Você está na página 1de 17

21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça


Processo: 27175/20.0T8LSB-A.L1 -A.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: NUNO ATAÍDE DAS NEVES
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
DECISÃO QUE NÃO PÕE TERMO AO PROCESSO
AÇÃO EXECUTIVA
COMUNICABILIDADE
DÍVIDA DE CÔNJUGES
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
IDENTIDADE DE FACTOS
TÍTULO EXECUTIVO
DECISÃO ARBITRAL
INJUNÇÃO
Data do Acordão: 10-01-2023
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I - Tendo a decisão da 1ª instância, na acção executiva, indeferido o
incidente de comunicabilidade de dívida entre os cônjuges (art. 741º do
CPC), por inadmissibilidade legal, o Acórdão da Relação que revogou
aquela decisão, julgando improcedente a exceção da inadmissibilidade
do referido incidente, constitui decisão interlocutória que recaiu
unicamente sobre a relação processual.
II – Este Acórdão teve como consequência o prosseguimento da
tramitação do dito incidente de comunicabilidade, não conhecendo do
respectivo mérito, nem ao mesmo pondo termo, pelo que não constitui
decisão que admita recurso de revista nos termos e para os efeitos do
disposto no art. 671º nº 1 do CPC;
III – Neste caso, a admissibilidade da revista fica dependente da
verificação da previsão de alguma das alíneas do nº 2 do art. 671º do
CPC.
IV - Trata-se de um incidente deduzido no âmbito de uma acção
executiva, a admissibilidade do recurso de revista está sujeita ao
disposto no art. 854.º do CPC, segundo o qual “sem prejuízo dos casos
em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça, apenas cabe revista, nos termos gerais, dos acórdãos da
Relação proferidos em recurso nos procedimentos de liquidação não
dependente de simples cálculo aritmético, de verificação e graduação
de créditos e de oposição deduzida contra a execução”.
V - De acordo com a interpretação que tem sido feita do art. 854º do
CPC por este Supremo Tribunal em diversos Acórdãos, não cabe revista
(a não ser nos casos em que o recurso é sempre admissível) dos
acórdãos da Relação que, em sede de acção executiva, não respeitem a
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 1/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

recursos nos procedimentos de liquidação não dependente de simples


cálculo aritmético, de verificação e graduação de créditos e de
oposição deduzida contra a execução”, pelo que, não estando o
incidente de comunicabilidade da dívida incluído na previsão deste art.
854.º do CPC, a revista apenas é admissível de acordo com esta
disposição legal nos casos em que o recurso é sempre admissível.
VI - Tanto o art. 854.º como o art. 672º nº 2 al. a) do CPC remetem para
o art. 629º nº 2, que prevê os casos em que o recurso é sempre
admissível, sendo que a jurisprudência do STJ tem divergido quanto à
aplicabilidade do disposto na al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC no
âmbito de recursos de decisões interlocutórias por via da referida al. a)
do n.º 2 do art. 671.º do mesmo diploma, ou no âmbito de recursos de
decisões proferidas em acções executivas em incidentes não previstos
no art. 854.º do CPC.
VII – Invocando o recorrente a contradição de acórdãos da Relação e
não entre o Acórdão da Relação (recorrido) e Acórdão do STJ (caso em
que seria pacífica a admissibilidade de recurso caso estivessem
preenchidos os pressupostos previstos na al. b) do nº 2 do art. 671º do
CPC), a revista não é admissível, já que a al. d) do n.º 2 do art. 629.º do
CPC não é aplicável aos recursos de decisões interlocutórias previstas
na al. a) do n.º 2 do art. 671.º do CPC, porquanto, no que toca ao
acórdão fundamento proferido pela Relação, não se encontram
preenchidos os requisitos de admissibilidade da revista, atendo o
sentido e alcance deste normativo, determinante para a revista em
decisões interlocutórias, numa interpretação gramatical (“letra da lei”) e
o elemento lógico (“espírito da lei”), de que resulta a exigência de que
o acórdão fundamento tenha sido proferido pelo STJ.
VIII – Tratando-se a decisão recorrida de uma decisão interlocutória de
natureza meramente processual, o art. 671º nº 2 al. a) do CPC não
abrange o caso previsto na al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC, por
razões de coerência interna do regime legal de recursos para o STJ, pois
tal implicaria admitir a maior amplitude da revista para uma decisão
intercalar (admitindo a contradição com um acórdão da Relação) do
que para uma decisão final (em que se exige a contradição com um
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça).
IX – Não existe contradição de julgados entre o acórdão recorrido e o
acórdão fundamento, quando, ambos interpretando o artigo 741º nº 1 do
CPC e ponderando a admissibilidade do incidente de comunicabilidade
da dívida em sede executiva, no acórdão recorrido o título executivo é
uma sentença proferida por um tribunal arbitral e no Acórdão
fundamento o título executivo é uma injunção à qual foi conferida força
executiva, pois que um e outro encontram a sua justificação nos
diferentes quadros fácticos que foram objecto das duas decisões
resultante da diferente natureza do título dado à execução, sendo
completamente diversos os regimes jurídicos aplicáveis à tramitação do
processo arbitral, por um lado, e do procedimento de injunção, por
outro.
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 2/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

