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CONEXÃO FAMETRO:

1
ÉTICA, CIDADANIA E SUSTENTABILIDADE
XII SEMANA ACADÊMICA
ISSN: 2357-8645

DIREITO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA À EDUCAÇÃO: O


DESAFIO DA INCLUSÃO

Maria José Martins Galvão


Graduada em Serviço Social pela Faculdade Metropolitana da Grande Fortaleza - Fametro
Pós-graduanda em Educação, Diversidade e Inclusão Social pela Universidade Católica Dom Bosco - UCDB.
E-mail: mary.galv@hotmail.com

Edmara Martins de Souza


Assistente Social. Especialista em Políticas Sociais com Ênfase no Território e na Família.
Docente da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB
E-mail: ed.ucdb@gmail.com

Título da Sessão Temática: Constituição, Cidadania e Efetivação de Direitos


RESUMO

O presente estudo trata-se de uma pesquisa bibliográfica e documental que revela traços
da trajetória das pessoas com deficiência no Brasil. Tal experiência traz reflexões
primordiais e tem como objetivo enriquecer as discussões acerca dos direitos humanos
dessas pessoas dando ênfase no direito a educação. A temática vem de encontro ao
interesse de aprofundar os estudos sobre o direito das pessoas com deficiência e traz
resultados parciais sobre a problemática dos desafios da inclusão desse segmento na
educação. Compreendemos que além da existência de legislações que regulamentem e
norteiem a realização de ações inclusivas para esses sujeitos na área educacional, é
preciso que elas atendam a necessidades específicas desses estudantes nas suas mais
variadas dimensões.

Palavras-chave: Pessoas com deficiência. Direito à educação. Inclusão educacional.


1 INTRODUÇÃO

O presente estudo foi elaborado a partir da inserção da autora no curso de


Pós-graduação em Educação, Diversidade e Inclusão Social da Universidade Católica
Dom Bosco – UCDB. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica e documental que revela
traços da trajetória das pessoas com deficiência no Brasil. Tal experiência traz reflexões
primordiais e tem como objetivo enriquecer as discussões acerca dos direitos humanos
dessas pessoas dando ênfase no direito a educação.
Vale ressaltar que adotamos a concepção de Pessoas com Deficiência
(PCD’s) trazida por Ferreira (2007, p.13) ao apresentar a Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, destacando que “Pessoas com deficiência são, antes de
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mais nada, PESSOAS”. É neste sentido que nossa exposição visa mostrar a importância
da sociedade e do Estado reconhecerem que essas pessoas são dotadas de direitos,
incluindo a educação, e requerem as condições necessárias para se desenvolverem e
participarem com dignidade da vida social.

2 BREVE HISTÓRIA SOBRE AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL

Historicamente deixados à margem da sociedade, fortemente


estigmatizados, privados de liberdade e dignidade, as pessoas com deficiência vieram
lutando por melhores condições de vida ao longo da trajetória histórica do país.
Podemos entender melhor essa dinâmica quando relembramos parte do contexto
conflituoso, imerso por relações de poder e traços culturais conservadores - que foram
se transformando até a conjuntura atual e dando lugar a uma sociedade mais inclusiva.
Lembremo-nos que essa conjuntura ainda deixa marcas no tempo presente.
É preciso conhecer o traço de realidade vivenciado por essas pessoas para
entender como elas eram tratadas no passado. O quadro abaixo vem nos mostrar
algumas das peculiaridades apresentadas no contexto histórico das pessoas com
deficiência na sociedade brasileira.

