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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA – UESB


DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA – DG

ANA CÉLIA CARVALHO ROCHA

A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CIDADE


DE PIRIPÁ - BA

Vitória da Conquista - BA
2009
1

ANA CÉLIA CARVALHO ROCHA

A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CIDADE


DE PIRIPÁ - BA

Monografia apresentada à banca examinadora


do Curso de Pós-Graduação em Geografia
como requisito obrigatório para a obtenção do
título de Especialista em Análise do Espaço
Geográfico, pela Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia.

Orientador: Prof. Dr. Renato Leone Miranda


Léda.

Vitória da Conquista – BA
2009
2

ANA CÉLIA CARVALHO ROCHA

A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CIDADE


DE PIRIPÁ - BA

Monografia submetida à avaliação da banca examinadora do Curso de Pós-Graduação


em Geografia como requisito obrigatório para a obtenção do título de Especialista em
Análise do Espaço Geográfico, pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

Aprovada Banca Examinadora


.................

Profª. Ms. Meirilane Rodrigues Maia

Profª. Ms. Miriam Cléa Coelho Almeida

Prof. Dr. Renato Leone Miranda Léda

Data da Aprovação: ...../...../.....

Vitória da Conquista
2009
3

AGRADECIMENTOS

O ato de agradecer não atinge por completo a extensão dos sentimentos que
queremos reconhecer – o gesto de carinho, o apoio, a solidariedade, a
compreensão, a participação...

Primeiramente, agradeço a Deus, por esta conquista tão importante;


A minha família, pelo exemplo de pessoas que são, pela compreensão nos
momentos de ausência e, sobretudo, pelas imprescindíveis colaborações e pelo
constante apoio na concretização dos meus objetivos;
Aos amigos, pelas importantes colaborações durante a realização deste trabalho;
Agradeço especialmente ao professor orientador, que conduziu este trabalho com
responsabilidade, indicando, nos momentos mais confusos, qual o caminho a seguir,
tendo cuidado, passo a passo, da confecção desta monografia. Agradeço também
pela disponibilidade e compreensão.
Aos professores do curso de Pós-Graduação pelas valiosas instruções transmitidas
ao longo do curso;
Aos meus colegas de curso, pela amizade, colaboração, pela alegria de nossos
encontros e pelas experiências partilhadas.
Aos gestores públicos do município de Piripá, pela concessão das entrevistas,
instrumentos importantes para o desenvolvimento deste trabalho monográfico;
A todos os servidores que atuam no serviço de limpeza urbana da Prefeitura
Municipal de Piripá, e à população pesquisada, pelas respostas aos questionários,
que muito contribuíram para a efetivação deste trabalho;
Ao catador de material reciclável, que me atendeu atenciosamente durante a
entrevista;
Agradeço, enfim, a todos aqueles que, de alguma maneira, participaram e
possibilitaram a construção deste trabalho.
4

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar a gestão dos resíduos sólidos da cidade de
Piripá-BA e suas conseqüências sócio-ambientais, a partir da análise do processo
de coleta, transporte e armazenamento dos resíduos; da avaliação das políticas
públicas destinadas à limpeza urbana, bem como da atuação do poder público
municipal e da sociedade local em relação a essas políticas; analisando também as
condições de trabalho dos servidores públicos que atuam no gerenciamento dos
resíduos. Para o desenvolvimento da pesquisa foram realizadas entrevistas com os
gestores municipais (prefeito atual do município e da gestão 2004/2008), e com o
secretário de infra-estrutura, além da aplicação de dois tipos de questionários, sendo
o primeiro aplicado em 90 domicílios, o equivalente a 5% do número total de
domicílios urbanos; e o segundo, aos 30 servidores que atuam no serviço de
limpeza urbana. Após a análise dos dados coletados entre os meses de dezembro
de 2008 e janeiro de 2009, foi confirmada a hipótese principal da pesquisa: o mau
gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos, que se explica, principalmente, pelo
fato de toda a produção residual da cidade ser depositada em um vazadouro a céu
aberto. Observa-se, dentre outras deficiências, carência de políticas públicas e falta
de planejamento destinado a este seguimento tão importante do saneamento básico,
além da pouca participação da sociedade local neste setor. Porém, há uma
expectativa de melhoria, a partir do interesse demonstrado pelo poder público
municipal em rever a situação em que se encontra a gestão dos resíduos sólidos
urbanos. Por fim, pode-se afirmar que, com políticas eficazes e maior interesse do
poder público municipal, será possível pensar numa gestão de resíduos sólidos
pautada na qualidade sócio-ambiental.

Palavras-chave: Espaço urbano; limpeza urbana; gestão de resíduos sólidos.


5

LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – População do município de Piripá-BA – 1970/2007 ......................... 40


Tabela 02 – Percentual de ruas pavimentadas na cidade de Piripá-BA, 2006 ..... 51
Tabela 03 – Quadro de servidores da limpeza pública da cidade de Piripá-BA,
por tipo de serviço e vínculo empregatício, 2009................................55
Tabela 04 – Existência de lixeiras públicas na cidade de Piripá-BA segundo a
População, 2009............................................................................... 73
Tabela 05 – Avaliação do serviço de limpeza pública na cidade de Piripá-BA
segundo a população, por bairro, 2009 ............................................ 75
6

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Principais problemas ambientais da cidade de Piripá-BA ................ 45


Gráfico 02 – Problemas enfrentados pela população da cidade de Piripá-BA
em relação à água ........................................................................... 47
Gráfico 03 – Destino final dos resíduos sólidos da cidade de Piripá-BA .............. 50
Gráfico 04 – Frequência da coleta dos resíduos domiciliares na cidade de
Piripá-BA segundo a população ...................................................... 58
Gráfico 05 – Frequência da coleta dos resíduos domiciliares na cidade de
Piripá-BA segundo a população, por bairro ..................................... 59
Gráfico 06 – Materiais utilizados pelos servidores para proteção individual ........ 68
Gráfico 07 – Acidentes de trabalho sofridos pelos servidores da limpeza
pública em Piripá-BA ....................................................................... 69
Gráfico 08 – Satisfação dos servidores da limpeza pública em relação às
condições de trabalho ..................................................................... 70
Gráfico 09 – Avaliação do serviço de limpeza pública na cidade de Piripá-BA
segundo a população ....................................................................... 72

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Localização do município de Piripá-Bahia......................................... 41


Figura 02 – Planta urbana de Piripá-BA - Delimitação aproximada dos bairros,
2009 .................................................................................................. 43
7

LISTA DE FOTOGRAFIAS

Foto 01 – Umidade do solo no bairro Horizonte Azul, 2006 ................................. 46


Foto 02 – Esgoto a céu aberto no bairro Novo, 2006 ........................................... 49
Foto 03 – Rio Cana Brava – Principal receptor do esgoto da cidade de Piripá-BA,
2006 ..................................................................................................... 49
Fotos 04 e 05 – Estação de Tratamento de Esgotos desativada na cidade de
Piripá-BA, 2006 .................................................................................... 50
Foto 06 – Erosão do solo no bairro Alto do Campo, 2006 .................................... 52
Fotos 07 e 08 – Praça da Bandeira, Piripá-BA, 2009 ........................................... 56
Fotos 09 e 10 – Tipos de lixeiras públicas existentes na cidade de Piripá-BA,
2009 ..................................................................................................... 57
Fotos 11 e 12 – Acondicionamento inadequado de resíduos sólidos pela
população da cidade de Piripá-BA, 2009 ............................................. 59
Foto 13 – Resíduos em terreno baldio, no bairro Alto do Campo, 2006............... 60
Fotos 14 e 15 – Veículos utilizados para coleta e transporte dos resíduos sólidos
na cidade de Piripá-BA, 2009 ............................................................... 61
Foto 16 – Resíduos em logradouro, no bairro Novo, 2009 ................................... 61
Foto 17 – Resíduos em logradouro, no bairro Casas Populares, 2009 ................ 61
Foto 18 – Vala para deposição de resíduos sólidos na área do lixão, 2009 ........ 62
Foto 19 – Lixão do município de Pirpá-BA, localizado na Fazenda Boa Vista,
2009 ..................................................................................................... 62
Foto 20 – Resíduos hospitalares da cidade de Piripá-BA, 2009 .......................... 64
Foto 21 – Queima de resíduos hospitalares na área do lixão, 2009 .................... 64
Fotos 22 e 23 – Materiais recolhidos no lixão de Piripá-BA, 2009 ....................... 65
Foto 24 – Barraco construído ao lado do lixão de Piripá-BA, 2009 ...................... 66
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas


BNH – Banco Nacional da Habitação
CESBs – Companhias Estaduais de Saneamento Básico
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
ConCidades – Conselho das Cidades
DIRES – Diretoria Regional de Saúde
EMBASA – Empresa Baiana de Águas e Saneamento s.a
ETE – Estação de Tratamento de Esgotos
FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
FNS – Fundação Nacional de Saúde
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IQA – Índice de Qualidade da Água
ONU – Organização das Nações Unidas
PLANASA – Plano Nacional de Saneamento
PLANSAB – Plano Nacional de Saneamento Básico
PNDU – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano
PNSB – Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
RDH – Relatório de Desenvolvimento Humano
RSS – Resíduos Sólidos Urbanos
SEI – Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia
SNIS – Sistema Nacional de Saneamento
UESB – Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 10
1 GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS ....................................... 12
1.1 QUESTÕES SOBRE GESTÃO URBANA ................................................... 12
1.2 SANEAMENTO E MEIO AMBIENTE........................................................... 16
1.2.1 Saneamento básico e saneamento ambiental............................................. 16
1.2.2 Políticas públicas de saneamento no Brasil ................................................ 21
1.3 RESÍDUOS SÓLIDOS ................................................................................. 23
1.3.1 Gestão de resíduos sólidos urbanos ........................................................... 25
1.3.2 Limpeza urbana ........................................................................................... 26
1.3.3 Coleta e transporte de resíduos sólidos urbanos ........................................ 27
1.3.4 Destino final de resíduos sólidos ................................................................. 30
1.4 IMPACTOS DOS RESÍDUOS SÓLIDOS EM AMBIENTES URBANOS ...... 36
1.4.1 Populações expostas aos resíduos sólidos urbanos ................................... 38

2 PIRIPÁ: ESPAÇO URBANO E MEIO AMBIENTE .................................... 40


2.1 CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DO ESPAÇO URBANO . .......... 40
2.2 PRINCIPAIS PROBLEMAS AMBIENTAIS URBANOS..................................44

3 GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CIDADE DE PIRIPÁ-BA .......... 53


3.1 A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO ÂMBITO DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUNICIPAL .................................................. 53
3.1.2 Coleta e transporte dos resíduos sólidos urbanos ...................................... 57
3.1.3 Destino final dos resíduos sólidos ............................................................... 62
3.1.4 Condições de trabalho dos servidores públicos que atuam no gerenciamento
dos resíduos...................................................................................................67
3.1.5 A qualidade do serviço de limpeza urbana na visão da população ............. 71
3.2 ELEMENTOS PARA UMA AVALIAÇÃO CRÍTICA DA GESTÃO DOS
RESÍDUOS SÓLIDOS EM PIRIPÁ-BA ........................................................ 75
3.3 SUGESTÕES PARA A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS 80

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................ 82

REFERÊNCIAS ............................................................................................ 83
10

INTRODUÇÃO

O espaço urbano, assim como outros ambientes, necessita de proteção para


que exista certo equilíbrio entre seus elementos, no entanto, acompanha-se ao
longo da história, contínua degradação deste espaço, pois a relação
sociedade/natureza não ocorre de forma harmônica, refletindo as contradições do
sistema de produção capitalista, resultando numa série de problemas
socioambientais.
Neste contexto, vale ressaltar que a questão dos resíduos sólidos gerados em
ambientes urbanos representa um dos maiores problemas na atualidade,
considerando a enorme produção resultante do consumo humano em geral (mas
agravada pela exacerbação do consumismo), e a falta de locais adequados para
depositá-los. Sabe-se que a destinação inadequada dos resíduos sólidos tem
provocado a degradação do solo, de águas subterrâneas, do ar, assim como tem
comprometido a qualidade de vida de um grande número de pessoas,
especialmente das populações expostas aos resíduos, a exemplo das que
sobrevivem do reaproveitamento de produtos encontrados nos “lixões”.
Este trabalho aborda a gestão dos resíduos sólidos na cidade de Piripá-BA, e
tem como finalidade analisar a coleta, transporte e destinação final dos mesmos;
avaliar as políticas destinadas à limpeza urbana, bem como a atuação do poder
público municipal e da sociedade local em relação a essas políticas. Além disso,
avaliar também as condições de trabalho dos servidores e apresentar sugestões
para o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos.
Para o desenvolvimento deste trabalho foi feito, primeiramente, um
levantamento bibliográfico a respeito do tema proposto, para dessa forma, construir
sua base teórica. Depois, foi realizada a pesquisa de campo, que se procedeu da
seguinte forma: observação da área de estudo, atentando para os aspectos
relevantes à pesquisa e registro de tais aspectos na configuração dos espaços
através de fotografias; realização de entrevistas com os gestores municipais
(prefeito atual do município e prefeito da gestão 2004/2008), e com o secretário de
infra-estrutura, além da aplicação de questionários com a população local, numa
amostra que corresponde a 5% do número de domicílios urbanos. Outros
questionários foram aplicados aos servidores que atuam no serviço de limpeza
urbana.
11

Após a coleta dos dados, iniciou-se a etapa de organização e elaboração dos


gráficos e tabelas que serviram para melhor expressar os resultados obtidos,
seguida da interpretação e análise dos referidos dados, culminando com a redação
da monografia, que se encontra estruturada em três capítulos.
No primeiro capítulo, encontra-se a base teórica, em que são discutidos
assuntos referentes à temática central, importantes para o desenvolvimento deste
trabalho, tais como: questões sobre gestão urbana; saneamento básico e
saneamento ambiental; políticas públicas de saneamento no Brasil; resíduos sólidos;
gestão de resíduos sólidos urbanos; limpeza urbana; coleta, transporte e destino
final dos resíduos sólidos; impactos dos resíduos sólidos em ambientes urbanos;
bem como considerações sobre as populações expostas aos resíduos sólidos
urbanos.
O capítulo II aborda alguns aspectos importantes para a caracterização sócio-
ambiental do espaço urbano e uma análise sobre os principais problemas
ambientais da cidade, problemas estes resultantes do uso e da apropriação indevida
do espaço pela sociedade.
O capítulo III trata da parte mais relevante deste trabalho, no qual se analisa a
gestão dos resíduos sólidos na cidade de Piripá-BA e suas conseqüências sócio-
ambientais, com a análise do processo de coleta, transporte e armazenamento dos
resíduos; das condições de trabalho dos servidores públicos que atuam neste setor;
e da avaliação da qualidade e eficiência das ações governamentais destinadas à
limpeza urbana, tanto no plano da atuação do poder público municipal quanto no
que se refere ao envolvimento da sociedade local em relação a esses serviços
públicos essenciais. Neste capítulo constam também uma avaliação mais ampla da
gestão dos resíduos sólidos e algumas sugestões que poderão contribuir para seu
aperfeiçoamento.
Levando-se em conta a escassez de estudos sobre resíduos sólidos na área
de gestão urbana e a relevância geográfica do assunto analisado, considera-se a
importância deste trabalho. O estudo da gestão dos resíduos sólidos na cidade de
Piripá-BA fornecerá à sociedade e ao poder público informações sistematizadas
sobre o tema, que servirão para a tomada de decisões que resultem em mudanças
positivas em relação à situação atual, e dessa forma, evitar os problemas sócio-
ambientais provenientes dos resíduos sólidos urbanos. Servirá também para ampliar
o quadro de trabalhos científicos sobre o município.
12

1 GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS

1.1 QUESTÕES SOBRE GESTÃO URBANA

O espaço urbano constitui-se num complexo conjunto de diferentes formas,


onde se estabelecem funções as mais variadas possíveis, compreendendo a
organização espacial da cidade, que normalmente compõe-se de áreas comerciais,
industriais, residenciais, de lazer, dentre outras. Produzido pela sociedade a partir
das relações políticas, econômicas e culturais estabelecidas ao longo dos tempos, é
também um condicionante da sociedade. “O condicionamento se dá através do
papel que as obras fixadas pelo homem, as formas espaciais, desempenham na
reprodução das condições de produção e das relações de produção” (CORRÊA,
1995, p.8-9).
Apresenta-se concomitantemente fragmentado e articulado, pois suas partes,
embora distintas, mantêm relações espaciais entre si. Por ser uma produção
humana, o espaço urbano aparece como trabalho materializado, construído
historicamente a partir da relação da sociedade com a natureza. Neste sentido, vale
lembrar que não é estável, encontra-se numa incessante transformação e se
caracteriza pelas desigualdades, pois resulta do complexo sistema capitalista, que
se reproduz a partir de contradições.

