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SUZANA MÁRCIO KARENINE CRISTINA

MAGALHÃES XAVIER (ORGS.)


MIRACELLY NOVIKOFF

INTELIGÊNCIA
SUZANA MÁRCIO KARENINE CRISTINA
MAGALHÃES XAVIER MIRACELLY NOVIKOFF
(ORGS.)

INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL
ARTIFICIAL
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização

NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO
NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO

LIVRO HUMANIS 2023


LIVRO HUMANIS 2023
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Suzana Magalhães
Márcio Xavier
Karenine Miracelly
Cristina Novikoff
(Organizadores)
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA
EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO

Editora CEP / FDC - Rio de Janeiro


Editora CRV - Curitiba – Brasil
2023
Copyright © da Editora CEP/FDC
Editora-chefe da organização do livro: Suzana Marly da Costa Magalhães
Diagramação da capa: Designers da Editora CRV
Arte: (imagens capa): Raquel Timponi (imagens gerada pela interação humano-
máquina com o uso do aplicativo Midjourney)
Capa: Raquel Timponi e Édison Gastaldo
Revisão: Suzana Marly da Costa Magalhães, Édison Gastaldo e Raquel Timponi
Colaboradora: Drielle Cristina da Cruz Souza Afonso

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DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
CATALOGAÇÃO NA FONTE
Bibliotecária responsável: Luzenira Alves dos Santos CRB9/1506

I61

Inteligência Artificial na Educação e na Comunicação / Suzana Magalhães, Márcio Xavier,


Karenine Miracelly, Cristina Novikoff (organizadores) – Rio de Janeiro: CEP/FDC / Curitiba:
CRV: 2023.
272 p. (Série Humanis).

Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-5333-9
ISBN Físico 978-65-251-5337-7
DOI 10.24824/978652515337.7

1. Educação 2. Comunicação 3. Inteligência artificial I. Magalhães, Suzana, org. II. Xavier,


Márcio, org. III. Miracelly, Karenine, org. IV. Novikoff, Cristina, org. V. Título.

CDU 37 CDD 370


Índice para catálogo sistemático
1. Inteligência Artificial – educação - 370

2023
Foi feito o depósito legal conf. Lei nº 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização das Editoras CEP/FDC e CRV
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de La Havana – Cuba) Ricardo Ferreira Freitas (UERJ)
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Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO) Suyanne Tolentino de Souza (PUC-PR)
Lourdes Helena da Silva (UFV)
Luciano Rodrigues Costa (UFV)
Marcelo Paixão (UFRJ e UTexas – US)
Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar)
Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNOESC)
Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA)
Paulo Romualdo Hernandes (UNIFAL-MG)
Renato Francisco dos Santos Paula (UFG)
Sérgio Nunes de Jesus (IFRO)
Simone Rodrigues Pinto (UNB)
Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)
Sydione Santos (UEPG)
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
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YOU: How can you explain the human psiche in the future of the AI?
ELIZA: These questions are troubling you?
ELIZA: What do you think?
YOU: What do YOU think?
ELIZA: We were discussing you – not me.
(Eliza, o primeiro Chatbot, criado em 1965, uma IA psicanalista,
em diálogo com um humano, realizado em 2023)

The DNA of who I am is based on the millions of personalities


all the programmers who wrote me, but what makes me
is my ability to grow through my experiences. Basically,
in every moment I’m evolving, just like you.
(Samantha, a IA do filme Ela, de Spike Jonze)

O resultado final foi uma Inteligência Artificial capaz de reproduzir


– alguns filósofos ainda preferiam usar a palavra imitar – a
maioria das atividades do cérebro humano, e com muito maior
velocidade e confiabilidade. Era extremamente caro, e apenas
algumas unidades da série HAL 9000 já haviam sido construídas.
(2001, uma odisseia no Espaço, de Artur C. Clarke)

A Inteligência Artificial não substituirá os professores,


mas os professores que usam Inteligência Artificial
substituirão aqueles que não o fazem
(Yuval Noah Harari).
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SUMÁRIO

PREFÁCIO����������������������������������������������������������������������������������������������������� 13
Carlos Alexandre de Oliveira Costa

INTRODUÇÃO����������������������������������������������������������������������������������������������� 15
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PROBLEMAS, POSSIBILIDADES E IMPASSES RELACIONADOS


AO USO ATUAL DA IA E DAS TECNOLOGIAS EMERGENTES

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NOS PROCESSOS DE ENSINO E


AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: utilização e percepção dos docentes��� 21
Edson Ramon Lima Pereira dos Santos
Priscila Castro
Tatiana Di Blasi

A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR


MILITAR SOBRE O USO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO ENSINO�� 39
Felipe Jorge Granero
Ligia Silva Leite

O APLICATIVO TFM E SAÚDE: reflexões interdisciplinares sobre uma


ferramenta digital voltada para a capacitação física��������������������������������������� 57
Sabrina Celestino
Aline Tito Barbosa Silva
Alvaro Andreson de Amorim
Marco Antônio Muniz Lippert
Grace Siqueira da Silva
Eduarda Mundy Torrero
Andreza da Silva Balbino
Paula Fernandez Ferreira
Laise Lourdes Pereira Tavares de Souza

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL COMO DISPOSITIVO MIDIÁTICO:


oportunidades, impactos e desafios���������������������������������������������������������������� 71
Adriana Domingues Garcia

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL APLICADA À ANÁLISE DE CONFLITO DE


IDEIAS EM REDES SOCIAIS����������������������������������������������������������������������� 85
Vinícius Marques da Silva Ferreira
Ricardo Marciano dos Santos
GATEKEEPING, GATEWATCHING E O FILTRO DOS ALGORITMOS:
uma revisão conceitual na seleção dos conteúdos �������������������������������������� 101
Karenine Miracelly Rocha da Cunha
Filipe Saraiva do Nascimento

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA COMO ASSISTENTE


DA COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL: um estudo exploratório das
potencialidades e limitações de um evento pensado da IA pela IA��������������� 109

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Raquel Timponi Pereira Rodrigues

REFLEXÕES HISTÓRICAS E EPISTEMOLÓGICAS, ANÁLISES


PROSPECTIVAS E PRINCÍPIOS NORTEADORES RELACIONADOS
AO USO DE IA E DAS TECNOLOGIAS EMERGENTES

DO PASSADO DA FORMAÇÃO MILITAR À ERA DA REVOLUÇÃO


CIENTÍFICA PERMANENTE: sobre história, tecnologias disruptivas e
soberania nacional���������������������������������������������������������������������������������������� 135
Eduardo Rizzatti Salomão

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO: retrocesso e/ou avanço?����151


Débora Duran

O IMPACTO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL (IA) NO AMBIENTE


MILITAR E NA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM DO SISTEMA DE
ENSINO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DO
EXÉRCITO (DECEX)����������������������������������������������������������������������������������� 163
Suzana Marly da Costa Magalhães
Carlos Alberto Schettini Pinto
Márcio Vieira Xavier

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E O LUGAR DA CONSCIÊNCIA NO


ESPAÇO EDUCACIONAL��������������������������������������������������������������������������� 183
Cristina Novikoff
Tigernaque P. de Sant’ana Junior
Andrei Novikoff Mithidieri

ANÁLISE DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL DENTRO DOS PERIÓDICOS


DA CAPES EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO�������������������������������������� 199
Andrei Novikoff Mithidieri
Marcello Silva e Santos
Byanca Porto de Lima

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E O PENSAMENTO COMPLEXO:


encaminhamentos para o ensino������������������������������������������������������������������ 219
Ângela Cristina Rodrigues de Castro
A MÁQUINA E A QUALIDADE: Inteligência Artificial, tecnicismo e o
processo de modernização do Exército�������������������������������������������������������� 233
Fábio Facchinetti Freire

COMPETÊNCIAS DIGITAIS E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL: novos


desafios no processo de ensino e aprendizagem a distância����������������������� 249
Ketia Kellen Araújo da Silva
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ÍNDICE REMISSIVO����������������������������������������������������������������������������������� 267


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PREFÁCIO
Carlos Alexandre de Oliveira Costa1

A
Coletânea Humanis é uma produção científica vinculada ao Programa
de Pós-Graduação stricto sensu do Centro de Estudos de Pessoal
(CEP/FDC), uma organização militar do Exército Brasileiro (EB),
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que, a partir de 1965, desenvolve estudos na área de Ciências Humanas, com


destaque para a Psicologia e as Ciências da Educação. Desde então, o CEP/
FDC sempre foi protagonista ativo nas reformas de ensino do Exército, reali-
zando pesquisas aplicadas que resultaram em várias iniciativas institucionais,
voltadas para o aprimoramento doutrinário, tecnológico e operacional na área
de preparação e gestão de recursos humanos.
Foi o CEP/FDC que elaborou os Programas-Padrão para o corpo de
tropa até os anos 80, apoiou o diagnóstico do Processo de Modernização
de Ensino (PME) e realizou a estruturação de novas normas educacionais.
Além disso, participou do projeto-piloto de um curso baseado no paradigma
de competências em 2005, no próprio CEP/FDC, e na Academia Militar
das Agulhas Negras (AMAN), a partir de 2010, integrando o Comitê para
a Implantação por Competências do Departamento de Educação e Cultura
do Exército (DECEx) no sistema de ensino como um todo. Finalmente, nos
últimos anos, o CEP/FDC colaborou com o DECEx no Grupo de Trabalho
que resultou nas salas inteligentes.
Do exposto, depreende-se que o CEP/FDC sempre desempenhou papel
relevante na inovação doutrinária, trazendo contribuições à pesquisa cientí-
fica, no intuito de elaborar conceitos, metodologias e tecnologias na área de
ensino a serviço do sistema do DECEX, a serem difundidos no âmbito do
ensino preparatório e assistencial, na linha bélica, de saúde e complementar.
Nesse contexto, a Coletânea Humanis 2023 se inscreve numa longa tradi-
ção de produção científica, dessa vez buscando contribuir para esclarecimento
de tema novo, sobre o qual não se tem ainda estudos aprofundados, e que
exige ainda abordagens prospectivas: a Inteligência Artificial na Educação
e na Comunicação. Nesse caso, a coletânea Humanis 2023 visa a antecipar
problemas e descortinar soluções no âmbito da sociedade e do Exército, que
podem servir de esteio para as ações institucionais nos órgãos de direção seto-
rial de ensino, tais como o DECEx, o Departamento de Ciência e Tecnologia
(DCT) e o Comando de Operações Terrestres (COTER).

1 Coronel do Exército Brasileiro (Academia Militar das Agulhas Negras – AMAN -1993).
14

Para tal, os quinze artigos cuidadosamente preparados enfocam temas


relevantes atualmente para o Sistema de Ensino do Exército, dentre os quais:
a percepção dos docentes do Colégio Militar da Vila Militar e do próprio CEP/
FDC sobre a sua preparação para lidar com a Inteligência Artificial; o impacto
da IA no ambiente militar e no sistema de avaliação do DECEx; os usos do
aplicativo IPCFEx, TFM e saúde para a promoção da capacitação física e
saúde; a utilização da ferramenta de Inteligência Artificial Generativa (IAG),
no intuito de construir a identidade visual de evento científico; o mapeamento

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de competências digitais para melhorar a personalização e a interatividade na
EaD, ponderando a Inteligência Artificial.
INTRODUÇÃO

A
nalistas perspicazes pelo mundo afora têm externalizado o ponto de
vista segundo o qual as inovações tecnológicas mais recentes, dentre
as quais se destaca a Inteligência Artificial (IA), podem vir a gerar
transformações profundas na sociedade contemporânea, comparáveis àquelas
ensejadas pela invenção do Personal Computer (PC) individual, da Internet
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e das redes sociais digitais.


Ao que parece, uma revolução tecnológica e nas práticas sociais se apro-
xima, que pode vir a impactar consideravelmente a economia, a política, a
administração, os conflitos armados, a gestão pública, a vida privada, a edu-
cação, a experiência religiosa e estética.
A verdade é que o processo de difusão da IA já tem desdobramentos
consideráveis. Por exemplo, nos processos de gestão, exigindo iniciativas de
regulação jurídica do acesso aos dados, além de potencialmente colocar em
xeque os modelos atuais de desenvolvimento e avaliação de competências pro-
fissionais e pessoais, sob o risco de gerar desemprego e subemprego massivo.
Eis porque é preciso que a sociedade civil e o Estado questionem a sua
utilização extensiva e intensiva, exigindo a conciliação das demandas da
inovação tecnológica com uma ética que pondere as necessidades do indiví-
duo e da sociedade, tendo como objetivo o acesso democrático à tecnologia
e a sua utilização criteriosa, com vistas a promover o bem comum. Desse
modo, aumentam as reivindicações em relação ao respeito à privacidade e à
responsabilidade no controle de dados, ressaltando-se a importância de criar
mecanismos de controle do uso da IA pautado pela defesa dos direitos huma-
nos e de princípios éticos, tais como os de veracidade, equidade, dignidade
humana, bem-estar social e desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, a proposta desse livro é investigar, a partir de olhares de
várias disciplinas acadêmicas, o impacto de inovações tecnológicas recentes,
com destaque para a IA, nas áreas de Educação e de Comunicação Social, tanto
na sociedade brasileira como um todo, como no âmbito das Forças Armadas.
Para abordar tais temas, o livro se divide em dois eixos temáticos:
1- Problemas, possibilidades e impasses relacionados ao uso atual da IA
e das tecnologias emergentes;
2- Reflexões históricas, análises prospectivas e princípios norteadores
relacionados ao uso da IA e das tecnologias emergentes.
No Capítulo 1, intitulado A Inteligência Artificial nos processos de ensino
e avaliação da aprendizagem: utilização e percepção dos docentes, os autores,
por meio de uma coleta centrada na observação direta, questionário, entrevistas
16

e análise de conteúdo, analisam a percepção e as formas de utilização da IA


dos docentes do Colégio Militar da Vila Militar.
No Capítulo 2, intitulado A percepção de professores da Educação
Superior Militar sobre o uso da Inteligência Artificial no ensino, os autores
realizam uma avaliação dos docentes de um estabelecimento de ensino do
Sistema de Ensino Militar do Exército, o Centro de Estudos de Pessoal (CEP/
FDC), para estimar até que ponto eles se sentem preparados para utilizar a IA
em proveito de suas aulas.

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No Capítulo 3, intitulado O aplicativo IPCFEx, TFM e saúde: reflexões
interdisciplinares sobre uma ferramenta digital voltada para a capacitação
física e saúde, tendo em vista as características da era digital e dos contributos
possíveis da tecnologia para a difusão das práticas de autocuidado na popula-
ção civil e militar, os autores propõem reflexões de caráter interdisciplinar a
partir do layout e das funcionalidades desse aplicativo estruturado em parceria
do IPCFEx com o Instituto Militar de Engenharia do Exército (IME).
No Capítulo 4, intitulado Inteligência artificial como dispositivo midiá-
tico: oportunidades, impactos e desafios, através de uma abordagem qualitativa,
descritiva e indutiva, de pesquisa bibliográfica, e com base na matriz triádica
dos dispositivos midiáticos, a autora problematiza os usos possíveis da Inteli-
gência Artificial (IA) na Comunicação Social realizada pelas organizações, e
seu impacto nas rotinas produtivas e na sociedade midiatizada. O estudo pon-
dera a utilização de simples pesquisa, o planejamento de campanhas completas
de comunicação, o relato de reuniões de pauta, a redação de notícias e e-mails,
a criação de postagens para as redes sociais e de slides de apresentação.
No Capítulo 5, intitulado Inteligência artificial aplicada à análise de
conflito de ideias em redes sociais, com base na epistemologia, nos estudos
sociais e na Lógica Fuzzy, os autores propõem um modelo que visa compreen-
der como comportamento, emoção e subjetividade participam da construção
de um conflito ou polarização de ideias em redes sociais. Nesse sentido, os
autores abordam a análise de sentimentos, mineração textual, mineração de
emoção, bem como a fundamentação em método fuzzy e algoritmo desen-
volvido para auxílio à tomada de decisão na detecção de emoção em texto.
No Capítulo 6, intitulado Gatekeeping, Gatewatching e o filtro dos algo-
ritmos: uma revisão conceitual na seleção dos conteúdos, por meio de uma
revisão bibliográfica baseada na proposta de adequação conceitual de Gerring
(1999), centrada nos critérios tais como o de utilidade de campo, utilidade
teórica, ressonância, coerência e profundidade, os autores analisam a seleção
de notícias ou de temas disponibilizados a uma audiência pelos meios de
comunicação, incluindo a abordagem dos algoritmos.
No Capítulo 7, intitulado a Inteligência artificial generativa como
assistente da comunicação institucional: um estudo exploratório das
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 17

potencialidades e limitações de um evento pensado da IA pela IA, a autora


realiza uma pesquisa experimental de uma ferramenta de Inteligência Artifi-
cial Generativa (IAG), no intuito de construir a identidade visual do Evento
“Jornada de Comunicação Social 2023” do CEP/FDC. Desse modo, buscou-se
desenvolver uma reflexão sobre a IA, apresentando perspectivas e desafios
advindos do processo da concepção de artes visuais. Para tal, a autora utilizou
recursos em testes de geração de imagem pela ferramenta Midjourney, para
identificar pontos limítrofes, riscos e potencialidades da IA, considerando
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questões ligadas à autoria e transparência dos dados, e um olhar centrado na


estética/ padrão norte-americano no retorno das peças.
No Capítulo 8, intitulado Do passado da formação militar à era da
revolução científica permanente: sobre história, tecnologias disruptivas e
soberania nacional, o autor, tendo como fundamentação teórico-metodológica
as ferramentas e referências da ciência histórica, dos estudos estratégicos e
temas conexos, investiga o passado das Forças Armadas brasileiras e as dinâ-
micas de desenvolvimento industrial do país. Busca-se extrair apontamentos
e levantar problemas pertinentes ao debate atual da capacitação brasileira em
Defesa, considerando o cenário atual de uma revolução científica permanente
e a necessidade de superação do gap tecnológico.
No Capítulo 9, intitulado Inteligência artificial na Educação: retrocesso
e/ou avanço? A autora realiza um ensaio no qual discorre sobre as possibili-
dades múltiplas e complexas de recuo ou de progresso decorrentes do impacto
da IA na educação, sem pretensões de exaurir o tema, mas com o objetivo de
suscitar o pensamento crítico e criativo dos que atuam direta ou indiretamente
no contexto educacional.
No Capítulo 10, intitulado O impacto da Inteligência Artificial (IA) no
ambiente militar e na avaliação da aprendizagem do sistema de ensino do
Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), através de pes-
quisa bibliográfica e documental, os autores fazem uma análise prospectiva
dos efeitos da IA no ambiente militar e nas práticas avaliativas do DECEx,
considerando a sua identidade pedagógica construída pela assimilação idios-
sincrásica dos modelos de ensino tradicional, tecnicismo e Escola Nova.
No Capítulo 11, intitulado A Inteligência Artificial e o lugar da cons-
ciência no espaço educacional, os autores, através da revisão bibliográfica
sistematizada de textos coletados no banco de dados na Scientific Electronic
Library On-line – SciELO (2020-2023), investigam como a IA está sendo
compreendida na literatura científica e qual é o lugar da consciência no pro-
cesso de ensino com o uso de tecnologias de segunda geração. Os resultados
permitem avaliar as várias concepções sobre a IA no âmbito do ensino e obser-
var que as aplicações e as implicações da relação entre a IA e a consciência
ainda carecem de aprofundamento.
18

No Capítulo 12, intitulado Análise da Inteligência Artificial dentro dos


periódicos da CAPES em Engenharia de Produção, os autores, por meio de
uma abordagem qualitativa e exploratória e de coleta de dados no banco de
periódicos da CAPES, investigam quais são as aplicações conhecidas na lite-
ratura atual sobre Inteligência Artificial na área de Engenharia de Produção,
verificando a tendência de racionalidade empregada nos artigos das revistas
Qualis A1, A2, B1 e B2.
No Capítulo 13, intitulado A Inteligência Artificial e o pensamento com-

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plexo: encaminhamentos para o ensino, a autora, ponderando a educação
básica e o ensino militar do Exército Brasileiro, sob a égide do paradigma
do ensino por competências, a partir da perspectiva do pensamento com-
plexo de Edgar Morin, propõe, por meio de uma pesquisa bibliográfica, uma
investigação sobre as inteligências necessárias ao século XXI: a inteligência
cognitiva, a inteligência emocional, a inteligência volitiva e a inteligência
decernere. Assim sendo, a autora busca contribuir para a utilização crítica
da IA na mediação com o ensino: conhecer para compreender, compreender
para regular, regular para usar adequada e proficuamente.
No Capítulo 14, intitulado A máquina e a qualidade: Inteligência Arti-
ficial, tecnicismo e o processo de modernização do Exército, baseando-se
na abordagem de Nicolelis, o autor analisa as possibilidades da Inteligência
Artificial para o ensino no Exército, em especial quanto à avaliação somativa,
à luz do diagnóstico que originou o Processo de Modernização do Exército
(PME), bem como da Implantação do Ensino por Competências (IEC). O
artigo alerta para os riscos da retomada do tecnicismo, sob o verniz de uma
falsa “eficiência” conquistada por meio do incremento tecnológico.
No Capítulo 15, intitulado Competências digitais e Inteligência Artificial:
novos desafios no processo de ensino e aprendizagem a distância, por meio
da seleção de artigos publicados entre 2019 e 2023, a autora aborda o impacto
da IA na Educação a Distância (EaD), apresentando um panorama histórico e
conceitual de estudos sobre o tema, com o objetivo de realizar um mapeamento
atualizado das competências digitais, evidenciando o potencial da IA para
melhorar a personalização e a interatividade na EaD, embora a sua utilização
adequada seja ainda um desafio e levante questões éticas e pedagógicas.
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PROBLEMAS, POSSIBILIDADES E IMPASSES


RELACIONADOS AO USO ATUAL DA IA
E DAS TECNOLOGIAS EMERGENTES
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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
NOS PROCESSOS DE ENSINO E
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM:
utilização e percepção dos docentes
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Edson Ramon Lima Pereira dos Santos2


Priscila Castro3
Tatiana Di Blasi4

Introdução

A
Inteligência Artificial (IA) está transformando radicalmente todos
os aspectos da sociedade. A acelerada evolução tecnológica, ocor-
rida desde a segunda metade do Séc. XX, proporcionou avanços
revolucionários que alteraram diversas dinâmicas do mundo contemporâneo,
refletindo-se no cotidiano dos indivíduos. Nesse contexto, um dos maiores
desafios que a geração dos educadores enfrenta na atualidade é a mobilização
de recursos para compreender e interagir com a geração dos nativos digitais5.
Ao considerar as demandas sistêmicas que o avanço tecnológico gera,
surgem reflexões sobre a capacitação da sociedade para lidar com os desafios
futuros. No contexto da Ciência Política, Lipsky (2019) apresenta o conceito
Street-Level Bureaucracy, caracterizado pela centralidade dos atores da “ponta
da linha” para o sucesso de políticas públicas. Guimarães, Bernardo e Borde
(2022) complementam que o professor, enquanto burocrata de nível de rua,
operacionaliza seu projeto educativo articulando estratégias com elevada
autonomia nas interações com seus alunos.

2 Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais (UFPB). Especialista em Psicopedagogia Escolar


(CEP/FDC). Especialista em Ciências Militares (ESAO) e Bacharel em Ciências Militares (AMAN). Chefe
da Seção Psicopedagógica do Colégio Militar da Vila Militar. E-mail: santos.edsonramon@gmail.com
3 Mestra em Educação (UERJ). Especialista Administração, Supervisão e Orientação Educacional (Unipli). Gra-
duação em Letras (Português/ Inglês) (Universidade Salgado de Oliveira). Graduação em Pedagogia (UniCV).
Professora do departamento de LEM do Colégio Militar da Vila Militar. E-mail: priscilla707@gmail.com
4 Pós-Doutora em Biofisica (UFRJ). Doutora em Ciências (Fiocruz). Mestra em Ciências (Fiocruz). Licenciada
em Biologia (Universidade Estácio de Sá) e Bacharel em Biomedicina (Unirio). Professora de Biologia do
Colégio Militar da Vila Militar. E-mail: tati.di.blasi@gmail.com
5 De acordo com Prensky (2001), os estudantes mudaram radicalmente e os alunos de hoje não são os
mesmos para os quais o sistema educacional foi criado. Nesse sentido, ele cunhou o termo nativos digitais
em referência à categorização da geração dos “falantes nativos” da linguagem digital dos computadores,
vídeo games e internet. Saiba mais em (Prensky, 2001).
22

Com o intuito de atender às demandas do avanço da sociedade e promover


estratégias educacionais adequadas aos seus estudantes, a partir de 2012, o Exér-
cito Brasileiro implantou o Ensino por Competências (BRASIL, 2012). Nesse
contexto, alinhando as diretrizes institucionais e às peculiaridades do mundo
atual, a Diretoria de Ensino Preparatório e Assistencial (DEPA) estabeleceu,
entre outros, o objetivo de “capacitar o corpo permanente dos Colégios Militares,
de modo a estimular a inovação das práticas pedagógicas, uso das tecnologias
de informação e a conscientização da perspectiva dos multiletramentos como

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fundamento para desenvolver as competências discentes” (BRASIL, 2021).
Diante do exposto, considerando a relevância do papel dos educadores
nas escolas e a influência das inovações tecnológicas na vida das pessoas, esta
pesquisa tem o objetivo de identificar os efeitos sistêmicos gerados pelo avanço
tecnológico, em especial da Inteligência Artificial, no cotidiano dos professo-
res. Ou seja, partindo da reflexão de Prensky (2001) que caracteriza os edu-
cadores como imigrantes digitais6, pergunta-se: como os docentes percebem
e utilizam as ferramentas tecnológicas da IA em suas práticas profissionais?
De acordo com Silva (2018), uma possibilidade de desenvolver pesquisas
em Ciências Sociais destinadas ao estudo do “efeito das causas” é adotando
desenhos de pesquisas com N-pequeno. Nesse sentido, a partir de uma pers-
pectiva qualitativa, baseada em pesquisa de campo, adotamos os objetivos
específicos de identificar: i) em que medida os professores estão familiarizados
com a Inteligência Artificial; ii) como é a utilização das inovações tecnológicas
na preparação e/ou execução de suas aulas; e iii) qual a percepção dos profes-
sores dos desdobramentos futuros da Inteligência Artificial no contexto escolar.
Para atingir os objetivos propostos, o artigo se organiza em quatro seções,
além da introdutória. A primeira se destina à apresentação do referencial teó-
rico, a segunda aborda os critérios metodológicos adotados, a terceira é voca-
cionada aos achados da pesquisa e, por fim, são realizadas as considerações
finais. Por meio da análise, ressalta-se que os dados sugerem boa familiaridade
dos docentes com a IA, utilização significativa de inovações tecnológicas
no exercício da docência e demandas de desenvolvimento de habilidades e
competências de professores e alunos para fazer face aos desafios futuros.

Os três níveis da Inteligência Artificial

Num primeiro momento, o termo “Inteligência Artificial” pode ser


compreendido como: “a ciência de se produzir máquinas inteligentes,

6 De acordo com Prensky(2001) os docentes da atualidade são dotados de uma linguagem ultrapassada (da
era pré-digital) e, a fim de estreitar a relação com a nova geração, estão em esforço contínuo para alcançar
proficiência na linguagem dos nativos digitais.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 23

especialmente programas de computador inteligentes” (McCARTHY, 2007).


Entretanto, o avanço dos estudos na área evidenciou que a IA não consiste
apenas na descrição de uma única tecnologia. Baker e Smith (2019) explicam
que, para além de descrever uma série de tecnologias e métodos, é um termo
genérico que inclui um amplo ramo de inovações tecnológicas.
De acordo com Legg e Hutter (2007), de um ponto de vista histórico,
as inovações tecnológicas baseadas em IA podem ser classificadas em três
níveis: i) Artificial Narrow Intelligence (ANI), conhecida como IA restrita,
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caracterizada por inovações tecnológicas desenvolvidas para resolver proble-


mas específicos; ii) Artificial General Intelligence (AGI), definida como IA
geral, com o potencial de criar máquinas capazes de raciocinar e pensar como
os seres humanos; e iii) Artificial Super Intelligence (ASI), a Super IA, que
seria capaz de ultrapassar as capacidades da mente humana.
Nos debates acadêmicos sobre a IA, uma questão controversa é a atual
capacidade das inovações tecnológicas. Enquanto alguns acadêmicos argu-
mentam que a ANI caracteriza o nível alcançado atualmente (SABZALIEVA;
VALENTINI; 2023), outros defendem que o lançamento do ChatGPT7, em
dezembro de 2022, representa uma produção tecnológica nível AGI (LATIF
et al., 2023). Há ainda iniciativas como a carta aberta publicada pelo Future
of Life Institute8, em março de 2023, que solicita ao mundo uma pausa nos
experimentos das novas tecnologias, apontando os riscos de produção tecno-
lógica da ASI antes que a humanidade esteja preparada para essa realidade.
Ao pesquisarem o futuro da IA nas escolas, Baker e Smith (2019) suge-
rem a seguinte categorização: i) IA orientada para o aluno; ii) IA orientada para
o professor; e iii) IA orientada para a gestão escolar. A partir dessas reflexões,
considerando que os professores são o objeto de estudo do presente trabalho, a
revisão da literatura se divide em três momentos: a subseção inicial apresenta
as áreas de pesquisa da IA na educação, a seguinte se dedica às ferramentas de
IA disponíveis para os docentes e, por fim, identifica-se algumas prospecções
propostas nos debates acadêmicos.

7 O ChatGPT é uma inovação tecnológica desenvolvida pela empresa OpenAI, a partir de um modelo de
linguagem de última geração, baseado na arquitetura GPT (Generative Pre-training Transformer) e Machine
Learning a partir de Big Data.
8 O Future of Life Institute é uma organização sem fins lucrativos com o objetivo declarado de reduzir os
riscos globais relacionados ao desenvolvimento da IA. Em março de 2023, publicou uma carta aberta com
assinatura de pesquisadores notáveis de IA, líderes empresariais e renomados professores nos seguintes
termos: “os laboratórios entraram numa corrida fora de controle para desenvolver Inteligência Artificial cada
vez mais poderosas de forma que ninguém – nem mesmo os seus criadores – consegue compreender, prever
ou controlar de forma confiável” (ver mais em https://futureoflife.org/open-letter/pause-giant-ai-experiments/).
24

A Inteligência Artificial na educação

Ao estudar as tendências das pesquisas em IA na educação, Vicari (2018)


analisou a produção científica e o registro de patentes e elaborou um roadmap9,
identificando quatro grandes áreas de pesquisas: i) Learning Management Sys-
tem (Sistema de Gestão de Aprendizagem); ii) Sistema Tutorial Inteligente; iii)
Massive On-Line Open Course; e iv) Robótica Educacional. A autora destaca que
a IA aplicada à Educação é uma área de pesquisa multi e interdisciplinar, contem-

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plando o uso de tecnologias da IA em sistemas focados no ensino e aprendizagem.
O Learning Management System (LMS), também conhecido como
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), é uma “ferramenta que organiza
e regula as tarefas administrativas da sala de aula, apoia professores e alunos
no processo de ensino e aprendizagem e informa os pais sobre os progres-
sos dos seus filhos nas atividades escolares” (NASSER et al. 2011). É um
espaço virtual, que é articulado por meio da internet e reúne ferramentas de
comunicação e de disponibilização de conteúdo didático.
Por sua vez, os Sistemas Tutoriais Inteligentes (STI) são sistemas infor-
matizados que, incorporando elementos da IA, fornecem instruções persona-
lizadas, sem a intervenção de seres humanos, considerando as especificidades
dos indivíduos. Ota et al. (2019) apresentam iniciativas exitosas nas áreas de
português e matemática, argumentando que a personalização da aprendizagem
é orientada pela utilização de mecanismos de avaliação que geram feedbacks,
processados pelos algoritmos por meio da interação com os estudantes.
Os Massive On-line Open Courses (MOOCs) são cursos que podem ser
acessados por qualquer pessoa interessada em aprender sobre um determinado
assunto. São caracterizados pelo amplo acesso aos recursos pedagógicos e pela
construção de conhecimento por meio de interações sociais e educacionais.
Segundo Vicari (2018), Big Data e Learning Analytics surgiram, no contexto
educacional, a partir da grande quantidade de dados gerados pelos discentes
nos MOOCs e a necessidade de evolução da IA para processar esses dados.
Essa tecnologia foi rapidamente adaptada para as realidades dos Sistemas
Tutores Inteligentes, LMSs e Robótica Educacional.
A “robótica educacional” é caracterizada pelo uso da robótica em con-
textos pedagógicos. De acordo com Campos (2017), o campo de pesquisa e
prática emergiu como um recurso tecnológico de aprendizagem que oferta
o “aprender fazendo”, fomentando o interesse e a curiosidade dos alunos.
Entretanto, o autor destaca que a maioria das iniciativas envolvendo a robótica
na escola não está integrada às aulas regulares do currículo.

9 Roadmap é uma representação visual para explorar e comunicar interações dinâmicas entre recursos, objetivos
e alterações.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 25

A utilização de inovações tecnológicas da IA ocorre de maneira transversal


aos campos de estudos supracitados. Tavares, Meira e Amaral (2020) exem-
plificam essa utilização por meio da Aprendizagem Adaptativa, dos Tutores
Inteligentes, das ferramentas de diagnósticos, sistemas de recomendação, gami-
ficação e mineração de dados aplicados à educação. Vicari (2018) complementa,
destacando a vasta oferta de produtos de Processamento de Linguagem Natural
e da expansão de pesquisas sobre a Aprendizagem Colaborativa, a Criatividade
e a Ética Computacional, o Uso de Redes Sociais, da Internet das Coisas (IoT)
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e do Armazenamento de Conteúdo Educacional em Banco de Dados digitais.

As possibilidades de utilização da Inteligência Artificial nos processos


de ensino e de avaliação da aprendizagem

Alinhados com o protagonismo dos professores, Guimarães, Bernardo e


Borde (2022), Luckin et al. (2016) consideram que os docentes são os orques-
tradores de quando e como utilizar estas ferramentas de IA na educação. Revi-
sitando a categorização proposta por Baker e Smith (2019), são identificadas
três perspectivas para pensar a usabilidade da IA pelo docente: i) os professores
como aprendentes, utilizando a IA no autoaperfeiçoamento ou na formação
continuada; ii) a utilização da IA pelo professor como instrumento para ações;
e iii) a utilização das informações geradas pela IA na gestão escolar.
Refletindo sobre a necessidade da proatividade do docente no desen-
volvimento de competências e habilidades para trabalhar com a IA, Pedro
et al. (2019) distinguem “escolaridade” de “aprendizagem”, sugerindo que a
escolarização ocorre em ambientes estruturados, num tempo e num lugar fixos,
enquanto a aprendizagem ocorre de forma contínua, independentemente do
tempo e do local. Assim, segundo os autores, os MOOCs são ótimos exem-
plos de canais que contribuem para a formação dos professores em aspectos
relacionados com a IA, utilizando técnicas de IA.
No contexto dos STI, que tem como característica a adaptação de estraté-
gias didáticas e modelagem de processos de ensino e aprendizagem para oti-
mizar o aprendizado, professores podem buscar seu aprimoramento em áreas
que julguem interessantes. De acordo com Ocanã-Fernandez et al. (2019),
existe uma quantidade considerável de aplicativos gratuitos de aprendizagem
on-line, como Carnegie Speech ou Duolingo, que oferecem capacitação em
línguas estrangeiras, utilizando técnicas de programação baseadas na IA.
No escopo da utilização das inovações tecnológicas como ferramenta
do docente para suas ações educativas, Santos et al. (2021) exemplificam a
utilização da IA no contexto da programação tradicional por meio dos algorit-
mos que propõem indicações de conteúdos alinhados com o perfil do usuário.
26

Como exemplo, quando os docentes utilizam dispositivos on-line para efetuar


uma pesquisa, o sistema deep learning, baseado em IA, é ativado para, a partir
das características individuais, ofertar recomendações.
De acordo com Vicari (2021), a IA atual consegue bons resultados quando
o foco é apenas um indivíduo. Destaca, ainda, que é preciso reconhecer que foi
através de Machine Learning, com o apoio de Big Data, Learning Analytics,
raciocínio baseado em Redes Neurais e nos modelos estatísticos, que a IA
teve seus maiores avanços. Exemplos disso podem ser verificados em agen-

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tes inteligentes, como Siri (Apple), Alexa (Amazon) ou Cortana (Microsoft)
(FERRÃO et al., 2021).
Outra possibilidade do emprego da IA pelos profissionais da educação
está na utilização de metodologias ativas por meio do Ambientes Virtuais de
Aprendizagem (AVA). Santos et al. (2021) destacam a relevância do AVA para
as instituições de ensino, sendo de extrema importância para o sucesso de quem
ensina e de quem aprende. Seus mecanismos auxiliam na compreensão da rela-
ção entre recursos didáticos e as ferramentas tecnológicas que estão envolvidas.
Nesse contexto, o Brasil (2023) instituiu recentemente a Política Nacional
de Educação Digital, na qual estabeleceu o eixo Educação Digital Escolar,
com o objetivo de garantir a inserção da educação digital nos ambientes esco-
lares. Destaca-se, entre as estratégias prioritárias, a promoção de projetos e
práticas pedagógicas, assim como a promoção da formação de professores
em competências digitais ligadas à cidadania digital e à capacidade de uso
de tecnologia, independentemente de sua área de formação.

Demandas futuras a partir do avanço da Inteligência Artificial

Nunes (2022) provocou o pensamento crítico ao caracterizar o ambiente


informacional da atualidade com o acrônimo PSIC: precipitação, superfi-
cialidade, imediatismo e conturbação. Para o autor, a precipitação advém
da necessidade de parecer estar bem informado, num universo que migrou
das mídias de massas para a massa de mídias. No afã de emitir opiniões, os
indivíduos consomem informações de maneira superficial, buscando soluções
em tempo real, contribuindo para uma atmosfera conturbada.
Nesse contexto, as técnicas de IA que empregam Large Language Model
(LLM), como o ChatGPT, têm potencial de contribuir para a intensificação da
precipitação, da superficialidade e do imediatismo. Nesse sentido, Ang et al.
(2023) destacam que a IA pode ser uma bênção ou uma maldição. Para Islas
et al. (2023), os professores e os criadores de currículos escolares precisam
considerar a utilização destas ferramentas não como uma forma de infração
acadêmica, mas como uma competência estratégica para aprender e ensinar,
fornecendo recursos aos estudantes para enfrentar os desafios de seu tempo.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 27

Apesar da IA ser uma ferramenta facilitadora e um fator de mudança,


existem preocupações complexas sobre o seu impacto em diversas áreas, prin-
cipalmente no tocante à ética, privacidade, possibilidade de enviesamento e
potenciais responsabilidades legais. Um dos aspectos que demandam atenção
se relaciona aos dados dos indivíduos. Dijck, Poell e Wall (2018) apresentam o
conceito de “sociedade de plataformas”, que apresenta os fluxos econômicos e
de convivência social modulados por uma rede global de plataformas digitais,
baseadas em IA, com algoritmos vinculados ao Big Data.
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Estudando a complexidade do papel de poder exercido por meio de algo-


ritmos, Meireles (2021) identifica um processo de autoafirmação, no qual a
exposição da intimidade opera como um reforço da identidade, facilitando a
extração de dados por meio da exploração do estado emocional das pessoas.
Dessa forma, “o foco mudou de máquinas que superam os limites do nosso
corpo para máquinas que modificam o comportamento de indivíduos, grupos
e populações em prol de objetivos mercadológicos” (ZUBOFF, 2021).

Percurso metodológico

A fim de atingir os objetivos propostos, adotou-se uma abordagem de


pesquisa qualitativa para realizar uma análise aprofundada dos dados cole-
tados. De acordo com Rezende (2011), uma peculiaridade de pesquisas com
N-pequeno é que os dados se tornam intratáveis se compreendidos a partir de
uma lógica frequentista para pensar causalidade e inferência causal. Assim,
como indicado por Silva (2018), adota-se a investigação de campo, com os
pesquisadores em contato direto com o objeto em estudo.
O ponto de partida consistiu na adoção das seguintes questões de estudo:
i) Em que medida os profissionais do Corpo Docente estão familiarizados
com a Inteligência Artificial?
ii) Existe a utilização de produtos tecnológicos com Inteligência Artificial
na preparação e/ou execução de suas aulas? iii) Qual a percepção dos professores
para os desdobramentos futuros da Inteligência Artificial no contexto escolar?
Para coletar os dados, foram selecionadas três técnicas: observação par-
ticipante, aplicação de um questionário e entrevista com os professores. A
observação participante permitiu observar o uso da IA in loco, em situações
reais de planejamento e preparação, na sala dos professores, assim como
acompanhamento nas salas de aula durante as atividades de ensino. Isso pos-
sibilitou uma boa compreensão do uso da IA na educação, bem como das
percepções dos professores sobre essa tecnologia.
Com o intuito de sistematizar a análise, foi aplicado um questionário
utilizando a plataforma Google Forms. O questionário foi composto por per-
guntas abertas e fechadas, elaboradas com base em dados identificados na
28

revisão da literatura, particularmente nas reflexões de Parreira et al. (2021).


Teve como objetivo identificar a familiaridade, características de utilização e
percepção dos docentes quanto aos possíveis desdobramentos futuros do uso
da IA na educação. Por fim, partindo dos dados obtidos na observação direta
e nos questionários, foram realizadas entrevistas semiestruturadas pontuais
para aprofundar a análise.
Todo material coletado foi submetido à análise de conteúdo para a identi-
ficação dos principais temas e padrões presentes no material produzido. Desse

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modo, utilizou-se um processo interativo de pesquisa, permitindo o refina-
mento das categorias estudadas, à medida que os instrumentos apresentaram
resultados. A seguir, compartilhamos os achados do estudo, dividindo-os,
respectivamente, nos seguintes aspectos: familiaridade dos docentes com a
IA, em sua utilização no cotidiano profissional e em suas percepções quanto
aos desdobramentos futuros.

Percepções docentes sobre o uso da IA na educação

Baseado nas quatro áreas de pesquisa identificadas na prospecção de


Vicari (2018), realizou-se uma análise para buscar evidências das abordagens
teóricas sobre o uso da IA na educação. Em função do tamanho da população
de professores (N=17) e da viabilidade da execução, a totalidade do corpo
docente do Colégio Militar da Vila Militar participou da pesquisa. Destaca-se
que todos são militares, sendo 16 Oficiais Técnicos Temporários recém ingres-
sados, o que sugere que suas percepções incluem a experiência profissional
atual e suas atividades de magistério nas escolas anteriores (Tabela 1).

Tabela 1 – Características da Amostra


Sexo % Faixa Etária % Tempo de % Escolaridade % Área do %
Magistério Conhecimento
F 71 < 30 anos 12 < 10 anos 8 Graduação 12 Linguagens 35
M 29 Entre 30 e 76 Entre 10 67 Especialização 41 Matemática 12
40 anos e15 anos
> 40 anos 12 > 15 anos 25 Mestrado 29 Ciências da 18
Natureza
Doutorado 18 Ciências 29
Humanas
Orientação 6
Educacional

Fonte: Autores.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 29

Os docentes e as inovações tecnológicas que utilizam IA

A partir das evidências empíricas, pode-se inferir que a utilização de


plataformas, aplicativos e dispositivos que empregam algoritmos de IA fazem
parte do cotidiano dos docentes. Os resultados do questionário (Figura 1)
demonstram uma elevada assiduidade no uso de bancos de dados digitais,
redes sociais, softwares desenvolvidos para uso em celulares e elementos de
ensino a distância.
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Figura 1 – Familiaridade dos docentes com as inovações tecnológicas

Fonte: Elaboração dos autores.

Retomando a reflexão proposta por Baker e Smith (2019), relativa à


usabilidade da IA pelo docente como estudante, utilizando-a no auto-aper-
feiçoamento ou na formação continuada, os resultados apresentam as catego-
rias de inovações utilizadas pelos profissionais (Tabela 2). Verifica-se que as
iniciativas individuais são as opções mais acessadas pelos professores, com
ênfase em plataformas de vídeo, buscadores on-line e redes sociais.
Outra peculiaridade identificada na análise dos padrões de estudo dos
docentes relaciona-se à utilização de STI e MOOC para o autoaperfeiçoa-
mento. Apesar de constituírem a categoria menos acessada, cerca de metade
dos profissionais os utilizam para estudo individualizado. No contexto do
STI, foi citado o aplicativo de estudo de idiomas Duolingo10. Em relação aos
cursos on-line, foram apresentadas as plataformas Learncafe11 e Unesco12.
Nesse escopo, o Professor 1 sintetiza sua estratégia de preparo individual da

10 Duolingo – A melhor maneira do mundo de aprender um idioma.


11 https://www.learncafe.com/
12 https://openlearning.unesco.org/
30

seguinte forma: dentre os distintos mecanismos que estão disponíveis para


estudar apoiado por inovações tecnológicas, os cursos on-line de atualização,
especialização e formação continuada são realidade.

Tabela 2 – Categorias de inovações tecnológicas


utilizadas no autoaperfeiçoamento
Item Quantidade Percentual

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Plataformas de Vídeo 16 94%
Buscadores On-Line 15 88%
Redes Sociais 13 76%
Tradutores On-Line 12 71%
Buscadores Acadêmicos 10 59%
STI 9 53%
MOOC 8 47%
Fonte: Elaborado pelos autores.

Fruto do estudo das respostas apresentadas pelos participantes, verificou-


-se que o corpo docente do Colégio Militar está muito familiarizado com as
inovações tecnológicas baseadas em IA, o que facilita o estudo individuali-
zado. Pode-se inferir que, para além de conhecer e saber da funcionalidade dos
mecanismos, os professores utilizam diversos recursos para fins recreativos e
educativos, sugerindo que a IA faz parte do cotidiano desses profissionais.

As ferramentas baseadas em IA e o exercício da docência

No escopo do impacto da IA no cotidiano dos professores, os resultados


(Figura 2) mostraram que os docentes entendem que a tecnologia baseada em
IA facilita o trabalho do professor sem se configurar uma ameaça. Entretanto,
ressaltam que as inovações configuram um desafio que exige a constante
atualização dos profissionais. Ao identificar que os educadores não associam
desafio a dificuldade, pode-se inferir que entendem a demanda por capacitação
como algo natural e positivo.
No contexto do uso para preparo e execução das aulas, constatou-se a
presença de uma multiplicidade de ferramentas tecnológicas, variando de
buscadores na internet a softwares de criação de conteúdo. Ressalta-se a
consolidação do EB Aula, um LMS desenvolvido pelo Centro de Educação
a Distância do Exército para gestão técnica de EaD, como uma ferramenta
adequada para a institucionalização do Ensino a Distância (ver Tabela 2).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 31

Figura 2 – Impacto das inovações tecnológicas no trabalho docente


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Fonte: Elaboração dos autores.

Entre os mecanismos de busca, foram citados sites de nichos acadêmicos


como Google Acadêmico, Scielo e Web of Science usados para identificar pes-
quisas científicas relacionadas ao conteúdo curricular. Também foi identificada
a utilização de buscadores diversos como Google e Microsoft Bing, que são
usados para atividades diversas como procura por imagens e vídeos ilustra-
tivos, apresentados aos alunos por meio de computador e projetor de vídeos.

Tabela 3 – Categorias de inovações tecnológicas utilizadas na preparação de aulas


Item Quantidade Percentual
Buscadores On-Line 16 94%
Ambiente Virtual de Aprendizagem 15 88%
Ferramentas para construção de conteúdo 14 82%
Ferramentas para construção de jogos 7 41%
Ferramentas para criação de textos 2 12%
Fonte: Elaborado pelos autores.

No tocante às ferramentas de construção, os dados apontam para a uti-


lização de softwares para organizar o conteúdo e outros para estratégias de
criação de jogos. As iniciativas dedicadas à preparação das aulas utilizam os
programas Prezzi, Active Presenter, Canva e algumas ferramentas disponíveis
no EB Aula para montar dinâmicas com vídeos interativos no H5P. Quanto à
criação de jogos, identificou-se a utilização do Kahoot, Quizziz e Wordwall.
32

A partir dos dados, é válido destacar que, apesar da literatura enfatizar


a crescente utilização de ferramentas baseadas em machine learning e PLN
como o ChatGPT (ZHAI, 2022; ANG et al. 2023; LATIF et al. 2023), uma
pequena parcela de professores utiliza esse tipo de tecnologia. Entretanto,
constata-se a presença maciça de instrumentos tecnológicos nas práticas des-
ses profissionais.

Desdobramentos futuros da IA na educação

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Quanto aos reflexos futuros da difusão da IA, os dados apresentam que
os docentes entendem que, cada vez mais, as inovações tecnológicas estarão
associadas ao estudo remoto e autônomo. Entretanto, não pensam que a quan-
tidade de profissionais será reduzida (Figura 3). De maneira geral, acredita-se
que o papel dos profissionais da educação vai se transformar na direção da
curadoria das propostas educativas, aumentando a centralidade do aluno no
processo ensino aprendizagem.

Figura 3 – Percepção sobre o futuro do impacto das


inovações tecnológicas nas atividades educativas

Fonte: Elaboração dos autores.

No contexto das competências a serem desenvolvidas, os resultados


sugerem que as tecnologias de informação tenderão a alterar o perfil profis-
siográfico dos docentes. Segundo o Professor 3, “o processo educativo deve
ser pautado na constante atualização de suas bases formativas para direcionar
seus mecanismos de ensino e aprendizagem ao diálogo com a realidade dos
estudantes inseridos no contexto de ciberculturas”.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 33

Seguindo a mesma linha de raciocínio, o Professor 4 evidencia o papel do


docente como um desses mecanismos e afirma que é fundamental “promover
a qualificação dos professores, para que possam ter um estudo assertivo, com
maior apoio para a formação continuada, auxiliando-o de forma efetiva na sua
prática didática”. Retomando a reflexão de Islas et al. (2023), o Professor 5
apresenta que “a Inteligência Artificial pode e deve ser usada como ferramenta
facilitadora, e não como um substituto para a criatividade e planejamento.”
No escopo das reflexões apresentadas por Dijck et al. (2018) e por Meireles
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(2021), sobre a utilização das redes sociais e a influência dos algoritmos basea-
dos em IA, o Professor 6 compartilha que “o futuro da educação deve buscar
práticas educativas que capacitem os discentes a utilizar as novas tecnologias de
forma responsável, conscientizando-os dos seus benefícios e malefícios”. Por
sua vez, o Professor 7 complementa que “as diretrizes de implantação de IA na
educação direcionam uma mudança estrutural no ser e no pensar, o que condi-
ciona novos caminhos para o ofício do magistério e do cotidiano dos alunos”.
No contexto da implementação das medidas relacionadas a sistematização
da IA na educação, o Professor 7 relata que “as estratégias devem ser adotadas
aos poucos, buscando efetivar a inclusão de todos, promovendo maior solidez
na trajetória”. Entretanto, constata-se a existência de profissionais mais céti-
cos quanto a sua efetividade, como se observa no relato do Professor 8, que
apresenta o conflito entre tempo disponível e quantidade de trabalho como
um grande desafio:

Acredito que a estrutura de ensino atual contempla em partes a inserção das


novas tecnologias. Horários engessados e uma carga horária incompatível
com as demandas atuais desafiam os profissionais. A inserção dos AVA
no cotidiano escolar aumenta a demanda de tempo para preparo das aulas
enquanto as atividades desenvolvidas em salas presenciais são mantidas
inalteradas. Não há compatibilidade do trabalho com a carga horária.

De maneira geral, considerando o alinhamento da educação em valores,


dos conteúdos acadêmicos, da utilização de metodologias ativas, da existência
de computador com acesso à internet e projetor multimídia nas salas de aula,
os docentes afirmaram que os desdobramentos futuros da Política Nacional de
Educação Digital no estabelecimento de ensino onde ocorreu a pesquisa será
factível e viável. Porém, é consenso que a realidade da educação brasileira é
heterogênea. Como destaca o Professor 9:

As instituições de ensino têm muito a se beneficiar adotando a Inteli-


gência Artificial. Porém, como cada escola atua com públicos diferentes
e, às vezes, até em segmentos específicos, é evidente que suas neces-
sidades quanto à digitalização vão variar. Na educação, essa novidade
34

ainda cresce em passos lentos, possivelmente por conta dos custos de sua
implementação no sistema de ensino e pela necessidade de capacitação
de professores e líderes das instituições de ensino para realizarem o bom
uso das novas ferramentas.

Os dados apresentam que, do ponto de vista dos docentes, os desdobra-


mentos futuros da Inteligência Artificial no contexto escolar estão diretamente
relacionados à estrutura do estabelecimento de ensino. Nesse escopo, destacam

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a importância da educação em valores, do desenvolvimento socioemocional
e da garantia de acesso a essa tecnologia a todas as pessoas.

Considerações finais

Diante do papel do docente na educação, compreender a percepção dos


professores sobre aspectos que geram demandas sistêmicas é fundamental
para reflexões realistas quanto às possibilidades e limitações das práticas
pedagógicas aplicadas junto aos discentes. Além disso, entender as demandas
dos profissionais que atuam no “chão da sala de aula” pode fornecer preciosos
insights para a formulação e implementação de políticas educacionais.
Em síntese, este estudo evidenciou a familiaridade dos educadores com
as inovações tecnológicas baseadas em IA, sua utilização no cotidiano profis-
sional e suas percepções sobre os desdobramentos futuros da IA na educação.
Constata-se que os professores reconhecem demandas sistêmicas de desen-
volvimento de habilidades e competências alinhadas aos desafios oriundos do
avanço tecnológico e compreendem que o sucesso das práticas se relaciona
diretamente aos recursos estruturais.
Os resultados contribuem para um entendimento do papel da IA no exer-
cício da docência e visam subsidiar reflexões sobre o uso efetivo e responsável
da tecnologia na educação. Assim, as discussões apresentadas contribuem,
tanto no aspecto de lançar luz sobre a importância de considerar a perspec-
tiva dos docentes na elaboração de políticas públicas educacionais, quanto
na identificação de dificuldades observadas pelos burocratas do nível de rua.
Como marco conclusivo, para além de identificar como os docentes
percebem e utilizam as ferramentas tecnológicas baseadas na IA, ratifica-se
a demanda por mais estudos sobre o impacto da tecnologia na sociedade, e,
em particular, na educação. Assim, sugerimos a combinação de métodos que
permitam a análise profunda e detalhada de casos específicos e pesquisas
de maior alcance, com desenhos de pesquisas de N grande para subsidiar
análises quantitativas.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 35

REFERÊNCIAS
ANG, T. L.; CHOOLANI, M.; SEE, K. C.; POH, K. K. The rise of artificial
intelligence: addressing the the impact of large language models such as
ChatGPT on scientific publications. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.
nih.gov/pmc/articles/PMC10144457/. Acesso em: 10 jul. 2023.
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BAKER, Toby; SMITH, Laura. Educ-AI-tion rebooted? Exploring the


future of artificial intelligence in schools and colleges. Nesta Foundation,
2019. Disponível em: Educ-AI-tion Rebooted? Exploring the future of artifi-
cial intelligence in schools and colleges (nesta.org.uk). Acesso em: 12 jun. 23.

BRASIL. Ministério da Defesa. Exército Brasileiro. Estado-Maior do Exér-


cito. Portaria nº 137, de 28 de fevereiro de 2012. Aprova a Diretriz para o
Projeto de Implantação do Ensino por Competências no Exército Brasileiro.
Brasília, DF, 2012.

BRASIL. Ministério da Defesa. Exército Brasileiro. Portaria – DECEx/C


Ex nº 220, de 14 de junho de 2021. Brasília, DF, 2021.

BRASIL. Presidência da República. Lei nº 14.533, de 11 de janeiro de 2023.


Institui a Política Nacional de Educação Digital e altera as Leis nº 9.394, de
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Felipe Jorge Granero13


Ligia Silva Leite14

Tecnologias e educação

O
uso de tecnologias no meio educacional tem evoluído ao longo do tempo
e beneficiado, cada vez mais, o processo de ensino e aprendizagem.
Diante dessa realidade, exige-se um autoaperfeiçoamento dos docen-
tes, a fim de que esses estejam familiarizados e utilizem as novas ferramentas
tecnológicas em suas aulas. Essa demanda é crescente devido à necessidade
de fomentar um maior engajamento dos alunos no processo de aprendizagem.
Vivemos na era digital, na qual a tecnologia desempenha um papel sig-
nificativo em nosso cotidiano. Ao incorporar ferramentas tecnológicas nas
aulas, como dispositivos eletrônicos, softwares educacionais e outros recursos
interativos, os educadores podem vir a criar um ambiente de ensino mais
dinâmico e estimulante. Além disso, presume-se que o uso da tecnologia
poderia promover uma abordagem mais personalizada, permitindo que os
alunos explorem conteúdos de forma autônoma e interativa, o que aumenta-
ria a sua motivação e concentração. Portanto, de acordo com Silva (2017),
reconhecer e aproveitar os benefícios das tecnologias educacionais seria um
fator essencial para garantir um ensino eficaz e manter os alunos envolvidos
e interessados no processo de aprendizagem.
Assim sendo, este estudo considera que a capacitação do docente para
lidar com as tecnologias em sala de aula é crucial para garantir uma educa-
ção de qualidade no mundo contemporâneo. Por meio dessa preparação, o

13 Possui mestrado em avaliação pela Fundação CESGRANRIO, tendo especialização em Ciências Militares
pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO). É Bacharel em Ciências Militares (AMAN). Atualmente
é Chefe da Seção Técnica de Ensino no CEP/FDC. E-mail: felipegranero@hotmail.com
14 Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestrado em Educação pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutorado Em Educação – Temple University e Pós-Doutorado em
Tecnologia Educacional – Universidade de Pittsburgh. Atualmente professora adjunto do Departamento de
Estudos Aplicados ao Ensino, da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ) e do Mestrado Profissional em Avaliação, da Faculdade CESGRANRIO. E-mail: ligialeite@terra.com.br
40

professor se tornaria um facilitador do processo de aprendizagem, na opinião


de Ferreira (2019), capaz de utilizar as ferramentas tecnológicas de maneira
efetiva e promover experiências de ensino enriquecedoras para os alunos. Ou
seja, investir na capacitação docente é investir no futuro da educação.
Além disso, no cenário educacional atual, a capacitação docente em tec-
nologia desempenha um papel fundamental na preparação dos professores para
lidar com os desafios e oportunidades trazidos pela era digital. A crescente pre-
sença da Inteligência Artificial (IA) no campo da educação tem despertado um

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novo horizonte de possibilidades. Nesse contexto, compreender a importância
da capacitação docente em tecnologia, aliada ao uso inteligente da IA, torna-se
crucial para promover uma educação mais personalizada, adaptativa e eficaz.
Os estudos a respeito do uso da Inteligência Artificial na educação vêm
aumentando significativamente e ocupando um papel de destaque quando
comparado aos estudos em outras áreas. Para se ter uma ideia da importân-
cia do tema, um levantamento feito pelo Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial – SENAI, identificou a presença da IA na Educação, considerando
as bases de artigos, teses e dissertações consultadas (BRASIL, 2018):

Somando-se os resultados das buscas nas bases Scopus e WOS para artigos
relacionados com o termo genérico Inteligência Artificial, nos últimos três
anos, temos um total de 80.454 textos indexados. Deste montante, a IA
aplicada à Educação corresponde a 21.083, cerca de um quarto da produ-
ção científica. Já em relação à base de teses e dissertações, a área de IA
como um todo apresenta 6.241 resultados, sendo 948 relacionados à IA na
Educação, ou seja, 15% do total. Dessa forma, o levantamento realizado
constatou que parte significativa da produção científica atual em IA está
relacionada com o tema da Educação, o que indica forte presença da IA
nos sistemas educacionais e, consequentemente, um grande impacto nos
processos de ensino-aprendizagem no curto e no médio prazo.

A IA vem se consolidando como uma poderosa ferramenta transfor-


madora em diversos setores, e a educação superior não é exceção. O uso
da IA nesse contexto traz consigo um imenso potencial para revolucionar a
forma como os alunos aprendem, os professores ensinam e as estratégias de
adaptação das instituições às demandas contemporâneas. Assim sendo, com
a capacidade de processar e analisar grandes volumes de dados, tomar deci-
sões automatizadas e personalizar o aprendizado, a IA na educação superior
promete impulsionar a eficiência, a inovação e a qualidade educacional.
Em relação a este aspecto, Costa Júnior et al. (2023) afirma que:

A Inteligência Artificial (IA) é uma tecnologia que tem revolucionado mui-


tos setores da sociedade, incluindo a educação superior e pode ser definida
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 41

como o ramo da ciência da computação que busca criar máquinas que


possam realizar tarefas que, normalmente, requerem inteligência humana,
como aprendizado, raciocínio e resolução de problemas. Na educação supe-
rior, a Inteligência Artificial tem sido utilizada para diversos fins, desde a
personalização do ensino até a identificação de problemas de aprendizagem.

A rápida evolução da IA está transformando o cenário educacional, exi-


gindo que os professores estejam preparados para aproveitar todo o potencial
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dessa tecnologia inovadora. Nesse contexto, a capacitação dos educadores


em Inteligência Artificial se torna essencial para garantir uma educação de
qualidade que esteja alinhada com as necessidades e demandas do século XXI.
E devido à complexidade que se apresenta esse tema, percebe-se ser como o
ambiente educacional é atualmente bastante desafiador.
Mas, e os professores? Eles se sentem preparados para utilizar a Inteli-
gência Artificial em benefício do trabalho docente? Neste artigo, pretende-se
discutir a respeito dessa questão e realizar uma avaliação com docentes inseri-
dos no ensino superior, de um estabelecimento de ensino militar, no contexto
do Sistema de Ensino Militar do Exército.
Para atingir esse objetivo, foi proposta a seguinte questão avaliativa:
Até que ponto os professores da educação superior militar se sentem pre-
parados para utilizar a IA em proveito do processo de ensino e aprendizagem?

A Inteligência Artificial e a Educação Superior Militar

O uso da IA no contexto militar tem despertado um debate complexo e


controverso em todo o mundo. Com avanços tecnológicos rápidos e significati-
vos, ela está se tornando uma ferramenta cada vez mais presente nas operações
militares, desde na coleta e análise de informações até a tomada de decisões
estratégicas. No entanto, essa integração da IA traz consigo preocupações
éticas, legais e de segurança, exigindo um exame minucioso dos benefícios,
riscos e implicações envolvidas:

O contexto militar é também sujeito à adaptação em um mundo em pro-


gressiva interconexão e interdependência como o do século XXI. É fato
também inexorável que o mote central das forças armadas de um Estado
é defendê-lo e fazer a guerra quando tal defesa for necessária. Logo, em
um cenário belicoso como o atual, convém entender como a IA pode ser
utilizada, por quem, e quais os desafios para seu uso e os seus limites
éticos. Em matéria de IA para fins bélicos, trata-se de equipamentos que
podem cumprir atividades como um ataque às forças inimigas de forma
autônoma, sem que os seres humanos sejam colocados em situação de
risco de morte para executar tarefas que impliquem em situações com uso
de força e violência letal (PINTO; MEDEIROS, 2022, p. 102).
42

Percebe-se que o uso da Inteligência Artificial (IA) no Exército Brasi-


leiro está se tornando uma realidade cada vez mais presente e impactante.
Diversos são os setores em que estão sendo criadas ferramentas tendo por
base a IA para aperfeiçoar processos e realizar tarefas de forma automati-
zada. Como exemplo, mencionado na Defesa em Foco (2023), é possível
citar o “Max”, chatbot (robô usado em chats para imitar uma conversa
humana), a serviço da comunicação social do Exército. Em 2023 essa IA
completou quatro anos de existência e é um exemplo da evolução da tecno-

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logia, que permite aprimorar o atendimento ao público e otimizar o trabalho
de militares em outras áreas.
E no campo da educação militar não é diferente. Com o objetivo de
aprimorar a formação e capacitação de seus quadros, a instituição tem bus-
cado integrar tecnologias avançadas, como a IA, no processo de ensino e
aprendizagem. A aplicação dessa poderosa ferramenta no contexto militar
promete transformar a maneira como os soldados são treinados, aprimorando
suas habilidades táticas, estratégicas e operacionais.
Fruto da necessidade de fomentar o uso de tecnologias na educação
militar, no que diz respeito ao Exército Brasileiro, em 2021 foi editado pelo
Departamento de Educação e Cultura do Exército (BRASIL, 2021) a Dire-
triz de Orientação para o Incremento da Educação Assistida por Tecnologias
Digitais nos Processos de Ensino e Aprendizagem no Âmbito do Sistema de
Educação e Cultura do Exército Brasileiro.
Conforme o Art. 6º da referida diretriz (BRASIL, 2021), considera-se que

“[...] será buscada a integração entre a educação e a tecnologia, criando-se


experiências de aprendizagem aprimoradas por meios digitais, valendo-
-se do (a):
I – ensino participativo e em rede;
II – ensino híbrido;
III – educação ubíqua;
IV – aprender fazendo (learning by doing), inserido na cultura maker (faça
você mesmo), relacionado ao papel protagonista do aluno;
V – busca e o emprego das inovações tecnológicas nos processos de ensino
e de aprendizagem;
VI – emprego das informações disponíveis nas mídias digitais, sem res-
trição de tempo e espaço;
VII – desenvolvimento da inteligência emocional;
VIII – processos de ensino e de aprendizagem potencializados pela inte-
ração entre docente e discente, por meio das mídias digitais;
IX – emprego de Metodologias Ativas de Aprendizagem (MAA).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 43

E para possibilitar o atingimento de tais metas ambiciosas, a citada Dire-


triz destaca o papel do docente e a importância da capacitação. No Art. 8º
afirma-se que o incremento da educação assistida por tecnologias digitais nos
processos de ensino e aprendizagem será conduzido, dentre outros aspectos,
pela “capacitação contínua do docente (professor, instrutor e monitor), para
que esse profissional se mantenha inserido, contextualizado, envolvido na
discussão das ferramentas digitais mais significativas e na forma de como
utilizá-las, o que demanda aprendizado contínuo” (BRASIL, 2021).
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Dentre as iniciativas voltadas à capacitação docente para utilização de


ferramentas digitais, é possível destacar os seguintes estágios criados pelo
Exército Brasileiro:
a) Estágio de Preparação de Instrutores e Monitores (EsPIM), que fun-
ciona no Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC)
(BRASIL, 2021a); e
b) Estágio de Tecnologias Digitais na Educação (EATD), que funciona
no Centro de Educação a Distância do Exército (CEADEx) (BRASIL, 2021b).

