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Asfixia

Asfixia perinatal refere-se a uma condição durante a primeira e a segunda etapa do trabalho de
parto em que a troca gasosa comprometida provoca hipoxemia/redução de oxigênio para o
cérebro fetal.

Asfixia perinatal:

Definição - Asfixia perinatal é uma injuria sofrida pelo feto ou pelo RN devida à má
oxigenação (hipoxia) e/ou má perfusão (isquemia) de múltiplos órgãos.

Etiologia - Asfixia pode acontecer antes, durante ou após o parto; 90% dos casos ocorrem no
período ante ou intraparto como consequência de uma insuficiência placentária. Os casos
restantes, pós-parto, são secundários a doenças pulmonares, cardiovasculares ou neurológicas

Factores de Risco associados à necessidade de reanimação:

Tabela

Condições perinatais associadas à necessidade de reanimação neonatal

Factores Pré-natais Factores Relacionados ao Parto

Idade <16 anos ou >35 anos Parto cesariano

Diabetes Uso de ventosa

Hipertensão na gestação Apresentação não cefálica

Doenças maternas Trabalho de parto prematuro

Infecção materna Corioamnionite

Uso de drogas ilícitas Rotura de membranas> 18 horas

Óbito fetal ou neonatal anterior Trabalho de parto> 24 horas

Ausência de cuidado pré-natal Segundo estágio do parto> 2 horas

Idade gestacional <37 ou> 41 semanas Padrão anormal de FC fetal

Gestação múltipla Anestesia geral

Rotura prematura das membranas Hipertonia uterina

Polihidrâmnios ou Oligohidrâmnios Líquido amniótico meconial

Diminuição da movimentos fetal Prolapso de cordão

Sangramento no 2º ou 3º trimestre Descolamento prematuro da placenta

Malformação ou anomalia fetal Placenta prévia


Sangramento intraparto significante

Fisiopatologia

Durante o trabalho de parto normal as contrações uterinas produzem diminuição do fluxo


sanguíneo para a placenta num momento em que o consumo de oxigênio da mãe e do feto está
aumentado.

A desidratação e a alcalose respiratória por hiperventilação, frequentes neste período, podem


também propiciar diminuição do fluxo sanguíneo placentário. A convergência destes fatores
considerados normais leva a uma queda da saturação fetal de oxigênio, porém o feto saudável
resiste bem a este stress.

Desacelerações tardias começam a acontecer quando a pressão de oxigénio paO2 e a


saturação fetal caem abaixo de 20mmHg e 31% respetivamente. Contudo, alterações
ocorrentes neste período crítico, podem levar à asfixia fundamentalmente via quatro
mecanismos:

1. Alterações da oxigenação materna.


2. Diminuição do fluxo materno-placentário ou placento-fetal.
3. Alterações na troca gasosa a nível placentário ou a nível tecidual fetal.
4. Aumento nas necessidades fetais de oxigênio.

Na vigência de hipoxemia e isquemia o feto e o RN reagem inicialmente produzindo uma


centralização do fluxo sanguíneo visando priorizar o aporte sanguíneo para o cérebro, o
coração e as supra-renais, em detrimento dos pulmões, intestino, fígado, rins, baço, osso,
músculo esquelético e pele. Se o insulto persiste, cessam os movimentos respiratórios,
acontece uma queda da frequência cardíaca e um leve aumento na pressão arterial para manter
a perfusão cerebral. Este período se conhece como apnéia primária. A administração de
oxigênio suplementar e o estímulo tátil durante este período, levam ao reinicio da respiração
espontânea na maioria dos pacientes.

Persistindo a asfixia, o feto ou RN desenvolve movimentos respiratórios profundos,


semelhantes a suspiros (gasping), a frequência cardíaca continua a diminuir, a pressão arterial
cai e o paciente se torna quase flácido. Os movimentos respiratórios tornam-se cada vez mais
fracos, até o último suspiro, quando o RN entra em um período de apnéia chamado de apnéia
secundária. Neste período a frequência cardíaca, a pressão arterial e a paO2 continuam a cair
cada vez mais. Nesta fase o RN não responde à estimulação tátil e não reinicia a respiração
espontânea.

