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O CONCEITO PSICOLÓGICO DE ENERGIA

Toni Wolff
em: O Significado Cultural da Psicologia Complexa (3º capítulo, pp.123-154)
Springer - Berlin, 1935. Editado pelo Clube Psicológico em Zurich; homenagem a C.G.JUNG no seu 60° aniversário. (Adaptação
para estudos críticos).

Não há dúvida que todo o nosso conhecimento se inicia com a experiência; de


que outro modo poderia ser despertada a nossa capacidade de conhecer para
vir a ser exercitada, se não fosse por objetos que tangem os nossos sentidos e,
em parte, por si mesmos criam ideias e, em parte, mobilizam a atividade da
nossa compreensão para comparar, coligar ou separar tais objetos e assim
elaborar a matéria prima das impressões sensoriais em um conhecimento dos
objetos, o que se chama: experiência?
No tempo, nenhum conhecimento ocorre antes da experiência, já que com esta
inicia-se tudo.
Mas, se todo o nosso conhecimento se inicia com a experiência, ao mesmo tempo
nem tudo emerge da experiência. Bem poderia ocorrer que mesmo o nosso
conhecimento empírico fosse algo composto daquilo que nós obtemos por
impressões e daquilo que a nossa capacidade de conhecer fornece de si mesma
(apenas estimulada pelas impressões sensoriais)
KANT, Introdução à Crítica da Razão Pura.

1.1. O conceito psicológico de energia está sendo tomado do sistema conceitual da Física e emprega os seus
principais preceitos; No entanto, não é idêntico ao conceito de energia da Física e por isso não necessita
preocupar-se com todas as sutilezas ou até com os últimos conseguimentos da Física teórica.
RICKERT diz o seguinte sobre a metodologia desse problema na sua obra "Limites da formação de
conceitos nas ciências naturais": "O caminho pelo qual as ciências naturais aproximam-se do mundo corpóreo
à perfeição lógica é a eliminação dos conceitos de coisas, transformando-os em conceitos de relacionamentos".
Assim, RICKERT exclui a consideração de todas as nossas teorias físicas, por ex., a teoria da
relatividade, já que não têm nada com o seu intento de delinear a estrutura lógica das ciências naturais.
Por isso, deduz RICKERT, justifica-se "tomar em consideração o progresso das ciências naturais dos
últimos tempos, só na medida em que é necessário demonstrar: na sua estrutura lógica não passaram,
essencialmente, por nenhuma alteração. Justamente a condição do ideal lógico que servia como base para as
teorias anteriormente levantadas encontrar-se ainda oculto nas ideias mais modernas, tem que fornecer às
nossas elocubrações a força convincente. Assim, nós nos libertamos, na medida possível, do estágio lógico
atual no processo do desenvolvimento histórico das ciências naturais.
1.2. Como disciplina autônoma, a psicologia pode permitir-se "emprestar" conceitos análogos tanto das
ciências naturais como das ciências culturais, se dessa maneira puder adequadamente compreender o seu
objeto e ainda esclarecer seus empregos terminológicos . A Psicologia Complexa deve sua dificuldade quanto
a uma terminologia adequada não apenas ao fato de representar uma disciplina nova mas ainda ao seu objeto,
cuja índole só em parte é possível representar era termos racionais.
1.3. Pertence ainda ao aspecto paradoxal da psique demonstrar o par oposto energia-conteúdo, i.e., os
conteúdos psíquicos, os quais devem ser entendidos quanto ao seu sentido, mas como processos estão sendo
encarados como relacionamentos energéticos. Tais relacionamentos têm como tarefa principal considerar, não
apenas o significado momentâneo dos fenômenos quanto ao seu especial sentido mas também os nexos das
suas movimentações em relação uns com os outros.
Com isso, a Psicologia Complexa emprega o conceito de energia como um entre outros princípios "para a
seleção do essencial", com o intento consciente de uma analogia.
2.1. A Psicologia Complexa encontra no conceito psicológico de energia o correlato necessário para o seu
modo de ver a estrutura psíquica. O ponto de vista energético junta entre si os fenômenos psíquicos isolados,
em relacionamento funcional. Embora considere o significado dos fenômenos psíquicos quanto ao conteúdo,
coloca porem seu acento principal sobre os relacionamentos dinâmicos que existem entre os psiquismos: os
fenômenos ocorridos em sequência temporal condicionam um ao outro se forem considerados como
exteriorizações de um fator dinâmico a eles subjacente. Ainda mais: se um fenômeno desaparece e um outro
emerge, tais alterações são também encaradas como manifestações sempre diferentes de um mesmo processo
dinâmico, i.e., trata-se da mesma energia que sai de uma forma de emprego e ativa uma outra.
Também processos simultâneos, mas quanto à sua índole diferentes, estão entre si em relacionamento
dinâmico e ainda: para que um processo dinâmico possa emergir, tem que existir condições "desiguais".
2.2. O energetismo ora constitui uma premissa metodológica da Psicologia Complexa, ora pode ser, com o
mesmo juízo, assinalado como o substrato estrutural da psique.
Das ideações anteriores deve aparecer então, claramente, que a estrutura da psique possui um caráter
dinâmico inerente.
Mas que tais dinamismos encontram-se entre si em relacionamentos bem específicos, só se evidencia
da sequência psicológica dos fenômenos isolados— pressupondo, em todo caso, que a ideia de totalidade
psíquica constitua a base desse modo de ver. De acordo com esse pressuposto também o significado do
conteúdo dos fenômenos psíquicos só pode ser avaliado de modo inteiramente adequado, recorrendo ao ponto
de vista energético.
2.3. E uma expressão da complexidade da psique, que um modo de ver apenas não baste para a compreensão
dos conteúdos e dos processos psíquicos, mas somente a consideração de vários pontos de vista torna possível
apreender o seu objeto. Mas o aspecto dual do método psicológico partindo dos conceitos globais estrutura e
energetismo continua mesmo dentro desses dois pontos de vista. Como era necessário no caso da
fenomenologia psíquica distinguirmos entre consciente e inconsciente e ainda entre o geral e o específico,
assim também o conceito de energia apresenta um aspecto duplo.
2.4. O conceito psicológico de energia como uma analogia tomada da Física, procede de modo generalizante,
à maneira das ciências naturais, interpretando primeiro não os fenômenos isolados na sua particularidade e no
seu sentido específico, mas salientando o valor dinâmico pertinente ao ponto de vista sobreordenado de que
se originou.
Como conceito psicológico de energia, porém, tem como base a natureza psíquica e por isso não apenas
quantitativamente pode operar. O correlato necessário para isso é a compreensão qualitativa, i.e., o sentido
psicologicamente atribuído, já que a psicologia tem que lidar com seres humanos e não com corpos e processos
físicos.
2.5. A natureza psíquica, embora seja um decurso natural, manifesta-se, porém, apenas como conteúdo e
processo psíquico, i.e., sempre de uma forma específica.
O conceito psicológico de energia, então, abrange — em última análise — não apenas as relações
dinâmicas, mas também as de sentido. Por isso é necessário, também no seu emprego, o método científico-
cultural individualizante.
3.1. A psique, como um todo, é um complexo funcional de adaptação às e de orientação nas condições do
meio como também aos e nos dados internos estruturais do indivíduo. Assim, ela estabelece e determina a
relação do indivíduo com a realidade externa e com a realidade objetivo-psíquica. Tais relações são de
natureza dinâmica e não estática. As condições do meio são um processo histórico em medida maior ou menor,
já que valores econômicos, sociológicos, políticos e culturais alteram-se constantemente de modo mais rápido
ou mais lento, dependendo da época.
3.2. Do mesmo modo o indivíduo é um processo histórico em pequena escala. A psicologia do ser humano
altera-se correspondentemente em cada faixa etária na medida em que progride e também em relação com a
problemática subjetiva ou com o destino exterior. Não a estrutura inata da individualidade, mas seus efeitos
empíricos são passíveis de alterações, e com esses deve ocupar-se a psicologia empírico-científica. Ela
necessita, pois, uma compreensão dinâmica para juntar tudo que é passível de alterações sob um conceito
global, i.e., sob um conceito que abrangerá as sequências dos processos em um ponto de vista compreensivo.
3.3. Além da dinâmica da decorrência temporal dos processos psíquicos, torna-se patente ainda uma outra
série de relacionamentos, i.e., os processos coordenados entre si que decorrem de modo síncrono. Vendo de
um outro ponto de vista que não o da decorrência cronológica, quer dizer o da totalidade do psíquico, tornam-
se patentes dois dinamismos, o consciente e o inconsciente, temporalmente coincidentes e diferentes apenas
quanto à forma e ao conteúdo.
3.4. A complementariedade síncrona da consciência e do inconsciente é um fato funcionalmente evidente,
também além da compensação pelo sentido, porque é efetivo. Por isso emergiu como uma infalível regra
heurística da Psicologia Analítica , que os conteúdos que faltam na consciência condicionam uma atividade
intensificada do inconsciente e também vice-versa: uma preponderância de material inconsciente ocorre
quando a disposição da consciência é ineficiente.
Do valor superior ou inferior não é possível concluir sobre os conteúdos necessários para uma
compensação, antes trata-se da fenomenologia de uma “distribuição de forças”.
3.5. Se nos dinamismos cronológicos apresenta-se uma descrição por assim dizer, horizontal do decurso
psíquico, os processos síncronos ocorrem no eixo vertical do evento. Ambas as apresentações são encaradas
sob o ponto de vista de processos ou decursos de movimentos, os quais propõem-se como a estrutura inerente
da psique.
Daí emerge a necessidade de encontrar uma ideia que englobe as séries de relacionamentos tanto dos
decursos cronológicos como dos síncronos em um princípio sobreordenado e que esteja em condições de
considerar de um ponto de vista a oposicionalidade das sequências e as justaposições dinâmicas. Além disso
essa é a segunda exigência - deve saber explicar a série de relacionamentos diferentes quanto à forma e ao
conteúdo, de consciente-inconsciente (fenômeno síncrono) também como funcionamento dinamicamente
condicionado.
3.6. Esse princípio, então, que preenche tais requisitos é o ponto de vista da efetividade energética do psíquico
que conduz a um modo de ver energético. Nisso não apenas incidem as decorrências cronológicas e síncronas
e são dinamicamente coligadas as diferentes séries de relacionamentos síncronos, mas adquiriu-se com isso
um outro princípio heurístico de importância considerável. Tal princípio, também na Física, deu ao conceito
de energia seu significado sobreordenado, i.e., trata-se do princípio da substituição das relações qualitativas
por quantitativas ou do "efeito de forças" pela "função efetiva".
C. G. JUNG: "Ensaio de uma apresentação da teoria psicanalítica". 1913. Leipzig e Viena. Ef.
Ed.Deutiche:
"Como na antiga ciência natural falava—se sempre sobre os efeitos recíprocos na natureza e tal
modo de ver antiquado foi substituído pela lei da conservação da energia, assim tentamos nós
aqui no campo da psicologia, substituir os efeitos recíprocos das forças anímicas entre si
coordenadas por uma energia, pensada como homogênea. Em termos mais estritos também as
forças físicas não se transformam uma na outra, mas a energia muda a forma de se manifestar.
As forças são fenomenais, aquilo que basicamente reside nos seus relacionamentos equivalentes
é o conceito hipotético de energia, o qual, naturalmente, é inteiramente psicológico e não tem
nada com a assim chamada realidade objetiva.