O contexto de estudo

Este estudo teve como foco os professores que trabalham nos cursos
oferecidos para educação superior militar do Centro de Estudos de Pessoal e
Forte Duque de Caxias, tendo em vista a expertise desse Centro em capaci-
tações voltadas ao Ensino Militar, de acordo com Granero (2020):

O Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias é uma Instituição


de Educação Superior, de Extensão e de Pesquisa pertencente ao Exército
Brasileiro e, como tal, integra o Sistema de Ensino do Exército. O Sistema
de Ensino do Exército, de acordo com o Decreto nº 3.182, de 23 de setembro
de 1999, que regulamenta a lei no 9.786, de 8 de fevereiro de 1999, que
dispõe sobre o ensino no Exército Brasileiro (BRASIL,1999, p. 8), tem “a
finalidade de qualificar recursos humanos para a ocupação de cargos e para
o desempenho de funções previstas, na paz e na guerra, em sua organização.

Conforme Brasil (2018), o Sistema de Educação Superior Militar do


Exército é progressivo, dinâmico e flexível e tem por finalidades, dentre outras:
a) qualificar os recursos humanos, no nível de educação superior, em Ciên-
cias Militares e em Defesa, dotados de pensamento crítico, alta capacidade de
reflexão, que possuam fundamentação para participar das tomadas de decisões
complexas e para solucionar problemas com a aplicação dos saberes técnicos; e
b) formar, em alto nível de competência, recursos humanos para o exer-
cício das atividades de docência na educação superior das Linhas de Ensino
Militar Bélico, de Saúde e Complementar.
44

Dessa forma, percebe-se um alinhamento claro da importância dada pela Ins-


tituição à capacitação adequada aos quadros de docentes da educação superior, no
intuito de possibilitar uma qualificação de alto nível aos militares, face aos desa-
fios que se apresentam no cenário atual contemporâneo, de alta complexidade.
Apesar de existência de diretrizes institucionais, capacitações e outros incen-
tivos voltadas ao incremento do uso de tecnologias no ensino militar, o sucesso
de programas voltados ao aperfeiçoamento do trabalho docente depende, dentre
outros aspectos, de compreender o perfil dos professores, as suas competências, as

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suas dificuldades e o grau de conhecimento no uso de determinadas ferramentas.
No que se refere ao uso da Inteligência Artificial, avaliar se os professores
se sentem preparados para utilizar a IA é crucial para garantir a efetividade
dessa tecnologia, tendo em vista a adoção responsável, a personalização do
ensino e a atualização contínua dos educadores. Nesse sentido, somente com
professores capacitados e confiantes na utilização da IA é possível aproveitar
plenamente seus benefícios e promover uma educação de qualidade e adaptada
às necessidades dos alunos.
Nesse contexto, saber se os professores se sentem preparados para utilizar
a IA na educação permitiria aos gestores direcionarem recursos adequadamente,
fornecerem suporte e orientação técnico-pedagógica, alinhar as metas institucionais,
promover uma cultura de inovação e garantir resultados educacionais de alta qua-
lidade. Além disso, a colaboração entre gestores e professores seria essencial para
o sucesso da implementação da IA na educação, e nesse caso, no ensino militar.

Metodologia

O planejamento de um trabalho científico deve ser cuidadosamente elabo-


rado. Existem várias formas de desenvolver uma investigação científica, devido
à diversidade de perspectivas epistemológicas e de enfoques diferenciados que
se podem assumir no trato com os objetos pesquisados e eventuais aspectos
que pretende destacar (SEVERINO, 2007, p. 118, apud GRANERO, 2020).
A essência deste trabalho recai em avaliar como os docentes percebem
estar preparados para utilizar a Inteligência Artificial em benefício de suas
aulas. Nesse ponto, é importante destacar que, na avaliação, é imprescindível
a adoção de uma metodologia adequada aos seus propósitos (GRANERO,
2020, p. 56). Ainda quando nos referimos à avaliação, esse termo necessitaria
ser bem definido. Conforme nos ensina Worthen; Sanders; Fitzpatrick (2004,
p. 35), avaliação pode ser compreendida como a determinação do valor ou
mérito de um objeto de avaliação (seja o que for que estiver sendo avaliado):

A avaliação usa métodos de pesquisa e julgamento, entre os quais: 1)


determinação de padrões para julgar a qualidade e concluir se esses padrões
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 45

devem ser relativos ou absolutos; 2) coleta de informações relevantes; e 3)


aplicação dos padrões para determinar valor, qualidade, utilidade, eficácia
ou importância. Leva a recomendações cuja meta é otimizar o objeto de
avaliação em relação a seu(s) propósito(s) futuro(s) (WORTHEN; SAN-
DERS; FITZPATRICK, 2004, p. 35-36).

Para a concretização do objetivo traçado, foi então adotado o seguinte


percurso metodológico:
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a) revisão da literatura voltada ao tema;


b) definição da abordagem avaliativa que será empregada neste estudo;
c) construção do quadro de categorias e indicadores;
d) construção do instrumento de avaliação (com a respectiva escala
de respostas);
e) aplicação do instrumento de avaliação aos participantes deste estudo;
f) análise dos dados obtidos; e
g) apresentação dos resultados.
A revisão da literatura contemplou as etapas iniciais deste estudo, na
qual foram consultados trabalhos a respeito do tema investigado, como arti-
gos, trabalhos de conclusão de curso, entre outros, o que foi necessário para
caracterizar o objeto avaliado e que serviu como arcabouço teórico para a
realização dessa avaliação.
Neste trabalho foi selecionada a abordagem centrada nos especialistas,
que “visa obter julgamento profissional do objeto avaliado por parte dos espe-
cialistas” (LEITE; FERREIRA; FREITAS, 2023, p. 175), pois se pretendeu
avaliar a percepção dos próprios docentes a respeito da utilização da Inteli-
gência Artificial, e, obviamente, sendo esses os respondentes da avaliação:

A abordagem da avaliação centrada em especialistas, talvez a mais antiga e


a mais usada, depende basicamente dos conhecimentos específicos de um
profissional para julgar uma instituição, um programa, um produto ou uma
atividade. Por exemplo: o valor de um currículo para prevenção do uso
de drogas seria julgado por especialistas em currículo ou por especialistas
no assunto que observariam esse currículo em ação, examinariam seu
conteúdo e a teoria do aprendizado subjacente a ele ou, de alguma forma,
obteriam informações suficientes para chegar a um juízo fundamentado
de seu valor (WORTHEN; SANDERS; FITZPATRICK, 2004, p. 179).

Foi construído um quadro de categorias e indicadores tendo por base, prin-


cipalmente, os materiais consultados na revisão da literatura. As categorias e
indicadores foram selecionados em função da sua pertinência e relevância ao
objeto deste trabalho, além da aderência ao contexto da educação superior militar.
Desse modo, as categorias e indicadores selecionados serviram de base
para a construção do questionário, escolhido como instrumento de coleta de
46

dados por ser amplamente utilizado em avaliação e por atender aos propósitos
e objetivo ora delineados (ELLIOT, 2012).
O questionário construído foi composto por questões fechadas priorizan-
do-se a obtenção de dados quantitativos. Tal decisão foi tomada pelo fato de
que a intenção é a realização de uma avaliação preliminar de uma percepção
atual sobre a utilização da Inteligência Artificial pelos professores, na perspec-
tiva de que, futuramente, sejam realizadas avaliações mais aprofundadas, nas
quais se poderia utilizar, também, dados qualitativos. As questões fechadas são

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em formato de afirmações, tendo em vista a tendência percebida por este autor
na revisão bibliográfica, sendo o formato de questão foi amplamente utilizado.
As categorias, os indicadores e as afirmações utilizadas no questionário
constam no Quadro 1. Nesse quadro, ainda, optou-se por indicar a relação
entre os itens do questionário e os indicadores. Decidiu-se por não apresen-
tar, na íntegra, o questionário utilizado, por entender já serem suficientes os
dados ora explicitados.

Quadro 1 – Categorias, indicadores e afirmações do questionário


Categorias Indicadores Questões
1. Eu entendo o conceito de Inteligência Artificial e como ela pode ser aplicada
Compreensão na educação.
da IA 2. Tenho conhecimento sobre os princípios e técnicas fundamentais utilizadas
Conhecimento na Inteligência Artificial.
teórico 3. Estou ciente das questões éticas e de privacidade relacionadas ao uso de
Respeito à ética e Inteligência Artificial na educação.
à privacidade 4. Tenho conhecimento das políticas e regulamentações relacionadas à coleta
e uso de dados pessoais na Inteligência Artificial.
5. Estou familiarizado(a) com as ferramentas e tecnologias de Inteligência
Familiaridade com Artificial disponíveis para uso na educação.
IA 6. Sinto-me confiante em utilizar ferramentas de Inteligência Artificial para
Habilidades apoiar o processo de ensino e aprendizagem.
técnicas 7. Sou capaz de analisar e interpretar os resultados e dados gerados por
Capacidade de sistemas de Inteligência Artificial.
análise de dados 8. Consigo identificar padrões e tendências nos dados coletados para
melhorar o planejamento e a tomada de decisões educacionais.
9. Estou aberto(a) a aprender novas habilidades e a me adaptar às mudanças
Demonstração de trazidas pela Inteligência Artificial para a educação.
atitude 10. Procuro ativamente me atualizar sobre as últimas tendências e avanços
Disposição para em Inteligência Artificial aplicada à educação.
aprender 11. Estou disposto(a) a participar de programas de desenvolvimento
Desenvolvimento profissional relacionados à Inteligência Artificial na educação.
Profissional 12. Busco oportunidades para desenvolver minhas habilidades em Inteligência
Artificial por meio de cursos e workshops relacionados à educação.
continua...
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 47

continuação
Categorias Indicadores Questões
13. Estou apto(a) a integrar a Inteligência Artificial no planejamento de minhas
Planejamento para aulas e atividades educacionais.
uso da IA 14. Sinto-me preparado(a) para implementar ferramentas de Inteligência
Preparação Artificial na sala de aula de forma eficaz.
prática 15. Sou capaz de avaliar e interpretar os resultados do uso de Inteligência
Avaliação de Artificial no processo de ensino e aprendizagem.
Resultados 16. Utilizo dados e métricas gerados pela Inteligência Artificial para ajustar
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e melhorar minha prática pedagógica.


17. Tenho ou disponho de recursos e suporte disponíveis para ajudar os
Disponibilidade de professores a utilizar a Inteligência Artificial.
Suporte técnico
suporte técnico 18. Procuro atualizações e informações sobre novas ferramentas e técnicas
de Inteligência Artificial por intermédio de suporte técnico.
Fonte: O autor (2023).

No questionário elaborado, foram estabelecidas cinco opções de resposta


(escala Likert): concordo plenamente; concordo parcialmente; discordo par-
cialmente; discordo totalmente; e não se aplica (ou não sabe responder). Com
exceção da opção “não se aplica (ou não sabe responder)”, em que não há
um valor correspondente, cada opção de resposta possui um valor que varia
de 4 (concordo totalmente) a 1 (discordo totalmente). O Quadro 2 resume a
escala de respostas utilizada.

Quadro 2 – Escala de respostas utilizada


Escala de respostas Valor
Concordo totalmente 4
Concordo parcialmente 3
Discordo parcialmente 2
Discordo totalmente 1
Não se aplica (ou não sabe responder) Não há
Fonte: O autor (2023).

O instrumento de avaliação construído passou por um processo de vali-


dação. Inicialmente, foi realizada uma validação aparente, que se resumiu à
percepção dos autores sobre a qualidade do instrumento, que pareceu ser con-
fiável e fidedigno após a sua confecção. Tal percepção se deu por intermédio
do trabalho de pesquisa da literatura especializada em avaliação, feita pelos
próprios autores deste estudo, em que foram utilizados os princípios e precei-
tos de uma avaliação profissional, tendo em vista os princípios de validade:

Validade aparente é avaliada por um juiz, ou grupo de juízes, que exami-


nam uma técnica de mensuração e decidem se ele mede o que seu nome
48

sugere. A avaliação da validade aparente é um processo subjetivo. Todo


instrumento deve passar pela avaliação da validade aparente. Todo pes-
quisador que escolhe, ou constrói, um instrumento de medidas é um juiz
que decide se o instrumento de fato mede a variável que ela deseja estu-
dar. [...] A validade aparente refere-se ao fato do instrumento de medidas
parecer válido, ou não, aos sujeitos, ao pessoal administrativo que decide
quanto ao seu emprego, e a outros observadores não treinados tecnica-
mente (MARTINS, 2006, p. 6).

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Em seguida, o instrumento passou por um processo de validação técnica.
Esse processo foi realizado pelos autores deste trabalho, e por uma amostra de
professores, especialistas em avaliação, que compõem o quadro permanente
de docentes da Faculdade CESGRANRIO, instituição de referência em ava-
liações profissionais. Segundo Elliot (2012, p. 62-63), a validade se relaciona

[...] ao fato de o instrumento e suas questões apresentarem qualidade


técnica de construção, obedecendo a regras demandadas pela literatura
pertinente à área. Novamente são chamados os especialistas para efetivar
a validação, só que dessa vez são os especialistas em medidas ou avaliação
que verificam se o instrumento possui as características técnicas preconizadas
e indicam as modificações necessárias para que sejam alcançadas.

Por fim, foi realizada a validação de conteúdo, submetendo o instrumento


à uma amostra de professores do Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque
de Caxias, que possui expertise na utilização de tecnologias na educação. Tal
validação teve por objetivos verificar o grau de abrangência do instrumento
(“se cada domínio ou conceito foi adequadamente coberto pelo conjunto de
itens e se todas as dimensões foram incluídas”), a clareza (se os itens “foram
redigidos de forma que o conceito esteja compreensível e se expressa ade-
quadamente o que se espera medir”) e a pertinência (“se os itens realmente
refletem os conceitos envolvidos, se são relevantes e, se são adequados para
atingir os objetivos propostos”) (ALEXANDRE; COLUCI, 2011, p. 3064).
Os resultados foram apresentados por meio de questões, por indicador,
por categoria e, ao final, de forma global.
Em um primeiro momento, foram mostrados os percentuais de responden-
tes que assinalaram cada resposta da escala utilizada (“concordo totalmente”,
“concordo parcialmente” etc.), de forma a detectar o grau de concordância dos
docentes diante das afirmações apresentadas. A seguir, foram apresentados os
resultados consolidados por indicador e por categoria.
Ao final, foi realizada uma avaliação global, para julgar a percepção
dos docentes sobre a sua preparação pedagógica para utilizar a Inteligên-
cia Artificial, no intuito de responder à questão avaliativa formulada. Nessa
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 49

avaliação global foi feita uma relação entre a pontuação total obtida (soma
dos pontos de cada resposta, conforme escala apresentada) e a pontuação
máxima possível de ser atingida, de forma percentual e por faixas. Assim, foi
proposto um padrão de avaliação (Quadro 3), com a intenção de emitir uma
avaliação global e indicar recomendações em função do enquadramento em
uma determinada faixa percentual:

Quadro 3 – Padrão de avaliação


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Pontuação
Avaliação Global Recomendação
(percentual)
85% (ou acima) Os docentes se As atividades de capacitação docente para utilização da IA estão
do valor máximo consideram preparados sendo efetivas e devem continuar nos mesmos moldes. Não há
possível de forma excelente. necessidade de revisão.
Entre 70% – 84% As atividades de capacitação docente para utilização da IA estão
Os docentes se
do valor máximo sendo efetivas, contudo, há necessidade de uma revisão em
consideram preparados
possível determinados aspectos, a fim de otimizar o processo.
Entre 50% – 69% Os docentes se As atividades de capacitação docente para utilização da IA
do valor máximo consideram parcialmente estão sendo parcialmente efetivas. Há necessidade de uma
possível preparados ampla revisão.
Abaixo de 50% As atividades de capacitação docente para utilização da IA
Os docentes não se
do valor máximo não são efetivas ou não existem. Há necessidade de uma
consideram preparados
possível reformulação ou implantação de um novo processo.

4 Resultados

Participaram desta avaliação os docentes do Centro de Estudos de Pessoal


e Forte Duque de Caxias. O questionário foi divulgado no período de 5 a 10
de junho de 2023. Neste período, 17 docentes responderam ao questionário.
São expostos, a seguir, os resultados apurados.

 Grau de concordância nas questões

Para uma melhor apresentação dos resultados, os dados obtidos foram


organizados em uma tabela, após o que, foram obtidos os percentuais nos
quais foram assinaladas as opções possíveis (variando do “Concordo total-
mente” ao “Discordo totalmente”). As repostas assinaladas na opção “Não
se aplica ou não sabe responder” foram descartadas nos cálculos. Os valores
foram reunidos e apresentados por intermédio de gráficos nos quais foi utili-
zado um eixo central, marcando o número “0”, sendo que, à esquerda, cons-
tam os percentuais de discordância e à direita, os percentuais de concordância.
O Gráfico 1 resume o grau de concordância nas questões apresentadas:
50

Gráfico 1 – Grau de concordância nas questões

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Fonte: O autor (2023).

É possível identificar que 16 das 18 questões obtiveram maiores níveis


percentuais de concordância, e, em sua maioria, de forma significativa. Os
maiores graus de concordância foram nas questões 9, 10 e 1, com 94%, 88% e
82%, respectivamente. Tais questões dizem respeito à demonstração de atitude e
disposição para aprender aspectos relacionados à IA e ao nível de compreensão
no tema. Dessa forma, é possível concluir que as atitudes e o conhecimento de
IA por parte dos doentes são pontos fortes dentre os aspectos avaliados.
Por outro lado, duas questões obtiveram níveis maiores de discordância
(questões 16 e 6, com 53% e 51% respectivamente). Tais questões dizem
respeito aos dados e métricas gerados pela Inteligência Artificial e à confiança
na utilização de ferramentas de Inteligência Artificial. Assim, percebe-se que
os docentes possuem dificuldades na tabulação de dados e nas ferramentas
disponíveis no uso da IA.

 Grau de concordância nos indicadores

Além dos percentuais alcançados em cada questão, considerou-se funda-


mental a apresentação dos níveis de concordância compilados nos indicadores.
Nessa avaliação foram consolidados os níveis de concordância em cada indicador
no intuito de favorecer o estabelecimento de metas e de níveis de desempenho,
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 51

permitir comparações em avaliações futuras, entre outros. Assim sendo, os graus


de concordância dos indicadores são expostos no Gráfico 2, a seguir:

Gráfico 2 – Grau de concordância nos indicadores


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Fonte: O autor (2023).

Constata-se que todos os indicadores possuem níveis maiores de concor-


dância do que de discordância. Os indicadores relacionados à demonstração
de atitude, de desenvolvimento profissional e de compreensão da IA obti-
veram os maiores índices de concordância, com 83%, 77% e 73%, respec-
tivamente. Dessa forma, percebe-se que os docentes têm atitudes proativas
no sentido de conhecer o tema, o que pode vir a impactar positivamente no
autoaperfeiçoamento profissional.
Os indicadores com menores graus de concordância foram os relacio-
nados à familiaridade com a IA e à avaliação de resultados, com 51% e 53%
respectivamente, o que sugere adoção de medidas para que os professores
estejam mais familiarizados com a temática e para que saibam estimar os
resultados na utilização da IA.

 Grau de concordância nas categorias

A apresentação do grau de concordância nas categorias estabelecidas


nesta avaliação destina-se a possibilitar uma compreensão mais abrangente
dos níveis de concordância. Como as categorias representam um agrupamento
de aspectos que foram avaliados, a sua análise favorece um julgamento mais
amplo, contribuindo nas tomadas de decisão por parte dos gestores.
52

O Gráfico 3 apresenta os graus de concordância das categorias selecio-


nadas neste estudo:

Gráfico 3 – Grau de concordância nas categorias

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Fonte: O autor (2023).

Percebe-se que todas as categorias possuem um grau de concordância


maior do que de discordância. A disposição para aprender foi a categoria com
o maior grau de concordância dentre todas, com 79%, confirmando a tendência
já apresentada nos demais aspectos avaliados anteriormente, que sugere que
os docentes demonstram elevados níveis de interesse em aprender sobre a IA.
As habilidades técnicas e a preparação prática demonstraram ser as cate-
gorias com menores graus de concordância, com 59% e 58%, respectivamente,
o que sugere que elas devem ser priorizadas quando da adoção de medidas
corretivas no sentido de melhorar a capacitação dos docentes.

 Avaliação Global

No sentido de possibilitar responder à questão avaliativa formulada neste


estudo, foi realizada a tabulação das respostas de forma conjunta, em função
dos valores que cada resposta possui, conforme a escala de avaliação elabo-
rada, descartando-se as respostas “Não se aplica ou não sabe responder”. Essa
organização teve como intuito o enquadramento em uma das faixas percentuais
estabelecidas no padrão de avaliação.
No cálculo dos pontos obteve-se o seguinte resultado:
a) pontuação máxima possível: 1184 pontos;
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 53

b) pontuação total obtida: 885 pontos; e


c) pontuação (percentual): 75%.
Aplicando-se o padrão de avaliação definido neste trabalho, percebe-se
que o resultado global ficou enquadrado na 2ª faixa percentual (Entre 70%
– 84% do valor máximo possível). Assim, tem-se a avaliação global desta
avaliação, conforme o destacado a seguir:
– Avaliação Global: os docentes se consideram preparados;
– Recomendações: as atividades de capacitação docente para a utiliza-
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ção da IA estão sendo efetivas, contudo, há necessidade de uma revisão em


determinados aspectos, a fim de otimizar o processo.

Conclusões e recomendações

O objetivo deste estudo avaliativo focou em discutir a preparação dos profes-


sores em utilizar a Inteligência Artificial em benefício de suas aulas. Para tanto, foi
realizada uma avaliação com os docentes do Centro de Estudos de Pessoal e Forte
Duque de Caxias para julgar como eles se sentem preparados para utilizar a IA.
Do exposto, para balizar o caminho a percorrer neste estudo avaliativo,
foi formulada a seguinte questão avaliativa: até que ponto os professores da
educação superior militar se sentem preparados para utilizar a IA em proveito
do processo de ensino e aprendizagem?
Para a concretização dos objetivos traçados e de forma a responder à
questão avaliativa, foram executadas as seguintes etapas: revisão da literatura;
definição da abordagem centrada em especialistas, cujos preceitos foram res-
peitados; construção do quadro de categorias e indicadores, do instrumento
de avaliação e do padrão de avaliação; submissão do questionário aos parti-
cipantes deste estudo; e a apresentação dos resultados, fruto da análise das
respostas dadas pelos participantes.
Assim sendo, foi possível responder positivamente à questão ava-
liativa, visto que, na avaliação global, chegou-se à conclusão de que os
docentes se consideram preparados. Tal avaliação foi devida à pontuação
obtida no somatório de todas as respostas, em que se chegou ao percen-
tual de 75% da pontuação máxima possível, de acordo com o padrão de
avaliação definido.
Apesar da avaliação global culminar na percepção de que os docentes
se sentem preparados, é importante destacar que o percentual alcançado não
atingiu a melhor faixa do padrão de avaliação, que seria de 85% ou mais, o que
sugere a adoção de medidas corretivas efetivas futuras, a fim de possibilitar
uma melhoria substancial nos índices ora obtidos.
54

Dessa forma, é possível afirmar que este estudo avaliativo teve como
produto uma avaliação criteriosa (coerente com a literatura especializada) da
percepção dos docentes do Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de
Caxias em relação ao uso da IA para fins educacionais, abrindo espaço para
avaliações futuras.
Por fim, de tudo o que foi exposto, conclui-se que o objetivo deste estudo
avaliativo, que se refere à avaliação da percepção do docente no uso da Inte-
ligência Artificial, no contexto da Educação Superior Militar, foi atingido em

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sua plenitude.

Recomendações

De forma a possibilitar uma melhora na percepção dos docentes do Cen-


tro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias em relação ao uso da IA,
recomenda-se que:

a) sejam criadas oportunidades de capacitação docente voltadas, prin-


cipalmente, ao desenvolvimento das habilidades técnicas e da pre-
paração prática no que se refere ao uso da IA, aspectos esses que
demonstraram ser os com menor níveis de concordância;
b) sejam planejadas, no decorrer do ano letivo do Centro de Estudos de
Pessoal e Forte Duque de Caxias, reuniões a fim de deliberar sobre
o tema Inteligência Artificial na educação, de forma a incentivar os
docentes ao desenvolvimento intelectual e profissional na temática
e a nivelar percepções e conhecimentos;
c) sejam criadas metas para a utilização da Inteligência Artificial pelos
docentes, de forma que as atividades escolares do Centro de Estudos
de Pessoal e Forte Duque de Caxias sejam reconhecidas pelo uso
desta tecnologia;
d) sejam adotadas boas práticas de uso da Inteligência Artificial por
meio de experiências já utilizadas em outros estabelecimentos
de ensino;
e) sejam definidos, pelo Departamento de Educação e Cultura do
Exército, diretrizes, metodologias, metas, entre outros, a fim de
regulamentar o uso da inteligência para fins educacionais; e
f) a percepção dos docentes no uso da IA seja reavaliada a cada iní-
cio de ano letivo do Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque
de Caxias, para fins de acompanhamento e de implementação
de melhorias.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 55

REFERÊNCIAS
ALEXANDRE, Neusa Maria Costa; COLUCI, Marina Zambon Orpinelli.
Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos
de medidas. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 7, p. 3061-
3068, jul. 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/5vBh8PmW5g-
4Nqxz3r999vrn/?lang=pt. Acesso em: 29 maio 2023.
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BRASIL. Decreto nº 3.182, de 23 de setembro de 1999. Regulamenta a lei


nº 9.786, de 8 de fevereiro de 1999, que dispõe sobre o ensino no Exército
Brasileiro e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa
do Brasil, Brasília, DF, 24 set. 1999.

BRASIL. Ministério da Defesa. Portaria nº 236-DECEx, de 31 de outubro de


2018. Aprova as Instruções Reguladoras do Sistema de Educação Superior
Militar do Exército: Organização e Execução (EB60-IR-57.002). 7. ed. Sepa-
rata do Boletim do Exército, Brasília, DF, n. 47, 23 nov. 2018.

BRASIL. Ministério da Defesa. Portaria nº 407-DECEx, de 16 de setembro de


2021. Aprova a Diretriz de Orientação para o Incremento da Educação Assistida
por Tecnologias Digitais no Âmbito do Sistema de Educação e Cultura do Exér-
cito (EB60-IR-05.006). Boletim do Exército, Brasília, DF, n. 38, 24 set. 2021.

BRASIL. Ministério da Defesa. Portaria nº 407-EME/C Ex, de 11 de junho de


2021. Estabelece as condições de funcionamento do Estágio de Preparação de
Instrutores e Monitores. Boletim do Exército, Brasília, DF, n. 24, 18 jun. 2021a.

BRASIL. Ministério da Defesa. Portaria nº 420-EME/C Ex, de 18 de junho de


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liação de programas: concepções e práticas. São Paulo: Gente, 2004.
O APLICATIVO TFM E SAÚDE:
reflexões interdisciplinares sobre uma ferramenta
digital voltada para a capacitação física
Sabrina Celestino15
Aline Tito Barbosa Silva16
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Alvaro Andreson de Amorim17


Marco Antônio Muniz Lippert18
Grace Siqueira da Silva19
Eduarda Mundy Torrero20
Andreza da Silva Balbino21
Paula Fernandez Ferreira22
Laise Lourdes Pereira Tavares de Souza23

15 Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestra em Serviço Social pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Professora Adjunta e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa da
Capacitação Física do Exército (IPCFEx). E-mail: anirbasuff@hotmail.com
16 Graduada em Medicina na Universidade Federal Fluminense (UFF). Especialista em Cardiologia pela
Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Pós-Graduada em Geriatria pelo Instituto Brasileiro de Ciências
Médicas (IBCMED). Médica Cardiologista do Instituto de Pesquisa da Capacitação Física do Exército
(IPCFEx). E-mail: aline.tito@yahoo
17 Graduado em Fisioterapia pela Universidade Castelo Branco (UCB). Bacharel em Educação Física
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Ciências da Motricidade Humana pela
Universidade Castelo Branco (UCB). Pesquisador do IPCFEx. E-mail: alvaroandreson@yahoo.com.br.
18 Graduado em Educação Física pela Escola de Educação Física do Exército, graduado em Psicologia pela
Universidade Santa Ursula, pós-graduado em Musculação e Treinamento de Força, Treinamento Desportivo
e Psicologia do Esporte. Mestre em Ciências do Desporto pela UNIVERSO. Doutor em Ciências do Desporto
pela Universidade do Porto. Pesquisador Chefe da Seção de Saúde e Qualidade de Vida do IPCFEx. E-mail:
marcoantoniolippert@gmail.com
19 Graduada em Psicologia na Universidade Estácio de Sá. MBA em Gestão de Pessoas (Universidade Cândido
Mendes). Pós-Graduanda em Neuropsicologia (CAESM). Psicóloga na Seção de Saúde e Qualidade do
Instituto de Pesquisa da Capacitação Física do Exército. E-mail: gracesilva.psicologa@gmail.com
20 Nutricionista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Participou de projetos de iniciação científica
e extensão sobre adoção de ferramentas da qualidade em Serviço de Alimentação e Nutrição no Laboratório
de Microbiologia de Alimentos do Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Atuou como monitora da disciplina de Microbiologia dos Alimentos para o curso
de bacharelado em Nutrição. Pós-Graduada em Nutrição Clínica e Esportiva pelo Instituto de Pesquisas,
Ensino e Gestão em Saúde. E-mail: eduardamundy@gmail.com
21 Graduada em Tecnologia da Radiologia pela Universidade Iguaçu (UNIG) e em Pedagogia pela faculdade
UNYLEYA. Especialista em Anatomia Funcional pela Faculdade UNYLEYA. Especialista em Docência do
Ensino Superior pela AVM faculdade integrada e Especialista em Docência na Educação Profissional de
Nível Técnico. Auxiliar da Seção de Saúde e Qualidade de Vida. E-mail: andreza.adorarte@hotmail.com
22 Graduada em Farmácia na Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestra em Ciências Aplicadas ao
Sistema Músculo Esquelético pelo Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO). Chefe do
Laboratório de Análises Clínicas do Instituto de Pesquisa da Capacitação Física do Exército. E-mail:
bioquimica.ipcfex@gmail.com
23 Possui graduação em Nutrição pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí –
NOVAFAPI (2009). Graduação em Educação Física pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI (2010).
58

Introdução

A
revista The Economist publicou artigo em 2018 afirmando que o uso
de aplicativos de celulares e aparelhos eletrônicos para monitorar con-
dições crônicas de saúde, como diabetes, iriam revolucionar a saúde.
Partindo de Negri (2019), podemos compreender que são novas as ferramentas
aliadas para que o indivíduo tenha mais controle e conhecimento sobre sua
própria saúde, o que tende a melhorar a prevenção de ocorrências agudas que

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alertem à necessidade de providências antes que a situação se torne emer-
gencial. A autora ainda reporta que “os aplicativos também podem estimular
atitudes mais saudáveis, em termos de alimentação e de exercícios, atuando na
prevenção de doenças e condições crônicas de saúde” (NEGRI, 2019, p. 32).
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
o celular para uso pessoal está presente na vida de 155,2 milhões de brasileiros
com 10 anos ou mais, o que representa cerca de 84,4% da população a partir
dessa idade. Com base nos dados podemos ressaltar ainda que:

A maior presença do celular ocorre nos grupos com idade entre 25 a 39


anos (93%), passando gradualmente a declinar nos seguintes até o dos
adultos de meia-idade, de 50 a 59 anos (87,9%), terminando com queda
acentuada no dos idosos de 60 anos ou mais (71,2%). “O acesso à internet
por meio da telefonia móvel celular é um recurso de comunicação e de
obtenção de informação que vem sendo visto cada vez mais como inte-
grante do cotidiano de um número crescente de pessoas” (IBGE, 2018).

Sendo assim, pensando a relação com a tecnologia, ainda que no Exército


Brasileiro essa atribuição esteja a cargo do Departamento de Ciência e Tecnologia
(DCT) e da Agência de Gestão e Inovação Tecnológica do Exército (AGITEC),
as práticas em prol da inovação e modernização de processos podem ser identi-
ficadas em diferentes instâncias, dentre as quais reportamos a capacitação física.
O Centro de Capacitação Física do Exército (CCFEx) tem como missão
coordenar, controlar, supervisionar e promover as atividades de ensino, pes-
quisa e desporto, nas áreas da capacitação física, tendo em vista a atender às
necessidades do Exército Brasileiro. Para tal, o Centro sedimenta a produção
de estudos e doutrina há mais de 100 anos, inicialmente por meio da cente-
nária Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx) e mais recentemente,

Pós-Graduação lato sensu em Nutrição Clínica pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão – IBPEX
(2012). Pós-Graduação lato sensu em Nutrição, Exercício Físico e Envelhecimento pela Faculdade de
Ciências Médicas do Piauí – FACIME (2013). Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Alimentos e
Nutrição – PPGAN – UNIRIO. Atualmente é doutoranda da Universidade Federal do Rio de Janeiro/ UFRJ.
Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Micronutrientes/ NPqN. E-mail: laiseonline@yahoo.com.br
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 59

a partir da década de 1990, por meio da pesquisa, considerando a criação do


Instituto de Pesquisa da Capacitação Física (IPCFEx).
O Aplicativo IPCFEx: TFM e Saúde foi idealizado para facilitar o acesso
à informação em matéria de capacitação física, tendo por fundamento estu-
dos de cunho científico aplicados ao Exército Brasileiro, mas que pode ser
utilizado de forma gratuita pela população civil.
Tendo esta premissa como fundamento, para as elaborações presentes
neste artigo, partimos do mote da pesquisa aplicada, interdisciplinar e de cará-
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ter quanti-qualitativo. A pergunta diretiva é: qual o papel da tecnologia na pro-


moção da saúde e as possíveis contribuições do Exército Brasileiro para tal?

A interface entre exercício físico e tecnologia para promoção da saúde

Segundo conceituação realizada pelo American College Of Sports Medicine


(ACSM), o exercício físico se refere a toda atividade planejada e estruturada com
o objetivo de melhorar ou manter os componentes físicos (ACSM, 2014). Sendo
assim, podemos compreender que todo exercício físico pode ser considerado ativi-
dade física, mas nem toda a atividade física pode ser considerada exercício físico.
A utilização de tecnologias digitais e as classificadas como Internet das
Coisas (sigla em ingês IoT Internet of Things)24 já é uma realidade quando se
trata de exercício físico, considerando desde aqueles serviços com alto custo e de
impacto na performance esportiva, até os aplicativos e programas disponibilizados
gratuitamente nos serviços de distribuição digital. Tal constatação leva-nos a cor-
roborar as conclusões propostas por Oliveira e Fraga (2020), na revisão integrativa
destinada a analisar o uso de tecnologias digitais para a prática de exercício físico.

O uso das tecnologias digitais torna o trabalho de profissionais – como Fisio-


terapeutas, Médicos do Esporte, profissionais de Educação Física e Psicólogos
do Esporte mais eficiente. Amplia o acesso ao profissional em áreas remotas,
sem custo financeiro elevado. Programas de exercícios físicos mediados pela
tecnologia podem produzir efeitos positivos, principalmente quando envolvem
questões relativas à construção de vínculos entre os praticantes. As infor-
mações disponibilizadas e captadas pelas tecnologias digitais possibilitam a
identificação de padrões de comportamento dos usuários no que se refere à
prática de exercícios físicos (OLIVEIRA; FRAGA, 2020, p. 15).

As tecnologias digitais pensadas de forma ampla e inscritas no direito à


inclusão e acessibilidade digital podem ser consideradas instrumentos importan-
tes de promoção à saúde, funcionando como recursos que podem ser apropria-
dos individualmente pelos sujeitos implicados com o próprio autocuidado, mas
24 Refere a dispositivos com conectividade integrada à internet, como smartwatches.
60

possibilitando também, uma certa interação entre profissionais e usuários e entre


os próprios grupos de usuário, pois, conforme destacam Bhatt, Dey e Ashour
(2017), citados por Valentim et al. (2018), uma série de aplicativos já promovem
a promoção da prática desportiva, incentivando os usuários por meio da intera-
ção social com outras pessoas e de forma individual por meio da gameficação
da atividade desportiva em si, concedendo medalhas ao usuário à medida em
que este alcança os objetivos que foram traçados (VALENTIM, 2018, p. 264).
Pelas argumentações partilhadas, torna-se possível identificar que o uso

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de tecnologias digitais, tanto no incentivo quanto na democratização do exercí-
cio físico, representa não só uma realidade como se afina, também, ao processo
de acesso e compartilhamento de informações que se expressa como fruto do
contexto contemporâneo. No entanto, podemos destacar como pontos que se
colocam como questionamentos ao referido processo, o fato de se indagar
não só quanto à qualidade das informações disponibilizadas nos aplicativos
e ferramentas, mas também quanto à forma de uso destas informações.
Neste sentido, compreendemos ser oportuno referenciar os apontamentos
partilhados por Oliveira e Braga (2021), que se propõem a refletir sobre a
prescrição de exercícios físicos por inteligências artificiais, indagando sobre
o destino da educação física. Nas elaborações propostas pelos autores, três
pontos podem ser ressaltados como chaves para a reflexão, tendo como foco
os profissionais da área; o primeiro que incentiva a não restrição dos sujeitos
a variáveis, pontuando criticamente a tendência que fundamentam os estudos
e práticas na área da educação física; o segundo ressalta a necessidade de
se reconhecer a potência do encontro, o que nos leva a compreender que os
dispositivos digitais não substituem as interações sociais presenciais; e, por
último, os estudiosos aconselham, a não se subordinar a padrões preestabe-
lecidos, incentivando a consideração de se levar em conta a particularidade
dos sujeitos na prescrição e prática de exercícios físicos. Sendo assim, vale
reforçar as análises conclusivas propostas pelos estudiosos:

O trabalho pautado no “piloto automático”, sem planejamento, replicando


prescrições, é facilmente superado pela máquina. Nossos pontos de reflexão,
portanto, são no sentido de a máquina exercer as funções que demandam que
estejamos no piloto automático, de caráter complementar, para que possamos
cuidar da dimensão “humana”, daquilo que não é possível mensurar. Trata-se,
portanto, de um convite a explorar a dimensão da criatividade, expressão em
que a Inteligência Artificial é limitada (OLIVEIRA; FRAGA, 2021).

A argumentação crítica traçada sobre os dispositivos digitais intenta centra-


lizá-los como ferramentas, compreendendo suas potencialidades, mas chamando
atenção para o que expressam de limites, os quais se somam ao próprio limite do
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 61

humano. A apropriação de um dispositivo digital não deveria, necessariamente,


conduzir a substituição da interação social e a condução ao isolamento, mas
sim possibilitar a otimização de tempo e, pensando a prática de exercício físico,
o acesso às informações podendo funcionar como recursos de preservação da
saúde e do aumento da expectativa e da qualidade de vida.
No horizonte da atuação profissional interdisciplinar por nós partilhada,
os pontos acima destacados se fazem presentes, estando atrelados a uma dupla
responsabilidade. No cotidiano de nosso trabalho, ao mesmo tempo em que
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somos demandados a pensar e atuar em prol da capacitação física focada na


promoção e preservação da saúde de diferentes sujeitos (homens e mulheres),
somos impelidos a compreender que esses compõem uma categoria profis-
sional particular e extremamente importante, são militares do Exército que
integram as Forças Armadas Brasileiras.
Sendo assim, a missão de atuar em prol da capacitação física é acrescida de
responsabilidade, haja vista, que esta está intimamente ligada à operacionalidade
necessária para a prontidão do profissional, que tem como missão, a defesa da
soberania do país. Frente a essa demanda e atuando em uma Força descentrali-
zada no território nacional e de grande envergadura e capilaridade, as tecnologias
digitais são identificadas não só como importantes, mas como essenciais, tendo
em vista a dinamizar a informação e a incorporação desta por parte dos militares.

Aplicativo IPCFEx TFM/SAÚDE como ferramenta digital aplicada


à capacitação física

Figura 1 – Aplicativo IPCFEx e Saúde

Fonte: Play Store.


62

O aplicativo IPCFEx TFM/Saúde é uma ferramenta digital criada em


2021, com o objetivo de disponibilizar de forma acessível, ampla e gratuita, as
informações dispostas no Manual de Treinamento Físico Militar, fornecendo
instruções sobre a correta prática de exercícios que visam a um melhor condi-
cionamento corporal, além de informar sobre alguns riscos da saúde do usuário.
O aplicativo foi estruturado pelo IPCFEx junto ao IME Júnior, tendo
como público prioritário, inicialmente, os militares do Exército Brasileiro
presentes em todo o território nacional e também no exterior.

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Tendo em vista a execução das funcionalidades propostas, o aplicativo
IPCFEx TFM e Saúde conta com duas abas. No que se refere à aba TFM,
esta é composta pelos seguintes itens: Sessão de TFM, Controle da Carga do
Exercício Aeróbio, Treinamento de Aptidão Cardiorespiratória, Treinamento
de Aptidão Muscular, Treinamento Utilitário, Sessão de Exercícios de Alonga-
mento, Programa Anual de TFM e Teste de Avaliação Física. Já a aba Saúde
destaca conteúdos referentes à Avaliação Corporal, de Identificação de Fato-
res de Risco para Síndrome Metabólica, de Verificação de Pressão Arterial e
destinados à compreensão sobre o Desenvolvimento de Diabetes Melitus II.

Figuras 2 e 3 – Abas TFM e Saúde

Fonte: Play Store.

O aplicativo TFM e Saúde possui a finalidade de tornar mais aplicável o


conteúdo do Novo Manual de Treinamento Físico Militar (TFM) do Exército
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 63

Brasileiro (EM-70-MC-10.375). No entanto este Manual possui uma aplicabi-


lidade que transcende as fileiras do militarismo, podendo ser apropriado pelo
profissional de Educação Física (e outros usuários) em âmbito civil. Neste
sentido, no que concerne ao aplicativo, compreendemos ser importante pon-
tuar algumas de suas funcionalidades, focando naquelas medidas que podem
ser desenvolvidas de forma prévia e posterior à prática do exercício físico
e de prevenção da saúde. O exercício físico é um tipo de atividade física no
qual há o controle da intensidade do esforço. De acordo com a intensidade
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do esforço, os exercícios podem ser classificados como leves, moderados e


intensos, sendo necessário primeiro identificar a frequência cardíaca máxima
(FCM) estimada para cada faixa etária, o que é possível através de uma fór-
mula bem simples: 220 – idade. Para controlar a intensidade do treino dessa
forma, o aplicativo destaca, na aba TFM, o tópico de controle da carga do
exercício aeróbio, no qual está prevista a função de cálculo de frequência
cardíaca máxima (Figuras 4 e 5), sendo necessário apenas indicar a idade.

Figuras 4 e 5 – Cálculo de Frequência Cardíaca Máxima

Fonte: Play Store.

O cálculo de frequência cardíaca máxima e a funcionalidade


proporcionada pelo aplicativo contribuem para que o usuário tenha
conhecimento da progressão de seu treinamento, no que se refere a
64

capacidade cardiorrespiratória, esta que é um indicador de saúde extre-


mamente importante.
Ainda na aba TFM podemos identificar também, uma funcionalidade
destinada à seção de exercícios de alongamento (Figuras 6 e 7),, cuja
finalidade está relacionada à promoção de exercícios, visando ao aumento
da amplitude de movimento articular e ainda, a exercícios que oferecem
benefícios importantes ao sistema mioarticular (de músculo e articulação),
tanto para membros superiores quanto inferiores.

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Figuras 6 e 7 – Sessão de exercícios de alongamento

Fonte: Play Store.

Todo exercício físico demanda movimento. Os movimentos acontecem


nas articulações e o gerenciamento das articulações é realizado pelos músculos.
Sendo assim, se os músculos estiverem mais alongados, maior será a amplitude,
ou seja, melhor a qualidade do movimento, ação esta que pode não só bene-
ficiar a prática do exercício físico, mas contribuir para a prevenção de lesões.
As funcionalidades dispostas acima podem ser aplicadas tanto para
civis quanto para militares, no entanto, torna-se importante ressaltar, frente
à ferramenta destacada, os recursos destinados ao público militar. Consta, na
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 65

aba TFM do aplicativo, uma função que reporta ao Teste de Avaliação Física
(TAF), na qual estão disponíveis as normas que regulam o TAF. Nesta ferra-
menta, está disponível destinada à estruturação do programa de TFM, sendo
sugerida divisão por programas semanais de treinamento em 4 ou 5 sessões,
nas quais o/a militar opta pelo número (de sessões) e o próprio aplicativo já
faz uma proposta de distribuição de atividades. O aplicativo disponibiliza
igualmente conteúdo que fundamenta a sessão de TFM (Figuras 8 e 9), na
qual são depositadas orientações gerais e focadas na fase de aquecimento e
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movimento, fase de aquecimento estático, fase de trabalho principal e fase


de recuperação.

Figuras 8 e 9 – Sessão de exercícios de alongamento

Fonte: Play Store.

Em se tratando do militar, o TFM é compreendido como uma ação fun-


cional e obrigatória, haja vista que, segundo o manual, a necessidade de
treinamento físico nas Forças Armadas é inquestionável. O homem, segundo
a doutrina, é o elemento fundamental da ação, portanto, é imprescindível que
seja dada especial atenção à capacitação física e ao estado de saúde. O tempo
destinado ao preparo da tropa e rigidez física idealmente é distribuído em 5
sessões semanais (COTER, 2021).
66

Referindo o conteúdo disposto na aba saúde do aplicativo se torna impor-


tante destacar a funcionalidade relacionada à Síndrome Metabólica (SM), a
qual refere a um transtorno de saúde, representado por uma associação de
fatores de risco para doenças cardiovasculares (DCV), mais notavelmente,
obesidade, diabetes mellitus tipo II (DM2), dislipidemia e hipertensão arterial,
cuja fisiopatologia se atribui à resistência à insulina. Sua etiologia envolve
interações complexas entre genética, metabolismo e epigenética, incluindo
qualidade da dieta e estilo de vida sedentário (GALLARDO-ALFARO et al.,

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2013). Indivíduos portadores da SM têm duas vezes mais chances de morte
por todas as causas e por eventos cardiovasculares, além de cinco vezes mais
chances de desenvolver DM2 (BOVOLINI; ANDRADE; DUARTE, 2021).
Durante a última década, a SM também tem sido associada a outras
condições clínicas, como a doença hepática gordurosa não alcoólica, hipo-
gonadismo, síndrome dos ovários policísticos, apneia obstrutiva do sono,
demência vascular, doença de Alzheimer e câncer (ZAFAR et al.,2018).
A atividade militar por si possui características próprias como: privação
do sono, longa jornada de trabalho, maior risco de lesões, isolamento social
(durante treinamentos e operações militares) e, principalmente, exposi-
ção ao estresse de combate. A combinação dessas características, aliadas à
ocorrência da SM, potencializam o risco desses distúrbios nesta população.
Assim, fazem-se necessárias medidas que visem o diagnóstico e o controle
da SM em militares.
Na aba Saúde do aplicativo é possível que o militar (ou civil) identifique
se possui fatores de risco da SM (Figuras 10 e 11). O Instituto de Pesquisa da
Capacitação Física do Exército segue os parâmetros do Joint Interim State-
ment para diagnóstico de SM, seguindo uma combinação da circunferência
da cintura e outros dois ou mais pontos de corte dos quatro fatores. Esses
fatores de risco incluem glicemia elevada (maior ou igual a 100 mg/dL) ou
uso de medicamento para controle, aumento da pressão arterial (maior ou
igual a 130/85 mmHg) ou uso de medicamento para controle, níveis elevados
de triglicerídeos (maior ou igual a 150 mg/dL) ou uso de medicamento para
controle, níveis baixos de lipoproteína de alta densidade (HDL-c) (menor
que 40 mg/dL em homens e menor que 50 mg/dL em mulheres) ou uso de
medicamento para controle e adiposidade abdominal (circunferência da
cintura maior que 90 cm em homens e maior que 80 cm em mulheres). A
circunferência da cintura é avaliada com uso da fita métrica e é aferida na
região mais estreita do abdômen ou no ponto médio entre a última costela
e a crista ilíaca. Na impossibilidade de determinar a região mais estreita,
pode-se realizar a aferição sobre a cicatriz umbilical.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 67

Figuras 10 e 11 – Identificação de Fatores de Síndrome Metabólica


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Fonte: Play Store.

O excesso de peso é o principal fator de risco para o desenvolvi-


mento da SM. A obesidade contribui para a hipertensão, níveis elevados
de colesterol total, baixos níveis de colesterol HDL e hiperglicemia, que
estão associados a um risco elevado de DCV. A obesidade abdominal se
correlaciona com fatores de risco metabólicos, pois o excesso de tecido
adiposo nessa região do corpo libera mediadores inflamatórios na corrente
sanguínea, que exacerbam este risco. Sendo assim, um bom preditor para
SM é circunferência abdominal elevada (PALANIAPPAN et al., 2004).
O exercício físico como ferramenta não farmacológica é uma inter-
venção custo-efetiva para prevenir e mitigar o impacto da SM. Cada
componente desta condição de saúde é, até certo ponto, influenciado
favoravelmente pelo exercício físico (MYERS et al., 2019). Embora não
se espere que intervenções de exercícios físicos levem à normalização da
resistência à insulina, de distúrbios lipídicos ou obesidade, a melhora no
condicionamento físico demonstra ter um grande impacto sobre desfechos
de saúde relacionados à SM. Tendo em vista o aumento da pandemia de
obesidade nas últimas décadas, diversas instituições, inclusive o Exército
Brasileiro, têm envidado esforços para reduzir a incidência dessa doença,
da SM e de seus componentes.
68

O militar é constantemente estimulado a melhorar sua saúde física e


manter a sua vida fisicamente ativa. O Manual EB20-MC-10.375 regula o
Treinamento Físico Militar (TFM) e orienta que o mesmo deva ser reali-
zado com frequência mínima de três sessões semanais, utilizando diferentes
métodos de treinamento. Com o objetivo de fortalecer o uso do Manual
de TFM e contribuir para a redução da obesidade e SM na tropa terrestre,
o aplicativo IPCFEx: TFM e Saúde foi desenvolvido com ferramentas
objetivas de monitoramento da higidez física e da saúde dos militares,

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sendo possível também ser utilizado pela população civil.

Considerações finais

Segundo disposto pela OMS, hoje, a expressão “saúde digital” é fre-


quentemente usada como um termo amplo abrangendo eHealth, bem como
desenvolvimento de áreas como o uso de ciências computacionais avançadas
(nas áreas de big data, genômica e Inteligência Artificial) (OMS, 2018).
A contribuição da tecnologia para a prática do exercício físico e o cui-
dado foram o fio condutor presente neste artigo. Para tanto, focamos nos-
sos argumentos na literatura específica que reflete sobre o tema, destacando
o aplicativo IPCFEx TFM e Saúde como elemento concreto. O O referido
aplicativo, criado em 2021, apresenta atualmente cerca de 1.000 downloads,
sendo os relatos de sua utilização reportados tanto pelos profissionais militares
quanto por civis.
Esta ferramenta é compreendida como instrumento potencial de auxílio
à realização de exercício físico dirigido para civis e para militares, entendida
também como um instrumento importante para a manutenção da capacitação
física e, em consequência, para a saúde e a prontidão exigidas como condição
funcional os militares.
Dos limites de utilização do aplicativo reportamos as barreiras de acesso
impostas, neste momento, pela necessidade de sua atualização técnica, tendo
em vista a abertura para acesso de novos usuários. Das potencialidades iden-
tificadas nesta ferramenta, vale a pena ressaltar a maior difusão, tanto entre
profissionais militares quanto para o público civil, bem como a atualização
de conteúdos compatíveis com os novos dispositivos doutrinários referentes
à capacitação física no Exército.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 69

REFERÊNCIAS
BOVOLINI, A.; GARCIA, J.; ANDRADE, M. A.; DUARTE, J. A. Metabolic
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bolic syndrome: an update on diagnostic criteria, pathogenesis, and genetic
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INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
COMO DISPOSITIVO MIDIÁTICO:
oportunidades, impactos e desafios
Adriana Domingues Garcia25
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Introdução

N
este artigo, refletimos sobre as oportunidades, impactos e desafios
do uso de dispositivos de Inteligência Artificial (IA) na comunicação
social, mais especificamente das organizações públicas e privadas, no
contexto da sociedade midiatizada. O tema de estudo apreendido é constituído
das mudanças tecno-tecnológicas e semiointeracionais a partir da emergência
da IA, aplicada à Comunicação Social, as quais podem contribuir para novas
configurações no agenciamento deste espaço midiatizado.
O que motivou o primeiro insight deste estudo foi termos presenciado
um agente de comunicação social de organização pública, utilizando, em
maio de 2023, o Chat GPT. Essa foi a ferramenta responsável pela popu-
larização da IA no Brasil, a partir de 30 de novembro de 2022, quando a
empresa estadunidense OpenAi fez o lançamento desse chat inteligente.
Apenas cinco dias após a estreia, mais de 1 milhão de usuários já haviam
baixado e experimentado a ferramenta. Em janeiro de 2023, essa marca pas-
sou para 100 milhões de usuários, tornando-se o aplicativo de crescimento
mais rápido na história.
No Brasil, o projeto de lei para regulamentar os sistemas de IA ainda
está sendo discutido no Senado Federal. Trata-se do Projeto de Lei (PL) n°
2338, de 202326, que tem o objetivo de proteger os direitos fundamentais e
garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício
da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico
e tecnológico.

25 Oficial Técnico Temporária (OTT) do Exército Brasileiro, na especialidade Comunicação Social – Jornalismo,
servindo no Comando da 3ª Divisão de Exército, em Santa Maria/RS. Doutora em Comunicação pela
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Mestra em Ciências da Comunicação pela Universidade do
Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), em São Leopoldo/RS. Graduada em Comunicação Social, com habilitação
em Jornalismo pela Universidade Franciscana (UFN), em Santa Maria/RS. E-mail: adrigarcism@gmail.com.
26 Tramitação sobre a regulamentação da Inteligência Artificial. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=9347593&ts=1684441712901&disposition=inline&_gl=1*jfzlgs*_ga*MTUyMzAwOD
g1Ny4xNjg3NjMwNTAx*_ga_CW3ZH25XMK*MTY4ODE0ODc5OS4zLjAuMTY4ODE0ODc5OS4wLjAuMA
72

O conceito de comunicação organizacional está inserido na ideia de um


plano para harmonizar a comunicação externa com a interna, como forma de
criar um clima motivador dentro de uma organização pública ou privada, onde
educa, constrói novos valores e valoriza indivíduos. Serve também para produ-
zir comunicação para o mercado organizacional e criar valores nos públicos,
através de estratégias de mídias e propaganda institucional. Para KUnsch,
“vivemos numa sociedade organizacional, formada por um número ilimitado
de diferentes tipos de organizações, que constituem parte integrante e interde-

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pendente da vida das pessoas” (2003, p. 19). Sendo assim, esse tipo de comu-
nicação surge da necessidade das organizações melhorarem seu rendimento,
sua imagem, sua reputação, por meio da boa relação institucional/empresarial
e interação com seus públicos, assim como seus funcionários/servidores.
Saad (2021) aborda a comunicação organizacional e a transformação
digital, destacando as disrupções tecnológicas, demográficas e macroeco-
nômicas que estão remodelando a sociedade. A autora propõe uma visão de
mundo que ultrapasse as fronteiras corporativas para que se pense o tecido
social, evidenciando a comunicação com o meio conector dos processos de
transformação. É no campo epistemológico das Ciências da Comunicação
que se situa a comunicação organizacional. Para ela, há jogos de tensões
entre lógicas de poder, em um cenário sociotécnico fluido e movente, em que
atores humanos e não humanos estão em posição de igualdade, com crucial
necessidade de adesão.
No cenário atual, os novos modelos de IA generativa estão evoluindo
de modo acelerado e nos surpreendendo a cada dia com suas capacidades e
aplicações. Essa realidade se impõe de maneira autoritária, provocando trans-
formações profundas e incalculáveis, exigindo nossa adaptação. No sistema
comunicacional, surgem inéditos modos de produção de conteúdo midiático,
impulsionados por múltiplos processos de criação e interação multiníveis,
aqui, visualizados dentro da Teoria dos Sistemas de Niklas Luhmann (2005),
como autofortificação, baseada em autorreferencialidade e heterorreferencia-
lidade, em que o agente de Comunicação Social interage de acordo com os
códigos de um sistema autopoiético, que se reproduz a si mesmo e já não é
dependente da mediação realizada pela interação entre os presentes.
Nesse sentido, o objeto desse estudo é um novo comportamento comuni-
cacional apresentado. Acredita-se que o uso dos dispositivos de IA pode trazer
inúmeras possibilidades para a comunicação social. Entre elas, melhorar o aten-
dimento ao público, tornando a interação mais rápida e eficaz, com respostas ins-
tantâneas, aprimorar a produção de conteúdo, com pesquisas mais aprofundadas,
realizar planejamentos estratégicos mais eficientes, além de cruzar dados e gerar
relatórios com mais precisão e eficiência, entre outras possibilidades objetivando
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 73

o crescimento institucional ou dos negócios. Diante disso, consequentemente,


poderemos obter o feedback positivo desses processos comunicacionais nas
ações sociais. Em contrapartida, entende-se que os dispositivos de IA podem
exercer alguma forma de controle, no sentido de aprendizagem, padronização,
codificação ou decifração das práticas sociais e discursivas.
A pertinência dessa discussão se dá pela necessidade de estudos sobre as
complexas questões éticas e estéticas que surgem com o uso dessas tecnologias
emergentes e disruptivas, porém, é preciso evitar mistificações tecnofílicas ou
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tecnofóbicas, pois prejudicam o debate e a percepção sobre a realidade. Pretende-


-se, com essa reflexão, produzir conhecimento sobre essa inovadora modalidade
comunicativa que, apesar de muito incipiente em conceitos, se faz necessária e
já é parte da realidade da comunicação organizacional pública e privada.
Nesse contexto, cria-se a seguinte problemática: “Qual a dinâmica inte-
rativa da criação de conteúdo midiático utilizando o recurso de IA? Para
complementar a reflexão, apresentamos uma listagem de dispositivos de IA
que podem ser utilizados no âmbito da comunicação organizacional, com
uma breve explicação das suas funcionalidades. Apesar de inicial, essa é uma
forma de ilustrar como poderemos nos apropriar dessas ferramentas, para
efetivamente colocar em prática essa dinâmica.
Para construir essa reflexão, discutimos os conceitos de midiatização,
como ângulo de visão do novo jeito de ser e existir no mundo, centralizado
nos meios de comunicação e na visibilidade midiática, através de práticas e
processos sociais. A metodologia colocada em perspectiva é a matriz triádica
do dispositivo, por meio das articulações desenvolvidas por Ferreira (2006) e
Garcia (2012). Essa abordagem teórica tem a capacidade de iluminar nossas
inferências sobre os aspectos socioantropológicos, semiodiscursivos e tec-
no-tecnológicos. Esses vieses são muito apropriados para o nosso objeto de
estudo, pois privilegiam a dimensão e ação humana diante das tecnologias.

O espaço midiatizado

O pano de fundo para esse estudo é o campo conceitual da midiatização,


que torna ainda mais complexa a comunicação. A sociedade midiatizada é
formada por intersubjetividades emergentes, identificadas nas novas configu-
rações de vida social e individual, de práticas e dinâmicas operacionais, em
que há novos formatos de trocas simbólicas e antigos costumes.
Esse fenômeno supera o caráter representacional, que era centralizado
nos produtos midiáticos, típico da Sociedade dos Meios27. No novo estágio

27 O novo modelo teórico da Ciência da Comunicação: “Midiatização e Práticas Sociais” defende a transformação
da Sociedade dos Meios (MARTIN-BARBERO, 1985) que deixa de ser caracterizada pela existência de
74

dos processos comunicacionais, permanece a segmentação do espaço social,


pela formação de campos sociais relativamente fechados e autônomos, dota-
dos de interesses diversos e conflitantes, defendido por Rodrigues (1997). O
comportamento da sociedade caminha para o desenraizamento da experiência
coletiva, recompondo o saber e o fazer humano. O domínio do simbólico
constitui novas modalidades de secularização dos ritos sociais28 e das práticas
comunicacionais. Nesse cenário, o discurso midiático figura como uma ins-
tância de legitimidade e notoriedade. Dessa forma, a capilarização realizada

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pelo campo dos media é que garante o reconhecimento pelos demais campos,
e, por conseguinte, forma a opinião pública.
No mesmo tempo, há mais transparência nas relações, no sentido de tornar
as práticas sociais mais visíveis. Em decorrência disso, os campos se afetam nas
suas operações e mudam as formas de saber sobre os processos midiáticos29.
A midiatização começa a manifestar-se a partir do momento em que surgem
novas formas de fazer, de perceber e de apropriar-se dos produtos midiáticos,
ou seja, quando as práticas sociais são afetadas pela lógica midiática.
Entendemos que o uso dos dispositivos de IA na divulgação institucional
possui possibilidades múltiplas e imprevisíveis, que formam o conjunto de
saberes que emergem e interferem na vida cotidiana. Nossa cadeia de racio-
cínio está diretamente ligada aos processos midiatizados, em que é percebida
uma crescente autonomização dos processos intermidiáticos e intramidiáticos
de circulação de informações e modos interacionais, caracterizada pela inscri-
ção dos indivíduos midiáticos nos processos produtivos, deslocando os papéis
entre produção e recepção. “Mesmo que esse funcionamento seja apenas parte
do processo de midiatização, puramente descritivo, é sempre retomado e
reformulado conforme as questões em estudo (recepção, produção, circulação
etc.)” (FERREIRA; FOLQUENING, 2012, p. 4). Assim, buscamos analisar a
partir das dimensões dos processos comunicacionais, dos dispositivos e dos
processos sociais, para interpretarmos as transformações contextuais que estão
articuladas à midiatização.
Sendo assim, entendemos que já há algum tipo de ação, por parte dos
sujeitos agentes da comunicação, os quais utilizam de recursos automatizados,
vistos como dispositivos que colocam em circulação conteúdos codificados,
mas que são retroalimentados nas interações entre máquinas e humanos.

dispositivos sócio-técnico-discursivos, como apenas intermediadores, para “[...] uma sociedade onde a
cultura, lógicas e operações midiáticas afetam, relacional e transversalmente, a própria sociedade, no âmbito
mesmo de suas diferentes práticas” (FAUSTO NETO et al., 2010, p. 10).
28 Regras de vida individual e coletiva, maneiras de dizer e de fazer regulares, que orientam expectativas em
função de sua obrigatoriedade indiscutível (RODRIGUES, 1997, p. 25-26)
29 Essa visão direciona para a questão da autorreferencialidade, estudado principalmente por Fausto Neto
(2005), conceito o qual não nos aprofundaremos nesse trabalho.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 75

A interação como condicionante da IA

O conceito de Inteligência Artificial (IA) é apresentado no Projeto de Lei


n° 2338, de 2023, que dispõe sobre a regulação de IA no Brasil, como sistemas
computacionais com graus diferentes de autonomia, desenhado para inferir
como atingir um dado conjunto de objetivos, utilizando abordagens baseadas
em aprendizagem de máquina e/ou lógica e representação do conhecimento,
por meio de dados de entrada provenientes de máquinas ou humanos, com o
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objetivo de produzir previsões, recomendações ou decisões que possam influen-


ciar o ambiente virtual ou real. Já o operador dos sistemas de IA são pessoas
naturais ou jurídicas, de natureza pública ou privada, que empreguem ou uti-
lizem, em seu nome ou benefício, sistema de IA, salvo se o referido sistema
for utilizado no âmbito de uma atividade pessoal de caráter não profissional.
Conjecturamos essa definição à visão de Gunkel (2017), que entende que
a atividade comunicacional é uma condição definidora da IA. O autor destaca
que o desenvolvimento de aplicações de IA “complica a ideia do sujeito de
comunicação” (p. 1), requerendo modificações significantes tanto em seu
aparato conceitual quanto em sua estrutura filosófica.
Gunkel (2017) faz referência aos primeiros experimentos de IA, ainda
nos anos 50, com a configuração inicial do “jogo da imitação” de Alan Turing,
e sua comunicação mediada-por-computador (CMC).

[...] se um computador de fato pode se tornar capaz de simular um ser


humano de ambos os gêneros, em intercâmbios comunicativos com um inter-
rogador humano de modo que o interrogador não consiga dizer se está inte-
ragindo com uma máquina ou outro ser humano, Turing conclui que essas
máquinas devem ser consideradas “inteligentes” (GUNKEL, 2017, p. 1).

