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Professora Me. Laís Azevedo Fialho
APRESENTAÇÃO
Plano de Estudo:
• Mitos - Sentidos e significações, algumas conceituações do termo.
• Mitos Cosmogônicos e Mitos de Origem, definições e disputas.
• Os mitos e as possibilidades de abordagens teórico-metodológicas na pesquisa e
docência.
• Mitos Afro-brasileiros e Indígenas no âmbito escolar.
Objetivos de Aprendizagem:
• Estabelecer as disputas conceituais em torno dos mitos cosmogônico e os mitos de
origem, bem como de suas funções e estruturas.
• Identificar os tipos de mitos conceituados no campo de estudo das religiões e
religiosidades.
• Apresentar as possibilidades de abordagens teórico metodológicas das mitologias na
pesquisa científica e docência.
• Conceituar e contextualizar algumas narrativas mitológicas que fazem parte da cultura
brasileira.
INTRODUÇÃO
Bons estudos!
1 MITOS - SENTIDOS E SIGNIFICAÇÕES, ALGUMAS CONCEITUAÇÕES DO
TERMO
No presente tópico buscamos refletir sobre os estudos dos mitos nas Ciências
Humanas e os múltiplos sentidos e significações para esse conceito. Mais do que
elaborar um panorama da historiografia especializada, sistematizamos diversas
abordagens, produzidas em diferentes tempos, espaços e culturas. Iremos explorar
algumas correntes teóricas passando por pesquisadores conceituados do tema, que
balizam até o presente momento as noções conceituais de mito. O filósofo Ernst
Cassirer, autor clássico desse objeto, explica que a noção de linguagem é considerada
um dos primeiros modos de representação e comunicação entre os seres humanos no
período pré-histórico. A pintura e a gravura seriam tidas, em seguida, como modos de
fixar essas representações. Por conseguinte, o mito passa a ser componente da
relação entre o homem com o meio social.
SAIBA MAIS
“As narrativas da criação de Pandora e de Eva têm como elemento central a produção
de um corpo. Mas, se a carne é o traço significativo para a compreensão do corpo da
mulher na narrativa cristã, o mesmo não acontece na narrativa hesiódica. Nesta, o
corpo da mulher não é criado, mas fabricado, e, para sermos precisos, é fabricado sob
encomenda por Zeus, a fim de ‘presentear’ os homens. Esse corpo vem do barro, é
moldado como a argila por um artesão habilidoso. O fato das duas narrativas
enfatizarem o surgimento de um corpo para fundamentar a existência de dois seres - o
homem e a mulher - levanta a questão da relação entre corpo e gênero”.
Fonte: Ilva e Andrade (2009, s.p.)
#SAIBA MAIS#
REFLITA
Caro(a) estudante, você já havia parado para refletir sobre a herança grega no uso
habitual da palavra mito como sinônimo de mentira? É comum dizer que algo é um mito
quando na verdade se quer dizer que algo é uma fábula ou uma invenção. Quando
estudamos história compreendemos um pouco mais sobre a bagagem histórica das
palavras.
#REFLITA #
2 MITOS COSMOGÔNICOS E MITOS DE ORIGEM, DEFINIÇÕES E DISPUTAS.
O mundo foi criado por Olorum e sua mulher Olocum. Eles tinham
a mesma idade. Da união de Olocum com Aiê, a Terra, nasceu
Iemanjá. Da união de Iemanjá e Aganju nasceram os outros
deuses (PRANDI, 2001, p. 403)
Conforme Eliade (1972), a mitologia grega localiza esse evento como ocorrido
em um tempo mítico, período em que as forças celestes e telúricas se encontram pela
primeira vez e constituem as primeiras criaturas viventes. Assim, para o mitólogo, a
cosmogonia é anterior ao tempo, anterior a tudo, pois é exatamente o momento em que
uma realidade passa a existir.
Para exemplificar sobre a estrutura dos mitos cosmogônicos utilizando mitos de
outras culturas, elencamos a mitologia nórdica. Os mitos cosmogônicos nórdicos,
relatados no Poema Voluspá da Edda Poética, contam que no princípio não havia nada
além de um enorme abismo mágico e duas regiões isoladas. A primeira dela, Niflheimr,
era representada pelo gelo e a neblina e relacionada ao mundo dos mortos de onde
corriam 11 rios, a segunda, Múspel, era representada como a claridade e a luz, era
também protegida pelo gigante Surtr. Quando o gelo de de Niflheimr derreteu devido ao
calor de Múspel emergiu o grande Ymire, a vaca nutridora Auðhumla. Ao passo que o
animal lambia o gelo nasciam três seres: Oðinn, Vile e Vé. Eles exterminaram o gigante
Ymirque, ao sangrar demais, causou o afogamento de todos os gigantes. Apenas um
deles escapou da morte, acompanhado de sua mulher, no entanto seu corpo
desmembrado passou a constituir toda a estrutura do universo. “De sua carne
formaram a terra, seus ossos deram origem aos rochedos, de seus cabelos foram
formadas as nuvens; do sangue derramado surgiu o mar e do seu crânio o firmamento”
(LANGER, 2009, p. 133). A narrativa é comparada por alguns historiadores ao mito
bíblico da origem do Universo, registrado no livro de Gêneses. A narrativa conta que no
princípio não havia nada, só o verbo que era Deus, e todas as coisas se formaram em
sete dias, a partir da sua palavra.
