Soros e vacinas são fármacos de origem biológica (imunobiológicos) usados na
prevenção e tratamento de doenças. A diferença entre eles está no fato que os soros já contém os anticorpos necessários para combater uma determinada doença ou intoxicação, enquanto que as vacinas contêm agentes infecciosos incapazes de provocar a patologia, mas que induzem o sistema imunológico a produzir anticorpos próprios, evitando a contração da doença. Portanto, o soro é “curativo” e uma forma de imunização passiva (BOTTOM!), enquanto a vacina é, basicamente, preventiva e uma forma de imunização ativa (TOP!).
Soroterapia
No final do século dezenove, o estudo e a descoberta dos agentes causadores de
doenças infecciosas foi um passo fundamental no avanço da medicina experimental, através do desenvolvimento de métodos de diagnóstico e tratamento de doenças como difteria, tétano e cólera. Entre os principais aspectos desse avanço, está o desenvolvimento da soroterapia, que consiste na aplicação no paciente de um soro contendo um concentrado de anticorpos (imunização passiva). A soroterapia tem a finalidade de combater doenças específicas (como infecções causadas por vírus, bactérias, protozoários ou fungos) ou um agente tóxico específico (venenos e outras toxicidades). O médico sanitarista, dr. Vital Brazil Mineiro da Campanha, consciente do número de acidentes com serpentes peçonhentas no estado de Botucatu, passou a realizar experimentos com venenos ofídicos (cujos efeitos são observados em nível local, ou seja na região da picada, e sistêmico). Baseando-se em trabalhos anteriores, desenvolveu estudos sobre soros contra veneno de serpentes, descobrindo que cada tipo de veneno requer um soro específico, preparado com o veneno do mesmo gênero da serpente que causou o acidente. Já no Estado de SP, Vital Brazil identificou um surto de Peste Bubônica (vulgarmente chamada de “Peste Negra”) na cidade de Santos, no ano de 1898. Então, iniciou em condições precárias o preparo de um soro contra a patologia nas instalações da fazenda do Butantan. A produção iniciou-se oficialmente em 1901, dando origem ao Instituto Serumtheráphico de Butantan. Controlada a doença, o Dr. Brazil prosseguiu com a preparação de soros antiofídicos no Instituto, para atender ao grande número de acidentes com serpentes peçonhentas, visto que o Brasil era um país com grande população rural. Toda a produção de imunobiológicos ( o Butantan produz cerca de 80% dos soros e vacinas utilizados hoje no País) é enviada para o Ministério da Saúde e, por ele, redistribuída às Secretarias de Saúde dos Estados.
Instituto Butantan e a Produção Nacional de Soros:
A primeira etapa da produção de soros antipeçonhentos é a extração do veneno
de animais como serpentes, escorpiões, aranhas e taturanas. Depois da extração, o veneno (ou peçonha) é submetido a um processo chamado liofilização, que desidrata e cristaliza o veneno. A produção segue às seguintes etapas: 1. O veneno liofilizado (antígeno) é diluído e injetado no cavalo, em doses adequadas. Esse processo leva 40 dias e é chamado hiperimunização. 2. Após a hiperimunização, é realizada a sangria exploratória, retirando uma amostra de sangue para medir o teor de anticorpos produzidos em resposta às injeções de peçonha. 3. Quando o teor de anticorpos atinge o nível desejado, é realizada a sangria final, retirando-se cerca de quinze litros de sangue de um cavalo de 500 Kg em três etapas, com intervalo de 48H. 4. No plasma (parte líquida do sangue), são encontrados os anticorpos. O soro é obtido a partir da purificação e concentração desse plasma. 5. As hemácias (parte vermelha do sangue) são devolvidas ao animal, através de uma técnica desenvolvida no Instituto, chamada plasmaferese, que é uma técnica de reposição que reduz os efeitos colaterais causados pela sangria do animal. 6. No final do processo, o soro obtido é submetido a testes de controle de qualidade: 6.1. Atividade biológica - Para verificar a quantidade de anticorpos produzidos; 6.2. Esterilidade - Para detectar eventuais contaminações durante a produção; 6.3. Inocuidade - Teste de segurança para uso humano; 6.4. Pirogênio - Para detectar a presença dessa substância do metabolismo de organismos (como bactérias e fungos), que provoca alterações de temperatura nos pacientes; 6.5. Testes Físico-Químicos. A hiperimunização para obtenção do soro é realizada em cavalos desde o início do século porque são animais de grande porte, assim, produzem uma volumosa quantidade de plasma com anticorpos para o processamento industrial de soro para atender a demanda nacional, sem que os mesmos sejam prejudicados no processo. Há também um acompanhamento médico-veterinário destes cavalos, além de receberem alimentação indicada para se manterem saudáveis durante todo o processo.
Soros produzidos pelo Butantan:
Antibotrópico: para acidentes com jararaca, jararacuçu, urutu, caiçaca, cotiara.