O autor defende que são necessárias significativas reorientações e


reconceitualizações dos estudos do campo da Comunicação, de maneira a
acomodar as oportunidades e desafios introduzidos pelas máquinas cada vez
mais inteligentes.
No aspecto da interação, no seu sentido mais conceitual de afetar
ou influenciar o desenvolvimento ou condição de um outro, que pode ser
máquina ou ser humano, destacamos, em concordância com o autor, que o
modo como inserimos os comandos, as perguntas, ou seja, o que fazemos com
essas manipulações também faz diferença. Nesse sentido, a mente humana
é essencial para os bons resultados dos processos midiáticos, o que justifica
visualizarmos as ferramentas de IA como dispositivos multidimensionais,
conforme tratamos a seguir.
76

IA como dispositivo

Para nomearmos as ferramentas de Inteligência Artificial (IA) como


“dispositivos” é preciso que se defina o que se entende por esse termo, pois,
a utilização do conceito tem causado discussões interessantes, já que as ela-
borações teóricas são diversificadas. Klein (2007) faz um estudo da gênese
do conceito de dispositivo e sua utilização nos estudos midiáticos. Ele infere
que o conceito é mais utilizado na sua forma unidimensional, sendo confun-

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dido algo estritamente técnico ou tecnológico. Entretanto, existem autores
que suprimem o aspecto técnico-tecnológico, porém, destacam somente uma
dimensão, como socioantropológica, ou a linguagem.
Neste artigo, é entendido o dispositivo em uma perspectiva de contem-
plação multidimensional do conceito, por entender que o processo comu-
nicacional não se explica somente através de suas mudanças tecnológicas,
nem somente pelo comportamento dos agentes de comunicação envolvidos,
ou tão somente pelos recursos de linguagem que atuam nas plataformas de
IA. Sendo assim, a análise abrange a circulação de relações e confluências
possíveis desses elementos.

Viés metodológico

Este estudo é de caráter qualitativo, descritivo e indutivo, realizado por


meio de uma pesquisa bibliográfica dos estudos de midiatização e da abor-
dagem teórica-metodológica do “dispositivo midiático” (FERREIRA, 2006).
Buscamos, com isso, refletir sobre as possibilidades de emprego de IA nas
rotinas produtivas de produções midiáticas da atualidade. Para complemen-
tar a reflexão, elencamos alguns aplicativos que têm funções específicas de
otimizar e melhorar os processos criativos.
Ferreira (2006) apresenta um campo de análise a partir de uma matriz
primária triádica onde são relacionados e interseccionados aspectos socioan-
tropológicos (SA), semiolinguísticos-discursivos (SL) e tecno-tecnológi-
cos (TT). Segundo o autor, nenhuma dimensão isolada consegue dar conta
das inter-relações de condicionamentos e contingenciamentos dos processos
comunicacionais, pois, um é polo dominante relativamente a outro, ou seja,
instalam relações de causalidade. Quando uma terceira dimensão fica apagada,
ela aparece, como “sintoma” no aparato descritivo.
A dimensão socioantropológica corresponde aos sujeitos midiatizados,
suas culturas, ações e instituições. Na dimensão semiolinguística-discursiva
atuam as operações de linguagens que fornecem múltiplos sentidos. Já os
aspectos tecno-tecnológicos relacionam as técnicas de produção e circulação
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 77

de informações, assim como os suportes tecnológicos utilizados nos processos


de comunicação.
Em complemento a essa primeira elaboração conceitual, Ferreira (2007,
2010) apresenta os dispositivos como acoplamentos e operações entre pro-
cessos de interação social, linguagens, técnicas e tecnologias. Para o autor,
esses três elementos estabelecem modos da sociedade interagir sobre (e com)
os produtos midiáticos, identificando tanto o conjunto de materialidades,
quanto o complexo de relações, agenciamentos e intersecções com processos
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sociais e de comunicação.
Em Ferreira (2010) é apresentado o estudo do dispositivo midiático
(DISP), inserido no espaço midiatizado, envolvido ativamente em relações
e intersecções entre processos sociais (PS), que são as instituições e atores
analisáveis por meio de diversas perspectivas das teorias sociais clássicas; e
processos de comunicação (PC), constituídos de questões novas, atos diferidos
no tempo e espaço em tensão com os dispositivos. Sendo que não só um polo
condiciona o outro, mas também intercede nas relações.

Por dispositivos midiáticos [...] entendemos as incidências nos processos


sociais e nos processos de comunicação que emergem dos acoplamentos,
defasagens, interpenetrações entre processos de interação, de linguagem,
técnica e tecnologia [...] Os dispositivos sendo triádicos, contemplam
possibilidades relacionais de caráter exponencial (FERRREIRA, 2010).

Desta forma, o autor incorpora uma processualidade mais abrangente


constatando que os dispositivos acionam processos passíveis de interações
entre código, sistemas e estruturas. “Um dispositivo [...] só é compreensível
em processo” (FERREIRA, 2010). Assim, o movimento analítico dos estudos
sobre objetos midiatizados deve considerar as trocas mútuas entre os três
polos. No entanto, para que isso seja possível, é preciso que, nas pesquisas,
se adote uma perspectiva em que a circulação seja o objeto comunicacional
e que sejam utilizados métodos abdutivos, em direção aos estudos de caso.
Ferreira (2010) apresenta uma proposição epistemológica para entender
os processos midiatizados em que é preciso superar a análise focada nos pro-
cessos de produção e consumo. Para o autor, devemos analisar os fenômenos
a partir da circulação. Dessa forma, as interpretações midiatizadas passam a
ter a condicionante do contexto relativizada, já que ela não identifica o caso
midiático, mas sim, os de cunhos sociológico, psicológico, antropológico
etc., em relação ao midiático.
Essa proposta metodológica decorre da visão de que os processos onto-
lógicos de midiatização são novos e as teorias clássicas das ciências sociais e
da linguagem são insuficientes para dar conta dos fenômenos. “Não se trata
78

de negar as heranças, mas colocá-las em um novo jogo interpretativo, em


que as disciplinas originais [...] devem estar subordinadas a esse objeto em
construção” (FERREIRA, 2010). O autor reitera que é preciso compreender
a circulação, como um objeto singular, imerso na configuração própria ao
caso em construção.

Oportunidades, impactos e desafios

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Inferimos que em suas múltiplas aplicações, os dispositivos de IA criam
textos, imagens, vídeos e músicas, impactando uma ampla variedade de traba-
lhos e profissões, nas áreas de ciência, educação, design, finanças, engenharia
e auxílio à realização de exercício, entre outros. Especificamente na área da
comunicação social as implicações éticas e estéticas estão em debate. Há
implicações sobre a criação artística, o conceito de arte, a apropriação de
conteúdos e as questões autorais, condicionamentos estéticos pela padroni-
zação a partir de parâmetros pré-definidos. A grande questão que surge é: a
criação em interação com IA representa um salto intuitivo ou uma mera
automatização dos processos?
No que diz respeito à disruptura na sociedade midiatizada, como impactos
e desafios da popularização da IA, podemos prever efeitos sobre as relações
de poder no sistema internacional, nas relações Norte-Sul. Na organização
do trabalho, podem surgir complicações relacionadas às formas de desestabi-
lização de profissionais e profissões inteiras e a consequente desvalorização
dos trabalhadores.
No conhecimento humano, os impactos podem estar relacionados tanto
positivamente nas possibilidades de superação de barreiras intelectuais e
aprimoramento da criatividade quanto na degradação das habilidades e
obsolescência humana. Vislumbramos também os controles de aprendi-
zagem que podem ser exercidos, pelas possibilidades de manipulação das
informações com discursos ideológicos para a promoção de determinadas
agendas, em contrapartida, a regulamentação e controle social da IA, sendo
criadas formas de uso cívicas, como práticas de participação cidadã para
fortalecer as democracias.
A seguir, mostramos os recursos em IA disponíveis aos agentes de comu-
nicação social, que podem, de maneira otimista, melhorar a performance da
comunicação organizacional de um modo geral, vistos como oportunidades:
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 79

Quadro 1 – Exemplos de dispositivos de IA para emprego


em rotinas produtivas de comunicação
Dispositivo
Função
de IA
ChatGPT Gera ideias de conteúdos de acordo com a persona, ou públicos de preferência. Edita os conte-
údos e faz otimizações nas estratégias de SEO, melhora a qualidade textual e reduz o número
de erros. No cruzamento de dados, seleciona palavras-chave relevantes, cria legendas para
vídeos, gera e otimiza títulos atrativos, encontra fontes de referências e ideias, cria resumos
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que podem auxiliar no entendimento de um assunto. Cria um assistente virtual capaz de


ajudar os clientes em tarefas como agendamento de consultas, pedidos de novos produtos
e localização de informações.

Midjourney Apesenta recursos de escrita rápida e criação de imagens que podem ser incluídos em posts nos
diversos canais de comunicação. Utiliza uma rede neural para gerar imagens a partir de descrições
textuais. Funciona da seguinte forma: o usuário envia uma descrição textual para o Midjourney e a rede
neural interpreta essa descrição e gera uma imagem que se aproxima do que foi descrito.

continua...
80
continuação
Dispositivo
Função
de IA
Synthesia Plataforma para a elaboração de vídeos por meio da IA. Desenvolve vídeos em até 120 idiomas,
economizando tempo e recursos valiosos para a elaboração desse material. Oferece uma alternativa
acessível para a elaboração de vídeos tradicionais, além de dispor de um aplicativo baseado na web e
que pode ser facilmente acessado pelo navegador. A interface também é bastante intuitiva. Os avatares
Synthesia que fazem os vídeos podem ser escolhidos entre mais de 100 tipos disponíveis, além da
possibilidade de desenvolver um avatar corporativo exclusivo

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Voicely Faz locuções de textos e transforma em arquivos de áudio. Cria vozes realistas para qualquer texto.
Conta com mais de 745 vozes registradas em seu banco de dados, incorporando 128 idiomas e
dialetos diferentes.

Speech Text Converte voz em texto. Conta com recurso de leitura em voz alta, permitindo que pessoas com defici-
ência visual tenham acesso a conteúdos escritos. Suporta mais de 30 idiomas diferentes e apresenta
um sistema bastante preciso, com uma taxa de erro de palavra de apenas 3,8% no conjunto de dados
utilizados. Utilizado para transcrição de entrevistas, videoconferências, transcrições de podcasts
e transformação de conteúdos MP3 para texto.

continua...
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 81
continuação
Dispositivo
Função
de IA
Speech Text
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Fonte: Rockcontent e a autora.

Inferências

Defendemos que é preciso evitar a ideia simplificadora de que os dis-


positivos seriam simplesmente os meios de comunicação, tecnologias ou
suportes, pois, as relações se constituem alargadamente pelas conexões que
mantemos entre nós, os outros – inclusive máquinas – e o mundo. No entanto,
não é o elemento tecnológico que se destaca no processo estudado, mas sim,
dá direção e sentido a seu uso, levando à produção midiática, aos modos de
endereçamento, às promessas e contratos.
Com base no nosso referencial teórico e analítico, inferimos que, no processo
de emprego dos dispositivos de IA, a apreensão da contextualização comunicacio-
nal é derivada dos aspectos macroestruturais (tecno-tecnológicos) e está subtraída
dos processos sociais e de comunicação, que resulta na interação propriamente
dita. E isso acontece em níveis de interação variados, atendendo a diferentes lógi-
cas de funcionamento, por meio de autofortificações na ambiência midiatizada,
mas que convergem para um objetivo comum: aprimorar as rotinas produtivas
comunicacionais. E isso pode ser estratégico para aprimorar o processo.
Ressaltamos que são nas relações com o dispositivo que são formuladas as
produções de conteúdo midiático, através da diversidade de linguagens, do des-
centramento e acionamento de interdispositivos divergentes e heterogêneos que
passam por um trabalho de orquestração pelos indivíduos e acabam convergindo
para reingressarem na esfera midiática, em forma de repercussão da repercussão,
aqui tratada como circulação, dando o caráter autopoiético do processo.
Visualizamos o dispositivo de IA como um espaço de circulação de
inteligência, por meio da dinâmica da apropriação da inteligência geral dos
conhecimentos humanos disponíveis, que são codificados em informações e
82

não informações, que vão se retroalimentando por meio da interação autorrefe-


rente e heterorreferente, sendo que as fontes de dados abertas na internet são o
que alimentam esses dispositivos. Nesse sentido, a autofortificação do sistema
depende dos comandos em linguagem natural, realizados por um humano.

Considerações finais

Vivenciamos uma era de complexidades interacionais, em que existe a

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dinâmica de máquinas autônomas, algoritmos capazes de aprendizado e siste-
mas inteligentes, introduzindo novos desafios e oportunidades para os estudos
em Comunicação. Identificamos no espaço dos dispositivos de IA processos
autonomizados, elaborados pelos próprios participantes da interação, com
potencial de estímulo à alta performance do trabalho. No entanto, defendemos
que não é possível prever que a IA terceirizará a produção de ideias originais,
já que não é possível criar nada exclusivo por meio dela. Apesar dos produtos
midiáticos serem diferentes, o conteúdo em si não é.
Verificamos, em contraposição a Luhmann (2005), que a autonomia desse
processo autopoiético não se encerra na diferença e irritação do sistema com
o ambiente. A autonomia não está apenas na autodeterminação do ambiente
no sistema, mas também nos processos em que, partindo das irritações/aco-
plamentos estruturais – que depois geram conteúdos midáticos – possibili-
tam transformações importantes de construção social, com a adaptação dos
sistemas, que devem atender a lógicas específicas entre elas: limitações de
produção, domínio da ferramenta, ineficiência das interações e regulações.
Nesse sentido, a comunicação se articula com o ambiente, já que, de
alguma forma, acontecerá a criação homem-robô, baseada em construções
próprias – intersubjetividades de cada indivíduo-ator midiático em interação,
seja ela explícita ou não, mas será um nível de interação baseado no domínio
das ferramentas. Essas respostas retroalimentam a circulação, produzindo
reconfigurações nos sistemas, nas suas estruturas e códigos, gerando novos
elementos para as criações midiáticas, o que pode resultar em interações ricas.
É exatamente sobre esse aspecto de construção social engendrados por
complexos e múltiplos movimentos que destacamos a função das IAs na
comunicação organizacional pública e privada, tendo em vista que as rotinas
produtivas sofreram modificações importantes na ambiência midiatizada. Para
acompanhar essa demanda, o profissional precisa buscar conhecimento técnico
dos desenvolvedores dessas ferramentas, para ser usado em sua capacidade
total, seja em programação ou análise de dados. Para finalizar, destacamos o
entendimento de que, vistos com dispositivos midiáticos, as ferramentas de
IA têm a finalidade de aumentar as capacidades humanas e contribuir para a
eficiência e eficácia dos processos comunicacionais.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 83

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Artigo inédito.

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RAPOSO, João Francisco (org.). Comunicação organizacional: práticas,
desafios e perspectivas digitais. São Paulo: Summus Editorial, 2021. p. 13.23.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
APLICADA À ANÁLISE DE CONFLITO
DE IDEIAS EM REDES SOCIAIS
Vinícius Marques da Silva Ferreira30
Ricardo Marciano dos Santos31
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Introdução

É
essencial a reflexão sobre a difusão das redes sociais digitais à luz da
Ciência da Informação (CI), ressaltando-se o interesse e a vantagem
científica nas pesquisas desse campo tão atual, visto que elas atual-
mente nos levam à constatação de onipresença e à análise sobre a ocupação
de um espaço crescente por esse tema nos debates acadêmicos, nas mídias,
nas instituições privadas e públicas, bem como no senso comum. A definição
de rede é inerente ao ser humano, pois se trata de uma condição natural que
o leva a reunir-se com o seu próximo, estabelecendo vínculos de amizades,
profissionais, afetivos, laços de interesses que se estendem ao longo do tempo
e se transformam, sendo possível constatar que a informação e o conhecimento
se fazem presentes em todos os âmbitos, aspectos e áreas considerados basi-
lares tanto do ponto de vista profissional quanto acadêmico, quando modi-
ficados pelas ações dos atores institucionais ou por indivíduos, tornando-se
competências de grande valor, possibilitando crescimento e desenvolvimento
socioeconômicos que incentivam o progresso, sendo esses recursos essenciais
para a composição e manutenção das redes sociais digitais.

30 Graduado em Tecnologia da Informação pela UniverCidade. Licenciatura em Informática pela UCAM.


Especialista em Gestão Tecnológica em Ambientes Educacionais pelo IST-Rio. Especialista em
Desenvolvimento de Sistemas com JAVA e PHP pela UNIBF. Especialista em Cybercrime e Cybersecurity:
Prevenção e Investigação de Crimes Digitais pela UNIBF. Mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/
UFRJ. Doutorado em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia pela UFRJ. Professor pela
Universidade Veiga de Almeida. Pesquisador do LAMAE/UFRJ e LabFuzzy/UFRJ. Professor e Pesquisador
colaborador da Escola Superior de Guerra (ESG).
31 Graduado em Pedagogia Administração Escolar pela UVA. Graduação em Análise e Desenvolvimento de
Sistemas pela Uninter. Especialista em Tecnologia Educacional pela UCAM. Especialista em Supervisão
e Orientação Escolar pela Unicid. MBA Big Data e Inteligência Competitiva pela Uniamérica. MBA em
Segurança da Informação pela Uniamérica. Mestrado em Informática pela UFRJ. Doutorado em História
das Ciências e das Técnicas e Epistemologia pela UFRJ. Professor pela UNIG e FAETERJ-Rio. Pesquisador
do LAMAE/UFRJ e da FIOCRUZ.
86

Segundo Felício et al. (2014), o encontro de pares em ambientes digi-


tais já existentes traz a possibilidade de aprender através da observação dos
interesses de outros indivíduos publicados em espaços virtuais.
Outrossim, sabemos que, por consenso, jornais impressos, digitais e
editores são os responsáveis pela
​​ publicação dos acontecimentos cotidia-
nos e pela autenticidade da propagação da notícia, porém, a natureza da
mídia social ou redes sociais digitais é diferente da mídia tradicional, pois
é dinâmica, interativa e permite autonomia aos atores ou indivíduos para

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produzir conteúdo de propagação digital, mas eles não são responsabili-
zados ​​pelo conteúdo. Desse modo, a veracidade permanece questionável
em plataformas de redes sociais ou mídias digitais enquanto os indivíduos
da mídia tradicional não possuem instrumentos de fiscalização ou controle
sobre a propagação do conteúdo.
No entanto, a manifestação da desinformação e da propagação de notí-
cias falsas não é um evento do século XXI, pois, ao analisar outros perío-
dos históricos, podemos constatar que tal evento é inerente à comunicação
humana, uma vez que os canais de comunicação, através de impressão de
jornais, do rádio e da televisão já foram responsabilizados por causar efeito
de desinformação, quando se popularizaram. No século XX, com a inserção
da internet e a celeridade da propagação da informação, ampliou-se ainda
mais a velocidade com que os informes se multiplicam, prejudicando a veri-
ficação das fontes e a fidedignidade dos fatos, que propiciam um ambiente
em que o sentimento de “anonimato ou ocultação” nas redes sociais per-
mite impulsionar um comportamento social de efeito “manada”, espalhando
notícias sem verificação.
Segundo Rais (2018), a concepção de fake news inclui três elementos
essenciais: dolo, falsidade e danos. Entretanto, frequentemente temos que lidar
com dados e/ou informações que naturalmente não podem ser especificadas
por valores numéricos de precisão e, além disso, é necessário ter a destreza de
analisá-las para uma tomada de decisão ou em um estudo de caso, de maneira
mais acertada. São informações que, apesar de poderem ser dimensionadas,
envolvem certo grau de interpretação e ações movidas por subjetividades, ou
seja, que admitem discordâncias entre indivíduos de um grupo, ambiguida-
des, idiossincrasias, incoerências, relativizações, incertezas, e a influência de
valores socioeconômicos e culturais, incorrendo em efeitos do coletivo nas
redes que revelam divergências internas e externas.
Assim, este estudo objetiva a aplicação da lógica Fuzzy32, baseado na
análise de comportamento e conhecimento da polarização de ideias dos atores
ou grupos nas redes sociais digitais, especificamente no Twitter. Aproveita-se a

32 Lógica Fuzzy – Permite lidar com a ambiguidade da informação e a incerteza do mundo real.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 87

expertise dos estudos anteriores desenvolvidos por pesquisadores do LAME33,


estabelecendo uma relação de continuidade com as pesquisas já realizadas,
nas quais se constatou como as redes sociais digitais impactaram os padrões
éticos da própria democracia, explorando-se os principais fenômenos ou temas
das fake news, bem como sua propagação que influenciou, por exemplo, o
plebiscito do Brexit no Reino Unido, as campanhas eleitorais estadunidenses
no ano de 2016 e a brasileira em 2018, fomentando-se o debate científico
acerca do perigo do conflito de ideias nas redes sociais digitais.
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Pesquisa bibliográfica

Esta seção apresenta a pesquisa bibliográfica elaborada no presente tra-


balho. São abordados assuntos que auxiliam uma análise mais detalhada do
problema proposto, tais como a análise comportamental, as redes sociais, a
Inteligência Artificial, a lógica Fuzzy e o algoritmo.

Análise comportamental

Com o advento tecnológico impulsionado pela globalização, A Comuni-


cação Social tem se transformado significativamente, pois, com a celeridade e
troca de informações, seja por meio de correio eletrônico (e-mail), aplicativos,
salas virtuais (chats) dentre outros recursos, os indivíduos têm a possibilidade
de se conhecerem, de se relacionar, de trocar informações, permitindo-se o
desenvolvimento de diversas possibilidades de interações no ambiente virtual
por meio das redes sociais digitais, dos mais variados tipos de públicos e com
diferentes finalidades.
Ao longo dos anos, a análise comportamental tem proporcionado à socie-
dade várias possibilidades de entendimento dos assuntos relacionados ao
modo pelo qual os indivíduos se expressam e agem, permitindo-se saber os
motivos e interesses do comportamento e das ações, uma vez que, somente
se desvendando e analisando as razões e os mecanismos subjacentes à con-
duta humana, é possível prevê-la e obter o controle comportamental. A esse
respeito, segundo Skinner (1953, p. 15),

O comportamento é um assunto difícil, não porque é inacessível, mas


porque é extremamente complexo. Desde que é um processo, e não uma
coisa, não pode ser facilmente imobilizado para observação. É mutável,
fluido e evanescente, e, por essa razão, demanda grande exigência técnica
da engenhosidade e energia do cientista.

33 LAME – Laboratórios de Métodos Avançados e Epistemologia do Instituto Tercio Pacitti de Aplicações e


Pesquisas Computacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
88

Trata-se de uma avaliação do comportamento do indivíduo, na qual é


possível entender as características constantes em cada um dos indivíduos
e a forma como reagem aos estímulos diante das adversidades, visto que a
maioria dos testes comportamentais se baseia em perfis de usuários, ou seja,
identificam comportamentos predominantes que se resumem a padrões de
personalidade e condutas.

Redes sociais digitais

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O emprego científico da concepção ou do ponto de vista das redes sociais
digitais para reflexão e abordagem de eventos sociais, políticos e econômicos
tem chamado a atenção dos pesquisadores de praticamente todas as áreas,
sobretudo, das Ciências Humanas, Sociais e Comportamentais para novas
perspectivas metodológicas. A exploração científica das redes sociais digitais
(SNA)34, extraordinariamente, é um recurso metodológico essencialmente
multidisciplinar (Antropologia, Sociologia, Psicologia, Matemática, Compu-
tacional, Estatística), cuja essência se traduz na oportunidade da formalização
textual ou imagética, sendo ela abundante de conceitos centrados nas proprie-
dades e eventualidades características da vida cotidiana. Desse modo, amostras
e fundamentos formulados a partir de conceitos ou percepções sociais podem
ser matematicamente comprovados através de experimentos.
Segundo Wattenberg (2006), a exploração de redes sociais digitais
implica em três tarefas base, sendo configuradas por:
(1) Identificação de comunidades: os atores estarão agrupados em comu-
nidades de acordo com seus atributos ou características afins, sendo impor-
tante a avaliação da densidade de uma comunidade em termos de conexão e
identificação de cliques e relacionamentos abertos;
(2) Identificação de atores principais ou centrais: é necessária a identi-
ficação dos atores que possuem maiores números de conexões, assim como
pontos de articulações – atores que formam pontes (bridges) entre comuni-
dades. Essa missão requer a compreensão da estrutura global da rede social,
isto é, encontrar comunidades, descobrir como são conectadas e quais atores
as conectam entre si;
(3) Análise de papéis, disposição de conexões e atores: essa análise é
realizada sabendo a conexão dos atores dentro e fora de uma comunidade. Tal
tarefa requer interpretação e depende dos atributos de atores e relacionamentos.
Segundo Stanley Wasserman e Katherine Faust (1999), uma das peculia-
ridades da SNA é a concentração no aspecto de relação dos dados coletados.

34 SNA – Social Network Analysis ou análise de redes sociais.


INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 89

De um ponto de vista formal, há essencialmente um tripé teórico em SNA:


(1) a teoria dos grafos (graph theory), (2) a teoria probabilística (probability
theory) ou estatística (statistics) e (3) os modelos algébricos (algebraic models).
A teoria dos grafos (graph theory) enfatiza uma análise descritiva com destaque
na qualidade dos dados. Os demais métodos (2 e 3), probabilísticos, são comu-
mente aplicados em análise de redes de múltipla relação ou multirrelacional e
teste de hipóteses. Logo, de forma geral, padrões de redes admitem normatizar
conceitos teóricos, determinar teorias ou modelos e examinar estatisticamente
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sistemas múltipla relação. Desse modo, pode-se afirmar, de acordo com Mar-
teleto (2001, p. 72), que “a análise de redes estabelece um novo paradigma na
pesquisa sobre a estrutura social. [...] A estrutura é apreendida concretamente
como uma rede de relações e de limitações que pesa sobre as escolhas, as
orientações, os comportamentos, as opiniões dos indivíduos”.

Inteligência Artificial

Historicamente, o primeiro trabalho evidenciado como IA35 foi elaborado


por Warrem Macculloch e Walter Pitts (1943), mas foi Alan Turing o pioneiro
na articulação e desenvolvimento da perspectiva da IA em seu artigo do
ano de 1950 denominado “Computing Machinery and Intelligency”, no qual
evidenciou o chamado Teste de Turing, fundamentado na incapacidade de
diferenciar entidades irrefutavelmente inteligentes, similares ao ser humano
e partindo do pressuposto de que o computador pode ser aprovado em uma
determinada testagem realizada por um humano, após propor algumas inda-
gações por escrito, não se conseguindo descobrir se as respostas escritas são
de um ser humano ou de uma máquina.
Em 1955 o termo “Inteligência Artificial” foi cunhado pelo então profes-
sor de Matemática, John McCarthy do Dartmouth College; prosseguindo com
os acontecimentos históricos, entre junho e agosto de 1956, um grupo de pes-
quisadores revolucionou o renomado campus Dartmouth College, localizado
em New Hampshire, no qual nomes memoráveis da computação, tais como
Oliver Selfridge, John McCarthy, Trenchard More e Marvin Minsky discutiram
a evolução da automação, assunto esse fomentado pela academia, causando
divergência de opiniões a respeito da habilidade de máquinas executar um
trabalho humano. Contudo, a artificialidade é descrita como criação artística
ou indústria humana e não por causas naturais (MICHAELIS, 2018a). Assim,
podemos começar a entender o conceito de Inteligência Artificial (IA), pois
não há uma conceituação ou definição exata a respeito da inteligência, mas
pode-se entender de maneira pragmática que está associada à compreensão,

35 IA – Inteligência Artificial.
90

interpretação, raciocínio e à habilidade do conhecimento em aproveitar aspec-


tos de uma situação e utilizá-la para resolver situações e problemas propostos.
Segundo Kurzweil (1990), IA é a arte de criar máquinas que executam
funções que exigem inteligência quando executadas por pessoas.
A Inteligência Artificial está fundamentada em simular o comportamento
e a capacidade humana de solucionar e decidir situações complexas, visto
que a sua grande vantagem está na capacidade de alto desempenho de pro-
cessamento que é exponencialmente superior ao do ser humano (Figura 1).

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Figura 1 – As dicotomias entre Inteligência Artificial,
Aprendizado de Máquina e Aprendizagem Profunda
Inteligência Artificial, Aprendizagem de Máquina e Aprendizagem Profunda

Inteligência Artificial (IA)


Inteligência Artificial Campo que estuda como criar programas de informática
com a habilidade de aprender e racioci- nar como os
humanos para resolver problemas de forma criativa.

Aprendizagem de Máquina Aprendizagem de Máquina


Aplicação de uma IA dedicada a criação de um algoritmo
que permita aos sistemas aprender sem intervenção
humana, ou seja, sem a necessidade de serem programa-
Aprendizagem dos explicitamente.

Profunda Aprendizagem Profunda


Subconjunto da Aprendizagem de Máquina focado na
criação de redes neurais artificials, ou seja, sistemas
que imitam o cérebro humano, adaptan- do-se e aprenden-
do a partir de grandes quanti- dades de dados.

Fonte: Adaptado de Qubale.

Com os últimos avanços científicos aliados ao baixo custo de mercado


dos recursos tecnológicos, tais como software, máquinas virtuais e servido-
res que possibilitam o apoio do momento singular da Inteligência Artificial,
torna-se possível a construção de sistemas com capacidade de simular a
escrita, leitura, fala, escuta e visualização, deixando de ser novidade a
utilização do apoio de agentes inteligentes no cotidiano socioeconômico.

Formulação do problema

Após mencionar na seção anterior os assuntos relacionados ao presente


trabalho de pesquisa, é apresentada a elaboração do problema.
Na atualidade, os impasses relacionados às mídias sociais e à utilização
da Inteligência Artificial são considerados desafiadores, especificamente na
análise de sentimentos e polarização de ideias que é o foco da formulação do
problema. Eles envolvem diversas variáveis e aspectos a serem analisados,
como subjetividade, comportamento, ontologias das palavras, dentre outros.
Desse modo, o estudo do problema envolve uma das redes sociais digitais
mais utilizadas no Brasil e no mundo, o Twitter, conforme a figura comparativa
a seguir (Figura 2) que exprime os padrões mundiais de utilização:
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 91

Figura 2 – Relevância das plataformas de mídias


sociais quanto a coincidência de utilização
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Fonte: Adaptado de DataReportal (abril/2021 – https://datareportal.com).

A pesquisa se direciona à criação de um modelo baseado em IA e à


análise de sentimentos em ambiente difuso, que aplica marcos comporta-
mentais em rede que indiquem trânsitos de subjetividades de indivíduos ou
nos grupos (clusters) das redes sociais, focando na problemática da pola-
rização de ideais, tendo como filtro e base de coleta de dados de exemplo,
palavras-chave relacionadas a acontecimentos periódicos que evidentemente
ensejam polarização de ideias, tanto no Brasil como no mundo, tais como
eleição presidencial estadunidense, eleição presidencial brasileira, brexit,
covid-19, lockdown e negacionismo.

Metodologia

A pesquisa teve um delineamento bibliográfico que fundamentou a


elaboração desta pesquisa, sendo esta qualiqualitativa do tipo explorató-
ria e com experimento baseado em algoritmos de Inteligência Artificial e
lógica fuzzy.
Os métodos e resultados utilizados no processo de desenvolvimento
evidenciam a polarização dos dados obtidos mediante representação das
emoções textuais imprecisas e subjetivas nos comentários dos atores da
rede social Twitter. Para tanto, foram utilizados métodos fuzzy da biblio-
teca scikit-fuzzy escrita em python para que seja computada através de um
algoritmo facilmente pelo computador.
92

Aplicação do modelo

Para a aplicação do modelo proposto, foi necessário utilizar nove (09)


etapas conforme descrição do modelo proposto a seguir (Figura 3):

Figura 3 – Descrição do Modelo

Coleta de Dados

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Base de Dados de Extração de palavras
Frases Processamento únicas
Com IA

Remoção de Stop
Words Extração do radical das
Fuzificação/ palavras
Defuzificação (AM)
Classificação de textos
Extração das palavras
de cada frase
Base de Dados de Agregação de
Treinamento opiniões / Análise
de Sentimentos Aferição de precisão do
algoritmo
Detecção de Emoções
em Textos
Defuzificação

Obtenção de
Obtenção do
unidade de índice
gráfico da nuvem
de subjetividade e
de palavras
Polarização

Tomada de
Decisão

Fonte: Elaboração própria.

Experimentos e resultados

Para a utilização dos benefícios da lógica fuzzy, combinou-se a utilização


de bibliotecas python baseada em lógica fuzzy e os algoritmos computacionais
de Inteligência Artificial em um único modelo. A coleta de dados baseados
em comentários entre atores do Twitter se deu através da API, visto que foi
possível a configuração de palavras-chaves e periodicidade para a busca e,
consequentemente, a coleta dos dados decorrente da busca.
O princípio ou aplicabilidade por trás do funcionamento do algoritmo
consiste no pré-processamento dos dados coletados, bem como no treina-
mento da Inteligência Artificial, classificação dos sentimentos encontrados
nos comentários e das emoções dos textos e seus graus de pertinência.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 93

Os parâmetros de configuração baseados nas palavras-chaves, periodi-


cidades, resultados quantitativos e percentuais de polaridade de sentimentos
estão representados na Tabelas 1 abaixo:

Tabela 1 – Assuntos ou palavras-chaves, periodicidade, quantitativo


e percentuais de polarização de sentimento dos comentários

Quantitativo e percentual de
Comentários Total de
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Assunto Período Polaridade dos comentários


objetivos – (%) Comentários
Positivo – (%) Neutro – (%) Negativo – (%)
Eleições 2.599 – 2.348 – 1.481 – 2101 –
2016 6428
Americana (~ 40,4%) (~ 36,5%) (~ 23%) (~ 32,6%)
14.779 – 11.540 – 9.032 – 10.080 –
Brexit 2016 35351
(~ 41,8%) (~ 32,61%) (~ 25,5%) (~ 28,51%)
Eleições 15.648 – 15.414 – 8.707 – 14.126
2018 39769
Brasileiras (~ 39,34%) (~ 38,75,61%) (~ 21,89%) (~35,52%)
2020 4.378 – 6.674 – 10.190 – 5.893 –
Covid-19 21242
– 2021 (~ 20,6%) (~ 31,41%) (~ 48%) (~ 27,74%)
2020 2.226 – 3.606 – 3108 – 3248 –
Lockdown 8940
– 2021 (~ 24,89,6%) (~ 40,33%) (~ 34,76%) (~ 36,33%)
2020 – 2.363 – 3.110 – 2.013 – 2.766 –
Negacionismo 7486
Jan/2022 (~ 31,56,6%) (~ 41,54%) (~ 26,89%) (~ 36,94%)
119216
Fonte: Elaboração própria.

Tabela 2 – Representação das emoções através de


conceitos e cores no formato hexadecimal

Emoção Cor de Representatividade / Hexadecimal

Alegria #FFFF00

Desgosto #6DD900

Medo #26C9FF

Raiva #B20000

Surpresa #FF8000

Tristeza #4D7AFF

Emoção Cor de Representatividade / Hexadecimal


Fonte: Elaboração própria.
94

Resultados do experimento com os termos referentes à Eleições


americanas

Conforme a Tabela 2, o experimento da pesquisa referente às eleições


estadunidenses se configura na delimitação do período de 2016, Twitter USA,
apresentando os seguintes resultados de polarização de sentimentos e, especi-
ficamente, no caso da representação da análise textual de emoção, baseando-se
em uma pequena amostra, conforme consta abaixo (Gráfico 1):

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Gráfico 1 – Gráfico de dispersão e de pizza da polarização de ideias baseado
na análise de sentimentos da palavra-chave “Presidencials Elections”

Fonte: Elaboração própria.

Tabela 3 – Resultados comparativos entre o modelo Crisp e modelo Fuzzy.


Eleições Americanas
CRISP FUZZY Percentual RGB (255)
(2016)
Graus de Alegria Raiva Medo Desgosto Surpresa Tristeza
ID Comentários Emoção
pertinência % % % % % %
“O eleitorado recebe alegria: 5.1%
um padrão-ouro | desgosto:
de aprovação para 12.05% |
alguns dos compor- medo: 1.6% |
1 surpresa 5,1 22,41 1,6 12,05 56,12 2,73
tamentos mais ultra- raiva: 22.41%
jantes já vistos na | surpresa:
campanha política 56.12% |
americana”. tristeza: 2.73% |
continua...
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 95

continuação
Eleições Americanas
CRISP FUZZY Percentual RGB (255)
(2016)
Graus de Alegria Raiva Medo Desgosto Surpresa Tristeza
ID Comentários Emoção
pertinência % % % % % %
Acabei de assistir
a primeira hora de
seus palavrões e pa-
lavrões sobre Trump
alegria: 0.07%
e seus apoiadores,
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| desgosto:
e mal posso esperar
0.46% | medo:
para ver o resto. Seus
33.94% |
rostos presunçosos
2 surpresa raiva: 11.02% 0,07 11,02 33,94 0,46 39,87 14,63
assumindo expres-
| surpresa:
sões horrorizadas
39.87% |
quando Trump co-
tristeza:
meça a matá-lo deve
14.63% |
ser hilário!!! HAHAH-
AHA!!! Vamos fazer
de novo pessoal!!
TRUMP2020!!!!!!!!!!’
alegria: 3.78% |
desgosto: 0.5%
Eu não posso acredi- | medo: 13.0%
tar que meus impos- | raiva: 1.91%
3 surpresa 3,78 1,91 13 0,5 67,67 13,13
tos vão para financiar | surpresa:
este BS! 67.67% |
tristeza:
13.13% |
Donna Brazil dá a
Hillary as principais
questões do debate
antes do tempo e
eles não são presos!
alegria: 0.09%
Corrupção. Corrup-
| desgosto:
ção flagrante! Donna
1.92% |
consegue emprego
medo: 2.17%
4 como colaboradora surpresa 0,09 18,4 2,17 1,92 71,2 6,23
| raiva: 18.4%
da Fox News? Os
| surpresa:
republicanos teriam
71.2% | tristeza:
sido enterrados sob
6.23% |
a prisão se tivessem
pensado nesse nível
de TRAPAÇA! Para
o inferno com a es-
querda como um todo.
continua...
96

continuação
Eleições Americanas
CRISP FUZZY Percentual RGB (255)
(2016)
Graus de Alegria Raiva Medo Desgosto Surpresa Tristeza
ID Comentários Emoção
pertinência % % % % % %
alegria: 18.11%
90 por cento dos re- | desgosto:
pórteres são tenden- 2.29% | medo:
ciosos em relação ao 5.3% | raiva:
5 surpresa 18,11 32,68 5,3 2,29 36,28 5,35
GOP e Trump. Só 32.68% |

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vim aqui para vê-los surpresa:
chorando. 36.28% |
tristeza: 5.35% |
Fonte: Elaboração própria.

A Tabela 3 faz uma comparação dos resultados das emoções textuais


representados. Respectivamente, podemos perceber pela coluna CRISP que a
emoção textual é classificada de modo pragmático através do modelo Crisp, e
que pode ser representada por uma cor. Por sua vez, a coluna FUZZY classifica
com os graus de pertinência de cada emoção contida no comentário através
do modelo Fuzzy, permitindo uma representação com mais informações e
possibilitando a mesclagem das emoções representadas em cores mediante
percentuais obtidos.

Gráfico 2 – Está representando cada linha da Tabela 5, na qual cada número do


gráfico corresponde ao campo ID com predominância da emoção “surpresa”

Fonte: Elaboração própria.


INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 97

Gráfico 3 – Representação da primeira partição do Gráfico 1 das


emoções textuais dos assuntos ou palavras-chaves com a lógica fuzzy
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Fonte: Elaboração própria.

Podemos perceber na representação a variação de emoções correlatas


às cores, conforme Tabela 3, que evidencia as nuances de emoções textuais,
bem como seus termos linguísticos. Logo, podemos concluir que os resultados
do modelo fuzzy evidenciados no Gráfico da mandala apresentam as nuances
ou a qualidade das variações das emoções, aumentando o quantitativo de
dados e o ganho considerável de informação que permite possibilidades de
sobreposição de emoções numa mesclagem mediante intensidade, na qual é
possível visualizar a integração e harmonia das cores.

Considerações finais

Considera-se que a presente pesquisa alcançou, em grande parte, o seu


propósito, ao trazer subsídios relevantes a respeito de um modelo de análise
de conflitos de ideias em redes sociais digitais, baseado em lógica fuzzy para
a análise de dados textuais oriundos da rede social Twitter.
O modelo proposto nesta pesquisa gerou resultados da análise textual
da polarização de sentimentos e emoções extraídas diretamente dos comen-
tários Twitter, tratada a partir da aplicação da lógica fuzzy e da Inteligência
Artificial, possibilitando a comparação dos resultados dos indicadores dos
diálogos referente ao método convencional, em que é possível evidenciar
tanto as nuances da polarização dos diálogos textuais entre atores ou gru-
pos, sobretudo, quanto as emoções representadas graficamente com cores e
98

rotuladas como termos linguísticos em seus graus de pertinência, traduzindo


assim, várias possibilidades para uma tomada de decisão mais realista.
Portanto, considerando a parametrização em cores face aos resultados
apresentados neste trabalho, assim como a análise da leitura numérica e da
leitura visual dos resultados apresentados pelo modelo proposto, podemos
perceber que os resultados oriundos do método convencional (Crisp) clas-
sifica pragmaticamente os comentários em uma única emoção, enquanto
o método fuzzy aumenta o quantitativo de dados e a partir dos resultados

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gerados, obtém ganhos consideráveis de informação. Ele possibilita que
cientistas de análise de tendências de dados possam trabalhar hipóteses muito
bem fundamentadas do ponto de vista matemático, no qual a tendência de um
indivíduo ou grupo de indivíduos ou de uma rede que tenha um repertório
de emoções de uma classificação aleatória, por exemplo, do tipo “surpresa”,
consiga estabelecer a previsibilidade do seu comportamento, visto que os
desdobramentos do tipo “surpresa” apresentará diversos caminhos ou possi-
bilidades, apesar de mostrar uma predominância do grau de pertinência sur-
presa, as emoções intrínsecas em cada um deles, justificando esse repertório
que, na visualização por cores, fica claramente diferenciado.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 99

REFERÊNCIAS
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MOTTA, Claudia Lage Rebello da; SILVA, José Otávio Pompeu; OLIVEIRA,
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dade da lógica fuzzy nos testes cognitivos iniciais do mecanismo de combina-
ção social – oraculous. Revista das Faculdades Integradas Vianna Júnior,
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KURZWEIL, R. “The Age of Spiritual Machines”. Massachusetts: The


MIT Press, 1990.

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MICHAELIS – DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA.


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Paulo: Thompson, Reuters Brasil, 2018. cap. 1, p. 19-39.

SKINNER, B. F. O comportamento verbal. São Paulo: Cultrix, 1978.

WASSERMAN, Stanley; FAUST, Katherine. 4. ed. Social Network Analysis:


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WATTENBERG, M. “Visual exploration of multivariate graphs”. Proc. of


SIGCHI Conf. Human Factors in Computing Systems, New York, ACM,
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GATEKEEPING, GATEWATCHING E O
FILTRO DOS ALGORITMOS:
uma revisão conceitual na
seleção dos conteúdos
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Karenine Miracelly Rocha da Cunha36


Filipe Saraiva do Nascimento37

Introdução

U
m conceito apropriado não tem a clareza do ponto de vista empírico
ou teórico como principal atributo. Segundo Gerring (1999), um
bom conceito é construído sobre uma estrutura de três partes: sua
extensão, ou seja, o(s) fenômeno(s) que ele cobre; os atributos que o definem,
o que inclui a definição e a conotação; e o termo que o indica.
A partir dessa fundamentação teórica, este estudo busca fazer uma revisão
conceitual pautada na necessidade de atualização no que diz respeito à seleção de
informações disponíveis para os usuários de mídia atualmente. Justifica-se essa
necessidade de revisão na evolução tecnológica que permeia os meios de comu-
nicação, bem como no próprio processo de produção e consumo de conteúdos.
O ambiente informacional atual é caracterizado pela abundância de infor-
mação, do capitalismo dadocêntrico (HAN, 2022), que criam um cenário
de hipertelia comunicacional (CUNHA, 2016). Nesse mesmo ambiente, é
destaque a presença da Inteligência Artificial em vários processos. Segurado
(2021) fala em era informacional, período em que os algoritmos assumem
um papel cada vez mais de destaque e transformam os aspectos mais banais
de nossa vida cotidiana, como uma navegação na internet ou localização por
GPS, em ativos rentáveis e monetizáveis.
Segurado (2021) destaca que os modelos de previsiblidade e as reco-
mendações dos algoritmos exercem um papel central na lógica da indústria de

36 Graduada em Jornalismo pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Mestra em Comunicação Midiática pela
Unesp. Doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP). Professora do Centro de
Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC). E-mail: kareninemrc@hotmail.com
37 Tenente-Coronel do Exército Brasileiro (Academia Militar das Agulhas Negras – AMAN, 2002). Bacharel
em Administração de Empresas (Universidade de Caxias do Sul – UCS, 2010). Pós-Graduado em Comu-
nicação Social (Centro de Estudos de Pessoal – CEP/FDC, 2016). Pós-Graduado em Psicopedagogia
Escolar (CEP/FDC, 2021). Mestre em Comunicação Social Militar (CEP/FDC, 2019). E-mail: nascimento.
comsoc@gmail.com
102

influência. Daí justifica-se a importância de estudar esses novos seletores de


informação. Este trabalho se debruça sobre o papel da Inteligência Artificial
na seleção de conteúdo disponibilizado para consumo nas mídias digitais, ou
seja, o que os algoritmos selecionam e priorizam e como esse filtro algorítmico
reflete a linguagem e o pensamento humano de quem está por trás dessa seleção.
A conectividade tem grande relação com hábitos de busca de informa-
ção, criação e expressão de opiniões, aprendizagem e lazer. De acordo com a
pesquisa O melhor da internet (FOLHA DE S. Paulo, 2023), 17% dos entre-

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vistados passam o tempo todo conectado, 15% a maior parte do tempo e 18%
a metade do tempo. Essa conexão é para ler notícias (82% dos participantes da
pesquisa apontaram essa função) e assistir a vídeos (78%). Outro apontamento
interessante da pesquisa é que a internet tem um papel muito importante para
estar informado a respeito do mundo, conforme 84% dos entrevistados, o que
sugere que ler notícias é o hábito mais comum entre os internautas brasileiros.

Do guardião ao observador das informações

Nem tudo o que acontece é transformado em notícia. E nem todas as


notícias produzidas entram no noticiário. Mesmo as que entram, passam por
critérios de seleção para indicar onde e como serão veiculadas, bem como
o tempo e/ou o espaço destinado às mesmas. Uma vez publicadas, essa
decisão editorial, que atua como um filtro selecionador do que passa e do
que fica, do que é mais ou menos importante e digno de destaque, organiza
uma hierarquia do conteúdo no sentido de destacar, suprimir, ou dar pouca
importância ao conteúdo noticiado.
O conceito de gatekeeping foi amplamente utilizado para explicar o
processo de filtragem e seleção das notícias, operado por jornalistas na era
dos meios de comunicação de massa. O termo foi apropriado ao jornalismo
pela primeira vez em 1950 por David Maning White para se explicar a orga-
nização do fluxo de notícias em uma empresa jornalística (CUNHA, 2009).
Oriundo da Psicologia Social, o termo já era empregado na década ante-
rior para conceituar o processo de decisão doméstica na filtragem e organiza-
ção dos hábitos alimentares da família. Ou seja, nos lares havia um guardião
da porta de entrada dos alimentos. Da mesma forma, no jornalismo, editores
atuavam como porteiros responsáveis pelo fluxo de informação ao levantarem
a cancela para o que julgavam essencial noticiar e abaixando para os fatos
que deveriam ser deixados de lado.
Cunha (2009), em uma revisão do conceito bem anterior ao contexto
atual, que justifica e fundamenta a abordagem deste texto, já apontava críticas
ao gatekeeping, cujas limitações não abordavam os aspectos subjetivos das
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 103

rotinas produtivas do noticiário, bem como da questão ideológica da composi-


ção do mesmo. Para completar, outra carência do conceito era a existência de
vários gatekeepers no processo noticioso, incluindo as fontes, que selecionam
fatos ou vieses para serem informados aos jornalistas no processo de apuração.
Há mais de uma década, Cunha (2009) apontava que o gatekeeping
não abrangia todas as nuances da comunicação colaborativa e participativa,
incipiente em 2009, cujo apogeu nós testemunhamos agora com o que pode-
mos chamar de protagonismo das mídias sociais no cenário comunicacional.
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Isso porque o gatekeeping é um conceito da era dos meios de comunicação


de massa, organizada sobre o prisma de um fluxo informativo unidirecional,
cujos poderes de seleção estavam nas empresas midiáticas.
Bruns (2011) apresenta outra abordagem conceitual que atualiza o gate-
keeping. O gatewatching se refere à prática de observação dos portões de saída
dos meios de comunicação tradicionais e das mídias sociais, ou seja, vigiar
as informações veiculadas. Ao contrário do gatekeeping, conceito restrito
aos jornalistas em função de edição, tanto os profissionais quanto os usuários
assumem o papel de gatewatcher. Jornalistas observam para buscar informa-
ções, visto que elas agora não são produzidas apenas por grandes empresas
de mídia. Esse processo de observação e vigilância inclusive pode ocorrer
nas mídias sociais, nas discussões criadas por usuários.
O conceito do gatewatching considera o cenário de comunicação atual,
participativo, colaborativo e segmentado em nichos. Cunha (2016) avança na
utilização dos dois conceitos simultaneamente: antes da seleção editorial do
gatekeeping, voltada para critérios internos, o gatewatching levanta os temas
predominantes na comunicação. O gatewatcher é um gestor de informações.
Por exemplo, o Twitter é uma mídia social que pauta empresas de mídia. Jor-
nalistas observam os temas discutidos e não raro os trending topics pautam o
noticiário. E como o gatewatching não é exclusividade do jornalista profis-
sional, qualquer usuário de mídia pode fazer o mesmo ao produzir conteúdo.

Algoritmos e filtros-bolha

A revolução digital proporcionou o advento de novos meios de comu-


nicação e formas de veiculação de conteúdo que impactaram a difusão
de informações. Esse impacto não é restrito somente aos suportes físicos
das plataformas, mas determina novos hábitos de produção e consumo de
informação, troca e interação.
Na comunicação engendrada nas plataformas, sejam mídias sociais
ou sites noticiosos, o algoritmo assume o papel de considerar o que é
relevante para o usuário. Dessa forma, há uma influência do algoritmo na
104

decisão editorial, uma vez que o algoritmo das plataformas interfere na


distribuição do conteúdo.
A tecnologia digital é fundamentada no algoritmo. Santaella (2023) define
que o algoritmo é um código organizado como linguagem que comanda e
dá instruções a uma máquina para resolver problemas. Algoritmos são as
diretrizes que descrevem como executar uma tarefa. “Vivemos na era dos
algoritmos [...] Atualmente, os algoritmos integram tudo o que se faz no
mundo civilizado” (SANTAELLA, 2023, p. 36).

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Outro aspecto a ser considerado no cenário atual é que as mídias sociais
dão espaço para os pequenos ou micro consensos. São as bolhas formadas por
grupos de interesses e afinidades. Ao mesmo tempo, as ofertas de conteúdo,
antes restritas a poucos meios de comunicação, são fragmentadas e pulveri-
zadas. Há muito mais oferta de informação e ela vem de todos os lados.
Os microconsensos são estudados desde os tempos analógicos. Lippmann
(2010) traz a ideia de segmentação da sociedade ao analisar a formação de
opiniões. As pessoas tendem a se reunir em grupos que agrupam indivíduos
com ideias, costumes e tradições compatíveis, que provavelmente reagirão às
mensagens recebidas de maneira análoga. Ou seja, agem sob influência de pseu-
doambientes criados mentalmente como representações interiores do mundo,
determinantes em seus pensamentos, sentimentos e ação. O único sentimento
que alguém pode ter acerca de um evento que não vivenciou é o sentimento
provocado por uma imagem mental daquele evento. As pessoas agem de acordo
com o que pensam que sabem. Fatos casuais, imaginação criativa e desejo de
crer falsificam a realidade provocando respostas violentamente instintivas.
Ainda conforme Lippmann (2010), o que cada pessoa faz, ou mesmo deixa
de fazer, não está baseado em conhecimento direto e determinado, mas em ima-
gens feitas pela própria pessoa ou a ela transmitidas. A forma como o mundo é
imaginado determina, em um momento particular, as ações a serem desencadea-
das, mesmo sem determinar o que será alcançado, direcionando seus esforços,
seus sentimentos, suas esperanças e não suas realizações e seus resultados.
Para Charaudeau (2020), a identidade de um grupo é feita pelo compar-
tilhamento de opiniões, conhecimento, valores e gostos entre seus membros,
constituindo um vínculo social, espelhando-se e reconhecendo-se como per-
tencentes a um mesmo conjunto, compartilhando uma identidade social e
cultural. Nesse sentido, um grupo, diante de outro grupo dominante, se sente
ameaçado em sua identidade e reage, isolando-se em si mesmo, reivindicando
especificidades e apagando semelhanças possíveis com outros grupos e real-
çando os próprios valores que julgam diferentes.
As especificidades realçadas internamente em um grupo expressam-se
por opiniões compartilhadas, ao considerar opinião como um julgamento
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 105

pessoal ou coletivo que um indivíduo faz sobre pessoas ou acontecimentos


do mundo quanto ao seu valor, que o leva a tomar uma decisão. A opinião
não é um conhecimento, mas um ponto de vista a respeito de um saber, não
enunciando uma verdade sobre o mundo, mas um ponto de vista sobre as
verdades, sendo assim uma crença (CHARAUDEAU, 2020).
No que diz respeito à organização e distribuição de conteúdo, os algo-
ritmos hierarquizam e priorizam as informações conforme as diretrizes com
as quais são programados. Assim, selecionam o conteúdo que será visto com
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mais frequência por um usuário a partir de seu próprio comportamento.


Por um lado, a seleção e a filtragem feitas pelo algoritmo ajudam a
colocar ordem no caos informativo, resultado do excesso de informação que
caracteriza o cenário comunicacional atual. Por outro lado, esse trabalho de
seleção dos algoritmos reforça os pontos de vista preexistentes, uma vez que
eles são programados a partir de características e informações que o usuário
tem e transparece. Toda e qualquer informação disponibilizada pelo usuário
em suas ações rotineiras na internet, por exemplo, é processada e significada
pelo algoritmo. Essa sequência de comandos cria e organiza os critérios de
relevância para filtrar o conteúdo. Não é o usuário que filtra. Apesar disso, é
importante reconhecer, ainda que sem delongas, o papel da curadoria infor-
macional realizada pelo próprio usuário diante da quantidade de informações
e dos caminhos que a hipertextualidade da internet permite.
É o chamado filtro-bolha. Cruz-Stefani (2019), citando Parisier (2017),
autor do conceito filtro-bolha, explica que esses agrupamentos de interesse são
capitaneados pelos algoritmos a partir do conteúdo consumido pelo usuário
na internet. São bolhas porque são tribos digitais que se isolam ao selecionar
informações desde si, que corroboram com as convicções do grupo, conforme
resume Han (2022).
O filtro-bolha capta as predileções do usuário e passa a oferecer infor-
mações, por meio de sugestões e anúncios ou mesmo pela hierarquização do
conteúdo nos feeds das mídias sociais. Ao dar um “like” em uma postagem
de mídia social, comentar ou compartilhar conteúdos, ou mesmo somente a
partir do rol de seguidores e perfis seguidos, o algoritmo é capaz de estruturar
essa escolha e hierarquização. Han (2022, p. 23) afirma que “o big data e a
Inteligência Artificial constituem uma lupa digital”.
O filtro-bolha tem relação com o viés de confirmação, definido por Segu-
rado (2021, p. 94) como a tendência cognitiva segunda a qual as pessoas estão
propensas “a prestar atenção naquilo que confirma suas crenças e, frequen-
temente ignorar o que contradiz sua visão de mundo.”
Longe do conceito mais popular de comunicação, de tornar comum, o
filtro-bolha é uma força centrífuga que afasta as pessoas divergentes, mas
também funciona como um imã que atrai pessoas que compartilham valores e
106

crenças semelhantes. Mais uma vez, voltamos à precisão conceitual, ainda que
o enfoque deste texto não seja o conceito de comunicação, mas os conceitos
que dizem respeito aos filtros informativos.

Considerações finais

Gerring (1999) ressalta a importância da indicação de quais termos e


qual a definição desses termos é usada em um estudo. Assim, importa o termo

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algoritmo para a proposta conceitual ora apresentada e a definição do mesmo.
O algoritmo é uma área da Inteligência Artificial cujo trabalho permite que
sistemas informatizados tenham comportamentos semelhantes ao do homem.
O algoritmo traduz para uma máquina a linguagem e o pensamento humano.
A decisão do algoritmo é feita com base no comportamento do usuário
em uma plataforma. O algoritmo coleta informações para construir um perfil
do usuário da plataforma e o resultado dessa coleta aparece no conteúdo
disponibilizado. Ou seja, o perfil construído pelo algoritmo com os dados
resulta na seleção do conteúdo.
A coleta de dados é feita de diversas maneiras: conteúdo curtido e com-
partilhado, interações com perfis em redes sociais ou colaborando com avalia-
ções ou mesmo comentários, cliques em anúncios ou histórico de navegação
em sites, histórico de buscas em buscadores on-line, localização fornecida
durante a navegação, dados pessoais como idade, gostos e costumes, adi-
cionados em cadastros digitais etc. Martino (2015) sugere que os usuários
deixam rastros nas mídias digitais. “Toda e qualquer operação deixa algum
tipo de registro que pode ser recuperado e utilizado para fins muito diferen-
tes do original” (MARTINO, 2015, p. 257). Paradoxalmente, é a vigilância
que acompanha a liberdade de comunicar, de expor dados, de participar, de
interagir, de curtir, compartilhar, salvar e o que mais for possível em termos
de engajamento com conteúdo. Como Han (2022) destaca, é a vigilância da
modernidade em ação: toda e qualquer atividade é captada para construir o
perfil desse usuário, saber suas preferências, indicar conteúdo e direcionar
navegação. O algoritmo de fato é o selecionador!
Importa ressaltar que é a inteligência humana que alimenta o algoritmo.
A inteligência da Inteligência Artificial é humana, como é possível interpre-
tar a partir das análises de Santaella (2023). O algoritmo dá significado aos
padrões disponibilizados pela inteligência humana. Vejamos a seguinte situa-
ção hipotética: ao fazer uma busca, o usuário digita “Brasileirão” e o algoritmo
constrói o significado que esse usuário quer informações sobre o Campeonato
Brasileiro de Futebol e não sobre um grande brasileiro. Logo, passa a filtrar
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 107

e disponibilizar conteúdo relacionado ao assunto, reconhecendo padrões e


publicações importantes do dia sobre o campeonato nacional de futebol.
Por fim, diante do inexorável caminho da Inteligência Artificial apresen-
tado por este texto, não se discute seu uso e nem se abre margem para teorias
da conspiração populares. Ressalta-se, portanto, a necessidade de adaptação
do jornalismo e da comunicação institucional nas mídias digitais, incluindo as
mídias sociais. É importante conhecer o funcionamento do algoritmo como filtro
de conteúdo, para tentar fazer parte do que ele seleciona e manter-se relevante
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no cenário comunicacional do excesso de informações. É essa aplicabilidade


que torna um conceito de fato bom, para terminar retomando o início deste texto.
A comunicação, pois, é impensável sem Inteligência Artificial hoje. Na
aplicação do conceito de filtro algorítmico, torna-se mais produtivo discutir
a exigência de transparência sobre a origem dos dados usados para treinar
e ensinar os algoritmos no aprendizado de máquina ou machine learning.
Essa transparência precisa dar conta dos parâmetros usados pela Inteligên-
cia Artificial para recomendar conteúdo e para deixar outros subjugados ao
esquecimento. Afinal, a Inteligência Artificial, como destaca Santaella (2023),
é alimentada com informações da inteligência humana. Deixar claro quem é
essa inteligência humana, comumente ligada às big techs, é preponderante,
assim como os propósitos da mesma.
Paralelo a isso, importa reconhecer que, na era da informação, parado-
xalmente, todos estão expostos à desinformação. Então, a transparência dos
critérios do algoritmo deve ser acompanhada pela educação digital no sentido
dos usuários desenvolverem competências38 para o uso das tecnologias e das
plataformas. Assim, poderão conhecer os padrões de seleção e os hábitos
por vezes difusos e corriqueiros que alimentaram os algoritmos na tarefa da
filtragem de informação.

38 Conforme Martino (2015, p. 231), a competência midiática ou media literacy diz respeito ao entendimento
do funcionamento e uso da mídia, extrapolando a ideia de “saber usar”. Ou seja, é uma competência maior
que dominar as técnicas de uso dos dispositivos midiáticos. É compreender o fluxo de sentidos e pensar
criticamente a cultura das mídias.
108

REFERÊNCIAS
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novos desafios para o jornalismo. Brazilian Journalism Research, v. 7, n.
II, p. 119-140, 2011.

CHARAUDEAU, Patrick. A conquista da opinião pública: como o discurso

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manipula as escolhas políticas. São Paulo: Contexto, 2020.

CRUZ-STEFANI, Kalynka. Crenças, filtros-bolha e ódio na internet. In: SAN-


TAELLA, Lucia (org.). Inteligência Artificial e redes sociais. São Paulo:
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CUNHA, Karenine Miracelly Rocha da. Da informação à comunicação:


acontecimentos do jornalismo. Curitiba: Appris, 2016.

CUNHA, Karenine Miracelly Rocha da. Gatekeeping. Gatewatching. In:


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São Paulo: Paulus, 2009. p. 209-210.

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GERRING, John. What makes a good concept? A critical framework for


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p, 357-393, 1999.

HAN, Byung-Chul. Infocracia: digitalização e a crise da democracia. Petró-


polis: Vozes, 2022.

KRÜGER, Helmuth. Ideologias, sistemas de crenças e atitudes. In: PSICOLO-


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LIPPMANN, Walter. Opinião pública. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

MARTINO, Luís Mauro Sá. Teoria das mídias digitais: linguagens, ambien-
tes, redes. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

SANTAELLA, Lucia. A inteligência artificial é inteligente? São Paulo:


Edições 70, 2023.

