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Teoria geral da prova

Prof. Me. Moisés de O. Matusiak


Direito Processual Penal
CESUCA – 2022/2
Conceito e função da prova

“[...] prova é o elemento que autoriza a


conclusão acerca da veracidade de um
fato ou circunstância.” (REIS e
GONÇALVES, 2016)
“A palavra prova tem a mesma origem
etimológica de probo (do latim, probatio e
probus), e traduz as ideias de verificação,
inspeção, exame, aprovação ou confirmação.
Dela deriva o verbo provar, que significa verificar,
examinar, reconhecer por experiência, estando
relacionada com o vasto campo de operações do
intelecto na busca e comunicação do
conhecimento verdadeiro.” (LIMA, 2020) (Grifei)
“O processo penal é um instrumento de
retrospecção, de reconstrução aproximada de
um determinado fato histórico. Como ritual,
está destinado a instruir o julgador, a
proporcionar o conhecimento do juiz por meio
da reconstrução histórica de um fato. Nesse
contexto, as provas são os meios através dos
quais se fará essa reconstrução do fato
passado (crime).” (LOPES JR., 2018) (Grifei)
“O objetivo da atividade probatória é
convencer seu destinatário: o juiz. Na medida
em que não presenciou o fato que é
submetido à sua apreciação, é por meio das
provas que o juiz poderá reconstruir o
momento histórico em questão, para decidir
se a infração, de fato, ocorreu e se o réu foi
seu autor.” (REIS e GONÇALVES, 2016).
“A finalidade da prova é a formação da convicção do
órgão julgador. Na verdade, por meio da atividade
probatória desenvolvida ao longo do processo, objetiva-se
a reconstrução dos fatos investigados na fase
extraprocessual, buscando a maior coincidência possível
com a realidade histórica. Verdade seja dita, jamais será
possível se atingir com absoluta precisão a verdade
histórica dos fatos em questão. Daí se dizer que a busca é
da verdade processual, ou seja, daquela verdade que pode
ser atingida através da atividade probatória desenvolvida
durante o processo.” (LIMA, 2020) (Grifei e sublinhei)
Destinatário da prova/Prova x elementos
de informação
“[...] na fase investigatória, não se pode usar a
expressão ‘prova’, salvo no caso de provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas. Objetiva o inquérito
policial a produção de elementos de informação. Por
isso, preferimos dizer que o órgão do Ministério Público
é o destinatário desses elementos, e não da prova, cuja
produção se dá, em regra, somente em juízo, quando a
decisão acerca da prática de determinado fato
delituoso compete única e exclusivamente ao juiz
natural.” (LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
Sistemas de avaliação da prova
“Quando se aborda o presente tema, tem-se em
vista a relação existente entre o julgamento da
causa pelo juiz natural e as provas produzidas em
juízo. Busca-se investigar a vinculação (ou não) do
magistrado a alguma modalidade de prova. São
basicamente três sistemas acerca do assunto, a
saber: 1) Sistema da íntima convicção; 2) Sistema da
prova tarifada; 3) Sistema da persuasão racional do
juiz (convencimento motivado).” (LIMA, 2020)
(Grifei)
“De acordo com o sistema da íntima
convicção, também conhecido como sistema
da certeza moral do juiz ou da livre convicção,
o juiz é livre para valorar as provas, inclusive
aquelas que não se encontram nos autos, não
sendo obrigado a fundamentar seu
convencimento.” (LIMA, 2020) (Grifei)
Sistema da prova tarifada: “Também conhecido
como sistema das regras legais, da certeza moral do
legislador ou da prova legal, o presente sistema,
próprio do sistema inquisitivo, trabalha com a ideia
de que determinados meios de prova têm valor
probatório fixado em abstrato pelo legislador,
cabendo ao magistrado tão somente apreciar o
conjunto probatório e lhe atribuir o valor
conforme estabelecido pela lei.” (LIMA, 2020)
(Grifei e sublinhei)
“De acordo com o sistema do livre
convencimento motivado (persuasão racional
ou livre apreciação judicial da prova), o
magistrado tem ampla liberdade na
valoração das provas constantes dos autos,
as quais têm, legal e abstratamente, o mesmo
valor, porém se vê obrigado a fundamentar
sua decisão.” (LIMA, 2020) (Grifei e sublinhei)
Sistema predominante no Processo Penal Brasileiro

“Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre


apreciação da prova produzida em contraditório
judicial, não podendo fundamentar sua decisão
exclusivamente nos elementos informativos colhidos
na investigação, ressalvadas as provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas.” (Código de Processo
Penal) (Grifei)
“O Código de Processo Penal permanece fiel, salvo no que
diz respeito às decisões proferidas pelo Tribunal do Júri, ao
sistema da livre convicção do juiz (ou da persuasão
racional), que confere ampla liberdade ao magistrado para
formar seu convencimento, sem subordinar-se a critérios
predeterminados pela lei acerca do valor que se deve
atribuir a cada um dos meios de prova. Nesse sistema,
porém, o juiz deve fundamentar a sentença (art. 93, IX, da
CF), de maneira a demonstrar que seu convencimento é
produto lógico da análise crítica dos elementos de convicção
existentes nos autos.” (REIS e GONÇALVES, 2016)
“Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal
Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os
seguintes princípios:
[...];
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão
públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de
nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados
atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes,
em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à
informação; 
[...].” (Constituição Federal) (Grifei)     
“O livre convencimento do magistrado é
limitado, porém, pela proibição de o juiz
fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na
investigação (art. 155, caput, segunda parte),
já que em tal etapa não é garantido o exercício
do contraditório, prerrogativa de estatura
constitucional (art. 5º, LV, da CF).” (REIS e
GONÇALVES, 2016)
“Somente são considerados atos de
prova e, portanto, aptos a
fundamentarem a sentença, aqueles
praticados dentro do processo, à luz da
garantia da jurisdição e demais regras
do devido processo penal.” (LOPES JR.,
2018) (Grifei)
“Essa limitação, porém, não atinge o objeto
das provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas, em relação às quais o
contraditório é exercido, de modo diferido,
por meio do exame das referidas provas
durante a instrução.” (REIS e GONÇALVES,
2016)
“Provas cautelares: são aquelas em que há um risco de
desaparecimento do objeto da prova em razão do decurso do
tempo, em relação às quais o contraditório será diferido.
Podem ser produzidas no curso da fase investigatória ou
durante a fase judicial, sendo que, em regra, dependem de
autorização judicial. É o que acontece, por exemplo, com
uma interceptação telefônica. Tal medida investigatória, que
tem no elemento da surpresa verdadeiro pressuposto de sua
eficácia, depende de prévia autorização judicial, sendo que o
investigado só terá conhecimento de sua realização após a
conclusão das diligências.” (LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
“Prova não repetível: é aquela que, uma vez produzida, não tem como ser
novamente coletada ou produzida, em virtude do desaparecimento, destruição
ou perecimento da fonte probatória. Podem ser produzidas na fase investigatória
e em juízo, sendo que, em regra, não dependem de autorização judicial.
Exemplificando, suponha-se que alguém tenha sido vítima de lesões corporais
de natureza leve. O exame pericial levado a efeito imediatamente após a prática
do delito dificilmente poderá ser realizado novamente, já que os vestígios
deixados pela infração penal irão desaparecer. Ante o perigo de que haja
dispersão dos elementos probatórios em relação aos fatos transeuntes, sua
produção independe de prévia autorização judicial, podendo ser determinada
pela própria autoridade policial imediatamente após tomar conhecimento da
prática delituosa. Como dispõe o art. 6º, inciso VII, do CPP, logo que tiver
conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá, dentre
outras diligências, determinar que se proceda a exame de corpo de delito e
quaisquer outras perícias.” (LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
“Por prova não repetível entende-se aquela
cuja reprodução em juízo tornou-se inviável
em decorrência de acontecimento ulterior à
sua colheita, tal como ocorre com o
depoimento de testemunha que faleceu após
ser ouvida na fase do inquérito.” (REIS e
GONÇALVES, 2016)
“Provas antecipadas: são aquelas produzidas com a observância do
contraditório real, perante a autoridade judicial, em momento
processual distinto daquele legalmente previsto, ou até mesmo
antes do início do processo, em virtude de situação de urgência e
relevância. Tais provas podem ser produzidas na fase investigatória
e em juízo, sendo indispensável prévia autorização judicial. É o caso
do denominado depoimento ad perpetuam rei memoriam, previsto
no art. 225 do CPP. Supondo-se que determinada testemunha
presencial do delito esteja hospitalizada, em grave estado de saúde,
afigura-se possível a colheita antecipada de seu depoimento, o que
será feito com a presença do juiz, e com a participação das partes
sob contraditório.” (LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
“Art. 156.  A prova da alegação incumbirá a
quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz
de ofício:  
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação
penal, a produção antecipada de provas
consideradas urgentes e relevantes,
observando a necessidade, adequação e
proporcionalidade da medida;
[...].” (Código de Processo Penal) (Grifei)
“Art. 225.  Se qualquer testemunha houver de
ausentar-se, ou, por enfermidade ou por
velhice, inspirar receio de que ao tempo da
instrução criminal já não exista, o juiz
poderá, de ofício ou a requerimento de
qualquer das partes, tomar-lhe
antecipadamente o depoimento.” (Código de
Processo Penal) (Grifei e sublinhei)
Sistema aplicável ao Tribunal do Júri