[...] a sociedade constrói um mundo objetivo através da prática sócio-


espacial, demonstrando em suas contradições um movimento que
aponta um processo em curso, o qual tem sua base no processo de
reprodução das relações sociais - realizando-se enquanto relação
espaço-temporal (CARLOS, 2005, p. 20).

O crescimento intenso e descontrolado do espaço urbano nas últimas


décadas tem despertado grandes preocupações da sociedade e de cientistas acerca
dos mecanismos de proteção e defesa do bem-estar de seus habitantes, pois a falta
de infra-estruturas sociais, a exemplo do saneamento básico, aliada à falta de
planejamento público, vem contribuindo para deterioração do ambiente das cidades,
daí a importância da gestão urbana. Neste contexto, não se pode prescindir do
planejamento, que é a preparação para a gestão. Sendo um mecanismo de gestão
urbana, o qual se constitui em algo indispensável para a organização do espaço
13

urbano, pois este necessita de direcionamento adequado, ou seja, precisa ser


condicionado conscientemente, a fim de evitar problemas e ampliar as
possibilidades de melhor gerenciamento.
Castells (1983, p. 376-377), em sua obra clássica, “A questão urbana”,
considera o espaço urbano produto de dada formação social, e por isso afirma que o
planejamento urbano é a intervenção do político sobre a articulação específica das
diferentes instâncias de uma formação social no âmago de uma unidade coletiva de
reprodução da força de trabalho, com a finalidade de assegurar sua reprodução
ampliada, de regular as contradições não antagônicas, assegurando assim os
interesses de classe social no conjunto da formação social e a reorganização do
sistema urbano, de forma a garantir a reprodução estrutural do modo de produção
dominante. Para Souza

[...] planejar significa tentar prever a evolução de um fenômeno ou,


para dizê-lo de modo menos comprometido com o pensamento
convencional, tentar simular os desdobramentos de um processo,
com o objetivo de melhor precaver contra prováveis problemas ou,
inversamente, com o fito de melhor tirar partido de prováveis
benefícios. [...] O planejamento a preparação para a gestão futura,
buscando-se efetivar ou minimizar problemas e ampliar margens de
manobra; e a gestão é a efetivação, ao menos em parte [...], das
condições que o planejamento feito no passado ajudou a construir
(SOUZA, 2006, p.46).

É importante salientar que, além da sociedade, o Estado exerce papel


importante na produção e reprodução do espaço urbano, pois constitui um agente
social responsável pela implementação de serviços públicos como transporte,
educação, abastecimento de água, iluminação, manejo de resíduos sólidos, etc,
destinados à população em geral, mesmo que desigualmente distribuídos no
espaço. Atuando também na elaboração e fiscalização de leis referentes ao uso do
solo, o Estado é, portanto, produtor e gestor do espaço supracitado. “E é decorrente
do seu desempenho espacialmente desigual enquanto provedor de serviços
públicos, [...] que o Estado se torna o alvo de certas reivindicações de segmentos da
população urbana” (CORRÊA, 2005, p. 24-25).
Neste contexto, não se pode desconsiderar a importância do planejamento
para a gestão urbana, no entanto, é relevante questionar o papel que vem
desempenhando, cuja finalidade, muitas vezes, é criar condições para reprodução
14

da sociedade capitalista, e dessa forma, legitimar o poder da classe dominante,


ampliando as desigualdades socioespaciais. Como o planejamento raramente se
concretiza por completo, pode-se afirmar que o planejado e o espontâneo interagem
no espaço urbano. Este não pode ser controlado e modelado apenas pelo Estado,
mas principalmente pela interação constante entre os agentes da sociedade, pois é
produto dos processos socioespaciais, “sendo o Estado apenas um dos
condicionantes em jogo (ainda que seja um condicionante crucial nas modernas
sociedades capitalistas)”, conforme afirma Souza (2006, p. 52).
Para Villa (1997) e Costa (1978) citados por Carvalho (2000), o planejamento
e a gestão urbanos têm como objetivos a promoção e melhoria das condições de
habitat, viabilizando uma vida saudável, social, material e espiritualmente (cultura,
lazer, educação e trabalho) para todos os municípios; proteção das condições
geoambientais na cidade e no seu entorno; e maior eficácia social e eficiência
econômica do capital social, ou seja, do ambiente construído que é a cidade,
distribuindo-se igualitariamente ou eqüitativamente os benefícios e ônus dos
investimentos urbanos.
Tendo em vista os objetivos expostos, pode-se dizer que propiciariam o
desenvolvimento sócio-espacial, promovendo mudanças significativas e positivas
que resultariam em bem-estar e justiça social. Para tanto, seria imprescindível a
organização e participação social, pois as mudanças somente são verdadeiramente
positivas quando se leva em consideração o interesse da maioria da sociedade.
Neste sentido,

[...] a partir do momento em que se assume que a finalidade do


planejamento e da gestão urbanos é contribuir para a mudança
social positiva, e que o planejamento é uma estratégia de
desenvolvimento sócio-espacial, a modificação de um hábito mental
freqüentemente bastante arraigado se impõe: não é razoável cultivar
um campo como “teoria do planejamento” que não seja como um
subconjunto de uma reflexão teórica sobre a sociedade e, mais
especificamente, sobre mudança social (SOUZA, 2006, p. 73).

No que tange ao desenvolvimento urbano, não deve ser considerado apenas


o desenvolvimento econômico que é, na sua essência, uma combinação de
crescimento econômico e modernização tecnológica, já que o aumento da produção
de bens e o progresso tecnológico na produção destes são insuficientes para
15

influenciar o nível de bem-estar social e tampouco tornar a sociedade mais justa.


Neste sentido, falar de desenvolvimento urbano é abranger a sociedade nas
dimensões: econômica, política e cultural, enfocando a dimensão espacial, não
apenas no âmbito econômico e natural, mas o espaço enquanto produção histórica.
Neste contexto, não se pode abdicar dos instrumentos de gestão urbana, a
exemplo do orçamento público, que segundo Souza (2006), tem como finalidade
mais evidente o disciplinamento das finanças públicas. O que inicialmente tinha a
função de facilitar o controle dos parlamentares sobre o governo, tornou-se um
importante instrumento de gestão urbana, uma imprescindível ferramenta
administrativa, isto se deu principalmente com a fase monopolista do capitalismo e
com o início da construção do sistema social em diversos países, momento em que
as despesas públicas apresentaram um rápido crescimento.
Outro considerável instrumento de gestão urbana é o Plano Diretor, previsto
constitucionalmente e regulamentado no Estatuto da Cidade. Segundo Silva (2000),
o Plano Diretor apresenta vários aspectos: físico, social e administrativo-institucional.
O aspecto físico diz respeito à ordenação do espaço municipal, traçando as
localidades e zonas para diferentes usos. O aspecto social do plano diretor está
relacionado à busca pela melhoria da qualidade da comunidade, mediante o
planejamento dos espaços habitáveis. Por último, o aspecto administrativo
institucional se refere ao meio de atuação urbanístico do Poder Público.
Nesse sentido, pode-se dizer que o Plano Diretor consiste em um documento
de planejamento que visa promover o desenvolvimento e a expansão do espaço
construído. Por meio deste instrumento político institucional é possível definir quais
os melhores modos de ocupar o espaço urbano, prevendo os lugares onde se
localizarão as áreas destinadas para as diversas funções sociais de habitação, de
lazer, das atividades industriais e todos os demais usos do solo, não somente no
presente, mas também no futuro, de modo a mudar a realidade urbana, trazendo
melhor qualidade de vida à população.
No que tange à questão ambiental, Ribeiro e Vargas (2004) discutem sobre
os instrumentos tradicionais e apontam o objetivo da proposta de novos
instrumentos de gestão ambiental urbana.

Os instrumentos fundamentais de gestão ambiental urbana


apresentam quatro formatos distintos: os normativos, que incluem as
16

legislações de uso e ocupação do solo, dentre outros; a


regulamentação de padrões de emissão de poluentes nos seus
diversos estados – líquido sólido e gasoso – dentre outros; os de
fiscalização e controle das atividades para que estejam conforme as
normas vigentes; os preventivos, caracterizados pala delimitação de
espaços territoriais protegidos (parques e praças), pelas avaliações
de impacto ambiental, análises de risco e licenciamento ambiental; e
os corretivos, que se constituem nas intervenções diretas de
implantação e manutenção de infra-estrutura de saneamento, plantio
de árvores, formação de praças, canteiros e jardins, obras de
manutenção, serviço de coleta de resíduos etc (RIBEIRO e
VARGAS, 2004, p. 13-14).

Sabe-se que tem sido difícil a implementação desses instrumentos, tanto pela
escassez de recursos quanto pela falta de colaboração de alguns grupos sociais que
agem contrariamente aos resultados positivos em relação à qualidade ambiental.
Daí a necessidade de novos instrumentos de gestão nesta área.

A proposta de inclusão de “novos instrumentos” como a educação, a


comunicação, o marketing e a negociação ambientais tem como
finalidade aumentar a eficiência dos responsáveis pela gestão
ambiental urbana, utilizando-os de forma complementar e integrada
aos instrumentos tradicionais. Pretende-se com isso obter melhorias
na qualidade ambiental a partir de sinergias positivas... (RIBEIRO e
VARGAS, 2004, p. 14).

Considerando os instrumentos mencionados, é possível afirmar que as


parcerias poderão ser alternativas viáveis no que se refere à gestão ambiental
urbana, uma vez que estas ampliarão as possibilidades de investimentos,
favorecendo a aplicação de ações preventivas e corretivas a fim de promover
melhorias mais significativas no setor. Neste contexto, vale salientar a necessidade
de investimentos em saneamento básico como forma de evitar uma série de
problemas sócio-ambientais.

1.2 SANEAMENTO E MEIO AMBIENTE

1.2.1 Saneamento básico e saneamento ambiental

O saneamento básico é definido como o conjunto de serviços e ações com o


objetivo de alcançar níveis crescentes de salubridade ambiental, nas condições que
17

maximizem a promoção e a melhoria das condições de vida nos meios urbano e


rural, segundo projeto de lei federal 5.296/2005 que estabelece o marco regulatório
para o saneamento. Além disso, especifica os quatro conjuntos de serviços públicos
que o constituem: abastecimento de água, o esgotamento sanitário, o manejo de
resíduos sólidos e o manejo de águas pluviais.
Conforme Kobyiama, Mota e Corceuil (2008), a complexidade do
funcionamento e dos processos necessários para manutenção da vida humana,
segundo o modelo econômico capitalista, principalmente no perímetro urbano, torna
essencial a implantação, execução e manutenção de um sistema de saneamento
básico eficaz. Essas ações vêm garantir a integridade e qualidade do meio ambiente
para as gerações atuais e futuras.
No entanto, os serviços de saneamento básico, mesmo sendo eficazes, não
conseguem dar conta da proteção do ambiente, considerando a integração entre
área urbana e rural, daí a necessidade do saneamento ambiental, um conceito muito
mais amplo que o saneamento básico.

Este conceito como definido anteriormente engloba os serviços de


abastecimento de água, o esgotamento sanitário, o manejo de
resíduos sólidos e de águas pluviais. Entretanto, essa simplificação
não garante que se alcancem os níveis crescentes de salubridade
ambiental, previstos pelo saneamento ambiental que consiste não só
nos serviços enumerados no saneamento básico, mas também, no
que diz respeito ao controle de doenças, garantindo saúde pública
(KOBYIAMA, MOTA e CORCEUIL, 2008, p. 26-27).

Neste sentido, é importante salientar que o saneamento se constitui num


responsável direto pela qualidade de vida da população e consiste basicamente em
ações relacionadas à água. Dessa forma, a obtenção de boas condições de
saneamento depende do gerenciamento adequado dos recursos hídricos. Ainda
segundo Kobyiama, Mota e Corceuil

A meta final de ambos os saneamentos, básico e ambiental, é a


mesma. Porém, enquanto o saneamento básico possui uma visão
mais antropocêntrica e conseqüentemente tecnológica, o
saneamento ambiental procura a preservação do ambiente, papéis
dos organismos no tratamento de resíduos, etc. Assim, o
saneamento ambiental enfatiza o aproveitamento do meio ambiente
18

para obter o bom saneamento (KOBYIAMA, MOTA e CORCEUIL,


2008, p. 27).

É evidente que o saneamento básico é parte do saneamento ambiental, e


este, por sua vez, denomina-se como o todo, sendo ambos complementares.
Portanto, pensar em um dissociado do outro é pensar na complexidade do ambiente,
uma vez que, as ações de saneamento básico desvinculadas do saneamento
ambiental resultam em problemas sócio-ambientais.
Segundo Arretche (2005), os serviços de saneamento básico se
intensificaram no Brasil, somente na década de 1970, quando o país passou a ser
predominantemente urbano, pois nesse período apenas uma pequena parcela da
população usufruía de água tratada e esgotamento sanitário1. Até então, a
responsabilidade pela oferta de serviços era municipal, existindo basicamente
empresas municipais de água e esgoto com estruturas administrativas e financeiras
totalmente distintas, dessa forma, a oferta de serviços era insuficiente. Não existia
planejamento nem recursos necessários para ampliar essa oferta na quantidade
adequada, correspondente aos índices de crescimento populacional e urbanização.
Então, para enfrentar as demandas, foi criado em 1968 e implementado no início
dos anos de 1970 o Sistema Nacional de Saneamento, integrado pelo Plano
Nacional de Saneamento (Planasa), Banco Nacional da Habitação (BNH), pelo
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), principal fonte de recurso do
Planasa e pelas companhias estaduais de saneamento.
Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2000,
o abastecimento de água constitui uma questão fundamental para as populações e é
imprescindível sua resolução ou superação, pelos riscos que sua ausência ou seu
fornecimento inadequado podem causar à saúde pública. A universalização deste
serviço é a grande meta para os países em desenvolvimento. Os números
evidenciados pela pesquisa mostram que, no Brasil, a cobertura de abastecimento
de água já atingiu um significativo contingente populacional. E os municípios que
não possuem rede de distribuição de água, utilizam como alternativas para o
abastecimento das populações chafarizes e fontes, poços particulares e
abastecimentos por caminhões pipas, bem como utilização direta de cursos de água.

1
Conjunto de obras e instalações destinadas à coleta, transporte, afastamento e disposição final das
águas residuárias da comunidade, de uma forma adequada do ponto de vista sanitário (Pesquisa
Nacional de Saneamento Básico 2000).
19

Se comparado com o abastecimento d’água, o serviço de esgotamento


sanitário não alcançou avanços significativos, pois a pesquisa revela que apenas
33,5% dos domicílios são atendidos por rede geral de esgoto, além de apresentar
um quadro marcante de desigualdades regionais. O atendimento chega a seu nível
mais baixo na região Norte, onde apenas 2,4% dos municípios são atendidos,
seguido da região Nordeste (14,7%), e das regiões Centro-Oeste e Sul (28,1%). A
região Sudeste apresenta o melhor atendimento, mesmo assim, cobre pouco mais
da metade dos domicílios da região (53,0%).

[...] o maior problema é a poluição de redes pluviais, rios, canais,


lagoas, baías e oceanos pelos efluentes líquidos não-tratados,
industriais e domésticos. [...] a situação dos esgotos domésticos é
caótica. São poucas as partes dos sistemas de esgotamento que
passam por estações de tratamento, de que tipo for, e o
funcionamento dessas estações e sua própria manutenção
constituem um problema que raramente é resolvido
satisfatoriamente. Nossas cidades estão cheias de exemplos
caricaturais de estações que não funcionam, mal funcionam ou,
simplesmente, são “baipassadas” pela rede de esgoto (SIRKIS,
2003, p. 226).

