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Isto é Design de Serviço na Prática

01
POR QUE DESIGN
DE SERVIÇO?
Inovação na prática que derruba silos e que começa com a experiência
– por que as organizações adotam o design de serviço.

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Comentários de especialistas

Chris Ferguson Jeff McGrath Lauren Currie Maurício Manhães

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Isto é Design de Serviço na Prática

01
POR QUE DESIGN DE SERVIÇO?
1.1 O que os clientes querem? ........................................ 3

1.2 Desafios das organizações ........................................ 6


1.2.1 Clientes empoderados .................................................. 6
1.2.2 Silos ................................................................................. 7
1.2.3 Necessidade de inovação ........................................... 10
1.2.4 Reação das organizações ............................................ 11

1.3 Por que uma abordagem de design de serviço? ..... 14 Este capítulo também inclui

Serviços? Produtos? Experiências? 5

United Breaks Guitars 9

Por que escolhi o design de serviço 12

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1.1 O QUE OS CLIENTES QUEREM?


01

Na sua infância, talvez você tenha brincado de “jogo do embrulho”. sistemas e ferramentas operados pela empresa, como sistemas de
Antes de uma festa, um presente-surpresa era embrulhado sob várias logística, faturamento e sistemas de ponto de venda. Finalmente, no
camadas de papel de presente até que ficasse impossível identificar centro do embrulho, encontramos a oferta em si, que pode ser um
a forma do objeto em seu interior. As crianças que participavam da contrato de telefone ou um par de tênis de corrida.
brincadeira tinham que desembrulhar camada a camada, ansiosas O cliente de uma empresa é como uma criança brincando de
para descobrir qual seria o presente embrulhado. jogo do embrulho. A única maneira de ele chegar à oferta que deseja
As ofertas das organizações – produtos, serviços físicos e digi- é passando por essas camadas – e todas elas contribuem para a sua
tais02 que desejamos – são embrulhadas mais ou menos do mesmo experiência como cliente. Uma equipe desinteressada, funcionários
jeito. A camada mais externa do embrulho representa o comporta- mal informados, processos intrincados e sistemas desajeitados podem
mento, a maneira, o tom do membro da equipe (ou da interface tecno- tornar a compra ou a interação com a oferta menos gratificante e,
lógica) com quem estamos lidando. Logo abaixo fica uma camada consequentemente, menos valiosa para o cliente.
de expertise no assunto e no sistema, constituída do conhecimento
daquela pessoa ou sistema sobre as ofertas e operações. Abaixo dela há
uma camada de processos executados pela equipe – como as rotinas
de venda ou de reembolso – e, mais abaixo, temos outra camada de

A experiência da nossa oferta é filtrada pela percepção que o cliente tem EXPERIÊNCIA DO CLIENTE
sobre nosso comportamento, nossa expertise, nossos processos, nossos
sistemas e ferramentas. O cliente só percebe as soluções através dos véus
de todas essas camadas, começando pela camada mais externa.03 COMPORTAMENTO

EXPERTISE
01 Neste livro, de modo geral, usaremos a palavra “cliente” em seu sentido mais amplo, de alguém que
recebe o valor que produzimos. Em seu próprio contexto, talvez você use outras palavras, como “freguês”, NO ASSUNTO
“usuário”, “colega”, “cidadão”, “stakeholder” ou “chefe”. Quando for importante diferenciar – por exemplo,
em um caso B2B entre um “usuário” que interage diretamente com a oferta e um “cliente” que a compra – PROCESSOS
deixaremos clara a distinção. Para mais detalhes, veja o texto “Terminologia do stakeholder”, em 3.4.
02 O termo “produtos” descreve qualquer coisa que a empresa ofereça – não importa que seja algo tangível SISTEMAS
ou não. Na academia, produtos frequentemente são divididos em bens e serviços, mas, na verdade, eles E FERRA-
costumam ser produtos físicos/digitais e pacotes de serviço. Como “bens” são coloquialmente entendidos MENTAS
como algo tangível, preferimos falar de produtos físicos/digitais. Leia mais sobre isso no texto “Design de
serviço e lógica serviço-dominante”, em 2.5.
03 Este modelo de seis níveis é uma adaptação dos autores do modelo de cinco etapas da Swisscom.
Veja, por exemplo, Oberholzer, G. (2011, May 05). “Customer Experience – wie vermittle ich das meinen
Mitarbeitenden? – CEN-Xchange Mai”, disponível em https://stimmt.ch. OFERTAS

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Isto é Design de Serviço na Prática

