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Educação especial inclusiva:

História, conceitos e políticas públicas

https://diversa.org.br/sumario-educacao-inclusiva/o-que-e-educacao-inclusiva/
Situação problema
• Você é psicólogo escolar e uma professora te procura para orientações pois
tem um aluno esquisito na sala. Ela diz que Ricardo é inquieto, não entende
o que ela diz, parece surdo. Atrapalha a aula, fala sozinho, às vezes. Te diz:
“esse menino não é normal, vai atrapalhar o andamento da turma”.
• O que você diria a ela que orientações daria?
Aspectos históricos: segregação, integração, inclusão
• Historicamente as pessoas com deficiência foram totalmente excluídas das redes
de ensino. Ou, quando muito, tiveram acesso parcial à educação, o qual se dava a
partir dos modelos de segregação ou integração.
• No primeiro, o estudante com deficiência era atendido por uma instituição
educacional apartada do ambiente da escola comum, denominada escola especial.
No segundo, o aluno frequentava uma sala de aula inserida dentro de uma escola
comum, porém, exclusivamente destinada a pessoas com deficiência. Chamada de
sala especial.
• A evolução do campo dos direitos humanos trouxe à tona o paradigma da inclusão.
Essa proposta é orientada pelo direito que todos os estudantes têm de frequentar a
sala de aula comum juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de
discriminação.
Diferença entre integração e inclusão
O modelo da integração é baseado na busca pela “normalização”. Nega-se a questão da diferença. A integração
admite exceções, uma vez que é baseada em padrões, requisitos e condições.

Já a educação inclusiva é incondicional. Uma escola inclusiva é uma escola que inclui a todos, sem discriminação, e a
cada um, com suas diferenças, independentemente de sexo, idade, religião, origem étnica, raça e deficiência. Uma
escola inclusiva é aquela com oportunidades iguais para todos e estratégias diferentes para cada um, de modo que
todos possam desenvolver seu potencial. Uma escola que reconhece a educação como um direito humano básico e
como alicerce de uma sociedade mais justa e igualitária.

Ao contrário da integração, na qual o aluno deve se adaptar às condições da escola, a inclusão prevê sua
transformação de modo a garantir o acesso, a permanência e a aprendizagem de todos.
O que temos nas escolas hoje? Integração ou inclusão...

Tornar uma escola inclusiva implica transformar a cultura escolar, ou seja, as políticas, as
práticas e, inclusive, as pessoas que fazem parte dela, para garantir o direito de todos à
educação. Implica mudar a visão da homogeneidade para a diversidade, acreditar que
todos podem aprender e reconstruir a escola de forma que seja, de fato, para todos.

Acontece que nem todas as escolas estão dispostas a mudar tanto assim. Por isso,
assumem a inclusão como um projeto adicional, atrelado às práticas já existentes. Elas se
auto definem inclusivas simplesmente pela presença de estudantes com deficiência – o que
não é suficiente para caracterizar a inclusão.
• Nem sempre a discriminação é tão explícita. Agrupamentos ou a
categorização de turmas com base na performance acadêmica, um currículo
adaptado ou estratégias pedagógicas diferenciadas somente para as
pessoas com deficiência, e até mesmo a atribuição de notas com base em
parâmetros de desempenho pré-estabelecidos, também são exemplos de
práticas integracionistas fadadas à exclusão.
• Por isso, apesar de o modelo da integração preceder a educação inclusiva,
ou seja, já ter sido superado no que diz respeito às leis, normas e políticas
vigentes, na prática se mantém na maioria das escolas, e, muitas vezes, sob
a insígnia da inclusão.
O que é Educação inclusiva?

A educação inclusiva pode ser entendida como uma concepção de


ensino contemporânea que tem como objetivo garantir o direito de todos
à educação.

Ela pressupõe a igualdade de oportunidades e a valorização das


diferenças humanas, contemplando, assim, as diversidades étnicas,
sociais, culturais, intelectuais, físicas, sensoriais e de gênero dos
seres humanos, entre outras.