Pode-se afirmar que nas cidades brasileiras houve significativos avanços no


abastecimento de água e menos no esgotamento sanitário, porém os sistemas de
abastecimento de água no país também apresentam problemas, pois muitas
cidades, principalmente as de maior porte, sofrem perdas importantes na fase de
transporte e distribuição. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento
Básico (PNSB), “as redes de distribuição de água são as principais responsáveis
pelas perdas físicas nos sistemas de abastecimento, podendo atingir até 40% do
volume de água produzido”. Além das perdas, ocorre também desperdício, que é
fruto de uma cultura da abundância, numa época em que muitos países do mundo
lutam pela preservação da água, um recurso natural indispensável à vida e que vem
se tornando escasso.
No que tange ao serviço de limpeza urbana e coleta de lixo, a PNSB 2000
informa que, na época que foi realizada, eram coletadas 125.281 toneladas de lixo
domiciliar, diariamente, em todos os municípios brasileiros. Trata-se de uma
quantidade expressiva de resíduos, para os quais deve ser dado um destino final
20

adequado, sem prejuízo à saúde da população e sem danos ao meio ambiente.


Ainda segundo a pesquisa

Quanto à qualidade e eficiência nos serviços de limpeza urbana e


coleta de lixo, cabe observar que os investimentos nesse setor
tendem a aumentar, a partir do momento em que se pretende atingir
a universalização dos serviços, ou seja, levar os benefícios da coleta
regular, dos programas de redução de resíduos, da reciclagem, da
limpeza de logradouros e da destinação adequada a, a toda
população urbana brasileira (Atlas de Saneamento, 2004).

A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico mostrou também que a maioria


dos municípios brasileiros possui algum serviço de drenagem urbana (78,6%),
independentemente da extensão de suas redes e eficiência do sistema como um
todo. A pesquisa ressaltou que a importância dos serviços de drenagem urbana,
principalmente nas médias e grandes cidades, torna-se mais destacada em épocas
de chuvas, quando as imagens das enchentes, com conseqüentes danos materiais e
humanos, freqüentemente são mostrados pela imprensa.
O Relatório de Desenvolvimento Humano 2006 (RDH), divulgado no dia 09 de
novembro pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano
(PNDU), revela que 43,5 milhões de brasileiros não têm acesso a saneamento
básico e, segundo previsão da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil
dificilmente cumprirá a meta do milênio de levar saneamento a 85% da população
até 2015.
O RDH 2006 aponta que a proporção de brasileiros com acesso à água
potável aumentou 8% entre 1990 e 2004, de 83% para 90%. O avanço deixou o país
perto da meta de elevar o indicador para 91,5% estabelecida pelos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio (uma série de metas socioeconômicas que os países
membros da ONU se comprometeram a atingir até 2015). Com essa melhora, o nível
de acesso da população brasileira à água é semelhante ao dos países com altos
índices de Desenvolvimento Humano (IDH), como Coréia do Sul (92%) e Cuba
(91%). O mesmo não ocorreu com o serviço de esgoto. Segundo o PNDU, o Brasil
possui uma taxa de coleta de esgoto de 75%, e para atingir a meta do milênio, terá
que intensificar o ritmo atual de expansão dos serviços e ampliar a cobertura de
esgoto em 14%.
21

“O tratamento de dejetos é determinante para a sobrevivência infantil”. Essa é


uma das conclusões do Relatório de Desenvolvimento Humano 2006 (RDH),
divulgado no dia 09 de novembro pelo PNDU. Segundo o documento, melhorando o
saneamento, pode-se chegar a uma redução superior a 30% na mortalidade infantil.
Isso acontece porque havendo melhoria no saneamento, evita a transmissão de
diversas doenças, uma delas é a diarréia. O relatório toma como exemplo um estudo
realizado em favelas de Salvador, no período de 1989 a 1990. O estudo realizado na
capital baiana mostra que a ocorrência de diarréia é duas vezes mais alta entre
crianças de famílias sem instalações sanitárias do que entre aquelas que têm
acesso ao saneamento. Nas regiões onde as crianças vivem sem nenhuma infra-
estrutura de saneamento, a incidência da doença é três vezes mais alta do que em
comunidades com sistemas de drenagem de esgotos.

1.2.2 Políticas públicas de saneamento no Brasil

As políticas públicas consistem em um conjunto de medidas que visam


apresentar as indicações e estratégias de concretização de interesses públicos e de
alteração de relações sociais estabelecidas. Bucci (2002, p. 241) as define como
“[...] programas de ação governamental visando coordenar os meios à disposição do
Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente
relevantes e politicamente determinados”. Algumas políticas têm um espaço
geográfico de atuação de políticas setoriais específicas, como as políticas urbanas,
voltadas a um ambiente específico: o espaço urbano.
Conforme Arretche (2005), o Plano Nacional de Saneamento (Planasa) foi a
primeira iniciativa do Governo Federal no setor. Com este, foram criadas as
Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESBs) em cada um dos Estados
brasileiros. É importante ressaltar que para que as CESBs pudessem operar em
seus respectivos Estados, foi necessária a concessão municipal para o
desenvolvimento dos serviços, estabelecida pela Constituição. Nos anos seguintes,
houve uma expressiva expansão dos serviços, em parte, influenciada pelo volume
de recursos destinados ao setor, porém esta expansão ocorreu de modo desigual.
Foram privilegiados os investimentos em água, por representarem menores custos e
propiciarem retornos mais rápidos através de tarifas. Além disso, o Planasa
22

privilegiou as regiões mais ricas do Sul e Sudeste do país, concentrando os


investimentos nas cidades mais populosas e, nestas, nos grupos populacionais de
maior renda.
É importante ressaltar que nem todos os municípios aderiram ao Planasa,
alguns se mantiveram autônomos, sendo da administração municipal toda
responsabilidade pelo serviço. Isso ocorreu, sobretudo, na região Sudeste,
particularmente nos municípios de Minas Gerais e São Paulo. Outros municípios
mantiveram uma autonomia parcial, mantendo-se conveniados a um órgão do
Ministério da Saúde, atual Fundação Nacional de Saúde (FNS). Neste caso, os
serviços são operados pelo gestor municipal, com autonomia técnica e financeira,
porém administrados com marcada influência do FNS. Conforme Arretche (2005),
“Em 1993, cerca de 6% dos municípios brasileiros adotavam este sistema, em 625
localidades. Estes estão concentrados basicamente na região Nordeste”.
A Constituição de 1988 não determina qualquer modalidade preferencial de
prestação de serviços. Conforme a Carta, a implementação de programas é de
competência de qualquer um dos níveis da federação, ainda que submetidos a
diretrizes gerais emanados pela União. Por outro lado, a partir dos anos de 1990,
sob o impulso dos processos de reforma do Estado, uma grande reestruturação vem
ocorrendo na engenharia administrativa dos serviços de saneamento básico no
Brasil, modificando significativamente a estrutura institucional que havia sido
montada sob o Planasa. “A gestão da política federal de saneamento básico está
sob responsabilidade da Secretária de Estado de Desenvolvimento Urbano, ligada
diretamente à Presidência da República” (ARRETCHE, 2005).
Segundo dados do Ministério das Cidades, o Governo Federal, juntamente
com o Conselho das Cidades (ConCidades), está dando início ao processo de
elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), sob a
coordenação da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das
Cidades, conforme determina a Lei nº 11.445/2007 e a Resolução Recomendada nº
33, de 01º/03/2007, do ConCidades. O Plano Nacional de Saneamento Básico,
quando aprovado, constituirá o eixo central da política federal para o saneamento
básico, promovendo a articulação nacional dos entes da federação para a
implementação das diretrizes da Lei nº 11.445/07. Será instrumento fundamental à
retomada da capacidade orientadora do Estado na condução da política pública de
saneamento básico e, conseqüentemente, da definição das metas e estratégias de
23

governo para o setor no horizonte dos próximos vinte anos, com vistas à
universalização do acesso aos serviços de saneamento básico como um direito
social.
A Lei Federal nº 11.445, de 05 de Janeiro de 2007, estabelece diretrizes
nacionais para o saneamento básico e para a política federal de Saneamento
básico, estabelecendo a universalização do acesso aos serviços de abastecimento
de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos,
disponibilizando os serviços de drenagem e de manejo das águas pluviais em todas
as áreas urbanas.

1.3 RESÍDUOS SÓLIDOS

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) define resíduos sólidos


como os “restos das atividades humanas, consideradas pelos geradores como
inúteis, indesejáveis, podendo apresentar-se no estado sólido, semi-sólido ou
líquido, desde que não seja possível de tratamento convencional (ABNT, 2004). Os
lodos provenientes do sistema de tratamento de água e esgoto incluem nesta
definição.
Os resíduos originados das residências são denominados domésticos, estes
são resultantes de atividades cotidianas como: limpar a casa, cozinhar, estudar,
entre outras. Os resíduos comerciais são os originados dos estabelecimentos
comerciais a exemplo dos bares, restaurantes, açougues, supermercados, cinemas,
escolas, etc.; e os resíduos industriais, constituem aqueles originados das indústrias,
podendo oferecer riscos à saúde, dependendo do tipo.
Além dos resíduos domésticos, comerciais e industriais, as cidades geram os
resíduos conhecidos por hospitalares, produzidos não somente por hospitais, mas
também por postos de saúde, clínicas, sanatórios, farmácias e outros
estabelecimentos similares. Há também os resíduos públicos, que são provenientes
dos serviços de limpeza das áreas urbanas, como varreduras, capinação, poda de
árvores, bem como o de recolhimento de animais mortos; e os resíduos de
construção civil, estes constituem os entulhos de demolição, solos provenientes de
escavações e diversos outros materiais utilizados em construções.
24

Nas sociedades primitivas, a produção de resíduos sólidos era muito


pequena, constituída essencialmente de restos de alimentos. Essa produção não
resultava em grandes impactos ambientais, pois além de volume muito reduzido,
havia grande capacidade de decomposição. Porém, a partir da revolução Industrial
(século XVIII), período em que as fábricas começaram a produzir objetos de
consumo em larga escala e a introduzir novas embalagens no mercado, aumentou
consideravelmente o volume e a diversidade dos resíduos gerados em áreas
urbanas. Esta situação se agravou com a explosão demográfica dos últimos trinta
anos, fato que levou à triplicação dos resíduos urbanos, resultando em significativos
problemas socioambientais.
As nações de todo o mundo estão enfrentando por uma crise ambiental
alarmante, o que não ocorre por acaso, mas devido às próprias demandas do
modelo produtivo do capital, e parte desta está relacionada ao problema dos
resíduos sólidos urbanos. No Brasil, além da alta produção, a dificuldade está em
onde depositá-los. Segundo Rodrigues e Cavinatto (2003), uma comparação feita
entre diversos países do mundo, indica que os resíduos domiciliares brasileiros
possuem uma das taxas mais elevadas de detritos orgânicos em sua composição,
enquanto que nos países desenvolvidos predominam papel, papelão e embalagens
plásticas. Esses dados revelam que a população brasileira consome uma pequena
quantidade de produtos descartáveis em relação às demais, porém desperdiça
muitos alimentos, como afirma Berté

Atualmente, o Brasil produz cerca de mais de 80.000 toneladas de


resíduos diariamente, sendo que 90% desse lixo não recebe
destinação adequada. Outro fato que agrava o problema do lixo
brasileiro é a composição, da qual cerca de 60% em média é de
matéria orgânica, que por um simples tratamento poderia ser
reciclado; o desperdício é o que caracteriza. Cerca de 4,5% de tudo
aquilo que é produzido no Brasil, é simplesmente jogado fora
(BERTÉ, 2004, p. 33).

Neste contexto, vale salientar que a crescente produção dos resíduos


sólidos está associada ao aumento do consumo, principalmente de produtos
descartáveis. E estes, por sua vez, movimentam a indústria de reciclagem, que
atende ao mercado capitalista, transformando “resíduos” em mercadoria. Entende-se
que o problema mencionado será resolvido apenas se os resíduos forem
25

depositados adequadamente em aterros sanitários e/ou enviados (os aproveitáveis)


para centros de reciclagem. No entanto, a situação não é tão simples como parece,
é necessário buscar a raiz do problema. Neste sentido, a redução da produção dos
descartáveis e a diminuição do consumo são alternativas viáveis para minimizar o
problema. Entretanto, é complexo pensar nessas alternativas em concomitância com
a continuidade do sistema capitalista, que se sustenta com a extrema exploração
dos recursos naturais e da força de trabalho humana.

1.3.1 Gestão dos resíduos sólidos urbanos

“Gestão remete ao presente: gerir significa administrar uma situação dentro


dos marcos dos recursos presentemente disponíveis e tendo em vista as
necessidades imediatas” (SOUZA, 2006. p. 46). Em se tratando de gestão de
resíduos sólidos, a qual pode ser definida como as ações associadas ao controle da
geração, armazenamento, coleta, transporte, processamento e disposição final dos
resíduos, de modo que esteja em conformidade com os melhores princípios de
conservação dos recursos naturais, saúde pública, economia e outros aspectos
referentes à preservação socioambiental. Segundo Braga e Dias (2008), “o
gerenciamento de resíduos sólidos inclui todas as funções administrativas, legais,
financeiras, de planejamento e de engenharia envolvidas na solução dos problemas
relativos aos resíduos sólidos”.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2000, a
responsabilidade pela proteção do meio ambiente, pelo combate à poluição e pela
oferta de saneamento básico a todos os cidadãos brasileiros está prevista na
Constituição Federal, que deixa ainda, a cargo dos municípios, legislar sobre
assuntos de interesse local e de organização dos serviços públicos. Por isto, e por
tradição, a gestão da limpeza urbana e dos resíduos sólidos gerados em seu
território, inclusive os provenientes dos estabelecimentos de serviços de saúde, é de
responsabilidade dos municípios.
A PNSB 2000 revelou que do percentual do orçamento municipal destinado à
limpeza urbana, na grande maioria dos municípios com população abaixo de 50 000
habitantes, 5% no máximo, é destinado à gestão de resíduos sólidos. E que os
investimentos nos serviços de limpeza urbana e coleta de lixo tendem a aumentar, a
26

partir do momento em que se pretende atingir a universalização dos serviços, ou


seja, levar os benefícios da coleta regular, dos programas de redução de resíduos,
da reciclagem, da limpeza de logradouros e da destinação final adequada a toda a
população urbana brasileira.
Em relação à prestação dos serviços da limpeza urbana (varrição, coleta,
coleta seletiva, reciclagem, remoção de entulhos, coleta de lixo especial, tratamento
e disposição final) no espaço urbano, os dados da PNSB sugerem que, não havendo
recursos suficientes para oferta de serviços a todos os distritos, privilegiam-se
aqueles com zonas de comércio e bairros residenciais que, normalmente são os
distritos mais populosos ou sedes do município.
Ainda conforme a PNSB, os resultados sobre limpeza urbana refletem uma
imagem momentânea, relativa à situação no ano de 2000, que pode ser alterada em
pouco tempo. Todavia, a pesquisa demonstrou nítida tendência de melhoria do
setor, em todo o Brasil. Assim como a década de 1970 foi a da água, com projetos
em todo o país alavancados pelo Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), a
partir da década de 1990 em diante, estendendo-se pelo novo século XXI, observa-
se uma tomada de consciência importante no que diz respeito à gestão dos resíduos
sólidos.
É importante destacar que para a adequada gestão dos resíduos sólidos é
necessário que o total coletado seja tratado e disposto em locais adequados,
afastados dos pontos de geração. Para isso, além da participação ativa da
população, é preciso que os gestores públicos forneçam infra-estrutura adequada,
pois o desenvolvimento e execução dos projetos nesta área só serão efetivados se
houver parceria entre poder público e sociedade, do contrário, as tentativas serão
fracassadas.