JUNG originalmente ("Sobre a psicologia da Demência Precoce") empregou a expressão energia
psíquica e depois a substituiu (esteando-se no termo libido de FREUD mas também ampliando-o) pelo
conceito de libido. (Tal ampliação e dessexualização em "Transmutação e Símbolos da Libido" estão
extensamente fundamentadas e comprovadas). O conceito de libido corresponde inteiramente ao conceito
psicológico de energia, que JUNG emprega já exclusivamente, nos últimos anos. Na obra acima citada,
"Ensaios de uma apresentação da teoria psicanalítica", ambas as expressões são ainda usadas como
equivalentes. "Queremos apontar ao conceito de libido aquela posição que realmente lhe cabe, i.e., sem mais
o energético, para que estejamos em condições de compreender o evento vivente energeticamente e substituir
a noção antiga de "efeito recíproco" por relações absolutas de equivalência. Nós devemos a compreensão
energética também a possibilidade das imagens dinâmicas e dos sinais de relacionamento que, no caos do
mundo psíquico são, para nós, de valor inestimável".
O nosso trabalho emprega exclusivamente a nova terminologia, i.e., fala sobre conceito psicológico de
energia e de modo de ver energético. Tais expressões não são ainda aceitas amplamente, por isso é preferível
substituir simplesente a costumeira denominação "libido" por "energia psíquica".
3.7. Como para a Física, também para a Psicologia Complexa a compreensão energética é de inestimável valor
metodológico porque por ela o “conceito de coisa” será substituído pelo “conceito de relação”. Já que na Física
a energia não possui “nenhuma existência identificável” (Sir JAMES JEANS: “As novas bases do
conhecimento da natureza”), também a energia psíquica “não apenas não é concreta ou conhecida, mas é
justamente um X, uma mera hipótese, uma imagem ou um ‘tento’”. ( JUNG: “Ensaio de uma apresentação da
teoria psicanalítica”).
3.8. Com o conceito psicológico de energia então, não se explica a substancia psíquica, mas os processos
psíquicos são por ele entre si colocados em quantitativos relacionamentos dinâmicos de movimentação e
apenas tais relacionamentos estão sendo formulados pela compreensão energética. Assim, a energia constitui
uma noção abstraída desses relacionamentos de movimentação dinâmica" ("Sobre o Energetismo da Alma").
Trata-se, em primeiro lugar, nem de conteúdos específicos, nem de qualidades, mas de relacionamento dos
fenômenos, sob o ponto de vista de intensidade e de estados de tensão. Seu valor energético é unicamente o
valor da efetividade e fora de qualquer valoração de um ponto de vista não energético (por exemplo, moral,
estético e até quanto a um conteúdo).
3.9. Com a compreensão energética do psíquico também não está conectada uma explicação dos processos
psíquicos em geral, só de um determinado aspecto deles. Já que a energia como tal não é tangível nem visível,
mas sempre aparece em e por formas específicas de manifestação, os fenômenos psíquicos devem ser
compreendidos e avaliados também por um outro ponto de vista que não o dinâmico, quando se trata de
significado não energético, mas de conteúdo. Esse aspecto pertence ao capítulo da ESTRUTURA (2º capítulo).
4.1. No campo do conceito psicológico de energia propõem-se tanto princípios paralelos ao conceito físico de
energia como também específicas diferenças psicológicas.
Aos princípios paralelos pertencem: o princípio de equivalência - i.e., a transferência de uma soma
determinável de energia de uma condição para uma outra - e o conceito de entropia, i.e., o movimento para
um equacionamento energético e o decurso irreversível. A cada princípio é inerente a ideia de uma queda de
potencial: uma transposição de energia só ocorre dentro de uma diferença de nível.
4.2. As variantes e diferenças do modelo físico, psicologicamente condicionadas, baseiam-se no fato de que
na psicologia não se trata de corpos anorgânicos e processos mecânicos, mas de entes psíquicos viventes. Por
isso o energetismo psicológico tem que considerar as particularidades características do seu objeto e
transformar, correspondentemente, o modelo da Física, e se for necessário, até ultrapassá-lo.
4.3.1. A tais modificações corresponde, primeiro, o conceito do fator de extensidade, o qual circunscreve a
determinação ou concretização dinâmica sempre existente no fenômeno, i.e., a forma e o conteúdo da energia.
4.3.2. Em segundo lugar; a intervenção, possível até certo grau, no decurso entrópico irreversível na natureza,
o que difere de uma intervenção no processo na natureza por uma máquina, pelo fato de que a consciência,
como "interventor" constitui tanto a premissa como também — em última análise — o produto da substância
psíquica em que faz sua intervenção.
4.3.3. Uma terceira diferença do modelo da Física é a possibilidade e a necessidade - patentemente conectada
com aquela capacidade estrutural de intervir - de separar-se do Psíquico-Total como sistema parcial energético
e encerrar-se contra o sistema objetivo-psíquico.
4.3.4. E como uma quarta modificação está sendo dada - ao contrário - a possibilidade de relacionar entre si
os sistemas parciais em si encerrados e coligá-los.
4.4. A formação e o encerramento de um sistema parcial ocorre nos últimos anos da infância e durante a
juventude, quando a consciência do Eu distingue-se do Psíquico-Total e afirma-se contra este, constantemente
retirando dele energia. Nessa idade o potencial maior reside na consciência e o objetivo-psíquico constitui um
sistema apartado e relativamente inefetivo. Ao chegar a segunda metade da vida, no entanto, seu valor crescera
e com isso a coligação entre si dos dois sistemas parciais, inconsciente-consciente, torna-se necessária. Nessa
fase o sistema parcial objetivo-psíquico tem, durante certo tempo, o potencial maior, que paulatinamente chega
a se equacionar com o sistema consciente. Ao mesmo tempo, com a integração do sistema parcial inconsciente,
não ocorre porém, um tal equacionamento de energia do qual possa resultar uma condição entrópica; antes
existe até quase o fim da vida um estado de tensão energética e assim, uma diferença de níveis.
4.5. A causa disso é que, pelo equacionamento dos dois sistemas parciais, estabelece-se uma distribuição
inteiramente alterada de forças, de modo que o movimento energético oscila entre os dois sistemas parciais,
os quais, dentro do sistema total psíquico constituem dois sistemas abertos um para o outro e o sistema total
possui o potencial mais alto. Tais processos estão bem de acordo com uma compreensão energética, se não
nos atemos muito estreitamente ao conceito de energia da Física, mas antes às determinações características
do conceito psicológico. Isto seria, em todo caso, a base última das específicas movimentações e transposições
da energia psíquica, já não é acessível a uma explicação e pertence às singularidades da existência mesma. 0
modo como o corpo vivo afasta-se do modelo meramente físico, revela-se na sua contraparte interna, no
psíquico que - como diz Sir JAMES JEANS - "é dotado com a capacidade de - dentro de determinados limites
- esquivar-se das leis da natureza".
5.1. Também naqueles princípios que andam paralelos com os sistemas de referência da Física, o
"empréstimo" não pode ser exato, tratando-se de ser vivente. Pela mesma razão não é possível, porém, manter
aparte paralelos e diferenças psicológicos já que ambos estão se interpenetrando.
5.2. A primeira exigência de uma determinabilidade energética é a medição ou avaliação de quantidades
energéticas. Medições são possíveis apenas em sistemas parciais fechados e ainda tais sistemas estão sendo
artificialmente separados em prol da observação. No caso de medições exatas não se trata de sistemas parciais
energéticos naturais: consciente-inconsciente, mas de limitações intencinalmente traçadas dentro de
determinados moldes. Em tais sistemas parciais isolados a quantidade energética pode ser determinada de
modo exato-objetivo. Isto, por exemplo, é possível pela experiência de associações, através da medição do
tempo de reação e constatação exata de outras marcas de complexos. Também a psicologia experimental
possui procedimentos para determinações exatas, ao registrar alterações psicológicas em estados afetivos,
avaliando assim a intensidade da força do afeto.
5.3. Em segundo lugar
"possuímos um sistema altamente diferenciado para reconhecer e avaliar atuais manifestações
de afetos nos outros: para isso existe um instinto direto para reconhecer, que os animais também
têm numa medida bem alta. Percebemos já as oscilações emocionais mais leves nos outros e
temos um senso bastante refinado quanto à qualidade e quantidade dos afetos dos outros"
("Sobre o energetismo da alma").
Até certo grau isto vale também para os nossos próprios afetos.
5.4. A experiência e a observação sempre recorrem apenas a menores sistemas parciais. Uma exata e completa
determinação de quantidade na Psique Total nem seria possível, porque não constitui um sistema
absolutamente fechado em termos temporais e porque uma inteira biografia desde o nascimento até a morte
não pode ser submetida a tal investigação. Por isso apenas determinadas e delimitadas fases temporais são
acessíveis a uma percepção energética.
5.5. Algo semelhante ocorre com um ponto de vista de certa maneira espacial. Aí também não pode ser
determinado de modo certo o perímetro total dos processos psíquicos, já que nunca são todos ao mesmo tempo
conscientes e por isso o sistema não pode ser delimitado.
Além dessas restrições especificamente psicológicas, uma absolutamente exata determinação de
quantidade da Psique Total nem é possível por razoes metodológicas gerais, já que cada observação constitui
uma intervenção que altera o objeto a ser observado.
5.6. Ocupando-se com o sistema parcial a ser examinado no momento atual, este seria fechado no sentido de
que o indivíduo, embora em contato constante com o meio externo, suas ações e reações em relação com este
sistema originam-se exclusivamente da sua psicologia específica, i.e., individual. A avaliação energética tem
que se manter, por isso, exclusivamente nesse espaço interno individual, encarando o meio apenas como
material e mobilizador.
5.7. Assim, tanto no ponto cronológico como no ponto síncrono podem ser constatadas quotas avaliáveis de
energia, as quais estão em relação, no primeiro caso, com uma temporal, e no segundo com uma, por assim
dizer, espacial alteração do estado, Por exemplo, cada um conhece pela sua experiência, situações nas quais
alguém diz: "Anteriormente tive interesse por isso e por aquilo e tal interesse desapareceu totalmente", ou
"Anteriormente eu podia sentir e perceber de modo muito mais intenso, mas agora tudo aparece meio
indiferente". Aplicando isso em uma condição espacial: "Eu quiz ou devia empenhar-me em certas coisas,
mas apesar de todo o esforço da vontade, simplesmente não estou em condições de criar a energia necessária
para isso..."
5.8. Daí propõe-se o emprego da primeira lei principal do energetismo; a energia não pode originar-se de nada
e não pode tornar-se em nada; a soma de energia num sistema fechado permanece então, constante.
Psicologicamente isto significas a energia investida numa forma anterior de uso, retirou-se dela, ativando um
outro conteúdo para mim desconhecido. Ou, no segundo caso: a energia não está à disposição do consciente,
então tem que estar no inconsciente.
5.9. No emprego do conceito de constância, psicologicamente não o princípio da conservação da energia, mas
o princípio da equivalência é o válido. De acordo com este último: se qualquer energia abandona um
determinado estado, em outro ponto aparecerá uma quantia igual da mesma ou de uma outra energia.
Psicologicamente isto significa que uma atividade psíquica que se tornou obsoleta será substituída por
uma outra atividade de igual intensidade energética, i.e., só pode ser substituída por uma atividade de valor
equivalente.