X - Nos termos do art. 36º nº 1 da Lei da Arbitragem Voluntária, “só


podem ser admitidos a intervir num processo arbitral em curso terceiros
vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se baseia, quer
o estejam desde a respetiva conclusão, quer tenham aderido a ela
subsequentemente. Esta adesão carece do consentimento de todas as
partes na convenção de arbitragem e pode ser feita só para os efeitos da
arbitragem em causa.”
XI - Norma que não tem aplicação ao procedimento de injunção, em
cujo regime legal não existe qualquer norma similar ou sequer
equiparável.
XII - Ou seja, qualquer pessoa pode ser demandada no procedimento de
injunção, independentemente do seu consentimento, sendo plenamente
aplicável a esse procedimento o disposto no art. 34º nº 3 do CPC, o que
já não sucede no processo arbitral, em que o cônjuge da parte apenas
pode intervir se tiver aderido à convenção de arbitragem, motivo pelo
qual não pode exigir a aqui exequente que o título executivo inclua
aquele cônjuge.
XIII - Se no acórdão recorrido se defende que a admissibilidade do
incidente da comunicabilidade, quando a dívida conste de título diverso
da sentença, encontra a sua razão de ser no art. 34º nº 3 do CPC, e não
tendo esta norma aplicação em sede de arbitragem voluntária, não pode
a exequente obter o título executivo baseado em decisão arbitral
também contra o cônjuge do executado, sem que tal ficasse dependente
da vontade deste último em aderir à convenção de arbitragem.

XIV - De onde resulta com clareza que é totalmente diverso o quadro


factual na base de cada um dos arestos em confronto, o que, só por si,
afasta qualquer hipótese de contradição jurisprudencial relevante, para
efeitos do preenchimento da previsão da al. d) do n.º 2 do art. 629.º do
CPC.
Decisão Texto Integral: No incidente de comunicabilidade deduzido por Argitop SGPS, S.A.
contra AA, ao abrigo do art. 741º do Código de Processo Civil, por
apenso aos autos de execução que aquela moveu contra Carlos Adelino
no Juízo de Execução ... (juiz ...), foi proferida decisão que indeferiu o
mesmo (incidente de comunicabilidade de dívida), por
inadmissibilidade legal.
Inconformada, a exequente interpôs recurso de apelação para o
Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo que seja declarada a nulidade
da decisão recorrida, que seja admitido definitivamente o incidente de
comunicabilidade da dívida e que seja desaplicada a norma que se retira
do nº 1 do art. 741º do C.P.C., se interpretada no sentido de incluir as
sentenças dos tribunais arbitrais no seu âmbito de exclusão, pelo menos
nas situações em que o cônjuge do executado não está vinculado pela
convenção de arbitragem, por violação do disposto nos arts. 20º e 209º
nº 2 da C.R.P.

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 3/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

A recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão


recorrida.

Foi proferido Acórdão que decidiu “julgar procedente o recurso,


revogando o despacho recorrido e, em sua substituição, julgando
improcedente a exceção da inadmissibilidade do incidente da
comunicabilidade da dívida”.

Inconformada, veio a requerida AA interpor recurso de revista para este


Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do disposto nos arts. 629.º, n.º
2, al. d), ex vi 854.º do CPC, invocando a contradição do acórdão
recorrido com o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11-05-
2020, proferido no Processo n.º 1914/19.0T8LOU-A.P1, oferecendo as
suas alegações, que culminam com as seguintes conclusões:
A. O presente recurso tem por objeto o acórdão com ref. citius ...91,
proferido nos presentes autos pelo Tribunal a quo, que julgou
procedente o recurso interposto pela aqui Recorrida e em consequência,
revogou o despacho recorrido que havia rejeitado incidente de
comunicabilidade da dívida por inadmissibilidade legal, e em sua
substituição julgou improcedente a exceção de inadmissibilidade do
incidente da comunicabilidade da dívida.

Da admissibilidade do recurso
B. O presente recurso é admissível ao abrigo do disposto no artigo
629.º, n.º 2, alínea d) ex vi artigo 854.º do CPC, porquanto o acórdão
recorrido encontra-se em contradição com o acórdão proferido pelo
Tribunal da Relação do Porto16 (“acórdão fundamento”) no domínio da
mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e de
outro modo não seria possível o seu recurso ordinário, conforme prevê
o artigo 854.º do CPC.
C. Tanto o acórdão recorrido como o acórdão fundamento discutem a
interpretação do artigo 741.º, n.º 1 do CPC,
D. E ambos debatem a mesma questão fundamental de Direito,
essencial para a solução do caso: a admissibilidade do incidente de
comunicabilidade da dívida em sede executiva, quando o título
executivo não é uma sentença proferida por um tribunal estadual.
E. Sucede que, ambos apresentam critérios de interpretação
divergentes do artigo 741.º, n.º 1 do CPC, o que leva a uma aplicação
da norma em sentidos opostos, com soluções divergentes.
F. No acórdão recorrido defende-se que a dedução do incidente de
comunicabilidade da dívida em sede executiva está apenas vedada

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 4/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