1.3.2 Limpeza urbana

Limpeza urbana é definida no Atlas de Saneamento 2004 como limpeza de


ruas e logradouros públicos pavimentados (varredura manual ou mecânica) e não-
pavimentados (capinação, raspagem da terra e roçagem), além de limpeza de
monumentos, de bocas de lobo, também conhecidas como bueiros em algumas
regiões, e retirada de faixas e cartazes.
27

Os serviços de limpeza pública no Brasil estão geralmente a cargo das


prefeituras dos municípios e compreendem algumas etapas como: limpeza da área
urbana, a coleta dos resíduos, o transporte dos detritos, geralmente, para fora das
cidades, e seu destino final. No entanto, a PNSB 2000 revelou tendência de
terceirização dos serviços de limpeza urbana, em todas as regiões brasileiras, mais
acentuada nos municípios de maior porte, e com menor intensidade no Nordeste. De
acordo com a pesquisa, nos municípios com população acima de 500.000
habitantes, por exemplo, onde a prefeitura e outras entidades são responsáveis
pelos serviços de limpeza urbana, enquanto que nas regiões, Norte, Centro-Oeste e
Sul a média é de 100%, no Nordeste é de apenas 16,7%, seguida da região Sudeste
com 54,5%.
Embora o percentual de municípios que adotam os serviços sob
administração direta da prefeitura ainda seja muito grande, já se nota uma reversão
do quadro entre os municípios que tem alguma forma de cobrança, pois como
aponta a PNSB, é grande a quantidade de pequenos municípios que não cobram
nenhum tipo de tarifa para estes serviços, retirando de outras rubricas de seu
orçamento todos os custos necessários à sua realização. No entanto, quase todos
os municípios acima de 100.000 habitantes têm instituída uma taxa específica para a
limpeza urbana, independentemente da região onde se localiza.
No aspecto referente à forma de execução dos diversos serviços, as
informações coletadas pela pesquisa, indicam que a população dá grande
importância à freqüência com que a coleta domiciliar e a varrição de logradouros são
realizadas, que constituem as atividades mais visíveis da limpeza urbana. Quanto à
varrição, ocorre na maioria dos municípios com freqüência diária, embora não seja
insensato afirmar que não ocorre em todos os logradouros da cidade. Poucos
municípios executam esse serviço de forma mecanizada, com varredeiras
mecânicas, e isto ocorre predominantemente nas Regiões Sul e Sudeste.

1.3.3 Coleta e transporte de resíduos sólidos urbanos

Conforme Diagnóstico de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos – 2006, a


coleta regular de resíduos sólidos domiciliares e públicos se define como o conjunto
de procedimentos referentes ao recolhimento de resíduos de origem domiciliar ou
28

comercial com características domiciliares, que são previamente acondicionados e


oferecidos à coleta pública pelo usuário, e resíduos de origem pública, ou seja,
provenientes da limpeza de logradouros. A partir da amostra pesquisada para o
diagnóstico mencionado, constatou-se que “o atendimento da população por
serviços de coleta regular apresenta razoável cobertura, com a média da amostra
chegando a quase 100%”. Quanto à quantidade, a média da massa coletada de
resíduos sólidos domiciliares e públicos per capita no Brasil é de 0,93 kg./hab./dia, e
na Bahia, de 0,76 kg./hab./dia.
No que se refere à freqüência com que a coleta domiciliar é realizada no
Brasil, considerando a amostra de municípios selecionada pelo Sistema Nacional de
Informações sobre Saneamento (SINS) em 2006 e divulgada em 2008, a freqüência
de coleta que predomina é a de duas ou três vezes por semana (61,8%) com uma
considerável taxa de população atendida com coleta diária (33,9%) e uma taxa
residual de população atendida com coleta de freqüência semanal (4,3%). Quanto
ao agente executor do serviço de coleta dos resíduos sólidos urbanos, considerando
os municípios pesquisados pelo SNIS, a execução da coleta de resíduos
domiciliares e públicos é realizada, na maior parte dos municípios, por empresas de
modo exclusivo, seguida da atuação exclusiva da prefeitura e em menor escala pelo
trabalho conjunto da prefeitura e empresas.
Conforme Rodrigues e Cavinatto (2003), no Brasil, o tipo de embalagem
usada para armazenar os resíduos sólidos varia conforme a região e os hábitos da
população. Ainda é muito comum a utilização de latas, baldes e tambores, mas o
saco plástico tem sido mais utilizado, este é uma solução mais moderna, que, além
de fácil manipulação, protege os detritos da chuva, porém fura com facilidade e, por
não ser biodegradável, tende a permanecer por longos anos no ambiente.
Atualmente, as pessoas costumam reaproveitar os materiais plásticos das compras
feitas em lojas e supermercados. Esse reaproveitamento é importante, pois
representa redução de gastos e de consumo desse tipo de material tão prejudicial ao
meio ambiente.
Os resíduos devem ser embalados em recipientes fechados e deixados em
frente à residência, ou em local mais próximo, apenas no dia certo da coleta, um
pouco antes da passagem do veículo coletor. De preferência, as embalagens devem
ser colocadas em um suporte elevado para impedir o acesso de animais. Os
materiais cortantes como cacos de vidro, devem ser embalados separadamente em
29

jornais ou papelão para evitar acidentes com os funcionários que fazem à coleta. Em
localidades onde o carro não passa para fazer a coleta, os habitantes devem
carregar seus resíduos até a rua ou praça mais próxima, por onde passa o veículo
coletor.
Neste contexto, vale ressaltar que mesmo em áreas onde há coleta regular,
muitas pessoas depositam seus resíduos domiciliares em terrenos baldios,
provocando mau cheiro na vizinhança e atraindo insetos e roedores. Isso mostra o
descaso de parte da população urbana em relação à limpeza pública e/ou o
desconhecimento dos malefícios que os resíduos a céu aberto podem provocar à
sociedade e ao ambiente. Sendo importante lembrar que, embora o serviço de
limpeza urbana seja de responsabilidade dos gestores municipais, a população deve
colaborar para que a mesma seja mantida.
Além dos detritos das residências, são coletados, dentre outros, os resíduos
gerados pelo comércio e pela indústria, os resultantes da limpeza de vias públicas,
como ruas e praças, de podas de árvores e dos hospitais. A coleta dos resíduos
hospitalares merece atenção especial, pois os quais representam maior perigo à
população e principalmente aos coletadores.

Este serviço corresponde ao conjunto de procedimentos referente ao


recolhimento de resíduos infectantes ou perfurocortantes gerados em
estabelecimentos de atenção à saúde (hospitais, clínicas, postos de
saúde, clínicas veterinárias, consultórios médicos e odontológicos,
farmácias, laboratórios de análises clínicas e demais
estabelecimentos congêneres) e que, em função de suas
características específicas, demandam a adoção de métodos e/ou
procedimentos especiais de acondicionamento, transporte tratamento
ou disposição final (Diagnóstico de Manejo de Resíduos Sólidos
Urbanos – 2006, 2008, p. 39).

Em muitos municípios, principalmente os de pequeno porte, o mais comum é


as prefeituras recolherem os vários tipos de resíduos no mesmo veículo e depositá-
los juntos, ou queimarem os resíduos hospitalares de forma inadequada, em lixões
afastados ou nos arredores da cidade. O trabalho de coleta de resíduos sólidos se
constitui numa tarefa fundamental na manutenção da limpeza de áreas públicas.
Havendo apenas alguns dias de paralisação dessa atividade, uma quantidade
significativa de detritos se acumula nas ruas e calçadas. Quando isso ocorre, além
30

de espalhar sujeira e causar um cheiro insuportável, atrai milhares de insetos e


outros animais nocivos ao ser humano.
Quanto ao transporte dos resíduos sólidos urbanos, segundo Rodrigues e
Cavinatto (2003), no passado, o único veículo disponível para recolher os resíduos
sólidos das ruas eram as carroças. Atualmente, ainda há lugares que as utilizam,
mas, principalmente nas cidades de maior parte, elas foram substituídas por
caminhões modernos, bem equipados com espaço fechado que tritura e amassa os
resíduos, diminuindo o seu volume, e aumentando assim a capacidade de
transporte, tornando o serviço mais eficiente. As cidades de menor porte,
geralmente, utilizam caminhões dotados de carrocerias de madeira ou carros
menores, com caçambas abertas.
Conforme Diagnóstico do Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos – 2006, os
veículos usados nos serviços de coleta de resíduos domiciliares, considerando os
municípios pesquisados, são predominantemente de propriedade privada 78,2%, no
entanto, nos pequenos municípios a situação inverte-se, detendo as prefeituras
63,8% dos veículos. Neste caso, pode se afirmar que a participação de empresas
cresce com o aumento do porte dos municípios.
Normalmente, os resíduos coletados nas cidades são transportados para
áreas distantes do perímetro urbano, onde são depositados em aterros sanitários,
aterros controlados ou, principalmente, em vazadouros a céu aberto (lixões). O pior
é que, muitas vezes, os trabalhadores viajam nos mesmos compartimentos dos
veículos onde são transportados os resíduos, tornando-se potenciais vítimas de
doenças causadas pelos detritos contaminados e/ou pelos vetores que ali se
encontram.

1.3.4 Destino final de resíduos sólidos

Com o crescente aumento na produção de resíduos sólidos, uma das


conseqüências mais preocupantes é a sua destinação final. Infelizmente, quase o
total destes coletados no Brasil não recebe destinação adequada, é simplesmente
jogado a céu aberto, em locais conhecidos como lixões ou vazadouros. É importante
destacar que as consequências decorrentes de uma disposição inadequada
31

resultam em diversos e sérios problemas. A situação se agrava principalmente nos


grandes centros urbanos, como afirma Sirkis

O destino final dos resíduos sólidos das grandes cidades apresenta


um problema capital a pressionar cada vez mais a vida das cidades,
nas próximas décadas, porque, até agora, a quantidade de resíduos
sólidos na maioria das cidades vem crescendo sem parar. Com a
disponibilidade de espaços existente em nosso país, aterros sanitários
bem preparados e geridos, associados a uma eficiente coleta e
transporte do lixo, ainda podem ter uma sobrevida de uma ou duas
décadas. Mas o colapso estará na curva da história, logo adiante, se
não houver uma mutação primordial da relação da sociedade com os
resíduos sólidos que produz incessantemente (SIRKIS, 2003, p. 227).

As formas mundialmente mais usuais de destino dos resíduos sólidos são:


lixão, aterro sanitário e incineração, porém nem todas são sanitariamente corretas.
Outra forma não muito comum, mas que vem crescendo nos últimos tempos,
principalmente nos países desenvolvidos, é a reciclagem.
Segundo Prandini (1995), a maioria dos resíduos sólidos municipais
coletados nas cidades brasileiras (aproximadamente 76% do total recolhido) não
recebe destinação final adequada, sendo despejada em lixões, nos quais não há
qualquer espécie de tratamento inibidor ou redutor dos efeitos poluidores. Ainda
segundo o mesmo autor, apenas 10% do volume total coletado é depositado em
aterros sanitários, 13% vai para aterros controlados, 0,9%, para usinas de triagem e
compostagem e 0,1% é destinado à incineração. Quanto à disposição dos resíduos
sólidos de serviços de saúde

Em 2000, a situação de disposição e tratamento dos Resíduos


Sólidos de Serviços de Saúde - RSS - melhorou, com 9,5 % dos
municípios encaminhando-os para aterros de resíduos especiais
(69,9 % próprios e 30,1 % de terceiros). Em número de municípios,
2.569 depositam-nos nos mesmos aterros que dos resíduos comuns,
enquanto 539 já estão enviando-os para locais de tratamento ou
aterros de segurança. A disposição destes resíduos nos mesmos
aterros que recebem o lixo domiciliar não é necessariamente uma
medida inadequada, pois sua disposição em valas sépticas, isoladas
e protegidas do acesso de pessoas tem sido aceita por alguns
órgãos de controle ambiental. É interessante observar, também, que
apenas uma diminuta percentagem de municípios utiliza algum
sistema de tratamento térmico dos RSS (incinerador, microondas,
autoclave) (PNSB 2000, 2002).
32

O “lixão” constitui um espaço onde se deposita “lixo” a céu aberto. Nem


sempre o local para disposição de um “lixão” é previamente estudado, observa-se
apenas a não ocupação de um determinado espaço. A princípio, o lixão provoca um
impacto visual, relacionando-se a este, aspectos como espalhamento de detritos
pelo vento e mau cheiro, podendo-se observar “montanhas” de resíduos em alguns
casos, porém a poluição do ar, a contaminação do solo e de lençóis freáticos
constituem gravíssimos impactos que, degradam tanto o ambiente quanto a
sociedade. Portanto, a destinação final dos resíduos sólidos não pode ser ignorada,
pois uma quantidade expressiva de resíduos é simplesmente jogada a céu aberto,
tornando o ambiente urbano um espaço extremante propício a proliferação de
doenças.
E o problema não se encerra, pelo contrário, se agrava quando os catadores
(aqueles que pegam produtos aproveitáveis nos lixões) encontram aí um meio de
sobrevivência, coletando restos de alimentos, calçados, roupas e tudo que lhes
possam ser úteis. Além desses, existem os que coletam materiais para serem
vendidos. Os catadores enfrentam situações de risco ao lidarem com diversos tipos
de resíduos como afirmam Rodrigues e Cavinatto:

Como vivem em contato direto com os resíduos, os catadores estão


permanentemente sujeitos a acidentes com cacos de vidro, pregos,
latas abertas ou enferrujadas e frascos de aerossóis, que muitas
vezes pegam fogo e explodem. Sua saúde também é comprometida
pelos micróbios patogênicos que chegam aos lixões por meio do
material contaminado, descartado por hospitais ou pessoas doentes
(RODRIGUES e CAVINATTO, 2003, p. 55).

Assim, o problema maior está no alto grau de contaminação ao qual se expõe


essas pessoas, por meio de micróbios nocivos à saúde e de substâncias químicas
e/ou tóxicas. A proliferação de insetos e roedores acentua ainda mais esta situação
no que se refere à transmissão de doenças. Dentre os principais transmissores
estão mosca, mosquitos, baratas e ratos. Considerando os fatos apresentados, é
possível afirmar que a falta de um destino final adequado para os resíduos sólidos
repercute de forma negativa no espaço urbano, comprometendo a qualidade de vida
dos seus habitantes.
Outra forma de destinação final de resíduos sólidos é depositá-los em aterros
sanitários, no qual o lixo é compactado e coberto com uma camada fina de terra ao
33

fim de cada dia. A área para a instalação de um aterro deve ser cuidadosamente
escolhida, visando proteger, acima de tudo, as águas superficiais e subterrâneas,
dando preferência a terrenos que necessitam ser recuperados (valas, erosão, areias,
etc.)
O aterro sanitário é uma obra de engenharia projetada para receber vários
tipos de resíduos. Para sua construção, precisa basicamente dos seguintes serviços:
terraplanagem; forração do terreno com material impermeável, de preferência argila;
canalização das águas da chuva e do chorume 2; tubulação para a saída de gases;
plantio de grama; e finalmente, instalação de uma cerca ao redor da área de serviço.
“A técnica de compactação utilizada para a obtenção de bons resultados, estabelece
que o lixo seja descarregado no solo e seja empurrado pelo trator de baixo para
cima.” (BERTÉ, 2004, p.36)
Esse método de enterrar os resíduos não agride nem prejudica a saúde das
pessoas. Além de eliminar os impactos visuais, evita o mau cheiro, a atividade de
catação, a proliferação de “vetores”, a presença de animais à procura de alimentos,
o espalhamento de detritos pelo vento ou pelas enxurradas e o surgimento de focos
de fogo e fumaça. O aterro protege também as águas de poços e rios do chorume
que, pode causar sérios problemas à operação do aterro. Este deve ser retirado
através de um sistema de drenos (canaletas abertas sobre camadas de resíduos e
preenchido com pedras britadas ou material similar). Dessa forma, o chorume é
captado e bombeado para cima do aterro.
Em geral, um aterro deve ser utilizado até, no máximo dez anos, alguns
chegam a durar vinte anos, tornando sua implantação mais vantajosa do ponto de
vista econômico. É importante ressaltar que após o fim das atividades do aterro, ao
contrário do que acontece com os lixões, os moradores da vizinhança podem
usufruir de um parque, jardim ou campo de futebol, construídos em cima das últimas
camadas de resíduos, sem que o terreno apresente qualquer risco à saúde dessas
pessoas.
O aterro controlado é mais uma forma de disposição final dos resíduos
sólidos. Esse tipo de aterro é menos prejudicial que os lixões pelo fato de os
resíduos dispostos no solo serem posteriormente cobertos com terra, o que acaba
por reduzir a poluição local. Porém, trata-se de solução com eficácia bem inferior à

2
Líquido malcheiroso, de coloração negra, resultante da decomposição de matéria orgânica.
34

possibilitada pelos aterros sanitários, pois, ao contrário destes, não protege o solo
nem as águas subterrâneas contra possíveis contaminações.
A incineração, processo de queima de resíduos em altas temperaturas,
também se constitui numa forma de destinação final de resíduos, a qual não
consiste em simples queima, pois as temperaturas devem ser muito elevadas para
que os resíduos sejam realmente reduzidos a cinzas. A incineração deve ser
aplicada, principalmente para resíduos hospitalares e/ou contaminados, e suas
cinzas devem ser dispostas em aterros apropriados. Vale destacar que o “volume de
cinza do lixo incinerado é aproximadamente 10% (dez por cento) do volume inicial.”
(BERTÉ, 2004, p.37). Além dessa vantagem, a energia resultante da queima de
resíduos pode ser aproveitada para a geração de eletricidade ou ainda para
movimentar máquinas industriais. A incineração não pode ocorrer de forma irregular,
pois nesse processo há liberação de gases tóxicos, principalmente, originados da
queima de embalagens plásticas.