Ainda cabe destacar que mitos cosmogônicos que se baseiam no suplício pelo
esquartejamento do corpo de um gigante em um tempo mítico, para origem do céu,
terra, montanhas, rios e mares são identificados em outras culturas. Um exemplo é o
Rigveda da Índia antiga, na figura de Purusa (Homem primordial), nos mitos de Tiamat
e de P’na-ku (ELIADE, 1972). Essa postura analítica que busca encontrar estruturas
comuns em narrativas mitológicas de culturas diferentes é uma abordagem
metodológica encontrada nas mitologias comparadas, amplamente utilizada por
historiadores e cientistas das Religiões da contemporaneidade, como Cruz (2007, p. 2),
para quem:
REFLITA
“A história é nosso mito”, “combina o ‘pensável’ e a origem, de acordo com o modo pelo
qual uma sociedade se compreende”.
Fonte: Certeau (1982, p. 33)
#REFLITA#
3 OS MITOS E A HISTÓRIA CULTURAL, POSSIBILIDADES DE ABORDAGENS
METODOLÓGICAS
[...] é o poder em si, ela tem tudo dentro de seu ser. Ela pode
tudo. Ela é um ser autossuficiente, ela não precisa de ninguém, é
um ser redondo primordial, esférico, contendo todas as oposições
dentro de si. Elas são andróginas, elas têm em si o bem e o mal.
[...] Elas têm a feitiçaria, antifeitiçaria, elas têm absolutamente
tudo.
O antropólogo Pierre Verger (1994, p. 16) aponta que “na região ioruba, as
atividades das feiticeiras [Iá Mi Oxorongá] ligam-se aos orixás, e aos mitos da criação
do mundo”. Ou seja, o grande criador do mundo só existe porque elas sempre
existiram. Podemos conjecturar que muitas dessas noções ontológicas e cosmológicas
da mitologia ioruba foram apagadas na difusão cultural para dar lugar ao masculino,
por influência das disputas e hierarquizações de gênero que privilegiam a cultura
patriarcal. Do mesmo modo, a retomada das narrativas mitológicas que atribuem
grande importância ao feminino deve-se às disputas de conferir maior importância à
mulher na sociedade contemporânea. Não só o papel desempenhado pelas Iá Mi na
mitologia, mas também das guerreiras Obá, Oxum e Iansã, por exemplo, o feminino é
associado à fertilidade, força, astúcia e independência. Iansã é definida como aquela
que, além de lutadora aguerrida, é capaz de se disfarçar de animais e comandar
tempestades. De acordo com os mitos, ela é a grande guerreira que comanda os
ventos: “É livre e violenta como a tempestade que ela comanda” (AUGRAS, 1983, p.
150).
Mitos como “Oiá recebe o nome de Iansã, mãe dos nove filhos (PRANDI, 2001,
p. 294), “Oiá transforma-se num búfalo” (PRANDI, 2001, p. 297), “Oiá é disputada por
Xangô e Ogum” (PRANDI, 2001, p. 307) demonstram o feminino associado a aspectos
como poder, transformação e fertilidade. Isso se dá porque, na organização social
ioruba, as mulheres desempenhavam diversas funções na vida pública, dividindo
espaços de poder com os homens (VERGER, 2002). Elucidar esses valores
socioculturais e políticos presentes na sociedade ioruba nos auxilia a compreender
melhor a respeitável posição feminina na mitologia dos orixás. Tais aspectos, diferente
dos sentidos atribuídos às representações judaico-cristãs, como o mito da Mãe de
Jesus, não são associadas somente à virgindade, pureza ou submissão.
Os mitos narrados em uma cultura correspondem ao que ela considera
pertinente à vida, em um tempo e espaço específicos e em sua roupagem, portanto,
condizente ao ambiente e à condição histórica. Eles aparelham questões universais no
tocante à existência humana e influenciam a vida de todos, legando procedimentos
para um bom viver. A mitologia se apresenta por meio de narrativas que se articulam
entre si e que se repetem ao longo dos tempos, fornecendo símbolos à humanidade.
Servem de metáforas para as preocupações e anseios humanos (CAMPBELL;
MOYERS, 1990).
A História Cultural tem sido um terreno fecundo para o estudo das mitologias na
contemporaneidade. Esse campo da história objetiva reconhecer a maneira como, em
diferentes espaços e temporalidades, certa realidade social é produzida, observada,
dada a ler. Nesse contexto, se inserem as representações sociais. Podemos conceber
uma história cultural que “tome por objetivo a compreensão das representações do
mundo social, que o descrevem como pensam que ele é ou como gostariam que fosse”
(CHARTIER, 1990, p. 19).
As representações são dispostas de acordo com as orientações dos grupos
sociais que as concebem e com suas visões de mundo. Elas são manifestadas por
padrões, normas, instituições e imagens. Constituem-se em objetos capazes de
substituir na memória o outro ausente, ao mesmo tempo que revelam sua presença
como a apresentação pública de algo ou alguém (CHARTIER, 1990).
As narrativas mitológicas são tomadas pelos historiadores das religiões como
fonte para identificar questões fundamentais de uma cultura. Não somente por ser um
resultado de reflexos sociais, mas também para compreensão sobre como elas podem
ser compreendidas e ressignificadas em seu tempo histórico. Ou seja, a roupagem que
uma mitologia assume em um tempo, espaço e cultura definida indica uma perspectiva
de verossimilhança, efeito de real e encarnam noções de imaginários possíveis das
divindades e seu caráter, por exemplo. É o que Sandra Pesavento (2006, s.p.)
denomina como verdade do simbólico.
A pesquisadora Malandra (2015) afirma que a função dos mitos não é somente
outorgar uma sequência de fatos explicativos do começo do cosmos e da sociedade,
mas oferecer um contexto harmonioso e significativo que justifique as circunstâncias do
presente. Conforme a autora, o mito opera como lição alegórica e como aviso que
determina uma conduta adequada. Para demonstrar isso, ela cita diversas narrativas,
inclusive a do Jardim do Éden, na qual se sublinha a liberdade do ser humano em
escolher comportar-se de forma desarmoniosa relativamente à criação original. Em sua
visão, esses mitos funcionam tal qual uma telenovela divina, em que as ações
harmoniosas e desarmoniosas entre deuses servem de metáfora para as razões que
explicam certos eventos da esfera mundana.