Tradicionalmente, as empresas focam muito no conteúdo no valorizada pelos pacientes.02 Não é difícil imaginar o mesmo em ou-
centro do embrulho, e talvez nas poucas camadas mais internas que tras situações. Um turista não fará comentários sobre a porta, a janela
permitem entregar esse conteúdo; elas se concentram em oferecer ou a cama de um quarto de hotel até que uma dessas coisas apresente
excelência técnica e operacional, pois querem acertar. Para elas, seu algum problema; da mesma forma, um diretor financeiro não vai
trabalho é otimizar as engrenagens de sua atividade – como, por avaliar seus contadores por seus conhecimentos matemáticos até que
exemplo, uma hamburgueria que investe pesado no desenvolvimento eles comecem a perder o controle sobre as finanças da empresa. Nesse
de novas receitas. Ou então elas trabalham duro nas vendas, dizendo ponto, a carência se torna um problema, mas, do contrário, os clientes
ao mundo que têm exatamente o que o cliente precisa para resolver o avaliam as organizações com base em outros fatores.
seu problema – como, por exemplo, um banco que se empenha para Em uma hamburgueria, então, seus frequentadores na verdade
apresentar e manter uma imagem de confiabilidade para seus clientes. dariam mais valor a uma recepção calorosa do que a uma nova e
Mas é com essa oferta central que o cliente realmente se importa? surpreendente receita de hambúrguer. Em um banco, os clientes se
Em um estudo, pesquisadores perguntaram a dezenas de milhares importariam mais com o péssimo processo de login do site do que
de pacientes sobre os fatores que faziam a estada em hospitais ser com a confiança na instituição.03 Como clientes, parece que somos
agradável ou não.01 A maioria de nós esperaria que o “resultado mais influenciados pelas camadas de experiência que estão em torno
médico” – a cura de uma enfermidade – seria a coisa mais importante da oferta principal do que pela oferta principal em si. Então, de que
para os pacientes, afinal, “cura” é uma proposta de valor fundamental forma as organizações podem entender melhor o que seus clientes
dos hospitais, e é o motivo pelo qual as pessoas vão até lá. Entretanto, valorizam e usar o seu conhecimento sobre eles para tornar essa
nenhum dos 15 principais fatores de satisfação apontados no estudo experiência sistematicamente melhor?
estavam relacionados à melhora ou não da saúde do paciente durante
sua estada no hospital. Os principais fatores de satisfação normalmen-
te estavam ligados às interações com a equipe do hospital, incluindo
aspectos como o fluxo de informações, a maneira de lidar com recla-
mações, uma equipe de enfermagem empática e bem-educada, um
ambiente agradável no hospital e a sensação de estar sendo cuidado
por uma equipe motivada.
Claro que, se alguém não tem um bom resultado médico, a
situação pode ser diferente. Quando ficamos mais doentes, a parte
médica da experiência torna-se muito mais importante; porém, até lá,
parece que a principal competência de um hospital – curar – não é tão
02 Esse fenômeno é bem documentado e pesquisado desde os anos 1960 – por exemplo, a teoria de Herzberg
sobre motivadores e fatores de higiene: fatores de higiene só contribuem para a insatisfação quando não
estão presentes, mas não contribuem para a satisfação se estão presentes, enquanto os motivadores contri-
buem para a satisfação se os fatores de higiene são cumpridos. Fonte: Herzberg, F. (1964). “The Motivation-
-Hygiene Concept and Problems of Manpower.” Personnel Administration, 27, 3–7. Veja também o texto “O
modelo Kano”, em 6.3.
01 Frampton S., Gilpin L., & Charmel P., eds. (2003). “National Patient Satisfaction Data for 2003.” 03 Exemplos de hambúrguer e banco retirados de Tincher, J. (2012, May 31) “The First Key to Creating a
In Putting Patients First: Designing and Practicing Patient-Centered Care. San Francisco, CA: Jossey-Bass. Great Customer-Inspired Experience”, disponível em https://heartofthecustomer.com.

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Serviços? Produtos? Experiências?


Este livro leva a palavra “serviço” no título, mas os primeiros parágrafos são sobre hambúrgueres e
tênis esportivos. Mas esses são serviços? Muitos profissionais de negócios fazem um estardalhaço
sobre a diferença entre serviços e bens (com frequência chamados coloquialmente de “produtos”) e
sobre qual é exatamente a diferença entre eles.

“Se a minha empresa oferece, então é o nosso de serviços”. Já a abordagem jobs-to-be-done O que todas essas discussões terminológicas
produto”, dizem uns. “Só é produto algo que (tarefas a fazer) sugere que os clientes “contra- têm em comum é o fato de que os clientes não
você possa derrubar em seu pé”, dizem outros. tam” certo produto ou serviço para que alguma se importam. Eles gastam o seu dinheiro (ou
Há algumas abordagens que desconsideram tarefa específica seja feita.05 Dentro dessas gastam o seu tempo, ou dão a sua atenção, ou
essa questão. Dentro da lógica serviço- discussões, há mais questões em torno dos trocam alguma coisa que valorizam, como
-dominante,04 bens tangíveis são meramente aspectos emocionais, relacionais e funcionais dados, votos ou permissões) e desejam que as
mecanismos de distribuição para a prestação de dos serviços e produtos. organizações cocriem valor com eles – ajudan-
serviço, e tais bens são chamados de “avatares Neste livro, a palavra “produto” é usada do-os, resolvendo seus problemas ou propor-
para descrever qualquer coisa que uma em- cionando-lhes o que almejam. E enquanto isso
presa ofereça – seja algo tangível ou não. Para acontece, eles esperam que as organizações
evitar confusão, em vez de “bens e serviços”, ofereçam uma experiência que atinja ou exceda
frequentemente falamos de “produtos físicos suas expectativas e se encaixe harmoniosamente
e digitais”, bem como produtos que chama- em suas vidas, atendendo suas necessida-
mos de “serviços”. des emocionais. ◀

04 Veja o texto sobre lógica serviço-dominante em 2.5. Veja também 05 Veja Christensen, C. M., Anthony, S. D., Berstell, G., & Nitterhouse, D.
Vargo, S. L., & Lusch, R. F. (2004). “Evolving to a New Dominant Logic (2007). “Finding the Right Job for Your Product.” MIT Sloan Manage-
for Marketing.” Journal of Marketing, 68(1), 1-17. ment Review, 48(3), 38.