“Art. 5º [...]
[...];
XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a
organização que lhe der a lei, assegurados:
[...];
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
[...].” (Constituição Federal) (Grifei)
“No tocante às decisões proferidas pelo
Tribunal do Júri, todavia, vigora o sistema da
íntima convicção do juiz (ou da certeza moral
do juiz), que confere ampla liberdade aos
juízes leigos para avaliação das provas,
dispensando-os de fundamentar a decisão.”
(REIS e GONÇALVES, 2016)
Ônus da prova
“Art. 156.  A prova da alegação incumbirá a quem a
fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:   
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a
produção antecipada de provas consideradas urgentes
e relevantes, observando a necessidade, adequação e
proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de
proferir sentença, a realização de diligências para
dirimir dúvida sobre ponto relevante.” (Código de
Processo Penal) (Grifei)
“Art. 5º [...]
[...];
LVII - ninguém será considerado culpado até o
trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;
[...].” (Constituição Federal)
“Com base na primeira parte do art. 156 do CPP, cuja
redação não foi alterada pela Lei nº 11.690/08, a prova da
alegação incumbirá a quem a fizer. Diante dessa regra,
discute-se qual é o ônus da prova da acusação e da defesa
no processo penal. Acerca de tal questionamento, é
possível apontarmos a existência de duas correntes: uma
primeira (majoritária), que trabalha com uma efetiva
distribuição do ônus da prova entre a acusação e a defesa
no processo penal, e uma segunda, que aponta que, no
processo penal, o ônus da prova é exclusivo da acusação.”
(LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
Entendimento predominante

“Acaso o acusado alegue qualquer circunstância que


tenha o condão de refutar a acusação, caberá à
defesa sua demonstração. É o que ocorre quando
invoca, em seu favor, por exemplo, excludente de
ilicitude ou culpabilidade, álibi ou, ainda,
circunstância excepcional que contrarie as regras da
experiência comum.” (REIS e GONÇALVES, 2016)
(Sublinhei)
Entendimento minoritário