quando o título executivo é uma sentença proferida por um tribunal


estadual.
G. Já no acórdão fundamento, o entendimento é de que deve ser
vedada a possibilidade de dedução do incidente de comunicabilidade
sempre que se esteja perante um título executivo, precedido de uma
fase declarativa prévia.
H. A seguir-se a orientação do acórdão recorrido, o acórdão fundamento
teria de ter decidido pela admissibilidade do incidente da
comunicabilidade da dívida em sede de execução, quando o título
executivo é uma injunção à qual foi aposta fórmula executória.
I. A seguir-se a orientação do acórdão fundamento, o acórdão recorrido
deveria ter decidido pela inadmissibilidade do incidente da
comunicabilidade da dívida em sede de execução.
Do mérito do recurso
J. A limitação prevista no artigo 741.º, n.º 1 do CPC tem por
fundamento o facto de que em sede declarativa, qualquer uma das
partes – Exequente e Executado - já poderia e deveria ter invocado a
comunicabilidade da dívida, nomeadamente através da demanda de
ambos os cônjuges, sob pena de o trânsito em julgado da decisão
precludir o seu exercício.
K. O legislador visou garantir a segurança jurídica e tutelar o cônjuge
em relação ao qual a comunicabilidade é arguida, de modo a garantir
que possa exercer o seu direito ao contraditório de forma atempada,
antes do trânsito em julgado da decisão que virá a constituir o título
executivo, evitando-se a vinculação deste a uma decisão que não
produz efeitos de caso julgado em relação a si, como sucede com a
sentença arbitral (36.º e 42.º, n.º 7 da LAV, 3.º, 55.º a contrario e 621.º
do CPC) e relativamente à qual nunca poderia exercer um contraditório
pleno, face às limitações decorrentes do n.º 1 do artigo 787.º conjugado
com os artigos 729.º, 730.º e 857.º do CPC.
L. Perante a existência prévia de uma fase declarativa, impende sobre o
credor o ónus de intentar ação declarativa contra ambos os cônjuges, tal
como impõe o artigo 34.º, n.º 3 do CPC, sob pena de preclusão do seu
direito de invocar a comunicabilidade da dívida.
M. É este o raciocínio que a jurisprudência emprega nas suas decisões.
N. Conforme refere o acórdão fundamento, no procedimento de
injunção, tal como ocorre no processo arbitral, a fase declarativa é
instaurada pelo credor, que tem a liberdade de escolher o tipo de ação a
que pretende recorrer e o ónus de invocar a comunicabilidade da dívida
ab initio.
O. Os pressupostos para a admissibilidade do incidente de
comunicabilidade da dívida em sede executiva, nos termos previstos no
artigo 741.º, n.º 1 do CPC são, conforme define o acórdão fundamento:
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 5/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

a inexistência do recurso a uma fase declarativa em que o credor


poderia e deveria ter observado o litisconsórcio necessário.
P. Padece de erro o raciocínio do Tribunal a quo que defende a
admissibilidade do incidente de comunicabilidade em sede executiva,
por impossibilidade de chamamento da Recorrente aos autos no
processo que correu termos no tribunal arbitral.
Q. Aquilo que aqui releva é a previsibilidade da comunicabilidade da
dívida e o ónus da Recorrida enquanto credora.
R. A Recorrida tinha já conhecimento prévio do casamento entre a
Recorrente e o Executado BB antes da celebração da convenção de
arbitragem.
S. Sabia também nesse momento que em caso de incumprimento, o
Executado poderia tornar-se seu devedor, e
T. Tinha nesse momento a possibilidade de solicitar a intervenção da
Recorrente no referido pacto de arbitragem ou recusar-se a celebrá-lo.
U. Querendo obter uma decisão exequível sobre os bens próprios do
cônjuge do seu devedor, a Recorrida tinha o ónus de demandar ambos
os cônjuges nos tribunais estaduais, em cumprimento do disposto no
artigo 34.º, n.º 3, 2ª parte do CPC, apresentando como causa de pedir a
violação do acordo parassocial e o casamento em comunhão de
adquiridos, concluindo com um pedido de condenação de ambos, o que
nunca violaria a cláusula compromissória, estando-se perante uma
situação de litisconsórcio necessário.
V. Não o fazendo, a dívida passa a ser tratada como própria, sem
possibilidade de reverter tal tratamento.
W. A conduta adotada pela Recorrida é processualmente proibida por
violação do princípio da boa fé processual.
X. A interpretação feita pelo Tribunal a quo não vai de encontro à
intenção do legislador acima exposta e discutida entre a doutrina e a
jurisprudência, nomeadamente as citadas nas presentes alegações de
recurso.
Y. O Tribunal a quo incorreu em erro de interpretação e
consequentemente de aplicação do artigo 741.º, n.º 1 do CPC.
Z. Padece inclusivamente de uma contradição quando apresenta como
fundamento a necessidade de distinguir o processo arbitral da ação
declarativa que corre termos nos tribunais estaduais, com base no artigo
36.º, n.º 1 da Lei da Arbitragem Voluntária, ao reconhecer que não pode
haver a intervenção de terceiros no processo arbitral, quando estes não
estão vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se
baseia,
AA. Mas depois extrai uma conclusão que se traduz na imposição a
esse mesmo terceiro de uma decisão arbitral já transitada em julgado e
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 6/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