Ainda sobre as funções dos mitos, passamos ao mitólogo Campbell (1990), que
as sistematiza em quatro principais. São elas: a Função Mística ou Metafísica, a
Função Cosmológica, a Função Sociológica e a Função Psicológica ou Pedagógica. A
primeira designa a função religiosa da mitologia, que desperta na psique humana um
sentimento de assombro.
Quer concebamos a mitologia em termos da afirmação do mundo
como ele é, da negação do mundo como ele é ou da restauração
do mundo ao que deve ser, a primeira função da mitologia é de
despertar na mente um sentimento de assombro perante essa
situação mediante uma entre três formas de participar dela:
exteriorizando, interiorizando ou efetuando uma correção
(CAMPBELL, 1990, p. 18).
O mito permite entender que o mundo, o homem e a vida têm todos uma origem
e uma história e que é através dele que dado indivíduo pode sair da
contemporaneidade, do tempo cronológico e introduzir-se no tempo primordial, vivendo
e experienciando pela primeira vez um certo evento. Essa história transforma-se,
assim, em algo relevante e inspirador. Para apresentar ainda outra perspectiva teórica
sobre as funções dos mitos convocamos Bronislaw Malinowski (apud CRIPPA, 1975, p.
16), para quem:
SAIBA MAIS
Muitos historiadores utilizam o cinema como fonte histórica para pensar os mitos e as
suas funções na cultura. A obra fílmica tem sua legitimidade como fonte porque é uma
construção histórica e cultural, como texto passível de ser utilizado como instrumento
de compreensão de diversas questões. Além disso, o texto fílmico pode ser utilizado
como poderoso recurso didático-pedagógico para auxiliar na compreensão de
conceitos e ideias baseados em textos convencionais.
#SAIBA MAIS#
REFLITA
“Uma das características do mito é seu caráter muitas vezes liminal. Com isto
queremos dizer que o mito é de tal natureza que, sob o prisma destes conceitos, pode
mesmo justapô-los. O filme The Matrix pode ser um exemplo conhecido disto no qual,
em meio à uma série de motivos religiosos ao longo do filme, inclusive escatológicos, o
herói Neo repete o destino religioso do Cristo crucificado e inaugura uma nove era”.
Fonte: Rosário (2007, p. 9).
#REFLITA#
4 MITOS AFRO-BRASILEIROS E INDÍGENAS NA SALA DE AULA
Fonte: a autora.
SAIBA MAIS
“Com Mitologia dos orixás, Reginaldo Prandi apresenta a maior coleção de mitos
iorubanos e afro-americanos já publicada até hoje. Esta obra é resultado de um
trabalho meticuloso de mais de dez anos, que envolveu uma vasta pesquisa
bibliográfica (cerca de cem títulos) e também uma longa experiência de campo. Nada
menos do que 42 histórias míticas foram colhidas pelo autor. No total, Prandi conseguiu
reunir 301 mitos ¾ dos quais 106 seriam originários da África, 126 do Brasil e 69 de
Cuba”
Fonte: Hofbauer (2001, p. 251).
#SAIBA MAIS#
REFLITA
A intérprete Elza Soares gravou, em 2015, uma música intitulada Exu nas Escolas.
Existem alguns trabalhos que refletem sobre essa canção como uma reivindicação por
uma educação democrática, que considere todas as formas de crenças.
Contextualizando na crítica, por exemplo, a presença de símbolos como bíblias e
crucifixos judaicos cristãos em espaços públicos. Se o estado é laico e as escolas
públicas, um espaço de estudo da religião de modo não confessional, não seria
plausível considerar que houvesse representações materiais de todas as religiões?
#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caro(a) estudante, concluímos aqui a incursão sobre o estudo dos mitos,
proposto para a primeira unidade. Identificamos que existem diversos modos de se
pensar e viver o mito como uma realidade complexa, como uma história verdadeira que
funda o mundo e dá sentidos para ele. Compreendemos também que o mito de origem
pode ser compreendido como uma continuidade do mito cosmogônico.
No corpo desta unidade buscamos abordar diversas teorias e metodologias
utilizadas para a análise do mito. Desde as contribuições mais específicas para a o uso
das mitologias na historiografia, como Eliade (1972), Camplbell (1990) e Detienne
(2004) entre outros, a estudos mais específicos de mitos de diferentes culturas, como
Prandi (2001) e Jecupé (1998).
Abordamos também a importância de se pensar o mito na escola e, desse
modo, apreender e difundir um pouco mais sobre as múltiplas estruturas que sustentam
a cosmovisão de diferentes grupos culturais. Sobretudo, destacamos a importância do
estudo dos mitos Afro-brasileiros e Indígenas, bastante apagados na difusão cultural
em detrimento das narrativas europeias.
Com isso, concluímos nossa proposta inicial que foi estabelecer as disputas
conceituais em torno do mito, compreender os tipos de mitos conceituados no campo
de estudo das religiões e religiosidades e conceituar e contextualizar algumas
narrativas mitológicas que fazem parte da cultura brasileira.
Esperamos que, como esse conteúdo inicial, o tema suscite seu interesse e que
busque outras obras e autores que possibilitem o seu desenvolvimento intelectual e
uma formação sólida e singular. Bons estudos!
LEITURA COMPLEMENTAR
CAMPBELL, J.; MOYERS, B. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990.