“A partir do momento em que o imputado é


presumidamente inocente, não lhe incumbe provar
absolutamente nada. Existe uma presunção que
deve ser destruída pelo acusador, sem que o réu (e
muito menos o juiz) tenha qualquer dever de
contribuir nessa desconstrução (direito de silêncio –
nemo tenetur se detegere).” (LOPES JR., 2018) (Grifei)
“Ao lado da presunção de inocência, como
critério pragmático de solução da incerteza
(dúvida) judicial, o princípio do in dubio pro
reo corrobora a atribuição da carga probatória
ao acusador e reforça a regra de julgamento
(não condenar o réu sem que sua
culpabilidade tenha sido suficientemente
demonstrada).” (LOPES JR., 2018)
“[...] incumbe ao acusador provar a presença
de todos os elementos que integram a
tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade e,
logicamente, a inexistência de causas de
justificação.” (LOPES JR., 2018)
Os limites extrapenais da prova
“O art. 155, parágrafo único, do CPP, expressa a existência de limites extrapenais da
prova, na medida em que remete à lei civil e exige que se observem as restrições que
lá se fazem em relação à prova quanto ao estado das pessoas. Diz o dispositivo legal
que “somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições
estabelecidas na lei civil”.
Assim, por exemplo, para que incida a agravante do art. 61, II, “e”, do CP, deve haver a
prova – nos termos da lei civil – de que o crime foi praticado contra ascendente,
descendente, irmão ou cônjuge. Tais circunstâncias de parentesco ou matrimônio devem
ser provadas através da respectiva certidão de nascimento ou casamento, conforme o
caso. Não se comprova o parentesco por prova testemunhal, por exemplo, de modo
que na falta do documento civil respectivo não poderá tal circunstância ser provada de
outro modo, não incidindo, portanto, a agravante.
Na mesma linha, a extinção da punibilidade por morte do agente somente pode ser
declarada quando houver a prova civilmente prevista, ou seja, a certidão de óbito,
como prevê o art. 62 do CPP (e não poderia ser diferente a disciplina legal).” (LOPES JR.,
2022) (Grifei e sublinhei)
“Art. 107 - Extingue-se a punibilidade:
 I - pela morte do agente;
[...].” (Código Penal)