Implica a transformação da cultura, das práticas e das políticas


vigentes na escola e nos sistemas de ensino, de modo a garantir o
acesso, a participação, o desenvolvimento e a aprendizagem de
todos, sem exceção.
Quais são os princípios da
Educação Inclusiva
São cinco, a saber:
TODA PESSOA TEM O DIREITO DE ACESSO À EDUCAÇÃO…

… de qualidade na escola regular e de atendimento especializado complementar, de acordo com suas


especificidades. Esse direito está em consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras
convenções compartilhadas pelos países membros das Nações Unidas.

TODA PESSOA APRENDE…

… Sejam quais forem suas particularidades intelectuais, sensoriais e físicas, parte-se da premissa de que
todos têm potencial de aprender e ensinar. É papel da comunidade escolar desenvolver estratégias
pedagógicas que favoreçam a criação de vínculos afetivos, relações de troca e a aquisição de conhecimento.

O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DE CADA PESSOA É SINGULAR…

… As necessidades educacionais e o desenvolvimento de cada estudante são únicos. Modelos de ensino que
pressupõem homogeneidade no processo de aprendizagem e sustentam padrões inflexíveis de avaliação
geram, inevitavelmente, exclusão.
O CONVÍVIO NO AMBIENTE ESCOLAR BENEFICIA TODOS…

… A experiência de interação entre pessoas diferentes é fundamental para o pleno desenvolvimento


de qualquer um. O ambiente heterogêneo amplia a percepção dos educandos sobre pluralidade,
estimula sua empatia e favorece suas competências intelectuais.

A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DIZ RESPEITO A TODOS…

… A diversidade é uma característica inerente a qualquer ser humano. É abrangente, complexa e


irredutível. Portanto, a educação inclusiva, orientada pelo direito à igualdade e o respeito às
diferenças, deve considerar não somente as pessoas tradicionalmente excluídas, mas todos os
estudantes, educadores, famílias, gestores escolares, gestores públicos, parceiros etc.
Quem é o público alvo da educação especial na
perspectiva inclusiva?
O público-alvo da educação inclusiva orientada pelo direito universal à educação, envolve todas as pessoas,
independentemente de suas particularidades.

As pessoas com deficiência têm sido um dos principais focos da área, porque foram historicamente privadas da
participação nas redes de ensino. Bem como por estarem associadas a um estigma de “atipicidade”, o que acentua o
processo discriminatório e a exclusão. Por essas e outras razões, a legislação determina que o público-alvo da educação
especial na perspectiva da educação inclusiva corresponde aos estudantes com deficiência, Transtorno do Espectro Autista
(TEA) e altas habilidades/superdotação.

Mas é importante reforçar que a educação inclusiva diz respeito a todas as pessoas, sem exceção. Ou seja, todos as
alunas e alunos, com ou sem deficiência, têm direito ao acesso (matrícula e presença), à participação em todas as
atividades da escola e à aprendizagem, com equiparação de oportunidades para o pleno desenvolvimento de seu
potencial.
O que é pessoa com deficiência?
Esse é um conceito que vem se transformando ao longo da história. A definição mais atual foi
estabelecida pela Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, das Nações Unidas
(ONU), em 2006, e diz que:

“Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.”

A chave para compreender o que é deficiência na perspectiva inclusiva está na segunda parte, que
se refere a fatores que são externos à pessoa, as chamadas barreiras.