JECUPÉ, K. W. A Terra dos mil povos: história indígena brasileira contada por um
índio. São Paulo: Editora Peirópolis, 1998.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & Literatura: uma velha-nova história, Nuevo
Mundo Mundos [Emlínea] Nuevos, Debates, 2006.
PRANDI, R. Mitologia dos orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
Plano de Estudo:
• Símbolos - Sentidos e significações, algumas conceituações do termo.
• Função social e religiosa dos símbolos na tradição religiosa.
• Os símbolos e as possibilidades de abordagens teórico-metodológicas na pesquisa
científica.
• O lugar e o papel dos símbolos no processo educativo laico.
Objetivos de Aprendizagem:
• Estabelecer as disputas conceituais em torno dos símbolos nas Ciência Humanas.
• Analisar de que modo tem sido sistematizado o estudo dos símbolos no campo das
religiões e religiosidades.
• Apresentar algumas possibilidades de abordagens teórico metodológicas para o uso
dos símbolos na pesquisa científica.
• Conceituar e contextualizar símbolos que fazem parte da cultura religiosa brasileira
demonstrando como explorá-los dentro de sala de aula.
INTRODUÇÃO
Bons estudos!
1 SÍMBOLOS SAGRADOS – SENTIDOS E SIGNIFICAÇÕES, ALGUMAS
CONCEITUAÇÕES DO TERMO
[...] o símbolo não somente torna o Mundo “aberto”, mas também ajuda
o homem religioso a alcançar o universal. Pois é graças aos símbolos
que o homem sai de sua situação particular e se “abre” para o geral e o
universal. Os símbolos despertam a experiência individual e
transmudam na em ato espiritual, em compreensão metafísica do
Mundo. […] Um símbolo religioso transmite sua mensagem mesmo
quando deixa de ser compreendido, conscientemente, em sua
totalidade, pois um símbolo dirige se ao ser humano integral, e não
apenas à sua inteligência (ELIADE, 1992, p. 101-102).
SAIBA MAIS
A cruz é um símbolo utilizado em todo o mundo de várias maneiras. O’Connell e Airey
(2010) falam da cruz como sendo um símbolo quase inseparável do cristianismo.
Conforme os pesquisadores, o primeiro registro de cruz data de 300.000 anos na
Alemanha, onde foram esculpidas em uma estatueta de mamute.
Fonte: O’Connell e Airey (2010).
#SAIBA MAIS#
REFLITA
Caro(a) estudante, você já havia parado para pensar que muitas religiões têm símbolos
vivos até os dias de hoje, e que são utilizadas no cotidiano dos seus adeptos? Do
mesmo modo que o crucifixo representa Jesus Cristo, um fio de contas pode
representar um orixá, cultuado nas Religiões Afro-brasileiras.
Fonte: a autora.
#REFLITA#
2 FUNÇÃO SOCIAL E RELIGIOSA DOS SÍMBOLOS NA TRADIÇÃO RELIGIOSA
Enquanto o signo não tem uma relação necessária com aquilo a que
aponta, o símbolo participa na realidade daquilo que representa. O
signo pode ser mudado arbitrariamente segundo as exigências do
momento. Mas o símbolo cresce e morre de acordo com a correlação
entre aquilo que é simbolizado e as pessoas que o recebem como um
símbolo. Assim, pois, o símbolo religioso, o símbolo que aponta para o
divino, só pode ser um símbolo verdadeiro se participa no poder do
divino para o qual aponta (TILLICH, 2001, p. 32).
Desse modo, a postura teórica do teólogo admite que toda afirmação objetiva
sobre Deus deve ser simbólica, considerando que uma afirmação objetiva é aquela que
utiliza um segmento da experiência finita para dizer algo sobre Deus. Significa que,
para o autor, o símbolo não pode ser equiparado ao sinal.
O teórico Pastro (2010) também postula que o símbolo é uma forma objetiva que
representa algo inalcançável, ou seja, é um signo em relação a outro objeto. O primeiro
não teria por si só um caráter sagrado, mas apontaria para um arquétipo primordial que
seria sacro. Para ele, através de imagens simbólicas, os sujeitos religiosos
interpretariam uma realidade sagrada, vide as funções que esse símbolo desempenha
em um sistema específico e pré definido.
Obs.: Cada cor representa uma divindade cultuada. O tipo de fio, a quantidade de contas, as
firmas e as voltas no pescoço também são designadas pela função religiosa do adepto.
Fonte: Oxalá (2013).
REFLITA
“É a forma que nos revela a natureza das coisas”.
Fonte: Casel (2009).
#REFLITA#
3 OS SÍMBOLOS E AS POSSIBILIDADES DE ABORDAGENS TEÓRICO-
METODOLÓGICAS NA PESQUISA CIENTÍFICA
REFLITA
Para Cassier (1994), o que diferencia os homens dos animais é a mediação simbólica
posta em prática como atividade do pensamento.
#REFLITA #
4 O LUGAR E O PAPEL DOS SÍMBOLOS NO PROCESSO EDUCATIVO LAICO
SAIBA MAIS
No período de 1500 a 1800, a educação religiosa foi desenvolvida como ensino da
religião oficial para ser utilizada na evangelização dos indígenas e catequese dos
negros, tudo era conforme os acordos estabelecidos entre o Sumo Pontífice e o
Monarca de Portugal. A aliança feita entre o Estado Português e a Igreja Católica
resultou no poder político, o rei detinha o poder espiritual sobre seus súditos, deles
exigia doações e taxas para a igreja, esquema que gerou a adesão ao Cristianismo,
instalando, assim, a Cristandade no Brasil.
Fonte: Almeida e Siqueira (2015).