“Art. 62.  No caso de morte do acusado, o juiz


somente à vista da certidão de óbito, e depois
de ouvido o Ministério Público, declarará extinta
a punibilidade.” (Código de Processo Penal)
Vedação às provas ilícitas
“Não seria lógico que o Estado, a pretexto de
distribuir justiça, permitisse que seus agentes
ou que particulares violassem normas
jurídicas para garantirem o sucesso do esforço
probatório, pois, assim, estaria,
paradoxalmente, incentivando
comportamentos contrários à ordem jurídica
que pretende tutelar com a atividade
jurisdicional.” (REIS e GONÇALVES, 2016)
“A norma assecuratória da inadmissibilidade das provas obtidas com violação de
direito, com efeito, presta-se, a um só tempo, a tutelar direitos e garantias individuais,
bem como a própria qualidade do material probatório a ser introduzido e valorado no
processo. Em relação aos direitos individuais, a vedação das provas ilícitas tem por
destinatário imediato a proteção do direito à intimidade, à privacidade, à imagem (art.
5º, X), à inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI), normalmente os mais atingidos durante
as diligências investigatórias. No que se refere à questão da qualidade da prova, o
reconhecimento da ilicitude do meio de obtenção da prova já impede o aproveitamento
de métodos cuja idoneidade probatória seja previamente questionada, como ocorre,
por exemplo, na confissão obtida mediante tortura, ou mediante hipnose, ou, ainda,
pela ministração de substâncias químicas (soro da verdade etc.). De outro lado, a
vedação das provas obtidas ilicitamente também oferece repercussão no âmbito da
igualdade processual, no ponto em que, ao impedir a produção probatória irregular
pelos agentes do Estado – normalmente os responsáveis pela prova –, equilibra a
relação de forças relativamente à atividade instrutória desenvolvida pela defesa.”
(PACELLI, 2021) (Grifei)
“Art. 5º [...]
[...];
LVI - são inadmissíveis, no processo, as
provas obtidas por meios ilícitos;
[...].” (Constituição Federal)
“Art. 157.  São inadmissíveis, devendo
ser desentranhadas do processo, as
provas ilícitas, assim entendidas as
obtidas em violação a normas
constitucionais ou legais.” (Código de
Processo Penal)
“A ilicitude da prova pode decorrer das mais
variadas ações: busca domiciliar sem mandado,
quando não houver consentimento do morador
ou situação de flagrância; violação de sigilo
bancário; exercício de ameaças para obtenção
de confissão; interceptação de comunicações
telefônicas sem autorização judicial; colheita de
testemunho em Juízo sem a presença de
defensor etc.” (REIS e GONÇALVES, 2016)
“Devem-se distinguir prova ilegal, ilegítima e ilícita. A prova ilegal é o
gênero, do qual são espécies a prova ilegítima e a prova ilícita. Assim:
- prova ilegítima: quando ocorre a violação de uma regra de direito
processual penal no momento da sua produção em juízo, no processo.
A proibição tem natureza exclusivamente processual, quando for
imposta em função de interesses atinentes à lógica e à finalidade do
processo. Exemplo: juntada fora do prazo, prova unilateralmente
produzida (como o são as declarações escritas e sem contraditório) etc;
- prova ilícita: é aquela que viola regra de direito material ou a
Constituição no momento da sua coleta, anterior ou concomitante ao
processo, mas sempre exterior a este (fora do processo).” (LOPES JR.,
2018)
“– Prova ilegítima. Quando a norma afrontada tiver natureza processual, a prova
vedada será chamada de ilegítima. Assim, será considerada prova ilegítima: o
documento exibido em plenário do Júri, com desobediência ao disposto no art. 479,
caput (CPP); o depoimento prestado com violação à regra proibitiva do art. 207
(CPP) (sigilo profissional) etc. [...].
– Prova ilícita. Quando a prova for vedada, em virtude de ter sido produzida com
afronta a normas de direito material, será chamada de ilícita. Desse modo, serão
ilícitas todas as provas produzidas mediante a prática de crime ou contravenção, as
que violem normas de Direito Civil, Comercial ou Administrativo, bem como aquelas
que afrontem princípios constitucionais. Tais provas não serão admitidas no
processo penal. Assim, por exemplo, uma confissão obtida com emprego de tortura
(Lei n. 9.455/97), uma apreensão de documento realizada mediante violação de
domicílio (CP, art. 150), a captação de uma conversa por meio do crime de
interceptação telefônica (Lei n. 9.296/96, art. 10) e assim por diante.” (CAPEZ, 2020)
Provas tecnicamente consideradas ilegítimas:

“Art. 207.  São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função,


ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas
pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.
[...].
Art. 479.  Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a
exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência
mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. 
Parágrafo único.  Compreende-se na proibição deste artigo a leitura de jornais
ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações,
fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo
conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e julgamento
dos jurados.” (Código de Processo Penal) 
Provas consideradas tecnicamente ilícitas:

“Art. 1º Constitui crime de tortura:


I - constranger alguém com emprego de violência ou
grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou
confissão da vítima ou de terceira pessoa;
[...].
Pena - reclusão, de dois a oito anos.” (Lei 9.455/1997)
“Art. 10.  Constitui crime realizar interceptação
de comunicações telefônicas, de informática ou
telemática, promover escuta ambiental ou
quebrar segredo da Justiça, sem autorização
judicial ou com objetivos não autorizados em
lei: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e
multa.” (Lei 9.296/1996)  
“Em primeiro lugar, tomou-se como gênero a expressão
provas ilícitas, do qual surgem as espécies: as obtidas em
violação a normas constitucionais ou legais. Naturalmente,
constituem provas ilegais as que afrontam qualquer norma
da legislação ordinária, por isso, envolvem tanto as penais
quanto as processuais penais. Uma prova conseguida por
infração à norma penal (ex.: confissão obtida por tortura)
ou alcançada violando-se norma processual penal (ex.:
laudo produzido por um só perito não oficial) constitui
prova ilícita e deve ser desentranhada dos autos.” (NUCCI,
2021) (Grifei)
“Seja qual for a espécie de prova ilegal (ilícita
em sentido estrito ou ilegítima), no entanto,
sua utilização será sempre vedada,
constituindo o reconhecimento de sua
ineficácia importante mecanismo para evitar
abusos e arbitrariedades pelos órgãos
incumbidos da investigação.” (REIS e
GONÇALVES, 2016) (Grifei)
“Art. 157 [...]
§ 1o  São também inadmissíveis as provas
derivadas das ilícitas, salvo quando não
evidenciado o nexo de causalidade entre umas
e outras, ou quando as derivadas puderem ser
obtidas por uma fonte independente das
primeiras.” (Código de Processo Penal) (Grifei)
“Provas ilícitas por derivação são aquelas que,
embora lícitas na própria essência, decorrem
exclusivamente de outra prova, considerada ilícita, ou
de uma situação de ilegalidade, restando, portanto,
contaminadas.
Trata-se, enfim, da aplicação da teoria norte-
americana dos Frutos da Árvore Envenenada (fruits of
the poisonous tree), segundo a qual o defeito existente
no tronco contamina os frutos.” (AVENA, 2022)
“Provas ilícitas por derivação são os meios probatórios que, não obstante
produzidos, validamente, em momento posterior, encontram-se afetados
pelo vício da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os,
por efeito de repercussão causal. A título de exemplo, suponha-se que
alguém tenha sido constrangido, mediante tortura, a confessar a prática de
um crime de homicídio. Pode ser que, dessa prova ilícita originária, resulte a
localização e apreensão de um cadáver. Apesar de a apreensão do cadáver
ser aparentemente lícita, não há como negar que há um nexo causal
inequívoco entre a confissão mediante tortura e a localização do cadáver. Em
outras palavras, não fosse a prova ilícita originária, jamais teria sido possível
a prova que dela derivou. Nessa linha de pensamento, é possível concluir
que a ilicitude da prova originária transmite-se, por repercussão, a todos os
dados probatórios que nela se apoiem, ou dela derivem, ou, finalmente,
nela encontrem o seu fundamento causal.” (LIMA, 2020) (Grifei)
“A partir da edição da Lei n. 11.690/2008, a lei
processual passou a prever, expressamente, a
inadmissibilidade da prova ilícita por derivação
(art. 157, § 1º, primeira parte, do CPP), em
consonância com o então já pacificado
entendimento jurisprudencial, de modo a
estabelecer que as provas obtidas por meio ilícito
contaminam as provas ulteriores que, embora
produzidas licitamente, tenham se originado das
primeiras.” (REIS e GONÇALVES, 2016) (Grifei)
“Assim é que, por exemplo, a apreensão de
substâncias entorpecentes em residência
vistoriada por determinação judicial (prova,
em princípio, lícita) não terá valor probatório
acaso a informação que possibilitou a
expedição de mandado de busca e a
descoberta da droga tenha sido obtida por
meio de escuta telefônica ilegal.” (REIS e
GONÇALVES, 2016) (Grifei)
“Art. 157 [...]
§ 1o  São também inadmissíveis as provas derivadas das
ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de
causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas
puderem ser obtidas por uma fonte independente das