proferida no âmbito de um processo arbitral no qual a sua intervenção


não podia ser forçada, e que não o pode vincular, pois seria
manifestamente contrário ao disposto nos artigos 36.º e 42.º, n.º 7 da
LAV, 3.º, 55.º a contrario e 621.º do CPC.
BB. O Tribunal a quo coloca a Recorrente numa situação mais gravosa
do que aquela em que se encontraria se tivesse sido forçada a intervir
no processo arbitral sem consentimento, porque força-a a vincular-se a
uma decisão de um tribunal arbitral, com a agravante de nem sequer
poder exercer o contraditório, nem em fase declarativa nem agora em
sede de execução.
CC. O Tribunal a quo criou na verdade uma situação contra legem,
porque 1) admitiu um incidente de comunicabilidade da dívida numa
ação executiva que tem por base uma sentença – o que se encontra
vedado por lei através do artigo 741.º, n.º 1 do CPC -, 2) porque força
a Recorrente a ser vinculada por uma sentença que não produz
quaisquer efeitos sobre si, uma vez que não está abrangida pelo caso
julgado (artigos 3.º, 55.º a contrario e 621.º do CPC), 3) admite uma
execução com um fim e limites que extravasam o título que tem por
base, e 4) porque a sentença em causa é arbitral e a Recorrente não
aceitou sujeitar-se à arbitragem.
DD. A interpretação do artigo 741.º, n.º 1 do CPC constante no acórdão
recorrido padece de uma inconstitucionalidade, por violação do
disposto nos artigos 2.º do CPC e 20.º da CRP, que preveem o direito da
Recorrente de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, assim
como de uma ilegalidade por impor a um terceiro que não foi parte na
convenção de arbitragem, a decisão arbitral já transitada em julgado e
proferida no âmbito de um processo arbitral no qual a sua intervenção
não podia ser forçada, e que não o pode vincular.
EE. Inconstitucionalidade esta que se invoca nos termos e para os
efeitos previstos no artigo 280.º, n.º 1, alínea b) da CRP e artigos 70.º,
n.º 1, alínea b) e 72.º, n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional.
FF. Deve por isso o acórdão recorrido ser substituído por outro que
adote a interpretação feita pelo acórdão fundamento ao artigo 741.º, n.º
1 do CPC.
Terminando no sentido de:
- Ser admitido o presente recurso, em virtude das invocadas
contradições entre as decisões proferidas (acórdão fundamento e
acórdão recorrido), no domínio da mesma legislação e sobre a
mesma questão fundamental de Direito, nos termos dos artigos
629.º, n.º 2, alínea d) ex vi artigo 854.º do CPC;
- Ser concedido provimento ao presente recurso e, em
consequência, ser revogada a decisão recorrida e substituída por
outra que julgue procedente a exceção de inadmissibilidade do
incidente de comunicabilidade da dívida.

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 7/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

A exequente recorrida ofereceu as suas contra-alegações,


culminando no sentido de a revista ser liminarmente rejeitada, por
ser ostensiva a inexistência de uma contradição de julgados, ou,
subsidiariamente, ser julgada totalmente improcedente, confirmando-se
o Acórdão Recorrido nos seus exatos termos.
1. Sobre a (in)admissibilidade da revista

Procedendo à análise dos requisitos de admissibilidade da revista, nos


termos do art. 652º nº 1 al. b) do CPC, importa desde já sublinhar que o
recurso tem por objecto uma decisão interlocutória que recaiu
unicamente sobre a relação processual.
De facto, o Acórdão recorrido, ao julgar improcedente a exceção da
inadmissibilidade do incidente da comunicabilidade da dívida, proferiu
decisão interlocutória que tem por consequência o prosseguimento da
tramitação do incidente em causa (art. 741º do CPC), pelo que tal
decisão não conheceu do mérito do incidente, nem pôs termo ao
mesmo, antes determinou o seu prosseguimento.
Assim, não constituindo o acórdão recorrido uma decisão final nos
termos e para os efeitos do disposto no art. 671º nº 1 do CPC, a
admissibilidade da revista está dependente da verificação da previsão
de alguma das alíneas do nº 2 dessa disposição legal.
Por outro lado, tratando-se de um incidente deduzido no âmbito de uma
acção executiva, a admissibilidade do recurso de revista está sujeita ao
disposto no art. 854.º do CPC, segundo o qual “sem prejuízo dos casos
em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça, apenas cabe revista, nos termos gerais, dos acórdãos da
Relação proferidos em recurso nos procedimentos de liquidação não
dependente de simples cálculo aritmético, de verificação e graduação
de créditos e de oposição deduzida contra a execução”.
De acordo com a interpretação que tem sido feita deste preceito, não
cabe revista (a não ser nos casos em que o recurso é sempre admissível)
dos acórdãos da Relação que, em sede de acção executiva, não
respeitem a recursos nos procedimentos de liquidação não dependente
de simples cálculo aritmético, de verificação e graduação de créditos e
de oposição deduzida contra a execução.
Não estando o incidente de comunicabilidade da dívida incluído na
previsão deste art. 854.º do CPC, a revista apenas é admissível de
acordo com esta disposição legal nos casos em que o recurso é sempre
admissível.
Neste sentido, entre muitos outros, vejam-se os acórdãos do STJ de 26-
10-2022 (Revista n.º 652/21.8T8PRT.P1.S1), de 21-06-2022 (Revista
n.º 381/09.0TBMNC.G1.S1), de 18-01-2022 (Incidente n.º
400/20.0T8CHV-C.G1.S1), de 18-01-2022 (Revista n.º
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 8/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