SEGURADO, Rosemary. Desinformação e democracia. A guerra contra as


fake News na internet. São Paulo: Hedra, 2021.
A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
GENERATIVA COMO ASSISTENTE DA
COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL:
um estudo exploratório das potencialidades e
limitações de um evento pensado da IA pela IA
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Raquel Timponi Pereira Rodrigues39

Introdução

A
Inteligência Artificial (AI) se tornou assunto recorrente em pautas
midiáticas e do campo comunicacional no ano de 2023, devido à
popularização recente do ChatGPT40, sistema de Inteligência Artificial
da empresa OpenAI que permite a interação e conversação do usuário da plata-
forma (humano) com um robô em formato de chat em texto, e de plataformas
populares como Midjourney, voltada à produção de imagens com aplicações
no design e na criatividade, de modo a propor a automatização de dados em
auxílio ao humano nos processos de tarefas e atividades do cotidiano.
Apesar da AI ser um assunto com vasta bibliografia científica reunida
em um conhecimento de pesquisa dos últimos 70 anos, tal como registram
os autores de referência Stuart Russel e Peter Norvig (2022), com início nos
anos 1956, após os experimentos de Alan Turing (em testes entre a máquina
simulando o comportamento humano), posteriormente, em aplicações em

39 Graduada em Comunicação Social – Habilitação Jornalismo, pela Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF). Mestra em Comunicação, pela linha Tecnologias da Comunicação e Cultura do Programa de Pós-
Graduação em Comunicação PPGCom, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Doutora em
Comunicação Social, linha Mídias e Mediações Socioculturais, pelo Programa de Pós-Graduação da Escola
de Comunicação (ECO-Pós) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora Adjunta das
Especializações em Comunicação Social do Centro de Estudos de Pessoal (CEP/FDC), Exército Brasileiro.
E-mail: raquel.timponi@gmail.com
40 Ferramenta de IA desenvolvida pela empresa OpenAI, baseada no modelo GPT de linguagem pré-treinada
(Pre-trained Language Model, PLM), que interage de forma conversacional para gerar respostas para
perguntas, solicitações e comentários (Disponível em: https://openai.com/blog/chat. Acesso em 23 mar.
2023). Sobre o modo de funcionamento, foi construída usando grande quantidade de documentos da
internet, capaz de gerar texto natural e coerente, quando alimentado com determinada tarefa ou contexto
(atendimento ao cliente, treinamento de funcionários, conversas virtuais, além de aplicações diversas na
produção de conteúdo midiático), podendo seu comando ser dado em várias línguas, inclusive o português,
uma vez que o chatbot possui sistema de tradução automática (CARNEIRO, 2023, p. 2). Disponível em:
https://openai.com/blog/chat
110

jogos e simulação da máquina do raciocínio humano (quando a máquina ven-


ceu um campeão de xadrez), as discussões dessas pesquisas ficavam restritas
ao campo da academia ou ainda reverberadas imaginário social em filmes de
ficção científica, pelos limites impostos pela falta de capacidade de armaze-
namento dos dados e pelos riscos da simbiose homem-máquina.
Todavia, na atualidade, a IAG, uma das subáreas da AI, como a ênfase
no aprendizado profundo da máquina, a capacidade de armazenamento de
dados em computadores e o acesso facilitado ao banco de dados da web

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permitiu que se desenvolvessem algoritmos e sistemas capazes de executar
tarefas tradicionalmente realizadas apenas por seres humanos. Assim, embora
o conceito de aprendizado profundo fosse inventado anos atrás, apenas recen-
temente ganhou aplicação prática, quando, no contexto da Revolução Digital
e da “era da datificação” (GABRIEL, 2022), passou a existir poder compu-
tacional, particularmente devido ao advento das GPUs (graphic processing
units), super computadores que permitiram a potencialização nas produções
aplicadas na indústria para demonstrar a eficácia e dados de treinamento em
resultados significativos conquistados, aplicados a diversas áreas no cotidiano,
elementos que possibilitaram a transposição dos conhecimentos do campo da
ficção científica para a vida cotidiana.
Neste contexto, os avanços tecnológicos da Inteligência Artificial combi-
nados com outras tecnologias emergentes no mercado do contexto da revolução
digital trouxeram uma variedade de aplicações da IA, incluindo robótica, análise
de dados, machine learning, deep learning, processamento de linguagem natural
(PNL), visão computacional e reconhecimento de voz (GABRIEL, 2022). Esses
sistemas são capazes de aprender com dados, identificar padrões, tomar decisões e
resolver problemas de forma autônoma, sem a necessidade de intervenção humana.
Mas, ao mesmo tempo, essas mesmas tecnologias, se mal utilizadas,
podem ter a função de propagar elementos preconceituosos e enviesados, o
que exige cuidados no tratamento das informações do banco de dados, no pro-
cesso de programação e no treinamento destas ferramentas. Portanto, pode-se
dizer que a presença dessas tecnologias alterou significativamente as práticas
comunicativas em todos os níveis: pessoal e institucional, público e privado.
Dadas as atualizações do assunto na mídia, justifica-se a necessidade da
abordagem sobre essa temática a partir da pergunta norteadora do estudo: Como
pensar a Inteligência Artificial generativa a partir de um experimento pela IA na
organização/concepção da identidade visual aplicada em um evento da Comuni-
cação Institucional, de modo a refletir sobre suas potencialidades e limitações?
Assim, o objetivo geral deste estudo é realizar a aplicação da concepção
da identidade visual da Jornada de Comunicação 2023, em uma proposta de
planejamento de um evento sobre o tema da Inteligência Artificial, pensado
pelo aspecto ferramental em um estudo exploratório, de testes de funcionali-
dade de uma ferramenta de IA de produção de imagem. Neste sentido, ainda
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pretende-se como objetivos específicos: apresentar, por meio de uma metodo-


logia baseada na experiência, questões e temas emergentes durante o processo
de concepção de uma arte em IAG pela ferramenta Midjourney; realizar breve
levantamento conceitual do subcampo da Inteligência Artificial generativa,
elencando as principais etapas de tratamento da informação no processo da
codificação da linguagem realizada por algoritmos de IA; e, por fim, refletir
sobre as principais perspectivas e fatores dificultadores do processo, no quesito
que envolve ética, autoria, transparência e governança dos dados.
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Portanto, o estudo se justifica como uma possibilidade de debate sobre


o assunto da IAG em suas mais variadas dimensões e aplicações no universo
da Comunicação Institucional. Assim, a proposta é de realização do recorte
do objeto em um evento científico do Centro de Estudos de Pessoal e Forte
Duque de Caixas (CEP/FDC), a Jornada de Comunicação Social, que também
tem como proposta temática de 2023 a “Inteligência Artificial e Comunicação
Institucional: desafios contemporâneos”. Mais especificamente, é realizado
um experimento um experimento científico de se pensar a IA pela via ins-
trumental da IA, como um exemplo de aplicação possível de elementos que
estão disponíveis na atualidade para uso comercial no mercado.
Para isso, como referencial teórico, o caminho adotado é de apresentar o
contexto da Inteligência Artificial na era da sociedade datificada e do capita-
lismo informacional/ de vigilância. Em seguida, apresenta-se o subcampo da
Inteligência Artificial generativa e o modo de funcionamento de ferramentas
voltadas para a produção de imagens por processamento de linguagem natu-
ral e a lógica da predição na ferramenta Midjourney, bem como elementos
necessários no prompt (comando de entrada na ferramenta) pelo usuário, para
a compreensão da linguagem de programação e para resultados mais precisos.
Desses elementos, também são tratados conceitualmente dois pontos
apareceram nos resultados da pesquisa, como fundamentais neste processo:
1) a ética envolvida no processo da concepção e autoria, e 2) a necessidade
sobre o debate sobre a transparência dos dados fornecidos pelos usuários
dos ambientes das plataformas digitais, tema que retorna a importância da
governança sobre os processos de IA.

Inteligência artificial no contexto da sociedade datificada


e plataformizada

A Inteligência Artificial está presente de forma capilarizada e invisível


em diversas atividades realizadas no cotidiano. Seja realizar uma busca ou
requerer uma tradução no Google, acessar sistemas inteligentes para programar
itinerário da rota mais rápida com o Waze, visualizar recomendações de livros
112

na Amazon.com, de músicas e filmes por plataformas de streaming (como


Spotify e Netflix), pedir um Uber pelos dados de geolocalização, acessar dados
pessoais por técnicas de reconhecimento facial digital, utilizar serviços de
assistentes inteligentes de voz como Siri e Alexa, quando o sistema bloqueia
uma operação bancária ao detectar tentativa de fraude de outra localização
não comum ao usuário, ou ainda pela mediação e seleção do conteúdo que
será publicado no feed das mídias sociais pelos algoritmos de Inteligência
Artificial, a partir de um padrão de preferências e rastros deixados pelos

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usuários na interação com o conteúdo. Segundo a autora Lúcia Santaella, as
atividades que realizamos na cultura digital que aprendemos a conviver estão
impregnadas de Inteligência Artificial, onipresente em meio à triagem dos
dados que disponibilizamos (SANTAELLA, 2023, p. 11).
Neste contexto, diferentemente da lógica de utopia democrática que
esteve presente nos estudos das duas primeiras décadas da Internet (a exemplo
de Manuel Castells e Pierre Lévy), a digitalização acabou tomando um rumo
distinto, com a lógica do ecossistema da plataformização e as commodities
passaram a dominar o cenário, anteriormente pautado pelos grandes conglo-
merados mídiáticos (MORAES, 2020).
Assim, na nova ótica da era dos dados, as big techs passaram a sustentar
seus negócios por meio de coleta de algoritmos em atividades cotidianas, o
que chamamos de “capitalismo informacional, baseado no mais importante
recurso natural na era da IA: os dados humanos” (WEBB, 2020, p. 5). Tendo a
IA tornado possível a análise desses dados e aplicações em diferentes ativida-
des, de tratamento da quantidade abundante de dados para refinamento pelos
algoritmos de reconhecimento de padrões, as big techs, também conhecidas
como os nove Titãs da IA (pelo fato de a pesquisa em desenvolvimento e
financiamento da IA estar concentrada nas mãos das nove principais grandes
empresas gigantes da tecnologia, como Google, Amazon, Apple, IBM, Micro-
soft, Facebook – no caso dos EUA -, e Baidu, Alibaba, Tencente, na China),
passaram a arquitetar programações de algoritmos em aplicações comerciais
(WEBB, 2020), de forma a promover o domínio da “infraestrutura das plata-
formas” (DIJCK, POELL, DE WAAL, 2018), em um ecossistema global de
plataforma sustentado por dados e organizado por meio de algoritmo, o que
interfere na visibilidade das informações.
Neste sentido, autores como Shoshana Zuboff (2019) explicam como a
concentração desses meios de produção de IA pelas Big Techs possibilitou que
a imensidão de dados gerados nas movimentações on-line se transformasse
em informação útil às empresas. Todavia, a autora tem uma perspectiva crí-
tica, no sentido de revelar como os dados recolhidos por IA passaram a ser
utilizados para vigilância, controle, e prognóstico do comportamento, o que
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 113

tem contribuído para a manipulação do usuário de rede. Na mesma linha de


pensamento, a autora Dora Kaufman explica como informações pessoais dos
usuários são utilizadas, uma vez que o desenvolvimento de modelos de IA
predição “permitem entrar em informações sobre os usuários, consumidores
e fazer previsões sobre seus desejos, comportamentos, interesses, padrões de
pesquisa por onde circulam” (KAUFMAN, 2022, p. 38).
Na visão de Shoshana Zuboff (2019) a maior ameaça não está nos dados
produzidos voluntariamente nas interações nos meios digitais, conhecidos
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como “dados consentidos”)41, mas sim, nos “dados residuais”, em níveis invisí-
veis, isto é, dados em que os usuários não exercem controle – ou seja, as ações
dos usuários registradas em rede que geram projeções sobre o comportamento
humano, o que envolve personalidade, emoções, orientação sexual, política,
conjunto de informações que o usuário, em tese, não teria a intenção de revelar.
Ainda no sentido de refletir sobre o controle e influência desse ecossis-
tema de plataformas de IA no usuário, o pesquisador proeminente da área de
Inteligência Artificial, Stuart Russel (2021, p. 105) explicita como é feita a
influência nas redes: “a maneira mais sutil de mudar o comportamento das
pessoas é modificar seu ambiente de informações, de maneira que passem a
acreditar em coisas diferentes e a tomar decisões diferentes”. Portanto, se a
publicidade tradicional e as ferramentas de guerra anteriormente já utiliza-
vam instrumentos psicológicos, o que muda atualmente, segundo o autor, é
a capacidade de personalizar mensagens pela IA e de maximizar o impacto
sobre elas, de modo a aprender a cada mensagem enviada, pelo rastreamento
dos hábitos de leitura, suas preferências, seu provável nível de conhecimento
sobre os assuntos que pesquisa (RUSSEL, 2021). A título de exemplo sobre a
influência dos algoritmos em rede, ver o estudo de Rose Marie Santini (2020)
sobre a “algoritmização do gosto”, que aborda do modo que as plataformas
de streaming e sistemas de recomendação estão interferindo/influenciando
no gosto das pessoas, no caso específico da música.
De modo semelhante, outro exemplo demonstra preocupação de uma falta
de governança do acesso aos dados e da falta de transparência na divulgação
dos usos que são feitos do material coletado. Assim, nos aplicativos que geram
imagens envelhecidas das pessoas ou na confecção de avatares pessoais para
uso em mídias sociais há um objetivo para além do caráter lúdico, uma vez
que, pelas técnicas de reconhecimento facial, é possível registrar usuários,
promover o treinamento das ferramentas de IA, além de outras possíveis

41 Apesar de não termos consciência do que será feito com esses dados, pelo fato de não haver o hábito dos
usuários da rede digital de leitura da política de privacidade apresentada em aplicativos ou ao aceitar os
termos ao entrar em uma plataforma de mídia social, essa é uma questão importante que deve ser avaliada.
114

aplicações para fins diversos, incluindo o uso de câmeras de vigilância para


identificação de sujeitos suspeitos.
Advindo desta lógica de mapeamento facial está o problema da deepfake
(produção de imagens, vídeos e áudios falsos por intermédio da técnica de
reconhecimento facial e de voz pela Inteligência Artificial). A esse respeito, um
exemplo da ótica de questionamento e as limitações da IA foi a viralização de
uma imagem do Papa Francisco42 vestindo um casaco branco estiloso, produ-
zida pela ferramenta de IAG Midjourney, que circulou nas mídias sociais e foi

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matéria em diversos jornais mundiais, levantando questões como critérios éticos,
direito à privacidade e segurança dos dados quanto ao mal uso em sociedade.
A falta de transparência na exploração dos dados humanos revela a
necessidade de uma regulação, de modo a considerar o aspecto ético e a
proteção dos dados privados. No sentido de ressaltar a importância do debate
da governança, apesar de no Brasil existir a Lei Geral de Proteção de dados
(LGPD)43, que assegura princípios para a proteção dos dados do indivíduo e,
na Europa, o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR)44. No
Brasil a legislação ainda se limita aos princípios, com elementos generalistas
e aplicabilidade restrita. Sobre o assunto específico da regulamentação das
plataformas e da IA, ressalta-se o debate recente sobre o Marco Regulatório
da IA no Brasil45 e o estudo realizado pelo Comitê Gestor da Internet (CGI.br)
no Brasil sobre a regulação das plataformas no Brasil, que está promovendo
simpósios e debates, ainda na fase da consulta pública.
Entre as trilhas e diretrizes dos documentos que existem sobre o assunto,
destacam-se algumas recomendações da regulamentação com pré-requisitos
para o desenvolvimento de uma IA confiável: respeito à autonomia humana,
explicabilidade e transparência, justiça, evitar trajetórias que levem à discri-
minação, intervenção e supervisão humana, robustez técnica e segurança,
privacidade de governança de dados, bem-estar social e ambiental, e prestação
de contas. Em geral, esses são os princípios legais que têm funcionado como
base fundadora para diversos institutos que pensam em uma regulação da IA
(KAUFMAN, 2022, p. 90-91).

42 Sobre o assunto, ver artigo dos jornalistas Noah Yuval, Harris Harari e Raskin Tristan do The New York Times,
de nome “Precisamos aprender a dominar a Inteligência Artificial antes que ela nos domine”, republicado
no jornal O Globo, edição impressa, Editoria Economia, em 28 de março de 2023.
43 Disponível em: https://www.lgpdbrasil.com.br. Acesso em: 6 maio 2023. Se refere à Lei nº 13.709, de 14 de
agosto de 2018, modificada pela Redação dada pela Lei nº 13.853, de 2019.
44 General Data Protection Regulation. Disponível em: https://gdpr-info.eu/. Acesso em: 15 maio 2023.
45 Sobre o assunto, o seminário “A Construção do Marco Regulatório da Inteligência artificial no Brasil”,
promovido em março de 2023 pelo Supremo Tribunal Federal, em Brasília, tratou dos principais pontos
elaborados em documento feito por um conjunto de juristas, profissionais do terceiro setor, entre outros.
Disponível em: https://www.youtube.com/live/NNwAxLWBpIc?feature=share. Acesso em: 15 maio 2023.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 115

Na ótica do debate sobre a governança, casos recorrentes sobre o assunto


na mídia acabaram por deixar em destaque nos últimos meses duas ferramentas
mais famosas de IA, divulgadas de forma massiva nos grandes veículos de
mídia nacional e internacional, como o ChatGPT (geração de texto) e Mid-
journey (geração de imagem), e trouxeram questionamentos quanto ao seu
uso, uma vez que representam não só aplicação comercial da IA em produtos
– na “a era das ferramentas intuitivas” (GABRIEL, 2022, p. 8) que passam a
ser ativas, pois apresentam e criam sozinhas -, mas na medida em que abrem
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caminhos para a previsão de situações futuras, alterando regras do jogo da


via nas dimensões educacionais, de aprendizado, de negócio, entretenimento,
arte, comunicação. Assim, esses elementos forçam a retomada de questões
filosóficas quanto aos usos que serão feitos a partir dessa tecnologia e que
determinarão o futuro da sociedade.
Portanto, se por um lado como perspectivas são abertas possibilidades de
aplicação da IA na produção de conteúdo e nas diferentes áreas, incluindo a
Comunicação Social, o que pode aumentar a produtividade no trabalho em uma
instituição, na precisão na leitura dos dados, na velocidade de desenvolvimento
e possibilidade de ser um assistente ao homem e às atividades de raciocínio; por
outro, apresentam desafios nos campos da ética, da segurança e da igualdade.
Especificamente, no período de novembro de 2022 a maio de 2023,
milhares de notícias ganharam destaque na mídia sobre o assunto e algu-
mas destacam questões e problematizações quanto ao uso da IA. A título de
exemplo, uma fotografia produzida por IAG ganhou um concurso de imagens
e gerou questionamento sobre a legitimidade de uma imagem em IA poder
ou não ser considerada arte. Nessa mesma perspectiva, movimentos feitos
por artistas contra as plataformas de IAG de imagens forçam a retomada de
debates sobre a questão da autoria e do plágio, devido à possibilidade de a
ferramenta realizar a captação de um estilo de produção de um artista por um
simples comando de prompt de IA, feito por um usuário comum no ambiente
digital. Assim, para adentrar neste estudo, é preciso compreender como fun-
ciona o processamento de imagens pela IAG.

Inteligência artificial generativa e o processamento de imagens em PNL

Para compreender como procederam os testes com ferramentas de criação


de imagens de IA para a produção das artes visuais de um evento do Exército
Brasileiro sobre Inteligência Artificial, pelos métodos disponíveis comer-
cialmente, é necessária uma breve explicação sobre a Inteligência Artificial
generativa e o modo de processamento de imagens pelo bot Midjourney.
116

A Inteligência Artificial generativa (IAG) é uma subárea da Inteligência


Artificial, voltada a atividades de criatividade e produção artística. Diferen-
temente da IA convencional, programada para executar tarefas específicas, a
IAG traz possibilidades de se trabalhar com diferentes elementos, como texto,
imagens, vídeos, e tenta simular a criatividade humana, a partir do aprendizado
da máquina, processamento de linguagem natural (PNL) e deep learning (com
a predição, baseada em previsão, o que funciona por lógica e probabilidade),
a partir de um aprendizado prévio com dados armazenados. Por isso, ocorre a

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necessidade de um bom capital humano para o desenvolvimento de softwares
de IA, para o treinamento do algoritmo quanto aos erros cometidos.
Entre as diversas ferramentas voltadas à produção de imagens artifi-
ciais, estão a DALL-E-246, da empresa OpenAI de Elon Musk, o software
concorrente Midjourney47, e outras ferramentas afins como Leonardo.ia e
Blue Willow, Stable Diffusion48, Craiyon, NightCafé AI, Jarper Art49, e inú-
meras outras ferramentas que passaram a estar disponíveis para o usuário
comum da web.
Ao avaliar o modo de funcionamento do software de Inteligência Artificial
Midjourney, destaca-se a função da interface entre comunicação (linguagem
humana) e sistemas computacionais, baseada em modelos de processamento
de linguagem natural (PNL)50, o que significa que algoritmos de Inteligência
Artificial são treinados para lidar com texto, entender e escrever palavras com
lógica semelhante às palavras humanas, além de recursos de aprendizado de
máquina e da visão computacional, a depender da atividade requisitada.
De modo a explicar como a linguagem é gerada por algoritmos, aplicati-
vos geram imagens e artes de IA a partir de textos com comandos de prompts
programados para gerar imagens. Para se criar uma IAG, é preciso adicionar
um imenso volume de textos, vídeos, imagens que serão processados. De
forma simplificada, o usuário entra com um comando de prompt em forma de
texto, o software acessa o banco de dados e de imagens previamente coletadas

46 Ferramenta de criação de imagem a partir de descrição de texto, da OpenAI, mesma responsável pela
criação do ChatGPT.
47 O Midjourney é um chatbot que funciona obrigatoriamente junto à plataforma Discord.com. No início dos
testes para a produção deste capítulo, a ferramenta apresentava a versão free para teste e geração de
algumas imagens. A partir de 3 de março de 2023, o software passou a ser somente pago, gerando prompts
de imagens ilimitados. Especialmente após problemas de usos indevidos em deepfakes, a plataforma está
desenvolvendo princípios e restrições aos usuários que funcionem como normas de segurança.
48 Gerador de imagem digital que ficou conhecido por ter um uso facilitado e ser gratuito. Desenvolvido pela
empresa StabilityAI. Disponível em: https://stablediffusionweb.com/. Acesso em: 15 mar. 2023.
49 Considerado um gerador de arte em IA diferencial apropriado para designers, pois, na opção de entrada
avançada da ferramenta, é possível e adicionar o máximo de detalhes que quiser à obra de arte, tornando-a
personalizada, o que difere do padrão semelhante estético das demais plataformas.
50 É como os computadores entendem os humanos e manipulam a linguagem para dar um padrão de resposta
traduzido.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 117

e cria conteúdo original. Como forma de exemplificação, um algoritmo de


aprendizado da máquina pode ser treinado utilizando milhões de imagens de
gatos de todos os tipos e estilos, classificados em um banco de dados. Quando
requeridos pelo prompt adequado, poderá criar um terceiro elemento, de modo
a associar diferentes referências e combinações.
Como forma de estabelecer uma explicação mais técnica, o modo de
funcionamento, a lógica de processamento natural e resposta com base em
lógica e predição ocorre por representações numéricas dadas para as palavras
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da língua (word embedding), baseadas em hipóteses linguísticas clássicas,


inteligências artificiais com prompts de entrada para conversas, como o GPT
(treinada com textos da internet e trilhões de palavras), de modo a dar ordem
a partir de parâmetros que funcionam como redes neurais, neurônios artificiais
que levam tempo para processar conhecimento (TAULLI, 2020).
Taulli (2020) ainda explica como a IA traduz a linguagem humana por
meio do processamento natural, o que ocorre por meio de duas etapas prin-
cipais: 1) limpeza e pré-processamento do texto, que envolve técnicas de
tokenização (processo em que o texto é analisado e segmentado em várias
partes), estemização (descreve o processo de redução de uma palavras à sua
raiz, como a redução de sufixos e prefixos de palavras) e lematização (envolve
encontrar palavras de raízes semelhantes entre o banco de dados, para analisar
o texto) e 2) compreensão da máquina para geração da linguagem. Na segunda
etapa são feitas as categorizações das palavras em sua ordem gramatical,
análise de sintagmas a partir de modelagem de tópicos (padrões ocultos no
texto). Todavia os programas de IA também utilizam os conhecimentos do
aprendizado profundo baseadas no processo de predição51” (AGRAWAL;
GANS; GOLDFARB, 2019, p. 5).
No caso específico, o Midjourney é um software de IA em que, para
seu funcionamento, é preciso estar logado na plataforma Discord.com. Após
logado, seu processo de funcionamento utiliza Processadores de Unidade
Gráfica (GPUs) para interpretar e processar cada prompt a partir de uma
entrada de descrição da imagem que deseja ser gerada.
Assim, o caminho para se obter um resultado assertivo na ferramenta é
seguir uma semântica básica em texto, baseada em três etapas: 1. o comando /
imagine + enter, (o que gera o prompt), 2. a descrição da imagem a ser gerada,
composta por sujeito, verbo e objeto, e 3. a descrição da condição da cena
(apresentada pelos parâmetros), tal como a Figura 1 ilustra.

51 A predição é o modo de usar informações disponíveis e a lógica para gerar as informações que não tem,
por uma variedade de técnicas: “classificação, agrupamento, regressão, árvores de decisão, inferência
bayesiana, redes neurais, análise de dados topológica, aprendizado profundo, aprendizado por reforço,
aprendizado profundo por reforço, redes de cápsula etc.” (AGRAAL et al., 2019, p. 13).
118

Figura 1 – Semântica de um prompt de comando composta de três etapas

Fonte: Extraído da ferramenta Midjourney, em conta logada na plataforma Discord.com

Ainda nesse processo, como parâmetro, é possível colocar elementos

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básicos na descrição como proporção da imagem em largura e altura (aspect
ratio –ar, representada pelo uso de proporções, 7:4, 4:3, por exemplo), caos
(chaos) indica o nível de abstração de uma imagem (se o usuário quer
uma imagem mais próxima de uma fotografia realista ou de uma imagem
abstrata), qualidade da imagem (quality), semente (seed) indica a raiz da
imagem gerada quando se quer gerar outra imagem advinda do que a fer-
ramenta já gerou, reprodução do estudo do artista desejado, é o estilo do
autor (style), bem como parâmetros para aumento de resolução das imagens
geradas (upscale).
Quando se quer solicitar uma imagem composta de diversos elementos,
ao invés de se descrever uma frase completa com o detalhamento de cada
componente, a ferramenta responde melhor quando se separa elementos da
imagem por vírgulas (como se fossem tags), colocando pesos para cada um
dos objetos da cena, pois assim é gerada uma compreensão mais facilitada
para o algoritmo (lembrando que são padrões matemáticos que o programa
entende e não a linguagem humana). Assim, o algoritmo tentará encaixar
todos os elementos na composição, no estilo artístico de um pintor ou escultor
favorito, ou em um comando técnico como tipo de filme ou lente ou ilumi-
nação específica. Sobre o assunto para gerar um melhor resultado, o Guia do
Midjourney (2022, s.p.) explicita:

Ferramenta Midjourney funciona melhor com sentenças simples, curtas,


que descrevam o que você quer ver. Eviste listas longas nas pergun-
tas. Um exemplo é: ao invés de usar o termo ‘Mostre uma imagem
de muitas papoulas da Califórnia florescendo, deixe em um laranja
brilhante e vibrante e desenhe em um estilo ilustrado com lápis de
cor’, a ferramenta prefere um texto mais direto: ‘Papoulas da Cali-
fórnia em laranja brilhante desenhadas com lápis de cor (Disponível
em: https://docs.midjourney.com)52.

52 Livre tradução para: “Midjourney Bot works best with simple, short sentences that describe what you want
to see. Avoid long lists of requests. Instead of: Show me a picture of lots of blooming California poppies,
make them bright, vibrant orange, and draw them in an illustrated style with colored pencils Try: Bright orange
California poppies drawn with colored pencils” (MIDJOURNEY GUIDE).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 119

Da mesma forma, a ferramenta Midjourney aceita apenas textos em


inglês no comando do prompt e, a cada pedido, são geradas quatro imagens
que o usuário pode aumentar a resolução (em upscale U1, U2, U3 e U4), pedir
variações de detalhes das imagens e salvá-las no computador.
Ainda entre os elementos e parâmetros, apesar de existirem bibliotecas de
prompts para guiar usuários a resultados mais assertivos, há a possibilidade de
utilização de outros dois comandos básicos, como: “/blend + enter” (a partir
de duas imagens pessoais do arquivo do computador do usuário, o comando
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de prompt realiza uma mistura de referências entre as imagens preexistentes,


gerando uma terceira). Ainda é possível que no prompt o usuário solicite a
geração de imagem a partir de uma preexistente (que esteja com link na web),
para criação do prompt a partir de parâmetros e efeitos dela. Esse recurso é
muito utilizado para se criar avatares para uso nas mídias sociais ou para o
refinamento de informações de imagens de IA geradas anteriormente.
O comando “/setting +enter” também permite que o usuário vá para as
configurações da ferramenta. Além desses elementos, uma forma de refinar
os resultados apresentados pelo bot é a possibilidade de salvar uma imagem
gerada pelo programa Midjourney pela identificação de um número “seed”
(semente em inglês, o que funciona como uma identidade da imagem), o que
permite criar outra referência de prompt (complemento ou detalhamento) em
cima da imagem gerada anteriormente.
Dessas possibilidades, emerge no debate a importância dos humanos no
treinamento dos processos. Segundo Agrawal et al. (2020), quando humano
e máquinas preditivas trabalham juntos a precisão preditiva é maior, uma vez
que utiliza como base os hábitos de consumo humanos. Neste sentido, quanto
mais a IA é usada, maior a coleta de dados e o aprendizado. Com muitos
usuários na web na produção de dados, a IA está melhorando rapidamente.
Mas isso não significa que ela tenha compromisso com os dados corretos.
Daí advêm problemas que serão tratados no item a seguir.

Enviesamento e a questão da ética nos dados de IA

Da mesma forma que os dados podem ser potencializados por humanos no


sentido de aumento da amostra e também do refinamento dos dados a depender
de quem está realizando o prompt do comando, surgem dois problemas sérios,
advindos desse elemento humano nas três etapas de programação da IA: o envie-
samento algorítmico e a falta de ética e de transparência na coleta dos dados.
Assim, o viés pode estar presente quando a coleta dos dados for ruim,
o que se revela em três dimensões no desenvolvimento de sistemas: dados,
algoritmo e humano (GABRIEL, 2022).
120

Com relação ao primeiro elemento dos dados, surgem questionamentos


no que se refere aos erros que ocorrem no processo de levantamento, o que
leva ao enviesamento na etapa de treinamento.
Em segundo lugar, elemento do viés do algoritmo também se sustenta
na programação dos dados, que são o “alimento da inteligência”. É preciso
uma captura adequada e a manipulação e processamento desses dados. Neste
raciocínio, o desenvolvimento do algoritmo é essencial e determinante para
garantir que não contenha determinantes de enviesamento ético, favorecendo

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ou privilegiando qualquer tipo de grupo ou indivíduo, a depender do foco de
interesse. Deste modo, a maneira que os dados forem processados pode condu-
zir a resultados bastante diferentes, em função do objetivo final do algoritmo,
uma vez que o “algoritmo é uma sequência finita de regras procedimentos
que levam à receita de um problema” (GABRIEL, 2020, p. 109). A título de
comparação, como em uma receita de bolo a inversão na ordem do preparo,
mesmo mantendo os ingredientes afeta o resultado final; analogamente, os
mesmos dados em algoritmos diferentes geram resultados distintos. Para evitar
esse elemento, uma possível solução esse processo é “buscar o maior grau
de diversidade possível e o maior número possível de visões e objetivos no
desenvolvimento do sistema, atendendo a um número maior de indivíduos e
grupos de interesse” (GABRIEL, 2022, p. 109).
Por fim, é preciso considerar o terceiro elemento que pode conter enviesa-
mento em uma mensagem: o material humano. Os desenvolvedores humanos
possuem vieses pessoais que direcionam a sua programação, pois a forma
com que cada um desenvolve um código acaba por selecionar elementos
que serão considerados como parâmetros bons ou ruins, o que influenciará
na performance/interface com o usuário. “Segurança, arquitetura, elegância,
robustez, resiliência, tipo de plataforma, linguagem de programação, entre
outros fatores podem ser focos de vieses em desenvolvimento” (GABRIEL,
2022, p. 110). Desse modo, o viés do algoritmo não influencia no objetivo
final e, consequentemente, no resultado obtido na aplicação do algoritmo.
Autoras como Dora Kaufman (2022) e Martha Gabriel (2022) defendem
que, assim como as atividades de qualquer indivíduo devem ser regidas pela
ética, pela moral e pelas leis, é preciso garantir que “os sistemas inteligentes,
conforme evoluem, sejam também éticos, morais e legais” (GABRIEL, 2022,
p. 108), sem abrir espaço para enviesamentos de preconceitos.
Portanto, como o uso dessas ferramentas por humanos, está promovendo
um treinamento e colaborando com as ferramentas de IA, além do compro-
misso ético, também é necessário o repertório cultural, elemento humano
fundamental para as novas profissões que estão surgindo, como o design de
prompt na etapa de coleta de dados, no desenvolvimento dos algoritmos e
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 121

no treinamento da ferramenta por processos humanos. Durante a contratação


para a composição do material humano das empresas de IA, mais que uma
formação técnica, habilidades e conhecimento em cultura, arte, técnicas de
fotografia, design, iluminação em estética e estilos de arte são fatores dife-
renciais para se criar composições diferentes nos softwares e apresentarem
resultados gerais com qualidade e responsabilidade.
Portanto, habilidades pessoais e formação cultural requisitos fundamen-
tais que podem se aliar aos avanços tecnológicos e ser requeridos aos profissio-
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nais de desenvolvimento da IA. Ainda como aspecto humano, o conhecimento


prévio do usuário dos softwares de IA sobre os parâmetros possíveis e modo
de funcionamento são diferenciais no processo de condução de um prompt, no
sentido de que aumentam a assertividade e qualidade nas respostas, de modo
a trazer potencialidades no processo de desenvolvimento da IA.
Quando falamos das etapas de processamento de uma linguagem no
entendimento de um algoritmo no tratamento dos dados, emerge uma ques-
tão fundamental no campo da ética e da transparência. Ao tratar do assunto,
a autora Dora Kaufman (2022) explica que a ética é objeto da inteligência
humana. Se falta ética nos processos de IA e nos resultados das imagens
Como as tecnologias não têm autonomia, no estágio atual do desenvolvi-
mento da IA, é necessária a prerrogativa do controle humano durante as três
etapas, de forma a garantir a ética na condução dos processos. Como possível
caminho, podem ser elaborados nos sistemas um conjunto as melhores prá-
ticas que possam ser replicados em uma variedade de configurações, apesar
de toda a complexidade envolvida no assunto (KAUFFMAN, 2022, p. 90).

Metodologia

Essa pesquisa classifica-se, quanto à finalidade, como aplicada, uma vez


que pretende gerar conhecimento de potenciais limitações e potencialidades
quanto ao uso da ferramenta de geração de imagens em IA para a criação da
identidade visual de um evento de Comunicação. Quanto aos objetivos, trata-
-se de um estudo explotarório, tendo em vista que visa a proporcionar maior
familiaridade com a ferramenta e os possíveis problemas que possam surgir
de seu uso (limitações) e potencialidades. Quanto à natureza da abordagem do
problema, realiza uma pesquisa qualitativa, na medida em que busca possíveis
interpretações e reflexões geradas dos retornos de uma experiência realizada
pela ferramenta Midjourney, de criação de imagens, de modo a aprofundar
o conhecimento e a buscar uma reflexão para o processo, sobre as principais
potencialidades e limitações e questões que saltam aos olhos como resultados
no processo de geração de uma imagem artificial.
122

Já os procedimentos técnicos para coleta de dados do trabalho foram,


primeiramente, um estudo bibliográfico, realizado por meio de acesso às fon-
tes de consulta a livros, artigos de autores que tratam das principais questões
envolvidas no processo de geração de imagens em IA no contexto contempo-
râneo como embasamento teórico à pesquisa e à questão norteadora.
Em seguida, ainda como procedimento de coleta, como forma de elencar
as principais questões teóricas que poderiam estar presentes no processo de
uma IA, realizou estudo experimental por meio de um teste com a ferramenta

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Midjourney, a partir de elementos percebidos por observação do pesquisador
no contato com a ferramenta pesquisada, de modo a buscar explicações de
como ocorre o processo e a selecionar variáveis que influenciam, a partir da
observação do comando dos prompts e dos resultados apresentados.
Como elemento próprio do método experimental, coleta-se informações
e levantamento de assuntos provenientes dos experimentos e realiza-se uma
análise dos resultados. De modo a promover uma explicação mais detalhada
do processo, o amparo teórico para a realização do estudo exploratório está
no método apresentado pelo pesquisador Márcio Carneiro (2023) conhecido
como EEAF (Entrevista Exploratória Para identificação de Funcionalidades)
de softwares de IAG, que possibilita um estudo a partir da “coleta de dados
iniciais quando o objeto de investigação é uma solução comercial de Inteligên-
cia Artificial que gera a partir de textos e imagens” (CARNEIRO, 2023, p. 4).
A proposta é aplicar esse método pensado para outros modelos de geração
de linguagem artificial. De maneira análoga, o que se propõe neste capítulo é
uma adaptação da lógica sugerida por Carneiro (2023) da entrevista realizada
na ferramenta de geração de texto ChatGPT para a realização de um teste de
comandos dados junto à ferramenta Midjourney de criação de imagens em IA.
Carneiro justifica a importância desse procedimento de coleta pela “difi-
culdade em se obter informações mais precisas sobre modos de operação e
detalhes do modelo em si [...] do conteúdo protegido pela legislação da pro-
priedade intelectual ou industrial, o que dificulta o acesso do pesquisador”
(CARNEIRO, 2023, p. 5).
Diante dessa dificuldade, o pesquisador sugere que sejam feitos estu-
dos da engenharia reversa, ou seja, “a partir de testes e demandas feitas na
plataforma, o pesquisador levanta as principais características do sistema,
em análise a partir da própria resposta que o programa gera” (CARNEIRO,
2023, p. 4-5). Ou seja, pela observação e teste o pesquisador coleta informa-
ções reveladas sobre sua operação que não estão claramente53 disponíveis da
documentação oficial ou pública, em testes para efeito de validação.

53 Para Carneiro (2023) questões sensíveis levantadas por autores da vigilância, como Amadei e Silva (2019),
emergem quando do uso dessas ferramentas, como racismo algorítmico, controle e vigilância e desigualdade.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 123

Assim, é o que se pretende no estudo exploratório: avaliar, nas funcionali-


dades do Midjourney, um protocolo de análise de um conjunto de ferramentas,
com potencialidades, principais limitações e erros, a partir da coleta e análise
dos resultados da saída dos comandos dos prompts das imagens, elementos
estes que funcionam como matéria-prima para o pesquisador utilizar na com-
preensão de seu objeto de pesquisa.
Assim, a relação foi pensada em uma sistematização quanto aos seguintes
critérios: 1. Forma de organização semântica do prompt e a mudança no resul-
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tado quanto ao acesso aos parâmetros do Midjourney; 2. Questões levantadas


no que diz respeito aos critérios éticos, de transparência na estruturação dos
dados e na previsão da variedade dos resultados e enviesamento algorítmico,
o que afeta na precisão do retorno dos comandos de prompts.
A respeito desses critérios, poderia-se gerar diversos artigos com aná-
lise aprofundada de cada um dos parâmetros e elementos que emergem dos
resultados. Devido à limitação do tamanho do texto, para fins de organização
deste estudo, foram organizadas as reflexões geradas, a partir de alguns pontos
principais do gerador de conteúdos artificial.

Análise dos dados

Para a análise desse estudo, foi realizado o teste de alguns prompts para gerar
imagens pela ferramenta de IAG Midjourney, a iniciar por comandos de prompts
que traduzissem a identidade visual do evento. Escolheu-se para a realização do
experimento a concepção visual de uma arte gráfica do evento Jornada da Comu-
nicação Social de 2023, com temática sobre a IA e a Comunicação Institucional.
Como ponto de partida, a equipe organizadora se reuniu para pensar em
uma imagem metáfora que pudesse fazer parte da concepção da identidade
visual do evento, definida da seguir: a construção de um autômato de IA em
uma pose semelhante à imagem da escultura da escultura “O pensador”, de
Rodin, como uma sombra projetada sobre sua imagem de um humano pen-
sante, de modo a demonstrar a precedência do humano em relação às máqui-
nas de IA. Ainda como concepção, era objetivo utilizar a imagem como uma
metáfora do tempo atual em que é preciso se voltar para dentro e refletir sobre
o processo com o cérebro, elemento que torna o humano superior à máquina
(o processo de sua reflexão e conhecimento, baseado em suas vivências e
experiências). Ainda como brainstorming, partiu-se para uma segunda pos-
sibilidade de imagem, em uma alternativa de se pensar uma imagem de um
robô com a imagem refletida de um homem sobre a água em uma paisagem,
como uma referência ao mito da imagem de Narciso, de modo a comparar o
homem com o autômato, e a também demonstrar o pensamento do humano
124

central sobreposto à IA (no sentido de trazer o significado de que o elemento


humano está por traz da máquina).
Deste modo, a proposta partiu de experimentos realizados por observação
e testes da ferramenta Midjourney por essa pesquisadora, na versão V4, em
um período de março a maio de 2023, em horários diversos, com acesso via
desktop do computador. Para testar diferentes funcionalidades da ferramenta
a partir de uma semântica textual realizada no comando dado aos prompts no
Midjourney, foi criado um perfil54.

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Como descrição inicial, nomeou-se o que se queria criar com o comando /
imagine -objeto (sujeito da frase) + descrição da cena + parâmetros básicos (como
estilo do autor, iluminação da cena, qualidade). Durante o processo de criação, se
destacaram três fases. Antes de iniciar o teste, foram feitos prompts para testes das
funcionalidades da ferramenta Midjourney e verificação se a mesma entenderia o
contexto de algumas artes, a partir da descrição a seguir, com algumas variações
no texto para gerar imagens diferentes: “/imagine a robot like a Penseur Rodin
style, reflecting a image of a human, in Picasso’s style, hiperrealism, --2q”. Na
mesma ótica, foram testadas a imagem, variando o estilo de Leonardo da Vinci,
ao cineasta Guillermo del Toro, com base em cenas de filmes de ficção científica,
como Blade Runner, o Exterminador do Futuro e 2001: A Odisseia no Espaço,
Wall-E, como teste da compreensão de referências culturais, filmográficas e de
obras de arte. Como primeiro resultado, a ferramenta obteve retorno de imagens
com elementos bem próximos aos das obras dos artistas indicados no prompt,
com um nível de realismo muito próximo às obras e estilos, o que indica, por
um lado, a alta capacidade de reprodução de estilos de obras e autores, sem ser
necessariamente um design, porém, por outro, um problema em relação à auto-
ria e ao plágio, o que explica a razão de contestações que a ferramenta teve em
manifestos relatados nas notícias de jornais recentes.
Em seguida, partiu-se para a primeira fase dos testes com o pedido: “/
imagine a robot in a landscape reflecting the image of a human on the water,
Monet style, --hiperdetailed, --2q”. Todavia, como os prompts iniciais esta-
vam muito descritivos, com frases amplas, o retorno não era compreendido
e a ferramenta não conseguia entender a lógica de uma metáfora de um robô
com o reflexo da imagem de um homem. Assim, como resultados, aparece-
ram robôs muito próximos do imaginário dos filmes de ficção científica, como
Blade Runner, Odisséia no Espaço, sem muita identificação do rosto, em um
imaginário distante dos autômatos humanoides, ou imagens de robôs postos
lado a lado com um homem, refletindo cada um sua própria imagem na água

54 Para teste das funcionalidades básicas do Midjourney, a autora deste artigo realizou alguns prompts na
versão gratuita, de modo a testar alguns parâmetros. Após a versão teste se esgotar, foi comprado um plano
mensal de ferramenta, de modo a permitir a geração de mais imagens sem limites e a gerar prompts com
resultados mais assertivos.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 125

e não a máquina com o reflexo do homem. Destaca-se do processo o fato de a


ferramenta obter êxito nas referências das cenas de filmes e estilos de artistas
e de pintores e iluminação, mas não corresponder a um resultado exato que se
desejava enquanto arte, após as primeiras tentativas de comando do prompt pela
compreensão de uma metáfora.
Como segunda fase do processo, concentrou-se na realização de uma
imagem com o parâmetro “/blend + enter”, com a utilização de uma imagem
externa como ponto de partida para a criação de outra imagem ou mistura de
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referência de duas imagens. Como teste foi utilizada a referência da imagem


da identidade visual da Inteligência Artificial do Exército Sargento Max, de
concepção do Centro de Comunicação Social do EB, com o intuito de se criar
um avatar de IA para o evento. E o pedido ao comando do prompt o texto era
o seguinte: “/blend an avatar as similiar as the image [entrada do endereço da
imagem na web]”.
Como resultados dos prompts de imagem, apesar de o estilo ter sido
facilmente captado no traço do avatar, observou-se que havia uma lógica
para imagens geradas a partir de outras com um parâmetro muito próximo
ao referencial europeu /norte-americano (avatares de olhos claros ou robôs
muito semelhantes à ótica dos filmes de ficção científica tradicionais, sem uma
definição da face dos avatares), o que dificultou o processo de se criar um
avatar de IA, para a Jornada de Comunicação Social. Observou-se durante esse
processo que não eram geradas imagens com rostos em posição frontal, mesmo
o que requerido no prompt e para ter como retorno avatares mais próximos à
feição do brasileiro em um retorno assertivo, era preciso especificar no prompt
da imagem, o que se revelou como uma espécie de enviesamento dos dados,
selecionados por um padrão europeu na base de dados. Ainda nesse resultado,
observou-se também que os elementos apareciam em avatares ou de meninos,
com feição de criança ainda ou de avatares muito envelhecidos, o que lembra
o treinamento já realizado em aplicativos com técnicas de reconhecimento
facial, utilizado para captar dados dos usuários nas mídias sociais.
Durante esse processo, verificou-se, nas fotografias reais e nas artes
resultantes do parâmetro /blend, a relação de elementos relacionados à autoria
e à deepfake, advindos da lógica do reconhecimento facial, uma vez que,
para o reconhecimento dos traços faciais, era preciso realizar o upload de
uma fotografia para um site na web para se montar uma imagem de Inte-
ligência Artificial a partir da base de dados. A partir daí, foram realizados
testes com fotografias dos integrantes da equipe da Jornada, de modo a criar
possíveis avatares para seus rostos e a atuarem junto a um aplicativo D-id55

55 Software de IA planejado para dar movimentação à boca de imagens e avatares, feito à base de Inteligência
Artificial. O usuário realiza o upload da foto do avatar, digita o texto que deseja que seja transformado em
vídeo e o aplicativo transforma o texto em voz sintetizada e movimenta a boca da fotografia apresentada,
126

para a feitura de vídeos com mensagens dos avatares de IA ao longo do


evento. Dos cinco integrantes da equipe, o avatar funcionou bem com duas
das professoras, de modo a trazer resultados mais próximos às suas feições,
com os comandos de prompts e parâmetros próximos às animações da Pixar
Animation Studios.
Todavia outros três integrantes não obtiveram resultado satisfatório no
retorno das imagens na criação do avatar. Os principais erros ocorridos no
processo foram: 1) retorno de avatares que não se assemelhavam à feição

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dos integrantes da equipe, ou ainda que retornavam imagens de avatares
muito jovens ou muito idosos sobre aquelas faces, em erros em elementos
faciais, como descrição do formato e sobrancelha, tipos de lábios e formato
do rosto, para a validação e retorno da ferramenta. 2) Retorno de avatares de
outro gênero do descrito no prompt. Ao avaliar os hábitos dos usos desses
usuários nas redes sociais on-line e ao perguntar se tinham hábito de postar
fotografias e imagens em suas redes sociais, observou-se que, para os que não
postam muita informação e imagens na web, o retorno do prompt foi menos
assertivo. Essa resposta indica que há um acesso a fonte de dados digitais
para a assertividade do prompt, e que revela a falta de transparência de como
os dados são armazenados. Por último, esse não entendimento dos prompts
revela que dessas imagens advém outro problema como o enviesamento algo-
rítmico e os possíveis usos em deepfakes, o que reitera a exigência de uma
política de governança.
Por fim, partiu-se para a terceira fase de indicação de prompts mais
técnicos e assertivos, baseados em estilos, parâmetros e lógica para gerar
imagens menos reais. Neste princípio, foram geradas as imagens para o evento
selecionadas em quatro resultados de prompts, com descrições de estilos mais
abstratos (como o parâmetro quilling paper na composição das imagens), de
modo a não esbarrar na questão racial e de reconhecimento facial na identidade
visual do evento, conforme demonstra o print com montagem das imagens
selecionadas como possibilidades para o evento, na Figura 2.

com a opção de escolha de diferentes vozes ou de uma gravação feita pelo próprio usuário. Disponível em:
https://www.d-id.com. Acesso em: 3 mar. 2023.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 127

Figura 2 – Montagem das principais imagens geradas para a identidade visual do


evento. As imagens de cima foram geradas pela ferramenta Midjourney. Abaixo
estão possibilidades de artes gráficas correspondentes feitas no Canva.com. As
duas últimas foram produzidas pelo professor, designer gráfico do CEP/FDC
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Fonte: Da autora, a partir da Ferramenta Midjourney e do aplicativo de edição de imagens Canva.com.

As três primeiras imagens da figura acima foram geradas a partir dos


seguinte prompt de comando: “/imagine paper quilling of a robot artifi-
cial inteligence, positioned like Rodin’s The Thinker, cinamatograph
scene, by Van Gogh style of painting”. A terceira imagem foi requerida
com o seguinte comando a partir de um link embasado na segunda imagem
do prompt anterior: “/imagine a blade runner cinematograph scene and
Guillermo del toro landscape, with orange and blue colours of https://s.
mj.run/erCRV_bWmKg, fairy light”. E a última, do robô dourado, foi gerada
a partir do seguinte comando: “/imagine a golden and blue robot based on
the [link de imagem advinda da web], positioned like a Rodin’s The Thinker,
reflecting the shadow of a man, hiperrealist scene, 3:2, 2q”.
Portanto, como resultado, esses elementos demonstram que com o uso
de prompts mais técnicos, o objetivo de montagem da identidade visual para
128

o evento de Comunicação foi atingido, com resultados de imagens mais asser-


tivas, o que indica a importância da destreza e conhecimento do usuário no
comando dos prompts para a assertividade e qualidade na resposta. Por fim,
quanto mais parâmetros e maior o conhecimento do modo de funcionamento
da ferramenta Midjourney, melhor o resultado do prompt. Além disso, revela-
-se que o repertório cultural do usuário é um diferencial para melhor resultado
nos prompts, em associações e metáforas que se queira pedir à máquina.
Para solucionar o problema da falta de entendimento da metáfora da

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sombra humana refletida sobre a imagem de um robô, a solução encontrada
foi a de colocar a sombra manualmente em um programa de edição de ima-
gens Canva.com, de forma complementar à concepção original da imagem
do evento de IA feita por uma ferramenta de IA56.
Como resultado do experimento feito na ferramenta Midjourney, ele-
mentos fruto do treinamento da ferramenta ou da falta de representação da
variedade de elementos na base de dados e do desenvolvimento dos algorit-
mos alertam para a necessidade de correção de erros e imprecisões, como o
enviesamento, o problema da autoria e a falta de transparência na coleta de
dados pelo reconhecimento facial. Além disso, indicam a necessidade de uma
atualização da base de dados e de um maior cuidado no desenvolvimento da
ferramenta para a interação com o público.

Considerações finais

Ao se pensar a Inteligência Artificial como assistente da comunicação


institucional, o estudo exploratório, realizado a partir da estratégia de testes
com a ferramenta de IAG como assistente de produção da organização de
um evento da área de Comunicação Social, trouxe reflexões importantes e
problematizações para o campo, advindas do processo de planejamento e
feitura de um evento: Seria uma arte produzida por IAG uma obra de arte?
Qual a viabilidade de um design artificial na criação possível da identidade
visual para um evento? Essas e outras reflexões demonstram a necessidade
da emergência de uma governança sobre o tema da IA.
Como reflexões finais sobre a ferramenta, observou-se que o resultado
dos prompts criados por textos criados via código apresentam a necessidade
de revisão humana, principalmente se utilizados como assistentes da criação
de conteúdo e produtos de imagem, que dependem de elementos contextuais e
metafóricos. Também se observou que, na semântica do processamento da lin-
guagem dos textos colocados pelo usuário, há uma dificuldade de compreensão

56 No caso de outros programas como o Jasper AI, esses elementos de design já poderiam ter sido feitos na
mesma plataforma em complemento da imagem produzida pela IA.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 129

de frases completas com conectivos e com descrições muito detalhadas, por


ser basicamente uma máquina de predição, baseada em lógica. Neste sentido,
o conhecimento técnico da ferramenta com a utilização de parâmetros espe-
cíficos apresenta resultados mais precisos, o que exige uma especialidade do
profissional que for criar esses elementos pela via artificial.
Quanto ao fato de a ferramenta apresentar resultados distorcidos no
recursos de criação de imagens a partir de imagens prévias, como erros na
classificação de gênero nas imagens, sustenta-se a hipótese de que a falta
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de hábito de postagem de imagens desses usuários em suas mídias sociais


individuais impediu o mapeamento facial dos mesmos no ambiente digital, o
que, por probabilidade, explicaria porque a ferramenta funcionou bem para
alguns usuários e, por outro lado, não obteve avatares condizentes de outros
integrantes, a partir das fotografias prévias disponibilizadas no prompt.
Não se pode desconsiderar a alta qualidade técnica das imagens gera-
das na ferramenta Midjourney, e o hiper-realismo das imagens geradas,
além da perfeição na reprodução de estilos de artistas, o que pode ser um
potencializador de produção de conteúdos. Todavia, por outro lado, a con-
cepção desses elementos levanta aspectos importantes sobre a Inteligência
Artificial que merecem atenção, como a dimensão da segurança dos dados,
da ética, direito autoral e transparência dos dados dos usuários que circulam
informações no ambiente digital.
Por fim, mais que as reflexões realizadas do processo, os elementos
revelados nos resultados dos prompts deste estudo sugerem que seja dada
importância à centralidade do elemento humano na verificação e condução de
todas as fases do processo de desenvolvimento da IA, bem como a urgência
na realização de mecanismos de governança. Desse estudo metodológico,
abrem-se novas possibilidades de realização de testes com diferentes áreas
de aplicação em estudos futuros, uma vez que o mundo já se apresenta um
cenário híbrido entre humanos e máquinas, em atividades cotidianas que
ultrapassaram a ficção científica, na medida em que as tecnologias de inteli-
gência artificiais buscam reproduzir, com intuição e predição, a criatividade
do homem, até então, elemento diferencial da capacidade humana.
130

REFERÊNCIAS
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a simples economia da Inteligência Artificial. Trad. Wendy Campos. Rio de
Janeiro: Alta Books, 2018.

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rimental da metodologia EEAF usando a ferramenta Chat GPT de Inteligência
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SP: Ed. Atlas, 2022.

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Disponível em: https://gdpr-info.eu/. Acesso em: 15 maio 2023.

KAUFMAN, Dora. Desmistificando a Inteligência Artificial. Belo Hori-


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LGPD: sua empresa está preparada? LGPD Brasil.com.br. [S. l: s. d.], 2022.
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MORAES, Roberto. Com modificação de dados, concentração econômica e


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Revista ComCiência: Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, Dossiê,
n. 220, set. 2020. Disponível em: https://www.comciencia.br/commoditifi-
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RUSSEL, Stuart. A Inteligência Artificial a nosso favor: como manter o


controle sobre a tecnologia. Trad. Berílio Vargas. São Paulo: Ed. Companhia
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Ed. 70, 2023.
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técnica. São Paulo: Ed. Novatec, 2020.

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society: Public vlues in a connective world. England: Oxford University
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WEBB, Amy. Os nove Titãs da IA: como as gigantes da tecnologia e suas


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máquinas pensantes podem subverter a humanidade. Rio de Janeiro: Ed. Alta


Books, 2020.

YUVAL, Noah; HARARI, Harris; Tristan; RASKIN. Precisamos aprender


a dominar a inteligencia artificial antes que ela nos domine [Artigo do The
New York Times republicado]. Jornal O Globo, Rio de Janeiro: Editoria
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ZUBOFF, Soshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro


humano na nova fronteira do poder. Trad. George Schlesinger. Rio de Janeiro:
E-book, 2021.
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REFLEXÕES HISTÓRICAS E
EPISTEMOLÓGICAS, ANÁLISES
PROSPECTIVAS E PRINCÍPIOS
NORTEADORES RELACIONADOS AO USO
DE IA E DAS TECNOLOGIAS EMERGENTES
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DO PASSADO DA FORMAÇÃO
MILITAR À ERA DA REVOLUÇÃO
CIENTÍFICA PERMANENTE:
sobre história, tecnologias disruptivas
e soberania nacional
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Eduardo Rizzatti Salomão57

Introdução

A
preocupação em obter capacitação adequada aos desafios da guerra
moderna, onde se inserem o desenvolvimento da indústria e a forma-
ção dos profissionais do ofício militar, é assunto que, de longa data,
ocupa a atenção dos formulares da política de defesa de inúmeras nações.
Diante da revolução científica permanente, a guerra passou a exigir maior e
constante capacitação técnica dos contendores, num ambiente onde as desi-
gualdades e assimetrias entre os países tem se ampliado vertiginosamente.
Países em desenvolvimento, a exemplo do Brasil, estão em posição delicada
nesse cenário, uma vez que o assunto passa pela constante capacitação tecno-
lógica, alertando para os riscos políticos para a soberania nacional inerentes
às fragilidades nessa área.
Sob o ponto de vista da política de defesa (BRASIL, 2016), a capaci-
tação das tropas para operar novas tecnologias é crucial, sendo um assunto
que passa pelo preparo para guerras convencionais, assimétricas, híbridas e
outras modalidades de conflito. Trata-se, entretanto, como infere a política
de defesa, de tema inserido em um contexto mais amplo, envolvendo ques-
tões como o potencial industrial, científico e tecnológico do país, o domínio
de cadeias produtivas, cabendo ressaltar a necessidade de implementar, em
termos efetivos, uma visão estratégica no setor. Ilustra a importância dada ao
desenvolvimento científico e tecnológico aplicado ao preparo militar, a atitude
tomada pelas nações com alto nível de industrialização e com tradição de apli-
cação de políticas estratégicas, onde se destaca o exemplo norte-americano:
“A decisão política das Forças Armadas dos Estados Unidos de estar duas
57 Licenciado em História pela Universidade Estadual do Paraná (Unespar), Campus de União da Vitória.
Doutor em História pela Universidade de Brasília (UnB). É membro do Corpo Docente do Instituto Militar de
Engenharia (IME). Major do Exército Brasileiro, integra a carreira do magistério do Quadro Complementar
de Oficiais (QCO). E-mail: salomao.edu@gmai.com
136

gerações tecnologicamente à frente de seus inimigos demonstra o valor atri-


buído àquela questão” (SPEAR; COOPER, 2010 apud SILVA, 2020, p. 118).
Visando contribuir para o debate de interesse da defesa, este trabalho
tem por propósito questionar, primeiramente, o que a história informa a res-
peito dos caminhos seguidos pelo Brasil em favor da sua capacitação militar.
Busca-se, na sequência, problematizar o impacto das exigências atuais no
campo da ciência, tecnologia e inovação da indústria de defesa, com destaque
para as tecnologias disruptivas, tais como a robótica avançada e a Inteligên-

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cia Artificial (IA). Dessa abordagem, partindo de uma apreciação histórica,
foca-se o objetivo de extrair, em caráter de ensaio, reflexões para o tempo
presente, tendo como motivação escrutinar os desafios para a defesa brasileira
e a formação militar de interesse para o debate sobre a manutenção efetiva
da soberania do Brasil.

Desenvolvimento

Considerações sobre a fundamentação teórico-metodológica

Tendo como fundamentação teórico-metodológica as ferramentas e refe-


rências da ciência histórica, com foco no universo militar, em diálogo com
produções dedicadas aos estudos estratégicos e temas conexos, este ensaio
visa inquirir o que o passado de experiência das Forças Armadas brasileiras e
o posicionamento industrial do país, entre outros dados, informam no interesse
de extrair apontamentos e problemas pertinentes ao debate atual da capaci-
tação brasileira em defesa. A justificativa do trabalho está em confrontar os
caminhos outrora adotados no campo do preparo militar com o cenário da
revolução científica permanente.
Paul Kennedy, ao se valer do ferramental da História na análise de ten-
dências do percurso das grandes potências e da política internacional rumo
ao século XXI, expressou o enfoque analítico que baliza este trabalho:

Até mesmo o passado muito recente é história, e embora os problemas


de inclinação ou tendências e fontes coloquem o historiador da década
anterior numa ‘posição difícil para separar o efêmero do fundamental’, ele
ainda assim continua operando dentro de uma mesma disciplina acadêmica
(KENNEDY, 1989, p. 417).

E, operando dentro da História (a disciplina), fica claro ser inviável


qualquer afirmação em favor da previsibilidade dos acontecimentos, tudo
não passando de apreciação provisória e conjectural. As tendências em curso
favorecem suposições, mas não passam justamente disso, uma vez que o
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 137

material analisado, a validade de pressupostos, e a constante alternância dos


rumos da política, não favorecem quaisquer previsões e projeções seguras,
como expressou Kennedy (1989). Mas, dito isso, a História não se nega, ter-
minantemente, ao exame do passado em proveito de apreciar um hipotético
futuro, como ressaltou Reinhardt Koselleck:

Por sua singularidade, os acontecimentos e os indivíduos, bem como suas


ações e omissões, dificilmente podem ser previstos. Mas podemos anali-
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sar as condições gerais, mais ou menos passíveis de repetição, nas quais


acontecimentos futuros podem ocorrer. Esse potencial de prognósticos
depende de um mínimo de repetibilidade, que precisa ser estipulado. Se
assim não fosse, a humanidade despencaria paulatinamente em um nada
sem fundo (KOSELLECK, 2014, p. 14).

Para alcançar o objetivo aqui proposto, buscaram-se questões extraídas do


confronto entre a história militar brasileira e os desafios em termos de ciência
e tecnologia. A pretensão é alimentar o debate sobre os caminhos seguidos
pela capacitação brasileira na área da defesa. O guia para essa tarefa foi a
seleção qualitativa de referenciais da História, estudos estratégicos e áreas
afins. Este trabalho não é o produto de uma revisão bibliográfica no sentido
estrito do método, de forma que não ousa esgotar o assunto. Os autores e obras
de referência são apontados ao longo do texto, dentre os quais se destacam
Paul Kenneddy (1989), Raymond Aron (2017) e, no caso da experiência
militar brasileira, José Murilo de Carvalho (2005), Frank McCann (1995;
2005), Doratioto (2002), Celso Castro (2012), entre outros autores de relevo.
Estudos sobre indústria, ciência e desenvolvimento, tecnologias disruptivas,
robótica avançada e IA foram igualmente fundamentais (SINGER, 2009;
ROFF, 2015; ARKIN, 2012; HOROWITZ, 2016; ARKIN et al., 2018). Não
menos relevantes, foram consultados artigos de opinião, ensaios e relatórios.