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Isto é Design de Serviço na Prática

1.2 DESAFIOS DAS ORGANIZAÇÕES


1.2.1 Clientes empoderados

A revolução digital tornou a demanda dos clientes por boas expe- se estimava que más experiências de clientes resultavam em perdas de
riências ainda mais poderosa. Antes, o mais comum era eles serem US$ 83 bilhões em negócios, apenas nos Estados Unidos.03 As empre-
forçados a aceitar o que encontravam localmente ou no jornal; agora, sas que sabem proporcionar uma boa experiência para seus clientes
eles têm um leque enorme de opções. E, de fato, muitas vezes é mais têm desempenho superior no mercado,04 têm mais chances de serem
fácil comprar algo de um vendedor do outro lado do planeta do que recomendadas por clientes e de verem seus clientes retornarem e com-
de uma loja na sua cidade. Mesmo dentro de um mesmo provedor de prarem novamente;05 além disso, a maioria dos clientes está disposta a
serviço, os clientes contam com inúmeros canais de informação e de pagar a mais quando já sabe que terá uma experiência melhor.06
compras e podem alternar esses canais conforme lhes convir. Clientes Afinal, se parece óbvio que o foco na experiência do cliente é
obtêm informações valiosas a partir da comparação de preços, de fundamental, então por que tantas organizações não conseguem
fontes alternativas, de avaliações do público e de uma infinidade de acertar? Mesmo repletas de profissionais inteligentes e que desem-
outros dados bem ali, nas suas telas. penham um bom trabalho, elas, ainda assim, conseguem enfurecer,
As mídias sociais amplificam essa mudança, à medida que os irritar, confundir, frustrar ou simplesmente não impressionar seus
clientes agarram a oportunidade de compartilhar experiências com clientes.07 Um dos motivos para isso é a maneira como as organizações
potencialmente milhões de outras pessoas. Bate-papos online estão re- estão estruturadas.
modelando os negócios,01 pois os usuários confiam mais na palavra de
amigos e conhecidos do que em grandes campanhas de publicidade.
Talvez os serviços de business-to-business (B2B) sejam menos sensíveis
às mídias sociais, mas a propaganda boca a boca parece desempe-
nhar o mesmo papel nesse caso, com as indicações de funcionários e 03 Veja, por exemplo, “The Cost of Poor Customer Service: The Economic Impact of the Customer Experience
and Engagement in 16 Key Economies” (September 2009) Genesys, disponível em www.ancora-
clientes frequentemente apontadas como o gerador de vendas mais learning.com.au.
eficiente.02 Sejam quais forem os números, concordamos que, quando 04 Veja, por exemplo, Watermark (2015). “The Customer Experience ROI Study”. Recuperado de http://www.
watermarkconsult.net/docs/Watermark-Customer-Experience-ROI-Study.pdf.
uma empresa erra, o mundo inteiro fica sabendo – e as pessoas acredi- 05 Veja, por exemplo, Temkin Group (2012). “The ROI of Customer Experience”. Recuperado de https://
tam no que ouvem falar. temkingroup.com/research-reports/the-roi-of-customer-experience/.
06 Veja, por exemplo, RightNow/Oracle (2011). “Customer Experience Impact Report”. Recuperado de
Como muitos estudos já mostraram, a experiência do cliente faz www.oracle.com.
uma enorme diferença no resultado final de um negócio. Em 2009, já 07 Resultados de pesquisas corroboram a conclusão de que os clientes perderam a fé nas práticas empresariais.
Por quê? “Muitos profissionais de marketing deveriam confessar que, lá no fundo, os clientes nunca são
sua prioridade número um.” No livro Marketing 3.0, Philip Kotler et al. descrevem a transformação do
marketing de orientado a produto (1.0) a centrado no cliente (2.0) a centrado no ser humano (3.0 e, mais
01 Isso já foi detalhado em The Cluetrain Manifesto, em 1999. Veja Levine, R., Locke, C., Searls, D., & Wein-
tarde, 4.0, para incluir todos os aspectos da jornada do cliente). Isso inclui uma mudança na gestão de
berger, D. (2010). The Cluetrain Manifesto. Basic Books.
produto dos “Quatro Ps” (produto, preço, praça e promoção) para “Cocriação”. (Fonte: Kotler, P., Kartajaya,
02 Implisit, relatado como exemplo em eMarketer. “Referrals Fuel Highest B2B Conversion Rates.” (2015, H., & Setiawan, I. (2010). Marketing 3.0: From Products to Customers to the Human Spirit. John Wiley
February 10), disponível em https://www.emarketer.com. & Sons, p. 31.)