9317/18.7T8PRT.P1.S1), de 03-11-2021 (Revista n.º


10112/19.1T8PRT-A.P1.S1), e de 26-01-2021 (Revista n.º
1060/14.2YYLSB-B.L1.S1), todos publicados em www.dgsi.pt.
Também neste sentido se pronunciou ABRANTES GERALDES na
obra “Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, 2020, págs.
583 e 584, em anotação ao art. 854º do CPC, referindo que “por opção
do legislador, [no âmbito da acção executiva] ficam excluídos do
recurso de revista, em regra, os Acórdãos da Relação proferidos no
âmbito da oposição deduzida contra a penhora, de comunicabilidade
das dívidas dos cônjuges, de remição e demais incidentes ou
procedimentos declarativos não enunciados no preceito. Todavia, o
preceito ressalva os casos em que o recurso de revista “é sempre
admissível”, o que nos remete tanto para o art. 629º nº 2 al. a), b), c) e
d), como para o art. 671º nº 2 al. b)”.
Tanto o art. 854.º como o art. 672º nº 2 al. a) do CPC remetem para o
art. 629º nº 2, que prevê os casos em que o recurso é sempre
admissível.
Porém, a jurisprudência do STJ tem divergido quanto à aplicabilidade
do disposto na al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC no âmbito de
recursos de decisões interlocutórias por via da referida al. a) do n.º 2 do
art. 671.º do mesmo Código ou no âmbito de recursos de decisões
proferidas em acções executivas em incidentes não previstos no art.
854.º do CPC.
A divergência assume relevância no caso concreto dos autos porquanto
a contradição de acórdãos invocada ocorre entre acórdãos da Relação e
não em relação a acórdão do STJ, caso em que seria pacífica a
admissibilidade de recurso caso estivessem preenchidos os
pressupostos previstos na al. b) do n.º 2 do art. 671.º do CPC.
Com efeito, no presente caso, a recorrente invoca como fundamento de
recurso o disposto na alínea d) do n.º 2 do art. 629.º, alegando a
contradição do acórdão recorrido com um acórdão proferido pelo
Tribunal da Relação do Porto em 11-05-2020, no Processo n.º
1914/19.0T8LOU-A.P1, já transitado em julgado, conforme a certidão
junta aos autos.
Admitindo a interposição de recurso de decisão interlocutória com base
na referida al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC, defendendo que não é
necessário que nesses casos a oposição de julgados ocorra com acórdão
do STJ, a título exemplificativo, se pronunciaram os acórdãos do STJ
de 09-04-2019 (Revista n.º 692/11.5TBVNO.E1.S1), de 08-09-2021
(Revista n.º 122900/17.2YIPRT-C.E1.S1), de 12-09-2019 (Revista n.º
587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1), de 01-03-2018 (Revista n.º
3580/14.0T8VIS-A.C1.S1).
Neste sentido pronunciou-se também ABRANTES GERALDES na sua
obra “Recursos em Processo Civil”, 6.ª ed., Almedina, Coimbra, 2020,
págs. 63 e 65-66:
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 9/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

“De acordo com a primeira tese, o recurso de revista de acórdãos da


Relação sobre decisões interlocutórias de natureza processual
sustentados em contradição jurisprudencial ficam submetidos
exclusivamente ao regime específico do art. 671.º, n.º 2, al. b)
(pressupondo uma contradição reportada a um acórdão do Supremo),
ao passo que, para a segunda tese, essas situações também são
abarcadas pela al. d) do n.º 2 do art. 629.º. Bastando, neste caso, o
confronto com outro acórdão da Relação, tal permite que fiquem no
radar do Supremo Tribunal de Justiça questões de direito adjectivo
objecto de decisões divergentes das Relações, em casos em que o
recurso de revista não seja admitido por algum motivo de ordem legal
não ligado ao valor do processo.
(…)
Apesar dos argumentos aduzidos em prol de uma via mais estreita de
acesso ao recurso de revista, cremos ser mais ajustada a tese inversa,
ou seja, a que admite a aplicação conjunta do art. 629.º, n.º 2, al. d), e
do art. 671.º, n.º 2, al. b).
Para o efeito, destaca-se, desde logo, o elemento literal extraído do n.º
2 do art. 671.º, norma que, referindo-se explicitamente ao recurso de
revista de decisões interlocutórias de cariz formal, assegura duas vias
alternativas: a que decorre da al. b) (admissão de recurso de revista do
acórdão da Relação que esteja em contradição com acórdão do
Supremo, verificadas as demais condições aí previstas) e a que resulta
da al. a) que, remetendo geneticamente para o n.º 2 do art. 629.º, não
exclui a norma da al. d).
A par desse elemento formal, constata-se ainda, como argumento de
ordem racional ou teleológica, o facto de apenas desse modo se
garantir a efectiva possibilidade de, por intervenção do Supremo
Tribunal de Justiça, serem sanadas contradições jurisprudenciais
estabelecidas ao nível das Relações em torno de questões de direito
adjectivo que, por regra, não são suscitadas nos demais recursos de
revista”.
Em sentido contrário à aplicabilidade da al. d) do n.º 2 do art. 629.º do
CPC aos recursos de decisões interlocutórias, pronunciou-se o Acórdão
de 27-04-2022 (Revista n.º 735/14.0TBPDL-Q.L1.S1), estando aí em
causa uma decisão interlocutória numa acção executiva, em que se
defendeu que a alínea d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC não se aplica a
esse tipo de decisões, uma vez que essa norma “tem em vista
exclusivamente aqueles processos em que a lei limita absolutamente o
direito ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, como sucede,
por exemplo, nas hipóteses do n.º 2 do art. 370.º do CPCivil ou do n.º 5
do art. 66.º do Código das Expropriações (…). Pretendeu-se, dessa
forma, permitir o recurso de revista naquelas situações em que,
atendendo à especialidade da matéria (natureza da ação ou
procedimento), a lei entendeu adequado abduzir a possibilidade de
acesso a um terceiro grau de jurisdição. Deste modo, o recurso previsto
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 10/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

