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RESENHA

Gerlainy Roberta da Silva Andrade

SILVA, Artur Stamford da. Educar em direitos humanos sem inimigos autoelegidos. In:
SILVA, Artur Stamford da, SANTIAGO, Maria Betânia do Nascimento. Educação em
Direitos Humanos, Justiça e Cultura de Paz. Maceió: Editora Olyver, p. 51-85, 2023.

1 DESCRIÇÃO

O capítulo “educar em direitos humanos sem inimigos autoelegidos”, da autoria


de Artur Stamford da Silva, está dividido em três partes: as tentativas de superar a
metafísica, o antifundacionismo de Richard Rorty e o educar sem proselitismo, e, por
fim, a godelização da racionalidade e educação. O autor inicia tratando do que é ser do
bem e do mal e de como a nossa acusação promove dicotomias que no fim reduzem o ser
humano a inimigos autoelegidos.

O conteúdo do texto inicia com reflexões acerca das tentativas de superar a


metafísica, partindo da apresentação do antirepresentacionismo de Richard Rorty até a
godelização da racionalidade. Nesse sentido, o presente texto finaliza com as ideias de
Jean Piaget de que o desenvolvimento da inteligência ocorre por meio da assimilação e
acomodação que vão se configurando em estágio do desenvolvimento, concluindo,
portanto, que o código da educação é a mediação docente discente bem-sucedida e não a
mera transmissão de informações.

2 MAPA CONCEITUAL OU FICHAMENTO

1. Tentativas de superar a metafísica

1.1 As tentativas de superar a metafísica são agrupadas em giros, cada um


contendo uma concepção de objeto, de observador e de justificação
(observação/verdade).

1.2 O giro positivista é caracterizado por ter a indução como método do saber
científico, em conformidade com Francis Bacon.

1.3 René Descartes propõe o “Ego cogito ergo sum, sive existo” (penso, logo
existo), tratando de um conhecimento próprio do ser humano, desvinculando-se
assim de qualquer relação com política e com religião, proporcionando a dúvida
cética.
1.4 A dúvida cética proporcionada pelo método cartesiano proporcionou o
surgimento da dicotomia indução/dedução com a qual se ocuparam os modernos.

1.5 A pretensa superação da metafísica praticamente se esvai quando Augusto


Comte propõe a religião positiva.

1.6 Entretanto com David Hume saímos do positivismo e passamos ao giro


epistemológico, enfatizando a observação.

1.7 No giro cético epistemológico a aposta passa do fundacionismo, na explicação


voltada a estabelecer a única resposta correta, tem-se assim o ceticismo da
observação epistêmica.

1.8 Hume conta quatro ceticismos: o cético da dúvida universal; o cético


consequente; o cético por abstração; e o cético acadêmico.

1.9 Nesse seguimento, tem-se o giro fenomenológico com Edmund Husserl, o


qual se dedica a apresentar rejeições ao ceticismo de Descartes e de Hume, assim
ele critica o ceticismo metafísico, tanto aos moldes objetivistas do cético da
cognição, quanto aos do cético da intelecção (subjetividade).

1.10 O ceticismo radical (niilismo) elimina a possibilidade do conhecimento e do


fazer ciência.

1.11 O ceticismo pirrônico permite Husserl se afastar do problema da existência


ou não das coisas naturais, assim a atitude cética de buscar a primeira razão perde
lugar e ganha força o conhecimento da estrutura transcendental: a redução
fenomenológica.

1.12 Logo, com o giro fenomenológico o objeto é o fenômeno, não a coisa em si,
nem a observação epistêmica, mas a experimentação.

1.13 Paralelamente à fenomenologia, contudo, está se desenvolvendo a filosofia


da linguagem, em que a exigência passa a ser a intencionalidade, uma questão de
relação entre a linguagem e o pensamento.

1.14 Assim, Ferdinand Saussure desenvolve a linguística, a análise linguística, a


qual propiciou caminhos de pesquisa e análises como as desenvolvidas por
Wittgenstein que passa da questão “o que é a linguagem” para “que usos fazemos
da linguagem”.