5.10. “A experiência prática nos ensina, em geral, que uma atividade psíquica só pode ser substituída
em termos equivalentes; assim, por exemplo, um interesse patológico, uma fixação em um sintoma, só
pode ser substituída por uma ligação igualmente intensa a um outro interesse e por isso um
desligamento da libido do sintoma, sem substituição adequada nunca ocorrerá. Se a substituição for de
menos valor energético, sabemos logo que uma quota-parte da energia encontra-se em qualquer outro
lugar, se não no consciente, então na inconsciente formação de fantasias ou em uma perturbação das
‘partes superiores’ das funções fisiológicas"("Sobre o energetismo da alma").
5.11. E no segundo caso: se uma quota de energia ativou uma nova forma de uso, uma quantia correspondente
de energia retirou-se, eo ipso, de uma forma anterior de emprego. A nova forma de manifestação de energia
pode já estar presente na consciência sem que seja reconhecida a transposição equivalente da forma anterior
desaparecida. Nesse caso há uma inconsciência apenas sobre a correspondência entre o estado anterior e a
atual condição energética.
5.12. Mas pode ocorrer, com a mesma frequência, que uma quota de energia desapareceu por completo sem
que na consciência possa ser constatada uma formação substitutiva. Nesse caso de acordo com o princípio de
equivalência, pode ser percebida uma atividade intensificada do inconsciente. A quota de energia que
desapareceu da consciência “constelou” então o inconsciente e encontra-se lá pronta para novo emprego, no
caso da nova condição energética poder ser conscientizada. A atividade inconsciente, então, adquire aquele
valor de intensidade que se retraiu do uso consciente.
5.13. A fenomenologia dessa atividade inconsciente pode apresentar-se na forma de sonhos especialmente
vivos, fragmentos de peculiares fantasias e semelhantes. A manifestação mais frequente é a formação de
sintoma que interrompe o decurso consciente com extensão ampla e com a mais variada índole. Estende-se
desde um nervosismo comum, inquietação interior, repentinas explosões afetivas, vazio ou tristeza
inexplicáveis, atividade exagerada e ansiedade incompreensível, até perturbações sérias da consciência, como
depressão, estado abúlico, disfunções em áreas importantes, ideias obsessivo-compulsivas e abalamento
nervoso, ou até a escal inteira de sintomas corpóreos psicogênicos.
5.14. A formação de sintoma então, é a substituição equivalente do valor energético que desapareceu da
consciência. Tal constatação, porem, não é apenas uma dedução teórica tirada da visão de complementariedade
entre consciência e inconsciente mas um fato da experiência com base em material empírico.
"Quando a análise desse sintoma consegue reconduzir à consciência tais conteúdos ocultos, via
de regra é possível comprovar que a quota de libido que desapareceu da consciência criou uma
configuração no inconsciente, a qual apesar de toda a sua diferença, tem em comum não poucas
feições com aqueles conteúdos conscientes que perderam a sua energia. É como se a libido
tivesse levado consigo determinadas qualidades para o inconsciente, o que com frequência se
percebe com tal nitidez que já do seu caráter é possível reconhecer: de onde se origina a libido
que ativou o inconsciente". ("Sobre o energetismo da alma").
5.15. Com essa constatação está sendo formulado, ao mesmo tempo, um outro fato psicológico, o qual JUNG
circunscreve com o conceito de "fator de extensidade". (JUNG tomou o conceito do fator de extensidade de
ED. von HARTMANN. Quanto à empiria desse deste fator lê-se especialmente em “Transmutações dos
Símbolos da Libido”). Isto significa que o “volume” de energia que se fixa numa configuração não pode ser
transposto sobre uma outra sem transpor também partes daquela configuração. O fator de extensidade outorga,
então, à nova forma de condição energética sua determinação dinâmica.
5.16. O fator de extensidade psicológico tem, então, como consequência, que a energia não abandona uma
configuração como uma mera intensidade, transpondo-se inteira para uma nova, mas os caracteres da
configuração anterior em que a energia estava investida são transpostos para o novo fenômeno e este adquire
qualidades as quais estavam fixadas também na anterior.
5.17. O conceito do fator de extensidade conduz, com isso, ao modo e à maneira da transposição da energia,
a qual é de especial importância para o energetismo psicológico, tendo por isso suas específicas destinações
psicológicas.
6.1. A Psicologia Complexa emprega, em vez do pronunciamento válido na Físicas "uma quota de energia
transfere-se de um sistema ou estado para um outro", expressões como deslocamento e transmutaçao da
energia.
6.2. Deslocamento significa um decurso natural deixado para si mesmo, i.e., apenas uma mera ativação do
inconsciente, por exemplo: a intensificação de sonhos e fantasias e formações substitutivas de conteúdos
inconscientes em forma de sintomas.
6.3. Transmutação ou também transformação, ao contrário, corresponde a transposição intencional, como
ocorre na Física com a ajuda de máquinas. Em termos psicológicos, por isso, a transmutação energética exige
uma intervenção no mero decurso, i.e., a conscientização ou a inclusão dos conteúdos inconscientes
constelados pelo processo energético de um lado, e do outro um posicionamento consciente frente a eles.
6.4. A ativação como mero deslocamento faz evidente o fator de intensidade: o valor energético desaparecido
da consciência está sendo transposto de modo equivalente mas não está, de modo equivalente,
psicologicamente transmutado. A intensificação do decurso inconsciente, funcionalmente não constitui
nenhuma adequada formação substitutiva, o que pode ser visto mais claramente nos sintomas neuróticos, os
quais atuam como mera perturbação do decurso consciente.
6.5. São fenômenos de congestionamento do processo energético causados pela falta de naturais quedas de
potencial, ou antes, pelo impedimento que obstaculiza a natural queda de potencial que poderia conduzir a
energia a uma outra condição. Apenas a consideração do fator de extensidade permite aquela intervenção que
a nova condição energética transmuta de modo equivalente também psicologicamente. i.e., de acordo com o
sentido.
Com isso levanta-se a exigência de empregar também a lei de entropia como modelo. O princípio da
equivalência só pronuncia que transmutações de energia de valores iguais ocorrem. Nada diz sobre a espécie
do processo e se e como originam-se movimentações de energia.
6.6. Uma movimentação energética só ocorre se há diferença de potencial. A transformação das formas de
energia está ligada à ocorrência de diferenças de intensidade. Cada condição energética transpõe-se de pontos
de intensidade maior para os de intensidade menor. Movimentação só acontece onde há queda de potencial,
i.e., diferenças energéticas de níveis e isso é o mesmo que a transmutação da energia de uma condição a outra.
6.7. O conceito aqui empregado da "diferença de potencial" vem da termodinâmica e compreende em si ainda
o pronunciamento de que transposições de energia dentro de um sistema natural fechado tendem ao
equacionamento da queda de energia, i.e., diferenças de valores do sistema total transpõem-se de um estado
indeterminado para um estado determinado. Quando ocorreu um completo equacionamento e se conseguiu
um estado em que não existem mais diferenças de intensidade, cessa qualquer alteração e o processo chega a
uma parada. A energia não se transpõe mais em termos de equivalência porque está sendo distribuida de modo
inteiramente igual. A expressão dessa lei é o princípio de entropia, significando a irreversibilidade do decurso
energético num sistema natural.
6.8. Na natureza "não viva" os processos energéticos decorrem sempre de modo entrópico, i.e., de uma
maneira que a energia do estado de intensidade mais alta transpõe-se a um estado de intensidade mais baixa.
O contrário nunca acontece só por si mesmo. O processo energético tem, então, determinada direção. Na
natureza, deixada para si mesma, é irreversível.
6.9. Por uma intervenção no decurso natural, porém, pode ser obtido trabalho da intensidade maior e, dessa
maneira, em parte reverter o processo energético e com isso a chegada ao estado final entrópico está sendo
em maior ou menor parte impedido. Toda a vida orgânica edifica-se sobre tal fato. Em relação com a natureza
concreta o meio da intervenção é a técnica; invenções técnicas mais simples são também possíveis em vários
animais.
6.10. O fato de estar ligado com quase todos os processos o desenvolvimento de calor e o equacionamento das
diferenças de temperatura com nenhum meio pode ser inteiramente cancelado, cada transposição de energia,
obtida por trabalho está coligada com uma parcial perda de energia. Num sistema fechado - i.e., num sistema
em que não é possível nenhuma condução de energia de fora - por isso aumenta pelos processos por si mesmos
ocorridos aquela soma de energia da qual já não pode ser obtida nenhum trabalho ou, com outras palavras, a
que não pode ser transposta mais em termos equivalentes.
7.1. O problema central do energetismo psicológico é o problema da transposição adequada de energia. Por
isso é necessário examinar as equivalências psicológicas da queda de potencial e do conceito de entropia.
Isto significa que só podemos investigar os correspondentes relacionamentos de movimentações.
Como a consciência humana inventou máquinas para intervir no decurso entrópico da natureza, assim
encontram-se na psique mesma - como pressuposto da consciência - processos que também intervém no
decurso irreversível da natureza psíquica. Até poder-se-ia dizer; como na natureza externa o segredo da
matéria viva furta-se do decurso mecânico da Física, assim a consciência é o fator misterioso que está em
condições de transmutar em valores superiores - sem considerar as leis inerentes da entropia - o ente psíquico
e meramente natural.
7.2. Sir JAMES JEANS em "As novas bases do conhecimento da natureza" descreve a entropia e a intervenção
nela com a imagem seguinte:
E necessário definir a entropia, em geral, pelo modo como a um estado mais frequente sempre
cabe mais entropia do que a um estado menos frequente. Assim a entropia será também a medida
de 'frequência' de uma condição dada. A condição final (entropia) evita qualquer tipo de
acumulações, sejam elas de substâncias específicas ou de energia. Na 'condição mais frequente'
tanto a matéria como a energia são igualmente distribuídas.
Mesmo assim um ser de um outro mundo, observando com atenção adequada a nossa Terra,
notaria sinais que o fariam pensativo e o levariam à suposição se aqui não se encontram,
surpreendentemente, exceções locais das leis gerais de entropia. Do ponto de vista puramente
físico, por exemplo, o ouro é um metal bem comum. As leis da natureza não o favorecem nem
o tratara de modo especial. Mesmo assim o nosso visitante poderia observar que todo o ouro do
mundo, originalmente distribuído de modo relativamente igual sobre todas as partes da Terra,
mostra a tendência de se acumular em poucas e pequenas partes, o que parece contradizer mais
patentemente a segunda lei principal da termodinâmica. Do mesmo modo, de acordo com essa
lei, não deveria ocorrer fogo, só assim, mesmo admitindo que possa ocorrer ocasionalmente.
Tais transgressões ocasionais invariavelmente deveriam ser mais prováveis quando o tempo é
quente e seco. Ao contrário, o nosso visitante descobriria não apenas inúmeros fogos sobre a
terra mas constataria que ocorrem com especial frequência quando o tempo é frio e úmido; até
o perceberia em número maior naquelas partes da Terra que estão cobertas com a neve de
inverno do que nas áreas tórridas do equador. Ele constataria ainda que pequenas acumulações
de gelo aparecem especialmente quando o tempo é quente e seco.
A chance para a ocorrência de todos esses eventos no decurso normal de uma natureza intata
seria da mesma ordem de grandeza do que o congelamento de um pequeno caldeirão de água
colocado sobre o fogo.
Um levantamento estatístico quanto às transgressões mais grossas contra a segunda lei
demonstraria que os ninhos de criminalidade podem ser encontrados justamente naquelas áreas
que nós denominamos centros de civilização. Matéria 'inanimada' obedece incondicionalmente
a lei, mas aquilo que nós chamamos 'vida' ' furta-se a ela com resultado variado. Seria bem
razoável até definirmos a vida como caracterizada pela capacidade de furtar-se a essa lei.