na alínea d) do n.º 2 do art. 629.º visa garantir (esta, repete-se, a sua


ratio) que não fiquem sem possibilidade de pronúncia por parte do
Supremo conflitos na jurisprudência das Relações em matérias que
nunca poderiam vir a ser apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça,
porque, independentemente do valor das causas a que respeitem, o
recurso para este tribunal está à partida afastado. Portanto, não é
simplesmente porque se regista uma contradição de julgados a nível
das Relações quanto à mesma questão fundamental de direito que o
recurso de revista (e ainda por cima independentemente do valor da
causa e da sucumbência) se torna sempre admissível à luz da alínea d)
do n.º 2 do art. 629.º”
Também no Acórdão de 11-02-2020 (Revista n.º 383/17.3T8BGC-
B.P1.S2), sustenta-se que a menção feita na al. a) do n.º 2 do art. 671.º
do CPC, “aos casos em que o recurso é sempre admissível” não
abrange o caso previsto na al. d) do n.º 2 do art. 629.º do CPC, pois um
entendimento diverso “levaria ao absurdo de uma contradição de
julgados em simples matéria interlocutória de natureza processual
autorizar recurso para o Supremo independentemente do valor da
causa e da sucumbência, enquanto a oposição de julgados relativa a
decisão final de mérito que viesse a ser proferida nas circunstâncias
dos n.os 1 e 3 do art. 671.º do CPC só admitiria recurso para o
Supremo (por via da revista excecional) se se verificassem os requisitos
atinentes ao valor e a sucumbência.”
No mesmo sentido, no acórdão de 30-04-2020 (Revista n.º
7459/16.2T8LSB-A.L1.S1), entendeu-se que: “por razões de coerência
interna do regime de recursos para o STJ, deve entender-se que a
norma da al. a) do nº 2 , do art. 671º do CPC não abrange a situação
prevista na alínea d) do n.º 2 do art.º 629º do mesmo Código, sob pena
de os requisitos de admissibilidade do recurso para o STJ de uma
decisão intercalar serem mais amplos do que o recurso que viesse a ser
interposto de uma decisão final.”
Neste mesmo sentido se expressaram também os acórdãos de 14-07-
2022 (Reclamação n.º 575/05.8TBCSC.W.L1-A.S1), de 11-10-2022
(Revista n.º 3450/20.2T8STS-A.P1.S1), de 27-02-2020 (Revista n.º
14021/17.0T8LSB.L1.S1) e de 29-01-2019 (Revista n.º
1410/17.0T8BRG-A.G1.S2).
No Acórdão de 12-11-2020 (Revista n.º 6333/15.4TBOER-A.L1.S1)
assevera-se que “Estando em causa um acórdão que recaiu sobre
decisão interlocutória com efeito circunscrito à relação processual, há
que convocar as regras recursivas decorrentes das als. a) e b) do art.
671.º, n.º 2, do CPC, a fim de, previamente ao conhecimento da revista,
apreciar da respectiva admissibilidade, sendo que a al. b) desta
disposição adjectiva não se confunde com a previsão contida no art.
629.º, n.º 2, al. d), ambos do CPC, tendo as mesmas aplicação distinta.
O acórdão fundamento proferido pelo Tribunal da Relação não poderá
sustentar o preenchimento dos requisitos necessários à admissibilidade
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 11/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

da revista, cujo objecto é uma decisão interlocutória, na medida em


que o sentido e alcance do dispositivo adjectivo civil que se impõe
convocar para a revista em decisões interlocutórias, numa
interpretação que convoca o elemento gramatical (“letra da lei”) e o
elemento lógico (“espírito da lei”), é muito claro ao exigir que o
acórdão fundamento, transitado em julgado, tenha sido proferido pelo
STJ.”
Assim como no Acórdão de 26-11-2020 (Revista n.º 278/19.6T8FAF-
A.G1.S1) se postula que “Os acórdãos da Relação que apreciem
decisões interlocutórias, isto é, não finais, só podem ser objecto do
recurso de revista no caso de se verificar uma das situações previstas
nas alíneas a) e b) do art. 671º nº 1 do CPCC. A hipótese prevista na
alínea a) - nos casos em que o recurso é sempre admissível - não se
aplica aos casos previstos na al. d) do nº2 do art. 629º”.
Concordamos inteiramente com este entendimento, pelo que, estando,
como está, em causa o recurso de uma decisão interlocutória, a revista
interposta com fundamento em contradição de julgados, não é
admissível à luz do art. 629º nº 2 al. d), ex vi do art. 671º nº 2 al. a),
impondo-se que o Acórdão fundamento tenha sido proferido pelo
Supremo Tribunal de Justiça, neste caso sendo patente a
admissibilidade da revista à luz do art. 671º nº 2 al. b) do CPC.
Haverá, assim, que concluir no sentido da inadmissibilidade da presente
revista.

Contudo, mesmo não concedendo na admissibilidade da revista, como


deixámos exposto, mas ainda assim concebendo tal admissão com base
na invocação de contradição do acórdão recorrido com outro acórdão
da Relação, não deixaremos de apreciar a invocada contradição de
julgados, desde já se adiantando que a mesma não se verifica.
Vejamos:
Constitui jurisprudência corrente do STJ que a admissibilidade da
revista em caso de oposição de julgados, implica a verificação
cumulativa dos seguintes pressupostos: (i) identidade do quadro factual,
(ii) identidade da questão de direito expressamente resolvida, (iii)
identidade da lei aplicável, (iv) carácter determinante da resolução
daquela questão para a decisão final e, por fim, (v) oposição concreta
de decisões - cfr., entre outros, os acórdãos do STJ de 14-03-2019
(Revista n.º 406/17.6YHLSB.L1.S1, de 30-06-2021 (Revista n.º
22121/20.3T8LSB.L1.S1), de 14-07-2021 (Revista n.º
12989/20.9T8PRT-A.P1.S1), de 14-09-2021 (Revista n.º
338/20.0T8ESP.P1.S1), de 07-10-2021 (Revista n.º
1138/13.0TBSLV.E1.S1) e de 18-01-2022 (Revista n.º
1560/13.1TBVRL-M.G1.S2)
No caso sub judice, importa apreciar a contradição do acórdão
recorrido com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 12/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