Quadro 1 – Educação das pessoas com deficiência no Brasil

As pessoas com deficiência eram confinadas pela família/recolhidas pelas Santas Casas
de Misericórdia ou pelas prisões. (Não havia acesso a Educação).
Período
As pessoas com hanseníase eram isoladas no Hospital dos Lázaros,
Colonial
Ano de 1741 destinado especificamente ao acolhimento institucional dessas
pessoas. (Deficiência vista como doença).
O Decreto nº 82, de 18 de julho de 1841 determina a criação do
primeiro hospital específico para atendimento das pessoas com
deficiência - chamados neste tempo de alienados - Hospício Dom
Pedro II, vinculado a Santa Casa de Misericórdia - fundado no Rio de
Ano de 1841
Janeiro, mas só veio a funcionar em dezembro do ano de 1852. No
período republicano foi separado da Santa Casa de Misericórdia e
renomeado de Hospício Nacional de Alienados. (Deficiência vista
Período como doença).
Imperial Criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos* no Rio de Janeiro.
Atendeu inicialmente alunos de apenas duas províncias - Rio de
Ano de 1854 Janeiro e Ceará. Depois expandiu seu atendimento para as outras
províncias. (Classificado como instituição de ensino - funcionava
como internato).
Criação do Imperial Instituto dos Surdos-Mudos** no Rio de Janeiro.
Ano de 1856 (Classificado como instituição de ensino - funcionava como
internato).

Fonte: BRASIL, 2010. Dados sistematizados pelas autoras. *Atual Instituto Benjamin Constant – IBC. ** Hoje
denominado de Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES.

No Brasil Colônia (1500-1822) não existiam instituições dedicadas ao


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acolhimento das pessoas com deficiência - cabia à família cuidar de seus indivíduos
com necessidades especiais. A prática da época centrava-se na segregação e na exclusão
desses indivíduos do convívio social - e se estes causassem alguma “desordem pública”
eram mandados para as Santas Casas de Misericórdia ou até mesmo para as prisões.
(BRASIL, 2010).
No período imperial (1822-1889) percebe-se que não havia ainda grande
preocupação com a inclusão dessas pessoas na sociedade, uma vez que o contexto da
época era marcado por uma “sociedade aristocrática, elitista, rural, escravocrata e com
limitada participação política, era pouco propício à assimilação das diferenças,
principalmente as das pessoas com deficiência”. (BRASIL, 2010, p. 20). Podemos
compreender também que foi a partir dessa época que foram sendo criadas as primeiras
instituições educacionais para esse público.

Essas instituições, que funcionavam como internatos, inspiravam-se nos


preceitos do ideário iluminista e tinham como objetivo central inserir seus
alunos na sociedade brasileira, ao fornecer - lhes o ensino das letras, das
ciências, da religião e de alguns ofícios manuais (BRASIL, 2010, p. 21).

A concepção de educação destinada às pessoas com deficiência nesse tempo


ainda era incipiente, pois a deficiência ainda era vista como uma doença1. No decorrer
do tempo histórico engendraram-se novas visões em relação ao ensino ofertado para
esse grupo - que veio ganhando novas dimensões e espaço nas discussões societárias.
As pessoas com deficiência foram por muito tempo tratadas com
desrespeito, tornando-se reféns de várias atrocidades, como se fossem “coisas de
ninguém”. Mas foi a partir das lutas coletivas da sociedade, com a criação de legislações
referenciadas em tratados internacionais como a Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948 que se reconheceu que todos os seres humanos são livres e iguais em
direitos, devendo agir em espírito de fraternidade uns com os outros.

3 MARCOS REGULATÓRIOS DE INCLUSÃO DAS PESSOAS COM


DEFICIÊNCIA NA EDUCAÇÃO

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“O Positivismo e a afirmação do saber médico do final século XIX possibilitaram o surgimento de um
modelo no qual as pessoas com deficiência passaram a ser compreendidas por terem problemas orgânicos
que precisavam ser curadas. No modelo médico, as pessoas com deficiência são “pacientes” – eram
tratadas como clientela cuja problemática individual estava subentendida segundo a categoria de
deficiência à qual pertenciam. Fazia-se todo o esforço terapêutico para que melhorassem suas condições
de modo a cumprir as exigências da sociedade”. (BRASIL, 2010, p. 14).
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A educação como um campo de disputas pela hegemonia de classes, como


ressalta Frigotto (1999), foi historicamente negada para as camadas subalternas da
sociedade - e dentre estas se incluem as pessoas com deficiência. Foi um longo caminho
para que as legislações brasileiras, assim como a sociedade, reconhecessem que a
educação também é um direito desse grupo populacional, uma vez que:

A escola historicamente se caracterizou pela visão da educação que delimita a


escolarização como privilégio de um grupo, uma exclusão que foi legitimada
nas políticas e práticas educacionais reprodutoras da ordem social. A partir do
processo de democratização da escola, evidencia-se o paradoxo
inclusão/exclusão quando os sistemas de ensino universalizam o acesso, mas
continuam excluindo indivíduos e grupos considerados fora dos padrões
homogeneizadores da escola (BRASIL, 2008).

Vejamos o que trazem algumas das legislações brasileiras a respeito da


educação das pessoas com deficiência. Conforme Ribeiro, Bezerra e Holanda (2015,
p.33) a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1961 “foi uma das primeiras
políticas a tratar da educação especial para as pessoas com deficiência, apontando o
direito dos ‘excepcionais’ à educação enquadrando-os no sistema geral de ensino”. De
acordo com a referida Lei, em seu Título X - Da Educação dos Excepcionais:

Art. 88. A educação de excepcionais, deve, no que for possível, enquadrar-se


no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade.
Art. 89. Tôda iniciativa privada considerada eficiente pelos conselhos
estaduais de educação, e relativa à educação de excepcionais, receberá dos
poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos
e subvenções (BRASIL, 1961 [sic]).

A LDB de 1971 por sua vez, enfatiza em seu Art. 9 que:

Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se


encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os
superdotados deverão receber tratamento especial, de acôrdo com as normas
fixadas pelos competentes Conselhos de Educação (BRASIL, 1971 [sic]).

No ano de 1973 é criado pelo Ministério da Educação o Centro Nacional de


Educação Especial (CENESP) que passa a gerenciar o sistema de ensino destinado as
pessoas com deficiência e superdotação no país - mas ainda com ações fragmentadas,
assistenciais, com iniciativas isoladas do Estado, sem atendimento educacional
especializado a essas pessoas. (BRASIL, 2008).
No período de redemocratização do país, o movimento político das pessoas
com deficiência iniciado na década de 1970, ganhou voz e reconhecimento
(principalmente a partir de 1979), uma vez que esse grupo passou a exigir do Estado a
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efetivação dos direitos civis, políticos e sociais. Parte daí a compreensão de que o
esforço desse coletivo:

[...] reflete a intenção de rompimento com as premissas de menos-valia que


até então embasavam a visão sobre a deficiência. Termos genéricos como
“inválidos”, “incapazes”, “aleijados” e “defeituosos” foram amplamente
utilizados e difundidos até meados do século XX, indicando a percepção
dessas pessoas como um fardo social, inútil e sem valor (BRASIL, 2010, p.
14-15).

Condição esta, que vai sendo dissolvida principalmente a partir da


Constituição Federal de 1988. Na área educacional - reconhece em seu Art. 205 que “a
educação é direito de todos, dever do Estado e da família e será incentivada pela
sociedade visando o total desenvolvimento dos cidadãos e sua preparação para o
exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.” A Carta Magna ressalta ainda,
em seu Art. 208 que seja realizado o atendimento especializado para as pessoas com
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.