Elas podem estar presentes na arquitetura, na comunicação, nos meios de transporte e até mesmo
em nossas atitudes. De acordo com essa nova definição, portanto, a deficiência é resultante da
combinação entre os impedimentos da pessoa e as barreiras existentes no ambiente.
Como a convenção dos direitos
das pessoas com deficiência
define pessoa com deficiência?
• A definição estabelecida pela Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, das Nações
Unidas (ONU), em 2006, diz que:
• “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.”
• Todas as diretrizes da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência se baseiam no modelo
social de deficiência.
• Ao contrário do modelo médico, cuja principal característica é a descontextualização da deficiência, vista
como um “problema” que reside na pessoa, o modelo social esclarece que o fator limitador são as barreiras
presentes no ambiente físico e social e não a deficiência em si.
• O foco, portanto, não está em “tratar” a pessoa ou esperar que ela “mude”, mas identificar e eliminar as
barreiras existentes nos espaços, no meio físico, no transporte, na informação, na comunicação, nos
serviços, nas atitudes etc., que impedem ou dificultam sua plena participação em todos os aspectos da vida
contemporânea.
O que é acessibilidade?
• A acessibilidade prevê a eliminação de barreiras presentes no ambiente físico e social
que impedem ou dificultam a plena participação das pessoas com e sem deficiência
em todos os aspectos da vida contemporânea. A acessibilidade é fundamental para a
inclusão e deve estar presente em diferentes contextos, tais como: arquitetônico,
comunicacional, metodológico, instrumental, atitudinal, programático, entre outros.
Quais os diferentes tipos de acessibilidade?
• Acessibilidade arquitetônica: eliminação de barreiras ambientais físicas nas residências, nos edifícios, nos
espaços e equipamentos urbanos, nos meios de transporte individuais ou coletivos;
• Acessibilidade comunicacional: eliminação de barreiras na comunicação interpessoal (oral, língua de
sinais), escrita (jornal, revista, livro, carta, apostila etc., incluindo textos em braile e o uso de computador
portátil) e virtual (acessibilidade digital);
• Acessibilidade metodológica: eliminação de barreiras nos métodos e técnicas de estudos (escolar), de
trabalho (profissional), de ação comunitária (social, cultural, artística etc.) e de educação familiar;
• Acessibilidade instrumental: eliminação de barreiras para o acesso e manuseio de instrumentos, utensílios e
ferramentas de estudos (escolar), de trabalho (profissional), de lazer e recreação (comunitária, turística,
esportiva etc.);
• Acessibilidade programática: eliminação de barreiras “invisíveis” embutidas em políticas públicas (leis,
decretos, portarias etc.), normas e regulamentos (institucionais, empresariais etc.);
• Acessibilidade atitudinal: eliminação de preconceitos, estigmas, estereótipos e discriminações nas pessoas
em geral.
Qual é a principal estratégia de acessibilidade da educação
brasileira?
• O Atendimento Educacional Especializado (AEE) é um serviço destinado a estudantes com deficiência,
Transtorno do Espectro Autista (TEA) e altas habilidades/superdotação.
• Seu objetivo é desenvolver práticas pedagógicas inclusivas e atividades diversificadas para eliminar
barreiras no processo de ensino-aprendizagem e garantir o pleno acesso e a participação desses estudantes na
escola regular. Por esse motivo, o AEE configura como uma das principais estratégias de acessibilidade no
contexto educacional brasileiro.
Como devemos nos referir às pessoas com deficiência
• O termo recomendado para se referir a alguém que apresenta alguma deficiência, seja ela física, intelectual, visual,
auditiva ou múltipla é: pessoa com deficiência. Essa terminologia tem sido usada mundialmente nos últimos anos,
em todos os idiomas, no meio acadêmico, em documentos oficiais, debates etc.
• Mas por que não usamos mais as expressões:
• “Deficiente?” O termo é inadequado, já que uma pessoa não é definida por sua deficiência. Ela não é deficiente. Ela
tem uma deficiência, além de outras tantas características. E é, antes de mais nada, uma pessoa.
• “Portador de deficiência?” Uma pessoa não porta sua deficiência, ela tem uma deficiência. Tanto o verbo “portar”