1.15 O giro linguístico marca a passagem para a concepção da linguagem como


objeto, tendo o sujeito como intersubjetivo e a observação como coerência, assim
marca justamente a perspectiva de autonomia da linguagem a qual se torna imune
às interferências naturais e intencionais.
1.16 Wittgenstein afirmava: “o que pode ser dito, por ser dito claramente”.

1.17 Dessa forma, concebe-se a linguagem científica como especializada, ideal,


artificial e não natural, entendendo-se ter afastado afastado o conhecimento de
toda metafísica e teologia.
2. Antifundacionismo de Richard Rorty e o educar sem proselitismo

2.1 Rorty questiona se os filósofos da linguagem dispõem de critério para


viabilizar acordos racionais sobre algo, concluindo que não.

2.2 O giro linguístico, visto anteriormente, foi superado passados dez anos ao
reconhecer que as ideias deste giro não eram tão revolucionárias à metafilosofia, à
metafísica ontológica, como Rorty, havia acreditado.

2.3 Para Rorty, a fenomenologia foi transformada em antropologia e a


epistemologia analítica em historicismo.

2.4 A aposta na linguagem levou à formação do positivismo lógico, do Círculo de


Viena, com a proposta da linguagem artificial, bem como à aposta na linguagem
natural, ordinária, com o círculo de Oxford.

2.5 Acatar a afirmação de Rorty sobre a resistência da metafísica implica admitir


que não é possível uma educação sem fundamentos metafísicos.

2.6 Para Rorty, a via gnosiológica, portanto a verdade como conhecimento, não
apresenta saída ao embate.

2.6 A “autodecepção” de Rorty com o giro linguístico o levou a radicalizar sua


proposta antifundacionista, antirepresentacionista da linguagem em seu
pragmatismo.

2.7 Rorty considerar que verdade não se confunde com justificação, não implica
que ele nega a possibilidade de haver verdade, nem que relativismo é
necessariamente não haver conhecimento.

2.8 A sugestão do professor autor, portanto, é distinguir fé de crença, pois na


crença não se trata de defender algo, mas de apresentar ao debate, de lançar à
reflexão, com isso, na crença há espaço para o constante aprendizado.

3. Godelização da racionalidade e educação

3.1 Kurt Gödel traz uma solução para o paradoxo do conjunto, o paradoxo do
mentiroso, com seu teorema da incompletude.
3.2 O teorema da incompletude viabiliza uma perspectiva diversa da
fundamentalista causal, o que nos leva a tratar da possibilidade de lidar com
direitos humanos sem proselitismos.

3.3 Assim, a causalidade não é eliminada com a gödelização da racionalidade,


mas é tomada como insuficiente para lidar com todos os problemas da vida social
humana, mas não por isso é considerada inferior ou desprezada.

3.4 De acordo com Heinz von Foerster há sistemas que observam, são aqueles
que operam com causalidade retroativa, por retroalimentação.

3.5 A dicotomia dominante em toda metafísica ontológica, objeto/sujeito, se esvai


com a função de operação de observação.

3.6 Sistemas que observam não incorporam informações que se desagregam na


interferência de seu ambiente.

3.7 Sistemas auto-organizados são aqueles que vivem em constante estado de


interação com o ambiente, interação esta que levam o sistema a observar a energia
e a ordem do seu próprio ambiente.

3.8 Desse modo, cada sistema tem seu ambiente em que se desenvolve.

3.9 Na teoria da Forma, uma distinção é traçada delineando um limite, e é a


distinção é quem torna possível haver qualquer comunicação.

3.10 A metáfora máquina não trivial empregada para lidar com o social como
comunicação (humana ou não) nos leva a considerar que a forma de comunicação
contém estrutura e variação.

3.11 Observa-se que não se trata de pensar a comunicação como algo que tem
uma correspondência metafísica, física (natural), nem imaginária (mental,
fenomenológica), nem linguística, mas sim como comunicação.

3.12 Ocorre que a causalidade nos leva a acreditar que comunicação é um produto
de uma autoria, entretanto o que a teoria nos traz é que os autores não são
controladores da comunicação, a expectativa do enunciador não passa de sua
expectativa, a qual não se transmite ao destinatário.