3.1 INCLUSÃO: precisamos falar mais sobre o assunto (Resultados)

Após a Constituição foram criadas várias legislações com princípios ligados


aos direitos humanos das pessoas com deficiência, e estas foram fortalecendo cada vez
mais a inclusão desses sujeitos na sociedade e no cenário educacional.
A LDB de 1996 é uma das legislações que inova em relação às LDB’s
anteriores. De acordo com Ribeiro, Bezerra e Holanda (2015) essa Lei inova ao dar
atenção à educação especial, detalhando como ela deve ser realizada. Além de ressaltar
que a educação desse público deve ser ofertada preferencialmente na rede regular de
ensino, como direciona a Constituição de 1988. A referida Lei dispõe em seu Art. 59
sobre as ações do sistema de ensino para a educação dos estudantes com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
Em relação à Política Nacional de Educação Especial do Ministério da
Educação de 1994, os autores supracitados destacam que ela não conseguiu trazer
práticas educativas inovadoras, consistindo apenas na homogeneização da participação
desses sujeitos orientada por um processo de integração à instrução. Por sua vez, em
2008 a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva vem trazer
tanto as condições de acesso e de permanência dos estudantes com deficiência,
transtornos globais de desenvolvimento e com altas habilidades como a importância da
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formação de professores e do Atendimento Educacional Especializado (AEE)2.


Compreendemos que além da existência de legislações que regulamentem e
norteiem a realização de ações na área da educação para as pessoas com deficiência, é
preciso que elas atendam a necessidades específicas desses estudantes nas suas mais
variadas dimensões - não os excluindo do convívio com outros alunos, mas que se
utilize de metodologias que permitam além do aprendizado, a convivência. Que esses
instrumentos normativos sejam apreendidos e colocados em prática por um viés que nos
faça compreender que:

Inclusão e participação são essenciais à dignidade humana e ao gozo e


exercício dos direitos humanos. No campo da educação, tal se refere no
desenvolvimento de estratégias que procurem proporcionar uma equalização
genuína de oportunidades. A experiência em muitos países demonstra que a
integração de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais é
mais eficazmente alcançada em escolas inclusivas que servem a todas as
crianças da comunidade (DECLARAÇÂO DE SALAMANCA, 1994).

O que ainda vemos como um entrave para a inclusão das PCD’s na educação é
o preconceito que a sociedade e o próprio meio educacional ainda cultivam. Por essa
razão além de legislações, é fundamental a atuação de profissionais que sejam
capacitados e comprometidos com os ideais de igualdade social e que lutem para que o
Estado cumpra seu papel de prover ações na área educacional dessa categoria.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A abordagem da temática demonstrou que a educação como direito das pessoas


com deficiência vem ganhando espaço na sociedade brasileira. Percebemos que as
legislações vieram e vem dando norte para a realização das ações de inclusão, mas é
necessária a colaboração da sociedade como um todo para que haja realmente a inserção
das PCD’s, não somente na educação, mas em todas as instâncias da vida social.
Entendemos, portanto, como bem dizia Bobbio (2004), que existem diversos
fundamentos de reconhecimento dos direitos humanos, e é na luta societária que eles
são reconhecidos, por isso é preciso desejá-los e persegui-los para que eles sejam
protegidos. Uma educação na perspectiva de inclusão deve seguir os preceitos de
reconhecimento dos direitos humanos impressos na Constituição Federal de 1988, os
quais comunica para a sociedade brasileira a existência de um Estado Democrático de
Direitos.

2
Definido pelo Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011.
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REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. (Tradução de Carlos Nelson Coutinho). Rio de
Janeiro: Elsevier, 2004.

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________. LEI Nº 5.692, DE 11 DE AGOSTO DE 1971. Disponível em:


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<http://www2.camara.leg.br/documentos-e-pesquisa/edicoes/paginas-individuais-dos-
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________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política


Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília:
MEC/SEESP, 2008.

FERREIRA, Antonio José. A Convenção sobre os direitos das Pessoas com Deficiência
muda a vida das pessoas. In: Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência. 2007. Disponível em: <
http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/publicacoes/convencao-sobre-os-direitos-
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FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a crise do capitalismo real. 5. ed. São Paulo:


Cortez, 1999.

NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Salamanca: sobre princípios, políticas e práticas


na área das necessidades educativas especiais. Resolução das nações unidas adotada em
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http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em: 15 set. 2016.

RIBEIRO, Renata Rosa Russo Pinheiro; BEZERRA, Tarcileide Maria Costa;


HOLANDA, Telma Regina Pessoa. História e política da educação especial: da
exclusão à inclusão. In: SANTOS, Geandra Cláudia Silva et al. (Orgs). Inclusão:
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