7.3. Logo que passamos do pressuposto teórico do conceito de energia ao seu emprego prático, estamos
perante formas específicas de manifestação da energia. Na Física, de modo abreviado, fala-se de energia
elétrica, energia química, energia do carvão, energia do vapor, etc., e com isto o conceito de energia está sendo
concretizado e identificado com as substâncias submetidas à visão energética.
7.4. Na psicologia ocorre o mesmo. Movimentação energética só é visível em virtude de determinados ou
determináveis processos e conteúdos e o ponto de vista energético não pode ser deles apartado. O conceito
valórico de energia como circunscrição de processos de movimentos, embora ocupe um ponto superior, está,
porém, ao mesmo tempo, coligado com outros conceitos psicológicos de valores.
7.5. O valor energético de um processo é também simultaneamente de determinação e significação quanto ao
conteúdo, como por exemplo, os movimentos da progressão e da regressão ou os da extraversão e introversão.
E além dos valores psicologicamente determinados são também válidos, ao mesmo tempo, valores culturais
gerais como o valor ético, a noção da diferenciação da consciência, etc.
Com isso, no emprego do conceito psicológico de energia serão também incluídos momentos do
método científico-cultural e mui especialmente as premissas da Psicologia Complexa em relação com a
estrutura e a fenomenologia da Psique.
7.6. Uma premissa específica constitui a atividade criativa da psique como algo não fundamentável mas,
empiricamente, a causa última para movimentos e transposições de energia. Na medida em que podem ser
observadas transformações energeticamente equivalentes, trata-se de princípio paralelo ao modelo da Física.
A diferença psicológica disto reside no fato de que, funcionalmente e quanto a conteúdo, novos valores podem
manifestar-se.
JUNG: "Psicologia Analítica e Visão do Mundo" em "Problemas Psíquicos do Presente
"Observado desse lado (i.e., do lado da atividade positiva) o inconsciente aparece como a
totalidade de todos os conteúdos psíquicos in statu nascendi"
Com isso, o psíquico intervém, via de regra, no decurso irreversível. A consciência, no entanto, não
pode intervir nisto de modo ilimitado porque a transposição energética es tá ligada a determinadas condições.
7.7. Pertence à índole criativa da psique que a sua estrutura está caracterizada pelas intervenções no decurso
meramente natural. A criação da consciência e a possibilidade da diferenciação e ampliação desta, constitui
sua intervenção cardinal. De outro lado parece estar conectada com essa experiência também uma intenção
exatamente determinada, porque depende inteira e incondicionalmente da disposição e do esforço deste seu
produto o conseguimento de intervenções posteriores e transformações adequadas. Nisso, porém, apenas o
mero processo natural psíquico será transformado em cultura, i.e., em estado consciente, mas no entanto, só
quando as leis inerentes da natureza psíquica estão sendo, também, observadas.
8.1. O princípio superior da Psicologia Complexa: a complementariedade da consciência e do inconsciente
(ou Objetivo-Psíquico) e a compreensão básica do Psíquico-Total recebem sua fundamentação, antes de tudo,
do energetismo psíquico.
8.2. Visto energeticamente, o Psíquico-Total constitui um sistema energético relativamente fechado. Não pode
ser reduzido a processos corpóreos nem é mero produto das influências genéticas e do meio, mas constitui o
dado autônomo e inerente de um indivíduo. Nos atuais seres humanos ocidentais e civilizados o sistema total
separou-se em dois sistemas parciais relativamente fechados um para o outro e por isso constituem dois
sistemas em si fechados.
8.3. A orientação psicológica do indivíduo hodierno dirige-se inteiramente ao sistema consciente. Este é
caracterizado por valores culturais ou ao menos de civilização e pela sua coligação com o Complexo-Eu. Sua
função é a relação do indivíduo com a sua própria pessoa e com o mundo exterior.
8.4. O sistema inconsciente (ou Objetivo-Psíquico), primeiro era acordo com sua índole e segundo em virtude
da sua não-coligação com o sistema consciente, é natureza, i.e., natureza psíquica. E caracterizado pelo
decurso de arquetípicas constelações energéticas. Sua função é o equacionamento do sistema consciente em
conexão com os dados coletivos, objetivo-psíquicos. Tal função, porém, só pode executar se estiver coligado
cora o sistema consciente. A ligação dos dois sistemas entre si produz uma alteração, i.e., uma expansão do
sistema consciente pela qual ambos os sistemas tornam-se sistemas abertos dentro do sistema abrangente do
Psíquico-Total.
8.5. O processo de comutação energética decorre tanto no sistema parcial consciente como no sistema parcial
inconsciente, com diferenças, no entanto, características.
O inconsciente pessoal pertence, energeticamente, ao sistema consciente, já que seus conteúdos estão
psicologicamente ligados ao Complexo-Eu e por isso podem ser assimilados pela consciência.
8.6. Na infância mais tenra ambos os sistemas parciais são ainda individidos. No entanto, a formação do
Complexo-Eu e com isto da consciência - por sua inexplicável intervençao no decurso da natureza - logo
adquire uma consistência, a qual possibilita ao jovem isolar-se paulatinamente frente às quedas de potencial
(descargas) do sistema total.
Tal isolamento (fechamento) do sistema consciente frente ao sistema Psíquico-Total e o problema
psicológico da infância - um problema que, quanto à importância e dificuldade, não se deve ter em pouca
conta. Há crianças que nunca conseguem passar por tal processo. Seus paralelos filogenéticos podem bem
elucidar esse problema. Sua sedimentação arquetípica encontra-se em inúmeros mitos e sagas. Só para
mencionar alguns motivos: a época de ouro, a bem-aventurança da condição primordial, as lendas do Paraíso,
a época em que os deuses ainda andavam na Terra, o ser humano cósmico-primeval, a ideia platônica sobre
os seres hermafroditas, separados em duas partes pelos deuses, o mito hindu sobre a ilha de joias no mar de
nectar, etc.
Em crianças observam-se motivos semelhantes em sonhos "cósmicos". O acordar, i.e., a separação da
consciência, é experimentada com frequência como choque medonho ou no ' símbolo de um nascimento na
Terra, mas sendo originado de um outro planeta. Nos primitivos o emergir do ser humano não está sendo
explicado por causas naturais apenas, mas, ao mesmo tempo e principalmente, por causas "espirituais", tanto
cosmogônicas como individuais.
Com isso a consciência em diferenciação torna-se um sistema relativamente fechado que contém em
si mesmo as diferenças de intensidade necessárias para as comutações energéticas.
8.7. As diferenças de níveis, estabelecidas pelas quedas de potencial energético significam, psicologicamente,
posições conflituais. Na criança pequena expressam-se como divergência entre o ente natural-pulsional e o
futuro indivíduo socialmente ajustado, no jovem como o período de "impulsos e tempestades" e nas lutas de
natureza ética e ideológica. O adulto maduro tem conflitos psíquicos e tem que superar seus opostos internos.
Com o tempo equacionam-se as tensões iniciais e constrói-se uma disposição estável e relativamente imutável.
8.8. Com isto, as diferenças de intensidade diminuem sempre mais e mais dentro do sistema consciente e
assim estabelece-se uma condição de certo modo entrópica, a qual, dependendo da situação, pode ser avaliada
até como fator negativo. A disposição dentro do sistema consciente é bem firme, mas também rígida, já que
se fecha perante a1terações posteriores. Embora exista a queda de potencial necessária para o processo
energético, estabelece-se entre os sistemas consciente e inconsciente desta vez. A ligação ou a passagem entre
os dois sistemas está sendo constituída pelas funções psíquicas inferiores. Se ocorre a coligação com o sistema
inconsciente pelo reconhecimento da nova diferença de potencial, então o movimento energético transpõe-se
no processo autônomo, objetivo-psíquico. Com outras palavras: em vez da diferenciação anteriormente
necessária da consciência, ocorrerá a diferenciação da personalidade total, o que é igual à expansão do sistema
consciente. A consciência consolidada tornar-se-á a função de um mais aberto estar-consciente.
8.9. O caso inverso do "enrijecimento" da consciência - que é um fenômeno normal quando não dura demais
- ocorre na psicose: o sistema inconsciente ou nunca foi inteiramente isolado do consciente ou a "parede" entre
os dois é tão tênue que pode ser logo "derrubada" por um estremecimento intenso. Em todo caso, a queda de
potencial para o sistema inconsciente é tão grande que este paulatinamente exaure toda a energia do sistema
consciente e, com o emergir da doença, ocupa o lugar deste. O aspecto psicológico desse estado é um
fechamento intenso contra o meio. Com a extinção do sistema consciente, a relação tensional entre os dois
sistemas é cancelada e o movimento energético tornou-se entrópico.
8.10. Agora o sistema inconsciente está presente de certo modo em estado original - em todo caso em uma
condição que decorre sem qualquer intervenção do sistema consciente e por isso, quanto à sua fenomenologia
e energetismo, é semelhante antes a um sistema natural deixado para si mesmo. Também nesse sistema em si
inteiramente fechado ocorre uma certa comutação de energia já que as imagens psíquicas, as auto-
apresentações do sistema inconsciente, transmutam-se e transformam-se. Seu sentido, porém, apenas para um
observador externo será compreensível, para depois, percebivelmente, desintegrar-se, já que nenhuma
intervenção de uma consciência intata poderá elevá-lo e assimilá-lo das "formações dos reinos desprendidos".
9.1. A estrutura energética do sistema objetivo-psíquico ou natural, manifesta-se na sua dinâmica, i.e., na
alteração auto-atuada dos seus conteúdos. Seus conteúdos são imagens já que a específica forma de
manifestação da energia psíquica em estado natural é a imagem fantasiosa, à qual também pertence o sonho.
A constante alteração das imagens significa uma movimentação energética que, por isso, pressupõe uma certa
tensão ou diferença de níveis. Isto se expressa na ambiguidade e na ambivalência das imagens fantasiosas e
nas suas manifestações em pares-opostos. Conteúdos novos, i.e., ainda inconscientes, nas fantasias e sonhos
com frequência aparecem como pares, como gêmeos ou dualidades. Um conteúdo objetivo-psíquico, avaliado
do lado da consciência, é de sentido múltiplo, paradoxal e eventualmente ambíguo.
9.2. Os fenômenos do processo objetivo-psíquico deixado para si mesmo têm preponderantemente um caráter
enantiodrômico. Conteúdos positivos revezam-se incessantemente com negativos; se, por exemplo, trata-se
de uma situação conflituosa na consciência, uma imagem que apresenta a tentativa de solução será
imediatamente seguida por uma outra com desfecho destrutivo. Se as imagens fantasiosas ocupam-se com
determinados valores, na imagem subsequente será apresentado o outro valor ou desvalor se o princípio lúcido
chega a se expressar, logo aparecerá o escuro, em suma: manifestam-se todas as probabilidades psíquicas, em
sequência constante de SIM e NÃO. Embora diferentes fenomenologicamente, falta-lhes, porém,
inteiramente, o caráter antinômico. Só a intervenção da consciência distingue seu valor psicológico.
9.3. O processo objetivo-psíquico, se deixado para si mesmo, tem a direção natural, i.e., segue o decurso
entrópico; produz constantemente fenômenos psíquicos como sonhos, fantasias e sintomas mas estes apenas
comutam de um para o outro.
A lei de que a entropia aumenta num sistema natural fechado poderia talvez fornecer a explicação para
a eventual independência do Objetivo-Psíquico da categoria do tempo.
