendeu o que ela disse aí?
— Não sei o que espera que eu diga.
— Você não sabia do transplante? Não sabia sobre ela ter o coração da Anna?
Ela se levantou da cadeira e esfregou uma mão na outra.
— Fala logo! — rosnei de punho cerrado.
Todo seu corpo estremeceu e ela voltou a se sentar na cadeira, caindo sobre ela dessa vez.
Vi a agonia em seus olhos e a briga que ela travou dentro de si antes de me revelar a verdade.
— Ela queria esconder a todo custo o transplante e o pai dela mandou fazer a cirurgia
plástica que ficou perfeita. A família dela é poderosa, e ela precisava de um coração para não
morrer e o seu pai, o Don, precisava de um incentivo para matar a Anna.
— Ela queria esconder e você achou que o que ela queria era mais importante do que eu te
ordenei fazer? — Inclino o meu corpo sobre a mesa.
— Sinto muito, mas ela estava com muito medo da sua reação, Don — ela respondeu sem
me encarar.
— Ela estava com medo, e você foi bem corajosa em me esconder toda essa informação,
Nina, e mais corajosa em admitir que sabia.
— Perdão, Don. Eu lhe suplico. — Ela juntou as mãos enquanto implorava.
— Lorenzo! — gritei, e ele entrou de imediato, já que certamente tentava ouvir tudo atrás
da porta.
— Pois não?
— Leve a Nina para a casa do vinhedo e deixe-a a pão e água — ordenei, e essa é a chance
de ele me provar que é leal a mim.
— Não! — ele gritou.
— Não? — Estreitei os olhos, analisando-o.
— Ela não tem culpa das mentiras da sua esposa.
— Lorenzo, leve a Nina até a casa do vinhedo — torno a ordenar entredentes.
— Lorenzo, eu irei — ela disse, indo até ele e segurando as mãos dele, que tremia de raiva.
— Peça a um dos seus soldados que faça isso. Eu não farei — disse, virando as costas.
— Está com tanta raiva e rancor que sequer percebeu o que a Beatrice disse na carta. Se ela
se foi, é porque nunca sentiu que poderia confiar no senhor para lhe dizer tal verdade.
— Cale-se!
— E está com o coração tão sujo de ódio que sequer entendeu que a Giulia é a sua filha.
As palavras entraram em mim como espadas, me apoiei na mesa, sentindo todo o meu
corpo tremer. A Giulia é minha filha, afirmei para mim, segurando as lágrimas que queimavam
os meus olhos.
38
Traição se paga com sangue

Vincenzo Ferrari

Subi rápido até o quarto da Giulia e me ajoelhei ao seu lado, chorando livremente na sua
presença.
— Me perdoe, eu achei que você estivesse morta — eu disse, alisando o seu rosto. Ela
dormia.
Era como se uma bala tivesse atingido o meu coração, eu deveria ter investigado e não
aceitado simplesmente quando falaram que ela estava morta.
— Como é linda. — Eu a olhava fixamente.
— Por que está chorando? — Giulia acordou com os meus ruídos no quarto e tocou o meu
rosto, aparando as minhas lágrimas.
Balancei a cabeça, sem conseguir responder. Fiquei encarando-a, tentando encontrar algo
no rosto que me trouxesse à lembrança da Anna. E sempre esteve ali, ela é idêntica, os olhos, o
formato do rosto, tudo.
— Não chora, vem, eu vou te colocar para dormir. — Ela se sentou na ponta da cama,
puxando a minha cabeça para o seu colo, e acariciou os meus cabelos.
A vida está me dando uma segunda chance. Levanto-me e a abraço, aconchegando-a em
meu peito.
— Eu sinto muito — eu disse com a voz embargada. — Eu acreditei que você havia
morrido, mas você está aqui, e eu vou cuidar de você. Sempre.
Giulia se afastou e me olhou com curiosidade. Eu teria muito o que explicar para ela.
Agora eu tinha uma filha para cuidar, para proteger e amar. A minha filha com a Anna.
— A Trice já chegou? Onde ela está? — ela perguntou.
— Ainda não, mas vou buscá-la e vou trazê-la para você — afirmei, alisando os seus
cabelos. — Deite-se novamente, eu sairei agora para trazer a Beatrice de volta.
Ela balançou a cabeça positivamente e se deitou se encolhendo no edredom.
Desci para delegar os próximos passos aos soldados, eu precisava achar a Beatrice, ela
nunca ficaria com Andrei.

— Tragam os Marino aqui — ordenei a Lorenzo, que ainda me olhava com rancor.
— Eu não estou aqui para isso, Don, peça que os seus soldados façam.
— E você está aqui para quê? — vociferei.
— Solte a Nina, Vincenzo — ele falou em um tom rancoroso.
— Se ela tivesse feito o que mandei, a Beatrice não teria fugido. Agora pare de falar, faça
o que mandei e traga os meus sogros e meu cunhado aqui. Sabe de uma coisa, Lorenzo? Procure
pelo Mattia e não falhe, vou pessoalmente à mansão Marino.
— A Nina está presa e o que fará com a Beatrice? Ela fugiu com o seu inimigo, ela merece
ser queimada — Lorenzo continuou pronunciando com ódio.
— O que te faz achar que pode me dizer o que devo fazer? — perguntei.
— É traição, e traição se paga com sangue — ele disse entredentes.
— Não se preocupe, considerarei as suas palavras quando for julgar a Nina também. —
Apenas um lado dos meus lábios se curvou em um sorriso, e eu virei as costas, indo em direção
ao jardim.
— Vincenzo, se tocar na Nina, eu não vou te perdoar — ele gritou, mas não virei para
encará-lo e caminhei em direção ao carro.

***

Beatrice Marino

— O que faremos com o consigliere do Vincenzo? — Ouvi o soldado perguntar a Andrei.


Ele gargalhou diabolicamente.
— Odeio traidores, se ele foi capaz de trair a própria família, nunca será leal a mim. Dê a
ele o que um traidor merece e depois jogue-o na lata de lixo de onde ele veio.
— Na mansão Ferrari, Don?
— Exatamente.
Eu estava sentada no sofá, imóvel, esperando o que seria de mim daqui em diante.
— Minha princesa, o jatinho já está pronto, iremos para Rússia em breve, mas antes tenho
um assunto importante para resolver — ele disse, se sentando ao meu lado.
— Andrei, eu não trouxe os meus remédios comigo.
— Me diga tudo que precisa, mandarei comprar para você.
— O Vincenzo agora sabe sobre o coração da Anna e, se ele achar que eu fugi com você,
eu temo pela minha família.
— O seu pai recusou várias vezes a minha oferta e não evitou esse casamento com o
Vincenzo — ele falou sem dar a menor importância.
— Mas ainda são a minha família — retruquei.
— Esqueça tudo que viveu aqui, teremos uma nova vida na Rússia. — Ele levantou-se do
sofá e foi até uma mesa repleta de bebidas, pegou uma garrafa e bebia diretamente dela. — Você
está cada dia mais linda — ele disse, voltando a se sentar do meu lado e passando o braço em
volta do meu ombro.
— Eu posso me despedir dos meus pais? — indaguei.
— Não será necessário, eles certamente pegarão o primeiro voo para a Rússia quando
souberem que estamos juntos. E o seu irmão, então — ele sorriu, levantando-se —, ele vai surtar,
mas prevejo uma boa amizade.
Ele estava falando coisa com coisa. Amizade?
— Vincenzo vai matar todos antes mesmo que eles cruzem o jardim de casa.
— Eu vou matar o Ferrari antes de sair da Itália. Não se preocupe tanto com ele, não sei se
chegarei antes de ele matar a sua família, mas lhe prometo vingança.
— Chefe, quando vamos atacar o Ferrari? Estive considerando atraí-lo para Rússia, o que
acha? — indagou o homem que parecia ser o seu consigliere.
— Eu sou ansioso, não quero esperar tanto tempo para meter uma bala no coração dele.
— Estamos no território dele — ele disse em tom de alerta.
— E daí? Eu quero ridicularizá-lo. Em seguida, tragam a menina, ela é importante para a
minha princesa.
Arregalei os meus olhos quando o vi falar da Giulia.
— Mas é filha do seu inimigo — contrapôs o consigliere.
— É só uma criança, podemos moldá-la.
A casa estava cercada de soldados, mas eu precisava sair dali.
— Beatrice, coloque os nomes dos remédios que você toma — ele disse, entregando uma
folha de papel e uma caneta. — Providencie todos para mim rápido, ela não pode ficar sem os
medicamentos.
— Entendido, chefe — confirmou o seu conselheiro.
— Arrume os carros e os soldados, vamos armar para ele até amanhã à noite.
— Como quiser, chefe.
Eu precisava arrumar uma forma de sair do cativeiro antes de voar para a Rússia, lá deve
ter um exército maior, e eu nunca conseguiria fugir.
39
Achei que gostasse de caçar