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1.2.2 Silos

COMENTÁRIO Desde a industrialização, por meio de movimentos como o tayloris- o procedimento de devolução criado pelo jurídico e, finalmente,
“Ferramentas e métodos mo08 e a gestão da qualidade total,09 as organizações têm focado na venderá um par de tênis desenhado pelo P&D ou adquirido pelo
de negócios enfatizam a excelência e eficiência operacional. Em um paradigma mecanicista, departamento de compras. A situação se torna ainda mais complexa
padronização e a capaci- elas entendem suas atividades como uma série de processos operacio- quando a relação do cliente final com a empresa começa a ficar longa
dade de ampliação de uma
nais e procuram otimizar cada etapa individualmente, com frequência e mais silos entram em jogo.
oferta, e conectam-se com
as pessoas por meio da
em termos de custos – afinal, custo e eficiência são conceitos bastante Todos esses profissionais são bons no que fazem e se tornam
publicidade em canais de simples, que proporcionam “alavancas” convenientes para a gestão. cada vez mais eficientes dentro de seus silos, enquanto o cliente
comunicação de massa. Essa Unidades organizacionais inteiras (também chamadas de “silos”) indefeso vai sendo jogado de um silo para outro. Sabemos que exis-
abordagem tem um potencial foram construídas em torno de atividades que fazem sentido para tem iniciativas e esforços para um trabalho integrado – mas de que
limitado de entender e de
a empresa, com um conjunto de ferramentas de negócios especifi- forma, exatamente, isso deveria acontecer? Profissionais situados em
afetar as novas realidades da
experiência do cliente.”
camente estruturadas para entender, acompanhar e gerenciar essas diferentes suborganizações têm seus próprios pontos de vista sobre
atividades e otimizá-las dentro do silo a partir da perspectiva da o que é importante, além de suas próprias medidas de sucesso e seus
— Chris Ferguson
empresa – e não do cliente. Muitas vezes, algo que esteja fora da oferta KPIs (key performance indicators – indicadores-chave de desempe-
básica e dos processos necessários para entregar o valor central do nho). Há muitas ferramentas, como os diagramas de processo, que
serviço corre o risco de ser visto como uma despesa extra, um novo podem apontar contribuições de diferentes áreas para um mesmo
centro de custo ou um “fator emocional” – que deve ser simplificado, processo, mas elas geralmente só consideram o cliente final caso ele
reduzido, excluído ou talvez deixado para os “especialistas em fatores seja necessário para determinada parte do processo – do contrário,
emocionais”, como os profissionais da publicidade ou do RH. ele pode ser completamente excluído. Portanto, elas podem ser usadas
Esses silos organizacionais refletem diversas camadas de expe- para promover uma cooperação eficiente entre os silos, mas não para
riência do cliente e estão nas mãos de equipes distintas. Quando com- compreender os efeitos decorrentes desses processos para o cliente
COMENTÁRIO pro um tênis de corrida, por exemplo, o processo de aconselhamento final. Até mesmo os gráficos e citações da “voz do cliente” muitas ve-
“Reuniões são um dos pro- da compra pode ser iniciado pelo departamento de vendas, enquanto zes são tão amplamente divulgados que acabam por se descolarem do
blemas mais penosos e, ainda as habilidades humanas e o conhecimento técnico especializado do seu contexto original, levando as necessidades reais do cliente a serem
assim, mais subestimados dos vendedor podem ser treinadas pelo RH. O vendedor fará uso dos esquecidas. E o mais fundamental: há muitas partes da jornada do
negócios atuais. Nesse contexto,
sistemas de vendas e estoque desenvolvidos pela área de TI, explicará cliente que são importantes para ele, mas que não ficam visíveis nos
uma abordagem voltada ao
design é ordinária e extraordi-
tradicionais processos internos das empresas. Tratam-se de partes da
nária ao mesmo tempo, pois as 08 Taylorismo, ou administração científica, é uma metodologia de eficiência da produção do início do século jornada que não são diretamente influenciadas pela empresa, mas que
XX. É baseada na divisão do trabalho nas menores subdivisões significativas possíveis, cada uma podendo
reuniões deixam de ser o lugar ser medida e otimizada para garantir um fluxo perfeito de ações do trabalhador.
onde as suas ideias morrem.” 09 Gestão da qualidade total é uma metodologia de negócios, muito famosa nos anos 80 e 90, que buscava a
melhoria contínua da qualidade dos produtos e serviços utilizando ciclos de feedback e análise sistemática
— Lauren Currie dos processos de trabalho.

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A Dave Caroll é cantor e compositor profissional há mais de 25 anos.

B Os vídeos de seu canal no YouTube, “United Breaks Guitars”, costumam ser


usados como exemplo do impacto que um cliente pode ter sobre uma marca.
C Hoje, Dave participa regularmente de conferências internacionais como palestrante.

D Livro lançado por Dave, United Breaks Guitars.01 D

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United Breaks Guitars


POR DAVE CARROLL

Sou cantor e compositor profissional há mais um ano –, o primeiro vídeo viralizou imediata- “United Breaks Guitars” virou um exemplo
de 25 anos. Em 31 de março de 2008, eu estava mente e alcançou um milhão de visualizações perfeito da nova relação entre empresas e
viajando para Nebraska com a minha banda, em apenas quatro dias. Durante o mês de julho clientes, e demonstrou o poder de uma voz na
Sons of Maxwell. Pousamos no aeroporto de 2009, ele ficou como o vídeo musical nº 1 no era das mídias sociais. Ele se tornou um estudo
de Chicago para desembarcar e pegar nossa mundo e foi o centro de um frenesi da mídia de caso referência na indústria da música e do
conexão quando uma passageira do nosso voo de massa. Hoje, o vídeo tem quase 16 milhões atendimento ao cliente, bem como nos círculos
olhou pela janela e falou “Meu Deus, estão de visualizações. As ações da United Airlines de discussão profissionais do branding e das
arremessando guitarras lá fora”. Acabou que tiveram uma queda de 10% no mercado de mídias sociais. Outro resultado inesperado da
a minha guitarra Taylor de US$ 3.500 ficou capitalização, ou uma desvalorização de U$180 minha história foi que ela me conduziu a uma
muito danificada, e essa foi a minha entrada milhões, e o relatório desse desempenho tornou produtiva carreira de palestrante sobre os temas
em um frustrante labirinto de atendimento ao o vídeo relevante para negócios no mundo de experiência do cliente, branding e o poder
cliente com a United Airlines. Depois de nove inteiro. Estava claro que as mídias sociais eram do storytelling.
meses, disseram-me que, pelo fato de eu não ter mais do que vídeos de gatos puxando a descar- Ao compartilhar a minha mensagem em
aberto um requerimento nas primeiras 24 horas ga. Um único cliente insatisfeito poderia afetar a mais de 25 países até o momento, descobri que
do ocorrido, e sim cinco ou seis dias depois, a rentabilidade de uma das marcas mais reconhe- tenho grande entusiasmo por defender que as
United estava isenta de cumprir sua política de cidas do mundo com um vídeo de US$150. empresas se tornem mais solidárias, para evita-
responsabilidade por danos. Minha história foi ao ar na CNN e em rem todo tipo de problema com seus clientes,
Respondi a eles prometendo que iria quase todas as agências de notícias do Ocidente. e que adoro ensinar as pessoas a se tornarem
compor três músicas e criar três vídeos que O “United Breaks Guitars” também serviu de contadoras de histórias mais eficientes nesse
seriam postados no YouTube com o objetivo de inspiração para inúmeros clientes insatisfei- mundo frenético e barulhento de hoje. ◀
atingir um milhão de visualizações no prazo de tos, e minha caixa de emails foi inundada por
um ano. Enquanto cumpria a minha promessa milhares de mensagens de incentivo e gratidão
– a trilogia “United Breaks Guitars” (“A United de clientes do mundo todo.
quebra guitarras”) foi, de fato, completada em 01 Carroll, D. (2012). United Breaks Guitars. Hay House, Inc.