A primeira instalação de que se tem conhecimento para fim


específico de incineração de resíduos sólidos é a de Nothingham, na
Inglaterra, colocada em operação em 1874. No Brasil, o primeiro
incinerador foi instalado em 1900, em Belém do Pará, cujas
operações foram encerradas no segundo semestre de 1978.
(BERTÉ, 2004, p.38)

Devido ao fato da incineração ser o processo mais seguro para a eliminação


de elementos mais contagiosos, o Ministério do Interior pela Portaria número 053, de
1º de março de 1979, anexo em seu item VI, determinou que:

Todos os resíduos sólidos portadores de agentes patogênicos,


inclusive os de estabelecimentos hospitalares e congêneres, assim
como alimentos e outros produtos de consumo acondicionados e
conduzidos em transporte especial, nas condições estabelecidas
pelo órgão estadual de controle de poluição e de preservação
ambiental, são em seguida obrigatoriamente incinerados.

Em 1991, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), mediante a


resolução nº 06, de 19 de setembro, alterou o item VI daquela portaria em seu
seguinte artigo:
35

Art.2º - Nos Estados e Municípios que optarem por não incinerarem


os resíduos mencionados no art.1º, os órgãos estaduais de meio
ambiente estabelecerão normas para tratamento especial como
condições para licenciar a coleta, o transporte, o acondicionamento
a disposição final.

O processo de incineração possibilita a instalação em áreas pequenas, a


diminuição dos resíduos e conseqüentemente a redução de áreas para depositá-los,
porém, o alto custo de instalação e operação, dificulta a implantação de um
incinerador.
Uma alternativa de redução de resíduos e de reaproveitamento destes que
vem crescendo na atualidade é a reciclagem, “termo utilizado para toda e qualquer
prática que restaure materiais que foram usados e descartados, para obtenção de
produtos que possam ser utilizados” (BERTÉ, 2004, p.39). Reciclar significa
transformar os restos descartados por residências, fábricas, lojas e escritórios em
matéria-prima para a fabricação de outros produtos. Atualmente, a reciclagem é um
processo imensamente explorado em países desenvolvidos, a exemplo do Japão,
Estados Unidos e muitos países da Europa. Este fato está relacionado ao
crescimento econômico, ao desperdício e ao intenso uso de produtos descartáveis.
No Brasil, nos últimos anos, com o crescente uso de embalagens
descartáveis, uma série de produtos como objetos de plástico e latas de alumínio
passou a ser aproveitada comercialmente, com a implantação de programas de
reciclagem. Papel, alumínio, vidro e plástico são os materiais mais utilizados para a
reciclagem. Reciclando-os, reduz a poluição, diminui notavelmente os gastos
energéticos e os custos industriais, além da significativa preservação dos recursos
naturais.

A fabricação de papel reciclado, por exemplo, consome 74% menos


energia e 50% menos água que a produção convencional. Entre
1970 e 1994, a porcentagem de papel reciclado cresceu de 23%
para 37% no mundo inteiro. No Brasil, de sua parte, lidera o ranking
mundial de reciclagem de alumínio. [...]. O processo propicia
extraordinária redução de consumo energético: a fabricação de uma
lata de alumínio a partir de outra lata, por exemplo, requer apenas
5% da energia utilizada para chegar ao produto final desde a
matéria-prima. (Almanaque Abril, 2003, p. 115)
36

Com todas essas vantagens, a reciclagem apresenta-se como um processo


viável para minimizar os problemas ambientais, porém, especialistas alertam para o
fato de que é preciso, primeiramente, reduzir a quantidade de resíduos. Fala-se nos
“três erres”: redução, reutilização e reciclagem. O primeiro é realizado por meio do
consumo consciente; o segundo, pelo reaproveitamento de materiais que possam
ser novamente utilizados; e o terceiro, pelo reenvio dos resíduos ao processo
produtivo, para a fabricação de novos produtos.

1.4 IMPACTOS DOS RESÍDUOS SÓLIDOS EM AMBIENTES URBANOS

A crescente produção de resíduos sólidos urbanos, e consequentemente o


gerenciamento inadequado destes são responsáveis por uma série de impactos que
repercute, tanto no ambiente, quanto na sociedade. São muitos os agentes físicos,
químicos e biológicos presentes nos resíduos municipais e nos processos dos
sistemas do seu gerenciamento, capazes de interferir no equilíbrio socioambiental.

Os impactos provocados pelos resíduos sólidos municipais podem


estender-se para a população em geral, por meio da poluição e
contaminação dos corpos d’água e dos lençóis subterrâneos, direta
ou indiretamente, dependendo do uso da água e da absorção de
material tóxico ou contaminado. A população em geral está ainda
exposta ao consumo de carne de animais criados nos vazadores e
que podem ser causadores de da transmissão de doenças ao ser
humano. Estima-se que mais de cinco milhões de pessoas morrem
por ano, no mundo inteiro, devido a enfermidades relacionadas com
resíduos (MACHADO e FILHO, 1999. apud: ANJOS e FERREIRA,
2001, p. 691).

Alguns agentes físicos comuns nas atividades com resíduos podem provocar
efeitos muito negativos nas pessoas que mantém contato com equipamentos de
coleta ou de sistemas de gerenciamento de manuseio, transporte e destino final. A
poeira, por exemplo, pode ser responsável por desconforto, irritação dos olhos e por
problemas respiratórios; o mau cheiro pode causar mal estar, dores de cabeça e
náuseas, principalmente nos trabalhadores da limpeza pública e catadores; e ruídos
em excesso, a depender da intensidade, pode promover a perda parcial ou
permanente da audição, causar cefaléia, dentre outros problemas. “Responsáveis
por ferimentos e cortes nos trabalhadores da limpeza urbana, os objetos
37

perfurocortantes e cortantes são sempre apontados entre os principais agentes de


riscos nos resíduos sólidos” (ANJOS e FERREIRA, 2001, p.692).
Dentre outros tipos, pode ser encontrada nos resíduos sólidos urbanos, uma
grande variedade de resíduos químicos, como: produtos de limpeza, cosméticos,
pilhas e baterias, tintas, pesticidas e remédios. Resíduos desse tipo precisam de
cuidados especiais, não podem ser depositados em qualquer lugar, pois alguns
desses são classificados como perigosos, e podem ter efeitos irreversíveis à saúde
e ao ambiente, a exemplo do fato que aconteceu nos Estados Unidos, na região das
Cataratas de Niágara

Durante a década de 1950, numa área conhecida como “Love


Chanel” ou “Canal do Amor”, foram depositadas mais de 22 mil
toneladas de resíduos químicos. Com o crescimento da cidade, o
canal foi aterrando, e ali foi construída uma escola. Posteriormente
vários bairros residenciais surgiram ao seu redor. Anos depois
começaram a aparecer correntezas de lodo negro e bolhas que
explodiam soltando fumaça no chão, o que despertou a atenção dos
moradores. Ao mesmo tempo, estranhas doenças passaram a atingir
principalmente as crianças, que frequentavam a escola, além de
surgirem casos de recém-nascidos, que apresentavam graves
anomalias. Assim o Canal do Amor foi transformado em um
verdadeiro “Vale da Morte”, em razão do descuido e da
irresponsabilidade dos industriais e dos loteadores do terreno
(RODRIGUES e CAVINATO, 2003, p. 21).

Encontram-se também nos resíduos sólidos os agentes biológicos que podem


ser responsáveis pela transmissão direta e indireta de doenças. Conforme Anjos e
Ferreira (2001), a transmissão indireta se dá pelos vetores que encontram nos
resíduos condições adequadas de sobrevivência e proliferação. Porém, as pessoas
que lidam diretamente com os resíduos podem ter sua saúde comprometida, através
do contato com lenços de papel, absorventes, fraldas descartáveis, papel higiênico,
camisinhas, descartados pela população, e principalmente pelos resíduos dos
serviços de saúde misturados aos resíduos domiciliares.
Embora tenham sido tomadas algumas medidas referentes à gestão dos
resíduos sólidos, o lançamento destes resíduos no ambiente mantém-se como
prática comum, e os problemas decorrentes dos mesmos vêm aumentando
significativamente. Além da poluição visual, do ar e do solo, muitos “lixões”
38

encontram-se à beira de cursos d’ água, ou nos próprios, provocando fortes


impactos, e dessa forma, rompendo o equilíbrio socioambiental.

1.4.1 Populações expostas aos resíduos sólidos urbanos

Muitas são as pessoas que se expõem aos efeitos diretos ou indiretos do


gerenciamento inadequado dos resíduos sólidos urbanos, mas há dificuldade na
definição das populações expostas. Segundo Anjos e Ferreira (2001) “está no fato
de os sistemas de informação e monitoramento sobre saúde e meio ambiente não
contemplarem, em geral, o aspecto coletivo das populações, não dispondo de dados
epidemiológicos suficientes e confiáveis”. Apesar disso, é possível identificar
algumas populações suscetíveis de serem afetadas pelos problemas ambientais,
resultantes do gerenciamento de resíduos sólidos urbanos.

A primeira população a ser considerada é aquela que não dispõe de


coleta domiciliar regular e que, ao se desfazer dos resíduos
produzidos, lançando-os no entorno da área em que vive, gera um
meio ambiente deteriorado com a presença de fumaça, mau cheiro,
vetores transmissores de doenças, animais que se alimentam dos
restos, numa convivência promíscua e deletéria para a saúde
(RUBERG e PHILIPPI,1999. apud: Ferreira e Anjos, 2001, p.691).

Geralmente, a população mencionada se constitui na parcela pobre da


sociedade, que vive em áreas onde os serviços de saneamento básico são
precários. No entanto, os riscos podem se estender às populações mais próximas,
nem sempre de classe baixa, através do mau cheiro, da fumaça, da mobilidade de
insetos e outros vetores, como também através dos resíduos arrastados pelas
chuvas fortes, e dessa forma, propiciando condições favoráveis a epidemias, a
exemplo da leptospirose e dengue.
Outra população sujeita à exposição aos resíduos sólidos urbanos são as de
moradores das vizinhanças das unidades de tratamento e destinação de tais
resíduos, pois o mau cheiro está sempre presente quando se manuseiam grandes
quantidades de resíduos domiciliares, devido ao processo de decomposição da
matéria orgânica. “Na maioria das cidades da América Latina a situação se agrava
pelo fato de os resíduos sólidos municipais serem dispostos no solo, de forma
39

inadequada, em vazadouros a céu aberto (lixões) (CETESB, 1998. apud: Ferreira e


Anjos, 2001). Esses espaços atraem pessoas de baixa renda, que os utilizam como
fonte de meios de sobrevivência, constituindo uma população bastante exposta, pela
total ausência de saneamento básico. Uma parcela dessa população constitui o
grupo dos chamados catadores, que sofrem os incômodos do mau cheiro, os efeitos
da poluição e contaminação, e convive com a presença de vetores. Além de serem
afetados, os catadores podem servir como transmissores de doenças, atingindo as
pessoas com quem convivem como revelam Anjos e Ferreira

Ao remexerem os resíduos vazados à procura de materiais que


possam ser comercializados ou servir de alimentos, os catadores
estão expostos a todos os tipos de risco à sua integridade física por
acidentes causados pelo manuseio dos mesmos e pela própria
operação do vazadouro. Esta população, que normalmente vive
próxima aos vazadouros, serve de vetor para a propagação de
doenças originadas dos impactos dos resíduos, uma vez que parte da
mesma trabalha em outras localidades, podendo transmitir doenças
para pessoas com quem mantém contato (ANJOS e FERREIRA, 2001,
p.691).

Fazendo parte das populações expostas estão os trabalhadores, envolvidos


diretamente com a coleta, transporte e destinação final dos resíduos sólidos
urbanos. A exposição pode ocorrer por diversos motivos, dentre os quais, vale
destacar a falta de condições adequadas de trabalho, os riscos de acidentes
provocados pela falta de treinamento e, principalmente, os riscos de contaminação
pelo contato direto com os resíduos.
A partir do exposto, conclui-se que os resíduos sólidos urbanos, de modo
geral, representam um grande problema na atualidade. De certa forma, os resíduos
sólidos existem pela própria necessidade de consumo de bens materiais, inerente à
sobrevivência humana, mas sua produção e acumulação em larga escala são
histórica e geograficamente situadas, e fazem parte do sistema econômico vigente,
que impõe a exploração dos recursos naturais, muito além da capacidade de
reposição e assimilação dos dejetos nos ecossistemas. Porém medidas eficazes
precisam ser tomadas, no sentido de gerir corretamente os resíduos, pois a gestão
inadequada ainda prevalece em nossa sociedade, provocando uma série de
problemas socioambientais que poderiam ser evitados.
40

2 PIRIPÁ: ESPAÇO URBANO E MEIO AMBIENTE

2.1 CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL E ESPAÇO URBANO

Piripá é um município do Estado da Bahia, localizado na mesorregião Centro


Sul-Baiano e microrregião de Brumado. Embora faça parte da região econômica da
Serra Geral, encontra-se fortemente ligado ao município de Vitória da Conquista
(localizado na região Sudoeste da Bahia), principalmente nos setores de comércio,
educação e saúde. Limita-se com os municípios de Cordeiros, Condeúba,
Presidente Jânio Quadros, Tremedal e Ninheira (Estado de Minas Gerais). Possui
uma área de 651 Km² e encontra-se a 630 km de Salvador, com as seguintes
coordenadas geográficas: latitude – 14º 93’ S e longitude – 41º 72’ W, conforme
Figura 01, cuja altitude é de 618 m em relação ao nível do mar (IBGE, 2000).
Segundo o Censo 2000 do IBGE, o município apresenta uma população total
de 16.128 habitantes, dos quais 5.248 vivem na área urbana. Neste aspecto, algo
digno de nota é o fato de que, conforme Contagem da População 2007, esta cai
para 13.515 habitantes, sendo 6.932 na zona rural e 6.583 na zona urbana,
conforme Tabela 01. Esses dados mostram um considerável aumento da população
urbana, porém ocorre exatamente o contrário em relação à rural, uma vez que houve
um significativo decréscimo da população total, se comparado ao ano 2000. A
densidade demográfica do município é de 24,7 hab/km² e a taxa de urbanização, de
48,7 % (IBGE, 2007).

Tabela 01 - População do município de Piripá - 1970/2007


1970 1980 1991 2000 2007
Urbana 793 1.910 3.478 5.248 6.583
Rural 7.218 8.119 6.938 10.880 6.932
População total 8.011 10.029 10.416 16.128 13.515
Fonte: IBGE, Censos Demográficos, 1970, 1980, 1991, 2000 e Contagem da
População, 2007.

O município apresenta clima dos tipos semi-árido e subúmido a seco, com


temperatura média anual de 21,7º (máxima de 28º e mínima de 17º); encontra-se
numa área de Contato Caatinga/Floresta Estacional e de Contato Cerrado/Floresta
Estacional; e o relevo compreende os Patamares do Médio Rio de Contas,
41

Pediplano do Alto Rio Pardo e Planaltos dos Geraizinhos. A região onde o município
se localiza apresenta uma litologia variada, com os principais tipos de solos:
Latossolos Amarelos, Solos Litólicos e Areias Quartzosas. Com relação à
hidrografia, faz parte da Bacia Hidrográfica do Rio de Contas, sendo o município
banhado pelos rios Canabrava e Gavião.