Quanto mais tempo ficar nesta fase maior o risco de lesão cerebral. Este período culmina com
o óbito, a menos que a reanimação efetiva seja iniciada imediatamente.
Sinais de asfixia perinatal

A reanimação depende dos sinais correspondentes aos de sofrimento fetal tais como:

 FC <100/min;

 Presença de mecónio;

 Respiração irregular ou apnéico;

 Atonia com hiporeflexia (sem tónus com pouco reflexo).

Algoritmo de Reanimação Neonatal

Material necessário para a reanimação

Antes de iniciar a reanimação, é necessário garantir que o material esteja limpo, esterilizado e
colocado nos locais adequados para a sua imediata utilização.

Este material consiste em:

1. Mesa de reanimação com: Fonte de calor, fonte de oxigénio com fluxómetro e


aspirador a vácuo com manómetro;

2. Material para aspiração: sondas de aspiração traqueal (nº8 e 10) e sondas nasogástricas
(nº 6 e 8);

3. Material para ventilação com pressão positiva: ambú, máscaras para RN de termo e
pré-termo;

4. Medicamentos: bicarbonato de sódio, adrenalina e dextrose a 5-10%.

Passos para a reanimação

A reanimação neonatal segue o mesmo esquema de ABCD tanto para o RN na sala de partos
como para o RN com qualquer situação de emergência:

A (airway) – permeabilidade das vias aéreas

B (breathing) – restabelecimento da respiração

C (circulation) – restabelecimento da circulação

D (drugs) – drogas/medicamentos
A (airway) – permeabilidade das vias aéreas

1º Passo: posicionar correctamente o RN:

1. Colocar o bebé de costas num lugar firme e quente;

2. Posicionar a cabeça do bebé de modo que esteja ligeiramente estendida para


permitir a permeabilização das vias respiratórias.

3. Colocar os ombros do bebé sobre um pedaço de pano

Figura 1. Posição neutra da cabeça para manter as vias aéreas abertas e iniciar a respiração
com Ambú

2º Passo: desobstruir as vias aéreas

1. Com uma pêra de borracha, proceder a desobstrução das vias aéreas, aspirando as
secreções que podem estar retidas na boca e nariz.

Figura 2. No lado esquerdo aspiração na boca e no lado direito aspiração das narinas

3º Passo: aspirar

1. Limpar a boca do bebé e depois o nariz;

2. Introduzir suavemente o tubo de sucção na boca (+/- 5 cms a partir dos lábios) e
aspirar;

3. Depois introduzir o tubo 3 cm dentro das narinas e aspirar. Se o aspirador for


mecânico não exceder 120 mmHg;
4. Repetir a sucção da boca e do nariz se for necessário – não mais que duas vezes.

Figura 4. À esquerda medição do tubo a ser introduzido na boca do recém-nascido. À direita


aspiração da boca com tubo aspirador

Fonte: OMS. Cuidados Hospitalares para criança. ARTMED EDITORA S.A. 2008

NB: Todas as manobras acima descritas devem ser feitas rapidamente em 30 segundos

B (breathing) – restabelecimento da respiração

Ventilar:

1. Colocação da máscara de modo a cobrir o queixo, a boca e o nariz;

Figura 5. Posição da máscara.

2. Conseguir uma boa adaptação da máscara;

3. Apertar a bolsa de ar com 2 dedos ou com toda a mão, 2 a 3 vezes e observar se o


peito levanta.

 Se o peito não levantar:

 Reposicionar a cabeça;
 Verificar a adaptação da máscara

 Observar o peito enquanto faz a ventilação:

1. Está a mover-se com a ventilação?

2. O bebé está a respirar espontaneamente?


 Se a adaptação da máscara estiver correcta e se o peito levantar, ventilar e
comprimir a bolsa (“ambu”) 40 vezes por minuto até que o RN comece a chorar ou
a respirar espontaneamente.

 Um assistente pode conectar oxigénio ao ambu para enriquecer o ar.