#SAIBA MAIS#
REFLITA
No Brasil, é notório que o catolicismo é a religião historicamente majoritária, logo, tem
destaque e relevância cultural na religiosidade, todavia não quer dizer que as outras
religiões sejam menos importantes, pois participaram na formação da cultura da
sociedade brasileira.
Fonte:
#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS
● GAARDER, J.; HELLERN, V.; NOTAKER, H. O livro das religiões. São Paulo:
Companhia do Bolso, 2005.
● CARDITA, Â. O mistério, o rito e a fé: para uma recondução antropológica da
teologia litúrgica-sacramental. Lisboa: BOND, 2007.
● GERDES, P. Etnografia: Cultura e o despertar do pensamento geométrico. Belo
Horizonte, Boane / Moçambique: Instituto de tecnologias e de gestão (ISTEG), 2012
LIVRO
CAMPBELL, J.; MOYERS, B. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990.
O’CONNELL, M.; AIREY, R. O grande livro dos signos & símbolos. vol. I. São Paulo:
Escala, 2010.
OXALÁ, P. P. de. Fio de contas, uma aliança de fé. 2013. Disponível em:
https://extra.globo.com/noticias/religiao-e-fe/pai-paulo-de-oxala/fio-de-contas-uma-
alianca-de-fe-10720714.html
HISTÓRIAS DE/DA FÉ
Plano de Estudo:
Objetivos de Aprendizagem:
• Analisar de que modo tem sido sistematizado o estudo das histórias de fé no campo
das religiões e religiosidades.
• Apresentar e refletir sobre alguns espaços sagrados que fazem parte da cultura
religiosa brasileira demonstrando como deslocar tal tema para dentro da sala de aula.
INTRODUÇÃO
Bons estudos!
1 REFLEXÕES TEÓRICAS ACERCA DOS ESPAÇOS SAGRADOS
Tal como uma igreja constitui uma rotura de nível no espaço profano
de uma cidade moderna, o serviço religioso que se realiza no seu
interior marca uma rotura na duração temporal profana: já não é o
Tempo histórico atual que é presente –o tempo que é vivido, por
exemplo, nas ruas vizinhas –, mas o Tempo em que se
desenrolou a existência histórica de Jesus Cristo, o tempo santificado
por sua pregação, por sua paixão, por sua morte e ressurreição
(ELIADE, 1994, p. 39)
Para além dos lugares fixos e materiais que hospedam uma comunidade
religiosa, como templos, igrejas e terreiros, também podemos admitir que outos
espaços tornam-se sagrados e de agradecimentos por alguns momentos, que diferem
do seu habitual caráter profano, do cotidiano, tais como procissões e encruzilhadas.
Para contextualizar o primeiro exemplo, destacamos que a procissão inaugura outro
espaço no cenário urbano, o espaço sacralizado. Ruas e praças públicas tornam-se
locais de devoção e manifestação do sagrado graças a uma cuidadosa preparação
litúrgica.
Nas procissões, a partida é um centro físico e social de
autoridade e poder religioso: uma igreja. Seu roteiro, por outro
lado, marca uma área onde se sacraliza um dado espaço da
cidade que, por isso mesmo, acaba se tornando nobre ou
sagrado. É um espaço que deve ficar aberto ao ritual e, em
conseqüência, fechado às atividades de rotina do mundo diário
(DAMATTA, 1986)
SAIBA MAIS
#SAIBA MAIS#
REFLITA
Você já parou para pensar, caro(a) leitor, que alguns espaços são sagrados para
alguns grupos religosos e não para outros? Desse modo, a prática da alteridade e o
exercício do respeito são extremamentes necessárias para haver democraria e o o
direito pleno ao exercício da fé.
Fonte: a autora.
#REFLITA#
2 FUNÇÃO SOCIAL E RELIGIOSA DOS ESPAÇOS SAGRADOS E DE
AGRADECIMENTO NA TRADIÇÃO RELIGIOSA
SAIBA MAIS
Alguns teóricos, como Ricardo Luiz de Souza, pensam sobre alguns cultos à margem
da Igreja católica, a partir do conceito de catolicismo popular. “O catolicismo popular
carece de um estatuto próprio perante as práticas da Igreja, existindo, contudo, em
íntima interação com ela. Não a contesta, mas pode, eventualmente, adquirir um viés
nitidamente anticlerical. Não se opõem aos atributos do clero, mas cria seus próprios
atributos, e é organizado e praticado por leigos que buscam, em maior ou menor grau,
manter sua autonomia enquanto fiéis, ao mesmo tempo em que se declaram filhos da
Igreja”
#SAIBA MAIS#
REFLITA
#REFLITA#
3 CAMINHOS DE FÉ NO BRASIL E AS POSSIBILIDADES DE ABORDAGENS
TEÓRICO-METODOLÓGICAS NA PESQUISA CIENTÍFICA
10. MÉTODO ANALÍTICO: outro aspecto que a história das religiões pode
privilegiar é o exame das causas das manifestações religiosas, seu
contexto cultural, suas influências sobre outros acontecimentos etc.
Posto isso, partimos dessa noção de que existem diversos métodos para nosso
campo de atuação. Elencamos também de que o objeto material da história das
religiões é o conjunto dos fatos religiosos em si mesmos, ou comparados, enquanto
manifestações da cultura humana. Ou seja, o método pode ser descritivo, analítico ou
comparativo, como descrevemos acima.
12. Discussão sobre a tripla matriz religiosa brasileira, tendo como pano de
fundo a caricatura da matriz mestiça da religião e do sertanejo
apresentada por Euclides da Cunha em Os Sertões, bem como numa
leitura do texto clássico Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, até
abordagens sócio-antropológicas acerca do Sagrado Selvagem e o
conceito de sincretismo religioso.