Anticrotálico: para acidentes com cascavel. Antilaquético: para acidentes com surucucu. Antielapídico: para acidentes com coral. Antibotrópico-laquético: para acidentes com jararaca, jararacuçu, urutu, caiçaca, cotiara ou surucucu. Antiaracnídico: para acidentes com aranhas do gênero Phoneutria (armadeira), Loxosceles (aranha marrom) e escorpiões brasileiros do gênero Tityus. Antiescorpiônico: para acidentes com escorpiões brasileiros do gênero Tityus. Antilonomia: para acidentes com taturanas do género Lonomia.
Além dos soros anti-peçonhentos, o Instituto Butantan também produz soros
para o tratamento de infecções e prevenção de rejeição de órgãos. A maior parte desses soros é obtida pelo mesmo processo dos soros antipeçonhentos. A única diferença está no tipo de substância injetada no animal para induzir a formação de anticorpos. No caso dos soros contra difteria, botulismo e tétano, é usado o toxóide preparado com materiais das próprias bactérias. Para a produção do anti-rábico, é usado o vírus rábico inativado.
● Anti-tetânico: para o tratamento do tétano.
● Anti-rábico: para o tratamento da raiva. ● Antidiftérico: para tratamento da difteria. ● Anti-botulínico - "A": para tratamento do botulismo¹ do tipo A. ● Anti-botulínico - "B": para tratamento do botulismo do tipo B. ● Anti-botulínico - "ABE": para tratamento de botulismo dos tipos A, B e E. ● Anti-timocitário: o soro anti timocítico é usado para reduzir as possibilidades de rejeição de certos órgãos transplantados. O Instituto Butantan produz dois tipos desse soro: o de origem eqüina e o monoclonal. O primeiro tipo é obtido através da hiperimunização de cavalos com células obtidas do timo humano (glândula localizada no pescoço) e, em seguida, são purificados. O segundo tipo é produzido a partir de células obtidas em equipamentos especiais chamados bioreatores. OBS¹.: O botulismo é uma doença bacteriana grave, não contagiosa, causada pela ação de uma potente toxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum, encontrada no solo, nas fezes humanas ou de animais e nos alimentos. A doença pode levar à morte por paralisia da musculatura respiratória.
Como resultado de estudos na área, estão sendo desenvolvidas novas formas de
utilização dos soros, aumentando o seu potencial de utilização, seja através da obtenção de graus mais elevados de purificação, da redução de custos ou do aumento do prazo de armazenamento, como os produtos liofilizados. Uma pequena parcela de indivíduos tratados com os soros de origem eqüina torna-se hipersensível a certos componentes desses soros. Para esses casos, o Butantan vem estudando a possibilidade de produção de alguns soros a partir de sangue humano, como o anti-rábico e o anti-tetânico, que também pode ser obtido a partir de mães que foram vacinadas contra o tétano (visando o controle profilático dessa doença em recém-nascidos) já que elas concentram os anticorpos na própria placenta.
Vacinas:
As vacinas contêm agentes infecciosos inativados (vivos, porém atenuados, ou
mortos) ou seus produtos, que induzem a produção de anticorpos pelo próprio organismo por parte da pessoa vacinada, evitando assim a contração de uma patologia. Isso acontece por causa de um mecanismo orgânico chamado "memória celular” ou, como também pode ser conhecida, “memória imunológica”. As células do sistema imunológico são, sobretudo, muito organizadas, tendo cada uma a sua função. Se o organismo entrar em contato com qualquer agente infeccioso, mesmo em um estado atenuado, ele desenvolverá linfócitos especiais (estes chamados de células da memória) que serão capazes de reconhecer esse agente infeccioso. As vacinas diferem dos soros também no seu processo de produção, sendo feitas a partir dos microrganismos inativados ou de suas toxinas, em um processo que envolve: ● Fermentação; ● Detoxificação; ● Cromatografia
Quando a vacina é composta pelo microrganismo inativado, pode ser necessário
aplicar mais doses ao longo da vida, pois sua proteção não é tão forte como a vacina composta por microrganismos vivos atenuados. Alguns exemplos são as vacinas para gripe, poliomielite, hepatite A e raiva.
Vacinas Produzidas por Partes Específicas de
Organismos:
Esta vacina é composta por partes específicas do microrganismo (proteína,
açúcar ou cápsula), chamadas de vacinas subunidades, recombinantes, polissacarídicas e combinadas. Ela também é considerada uma vacina inativada. É usada para proteger de Hepatite B, Coqueluche, HPV (papiloma humano), Herpes Zoster (conhecida popularmente como Cobreiro) e outros.
Vacinas Produzidas por Toxóides:
Essa vacina é composta pela toxina (proteína) inativada produzida pelo
microrganismo, isto é: ela não tem capacidade de produzir a doença, mas não perde suas características imunogênicas e antigênicas, estimulando assim o sistema imunológico a produzir defesas contra a doença. Ela também é considerada uma vacina inativada.
Vacinas Produzidas por Ácido Ribonucleico
Mensageiro (mRNA):
As vacinas de mRNA carregam o código genético do vírus que contém as
instruções para que as células do corpo produzam determinadas proteínas que estimulam a resposta imunológica do corpo.