primeiras.”
§ 2o  Considera-se fonte independente aquela que por si
só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da
investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir
ao fato objeto da prova.  (Código de Processo Penal)
(Grifei)
De acordo com a segunda parte do § 1º, bem
como o § 2º, ambos do art. 157 do CPP:
- não há contaminação quando não ficar
evidenciado o nexo causal;
- não há contaminação quando a prova puder
ser obtida por uma fonte independente
daquela considerada ilícita.
“A prova originária de fonte independente não se macula pela
ilicitude existente em prova correlata. Imagine-se que, por
escuta clandestina, logo ilegal, obtém-se a localização de um
documento incriminador em relação ao indiciado. Ocorre que,
uma testemunha, depondo regularmente, também indicou à
polícia o lugar onde se encontrava o referido documento. Na
verdade, se esse documento fosse apreendido unicamente pela
informação surgida da escuta, seria prova ilícita por derivação e
inadmissível no processo. Porém, tendo em vista que ele teve
fonte independente, vale dizer, seria encontrado do mesmo
modo, mesmo que a escuta não tivesse sido feita, pode ser
acolhido como prova lícita.” (NUCCI, 2021) (Grifei e sublinhei)
“No Brasil, a análise da jurisprudência demonstra que a teoria da
fonte independente já vem sendo adotada pelo Supremo Tribunal
Federal há alguns anos. Em julgamento ocorrido em agosto de 2004,
a 1ª Turma do STF entendeu que “eventuais vícios do inquérito
policial não contaminam a ação penal. O reconhecimento
fotográfico, procedido na fase inquisitorial, em desconformidade
com o artigo 226, I, do Código de Processo Penal, não tem a
virtude de contaminar o acervo probatório coligido na fase judicial,
sob o crivo do contraditório. Inaplicabilidade da teoria da árvore
dos frutos envenenados (fruits of the poisonous tree). Sentença
condenatória embasada em provas autônomas produzidas em
juízo.”” (LIMA, 2020) (Sublinhei e grifei)
“ – Teoria da fonte independente (independent source
doctrine): é quando se demonstra que não há nexo causal entre
as demais provas e aquela considerada ilícita. A fonte de uma
prova independente é geneticamente desvinculada da ilícita,
sendo, portanto, válida. Não se estabelece um nexo de causa e
efeito.
- Teoria da descoberta inevitável (inevitable discovery
exception): quando se demonstra que a prova poderia ser
obtida por qualquer outra forma; seria descoberta de outra
maneira, inevitavelmente. Mas a carga de provar que a
descoberta era inevitável é inteiramente da acusação.” (LOPES
JR., 2018) (Grifei)
“É verdade que o legislador não se refere de maneira
expressa à teoria da descoberta inevitável. Porém, como
dito acima, seu conteúdo pode ser extraído do art. 157, §
2º, do CPP: “considera-se fonte independente aquela que,
por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios
da investigação ou instrução criminal, seria capaz de
conduzir ao fato objeto da prova” (nosso grifo). Parece ter
havido uma confusão por parte do legislador ao se referir
à fonte independente, pois o conceito por ele trazido é o
da limitação da descoberta inevitável.” (LIMA, 2020)
(Grifei e sublinhei)
“Exemplos:
1) A autoridade policial, mediante tortura, obtém de Joaquim a confissão de que, efetivamente, matou
determinado indivíduo, depositando o corpo em um terreno baldio existente nas proximidades de sua casa.
Dirigindo-se ao local, o corpo é localizado. Nesse caso, o contexto probatório formado pela descoberta do
corpo no local indicado por Joaquim não poderá ser utilizado contra ele, pois obtido ilicitamente, vale dizer, a
partir de tortura. Imagine-se, contudo, que, independentemente da forma criminosa como obtida a confissão
de Joaquim, quando se deslocou ao lugar por ele indicado, tivesse o delegado se deparado com um grupo de
parentes da vítima fazendo buscas, já se encontrando bastante próximos do lugar onde estava o corpo, ficando
claro, com isto, que o cadáver seria inevitavelmente descoberto. Ora, em tal hipótese, ainda que haja nexo de
causalidade entre a situação ilegal e a prova obtida, a localização do cadáver poderá ser validada sob o