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são uma parte importante da experiência do cliente – como tempo de uma tremenda diminuição dos ciclos de negócios e por uma onipre-
espera, avaliações de terceiros ou discussões com amigos.01 sença geral da tecnologia da informação, tornando a cópia mais fácil
Então, juntamos uma equipe multidisciplinar em uma mesma do que nunca. Se uma oferta tem valor e é facilmente reproduzível, ela
COMENTÁRIO sala, mas por onde devemos começar? Normalmente, a ferramenta será copiada direta ou indiretamente, legal ou ilegalmente por pessoas
“Como descrito por básica para dar ignição nesses esforços cooperativos é uma reunião, e, que não tiveram os custos de desenvolvimento e que podem ofertá-la
Schumpeter em 1927, o ciclo nesse ponto, as equipes se veem diante da tarefa colossal de conciliar por um preço menor. E ainda que o preço seja similar, o resultado é o
econômico de negócios tem diferentes visões de mundo e diferentes terminologias apenas dis- mesmo – a comoditização. Nesse caso, pode haver duas ou mais ofer-
quatro fases: atividade cerebral,
cutindo o assunto. Não é de se admirar que as colaborações multi- tas similares no mercado, o que culminará em uma guerra de preços.
curva de adoção, rotina e crise.
Quando os ciclos duravam 60
disciplinares sejam extremamente difíceis, pois cada representante A inovação muitas vezes visa agradar o consumidor, já que novas
anos, essas fases ocorriam sem defende honestamente o seu próprio ponto de vista, fazendo uso de funcionalidades podem não permanecer novas por muito tempo. Em
que as pessoas percebessem. seu próprio jargão. vários modelos de satisfação do cliente,02 fica claro que as caracterís-
Hoje eles duram seis meses, e Como podemos facilitar a colaboração entre essas pessoas e a ticas de uma oferta que são vistas inicialmente como surpreendentes
saber como trabalhar com várias
criação de novos valores comuns, de modo que cada área enxergue os logo se tornam “esperadas”. Um exemplo vívido disso é a internet
fases de ‘atividade cerebral’
para criar conhecimento é fun-
resultados como seus e passe a apostar no sucesso comum? E como wireless nos hotéis no início do século XXI. No início, os viajantes
damental. Na visão de mundo podemos ajudá-las a coordenar experiências entre os seus silos, traba- ficavam surpresos e maravilhados de poder utilizar o WiFi em hotéis
da lógica serviço-dominante, lhando juntas para criar a real satisfação do cliente? e aceitavam pagar pelo acesso com gosto. Não demorou muito para
essas fases de atividade cere- os clientes passarem a esperar que todo hotel oferecesse WiFi gratuito
bral são o principal motivo pelo
e começarem a se queixar de que estariam pagando mais caro pela
qual as organizações deveriam
adotar o design de serviço.”
1.2.3 Necessidade de inovação internet do hotel do que em suas próprias casas. Hoje, como há WiFi
disponível gratuitamente em cafeterias, taxis e ônibus, os hóspedes de
— Maurício Manhães
A maioria das organizações se sente muito pressionada a inovar. hotéis “consideram o WiFi algo básico, como água quente, eletricidade
Elas veem a inovação como algo necessário e desejável, e priorizam- ou ar condicionado”,03 e costumam ficar incomodados quando veem
-na como uma das metas de seu trabalho. Frequentemente, ela está que ele foi cobrado como extra na sua conta de hospedagem. Nos
ligada à geração de uma proposta de valor única (USP, unique selling termos utilizados pelos proponentes do modelo Kano,04 aqui o fator
proposition), e sua inovação pode se manifestar por meio da criação de de satisfação se deteriorou para um fator de desempenho e, por fim,
ofertas únicas, mas também nos processos internos que possibilitam
essas ofertas ou até mesmo no modelo de negócios da organização.
Como quer que seja, a necessidade de inovação é motivada por um 02 Veja Oliver, R. L. (1977). “Effect of Expectation and Disconfirmation on Postexposure Product Evaluations:
mundo (dos negócios) em constante mudança e superconectado, por An Alternative Interpretation.” Journal of Applied Psychology, 62(4), 480 (e também as publicações posterio-
res de Oliver). Neste livro, veja o texto “O modelo Kano”, em 6.3.
03 White, A.C. (2015, July 6). “Free Hotel Wi-Fi Is Increasingly on Travelers’ Must-Have List.”
01 Leia mais sobre mapas de jornada centrados em produtos e centrados em experiência em 3.3.1, “Uma New York Times.
tipologia dos mapas de jornada”. 04 Veja o texto “O modelo Kano”, em 6.3.