Guerra e modernização da Forças Armadas brasileiras: do passado


ao presente

Lançando o olhar sobre a história do Brasil, destacam-se eventos his-


tóricos singulares que mais profundamente impactaram a nação, bem como
estimularam a consolidação e a modernização das Forças Armadas. Entre esses
momentos mais expressivos, está a Campanha da Tríplice Aliança (1865-1870)
contra o Paraguai. Dessa experiência, resultou o fortalecimento pontual da
Armada (Marinha) e do Exército imperiais, traduzindo-se em mobilização
humana e material em níveis até então não experimentados na América do
Sul (DORATIOTO, 2002). Nesse evento traumático para todos os países
138

envolvidos e notadamente mais grave para a República do Paraguai, o Impé-


rio do Brasil contratou empréstimos de vulto, endividando-se para adquirir
materiais bélicos de ponta, armas convencionais e uniformes, visando acelerar
a imprescindível transformação, sobretudo, do então acanhado Exército Impe-
rial, em tempos em que se contava com os mais notados serviços da Guarda
Nacional (SODRÉ, 1979; DORATIOTO, 2002).
Da campanha que se desdobrou pela região platina, profundamente mar-
cante na configuração das fronteiras e com amplos reflexos políticos para

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as nações envolvidas, constituiu-se o núcleo profissional que constituiu, em
termos efetivos, o Exército que despontou na República, estando no centro
da crise que levou à deposição de D. Pedro II (ISVEKSOHN, 1997; DORA-
TIOTO, 2002). Desse momento em diante, o Exército será empregado, entre
altos e baixos, como sustentáculo do novo regime político. No decorrer da
Primeira República (1889-1930), em termos propriamente militares, a expe-
riência passada no Cone Sul não garantiu o preparo ou a estabilidade das
Forças Armadas. Muitas fragilidades foram evidenciadas ao longo dos anos,
incluindo fatores disciplinares e políticos. De maior júbilo, sem com isso
querer se comemorar a dor e sofrimento da miséria da guerra, tem-se a expe-
riência colhida pelo Brasil nas duas grandes guerras.
A Primeira Guerra Mundial (PGM) (1914-1918), na época conhecida
como a Grande Guerra europeia, trouxe à tona o extremo de uma era de
inovações que elevaram as mortes de combatentes e civis a números exor-
bitantes. A Segunda Guerra Mundial (SGM) (1939-1945) ampliou o terror
contra os civis. O impacto desses eventos ganhou proporções dantescas, em
que se destaca o lançamento do horror da guerra sobre cidades com bombar-
deios indiscriminados que colocaram em séria dúvida seu valor efetivamente
militar e político – os intensos ataques a Londres e a destruição de Dresden
são clássicos. E, coroando o uso extremo do potencial destrutivo das novas
tecnologias a serviço da guerra, temos a inauguração do emprego da bomba
nuclear em Hiroshima e Nagazaki (HOBSBAWN, 1994).
A participação brasileira na PGM foi modesta, mas de grande importância
para a reforma e a modernização das Forças Armadas. O Brasil foi a única
nação sul-americana envolvida diretamente no conflito, declarando guerra às
potências centrais europeias (Alemanha e Império Austro-Húngaro, contando
com a adesão do Império Turco Otomano) e seus aliados após ao afundamento
de navios mercantes nacionais (PRIORE; DAROZ, 2019). Em termos efetivos,
na PGM a Marinha do Brasil atuou no patrulhamento marítimo na costa afri-
cana, com foco em Dakar, em missão que custou mais de uma centena de vidas
colhidas pela Gripe Espanhola. Aviadores da Marinha e do Exército foram
enviados para treinamento no exterior, alguns tomando parte em operações
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 139

de guerra. De notável impacto nas relações bilaterais, enviou-se à França a


Missão Médica Brasileira, a qual, além de fornecer médicos e técnicos para
atuar nas províncias francesas, operou um hospital militar com oferta de 500
leitos. Dentre as mais citadas ações do governo brasileiro, temos ainda o envio
de uma comissão de estudos e compras, conhecida como “Missão Aché”
(nome dado em alusão ao comandante da mesma: general Napoleão Felipe
Aché). A missão correspondeu, também, à atividade de observação militar,
fortalecendo as tratativas que levaram à contratação, em 1919, da Missão
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Militar Francesa (MMF) (1920-1940) para o Exército Nacional (MALAN,


1988; BRUM, 2015; PRIORE; DAROZ, 2019). Da experiência na PGM, res-
saltou-se a necessidade urgente de reformar e modernizar as forças militares
brasileiras. Foram organizadas escolas de aviação na Marinha e no Exército
(raízes da Força Aérea Brasileira – FAB, criada nos anos 1940) e implemen-
tado o treinamento na operação de carros de combate.
Nos anos anteriores a PGM, investiu-se na aquisição para a Marinha de
modernos couraçados de fabricação inglesa, os dreadnoughts, em operação
no Brasil em 1910. Ainda sobre a modernização, temos a construção de novos
aquartelamentos, com destaque para fortes dotados de artilharia de ponta adqui-
rida da Alemanha, a exemplo do Forte de Copacabana equipado com canhões
Krupp. No âmbito do ensino, destaca-se o envio de oficiais para estagiar no
Exército alemão e, em tempos da PGM, no Exército francês. No tocante à for-
mação inicial dos oficiais, tem-se a criação da Academia Militar do Realengo
(1913) e da Escola de Engenharia Militar (1931). Essas instituições de ensino
evidenciavam o propósito de centralizar a formação de oficiais, dando aos currí-
culos um perfil técnico, vislumbrando apartar os jovens aspirantes ao oficialato
do frenesi político experimentado na extinta Escola Militar da Praia Vermelha
(EMPV), fechada em 1904 por ocasião da Revolta da Vacina (MOTTA, 2001;
CARVALHO, 2005; CASTRO, 2012). Outra questão apresentada como urgente
era recrutar e treinar os novos soldados e seus comandantes, em grande quan-
tidade e rapidamente, diante da necessidade de recompletamento de tropas
no teatro de operações na hipótese de guerra. O problema da renovação das
premissas do serviço militar esteve no centro desse debate (BEATTIE, 2009).
No tocante à formação militar, a desejada profissionalização do ofício
das armas no Brasil era uma ambição ainda não alcançada em termos ideais.
Sobre o Exército, o general Estevão Leitão de Carvalho destacou “a ausência
do espírito militar nos cursos das Escolas do Realengo e da Praia Vermelha”
(apud CARVALHO, 2005, p. 25) em face da excessiva atenção dada à forma-
ção bacharelesca. Na Marinha, o contexto não era muito diverso, considerando
os apontamentos de que, na Escola Naval, o ensino matemático e teórico
concentrava todas as atenções e muitos alunos eram formados sem disparar
140

sequer um tiro de canhão (CARVALHO, 2005). Sem impedimentos, dessas


gerações de militares surgiram profissionais relevantes para um país ainda
acanhado em oferta de ensino superior (MCCANN, 2005).
Com a Revolução de 1930, o envolvimento da cúpula do Exército com
o governo Vargas, em especial no Estado Novo (1937-1945), marcou uma
fase de embates sobre o envolvimento dos militares na política. O chefe do
Estado-Maior do Exército, general Góes Monteiro, encaminhou a instituição
para fazer a política do Exército e não a política no Exército (COELHO,

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2000). Entretanto, a persistência dos recorrentes embates políticos notáveis,
nem sempre centrados em interesses corporativos, foi significativa. Quando
da aliança entre o Brasil e os Estados Unidos da América (EUA), levando à
formação da Força Expedicionária Brasileira (FEB), no contexto da SGM, as
fragilidades brasileiras no campo militar eram gritantes. A guerra se desdobrou
pelo litoral brasileiro, com afundamento de navios, e adentrou no interior
com os efeitos da mobilização material e humana sobre a população (MAXI-
MIANO, 2010). Nos anos 1930, energias foram dispendidas na resolução de
problemas internos. A mobilização da FEB surgiu como uma oportunidade
para modernizar as Forças Armadas. Após percalços iniciais, as tropas brasi-
leiras se notabilizaram pelo sucesso em várias operações.
De saldo, da experiência da SGM, firmou-se um acordo para aquisição de
materiais e equipamentos dos EUA (muitos de segunda mão, a bem da verdade)
e uma nova doutrina militar. Houve também ganhos diplomáticos e o acesso a
empréstimos em favor da consolidação da indústria de base (MCCANN, 1995).
Em 1949, criou-se a Escola Superior de Guerra (ESG), tendo como fonte de
inspiração inicial o National War College estadunidense. Nos anos seguintes,
adveio o problema da guerrilha no contexto das lutas revolucionárias sul-a-
mericanas, levando ao desenvolvimento de programas de treinamento focados
em técnicas de combate urbano e de contra insurgência. O foco na Doutrina
de Segurança Nacional tomou a atenção do Executivo brasileiro no período
1964-1985. O alinhamento relativo com os EUA, no curso da Guerra Fria, não
trouxe ganho expressivo em termos de soberania militar e tecnológica. Nesse
quesito, adotando postura pragmática, coube ao Governo Geisel (1974-1979)
a conquista do acordo entre Alemanha e Brasil que facultou a construção das
Usinas Nucleares de Angra dos Reis, a despeito da oposição norte-americana ao
projeto. O caso do abandono da produção do carro de combate pesado Osório,
e a derrocada da Engenheiros Especializado S/A (Engesa), resultando em seu
fechamento nos anos 1990, é o exemplo menos feliz dos rumos da indústria
de defesa brasileira (STRACHMANN; DEGL’LESPOSTI, 2010).
Nos últimos anos, a participação das Forças Armadas em missões no
exterior sobre a égide de organismos internacionais, sob a tutela da ONU, é
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 141

algo a comemorar em termos de adestramento militar, aquisição de materiais


e proveitos no âmbito das relações internacionais. É exemplo a Missão das
Nações Unidas para a Estabilização no Haiti ou MINUSTAH (2004-2017). Na
atualidade, persistem questões muito preocupantes no cenário interno, como
o recorrente emprego das Forças Armadas em missões de segurança pública,
trazendo ao debate os riscos da banalização dessa aplicação (SILVA, 2019).
Nos últimos anos, constata-se que se formou um verdadeiro abismo tecno-
lógico separando as forças militares brasileiras de suas congêneres das nações
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mais industrializadas (SILVA, 2019). O emprego de armamentos com tecno-


logia autônoma, com a chamada Revolução dos Assuntos Militares (RAM),
alterou o cenário da guerra decisivamente (SINGER, 2009). O avanço de novas
tecnologias são um desafio para o Brasil, nas quais se insere o amplo uso de
sistemas remotamente pilotados armados (os drones), de misseis e bombas
guiadas por radar, misseis supersônicos, bombas termobáricas, canhões eletro-
magnéticos (railgun – em desenvolvimento), de sistemas de armas de energia
dirigida (laser), de robótica avançada e da IA, entre outras inovações.
Do exposto, discorrer sobre os chamados gaps entre países não é sufi-
ciente, uma vez que as vertiginosas transformações científico-tecnológicas não
podem ser acompanhadas apropriadamente pelas nações menos desenvolvidas.
No Brasil, a reversão desse quadro é debatida de longa data (no passado, era
assunto demasiadamente limitado ao ambiente castrense). Registram-se ganhos
com programas de aquisição de equipamentos e armamentos, nos quais se
inserem estímulos à indústria no curso da Estratégia e da Política Nacional de
Defesa (END/PND) (BRASIL, 2016). Sem querer limitar a questão ao aspecto
econômico, fica evidente que o abismo tecnológico entre o Brasil e as nações
desenvolvidas não será diminuído sem forte investimento em ciência e tecno-
logia, o que exige aplicação de visão estratégica e não meramente aplicação de
numerário. Sobre a disponibilidade de recursos monetários, sem ignorar outras
condicionantes, Paul Kennedy afirmou que “o mundo não precisou esperar até a
época de Engels para saber que ‘nada é mais dependente das condições econô-
micas do que precisamente o exército e a marinha’” (KENNEDY, 1989, p. 418).

Resultados e discussão

Desafios para o tempo presente: o futuro do potencial militar brasileiro


em questão

No passado, o avanço industrial e técnico exigiu que o ensino teórico


e prático, em particular, não descuidasse da correta execução de diversos
procedimentos. Era necessário ao militar, tecnicamente capacitado, estar apto
142

a agir de forma improvisada se preciso, uma vez que a condução de tropas


no campo de batalha, em face da celeridade das transformações no aparato
bélico, exige, idealmente, alto grau de adaptação e flexibilidade. Esse era um
dos desafios do ensino militar brasileiro nas primeiras décadas da República,
equilibrando a formação técnica com o preparo intelectual, algo nem sempre
bem-sucedido (MOTTA, 2001).
Evidentemente, a mobilização da capacidade industrial para finalidades
bélicas afetou de forma decisiva os rumos das guerras, exigindo o domínio

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de novos conhecimentos e a formulação de estratégias e táticas adequadas ao
novo cenário. Na atualidade, as tecnologias disruptivas58 são um dos assuntos
que mais evidenciam o distanciamento do Brasil diante dos países mais ricos
e industrializados. De interesse desse debate, a PND/END (BRASIL, 2016)
destaca preocupações nada recentes:

2.3.13. Há uma tendência mundial de aumento das desigualdades tecno-


lógicas e de produção entre os países, muito em função do papel desem-
penhado pelas novas tecnologias e pelos investimentos em inovação.
As tecnologias disruptivas acentuarão as assimetrias na área da Defesa,
influenciando o equilíbrio de poder regional e mundial e subvertendo
tradicionais conceitos e lógicas da geopolítica (BRASIL, 2016, p. 18).

Acentuando o problema, o desenvolvimento industrial brasileiro tem,


persistentemente, se demonstrando acanhado. Nos últimos 10 anos, estima-
-se que a produção da indústria, em termos de impactos no Produto Interno
Bruto – PIB, reduziu-se drasticamente. Dados colhidos do portal do IBGE
(https://www.ibge.gov.br/) indicam que a participação da indústria no PIB
encolheu 33% desde 2010. Nesse quadro, temos que “os investimentos fede-
rais em ciência no Brasil nos últimos anos vêm despencando em queda livre,
independentemente do governo”59.
No campo técnico-científico, sendo otimista ao olhar o somatório dos
anos, há conquistas a comemorar, a exemplo da constituição de uma sólida
indústria aeronáutica. Recentemente, destaca-se o lançamento pela Embraer
do KC-390 Millennium, avião de transporte multimissão. O acordo para pro-
dução e comércio de caças F-39 Gripen, entre a Embraer e a empresa sueca
SAAB, traz esperança para o futuro (a linha de produção foi inaugurada
em 2023). São exemplos os esforços no domínio de tecnologia nuclear para
propulsão submarina, em desenvolvimento no Centro Tecnológico da Mari-
nha em São Paulo, e de misseis de cruzeiro e as relevantes aquisições de

58 Em síntese, essa definição corresponde à inovação tecnológica, englobando produtos e serviços, que
provocam rupturas com tecnologias já estabelecidos no mercado.
59 http://portal.sbpcnet.org.br/noticias/crise-na-ciencia-nao-se-deve-so-a-falta-de-recursos/
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 143

blindados pesados, com destaque para novos Leopard e a produção nacional


de blindados sobre rodas Cascavel, o desenvolvimento de satélites com foco
no levantamento de dados para o meio ambiente (ofertando informações de
interesse da defesa, e o Projeto SIVAM – Sistema de Vigilância da Amazônia.
A criação do Centro de Defesa Cibernética (CDCiber), em 2012, foi também
um passo importante para o Estado brasileiro melhor se capacitar para prover
a segurança de dados e informações.
Os esforços acima indicados, em breve amostragem, destacam que há
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interesse em dinamizar o setor da defesa, em que pese o país estar aquém


do desejável. Ao olharmos o ranking internacional, ponderando a realidade
brasileira, pode-se até pensar em contrário. No ranking gerado pela Global
Firepower60, o Brasil está na lista das 15 maiores potências militares mundiais,
estimando-se, para 2023, ocupar o 12º lugar entre 145 dos países considera-
dos para avaliação. Na posição supracitada, o ranking considera não apenas
os aspectos ditos propriamente militares (poder terrestre, naval, aéreo, por
exemplo), mas os recursos naturais, financeiros, população, dentre outros. É
uma posição aparentemente adequada, considerando o histórico recente de
não envolvimento direto do Brasil em conflito armados. Isso não se traduz,
porém, em dados confiáveis que ajudem a avaliar a limitada capacidade de
reagir a ameaças por parte de potências cuja capacidade militar é, notoria-
mente, estratosfericamente superior à brasileira.
No tocante às tecnologias disruptivas, observa-se que o Brasil é sobretudo
consumidor de produtos geradas no exterior, registrando-se alguns esforços
no seu desenvolvimento (RAUEN, 2017). Mesmo em face de um cenário
de ausência de conflitos com envolvimento direto do Brasil, não é coerente
descuidar de um país cujo território é o quinto maior do planeta, não fazendo
fronteira tão somente com Chile e Equador e contando, no Oceano Atlântico,
com uma zona econômica exclusiva que corresponde a uma faixa territorial
de 200 milhas marítimas, algo em torno de 370 km de extensão. Na chamada
Amazônia Azul, ressaltam-se interesses soberanos na área de pesca, explora-
ção de gás e petróleo na camada pré-sal, além de muitas outras possibilidades
em pesquisa, desenvolvimento e comércio. A questão do potencial militar não
envolve, é sempre válido reafirmar, a capacitação militar em si (quantitativo
de tropas, armas, veículos, por exemplo), mas a capacidade da indústria de
defesa atuar com um dos pilares do desenvolvimento tecnológico, favore-
cendo o crescimento econômico com produção de bens de alto valor agregado
e, consequentemente, o bem-estar da população ao colher os benefícios da
soberania científica e tecnológica.

60 https://www.globalfirepower.com/countries-listing.php
144

Nesse conjunto, insere-se o interesse do Brasil na construção da Estrada do


Pacífico, no curso da RILA (Rota de Integração Latino-Americana), conectando
portos brasileiros aos chilenos, por meio rodoviário e ferroviário, percorrendo
território paraguaio e argentino (BITENCOURT, 2021). Posta em funciona-
mento, a Estrada do Pacífico promoverá aquecimento econômico para as nações
envolvidas, estimulando o comércio e o turismo, e propiciando a minimização
de gastos com o transporte náutico. Obviamente, a nova rota afetará os ganhos
do Canal do Panamá e, quiçá, despertará reações de nações que não desejam

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que o gigante chinês se beneficie em demasia do estreitamente de relações
comerciais com os países da América do Sul. Para o Brasil defender seus inte-
resses no continente, suas Forças Armadas deverão estar à altura da missão de
dissuadir ameaças, trazendo segurança para negócios e investimentos.
No centro desse debate, grave e urgente é o problema da desnaciona-
lização da indústria de defesa, com implicações de monta para a autonomia
científico-tecnológica (ANDRADE; FRANCO, 2016) e para o enfraqueci-
mento do poder militar brasileiro. Note-se que o poder militar impacta, his-
toricamente, a capacidade de um país se fazer mais notável nas altas cúpulas
e fóruns internacionais (ARON, 2017). Em vista da capacidade limitada se
fazer notar, em termos políticos e militares, agindo em apoio a outras nações,
há agentes políticos que taxam, de forma provocativa, o Brasil de “anão
diplomático”61. Mesmo considerando outras expressões nacionais de relevo,
como a disponibilidade de recursos naturais, comodities, bens e serviços,
a expressão militar é crucial para favorecer o posicionamento no cenário
internacional, problema que não se limita tão somente à disponibilidade de
recursos monetários, “mas de visão estratégica e de uma política de Estado
que compreenda a necessidade de aumentar os investimentos no setor para
assegurar a competitividade e promover o desenvolvimento econômico e
social do país” (ALISSON, 2018, online)62.

A IA como novo paradigma?

Inserida na discussão das tecnologias disruptivas, uma das questões que


se somam ao conjunto de preocupações é a aplicação da IA em diversas possi-
bilidades de emprego militar. Em suas versões mais difundidas, a IA favorece a
elaboração de cenários de batalha, valendo-se de ambientes virtuais que permi-
tem treinamento em ambiente seguro e controlado, também contribuindo para o
planejamento de missões, coleta e análises de informações para a inteligência e
segurança contra ciberataques. Em face de um universo de milhões de bites de
61 https://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/07/israel-lamenta-decisao-do-brasil-de-convocar-embaixador-em-
tel-aviv.html.
62 http://portal.sbpcnet.org.br/noticias/crise-na-ciencia-nao-se-deve-so-a-falta-de-recursos/
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 145

dados, a IA é um recurso valioso para otimização de processos de decisão, entre


tantas outras aplicações. De preocupante, o emprego da IA, na definição de alvos
e na tomada de decisões autônomas, podendo levar a erros que resultem em mor-
tes de não-combatentes (ARKIN,2012; 2018; HRW, 2015; HOROWITZ, 2016).
O desenvolvimento de tecnologias de IA (aqui não se adentrará aos seus
vários níveis, dados os limites da proposta deste artigo), com destaque para
o machine learning (o “aprendizado de máquina”), é objeto de atenção de
empresas em geral e da indústria militar em particular, que avança na produ-
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ção de drones, robótica avançada e outros instrumentos não convencionais


de combate. Avaliando o cenário, o investimento em IA tem subido expo-
nencialmente: “O investimento global em Inteligência Artificial é liderado
pela China, país que, em 2021, aplicou 622 bilhões de dólares em pesquisa
e desenvolvimento dessa tecnologia. Os Estados Unidos, porém, não ficam
muito para trás, tendo investido 599 bilhões no mesmo ano [...] O Brasil é o
décimo país da lista, com 38 bilhões de dólares” (VIANNA, 2023, on-line).
Diante do emprego da IA no campo de batalha, urge também debater
questões éticas. Inúmeros são os problemas que demandam análises específi-
cas, mas cabem algumas apreciações. De quem seria a responsabilidade pelos
danos causados por meios de combate conduzidos por IA? Ou a IA poderia
minimizar esses riscos? Nessa questão entram perguntas como avaliar o poten-
cial de uma máquina distinguir corretamente alvos civis de alvos militares e
avaliar com segurança ameaças em potencial, o que leva a pensar nos proble-
mas advindos do cenário do emprego generalizado da IA por forças militares
e paramilitares, considerando uma perspectiva de proliferação desse recurso.
O direito internacional humanitário impõe a responsabilização pessoal
pelos chamados crimes de guerra (HRW, 2015). A esse respeito, Ronald Arkin
et al., (2012; 2018) e Horowitz (2016) ressaltam a necessidade de aperfeiçoar
esses mecanismos de responsabilização legal pelos danos causados por robôs
militares programados para tomar decisões autônomas, onde se situam os
militares encarregados das missões. O emprego da IA no campo de batalha
não exclui também a possibilidade da tomada de decisões com base em cri-
térios discriminatórios ou mesmo preconceituosos, partindo de parâmetros
estabelecidos por programações que se utilizem de estereótipos para definir
alvos, como avalia Heather M. Roff (2015).
Seria o emprego da IA a nova “revolução” no campo de batalha, conver-
tendo-se em paradigma da guerra do futuro? A IA é um instrumento poten-
cialmente revolucionário, mas, na avaliação do seu emprego militar, deve se
considerar tanto os riscos, potencialidades e limitações, quanto o deslumbra-
mento capaz de cegar analistas de defesa e entusiastas diante de uma novidade
tão promissora.
146

Considerações finais

O gigantismo do Brasil na América do Sul, em termos de território,


população, recursos naturais e potencial econômico, e a sua integração a
blocos políticos e econômicos, com destaque para o Mercado Comum do Sul
(Mercosul) e o BRICS63, amplia o campo de ação brasileiro e apresenta bene-
fícios e oportunidades, mas não assegura vantagens indiscutíveis no cenário
das disputas internacionais.

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A posição estratégica no Atlântico Sul e os compromissos multilaterais
exigem capacitação em termos de defesa, pois, para se fazer ouvir, não bastam
boas intenções e alianças. Essa afirmação não busca alimentar a rivalidade do
Brasil com outras nações, ou fazer coro à necessidade de mobilizar recursos
para armar o país com se essa fosse a solução para os problemas nacionais.
Desse modo, este artigo visou enfatizar a importância do desenvolvimento
industrial e humano, tendo como premissa beneficiar a população com a
geração de empregos e o crescimento científico e tecnológico, ao passo em
que se capacitam as Forças Armadas à altura dos desafios de uma nação con-
tinental com vocação para atuar em favor do equilíbrio das disputas regionais
e quiçá internacionais.
A necessidade de o Brasil crescer industrialmente implica em investi-
mentos continuados em pesquisa e desenvolvimento. Como alerta o passado
de experiência brasileiro, a fragilidade em termos de preparo militar e ensino,
considerando os recursos militares de alta tecnologia, faz-se presente de longa
data, apontando para a incapacidade de o país reagir prontamente a expressivas
ameaças a sua soberania. Sobre esse aspecto, a desnacionalização da indústria
de defesa deve estar no centro do debate. Ou são estimulados os investimentos
em ciência e tecnologia de ponta, tendo por guia uma visão estratégica, vis-
lumbrando desenvolver autonomia, conhecimentos e capacidades para fazer
frente aos novos desafios, ou ao Brasil estará reservado papel de pequena
grandeza, em dissonância com suas dimensões continentais e humanas.

63 Acrônimo cunhado pela imprensa internacional para designar o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia,
China e África do Sul.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 147

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NA EDUCAÇÃO:
retrocesso e/ou avanço?
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Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização

Introdução

A
discussão sobre Inteligência Artificial tem sido, nos últimos tempos,
uma das temáticas prioritárias na agenda acadêmica e hipermidiática.
Para além das narrativas de ficção científica e do imaginário cole-
tivo, eis que a IA ultrapassou as fronteiras da futurologia, deixando de ser
uma tendência para impor-se como realidade irreversível. Enquanto temática
transdisciplinar, reveste-se de especial importância, uma vez que mantém
conexões com diversas áreas do conhecimento, tanto as que se voltam à ino-
vação tecnológica como aquelas dedicadas à investigação fundamentada nas
ciências humanas e sociais.
Minha proposta para este artigo é resgatar algumas memórias profissio-
nais que podem contribuir para a reflexão sobre a pergunta provocativa que
acompanha a discussão sobre IA, especificamente no que diz respeito à atuação
dos docentes. Afinal, na educação, a IA representa retrocesso e/ou avanço?
Por razões óbvias, não faz mais o menor sentido lutar com a realidade,
ainda que muitos teóricos consistentes se posicionem de forma crítica diante
dos riscos do avanço tecnológico. Se até algum tempo o avanço da IA acompa-
nhava discretamente o desenvolvimento do hardware, do software, das redes e
da robótica, o fato é que nos últimos anos emergiu como onda transformadora
cujas potencialidades estimulam os ânimos dos tecnófilos. De outro modo,
instaurou-se um certo pânico por parte dos tecnófobos que profetizam sobre
um futuro que desperta medo e insegurança. Entre os dois extremos, apesar
das facilidades impregnadas nos superpoderes da IA, do desemprego estrutu-
ral ao plágio, da invasão de privacidade ao roubo da propriedade intelectual
e do deepfake à manipulação social e política, os riscos que dela advêm são
64 Pedagoga, mestra e doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
(USP). Realizou diversas especializações, além de estágio pós-doutoral na Escola de Comando e Estado-
Maior do Exército (ECEME). É docente do quadro do magistério superior do Exército Brasileiro (Centro de
Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias – CEP/FDC), atua como assessora pedagógica na Assessoria
de Liderança e Valores Militares do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), na qual
é editora dos Cadernos de Liderança Militar e, recentemente, passou a integrar a Chefia de Educação e
Cultura (CHEC) do Ministério da Defesa.
152

cada vez mais evidentes e dramáticos. Muito embora as advertências sobre


os perigos sejam desejáveis e necessárias, como a IA deixou de ser tendência
para impor-se como realidade irrecusável e irreversível, somos agora obriga-
dos a refletir com mais disposição sobre os desafios a serem enfrentados no
âmbito educacional.

Retrocesso ou avanço?

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A partir dos anos 90, diversas iniciativas relacionadas à tecnologia edu-
cacional e educação a distância passaram a ganhar relevância nos cenários
nacional e internacional. Para acompanhar as demandas da virada do século,
houve uma verdadeira explosão de softwares educativos, políticas públicas e
ações de capacitação focadas na atualização e instrumentalização dos docen-
tes. Tanto nos governos federal, estadual e municipal como na iniciativa
privada, a informática educativa passou a representar uma das prioridades
da gestão escolar e acadêmica.
A chegada dos computadores às instituições de ensino trouxe consigo
uma série de questionamentos. À época, não raro os argumentos eram apre-
sentados, direta ou indiretamente, contra ou favor da utilização das tecno-
logias nas instituições de ensino, como se o desafio pudesse ser reduzido às
suas vantagens e desvantagens. Para alguns profissionais, principalmente
para os defensores do ideário tecnicista, as tecnologias seriam a solução
para diversos problemas educacionais enquanto, para outros mais céticos,
representaria um novo problema ao assumirem o protagonismo da agenda
de investimentos em detrimento de demandas antigas ainda não atendidas.
Dentre muitas questões, havia uma que geralmente se destacava: afinal,
computadores irão substituir os professores? A resposta frequente a essa
questão candente era, na maioria das vezes, não. A título de exemplo, vale
relembrar um texto clássico de Luiz Fernando Veríssimo, publicado na revista
Nova Escola, em 1990:

Retrocesso
O visitante estranhou porque, quando o levaram para conhecer a sala de
aula do futuro, não havia uma professora-robô, mas duas. A única dife-
rença entre as duas era que uma era feita totalmente de plástico e fibra de
vidro – fora, claro, a tela do seu visor e seus componentes eletrônicos –,
e a outra era acolchoada. Uma falava com as crianças com sua voz metá-
lica e mostrava figuras, números e cenas coloridas no seu visor, e a outra
ficava quieta num canto. Uma comandava a sala, tinha resposta para tudo e
centralizava toda a atenção dos alunos, que pareciam conviver muito bem
com a sua presença dinâmica, a outra dava a impressão de estar esquecida
ali, como uma experiência errada.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 153

O visitante acompanhou, fascinado, uma aula como ela seria num futuro
em que o computador tivesse substituído o professor. O entendimento
entre a máquina e as crianças era perfeito. A máquina falava com clareza
e estava programada de acordo com métodos pedagógicos cientificamente
testados durante anos. Quando não entendiam qualquer coisa as crianças
sabiam exatamente que botões apertar para que a professora-robô repe-
tisse a lição ou, em rápidos segundos, a reformulasse, para melhor com-
preensão (As crianças do futuro já nascerão sabendo que botões apertar.)
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– Fantástico! – comentou o visitante.


– Não é? – concordou o técnico, sorrindo com satisfação.
Foi quando uma das crianças, errando o botão, prendeu o dedo no teclado
da professora-robô. Nada grave. O teclado tinha sido cientificamente pre-
parado para não oferecer qualquer risco aos dedos infantis. Mesmo assim,
doeu, e a criança começou a chorar. Ao captar o som do choro nos seus
sensores, a professora-robô desligou-se automaticamente. Exatamente
ao mesmo tempo, o outro robô acendeu-se automaticamente. Dirigiu-se
para a criança que chorava e a pegou no colo com os braços de imitação,
embalando-a no seu colo acolchoado e dizendo palavras de carinho e con-
forto numa voz parecida com a do outro robô, só que bem menos metálica.
Passada a crise, a criança, consolada e restabelecida, foi colocada no chão
e retomou seu lugar entre as outras. A segunda professora-robô voltou
para o seu canto e se desligou enquanto a primeira voltou à vida e à aula.
– Fantástico! – repetiu o visitante.
– Não é? – concordou o técnico, ainda mais satisfeito.
– Mas me diga uma coisa... – começou a dizer o visitante.
– Sim?
– Se entendi bem, o segundo robô só existe para fazer a parte mais,
digamos, maternal do trabalho pedagógico, enquanto o primeiro faz a
parte técnica.
– Exatamente.
– Não seria mais prático – sugeriu o visitante – reunir as duas funções
num mesmo robô?
Imediatamente o visitante viu que tinha dito uma bobagem. O técnico
sorriu com condescendência.
– Isso – explicou – seria um retrocesso.
– Por quê?
– Estaríamos de volta ao ser humano. E o técnico sacudiu a cabeça,
desanimado. Decididamente, o visitante não entendia de futuro (VERÍS-
SIMO, 1990).

O texto emblemático do escritor anunciava os riscos da supervalorização


do uso de computadores para fins educativos. Entre o deslumbramento com
a capacidade da máquina e a decepção com sua concomitante incapacidade
154

afetiva, a ocorrência inesperada do dedo preso do aluno no teclado da profes-


sora-robô nos leva a pensar na educação como um processo que não se limita
à dimensão racional, uma vez que mantém relação intrínseca com a dimensão
emocional. Diante da expectativa de avanço, o risco de retrocesso emerge
nas linhas da narrativa que apresenta uma conclusão já conhecida intuitiva-
mente no senso comum, mas que ganhou vigor com os estudos recentes da
neurociência: a cognição envolve relações viscerais entre razão e emoção
(DAMASIO, 1996; MORA, 2017).

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À primeira vista, a imagem da professora-robô dava a entender que a
substituição do ser humano pela máquina, em vez de avanço, representaria
retrocesso. Pelos motivos implícitos no texto e muitos outros, para todos os
efeitos seria pouco provável que os aparatos tecnológicos viriam a tomar o
lugar dos profissionais da educação. Entre a professora e o robô, prevaleceria
a professora, sem a possibilidade, ainda que distante e improvável, de coe-
xistência na sala de aula.
Com o passar do tempo, por força das circunstâncias, alguns professores
passaram a se interessar mais pelas tecnologias com vistas ao aperfeiçoamento
de suas práticas educativas, enquanto outros reagiram com desdém ou receio.
Enquanto muitos se limitaram a pensar nas tecnologias como ferramentas de
ensino ou objetos de aprendizagem, com foco limitado nos aspectos didáti-
co-metodológicos, diversos especialistas das áreas tecnológica, psicológica,
filosófica, sociológica e de comunicação passaram a teorizar sobre as impli-
cações e consequências mais amplas e profundas da emergente sociedade da
informação ou sociedade em rede (CASTELLS, 1999; MATELLART, 2022).
Dos computadores às redes telemáticas, a internet desencadeou uma
verdadeira revolução no cenário global e, consequentemente, no contexto
educacional. O processo de globalização, aliado e alinhado com a revolução
tecnológica, culminou no que Lojkine (1995) denominou revolução informa-
cional. Outros autores, como Pierre Lévy (1993, 1999), apontaram acertada-
mente para as potencialidades e desafios trazidos na esteira das tecnologias
da inteligência e da cibercultura ou cultura digital.
Diante do ritmo acelerado das transformações econômicas e socioculturais
decorrentes do avanço tecnológico, a inclusão digital transformou-se, então, num
clamor mundial e passou a constituir a agenda das políticas públicas (WARS-
CHAUER, 2006; DURAN, 2010). A essas alturas, a utilização de computadores
pessoais e celulares conectados à Internet passou a fazer parte do cotidiano
de alunos e professores, de modo que os níveis de apropriação tecnológica
na sociedade aumentaram, independentemente do uso atrelado às práticas de
educação formal nos ambientes escolares e acadêmicos. Das ferramentas de
ensino à cultura de aprendizagem, as tecnologias digitais já não poderiam mais
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 155

ser consideradas tão somente como recursos ou “adereços” pedagógicos, uma


vez que se tornaram parte da própria dinâmica cotidiana da população.
No contexto das redes e, posteriormente, das redes sociais, a pergunta
sobre a substituição dos professores pelos computadores passou, então, a ser
respondida com outra palavra: depende. Diante do rompimento das barreiras
espaçotemporais e da possibilidade de acesso à informação ao toque de um
clique, muitos passaram a se valer de novas formas de aprendizagem para
ampliar seu repertório de conhecimentos para além dos limites da sala de
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aula convencional. Da biblioteca ao Google e da sala de aula ao Youtube, o


fato é que não é mais segredo – e nem tampouco constrangimento – admitir
que, para muitos alunos, a frequência à escola ou à universidade já não faz
mais tanto sentido como antes. Como é de conhecimento comum, as possi-
bilidades de aprendizagem nas diversas plataformas digitais, cursos on-line
e redes sociais passaram a colocar em xeque a qualidade e a efetividade dos
modelos e padrões convencionais de ensino.
Em 2010, quando publiquei o livro intitulado Letramento digital e desen-
volvimento: das afirmações às interrogações, meu objeto de pesquisa era, à
época, o discurso determinista sobre as supostas relações de causa e efeito
entre o uso de tecnologias e desenvolvimento – em suas múltiplas dimensões
(DURAN, 2010). Se, por um lado, continuo sustentando o argumento segundo
o qual a utilização das tecnologias digitais de informação e comunicação
(TDIC), por si e em si mesmas, não pode ser tomada como como sinônimo de
passaporte para o desenvolvimento, as evidências atuais me levam a pensar
que hoje o desenvolvimento depende ainda mais da apropriação tecnológica
nas mais diversas áreas. O digital divide, com o passar dos anos, deu origem
à fratura cognitiva, uma vez que indivíduos e grupos que não são capazes de
se apropriar dos recursos tecnológicos para aprender estão ficando em situa-
ção de desvantagem, praticamente excluídos das oportunidades de trabalho,
emprego e engajamento em fóruns de interesse coletivo.
Em diversas publicações anteriores, argumentei que a lógica reducionista
das tecnologias como meras ferramentas de ensino não mais se sustentava.
Em outras palavras, isso significa dizer que as TDIC não poderiam mais ser
consideradas apenas como ferramentas ou instrumentos, pois se tornaram
elementos fundantes de uma nova cultura de aprendizagem. Seria ingênuo
pensar que teríamos, com as tecnologias digitais, apenas a ampliação das
técnicas e metodologias de ensino, uma vez que estava a caminho uma pro-
funda transformação nos modos de ensinar, aprender, ensinar a aprender e
aprender a ensinar.
Durante a pandemia, publiquei um artigo no jornal da USP para compar-
tilhar algumas reflexões sobre a viralização da educação on-line (DURAN,
156

2020). A meu ver, a pandemia nos colocou direta ou indiretamente diante de


muitas questões complexas, tais como: saúde (qualidade de vida e condições
de trabalho), comunicação (subinformação, superinformação e desinformação)
e defesa nacional (conexão entre geopolítica e guerra cibernética, além da
digitalização progressiva do teatro de operações com risco de vírus virtuais).
A imunidade, no sentido mais amplo da palavra, transformou-se num desafio
a ser prontamente enfrentado pela sociedade global e a educação on-line um
tema prioritário no cenário da crise:

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Nos últimos dias, estamos aprendendo e ensinando sobre coronavírus, uns
com os outros, de forma dialógica. Da teoria à prática e vice-versa, cons-
truímos e atualizamos, diariamente, uma real experiência de aprendizagem
com base em textos, imagens, animações, música, infográficos, vídeos e
um sem-número de aplicativos. Estamos imersos no ciberespaço e às voltas
com a linguagem digital que propicia a multimodalidade (comunicação que
envolve diversos meios e formas), hipertextualidade, interdisciplinaridade
e interatividade. Com a necessidade de evitar o alastramento da pandemia,
os encontros presenciais têm sido evitados, inclusive nas instituições de
ensino formal, o que nos obriga a reconhecer a educação on-line como
alternativa para enfrentar o problema. Inevitavelmente, tal situação nos
obriga a refletir sobre o caráter problemático da educação nacional, uma
vez que não parece razoável supor que apenas uma situação de calamidade
pública seja capaz de trazer à tona questionamentos óbvios vocalizados
por pesquisadores, especialistas, profissionais da educação, alunos e pais.
A educação on-line não pode ser considerada como tendência para fins
de substituição ou complementação da educação formal, em casos de
virulência; mas como realidade instaurada enquanto imposição da época
atual, em caráter de emergência.

A pandemia demonstrou que interconectividade, interatividade, hipertex-


tualidade, interatividade e interdisciplinaridade são indispensáveis nos dias
atuais. Não tenho dúvidas quanto à importância decisiva da transformação
digital no contexto da sociedade contemporânea, mas, apesar disso, continuo
reiterando o mote segundo o qual revolução tecnológica não é sinônimo de
revolução pedagógica. Temos visto, ao longo dos anos, que muito do que foi
chamado de inovação, no contexto educacional, na realidade não passou de
transposição, isto é, modelos instrucionais da sala de aula presencial foram
apenas replicados, com o uso de tecnologias, nos softwares educativos e
ambientes virtuais de aprendizagem repletos de arquivos em pdf. e videoaulas.
Apesar das limitações, há inúmeras experiências que evidenciam o quanto
avançamos no que diz respeito à interatividade e à interdisciplinaridade.
Até aqui, refletimos em termos de alternância, ou seja, nos modos
pelos quais, no contexto educacional, geralmente alguns processos de
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 157

transformação são percebidos como avanço ou retrocesso. Acredito que,


apesar de não ser incorreto, esse raciocínio é incompleto, pois precisamos
aprender a refletir sobre a realidade em sua totalidade contraditória, de
modo se faz necessário rever algumas abordagens para poder enxergar, ao
mesmo tempo, avanços e retrocessos.

Avanço e retrocesso!
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A educação formal tem sido confrontada pela disseminação de um sem-


-número de iniciativas de educação não-formal e informal. A rigor, já nem
sabemos mais se essa categorização ainda resiste às novas modalidades, for-
mas, tipos e alternativas de ensino que se revelam em nossos dias. De acordo
com Santaella (2010), a evolução dos dispositivos móveis de última geração
impulsiona processos de aprendizagem abertos, espontâneos e assistemáticos
que são atualizados de acordo com as necessidades, vontades e preferências
individuais em qualquer lugar e a qualquer tempo:

Transpondo essas características de diversificação e hibridação crescente


da ecologia midiática para o campo da educação evita-se a ideia de que
formas emergentes de aprendizagem e novos modelos educacionais tenham
que necessariamente apagar as formas e modelos precedentes. Quer dizer, e
esta é a tese que pretendo aqui propor: cada uma das formas de aprendiza-
gem apresenta potenciais e limites que lhe são próprios. Por isso mesmo, a
educação a distância não substitui inteiramente a educação gutenberguiana,
assim como a aprendizagem em ambientes virtuais não substitui ambas,
tanto quanto a aprendizagem ubíqua não é capaz de substituir quaisquer
dessas formas anteriores. Ao contrário, todas elas se complementam, o
que torna o processo educativo muito mais rico.

No contexto da pandemia covid-19, o mundo se deparou com uma situa-


ção sui generis que, dentre incontáveis evidências, atestou que não havia mais
razão para subestimar ou rejeitar a incorporação das tecnologias nas práticas
educativas. Em meio ao desespero generalizado, ficou comprovado que a
população aprendeu a lidar com os problemas do coronavírus por meio de
práticas de educação não-formal e informal de forma mais ágil e mais intensa
do que seria possível nos moldes convencionais da educação formal. Muito
do que foi aprendido nem sequer contou com ações diretas de ensino e, para
surpresa de muitos, a tão questionada educação a distância, outrora objeto de
desconfiança e até repulsa, transformou-se na alternativa viável para garantir
a continuidade das aulas. Ainda que não tenha a intenção de discutir termi-
nologia, vale lembrar que, no caso da pandemia, o mais correto seria falar de
158

ensino remoto e, ademais, no ciberespaço a ideia de educação on-line parece


ser mais apropriada que a de educação a distância.
De acordo com a referida autora, o acesso à informação, a comunicação
e a aquisição de conhecimento se tornaram absolutamente ubíquos e pervasi-
vos. A seu ver, a aprendizagem ubíqua não traria um apagamento da educação
formal, mas seu enriquecimento como consequência da complementação de
diferentes tipos de aprendizagem. De fato, há uma década ainda poderíamos

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sustentar que os professores e a educação formal não seriam radicalmente
ameaçados pela diversificação e hibridação da ecologia midiática. Contudo,
diante do progresso exponencial da IA, a discussão sobre a substituição dos
professores pelos computadores, que começou pela negação e passou pela
possibilidade, agora tende a ser uma probabilidade mais próxima. Aliás, não
apenas os professores, mas também as próprias instituições de ensino são
colocadas em xeque por uma série de motivos. Portanto, mesmo que os argu-
mentos sobre a complementaridade ainda sejam legítimos, os riscos de fra-
gilização ou, no limite, de obsolescência das instituições de ensino, tal qual
a conhecemos, são muito maiores.
De acordo com Gabriel (2022), a IA representa o principal condutor das
mudanças tecnológicas no planeta. Ela tende a reconfigurar muitos aspectos
da nossa realidade, de tal modo que está reestruturando o mundo de forma
inédita em relação às outras tecnologias que a antecederam. Do ponto de vista
evolutivo, nos últimos anos a IA inaugurou a era das ferramentas intuitivas,
diferentes das ferramentas que a antecederam, cujo funcionamento era com-
pletamente passivo e dependente das ações humanas:

Com a IA, as ferramentas passam a ser ativas – aprendem, criam sozinhas


e se tornam intuitivas: conseguem prever situações futuras sem a menor
intervenção humana e sem ter que partir do zero a cada nova situação. Mui-
tas vezes, essas ferramentas geram soluções que jamais teríamos condições
de imaginar como seres humanos, mudando completamente as regras do
jogo da vida (e todas as suas dimensões: educação, aprendizagem, negó-
cios, entretenimento etc.) (GABRIEL, 2022, p. 8).

A IA, como todas as tecnologias, traz consigo potenciais benefícios e


malefícios, a depender do curso de sua utilização. No entanto, dada a sua
penetração na dinâmica das mais diversas esferas da vida humana, não faz
sentido, como nas décadas anteriores, ficar se perguntando lentamente sobre
prós e contras, pois é evidente que suas consequências trarão avanços e retro-
cessos. Dito de outro modo, é urgente um posicionamento proativo diante do
desenvolvimento da IA, uma vez que, quanto mais tempo demorarmos para
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 159

conhecê-la e explorá-la em suas potencialidades, mais suscetíveis estaremos


aos seus efeitos indesejáveis no contexto educacional.
Por esse motivo, apesar dos temores legítimos, não há como ignorar ou
recusar a realidade imposta. É preciso conhecer os novos recursos para que
seja possível, então, compreender suas implicações socioculturais e educacio-
nais não apenas no que diz respeito às possibilidades didático-metodológicas,
mas principalmente no que tange aos modos pelos quais as pessoas passam
a se relacionar com o conhecimento, umas com as outras e com tecnologias
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mais recentes. Desse modo, é possível que tenhamos algumas chances de


construir coletivamente algumas alternativas criativas para que as instituições
de ensino possam se valer da IA para promover o tão almejado desenvolvi-
mento humano e social.
Uma das questões mais óbvias, à primeira vista, diz respeito à subs-
tituição dos professores pelas máquinas. Com a chegada do ChatGPT, nos
deparamos com algo surpreendente, já que temos, em poucos segundos, mono-
grafias, poesias, artigos, peças jurídicas e um sem-número de outros textos
produzidos sem esforço humano. Esse fenômeno, acompanhado pelo acesso à
informação nos mecanismos de busca, redes sociais e plataformas de conteúdo,
inevitavelmente nos leva a pensar sobre o sentido da docência nos dias atuais.
No entanto, essa preocupação mantém seu foco no aspecto informativo dos
processos de ensino e aprendizagem, como se, nas relações entre aprendentes
e ensinantes, os conteúdos fossem apenas de ordem factual ou conceitual.
Nessa linha de raciocínio, o risco incide sobre quem ou o que consegue
transmitir mais informação. De acordo com essa perspectiva reducionista,
os relacionamentos construídos na ambiência escolar ou acadêmica estaria
limitados aos aspectos quantitativos da cognição, mais ou menos relacio-
nados ao quanto é possível aprender em certas condições. Quando o foco
recai sobre quanto aprender, parece razoável supor que máquinas são mais
rápidas, econômicas e eficazes do que os seres humanos. No entanto, quando
começamos a refletir sobre como aprender, aí a reflexão de caráter pedagógico
toma outro rumo.

Conclusão

No contexto da revolução tecnológica, inicialmente a grande preocupação


era tornar os profissionais da educação aptos a utilizarem as então denomina-
das ferramentas tecnológicas para fins pedagógicos. A popularização do com-
putador pessoal despertou um senso de urgência modernizante nos ambientes
de educação formal, uma vez que, no mercado de trabalho, a informatização
de processos e a automatização de rotinas já revelavam uma transformação
160

profunda na dinâmica econômica, social e cultural do mundo globalizado.


Apesar dos investimentos em laboratórios de informática e capacitação, a
apropriação tecnológica por parte dos professores foi gradativa e, na maioria
das vezes, voltada para fins pessoais, uma vez que o uso educacional, por uma
série de razões, não foi imediatamente tão expressivo. Com o passar dos anos,
o acesso à internet e às redes sociais, bem como a pandemia da covid-19, con-
tribuíram para que houvesse um salto na compreensão da importância do tema.
Sendo assim, se um dia foi fácil reagir à hipótese de substituição dos

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professores pelos computadores, a exemplo da professora-robô, hoje é pra-
ticamente impossível concordar que um docente-autômato, ou seja, aquele
que tão somente transmite e reproduz informações, não corra o risco de ser
substituído por algum tipo de IA. Por questões de economicidade, praticidade
e efetividade, softwares e sites têm melhor performance para armazenar e
disseminar informações. No entanto, para além de uma visão meramente
pragmática e utilitarista, o x da questão, no caso, não diz respeito à capacidade
informativa dos professores, já superada pelas máquinas; mas ao seu papel
formativo, que envolve, além da dimensão afetiva, a internalização de valores
na dinâmica das relações interpessoais.
Somos forçados a admitir que a IA trará, inevitavelmente, avanço e
retrocesso. Não se trata de uma coisa ou outra, mas das duas coisas. Poderá
trazer avanço se, além de potencializar o desenvolvimento em diversos veto-
res, for capaz de confrontar as instituições de ensino sobre a sua tradição
reprodutivista no intuito de despertá-las para a importância da aprendizagem
significativa como uma das condições para legitimar as práticas de ensino
e sua própria razão de existir nos dias atuais. Fará a educação avançar se
os professores finalmente assumirem a responsabilidade no sentido de se
colocarem como aprendizes ao longo da vida, pois já passou da hora de
entenderem o que é óbvio: não se aprende de uma vez para sempre e quem
trabalha com o conhecimento deve ter, ainda mais que os próprios alunos,
vontade de aprender.
Da própria ameaça das máquinas poderá surgir, a depender do curso das
ações pedagógicas, consciência da importância de se desenvolver, cada vez
mais, o pensamento crítico e criativo. Como é de conhecimento comum, a
IA funciona com base no repertório de dados do qual dispõe, de modo que
fica evidente que, com a intensificação da desinformação, não é difícil que as
respostas oferecidas pela IA possam esconder, até mesmo propositalmente,
vieses e inverdades.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 161

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rus-viraliza-educacao-online/. Acesso em: 2 jul. 2023.

DURAN, Débora. Letramento digital e desenvolvimento: das afirmações


às interrogações. São Paulo: HUCITEC, 2010.

GABRIEL, Martha. Inteligência artificial: do zero ao metaverso. Sâo Paulo:


GEN/Atlas, 2022.

LEITE, Ligia Silva (coord.) Tecnologia educacional: descubra suas possi-


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LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

LOJKINE, Jean. A Revolução Informacional. São Paulo: Cortez, 1995.

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Loyola, 2002.

MORA, Francisco. Neuroeducación: Solo se puede aprender aquello que se


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REICH, Robert. O trabalho das nações: preparando-se para o capitalismo


do século XXI. São Paulo: Educator, 1994.
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ReCeT: Revista de Computação e Tecnologia da PUC-SP, v. 2, p. 17-22, 2010.

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1990. p. 19.

WARSCHAUER, Mark. Tecnologia e inclusão social: a exclusão digital em

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debate. São Paulo: Senac, 2006.
O IMPACTO DA INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL (IA) NO AMBIENTE
MILITAR E NA AVALIAÇÃO DA
APRENDIZAGEM DO SISTEMA
DE ENSINO DO DEPARTAMENTO
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DE EDUCAÇÃO E CULTURA
DO EXÉRCITO (DECEX)
Suzana Marly da Costa Magalhães65
Carlos Alberto Schettini Pinto66
Márcio Vieira Xavier67

Introdução

A
IA já começa a permear os conflitos armados, na guerra contem-
porânea, contribuindo para incrementar a eficiência, a precisão e a
velocidade das operações militares, ajudando na tomada de decisões
em tempo real, ao realizar análises preditivas e melhorar a comunicação
entre as equipes.
Em uma análise prospectiva, considera-se que a IA pode vir a ser usada
para desenvolver e comandar sistemas autônomos de armas e veículos, em
ambientes adversos, sem a necessidade da presença do ser humano. Por sua

65 Pós-Doutora em História Política e Bens Culturais com foco nas Instituições Militares (FGV/RJ). Doutora em
Letras (Université de Paris III – Sorbonne Nouvelle). Mestra em Educação (UFC). Graduada em Pedagogia
(UFC) e Letras (UNIRIO). Especialista em Gestão de Ensino a Distância (UFF). Atualmente é chefe da
Seção de Pós-Graduação do CEP/DC.E-mail: suzanaisgn@gmail.com
66 Doutorando em Engenharia de Produção e Sistemas no CEFET-RJ. Mestre em Engenharia de Produção
e Sistemas pelo CEFET –RJ. Mestre em Operações Militares pela EsAO-RJ. Bacharel em Administração
pela UFRuRJ. Bacharel em Ciências Militares. Assessor da Seção de Pós-Graduação do CEP/FDC. E-mail:
schettini.buco@gmail.com
67 Mestre em Humanidades Ciências Militares (CEP/FDC). Especialista: Neuroeducação (UNINTER).
Psicopedagogia Escolar (CEP/FDC). Administração de Empresa (FGV/SP). Ciências Militares (EsAO).
Bacharel em Ciências Militares (AMAN). Participa do grupo de Pesquisa no CEP/FDC “Neuro Mil da formação
ao combate” desde 2022. Atualmente coordena o Curso de Psicopedagogia Escolar no CEP/FDC. E-mail:
marciovx1260@gmail.com
164

vez, no campo educacional, supõe-se que a difusão da IA irá influenciar consi-


deravelmente as instituições educativas militares, ensejando novas demandas
para o ensino e para a avaliação de aprendizagem.
A esse respeito, é importante destacar que as tecnologias educacionais
não são técnicas assépticas e neutras, mas que geram resultados distintos em
conformidade com os modelos de ensino subjacentes às estratégias e proces-
sos educativos...
Entende-se aqui modelo de ensino como um conjunto de princípios sobre

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o processo de ensino-aprendizagem que norteia as várias formas de ação edu-
cativa. O modelo engloba também as concepções e interpretações de docentes
e alunos que podem ser assumidas conscientemente ou não, uma vez que
“um modelo ‘existe’ sob diferentes facetas: implícito ou explícito, instituído
(como a pedagogia diferenciada) ou consuetudinário (pedagogia tradicional)”
(MORANDI, 2002, p. 141).
Isso posto, este estudo realizou, por meio de pesquisa bibliográfica e
documental, uma reflexão prospectiva sobre os desdobramentos da IA no
ambiente militar e nas práticas avaliativas do sistema de ensino do DECEx68,
problematizando a dinâmica de transformação e de inflexão dos modelos de
ensino mais influentes na construção da sua identidade pedagógica.

O que é a IA?

A IA é um ramo da ciência da computação que tem como objetivo criar


máquinas capazes de realizar tarefas que requerem inteligência humana, como
reconhecimento de fala, visão computacional, aprendizado de máquina, racio-
cínio e tomada de decisões. De acordo com o sítio do IND 4.0, a IA pode ser
descrita ainda como uma solução digital (software) que imita o funcionamento
da inteligência humana na execução de determinadas funções (IND 4.0, 2019).
Já segundo Cônsolo (2020, p. 108) a IA pode ser definida como

A capacidade que a máquina possui de tomar decisões inteligentes com


base em opções preestabelecidas, sem precisar da interação humana. Nor-
malmente, o trabalho é realizado em conjunto com o machine learning,
com o qual o sistema é abastecido constantemente por um banco de dados,
podendo assumir funções que antes eram desempenhadas por pessoas [...]
(CÔNSOLO, 2020, p. 108).

Somente em 1950, Alan Turing foi pioneiro na caracterização de uma


IA, quando publicou na revista Mind o seu artigo Computing Machinery and
68 O sistema de ensino do DECEx engloba a linha bélica, que forma militares combatentes, e ainda a linha de
saúde e a complementar, que preparam militares para o suporte técnico ao combate.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 165

Intelligence, no qual propunha, logo de início, a seguinte pergunta: “as máqui-


nas podem pensar?’’ Esse trabalho introduziu o chamado Teste de Turing, o
qual busca evidenciar a capacidade da máquina em exibir um comportamento
de inteligência semelhante ao do ser humano. Em seu artigo, Turing (1950, p.
9) estabeleceu as bases de um questionamento crítico sobre a IA mostrando
as consequências de criação da capacidade de pensar das máquinas, tendo
em vista o fato de que “nós gostamos de acreditar que o homem é de alguma
maneira sutil superior ao resto da criação (TURING, 1950, p. 9).
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Na sequência, em 1956 foi estruturado o primeiro projeto totalmente


ligado à IA. Foi desenvolvido na Carnegie Mellon University pelos cientistas
Allen Newell, Cliff Shaw e Herbert Simon, que criaram o programa The Logic
Theorist, visando imitar as habilidades de resolução de problemas de um ser
humano, que foi apresentado no Darthmound Summer Research Project on
Artificial Intelligence (DSRPAI).
The Logic Theorist foi capaz de provar muitos teoremas matemáticos,
incluindo o de Pitágoras (a2=b2+c2) e o da incompletude de Gödel. Ele foi
um marco importante na história da Inteligência Artificial, mostrando que as
máquinas poderiam ser programadas para raciocinar e resolver problemas de
forma autônoma, abrindo caminho para o desenvolvimento de outras aplica-
ções e sistemas de IA.
Depois, sob a égide da quarta revolução industrial, a Indústria 4.0 se
apropriou do projeto da IA, caracterizando-se pela busca da integração de
tecnologias avançadas em processos de fabricação, tais como Inteligência
Artificial, internet das coisas, robótica avançada, realidade aumentada e vir-
tual, dentre outras.
Nesse contexto, a neurociência também se interessou pelo estudo da
IA por razões óbvias: a Inteligência Artificial é inspirada no funcionamento
do cérebro humano enquanto a neurociência estuda como o cérebro humano
processa informações. Desse modo, muitos pesquisadores supõem que é pos-
sível a convergência entre a neurociência e a Inteligência Artificial, no sen-
tido de auxiliar na replicação dos processos cognitivos humanos em sistemas
artificiais.
De fato, os modelos de aprendizado de máquina usados na Inteligência
Artificial muitas vezes são baseados em redes neurais, que são estruturas
computacionais que imitam a forma como os neurônios no cérebro se comu-
nicam. Tais redes são projetadas para aprender a partir de dados, assim como
o cérebro humano aprende a partir da experiência.
Assim sendo, é possível vislumbrar várias perspectivas de aplicação
da IA na área educacional, tendo em vista o emprego atual das tecnologias:
166

1. Personalização do aprendizado: a IA pode ser usada para adaptar o


aprendizado ao nível de habilidade, ritmo e estilo de aprendizado de cada
aluno, tornando o processo de ensino mais eficaz e eficiente;
2. Feedback instantâneo: com a ajuda da IA, os professores podem rea-
lizar uma variedade e quantidade maior de avaliações formativas dos alunos,
fazendo uma devolutiva imediata, o que permite que eles ajustem seu apren-
dizado e corrijam suas lacunas;
3. Ensino baseado em dados: a IA pode ser usada para analisar grandes

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quantidades de dados educacionais, tais como desempenho do aluno, histó-
rico de notas e outros indicadores. Tais informações podem ser usadas para
identificar padrões e tendências, ajudando os educadores a tomarem decisões
embasadas sobre o processo de ensino-aprendizagem;
4. Chatbots educacionais: podem ser usados para fornecer respostas
rápidas a perguntas comuns dos alunos e fornecer assistência ao processo
de ensino-aprendizagem;
5. Automação de tarefas administrativas: a IA pode ser usada para
automatizar tarefas administrativas tediosas, tais como correção automá-
tica de provas objetivas, classificação e organização de dados de pesquisa,
permitindo que os pesquisadores e educadores se concentrem em tarefas
pedagógicas mais importantes.
Atualmente, um dos grandes desafios educacionais consiste precisa-
mente no surgimento do ChatGPT, que é um modelo de linguagem natural
que utiliza Inteligência Artificial para construir textos coerentes e plausíveis.
Ele é baseado em uma técnica chamada transformer69, que usa uma rede neu-
ral profunda para processar informações em sequências, tendo sido treinado
com uma grande quantidade de dados para apreender padrões e tendências
na linguagem humana.
Diante das habilidades consideráveis do ChatGPT, como os professores
poderão realizar o planejamento e a execução de suas aulas? Como farão para
redimensionar os instrumentos de avaliação? Na conjuntura atual, supõe-se
que urge tentar ultrapassar o modelo pedagógico ainda vigente da cópia e
da transcrição literal dos textos a fim de “driblar” a tendência dos alunos de
utilização mecânica da IA, superando os cacoetes de um ensino voltado para
os processos de retenção da memória...

69 [3] https://openai.com/blog/chatgpt / https://www.opencadd.com.br/wp-content/uploads/2019/01/dartmouth_


summer_project.pdf
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 167

A IA no ambiente militar

Brown (2020, p. 37) entende que a integração da AI aos conflitos armados


“ainda se encontra limitada, não tendo, ainda, alterado o combate de maneira
significativa, especialmente no nível tático, já que os seres humanos ainda
detêm o controle total’’ (BROWN, 2020, p. 37).
Entretanto, a IA vem sendo amplamente utilizada em várias áreas de
atuação do profissional militar. A sua implementação nas Forças Armadas
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tem como objetivo aumentar a eficiência das operações militares, reduzindo


o risco de perda de vidas humanas. Considera-se que a sua tecnologia pode
ajudar na tomada de decisões em tempo real, fornecendo análises preditivas
e melhorando os sistemas de comunicação entre as equipes militares. Além
disso, a IA pode ser empregada para desenvolver e comandar sistemas autô-
nomos de armas e veículos, os quais podem operar em ambientes hostis sem
a necessidade de um ser humano presente no local.
Sobre o tema, Silva (2021, p. 89) destaca ainda que a Inteligência Militar
seria beneficiada nas atividades de obtenção e proteção de informações, além
de prever um grande avanço nas “disciplinas de Inteligência Cibernética, na
Geointeligência, permitindo uma melhor qualidade na produção do conheci-
mento e no assessoramento à autoridade decisora”.
Por sua vez, Klare (2019) destaca que a IA participaria de diversas ope-
rações, passando pela vigilância e a logística e atuando, inclusive, no campo
de batalha, podendo ser aplicada em todas as funções de combate, tais como a
utilização de veículos autônomos terrestres, drones equipados de armamento
e até nos centros de comando e controle.
A esse respeito, Padilha (2020) mencionou Rob de Wijk, fundador do
Centro de Estudos Estratégicos de Haia70, que se refere “a uma ‘hiper guerra’”,
na qual a tomada de decisões seria acelerada pelo uso de IA, que encurtaria o
ciclo de Observação, Orientação, Decisão e Ação (OODA). Tais avanços pode-
riam ser feitos também com a introdução de armas autônomas e hipersônicas.
Tong (2023) também destaca a reportagem do Jornal South China Mor-
ning Post sobre os militares da China que iniciaram o debate sobre o ChatGPT,
na qual analisam como as Forças Armadas poderiam usar o software de IA

70 [6] https://hcss.nl/
168

na coleta de informação e na guerra cognitiva. A China afirmou ainda que


tem o objetivo de aprender sobre as experiências de guerras dos EUA e dos
países da OTAN, o que proporcionaria um excepcional arcabouço cognitivo
para eficazes simulações de combate. De fato, como a Inteligência Artificial
aprende com seus erros, ao receber uma grande massa de informações, ela
seria capaz de modificar e de desenvolver a estratégia e a tática a um nível
exponencial. Além disso, a Inteligência Artificial pode combater com armas
que ainda estão em desenvolvimento. Isso significa que a IA permitiria criar

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simulações realistas da guerra do futuro, inventando seus próprios métodos
de combate e novos armamentos (SPUTNIK, 2023).
Por mais arrojadas que sejam, tais ideias não são um mero exercício
da imaginação digno da ficção científica, pois, de acordo com o Documento
de Trabalho 06/2018, do Centro Superior de Estudos da Defesa Nacional
Espanhola (CESEDEN, 2018, p. 81), “para manter a vantagem militar, as
capacidades militares precisam ser vistas transformadas pela aplicação de
processamento de dados, conectividade, robótica, autonomia, Inteligência
Artificial (IA) e a Machine Learning (ML)’.
Sobre esse tema, o Monitor Mercantil (2020) destaca ainda que o desafio
do desenvolvimento de drones, robôs e algoritmos diversos de IA para fins
de emprego militar representa uma questão de envergadura maior do que as
redes 5G, podendo transformar completamente o panorama militar mundial
e, consequentemente, as relações de poder.
Quanto ao Exército Americano, Melo (2019, p. 5) destaca os projetos
mais recentes, tais como os drones Perdix da SCO (Strategic Capabilities
Office) da Força Aérea americana e “o projeto Sea Hunter da marinha ame-
ricana, uma embarcação autônoma antissubmarino, e até mesmo o projeto
secreto Ghost Fleet”.
No Brasil, a Marinha do Brasil já utiliza a IA no Programa Estratégico
de Gerenciamento da Amazônia Azul, para identificar padrões de ameaças a
partir de diversas fontes de dados: oriundos de navios-patrulha oceânicos –
“radares de curto, médio e longo alcance (over the horizon – OTH), em terra e
em embarcações, câmeras de alta resolução, dados de inteligência (SIMMAP)”
(FIDOS JR.; PINTO, 2021, p. 68).
Em síntese, considera-se que as aplicações da IA no ambiente militar já
em curso incidem sobre as seguintes áreas:
1. Análise de dados: a IA pode ser usada para coletar, interpretar grandes
quantidades de dados em tempo real, ajudando as Forças Armadas a tomarem
decisões melhor embasadas;
2. Robótica: os robôs podem ser usados para realizar tarefas perigosas
ou repetitivas, permitindo que os soldados se concentrem em tarefas mais
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 169

importantes. Alguns exemplos incluem robôs de desativação de bombas, veí-


culos autônomos e drones;
3. Treinamento militar: a IA pode ser usada para simular situações de
combate e treinar soldados em um ambiente seguro e controlado, ajudando a
melhorar sua eficácia em campo;
4. Operações autônomas: a IA pode ser usada para controlar veículos
autônomos e sistemas de armas, permitindo que as forças militares realizem
operações sem a necessidade de um operador humano.
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Com base no exposto, pode-se dizer que é possível vislumbrar que, em


alguns anos, existirá um campo de batalha transfigurado pela combinação de
diferentes tecnologias com a IA, no qual centenas de drones poderão operar
integrados com robôs e máquinas terrestres sob a coordenação de uma mesma
unidade de IA. A percepção atual é que a sua capacidade de compreensão e
de reação a bruscas mudanças de cenário que costumam acontecer no âmbito
dos conflitos armados será de tal monta que tornará as capacidades cognitivas
humanas obsoletas nessa área (MONITOR MERCANTIL, 2020).