fundamento de que o local em que se achava o corpo seria inevitavelmente descoberto.
2 )Outro exemplo ilustrado pela doutrina é o da busca ilegal realizada pela autoridade policial na residência do
suspeito, resultando da diligência a apreensão de documentos que o incriminam. Ora, tais documentos, na
medida em que surgiram a partir de uma ilegalidade, constituem prova ilícita por derivação. Considere-se,
porém, que se venha a constatar que já existia mandado de busca para o local, mandado este que se
encontrava em poder de outro delegado de polícia, o qual, no momento da diligência ilegal, estava se
deslocando para a casa do investigado. Neste caso, considerando a evidência de que os mesmos documentos
obtidos ilegalmente seriam inevitavelmente descobertos e apreendidos por meios legais, afasta-se a ilicitude
derivada, podendo ser aproveitada a prova resultante daquela primeira apreensão.” (AVENA, 2022)
“Art. 157 [...]
§ 3o  Preclusa a decisão de desentranhamento da prova
declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão
judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.  
§ 5º O juiz que conhecer do conteúdo da prova
declarada inadmissível não poderá proferir a sentença
ou acórdão.” (Código de Processo Penal)
#ADI 6298 – STF: Medida cautelar deferida para
suspender a vigência do §5º do art. 157 do Código de
Processo Penal.
- É possível relativizar o princípio da vedação
das provas ilícitas com base no princípio da
proporcionalidade?
“A aceitação do princípio da proporcionalidade pro reo não
apresenta maiores dificuldades, pois o princípio que veda
as provas obtidas por meios ilícitos não pode ser usado
como um escudo destinado a perpetuar condenações
injustas. Entre aceitar uma prova vedada, apresentada como
único meio de comprovar a inocência de um acusado, e
permitir que alguém, sem nenhuma responsabilidade pelo
ato imputado, seja privado injustamente de sua liberdade, a
primeira opção é, sem dúvida, a mais consentânea com o
Estado Democrático de Direito e a proteção da dignidade
humana.” (CAPEZ, 2021) (Grifei e sublinhei)
“No que tange ao princípio da proporcionalidade pro societate,
consistente na admissibilidade das provas ilícitas, quando
demonstrada a prevalência do interesse público na persecução
penal, a tendência atual da jurisprudência dos Tribunais
Superiores é a da sua não adoção. De acordo com esse
entendimento, a não admissão de mecanismos de flexibilização
das garantias constitucionais tem o objetivo de preservar o
núcleo irredutível de direitos individuais inerentes ao devido
processo legal, mantendo a atuação do poder público dentro
dos limites legais. As medidas excepcionais de constrição de
direitos não podem, assim, ser transformadas em práticas
comuns de investigação.” (CAPEZ, 2021) (Grifei e sublinhei)
“A maioria doutrinária e jurisprudencial tende a não
aceitar o princípio da proporcionalidade como justificante
da utilização da prova ilícita em favor da sociedade, ainda
que se trate do único elemento probatório existente nos
autos possível de conduzir à condenação do réu.
Permitem, deste modo, a aplicação do supracitado princípio
tão somente em favor do réu, sob o argumento de que o
texto constitucional não se coaduna com o erro judiciário,
razão pela qual é inaceitável que um inocente seja
condenado apenas porque a prova que o inocenta não foi
obtida por meios lícitos.” (AVENA, 2022) (Grifei e sublinhei)
Referências
AVENA, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca. Grupo GEN,
2022.
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. Editora Saraiva, 2020. [Minha
Biblioteca].
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. Salvador: Ed.
JusPodivm, 2020.
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 19ª ed. Disponível em: Minha Biblioteca.
Editora Saraiva, 2022.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal. Grupo GEN, 2021. [Minha
Biblioteca].
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. Grupo GEN, 2021. [Minha Biblioteca].
REIS, Alexandre Cebrian Araújo; GONÇALVES, Vitor Eduardo Rios. Direito Processual
Penal Esquematizado. Coordenador Pedro Lenza. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

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