13. Religiões no Brasil Colonial: análise das correntes teológicas na
sociedade colonial brasileira apontadas por Riolando Azzi: teologia da
conquista, teologia da conversão, teologia da escravidão, teologia da
inquisição, entre outras. Ao mesmo tempo, os principais aspectos e
seus conflitos apresentados nas análises de Laura de Mello e Souza e
Ronaldo Vainfas.
Esperamos que tenha sido uma boa leitura para você, que tenha se
familiarizado com ferramentas teóricas fundamentais e algumas bases bibliográficas
para pensar a complexidade que incide sobre as crenças, em especial no Brasil. Em
seguida, munidos dessas importantes noções, passaremos para algumas
considerações didático pedagógicas acerca do tema.
SAIBA MAIS
O Brasil é o maior país católico do mundo, mas, na última década, a Igreja teve uma
redução da ordem de 1,7 milhão de fiéis, um encolhimento de 12,2%. Os dados são
da nova etapa de divulgação do Censo de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Alguns teóricos compreendem esse fenômeno como fruto da
expansão das correntes evangélicas.
#SAIBA MAIS#
REFLITA
No Brasil do novo milênio, a ideia moderna de que o indivíduo, por seu livre arbítrio,
escolhe e opta por uma religião dentre outras conjuga-se agora com a capacidade
múltipla desse mesmo indivíduo de combinar dimensões as mais díspares, mas que
adquirem sentido na síntese, mais uma vez sincrética, que se faz no seu interior.
Partindo dessas premissas, caro(a) leitor, você poderá aprofundar seus estudos
e desenvolver seus métodos a partir de diretrizes e categorias teórico-metodológicas
validadas cientificamente. Com esses apontamentos é possível que você aborde a
questão dos espaços sagrados e das histórias da fé de modo ético, plural e instigante.
Você pode sondar em sua sala de aula qual é o interesse e as curiosidades dos
alunos nos temas religiosos, por exemplo. O que querem saber? O que gostariam de
perguntar a pessoas de diferentes religiões?
Todos os anos na segunda quinta-feira do mês de janeiro, após o dia de Reis, realiza-
se a Lavagem do Bonfim, na escadaria da igreja, onde baianas lavam com água de
cheiro e muita festa os seus degraus. Tudo começa com uma procissão desde a Igreja
de Nossa Senhora da Conceição da Praia, padroeira da Bahia, até ao Bonfim. Uma
grande massa humana acompanha a festa.
#SAIBA MAIS#
REFLITA
#REFLITA #
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, no tópico quarto trouxemos algumas discussões em torno dos métodos
e diretrizes para abordar espaços sagrados e as histórias da fé em sala de aula.
Indicamos que é fundamental assumir uma postura pedagógica que propõe a égide da
tolerância à todas as formas de manifestações de fé. Acenamos para a importância de
se compreender e passar adiante a noção de que vivemos em uma sociedade
pluralizada, com diferentes culturas e religiosidades. Destacamos que é papel do(a)
educador(a) defender que todas as práticas de fé e crenças devem ser respeitadas no
exercício da alteridade.
Ano: 2018
CAMURÇA, M. Entre sincretismos "guerras santas & quot: dinâmicas e linhas de força
do campo religioso brasileiro. Revista USP, n. 81, p. 173-185, 2009.
Plano de Estudo:
• Algumas reflexões teóricas sobre corpo e religião a partir da História Cultural em
diálogo com a Antropologia.
• Função social e religiosa dos ritos de iniciação e de passagem.
• Ritos Afro-brasileiros.
Objetivos de Aprendizagem:
• Estabelecer as disputas conceituais em torno dos ritos nas Ciência Humanas.
• Apresentar algumas reflexões teóricas sobre os ritos de iniciação e passagem a
partir das Histórias das Religiões e Religiosidades.
• Indicar algumas possibilidades de abordagens teórico metodológicas para a pesquisa
científica sobre os ritos.
• Apresentar e refletir sobre alguns ritos que fazem parte da cultura religiosa brasileira
demonstrando como deslocar tal tema para o âmbito escolar.
INTRODUÇÃO
Bons estudos!
1 ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE CORPO E RELIGIÃO A PARTIR DA
HISTÓRIA CULTURAL EM DIÁLOGO COM A ANTROPOLOGIA
Em diálogo com as ciências sociais podemos perceber uma atribuição cada vez
maior de espaço ao corpo e à sensibilidade. Algumas pesquisas com viés etnográfico
indicam as diferenças no modo como as culturas hierarquizam os sentidos e conferem
privilégio a certas experiências sensíveis. Outros trabalhos demonstram que é uma
tendência ocidental privilegiar outros modos de expressão que não o do corpo. Isso se
relaciona com a questão filosófica de que a existência não se manifestaria
necessariamente a partir do pensamento (Penso, logo existo/Sinto, logo existo)
(MELLOR; SHILLING, 1997).
Nesse sentido, existe um amplo campo de possibilidade para abordar o papel
da sensibilidade no aprendizado e na prática religiosa, que vai além de uma simples
descrição das experiências sensíveis produzidas nos rituais. Com aponta Rabelo
(2011, s.p.), “é preciso traçar os fios que conectam essas experiências a outras arenas
da vida social, encontrar os caminhos pelos quais elas desembocam, com maior ou
menor força, na vida cotidiana”.
A autora destaca que há uma relação importante a ser considerada entre corpo
e o lugar em que ele está circunscrito e construído historicamente. Já que nossos
modos de ação corporal correspondem a demandas sociais de engajamento do corpo.
Ou seja, nossos corpos podem desenvolver sensibilidades de acordo com o lugar
onde estamos inseridos socialmente.