Vincenzo Ferrari

Contei os postes com impaciência, ansioso para chegar à mansão dos Marino. Onde você
se encontra, Beatrice? Fechei o punho e tencionei a mandíbula. Você é minha, Beatrice,
viveremos juntos no inferno ao qual fui condenado.
— Don? — um dos seguranças da casa me indagou, confuso pela visita no meio da noite.
— Abra o portão — ordeno, e ele faz rapidamente.
Desci do carro e entrei na casa.
— Acordem a todos — ordenei aos gritos.
Em poucos minutos, Luigi é o primeiro a descer e logo atrás os pais da Beatrice.
— Aconteceu algo com a minha irmã? — questionou Luigi.
— Isso é exatamente o que quero saber, onde está a Beatrice? — indaguei, indo até eles.
— Como assim? — A sua voz saiu trêmula e me parecia que realmente ele não fazia ideia
do que eu estava falando.
— O que fez com a minha filha? — A voz irritada da minha sogra reverberou.
— Estão de teatro? Beatrice deixou uma carta, ela fugiu com o Andrei, e vocês estão me
dizendo que não sabem? — perguntei com deboche.
A mãe de Beatrice caiu sentada no chão com a expressão de espanto.
— Mamma. — Luigi se apressou para levantar a mãe.
— Desgraçado! — Ela partiu para cima de mim, batendo em meu peito com os punhos
cerrados. — A sua casa é cheia de soldados, como está me dizendo que ela fugiu? O que fez com
ela, diga! Você matou a minha filha? — gritava e me batia.
— Acalme-se! — Antônio, o meu sogro a segurou. — Vamos conversar e entender o que
está acontecendo.
A mulher ainda me olhava com ódio enquanto o seu rosto era banhado pelas lágrimas.
— Sente-se, Don, o que aconteceu? — ele perguntou.
— Eu já disse o que aconteceu, ela foi embora com Andrei.
— Impossível! Ela não iria embora e nos deixaria aqui, à mercê da sua fúria — minha
sogra voltou a dizer.
Eu realmente esperava encontrar um exército do Andrei guardando a entrada quando
chegasse aqui.
— Preciso que me acompanhem — eu disse educadamente, embora eu não estivesse
fazendo um convite.
— Para onde? — Luigi questionou.
— Para a minha casa, até que a Beatrice retorne.
— Em que condições nos quer na sua casa? — indagou Luigi.
— Não posso dizer que são convidados — eu disse, apontando para a porta.
— O que pretende com isso? — a minha sogra quis saber.
— Temos muitos assuntos pendentes, que resolveremos depois que eu trouxer a minha
esposa para casa. Vamos, não desperdicem o meu tempo, os meus soldados pegarão bolsas com
roupas para vocês.
— Beatrice não foi por vontade própria, eu tenho certeza disso — afirmou Antônio.
— Veremos, meu sogro, mas, independentemente dos motivos ou das vontades, ela voltará
para nossa casa.
Andei em direção à saída, eles me acompanhavam sem muito entusiasmo, embarcando em
outro veículo, enquanto eu pretendia voltar para casa sem maiores problemas. O meu celular
tocou e vi que era uma ligação do Lorenzo. Atendi imediatamente.
— Estou te ouvindo.
— Encontrei o Mattia, aliás, ele foi jogado aqui na frente da mansão.
— Estou chegando — falei, encerrando a ligação. — Acelera — ordenei ao motorista.
A estrada estava livre por conta do horário e, em poucos minutos, o carro estacionou na
mansão.
— Onde ele está? — indaguei aos gritos, saindo do carro.
— Don, o que faremos com eles? — pergunta um dos meus soldados.
— Coloque-os na casa em anexo e não os deixe circulando pela mansão. Não quero
ninguém andando por aqui até que eu autorize.
— Vai nos trancar como se fôssemos animais? — pergunta a minha sogra assim que virei
as costas. Vire-me para encará-la.
— Nem queira saber como trato as pessoas que vejo que a vida vale menos que a de um
cachorro. Acredite, essa casa é um ato imenso de bondade, considerando todos os ótimos
momentos que tive com a sua filha, mas não me irrite ou posso esquecer todas essas coisas. —
Tornei a virar de costas e caminhei até a casa do vinhedo.
Ao chegar lá, encontrei Mattia debilitado, caído no chão enquanto Nina tentava estancar o
sangue que ensopava a sua camisa na altura do abdômen.
— O que aconteceu? — indaguei a Lorenzo, que estava parado ao lado de Nina.
— Ele não fala nada, não sei o que houve.
— Leve Nina para outro lugar — ordenei.
— Ele está morrendo — ela retrucou.
— Entã q1o fique e prolongue as horas dele. — Girei a cadeira e me sentei com os
braços apoiados no encosto traseiro.
Ele mudou a expressão gélida e me encarou com deboche.
— Ele levou uma facada — ela tornou a falar.
— Ele foi torturado, eu já notei, me tiraram esse prazer, mas quem, Mattia? — indaguei,
me levantando da cadeira e me abaixando do lado dele. — Ele sorriu sem me responder. —
Arrancaram a sua língua? — Olhei para Nina.
— Não, a língua está aí — ela respondeu, mesmo sabendo que apenas debochei.
— Onde está a Beatrice? — perguntei com ira.
— Achei que gostasse de caçar — respondeu com a voz fraca.
— Você tinha tudo aqui, Mattia, era o meu homem de confiança.
— Vá se foder! — Ele cuspiu depois de falar.
Enfiei o meu dedo onde ele levou a facada, ele riu com a dor e foi impossível não lembrar
do meu pai.
— Está achando engraçado? — questionei, desdenhoso.
— Enquanto você está aqui, colocando o dedo em minha ferida, Andrei coloca outras
coisas na sua mulher.
Cerrei o punho e o encarei com ódio.
— O quê? Ela foi porque quis, eu apenas a ajudei a sair. Ela se agarrou ao pescoço dele
quando o viu e eles se beijaram.
— Sério? Você lhe fez um favor em troca de quê? O que Andrei te ofereceu para você
levar a minha esposa. Deixe-me adivinhar, ele me mataria, e você assumiria o meu lugar. Mas
aqui está você morrendo, e ele certamente ainda tentará me matar. Posso deixar você vivo,
Mattia, vou te perdoar, é só você me dizer onde ele está.
O miserável gargalhou, mesmo sabendo que lhe causava ainda mais dor.
— Eu não quero o seu perdão, eu quero que você morra.
— Lorenzo, pegue o celular e puxe os locais onde ele se conectou — ordenei. — Faça
urgentemente, o dia não vai nascer antes que Beatrice volte.
— O que faço com ele? — indagou Lorenzo.
— Patético, você, Lorenzo, a sua mulher está presa no galpão, ele faz o que quer e você
continua como um cachorro abanando o rabinho para ele — Mattia debochou.
— Isso não é da sua conta — Lorenzo respondeu.
Eu estava com ódio da Nina, mas eu não seria capaz de fazer o meu irmão sofrer o mesmo
que sofri e sofro sem a Anna.
— Nina, quero ele vivo — ordenei. — Eu quero cortar em minúsculos pedaços e queimar
na fogueira, mas agora tenho outras prioridades. Me acompanhe, Lorenzo.
— Chequei os locais onde ele se conectou, tem uma localização próxima à mata fechada.
— Prepara o máximo de homens possível, quero todos armados até os dentes, vamos matar
aquele filho da puta que acha que pode roubar o que me pertence.
40
Vocês me tiraram tudo