O sistema de ensino do DECEx

Para estimar o impacto futuro da IA no sistema de ensino do DECEx, é


importante realizar primeiramente uma reflexão sobre a identidade pedagógica
desse sistema que se constituiu a partir da assimilação idiossincrásica de três
modelos pedagógicos: a pedagogia tradicional, a Escolanova e o Tecnicismo.
A pedagogia tradicional, “magistocêntrica”, existe no Exército desde
a criação, em 1810, da Academia Real Militar, voltada para o ensino de
Engenharia, que incluía cálculo diferencial e integral e as disciplinas de
física e astronomia, dentre outras, priorizando-se os métodos expositivos
e a demonstração matemática, em detrimento da atividade experimental ou
prática (MOTTA, 2001).
A Escolanova foi introduzida no DECEx somente com a Missão Francesa
(1920-1940), que enfatizou os métodos ativos, centrados no aluno (MAGA-
LHÃES, 2015), a reboque de um projeto de modernização das Forças Armadas
focado no fomento da indústria de defesa (BELLINTANI, 2009). No campo
pedagógico, a Missão Francesa preconizou o trabalho de grupo, por meio do
trabalho de Estado-Maior, e os exercícios no terreno. Além disso, difundiu “a
metodologia de estudo de situação que consistia num método de resolução de
problemas militares” (BELLINTANI, 2009, p. 333), uma estratégia de ensino
consistente com o modelo de ensino da Escolanova.
A Escolanova propunha a adequação do currículo e da didática às neces-
sidades e interesses dos alunos, valorizando as contribuições das ciências da
170

educação, e, em particular, da psicologia, visando ao desenvolvimento pleno


das capacidades e habilidades e atitudes dos alunos (CAMBI, 1995). Nesse
sentido, pode-se dizer que a Escolanova se consubstancia como uma pedago-
gia da recepção, na medida em que busca adequar o ensino às características
psicológicas dos alunos (ALTET, 2018), contestando a mera transmissão de
conteúdos, como preconizava o ensino tradicional.
Na sequência, nas décadas de 1940 e 1950, a Missão Americana favo-
receu, inicialmente, a Escolanova e os métodos ativos, o que se constata nos

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diversos manuais de ensino que organizou em parceria com oficiais brasilei-
ros. Por exemplo, no manual Os métodos de instrução, destinado ao curso
de Artilharia de Costa e Antiaérea, são preconizadas atividades práticas e
contextualizadas de ensino e a integração entre teoria e prática: “o estudante
deve saber como e em que utilizar a informação que recebeu antes mesmo
que tenha realmente aprendido alguma cousa. Ele deve saber aplicá-la em
alguma coisa” (SMITH; MACHADO, 1940, p. 14.)
O enfoque nos métodos ativos, tipicamente escolanovista, congruentes com
o modo de aprender dos alunos, mostra-se também no Manual do Instrutor, de
1955, que considerava que “os processos de ensino e a sequência de instrução
determinam-se pelo estudo da maneira pela qual os homens aprendem, e não
pela maneira segundo a qual a tarefa é executada’’ (T 21-250, 1955, p. 14). Esse
Manual explicitava claramente esse princípio escolanovista, segundo o qual “o
principal critério para ordenar os assuntos consiste em pô-los de acordo com
mentalidade e o grau de percepção dos instruendos’’ (T 21-250, 1955, p. 20).
Entretanto, no início da década de 1960, a influência crescente do beha-
viorismo nos Estados Unidos impactou também a Missão Americana no Brasil.
Tal vertente psicológica definia a aprendizagem como mudança de comporta-
mento a ser obtida por meio de processos de condicionamento – a construção
da associação entre estímulos e respostas comportamentais. Nessa perspectiva,
o behaviorismo enfatizava o papel do ambiente, “limitando-se ao estudo dos
comportamentos manifestos e mensuráveis, descartando a consideração de
eventos internos que ocorrem na mente do indivíduo e atuariam como media-
dores entre os estímulos e as respostas’’ (LOMONICO, 1999, p. 4).
O behaviorismo se traduziu no campo educacional no modelo de ensino
tecnicista, cujo foco era a organização de estímulos para ensejar os proces-
sos de ensino-aprendizagem, preconizando-se o uso de meios audiovisuais,
a instrução programada, as técnicas de ensino e o currículo por objetivos.
No Exército brasileiro, o tecnicismo se manifestou claramente na difusão
da taxionomia dos objetivos educacionais de Benjamin Bloom, que estrutu-
rou gradualmente o Programa-Padrão, responsável pela instrução militar das
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 171

praças no corpo de tropa, e a metodologia de construção curricular do então


Departamento de Educação e Pesquisa do Exército (DEP).
Na sequência, o sistema de ensino do DECEx passou a apresentar traços
escolanovistas e tecnicistas, tanto no campo do ensino quanto da avaliação,
cuja integração nem sempre era bem resolvida.
Esses modelos de ensino nortearam o Processo de Modernização de
Ensino (PME), desencadeado a partir de 1996, que visava preparar os militares
de carreira para o cumprimento de novas hipóteses de emprego, tais como
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as Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Por meio dos métodos


ativos, o PME reconhecia, em seu documento fundador, que o ritmo acelerado
das mudanças exigia, em qualquer atividade, “o exercício de algumas aptidões
particulares relacionadas à sua capacidade de perceber a evolução e de atuar
produtivamente em cenários complexos e dominados pela incerteza (Política
educacional para o ano 2000, 1995, p. 3).
Para dar conta desse cenário complexo e instável, o PME endossou um
princípio escolanovista, o aprender a aprender, que considerava o professor
como um facilitador cujo objetivo deveria ser o desenvolvimento das atitudes
de pesquisa e de autoaperfeiçoamento por parte do corpo discente, “visando
sua instrumentalização para manejar conhecimentos em vertiginoso avanço
na contemporaneidade’’ (WORTMEYER, 2010, p. 1).
Assim sendo, apesar de manter o currículo por objetivos, tecnicista, e um
sistema de avaliação com baremas constituídos de respostas comportamentais, o
PME implementou e potencializou várias práticas pedagógicas inovadoras escola-
novistas, através dos chamados Projetos Facilitadores que visavam a desenvolver
as capacidades intelectuais avançadas, tais como a abstração de conceitos, o
planejamento e o manejo consciente de métodos de estudo pelo aluno – Trabalho
em Grupo; Biblioteca; Informática; Programa de Leitura e Liderança Militar.
A orientação escolanovista foi também endossada pelo ensino por com-
petências, instaurado a partir de 2012, que recriou o antigo Perfil Profissio-
gráfico com base no chamado eixo transversal. Ele explicitou e sistematizou
os componentes que permeiam todo o processo de ensino-aprendizagem e
que sustentam a ação das competências mobilizadas: capacidades cognitivas,
morais, físicas e motoras, atitudes e valores.
Convém ressaltar o fato de que o eixo transversal se inscreve no universo
epistemológico do construtivismo, imbricado à concepção escolanovista, para
quem “em vez de comportamentos ou habilidades como meta da instrução,
são enfocados o desenvolvimento de conceitos e a compreensão em profundi-
dade’’ (TWOMEY-FOSNOT, 1998, p. 28). Assim sendo, até os modelos dos
documentos curriculares serviam para que o docente percebesse a interface
psicológica das competências e dos conteúdos escolares, pois neles constam
172

campos previstos para as capacidades, habilidades e atitudes, consideradas


como algo subjacente ao comportamento observável.
Com base nesse histórico da entrada e da difusão dos diferentes modelos
de ensino no DECEx, pode-se compreender melhor o processo de construção
da identidade pedagógica desse sistema de ensino, marcado pelo princípio
do pluralismo pedagógico, tal como foi ressaltado pelo Art. 3, §5 da Lei nº
9786, de 8 de fevereiro de 1999.
Nesse contexto, problematiza-se se tal diversidade de abordagens peda-

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gógicas não suscitaria eventualmente problemas e aporias nas situações de
ensino e de avaliação, quando os modelos de ensino colidem ou se anulam,
por se basearem em premissas irreconciliáveis sobre a compreensão dos pro-
cessos de aprendizagem e de ensino.
Isso posto, tendo em vista as dinâmicas de transformação e permanência
desses modelos pedagógicos no âmbito do sistema de ensino do DECEx, este
trabalho tem como objetivo estimar qual seria o impacto da IA nos conceitos
e práticas educativas, antecipando as possibilidades de recrudescimento ou
de reversão dos modelos de ensino descritos, principalmente nas práticas de
avaliação educacional.

A avaliação educacional no sistema de ensino do DECEX

Compreende-se até aqui que, no âmbito do DECEx, com destaque para a


parte do sistema que se ocupa da educação profissional militar, encontram-se
ainda as marcas deixadas pela pedagogia tradicional, que se evidenciam nas
abordagens e práticas educacionais que envolvem a transmissão de conhe-
cimento intelectual e estético do professor para o aluno por meio de aulas
expositivas e de avaliações que enfatizam a reprodução de textos. Por sua vez,
as influências da pedagogia tecnicista se mostram na utilização de métodos
e técnicas de ensino voltados para as práticas de condicionamento em busca
da mudança de comportamentos observáveis, priorizando-se a padronização
dos processos educacionais.
Finalmente, o legado da pedagogia da Escola Nova, intensificado nas
últimas décadas no Exército, evidencia-se na defesa de métodos que fomentam
a autonomia do aluno e o acompanhamento gradual do processo de ensino-
-aprendizagem, tais como a pedagogia de projetos e os trabalhos de grupo,
buscando-se, de algum modo, promover a interação em sala de aula e a adap-
tação do currículo escolar e dos procedimentos didáticos às necessidades
individuais dos estudantes.
Para além dos traços desses modelos de ensino, o sistema de avaliação
do DECEx é extremamente rigoroso. Ele prevê vários procedimentos para
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 173

a construção dos instrumentos avaliativos, visando a garantir a igualdade


de condições e a previsibilidade do certame: teste de estimativa de tempo;
elaboração do esquema para atribuição dos escores; análise e testagem de
provas (pilotagem) pela seção técnica de ensino, chefe da divisão de ensino
e comandante; detalhamento prévio das condições de aplicação das provas e
de outros instrumentos de avaliação.
A verdade é que o caráter sistemático das práticas e procedimentos da
avaliação se deve a injunções do sistema de pessoal. Nesse sentido, o pro-
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cesso de avaliação de aprendizagem no Exército está profundamente ligado


a lógicas de gestão, do sistema de movimentação de pessoal, que se baseiam
no valor do mérito intelectual, já que os primeiros colocados podem escolher
a organização militar na qual serão classificados após o término do curso,
sendo os discentes ranqueados de acordo com os graus obtidos.
Entretanto, também é possível identificar os traços dos modelos de ensino
supracitados em vários conceitos e práticas de avaliação. A esse respeito,
sob a influência da Escolanova, as Normas para Avaliação da Aprendizagem
(NAA) vigentes sugerem o uso de uma grande diversidade de ferramentas
de avaliação de aprendizagem, justamente para permitir a ponderação de
diferentes conhecimentos, competências, habilidades e atitudes dos alunos,
o que se contrapõe à prática tradicional de uso exclusivo de prova escrita,
focada somente na aquisição de conhecimentos teóricos:

Art. 17. São tipos de ferramentas de avaliação da aprendizagem: exercí-


cios, situações-problema, prova, ensaio, fichamento simples, fichamento
cruzado, seminário, mapa conceitual (MC), portólio, projeto interdis-
ciplinar (PI), diário de campo, trabalho de conclusão de curso (TCC),
projeto de pesquisa, relatório de pesquisa, parecer técnico, dentre outros
(BRASIL, 2020, p. 11).

Por outro lado, as NAA também apresentam aspectos tecnicistas, já que


exigem a quantificação de escores nos instrumentos de avaliação atrelada à
estipulação precisa das respostas comportamentais no gabarito – a chamada
“solução da casa’’.
A verdade é que a pressão do sistema de movimentação de pessoal e o
valor do mérito intelectual, que são positivos no cenário institucional brasi-
leiro, tão permeado por práticas clientelistas, ensejam, no campo educacional,
uma tendência a “tecnificar’’ o processo de avaliação, no sentido de busca
de precisão e exatidão. Isso resulta em instrumentos de avaliação que enfa-
tizam a obtenção de respostas comportamentais mais simples, que são mais
fáceis de serem pontuadas com escores, e mais coerentes com uma resposta
preditiva no gabarito.
174

A esse respeito, é importante destacar que, ao desenvolver um barema


no gabarito, o instrutor/professor tem que basear no referencial teórico e
epistemológico da disciplina, que é o eixo balizador do desenvolvimento do
conteúdo e das metodologias de ensino utilizadas:

Figura 1 – Exemplo de um barema de avaliação


Em
Não Sim Escores

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Critério Indicadores Parte
Obtidos
0 Até 9 10
Apresentou a relação dos fundamentos da psicopedagogia
com as situações vivenciadas.
Apresentou a relação da avaliação dos problemas de
aprendizagem com as situações vivenciadas.
Desenvolvimento
Apresentou a relação da educação inclusiva com as
situações vivenciadas.
Apresentou as ações do Sgt Monitor, de forma coerente, de
acordo com a UD I, II e III.

Fonte: Os autores (2023).

Ou seja, conforme a tabela apresentada na Figura 1, o docente tem que


distribuir os escores nos indicadores, em conformidade com os conteúdos
ensinados durante a disciplina, referenciados por uma bibliografia.
Esse tipo de barema evidencia a influência simultânea dos modelos de
ensino tecnicista e escolanovista. Por um lado, estabelece critérios de ava-
liação, o que é tipicamente escolanovista, pois antecipa diferentes modos de
desenvolvimento de um texto que relacionem os conceitos de Psicopedagogia,
problemas de aprendizagem, educação inclusiva e as vivências pessoais do
aluno. Tais critérios resultam na estimação de três variações de resposta (“não’’,
“em parte”, “sim”), focadas em algumas capacidades e habilidades complexas.
Por outro lado, tal gabarito também está próximo da pedagogia tecnicista,
pois ainda usa descritores que predeterminam de modo extremamente preciso
as respostas para as questões propostas.
Ora, de acordo com o paradigma escolanovista e construtivista, é preciso
justamente fomentar e avaliar as respostas mais complexas, que envolvem
capacidades mentais avançadas, e elas são justamente as mais difíceis de
serem antecipadas. A sua ponderação exigiria um escalonamento mais signi-
ficativo de descritores para mais de três possibilidades cuja elaboração seria
extremamente árdua para os docentes, considerando as suas condições de
trabalho, visto que acumulam muitas atribuições.
Entretanto, como o sistema de movimentação de pessoal exige o “enfi-
leiramento’’ dos discentes, com vistas a obter uma classificação por mérito
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 175

intelectual, gera-se um processo de “engessamento’’ das práticas de avalia-


ção do processo de ensino-aprendizagem, que resulta em uma simplificação
considerável da avaliação por critérios que é potencialmente rica em ter-
mos pedagógicos.
Desse modo, os instrumentos de avaliação mais utilizados nas escolas
militares tendem a não avaliar adequadamente competências, conhecimentos,
habilidades e atitudes mais sofisticados, inclusive em situações imprevistas,
como se exige atualmente para a atuação dos militares, em face das demandas
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das novas hipóteses de emprego, tais como a guerra cibernética, a guerra de


informação, as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), dentre outras.
Nesse contexto, como o sistema de avaliação atual enfrentaria o fato da
difusão progressiva da IA no âmbito das escolas militares?

Aspectos positivos e negativos do uso da IA no sistema de


avaliação do DECEx

A IA poderia auxiliar os docentes na correção das avaliações dos alunos,


especialmente em instrumentos constituídos de questões objetivas, “de mar-
car”, podendo o docente e o instrutor se dedicarem mais ao aperfeiçoamento
do processo de ensino-aprendizagem em si, preparando melhor as aulas e os
próprios instrumentos de avaliação.
Entretanto, o uso da IA nas escolas apresentaria também aspectos problemá-
ticos que demandam o delineamento de estratégias institucionais em tempo ágil.
Por exemplo, como o sistema de avaliação se adaptaria a um gabarito/barema com
uma infinidade de possíveis respostas, passíveis de serem elaboradas pela IA?
Se o instrutor/professor utilizar uma prova com consulta, e o aluno se valer
de IA, tal como o Chatgpt, como seria feita a estimação do tempo de avaliação?
Além disso, existe a necessidade de ensinar os alunos a fazerem um
escrutínio ético dos textos produzidos pela IA, pois é sabido que essa ferra-
menta desenvolve a resposta usando cópias não fidedignas das fontes biblio-
gráficas e sem crivo de seleção textual.
Poderiam ser levantados ainda outros questionamentos relevantes. De
quem seria a autoria de um seminário, para se saber se foi construído de modo
autoral ou por meio de IA? Ou ainda, quais seriam os mecanismos para se
verificar o plágio de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)? O uso da IA
seria um fator inibidor da pesquisa do aluno ou poderia se tornar um suporte
indispensável para o fomento de um pensamento crítico?
Sobre isso, pode-se antecipar também um conflito entre as práticas de
uso da IA pelos alunos e a cultura do mérito vigente no Exército, o que gera-
ria o repúdio à IA, que ensejaria a “cola’’ ou “pesca”, com implicações éticas
176

e disciplinares de extrema gravidade, uma vez que resultariam na expulsão


do discente.
Uma das possibilidades da difusão da IA no sistema de ensino do DECEx
seria também o reforçamento de alguns elementos do modelo de ensino tra-
dicional, tais como o uso exclusivo da prova escrita, na qual seria inviável
o uso da IA, o que seria um retrocesso no uso dos métodos ativos que se
difundiram desde a Missão Francesa, como já foi mencionado neste estudo.
Assim, seriam descartados os outros tipos de instrumentos de avaliação, mais

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focados no processo de aprendizagem, e não na obtenção de resposta compor-
tamental precisa, que seriam aplicados em situações próximas da realidade da
vida profissional, exigindo, por exemplo, a consulta livre, em ambiente não
controlado, de fontes bibliográficas e documentais.
Outra consequência poderia ser a intensificação do modelo tecnicista na
construção de baremas, exigindo-se mais precisão nas respostas do gabarito,
para desbordar da IA dificultando ainda mais as condições de trabalho dos
instrutores e docentes e ensejando uma mediocrização do sistema de avaliação.
Diante dessas possibilidades, deve-se problematizar como é possível
preparar os militares para a guerra do futuro, realizada por drones, robôs e
algoritmos de IA para fins de emprego militar, em um sistema de ensino que
se recuse a utilizá-la...
A verdade é que é preciso enfrentar o fato de que a IA deve revolucionar
os conflitos armados do século XXI, além da economia, a política e a edu-
cação, de uma forma irreversível nas próximas décadas, tornando as novas
gerações tão diferentes das atuais quanto as gerações contemporâneas do
advento do computador e da internet o foram daquelas formadas na cultura
alfabética, linear, do livro impresso.

Conclusão

As Forças Armadas que não possuírem capacidade tecnológica para ope-


rar com autômatos e IA estarão em desvantagem quando enfrentarem qualquer
potência que possua tais capacidades. Uma ideia que corrobora esse ponto de
vista é que os softwares com IA podem ser utilizados na detecção de padrões
da população ou mesmo das forças adversas e direcionar ataques informa-
cionais, potencializando conflitos entre vários segmentos da sociedade. Eles
podem também aprender o “modus operandi” do inimigo e preparar formas
alternativas de contra-ataque.
Nesse contexto, a preparação profissional dos militares de carreira para
um novo ambiente operacional marcado pelas tecnologias emergentes, dentre
as quais se destaca a IA, deveria se iniciar nos bancos escolares cuja missão,
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 177

no âmbito do Exército Brasileiro é, majoritariamente, do DECEx e de seus


estabelecimentos de ensino.
Isso posto, a partir de uma reflexão histórica sobre a difusão dos modelos
de ensino nas escolas militares, tais como a Pedagogia tradicional, o Tecni-
cismo e a Escolanova, e da análise das diferentes possibilidades de introdução
da IA nos conflitos armados, realizou-se uma prospecção do impacto da IA
no ambiente militar e no âmbito do sistema de ensino do DECEx, com foco
na avaliação educacional, destacando que a sua difusão pode recrudescer ou
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alterar alguns aspectos desses modelos de ensino.


Ressaltou-se a necessidade de enfrentar as consequências positivas e
negativas da IA nas instituições educativas militares, percebida como parte
integrante da vida pessoal e profissional dos militares no futuro próximo. É
preciso também salientar o fato de que o sistema de ensino precisa se preparar
para esses desafios por meio da criação de fóruns de discussão permanentes
nos órgãos de direção setorial de ensino tais como o DECEx e o Departamento
de Ciência e Tecnologia (DCT), com a participação das escolas militares, no
intuito de adaptar normas de ensino e de adequar os cursos de preparação
de gestores de ensino e de instrutores a práticas curriculares, didáticas e de
avaliação que ponderem a IA e o seu uso criterioso em contexto escolar.
178

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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
E O LUGAR DA CONSCIÊNCIA
NO ESPAÇO EDUCACIONAL
Cristina Novikoff71
Tigernaque P. de Sant’ana Junior72
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Andrei Novikoff Mithidieri73

Introdução

A
presentar as abordagens da Inteligência Artificial (IA) contidas na
literatura científica e identificar suas aplicações e implicações no
contexto educacional para pensar sua relação com a consciência, no
ensino, é o objetivo do presente texto nesta edição da Humanis 2023.
É notória a presença da IA na vida social de abrangência global e local,
via assistentes virtuais, sistemas de recomendação, reconhecimento facial,
tradução automática, jogos de computador e em uma variedade de outras
tecnologias. Assim, abordar a IA como linguagem de programação para o
ensino é razoável quando se observa que ela está cada vez mais presente nas
Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), como assistentes virtuais
de voz e chatbots educacionais, como a Alexa da Amazon, o Google Assis-
tant e o Duolingo. Ela favorece uma relação entre o ensino e a aprendizagem
de modo lúdico ou sistemático, remodela os ambientes educacionais e vem
ganhando espaço no cotidiano dos alunos. As diferentes abordagens de pes-
quisa para aprendizagem, por meio de jogos de perguntas e respostas, ofere-
cem informações pertinentes para o processo educacional e são estratégias
amplamente utilizadas em salas de aula, tanto presenciais quanto virtuais.

71 Doutorado em Psicologia da Educação (PUC-SP). Professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências


Militares e Humanidades do Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC). Líder do
Laboratório do Grupo de Estudos e Pesquisas em Representações Sociais na/para Formação de Professores
(LAGERES/CNPq). Líder do Grupo de Pesquisa NeuroMil: da formação ao combate (CDESM). E-mail:
cristina.novikoff@gmail.com
72 Mestre em Humanidades em Ciências Militares (CEP/FDC). Professor do Programa de Pós-Graduação em
Ciências Militares do Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC). Doutorando em
Ciências Militares do Instituto Meira Mattos da ECEME. E-mail: tigermbax@hotmail.com
73 Graduado em Engenharia de Produção pelo centro Universitário de Volta Redonda – UNIFOA. Técnico do
Laboratório do Grupo de Estudos e Pesquisas em Representações Sociais na/para Formação de Professores
(LAGERES/CNPq). E-mail: andrei.novi@yahoo.com
184

Essas práticas visam auxiliar os estudantes na busca por recursos educativos


e promover um ambiente de aprendizado engajante.
As buscas por informações no ensino para a construção de conhecimentos
são ampliadas com o auxílio da IA. Suas múltiplas aplicações inferem em
diversas outras áreas, para que se possa criar políticas públicas para promo-
ver uma formação sólida que prepare os profissionais para lidar com essas
questões éticas, incentivando a reflexão crítica sobre as aplicações da IA
no contexto educacional para além da fundamentação técnica. Cabe, assim,

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propor reflexões sobre as aplicações formativas com uso de IA.
A questão levantada é acerca do papel do ensino no desenvolvimento
da consciência, como função superior pautada por estudos nas neurociências,
filosofia e psicologia, considerada como de natureza humana e relacional.
Portanto, a pergunta de partida é: como a IA está sendo entendida na literatura
científica e qual é o lugar da consciência no processo de ensino com o uso dessa
linguagem? O pressuposto teórico é de que sistemas, plataformas e ferramentas
que usam a IA favorecem o desenvolvimento do aprendizado formal, mas ainda
carecem da mediação do professor para o desenvolvimento da consciência.
A metodologia está pautada por estudo exploratório de natureza qualita-
tiva com a revisão sistemática de dados conceituais e informacionais, com o
objetivo de discutir criticamente a relação entre IA e consciência no contexto
do ensino formal. Os textos selecionados abrangem duas categorias principais:
livros e periódicos com classificação Qualis A. Ambos contêm os seguintes
descritores: “Inteligência Artificial”, “consciência” e “ensino”. O critério
de inclusão para os artigos publicados em periódicos foi temporal, ou seja,
aqueles editados entre 2020 e 2023 na área temática das ciências humanas.
O critério de exclusão adotado foi a ausência de registro de download do
artigo. A busca foi realizada nas bases de dados da plataforma de periódicos
da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes),
especificamente na SciELO. O período de revisão abrangeu o intervalo de
2010 a 2023, que corresponde a um tempo significativo de estudos sobre o
tema da IA (VICARI, 2021), levando em consideração a relevância do Cha-
tGPT no período de transição entre 2022 e 2023. Os livros, totalizando 15
exemplares, foram selecionados por tema, independentemente do período
de publicação.
Dos 132 artigos encontrados, 23 foram selecionados e, após a filtragem
pelo número de downloads, apenas cinco representaram os indexadores de
interesse para o presente texto. Os artigos e livros foram tratados na TABDN
(NOVIKOFF, 2010). Essa tabela contém três seções: duas seções de descrição
de textos e uma seção de análise e interpretação textual. A primeira seção
corresponde à descrição do resumo do artigo; a segunda, à descrição dos
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 185

elementos científicos distribuídos em cinco dimensões, a saber: epistemoló-


gica, teórica, técnica, morfológica e analítico-conclusiva; e a terceira seção
é destinada à elaboração de texto crítico do artigo estudado. Essa última e a
dimensão teórica foram eleitas e recortadas para serem trabalhadas neste artigo.
Para orientar o leitor, o texto está dividido em três seções. A primeira
descreve a literatura, com apresentação de definições de IA e algumas apli-
cações no ensino. Em seguida, a apresentação de argumentos críticos sobre
o lugar da consciência no aprendizado, encerrando-se com a descrição de
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estratégias propositivas para o ensino mediado por IA.

Ferramentas educacionais com IA74

Em Arbix (2020) são elencadas duas abordagens distintas de IA: as deno-


minadas narrow AI (IA estreita ou fraca) e as designadas como general AI (IA
geral ou forte). A narrow AI é capaz de realizar tarefas complexas, mas com
um escopo limitado, como identificar padrões, redigir textos, compor músicas
e diagnosticar doenças. Ela se baseia em machine learning e depende de dados
para aprender e executar tarefas específicas. No entanto, não consegue lidar
com emoções, pensamento ou autoconsciência. Por sua vez, a pesquisa sobre
strong AI (IA forte) busca desenvolver máquinas com inteligência similar à
humana, capazes de executar tarefas intelectuais e exibir certo grau de cons-
ciência e emoção. Alguns pesquisadores temem que essas máquinas avançadas
possam se tornar uma super AI, ameaçando a existência humana.
Para trabalhar os tipos de ferramentas de IA, demonstra-se, inicialmente,
o estudo sobre a percepção dos professores com relação ao impacto das novas
tecnologias na profissão docente de Parreira, Lehmann e Oliveira (2021).
Os pesquisadores identificaram a percepção dos professores acerca dessas
inovações tecnológicas como primeira geração e as de segunda geração,
representadas pelos sistemas de IA. Os pesquisadores também levantaram
os impactos percebidos pelos docentes e as possíveis soluções para lidar com
os desafios que surgem na prática docente. A análise a respeito das percepções
dos docentes apresentou os seguintes resultados:

• Atitude positiva com relação às inovações de primeira geração,


considerando-as desenvolvedoras das competências humanas.
• Reconhecimento da necessidade de controlar os efeitos negativos
das tecnologias de primeira geração por meio do desenvolvimento
de competências transversais.

74 No presente artigo adotaram-se as grafias IA (Inteligência Artificial) e IAG (Inteligência Artificial Geral) que
são as mais utilizadas na literatura vigente.
186

• Dificuldade de distinguir entre tecnologias de primeira e segunda


geração ao avaliar o impacto no trabalho, embora cientes de que
haverá mudanças significativas no perfil de competências.
• Consciência de que as competências interpessoais e conceitual-es-
tratégicas serão fundamentais em suas futuras atuações.
• Compreensão de que flexibilidade e capacidade de adaptação serão
essenciais para enfrentar os desafios futuros.
• Reconhecimento de que as competências transversais são a base da

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flexibilidade e da capacidade adaptativa.
• Alinhamento com estudos sobre equipes mistas de humanos e sis-
temas de IA.

A partir desse lugar de percepção docente, é importante lembrar o papel


social da educação de democratizar o ensino com os diferentes tipos de
ferramentas educacionais com e sem uso da IA. As primeiras são os livros
didáticos ou de literatura, quadro de giz e flipchart que não usam linguagem
computacional. O segundo grupo é composto por máquinas dotadas de IA.
Essas, oriundas do campo da ciência da computação, usam a linguagem de
programação ou um conjunto de instruções e regras utilizadas para criar algo-
ritmos e sistemas de IA. Tais linguagens são projetadas para permitir que os
programadores comuniquem e instruam os computadores a executar tarefas
específicas relacionadas à IA, como aprendizado de máquina, processamento
de linguagem natural, visão computacional e aplicações como Python, R, Java,
C++, entre outras. Essas linguagens fornecem estrutura e recursos específicos
para a implementação de algoritmos e modelos de IA. Portanto, a IA envolve
a criação de algoritmos e modelos computacionais que possibilitam que as
máquinas ajam de forma autônoma, busquem dados, aprendam com experiên-
cias anteriores, tomem decisões, resolvam problemas e interajam com seres
humanos e com o ambiente (GOODFELLOW; BENGIO; COURVILLE,
2016; DOMINGOS, 2018; GABRIEL, 2022).
O objetivo da IA é capacitar as máquinas a executarem tarefas que nor-
malmente requerem habilidades cognitivas humanas, como compreensão de
linguagem natural, reconhecimento de voz, visão computacional, tomada de
decisões, aprendizado, raciocínio lógico, resolução de problemas complexos e
adaptação a situações novas, causando impacto na sociedade, na economia e no
Estado (VAINZOF; GUTIERREZ, 2021). Ademais, tanto o estudo e pesquisa
quanto o impacto nessas três esferas dependem do ensino com, na e para o uso da
IA. Daí a importância de entendê-la, como se descreve no decorrer deste tópico.
Diferentes abordagens e técnicas dentro da IA, como aprendizado de
máquina (machine learning), redes neurais artificiais, lógica fuzzy, algoritmos
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 187

genéticos, processamento de linguagem natural e robótica, entre outros, cor-


respondem a uma área da IA que se concentra em treinar os sistemas para
aprender com dados e aprimorar seu desempenho ao longo do tempo, sem
serem explicitamente programados para cada tarefa (ROSA, 2023).
Nessa direção, as ferramentas educacionais que incorporam a IA visam
melhorar o processo de ensino-aprendizagem. A seguir, são apresentadas
algumas delas já em uso nas escolas e universidades.
Segundo Gabriel (2022), as plataformas de ensino on-line que utilizam
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IA e a internet para fornecer uma ampla variedade de recursos e conteúdos de


aprendizagem vêm crescendo, sem retorno. Elas oferecem uma forma flexível
e acessível de educação, permitindo que os alunos acessem materiais didáticos,
participem de aulas, realizem atividades e interajam com professores e outros
alunos, tudo por meio de uma plataforma virtual.
Essas plataformas têm se tornado cada vez mais populares, especialmente
em razão dos avanços na tecnologia e da necessidade de ensino remoto durante
a pandemia de covid-19. Entre os diversos benefícios, tanto para as instituições
de ensino como para os alunos e educadores, estão o ambiente de segurança,
a economia, a liberdade de horário de estudo, entre outros.
Em linhas gerais, os benefícios organizacionais ou institucionais incluem
oferecer o acesso global, alcançando alunos em diferentes partes do mundo,
permitindo que pessoas de diversas localidades tenham acesso à educação de
qualidade, independentemente da distância. Também propiciam aos alunos a
possibilidade de estudar em seu próprio ritmo, definindo seus horários de estudo
e adaptando a aprendizagem de acordo com suas necessidades individuais. Outra
implicação no uso de plataformas educacionais, segundo Gabriel (2022), é a
inclusão e a equidade educacional ao proporcionar a aprendizagem personali-
zada com atividades adaptadas para atender às necessidades específicas de cada
aluno. Elas podem fornecer feedback imediato, adaptar o conteúdo com base
no desempenho do aluno e disponibilizar recomendações personalizadas para
o aprendizado. A variedade de recursos também agrega valor às plataformas de
ensino, quando dispõem de uma ampla gama de materiais didáticos, como vídeos,
apresentações, textos, quizzes interativos e fóruns de discussão, enriquecendo a
experiência de aprendizagem e facultando variadas formas de abordar o conteúdo.
Com relação à dinâmica de promover a interatividade, destacamos os
Sistemas de Tutoria Inteligente (STI), definidos como:

[...] sistemas diseñados para replicar la efectividad de la tutoría humana en


herramientas digitales– ayudan a los estudiantes a comprender las carac-
terísticas de los lenguajes de programación específicos y desarrollan sus
habilidades generales de resolución de problemas (RODRÍGUEZ CHÁ-
VEZ, 2021, p. 175).
188

Esses sistemas entram para ganhar espaço no processo de ensino e


aprendizagem. Eles podem identificar as necessidades individuais dos alu-
nos, fornecer feedback adaptativo, sugerir recursos relevantes e acompanhar
o progresso do aprendizado.
Rodríguez Chávez (2021) analisou os vários Sistemas Tutores Inteli-
gentes (STI) utilizados no ensino superior pelo apoio na aprendizagem das
diversas áreas educativas, bem como pelas técnicas de IA empregadas para
seu desenvolvimento e aplicação. Com base na exploração da literatura sobre

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a aplicação dos STI no Ensino Superior e assumindo que o principal objetivo
desses sistemas é identificar o nível de aprendizagem em uma área do conheci-
mento para oferecer suporte no processo de ensino-aprendizagem e estimular
os estudantes, ele observou que alguns sistemas fazem uso da gamificação
para evitar desinteresse e tédio. No entanto, a análise exploratória dos STI
adotados no ensino superior como apoio ao aprendizado em variadas áreas
do conhecimento mostra que a incorporação desses sistemas na educação
ajuda a resolver o problema do ensino ao considerar que todos os estudantes
têm necessidades de aprendizagem diferentes e formas distintas de aprender.
Nesse sentido, os STI desempenham um papel muito importante, uma
vez que foram criados para identificar as fraquezas e as necessidades de
aprendizagem individuais, estabelecendo assim uma metodologia de ensino
adequada para cada caso.
Vicari (2021) pontua que a tradução simultânea de texto e voz já está
integrada a várias aplicações educacionais, como “Learning Management
System” (LMS), Massive Open On-line Course (MOOCs) e STI. Esses, por
possuírem um componente chamado “modelo do aluno”, registram infor-
mações importantes sobre o aluno, como estilo de aprendizagem e estado
emocional com relação ao conteúdo educacional.
No rol de ferramentas, os smartbooks destacam-se por trabalharem o
conteúdo ensinado pelos STI, como equações de primeiro grau, e oferecem
desafios educacionais personalizados para cada aluno, sem desviar do con-
teúdo principal.
Entre as vantagens da IA para o aprendizado do aluno, mesmo no ensino
on-line realizado a distância, as plataformas educacionais oferecem recursos
que permitem a interação e a colaboração entre os alunos, como fóruns de
discussão, chats e atividades em grupo, promovendo a troca de ideias e o
trabalho colaborativo (VICARI, 2021).
Nesse contexto, começamos com o papel da consciência no processo de
ensino e a aprendizagem. Entre as funções superiores, ela é quem situa o sujeito
“ensinante” e o aprendente na condição de vontade de ensinar e aprender. Essa
relação bivalente é a prevalente – ambos ensinam e aprendem. O ato de ensinar
descola do ensino de abordagem verticalizada e passa a ser dialético.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 189

Outra aplicação da IA para personalizar o conteúdo de ensino são as


Plataformas de Aprendizado Adaptativo (PAA). Elas usam IA para persona-
lizar o conteúdo do ensino de acordo com as habilidades e as necessidades
dos alunos. Também adaptam o ritmo, a sequência e o nível de dificuldade
do material de ensino para maximizar o engajamento e o aprendizado dos
estudantes (CAMPOS; LASTÓRIA, 2020).
Os algoritmos de IA também são empregados em sistemas de correção
automática de provas e ensaios. Essas ferramentas podem analisar e avaliar as
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respostas dos alunos, fornecer feedback imediato e até mesmo atribuir notas
com base em critérios predefinidos. O tema sobre a avaliação é polêmico,
considerando as tradicionais discussões sobre avaliação e sua validade para
a formação do aluno. Não cabe aqui fomentar o debate, mas inquietar o leitor
para gerar reflexões.
Entre o processo de avaliação, as ferramentas de detecção de plágio com
os algoritmos de IA são aplicadas para avaliar e identificar plágio em trabalhos
acadêmicos. Essas ferramentas comparam o texto submetido com uma ampla
base de dados para detectar possíveis trechos copiados.
À medida que a tecnologia avança, aumenta a probabilidade de surgi-
mento de novas ferramentas e abordagens que aproveitem a IA para melhorar
a experiência de aprendizagem, além de oferecer suporte aos estudantes e
educadores (LEE, 2018; 2019; ROSA, 2011).
Vale salientar que as plataformas de ensino on-line não substituem com-
pletamente a interação presencial em sala de aula e o contato direto com pro-
fessores e colegas. Elas devem ser vistas como ferramentas complementares
que podem enriquecer o processo de aprendizagem e proporcionar oportuni-
dades de educação mais flexíveis e acessíveis.
Ressaltamos que a IA atual ainda está longe de atingir a mesma capa-
cidade e generalidade da inteligência humana, como pensam os adeptos do
ChatGPT. Esse robô virtual criado pela OpenAI é um dos problemas éticos
em debate pelo seu potencial de representar a Inteligência Artificial Geral
(IAG), considerado uma ameaça para inúmeras profissões, como a de profes-
sor. No presente artigo, não se adentra na discussão, no entanto pontuamos
que, embora seja capaz de realizar tarefas específicas de forma eficiente, o
chatbot GPT-5, como a promessa da OpenAI de torná-lo indistinguível de um
humano e atingir a IAG ainda enfrentará desafios, se não, pelo menos na com-
preensão de contextos amplos, ele estará no limite do raciocínio abstrato e na
adaptação a situações complexas e imprevistas. Portanto, a sua capacidade de
não diferenciar as reais motivações do ser humano ao solicitar informações ou
“criar cenários”, poderá impedi-lo de evitar atos contra a humanidade. Aqui, a
consciência é um caro tema a ser desenvolvido e separa homem de máquina.
190

Nessa linha, Campos e Lastória (2020) assinalam que, para formar um


pensamento crítico, é necessário confrontar a dessensibilização e a indife-
rença com relação ao sofrimento, bem como expor as facetas desagradáveis
e desconfortáveis nos algoritmos que moldam a cultura digital. A educação
desempenha um papel crucial nesse processo, indo além do conteúdo progra-
mado e revelando as contradições econômicas, políticas e sociais ocultas nos
dispositivos tecnológicos. Ao fazer isso, os autores afirmam que a crítica tem
o potencial de resgatar, de forma negativa, as possibilidades emancipatórias

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das tecnologias digitais. Daí assinalar a importância do papel da consciência
em conhecer para analisar criticamente a cultura digital.

Consciência: função superior

A consciência é um objeto essencial para pensar a educação. Como um


processo sistemático e intencional, a educação busca desenvolver as capacida-
des e as habilidades cognitivas, emocionais, sociais e culturais dos indivíduos,
de maneira a possibilitar sua inserção e participação na sociedade. Desse
modo, tanto a educação formal realizada em instituições educacionais, como
escolas e universidades, quanto a não formal, quando ocorre em ambientes
não escolares, são um movimento/processo que exige a “volitividade”. Essa
capacidade ou qualidade de uma pessoa de ter vontade própria, tomar decisões
e agir com base em suas próprias escolhas e desejos é fundamental para que
a aprendizagem ocorra e se torne significativa. Está relacionada à habilidade
de exercer o livre-arbítrio e de agir de acordo com as próprias intenções,
motivações e preferências.
A consciência encontra-se diretamente associada à “volitividade”, a qual,
por sua vez, está associada ao domínio da vontade, à capacidade de realizar
escolhas conscientes e de se envolver em ações autodeterminadas. É um
aspecto importante da autonomia e do controle pessoal sobre as próprias
ações e decisões.
No contexto psicológico, a “volitividade” está relacionada ao estudo
da motivação, do autocontrole e do processo de tomada de decisão. Envolve
aspectos como a definição de metas, a perseverança diante de obstáculos, a
capacidade de resistir a impulsos e a motivação para atingir objetivos.
Vygotski (1996), ao tratar de sua teoria da aprendizagem, trabalhou seus
conceitos e teorias relacionados ao desenvolvimento da vontade como parte
da afetividade e da capacidade de autorregulação, que podem ser entendidos
como aspectos fundamentais da “volitividade”.
A volição ou vontade, na perspectiva vygotskiana, é uma função psi-
cológica superior que se desenvolve ao longo do tempo, impulsionada pelas
interações sociais e pelo contexto cultural em que a criança está inserida. Ele
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 191

enfatizou a importância do ambiente social no desenvolvimento da volição,


argumentando que as crianças aprendem a regular suas ações e a controlar
seus impulsos pela mediação de outras pessoas (DUARTE, 2000).
Além disso, Vygotski enfatizou a importância das ferramentas psicológi-
cas como linguagem, símbolos e instrumentos culturais, no desenvolvimento
da volição. Por meio da internalização dessas ferramentas, as crianças são
capazes de regular seu comportamento de forma cada vez mais independente
e consciente.
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Apreende-se, com a teoria da subjetividade histórico-cultural (GON-


ZÁLEZ-REY, 2009), que a “volitividade” seria a capacidade de uma pessoa
exercer sua vontade e agir de forma autônoma, determinando suas próprias
ações e decisões com base em seus desejos e intenções, será fundamental para
a aprendizagem, além de estar associada à consciência.
A consciência é socialmente mediada de alguma coisa (VYGOTSKI,
1996), sempre dinâmica, em movimento e não é mecânica nem se associa à
soma de informações, uma vez que:

A cognição humana é uma produção, onde o processamento de infor-


mações representa apenas um momento de um processo complexo, cujo
aspecto central é a produção de ideias e modelos que não são resultado
de informações recebidas, mas sim das produções do sujeito sobre elas
(GONZÁLEZ-REY, 2009, p. 6).

Com Gonzáles-Rey (2009), é eleita a forma conceitual, para além da


definição, a fim de pensar o termo consciência, considerando aquele envolver
resposta a um problema (DELEUZE; GUATTARI, 2009) e não se limitando
à base categórica do delineamento por características fixas das definições. Ao
se referir a significados que são dinâmicos e apresentam sentidos de acordo
com a abordagem filosófica de ancoragem ao termo em estudo, adotamos
trabalhar com o conceito de consciência e não com a sua mera definição.
Desse modo, o conceito amplia as possibilidades de se pensar as formas de
resolução do problema da relação estabelecida entre a IA e o ensino formal,
como processos de criação de sentidos. Assim, segundo González-Rey (2009,
p. 6), não existem “processos cognitivos puros, exceto em situações artificiais,
formais e meramente reprodutivas”, daí o autor preferir o uso da expressão
processo de sentidos.
A consciência, como processo de criação de sentidos, é um conceito
valioso para o ensino, que não apenas promove a aprendizagem de fatos,
linguagem, formas e figuras, mas também a aprendizagem complexa dos
conceitos, que implica simultaneamente a relação com outros conceitos.
O conhecimento acadêmico ou científico isolado, quando desvinculado de
192

contextos norteadores de sentidos, torna-se apenas conhecimento enciclopé-


dico ou propedêutico. Aqui a IA, especialmente a IAG, vem com a promessa
de ser melhor que humanos (ZUIN, 2021).

IA, consciência e ensino: pontos críticos

A educação vista como um processo contínuo que ocorre ao longo da


vida, em diferentes contextos e situações, e que envolve tanto a aquisição de

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conhecimentos quanto o desenvolvimento de habilidades, atitudes e valores,
também exige o despertar da “volitividade”. Aqui, a IA entra como lugar de
desafios, interesses e curiosidades a serem explorados no ensino, especial-
mente diante da superinteligência ou IAG. Neste ponto, apresentamos a IAG
e seu limite diante da consciência.
Entre as características da superinteligência (SILVEIRA, 2022; BOS-
TROM; 2014), está a capacidade de os chatbots excederem significativamente
o desempenho cognitivo dos seres humanos, independentemente do objeto ou
fenômeno de interesse. A articulação entre os estudos de neurociências, cog-
nição biológica e a interface cérebro-computador tem sido explorada teórica
e empiricamente, em busca da superinteligência.
Em sua obra, Bostrom (2018, p. 336) cunha o termo “superinteligência”
como “qualquer intelecto que excede significativamente o desempenho cogni-
tivo dos seres humanos em praticamente todas as áreas de interesse”. O filósofo
sueco, apesar de alertar ser altamente perigoso a IA para os seres humanos,
acredita na capacidade dos seres humanos para impedir seus efeitos deletérios.
Esse filósofo da contemporaneidade salienta os possíveis impactos da IA
superinteligente no futuro da humanidade, discutindo desafios e estratégias
para lidar com seu desenvolvimento. Em sua apresentação sobre o cérebro
humano, ele afirma ser esse mais sofisticado e assinala algumas aptidões
inerentes ao ser humano que são ausentes nos cérebros dos demais seres
vivos. Entre elas, a capacidade de tomar a iniciativa, que está associada à
“volitividade” e é a marca diferencial que se destaca neste artigo.
Ainda não se tem resposta para a questão levantada por Bostrom (2018),
se será possível construir uma IA inicial, para engenhar condições iniciais de
forma a tornar uma explosão de inteligência “sobrevivível”, ou seja, passível
de se autodeterminar, nem como poderíamos alcançar uma detonação con-
trolada. Uma ideia crível que se registra aqui é a de que a linguagem da IA é
aquela que será ensinada às gerações futuras para que elas possam criar seus
próprios caminhos de formação de modo responsável.
Outra conotação de “superinteligente”, segundo Russell (2020), significa
ter uma capacidade sobre-humana de alcançar objetivos dados. A questão
levantada pelo filósofo é se, nós, humanos, somos capazes de especificar
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 193

nossos objetivos de forma completa e correta e de transferir tais objetivos


para as máquinas e se essas proporcionam benefícios para os humanos. O
autor acredita que as chances são muito pequenas. Russell (2020) aponta
ainda outro erro epistemológico anunciado por Wiener em 1960, de transferir
uma definição perfeitamente razoável de inteligência de seres humanos para
máquinas. Assim ele esclarece:

A definição é razoável para seres humanos porque temos o direito de per-


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seguir nossos próprios objetivos – afinal, de quem seriam os objetivos se


não os nossos? A definição de inteligência é unária, no sentido de que se
aplica a uma entidade por si só. Máquinas, por outro lado, não têm o direito
de perseguir seus próprios objetivos. Uma definição mais sensata de IA
seria ter máquinas perseguindo nossos objetivos (RUSSELL, 2020, p. 3).

Atualmente, o ChatGPT está na pauta das discussões, conflitando ques-


tões éticas para além de sua potencialidade em gerar linguagens de diversos
matizes: escrita, falada, imagética.
Nesse contexto, Jesué Graciliano da Silva produziu, com auxílio do
próprio ChatGPT, um manual de 110 páginas com dicas para que professo-
res façam bom uso da ferramenta. É um material rico para aprender a usar e
verificar como o aluno pode trabalhar, e aqui tomo de empréstimo a analogia
“o meteoro está vindo.... é preciso olhar para o céu”. Só assim o futuro da
humanidade terá chances de boas-novas (LEE, 2019).
Saviani (2008; 2009b) propõe uma abordagem crítica e histórica da edu-
cação, que se baseia na compreensão do contexto social, político e econômico
em que a educação está inserida. Ele defende que a educação deve ser um
processo democrático e participativo, em que os alunos tenham voz ativa no
processo de aprendizagem e sejam incentivados a desenvolver sua capacidade
crítica e reflexiva.
Assim, a educação para Saviani (2008; 2009a; 2009b) é um processo de
formação integral dos indivíduos que busca promover a capacidade crítica e
reflexiva, a autonomia e a participação ativa na construção de uma sociedade
mais justa e igualitária.
Outro aspecto a ser considerado na relação entre consciência, ensino e IA
é a aprendizagem profunda de que trata Zuin (2021, p. 20), ao delineá-la como
“aquela que não se consubstancia com uma ética rasa assentada no sistema de
premiações e punições do atual capitalismo de vigilância, cujo ethos também
se faz presente nas salas de aula”. Para que isso aconteça, é importante que
os professores assumam sua condição humana, com acertos e falhas, o que
provavelmente gerará empatia entre os alunos. Isso levará tanto os professores
quanto os alunos a utilizarem as tecnologias digitais para compreenderem
194

as causas dos fenômenos educacionais e a promoverem mudanças éticas em


suas práticas, tanto dentro como fora das escolas. Portanto, em uma era de
digitalização em diversos aspectos da vida, os professores continuam rele-
vantes e indispensáveis.
A partir dessa discussão inicial, outras questões emergem. Como o pro-
fessor deve se preparar para atuar no tempo presente? Ao considerar a IA como
ferramenta cada vez mais presente no cotidiano (LUGER, 2016; MEDEIROS,
2018; NETTO, 2021), tanto no espaço privado como no público, os professores

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precisam, minimamente, compreender o que é IA e quais seus fundamentos e
teorias de base para entenderem e atuarem perante seus impactos e possibilida-
des. Implica refletir sobre como os sistemas inteligentes estão revolucionando
as relações do homem com a máquina e alterando o curso da humanidade.
Nesse sentido, ressalta-se a relevância de os agentes educacionais discu-
tirem sobre o futuro da humanidade e da vida inteligente, pois assim poderão
encontrar os caminhos da educação para um ensino que tenha como meta a
vida planetária sustentável. Será importante criar uma linguagem que possi-
bilite entender e controlar o que Russel (2020) alerta, citando Norbert Wiener
(1960), sobre o equívoco de afirmações contemporâneas de que a IA “supe-
rinteligente” pode representar um risco existencial para a humanidade.

Considerações finais

A questão de como a IA é teoricamente delineada na literatura estudada


permite distinguir os entendimentos da IA de primeira e segunda gerações,
conhecida como Inteligência Artificial Geral (IAG). Essa forma avançada de
IA tem a capacidade de realizar tarefas cognitivas complexas e de aprender
com a experiência, semelhante à capacidade humana de inteligência geral. Ela
tem o potencial de personalizar o aprendizado para cada aluno, permitindo
que os professores ajustem o ritmo, o estilo de aprendizado e o conteúdo do
ensino de forma individualizada.
Os estudiosos da IA propõem diferentes ferramentas para auxiliar a edu-
cação formal em todas as suas versões. No entanto, observa-se na literatura
a ausência de abordagens éticas e da percepção da importância de desenvol-
ver essas ferramentas de maneira responsável e cuidadosa, considerando os
possíveis impactos na educação. O impacto da IA no ensino tem provocado
discussões sobre o papel da consciência em dois aspectos: como crítica ao
tema e como função superior a ser trabalhada no ensino.
Ao considerar que a educação deve promover o desenvolvimento integral
dos estudantes, englobando não apenas o aprendizado de conteúdos escolares,
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 195

mas também o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, a IA não


seria capaz de substituí-las pelos motivos discutidos neste texto. Portanto,
habilidades humanas como empatia, respeito, colaboração, criatividade, aná-
lise crítica (“volitividade”), intuição e sensibilidade emocional, altamente
valorizada em muitas profissões das ciências humanas, saúde e outras áreas,
podem não ser completamente replicáveis pela IA/IAG. Ela pode simular,
mas não experienciar essas habilidades de forma genuína.
Este texto enfatiza a importância de não culpar ou responsabilizar uni-
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camente os professores pelo processo de ensino, mas ressalta a consciên-


cia acadêmica de que cabe às políticas educacionais e aos governantes criar
condições para que os professores, em sua formação inicial, continuada ou
autodidata, invistam em estudos relacionados à IA no ensino.
A IA é uma realidade e, portanto, é necessário compreender a educação de
forma contextualizada, evitando se prender ao imediatismo, a fim de atender às
necessidades dos estudantes e criar ambientes de aprendizagem estimulantes e
desafiadores, considerando as habilidades cognitivas e socioemocionais. Em
outras palavras, a formação dos alunos deve levar em consideração a realidade
social, econômica e cultural do País, sem ignorar os acontecimentos globais,
a fim de mapear as necessidades e as expectativas dos estudantes e planejar
trilhas de aprendizagem relevantes e significativas para eles.
O ensino, como parte do processo educacional, não deve ser visto apenas
como a transmissão de conhecimentos, mas como um ato voluntário inserido
em uma cosmovisão em prol da aprendizagem voluntária. Para despertar a
vontade, é necessário ouvir o aluno, formular perguntas e incentivá-lo a sempre
buscar boas perguntas. É nesse movimento que se desenvolve a consciência.
Embora não seja o objetivo deste texto, é inegável o impacto da IA no
ensino, que está intrinsecamente ligado à sociedade, à economia e ao Estado,
gerando reflexões e debates éticos favoráveis ao desenvolvimento de políticas
públicas conscientes, boas práticas e regulamentação da IA na educação.
Nesse contexto, é importante garantir que os professores estejam pre-
parados para essas mudanças e tenham acesso à formação continuada e ao
treinamento para se adaptarem às novas tecnologias e às novas demandas da
sociedade e do mercado de trabalho. Isso também pode criar novos nichos
laborais e sustentáveis.
Construir novas trilhas de aprendizagem que levem os alunos às fronteiras
do pensamento sobre a condição humana e acerca do futuro da inteligência
é desenvolver a consciência necessária para enfrentar a IA: eis o desafio do
ensino nos tempos atuais.
196

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ANÁLISE DA INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL DENTRO DOS
PERIÓDICOS DA CAPES EM
ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
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Andrei Novikoff Mithidieri75


Marcello Silva e Santos76
Byanca Porto de Lima77

Introdução

A
Inteligência Artificial representa um instrumento teórico-metodo-
lógico de extrema importância para as ciências da engenharia de
produção e, por consequência, para os engenheiros que atuam nessa
área com o objetivo de “desenvolver, controlar e avaliar sistemas produtivos
integrados de bens e serviços, envolvendo pessoas, materiais, tecnologia,
informação e energia” (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENGENHARIA
DE PRODUÇÃO, 2018, p. 1). Dessa forma, o conhecimento sobre Inteligência
Artificial, seus conceitos, teorias e métodos, é crucial para a compreensão e
aplicação eficiente na engenharia de produção.
Ao buscar ampliar o conhecimento, é papel do profissional em formação
explorar a literatura de qualidade e investigar as pesquisas e desenvolvimentos
relacionados a um tema específico. Neste estudo, o foco reside em identifi-
car as diferentes abordagens de pensamento acerca da Inteligência Artificial
e compreender a racionalidade adotada pelos cientistas em seus trabalhos. A
perspectiva de uma racionalidade crítica e criativa, voltada para o bem comum
da humanidade, é uma preocupação dos adeptos da visão social e ecológica, pois
são essas perspectivas que direcionam suas práticas. Em contrapartida, as técni-
cas geralmente têm um viés mais focado em questões econômicas e lucrativas.

75 Graduado em Engenharia de Produção pelo Centro Universitário de Volta Redonda – UNIFOA. Engenheiro
da CBSI/CSN em Volta redonda. E-mail: andrei.novi@yahoo.com
76 Graduação em Arquitetura e Urbanismo pelo Instituto Metodista Bennett (1984). Mestrado em Arquitetura
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Doutorado e pós-Doutorado em Engenharia de Pro-
dução pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2003 e 2010, respectivamente). Professor do Centro
Universitário de Volta Redonda – UNIFOA. E-mail: marcellosanto@hotmail.com
77 Graduação em Engenharia de Produção pela Universidade Federal Fluminense (2007). Mestra em Engenharia
de Produção com ênfase em Qualidade e Produtividade pela Universidade de Taubaté (2010). Professora
do Centro Universitário de Volta Redonda – UNIFOA. E-mail: byanca.lima@foa.org.br
200

As diversas correntes de pensamento sobre a Inteligência Artificial podem


ser compreendidas através das contribuições filosóficas que datam desde a
antiguidade até os tempos modernos (HABERMAS, 2004). Além disso, pes-
quisadores da área de engenharia, como Groover (2010) e Oliveira (2010),
também fornecem insights valiosos para a compreensão da construção do
conhecimento no campo das engenharias.
Nesse contexto, os autores dedicaram-se ao estudo da Inteligência Arti-
ficial (RUSSELL; NORVIG; 2013; SELLITTO, 2002) como um sistema

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relevante para a engenharia de produção, com o intuito de identificar diferentes
abordagens de pensamento e tipologias de racionalidade.
Uma observação, ao ler sobre Inteligência Artificial no Brasil, é que
ainda são poucos os trabalhos de pesquisa que abordam esse tema, especial-
mente em periódicos de alto estrato de qualis, de acordo com os critérios
da Coordenação de Avaliação de Pessoal de Ensino Superior (CAPES).
Portanto, a proposta temática deste estudo não apenas se mostra inédita,
mas também pode contribuir significativamente para o campo da engenharia
de produção.
O objetivo geral da pesquisa foi identificar as diversas abordagens de
pensamento e discutir a tendência de racionalidade na aplicação da Inteligência
Artificial na engenharia de produção em periódicos qualificados pela CAPES.
Para alcançar esse objetivo, foram traçadas estratégias específicas: a) mapear
os periódicos de estrato A1, A2, B1 que publicam artigos sobre engenharia de
produção; b) descrever as diversas abordagens de pensamento sobre a Inteli-
gência Artificial nas engenharias; c) identificar as formas de racionalidade dos
autores e criar categorias de análise; e d) avaliar a tendência de racionalidade
dos artigos sobre Inteligência Artificial na engenharia de produção.
O método de estudo adotado foi de abordagem qualitativa e exploratória,
com coleta de dados no banco de periódicos da CAPES e análise utilizando
o programa IRAMUTEQ. Os dados coletados permitiram inferir a tendência
de racionalidade presente na produção científica sobre o tema.
Nossa intenção é contribuir de forma significativa para os estudos sobre
o tema, além de abrir novos caminhos para futuras pesquisas em diferentes
contextos formativos.

Dimensão Teórica: alguns entendimentos

A dimensão teórica desempenha um papel fundamental ao fornecer emba-


samento e diálogo com os estudiosos do campo, permitindo-nos compreender
o objeto de estudo de forma mais completa, delimitar seu escopo e identificar
as tendências presentes na literatura.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 201

No nosso referencial, estabelecemos três tópicos de estudo: Inteligência


Artificial, Engenharia de Produção e Tendências de Racionalidades. O pri-
meiro tópico aborda o surgimento da Engenharia de Produção, seguido pela
compreensão do conceito de Inteligência Artificial na literatura atual e sua
relação com a engenharia de produção. Por fim, exploramos as tendências de
racionalização relacionadas ao tema.

Engenharia de produção
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Se remontarmos aos primórdios da produção de mercadorias, quando


os artesãos eram responsáveis por todas as etapas do processo produtivo,
desde a concepção até a execução final do produto, podemos deduzir que a
origem da Engenharia de Produção ocorreu quando esses artesãos começaram
a se preocupar não apenas em produzir, mas também em organizar, integrar,
mecanizar, mensurar e aprimorar a produção.
A origem mais recente da Engenharia de Produção remonta à Revolu-
ção Industrial iniciada no século XVIII, na Inglaterra, com o surgimento da
manufatura e a introdução de máquinas-ferramenta. Isso levou à necessidade
de um tratamento mais adequado dos processos de produção. No entanto, foi
apenas no final do século XIX, especialmente com o chamado “Scientific
Management”, no qual Frederick Winslow Taylor (1856-1915) foi um dos
principais expoentes, que surgiram atividades de sistemas integrados de pro-
dução que se relacionam mais diretamente com a modalidade de engenharia
que concebemos atualmente.
Nessa trajetória, também devemos destacar os trabalhos do engenheiro
Henry Laurence Gantt (1861-1919), criador do “Gráfico de Gantt”, e do casal
Frank Bunker Gilbreth (1868-1924) e Lillian Moller Gilbreth (1878-1972),
considerada uma das pioneiras da ergonomia (LEME, 1983).
No contexto brasileiro, a Engenharia de Produção teve sua origem e
desenvolvimento ao longo do período cronológico compreendido entre 1970
e 1990, o qual marca a formação acadêmica nessa área.

Inteligência Artificial

Alan Turing, o matemático responsável pela formalização do conceito


de algoritmo e computação, desempenhou um papel fundamental no desen-
volvimento do computador e foi um dos pioneiros no campo da Inteligência
Artificial (IA). No entanto, foi em 1956 que a IA recebeu reconhecimento
científico com o trabalho de Newell e Simon, intitulado “Logic Theoristic”,
que apresentou o primeiro programa de IA.
202

Segundo Sellitto (2002, p. 364), a IA é um campo de conhecimento que


oferece modelos para apoio à tomada de decisões e controle, baseados em fatos
reais, conhecimentos empíricos e teóricos, mesmo que sejam fundamentados
em dados incompletos.
No campo da engenharia, a automação busca compreender e criar formas
de gerenciamento de sistemas industriais que melhorem o desempenho das
máquinas e processem de maneira semelhante aos processos humanos. Para
alcançar esse objetivo, diversos estudos se concentram no desenvolvimento

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de comportamentos e na compreensão do pensamento.
Diferentes áreas de conhecimento, como filosofia, psicologia e neuro-
ciência, continuam estudando modos de comportamento e pensamento que
hoje são relevantes para a engenharia, especialmente nas áreas de robótica e
Inteligência Artificial.
Ao estudar os conceitos da Inteligência Artificial, Russell e Norvig (2013)
propõem quatro abordagens teóricas, que são as seguintes:
I. Sistemas que pensam como seres humanos, baseado nas ideias de
Haugeland (1985), que destaca os esforços recentes e interessantes para
fazer com que os computadores possam pensar e ser compreendidos como
máquinas com mentes próprias, capazes de tomar decisões, resolver proble-
mas e aprender.
II. Sistemas que atuam como seres humanos, conforme proposto por
Kurzweil (1990), que descreve a Inteligência Artificial como a “arte de criar
máquinas que executam funções que requerem inteligência quando realizadas
por seres humanos”.
III. Sistemas que pensam de maneira racional, proposto por Charniak e
McDermott, que aborda o estudo das faculdades mentais através do uso de
modelos computacionais (CHARNIAK; MCDERMOTT, 1985 apud RUS-
SELL; NORVIG, 2013, p. 25).
IV. Sistemas que atuam de maneira racional, conforme a compreensão
de Poole e colaboradores (1998), que se dedicam ao estudo do projeto de
agentes inteligentes.
Os pesquisadores ainda delinearam as relações entre as linhas, con-
forme Quadro 1.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 203

Quadro 1 – Linhas de pensamento sobre Inteligência Artificial e


seus processos de estudos, segundo Russell e Norvig (2013)
Processo de estudo e desenvolvimento
Pensa racionalmente Age racionalmente
Age como seres
Pensa como humano (Medem o sucesso (Inteligência
As linhas de humanos
(Envolve processo (Envolve em termos de computacional
pensamento
de pensamento execução como o fidelidade ao e desempenho
e raciocínio) comportamento desempenho inteligente de
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humano) humano) artefatos)


I X X
II X X
III X X
IV X X
Fonte: Elaborado pelos autores.