3.13 A comunicação (sistema, forma de sentido) se diferencia do ambiente


(entorno, meio de sentido), porém não se separa dele (forma de dois lados que é).

3.14 Assim, se o sistema (a comunicação) não estiver em constante contato com o


seu ambiente, ele não tem como operar por comunicação com sentido, pois não se
diferencia.
3.15 Não haver diferenciação resulta não ser possível tematizar, não há como
comunicar porque não há a possibilidade de selecionar um sentido.

3.16 Portanto, conclui-se que educar em e para direitos humanos não é tratar os
temas como justificação última, mas como reflexões a serem debatidas.

3 COMENTÁRIOS

Minhas observações sobre o capítulo são das mais variadas possíveis, uma vez
que o texto perpassou diversos filósofos e seus métodos para explicar a superaração da
metafísica em seus giros e adentrou no antifundacionismo de Richard Rorty e na
Godelização da racionalidade, assim o capítulo proporcionou uma viagem aos
pensamentos e discussões desde o positivismo abordado por Francis Bacon.

Dessa forma, o que mais me chamou atenção no texto foram os giros nas
tentativas de superar a metafísica pois perpassaram os pensamentos de Bacon, o método
de René Descartes, a religião positiva de Augusto Comte, a saída do positivismo por
David Hume, o ceticismo pirrônico por Husserl para por fim tratar da linguística e da sua
influência para pesquisas como a Wittgenstein.

Assim, o capítulo em análise proporcionou uma inegável imersão na temática ao


perpassar pelos pensadores supracitados e aumentou o nível da discussão ao não finalizar
no último giro analisado, o linguístico, mas seguir em frente evidenciando a eventual
superação do giro linguístico e adentrando no tópico da comunicação dando ênfase ao
funcionamento desse sistema e expondo a necessidade de não haver justificação última,
mas reflexões que devem ser debatidas.

Por fim, outro tópico crucial discutido no capítulo analisado é a essencialidade do


trabalho de educação em e para direitos humanos na educação básica, pois é fundamental
formar as concepções fundamentais do que é viver em sociedade, entretanto outra
afirmativa que abarcou a minha preocupação quanto a esse tópico foi o que educar não se
esgota na escola, pois é importante reconhecer que o educar é um produto do que se tem
na escola, em casa e na sociedade.

4 APLICAÇÃO

O texto me lembra a situação da polêmica de algum tempo atrás quando estava se


discutindo sobre os professores estarem sendo “ditadores” em sala de aula, em conjunto
com essa situação outra que me lembrou também foi a de uma implícita e por vezes
explícita proibição a discussões políticas em sala de aula.

Os episódios supracitados me preocuparam bastante, em especial o último, porque


mostra que se perdeu muito e é necessário construir a ideia de discussão e de
comunicação, pois sem ela como podemos viver em sociedade? Os ambientes de sala de
aula estão formando a futura geração de profissionais, estudiosos e administradores do
país, então como pode esse ambiente vedar certas discussões em vez estimular os
debates?
É necessário com toda certeza ensinar o que é uma discussão e como se discutir,
não no sentido pejorativo que grande parte da população está acostumada, mas no sentido
de gerar reflexões e debates que enriqueçam. Tal ideia pode ser em parte utópica levando
em consideração que a educação do país precisa avançar muito ainda nesse sentido de
diálogos e debates mais maduros, mas ao me deparar com o tema discutido no capítulo e
as reflexões levantadas pelo professor essas situações surgiram, pois como o próprio
professor traz em seu texto “não se trata de pensar a comunicação como algo que tem
uma correspondência metafísica, física, nem imaginária, mas sim como comunicação”.

Portanto, é importante termos em mente que, conforme estudado no texto, os


autores não são controladores da comunicação e que a expectativa do enunciador não
passa de sua expectativa e não se transmite ao destinatário. Assim, para criar e estimular
debates e discussões em sala de aula e no geral é fundamental estar ciente de que a
comunicação pode se diferenciar do ambiente, mas não se separa dele.

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