O pesquisador Michael Jackson (1989) explora essa noção para pensar as
práticas de iniciação entre os Kuranko da Serra Leoa. Conforme ele, os ritos
constituem persistências desencadeadas por desorganizações do espaço cotidiano.
Ou seja, nas formas distintas do uso do corpo acionam-se gatilhos que produzem
novas imagens que se confrontam com outras possibilidades de organização do
mundo social. Essa seria uma chave pertinente para a compreensão do processo de
iniciação religiosa.
Já Duccini (2005), quando reflete sobre a inserção de grupos de camadas
médias no candomblé de Salvador, percebe os limites que aparecem nesse processo
de aprendizado do corpo em relação à pratica religiosa. Para ele, essa questão toca o
desenvolvimento de habilidades e sensibilidades que não são comuns no habitus de
classe dos adeptos.
A autora ainda apresenta duas análises que nos servirão como exemplo para
facilitar a compreensão do(a) leitor(a) desse complexo e importante debate. Na
primeira reflete sobre a relação entre corpo e religião a partir do candomblé. A autora
narra que
SAIBA MAIS
A importância do corpo extrapola a individualidade, nele se realizando a circulação de
motivos e atos, significativos e expressivos no que diz respeito aos processos e
relações sociais, manifestando, assim, uma linguagem intercomunicativa específica.
Fonte: Spaolonse (2006).
#SAIBA MAIS#
REFLITA
Você já havia parado para pensar, caro(a) estudante, que as disposições e técnicas
corporais são socialmente constituídas e revelam os lugares como contextos
adaptados a essas mesmas habilidades corporais e às classificações ou ideias
estereotipadas que elas corporificam?
Fonte: Rabelo (2011).
#REFLITA#
2 FUNÇÃO SOCIAL E RELIGIOSA DOS RITOS DE INICIAÇÃO E DE PASSAGEM
Identificando as fases dos rituais, Arnold Van Gennep (1978) chama a atenção
para a visão geral do ritual e a importância de se analisar todas as fases, o antes e o
depois, já que todas são relacionais e compõem o rito. Assim, entendemos a frase do
autor que diz: “para os grupos, assim como para os indivíduos, viver é continuamente
desagregar-se e reconstituir-se, mudar de estado e de forma, morrer e renascer” (VAN
GENNEP, 1978, p. 157). O pesquisador é o primeiro a se atentar ao estudo dos rituais
como objeto de pesquisa, considerando que sua obra data de 1909. Nas palavras de
Roberto da Matta, na apresentação de uma das edições da obra de Van Gennep
1978, p. 18):
SAIBA MAIS
“No total, a oposição entre o rito e o mito é aquela do viver e do pensar, e o ritual
representa um abastardamento do pensar consentido as servitudes da vida”.
Fonte: Levi-Strauss (1971, p. 6).
#SAIBA MAIS#
REFLITA
Você já tinha se questionado que algumas práticas cotidianas, como os cumprimentos,
despedida dos pais; respeito à ordem com horários compartimentalizados na escola e
no trabalho, podem ser consideradas ritos profanos?
#REFLITA #
3 RITOS AFRO-BRASILEIROS
Se observamos de quando é datada esta lei, notaremos quão tardia foi tomada
uma medida em que o estado brasileiro se propõe a lidar com a questão de combate
ao racismo e reconhecimento da história de resistência dos afrodescendentes. Além
disso, medidas como essa são fruto de lutas do Movimento negro1, que pautam
questões sociais e antirracistas e demonstram a necessidade de discutir o racismo e
trazer para o espaço público as memórias diaspóricas que a população Afro-brasileira
carrega consigo.
Realizamos tal discussão porque o modo como a sociedade brasileira corrobora
o esquecimento em relação à dor da escravidão no Brasil incide diretamente no
processo como as divindades afro-brasileiras são apagadas, silenciadas e esquecidas
1
Conforme Lino Gomes (2012, p. 735-740) o movimento negro é “como um ator coletivo e
político, constituído por um conjunto variado de grupos e entidades políticas (e também
culturais) distribuídos nas cinco regiões do país. Possui ambiguidades, vive disputas internas e
também constrói consensos, tais como: o resgate de um herói negro, a fixação de uma data
nacional, a necessidade de criminalização do racismo e o papel da escola como instrumento
de reprodução do racismo [...] Foi no início do terceiro milênio que uma demanda educacional
do movimento negro desde os anos de 1980 foi finalmente contemplada. Em 2003, foi
sancionada a Lei n. 10.639, alterando os artigos 26-A e 79-B da LDB e tornando obrigatório o
ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas públicas e privadas de ensino
Fundamental e médio.
nas narrativas. A própria historiografia historicamente negou às práticas afro-religiosas
o signo da religião, tratando-as como doença (histeria), superstição, feitiçaria, crendice
ou folclore, como veremos no tópico seguinte. Somente nas últimas décadas o quadro
modificou-se consideravelmente.
Conforme a literatura especializada, podemos compreender que os iorubas
acreditam que o homem descende dos orixás e cada ser humano tem uma linhagem
que se refere a um ancestral específico. Cada um herda do seu orixá seus atributos,
predisposições e intentos. Os orixás regozijam-se e entristecem-se, perdem e vencem,
avançam e retrocedem, amam e odeiam (PRANDI, 2001). Essa crença está bastante
presente na estrutura do Candomblé, pois se trata de uma oralidade oriunda da Costa
Ocidental da África, disseminada para regiões de outros continentes, inclusive o Brasil,
na diáspora provocada pelo tráfico escravista. O sociólogo Bastide (1961) nos explica
que há diversas prática incorporadas às religiões Afro-brasileiras que vieram de
diferentes lugares da África, no entanto a cultura ioruba destacou-se e popularizou-se
e é por isso que vamos dar esse enfoque, mas não significa que atribuímos maior
valor à ela do que a religião Bantu ou Gêge.
