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Anaxágoras

Anaxágoras emergiu como uma figura de significativa influência na história da filosofia,


exercendo particular impacto sobre os pensamentos de Sócrates e Platão. Sua presença na cena
filosófica é situada na época que precede a de Sócrates, representando uma geração anterior ao
célebre filósofo.

Anaxágoras, à semelhança de Empédocles, dedicou-se a abordar o desafio do monismo


proposto por Parmênides, que postulava a unicidade da realidade desprovida de movimento.
Enquanto Parmênides não seguia tão radicalmente nessa direção, sua escola enfrentava a
questão de como explicar a diversidade das coisas em contraposição à unidade proposta pelos
seguidores do filósofo.

Distinguindo-se do modelo dos elementos gregos, Anaxágoras rejeitou a categorização


convencional de terra, fogo e ar. Essa recusa fundamentava-se em sua perspectiva de que as
entidades eram compostas por partes infinitesimais. Ele argumentava que não seria adequado
considerar o fogo e a água, por exemplo, como elementos brutos, uma vez que eram
constituídos por unidades menores e observáveis a olho nu. Essa abordagem introduziu a noção
de que todas as substâncias eram compostas por partículas extremamente pequenas e,
crucialmente, que essas partes eram incalculavelmente diminutas.

Anaxágoras avançou ao afirmar que essas partes, de dimensões tão diminutas, escapavam
à métrica e à quantificação humanas, inaugurando assim uma perspectiva científica que
postulava a existência de uma matéria fundamental, minúscula e inapreensível pelos métodos
convencionais de mensuração. Essa abordagem representou um passo significativo em direção
à compreensão científica moderna, antecipando a ideia de uma matéria fundamental subjacente
às diversas manifestações do mundo físico.

Portanto, essa matéria, composta por partes infinitesimais, encontra-se em um estado de


ordem no mundo, e não no caos. Surge então a indagação: por que essas partes são ordenadas?
Como explicar a ordem presente no cosmos, que é intrinsecamente ordenado, dado que tudo é
formado por partes incalculavelmente pequenas? Essa questão levanta um problema
fundamental: qual é a razão para a ordem no universo? Vale ressaltar que a palavra "cosmos"
em grego significa ordem.

Anaxágoras introduz um elemento crucial na análise dos pré-socráticos: o Nous, ou


inteligência. Ele questiona o que ordena a matéria, e a resposta está na presença de uma
inteligência que guia e governa o universo. A existência dessa inteligência se torna necessária
para explicar a ordem, as propriedades e a sequência observadas no universo.

Embora Anaxágoras não forneça uma explicação clara sobre a natureza dessa
inteligência, ele afirma que ela direciona e governa as coisas, conferindo a elas um propósito.
Essa ideia ecoa, de certa forma, as futuras provas da existência de Deus desenvolvidas por
Aristóteles. A noção de inteligência não é completamente elaborada por Anaxágoras, mas
representa um passo nessa direção.
A vida humana, nessa perspectiva, é instigada a buscar a ordem e a inteligência. Ao
contrário de Empédocles, cujo enfoque está no culto da natureza e dos elementos, Anaxágoras
propõe que a verdadeira natureza do universo é regida por uma inteligência. Assim, ao exercer
a inteligência e descobrir a ordem da razão e da verdade, o ser humano se aproxima dessa
inteligência e da verdadeira essência do universo.

Ao cultuar a matéria composta por partes infinitesimais, não se aproximaria dessa


inteligência. A ordem dos astros, segundo Anaxágoras, deriva dessa inteligência, conferindo à
astronomia uma lógica e uma ordem. Suas contribuições à astronomia são notáveis, incluindo a
explicação dos eclipses como eventos resultantes da posição relativa dos planetas.

O filósofo também levanta a possibilidade de vida fora da Terra, sugerindo que o Nous
pode disseminar a vida pelo vasto universo. Ele associa profundamente a noção de vida à
inteligência, indicando que a própria distinção dos seres vivos resulta da ordem governada por
essa inteligência.

Dessa forma, Anaxágoras inclina-se à ideia de que existe apenas uma entidade divina, a
inteligência, rejeitando a concepção pagã tradicional com múltiplos deuses. Essa abordagem
mais monoteísta e questionadora do paganismo estabelecido resulta em perseguições contra
Anaxágoras, pois desafia as crenças convencionais.

Seu discípulo notável, Péricles, emerge como uma figura de excelência e destaque em
Atenas. Péricles, além de suas características marcantes de inteligência e carisma, torna-se um
líder durante a Guerra do Peloponeso, destacando-se como uma das principais figuras na
história de Atenas.

Durante esse período, Atenas enfrenta desafios significativos, com a democracia muitas
vezes levando ao caos nas assembleias. Péricles, no entanto, representa o ápice da democracia
ateniense ao guiar o estado de maneira aristocrática, utilizando a retórica para persuadir as
pessoas a seguir uma direção determinada. Anaxágoras, por sua vez, desempenha um papel
fundamental como mentor de Péricles, influenciando-o a adotar uma abordagem virtuosa e a
usar a retórica para liderar responsavelmente.

Tudo indica que Anaxágoras não compartilhava a crença nos deuses gregos, assim como
Sócrates. Ele os via como metáforas, desafiando a concepção convencional e introduzindo uma
perspectiva mais abstrata e racional sobre a divindade, ao negar a existência de múltiplos
deuses, propõe um único princípio de ordem no mundo, a inteligência. A vida humana,
portanto, é instigada a buscar a virtude para se alinhar a essa inteligência cósmica. A liberdade
irrestrita é vista como propensa ao caos e à desordem, destacando a necessidade de uma cultura
de responsabilidade liderada por indivíduos notáveis, como Péricles.

Péricles emerge como o campeão dessa abordagem virtuosa, um exemplo vivo, liderando
Atenas durante a Guerra do Peloponeso. Seu comprometimento com a virtude e a
responsabilidade, influenciado por Anaxágoras, é admirado. No entanto, a história registra que,
apesar da grandeza de Péricles, sua liderança não impediu que Atenas enfrentasse desafios,
incluindo a crítica de Tucídides à cultura de irresponsabilidade na democracia.

Finalmente, nosso filósofo é posteriormente perseguido, demonstrando as tensões entre


suas ideias e os princípios democráticos. Péricles, seu mentorando, é acusado de ameaçar a
democracia, questionando os ideais da época. Essa perseguição, somada ao isolamento de
Anaxágoras, molda profundamente o pensamento de Sócrates. A influência de Anaxágoras,
muitas vezes subestimada, desempenha um papel crucial nas bases do pensamento socrático,
ajudando a moldar a visão de Sócrates sobre Deus, virtude e política.

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