EDDINGTON ("A natureza do mundo físico") mostra que, como numa área de espaço em estado de
completo equilíbrio a energia não é mais divisível, também o tempo não possui mais direção. "O ponteiro não
sabe: em que direção deve mostrar. Seria desacertado dizer que uma tal área é atemporal; os átomos vibram
do modo costumeiro, como pequenos relógios e neles podemos medir a duração e a velocidade. O tempo ainda
sempre existe e mantém suas costumeiras particularidades, mas perdeu seu apontador de direção; ele é
estendido como o espaço, mas não 'progride'.
A coligação psicológica do sistema inconsciente com o sistema consciente nunca será estabelecida
pelo primeiro, como também a real e psicologicamente importante, diferença de potencial está sendo dada
apenas pela tensão entre o sistema consciente e o do objetivo-psíquico.
9.4. O sistema consciente possui como característica essencial a necessária diferença de nível para a
movimentação energética. Ele consiste na tensão entre os opostos. A diferença entre a disposição consciente
e a condição do estado inconsciente consiste na capacidade de discriminação em sentido mais amplo, i.e., para
discernir ou para colocar os opostos; a índole da consciência como intervenção da psique criativa no decurso
natural, parece determiná-la e obrigá-la a isso.
9.5. O discriminar consciente é uma intervenção no decurso natural e nos indiferenciados conteúdos e
processos deste sem discriminação existiria um estado inconsciente de uniformidade como, para comparar,
existe no sonho. A discriminação conduz a posicionamento e com isso a diretividade da consciência. A
diretividade, diferindo da mera direção natural, é uma disposição em relação aos conteúdos e eventos; é
valoração e seleção. A diretividade consciente em conexão com valores, propósitos e metas aguenta, até certo
grau tensões energéticas, sem compensá-las, e com isto é contrária â irreversível direção natural. No decurso
normal da consciência, o aspecto contrário à direção ou decisão pretendida, está sempre pressuposto ou
contido. Embora um lado tenha a intensidade maior, ocorre isso na base da coordenação dos pares opostos. O
NÃO está sempre incluído no SIM.
9.6. Se tal circunstancia não está sendo observada, a consciência identifica-se com um dos opostos, coloca-se
numa posição extrema e com isso a tensão tornar-se-á demasiada. A outra parte do par-oposto dissocia-se do
decurso consciente. Assim, o sistema consciente, de certo modo, "quebra" e a consequência será uma cisão da
personalidade - na maioria dos casos uma cisão de natureza passiva, na forma de uma neurose. O potencial
não considerado não se junta ao sistema inconsciente mas sim aos conteúdos não assimilados do sistema
consciente.
9.7 Em caso normal, no decorrer da vida ocorre o contrário com os pares-opostos coordenados dentro do
sistema consciente. Os opostos, com o tempo, chegam a se equacionar de modo tal que emerge uma disposição
solidificada e a tensão para o processo energético torna-se demais baixa. Tal estado, por isso, também é
semelhante, de certa maneira, a uma condição entrópica de equilíbrio, já que não existem mais adequadas
diferenças de intensidade. A diferença de nível e os potenciais serão, então, criados pelo sistema inconsciente.
Seus conteúdos não se manifestam necessariamente, mas sua intensidade energética impõe-se sobre o sistema
consciente. Com outras palavras: o sistema inconsciente encontra-se ativado. Com isto a diferença de
potencial, necessária para a movimentação energética, será conduzida sobre a oposicionalidade dos sistemas
consciente e inconsciente. Mas aqui depende tudo: se o sistema consciente se dispõe em relação a isso e como.
Com outras palavras: se conserva sua diretividade, dando porém, a ela, uma outra orientação.
10.1. A estrutura heterotética da consciência constitui uma réplica da estrutura da psique, em geral.
RICKERT (filósofo) denomina a unidade da relação sujeito-objeto como princípio heterológico. A
análise psicológica poderia ser chamada assim, de acordo com RICKERT: um processo heterotético.
Heterótese é um princípio ideativo que não avalia a antítese como negação, mas justamente considerando as
teses dos outros, chega à síntese.
A diferença energética de nível, e potencial, necessária para a movimentação e comutação,
psicologicamente está sendo dada nos pares opostos e no seu equacionamento regulador. O par oposto
supremo, o par-oposto da Psique Total, é a complementariedade da consciência e do inconsciente. Durante a
supremacia do sistema consciente o correlato inconsciente é de menos intensidade existe de certo modo
subentendido como base nao impositiva, sobre a qual se desenvolve o sistema consciente e que só de vez em
quando se torna ativo, apenas com o propósito de promover dentro do sistema consciente os exigidos processos
de compensação. Funciona, em princípio, como um oposto coordenado com a consciência, com a diferença
que esta última, no processo normal, é consciente.
10.2. O decurso imperturbado dos opostos coordenados dentro dó sistema consciente é a progressiva direção
energética. A progressão da movimentação energética consiste na incessante continuação do dirigido processo
de ajustamento às conscientes exigências da vida, na diferenciação, para isso necessária, da disposição
psicológica e das funções superiores e também nas produtividades que por elas podem ser conseguidas. As
funções inferiores possuem pouca intensidade energética e fornecem a tensão justamente necessária para
acentuar as funções superiores. Naturalmente, a tensão de opostos existe também em outros sentidos, como
conflito ético ou, em geral, em todas as espécies de decisões. A movimentação progressiva é sempre
caracterizada pela liderança do sistema consciente e pela coordenação da posição oposta que existe dentro dos
seus moldes.
A consideração da posição oposta pode ocorrer também por sua exclusão consciente.
10.3. Se, porém, uma disposição habitual torna-se, por razoes externas ou internas, insuficiente, haverá um
congestionamento de energia e então, de um lado, o ajustamento consciente não funciona mais e de outro,
ainda serão ativados os "fundos" da consciência. O estado de congestionamento significa o destacamento dos
pares-opostos. O SIM e o NAO, impulso e contra-impulso nao podem mais unir-se num ato coordenado. Com
a eclosão do conflito inicia-se uma movimentação energética retrógrada: a regressão.
10.4. A direção energética regressiva significa, psicologicamente, que agora estão sendo ativados aqueles
fatores subjetivos que foram excluídos do processo de ajustamento. A regressão não é um processo dirigido,
como a progressão e não está sendo caracterizada' pela escolha (diferenciação) de determinadas funções e
conteúdos. Tem, no entanto, a direção da natural queda de potencial que, em última análise, flui para o sistema
inconsciente. Em virtude disso, todos os elementos até então inconscientes, terão mais valor, tanto era termos
intensivos como extensivos. Tais elementos carregam conteúdos de funções psicológicas que se encontram
em oposição à função principal dirigida e diferenciada. Já que as funções inferiores estão mescladas com
elementos coletivo-psíquicos, com elas o sistema objetivo-psíquico será ativado.
10:5. Se a regressão permanece como um processo natural, deixado a si mesmo, i.e., se a consciência não
intervém, aderindo-se a ela, o movimento retrógrado também psicologicamente passa a significar um
retroceder porque a intensificação do sistema inconsciente' sobrepuja a direção progressiva. Ativam-se antigas
fases de desenvolvimento da adaptação, as quais encontram-se em oposição com a fase já conseguida e as
funções inferiores, desta vez consteladas, apresentam um caráter que corresponde a uma faixa etária já
superada do indivíduo: são demasiadamente pueris ou infantis. A dissociação dessa forma estabelecida,
significa uma condição neurótica. Na neurose a regressão é parcial e abrange apenas aquela parte da
personalidade que não está ainda incluída no sistema consciente. A regressão torna-se total na psicose. A
personalidade inteira desce a um grau de ajustamento que corresponde a uma forma sociologicamente
primitiva. Os conteúdos psíquicos carregam feições arcaicas.
10.6. Se, ao contrário, o sistema consciente inclui o sistema objetivo-psíquico ativado pela regressão, então
isso conduz ao processo de individuação já que, pois, a natureza da Psique tornou-se o objeto da movimentação
energética. Regressões de menor vulto podem ser frequentemente observadas nos preparos de ajustamentos
particularmente difíceis, especialmente em crianças e pessoas jovens. Nesse caso a Psique-Total estabelece
por si mesma a compensação com o movimento progressivo, i.e., sem a intervenção da consciência.
10.7. Progressão e regressão constituem movimentações de energia que seguem uma a outra temporalmente.
São "meios ou pontos de passagem para o decurso energético". A intensidade de uma aparece sempre na
intensidade da outra.
Encarando energeticamente:
"a progressão e o ajustamento dela resultante ocorrem como um meio para a
regressão, i.e., para a manifestação do mundo interno no mundo externo, pela
qual está sendo criado um novo meio para uma progressão de espécie alterada
que representa um ajustamento melhor às condições do meio. Pelo modo de ver
energético, porém, não se propõe que devem haver progressão e regressão da
libido, apenas que devem ocorrer transformações equivalentes, já que o
energetismo vê apenas o quantum mas nunca explica o ‘quale’. Progressão e
regressão nunca podem ser deduzidas da índole do conceito de energia, já que
só podem ser compreendidas energeticamente nas suas relações recíprocas.
Progressão' e regressão são ocorrências específicas as quais temos que entender
como processos dinâmicos e que, como tais, são condicionados pela qualidade
da substancia. A progressão, como um processo contínuo de ajustamento às
condições do meio, fundamenta-se na necessidade vital de ajustamento. A
necessidade força a orientação absoluta em relação às condições do meio e a
repressão de todas aquelas tendências e possibilidades que servem a
individuação. A regressão, ao contrário, como um ajustamento às condições do
nosso próprio mundo interno, fundamenta—se na necessidade vital de atender
as exigências da individuação. O ser humano não é uma máquina no sentido de
que possa executar incessantemente o mesmo tipo de trabalho para render, mas
só pode corresponder inteiramente, de modo ideal, ao mando da necessidade
externa se está ajustado ao seu próprio mundo interno, i.e, quando se encontra
em concordância consigo mesmo. E ainda vice-versa: só poderá também ajustar-
se ao seu próprio mundo interno e estar em concordância consigo mesmo, se
também está ajustado às condições do meio. Uma ou outra função só
temporariamente pode ser negligenciada, como a experiência demonstra".
(JUNG: "Sobre o energetismo da alma").
11.1. Como progressão e regressão a energia movimenta-se - em sentido psicológico - para a frente e para
trás, como se movimenta também, psicologicamente, em termos espaciais. Tais movimentações energéticas
são a extraversão e a introversão. Elas descrevem a direção psicológica da energia ao objeto externo e ao
sujeito. Extraversão e introversão podem decorrer tanto progressiva como regressivamente. A direção
introvertida ou extravertida da energia não é idêntica ao tipo com disposição extravertida ou introvertida, já'
que a primeira circunscreve um processo de movimentação energética e a outra uma habitual e relativamente
estável atitude psicológica.
11.2. Já que a consciente disposição tipológica não representa um sistema inteiramente fechado, a
movimentação energética pode tomar, em certas condições, a direção contrária da habitual. Com isto, porém,
envolve-se o sistema inconsciente. A disposição habitual possui um alto grau de diferenciação e abrange todos
os valores que o sistema consciente pode conseguir. Por isso, uma comutação apenas automática para o seu
oposto apresenta um caráter psicologicamente inferior. O processo permanece entregue a si mesmo e torna-se
igual a um decurso natural.