Beatrice Marino

Eu não recordo o momento exato em que adormeci, contudo, ao abrir os olhos, fiquei
confusa: eu não mais me encontrava na mesma residência de antes e a claridade intensa do sol
adentrava pela janela.
— Que bom que acordou, você dormiu durante um dia e meio. — Andrei estava em pé em
frente a uma janela imensa. Ele meneou a cabeça antes de andar em minha direção e se sentar ao
meu lado.
— Onde estamos? — indaguei.
— Precisamos mudar de casa, por isso te coloquei para dormir, quis evitar problemas no
caminho, aquele verme nos localizou, mas sou eu quem decido o momento exato em que vamos
nos encontrar. — Ele me encarava com olhos frios e animalescos. — Espero que goste da casa, a
vista é espetacular e temos um jardim — completou, animado.
Ele me parecia um doente, eu estava apavorada.
— Andrei, eu preciso ver a minha família — disse em tom de súplica.
— Me deixe matar o Ferrari e poderemos andar mais tranquilos pela Itália — ele falou, se
aproximando mais de mim. As suas mãos traçaram um caminho pelas minhas costas e ele
agarrou os meus cabelos com força, colando o meu rosto ao dele. — Você é tão linda. — Ele
puxou o ar com força, como um animal reconhecendo o cheiro da sua presa.
— Você está me machucando — disse num gemido de dor. A minha cabeça doía no local
onde ele puxava os meus cabelos.
Ele afrouxou as mãos, mas não se distanciou um único centímetro.
— Não sei se conseguirei conter o meu desejo por você, embora eu a respeite o suficiente
para não lhe forçar a nada. — Suspirou, pressionando com a própria mão a ereção que pulsava
em sua calça. — Diga que me quer — ele sussurrou no meu ouvido e voltou a me encarar com os
seus olhos famintos.
— E-eu — gaguejei, eu não queria contrariá-lo, mas as palavras não saíram da minha boca.
— As coisas virão com o tempo, tentarei ser paciente. Deixarei você sozinha, se arrume e
tome os seus remédios, tivemos que usar soro, tive medo de que você desidratasse. Eu já matei o
infeliz que disse que não faria mal o medicamento para te fazer dormir. Eu fiquei apavorado,
esperando que você acordasse.
Ele se virou e saiu do quarto. Permaneci deitada por alguns minutos, o cansaço mental me
dominava, eu não conseguia parar de pensar em planos para minha fuga. Me levantei e me dirigi
até a imensa janela do quarto, o espaço era enorme, com cerca de cinquenta metros quadrados.
Tomei um longo e quente banho antes de dirigir-me ao closet, incerta do que encontrar lá, mas
ele havia planejado tudo e tinha diversas opções para mim. Escolhi um vestido dentre tantos,
penteei meu cabelo e o prendi num coque. Ao sair do quarto, caminhei por um extenso corredor,
onde o aroma de comida fazia meu estômago revirar.
— A senhora está com fome? É claro que está, passou muito tempo dormindo — uma
mulher já idosa, de aparência amigável, falou para mim do andar de baixo da casa. — Venha,
desça, lhe servirei o almoço.
Eu coloquei um sorriso simpático nos lábios e desci, mas o cheiro da comida ainda me
incomodava. Enquanto mexia sem ânimo no que ela havia colocado no prato, aproveitei para
olhar tudo ao redor, tinham muitos homens espalhados pela casa, as minhas chances de fugir
eram mínimas.
— Não vai comer? — A voz grave de Andrei ecoou pelo ambiente. Ele arrastou uma
cadeira e se sentou ao meu lado.
— Estou sem fome — afirmei, jogando o garfo de lado.
— Trouxe notícias para você. — Ele me entregou um envelope, e eu rasguei com pressa,
jogando o conteúdo sobre a mesa.
— Mas o que é isso? — perguntei num grito quando vi fotos da Giulia chegando na escola
e até dentro dela.
— Notei que você está com uma postura diferente, está pensando em tentar fugir? — quis
saber, alisando o meu braço com o dedo indicador.
— Acredita que seja possível? — Olhei ao redor e um lado dos seus lábios se curvou em
um sorriso.
— Eu odeio ser contrariado e o simples fato de você cogitar algo já me deixa irritado.
— O que mais quer de mim? Você diz que gosta de mim, mas, no fundo, está apenas me
usando de isca, me fez revelar algo importante por carta e colocou a minha família em risco —
falei já em lágrimas.
— Desculpe, Beatrice, mas, como disse Maquiavel, “os fins justificam os meios”. Tudo
bem-planejado, a sua vinda, a carta, até o consigliere dele ter passado para o meu lado. Admito
que ter você no final de tudo isso será magnifico e excitante, você não imagina o quanto queimo
de desejo por você. Talvez, se tivesse vindo comigo naquele dia em que os cerquei próximo à
praia, eu tivesse poupado você de muitas coisas. Agora é tarde, você o escolheu, isso machucou
o meu ego.
Ele se ergueu da mesa e desapareceu rapidamente, deixando-me sozinha. A sensação de
náusea intensificou e corri em busca do banheiro mais próximo, jogando para fora tudo o que
havia em meu estômago. Ainda sentindo as ondas de náusea, fui me arrastando até meu quarto,
onde me deitei na cama, sentindo uma tontura que parecia ser causada pela minha má
alimentação.

***

Vincenzo Ferrari
Eu estava agarrado ao sobretudo da Beatrice, o cheiro dela ainda estava forte no tecido que
eu apertava com forma em minha mão.
— Você vai achá-la, não tenho dúvidas disso. — Olhei em direção de onde vinha a voz. —
Acabei de mandar a Giulia para escola — disse a minha sogra, se sentando no sofá na minha
frente.
— Deve voltar para a casa anexo agora — falei com um tom gélido.
— Claro, mas antes posso ler a carta que a minha filha escreveu?
— Quer saber o que ela disse na carta? — Sorri sem humor.
— Se me permitir.
— Eu mesmo vou lhe dizer o que tinha na carta — ela me olhava atenta, esperando que eu
falasse —, vocês me tiraram tudo, a minha esposa, a minha filha. Devo agradecê-los por ser
quem sou hoje? — Os seus olhos se arregalaram.
— Ela lhe contou tudo? — indagou com a voz trêmula.
— Sim, ela me contou tudo e deixou vocês à própria sorte.
— Não faria o mesmo pela Giulia? Não aceitaria um coração de origem duvidosa se fosse
para salvar a vida da sua filha?
Eu contraí a mandíbula.
— Vocês me tiraram tudo — rugi. — Deviam ter dado Giulia para mim ainda bebê. Era o
mínimo que poderiam ter feito, mesmo que quisessem evitar falar sobre Beatrice.
— Erramos em vários pontos, mas com as melhores intenções.
— Em que ponto acharam que estavam acertando?
— A Giulia se acalmava nos braços de Beatrice, ela encostava a menina em seu peito e o
choro cessava. Era doloroso ver que ela sentia falta da mãe e reconhecia o som que ela ouvia
ainda na barriga. Não foi difícil só para você, eu sou mãe e doeu.
Segurei as lágrimas em meus olhos, meu coração parecia estar sendo pisado.
— Saia, volte para a casa anexa e só saia quando a Giulia voltar — ordenei com a voz
embargada e virei as costas, me sentindo incapaz de conter as lágrimas.
41
E se ela não estiver aqui?

Vincenzo Ferrari

— Don, o que faremos com Mattia? — indagou Lorenzo no escritório onde estávamos.
— Só peça para Nina mantê-lo vivo, eu preciso encontrar a Beatrice, não tenho cabeça
para mais nada.
— Estou encantado com a minha sobrinha — comentou, e eu sorri como quem esquece
todos os problemas.
— Eu amei aquela garotinha desde o primeiro segundo em que a vi — confessei com um
sorriso bobo.
— O que fará com os pais da Beatrice? — ele perguntou.
— Ainda não sei, eu os trouxe para garantir que ela voltará.
— Mas se ela realmente fugiu porque quis, se ela o escolheu? — A pergunta de Lorenzo
fez o meu corpo tensionar.
— Ela é a minha esposa, aqui é o lugar dela.
Ouvi batidas na porta e autorizei a entrada.
— Don, localizamos eles — disse um dos meus soldados.
— Assim? Tão fácil? — Lorenzo perguntou, desconfiado.
— O que você está dizendo que é fácil, Lorenzo? — indaguei.
— Eles armaram para serem encontrados, vamos preparados, cerquemos aquele filho da
puta. E você fica — ele falou como uma ordem.
Gargalhei.
— Do que está falando? Eu irei. Vou matar aquele desgraçado e arrancarei a cabeça dele.
— Irmão, eu trarei a Beatrice.
— Agradeço a preocupação, mas irei, preparem todos, levemos um exército ainda maior do
que o que ele nos apresentou na última vez.
— Vincenzo, seremos previsíveis, ele nos espera e, se não formos, ele acreditará que você
não se importa com a Beatrice — disse Lorenzo.
— Não estou preocupado em ser previsível, ele está me chamando para o confronto, eu não
vou dar para trás.
— Ela disse na carta que foi porque quis — ele argumentou.
— Chega, Lorenzo, não é só pela Beatrice. — Embora isso fosse o motivo que me motivou
a agir sem muitas estratégias.
— Estou desconhecendo você, Vincenzo.
— Eu também não me reconheço mais, Lorenzo, agora prepare todos, vamos essa noite.

***

Beatrice Marino

Acordei com o ruído de vozes exaltadas vindo do lado de fora da residência. Rapidamente,
levantei-me para observar a movimentação e percebi que aparentavam estar se mobilizando para
um confronto. De repente, um susto me tomou quando a porta se abriu subitamente.
— Beatrice, desça e venha tomar café da manhã — disse Andrei com a cabeça na porta
entreaberta.
— O que é tudo isso? Estamos de partida novamente? — indaguei.
— Hoje será o dia em que você se tornará viúva e assim poderemos nos casar — ele falou,
vindo em minha direção e parando ao meu lado. — Considere isso um presente do seu futuro
marido, você poderá vir à Itália sempre que quiser.
Senti o meu estômago embrulhar e, nos meus olhos, brotaram lágrimas, que segurei.
— Em pouco tempo, ele virá para te buscar, e não voltará.
— Deveríamos apenas ir embora — eu disse com a voz embargada.
— Gosto de ver que está animada para ir para a Rússia, mas não posso deixar vivo o
homem que tocou em você — ele respondeu como um sádico.
— Não fale como se estivesse fazendo isso por mim, essa rivalidade entre vocês já existia.
— Mas agora estou diante da fraqueza dele. — Ele sorriu de forma maléfica.
Impossível não recordar o momento em que Vincenzo confessou que eu era a sua
vulnerabilidade, que eu conseguia causar dor e sofrimento a ele.
Andrei abriu a imensa janela e gritou:
— Quando tudo estiver pronto, avisem, vamos esperar por eles na estrada, só quero o
Ferrari aqui, ele deve chegar sozinho. E eu também estarei sozinho.
— Sozinho? — indaguei, e ele sorriu com ironia.
— Se apresse, você vai para outra casa.