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para um fator básico. A inovação de ontem ficou ultrapassada e uma Quando as organizações entendem a importância da experiência
nova é necessária. dos clientes, é comum passarem a acompanhar seus índices de satis-
COMENTÁRIO Tudo isso significa que muitas organizações priorizam a ino- fação. As ferramentas mais visíveis são pesquisas online e offline, ou o
“Todos os dias utilizamos vação como um fator-chave para o sucesso e, à medida que serviços Net Promoter Score (NPS)06 em particular, com milhares de organiza-
serviços que não funcionam – e se tornam visivelmente mais importantes para as empresas, o foco ções perguntando “Qual a probabilidade de você recomendar a nossa
isso precisa mudar. Design de sua inovação se volta para os serviços. Elas tentam atender as empresa/produto/serviço a um amigo ou colega?”. Essa valiosa métri-
de serviço é projetar serviços
necessidades múltiplas dos seus clientes, e não apenas impressioná- ca enfrenta o mesmo desafio de muitas medições quantitativas: quan-
que funcionem.”
-los com novos anúncios extravagantes ou extensões de linhas de seus do o seu NPS cai, você sabe que tem um problema, mas não sabe por
— Lauren Currie
atuais produtos. quê. Ciclos de voz do cliente fortes e pontos de escuta podem oferecer
Assim, as empresas de hoje buscam meios de entender as necessi- mais dados, mas não oferecem soluções para o problema em questão.
dades de seus clientes a fim de obter insights úteis e gerar ideias inte- Eles indicam qual é o tamanho do problema, e talvez sua causa-raiz,
ressantes. Além disso, buscam maneiras de trabalhar essas ideias em mas não ajudam a descobrir como consertá-lo ou como inovar.
equipes intersilos (ou interorganizacionais), diversificando, filtrando, As organizações estão em busca de maneiras novas, confiáveis e
COMENTÁRIO testando e evoluindo os conceitos de serviço até que sejam imple- escaláveis de irem além das métricas, para que possam inovar e criar
“Empresas do segmento B2B mentados como ofertas, operações ou mesmo modelos de negócios estratégias de experiências dos clientes entre os silos. E cada vez mais
seguem migrando para o setor novos ou aprimorados. A inovação pode ser tanto incremental quanto elas se voltam para o que chamamos de design de serviço.07
de serviços como um meio disruptiva e, por esse motivo, precisamos de técnicas que funcionem
de ampliar seus mercados.
em ambos os casos.
Isso é válido para empresas
de produtos tradicionais, em
que novos negócios focados
em serviços são criados – às 1.2.4 Reação das organizações
vezes em parceria com outras 06 Reichheld, F. F. (2003). “The One Number You Need to Grow.” Harvard Business Review, 81(12), 46-55.
empresas – para complemen- 07 Design de serviço? Outras pessoas podem falar de design thinking, design thinking de serviço, novo
É evidente que muitas organizações atuais – de startups a governos marketing, UX design, UX holística, CX design, design centrado no ser humano, gestão de experiência
tar e/ou aumentar o valor de do cliente, design de experiência, gestão de pontos de contato, lean UX, novo desenvolvimento de serviço,
produtos industrializados, desde
– compreendem a importância de inovar na experiência do cliente novo desenvolvimento de produtos, jornada do cliente, ou inovação, para nomear alguns. Outros percebe-
motores a jato e locomotivas à para obterem sucesso. E essa consciência está crescendo depressa. Em rão semelhanças com lean startup e metodologias de desenvolvimento ágeis. Não importa o nome que você
dá para a coisa – o que importa é o que sua empresa faz e como faz. Ainda assim, é bom ficar atento, pois
geração de energia. Todos esses 2014, um estudo previu que 89% das empresas esperariam competir algumas pessoas têm opiniões fortes sobre o que exatamente significam termos como design de serviço,
negócios baseados em serviços design thinking e todos os demais. Outras pessoas são mais flexíveis – por exemplo, algumas usarão o ter-
com seu foco principal na experiência do cliente até 2016 – isso em mo “design de serviço” para designar quase todo tipo de trabalho de desenvolvimento de serviço, enquanto
são oportunidades importantes
comparação com exíguos 36% em 2010.05 outras vão dizer que o termo se refere estritamente a uma abordagem específica com origens históricas
em um estúdio de design. Pode ficar um pouco complicado quando todas essas pessoas tentam conversar
para muitas empresas B2B,
sobre “design de serviço” sem perceber que elas se referem a coisas diferentes. Com “design thinking”, a
e consistem em uma grande situação fica ainda pior. A pessoa se refere a essa grande abordagem, ou àquela versão esplêndida, a todas
área de aplicação para o as maneiras de aplicar os princípios de design aos desafios empresariais? Certamente há muitos sabores
disponíveis – felizmente! – e todos têm algo a oferecer. Mas ficar refletindo sobre essas diferenças nem
design de serviço.” 05 Sorofman, J. (2014, October 23): “Gartner Surveys Confirm Customer Experience Is the New Battlefield”, sempre é útil. A menos que você realmente goste desse tipo de discussão, acreditamos que você se dará
disponível em www.blogs.gartner.com. melhor simplesmente ao seguir praticando.
— Jeff McGrath