11.3. Esse processo natural, entregue a si mesmo, é uma contra-corrida energética, i.e., enantiodrômica. O
processo enantiodrômico torna-se visível, antes de tudo, como fenômeno cronológico, sendo a consequência
de uma disposição extremamente unilateral dentro do sistema consciente. Os pares-opostos "quebram",
subsequentemente, de modo polar e a posição oposta, até então inconsciente, assume o lugar do anterior. A
enantiodromia é caracterizada psicologicamente, antes de tudo, pelos valores psicológicos contrários aos até
então vigentes. (Jung tomou a expressão enantiodromia de Heraclito. Ver Tipos Psicológicos", Definições.)
11.4. O decurso enantiodrômico não está ligado apenas à direção energética extravertida ou introvertida, mas
constitui um fenômeno psicológico geral. Se um processo psíquico - uma disposição, uma função, etc. - chegou
ao seu extremo, inicia-se do inconsciente, automaticamente, o contra-movimento, durante o qual constelam-
se todos os conteúdos e funções contrários aos até então atuantes, ocorrendo com isto uma "inversão de valores
Em casos individuais tal fato pode ter, psicologicamente, um significado bastante positivo, como por exemplo,
uma repentina tomada de consciência ou iluminação num estado de desespero ou em qualquer situação sem
saída e "preta" ou uma conversão de Saulo em Paulo.
11.5. Mas, em geral, o emergir do oposto inconsciente será idêntico a uma regressão e terá como
consequência uma alteração negativa do caráter ou uma cisão da personalidade, se o mero mecanismo não
está sendo acompanhado de um entendimento psicológico. Quanto mais cedo é percebido e assimilado o
contra-movimento iniciado no inconsciente tanto menos está sendo a pessoa entregue ao decurso automático.
11.6. O contra-movimento - como intensidade far-se-á perceber na consciência por diversos sinais: impõe-
se como um estado de ânimo que interfere, como cadeias de ideias e fantasias perturbadoras e atua bem
nitidamente nos sonhos. Se a direção contra-corrente da energia investida no inconsciente está sendo entendida
e aceita como compensação da disposição consciente, isto levará a uma expansão da consciência pela inclusão
do sistema objetivo-psíquico.
11.7. No caso de um decurso puramente enantiodrômico e não assimilado, haverá apenas o contra-movimento,
que adquirirá paulatinamente a intensidade maior, e através disso o Eu será da mesma forma idêntico à direção
contrária, assim como era antes, na posição anterior, com a diferença porém, que nenhuma, consciência
dirigida toma uma posição em relação com isto e assim o decurso segue apenas a natural queda de potencial.
Com isto, a tensão entre os sistemas consciente e inconsciente está eliminada, o ponto de vista até então
adotado pela consciência desaparece ou será até intencionalmente negado, já que a intensidade do contra-
movimento atua como critério compulsivo e o fator de extensidade não está sendo considerado .
11.8. A enantiodromia é um decurso cronológico quando se torna absoluto. Fenômenos parcialmente
enantiodrômicos podem ser também constatados como síncronos com os processos da consciência. Aparecem
nesses casos, por exemplo, como resistências aparentemente não motivadas contra atividades e pessoas
queridas, em obsessivas ideias menosprezadoras ou blasfematórias em relação com objetos venerados ou
numinosos — em suma: como processos que interferem com o decurso consciente e com os valores
conscientes. Se a consciência estiver pronta para investigar e reconhecer tais fatos, no mecanismo
aparentemente cego poderá ser divisado um sentido.
12.1. Para incluir o sistema objetivo-psíquico no sistema consciente - falando energeticamente: para
transmutar a energia da mera condição de deslocamento no sistema inconsciente, de modo psicologicamente
adequado - é necessário considerar dois fatores: primeiro, o fator de extensidade,. i.e., o esclarecimento e
avaliação psicológicos do novo potencial e, segundo, a lei inerente da transferência de energia.
12.2. A necessidade de transmutação pode ter duas razoes. Pode ser pretendida pela consciência em função
de uma introvisão, quando por exemplo, é realizado que a disposição até então vigente era inadequada ou
tornou-se, nessa altura, insuficiente. Pode também ser imposta à consciência quando uma quota de energia já
se transmutou no sistema inconsciente. Tal quota de energia impõe à consciência a sua intensidade. Se isso
ocorrer sob a forma de sintomas neuróticos, a nova condição energética faz-se perceber no sistema consciente
como uma falta (escassez). A consciência, embora permaneça intata não pode dispor da soma de energia
designada. Se a ativação do sistema inconsciente manifesta-se como emaranhamento psicológico, porque
aumenta-se o valor das funções inferiores ou das constelações arquetípicas, de modo inverso o sistema
consciente, sem realizar o fato, será infiltrado pelos conteúdos e dinamismos do sistema objetivo-psíquico.
12.3. O material do sistema objetivo-psíquico, seus conteúdos e seus processos específicos, são fenômenos
naturais e o posicionamento da consciência corresponde à intervenção cultural necessária para a transmutação
do mero decurso natural. Já que a energia psíquica, no seu estado natural, e a imagem fantasiosa são idênticas,
a energia do sistema objetivo-psíquico só pode ser incluído no sistema consciente se as correspondentes
imagens fantasiosas forem conscientizas. A imagem fantasiosa contém tanto a intensidade da energia do
sistema inconsciente como também sua determinação quanto a forma e conteúdo, i.e., a extensidade
energética. Por causa disto, com a imagem fantasiosa sempre está sendo proposta uma nova queda de
potencial. O fator de extensidade e o potencial energético são correlatos no energetismo psicológico. O
movimento da energia parte dessa determinada imagem fantasiosa; só a imagem fantasiosa assim existente
transmite continuada movimentação energética.
12.4. Praticamente isto significa que a energia não pode ser arbitrariamente transferida de uma forma de
manifestação para qualquer outra, i.e., ela não é totalmente disponível. À nova condição energética aderem
caracteres e qualidades da condição anterior. No entanto, tem que ser considerado, de outro lado que embora
o "volume" transferido possa parecer da mesma substância que a configuração anterior, quanto a sua índole
não precisa sê-lo. A expressão objetivo-psíquica é analógica e emprega, por isso, uma linguagem metafórica
baseada na fatualidade concreta. Conforme a necessidade psicológica o fator de extensidade tem que ser
compreendido, por isso, de modo concretístico ou simbólico, como já foi mostrado na interpretação redutiva
e sintética dos sonhos, no segundo capítulo (Pp.52-122).
12.5. A possibilidade de avaliar a nova condição energética de acordo com a situação individual, fundamenta-
se no próprio energetismo psicológico. Para um outro emprego só pode ser transferida uma quota de energia
que esteja livre para tal movimento. Já que no conceito de energia não se trata da transposição de substâncias
mas de relacionamentos entre movimentações, é evidente que a nova forma, já de antemão, também
psicologicamente não representa a forma um tanto alterada da forma anterior, mas eo ipso e genuinamente é-
algo diferente. Se não fosse este o caso, uma comutação, em primeiro lugar, nem teria qualquer sentido, já que
não seria compreensível: porque não era suficiente a forma anterior. E em segundo, uma comutação energética
nem seria possível sem que existisse uma queda de potencial, i.e., sem uma diferença psicológica entre o
emprego anterior e o atualmente proposto.
12.6. Então, se a energia comuta de um estado para outro, isto ocorre porque a segunda condição possui um
valor psicológico, o qual não está mais dado na primeira, já que a quota de energia libertada só na segunda
condição podia expressar-se de modo adequado. Com isto levanta-se também a exigência de encontrar o novo
elemento da segunda condição diferente do da primeira. Se a fenomenologia da segunda condição
aparentemente nada revela de novo ou parece apontar elementos ainda mais originais, com isto nada está
pronunciado para sua avaliação psicológica, porque só a revelação do seu sentido lhe outorgará seu particular
significado.
A suposição oposta, i.e., "biologística", levou na compreensão freudiana, de um lado, ao levantamento
da definição apenas causalista e coisificada do conceito de libido como uma substancia imutável. De outro
lado, o conceito de substância corresponde ao conceito racionalista da sublimação, pela qual se entende uma
comutação de libido que, embora inautêntica, propõe-se pelo critério da consciência, mas não é diferente da
substância básica.
12.7. No entanto, mesmo que o fator de extensidade não seja imutável por causa do sentido múltiplo da
configuração psíquica, a disponibilidade livre da comutação energética (e com isso, o emprego arbitrário do
ponto de vista sintético ou redutivo) mais adiante não é possível por causa da diferença de potencial, necessária
para a movimentação energética. Se a energia deve ser transferida de um estado para um outro, porque a
forma-ate então existente já não tem valor e tornou-se "obsoleta" - e a mera vontade tem a posse só de uma
quota de energia disponível para a consciência e não tem qualquer poder sobre o fator da exgtensidade e sobre
a diferença de nível, i.e., por si mesma não pode, sozinha, comutar energia de modo equivalente.
Já que na natureza física só uma parte bem limitada da energia natural pode ser por nós
transferida para uma forma praticamente empregável, ao passo que uma parte bem
maior temos que deixar atuar sem aproveitá-la, como fenômenos naturais, assim
também na nossa natureza psíquica só uma quota pequena de energia podemos desviar
do decurso natural. Uma parte desigualmente maior de energia não pode ser por nós
captada, porque mantém o decurso da vida de acordo com a sua lei (“Sobre o
energitismo da alma”)
12.8. O decurso da vida, de acordo com a sua lei, corresponde â função auto-reguladora da psique. Se, nos
potenciais atuais, trata-se de produtos inconscientes de natureza pessoal, como por exemplo na maioria dos
sonhos, a direção natural é percebida pelo confronto consciente com eles e pela subsequente assimilação do
seu sentido. Mas se o sistema objetivo-psíquico está sendo ativado, sua intensidade energética e demais para
que possa ser incluída no sistema consciente. Tal fato torna-se mais nítido pela consideração do fator de
extensidade, i.e., dos conteúdos do inconsciente coletivo. Para transmutá-los da mera efetividade em emendas
significantes com sentido real para o processo da vida do indivíduo, necessita-se um meio cuja função seria
equiparável a de uma máquina que está em condições de comutar a energia do mero decurso natural, de
maneira a que ela possa tornar-se apta para uma utilização cultural, mantendo ao mesmo tempo o potencial
natural, já que esse garante uma transformação relativamente equivalente.
13.1. Com a ativação do inconsciente coletivo o sistema objetivo-psíquico tornou-se descerrado, mas ainda
não encerrado psicologicamente no sistema consciente. Decorre, certa mente, a movimentação de energia
entre os dois sistemas, para cá e lá, os dois interpenetram-se mutuamente, mas não se comutam um no outro.
O sistema consciente será entremeado com elementos naturais, mas também decomposto por eles e os
elementos naturais do sistema objetivo-psíquico não serão, assim, compreendidos pelos fatores da consciência
para ele inadequados, para que possam ser retirado do decurso natural. As imagens fantasiosas do sistema
objetivo-psíquico bem são "a natureza dentro de nós e o espirito natural", as raízes primordiais da vida
psíquica; de outro lado, também os “só naturalmente crescidos”, que inicialmente fazem frente à consciência
e em si não são cultura. Seu descerramento, ao contrário, faz confrontar o indivíduo com as particularidades
da compreensão primitiva, com a sua inferioridade e com a sua condição entregue aos poderes objetivo-
psíquicos.
13. 2. Se, no entanto, o sistema consciente não se liga aos fatos naturais objetivo-psíquicos, mas também não
recusa sua inclusão, constelar-se-á dessa tensão de opostos um fator que se fundamenta tão essencialmente na
estrutura psíquica que, na realidade constitui sua essência. A oposicionalidade entre os dois sistemas é, de
certo modo, um epifenômeno; como fenômeno primordial constitui a natureza da psique. Nela, porem, não se
manifesta como polaridade, mas como princípio dual, como coexistência da "Natureza" e do "Espírito". Já
que natureza e espírito (ou "estar consciente") são as duas relações de origem ou aspectos das condições
psíquicas, fundamenta-se também o princípio espiritual na essência da psique.