***

Vincenzo Ferrari

A noite estava quente e abafada. As ruas de Florença estavam desertas e os poucos


moradores que ainda andavam pelas calçadas pareciam estar com pressa, como se soubessem que
algo grande estava prestes a acontecer, e eles estavam certos, mas, para a sorte deles, o confronto
seria longe daqui e nós já estávamos a caminho.
— Ele está a usando de isca — afirmei para Lorenzo no carro.
— Se esse for o caso, ele conseguiu. — Ele deu de ombros.
— Eu iria independente da Beatrice, mas é óbvio que, por ela, vou com mais vontade de
matá-lo.
— É nessa trilha, Don — o soldado que seguia no carro da frente nos avisou pelo rádio.
— Seguiremos a pé deste ponto — avisei, iríamos seguir pelas matas ao redor.
— Ele está em uma das casas da colina — afirmou Lorenzo.
— Com certeza é uma emboscada — um dos meus soldados comentou.
— Faremos como planejado — eu disse, confiante.
— Você acha que ele vai cair nessa? — Lorenzo quis saber, desconfiado.
— Ganharei tempo até ele perceber que caça um sósia — falei, ainda confiante
— Irmão, tome cuidado. — Lorenzo me abraçou quando saímos do carro.
— É sério que ainda não se acostumou com tudo isso? — Sorri ainda no abraço.
— Nunca. Você é tudo que eu tenho.
— Lorenzo, não seja sentimental — falei, me afastando e seguindo uma rota diferente.
Segui pela mata fechada com o objetivo de chegar aos fundos da casa, embora eu soubesse
que tudo está cercado, inclusive essa mata. Ouvi passos atrás de mim e me virei rapidamente,
pronto para atirar.
— Sou eu — afirmou Lorenzo.
— O que quer? — indaguei.
— Trarei a minha cunhada com você, o nosso chefe de segurança está cuidado de todo o
resto.
— Ok, Lorenzo, venha me acompanhe — falei, contrariado.
Aos poucos, os ruídos da noite eram substituídos pelo barulho ensurdecedor das armas
sendo disparadas. Eu podia sentir o cheiro da pólvora.
Ao chegar no topo da colina, analisei bem o local. As luzes ao redor estavam todas
apagadas, e a tensão e a adrenalina corriam pelo meu corpo.
— Tem vários homens do Andrei, eles estão focados nos soldados, mas são muitos tiros —
alertei Lorenzo.
Avancei com a pistola em punho, esquivando-me dos tiros, enquanto ele me seguia com
certa distância, cobrindo as minhas costas. Eu já podia ver vários dos meus inimigos no chão, o
cheiro de sangue já estava impregnado no ambiente.
— Aqui é o meu país, a minha terra, nenhum estrangeiro pode vir me confrontar no meu
território e achar que levará a melhor — murmurei para mim mesmo.
— Don, o Ferrari está subindo como o senhor ordenou. — Ouvi o alerta de um dos
soldados assim que cheguei próximo aos fundos da casa.
Eu e Lorenzo tínhamos silenciadores nas armas e atiramos em uma dezena de homens que
guardavam os fundos da mansão.
— Vou entrar e procurar por ela — avisei a Lorenzo.
— E se ela não estiver aqui? — A indagação dele me fez parar. Isso não havia passado
pela minha cabeça.
— Ela tem que estar.
42
Beatrice não voltou sozinha

Beatrice Marino

Eu esperava uma distração dos soldados de Andrei para sair da casa que não fica longe da
que estávamos. Eu podia ouvir os tiros, o meu corpo estremecia de medo, mas eu encontraria o
Vincenzo. Quando finalmente julguei que seria o momento certo, comecei a agir. Esperei até
ouvir o som dos passos dos homens se afastando do quarto, eles estavam sedentos para ir ao
confronto e se distraíam fácil, e eu sabia que aquele era o momento perfeito para agir.
O medo começou a tomar conta de mim, mas eu precisava encontrar Vincenzo. Tudo
estava trancado, inclusive as janelas, até que felizmente encontrei uma janela lateral que estava
entreaberta. Consegui passar pelo pequeno espaço aberto, mas caí e machuquei o joelho, me
levantei mancando, mas aquilo não me impediria de ir até o meu marido, ele certamente foi atrás
de mim lá na casa.
— Que merda, a garota fugiu, o chefe vai nos matar. — Ouvi um dos soldados gritar e
apressei os passos.
— Vou pegar aquela vadia do caralho! — outro gritou.
Enquanto avistava a casa ao longe, um incômodo abdominal me interrompia
ocasionalmente, mas eu persistia. Ao chegar ao fundo da casa, tive que saltar sobre vários corpos
espalhados e o odor de sangue fez com que meu estômago virasse, e eu vomitei.
— Vincenzo? — murmurei para mim, ouvindo a sua voz na casa.