FIGURA 01 - Localização do Município de Piripá - Bahia


14°12'S
Brasil:
Localização da Bahia
70° W 60° W 50° W 40° W

10° S

14°36'S
20° S
0 1150 km

Escala Aprox.
30° S

15°00'S
Bahia:
Localização da Região de Serra Geral

46° W 42° W 38° W

10° S

15°24'S
14° S

0 270 km

Escala Aprox.
0 16 32 km 18° S

Escala

15°48'S
43°36'W 43°12'W 42°36'W 42°12'W 41°36'W

Município de Piripá Fonte: Base Cartográfica Digital do IBGE, 2008. Elaboração: Ismaily Cunha, 2009.

No que se refere à história do município, em meados do século XIX, fugindo


de Portugal, o capitão Cazuza Marinho foi para São Paulo. Após sair desta cidade
sem destino, chega à Fazenda da Ressaca, (atual povoado de Piripá). Neste local
comprou um pequeno terreno, e para trabalhar, começou a atuar na região como
mercador ambulante, da Ressaca para Candial (Cordeiros) e Barra (Condeúba).
Pouco tempo depois, passou a morar em Condeúba, onde se casou e constituiu
42

família. Após sua morte, dois dos seus filhos, Augusto e José Marinho foram tomar
conta do terreno que havia comprado, tornando-se também mercadores.
Conta-se que em suas viagens da Ressaca para Condeúba, sempre paravam
para descansar com suas tropas embaixo de uma árvore, hoje território piripaense.
Numa de suas viagens, dormiram no local e acabaram perdendo a feira, surge então
a idéia de realizarem-na ali mesmo, e assim o fizera. Estava plantada a semente, e a
partir deste momento, Piripá começa a “germinar”. A feira atraía um grande número
de pessoas, e por esse motivo, tempos depois a árvore já não fazia mais sombra
para tanta gente, o que resultou na construção de um barracão, onde hoje é o
Mercado Municipal.
O desenvolvimento do comércio impulsionou a construção das primeiras
residências e a atração de moradores, fato que justifica o surgimento das cidades.
Além da atividade comercial, por volta de 1917, Augusto e José Marinho, atraídos
pela fertilidade das terras e pela existência do riacho Cana Brava, aí se fixaram com
o cultivo da cana-de-açúcar, e deram ao local o nome de Cabeça da Vaca. A imensa
produção de cana-de-açúcar impulsionou o surgimento de vários engenhos e em
poucos anos já existia um povoado chamado Lagoa da Tabua.
Em decorrência do crescente desenvolvimento do povoado, em 1926, já com
o nome Piripá, foi elevado à condição de distrito de Condeúba. Segundo
informações dos moradores mais antigos, a partir desta época, muitas foram as
tentativas para que o distrito tornasse município, o que aconteceu em 31 de julho de
1962, com a sua emancipação. Seu primeiro prefeito foi o Sr. Benjamim da Rocha
Castro. O nome Piripá é originário do vocábulo indígena Tupi: piri-ypá, que significa
lagoa do junco ou dos piris. A partir da emancipação, as características urbanas se
intensificaram no território piripaense.
Atualmente, o espaço urbano do município possui aproximadamente 1.800
domicílios. Embora não apresente grande dimensão territorial, encontra-se dividido
em localidades popularmente conhecidas como bairros, que são: Centro, Bairro
Novo, Alto do Campo, Horizonte Azul, além do Conjunto Habitacional Casas
Populares e do Loteamento Califórnia (de formação recente), mais conhecido como
Bairro Califórnia, conforme Figura 2.
43

Figura 02: Planta urbana de Piripá-BA - Delimitação aproximada dos bairros,


2009.
Fonte: Base Cartográfica da Prefeitura Municipal de Piripá, escala de 1:10.000 no original, 2006.
Org: Ana Célia C. Rocha; Ismaily Cunha, 2009.

Piripá é uma cidade tranqüila, apresentando um ruído contínuo, formado por


inúmeros sons diferentes, que é comum a todas as cidades, variando apenas de
intensidade. De modo geral, os moradores já estão tão acostumados com esse tipo
de ruído, que nem se quer o percebem. No entanto, não se pode ignorar os sons
provenientes de carros e/ou bares, sendo mais comuns em dias festivos.
Em relação ao ar, também não se verifica problemas, fato que pode ser
atribuído a quase inexistência de fábricas – as grandes poluidoras das cidades – e à
quantidade de veículos, que não chega a impactar o espaço urbano, pelo menos
visualmente.
Quanto à pavimentação, vale ressaltar que a situação não é tão agradável,
uma vez que há na cidade uma quantidade considerável de ruas não pavimentadas,
representando certo desconforto para a população, pois favorece a liberação de
poeira, e no período chuvoso, forma lamaceiro e intensifica a erosão que, em
algumas localidades chega a dificultar o tráfego de carros e motos, e também a
circulação de pessoas.
44

E no que se refere à arborização, pode-se dizer que a cidade apresenta-se


razoavelmente arborizada, possuindo árvores de pequeno, médio e grande porte,
porém não são bem distribuídas na cidade. Neste caso a ampliação seria
importante, pois além da função paisagística, a arborização urbana proporciona
diversos benefícios à população como sombreamento e ventilação purificação do ar,
diminuição do impacto das chuvas, ambientação a pássaros, dentre outros. Por tudo
isso, a arborização é essencial a qualquer planejamento urbano.

2.2 PRINCIPAIS PROBLEMAS AMBIENTAIS URBANOS

Em relação aos problemas ambientais da cidade de Piripá, vale ressaltar que


os dados aqui expostos referem-se à pesquisa realizada por Rocha (2006), já que o
presente trabalho se constitui numa extensão da monografia do Curso de
Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB),
que objetivou pesquisar e analisar os principais problemas ambientais da cidade.
A análise da questão ambiental da cidade de Piripá, e mais precisamente dos
problemas ambientais, permite conhecer sua ecologia, bem como as percepções
dos moradores sobre o acesso e a qualidade dos serviços urbanos prestados. Os
dados obtidos mostram que os moradores se queixam principalmente da
insuficiência de rede de esgotos, da questão do “lixo”, do déficit de pavimentação e
da irregularidade do abastecimento de água, o que revela as precárias condições de
saneamento básico da cidade.
No que se refere aos principais problemas ambientais da cidade, 85,8% dos
pesquisados consideram que o problema do esgoto é o mais relevante. Na
seqüência, vem os problemas dos resíduos sólidos, com 62,5%, seguido da erosão
do solo com 25,8%, e 14,1% sobre a poluição da água, conforme Gráfico 01. As
pessoas que consideram outros os problemas ambientais da cidade correspondem a
12,5%, os quais são: entupimento da rede de esgotos, falta de lixeiras, falta de
pavimentação e poluição sonora.
45

Quanto ao entupimento da rede de esgotos, os moradores dizem que se


sentem incomodados pelo forte mau cheiro. A falta de coletores de resíduos sólidos
em algumas localidades é justificada como problema ambiental, na medida em que
os detritos são espalhados por animais, atraindo insetos e/ou roedores, provocando
mau cheiro.
Houve quem reclamasse de poluição sonora, devido aos sons altos de bares
no período noturno, inclusive em horários que os moradores, geralmente estão
dormindo. Esse tipo de poluição constitui um problema ambiental, pois provoca
irritação, atrapalha o sono e causa dor de cabeça. Neste contexto, é importante
destacar que a poluição do ar, embora exista em pequenas proporções, não
constitui um problema ambiental da cidade. Apesar da existência dos problemas
mencionados, há quem não os percebem, pois alguns moradores disseram que a
cidade não apresenta problemas ambientais.
Os problemas ambientais existentes na cidade afetam, principalmente, os
habitantes das áreas afastadas do centro, onde praticamente não há saneamento
básico, comprometendo a qualidade de vida dos moradores, a exemplo dos que
habitam o loteamento conhecido como “bairro Horizonte Azul”. Neste, as ruas não
são pavimentadas, não existe rede de esgotos, o abastecimento de água é precário,
46

nem todas as ruas são iluminadas, a coleta dos resíduos sólidos é realizada apenas
uma vez por semana e não existe arborização. Além disso, parte do loteamento
encontra-se numa área de alta umidade, como retrata a Foto 01.

Ana Célia Carvalho Rocha


Foto 01 - Umidade do solo no bairro Horizonte Azul, 2006

No período chuvoso, os problemas ambientais se agravam. O processo


erosivo se intensifica, carregando muita sujeira das áreas íngremes para as áreas
baixas da cidade, onde as ruas são pavimentadas. Para o secretário de Agricultura e
Meio Ambiente Nivaldo Oliveira Castro, o transporte de materiais associado à falta
de pavimentação é um grande problema da cidade. Quando chove forte, ocasiona o
alagamento de ruas e casas, sendo também comum a obstrução de alguns pontos
da rede de esgotos. Isso devido à inexistência da rede de drenagem na cidade. A
Pesquisa Nacional de Saneamento (2000), revela que a existência dos serviços de
drenagem varia de acordo o tamanho da população.

As diferenças entre os municípios de pequeno e grande porte, no


que se refere aos serviços de drenagem urbana, têm explicações.
Uma delas, e talvez a principal, é a falta de recursos enfrentada
pelos municípios pequenos que têm que priorizar investimentos
diante de pequenos orçamentos. (PNSB, 2000).
47

Em relação à água que abastece a cidade de Piripá, esta vem do rio Cana
Brava, e é distribuída à população pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento
S/A (Embasa). Conforme a gerente da Embasa de Piripá, Andréia Almeida Silva, a
água do manancial apresenta alto teor de ferro, mas a correção é feita com o uso de
produtos químicos, tornando-a potável. E acrescenta que, depois de tratada, a água
não oferece riscos à população, apresentando a média de 98,9%, referente ao
Índice de Qualidade da Água (IQA), sendo o teste de qualidade realizado duas
vezes por semana no laboratório da Embasa, em Vitória da Conquista.
Muitos moradores reclamam do odor, cor e sabor da água que chega às suas
residências. Para eles, o odor muito forte e o gosto desagradável podem ser
provocados pelo uso de produtos químicos, o que é confirmado pela funcionária da
Embasa. A cor amarelada pode ser atribuída à sujeira presente na rede hídrica, pois
após algum tempo no reservatório, a água torna-se límpida.
A pesquisa revela que 100% das residências são atendidas pelo
abastecimento de água, no entanto, os moradores reclamam da existência de
problemas em relação a esse serviço, o que é explicitado por 41,6% dos mesmos,
revelando que o maior problema enfrentado em relação à água é o “abastecimento
insuficiente”, enquanto que 37,5% dizem não perceber problemas. Para 6,6%, o
problema enfrentado é a “poluição” e 18,3% dizem conviver com outros problemas
no que se refere à água que chega as suas residências. Como aponta o Gráfico 02.

%
48

A insuficiência no abastecimento afeta principalmente as pessoas que


residem nas áreas periféricas (afastadas da área central), ou nas áreas mais altas
da cidade, como as residentes nas localidades popularmente conhecidas como
bairros Horizonte Azul e Alto do Campo. Estas enfrentam a falta de água em algum
período do dia, chegando a ficar até dois dias com suas torneiras vazias, apesar de
pagarem pelo serviço prestado. As famílias de menor renda explicitam a dificuldade
no enfrentamento desse problema, pois suas condições precárias não permitem o
acesso a reservatórios como tambores e/ou caixa d’água.
É importante destacar que a Embasa implantou o sistema de racionamento na
cidade, há três anos, para que pudesse garantir o fornecimento de água a toda a
população, como uma solução para enfrentar os déficits no período em que a
capacidade do reservatório diminui. A empresa atribui a falta d’água da qual os
moradores se queixam a este racionamento, o que não justifica, uma vez que o
mesmo tem duração de apenas 4:30h (quatro horas e trinta minutos) por dia. No que
concerne aos aspectos diretamente relacionados ao consumo, como melhorar a
qualidade e garantir o abastecimento, percebe-se diferença entre os moradores.
Enquanto que alguns enfatizam a questão da qualidade da água; outros, priorizam a
quantidade.
Quanto ao esgoto, este aparece como principal problema ambiental da
cidade, sendo enfatizada a insuficiência da rede e a falta de tratamento. Quando
consultadas a respeito do destino do esgoto da sua residência, 67,5% das pessoas
pesquisadas responderam rede de esgotos, 27,5% disseram que o esgoto não é
canalizado, ficando este a céu aberto, e apenas 5% responderam outro, que
corresponde ao despejo direto em lagoa ou rio. Fato que merece destaque é a
existência de fossas, para o recebimento dos dejetos provenientes dos banheiros,
em quase todas as residências não atendidas pela rede de esgotos, o que ameniza
em parte o problema, já que o esgoto da cidade não é tratado.
Embora a maioria das residências seja atendida pela rede de esgotos, esta
apresenta problemas. São constantes os entupimentos, que podem ser atribuídos às
canalizações inadequadas; ao recebimento de resíduos sólidos, sendo que a rede
só deve conduzir substâncias líquidas; ou ainda, à falta de locais para escoamento
das águas pluviais, as quais acabam ocupando a rede de esgotos e causando
transtornos aos usuários do sistema.
49

A grande insatisfação dos moradores quanto ao serviço de esgoto da cidade,


em parte está relacionada ao esgoto a céu aberto, conforme mostra a Foto 02.
Neste caso, além do risco de contaminação, atrai insetos e exala mau cheiro.
Todavia, o que mais preocupa a população é o seu destino final, ou seja, o
lançamento do esgoto sem nenhum tratamento na Lagoa da Tabua, e
principalmente, no rio Cana Brava (Foto 03). O trecho deste rio que atravessa a
cidade encontra-se totalmente poluído, estendendo toda a poluição ao rio Gavião, do
qual é afluente. A contaminação de ambos representa grande perigo às pessoas que
utilizam suas águas para usos diversos, estando sujeitas a vários tipos de doenças,
a exemplo da esquistossomose.
Ana Célia Carvalho Rocha

Ana Célia Carvalho Rocha


Foto 02 - Esgoto a céu aberto no bairro Novo, Foto 03 – Rio Cana Brava – Principal receptor
2006 do esgoto da cidade de Piripá-BA, 2006

Em entrevista realizada com o prefeito do município, no dia 29/11/2006,


quando questionado a respeito da destinação final do esgoto ele confirma que o
esgoto é canalizado para o Rio Cana Brava, e menciona a existência de uma
Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), segundo ele, um investimento feito pelo
prefeito da gestão anterior, mas que não funciona, o que confirma o mau uso do
dinheiro público – uma prática comum em nosso país – e o descaso em relação ao
meio ambiente. Sobre isso, o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) destaca
que o problema não é a falta de recursos e de tecnologia, mas de vontade política.
A Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) mencionada pelo atual prefeito
realmente existe, e funcionou por um tempo, mas foi desativada. Hoje, a obra
encontra-se inutilizada e em estado de abandono, conforme Fotos 04 e 05. É
50

inadmissível o pagamento de um serviço do qual a população não usufrui. Neste


sentido, enquanto as providências necessárias não forem tomadas, o rio Cana Brava
continuará sendo degradado, comprometendo a qualidade de vida da população.

Ana Célia Carvalho Rocha

Ana Célia carvalho Rocha


Fotos 04 e 05 – Estação de Tratamento de Esgotos desativada na cidade de Piripá-BA, 2006

De acordo com a pesquisa, a questão dos resíduos sólidos aparece como um


dos principais problemas ambientais da cidade, porém as reclamações dos
moradores não dizem respeito à existência destes em ruas e praças, uma vez que
quase 100% da população têm acesso ao serviço de coleta.
Quando consultadas a respeito do destino final dos resíduos de suas
residências, 56,7% responderam “lixão” e 2,5%, “terreno baldio”. As que não
souberam, correspondem a 40,8% (Gráfico 03), uma parcela significativa, o que
confirma a falta de interesse das pessoas no que se refere à questão ambiental.