 Se estiver a respirar >30ciclos/min, e se não houver tiragem intercostal:

1. Colocar o RN em contacto pele-a-pele com o peito da mãe e continuar com os


cuidados;

2. Fazer monitoria de 15 em 15 minutos para verificar a respiração e o


aquecimento;

3. Explicar à mãe o que está fazendo e para ela monitorar a respiração do bebé;

4. Incentivar a mãe a começar a amamentação logo que for possível.

 Se houver tiragem intercostal

(Verificar os movimentos do peito do bebé)

 Se a pele entre as costelas estiver ‘sugada’ para dentro, e se as costelas


estiverem salientes, o bebé tem ‘tiragem intercostal’. Isto indica que o bebé
ainda tem problemas de respiração.

 Continuar a ventilação:

 Administrar oxigénio se disponível;

 Se não estiver a respirar ou estiver com severa dificuldades na respiração


depois de 20 minutos de ventilação PARAR!

Figura. 6. Ambú auto insuflável com máscara redonda

Fonte: OMS. Cuidados Hospitalares para criança. ARTMED EDITORA S.A. 2008
Figura 7. Diferentes posições da máscara, para a ventilação do RN com Ambú

Fonte: OMS. Cuidados Hospitalares para criança. ARTMED EDITORA S.A. 2008

Figura 8. Posição da máscara e mão que segura a máscara para uma correcta ventilação
Fonte: OMS. Cuidados Hospitalares para criança. ARTMED EDITORA S.A. 2008

Figura 9. Saída de ar a partir da máscara por causa de mal posicionamento desta

Fonte: OMS. Cuidados Hospitalares para criança. ARTMED EDITORA S.A. 2008

C (circulation) – restabelecimento da circulação

Massagem cardíaca:

1. Se o RN não chorar ou respirar e se a FC < 60/min após 30 segundos de


ventilação, iniciar a massagem cardíaca;
2. 3: 1 (compressões: respirações) para atingir FC de 90 /min;

3. Reavaliar FC cada 30 segundos;

4. Se FC <60 após 30 seg de compressões torácicas, iniciar o tratamento com


medicamentos;

5. Interromper manobras se circulação espontânea não se restabelecer em 15


minutos

Figura 4. Massagem cardíaca.

D (drugs) – drogas/medicamentos

1. Raramente indicadas, somente em RN com grave depressão respiratória e cardíaca.

2. Considerar hipoxia grave irreversível.

3. Estimar o peso para o uso correcto da dose.

4. Acesso EV por cateterização venosa umbilical

Administrar em sequência:

 Bicarbonato de sódio 4.2% - 2-4ml/kg para corrigir acidose;

 Dextrose 5-10% - 5-10ml, prevenindo ou tratando uma hipoglicémia;

 Adrenalina 1:10 000 (0.1-0.2ml) EV, endotraqueal ou, raramente e se por pessoal
especializado, intracardíaca.

Se após 20 minutos de ressuscitação, o bebé:

 Não estiver respirando e o pulso estiver ausente, pare a reanimação;


 Explique para a mãe que o bebé nasceu com problemas sérios de respiração (no caso
do RN na sala de partos), não foi possível recuperar a respiração e perdeu a vida,
entregando-o para que ela o segure no colo, se assim o desejar

Registar o evento no formulário sobre encaminhamento

Avaliação Pós-Reanimação

Depois da fase de reanimação, o RN deve estar em permanente vigilância em internamento.

Os parâmetros a controlar são:

1. Prevenir a hipotermia: enxugar bem e se possível manter na incubadora e em áreas


sem corrente de ar;
2. Prevenir a hipoglicémia: alimentação precoce, controlo da glicemia com testes rápidos
(glicofita), nos casos mais graves - administrar dextrose 10% em intervalos regulares e
dependendo dos resultados dos testes;
3. Prevenção das convulsões: se a asfixia for grave ou moderada dar fenobarbital 5mg/kg
I.M com objectivo profilático;
4. Antibióticos: se as manobras reanimadoras foram prolongadas ou feitas em deficientes
condições higiénicas ou se as condições do RN forem graves;
5. Se o estado geral for grave (coma ou Síndrome de distress respiratório) referir ou
transferir o RN para o nível superior;
6. Nos recém-nascidos com qualquer condição ou patologia descritas na tabela 1,
investigar a causa e tomar a conduta indicada .
Docente: Malinda Sal

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