***

Vincenzo Ferrari

Ao entrar em casa, eu explorei todos os cômodos, mas não encontrei nenhum sinal da
Beatrice. Foi então que vi o Andrei sentado em um dos quartos, aparentemente me esperando.
— Espero que esteja preparado para morrer — ele disse, apontando a arma para mim.
— Farei a passagem com prazer, contanto que você me acompanhe. — Sorri com deboche.
— A Beatrice não está aqui — ele desdenhou, me vendo olhar para os lados.
— Imaginei que seria assim — afirmei, fazendo pouco caso.
— Ela não quer voltar com você.
— Sério?
— Vincenzo! — Virei-me rapidamente, reconhecendo a voz de Lorenzo, enquanto ele era
mantido firmemente por dois soldados de Andrei. Franzi a testa em preocupação, mas retornei à
atenção para Andrei, que pendurou nos lábios um sorriso satisfeito.
— Ajoelhe — ele ordenou.
— Não, Vincenzo! — gritou Lorenzo.
O meu corpo estremeceu e trinquei os dentes, apontando a arma de volta para ele.
— Pode atirar nele — ele ordenou aos soldados, que não tiveram tempo nem de piscar
quando atirei nas suas cabeças. Lorenzo se soltou, pegando a arma caída, e apontou para Andrei.
— Lorenzo, vá para a porta principal — ordenei, e ele foi de imediato. — Onde está a
minha esposa? — vociferei.
Ele me encarava em silêncio, com um sorriso confiante no rosto.
— Abaixa a arma — mandei e eu podia ouvir os gritos dos meus homens vibrando.
Estávamos em vantagem, e ele sabia disso.
Mas, por mais que eu falasse, ele não tirava o ar soberbo, e eu sabia que ele tinha uma carta
na manga.
— Vincenzo. — Tremi ouvindo a voz dela e me virei para trás sem me importar se estava
baixando a guarda.
— Beatrice — sussurrei. Os seus olhos estavam apavorados, sangue do joelho escorria
pelas suas pernas, a terra cobria o seu vestido.
— Veio ver a morte do seu marido, princesa? — indagou Andrei, e eu ouvi o exato
momento em que ele apertou o gatilho.
— Não! — Um grito parecia sair rasgando os pulmões de Beatrice, que se jogou na minha
frente e caiu sobre mim em seguida.
— Não! Não! Beatrice. — Olhei para Andrei, que estava imóvel, com as mãos na cabeça,
sem acreditar no que estava vendo. Vi que ele também se importava com ela. — Desgraçado —
gritei, disparando vários tiros contra ele, que caiu agonizando no chão.
— Vincenzo? — Lorenzo retorna com outros soldados.
— Andrei está morto — um deles gritou e ouvi as comemorações vindas de fora da casa.
— Me ajude, Lorenzo — implorei e as lágrimas molharam o meu rosto. — Ela não pode
morrer.
— Ela está viva, mas vamos rápido, o pulso está fraco.
— Não podemos movê-la, a bala vai se mexer dentro dela. Onde foi o tiro?
— Vincenzo, ele saiu, olhe! — disse, apontando para a altura do ombro. — Vamos levá-la.
Rápido.
Eu não suportaria perdê-la, ela não pode me deixar. Examinei a ferida com cuidado,
Lorenzo tinha razão, a bala saiu.
A imagem da Beatrice naquelas condições me desesperou, os seus cabelos estavam
espalhados pelo chão, sujos do sangue que empoçava embaixo dela. Eu a peguei em meus braços
e andei apressado.
— Qual a situação lá fora? — indaguei a um dos soldados.
— Todos rendidos, Don.
— Perfeito! — disse, saindo com Beatrice em segurança. — Lorenzo, dirija. — Ele acenou
positivamente com a cabeça e assumiu o volante.
Mais uma vez eu estava em um carro derrapando pela estrada, dessa vez não nevava, mas o
meu corpo estava gelado. Beatrice tinha a cabeça em meu colo, eu havia tirado a camisa e
tentava estancar o sangue, que já havia tingido toda a minha camisa branca.
— Ligue para a Nina, peça que ela organize tudo para a chegada da Beatrice — ordenei a
um dos soldados que estava no banco de carona.
Uma das melhores coisas que fiz foi construir uma ala de urgência e emergência na
propriedade, além de muitas vezes não poder ir ao hospital, era bom evitar envolver a polícia em
nossos assuntos, mas o motivo principal eu sabia: depois do que aconteceu com a Anna, eu não
confiava mais em qualquer médico.
Ao chegar na propriedade, fomos recebidos por Nina, que prontamente iniciou o processo
de estabilização de Beatrice. Enquanto ela cuidava dela, eu me sentei do lado de fora e passava
as mãos pelos cabelos e tentando manter a calma.
— Não vai avisar aos pais dela? — Lorenzo indagou.
— Claro, mas antes quero saber como ela está.
— Eu posso ir até lá avisar.
— Faça isso, irmão.
Poucos minutos se passaram até a minha sogra chegar aos gritos em frente da sala de
emergência.
— Onde está a minha filha? — ela gritava e esmurrava o meu peito.
— Controle-se — disse o meu sogro, a segurando. Eu vi a sua expressão de ódio me
encarando, ele queria me bater tanto quanto ela.
Mais afastado, estava Luigi, ele estava tão devastado quanto eu. Paralisado, ele observava
tudo com um olhar inexpressivo.
— Ainda não sei como ela está, Nina está cuidando dela — disse gélido.
— A culpa é sua, entendeu?
— Lhe garanto, minha sogra, que o tiro não saiu da minha arma.
— Você a arrastou para tudo isso, seu desgraçado.
— Acalme-se — meu sogro volta a exigir.
— Deixe-a falar, me bater ou fazer o que ela quiser, eu sei que essa é a sua vontade
também, embora o senhor seja mais contido.
Olhei para as minhas mãos que tremiam, o meu corpo estava coberto pelo sangue dela e
tudo isso estava me deixando enjoado.
— As horas não passam, que porra! — gritei, percorrendo o corredor de um canto a outro.
Até que a porta se abriu.
— Como ela está? — perguntei com a voz falhando.
Nina respirou fundo antes de responder.
— O tiro foi na altura do ombro, ela perdeu muito sangue e o estado dela ainda é crítico, mas
acredito que logo irá se recuperar.
Fechei os olhos, aliviado. Sabia que ainda havia um longo caminho pela frente, mas, pelo
menos, ela estava viva. Sentei-me exausto, sentindo o peso daquela noite em meus ombros. Ela
estava viva, isso era tudo o que importava.
— O que precisamos fazer agora? — indaguei.
— Eu vou administrar os remédios para estimular a produção de glóbulos.
— Podemos fazer uma transfusão, temos o mesmo tipo sanguíneo — disse a minha sogra.
— Bom, é que não é tão simples assim, Beatrice não voltou sozinha e eu gostaria de tentar
os remédios primeiro até termos a autorização de um médico especialista — ela falou com um
semblante sério.
— Como assim não voltou sozinha? Que tipo de especialista você está falando?
— Um obstetra. — Ela deu de ombros com um sorrisinho. — Você vai ser pai.
— Como assim? Espera… Nina. — Eu senti o chão se abrir debaixo dos meus pés. Eu
deveria ter pulado de alegria, mas eu só pensei no estado em que ela estava e que eu não queria
passar por tudo de novo. — Nina, eu confio em você, não permita que ela me deixe.
43
Fique comigo

Vincenzo Ferrari

— Calma, Vincenzo, ela está bem, você vai se pai, ser alegre — disse o meu irmão.
— A minha filha está grávida? Tragam o médico, vamos fazer a transfusão de sangue —
disse a minha sogra com um tom alterado.
— Trarei um amigo — Nina afirmou.
— Posso ver a minha irmã? — Luigi chorava como um menino e o meu sogro parecia não
acreditar.
— É recomendado esperar, devemos evitar a disseminação de infecções e ela está sedada
agora.
— Sogra, pode verificar a Giulia? Eu não estou com cabeça agora — pedi, mas ela me
olhou contrariada.
— Mãe, por favor, cuide da Giulia — Luigi disse.
— Me avise assim que chegar — ela falou antes de sair e me lançar um olhar torto e, em
seguida, sumiu pelo jardim. Eu não tinha dúvidas de onde Beatrice havia herdado o gênio difícil
e desafiador.
Eu ainda estava coberto de sangue, e eles se entreolhavam.
— O que aconteceu exatamente? — o meu sogro perguntou.
— Andrei está morto, acredito que metade dos nossos problemas acabou.
— Fico feliz que tenha obtido a vitória — disse o meu sogro.
— Sim, alegre-se, o cenário mudou. Você já tem autorização para voltar para casa agora
que a Beatrice já está aqui comigo.
— Podemos ficar até que ela se recupere? — indagou Antônio.
— Claro, se mudem para a casa principal. Levem eles para a casa principal — ordenei ao
meu soldado. — Assim que o médico chegar, comunico. — Eles seguiram o soldado, e eu fiquei
com o meu irmão, aguardando o retorno de Nina.
— Ela ficará bem — disse Lorenzo.
— Eu tenho medo, eu estou apavorado, eu não vou suportar isso novamente, Lorenzo.
— Você não vai, Beatrice ficará bem, irmão — garantiu.
Eu andei nervoso de um lado para o outro e soltei o ar com força.
— Vou entrar para vê-la. Ela tem que ficar comigo. Ela não pode me deixar.
Caminhei lentamente até o quarto com as mãos trêmulas e a testa suando. Ainda não
conseguia aceitar estar prestes a perder a mulher que amo novamente. Entrei no quarto e a visão
de ela deitada na cama, pálida e desacordada encheu os meus olhos de lágrimas.
— Beatrice, você não tinha autorização para entrar na frente do tiro — esbravejei como se
ela pudesse retrucar. — Você acredita que viverei se você me deixar? — indaguei em lágrimas.
Me sentei ao lado dela e tomei a sua mão, sentindo a sua mão fria, e arrastei a mão até o
seu ventre o acariciando.
— Obrigado, vou amá-lo muito.
Fiquei em silêncio por um tempo, sentindo a presença dela ali e monitorando os seus sinais
vitais enquanto esperava Nina voltar com o outro médico. Subi um pouco a mão parando entre os
seios.
— Anna, você voltou para mim — eu disse, sentindo o seu coração bater contra o peito da
mulher que agora eu também amo. Ainda era difícil para mim, assim como deve ser complicado
para Beatrice.
Lembrei-me da viagem que fizemos juntos, das risadas que compartilhamos e das
conversas profundas que tivemos durante a noite. Senti o coração apertado ao pensar que poderia
perdê-la para sempre.
— Beatrice, por favor, fique comigo — sussurrei. — Eu não sei mais como viver sem
você. Eu te amo.
— Don, voltei — disse Nina, entrando com o médico.
Levantei-me, me recompondo.
— Conforme o que a doutora me passou no caminho, acredito que podemos proceder com
a transfusão, vou apenas fazer alguns exames.
— Chamarei a minha sogra para doar o sangue — comuniquei, saindo do quarto e indo até
a casa.
Quando entrei, a encontrei na sala com o Luigi e o meu sogro.
— Alguma novidade? — ela perguntou, vindo até mim.
— O obstetra acabou de chegar, ele vai fazer a transfusão.
— Irei para lá agora mesmo. — Ela passou apressada por mim.
— Como isso aconteceu? — Luigi questionou, voltando ao seu estado normal.
— A sua irmã se jogou na minha frente, seria eu naquela cama agora, e não ela. Sei que
preferiria que fosse assim, e eu também acreditei.
— O que fará agora que sabe sobre o coração? — Antônio quis saber dessa vez.
— Quer me ouvir sendo sincero? — Sentei-me na poltrona de frente a eles. — Eu pensei
em trancá-lo na mansão e mandar colocar fogo, eu faria isso com todos que levassem o nome
Marino, e ia deixar um decreto que se, por acaso, algum sobrevivesse, que estendessem a minha
ira por várias gerações.
— E por que desistiu?
— Porque eu estaria matando a mim mesmo no momento em que Beatrice deixasse de
respirar.
— Não sabíamos da origem do coração — ele se justificou.
— Só uma coisa que não vou perdoar, a Giulia.
Ele arregalou os olhos e me encarou.
— Ela sempre foi apegada a Beatrice.
— Mas eu sou o pai dela. Não acha contraditório você querer salvar a sua filha tirando a
minha de mim?
— Giulia sabe que é adotada.
— Ela é muito pequena para entender esse tipo de coisa — eu disse, ficando de pé.
— Sei que vai saber como conquistá-la, aliás, acredito que ela já gosta muito de você —
falou Antônio.
— Isso não é graças a você. — Virei as costas e os deixo sozinhos na sala.