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Isto é Design de Serviço na Prática

POR QUE ESCOLHI O “O design de serviço aplica o design thinking ao campo dos serviços e
foca na abordagem prática (e não apenas no discurso). Conhecer o design
de serviço é muito útil, pois pode ajudar gerentes e funcionários a obterem
DESIGN DE SERVIÇO um olhar de usuário.”
— Julia Pahl-Schoenbein
COM A PALAVRA, OS PRATICANTES Líder de projeto sênior em
desenvolvimento de negócios, Alemanha

“Interessei-me pelo assunto porque o design thinking e o design de


serviço colocam clientes e usuários no centro de sua metodologia e
estrutura – eles oferecem uma visão holística da solução e facilitam a
identificação de lacunas na experiência do cliente.”
— Musa Hanhan
Executiva de empresa de software, EUA

“Adoro o ciclo rápido e iterativo do processo e o fato de você não


precisar acertar de primeira. Os ‘primeiros rascunhos grosseiros’
são poderosos.”
— Soo Ren Chang
Profissional de RH, Malásia

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01 Por que design de serviço? 12/13

“Meu desafio era descobrir como gerar de modo colaborativo ideias de “Embora o design de serviço costume ser relacionado a um contexto
serviço que funcionassem e como guiar/facilitar esse processo. O design B2C, considero-o extremamente útil em um ambiente de negócios B2B.
de serviço me ajudou a superar esse desafio.” Aqui, empregamos as ferramentas de design de serviço, como mapas da
— Carola Verschoor jornada do cliente e mapas de stakeholders, para a empresa com a qual
Profissional de criatividade e mudança, Holanda trabalhamos e para os clientes finais da empresa. A grande vantagem
é poder potencializar a forma de pensar do designer e enquadrar o
problema ou a oportunidade. Passamos muito tempo na linha de frente
“Eu estava enfrentando o desafio de construir um serviço multicanal de serviço, enquadrando o problema, aumentando as chances de criarmos
que fosse consistente. Precisava encontrar uma forma de visualizar os um serviço que resultará em uma melhor experiência para nossos clientes
estágios e as partes do serviço para que pudesse identificar e comunicar os e os clientes finais dos nossos clientes.”
problemas, bem como para tentar melhorar esses aspectos para todos os — Jeff McGrath
stakeholders. O design de serviço me atendeu em todos esses quesitos com Cunsultor de negócios, EUA
suas ferramentas, especificamente os blueprints de serviço, as jornadas
do usuário e os mapas de stakeholders, e me ajudou a incorporar outras
ferramentas para compreender o todo. O design de serviço também me “O design de serviço ajuda os estrategistas políticos a focarem no impacto
ajudou a montar uma base para pesquisa, que era necessária, e me serviu que uma política pública tende a exercer sobre as pessoas que fazem
de guia no momento em que tivemos de destilar as informações em um uso de serviços do governo. Ele nos possibilita prototipar as políticas já
formato que fosse gerenciável.” no início do processo, o que nos permite entender em que ponto uma
— Stuart Congdon política poderá falhar e promover melhorias que poderão funcionar
Executivo de sistemas de infraestrutura, Reino Unido no mundo real.”
— Andrea Siodmok
Designer em cargo público, Reino Unido

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Isto é Design de Serviço na Prática