“Natureza e Espírito constituem um par oposto necessário na auto-regulação. A base
desses conceitos são, porém, condições psíquicas entre as quais a consciência humana
oscila, como o ponteiro na balança" (Sobre o energetismo da alma).
13.3. A coexistência ou colisão dos dois aspectos é empiricamente constatável na psicologia dos primitivos,
na psique infantil e nos sonhos compensadores no caso de um sistema consciente que negue ideologicamente
o aspecto espiritual. Propõe-se o aspecto espiritual também naqueles fenômenos objetivo-psíquicos que
contêm ideias e fatos que se estendem além da capacidade de formulação do sistema consciente são, em todo
caso, ideias em estado natural mas quanto ao seu sentido representam germes picturais para compreensões
simbólicas.
13.4. Na psicologia dos primitivos a dualidade psíquica é bem nítida. A psique primitiva é mais uniforme do
que a das culturas superiores, no sentido de que não vive como conflito consciente a oposição entre "natureza"
e "espírito". No entanto, os dois aspectos manifestam-se como dois isolados princípios dinâmicos. A realidade
do aspecto espiritual só pode ser explicada por um superior valor energético nele inerente, o qual se confronta
com o decurso natural como uma intensidade especificamente formada. E isto ocorre de modo tão extenso que
o aspecto espiritual na cultura primitiva domina e organiza o inteiro mundo de ideias, a inteira estrutura
sociológica e também a existência individual. Tudo que o primitivo faz e pensa é, ao mesmo tempo, de
significado natural e sobrenatural; todas as coisas essenciais são espiritualmente imbuídas e fundamentadas.
O fato de que “o princípio espiritual afirma-se contra a meramente natural com força imensa” seria explicável
pela intensidade energética das constelações arquetípicas, as quais condensam-se em percepções psíquicas e
essas apresentam-se como imagens formadas. Tais imagens obrigam a mentalidade primitiva a uma espécie
de confronto com o sentido dos processos arquetípicos e esse sentido constitui a base das todas as
representações e atuações mágicas.
13.5. Na disposição primitiva da consciência, a constelação arquetípica mesmo parece atuar como princípio
dual, de modo que o lado ideativo do arquétipo superpõe-se ao seu lado instintivo e com isso será a base da
cosmovisão (Weltanschauung), que poderia ser chamada uma cosmovisão psíquica. O primitivo, ao atender o
lado espiritual da constelação arquetípica, liberta-se do seu aspecto "natureza" ou daquilo que significaria uma
"condição meramente natural" com toda a inerente inércia e com todas as angústias de um caos total - diferindo
do animal que percebe e atende uniformemente o aspecto instintivo.
"Disto podia ser reconhecido, sem mais, o poder do arquétipo: ele compele o
primitivo a atuar contra a natureza para não ser a sua vítima. Esse é bem o
princípio de toda cultura, a consequência inevitável do estar consciente, com a
sua possibilidade de desviar da lei inconsciente" ("Psicologia Analítica e
Cosmovisão").
13.6. Tal oposição é
"a expressão e talvez a base daquela tensão a qual nós denominamos energia
psíquica. Sem essa tensão de opostos não seria possível qualquer energia."
("Sobre o energetismo da alma").
A tensão de opostos, assim, pode ser constatada não só filogeneticamente nos primitivos, mas também
ontogeneticamente na criança, porque é inata em cada indivíduo:
"Tal conflito pode ser entendido como uma oposição entre o ente natural ainda
profundamente primitivo do ser humano recém-nascido e a sua massa hereditária
altamente diferenciada. O ente natural é caracterizado por inquebrantada
instintualidade, i.e., por seu estado inteiramente entregue aos instintos. A massa
hereditária que está em oposição a esta condição consiste nas precipitações
mnêmicas de todas as experiências da série ancestral. Nessa herança incluem-se
não apenas os instintos originados da escala animal, mas também todas aquelas
diferenciações culturais que deixaram vestígios mnêmicos herdáveis. Assim, na
realidade, cada criança nasce com uma imensa incongruência: de um lado, um
ente por assim dizer inconsciente e teriotípico e do outro, a última encarnação
de uma soma hereditária primeval e infinitamente complicada.
Se nós develamos, por um procedimento redutivo (i.e., freudiano) os pré-
estágios infantis de uma pisgue adulta, como base última encontraremos os
germes infantis que de um lado contém o posterior "ser sexual" natural "in statu
nascendi" e do outro, no entanto, também todas as enredadas pré-condições do
"ser cultural", Isto reflete-se de modo mais nítido nos sonhos de crianças. Muitos
deles sao simplesmente infantis e compreensíveis, sem mais, mas há outros que
contêm possibilidades de significado e coisas quase vertiginosas, as quais só
revelam seu sentido profundo à luz de paralelos primitivos. Esse outro lado é o
espírito "in nuce". O espírito, como princípio efetivo da massa hereditária,
consiste na soma dos espíritos ancestrais, no pai invisível, cuja autoridade nasce
já com a criança. A infância é significante não só porque lá se iniciaram alguns
aleijamentos instintivos, mas também porque lá apresentam-se perante a alma
infantil aqueles sonhos e imagens que, animando ou atemorizando, apontam
para longe, preparam o inteiro destino, junto com aquelas intuições
retrospectivas que se estendem amplamente além da experiência infantil até a
vida dos ancestrais. Assim, na alma infantil, a condição "natural" depara-se com
uma condição espiritual" ("Sobre o Energetismo da Alma").
13.7. Nos "culturados" homens modernos as constelações arquetípicas constituem o sistema objetivo-psíquico.
Isto representa, em consequência da condição psicológica inteiramente alterada em função da diferenciação
do sistema consciente, ao contrário da mentalidade primitiva, antes o aspecto natural. Os processos e
conteúdos arquetípicos colocara o homem cultural de novo era contato com o instinto, já que expressam as
inerentes leis psíquicas. Nas constelações arquetípicas, o aspecto espiritual está também contido, já que elas
são processos coletivo-psíquicos e ao mesmo tempo, as imagens desses processos.
"Como os instintos levam o ser humano a uma conduta especificamente humana
de vida, assim obrigam os arquétipos ou categorias de percepção e visão a
formações especificamente humanas. Ao meu ver ê impossível dizer o que é
anterior: a percepção ou a pulsão para atuar. Parece-me como se ambas fossem
uma e a mesma coisa, uma e a mesma atividade d vida, as quais nós temos que
pensar separadas em conceitos,' apenas para uma melhor compreensão".
("Instinto e Inconsciente")
13.8. Em consequência do fechamento do sistema consciente, porém, o sistema objetivo-psíquico figura
primeiramente apenas como efeito dinâmico, mas mantém o aspecto natural também no caso de uma mera
conscientização dos seus conteúdos com todas as feições de um decurso natural. Por isso ê inevitavelmente
necessário não confundir os caracteres diferentes dos dois sistemas parciais - já que estão baseados na
particularidade discriminadora a do sistema consciente. Apenas o estar-consciente constitui a base de uma
inclusão psicologicamente adequada do sistema objetivo-psíquico. Já que o sistema consciente é apenas um
sistema parcial do sistema Total-Psíquico, não pode identificar-se, sem mais, com o aspecto espiritual
enquanto não incluir também os fatores do sistema objetivo-psíquico. "Espiritual" não é um conteúdo, mas
uma atitude, e uma espécie de atitude que nao exclui a "natureza" mas a imbui - ou também deixa-se imbuir
por ela para transformá-la, se a inclusão da natureza significa expansão da consciência e acaba com a parada
energética da vida.
14.1. O meio que estabelece a inclusão psicologicamente adequada do sistema objetivo-psíquico no sistema
consciente, é a configuração simbólica. Se a consciência, de um lado, mantém firme sua integridade, mas de
outro, acompanha a queda de potencial natural para dentro do objetivo-psíquico, haverá uma extrema tensão
de opostos que, inicialmente, por causa da incompatibilidade psicológica dos dois sistemas ainda não conduz
a um movimento subsequente, mas a uma parada e com isso a um congestionamento de energia. Assim, a
apenas intensiva dinâmica do processo autônomo condensar-se-á em uma imagem. A imagem fantasiosa
contém o "quantum" energético e o "quale" do sistema objetivo-psíquico. É uma expressão e uma réplica tanto
da intensidade energética quanto da forma específica na qual a constelação de energia do sistema objetivo-
psíquico emerge no momento adequado e com isso fornece a direção para a posterior movimentação
energética.
14.2. Essa direção é o decurso natural das imagens fantasiosas. E enantiodrômica, i.e., quanto ao conteúdo
decorre como comutação dos opostos. Ainda é entrópica, já que as formações de opostos vêm a se equacionar
paulatinamente, o que é possível porque as constelações arquetípicas não estão tão separadas entre si mas
interpenetram uma a outra de modo recíproco. O decurso de sistema objetivo-psíquico parece, de certa
maneira, uma paisagem ampla na qual os fenômenos isolados apresentam-se em sequência temporal,
simplesmente assim, porque de outro modo nem poderiam ser de alguma forma percebidos pela consciência;
é necessário certo tempo para passar de uma percepção a outra.
14.3. Do ângulo da estrutura do sistema objetivo-psíquico - e esta visão naturalmente só seria possível pela
percepção de todos os conteúdos - no entanto, não existe sequência temporal, mas a extensão espacial da ideia
psicologicamente mais adequada. Tudo é coligado com tudo, tudo se condiciona mutuamente e tudo pode
comutar-se com qualquer outro - dentro das leis inerentes a um sistema natural relativamente fechado.
14.4. Com a interferência da consciência, no decurso natural das imagens fantasiosas cria-se, primeiro, a
diferença psicológica de níveis entre os dois sistemas, possibilitando uma transmutação equivalente do
processo apenas psíquico. O posicionamento da consciência significa o fator através do qual a intensidade
mais alta dos processos naturais pode ser transmutada em cultura. O sistema consciente, abrindo-se para o
sistema objetivo-psíquico introduz este último nos componentes da sua própria índole. Com isto, a direção
apenas natural transmuta-se em diretividade psicológica, i.e., em formatividade configurada.
14.5. Tal configuração psicológica contem, assim, elementos de ambos os sistemas; de um lado é
caracterizada pelo potencial natural das imagens fantasiosas, i.e., por seus conteúdos específicos. De outro
lado, porém, está sendo cunhada pela capacidade formativa e discriminativa da consciência. O resultado da
interpenetração recíproca de ambos os sistemas é a configuração simbólica. O símbolo não é uma mera
imagem fantasiosa nem um produto apenas conscientemente excogitado, mas uma expressão sintética dos dois
aspectos da psique. Expressa o aspecto natural pela sua forma e o aspecto espiritual pelo seu significado.
14.6. A condensação da arquetípica imagem fantasiosa em símbolo induz o processo autônomo (mais
detalhadamente no segundo capítulo). Com isso, os dois sistemas como tais serão psicologicamente
descerrados um para o outro. A integração dos conteúdos simbolicamente configurados do processo autônomo
em termos intensivos terá como consequência um equacionamento paulatino da diferença de níveis entre os
sistemas consciente e objetivo-psíquico. O equacionamento intensivo, não obstante, não conduz a um processo
entrópico, porque o fator de extensidade não está sendo cancelado pelo anexar do sistema objetivo-psíquico.