***

Eu não preguei os olhos nem por um minuto e vi o sol nascer do pequeno banco que fica
ao lado do quarto onde Beatrice está. No entanto, não durei muito lá, eu tinha assuntos pendentes
com o Mattia. Eu ainda tinha em quem descontar todo o ódio por ter a minha esposa baleada no
quarto ao lado da minha casa.
— Mattia — disse ao entrar na casa do vinhedo onde ele estava amarrado com correntes,
igual a um animal.
— Primo — ele falou com um ar desdenhoso. — Ouvi rumores que a bela Beatrice voltou.
— Sim, ela está de volta, é uma pena que não esteja em condições para participar da
festividade da fogueira, por estar acamada.
— Vai mesmo me matar?
— Claro, não penso em outra coisa desde que retornou como um animal aqui para a
mansão.
— Então me mate. — Deu de ombros.
— Acha que vou hesitar? — indaguei, me aproximando dele.
— O seu pai já teria arrancado os meus olhos.
— Eu não sou o meu pai.
Caminhei pela sala e retornei para ele.
— Qual a sua raiva? O que tem contra mim? — quis saber.
— Não existe lealdade no nosso ramo, Vincenzo, todos esses anos, a única coisa que me
deixou satisfeito foi te ver sofrer pela Anna e se martirizar por não saber quem tinha o coração
dela. Eu sempre soube — ele confessou com um sorriso debochado. — Fui eu quem matou o
Francesco, ele queria abrir o bico, eu o persegui até seu último dia de vida, mas fiz ele acreditar
que era a família da Beatrice.
O meu corpo estremeceu de raiva.
— Achou divertido me ver sofrer? — questionei, caminhando até o armário, e voltei com
uma faca.
— Vai me esquartejar assim como fez com o seu pai?
— Não, tenho uma ideia melhor para você. Chamem o Lorenzo e peçam para que a Nina
me traga um cirurgião.
— Agora mesmo, Don.
— O que planeja fazer?
— Queimar você seria pouco, diria que seria até um ato de piedade. Resolvi que não quero
que se vá, não quero que vire cinzas. Quantas vidas podemos salvar com a sua vida insignificante
e imunda? Vejamos, dois rins, duas córneas, os pulmões são saudáveis, você nunca foi fumante,
o que mais? Vejamos, um coração talvez? Parabéns, primo, a sua vida ganhará um significado.
— Desgraçado — ele gritou, tentando se soltar.
— Ainda não te falei a parte boa, eu diria a parte mais divertida, eu quero você vivo e
consciente, vejamos se vai continuar rindo e debochando. Agora me dê licença, entrarei em
contato com o mercado ilegal de órgão e venderei cada um. Não pense que é pelo dinheiro, é só
pela satisfação de vender cada pedaço seu a preço de banana.
— Vincenzo, volta aqui! Vincenzo, você não pode fazer isso. — Eu o ouvi gritar já do lado
de fora da casa.
44
Você não me tirou nada, você me devolveu tudo

Beatrice Marino

Abri os olhos lentamente, tentando me acostumar com a luz branca e intensa do teto.
Tentei me mover, mas senti uma dor insuportável em todo o corpo, uma dor que se expandia
para cada célula de seu corpo. Pisquei algumas vezes, tentando focar na minha visão. Um tubo
estava conectado ao meu nariz, outro no seu braço. Senti uma pressão em meu ombro, como se
algo estivesse pulando dentro dele. Tentei gritar, mas a minha boca estava seca, e as palavras se
perderam em algum lugar em minha garganta.
Foi então que notei Vincenzo, ele estava sentado ao lado da cama. Ele segurava a minha
mão com os olhos marejados de lágrimas.
— Você acordou! — exclamou, aliviado.
Forcei um sorriso, mas uma lágrima caiu dos meus olhos.
— Que bom que você está bem — pronunciei baixinho.
Ele fez uma careta, claramente enfurecido.
— O que você fez, Beatrice? É claro que eu estaria bem, você não podia ter feito o que fez
— ele disse, irritado, a sua respiração acelerou. Ele se levantou da cadeira, passando a mão pela
barba que estava boa para ser feita.
— Foi instintivo. Eu não tinha que estar viva.
— Não fale bobagens — ele falou, voltando a sentar e pegar a minha mão, levando-a em
seu peito. — Você ficou entre a vida e a morte por alguns dias. Eu achei que ia te perder. — A
sua voz saiu embargada.
— Eu ainda estou aqui. — Forcei um sorriso.
Ele confirmou com a cabeça várias vezes e beijou a minha mão com força e voracidade
enquanto o seu rosto se banhava em lágrimas. Eu nunca tinha o visto chorar.
— Eu não sei como te agradecer por estar aqui agora comigo e por… — comecei a falar,
mas ele me interrompeu, colocando o dedo indicador nos meus lábios.
— Eu sou o seu marido, Beatrice, eu vou ficar com você para sempre e nunca mais viverei
esse pesadelo. Eu fiquei apavorado.
— Não sente raiva de mim ou dos meus pais? — quis saber, levando a minha mão até o
meu peito, onde eu poderia sentir as batidas do coração.
Um soluço escapou da sua boca, ele chorava como uma criança carente por colo.
— Perdão, eu nunca quis tirar tudo de você e, se eu pudesse voltar no tempo, se eu pudesse
fazer algo para que você tivesse a sua família aqui com você… — Ele se levanta arrastando a
cadeira para trás com violência e me beijou.
— Pare, pare, Beatrice — ele diz com seus lábios colados aos meus. — Eu te amo. — As
suas palavras fizeram o meu coração disparar, o som do marcapasso ecoou em meus ouvidos.
— Se acalme, o seu coração acelerou — ele disse com um sorriso, mas eu ainda me sentia
culpada e isso estava nos meus olhos. Ele puxou o ar com força para os pulmões, os soltando em
seguida. — Pare de me olhar assim, Beatrice. Você não é culpada. Eu amava a Anna, MUITO —
enfatizou. — Ela não morreu por sua culpa, o culpado fui eu, os meus sentimentos por ela a
mataram. Meu pai a mataria independente se fosse para doar ou não o coração, era o que ele
queria fazer.
Eu voltei a colocar a mão sobre o seu peito.
— Uma parte dela vive em você. A minha filha vive, tendo sido acalentada por você. Você
me devolveu a vida e agora está carregando a minha semente — ele disse, colocando a mão
sobre o meu ventre. — Você não me tirou nada, você me devolveu tudo e ainda me deu mais do
que eu merecia. Nunca mais me olhe com culpa.
— Uma semente? — indaguei, confusa.
— Sim, vamos ser papais. — Ele sorriu e voltou a me beijar.
Não foi possível conter as lágrimas de banharem o meu rosto.
— A nossa família vai crescer — ele disse, acariciando os meus cabelos.
— Eu te amo! Muito mais do que achei que fosse capaz.
Eu não sei exatamente quando eu descobri que o amava, mas lembro do exato segundo em
que o meu coração disparou e perdeu o compasso. Eu poderia dizer que foi nosso primeiro beijo,
mas não, foi no exato segundo em que os meus olhos o viram em pé, escorado sobre um balcão
de uma boate, me tocando de forma libertina. Naquele segundo, convenci a mim mesma que o
meu coração acelerou por medo e segui me enganando por longos dias.
— Atrapalho os pombinhos? — Lorenzo entrou no quarto.
— Não, aliás, sim — Vincenzo respondeu com um sorriso.
— Que bom que acordou, cunhada, chamarei a Nina para te ver, os seus pais estão
ansiosos, e a Giulia, então, nem se fala.
— Sim, faça isso, a chame, eu quero a minha esposa de alta — Vincenzo falou, Lorenzo
nos deixou sozinho e vai procurar por Nina.
— Eu também estou louca para ver os meus pais e a Giulia. Você já contou a ela sobre ser
o pai dela?
— Ainda não, estou esperando você me ajudar com isso — ele disse, beijando a minha
testa e, em seguida, ficamos esperando a Nina, conversando e planejando os nossos próximos
passos.