como o substantivo ou o adjetivo “portador” não se aplicam a uma condição inata ou adquirida. Por exemplo, não se
diz que alguém porta olhos verdes ou pele morena. Uma pessoa pode portar um guarda-chuva, se houver
necessidade, e pode deixá-lo em algum lugar. Não se pode fazer isso com uma deficiência, é claro.
• “Especial ou pessoa com necessidades especiais?” Todos são diferentes. Ou seja, todos têm alguma
necessidade particular, não só a pessoa com deficiência. Isso também se aplica aos estudantes em uma
sala de aula. Hoje se sabe que todos os alunos, não somente aqueles com deficiência, precisam ser vistos
por seus professores como únicos, “especiais”. Isso é pressuposto para que a prática pedagógica possa
ser, de fato, inclusiva. Além disso, o argumento em defesa dessa expressão, de que todos são
imperfeitos, esvazia a discussão sobre os direitos das pessoas com deficiência.
• “Aluno de inclusão?” Apesar de o termo ter se difundido no contexto educacional, ele é equivocado
quando usado para se referir aos estudantes com deficiência. Partindo pressuposto de que a educação
inclusiva diz respeito a todos, todos deveriam ser chamados de “alunos de inclusão”.
O que muda na Educação
Especial com a perspectiva da
inclusão?
• Trata-se de uma mudança radical, estruturante. A educação especial deixa de se
configurar como um sistema paralelo, passando a integrar a proposta pedagógica da
escola, apoiando a plena inclusão de todos por meio de recursos, serviços e do
Atendimento Educacional Especializado (AEE) para seu público-alvo.
• Veja a tabela com as diferenças...
Educação Especial Educação Especial Inclusiva
Sistema separado, paralelo ao regular Faz parte da proposta pedagógica da escola. Perpassa
todos os níveis, etapas e
modalidades de ensino. Por isso, é tida como transversal.
Substitui o ensino regular Complementa ou suplementa o processo de
escolarização em sala de aula
Dinâmica independente, total ou parcialmente dissociada Dinâmica dependente, totalmente articulada com o
do ensino regular trabalho realizado em sala
Restritiva e condicional. Somente os alunos considerados Incondicional e irrestrita. Garante o direito de todos à
aptos para o ensino regular podem frequentá-lo educação e à plena participação e aprendizagem
O referencial é o que se convenciona julgar como “típico” Parte do pressuposto de que a diferença é uma
ou estatisticamente mais frequente característica humana
Baseia-se no modelo social de deficiência. Foca na
Baseia-se no modelo médico de deficiência. Foca nos
articulação entre as características da pessoa e as
aspectos clínicos, ou seja, no diagnóstico
barreiras à sua participação presentes no ambiente
Nem todos os estudantes conseguem se adaptar à A escola deve responder às necessidades e interesses de
escola. Nem todos correspondem ao padrão estabelecido todos os alunos, sem exceção, partindo do pressuposto
por ela de que todas as pessoas aprendem
Estratégias pedagógicas diferentes para somente alguns
Diversificação de estratégias pedagógicas para todos
estudantes
Qual é o contexto atual da
educação inclusiva no Brasil
(após 2008)?
No aspecto legal: o país construiu e aprovou um conjunto de leis bastante avançadas,
baseadas na Convenção e coerentes com os princípios da educação inclusiva,
fundamentais para a garantia do direito de todos à educação.

Na matrícula na educação básica: o Censo escolar de 2020 (INEP), o número total


dessas matrículas apresenta um crescimento de quase 70% nesse período, beirando
1.300.000 matrículas na educação básica brasileira. O percentual de matrículas em
ambientes inclusivos atinge a expressiva marca de 88%, contrapondo um contexto
anterior oposto.

Desafios: No ensino médio e no superior, esses percentuais são menores, revelando um


verdadeiro funil para a progressão de estudantes com deficiência na educação.

Recentemente, em 2020, o governo brasileiro publicou o Decreto nº 10.502, chamado


pela sociedade civil de Decreto da Exclusão, que traz retrocessos de direitos e retoma o
incentivo à cultura de segregação do público-alvo da educação especial. O decreto foi
considerado inconstitucional e está suspenso pelo Supremo Tribunal Federal.

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