%
51

O aspecto principal no que se refere aos resíduos sólidos é a sua destinação


final, pois os mesmos são depositados em um “lixão”, que serve de ambiente à
proliferação de moscas, baratas, ratos e urubus. O problema maior está na
contaminação do solo e da água subterrânea. Este fato constitui realidade em Piripá,
assim como em muitos municípios do país, pois conforme a PNSB, 63,3% dos
municípios brasileiros depositam seus resíduos em lixões. Portanto, algo precisa ser
feito no sentido de reverter tal a situação.
A erosão é vista pelos habitantes como um dos problemas ambientais da
cidade, e está diretamente relacionada à falta de pavimentação, que atinge metade
dos pesquisados, conforme Tabela 02. Segundo os quais, as ruas não
pavimentadas representam certo desconforto, uma vez que favorece a liberação de
poeira, e no período chuvoso forma lamaceiro e intensifica a erosão, que chega a
dificultar ou impossibilitar o tráfego de carros e motos, além de dificultar a circulação
de pessoas.

Tabela 02 - Percentual de ruas pavimentadas na cidade de Piripá-BA, 2006

Pavimentação %
Ruas pavimentadas 50
Ruas não pavimentadas 50
Total 100
Fonte: Pesquisa de campo, setembro e outubro de 2006.

O crescimento urbano contribui para acelerar a erosão do solo na cidade, pois


o processo de urbanização ainda está em desenvolvimento. Atualmente, é grande o
número de áreas não pavimentadas atingidas pelo processo erosivo, o qual afeta
principalmente as mais inclinadas, a exemplo do “bairro Alto do Campo”, como se
observa na Foto 06. Neste contexto, não se pode desconsiderar os desmatamentos
no perímetro urbano que deixa o solo desprotegido e provoca erosão. Outras áreas
como “bairro Novo”, “bairro Casas Populares” e “bairro Horizonte Azul” também
apresentam esse problema.
52

Ana Célia Carvalho Rocha


Foto 06 – Erosão do solo no bairro Alto do Campo, 2006

A partir da pesquisa, constatou-se que a maioria da população atribui a


responsabilidade pelos problemas ambientais aos gestores públicos e à sociedade.
Assim sendo, o poder público, em parceria com a sociedade, deve elaborar projetos
com o objetivo de tentar reverter a situação atual, sendo também papel da
sociedade, cobrar e fiscalizar os serviços públicos, bem como agir de forma
consciente para que não venha a degradar o seu próprio espaço. Entretanto, no que
se refere ao enfrentamento e resolução dos problemas, o governo é visto
indiscutivelmente como o principal responsável. Isso indica que, apesar dos
cidadãos terem de exercer seu papel, as autoridades públicas são as que devem
liderar o processo.
53

3 GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CIDADE DE PIRIPÁ-BA

3.1. A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO ÂMBITO DA


ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUNICIPAL

O desenvolvimento do assunto aqui proposto baseou-se nas informações


colhidas na pesquisa de campo relacionando-as com questões mais gerais sobre a
gestão dos resíduos sólidos urbanos no contexto brasileiro.
A gestão dos resíduos sólidos urbanos do município de Piripá-BA é realizada
pela Administração Pública Municipal através dos seguintes serviços: coleta,
transporte e destinação final de resíduos. Estes se constituem em medidas básicas,
existindo pela própria necessidade do espaço urbano, já que não possui na cidade
um plano sistemático a ser seguido. Piripá, assim como muitos municípios
brasileiros, responde pelo gerenciamento de todos os tipos de resíduos sólidos
produzidos na cidade. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
realizada pelo IBGE, a gestão da limpeza urbana e dos resíduos sólidos, inclusive os
provenientes dos estabelecimentos de serviços de saúde, é de responsabilidade dos
municípios (PNSB, 2000).
Os recursos utilizados para a gestão dos resíduos são do próprio município,
onde “os sistemas de limpeza urbana são construídos essencialmente de serviços,
os quais necessitam para sua operação, do pleno engajamento da administração
municipal, garantindo um fluxo de recursos permanente para sua realização” (Atlas
do Saneamento, 2004).
Segundo Jeová Barbosa Gonçalves, prefeito da gestão 2004/2008, não há
um valor exato do gasto com tal serviço, uma vez que este é realizado de forma
desordenada, mas acredita que deve ser de, no máximo, 3% do orçamento público,
porcentagem que considera insuficiente, e argumenta dizendo: “para uma medida de
impacto no primeiro ano, deveria ter um investimento maior, teria que ser investido
3
no mínimo 10%, e com manutenção, eu acho que os 3% daria” . Neste aspecto,
nota-se uma aproximação com a média nacional, pois conforme exposto no capítulo
I, a PNSB 2000 revelou que do percentual do orçamento municipal destinado à
limpeza urbana, na grande maioria dos municípios com população abaixo de 50 000

3
Informações fornecidas pelo ex-prefeito Jeová Barbosa Gonçalves, em 30/12/2008.
54

habitantes, 5% no máximo, é destinado à gestão de resíduos sólidos por parte da


administração municipal.
Conforme informação do Secretário de Infra-estrutura, Gil César da Silva
Santos, não é feito nenhum tipo de registro em relação à coleta de “lixo” nem
qualquer estudo dentro dessa área para aprimoramento do sistema, o que evidencia
a inexistência de planejamento para execução desse serviço.
No que se refere ao transporte, o município conta com apenas dois veículos,
uma caçamba e um trator acoplado a uma carroceria, dos quais, somente o trator é
de propriedade da Prefeitura, o outro é particular, ou seja, do próprio motorista,
sendo relevante mencionar o fato destes veículos não serem apropriados para tal
serviço. Levando-se em conta a demanda no que tange ao serviço de coleta e
transporte de resíduos urbanos, o número de veículos é insuficiente. A secretaria de
Infra-estrutura informa que o trator é utilizado, principalmente, para realizar o serviço
de coleta nos lugares de difícil acesso.
Segundo o ex-prefeito Jeová Barbosa, a gestão dos resíduos sólidos urbanos
é realizada conforme as exigências do Ministério Público, e referindo-se mais
precisamente à destinação final destes, diz que

Aqui, a gente trabalha de acordo o Ministério público orienta. Prá


começo, o Ministério exigia que tivesse um aterro sanitário, [...] como
determinam as leis. Como os aterros são de responsabilidade do
governo Estadual e Federal, aí fica nesse impasse, a prefeitura
pressiona o Estado, o Estado pressiona a União, e acaba que todos
os municípios se esbarram nisso. O Ministério Público orientou um
aterro provisório, que a gente fez [...]. (informação verbal) 4

Neste sentido, no que se refere à realização dos serviços públicos, a


Constituição de 1988 procurou romper com a centralização, típica do período
anterior, dando mais autonomia financeira aos Estados e municípios. No entanto,
conforme Carlos e Lemos,

Apesar dos avanços que a nova Constituição trouxe, deve ser notado
que, segundo a ótica da distribuição de competências, foi ampliado o
rol das competências concorrentes entre as três esferas de governo.
Assim, grande parte das políticas públicas, principalmente sociais,
acabam não sendo efetivadas e enfrentadas, pois a competência

4
Informações fornecidas pelo ex-prefeito Jeová Barbosa, em 30/12/2008.
55

concorrente “empurra” os problemas de uma instância à outra,


faltando clareza em relação a qual instância deve realmente assumí-
la (CARLOS e LEMOS, 2005, p. 235-236).

A administração municipal se responsabiliza pela gestão dos resíduos


domiciliares, públicos, comerciais, hospitalares, bem como pela remoção de
entulhos. Quanto ao volume médio de resíduos produzidos diariamente, segundo o
Secretário de Infra-estrutura, a cidade produz em torno de 5 mil quilos por dia. Vale
ressaltar que não é possível confirmar este dado, pois os resíduos não são pesados,
sendo a prática de pesagem mais comum nos municípios de maior porte; nos
menores, normalmente a quantidade é baseada no número de viagens realizadas
pelos veículos de coleta ao local de deposição. Conforme Pesquisa Nacional de
Saneamento Básico,

Apenas 8,4%, dos municípios, em número, pesam efetivamente em


balanças o lixo coletado. Todavia, 64,7% do lixo urbano no Brasil é
pesado, na medida em que as grandes cidades, que geram a maior
parcela da produção de lixo, dispõem deste equipamento de
medição. Sem pesagem, a quantidade de lixo coletada é estimada,
[...] (PNSB, 2000).

O município conta com os serviços de varrição, capina, coleta e transporte


dos resíduos sólidos. Conforme informação da Secretaria de Infra-estrutura, para o
serviço de limpeza urbana, a prefeitura dispõe de 30 servidores, que exercem
diferentes funções (varredor, coletador, capinador, motorista e fiscal), dos quais 21
são efetivos e 9 contratados, como mostra a Tabela 03.

Tabela 03 - Quadro de servidores da limpeza pública da cidade de


Piripá-BA, por tipo de serviço e vínculo empregatício, 2009.

Servidores Efetivos Contratados


Varredores 10 4
Coletadores 6 1
Motoristas 2 1
Capinadores 1 1
Fiscais 2 0
Total 21 9
Fonte: Pesquisa de campo, janeiro de 2009.
56

Através da tabela, vê-se que dentre as funções exercidas pelo pessoal que
atua no gerenciamento dos resíduos na cidade, a de varredor apresenta maior
número de servidores, seguida das funções de coletador, motorista, capinador e
fiscal, apresentando situação semelhante à registrada na Pesquisa Nacional
realizada pelo (SNIS), pois “as taxas no serviço de varrição sempre são as maiores,
seguidas do serviço de coleta e por último o serviço de capina” (Diagnóstico do
Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos, 2008, p.70).
Tratando-se especificamente do serviço de varrição que acontece somente
nas ruas pavimentadas, fica sob responsabilidade dos próprios moradores a limpeza
das demais, o que provoca certa insatisfação de uma parcela significativa da
população, pois conforme Rocha (2006) apenas 50% das ruas da cidade são
pavimentadas (ver tabela 02, p. 52).
Um aspecto que merece destaque é a limpeza das ruas e praças,
principalmente no centro da cidade, onde o serviço de varrição é realizado
diariamente, que é uma das atividades mais visíveis da limpeza urbana, como se
observa nas Fotos 07 e 08. Para manter a limpeza na praça principal, a prefeitura
distribuiu uma quantidade significativa de pequenas lixeiras e destinou um dos
servidores da limpeza pública para esta função, o qual presta seu serviço
exclusivamente nesta área.

Ana Célia Carvalho Rocha


Ana Célia Carvalho Rocha

Foto 07 e 08 – Praça da Bandeira, Piripá-BA, 2009

O tipo de lixeiras distribuído na cidade varia de acordo à localidade, as lixeiras


menores aparecem nas praças e áreas residenciais, enquanto que as maiores
encontram-se, principalmente, nas áreas comerciais, em alguns pontos onde não se
57

observa as menores e também nas proximidades de escolas, como mostra as fotos


09 e 10.

Ana Célia Carvalho Rocha

Ana Célia Carvalho Rocha


Fotos 09 e 10 – Tipos de lixeiras públicas existentes na cidade de Piripá-BA, 2009

Vale destacar que tais lixeiras não são igualmente distribuídas no espaço
urbano, e as existentes nem sempre são adequadamente utilizadas pela população,
que deposita seus resíduos domiciliares, muitas vezes, desembalados, dificultando a
coleta e favorecendo a proliferação de insetos e roedores.

3.1.2 Coleta e transporte dos resíduos sólidos urbanos

Conforme informações da Secretaria de Infra-estrutura, a coleta dos resíduos


sólidos urbanos é realizada em todas as áreas da cidade, exceto nos domicílios de
difícil acesso, mais próximos da zona rural, neste caso, os resíduos são destinados
nas proximidades de suas próprias residências. O secretário Gil César acredita que
menos de 1% das residências urbanas não são atendidas pelo serviço de coleta.
Embora não existam relatórios, a pesquisa confirma que a informação prestada é
procedente.
Conforme informações da mesma secretaria, a coleta é diária. Esse dado
foge à realidade de coleta, pois a pesquisa de campo revela que esta é realizada
com freqüência diferente no perímetro urbano. Segundo a população pesquisada
(correspondente a 5% do número de domicílios da área urbana), a freqüência de
coleta na cidade se distribui da seguinte forma: para 64% é realizada duas vezes por
semana, seguida da coleta diária, com 15%; uma vez por semana, 12%; três vezes
58

por semana, 8% e outra, 1%, que corresponde a não existência de coleta, como
indica o Gráfico 04.

Foi possível perceber que a população dá muita importância à freqüência da


coleta de “lixo”, considerando um avanço no serviço de limpeza urbana quando a
coleta passa de duas para três vezes por semana, por exemplo. Esse dado se
assemelha ao que se registra na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (2000),
sobre este aspecto. A coleta mais freqüente é vista pela população como a única
forma eficiente de evitar o acúmulo de “lixo” nos logradouros públicos.
Como mostra o Gráfico 05, a freqüência da coleta varia no espaço urbano,
nos Bairros “Alto do Campo”, “Horizonte Azul” e “Casas Populares”, por exemplo,
ocorre duas vezes por semana, no “Bairro Novo”, a freqüência que predomina é
também a de duas vezes por semana, sendo em alguns pontos, semanal, já no
Centro, predomina a freqüência diária, e no Loteamento Califórnia, o serviço de
coleta ocorre apenas uma vez por semana, o que pode estar atribuído à formação
recente e à distância em relação ao centro da cidade.
59

Um fato que merece destaque é a falta de cuidados de parte da população


urbana em relação aos resíduos domiciliares, uma vez que há moradores que os
dispõem nas lixeiras sem embalá-los, e conforme informações dos coletadores,
outros colocam seus resíduos em frente às respectivas residências muito tempo
antes ou depois do horário da coleta (Fotos 11 e 12), atraindo cachorros e outros
animais que vagueiam pelas ruas à procura de comida, tornando os locais onde esta
prática é comum, ambientes sujos, mal cheirosos e propícios a proliferação de
insetos e roedores.
Ana Célia Carvalho Rocha
Ana Célia Carvalho Rocha

Fotos 11 e 12 - Acondicionamento inadequado de resíduos sólidos pela população da cidade de


Piripá-BA, 2009
60

Segundo o Secretário de Infra-estrutura Gil César da Silva Santos, o


armazenamento inadequado dos resíduos domiciliares e a disposição fora dos dias
e horários preestabelecidos para coleta regular dificultam o trabalho da limpeza
urbana e demonstra falta de compreensão daqueles que não têm o devido cuidado
com seus resíduos. Tal situação acarretará numa série de problemas ao ambiente e
os primeiros a serem afetados são os próprios causadores.
Neste contexto, é importante salientar que, embora o serviço de coleta atenda
quase a totalidade da população, há quem utiliza os terrenos baldios como lixeiras, o
que pode ser observado na Foto 13.

Ana Célia Carvalho Rocha

Foto 13 - Resíduos sólidos em terreno baldio, no bairro Alto do Campo, 2006

Como já foi mencionado, o transporte é realizado com dois veículos, uma


caçamba e um trator com carroceria, (Fotos 14 e15). Estes não são apropriados
para coleta e tampouco oferecem algum tipo de segurança aos coletadores. Neste
sentido, vale destacar que, por serem carros comuns, não dispõem de
compartimento destinado ao transporte dos servidores, que correm risco de serem
acidentados, e o que é pior, são eles próprios que exercem a função de compactar
os resíduos, a fim de diminuir o volume, e dessa forma, transportar uma quantidade
maior. Ademais, a absorção de mau cheiro associado ao contato direto com os
61

detritos compromete a qualidade de vida dos trabalhadores que realizam o serviço


de coleta e transporte dos mesmos.