***
— Estou ansiosa para ver a minha pipoquinha — disse, sentada ao lado de Vincenzo na
nossa sala de estar.
— Como a chamou? — Ele estreitou os olhos e me encarou.
— Pipoquinha? Por quê? — Sorri, e ele também sorriu, mordendo os lábios de forma linda
e sexy.
— Por nada. — Ele me deu um beijo suave nos lábios.
Em poucos minutos, ela entrou saltitante pela sala, acompanhada dos meus pais e do meu
irmão.
— Trice — ela gritou, correndo para os meus braços. — Papà, vem, vem. — Ela correu
em direção ao meu pai e vi o brilho nos olhos de Vincenzo se apagar.
— Estou indo, boneca. — Ele se aproximou e me beijou a testa.
— Não vai falar comigo, Giulia? Você se foi há três dias, eu estive com muitas saudades.
— Vincenzo abriu os braços, esperando por um abraço, que logo foi pago. Giulia envolveu o
pescoço dele com seus bracinhos.
— Eu também senti saudades. Eu vou poder ficar? — ela perguntou, se sentando no colo
dele.
— Claro que vai, aqui é a sua casa — ele respondeu como se fosse óbvio.
— Eu tenho duas casas agora? — Ela riu divertida.
A minha mãe se sentou ao meu lado, e o meu irmão aproximou-se para me cumprimentar.
As coisas pareciam tranquilas entre Vincenzo e eles, e isso me tranquilizava também.

Vincenzo Ferrari

Enquanto Beatrice conversava com a mãe e me afastei, sendo acompanhado pelo meu
sogro e cunhado, Lorenzo se juntou em seguida e exibia com satisfação a aliança de noivado.
— Preciso reorganizar as coisas na Rússia, não vou perder o controle das coisas por lá. —
As minhas palavras foram quase uma intimação para que o pai de Beatrice resolvesse a fusão
com a empresa dos sogros.
— Já estou em negociação, fundiremos as empresas, eles entenderam que essa é a única
opção — respondeu, e eu sorri com satisfação.
— Então parece que tudo está bem encaminhando, não precisarei seguir com os planos
antigos, todos resolveram colaborar, e isso é bom. Amanhã levantarei um líder para ficar
exclusivo no território russo, manteremos a liderança por lá. E sobre você Luigi, quero que seja o
meu novo consigliere.
— Eu? — ele indagou, surpreso.
— Sim, você. Além de Lorenzo, não existe outro em que eu confie mais nesse momento.
— Mas eu, não sei, eu… — ele falou, hesitante, e eu o interrompi.
— Está mais envolvido nisso do que imagina, cunhado, sempre estiveram. Somos uma
famiglia — comentei, abraçando-o.
— Eu aceito — ele disse, me deixando muito satisfeito.
— Está no seu sangue, cunhado, eu sempre notei isso. Quanto a você, Lorenzo, não pense
em passar mais que três dias de lua de mel — o alertei com um sorriso divertido.
— Sério que o meu padrinho só vai me dar três dias de folga?
— Padrinho?
— Claro, você e a minha cunhada. Quem mais seriam?
— Eu quero que você seja imensamente feliz e que esqueça tudo que eu te disse sobre
sentimentos. Ame-a muito — disse em um abraço.
— Obrigado, irmão, eu já a amo.
Eu nunca vi Lorenzo tão feliz, éramos só nós dois, um cuidando do outro. Eu o amava
muito, mesmo que, muitas vezes, eu precisasse se rude e impor a hierarquia. Mesmo com tudo,
magoado, zangado, irritado comigo, era só eu precisar dele que ele estava lá para mim, por mim.
45
Aceito seu amor com honra e gratidão

Vincenzo Ferrari

Era final de tarde e Giulia me convenceu que deveríamos acampar em nosso jardim, eu não
pude negar, e Beatrice parecia tão empolgada quanto ela. Duas meninas lindas, tentando armar
uma barraca de acampamento. Era óbvio que eu me lembrava da Anna quando olhava para
Giulia, do quando ela desejou ver o rostinho da nossa filha, mas eu precisava viver, eu precisava
seguir, e eu estava fazendo isso com os meus olhos cravados aos de Beatrice. Eu a amo tanto
quanto amei a Anna.
— Você precisa nos ajudar — Beatrice gritou depois de tentar pela milésima vez armar a
barraca.
— Eu estou indo. — Caminhei na direção dela. — É tudo de encaixe, você precisa apenas
apertar bem, aí, não vai soltar — disse, montando em poucos minutos.
— Eu ainda não posso usar bem esse braço, de onde arrumaria forças? — brincou, me
respondendo.
— Me chame para tudo, meu amor, eu terei prazer em abrir até um pote na cozinha para
você. — Dei vários beijos em seu rosto.
— Olha isso, Trice, eu vou plantar — Giulia falou com as mãos enfiadas em um vaso
cheio de terra que ela encontrou próximo às árvores.
— Já sabe que semente vai colocar? — Beatrice grita de onde estamos, mas Giulia estava
concentrada naquilo que estava fazendo com a terra, como se não houvesse nada mais importante
no mundo.
De repente, ela olhou para cima e avistou um pássaro que voava nos céus. Com um sorriso
contagiante, ela soltou o vaso e começou a correr atrás dele, com suas perninhas finas, como se
estivesse em uma caçada frenética. Nós dois rimos ao vê-la correndo e gritando atrás do pássaro,
ela estava se divertindo e sentindo-se livre. Era assim que eu queria que ela se sentisse, livre e
uma criança normal, algo que eu nunca pude ser.
Ela finalmente desistiu de tentar alcançar o pássaro e sentou-se na grama, ofegante. O
mundo poderia estar repleto de problemas, mas, naquele momento, tudo parecia ser um paraíso,
ela nos contagiava com suas brincadeiras fofas e inocentes.
— Quando vamos contar para ela sobre ela ser promovida a irmã mais velha? — Beatrice
perguntou, alisando o próprio ventre.
— Eu estou pronto para ouvi-la me chamar de pai.
Giulia correu e se sentou entre nós, parecia um bom momento para contar que sou o pai
dela, e eu estava nervoso, nunca estive em uma situação parecida antes.
— Giulia — Beatrice começou a falar, e meu corpo estremeceu —, você ainda é um
brotinho de feijão.
— De rosa, sou um broto de rosa — Giulia a corrigiu.
— Sim, mas, ainda assim, é um brotinho lindo e que eu amo. Talvez você não entenda o
que vou te contar agora, mas eu acho que é uma boa hora para te falar.
— Trice, eu já sou grande, me conte tudo. — Nós dois rimos quando ela se levantou e
colocou as mãos no queixo, nos encarando séria.
— Faz pouco tempo que o papà te falou que você tinha outro papà e que você chegou a
nossa família porque precisava de um lar, pois o seu papà estava fazendo uma viagem longa,
você lembra?
Ela olhou confusa, com o olhar triste.
— Você vai me mandar para longe, Trice?
— Claro que não, minha pipoquinha. Venha aqui, se sente no meu colo. — Beatrice abriu
os braços, e ela se sentou, se aninhando em seu colo. — O seu papà voltou, e ele te ama muito,
não vai te levar para longe, ficará com você, e você terá dois papà.
— Como ele é? Você acha que ele vai gostar de mim?
— Quem no mundo não gosta de você?
Beatrice me olhou, e eu senti que dali em diante seria comigo.
— Giulia, você ficaria feliz se eu fosse o seu papà? — indaguei com a voz trêmula.
Ela se pôs de pé em um salto e sorriu.
— Você quer que eu seja o seu papà? — perguntei, ansioso pela resposta, mas ela não
falou nada, apenas se jogou em meus braços e beijou várias vezes o meu rosto.
— Você está de castigo, me deixou muito tempo esperando — ela disse, de pé, com as
mãos na cintura. E nós dois rimos. — A Trice será a minha mamma? — quis saber com os olhos
brilhando.
— Sim, ela será a sua mamma, e ainda vai te dar um irmãozinho.
— Um irmãozinho? Onde ele está? — Ela olhou para os lados, procurando. — Bem aqui.
— Coloquei a sua mãozinha sobre o ventre de Beatrice.
— Cabe um bebê aí dentro? — ele perguntou, confusa, e voltamos a rir da sua fofura.
— Sim, cabe até mais de um aqui dentro, nós cuidaremos dele para quando ele sair, brincar
muito com você.
No momento, eu me sentia satisfeito. Giulia ainda era muito jovem para compreender o
peso das palavras que lhe foram ditas hoje, então, eu não exigia muito dela. Tudo o que eu queria
era que ela soubesse que eu sou o pai dela e que a ouvisse me chamar de "papà". Tínhamos um
longo caminho pela frente e muitos porquês ainda surgiram, afinal, ela não era uma criança
comum, e eu não era um homem comum. Não podia proporcionar a ela uma vida normal, mas
estava disposto a protegê-la de tudo. Havia um longo caminho a percorrer, mas eu estava pronto
para enfrentar tudo o que surgisse.
***