A diferença psicológica entre os dois sistemas permanecerá como função oposta: a consciência tem como
objetivo o relacionamento com a realidade concreta e o sistema-objetivo-psíquico a adaptação à realidade
endopsíquica. Com isso cria-se psicologicamente - uma extrema tensão de opostos, a qual mantém a
movimentação energética.
14.7. A configuração simbólica, como produto dessa tensão de opostos, é a função através da qual os dois
sistemas podem ser levados do seu fechamento recíproco a se tornarem, gradativamente, sistemas abertos.
Embora o símbolo não cancele a tensão dos opostos nos dois sistemas, une-os em uma nova base, criando-se
uma nova queda de potencial energético, na forma de um instrumento que conduz a movimentação energética
ao sistema psíquico total. O Total-psíquico, porém, contém em si mesmo a oposicionalidade que consistia na
separação entre o sistema consciente e o sistema objetivo-psíquico.
15.1. Encarando a configuração simbólica como função mediadora para o descerramento dos dois sistemas
separados, o energetismo psicológico chegou aos seus limites. O vir-a-ser de um processo espiritual - o que
significa a formação do símbolo - mesmo dentro dos moldes de um conceito de energia de orientação
científico-cultural, já não pode mais ser fundamentado. Apenas pode ser constatado como fato e como
manifestação patente de algumas daquelas intervenções criativas da psique. Se, então, nas proposições finais,
o modo de expressão energética for mantido, isto ocorre com a consciência de que com isto emprega-se uma
linguagem simbólica que corresponde, da melhor maneira, aos processos de movimentação de energia em
questão.
15.2. Na Natureza, o processo de transmutação de energia decorre de uma condição improvável na direção
de uma condição provável. A intervenção que transfere o processo natural em trabalho mantém a condição
improvável da desigualdade das diferenças de intensidade, o quanto for possível. Do ponto de vista da cultura,
porém, a condição improvavel é mais provável, porque transmuta formas insuficientes de energia em formas
mais adequadas.
15.3. A formação do símbolo é, por isso, de significado especial porque na área dos processos psíquicos
executa trabalho semelhante. Também cria cultura. Cada progresso de cultura é, do ponto de vista psicológico,
um estado consciente mais amplo. O sistema consciente tem a função de solidificar e conservar valores e com
isso serve a civilização. O sistema objetivo-psíquico contem em si imagens fantasiosas como germes de novas
possibilidades mas só em forma de pressentimentos e sonhos e, como processo natural, não propõe qualquer
trabalho dirigido.
15.4. O símbolo, que pela intervenção da consciência no decurso natural arquetípico, estabelece o
descerramento dos dois sistemas um frente ao outro, está em condições de cai tentar ambas as partes e com
isso transmutar as formas de energia de modo equivalente.
Em "Transmutações e Símbolos da Libido" Jung chama o símbolo, que
transmuta a energia, também "Libido-Equação" e entende por isso,
"representações capazes de expressar a libido de modo equivalente e com isso
transferi-la para um estado diferente do original". ("Sobre o energetismo da
alma")
O símbolo possui, patentemente, o potencial maior, porque inclui o indivíduo no total sistema psíquico.
15.5. A função de formar símbolo é um inerente dado psíquico. Ela leva à expressão o aspecto espiritual da
psique frente ao aspecto natural, se não de modo sobre-ordenado, ao menos de modo equivalente. Em todos
os pontos onde o símbolo, e o ipso, possui um potencial maior do que o decurso natural, é o aspecto espiritual
a nova forma da condição energética e a permanência da energia no estado natural teria como consequência
um congestionamento de energia.
15.6. A energia está, tanto nas funções naturais como nas espirituais, investida como intensidade e como
extensidade e por isso não pode arbitrariamente ser recolhida nem de uma nem de outra. Por isso, na primeira
metade da vida, um desvio demasiado dos fatos naturais é psicologicamente inadequado, porque o potencial
energético orienta-se nesse sentido. Na segunda metade da vida, porém, a orientação ocorre de acordo com a
cultura. O potencial reside no sistema objetivo-psíquico cuja inclusão constitui uma tarefa cultural, e já que
se trata do estruturalmente dado no indivíduo, é uma tarefa cultural de cunho individual. Por isso o processo
de individuação é caracterizado pela formação individual de símbolo. O símbolo individual comuta a energia
da disposição biológica para a disposição cultural. O símbolo é individual porque ajuda o indivíduo a vir-a-
ser sua verdadeira personalidade.
15.7. "No trabalho psicológico prático deparamos a cada passo com tais formações de símbolos cujo propósito
é transmutar a libido. No começo de um tratamento encontramos em atuação formações de símbolo cuja índole
despropositada manifesta-se na escassa queda de potencial proposta e dessa maneira a libido não se deixa
comutar em produtividade efetiva mas deflui, inconscientemente, nos trajetos antigos. Nesse caso é
aconselhável uma análise mesmo em sentido mais estrito, i.e., pelo método redutivo, que desmonta todas as
insuficientes formações de símbolos reduzindo-os aos seus elementos naturais. A redução causa uma
decomposição e com isso uma recondução ao decurso meramente natural pelo qual ocorrerá um relativo
congestionamento da libido. Dessa condição formam-se, indispensavelmente, as assim chamadas
"sublimações", i.e., certas atividades de índole cultural, pelas quais a libido insuportavelmente excessiva de
certo modo será acolhida. Mas com isso as verdadeiras exigências primitivas não serão atendidas. Mas se
examinamos cuidadosamente e sem preconceitos a psicologia de tal condição, e possível descobrirmos os
inícios de uma primitiva formação de religião e até de cunho individual. Já que a formação de religião e a
formação de símbolo constituem um interesse da mentalidade primitiva do mesmo modo importantes como a
satisfação de pulsões, com isto logicamente está sendo dado o caminho para um desenvolvimento posterior.
O caminho que conduz para fora do estado reduzido é a formação de religião de cunho individual. Com isso
a individualidade, em geral, sai da baixo do véu da personalidade coletiva ("Sobre o energetismo da alma").
16.1. O símbolo, na realidade, é a função mediante a qual cria-se cultura e desde os primórdios da humanidade
estava sendo criada. Na psicologia do primitivo o símbolo tem efetividade mágica, dominando o inteiro mundo
de representações. O símbolo primitivo forma-se pelo colidir das constelações arquetípicas, carregadas de
energia, com a consciência. Já que a diferenciação da consciência nessa escala cultural é ainda relativamente
fraca e, frente às constelações arquetípicas, não constitui um sistema fechado, o símbolo será a expressão de
intensidade e extensidade dos arquétipos, i.e., para sua ação e para sua forma especifica; ao mesmo tempo
significa o meio apotropaico que, de sua parte, pode influenciar esses poderes psíquicos.
16.2. Com a gradativa diferenciação da consciência, o sistema consciente obtém uma parte sempre maior na
formação do símbolo o que, de um lado, conduz ao configurar de um simbolismo religioso altamente
diferenciado, e de outro, também ao - na nossa época sempre crescente — empobrecimento em símbolos,
porque o sistema consciente e de maneira tal fechado frente ao sistema obietivo-psíquico, que não será mais
atingido pela efetividade deste. Já que a energia específica da formação do símbolo em nenhuma outra forma
pode ser expressada em termos equivalentes, a falta de símbolos efetivos leva, em certas condições, a sub-
rogados na forma de símbolos apenas assimilados de circuitos culturais alienos.
16.3. Símbolos verdadeiros, e por isso viventes, originam-se só na base de constelações arquetípicas e da
momentânea diferenciação da consciência, coletiva ou individual, que se confronta com a efetividade dos
arquétipos. A unidade estrutural do objetivo-psíquico é um dado do qual nenhum desvio é possível. Os
arquétipos são efetivos não apenas como intensidade, mas, do mesmo modo, também como extensidade
específica; são configurações psíquicas com caráter inerente e com significado apriorístico. Neles são dados
tanto forma como conteúdo e não podem ser transmutados em qualquer outra forma desejada. A energia neles
investida, não obstante, permite sua transformação do processo meramente natural em símbolo, pela
intervenção da consciência, mas no entanto, não desaparece do seu determinado conteúdo, transpondo-o
apenas a um nível culturalmente superior. Sua índole permanece conservada mas sua configuração está sendo
formada pela consciência momentânea.
16.4. Por isso existem, desde muito tempo, símbolos típicos que expressam as vivências fundamentais da
psique e cuja energia não pode ser transmutada de modo equivalente em nenhuma outra formação. Pode ser
apenas modificada pela diferenciação da consciência da época ou do indivíduo. Uma tal forma específica de
formação de símbolo era, desde tempos antigos, a vivência religiosa. A energia própria desta permanece nele
investida, tanto faz se a consciência sabe disto ou não. Se não existe qualquer símbolo adequado para ela, isto
cria congestionamentos da energia que, dependendo do caso, ou se manifesta numa neurose ou pelo caminho
de um substituto de menor valor, i.e., pela intensificação de qualquer outro fator psíquico, o qual depois, obtém
um poder ilegítimo sobre1 o indivíduo.
16.5. Com o verdadeiro símbolo religioso está sempre coligada também a ideia da efetividade e da
transmutação energética. Em escalas culturais superiores é a ideia de uma substância divina que está
transmitida no mistério ou no sacramento. No primitivo a visão energética ou dinâmica é idêntica à ideia do
numinoso. O numinoso é numinoso porque é sobre-poderosamente efetivo; extensidade e intensidade são
inseparáveis singularidades do seu ser.
16.6. O numinosamente efetivo, no entanto, na visão primitiva, não é apenas um objeto, mas antes de tudo
uma - meio invisível, meio substancial - potência que pertence a um ente especial e que o ser humano, em
certas condições, pode mesmo adquirir. É caracterizado como transferível e transmitível e tem a
particularidade de poder transformar-se tanto em algo bom como em algo mal. A visão do "magicamente
efetivo é por isso nitidamente, um primitivo modo de ver energético.
16.7. O conceito de energia é a formulação cientifica daquele algo que é equacionamento movimentado entre
opostos. A ideia de energia é, então, não apenas um conceito científico mas também, em si mesma, um
símbolo. Como tal, circunscreve aquele poder de efetividade psíquica que se origina dos opostos, é capaz de
ser transmitido e transmutado e, por isso, aparece também com a propriedade de atuante força criativa. O
símbolo da energia é um símbolo autêntico porque expressa a atuação criativa da psique, acima da
compreensão racional. Como expressão desse "tão misterioso" que constitui a essência primordial do ser
humano coliga-se o símbolo de energia e também a visão da imagem divina e sua oposicionalidade:
16.8. Embora o conceito de Deus seja um princípio espiritual por excelência, a necessidade coletiva quer
que seja ao mesmo tempo uma visão da primeira causa criadora da qual se principia toda instintualidade que
contra-age ao espiritual. Assim, Deus seria o conceito global não apenas da luz espiritual que aparece como
florescência última na arvore do desenvolvimento, não apenas o alvo espiritual da redenção em que culmina
todo critivo, não apenas o fim e a meta, mas também a causa mais escura e mais ínfima de todas as
obscuridades naturais. Isto é um tremendo paradoxo que corresponde patentemente a uma profunda verdade
psicológica. Como se vê, não propõe outra coisa do que apresentar a oposicionalidade do uno e mesmo ser,
de um ser cuja natureza interna é uma tensão de opostos. Tal ser é chamado pela ciência: energia." ("Sobre o
energetismo da alma").

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