de 11-05-2020, proferido no Processo n.º 1914/19.0T8LOU-A.P1, cuja


certidão foi junta aos autos.
Alega a recorrente que tanto o acórdão recorrido como o acórdão
fundamento discutem a interpretação do artigo 741º nº 1 do CPC e
debatem a mesma questão fundamental de Direito, essencial para a
solução do caso - a admissibilidade do incidente de comunicabilidade
da dívida em sede executiva, quando o título executivo não é uma
sentença proferida por um tribunal estadual.
Segundo a recorrente, enquanto no acórdão recorrido se defende que a
dedução do incidente de comunicabilidade da dívida em sede executiva
está apenas vedada quando o título executivo é uma sentença proferida
por um tribunal estadual, no acórdão fundamento, o entendimento é de
que deve ser vedada a possibilidade de dedução do incidente de
comunicabilidade sempre que se esteja perante um título executivo,
precedido de uma fase declarativa prévia.
Acrescenta a recorrente que a seguir-se a orientação do acórdão
recorrido, o acórdão fundamento teria de ter decidido pela
admissibilidade do incidente da comunicabilidade da dívida em sede de
execução, quando o título executivo é uma injunção à qual foi
conferida força executiva. Pelo contrário, a seguir-se a orientação do
acórdão fundamento, o acórdão recorrido deveria ter decidido pela
inadmissibilidade do incidente da comunicabilidade da dívida em sede
de execução.
Compulsado o teor de ambos os acórdãos aqui em confronto, podemos
concluir que não se verifica qualquer contradição entre os mesmos, isto
pela seguinte ordem de razões:
1 - As diferentes soluções jurídicas quanto à admissibilidade do
incidente de comunicabilidade da dívida em sede executiva, quando o
título executivo não é uma sentença proferida por um tribunal estadual,
encontram a sua justificação nos diferentes quadros fácticos que foram
objecto das duas decisões, mais concretamente, na diferente natureza
do título dado à execução.
Enquanto no acórdão recorrido o título executivo é uma decisão
arbitral, no acórdão fundamento o título é uma injunção à qual foi
conferida força executiva, sendo completamente diversos os regimes
jurídicos aplicáveis à tramitação do processo arbitral, por um lado, e do
procedimento de injunção, por outro.
Estando em causa uma decisão arbitral, considerou-se no acórdão
recorrido, que “a admissibilidade do incidente da comunicabilidade
apenas quando a dívida conste de título diverso da sentença encontra a
sua razão de ser no art. 34º nº 3 do C.P.C., segundo o qual “devem ser
propostas contra ambos os cônjuges… as ações emergentes de facto
praticado por um deles, mas em que pretenda obter-se decisão
suscetível de ser executada sobre bens próprios do outro”.

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 13/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

A questão da comunicabilidade da dívida não pode ser discutida na


execução baseada em sentença, porque era na ação declarativa que
essa questão deveria ter ficado definida.
Nos termos do art. 36º nº 1 da Lei da Arbitragem Voluntária, “só
podem ser admitidos a intervir num processo arbitral em curso
terceiros vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se
baseia, quer o estejam desde a respetiva conclusão, quer tenham
aderido a ela subsequentemente. Esta adesão carece do consentimento
de todas as partes na convenção de arbitragem e pode ser feita só para
os efeitos da arbitragem em causa.”
Concluiu a Relação nos presentes autos que “há, sem dúvida alguma,
diferenças entre a ação declarativa e o processo arbitral”, pelo que
“não está, pois, em conformidade com o espírito do legislador,
interpretar o termo “sentença” empregue no art. 741º nº 1 do C.P.C.
como abrangendo a decisão arbitral.”
As considerações acima tecidas constantes do acórdão recorrido não
têm aplicação quando o título executivo é um requerimento de injunção
ao qual foi aposta a fórmula executória, pois no procedimento de
injunção não existe qualquer norma similar ou sequer equiparável à do
art. 36º nº 1 da Lei de Arbitragem Voluntária.
Ou seja, qualquer pessoa pode ser demandada no procedimento de
injunção, independentemente do seu consentimento, sendo plenamente
aplicável a esse procedimento o disposto no art. 34.º, n.º 3, do CPC, o
que já não sucede no processo arbitral. O cônjuge da parte apenas pode
intervir no processo arbitral se tiver aderido à convenção de arbitragem,
motivo pelo qual não pode exigir-se à aqui exequente que o título
executivo incluísse aquele cônjuge.
Por isso, no acórdão fundamento, se defende que tem “todo o sentido,
em consequência, que ao credor, requerente da injunção, se exija, na
fase de formação do título, a demanda de ambos os cônjuges, quando a
dívida, que pretende ver reconhecida com a aposição da fórmula
executiva, seja uma dívida comum. Dito de outro modo, e usando agora
as palavras de Miguel Teixeira de Sousa (cfr. ponto 15) “o ónus da
obtenção de um título executivo contra ambos os cônjuges não pode
deixar de implicar a preclusão da invocação da comunicabilidade da
dívida numa execução posterior baseada no título formado no
procedimento de injunção contra um único dos cônjuges”. A
interpretação que se faz do disposto no n.º 1 do artigo 741 do CPC,
sustentada na razão de ser e natureza do procedimento de injunção,
não viola qualquer normativo constitucional nem ofende, ao contrário
do que parece sustentar o recorrente, qualquer princípio do Estado de
Direito Democrático e nomeadamente o do Acesso ao Direito. Com
efeito, a possibilidade incidental de suscitar a comunicabilidade da
dívida, além de não ser um direito aplicável a todos os títulos
executivos, depende justamente da natureza destes e não se justifica na
injunção, a qual, ao invés e salvo melhor saber, deve impor ao
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 14/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

requerente o chamamento (citação) de ambos os sujeitos que, no seu


entendimento, são responsáveis pela dívida, e não apenas o de um
deles.”