Beatrice Marino

O sol brilhava forte naquele dia de verão e o jardim estava florido e perfumado. Os
pássaros cantavam e um leve vento soprava, trazendo consigo o aroma das flores.
Eu estava no altar, Vincenzo envolvia a minha cintura com os seus braços, e Nina e
Lorenzo estavam radiantes, em pé diante do cerimonialista. A cerimônia foi simples, tinha
apenas os pais da Nina, os meus pais e alguns líderes de confiança. Lembrei-me do dia do meu
casamento. Como eu queria que naquele dia o meu sorriso fosse tão gracioso quanto o de Nina
que sorria enquanto Lorenzo colocou o anel em seu dedo e a emoção que vi em seu rosto quando
foi dito pela primeira vez o seu nome de casada: Nina Ferrari.
Depois de uma breve cerimônia, o casal caminhou de mãos dadas em direção à festa, onde
um banquete estava preparado. Começaram a dançar e a rir enquanto a música tocava suave ao
fundo.
— E se relembramos a nossa lua de mel? — perguntei a Vincenzo com um ar sugestivo.
— Minha esposa, como está ousada! — Ele umedeceu os lábios, me encarando com
desejo. — Estou prestes a te agarrar aqui, na frente todos — sussurrou em meu ouvido com uma
voz sexy e rouca.
— O que te impede de me arrastar para algum dos quartos e me fazer sua — quis saber,
passando a minha língua em seus lábios.
Ele sorriu, passando a mão na barba, estava hesitante, o que não é do seu feitio.
— O que foi? Eu estava apenas brincando, podemos fazer isso em outro momento, depois
que a festa de casamento acabar.
— Você me deixou excitado. Vem! — ele disse, puxando a minha cintura.
— Vincenzo, Vincenzo? — Os gritos de Lorenzo nos alcançaram antes de darmos cinco
passos à frente, mas o meu marido não parecia querer virar para saber o motivo de tanto
chamados.
— Agora não, Lorenzo — avisou, gesticulando com as mãos.
— Vincenzo, é agora entendeu? Aonde, você vai? — Virei-me para encarar Lorenzo, que
nos olhava confuso.
— Agora? O quê? — Pensei que talvez a noiva fosse jogar o buquê ou que fosse acontecer
algum brinde especial.
Vincenzo suspirou derrotado e pressionou levemente a sua intimidade, que antes estava
ereta.
— Meu amor, guarde esse fogo um pouco mais, em breve, vou te jogar contra a parede e te
foder de uma forma deliciosa — murmurou em meu ouvido enquanto me direcionou a pista de
dança onde Nina me entregou o seu buquê.
— O que está acontecendo? — indaguei, confusa.
— Quer casar comigo de novo? — Vincenzo sussurrou em meu ouvido.
— E se eu disser não dessa vez? — brinquei.
— Eu te arrasto até o altar novamente e te prendo a minha vida e nunca mais te solto. —
Ele me abraçou apertado.
Giulia levantou uma placa escrita “Diga sim ao papà”.
— Case-se comigo novamente — ele pediu novamente com um olhar aflito, como se
houvesse chances de eu falar outra coisa que não fosse sim.
— Claro que eu me caso.
E lá estávamos nós caminhando de braços dados, aproveitando a decoração da cerimônia
de Nina e Lorenzo. Ele me deixou onde começava o imenso tapete vermelho e caminhou sozinho
até o altar, o meu sorriso estava radiante. O meu pai parou ao meu lado e caminhamos juntos até
Vincenzo, que tinha os olhos marejados de lágrimas. Giulia havia saído do seu lugar e andava na
nossa frente, jogando flores pelo caminho. “Muito fofa a minha menina”.
— Cuide bem da minha princesa — disse o meu pai ao me entregar.
— Mais do que a minha própria vida — ele respondeu com um sorriso.
— Hoje estamos aqui para celebrar o amor e a união de Vincenzo Ferrari e Beatrice
Ferrari. Eles têm sido um testemunho vivo de como o amor pode superar tudo, e agora, após
algum tempo casados, eles estão renovando seus votos em frente a todos os amigos e familiares.
O noivo tem algo a dizer.
Vincenzo sorriu, parecia tímido enquanto pegava o microfone.
— Beatrice, hoje, aqui, diante de todos, juro ser fiel a você, mesmo que os negócios da
máfia me tirem de casa por longos períodos. Prometo protegê-la sempre e manter sua segurança
e a dos nossos filhos como minha prioridade, assim como protejo meus negócios. Aceito seu
amor com honra e gratidão, e sempre a tratarei como a bela rainha que você é. Serei sempre o seu
amigo e companheiro leal. Honrarei você e seus valores, e sempre os colocarei em primeiro
lugar. Eu te amo. — Ele me beijou suave, selando em nossos corações aquele momento.
Trocamos olhares admirados e sorrisos, e eu ouvi suspiros das pessoas ao redor. Todos que
amo estavam presentes, e eu estava feliz e dizendo sim pela segunda vez ao homem que eu amo.
Epílogo
Vincenzo Ferrari

Três anos depois…

Não é comum nevar em Florença e me lembro da última vez que disse essa frase. Fazia
frio, um que ia além dos termômetros, e foi exatamente no dia em que o meu coração congelou.
Mas hoje a neve cai delicadamente do céu e eu estou aquecido não pelas roupas e as luvas que
visto, nem mesmo por estar aninhando em frente a uma lareira, eu brincava na neve com a minha
família, e isso fez o meu coração se aquecer de novo.
— Papà, ele parece com você. — Giulia gargalhou enquanto fazíamos um boneco de neve
em nosso jardim.
— Jura? Você acha que o meu nariz é grande assim? — indaguei, carrancudo, apontando
para a imensa cenoura que compunha a face do boneco.
— Talvez fique melhor se tirar só um pedaço. — Ela saltou para alcançar o legume.
— O que você acha, Enzo, ele se parece com o papà? — O meu pequeno sorriu e caiu,
depois de ser acertado por uma bola de neve jogada por Giulia.
— Ah, então é guerra? Meninos contra meninas — eu disse, acertando Beatrice com uma
bola e, em seguida, todos estávamos correndo um do outro.
— Podemos nos juntar? — Lorenzo falou, chegando com Nina, que está grávida do
primeiro filho deles.
— Acho que não vou participar, estou pesada — ela retrucou.
— Deveríamos todos entrar e tomar um chocolate-quente, Nina não pode brincar, vamos
fazer companhia a ela — disse Beatrice, e todos concordamos.
Beatrice se enrolou em um cobertor vermelho brilhante assim que entramos, e uma
funcionária trouxe uma xícara de chá fumegante para ela e colocou em cima da mesinha de
centro, em seguida, ela trouxe xícaras com chocolate-quente e alguns biscoitos. As crianças
ficaram sentadas no tapete macio em frente à lareira, brincando com seus brinquedos e
conversando animadamente. O som crepitante da lenha queimando nos deu uma atmosfera calma
e acolhedora.
Nos sentamos todos juntos, conversando e relembrando histórias enquanto desfrutamos
aquele tempo juntos. Não era tão comum tantas horas de paz, os deveres muitas vezes nos
privavam de momentos assim, então nos reuníamos sempre que possível.
No fim da noite, eu e Beatrice já havíamos colocado as crianças para dormir e nos
aquecíamos com os nossos corpos deitados no sofá da varanda, enrolados. De longe, se alguém
pudesse nos ver, diria se tratar de apenas uma pessoa. Embora eu já não sentisse o luto como
antes, eu sentia prazer em às vezes encostar o meu ouvido em seu peito e ouvir o seu coração
bater, era acolhedor, reconfortante.
— Obrigado por tudo, Vincenzo — ela disse depois de um longo silêncio em que
apreciávamos apenas a nossa companhia.
Eu a encarei por alguns segundos e desenhei o seu rosto com o meu dedo indicador, ela
fechou os olhos e sorriu, as minhas mãos desceram, explorando seu corpo maravilhoso. Minhas
mãos acariciavam sua pele macia, enquanto eu beijava seus lábios com paixão e desejo. Foi
como se o tempo tivesse parado e apenas nós dois existíssemos naquele mundo de prazer e
desejo.
De repente, ela segurou meu rosto em suas mãos, olhou profundamente em meus olhos e
disse: “Eu te amo, em mim bate um coração que sempre te amou”. Foi como se todas as palavras
do mundo não fossem suficientes para descrever o que eu estava sentindo naquele momento. Eu
sabia que ela era a mulher da vida e que eu faria tudo por ela.
Nós nos entregamos ao prazer um do outro, estávamos em perfeita sintonia, conectados em
todos os sentidos possíveis. Eu não sou um homem bom, mas eu sempre serei o melhor de mim
para ela.

FIM.
Agradecimentos
Eu gostaria de expressar minha sincera gratidão a todos que colaboraram, de forma direta e
indireta, para tornar possível o lançamento deste livro. Dedico uma menção especial à Letícia
Ribas a minha maravilhada beta e Joyce da assessoria Fênix, que cuidaram com esmero e
profissionalismo de cada etapa do lançamento deste livro. Por fim, quero agradecer às minhas
leitoras por terem embarcado comigo nesta história.

[1]
Bela menina.
[2]
Garotinha.
[3]
Acalme-se.
[4]
Fale depressa.
[5]
Meu amigo.
[6]
Filho da puta.
[7]
Irmão.
[8]
Senhor.
[9]
Garota.
[10]
Bom dia.
[11]
Oh, meu Deus!

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