1.3 POR QUE UMA ABORDAGEM DE DESIGN DE SERVIÇO?


Há muitas maneiras de criar algo ou de potencializar o valor criado de novas ofertas e serviços – e durante essas etapas, sempre acon-
DICA DE por uma organização. As pessoas que trabalham com esse tipo de tecem rodadas de iteração. Com essa forte ênfase nas iterações de
ESPECIALISTA desafio podem chamar o que fazem de engenharia de serviços, pesquisa, de prototipação e mesmo de implementação, os projetos
“É fundamental enfocar o marketing, qualidade ou simplesmente de gestão. Poucas entre elas – de design de serviço acabam tendo uma base sólida na realidade,
problema ou a oportunidade uma crescente minoria – chamam esse processo de design de serviço. pois são construídos a partir de etapas de pesquisa e testes, e não a
com cautela. Muitas empresas
Elas compartilham de uma certa atitude e, frequentemente, de um partir de uma simples opinião ou da autoridade de uma pessoa. Essa
falham porque abordam o
problema errado ou porque
conjunto de ferramentas.01 O design de serviço adota a mentalida- abordagem iterativa torna a tomada de decisão uma atividade de
perdem completamente de e o fluxo de trabalho do processo de design, combinando uma baixo risco. Em vez de nos preocuparmos em acertar de primeira,
algumas oportunidades. Parece abordagem ativa, iterativa, com um conjunto de ferramentas flexível podemos sempre desenvolver uma série de alternativas e nos apoiar
que elas dedicam pouquíssimo e relativamente simples, emprestadas do marketing, do branding, da em um processo estruturado de prototipação e testes para aprimorar
tempo desenvolvendo um
experiência do usuário e de outras disciplinas. as soluções criadas.
enfoque (e fazendo perguntas)
na linha de frente do serviço,
É justamente essa colcha de retalhos que torna o design de Muitas organizações estão em busca de uma maneira eficiente
e acabam pulando para a serviço tão poderoso. Como uma disciplina do design, o design de de trabalhar, que permita que pessoas com diferentes experiências e
solução do problema baseadas serviço foca na solução do problema certo – enquadrando o problema responsabilidades trabalhem juntas de forma significativa e produtiva
em suas inclinações próprias, ou a oportunidade de forma específica. Sendo assim, começamos por – elas buscam um “destruidor de silos”. Uma vez que as ferramentas
e não nas necessidades ou investigar as necessidades do usuário/cliente. O design de serviço do design de serviço são moldadas pelo modelo mental do design, elas
desejos dos clientes.”
nos faz investigar e questionar, utilizando uma gama de métodos de são visuais, rápidas, leves e fáceis de entender. Assim, formam uma
— Jeff McGrath pesquisa, em sua maioria qualitativos, para explorar o “como e por linguagem comum para a colaboração, e equipes interdisciplinares
que” que justifica a oportunidade a ser trabalhada. Entendermos as gostam de utilizá-las. As ferramentas podem parecer muito simplistas
necessidades, em vez de nos adiantarmos direto para uma “solução”, é à primeira vista, pois elas não tentam englobar toda a complexidade
o que viabiliza o surgimento de uma verdadeira inovação. de um sistema de serviço (já existem ferramentas excelentes para
Além disso, o design de serviço adota a abordagem dos desig- isso). Elas nos permitem filtrar a complexidade através de uma lente
ners no sentido de promover experimentos breves e prototipação, no de variadas experiências do cliente, o que torna a sua abordagem
intuito de testar, de forma rápida e barata, possíveis soluções para um muito poderosa. Até mesmo serviços com um complexo sistema mul-
problema, gerando novos insights e ideias. A partir dos testes, os pro- ticanais tornam-se mais facilmente gerenciáveis quando suas equipes
tótipos podem evoluir para pilotos e por fim para a implementação conseguem entendê-los tanto em um nível prático quanto em um
nível mais humano e empático.
01 Veja o Capítulo 3, “Ferramentas básicas do design de serviço”.

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01 Por que design de serviço? 14/15

O design de serviço não é útil apenas para criar valor para o design de serviço. Se considerarmos apenas os exemplos que constam
“usuário final” ou o “cliente”. Ele considera todo o ecossistema de neste livro, eles incluem bancos, companhias aéreas, hospitais, indús-
trias, empresas de telecomunicações, ONGs, instituições de ensino,
valor e pode incitar foco em ofertas direcionadas aos clientes finais operadoras de turismo, companhias de energia, governos e outras
de uma empresa, mas também a outros negócios relacionados a – com cada vez mais organizações voltando-se para a abordagem do
design de serviço a cada dia.
ela, seus parceiros ou colaboradores. Em outras palavras, o design
As organizações enfrentam o desafio de oferecer novos e melho-
de serviço funciona tanto para serviços públicos, B2C e B2B quanto res serviços, promovendo experiências do cliente de ponta a ponta
para o desenho de processos internos. em seus múltiplos canais. O conjunto de ferramentas emprestadas
e a abordagem pragmática e iterativa do design de serviço utiliza
ferramentas de pesquisa e compreensão, para focar nas necessidades
O design de serviço é uma atividade extremamente prática dos stakeholders, e de prototipação, para testar e desenvolver possíveis
e pragmática, o que o torna inerentemente holístico. Para criar soluções antes de serem feitos grandes investimentos. As organiza-
experiências de valor, os designers de serviço devem aprender a lidar ções podem utilizar o design de serviço para melhorar os serviços
com as atividades de bastidores do serviço02 e com os processos na que oferecem hoje e também para desenvolver novas propostas de
linha de frente, que viabilizam o sucesso do negócio, levando sempre valor, talvez baseadas em uma nova tecnologia ou em novos avanços
em consideração a implementação desses processos. Além disso, eles de mercado. O design de serviço proporciona às organizações uma
devem abordar a experiência dos diversos stakeholders de ponta a maneira de equilibrar suas necessidades operacionais comerciais e de
ponta, e não apenas em momentos isolados do serviço, e devem tam- experiência de modo robusto e acessível, oferecendo uma linguagem
bém encontrar uma maneira de o negócio ser rentável considerando comum e um conjunto de ferramentas extraordinariamente poderosas
as necessidades da organização e o uso apropriado da tecnologia.03 para projetos que sejam inclusivos e que empoderem e mobilizem
Com essas características, não é de se admirar que muitas organi- uma vasta gama de stakeholders.
zações estão implementando métodos de design de serviço sob outras
nomenclaturas, e que muitas mais estão contratando consultorias de

02 “Bastidores do serviço” se refere aos processos ou ações que costumam ficar invisíveis para o cliente,
como conferir o estoque ou recolher o lixo. Já “linha de frente do serviço” se refere às partes do processo
visíveis ao cliente.
03 No epílogo do livro Marketing 4.0, “Chegar ao UAU!”, os autores e Setiawan afirmam que: “No mundo do
Marketing 4.0, em que excelentes produtos e serviços são commodities, o fator UAU é o que diferencia uma
marca de seus concorrentes”. Um momento UAU é uma experiência surpreendente, pessoal e contagiante
que um cliente deve ter. “Empresas e marcas de sucesso são aquelas que não deixam os momentos UAU por
conta do acaso. Elas projetam esses momentos UAU com design.” Veja Kotler, P., Kartajaya, H., & Setiawan,
I. (2016). Marketing 4.0: Moving from Traditional to Digital. John Wiley & Sons, p. 168 (publicado no Brasil
pela editora Sextante, 2017).

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