Nada nos diz que a decisão proferida pela Relação nestes autos seria
idêntica caso o título executivo fosse aquele que foi objecto de decisão
no acórdão fundamento. Na verdade, segundo a argumentação seguida
pela Relação no acórdão recorrido, parece-nos que a decisão seria
oposta, no sentido da inadmissibilidade do incidente de
comunicabilidade da dívida.
Realmente, se no acórdão recorrido se defende que a admissibilidade
do incidente da comunicabilidade quando a dívida conste de título
diverso da sentença encontra a sua razão de ser no art. 34.º, n.º 3, do
CPC, tal como acima já foi referido, esta norma não tem aplicação em
sede de arbitragem voluntária. Não podia, pois, a exequente obter o
título executivo baseado em decisão arbitral também contra o cônjuge
do executado, aqui recorrente, sem que tal ficasse dependente da
vontade deste último em aderir à convenção de arbitragem.
No procedimento de injunção, o art. 34.º n.º 3, do CPC, impõe esse
ónus ao requerente sob pena de, como se afirma no acórdão
fundamento, citando o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, precludir a
possibilidade de invocação da comunicabilidade da dívida numa
execução posterior baseada no título formado no procedimento de
injunção contra um único dos cônjuges.
Do acima exposto, resulta com clareza que é totalmente diverso o
quadro factual na base de cada um dos arestos aqui em confronto, o
que, só por si, afasta qualquer hipótese de contradição jurisprudencial
relevante para efeitos do preenchimento da previsão da al. d) do n.º 2
do art. 629.º do CPC.
A divergência jurisprudencial deve assentar na mesma questão
fundamental de direito e com base em quadro factual similar. Assim, no
caso dos autos, não existe qualquer contradição jurisprudencial acerca
da interpretação do art. 741.º, n.º 1, do CPC, uma vez que as diferentes
soluções de direitos alcançadas por cada um dos arestos aqui em
confronto resultam da diferente natureza do título executivo em causa
em cada uma das respectivas acções executivas.
Como se entendeu no acórdão do STJ de 18-01-2022 (Revista n.º
1560/13.1TBVRL-M.G1.S2, Relatora Maria João Vaz Tomé), acima
citado: “não há oposição de julgados quando a base factual subjacente
ao acórdão recorrido é essencialmente diversa daquela do acórdão
fundamento”. No mesmo sentido vejam-se os acórdãos acima citados a
propósito dos requisitos da oposição de julgados enquanto fundamento
de admissibilidade de revista.
A esse propósito também no acórdão do STJ de 12-07-2011 (Agravo n.º
6/05.3TBARC-D.P1.S1, Relator Orlando Afonso, não publicado na
www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 15/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

DGSI), em que estava em causa a admissibilidade de recurso com base


em oposição de julgados no âmbito de um procedimento cautelar, se
disse que “não estamos perante interpretações divergentes na base dos
mesmos factos ou de factos semelhantes. Encontramo-nos perante uma
interpretação e aplicação do direito na base de factologia diferenciada
ainda que no acórdão recorrido e nos acórdãos fundamento persista
um elemento fáctico comum que consiste no repúdio da herança. Não
há, contudo, qualquer oposição de julgados relativamente ao cerne
interpretativo referente às consequências decorrentes da existência de
um repúdio da herança. A oposição invocada pelos recorrentes não se
funda em divergência de direito, mas em mera consequência de
factologias em si distintas, ou seja, o "periculum in mora" tratado de
forma diferente num e nos outros acórdãos, não resultou ou deixou de
resultar num e noutro dos casos, da interpretação dada ao repúdio da
herança, mas das considerações fácticas específicas de cada um
deles.”
Haverá, pois, que concluir, na leitura “abstrata” que fizemos da
admissão da revista por invocação da contradição do acórdão recorrido
com outro acórdão da Relação, nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. d), do
CPC (que acima concluímos não ser de admitir), que não deveria ser
admitido o recurso de revista por falta de verificação da oposição de
julgados.

Termos em que a presente revista merece inteira rejeição.

DECISÃO
Por todo o exposto, Acordam os Juízes que integram a 7ª Secção
Cível deste Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar a revista.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.

Relator: Nuno Ataíde das Neves


1º Juiz Adjunto: Senhor Conselheiro Sousa Pinto
2ª Juíza Adjunta: Senhora Conselheira Maria dos Prazeres Beleza

Declaração de voto do 1º Juiz Adjunto, Senhor Conselheiro Sousa


Pinto:
“Voto a decisão por entender que não se verifica contradição entre
ao acórdão fundamento e o acórdão recorrido prevista na al. d) do
nº 2 do art. 629º do CPC.”

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 16/17
21/09/23, 18:51 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

***

Declaração de voto da 2ª Juíza Adjunta, Senhora Conselheira Maria dos


Prazeres Beleza:

“Voto a decisão por entender que não se verifica contradição entre


ao acórdão fundamento e o acórdão recorrido prevista na al. d) do
nº 2 do art. 629º do CPC.”

www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb2451bcf4647bd080258934004e3332?OpenDocument 17/17

Você também pode gostar