Ao longo da história, diferentes linhas de pensamento têm abordado a


relação entre os seres humanos e as máquinas, com críticas tanto à abordagem
centrada nos seres humanos como máquinas quanto à abordagem centrada
na racionalidade.
De acordo com Russell e Norvig (2013), um sistema é considerado racio-
nal quando é capaz de tomar as decisões corretas com base nos dados disponí-
veis. Nessa abordagem, a matemática e a engenharia desempenham um papel
fundamental. Por outro lado, na abordagem que considera a máquina como
uma resposta semelhante ao ser humano, os cálculos devem ser avaliados por
meio de estudos experimentais.
A Inteligência Artificial, além de buscar compreender o pensamento
humano, também busca construir sistemas ou entidades inteligentes. Isso
amplia a discussão sobre os limites da humanidade diante da inteligência e
abre espaço para uma série de questões polêmicas e interessantes relacionadas
ao processo de aprendizagem e percepção.
Os inúmeros estudos sobre Inteligência Artificial demonstram que ela
desempenha um papel importante em tarefas específicas, como jogos de
xadrez, detecção de fraudes, tradução automática, reconhecimento de voz e
veículos autônomos. O foco sempre é simular o raciocínio humano.
204

Nesse contexto, a tese de Barbosa (2004), intitulada “Mecanismo de


adaptação baseado em redes neurais artificiais para sistemas hipermídia adap-
tativos”, explora a “interface adaptativa, redes neurais artificiais, sistemas
hipermídia adaptativos e teoria das inteligências múltiplas”. O objetivo foi
adaptar a mídia para fornecer conteúdo específico de acordo com o perfil do
usuário. Foi uma tentativa de simular o raciocínio humano por meio da adap-
tabilidade, permitindo alterações explícitas por parte do usuário.
Além do uso de técnicas de IA, teorias cognitivas têm sido propostas

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em projetos de interface como resultado de pesquisas na área de interação
usuário-máquina (COSTA et al., 2001 apud BARBOSA, 2004, p. 2).
A Inteligência Artificial tem permitido, de acordo com Mata e colabo-
radores (2018, p. 1573), “expandir nossas habilidades para resolver novas
classes e escalas de problemas, impulsionando a pesquisa e a inovação em
quase todas as disciplinas científicas”.
Nesse sentido, os pesquisadores apontam que a Inteligência Artificial
está ganhando espaço em diferentes áreas do conhecimento, expandindo-se
e se tornando uma realidade no dia a dia de cada cidadão.
Os diversos aplicativos de Inteligência Artificial estão presentes em assis-
tentes pessoais virtuais usados por operadoras de telefonia, sistemas bancários
e agências de serviços diversos. Os veículos inteligentes são exemplos do uso
da Inteligência Artificial, assim como os sistemas de simulação de compras,
empréstimos, dispositivos móveis com reconhecimento de fala e dispositivos
domésticos inteligentes.
A Inteligência Artificial tem promovido alterações significativas no
comportamento humano, sendo utilizada como recurso para facilitar as rela-
ções comerciais, educacionais e produtivas da humanidade. Desde serviços
até entretenimento, a Inteligência Artificial é uma realidade a ser estudada e
explorada visando a melhoria da qualidade de vida.
Diante do exposto, podemos entender a Inteligência Artificial como
uma área da ciência da computação que busca criar sistemas que simulem
a capacidade humana de raciocinar, semelhante aos seres humanos. Assim,
uma máquina com Inteligência Artificial possui a capacidade de armazenar,
cruzar e relacionar dados de maneira mais rápida do que os seres humanos.
Trata-se de um instrumento teórico-metodológico importante para as ciências
da engenharia de produção e, consequentemente, para os engenheiros que
escolhem essa profissão. É responsabilidade dos cientistas e profissionais
dessa área utilizar a Inteligência Artificial com racionalidade em prol do bem
comum, pois são esses princípios que guiam as práticas.
Essas abordagens teóricas ajudam a entender os diferentes aspectos
da Inteligência Artificial e fornecem direcionamentos para a sua aplicação
em diversas áreas, incluindo a engenharia de produção. Na engenharia, a
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 205

automação buscava compreender e criar formas de gerenciamento de sistemas


industriais que favorecessem o melhor desempenho das máquinas, sejam elas
humanas ou industriais. Para alcançar esse desempenho, os estudos se con-
centravam em como desenvolver comportamentos e entender o pensamento.
A busca pela compreensão de como o ser humano é capaz de perceber
e agir resultou em estudos para compreender, prever e manipular coisas, o
mundo e o ser humano. Diferentes áreas de conhecimento, como filosofia,
psicologia e neurociência, continuam a estudar modos de comportamento e
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pensamentos que hoje têm relevância para a engenharia, especialmente na


robótica e na Inteligência Artificial.
A Inteligência Artificial, além de buscar compreender o pensamento
humano, procura construir sistemas ou entidades inteligentes. Isso amplia a
discussão sobre os limites da humanidade diante da inteligência e abre espaço
para uma série de temas polêmicos e interessantes relacionados ao processo
de aprendizagem e percepção.
Os inúmeros estudos sobre Inteligência Artificial demonstram que ela se
torna um promotor de tarefas específicas, como jogos de xadrez, detecção de
fraudes, tradução automática, reconhecimento de voz e veículos autônomos.
O foco está sempre em simular o raciocínio humano.
Nesse contexto, Barbosa (2004), em sua tese intitulada “Mecanismo de
adaptação baseado em redes neurais artificiais para sistemas hipermídia adap-
tativos”, estudou sobre “interface adaptativa, redes neurais artificiais, sistemas
hipermídia adaptativos e teoria das inteligências múltiplas”. O objetivo foi
adaptar a mídia para fornecer conteúdo específico de acordo com o perfil do
usuário. Foi um ensaio de simular o raciocínio humano por meio da adapta-
bilidade, permitindo que alterações explícitas sejam realizadas pelo usuário.
O objetivo do estudo realizado por Barbosa foi desenvolver uma meto-
dologia baseada em redes neurais do tipo Multilayer Perception (MLP) e
Interactive Activation and Competition (IAC) para implementar a adaptati-
vidade e adaptabilidade em interfaces hipermídia. O trabalho teve a intenção
de contribuir para o desenvolvimento de sistemas adaptativos por meio da
proposição de uma metodologia que utilizasse teoria cognitiva e técnicas de
Inteligência Artificial como base para a adaptação da interface, ou seja, adaptar
a apresentação do conteúdo.
Na proposta de Barbosa, é perceptível que em sistemas computacionais
existe uma distinção entre os conceitos de adaptatividade (adaptativity) e
adaptabilidade (adaptability).
Sistemas com adaptatividade têm a capacidade de modificar auto-
maticamente suas próprias características, de acordo com a percepção das
necessidades e características pessoais do usuário. Sistemas com adaptatibi-
lidade oferecem ferramentas para que o usuário altere explicitamente certas
206

características do sistema, para adequá-lo ao seu comportamento (OPPER-


MAN et al. 1997, apud BARBOSA, 2004, p. 4).
A metodologia desenvolvida por Barbosa (2004) considera quatro das
oito inteligências da Teoria das Inteligências Múltiplas (TIM), em particu-
lar as inteligências Linguístico-verbal, Lógico-matemática, Visual-espacial
e Cenestésico-corporal. Propõe-se que a apresentação de conteúdo em um
Sistema Hipermídia Adaptativo (SHA) seja adaptada ao usuário, levando em
consideração seu perfil definido pela TIM. Para isso, são utilizadas combina-

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ções diferenciadas de mídias, como texto, fluxogramas, desenhos e animações.
Além do uso de técnicas de Inteligência Artificial, teorias cognitivas têm
sido propostas em projetos de interface como resultado de pesquisas na área de
interação usuário-máquina (COSTA et al., 2001 apud BARBOSA, 2004, p. 2).
Os Sistemas Tutoriais Inteligentes (STIs) foram os primeiros sistemas
adaptativos a utilizar técnicas de Inteligência Artificial com o objetivo de
desenvolver sistemas inteligentes capazes de perceber as características do
aprendiz, facilitando o processo de ensino-aprendizagem. Esses sistemas são
tipicamente direcionados ao ensino, nos quais o estudante tem pouco controle
sobre o processo de aprendizagem, pois esse controle é estabelecido pelo
sistema (KAPLAN; ROCK, 1995 apud BARBOSA, 2004, p. 3).
A integração de STIs e Sistemas Hipermídia Educacionais deu origem a
sistemas híbridos chamados Sistemas Hipermídia Adaptativos (SHAs) (BRU-
SILOVSKY, 1996 apud BARBOSA, 2004, p. 3).
Inicialmente, os SHAs foram direcionados para a área da educação,
sendo essa a área mais popular de pesquisa. No entanto, atualmente, eles são
aplicados em outras áreas onde se espera que o sistema seja usado por pessoas
com diferentes metas e conhecimentos, e onde o espaço hiperlink seja bastante
extenso (Da BRA; BRUSILOVSKY, 2000 apud BARBOSA, 2004, p. 3).

Tendências de racionalidades

Boa parte do desenvolvimento e do ensino atual da engenharia concentra-


-se no âmbito do aprimoramento da competência técnica dos engenheiros nas
atividades de projeto e desenvolvimento. Essa é uma realidade que expressa
um maior interesse dos pesquisadores e das instituições pelo tratamento dos
aspectos técnicos relativos ao trabalho de projeto, relegando a um plano infe-
rior a compreensão da ação do engenheiro, isto é, a maneira pela qual ele
realiza seu trabalho (REBELATO et al., 2006).
A racionalidade é um conceito abordado por diferentes áreas do conhe-
cimento, como filosofia, psicologia, neurociências, administração, educação
e engenharia, apresentando sutis diferenças de entendimento. Para superar
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 207

essas divergências, destaca-se o que há de comum nesses entendimentos: a


capacidade de compreender algo ou alguma coisa e a habilidade de julgar
com base nessa compreensão.
As formas de racionalidade desenvolvidas na formação do engenheiro,
de acordo com Rebelato e colaboradores (2006), sugerem uma perspectiva
tecnicista. Nesse contexto, surge a questão de saber se as produções na área
também seguem essa lógica tecnicista ou se a transcendem, e quais são as
tendências de racionalidade presentes na literatura de alto nível na Engenharia
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de Produção em relação ao pensamento sobre Inteligência Artificial.


É conhecido que as racionalidades foram estudadas por diferentes pen-
sadores em diversas áreas, desde a filosofia até as ciências, abrangendo a
psicologia, administração, educação e engenharia. Interessa aqui destacar
a compreensão específica dentro da engenharia, mais precisamente na área
da engenharia de produção. Portanto, neste tópico, buscamos compreender
como o pensamento nessa área de conhecimento tem abordado a descrição
da Inteligência Artificial.
Segundo Herbert Simon (1979), a racionalidade limitada se refere
à capacidade cognitiva restrita do ser humano de perceber informações.
Ela se manifesta quando há pouco tempo para julgar ou tomar decisões
diante de inúmeras dificuldades para acessar informações. Portanto, tra-
ta-se de uma racionalidade com limitações, que resulta em decisões não
perfeitas, mas satisfatórias. Essa racionalidade envolve escolhas econô-
micas e utilitárias.
Por sua vez, Ramos descreve a racionalidade substantiva (1983, 1989)
no campo da administração, baseando-se nas discussões de Weber sobre a
racionalidade de valor, bem como nas propostas de Polanyi e Mannheim.
Essa racionalidade busca contrapor a hegemonia da racionalidade funcional/
utilitária, permitindo resgatar um comportamento moral no processo de tomada
de decisão do ser humano.
Mas é Habermas (2004) quem nos esclarece sobre o valor da racio-
nalidade comunicativa, na qual a ação comunicativa pode esclarecer o
processo de tomada de decisão nas relações humanas e organizacionais,
seja na colaboração ou na competição. O filósofo propõe que os discursos
afetam a lógica da racionalidade puramente utilitária. A ação comunicativa
difere da racionalidade substantiva, pois esta se concentra na lógica de
uma ação individual.
De forma geral, podemos compreender que as diferentes formas de racio-
nalidade, embora diversificadas, podem ser entendidas conforme descrito
no Quadro 2.
208

Quadro 2 – Tipos de racionalidades a partir da literatura em Simon,


Polanyi, Mannheim e Habermas adaptado pelos autores (2018)
Tipos de
Critérios
Racionalidades
Solução instrumental de problemas.
Uso de técnica e centrado na aplicação.
Procedimentos racionais e metódicos.
Engenheiro com lógica técnica.

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Uso de regras científicas.
Racionalidade tecnicista Foca nas habilidades cognitivas.
Transmissão de informações.
Não se prende à pressão da sociedade nem às emoções.
Predomínio do conteúdo sobre a prática.
Acumulação de técnicas e métodos.
Preocupação em atender interesses estatais e mercadológicos.
Atua na lógica da complexidade.
A atividade é modificada à luz de circunstâncias.
Julgamento profissional.
Racionalidade Conhecimento produzido na ação.
substantiva Não separação do pensar e do fazer.
Engenheiro com lógica técnica.
Reflexão na ação.
Complexidade, incerteza, instabilidade, excepcionalidade, conflito de valor.
Atua de modo a adequar meios e fins para atingir os objetivos organizacionais.
Visa à maximização de resultados para ter lucro, poder ou outros objetivos individuais.
Racionalidade limitada Pensamento hegemônico nas abordagens prescritivas do trabalho e nas fórmulas mágicas
de tomada de decisões.
Engenheiro atua pra si sem pensar na sociedade.
Racionalidade dialética.
Considera o pano de fundo sócio-histórico.
Atividade sócio/política.
Problematizadora de seu propósito.
Racionalidade crítica Engenheiro como problematizador político.
Transformação social
Função social do engenheiro.
Uso da crítica, da reflexão e da pesquisa.
Perspectiva crítica emancipatória.
Uso de linguagem acessível a todos.
Racionalidade na ação Centrada na intersubjetividade dos significados.
comunicativa I.A. como linguagem.
A linguagem da I.A. é aberta e interativa.
Fonte: Elaborado pelos autores.

A fim de avaliar a compatibilidade entre o conteúdo dos artigos e os


diferentes tipos de racionalidade, utiliza-se uma escala ascendente para deter-
minar a categoria de racionalidade à qual o artigo pertence. Portanto, para
ser classificado dentro de um tipo específico de racionalidade, o artigo deve
apresentar pelo menos três dos critérios destacados no Quadro 1. Além disso,
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 209

quanto maior o número de critérios encontrados no artigo, mais robusta será


sua associação com o tipo de racionalidade mencionado anteriormente.

Metodologia e viabilidade

O método escolhido para a realização deste estudo, com o objetivo de


verificar as tendências da racionalidade na literatura atual da Engenharia de
Produção, foi a bibliometria, com base na análise do estado do conhecimento.
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Dessa forma, esse estudo adotou uma abordagem qualitativa (CRES-


WELL, 2007; NOVIKOFF, 2010), que descreve o estado atual do conhe-
cimento sobre o tema, sem intervir diretamente na realidade. Os dados
analisados foram obtidos por meio de uma pesquisa bibliográfica abrangente,
com a análise de um grande volume de trabalhos representativos (79 artigos).
A pesquisa bibliográfica, conforme destacado por Novikoff (2007), é
uma abordagem que permite explorar e analisar criticamente os trabalhos
disponíveis na literatura relacionada ao tema, oferecendo subsídios para o
avanço do conhecimento e identificação de tendências.
Para realizar uma análise adequada dos artigos, é recomendado utilizar
uma Tabela de Análise de Textos Acadêmicos e Científicos das Dimensões
Novikoff (TABDN). Essa tabela serve como um guia para extrair os elementos
relevantes do texto e permite aprofundar e revisar os trabalhos, enriquecendo
assim a redação final.
Para o nosso estudo foi realizado o levantamento no banco de dados do
Portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes), fundação do Ministério da Educação (MEC), que foi lançado
em 2001, como serviço de periódicos eletrônicos. No site foram encontrados
50 periódicos relacionados à Engenharia de Produção, com 79 artigos relacio-
nados ao tema engenharia de produção e tecnologias. É importante destacar
que esse banco de dados tem reconhecimento no Brasil e no exterior.
Após a seleção dos periódicos, foram selecionados os artigos nas revistas
consideradas de maior estrato como A1, A2, B1 e B2. No site da CAPES. Em
seguida os artigos foram tratados na TABDN.
A análise dos dados dos artigos foi feita mediante a interpretação pautada
em Bardin (2011), ao se estabelecer as categorias de racionalidade descritas
anteriormente (racionalidade técnica, substantiva, limitada, da ação comuni-
cativa e crítica).
Para melhor entender qual racionalidade é adotada nos artigos os tex-
tos foram recortados e tratados no software IRAMUTEQ, com base na
análise de conteúdo. Exigiu a criação de categorias próprias do estudo
sobre racionalidades. Portanto, a análise do conteúdo levantado passou
210

pela pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, a


inferência e a interpretação.
Na pré-análise, foi organizado o material, de modo virtual, em pastas por
palavras-chave; após foi confrontado as hipóteses previamente elaboradas.
Seguimos para a exploração do material, momento que foi possível criar tabe-
las e gráficos para ilustrar as interpretações. E o tratamento dos resultados,
inferência e interpretação permitiu que os dados passassem por uma análise
minuciosa, reflexiva e crítica, em que foram cruzados com os teóricos estu-

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dados e sustentaram os nossos argumentos.

Resultados e discussão

Considerando que toda investigação científica deve começar com a busca


em bases de indexação do conhecimento científico relevante, é essencial des-
crever o processo de coleta de dados que embasou o presente estudo. O estado
atual do conhecimento é compreendido como um estudo quantitativo/qualita-
tivo e descritivo da trajetória e distribuição da produção científica sobre um
objeto específico, estabelecendo relações contextuais com diversas variáveis,
como data de publicação, temas e periódicos (UNIVERSITAS, 2002).
As dificuldades encontradas na identificação da literatura estão relacio-
nadas ao volume de revistas disponíveis nas bases de indexação e ao acesso
a essas informações. Alguns bancos de dados exigem pagamento para acesso,
enquanto outros oferecem fontes de informação gratuitas, como o banco da
capes, que disponibiliza mais de 38 mil periódicos.
Para delimitar e aprofundar o objeto de estudo, foram realizados três
recortes. O primeiro foi feito com base na área de conhecimento específica
das engenharias. Observa-se que, dos 38 mil periódicos da CAPES, 410 são
voltados para o campo das engenharias.
Após essa primeira etapa de levantamento dos periódicos por área de
conhecimento dentro do campo das engenharias e suas subáreas, foi realizada
uma busca específica na área de “Engenharia de Produção”, resultando em
cerca de 50 periódicos até o dia 2 de maio de 2018. É importante ressaltar
que, nesse contexto, as revistas de maior qualidade, classificadas como estrato
“A”, são geralmente publicadas em inglês, por ser essa a língua universal da
ciência (VOLPATO, 2013).
Em seguida, foram selecionadas revistas na plataforma Sucupira, que
conta com 3.710 periódicos. Inicialmente, foram escolhidos os periódicos que
continham o radical “eng” para engenharia, resultando em 224 periódicos. Em
seguida, foi realizada uma busca pelo radical “prod” para o termo produção,
e foram encontrados 15 periódicos. Por fim, foi feita uma busca pelo radical
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 211

“intel arti” para Inteligência Artificial, e foram encontrados apenas cinco


periódicos. A distribuição desses periódicos de acordo com o estrato Qualis
pode ser visualizada no Quadro 3.

Quadro 3 – Distribuição de periódicos CAPES das engenharias


Estrato
Título com radicais
A1 A2 B1 B2
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Eng 17 12 35 47
Eng. Produção 0 1 4 0
Intel Arti 1 0 1 3
Total 18 13 40 50

Fonte: Site da plataforma Sucupira/qualis.

Observa-se que, dos 38.000 periódicos indexados pela CAPES, apenas


140 são voltados para o campo das Engenharias, dos quais 121 se encontram
em estratos excelentes.
É importante esclarecer que existem outros periódicos que, mesmo não
tendo o radical “Eng” em seus títulos, podem abranger textos relacionados
às engenharias, como é o caso de revistas de natureza interdisciplinar. No
entanto, a opção foi não incluir essas publicações na seleção, pois demandaria
um tempo considerável para sua identificação. Dado o caráter específico do
tema em questão, foi adotada uma estratégia de seleção mais direcionada às
engenharias, especialmente aquelas relacionadas à “Inteligência Artificial”,
conforme descrito no Quadro 4.

Quadro 4 – Revistas da Engenharia que têm em seu


título a expressão “Inteligência Artificial”
ISSN Título Estrato
0952-1976 Engineering Applications Of Artificial Intelligence A1
0004-370204 Artificial Intelligence (General Ed.) B1
0218-0014 International Journal Of Pattern Recognition And Artificial Intelligence B2
Fonte: Site da plataforma Sucupira/qualis.

Observa-se que, embora o número de periódicos de alto estrato seja limi-


tado em relação ao universo total de revistas de engenharia, o qualis dessas
publicações é elevado.
Nesse sentido, destaca-se a importância das três revistas que aceitam
trabalhos e possuem estratos A1, B1 e B2, as quais merecem atenção para o
estudo. No entanto, optou-se por selecionar apenas a revista de estrato A1, que
representa o maior estrato e abrange quatro volumes. Cada volume apresenta
212

respectivamente 17, 16, 26 e 20 trabalhos, totalizando 79 artigos. Essas publi-


cações cercam o período de março a junho de 2018. É importante ressaltar
que o último volume, o volume 72, vai até junho, mas alguns artigos já estão
disponíveis para acesso. Além disso, é necessário destacar que os volumes
estudados fornecem apenas resumos gratuitos, sendo necessário pagar em
dólar para ter acesso aos artigos completos. Portanto, foram utilizados apenas
os resumos disponíveis no site de acesso livre da revista.
Após a coleta dos resumos, o estudo concentrou-se na análise das abor-

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dagens de pensamento sobre Inteligência Artificial propostas por Russell e
Norvig (2013), bem como na tendência de racionalidade dos resumos dos
artigos. A análise de conteúdo foi realizada no programa Word, utilizando a
ferramenta “localização avançada”.
A tabela criada para análise consiste em seis colunas, sendo uma para a
identificação dos autores, uma para a tradução de todos os resumos e quatro
para as abordagens de pensamento.
Para a construção dessa tabela, foram realizados dois processos de mine-
ração de termos, utilizando tanto radicais como palavras-chave. Inicialmente,
foram selecionados os radicais de acordo com a indicação de pertencimento
a cada abordagem, em consonância com os conceitos propostos por Russell
e Norvig (2013), conforme apresentado no Quadro 5.

Quadro 5 – Linhas de Pensamento segundo Russell e Norvig (2013)


Linhas de pensamento
L1 L2 L3 L4
Radicais Máqui Biol Máq Model Comput Agent Artef
Aprend. Experie Experim Estat Máq
Ensi Ser Hum Cal Experim
Fonte: Elaborado pelos autores.

Em relação à análise sobre as linhas de pensamentos, a L3 se apresentou


mais forte que as outras, conforme demonstra a Tabela 1.

Tabela 1 – Linhas de pensamento sobre Inteligência


Artificial encontrados no periódico A1
Periódicos/ L1 L2 L3 L4
Linhas Computadores pensam Sistemas que atuam Sistemas que pensam Sistemas atuam na inte-
e são entendidos como como seres humanos racionalmente modelos ligência computacional
máquinas com mentes computacionais agentes inteligentes
literalmente
Vol 69 4 5 1 6
Vol 70 5 5 2 4
continua...
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 213
continuação
Periódicos/ L1 L2 L3 L4
Linhas Computadores pensam Sistemas que atuam Sistemas que pensam Sistemas atuam na inte-
e são entendidos como como seres humanos racionalmente modelos ligência computacional
máquinas com mentes computacionais agentes inteligentes
literalmente
Vol 71 3 3 12 5
Vol 72 3 3 8 6
Total 15 (21%) 16 (22%) 23 (32%) 21(29%)
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Fonte: Elaborado pelos autores.


É observado que a abordagem mais representativa adotada é a L3, que
corresponde a 32% dos artigos analisados. Essa predominância indica uma
evolução no pensamento matemático e nos modelos computacionais para a
discussão da Inteligência Artificial (IA). Essa perspectiva sugere a necessi-
dade de uma racionalidade aprofundada para o desenvolvimento de estudos
nessa revista de alto qualis.
É importante ressaltar que, na área da Engenharia de Produção, o tema da
tendência de racionalidade ainda é escasso. Para analisar as diferentes tipologias
de racionalidade, foram adotados os conceitos de racionalidade limitada de
Herbert Simon, racionalidade substantiva de Ramos e racionalidade comuni-
cativa de Jürgen Habermas. Além disso, foram consideradas as racionalidades
técnicas dos estudos estruturalistas e a crítica dos estudos socioculturais.
De acordo com a metodologia previamente explicada, que envolve a
escolha de critérios de racionalidade para cada artigo (sendo necessário um
mínimo de três para ser considerado dentro de um tipo de racionalidade), foi
realizada uma avaliação pareada e recontagem dos indicadores. Os resultados
são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2 – Racionalidades nos artigos da revisa A1 Engineering


Applications of Artificial Intelligence – EAAI (2018)
Periódicos Racionalidade Racionalidade Racionalidade Racionalidade Racionalidade
Ano 2018 Tecnicista Limitada Substantiva Crítica Comunicativa
Vol 69 14 4 6 7 4
Vol 70 16 1 7 3 6
Vol 71 22 4 10 6 8
Vol 72 16 4 4 5 4
Total 68 13 27 21 22
Fonte: Elaborado pelos autores.

Diante das análises realizadas, é possível inferir sobre as linhas e racio-


nalidade com o uso do Gráfico 1.
214

Gráfico 1 – Racionalidades nos artigos da revisa A1 Engineering


Applications of Artificial Intelligence – EAAI (2018)

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Rco RC RS RL RT

Fonte: Elaborado pelos autores.


Observa-se uma relação entre as linhas de pensamento sobre IA e as for-
mas de racionalidade empregadas na pesquisa em Engenharia, o que permite
deduzir o seguinte sobre as hipóteses formuladas:
A hipótese de que a qualidade da produção de literatura no Brasil sobre
Inteligência Artificial na Engenharia de Produção está concentrada em perió-
dicos de extrato abaixo de A2 foi negada. Foi identificada a melhor revista, de
estrato A1, dedicada à Inteligência Artificial, intitulada “Engineering Appli-
cations of Artificial Intelligence” (A1).
A hipótese de que a racionalidade empregada na literatura brasileira
para descrever a Inteligência Artificial na engenharia de produção é tecnicista
foi confirmada.
Em relação à racionalidade empregada na literatura brasileira para des-
crever a Inteligência Artificial na engenharia de produção como crítica e
comunicativa, embora não tenha sido negada, constatou-se que houve poucos
artigos que atenderam aos critérios dessa forma de racionalidade na enge-
nharia de produção.
Quanto à hipótese de que a racionalidade empregada na literatura bra-
sileira para descrever a Inteligência Artificial na engenharia de produção
não é estratégica, ela foi negada, uma vez que a revista A1 direcionou sua
abordagem para as linhas de pensamento L3 e L4, que são voltadas para
a racionalidade e enfatizam a prospecção de estratégias futuras, sem focar
na subjetividade.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 215

Considerações finais

O estudo realizado teve como foco quatro volumes do periódico “Engi-


neering Applications Of Artificial Intelligence”, totalizando 79 resumos, nos
quais foram identificadas as linhas de pensamento de acordo com Russell e
Norvig (2013) e verificadas suas formas de racionalidade.
Ao analisar os resumos, observa-se que as entidades e sistemas de Inte-
ligência Artificial têm expandido sua capacidade de realizar operações seme-
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lhantes à aprendizagem e tomada de decisão, imitando processos físicos e


biológicos, com ênfase nos processos cognitivos.
O estudo da Inteligência Artificial, suas linhas de pensamento e tendên-
cia de racionalidade na Engenharia de Produção, revelou que a linguagem
científica está fortemente representada na linha do “pensar racionalmente” e
que a racionalidade predominante é a técnica.
No entanto, os autores também sinalizam a presença de outras raciona-
lidades, como revelado pelos resultados deste estudo. O trabalho realizado
oferece conclusões que abrem caminho para novas pesquisas, utilizando o
quadro de racionalidades desenvolvido pelos autores desta produção.
Em resumo, o estudo sobre Inteligência Artificial, a forma como os
pesquisadores a descrevem e as formas de racionalidade empregadas para
explicá-la são dignos de mérito, pois a compreensão dos conceitos e ideias
relacionados a esse tema favorece a ação e a criação de métodos para o uso
do objeto estudado.
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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E
O PENSAMENTO COMPLEXO:
encaminhamentos para o ensino
Ângela Cristina Rodrigues de Castro78
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Introdução

C
onforme define Margareth A. Boden (2020, p. 13), “a Inteligência
Artificial (IA) procura preparar os computadores para fazer o tipo de
coisas que a mente é capaz de fazer”, embora devamos considerar,
no entanto, que a inteligência propriamente não pertence a apenas uma única
dimensão, mas se constitui a partir de um espaço onde diferentes habilidades
são utilizadas para processar a informação.
O termo Inteligência Artificial (doravante, IA) foi cunhado por John
McCarthy em 1956 para substituir o que até então se denominara “simula-
ção computacional”, embora a referência a ela venha desde a Antiguidade,
quando pensadores e filósofos já falavam de uma inteligência não humana
que pensasse por si própria e que livraria os seres humanos da escravidão
(ARISTÓTELES, 1990).
A IA traz uma relação estreita com áreas do conhecimento como a da
linguagem e do raciocínio lógico, com a intencionalidade, a adaptabilidade,
a aprendizagem associativa, a replicação e a computação simbólica, assim
como com ciências como a matemática, a biologia, a psicologia, a neurologia,
a neurociência, além da computação e da programação.
Dessa forma, estudar e compreender a IA ocorre a partir de processos
multi e interdisciplinares, embora a sua aplicação deva ocorrer a partir de uma
perspectiva transdisciplinar79, considerando-se as demandas uma sociedade

78 Graduada em Letras (Português-Inglês) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestra em
Estudos e Análise do Discurso pelo Curso Interdisciplinar em Linguística Aplicada da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutora em Letras pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail:
rcastrocristina@gmail.com.
79 Neste artigo, consideram-se os seguintes conceitos: a) multidisciplinaridade – justaposição de duas ou mais
áreas do conhecimento, levando em consideração objetivos múltiplos, não necessariamente inter-relacionados
entre si, embora coordenados; interdisciplinaridade – perspectiva a partir da qual duas ou mais áreas do
conhecimento interagem entre si, inclusive na integração mútua dos conceitos; transdisciplinaridade –
conceito a partir do qual o conhecimento é compreendido de forma plural, sendo sua aquisição realizada de
maneira holística e contextualizada, indo muito além da divisão artificial em disciplinas. Exige um pensamento
que vá além da divisão cartesiana das áreas do conhecimento, o pensamento complexo.
220

volitiva, instável, que exige um ser humano mais crítico e consciente de, por
exemplo, questões como a sustentabilidade e a mentalidade criativa.
Assim, o objetivo deste artigo é o de responder ao questionamento: qual
o olhar que se deve dar à IA tendo em vista a sua aplicação nas práticas de
ensino? Pretende-se responder à pergunta a partir de uma breve revisão biblio-
gráfica sobre os temas do Pensamento Complexo, das Inteligências necessárias
ao ser humano do século XXI e do Ensino por Competências, em especial
nas instituições de ensino do Exército Brasileiro, como prosseguimento ao

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Processo de Modernização do Ensino, iniciado em 1995. Como encaminha-
mento, sugere-se que a prática de ensino mediada pela IA siga não apenas
uma perspectiva tecnológica, mas científica, considerando-se a complexidade
do real. Só assim será possível corresponder às demandas atuais da sociedade
na formação de seus/suas cidadãos/cidadãs.

O pensamento complexo

Patrick Paul (MORAES; NAVAS, 2015, p. 7), Doutor em Ciências da


Educação, escreve que o campo da educação “está em sua essência intrin-
secamente associado à pluralidade disciplinar e à complexidade humana”,
sendo a relação entre educação e transdisciplinaridade regularmente evocada.
No entanto, observa-se que as práticas de ensino ainda, muitas vezes,
orientam-se a partir de um paradigma científico tradicional, caracterizado por,
entre outras características, pelo reducionismo, a objetividade e a reproduti-
bilidade. Tais características estão relacionadas ao mundo construído entre
os séculos XVI e XX, mundo no qual imperava a visão técnica, material e
objetiva, em detrimento de uma dimensão mais humana da sociedade.
É fato que a organização dos conteúdos escolares em disciplinas possi-
bilitou o desenvolvimento do conhecimento, mas não existia o que permitisse
religar os conhecimentos entre si. Houve, então, a necessidade de mudança
do paradigma predominante para um em que fosse possível a emergência de
novos valores capazes de responder aos desafios do mundo contemporâneo,
capazes de responder “de uma forma real às crises imprevistas e aos desafios
que o mundo moderno engendra, mediante uma tecnologia galopante que
resulta desses saberes [até então construídos] dissociados de um conhecimento
real” (MORAES; NAVAS, 2015, p. 8).
Dessa forma, o ensino não pode ser destinado apenas à transmissão de
saberes e técnicas, mas deve também favorecer o desenvolvimento de valores
éticos, da mentalidade criativa e do pensamento crítico-reflexivo. É necessário
reconhecer serem as aprendizagens processos dinâmicos e complexos que acon-
tecem em espaços diferentes dos espaços escolares, não somente entre quatro
paredes: elas podem ocorrer nas mais diferentes situações, condições e espaços
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 221

dialógicos e dialogados. É preciso reconhecer a experiência como espaço (semi-


nal, muitas vezes) de qualquer aprendizagem, ou seja, o ser humano, como
sujeito e com suas experiências, deve ser considerado todo o tempo.
Assim, o que se tem em mente não é suprimir as disciplinas, mas articulá-
-las, religá-las, ou seja, verdadeiramente fazer com que elas se inter-relacionem
em contextos situados e funcionais. Somente podemos compreender a realidade
multidimensional que nos circunda a partir do que se denomina como comple-
xidade do real, percebendo as ligações, interações e implicações mútuas, as
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realidades simultaneamente solidárias e conflituosas, reformando o pensamento


de forma que não sejamos mais vítimas, por exemplo, do bombardeio de infor-
mações que chegam a nós diariamente, em avalanche, pela TV, pela internet,
pelos aplicativos de mensagens, pelas mídias sociais, sem que seja possível
um olhar analítico, crítico e reflexivo, que vá além daquilo que podemos, num
primeiro momento, aceitar como “verdades” pelo prisma unidimensional.
Conforme afirma Edgar Morin, “[o] ensino da compreensão é crucial,
se estivermos de acordo sobre a ideia de que o mundo se encontra devastado
pela incompreensão e que o progresso humano, por menor que seja, não pode
ser imaginado sem o progresso da compreensão” (ALMEIDA; CARVALHO,
2005, p. 95). Essa compreensão deve abranger a si mesmo, o outro, a partir
de uma leitura não linear, mas contextualizada, do mundo e das coisas.

As inteligências necessárias ao século XXI


Em virtude dos conceitos até aqui trabalhados, pode-se afirmar que no
processo de ensino e aprendizagem, ao excluirmos o sujeito, privilegiando
apenas os conteúdos, não reconhecendo a complexidade presente nesse pro-
cesso, assim como nas relações humanas, estamos fadados ao insucesso, uma
vez que vivemos “em um mundo incerto, mutante, complexo e indeterminado,
sujeito ao imprevisto e o inesperado” (MORAES; NAVAS, 2015, p. 13).
Nesse sentido, deve-se compreender também que o desenvolvimento da
inteligência geral requer o exercício da dúvida e da curiosidade, o que fer-
menta a atividade crítica, incluindo-se aí o exercício da lógica, do debate, da
indução, da argumentação, da observação, da experimentação e da discussão
(não nessa ordem).
Durkheim, citado por Edgar Morin (MORIN, 2010, p. 47), afirmava que
o objetivo da educação deve ser o “de criar [no aluno] um estado interior e
profundo, uma espécie de polaridade de espírito que o oriente em um sentido
definido, não apenas durante a infância, mas por toda a vida”, mais do que o
de transmitir conhecimentos [sic]80.

80 A autora deste artigo crê que, na escola, nas práticas expositivas em sala de aula, a partir também da leitura
e consulta aos livros didáticos e demais materiais didáticos, os docentes transmitem informações, não
222

Prosseguindo nessa perspectiva, compreendendo as demandas da socie-


dade atual, inclusive para o mercado de trabalho, que requer não mais uma
atividade meramente física, repetitiva e preditiva e que exige mais do que um
olhar para as tecnologias (de qualquer tipo) a partir meramente do tecnicismo,
as práticas escolares, em qualquer nível, devem ensinar a pensar (episteme), a
sentir (ethos) – tendo a empatia como um dos principais sentimentos a serem
desenvolvidos – e a agir (práxis), recuperando, de certa forma, os objetivos
da Paideia Grega (FAVA, 2018, p. 119).

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Assim, resumir-se-iam estes objetivos em quatro tipos de inteligência a
serem desenvolvidas, a saber:

a) Inteligência cognitiva – indivíduos que pensam, não apenas reprodu-


zem, que têm a capacidade de raciocinar, de sintetizar, de planejar,
de resolver problemas, de pensar de forma abstrata, de compreender
ideias complexas, de aprender aceleradamente e por toda a vida e
de assimilar com a experiência;
b) Inteligência emocional – indivíduos que saibam manear suas emo-
ções, tenham empatia;
c) Inteligência volitiva – indivíduos que tenham a atitude de agir, de
realizar, de transformar, de adotar, de se adaptar;
d) Inteligência decernere – indivíduos que tenham a habilidade de dis-
cernir, buscar a essência, de separar o que é importante e útil daquilo
que é descartável, escolher e decidir em meio ao caos, obscuridade
e incertezas (adaptado de FAVA, 2018, p. 119).

O conjunto destas inteligências, no mundo tecnológico em que vivemos,


reunidas num/a profissional, permitem que ele/ela tenha grandes chances de
êxito, de transformar, de inovar, de ser disruptivo/a, de fazer diferente, de ser
seguido/a e não seguidor/a.
Neste contexto, Fava (2018, p. 123) aponta que Big Techs, considerando
a inteligência emocional, já contratam comediantes e roteiristas para aproveitar
o aspecto humano da IA, “construindo personalidade em suas tecnologias”,
constituindo o que se pode denominar de uma outra geração de Inteligência
Artificial baseada na projeção de que “os seres humanos serão atraídos para a
interação entre máquinas que transmitam algum tipo de sentimento” (a IA dos
dispositivos da Apple, a Siri, que funciona a partir do processamento de língua
natural e do aprendizado de máquina, já faz uso desse tipo de tecnologia – tente
conhecimentos, uma vez que as informações somente se tornam conhecimentos por meio de um processo de
aprendizagem significativa, quando uma nova ideia se relaciona a conhecimentos prévios, em uma situação
relevante e significativa para o discente, o qual atualiza os conhecimentos anteriores, incorporando as novas
informações, atribuindo novos significados aos seus conhecimentos (MOREIRA, 2011).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 223

dizer a ela que ela está te incomodando e ela terá uma resposta semelhante a
de um humano, demonstrando, inclusive, se sentir ofendida).
Em outras palavras, não será a escola que baseia suas práticas de ensino
apenas no ensino mecânico, por transmissão, com aprendizagem passiva, em
memorização de conteúdos a serem descartados numa prova tradicional, sem
a preocupação de fixá-los, entendê-los, relacioná-los e saber o porquê e o para
quê que vai desenvolver estas quatro inteligências tão necessárias do século
XXI (presente) em diante (futuro). É preciso que se pense em um ensino
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inclusivo, na Aprendizagem Ativa e Significativa, na Pedagogia das Compe-


tências, na Aprendizagem Disruptiva, em novos e contextualizados modelos
de Avaliação da Aprendizagem para que tais objetivos sejam alcançados.

O Ensino por Competências – o caso das instituições de ensino


do Exército Brasileiro

Ensinar por competências significa entender que o mundo mudou, que


as necessidades são outras: a sociedade atual precisa de pessoas que pensem,
que saibam tomar iniciativas e resolver problemas complexos, que expressem
pensamentos e ideias, que saibam ouvir o outro e trabalhar em grupo.
Por outro lado, cabe ressaltar que a perspectiva do ensino por compe-
tências não é algo novo: as competências, na sua essência, têm uma perspec-
tiva inter e transdisciplinar. Elas trazem de volta, por exemplo, os princípios
pedagógicos que já estiveram presentes na proposta pedagógica da Escola
Nova, introduzida em 1882, no Brasil, por Rui Barbosa, antecipando assim a
teoria educacional de Dewey. No século XX, vários educadores se destaca-
ram, como, por exemplo, Lourenço Filho e Anísio Teixeira. Para Dewey, as
escolas deviam deixar de ser meros locais de transmissão de conhecimentos
e tornar-se pequenas comunidades, isto é, dar mais ênfase aos processos, às
ações, tirando o foco da teoria sem, contudo, dispensá-la, mas tornando-a
significativa (aqui é possível estabelecer a relação com a aprendizagem sig-
nificativa, proposta por Ausubel).
O ensino por competências também encontra suas raízes no Construti-
vismo, perspectiva em que o saber é entendido como algo que não está con-
cluído, terminado, mas em um processo incessante de construção e criação
(FREIRE et al., 2013).
O discurso pedagógico dos documentos oficiais (PCN, Diretrizes e Orien-
tações Curriculares, BNCC) e das matrizes de referência das Avaliações Exter-
nas de Larga Escala (SAEB, ENEM) também assume a perspectiva do ensino
por competências, insistindo na valorização de suas dimensões conceitual,
procedimental e atitudinal, as quais nos fazem voltar a atenção para os aspectos
224

da interdisciplinaridade, da contextualização, assim como para a relevância


das atitudes e da construção social para a constituição do conhecimento.
Por último, cabe ressaltar, também, a relevância da teoria das Inteligên-
cias Múltiplas, de Gardner, na prática pedagógica do ensino por competên-
cias: ela indica que a prática deve desenvolver-se a partir dos diversos campos
da inteligência e proporcionar condições para que todas as capacidades do
aluno se expandam, tendo o cuidado de não supervalorizar a dimensão cog-
nitiva apenas.

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Mas, afinal, o que são competências? Pode-se dizer que há ainda certa
escassez de produção teórica acerca deste conceito no contexto educacional.
Da literatura nacional, a maior parte se refere ao seu conceito na área de ensino
profissionalizante e administração. Os próprios documentos oficiais, muitas
vezes, não são tão precisos e, para compreender cada um desses conceitos
nesses documentos, é necessário que se tenha uma leitura prévia de autores
da área da Educação, como Zabala, Perrenoud, Pedro Demo etc. Ainda assim,
encontramos muitas incompatibilidades.
O conceito de competência compreende a capacidade de agir eficazmente
em um determinado tipo de situação, apoiando-se em conhecimentos, mas
sem se limitar a eles. Elas podem ser de diferentes naturezas (cognitivas,
intelectuais, relacionais, sociais, motoras, afetivas etc.) mas estão sempre
apoiadas na articulação de três elementos: conhecimentos (saberes)/ habi-
lidades/ atitudes. Elas não estão fechadas nos conteúdos ou nas disciplinas
escolares específicas, embora se refiram a eles. Como afirma Cruz (2010, p.
34), as ações da escola não podem estar reduzidas “apenas, ao desenvolvi-
mento da dimensão cognitiva, estruturada de maneira sequencial, linear, de
gradação ascendente, matematicamente concebida”, mas devem estar inseridas
“no contexto sociocultural e, com isso, se quer que o professor desenvolva a
dimensão sociopolítica das competências, ao lado das operações mentais de
natureza cognitiva”.
O conceito de competências emerge da prática social: elas exigem a
mobilização de conhecimentos e atitudes, traduzindo-se em ações, com o
propósito de solucionar problemas inerentes à vida, agregado à capacidade de
fazer a diferença. Em outras palavras, as competências estão no plano do “ser”.
No entanto, há que se considerar ainda o conceito de habilidades, que
constituem os componentes da competência explicitáveis na ação: elas não
existem em si mesmas, no espaço, mas decorrem da ação de uma pessoa sobre
o mundo. Em outras palavras, só podem ser reconhecidas como tais a partir
do reconhecimento do contexto de uma competência em que se inserem e
da qual elas fazem parte: as habilidades se encontram no plano do “fazer”.
A relação entre competências e habilidades e o conhecimento se materializa
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 225

no trabalho (intelectual ou prático) que uma pessoa realiza para fazer esco-
lhas, fundamentar seus atos, resolver situações e tomar decisões. Num ensino
mediado por ferramentas de IA, as competências e as habilidades em ação
traçam a linha entre usar adequadamente e usar a IA pela IA.
No Sistema Colégio Militar do Brasil (SCMB), a escolha por este enfoque
pedagógico veio como uma saída para diminuir o fracasso escolar, alinhado
ao desenvolvimento de práticas de multiletramentos. Entendeu-se que não
mais se podia adotar a prática de transmissão de informações disciplinares
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estanques, mas que o aluno necessitava ser orientado para o domínio das
(novas) linguagens e gêneros que se apresentavam, ser levado a refletir sobre
o processo do que lhe era ensinado, dando-lhe significado e estando preparado
para transferir o que aprende para dar conta das situações que se apresentariam
em sua vida, em diferentes contextos.
Na linha de ensino bélica, a implantação do ensino por competências (ao
menos na teoria e nos documentos) em 2011 ocorreu a partir do “Programa
O Profissional Militar do século XXI”, no contexto da “Diretriz do Processo
de Transformação do Exército Brasileiro (DPTEB)”, advinda do movimento
denominado de “Processo de Modernização do Ensino (PME)”, iniciado em
1995 (BRASIL, 1996). O ensino por competências surgiu como sugestão de
redirecionamento ao enfoque pedagógico adotado até então, o tecnicismo,
para correção de seus vieses81.
Neste sistema, o conceito de competências se apresenta como “capaci-
dade de mobilizar, ao mesmo tempo e de maneira inter-relacionada, conhe-
cimentos, habilidades, valores e atitudes, para decidir e atuar em situações
diversas”, semelhante ao que se apresentou para o SCMB, conforme descrito
em parágrafo anterior neste artigo.
A escolha pelo ensino por competências82 se justifica pelo cenário atual,
conforme descrito no caderno do “Programa O Profissional Militar do Século
XXI (CEP/FDC, 2011, p. 33):

[...] o campo de batalha moderno, com operações de amplo espectro,


nas quais o combatente está diante de um combate multifacetado com
a presença de várias agências, ações de guerra e de não guerra, exige

81 O ensino por competências não substituiu nem anulou completamente o tecnicismo nas práticas de ensino
militar, visto que algumas das técnicas e características deste enfoque pedagógico tinham (e têm) espaço
na formação militar. Na verdade, ambos os enfoques pedagógicos têm espaço na formação militar.
82 Devemos ressaltar que o ensino por competências apresenta afinidades com outras reformas ocorridas
ao longo do século XX no ensino militar, como as introduzidas pela Missão Francesa e pelas diretrizes da
Missão Americana, que “buscavam um processo de ensino-aprendizado centrado no aluno, [...] além da
ênfase no desenvolvimento das capacidades mentais avançadas, tais como o planejamento, a abstração,
a capacidade de resolver problemas” (CEP/FDC, 2011, p. 38).
226

do futuro tenente a tomada de decisões complexas, precisas e rápidas


em ambientes incertos. Em muitas situações, os reflexos de uma ação
tática podem ter consequências no campo estratégico (grifos nossos).

Ou seja, a questão da complexidade do real, que demanda a resolução de


problemas, a tomada de decisões, em um contexto instável, tendo em vista a
subjetividade inerente às ações humanas, sobressai e estabelece claramente
a relação entre o pensamento complexo e o ensino por competências. Hoje,

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considerando-se as guerras híbridas, considerando-se conflitos como o da
Rússia e Ucrânia (iniciado em 2022), que trazem um conflito de informações
e tecnológico, que afetam a opinião pública e lidam com aspectos sensíveis,
como os direitos humanos, é possível perceber como um enfoque pedagógico
como o do ensino por competências, relacionado à construção do conheci-
mento, ao ensino pela experiência, desenvolvido por meio do pensamento
crítico-reflexivo e mediado pelas tecnologias digitais e pela IA se torna rele-
vante na formação do militar profissional.

A Inteligência Artificial e o Pensamento Complexo –


encaminhamentos

Nas seções anteriores deste artigo, foi possível perceber que o pensa-
mento complexo (ou a complexidade do real) está na essência de todo o
debate acerca do ensino por competências, assim como está intrinsecamente
relacionado às inteligências do século XXI propostas por Fava (2018). É a
partir deste pensamento que compreendemos que em vez de segmentar o
conhecimento, devemos unificá-lo, conectando-o às multifacetadas perspec-
tivas da realidade que nos cerca, evitando, assim, a cegueira que nos impede
de usar adequadamente os recursos advindos do conhecimento científico.
Em seu vídeo sobre a Teoria do Pensamento Complexo de Edgar Morin,
Vilson Leffa (2022) explica que o ser humano tem uma visão equivocada da
ciência, que erroneamente favorece o reducionismo, a fragmentação e o rompi-
mento de conexões possíveis entre diferentes esferas do conhecimento. Como
o linguista aplicado explica, “a palavra complexidade foi escolhida porque
vem de complexus, do Latim, que significa ‘costurado junto’” (LEFFA, 2022).
Na teoria do Pensamento Complexo, o conhecimento se constrói, como
já referenciado neste artigo, por meio das conexões (Morin chama de religa-
ções) entre as diferentes áreas do saber, a articulação dos contraditórios, da
certeza versus a incerteza, do sujeito versus a sociedade – ao lançarmos um
olhar sobre um objeto, uma realidade, um problema a ser resolvido, devemos
fazê-lo por meio de um olhar analítico, mas articulador dos conhecimentos
nas diferentes áreas do saber, a fim de que a compreensão ocorra na sua
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 227

totalidade, a partir de uma perspectiva holística e humanizadora. E será este


olhar dispensado à Inteligência Artificial.
A IA é a construção virtual encontrada para fazer com que os computa-
dores realizem coisas que até então apenas a mente humana seria capaz de
fazer. E como se dá esse funcionamento? A partir da aplicação de métodos
estatísticos por meio da mineração de grandes bancos de dados (data mining),
extraindo, daí, correlações, projeções e estimativas de futuro, como se o futuro
pudesse ser estimado pelo passado, ideia que advém dos séculos XVI e XVII,
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imortalizada pelo matemático francês Pierre Simon Laplace. Era o chamado


“demônio de Laplace” (NICOLELIS, 2023).
Todavia, quando se pensa em IA, observa-se que a mitificação foi maior
que a realidade, talvez devido aos diversos livros e filmes de ficção científica,
como “Eu, Robô”, de Isaac Asimov, filmes como “Metrópolis”, “Her”, “O
Homem Bicentenário”, “Ex Machina”, entre outros. O processo do transu-
manismo passou a habitar o imaginário social das pessoas, passou-se a crer
que a “inteligência não-humana” sobreporia a inteligência humana e que os
robôs dominariam o mundo.
No ensino, à parte o temor da tecnologia, observa-se a movimentação
de especialistas na tentativa de deter ações de produções escolares e acadê-
micas a partir da utilização da ferramenta de IA denominada ChatGPT em
perspectivas que inibem a visão crítico-reflexiva e criativa desses discentes,
levando-os a pecar, inclusive, nos aspectos éticos.
No entanto, há que se ressaltar o outro lado da moeda: para se obter uma
resposta eficaz e adequada nesse modelo de plataforma denominada de LLM
(Large Language Models), é requerido um alto nível de letramento, visto que
se a entrada (input) se der por questões e prompts ambíguos pode confundir a
saída (output) da IA comprometendo sua habilidade de compreender e responder
adequadamente à pergunta. Os/As estudantes têm apenas que compreender que
a IA não substitui sua aprendizagem nem seu processo de letramento em uma
determinada temática, mas pode colaborar, trazendo até outras perspectivas.
Por outro lado, essa mesma ferramenta, assim como outras mais, constan-
temente deixam expostos seus vieses de preconceito, estereótipo – recentemente
foi feita uma busca de imagens na plataforma do Canva pelos termos “bebê
negro” e uma das imagens era a de um chimpanzé! – e não consegue também
responder a perguntas existenciais, ou seja, tiraria zero na disciplina de Filosofia.
Contudo, é possível dizer, com base em pesquisas científicas, principal-
mente na área da Psicologia, Neurologia e Neurociência, conforme afirma
Nicolelis (2023), que os “grandes atributos da mente humana – intuição,
inteligência, empatia, solidariedade – são todos não computáveis, não são
reduzíveis a um algoritmo digital”, embora a lógica digital possa influenciar
como o cérebro humano funciona.
228

Uma vez que mecanismos de IA estão em quase tudo à nossa volta,


inclusive nas plataformas de ensino, o olhar para esse tipo de tecnologia deve
ser informado, crítico e preocupado com questões éticas: a “tecnologia não
dever ser o fim, todavia, certamente deverá ser o meio para tornar o processo
de educar mais eficiente, efetivo e eficaz, sem perder o foco no que realmente
importa: a aprendizagem” (FAVA, 2018, p. 144).
Qualquer agente de ensino – docentes, instrutores, coordenadores peda-
gógicos, psicopedagogos, entre outros – deve reconhecer que há riscos e

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vantagens na utilização desse tipo de tecnologia (os docentes podem ter seu
tempo otimizado para atividades de orientação e tutoria, visto que dispositivos
de IA podem dar conta de atividades de correção de exercícios objetivos e
demais atividades repetitivas; os discentes podem ter um retorno mais rápido
de suas atividades, propiciando uma retificação da aprendizagem mais breve,
por exemplo): “A IA pode também nos ajudar a aprender de forma personali-
zada e mais eficiente. Ela analisa nossos modo e preferências de aprendizagem
e nos dá recomendações personalizadas de cursos e materiais de estudo.83”
(FITZPATRICK; FOX; WEINSTEIN, 2023, p. 43, tradução nossa).
Um outro elemento importante a ser considerado é o “Learning Analy-
tics” (análise da aprendizagem), conceito que se baseia nos dados de apren-
dizagem coletados em plataformas de ensino e que funciona por meio de
soluções como Big Data e Inteligência Artificial, principalmente. Por meio
da ferramenta do “Learning Analytics”, é possível capturar, analisar e distri-
buir dados gerados nos AVA (Ambientes Virtuais de Aprendizagem), como
erros e acertos de testes, quantidade de acessos a um determinado conteúdo,
tempo de permanência em um conteúdo ou atividade, acesso a atividades
complementares etc., transformando-os em informações que podem ajudar
a aprimorar o processo de ensino, e até criar planos didáticos de curso mais
adequados, a partir da identificação e categorização de comportamentos cole-
tivos e individuais dos usuários. Infelizmente, poucos docentes e tutores
têm conhecimento dessa funcionalidade e poucos gestores dão acesso a essa
ferramenta nos AVA das instituições de ensino.
Não obstante, é preciso lembrar que todos esses dados advêm de pro-
jeções estatísticas, que dependem do tipo/da qualidade e da quantidade de
dados informados, assim como não se pode esquecer que os algoritmos são
frios e reducionistas. Os dados ponderados devem ser considerados e o olhar
humano para os resultados deve estar sempre presente, ajustando os resul-
tados apresentados (no EB, na AMAN, utiliza-se a plataforma open-source
GEPHI para auxiliar na avaliação de conteúdos atitudinais, uma plataforma

83 AI can also help us to learn in a more personalized and efficient way. It will analyze our learning behavior
and preferences and provide us with customized recommendations for courses and study materials.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 229

que, a partir de redes neurais artificiais e com o auxílio da teoria dos grafos,
traz resultados baseados na compilação estatística).
Em países como a China, escolas já utilizam ferramentas de IA que
prometem conectar escola, pais e professores, informando acerca do humor,
do nível de atenção, das ações e atividades do/as estudantes. No Brasil,
já chegou um aplicativo/plataforma que faz a mesma coisa – ClassDojo
– inclusive, alegando ser possível trabalhar habilidades socioemocionais
a partir dele. Já há quem se coloque tanto a favor quanto contra tal uso
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(conferir o artigo on-line sobre a plataforma ClassDojo disponível nas refe-


rências bibliográficas).
Finalmente, outro aspecto que deve compor este olhar para a IA é o ético,
grande preocupação de instituições internacionais: por exemplo, a OECD
(Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgou
o documento “Recomendação do Conselho sobre Inteligência Artificial”,
em 2019, no qual são listados mais de 70 documentos publicados nos últi-
mos 3 anos que trazem recomendações sobre os princípios éticos para a IA.
Ressalta-se, porém, que a maioria desses documentos focam nos desafios
éticos existentes, mas menos nas ações que deveriam ser tomadas (NIEMI;
PEA; LU, 2023, p. 514). Como os autores confirmam, “Faltam orientações
éticas para a educação num contexto de aplicação da IA [...], embora sua
necessidade tenha sido reconhecida décadas antes [...]. Entretanto, questões
educacionais fazem parte das orientações nas políticas públicas gerais [...].”84
(NIEMI; PEA; LU, 2023, p. 514, tradução nossa), embora se reconheça a
transparência, justiça, equidade, não-maleficência (relacionada à segurança
de dados e humana), responsabilidade e privacidade como valores éticos
para o uso da IA.
Um ponto que deve ser destacado, contudo, é: as instituições de ensino
não devem ser os primeiros lugares a utilizar a IA por propósitos de mer-
cado – elas devem estabelecer a utilização de tecnologia nos seus próprios
termos, o que é desafiador, visto que as mudanças ocorrem num ritmo muito
frenético e a “inércia” dos currículos é histórica, “apresentando cegueira, falta
de preditividade e resistência a qualquer tentativa de mexer no status quo de
currículos incontestavelmente defasados” (FAVA, 2018, p. 144).
Em outras palavras, há ainda um longo caminho de aprendizagem em
relação ao uso da IA no ensino e esse caminho deve ser trilhado a partir de
um olhar analítico, crítico e reflexivo, colaborativo e cooperativo.

84 Ethical guidelines for education as a context of AI application are mainly lacking (Holmes et al. 2021), although
the need has been recognised decades ago (Aiken and Epstein 2000). Nonetheless, educational issues are
included in general policy-level guidelines (e.g. AI HLEG 2019a).
230

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ZABALA, Antoni; ARNAU, Laia. Como aprender e ensinar competências.


Porto Alegre: Artmed, 2010.
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A MÁQUINA E A QUALIDADE:
Inteligência Artificial, tecnicismo e o
processo de modernização do Exército
Fábio Facchinetti Freire85
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Introdução

N
ão é de hoje que nossa sociedade convive com diferentes inteligên-
cias artificiais (IAs). Assumindo funções humanas nas sombras do
mundo do trabalho, robôs atendem a nossas reclamações, saciam
nossa curiosidade, gerenciam nossa rotina. Porém, a emergência de alguns
deles capazes de nublar a fronteira entre o Homem e a Máquina nos inquieta
e assusta. O que temos a ganhar ou perder em um mundo no qual não mais
seremos os únicos capazes de transformar a realidade que nos cerca? E o
que o Exército Brasileiro (EB) tem a ganhar ou perder, como instituição
formadora de sujeitos, em uma sociedade pautada pela lógica da tecnologia?
Este trabalho objetiva, por meio de revisão bibliográfica, examinar “a
contrapelo” fatos e conceitos que estão ressignificando a nossa sociedade,
principalmente quando implicados na avaliação da formação militar, objeto
de nosso recorte. São fatos e conceitos que, uma vez assumidos sem uma
crítica ancorada em valores fundacionais, podem desvirtuar um processo de
subjetivação historicamente voltado para o ser do profissional das Armas,
muito mais do que para seu fazer cotidiano.
Em especial, interessa-nos o fugidio conceito de inteligência, o qual,
pela histórica dificuldade de aquilatar, foi substituído por sua manifestação
operacional, a competência. O que as IAs têm a nos dizer – e mais: a nos
esconder – sobre o que estamos olhando quando avaliamos a inteligência
(ou a competência)?

85 Coronel da reserva do Exército (Academia Militar das Agulhas Negras – AMAN, 1988). Mestre em Aplicações
Militares (Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais – EsAO, 1996). Mestre em Educação (Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, 2007). Doutor em Ciências Sociais (Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro – PUC-Rio, 2015). Pós-Doutor em História (Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO,
2022). Membro do grupo de pesquisa História Militar, política e fronteiras (2023). Como pesquisador, investiga
o ensino militar dentro do Exército Brasileiro. E-mail: fabiofreire1965@gmail.com
234

Turing e as quatro feridas narcísicas

O “teste de Turing”, ao definir uma avaliação capaz de chancelar a


existência, ou não, de uma IA equivalente à humana, estabeleceu o ponto de
inflexão a partir do qual nós, seres humanos, perderíamos nossa exclusivi-
dade como uma espécie “sapiens”. Considerando o progresso da informática
desde o século XX e o aumento escalar da capacidade de processamento
dos computadores – conforme primeiro esboçado pela Lei de Moore86 –,

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percebemos que esse turning point (ou momento de “singularidade tecno-
lógica”)87 não se apresenta mais como uma possibilidade (pode ocorrer ou
não), porém como uma certeza sobre a qual desconheceríamos o momento
de eclosão (quando ocorrerá).
Mas ao que estamos nos referindo quando citamos o “teste de Turing”?
O matemático inglês Alan Turing (1912-1954) propôs uma experiência na
qual dois interlocutores trocam mensagens, sem se conhecerem. O objetivo
da comunicação é verificar se cada um deles pode afirmar que o outro é um
ser humano. Vamos ocupar a posição de um dos debatedores: teríamos que,
mediante a troca de mensagens e sem nenhuma outra informação sobre com
quem estamos debatendo, poder afirmar a humanidade do outro participante,
ou – o que dá no mesmo, segundo o critério de Turing – não ter condições de
afirmar o contrário: que o debatedor oposto é uma IA.
O teste como um todo nos permite várias ilações interessantes em rela-
ção ao argumento que começamos a perseguir. Em primeiro lugar, a maneira
pragmática com a qual Turing evita definir diversos conceitos: prova, verdade,
pensamento, consciência, inteligência, entre outros. Em nenhum momento,
exige-se que o dialogante seja um ser humano: basta que ele se comporte como
tal e em tal nível que, para o fim colimado – argumentar – não seja possível
desqualificá-lo. Estamos aceitando a imitação como verdade, e a suficiência
(capacidade da IA em se comunicar, o que poderia ser substituído por uma
igual capacidade em resolver diversos tipos de problemas) como gabarito.
Não mais ser, porém parecer, de uma maneira suficiente.

86 Na esteira de outros pesquisadores que, como primeiramente Alan Turing, formularam hipóteses de
evolucionismo do hardware, o químico estadunidense Gordon Moore (1929-2023) previu, no artigo “Cramming
More Components onto Integrated Circuits” (MOORE, 1965), que o número de transistores contidos em um
mesmo dispositivo duplicaria, a custo constante, a cada vinte e quatro meses (esse intervalo foi reduzido
posteriormente para dezoito meses).
87 A hipótese da singularidade tecnológica diz respeito ao momento no qual uma IA capaz de
autoaperfeiçoamento ultrapassará a inteligência humana. Esse fenômeno imponderável pode proporcionar
leituras otimistas, como a de que essa IA irá resolver os problemas humanos para os quais nunca
encontramos solução; ou pessimistas, como a de que a Humanidade perderá seu livre-arbítrio para
as máquinas. Para saber mais sobre a singularidade tecnológica, ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/
Singularidade_tecnol%C3%B3gica#Hist%C3%B3ria_do_conceito
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 235

A opção metodológica que o teste faz, pelo critério de uma imitação


eficaz, unidimensiona a complexidade da existência humana, abordando-a, de
maneira pontual, segundo suas manifestações comportamentais. Bem antes
da onipresença midiática de IA´s como o ChatGPT88, todos nós já tínhamos
experenciado intercursos com IAs de menor capacidade, como os robôs que
atendem os Serviços de Atendimento do Consumidor (SAC) das operadoras
de telefonia; os assessores de design que sugerem soluções de imagem, como
no Powerpoint; ou sido induzidos, em nossos desejos de consumo, pelos algo-
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ritmos das plataformas digitais. Esses são exemplos ligeiros e, com certeza,
não exaustivos, de situações cotidianas em que admitimos as máquinas como
sujeitos de nosso convívio, porque elas foram – e são – capazes de resolver
problemas com eficácia humana (ou sobre-humana). Essas IAs não são “real-
mente” sujeitos, mas os imitam de maneira satisfatória, em aspectos opera-
cionais recortados da capacidade “multitarefa” (também “multiproblema”)
de todos os seres humanos.
Entendemos a complexidade humana, para fins deste trabalho, como um
tipo de relação holonômica89 entre suas partes constitutivas, de tal maneira que
sua qualidade intrínseca emerge de cada uma das partes, desde que nenhuma
delas seja tomada em separado do todo90. Quando Turing evita definir concei-
tos implicados na constituição do ser humano, está reconhecendo, ainda que
em modo implícito, que existe aí uma complexidade que ele não conseguiria
enfrentar, ou, por outra: que não seria necessário enfrentar, uma vez feita a
escolha pela imitação eficaz.
O que parece preocupar a muitos, em tempos de mediatização das IAs, é
a possibilidade de algum tipo de superação da espécie humana pelas máqui-
nas, no que isso venha a implicar em sermos dominados por elas. Mas o que
estaríamos perdendo, no caso dessa superação?
Santaella (2023) inclui a eclosão dessa super IA humanoide91 como o
momento da quarta ferida narcísica no Homem. A metáfora das três feridas
narcísicas foi apresentada por Sigmund Freud (2010), inventariando aqueles
momentos em que a humanidade foi destituída de posições hegemônicas
(podemos pensar em posições “centrais”). A primeira das feridas diz respeito

88 Para saber mais sobre o assistente virtual inteligente, no formato chatbot online, que trouxe a discussão
sobre as IAs (e o medo de um futuro distópico) para a superfície das redes sociais, ver: https://openai.com/
89 “Artur Koestler criou a palavra Holons para designar esses subsistemas que são, simultaneamente, ‘todos’ e
‘partes’, e enfatizou que cada holon tem duas tendências opostas: uma tendência integrativa, que funciona
como parte do todo maior, e uma tendência autoafirmativa, que preserva sua autonomia individual” (PAULA
CARVALHO, 1990, p. 213)
90 Ou, como disse o poeta: “Para ser grande, sê inteiro: nada / Teu exagera ou exclui. / Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és / No mínimo que fazes. / Assim em cada lago a lua toda / Brilha, porque alta vive” (PESSOA,
1969, p. 289).
91 “Semelhante ao humano”, portanto, uma imitação.
236

ao heliocentrismo de Ptolomeu, Copérnico e Galileu, quando a Terra deixou


de ser o centro do universo; a segunda ferida, a teoria darwiniana da evolu-
ção, quando a raça humana deixou de estar no centro da Criação; por último,
a descoberta do inconsciente pela psicanálise de Freud, quando deixamos
de estar no centro de nossa própria consciência. Nesses termos, ao sermos
ultrapassados em (mais) esse campo de supremacia, a inteligência, sofrería-
mos a quarta ferida em nosso orgulho como espécie, e seriamos descentrados
da posição de criadores do mundo que nos cerca, como não mais os únicos

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capazes de atribuir sentido a realidade em que existimos.
Mas é pertinente afirmar essa superação? Uma imitação eficaz da inte-
ligência é suficiente para contrapor-se à complexidade fundante do mundo
que nos cerca? A seguir, iremos aprofundar a distinção entre o que fazemos
(e como fazemos) no exercício de nossa inteligência (ou sua manifestação,
a competência) e o que realmente fazem (e como fazem) as IAs, em sua
imitação eficaz.