• A OFERENDA:
• O PADÊ DE EXU:
[...] a cerimônia pública prôpriamente dita começa quando o sol se põe
e se prolonga por muito tempo noite adentro. Tem início
obrigatôriamente com o padê de Exú, do qual muitas vêzes se dá uma
interpretação falsa [...] Dizem que Exú é o diabo. Exú é, na verdade, o
Mercúrio africano, o intermediário necessário entre o homem e o
sobrenatural, o intérprete que conhece ao mesmo tempo a língua dos
mortais e a dos Orixás, pois êle o o encarregaâo - e o padê não tem
outra finalidade - de levar aos deuses da África o chamado de seus
filhos do Brasil. O padê é celebrado por duas das filhas de santo mais
antigas, a dagã e a sidagã, ao som de cânticos em língua africana,
cantados sob a direção da iya têbêxê e sob o contrôle do babalorixá,
diante de um copo d'água e de um prato contendo o alimento de Exú. O
copo e o prato serão depois levados para fora da sala em que se
desenrolará o conjunto da cerimônia, sendo depositado numa
encruzilhada que é dos lugares preferidos de Exú (BASTIDE, p. 1961,
p. 22).
Fonte: https://wopita.com/media/2352453781201760562_28455937426
• AS DANÇAS PRELIMINARES:
[...] os deuses são chamados numa certa ordem que varia de
candomblé para candomblé, mas que, por ocasião das festas públicas,
é muitas vêzes a mesma em santuários determinados. Esta ordem é
conhecida como xiré: Começa por Exu para terminar por Oxalá. Cada
divindade recebe um mínimo de três cânticos [...]: Os cânticos, todavia,
não são apenas cantados, são também dançados", pois constituem a
evocação de certos episódios da história dos deuses, são fragmentos
de mitos, e o mito deve ser representado ao mesmo tempo que falado
para adquirir todo o poder evocador. O gesto juntando-se à palavra, a
fôrça da imitação mimética auxiliando o encantamento da palavra, os
Orixá não tardam a montar em seus cavalos à medida que vão sendo
cliamados (BASTIDE, p. 1961, p. 26).
Figura 2 - Xirê
• INICIAÇÃO:
[...] o processo iniciático compreende entre outras coisas a lavagem
das contas (colar de miçangas que todos iniciados recebem, amuleto
sagrado) e o eborí, o rito de "dar comida à cabeça". O ponto central da
iniciação consistiria, pois, em administrar ervas especiais que agem
como drogas sôbre as candidatas, reduzindo-as a um estado de
atordoamento, mantendo-as então sob uma espécie de dominação
hipnótica e estabelecendo-lhes no espírito, quando estão nesse estado
de desagregação mental, uma associação entre o desencadear de
certas músicas e o transe; [...] Tanto na lavagem das contas quanto no
bori, por meio do banho de ervas ou pelo sangue, era a cabeça
colocada em comunicação com a pedra da divindade que terá que
cuidar durante todo o resto da sua sua vida à qual dá de comer [...] O
processo leva meses, a fixação do Orixá na cabeça da filha não se faz
senão lentamente, etapa por etapa, desde a entrada no santuário até
mergulho que lhe marca o fim [...] Terminada a aprendizagem,
confirmado o Orixá, resta "fixar" o santo mais fortemente e de maneira
definitiva, à cabeça. Começa-se, como na primeira parte, por oferecer
sacrifícios a Exú e aos Eguns. Raspa-se inteiramente o crânio da
candidata com uma faca virgem; seja para que o santo possa penetrar
por qualquer orifício, como afirmam alguns habitantes da Bahia, seja
para levar a candidata ao estado de criancinha que vai nascer para
uma vida nova [...]Sabe-se que tôda mudança de personalidade se
traduz obrigatoriamente por uma mudança de nome. Todavia, o
babalorixá consulta a sorte para saber se o nome trazido do continente
negro é de fato conveniente. Deve haver identidade entre a resposta de
lfa e a intuição do neófito (iniciado) em estado de transe (BASTIDE,
1961, p. 41-54).
SAIBA MAIS
Hector Julio Paride Bernabó, conhecido como Carybé é um famoso pintor que
representou nas telas muitas das crenças e práticas do candomblé Baiano. Carybé
expressou na linguagem plástica os costumes, os ofícios, as crenças e os folguedos
do povo baiano, exaltando neles a beleza e dignidade da raça negra, como nenhum
artista baiano jamais fizera.
#SAIBA MAIS#
REFLITA
O conhecimento acerca dos ritos de outros grupos sociais e culturais nos faz perceber
de modo diferente as nossa próprias práticas e ritos, a partir uma perspectiva mais
ampla.
#REFLITA#
CONSIDERAÇÕES FINAIS
HELLERN, V.; NOTAKER, H.; GAARDER, J. O livro das religiões. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000.
MELLOR, Philip; SHILLING, Chris. Re-forming the body: religion, community and
modernity. London: Sage Publications, 1997.
Prezado(a) aluno(a),
Neste material, busquei trazer para você alguns conceitos para pensar as
práticas religiosas dentro de um bojo de estudos da História das Religiões e
Religiosidades. Identificamos que existem diversos modos de se pensar e viver
o mito como uma realidade complexa, como uma história verdadeira que funda
o mundo e dá sentidos para ele.
A partir de agora acreditamos que você já está preparado para seguir em frente
desenvolvendo ainda mais seus estudos que busquem compreender como
homens e mulheres de diferentes tempos e espaços vivem os mitos, os
símbolos, os espaços sagrados e os ritos. Pratiquemos a alteridade!