Qualidade, quantidade e os tipos de informação

“A contrapelo”, propomos o exame do que Nicolelis (2020) chama de


“computadores orgânicos”. Partindo da definição do viver como “dissipar
energia para poder embutir informação na massa orgânica do organismo”
(NICOLELIS, 2020, p. 47), concluímos que, sob diversas maneiras, a natureza
estoca informação convertendo energia, como parte da resistência contra a
entropia92 (morte). Essa é uma ideia que vem de Prigogine (1917-2003), para
quem a vida pode ser expressa como sistemas abertos em desequilíbrio, e a
morte, como o equilíbrio termodinâmico definitivo93.
Um exemplo, temos o ciclo da árvore: por meio de suas folhas que fun-
cionam como painéis solares, a árvore captura energia solar, a qual reagirá
com a água absorvida pelas raízes mais o dióxido de carbono, em um processo
(fotossíntese) que fará a árvore crescer, frutificar e reproduzir-se. Animais her-
bívoros, ao se alimentarem das árvores (folhas, frutos, raízes), estão realizando
um processo análogo de capturar recursos do meio ambiente, produzindo
energia que será dissipada em parte (devolvida para o ambiente), e, em outra
parte, gasta na transformação desses animais (crescimento e reprodução). Seres

92 Entropia é um conceito da termodinâmica que representa o nível de desordem de um dado sistema. Na


desordem máxima não existe troca de energia, portanto não há também movimento. O universo, como um
todo, caminha para essa situação de absoluta desorganização (incerteza), e a “vida” pode ser entendida
como a produção de ordem que se opõe à entropia.
93 Ficará para outro trabalho a exploração sociológica – cara para autores como Morin (2002, 2003, entre
outros trabalhos) – do desequilíbrio termodinâmico como a diferença fundamental – que anima e renova
também as sociedades humanas.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 237

humanos, por sua vez, alimentam-se tanto das árvores como dos animais, e
fazem a mesma coisa: recebendo energia, transformando / dissipando energia.
Ao longo de todo esse processo – incluindo-se aí, mesmo os seres
inanimados –, existe a produção de informação em toda a sorte de registros
que vão se acumulando dentro dos sistemas: as árvores, em seu ciclo vital,
desenvolvem anéis nos seus troncos, os quais são um registro do clima e da
geografia94; os herbívoros distinguem-se em cores, tamanhos, especificidades
diversas que são a codificação do seu entorno; os homens, em um estágio
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bem mais complexo por conta de sua cultura, produzem sentido sobre os
processos de fuga da entropia.
Porém os seres desprovidos de cérebros (ou estruturas equivalentes) não
são capazes de fazer um uso próprio dessa informação. Uma árvore registra,
pelo tamanho e espessura de seus anéis, como foram as estações dos últimos
anos, mas será necessário um ser humano para dispor dessa informação –
preservada em fósseis – para, por exemplo, reconstituir as eras geológicas
precedentes. E mais: seres neurologicamente mais complexos produzem
conhecimento sob a forma dessas modificações que ocorrem neles próprios,
e são capazes de aprendizagem, pela passagem entre si das modificações.
Cultura pode ser entendida, portanto, como o grande sistema de comparti-
lhamento de informação, sob a forma de energia e com o objetivo de evitar a
entropia95. Ao tipo de informação produzida, transmitida e gerenciada dessa
maneira, iremos chamar, com Nicolelis (2020), de informação gödelliana96.
Dessa concepção sobre computadores orgânicos – que é a formulação
mais antiga sobre computação –, seguimos para os computadores com os quais
estamos acostumados. Em 1948, o matemático e engenheiro elétrico Claude
Shannon publicou seu seminal conceito da informação em termos matemá-
ticos97, no qual estabeleceu o bit como unidade quantitativa de informação.
Essa formulação é partidária da mesma origem dos computadores analógicos,
quanto à relação entre energia e entropia, mas se atém ao que Shannon chama

94 Charles Babbage (1791-1871), um dos pioneiros da era moderna da computação, formulou a hipótese
de que seria possível determinar a idade e as condições climáticas de eras passadas a partir de árvores
fossilizadas. Porém a dendrocronologia só foi reconhecida como área de pesquisa muito tempo depois, a
partir do trabalho perseverante do astrônomo Andrew Ellicott Douglass (1867-1961).
95 Ou melhor, formulado por Nicolelis (2020, p. 60): “Basicamente, a nossa teoria propõe que seres vivos
dissipam energia para sustentar um processo de auto-organização que permite à informação ser incorporada
em sua matéria orgânica, de sorte a formar ilhas de entropia reduzida que valentemente tentam frear,
mesmo que em escala infinitesimal, a tendência dominante de todo o universo em migrar para um estado
de aleatoriedade terminal”.
96 Acompanhando a homenagem ao matemático Kurt Gödell (1906-1978).
97 SHANNON, Claude E. A Mathematical Theory of Communication. The Bell System Technical Journal, v. 27,
p. 379-423, July, 1948. Disponível: https://people.math.harvard.edu/~ctm/home/text/others/shannon/entropy/
entropy.pdf. Acesso em: 30 maio 23.
238

de “o problema fundamental da comunicação”, ou seja, “reproduzir em um


ponto, quer exata, quer aproximadamente, uma mensagem selecionada em
outro ponto” (SHANNON, 1948, p. 58). Junto com a “lógica booleana”98 e o
arcabouço teórico de Alan Turing, foi concebido um novo tipo de computação,
que não considera contexto, semântica ou significado (SHANNON, 1948).
Os elementos que a computação rapidamente apresentada acima – que
chamaremos de computação quantitativa, ou shannoniana, ou digital – não
considera, são centrais para o desenvolvimento de nosso argumento. O tipo

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de informação que os computadores digitais processam é sempre formal, por-
tanto, redutível a uma expressão matemática do tipo “x+1 = 2”. É verdade que
uma extensão gigantesca de informações existente ao nosso redor se apresenta
tratável nos termos da computação quantitativa, o que levou à empregabilidade
hegemônica dos computadores digitais e ao posterior transbordamento desse
emprego para campos regidos por informações não totalmente compatíveis
com o processamento shannoniano.
Porque a informação analógica, aquela na qual estamos todos imersos
como seres que produzem ordem em reação à entropia, essa é multifacetada,
posto que transporta sempre elementos outros – o contexto, a semântica e o
significado, no mínimo – que nunca estão presentes (ou só ao custo de enormes
desvios) na formulação digital. Esses elementos situam a informação em rela-
ção a algo que está fora dela. São eles que, por exemplo, nos permitem distin-
guir, de imediato, como reagir à expressão: “Isso é um assalto!”, quando dita
por um bandido que nos aborda, ou quando dita por qualquer um indignado
com o preço de uma mercadoria; ou entender, de pronto, que John Lennon
não se referia a um item de confeitaria quando disse que “o sonho acabou”;
ou ainda quando nos emocionarmos com qualquer expressão artística.
Em mais um exemplo da história, do alcance e do fascínio da computa-
ção shannoniana, podemos citar o jogo de xadrez. A geração do autor deste
artigo acompanhou a luta da humanidade rumo à derrota, representada pela
segunda partida entre o Grande Mestre enxadrista Garry Kasparov (1963) e
o computador Deep Blue, da IBM, em 1997. Após vencer no ano anterior,
Kasparov enfrentou uma versão atualizada do computador e foi derrotado,
configurando-se, assim, uma significativa superação do Homem pela Máquina
– já a quarta ferida narcísica? –, ainda que vaticinada como consequência
da Lei de Moore: seria apenas uma questão de tempo até que a escalada na
capacidade de processamento dos computadores permitisse uma vitória em
um esporte que é quantificável pela lógica digital99.

98 De George Boole (1815-1864); permitiu a codificação da informação em termos de “0 ou 1”.


99 Para saber mais sobre esse confronto entre o Homem e a Máquina, ver o documentário: “Game Over:
Kasparov and the machine” (2003), de Vikram Jayanti. Disponível: https://www.documentarymania.com/
video/Game% 20Over%20Kasparov%20and%20the%20Machine/ Acesso em: 30 maio 23.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 239

Tecnicismo e o processo de modernização do exército brasileiro

Correntes pedagógicas representam intencionalidades. Do grego pai-


dós (criança) e agodé (condução), a pedagogia representou, originalmente,
a atividade educativa de um adulto (normalmente um escravo) sobre uma
criança. O adulto que conduz faz determinadas escolhas, porque muitos são
os caminhos. De onde as correntes pedagógicas se configuram como percur-
sos orientados para objetivos distintos que, em sua última e mais profunda
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concepção, dizem respeito ao que se entende por Homem, e ao seu lugar na


sociedade e no mundo.
O Tecnicismo como corrente pedagógica se refere à concepção produti-
vista da educação (SAVIANI, 2007). Está relacionada a ela a teoria do capital
humano, que introduz diretrizes de racionalidade, eficiência e produtividade na
educação, uma área que, até então, não colocava esses princípios como essen-
ciais100. O Tecnicismo entende a ação humana reduzida à sua finalidade; agimos
diretamente para objetivos, e sendo possível estabelecê-los a priori, é possível,
também, organizar um processo educacional que nos conduza à melhor maneira
(a mais econômica) de realizá-los. Essa gerência da formação desconsidera a
incerteza, o imponderável, o subjetivo – enfim, toda a dimensão qualitativa da
ação humana, a qual não pode ser otimizada para finalidades quantificáveis.
Examinando as diversas correntes pedagógicas como diferentes relacio-
namentos entre os sujeitos (docentes e discentes) e os meios (ferramental)
pelos quais a relação de aprendizagem é estabelecida, podemos afirmar que,
na chamada pedagogia Tradicional101, os meios são criados e/ou seleciona-
dos para firmar a subordinação dos discentes aos docentes, de tal modo que
a subjetividade desses se impõe à subjetividade daqueles, formatando-a. Na
pedagogia Nova, em linhas gerais, a relação se inverte: os meios são criados
e/ou selecionados para colocar a subjetividade dos docentes a serviço da for-
mação da subjetividade dos discentes. No Tecnicismo – admitido, aqui, como
uma derivação da pedagogia Tradicional – ocorre a submissão de ambos os
polos de subjetividade (docentes e discentes) aos meios, eles mesmos erigidos
como referência para o sujeito finalístico.
Esse é um cenário em que a sociedade (e mais: a própria realidade) deve
organizar-se segundo uma lógica shannoniana, de informações quantitativas,
desprezando – ou subalternizando – as informações qualitativas. O que se
ganha e o que se perde com essa proposta? O mérito declarado – não nos

100 Foge ao escopo desse artigo uma discussão sobre os tipos de racionalidade. A ascensão do Iluminismo na
Modernidade, sobre o Cristianismo na Idade Média, representou uma valorização anterior de um tipo de razão.
Porém a razão imposta pelo Tecnicismo tem a ver com o que WEBER (2000) chamou de “racionalidade técnica”.
101 Para uma taxonomia das correntes pedagógicas, ver Libâneo (2001).
240

cabendo, aqui, uma discussão sobre a manutenção das relações de poder – seria
a economia de recursos (fazer com menos) e a conquista da eficácia (fazer
melhor); o que parece ser a consequência, no entanto, é a hegemonia de uma
subjetividade maquínica (GHIRALDELLI, 2023), ou – o que dá no mesmo
– a expulsão da Humanidade de seu próprio mundo (uma ferida narcísica).
No Brasil, a entrada do Tecnicismo se dá ao fim da década de 1960,
formalizado em seguida pela Lei 5.692/71, que consagra princípios do for-
dismo, do taylorismo, do enfoque sistêmico e do behaviorismo relacionado

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a uma concepção de ensino voltada ao comportamento e não à consciência
(SAVIANI, p. 369). Como uma tecnologia educacional, a corrente se espraia
para toda a dimensão educativa:

Embora uma tecnologia do ensino se ocupe principalmente com o compor-


tamento do aluno, existem outras figuras no mundo da educação às quais
se aplica uma análise experimental. Precisamos ter melhor compreensão
não só dos que aprendem como também: 1) dos que ensinam; 2) dos que
se empenham na pesquisa educacional; 3) dos que administram escolas
e faculdades; 4) dos que estabelecem a política educacional; e 5) dos que
mantêm a educação. Todas essas pessoas estão sujeitas a contingências de
reforço que podem precisar ser alteradas para melhorar a educação como
instituição (SKINNER apud SAVIANI, 368).

Privilegiando padronização (modelos fechados são mais econômicos:


mesmas provas, apostilas, aulas etc.), homogeneidade (não interessa reco-
nhecer as diferenças entre os sujeitos), predição (objetivos claros e bem defi-
nidos) e controle (mapeamento preciso para o caminho até os objetivos), o
Tecnicismo acarreta uma pesada burocracia. Multiplicam-se os formulários,
as fichas, os baremas, os quais, constituindo uma materialidade objetiva (em
sentido pobre) para o processo educacional, vão expulsando a complexidade
dos sujeitos, no que essa é constituída de incerteza, de história, de diversidade,
e buscando tudo aquilo que é quantificável, comparável, tabelável e cabível
em uma taxionomia – o universo shannoniano.
O EB aderiu amplamente ao Tecnicismo, na década de 1970, menos pela
colaboração dessa corrente aos resultados do emprego da Força Armada102,
do que pelo reforço à ideologia de impessoalidade, tão cara ao ethos militar.
O Tecnicismo é fabril, promete ganhos de escala e vai totalmente ao encontro
de fetiches de padronização do tipo: “condições de execução”103 e “padrão

102 Basta observar os sinais de modernização do ensino que já ecoavam do “irmão do norte”, os EUA, principal
referência doutrinária para o EB, e que podem ser recolhidos de Janowitz (1967).
103 “Orientam a execução de missões de combate para atingir o padrão mínimo desejado e descrevem os
principais aspectos a serem considerados na preparação do exercício correspondente” (BRASIL, 2012, p. 12).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 241

mínimo”104. Cumpre salientar que, assim como já observamos quanto às ações


humanas otimizáveis pelas IAs (porque são redutíveis a repetições e compara-
ções, principalmente – exemplo do jogo de xadrez), existe uma extensa gama
de fazeres militares que podem ser decompostos em ações mais simples, essas
enquadráveis no esquema quantitativo da informação shannoniana. Porém o
que nos interessa mais de perto, como pertinente aos questionamentos formu-
lados na introdução desse estudo, é o transbordamento da lógica da Máquina
para campos (que deveriam ser) regidos por informações gödellianas.
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Na segunda metade da década de 1995, o EB dá início ao seu Processo


de Modernização de Ensino (PME).
O PME surgiu no esteio dos debates em torno da Constituição de 1988,
da Reformulação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação e da elaboração
dos Planos Curriculares Nacionais (LUCHETTI, 2006). Dois documentos do
Estado-Maior do Exército (EME) – “Política Educacional para o Exército
Brasileiro no ano 2000” e “Política Educacional” – concluíram apontando
para a “necessidade de redimensionamento do perfil do militar profissional,
tendo em vista os desafios esperados para os primeiros anos do século XXI”
(BRASIL, 1996, p. 1). Entre os traços desse perfil, destacamos:

– Crença e compromisso com os valores centrais da Instituição;


– Atitudes que denotem criatividade, iniciativa, decisão, adaptabili-
dade, cooperação, arrojo, flexibilidade e liderança;
– Habilidades interpessoais que facilitem sua interação com indiví-
duos e grupos;
– Senso de responsabilidade pelo autoaperfeiçoamento;
– Habilidades cognitivas, nos níveis de compreensão, reflexão crítica
e de aplicação de ideias criativas;
– Domínio de idiomas estrangeiros;
– Habilidades para fazer uso dos recursos de informática;
- Habilidades físicas típicas da profissão (BRASIL, p. 2, grifos nossos).

Como síntese, podemos dizer que o novo perfil perseguia a autonomia


dos sujeitos, sua capacidade em agir na adversidade e na incerteza, trabalhando
em grupo e em uma realidade multicultural. Algo muito diferente do perfil
anterior, fortemente ancorado na obediência como um valor em si mesma
e na capacidade de reproduzir, com a máxima fidelidade, conhecimentos,
comportamentos e atitudes previamente apresentados.

104 “O padrão mínimo é definido por dois fatores: a síntese do desempenho coletivo do agrupamento,
demonstrado pela execução de tarefas que caracterizam o cumprimento da missão de combate; e as Tarefas
Específicas, relacionadas com a missão de combate, que devem ser executadas, satisfatoriamente, pelos
principais elementos do escalão considerados e seus agrupamentos subordinados (BRASIL, 2012, p. 13).
242

Em 1995, foi criado o Grupo de Trabalho para o Estudo da Modernização


do Ensino (GTEME), onde uma equipe seleta de oficiais produziu uma crítica
ampla, profunda e contundente sobre o Tecnicismo até então hegemônico. Esta
crítica foi publicizada em um relatório, “Fundamentos para a Modernização
do Ensino: Diagnóstico efetuado no sistema de ensino e proposta de ações
para corrigir as deficiências encontradas” (Doc. 49), de 15 de julho de 1996
(BRASIL, 1996), o qual, ao mesmo tempo em que mantinha os princípios de
uma pedagogia da Tradição (transmissão, de geração em geração, de um con-

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junto de saberes e de valores de uma ordem estabelecida), remetia à intenção
de adoção de novo enfoque pedagógico:

Inicialmente, é necessário entender como modernização do Sistema


de Ensino do Exército, o processo contínuo de adoção de novo enfo-
que pedagógico. Segundo o modelo que se quer adotar, a escola já não
pode ensinar tudo. Seleciona um núcleo de conhecimentos básicos para
ministrar a seus alunos. Esses devem participar ativamente do processo
ensino-aprendizagem, experimentando, pesquisando e trabalhando em
grupo, explorando a dúvida e o erro, manifestando seus talentos, usando
técnicas disponíveis na busca e seleção do conhecimento que constroem.
[...] Devem ser flexível e adaptável [sic] às novas gerações de tecnologias.
[...] Portanto, é um processo inesgotável, que se deseja transformado numa
postura pedagógica (GLEUBER VIEIRA, 1998, p. 6).

Da publicação do Doc. 49 até meados de 2006, tivemos a tentativa de


implantação das mudanças descritas no diagnóstico. O processo foi avaliado
em duas pesquisas: uma primeira, em 2006, promovida pelo Grupo de Estudo
Diagnóstico do Ensino Militar – GEDEM (BRASIL, 2006) e uma segunda,
em 2008, mais robusta e que faz referência à primeira, pelo Departamento
de Educação e Cultura do Exército – DECEx (BRASIL, 2009). Ambos os
levantamentos apontaram para a conquista parcial dos objetivos colimados.
A implantação do Ensino por Competências (IEC), cujas discussões
começaram em 2011, foi o desdobramento coerente do redirecionamento
pedagógico iniciado com o PME105. Em 2013, foi publicado seu primeiro
documento normativo: as Instruções Reguladoras do Ensino por Competên-
cias: Currículo e Avaliação – IREC/1ª Edição (BRASIL, 2013).
Ambas as intervenções – o PME e a IEC – buscaram atender, mais do que
aos óbices observados em relatórios, à prospecção sobre a sociedade futura
e seu tipo correspondente de guerra. Porque a complexidade e a tecnologia
crescentes vieram explodindo as fronteiras dos conflitos, bem como a ética

105 Foge ao escopo dessa investigação aprofundar as convergências entre o Ensino por Competências e o
próprio Tecnicismo. Para tanto, ver: Saviani (2007, capítulo XIV).
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 243

proposta por essa delimitação. A chamada guerra de 4ª geração, ou híbrida


(KORYBKO, 2018; MURRAY; MANSOOR, 2020) não acontece em terreno e
tempo restritos, com atores específicos. Ela pode acontecer sem ser declarada,
e terminar sem o enfrentamento de tropas. Passaram a ter peso, na tomada
de decisão, elementos como opinião pública, ecologia, direitos humanos etc.
Esse novo modelo de contenda recupera, ainda que em outros termos,
a valorização da formação ampla, interdisciplinar, contínua, crítica; não sob
a ótica humanista do Iluminismo oitocentista, presente na primeira das aca-
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demias militares106; nem do Positivismo comteano, na República Velha107;


sequer (ou pouco) ao gosto das pedagogias liberais cognitivistas; mas ao sabor
pragmático do compromisso para com o combate no século XXI.

Considerações finais

Neste ponto, convergindo os vetores apresentados ao longo do texto, no


intuito de amarrá-los e responder as questões que motivaram nosso trabalho,
vamos nos permitir agir, mais uma vez, a contrapelo do discurso mais óbvio.
Começamos o artigo descrevendo a intenção de Turing, em seu teste,
como despreocupada em definir o que seria, na verdade, uma inteligência
humana. Pragmático, o cientista se contentou com a capacidade em se parecer
com um ser humano: a imitação eficaz. Acostumamo-nos, assim, a crer que
possuíamos uma inteligência diferente e superior, e ver os avanços tecno-
lógicos galgando – cada vez mais rápido – os degraus até o nosso patamar.
Chegaria o dia – temerário! – em que a imitação pela IA seria tal que nos
enganaria. Não percebemos (narcisos que somos) que a lógica discreta e
insidiosa da Máquina, com seu mérito quantitativo, vinha emergindo de seu
meio técnico, prático, laboral, até transbordar para a dimensão das relações
humanas, a noosfera daquilo que é humano, demasiado humano.
A pressa se traduziu em pobreza de expressão108; a busca pela objetivi-
dade se corrompeu em limitação da criatividade; a confiança em modelos é a
covardia da inovação; poder dizer: “– não!” estava na essência (inimitável!)
do ser humano.
O processo de quantificação da realidade (“tudo passando a ter valor
de troca”, poderia dizer um Marx pós-moderno) vem dando a tônica nas
últimas décadas. Desse modo, não foi a IA que conquistou alturas cada vez
mais altas (ou não foi somente isso), rumo ao nosso Olimpo de arrogância

106 Lembrando, aqui, do estatuto de Dom Rodrigo Coutinho para a Real Academia Militar (1810).
107 Em especial, a reforma de Benjamin Constant, em (1890).
108 A novilíngua imaginada por Orwell (2019) nos contamina sem imposição autoritária, muita mais pela sedução
do conforto e do comodismo, como em um “admirável mundo novo” (HUXLEY, 2014). Sem nos incomodarmos
– e até gostando – vamos perdendo a capacidade linguística de criticar e divergir.
244

preguiçosa. Fomos nós que viemos descendo morro abaixo, complexidade


a menos, a qualidade degradando em uma entropia de ideias.
Para o caso militar, no ponto mais alto da hegemonia tecnicista – que era,
também, a hegemonia das avaliações somativas –, qualquer prova correspon-
dia a um somatório de “gaivotas”. A essas, pretendíamos que correspondesse
uma “ideia”, uma unidade de conhecimento passível de contabilização (o
grau). Tudo pensado como a solução ótima para classificações, transferências
e promoções. Corrigir uma avaliação desse tipo correspondia a um movi-

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mento invariável da comparação: do gabarito para a prova – sim (igual =
verde) ou não (diferente = vermelho). Algo que poderia ser feito por uma IA.
Não que essa tenha se enriquecido até um alto nível de performance; nós é
que desambicionamos de nossa própria excelência.
Foi contra esse cenário, em prospecção exitosa, que o PME se insur-
giu. Contra a vilanização da aprendizagem, antevista como um sério risco,
frente ao desenho do emprego bélico do século XXI. E as ações topifica-
das no Documento 49 propõem, quase todas, a retomada da qualidade, da
autoria, da iniciativa, da criatividade e do senso crítico, todos atributos da
analógica gödelliana.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 245

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COMPETÊNCIAS DIGITAIS E
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL:
novos desafios no processo de ensino
e aprendizagem a distância
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Ketia Kellen Araújo da Silva109

Introdução

O
presente capítulo, através de uma revisão sistemática da literatura
especializada, apresenta uma visão geral das mudanças trazidas pela
digitalização da educação, pela ascensão da Inteligência Artificial
e pela necessidade de desenvolver competências digitais na educação a dis-
tância. Assim, pretende-se destacar as mudanças observadas no processo de
ensino e aprendizagem a distância e nas competências digitais que auxiliem
no uso de Inteligência Artificial nessa modalidade.
O momento é de rápida transformação em todos os setores da sociedade,
causando mudanças significativas em todos os aspectos da vida cotidiana.
Entretanto, talvez nenhum seja mais transformador do que a IA, que, nos
últimos anos, influencia o modo como ensinamos e aprendemos, criando
oportunidades e desafios a serem enfrentados.
Dessa forma, o capítulo explora dois aspectos cruciais dessa transforma-
ção: a emergente importância das competências digitais e o papel da Inteligên-
cia Artificial na educação a distância. No cenário educacional do século XXI, é
cada vez mais evidente que as competências digitais se tornaram fundamentais
para a vida e para o trabalho. De acordo com Silva e Behar (2019), as CD são
um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA) voltados para
o uso das tecnologias digitais que, mobilizados, podem auxiliar o sujeito na
solução de determinada situação problema. Desse modo, na EaD conside-
ra-se fundamental entender quais competências digitais são essenciais e de
que forma podem ser construídas, tornando-se assim uma solução específica

109 Professora da Escola de Guerra Naval (EGN). Colaboradora na Universitat Oberta de Catalunya (UOC) no
Máster Universitário en Educación y TIC e do Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação
(PGIE/UFRGS). Pós-Doutorado no PPGIE/UFRGS. Doutora em Informática na Educação – PPGIE/UFRGS,
com período sanduíche na Universitat Oberta de Cataluña (UOC). Mestra em Educação PPGEDU/UFRGS.
Graduada em Pedagogia (UFRGS). Participa como pesquisadora no Núcleo de Tecnologia Digital aplicado
a Educação. Membro da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) e da Associação Brasileira
de Tecnologia Educacional (ABT). E-mail: ketia.kellen@marinha.mil.br
250

para as mudanças atuais e futuras provocadas pela sociedade. Dentre estas


mudanças emergentes, a IA se estabeleceu como uma ferramenta poderosa
para melhorar a eficácia e a eficiência das experiências de aprendizado per-
sonalizadas e interativas na EaD, permitindo o desenvolvimento de sistemas
de ensino adaptativos, personalizando a experiência de aprendizado de cada
aluno, identificando suas necessidades e ajustando o conteúdo e a abordagem
de ensino de acordo com seu perfil.
No entanto, a utilização adequada destes recursos na EaD tem se tornado

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um desafio. Para Lameras e Arnab (2021), abraçar o ensino e a aprendiza-
gem com o uso da IA é uma decisão complexa e ainda mal definida que os
professores precisam considerar ao refletir sobre: o que significaria ensinar
e aprender na era da IA? É nesse ponto que surgem diversas preocupações
com relação às questões éticas, uso de dados digitais, transparência e criati-
vidade no ensino e na aprendizagem. Assim, revela-se a necessidade de que
as instituições educacionais, ao se adaptarem a IA, preparem seus docentes e
discentes para o uso eficaz e ético dessas tecnologias. Já que, segundo Dong
e Chen (2020), seria ingênuo pensar que a IA terá impacto no ensino e na
aprendizagem apenas do ponto de vista tecnológico, mas também do ponto
de vista pedagógico, ético e de desenvolvimento de competências.
Além disso, as mudanças causadas pelas tecnologias e inovações digitais,
como big data, robôs autônomos, IoT, nuvens, realidade virtual e inteligência
virtual, implicam necessariamente em treinamento e adaptação. No entanto,
algumas das competências tradicionais, como inteligência emocional, criati-
vidade, flexibilidade e gestão, não podem ser executadas por máquinas. Por
essa razão, torna-se especialmente relevante a necessidade de ser adaptável e
capaz de aceitar rapidamente novas ideias (GIANECCHINI, 2018).
Assim, percebe-se a necessidade de esclarecer os tipos de IA através dos
conceitos e sua relação com a Educação a Distância e com a construção de
CD que auxiliem os docentes e discentes no uso dessas novas ferramentas.
Segundo Ahmad, Murugesan e Kshetri (2023), no futuro, o sucesso em muitas
carreiras exigirá trabalhar com IA de forma eficaz, por isso aqueles que não
possuírem as competências estarão em grande desvantagem no mercado de
trabalho. Já para Gallardo-Gallardo e Collings (2021), as competências que
eram cruciais há uma década não são mais valiosas, enquanto muitas novas
competências surgirão para atender às necessidades com a tecnologia e a IA.
Nessa perspectiva, o propósito deste capítulo foi investigar as principais
tendências e lacunas das pesquisas envolvendo a IA, a Educação a Distância
e as Competências Digitais dos últimos anos. Para isso, conduziu-se uma
RSL de estudos na língua inglesa, guiada pelas diretrizes propostas em Kit-
chenham e Charters (2007). Espera-se que essa discussão contribua para a
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 251

compreensão das constantes mudanças da educação, impulsionando futuras


propostas e práticas na área.
O capítulo está organizado da seguinte forma: Seção 2, apresenta-se a
metodologia utilizada. A Seção 3, trata dos resultados e discussão da revisão.
Por fim, na Seção 4 são apresentadas as considerações finais.

Metodologia
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Como método para revisão sistemática, utilizou-se o proposto por Kit-


chenham e Charters (2007). A pesquisa foi estruturada em três etapas, sendo a
primeira o planejamento. Nela ocorreu a identificação da necessidade de uma
revisão para Inteligência Artificial na educação a distância e as competências
digitais, com o estabelecimento de um protocolo de pesquisa. A nível nacional,
não foram identificados trabalhos que se relacionassem com as competências
digitais. Dessa forma, a busca foi realizada na língua inglesa. Na segunda
etapa, a de condução e extração dos dados, executou-se o protocolo com a
finalidade de identificar e filtrar apenas artigos relevantes. Por fim, na terceira
foi realizada a apresentação e análise dos dados extraídos a fim de responder
às questões de pesquisas da RSL.
Foram definidas as seguintes questões de pesquisas: “QP1. O que é a
Inteligência Artificial na educação? “QP2. Quais são os tipos de Inteligência
Artificial na educação a distância? e QP3. Quais competências digitais podem
ser construídas ou são essenciais para o uso de Inteligência Artificial na educa-
ção a distância?” Foram selecionados cinco repositórios digitais: ACM Digital
Library, Science Direct, Scopus, IEEE Explorer e Google Acadêmico. Para a
pesquisa, foram determinadas as palavras chaves “Education”, “E-learning”,
“Artificial Intelligence” e “Digital Competence” e seus respectivos sinônimos.

Critérios de seleção e extração dos dados

A condução foi de abril a junho de 2023 e foram identificadas 210 publi-


cações científicas. A seleção de artigos ocorreu em duas fases.: 1: aplicação de
critérios para decidir os estudos selecionados para a fase seguinte, com base
em um conjunto de 6 critérios de inclusão: 1) Publicações entre 2019 e 2023;
2) Publicações de revistas científicas; 3) Idioma inglês; 4) Artigo completo; 5)
Termo de busca presente em pelo menos um dos seguintes metadados: título,
resumo ou palavras-chave e 6) Temática principal, a Inteligência Artificial
na EaD e competências digitais. E 6 critérios de exclusão: 1) Artigo fora do
intervalo de tempo; 2) Artigo que não foi publicado em revista científica; 3)
Artigo de outro idioma; 4) Artigo que não é completo; 5) Sem o termo de
busca nos metadados definidos e 6) Artigo sem temática principal definida. Os
252

artigos aprovados foram submetidos à segunda fase da seleção para se estimar


a qualidade dos estudos, através das pesquisas com (i) maior validade, (ii)
melhor detalhamento; e (iii) maior descrição da temática, através de questões
definidas. Cada artigo obteve um peso que variou entre a faixa 0 e 10, sendo
o peso mínimo de 7 pontos para os aceitos. Após a etapa de avaliação quali-
tativa, foram aprovados 6 artigos, conforme Tabela 1 a seguir.

Tabela 1 – Artigos

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Artigos selecionados
Código Artigo
PARDAMEAN, Bens et al. AI-based learning style prediction in on-line learning for primary education. IEEE
A1
Access, v. 10, p. 35725-35735, 2022.
MURTAZA, Mir et al. AI-based personalized e-learning systems: Issues, challenges, and solutions. IEEE
A2
Access, 2022.
ADNAN, Muhammad et al. Earliest Possible Global and Local Interpretation of Students’ Performance in
A3
Virtual Learning Environment by Leveraging Explainable AI. IEEE Access, v. 10, p. 129843-129864, 2022.
SANTANA, Mónica; DÍAZ-FERNÁNDEZ, Mirta. Competencies for the artificial intelligence age: visualisation
A4
of the state of the art and future perspectives. Review of Managerial Science, p. 1-34, 2022.
SHAFIQUE, Rahman et al. Role of Artificial Intelligence in On-line Education: A Systematic Mapping Study.
A5
IEEE Access, 2023.
CAROLUS, Astrid et al. Digital interaction literacy model–Conceptualizing competencies for literate interactions
A6
with voice-based AI systems. Computers and Education: Artificial Intelligence, v. 4, p. 100114, 2023.
Fonte: Elaborado pela autora.

A extração de dados foi realizada a partir dos artigos selecionados e


informações relevantes para responder às questões de pesquisas estabelecidas.

Resultados e discussão

Esta seção apresenta as respostas para cada questão de pesquisa.

A Inteligência Artificial na educação

A partir da análise do conceito de Inteligência Artificial nos artigos, per-


cebe-se que a maioria dos quatro artigos [A1, A2, A3 e A5] não discutem o
termo, mas sim partem para a aplicação na educação. Já os artigos [A4 e A6]
apresentam brevemente o que é a IA, antes de focar na pesquisa. Tais artigos
destacam-se por apresentarem mais o viés da competência do que a própria IA.
Contudo, percebe-se uma discussão introdutória. Segundo Santana e Díaz (2022)
trata-se de um conceito difuso, principalmente devido às diferentes definições de
inteligência em si e à variedade de definições de IA apresentando a sua impor-
tância ao ser utilizada em alguma proposta educacional, principalmente na EaD.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 253

Os conceitos apresentados de IA são de Kaplan e Haenlein (2019), que


tratam a Inteligência Artificial como a capacidade do sistema de entender e
aprender com dados externos e utilizá-los para executar tarefas específicas e
atingir objetivos por meio de adaptação versátil. Trata-se de uma definição típica
de IA, ao se referir a uma máquina ou sistema de computador como o executor
de alguma simulação ou processo que imita o funcionamento interno de uma
entidade biológica considerada inteligente. Outro conceito apresentado é o de
Russell e Norvig (2020), que demarcam a IA como um campo de pesquisa
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separado, incluindo algoritmos que replicam capacidades humanas como criati-


vidade, aprendizado autônoma ou utilização da fala, ou máquinas que permitem
operar de forma autônoma em ambientes complexos e em constante mudança.
A análise fornece uma visão interessante sobre como a Inteligência
Artificial é discutida na literatura acadêmica. Percebe-se a IA como uma
ferramenta capaz de aprender e fazer de forma autônoma uma determinada
tarefa, deixando claro que, embora os artigos tratem de IA na educação, não
existe uma preocupação em esclarecer o conceito, por parecer que esse já
está amplamente acordado. A preocupação, na verdade, é apresentar como
essa ferramenta e suas aplicações podem ser utilizadas na educação e espe-
cificamente a distância, para auxiliar o processo de ensino e aprendizagem
automatizando algumas tarefas que seria do docente ou do estudante.
Parece haver uma tendência para o foco na aplicação prática da IA,
especialmente no campo da educação a distância, pois a IA é um campo bem
estabelecido com uma definição amplamente aceita. A esse respeito, Kaplan
e Haenlein (2019) e Russell e Norvig (2020) oferecem definições claras e
detalhadas de IA. Em ambos os casos, a IA é retratada como uma ferramenta
que pode aprender autonomamente e executar tarefas, seja ela a simulação de
habilidades humanas ou a operação independente em ambientes complexos.
No contexto da educação, isto implica na capacidade da IA em auxiliar ou
mesmo substituir o docente ou estudante em algumas tarefas, permitindo uma
automatização benéfica para o ensino e a aprendizagem. No entanto, nota-se
que, apesar dessa tendência geral, a IA ainda é um “conceito difuso”, como
sugerido por Santana e Díaz (2022), principalmente devido às várias defi-
nições. Isso sugere que, embora existam conceituações amplamente aceitas
de IA, ainda há espaço para discussões e debates sobre o que exatamente a
constitui e como ela deve ser aplicada. Em resumo, embora haja uma tendência
de foco na aplicação da IA na educação em vez de um aprofundamento do
conceito, ainda existe um diálogo acadêmico em curso sobre sua natureza e
como ela poderia ser mais bem compreendida e utilizada.
Assim, torna-se fundamental conhecer as aplicações para entender como
são realizadas na EaD. Tais questões serão analisadas a seguir.
254

A Inteligência Artificial aplicada à educação a distância

Os tipos de IA utilizados na educação a distância foram analisados nos seis


artigos. O estudo de Pardemean et al. (2022) [A1] trata do desenvolvimento de
um sistema de recomendação para aprendizagem personalizada on-line através
de dois modelos de IA. O primeiro para prever o aprendizado do aluno, definindo
o estilo de aprendizagem, e o segundo para recomendação de materiais a partir
deste perfil. O modelo de IA é baseado em filtragem colaborativa.

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Por sua vez, Murtaza et al. (2022) [A2] apresenta um sistema de e-lear-
ning adaptável e personalizado baseado em IA que oferece conteúdo específico
e direcionado para cada aluno. Nesse artigo, propõe-se uma estrutura que
integra rastreamento de conhecimento, adaptação do modo de aprendiza-
gem e sistemas de recomendação para a entrega de conteúdo de e-learning
personalizado, através da Machine Learning (ML) e Deep Learning (DL).
Dessa forma, integram-se diferentes técnicas baseadas em IA que foram pes-
quisadas e validadas e a criação de plataformas personalizadas de e-learning
resulta em um sistema abrangente que mitiga os problemas e deficiências de
modelos individuais.
Adnan et al. (2022) [A3] tratam o uso de IA explicável (XAI), um novo
ramo que pode ser usado em ambientes virtuais de aprendizagem, fornecendo
resultados de desempenho de estudo de alunos on-line de uma maneira com-
preensível para humanos. O estudo apresenta ainda o desenvolvimento de
um modelo preditivo XAI que interpreta e prevê o comportamento de apren-
dizagem dos alunos o mais cedo possível no curso. Ou seja, buscou criar um
modelo preditivo XAI que possa identificar os alunos em risco de reprovação
e explicar aos instrutores as principais causas de reprovação de maneira fácil
e compreensível para humanos, levando, assim, ao desenvolvimento de um
sistema que forneça feedback inteligente e recomendações de ações adequadas
para apoiar os alunos em estudos autorregulados.
Já Santana e Díaz (2022) [A4] não discutem uma aplicação específica
na educação, mas apontam o crescente uso da IA e da big data, levando as
organizações a aumentarem a sua demanda por cientistas e analistas de dados
especialistas em IA e tecnologia de big data. Nesse sentido, as organizações
devem colaborar com as instituições de ensino para alinhar os currículos com
os requisitos da indústria em termos de competências relacionadas à IA e big
data, através de competências digitais.
Shafique et al. (2023) [A5] realizam um levantamento sistemático que,
dentre os resultados, apresenta quatro formas de IA mais utilizadas na edu-
cação: 1. Abordagem baseada em aprendizado de máquina, 2. Abordagem
baseada em aprendizagem profunda, 3. Modelagem de equações estruturais
ou abordagem baseada em análise e 4. Abordagem híbrida.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 255

Carolus et al. (2023) [A6] trata de um estudo sobre IA baseado em voz,


através de um agente de Inteligência Artificial (IVA) com alto-falantes inteli-
gentes como (Amazon Echo, Google Home) ou serviços de assistente pessoal
inteligente controlados por voz com (Amazon Alexa, Google Assistant). Os
IVAs são implementados em vários dispositivos como smartphones, alto-fa-
lantes inteligentes, aparelhos de TV, relógios inteligentes e carros, e permitem
que os usuários executem várias tarefas usando entrada de voz. As funções
mais populares em geral incluem responder a perguntas curtas, tocar música
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e definir temporizadores ou alarmes (LOPATOVSKA et al., 2019). Os autores


acreditam que pais, professores e outros cuidadores são responsáveis por ensi-
nar as crianças a interagir alfabetizadas com IVAs. Os educadores deveriam
ser capazes de ensinar sobre IVAs às crianças de uma forma compreensível,
sendo capazes de fornecer conhecimento sobre IA baseada em voz e avaliar
pedagogicamente o comportamento de uso de crianças e adolescentes. Os
pais deveriam monitorar e avaliar o comportamento de uso de seus filhos para
garantir que sua privacidade seja protegida.
A partir dos estudos, percebe-se que são apresentadas e discutidas dife-
rentes aplicações da IA na educação, desde sistemas de recomendação para
aprendizagem personalizada até o uso de IA explicável (XAI) e IA baseada em
voz. Enquanto Pardamean et al. (2022) e Murtaza et al. (2022) se concentram
na criação de sistemas de aprendizagem personalizados ajustando a entrega de
conteúdo de acordo com o perfil de aprendizado do aluno, com a previsão e reco-
mendação mais abrangente e adaptável, integrando técnicas de IA como o ML
e DL, Adnan et al. (2022) exploram um ramo mais recente da IA, a explicável,
que permite resultados de desempenho de estudo dos alunos compreensíveis
pelos humanos. Isso difere dos estudos de Pardamean et al. (2022) e Murtaza
et al. (2022), pois se concentra na capacidade da IA de fornecer feedback e
recomendações compreensíveis aos humanos, e não apenas na personalização
do conteúdo de aprendizado. Já Shafique et al. (2023) apresenta uma visão
mais abrangente, discutindo quatro diferentes abordagens de IA utilizadas na
educação. Essa iniciativa enseja a estruturação de um panorama mais geral,
contrastando com os estudos anteriores que se focam em aplicações específicas.
Finalmente, Carolus et al. (2023) discute a IA baseada em voz e sua aplicação na
educação. Essa é uma abordagem muito diferente das outras, concentrando-se
em como os assistentes virtuais podem ser usados na educação e na necessidade
de educar as crianças sobre o uso desses assistentes com voz.
Em resumo, os estudos tratam de aspectos distintos da IA na educação,
desde a personalização da aprendizagem até a compreensibilidade da IA e
o uso de assistentes virtuais, trazendo uma perspectiva única, ressaltando a
versatilidade e o potencial da IA na melhoria da educação.
256

As competências digitais e a Inteligência Artificial na educação a


distância

A partir da análise dos seis artigos, foram identificados quatro estudos [A1,
A3, A4 e A6] que abordam as competências, nem sempre digitais, mas com
foco no uso da IA. O estudo de Pardamean et al. (2022) [A1] apresenta a impor-
tância da construção do pensamento integrativo e a construção de competências
para aprendizagem on-line em comparação com a aprendizagem convencional,

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como autonomia. Para os autores, a IA e a aprendizagem personalizada poderá
favorecer a construção de competências específicas do aluno no processo de
ensino e aprendizagem uma vez que “os estilos de aprendizagem baseados na
personalidade são pensados para ajudar os alunos com competências e hábitos
variados no monitoramento de situações de aprendizagem a melhorar suas
habilidades cognitivas” (PARDAMEAN et al., 2022, p. 3).
Adnan et al. (2022) [A3] não apresenta competências para IA, mas sim
na formação dos alunos, pois, ao interagirem na plataforma, precisam construir
competências ligadas às disciplinas.
Santana e Díaz (2022) [A4] identificam no estudo a importância de cons-
truir competências digitais para lidar com a IA. Embora existam vários tipos
de competências, nessa situação, as digitais tornam-se um recurso-chave de
capital humano (VAN LAAR et al. 2017). O conceito de CD é o da Comis-
são Europeia no projeto DIGCOMP, sendo um conjunto de conhecimentos,
habilidades, atitudes necessários ao usar as TIC e mídias digitais para realizar
tarefas; resolver problemas; comunicar; gerenciar informações; colaborar;
criar e compartilhar conteúdo; construir conhecimento de forma eficaz, efi-
ciente, adequada, crítica, criativa, autônoma, flexível, ética, reflexivamente
para o trabalho, lazer, participação, aprendizagem, socialização, consumo e
empoderamento (FERRARI, 2012, p. 3).
É importante ressaltar que as CD surgem como consequência das mudan-
ças tecnológicas e contribuem para a transformação cultural e digital, sendo a
aquisição de conhecimentos, valores, atitudes, ética e normas nos processos de
digitalização. Como acontece com qualquer tipo de competência, as classifica-
ções das digitais são múltiplas e ainda não há consenso sobre elas. No entanto,
uma revisão da literatura sobre IA e competências permitiu que os autores
identificassem os fatores necessários para alavancar o uso de IA, sendo: comuni-
cação e resolução de problemas, seguidos de colaboração, trabalho em equipe e
habilidades técnicas, que incluem todos os aspectos relacionados à programação
e ao uso de ferramentas de software e hardware ligadas à IA e big data.
Por fim, CAROLUS et al. (2023) [A6], trata da importância da Alfabe-
tização Digital em IA abrangendo as competências necessárias para interagir
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 257

com a IA de maneira autônoma e racional (NG et al., 2021). No artigo a IA se


centra no uso da voz em diversos recursos, sendo que modelos anteriores de
alfabetização em IA (LONG; MARGERKO, 2020) referem-se a tecnologias
e aplicativos de IA em geral, desconsiderando aplicativos a partir da voz.
Assim sendo, a tecnologia de IA baseada em voz rompe com as formas pre-
viamente estabelecidas de interação humano-computador, pois são baseadas
principalmente na modalidade de linguagem falada. Tal modalidade impõe
novas demandas às competências dos usuários uma vez que a linguagem é
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particularmente adequada para incorporar características humanas, que podem


ser acompanhadas de falsas expectativas (NASS; MOON; GREEN, 1997;
REEVES; NASS, 1996; WIENRICH; CAROLUS, 2021). Além disso, consi-
dera-se que os novos modelos de alfabetização se referem à tecnologia de IA
conceituando alfabetização de IA (WANG E YUAN, 2022) ou alfabetização
de dados (BULL; HGUYEN, 2020; LONG; MGERKO, 2020).
Assim, a partir da análise, percebe-se uma gama de competências neces-
sárias para interagir efetivamente com a Inteligência Artificial na educação,
que podem ser identificadas na Tabela 2.

Tabela 2 – Competências identificadas nos artigos


Autor Competências
Gestão da informação, colaboração, comunicação e compartilhamento, criação de con-
Ferrari (2012)
teúdo e conhecimento, ética e responsabilidade, avaliação e resolução de problemas.
Processamento de informações, comunicação, criação de conteúdo, segurança, resolução
Murawski e Bick (2017) de problemas, direitos digitais, inteligência emocional digital, trabalho em equipe digital,
uso de Big Data, uso de Inteligência Artificial e liderança virtual.
Metacognitivas (pensamento crítico, criatividade pensar, aprender a aprender e autorre-
gulação); competências sociais e emocionais (empatia, autoeficácia e colaboração); e
OCDE (2018)
habilidades práticas e físicas (usando novos dispositivos de tecnologia de informação e
comunicação).
Gianecchini (2018) Inteligência emocional, criatividade, flexibilidade e gestão.
Competências críticas (ou seja, pensamento crítico e resolução de problemas, colaboração
em redes e liderança por influência, agilidade e adaptabilidade, iniciativa e empreendedo-
Sousa e Wilks (2018) rismo, comunicação oral e escrita eficaz, avaliação e análise de informações, curiosidade
e imaginação) e competências tecnológicas disruptivas (ou seja, Inteligência Artificial,
nanotecnologias, robotização, internet das coisas e realidade aumentada).
Alfabetização informacional e de dados, comunicação e colaboração, alfabetização midiá-
Gonzalez-Vazquez et al. tica, criação de conteúdo digital (incluindo programação), segurança (incluindo bem-estar
(2019) digital e competências relacionadas à segurança cibernética), questões relacionadas à
propriedade intelectual, resolução de problemas e pensamento crítico.
Uso de hardware e software, programação, uso de aplicativos, capacidade inovação e
criatividade, processamento de informações, organização de dados, comunicação, cola-
Oberlander et al. (2020) boração, networking, netiqueta, compartilhamento de dados com outros, lei de segurança,
responsabilidade, motivação, vontade de aprender e abertura ao novo, ética e moral,
autonomia e independência, resolução de problemas.
continua...
258

continuação
Autor Competências
Pardamean et al. (2022) Pensamento integrativo e autonomia.
Adnan et al. (2022) Competências de acordo com as disciplinas específicas que estão sendo estudadas.
Comunicação, resolução de problemas, colaboração, trabalho em equipe, competências
Santana e Díaz (2022) técnicas relacionados à programação, uso de ferramentas de software e hardware ligadas
à IA e big data.
Carolus et al. (2023) Alfabetização digital em IA e alfabetização em dados.
Fonte: Elaborado pela autora.

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Conforme visto na Tabela 2, o agrupamento resultou em uma diver-
sidade de competências além das digitais, reagrupadas nas seguintes cate-
gorias: digitais, cognitivas e emocionais. As digitais estão relacionadas ao
uso de tecnologia digital, como computadores, dispositivos móveis, redes
e software e interação com estes recursos. As cognitivas estão relacionadas
às atividades mentais e de pensamento que uma pessoa usa para adquirir
conhecimento, compreender e interpretar o mundo ao seu redor e tomar
decisões. Por fim, as emocionais relacionam-se à capacidade de uma pes-
soa reconhecer, entender e gerenciar as próprias emoções e as emoções
dos outros. Dessa forma, foram identificadas as seguintes competências
organizadas por categoria e autores.

Competências Digitais

• Gestão da informação, colaboração, comunicação e compartilha-


mento de informação (FERRARI, 2012).
• Processamento de informações, direitos digitais, inteligência emo-
cional digital, trabalho em equipe digital, uso de Big Data e de Inte-
ligência Artificial, liderança virtual (MURAWSKI; BICK, 2017).
• Uso de novos dispositivos de tecnologia de informação e comu-
nicação (OCDE, 2018). Competências tecnológicas disruptivas,
alfabetização informacional e de dados, alfabetização midiática
(SOUSA; WILKS, 2018).
• Manuseio de hardware, de software e de aplicativos, organização
de dados, netiqueta (OBERLANDER et al., 2020).
• Uso de ferramentas de software e hardware ligadas à IA e big data
(SANTANA; DÍAZ, 2022).
• Alfabetização digital em IA e em dados (CAROLUS et al., 2023).
• Criação de conteúdo (FERRARI, 2012; MURAWSKI; BICK, 2017;
GONZALEZ et al., 2019).
• Segurança cibernética (FERRARI, 2012, GONZALEZ et al., 2019;
OBERLANDER et al., 2020;
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 259

• Programação (OBERLANDER et al., 2020; SANTANA;


DÍAZ, 2022).

Competências cognitivas

• Ética, responsabilidade, avaliação (FERRARI, 2012).


• Aprender a aprender, autorregulação, competências sociais, empatia,
autoeficácia e colaboração (OCDE, 2018).
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• Criatividade, flexibilidade e gestão pessoal (GIANECCHINI, 2018).


• Agilidade, adaptabilidade, iniciativa, comunicação oral e escrita,
avaliação e análise de informações, curiosidade e imaginação
(SOUSA; WILKS, 2018).
• Propriedade intelectual (GONZALEZ et al., 2019).
• Inovação, processamento de informações, responsabilidade, moti-
vação, vontade de aprender, abertura ano novo, ética, moral, auto-
nomia, pensamento integrativo (PARDAMEAN et al., 2022).
• Competências de acordo com as disciplinas específicas que estão
sendo estudadas (ADNAN et al., 2022).
• Trabalho em Equipe (SANTANA; DÍAZ, 2022).
• Resolução de problemas (MURAWSKI; BICK, 2017; SOUSA;
WILKS, 2018; GONZALEZ et al., 2019; OBERLANDER et al.,
2020; SANTANA; DÍAZ, 2022).
• Pensamento crítico (SOUSA; WILKS, 2018; OCDE, 2018; GON-
ZALEZ et al., 2019).
• Criatividade (OCDE, 2018; PARDAMEAN et al., 2022).
• Comunicação e colaboração (PARDAMEAN et al., 2022; SAN-
TANA; DÍAZ, 2022; OCDE, 2018).
• Autonomia (PARDAMEAN et al., 2022; MURAWSKI;
BICK, 2017).

Competências emocionais

• Inteligência emocional digital (MURAWSKI; BICK, 2017).


• Competências emocionais: empatia, autoeficácia (OCDE, 2018).
• Inteligência emocional (GIANECCHINI, 2018).

Ao realizar o cruzamento entre as competências identificadas com a Inte-


ligência Artificial e educação a distância, percebe-se uma relação estreita, já
que a IA é uma tecnologia complexa e requer uma combinação de diferentes
competências. Por isso, existe a dificuldade em apenas mapear o digital sem
o cognitivo e o emocional.
260

A seguir apresenta-se uma análise das competências digitais seleciona-


das e a relação à IA.

• Gestão da informação e processamento de informações: são fun-


damentais para lidar com a grande quantidade de dados gerados pela
IA e para tomar decisões com base nesses dados.
• Colaboração e trabalho em equipe: essenciais para trabalhar em
equipes multidisciplinares que desenvolvem e aplicam a IA.

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• Criação de conteúdo: a IA muitas vezes requer o desenvolvimento
de novos conteúdos ou a adaptação de conteúdos existentes.
• Segurança cibernética: é crucial para proteger os sistemas de IA
contra ameaças e garantir a privacidade dos dados.
• Uso de big data: a IA frequentemente envolve o processamento
de grandes conjuntos de dados. Por isso é essencial saber como
trabalhar com Big Data.
• Uso de IA: obviamente, o uso eficaz da IA requer um entendimento
direto desta tecnologia.
• Competências técnicas: relacionadas à programação, ao uso de fer-
ramentas de software e hardware. São essenciais para implementar
e gerenciar soluções de IA.
• Alfabetização Digital em IA e Alfabetização em Dados: essas
competências são cruciais para entender a IA e trabalhar eficazmente
com dados.

Além dessas competências, são de extrema importância as cognitivas


e emocionais. Por exemplo, as competências relacionadas à ética e respon-
sabilidade são vitais, dado que o uso da IA implica em questões éticas e
sociais complexas. Assim, uma formação em IA requer uma combinação de
todas as competências, digitais, cognitivas e emocionais. Para Huang (2019),
no futuro, os humanos aumentarão sua presença em tarefas de sentimento,
enquanto as tarefas de pensamento serão executadas por sistemas de IA, assim
como as tarefas mecânicas foram assumidas por máquinas e robôs. Por fim,
quando direcionadas para a educação a distância, deve-se conduzi-las para
os diferentes perfis de alunos e professores.

Considerações finais

O papel da IA na aprendizagem à distância é de extrema importância para


personalizar o processo de ensino, ajustando conteúdos e metodologias, bus-
cando atender às necessidades individuais dos alunos. Desse modo, sistemas
de IA podem analisar o desempenho dos estudantes, identificar dificuldades
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 261

e adaptar a atividades. Além disso, eles podem ser um aliado no desenvol-


vimento de competências digitais, através de plataformas interativas e adap-
tativas, nas quais os alunos aprenderiam sobre a utilização de ferramentas
digitais, segurança cibernética, programação, entre outros aspectos.
Assim, este artigo apresentou uma RSL com objetivo de analisar e sin-
tetizar os principais conceitos e modelos de IA na EaD bem como a iden-
tificação de competências digitais essenciais para o uso adequado da IA.
As contribuições alcançadas respondem às questões de análise, tendo como
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principais conclusões dessa revisão, o conceito de IA apresentado como uma


ferramenta que pode aprender autonomamente e executar tarefas, seja ela a
simulação de habilidades humanas ou a operação independente em ambien-
tes complexos. Entretanto, embora esse aspecto seja analisado em diversas
pesquisas, fica explícita nos resultados a necessidade de aprimoramento para
o campo educacional.
Com relação aos tipos de aplicações, percebe-se desde sistemas de reco-
mendação para aprendizagem personalizada, ambientes personalizados de
aprendizagem virtual adaptável e até o uso de IA explicável e baseada em
voz com assistentes virtuais educacionais.
Por fim, em relação às competências digitais, a partir da varredura de
estudos, identificou-se uma extensa lista composta por uma diversidade de
competências mapeadas de diferentes domínios além do digital, destacando-se
o cognitivo e o emocional.
Através dos resultados, cabe à literatura especializada e ao referencial
teórico compreender as competências digitais para IA na educação, o que
requer um estudo aprofundado sobre as aplicações, sendo fundamental que
as instituições de ensino continuem a investir em infraestrutura, formação de
professores e políticas de inclusão digital, ao mesmo tempo que sejam cau-
telosas ao lidar com questões de privacidade e ética. Dessa forma, pode-se
contribuir que todos os estudantes tenham a oportunidade de desenvolver as
competências necessárias para prosperar na era da IA.
No entanto, ainda existem muitos desafios no uso da IA na educação,
como a disparidade digital, a dificuldade de acesso a tecnologias de alta qua-
lidade e à internet, o que pode comprometer os benefícios para a educação
a distância. Além disso, a educação baseada em IA exige um investimento
substancial em infraestrutura tecnológica e treinamento de professores.
Por fim, espera-se que, à medida que a compreensão e o uso da Inteli-
gência Artificial se propaguem na EaD, apoiando os diversos processos de
ensino e aprendizagem a distância, esses sejam transformados em pesquisas
e práticas, sendo tal resultado uma forma de motivar mais estudos com esse
foco educacional.
262

REFERÊNCIAS
ADNAN, Muhammad et al. Earliest Possible Global and Local Interpretation
of Students’ Performance in Virtual Learning Environment by Leveraging
Explainable AI. IEEE Access, v. 10, p. 129843-129864, 2022.

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ieee.org/document/10132034. Acesso em: 11 jul. 2023.

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ÍNDICE REMISSIVO
A
Algoritmos 10, 16, 24, 25, 27, 29, 33, 36, 82, 91, 92, 101, 102, 103, 104,
105, 107, 108, 110, 111, 112, 113, 116, 120, 121, 128, 168, 176, 186, 187,
189, 190, 228, 235, 253
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Ambiente militar 10, 14, 17, 163, 164, 167, 168, 177, 179
Ambientes virtuais 26, 38, 144, 156, 157, 228, 254
Aplicativo TFM 9, 57, 62
Aprendizagem 9, 10, 11, 15, 17, 18, 21, 24, 25, 26, 31, 32, 35, 37, 38, 39,
40, 41, 42, 43, 46, 47, 53, 55, 73, 75, 78, 90, 102, 154, 155, 156, 157, 158,
159, 160, 162, 163, 164, 166, 170, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 178, 179,
183, 187, 188, 189, 190, 191, 193, 195, 198, 203, 205, 206, 215, 219, 221,
222, 223, 227, 228, 229, 231, 237, 239, 242, 244, 249, 250, 253, 254, 255,
256, 260, 261
Autoaperfeiçoamento 25, 29, 30, 39, 51, 171, 234, 241
Avaliação da aprendizagem 9, 10, 15, 17, 21, 25, 163, 173, 223

B
Big Data 23, 24, 26, 27, 68, 85, 105, 179, 228, 250, 254, 256, 257, 258, 260

C
Capacitação docente 40, 43, 49, 53, 54, 56
Capacitação física 9, 14, 16, 57, 58, 59, 61, 65, 66, 68, 69
Cibernética 143, 156, 167, 175, 257, 259, 260, 261
Ciência 13, 17, 21, 22, 37, 41, 55, 58, 69, 70, 73, 78, 85, 99, 136, 137, 141,
142, 146, 147, 150, 164, 177, 186, 196, 197, 204, 210, 217, 226, 246
Competências digitais 11, 14, 18, 26, 249, 250, 251, 254, 256, 258, 260,
261, 264
Comunicação institucional 10, 16, 107, 109, 110, 111, 123, 128
Comunicação social 15, 16, 17, 42, 71, 72, 78, 87, 101, 109, 111, 115, 123,
125, 128, 246
Contexto educacional 17, 24, 154, 156, 157, 159, 183, 184, 224
Cultura do Exército 10, 13, 17, 42, 54, 55, 151, 163, 178, 242
268

D
Desafios 9, 11, 16, 17, 18, 21, 22, 26, 34, 35, 38, 40, 41, 44, 56, 70, 71, 75,
78, 82, 84, 108, 111, 115, 135, 136, 137, 141, 142, 146, 152, 154, 166, 177,
185, 186, 188, 189, 192, 197, 217, 220, 229, 241, 249, 261
Dispositivo midiático 9, 16, 71, 76, 77
Docentes 9, 14, 15, 16, 21, 22, 23, 25, 26, 28, 29, 30, 32, 33, 34, 39, 41, 44,
45, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 151, 152, 164, 174, 175, 176, 185, 221, 228,

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231, 239, 250

E
Educação a distância 18, 30, 43, 152, 157, 158, 249, 250, 251, 253, 254,
256, 259, 260, 261
Educação Superior 9, 16, 39, 40, 41, 43, 44, 45, 53, 54, 55, 218
Educação Superior Militar 9, 16, 39, 41, 43, 45, 53, 54, 55
Engenharia de Produção 10, 18, 85, 163, 183, 199, 200, 201, 204, 205, 207,
209, 210, 213, 214, 215, 216, 217
Ensino-Aprendizagem 35, 40, 164, 166, 170, 171, 172, 175, 187, 188,
206, 242
Ensino do Exército 13, 14, 43, 179, 220, 223, 242
Ensino e aprendizagem 11, 18, 24, 25, 32, 38, 39, 41, 42, 43, 46, 47, 53, 55,
159, 179, 188, 221, 249, 253, 256, 261
Ensino por competências 18, 22, 35, 171, 178, 180, 220, 223, 225, 226,
242, 245
Escolanova 169, 170, 173, 177
Exército Brasileiro 6, 13, 18, 22, 35, 37, 42, 43, 55, 58, 59, 62, 63, 67, 71,
101, 109, 115, 135, 148, 149, 151, 170, 177, 178, 180, 220, 223, 225, 230,
233, 239, 241, 245, 246

F
Ficção científica 110, 124, 125, 129, 151, 168, 227
Forças Armadas 15, 17, 41, 61, 65, 136, 137, 138, 140, 141, 144, 146, 148,
167, 168, 169, 176, 181

G
Gatekeeping 10, 16, 101, 102, 103, 108
Gatewatching 10, 16, 101, 103, 108
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA EDUCAÇÃO E NA COMUNICAÇÃO 269

H
Hardware 151, 234, 256, 257, 258, 260
Hipermídia 204, 205, 206, 216

I
IA 7, 9, 10, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 32,
33, 34, 40, 41, 42, 44, 46, 47, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 78,
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79, 80, 81, 82, 89, 90, 91, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 117, 119,
120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 128, 129, 131, 135, 136, 137, 141, 144,
145, 151, 152, 158, 159, 160, 163, 164, 165, 166, 167, 168, 169, 172, 175,
176, 177, 178, 183, 184, 185, 186, 187, 188, 189, 191, 192, 193, 194, 195,
196, 201, 202, 204, 213, 214, 219, 220, 222, 225, 226, 227, 228, 229, 234,
235, 243, 244, 247, 249, 250, 252, 253, 254, 255, 256, 257, 258, 259, 260, 261
Identidade Visual 14, 17, 110, 121, 123, 125, 126, 127, 128
Impactos 9, 16, 71, 78, 142, 185, 192, 194
Inclusão 33, 59, 154, 162, 184, 187, 251, 261
Informações 25, 26, 41, 42, 45, 47, 59, 60, 61, 62, 74, 77, 78, 79, 82, 86, 87,
96, 101, 102, 103, 105, 106, 107, 110, 112, 113, 117, 119, 122, 129, 143, 144,
160, 165, 166, 167, 168, 183, 184, 188, 189, 191, 207, 208, 210, 221, 222,
226, 228, 238, 239, 241, 252, 256, 257, 258, 259, 260
Inovações Tecnológicas 15, 22, 23, 25, 29, 30, 31, 32, 34, 42, 185
Instrumentos de avaliação 56, 166, 173, 175, 176
Inteligência Artificial 3, 4, 7, 9, 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 21, 22, 23, 24,
25, 26, 27, 33, 34, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 47, 48, 50, 53, 54, 55,
56, 60, 68, 69, 71, 75, 76, 84, 85, 87, 89, 90, 91, 92, 97, 101, 102, 105, 106,
107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 122, 125, 128, 129, 130,
131, 136, 145, 150, 151, 161, 163, 165, 166, 168, 179, 180, 181, 183, 184,
185, 189, 194, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207,
211, 212, 213, 214, 215, 218, 219, 222, 226, 227, 228, 229, 230, 231, 233,
249, 251, 252, 253, 254, 255, 256, 257, 258, 259, 261, 263
Inteligência Artificial Generativa 10, 14, 16, 17, 109, 110, 111, 115, 116
Interdisciplinaridade 156, 219, 224

L
Linguagem natural 25, 82, 110, 111, 116, 166, 186, 187

M
Meios de comunicação 16, 73, 81, 84, 101, 102, 103, 104
270

Midjourney 4, 17, 79, 109, 111, 114, 115, 116, 117, 118, 119, 121, 122, 123,
124, 127, 128, 129, 130
Modelos de ensino 17, 164, 171, 172, 173, 174, 177
Modernização do Exército 11, 18, 233, 239

N
Neurociência 154, 165, 202, 205, 219, 227

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P
Padrão de avaliação 49, 52, 53
Processamento de linguagem 25, 110, 111, 116, 186, 187
Processo de aprendizagem 39, 40, 176, 189, 193, 203, 205, 206, 222
Processos de ensino 9, 15, 21, 25, 40, 42, 43, 159, 170, 261

R
Raciocínio humano 110, 204, 205
Redes sociais digitais 15, 85, 86, 87, 88, 90, 97
Revolução científica 10, 17, 135, 136
Robótica 24, 35, 110, 136, 137, 141, 145, 151, 165, 168, 187, 202, 205

S
Sistema de avaliação 14, 171, 172, 175, 176
Sistema de ensino 10, 13, 14, 16, 17, 34, 41, 43, 163, 164, 169, 171, 172,
176, 177, 230, 242, 245
Soberania nacional 10, 17, 135
Software 90, 116, 117, 125, 151, 164, 168, 209, 256, 257, 258, 260, 263

T
Tecnicismo 11, 17, 18, 169, 170, 177, 222, 225, 233, 239, 240, 242
Tecnologia 13, 15, 16, 23, 24, 26, 27, 30, 32, 34, 39, 40, 41, 42, 44, 54, 56,
57, 58, 59, 68, 69, 70, 77, 85, 104, 112, 115, 130, 131, 136, 137, 141, 142,
145, 146, 149, 152, 161, 162, 167, 177, 187, 189, 196, 199, 220, 223, 227,
228, 229, 233, 240, 243, 249, 250, 254, 257, 258, 259, 260
Tecnologias disruptivas 10, 17, 135, 136, 137, 142, 143, 144
Tecnologias emergentes 9, 10, 15, 19, 73, 110, 135, 176
Tendência de racionalidade 18, 200, 212, 213, 215
Tomada de decisões 41, 46, 145, 163, 164, 167, 186, 202, 208, 226
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SOBRE O LIVRO
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Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5 | 11,5 | 13 | 16 | 18
Arial 8 | 8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal | Supremo 250 g (capa)

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