Ana Célia Carvalho Rocha

Ana Célia Carvalho Rocha


Fotos 14 e 15 – Veículos utilizados para coleta e transporte dos resíduos sólidos na cidade de
Piripá-BA, 2009

Os veículos, além de inadequados, não apresentam bom estado de


conservação, e segundo alguns coletadores e motoristas, não são suficientes para
atender à demanda da coleta diária, sendo necessário realizar duas viagens por dia
até o local onde o “lixo” é depositado, mesmo assim, às vezes, não se consegue
transportar tudo que está previsto, sendo necessário concluir o serviço no dia
seguinte. Muitos dos pesquisados reclamam dos “montes” de resíduos que
permanecem por muitos dias nas ruas (Fotos 16 e 17), fato que pode ser atribuído à
carência de veículos para transportá-los.
Ana Célia carvalho Rocha

Ana Célia carvalho Rocha

Foto 16 - Resíduos em logradouro, no bairro Foto 17- Resíduos em logradouro, no bairro


Novo, 2009 Casas Populares, 2009
62

3.1.3 Destino final dos resíduos sólidos

A destinação final de resíduos sólidos urbanos da cidade de Piripá-BA não é


adequada, uma vez que a totalidade destes é depositada em um vazadouro a céu
aberto, mais conhecido como lixão. Diariamente, após o serviço de coleta, uma
parcela dos servidores do setor de limpeza pública, transporta os resíduos para o
“lixão”, fora do perímetro urbano, localizado na Fazenda Boa Vista.
Segundo Jeová Barbosa Gonçalves, prefeito da gestão 2004/2008, o
município trabalha de acordo a orientação do Ministério Público, que solicitou a
construção de um aterro provisório, seguindo as seguintes instruções: abrir valetas
para depositar o “lixo” e no fim de cada dia cobrí-lo com uma camada de terra,
evitando sua exposição. De acordo com as informações do ex-prefeito, o pedido foi
atendido. A partir das observações feitas no local, nota-se que houve realmente a
construção do aterro controlado 5, que pode ter funcionado por algum tempo, mas o
que se observa atualmente é o “lixão” (Fotos 18 e 19).

Ana Célia Carvalho Rocha


Ana Célia Carvalho Rocha

Foto 18 - Vala para deposição de resíduos Foto 19 - Lixão do município de Piripá-BA,


sólidos na área do lixão,2009 localizado na Fazenda Boa Vista, 2009

Quando questionado a respeito de reclamações referentes a problemas


provenientes do “lixão”, o Sr. Jeová Barbosa diz que

5
Local utilizado para despejo do lixo coletado, em bruto, com o cuidado de, após a jornada de
trabalho, cobrir esses resíduos com uma camada de terra diariamente, sem causar riscos à saúde
pública e à segurança, minimizando os impactos ambientais (PNSB, 2000).
63

Houve uma reclamação, não de um morador, mas de um proprietário


que mexe com o ramo de agropecuária, ele reclamou que sacolas de
plástico caíam dentro do mangueiro e que o gado possivelmente iria
comer, sendo que não teve problema nenhum. E a reclamação dele
foi resolvida, colocamos tela no setor [...]. A única reclamação foi
essa e do mais, teve reclamação só do Ministério Público, que
quando foi feito o lixão, fez a vistoria e exigiu que fizesse pelo menos
provisório aquele tipo de trabalho [...] (informação verbal) 6

Neste contexto, o município de Piripá contribui para aumentar a quantidade


de resíduos depositada em “lixões” e faz parte da porcentagem dos municípios
brasileiros que destinam inadequadamente seus resíduos sólidos urbanos, pois com
base na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, embora a situação do destino
final apresente alguma melhoria no que se refere à quantidade total de resíduos no
país, quando se trata do número de municípios, a situação revela-se bastante
insatisfatória.

A especificação das Unidades de Destino do Lixo indicou uma


situação de destinação final do lixo coletado no País, em peso,
bastante favorável: 47,1% em aterros sanitários, 22,3% em aterros
controlados e apenas 30,5% em lixões, ou seja, mais de 69% de todo
o lixo coletado no Brasil estaria tendo um destino final adequado em
aterros sanitários e/ou controlados. Todavia, em número de
municípios, o resultado não é tão favorável: 63,6% utilizam lixões e
32,2%, aterros adequados (13,8% sanitários, 18,4% aterros
controlados), sendo que 5% não informaram para onde vão seus
resíduos. Em 1989, a PNSB mostrava que o percentual de
municípios que vazavam seus resíduos de forma adequada era de
apenas 10,7% (PNSB, 2000).

De acordo com a PNSB, de qualquer forma, nota-se uma tendência de


melhora da situação da disposição final do lixo no Brasil nos últimos anos, que pode
ser creditada a diversos fatores, tais como: maior consciência da população sobre a
questão da limpeza urbana; forte atuação do Ministério Público, que vem agindo
ativamente na indução à assinatura, pelas prefeituras, dos Termos de Ajuste de
Conduta para recuperação dos lixões, e na fiscalização do seu cumprimento; aporte
de recursos do governo federal para o setor, através do Fundo Nacional de Meio
Ambiente; e apoio de alguns governos estaduais.

6
Informações fornecidas pelo ex-prefeito Jeová Barbosa, em 30/12/2008.
64

Ainda conforme a PNSB, apesar de todas estas forças positivas, não é


provável que se tenha atingido a qualidade desejada de destinação final do lixo
urbano no Brasil, na medida em que estes locais, por estarem geralmente na
periferia das cidades, não despertam interesse da população formadora de opinião,
tornando-se, assim, pouco prioritários na aplicação de recursos por parte da
administração municipal.
Na cidade de Piripá, os resíduos hospitalares e os materiais com validade
vencida recolhidos no comércio são embalados separadamente dos demais
resíduos da cidade e levados pelos agentes da Vigilância Sanitária para o “lixão”,
onde são queimados, num procedimento improvisado, para não dizer precário: os
mencionados agentes colocam o material no solo, jogam álcool e põem fogo,
conforme Fotos 20 e 21. É importante salientar que os servidores encarregados pela
destinação final dos resíduos hospitalares nem sempre utilizam equipamentos de
proteção individual como máscaras e luvas, expondo-se aos riscos de
contaminação, como por exemplo, pela fumaça tóxica proveniente da queima dos
resíduos.

Ana Célia Carvalho Rocha


Ana Célia Carvalho Rocha

Foto 20 – Resíduos hospitalares da cidade de Foto 21 – Queima de Resíduos hospitalares,


Piripá-BA, 2009 na área do lixão, 2009

Segundo Jeová Barbosa (prefeito da gestão 2004/2008), os resíduos


hospitalares são coletados em recipientes que os protegem (caixa para materiais
perfurocortantes), o transporte não é realizado no mesmo veículo dos demais
resíduos, e são “incinerados” sob orientação da DIRES. Evidentemente, porém, o
que se observa não se pode considerar incineração, uma vez que, no município não
65

existe incinerador, onde a queima ocorre em altas temperaturas, até transformar os


resíduos em cinzas.
Segundo Rodrigues e Cavinatto (2003), o lixo também nos revela sérios
problemas sociais. Em quase todas as cidades brasileiras existem pessoas que
vivem ao redor dos lixões, pegando restos de comida e objetos jogados fora. São os
denominados catadores, que todos os dias esperam a chegada dos caminhões de
coleta para recolher papel, papelão, alumínio, plástico ou latas, vendendo-os
posteriormente aos depósitos de sucata. Conforme a PNSB, um dos aspectos
sociais mais degradantes nos serviços de limpeza urbana é a catação de recicláveis
nos aterros e lixões, onde pessoas de todas as idades, misturadas ao lixo, entre
animais e máquinas, e em condições de insalubridade e risco, lutam pela
sobrevivência.
A presença de catadores também faz parte da realidade num município tão
pequeno como Piripá, embora em número muito reduzido. Durante a pesquisa de
campo foi possível identificar apenas um catador, o senhor Manoel Aparecido Alves,
35 anos, que vive da venda e do reaproveitamento de resíduos do “lixão” do
município, onde são recolhidos os seguintes produtos: garrafas e sacolas de
plástico, alumínio, vidro, papel, madeira, etc. (Fotos 22 e 23). Segundo o catador, a
maior parte do material é vendida e a outra, reaproveitada, como por exemplo,
pedaços de madeira, que os utiliza para a produção de porta-toalhas.

Ana Célia Carvalho Rocha


Ana Célia Carvalho Rocha

Fotos 22 e 23 – Materiais recolhidos no Lixão de Piripá-BA, 2009

Ainda informa que o material recolhido é vendido no próprio lixão, que depois
é transportado pelo comprador para o município de Vitória da Conquista, e diz
66

receber em torno de 100,00 (cem reais) por mês, mas este valor pode variar a
depender da quantidade de produtos recolhida, ou seja, da produção mensal.
Segundo Manoel, por falta de residência, chegou a passar 30 dias com sua família
(esposa e dois filhos) na área do “lixão”. Para isso, construiu um barraco (Foto 24),
que hoje é utilizado para descansar, pois mora na cidade, mas passa em torno de 12
horas por dia trabalhando como catador. Comenta que passou por dificuldades, mas
diz que agora está tudo bem.

Eu fiquei morando aqui com minha família um mês, correndo risco


com os meninos aqui. A hora que zuava um carro, a mulher corria e
escondia as crianças prá num prejudicar ninguém, nem eu nem o
prefeito que me deu apoio prá trabalhar [...]. Tive dificuldade, porque
o homem custou de pegar o material e a gente passou necessidade
sobre o negócio de despesa, aí teve um pessoal da comunidade que
trouxe uma compra, cesta básica, aí demorou pouco eu consegui a
casa lá na cidade. Pago o aluguel bem na verdade, mas... pago 60
conto. [...] De todos os lugares que trabalhei, o melhor foi aqui, só
vou sair de Piripá quando eu morrer. Tô feliz, Tô feliz! (informação
verbal) 7

Ana Célia Carvalho Rocha

Foto 24 – Barraco construído ao lado do lixão de Piripá-BA, 2009

Embora em “lixões” seja comum encontrar animais como ratos, baratas,


moscas, escorpiões, etc., por se constituírem ambientes propícios à proliferação
destes, o catador Manoel declara nunca ter visto nenhum dos animais citados, e diz
7
Informações fornecidas pelo catador de materiais recicláveis, em 20/01/2009.
67

também que nunca teve problemas de saúde causados pelo contato direto com os
resíduos, o que não é comum, mas demonstra ter consciência de que pode ser
vítima de problemas provenientes do espaço que freqüenta diariamente, quando diz:
“Peço a Deus prá num causar problema nenhum. Das doenças, eu peço a Deus prá
me livrar, e os colegas meus também” 8.
Nesse sentido, importa dizer que os chamados catadores são populações
bastante expostas aos resíduos sólidos urbanos. Conforme Ferreira e Anjos (2001),
“além dos incômodos do mau cheiro, convivem com a presença de vetores e sofrem
os efeitos da poluição/contaminação [...]”. Em se tratando dos problemas
decorrentes da destinação dos resíduos gerados pelo consumo humano, em matéria
publicada na Revista Aquecimento Global/2008, Cláudio Blanc afirma que

A questão do lixo é mais grave do que se tem consciência. A ONU


divulgou que, em 2005, a principal causa da epidemia de cólera que
se alastrou pela África foi os incontáveis lixões a céu aberto que se
espalham por todo o continente. Testemunhas afirmam que, em
algumas cidades, é preciso abrir caminho entre as pilhas de lixo
doméstico. Globalmente, uma população considerável, inclusive no
Brasil, vive em mal cheirosos depósitos dos restos do nosso
consumo (BLANC, 2008, p. 31).

Neste contexto, cabe ressaltar que o destino final é um aspecto relevante da


gestão dos resíduos sólidos urbanos devido aos inúmeros problemas provocados
pelo depósito em locais inapropriados, e precisa ser tratado com seriedade pelo
Poder Público Municipal.

3.1.4 Condições de trabalho dos servidores públicos que atuam no gerenciamento


dos resíduos

Conforme pesquisa realizada com o pessoal que atua no serviço de limpeza


urbana em Piripá, todos os servidores trabalham 8 horas por dia, de segunda a
sábado, tendo cada um deles um dia de folga durante esse período. Do total de 30
servidores, 70% são efetivos, como mostrou a Tabela 04, sendo todos concursados
ou contratados pelo município. Quando questionados sobre a participação em
treinamento referente ao trabalho que realizam, apenas 6,7% disseram ter

8
Informação fornecida pelo catador de materiais recicláveis, em 20/01/2009.
68

participado, dentre eles um servidor da Vigilância Sanitária, que trabalha na coleta e


destino dos resíduos hospitalares. Um número muito reduzido, considerando a
necessidade de capacitação dos trabalhadores para que sejam evitados problemas
socioambientais provenientes dos resíduos sólidos municipais.
Quando questionados a respeito dos equipamentos de proteção individual,
apenas 20% dos servidores afirmam usar botas, 17% usam máscaras, 30%, luvas e
27% apontam outros, referindo-se ao uso de chapéus ou bonés e de protetor solar, e
uma parcela expressiva destes declara trabalhar totalmente desprotegidos, o
equivalente a 67% (Gráfico 06). Vale ressaltar que todos usam suas próprias roupas
para realizar o trabalho, devido à inexistência de uniformes fornecidos pela
Prefeitura. Tanto o secretário de infra-estrutura quanto o atual prefeito da cidade
informam que luvas, botas e máscaras são materiais fornecidos aos trabalhadores.
Sendo verdadeiras estas informações, caberia questionar a razão do uso restrito dos
equipamentos, se falta de orientação técnica ou mero descuido dos próprios
servidores.

A pesquisa revela também que 23% dos servidores já sofreram algum


acidente no trabalho, dos quais 13% sofreram cortes com vidros, 10% perfuração
com objetos pontiagudos, 6,7% caíram do veículo e foram picados por insetos, 3,3%
69

foram mordidos por animais e atropelados, dentre outros acidentes, que


corresponde a 3,3%, como mostra o Gráfico 07.

Quando consultados a respeito de problemas de saúde relacionados às


condições de trabalho, 47% dos servidores declaram ter sofrido alguns problemas e
que estes foram manifestados depois que começaram a exercer esta função, outros
53% afirmam que nunca tiveram problemas por causa do trabalho que realizam. Os
principais problemas mencionados foram: dores na coluna, dor de cabeça, irritação
dos olhos, alergia, problemas respiratórios e sinusite.
Em relação ao atendimento médico, uma parcela dos trabalhadores disse que
o receberam por intermédio da Prefeitura, mas alguns afirmam que a Prefeitura
forneceu atendimento apenas parcial, pois não houve fornecimento de remédios. Um
dos servidores diz que trabalha com o “lixo” há mais de dez anos e que nunca
realizou uma consulta médica para saber se tem algum problema relacionado ao
mesmo.
70

Ao tratarem das populações expostas aos efeitos diretos do gerenciamento


inadequado dos resíduos sólidos municipais, a literatura registra os riscos de
acidentes e de contaminação associados ao trabalho.

Os trabalhadores diretamente envolvidos com os processos de


manuseio, transporte e destinação final dos resíduos formam uma
população bastante exposta. A exposição se dá notadamente: pelos
riscos de acidentes de trabalho provocados pela ausência de
treinamento, pela falta de condições adequadas de trabalho e pela
inadequação da tecnologia à realidade dos países em
desenvolvimento; e pelos riscos de contaminação pelo contato direto
e mais próximo do instante da geração do resíduo com maiores
probabilidades da presença ativa de microorganismos infecciosos
(SIVIERI; VELOSO apud: FERREIRA; ANJOS, 2001, p. 691).

Por fim, nota-se o nível de satisfação dos servidores públicos no que se refere
às condições de trabalho. Apesar de não serem as melhores, uma porcentagem
relevante 77% declara estar satisfeita, enquanto 20% demonstram sua insatisfação
e 3% dizem que não estão totalmente satisfeitos (Gráfico 08).

As justificativas dos que se declaram satisfeitos se concentram no pagamento


do salário em dia, enquanto outros declaram que não falta dinheiro para atender às
suas necessidades. Alguns também afirmam que não querem procurar trabalho em
71

cidades grandes, como atesta um dos servidores, pois: “É melhor trabalhar aqui do
que correr risco de vida em cidade grande, como São Paulo” (conhecido destino de
muitos trabalhadores de Piripá que vão à procura de emprego). Considerando esta
última justificativa, é possível afirmar que a satisfação não está diretamente
relacionada às condições de trabalho, e sim à possibilidade de um emprego em sua
própria cidade, e talvez esta seja a única opção, o que não ficou muito claro.
Os servidores insatisfeitos com as condições de trabalho manifestam
apresentando os seguintes motivos: falta de uniforme, falta de materiais para
proteção individual, baixo salário, falta de carros próprios para coleta e transporte do
lixo, dentre outras. Alguns reclamam das exigências e da falta de compreensão dos
responsáveis (da Secretaria de Infra-estrutura), quando necessitam faltar ao
trabalho, até mesmo para irem ao médico.
Levando-se em conta as informações acima, é notória a necessidade de
melhoria das condições de trabalho dos servidores da limpeza urbana, tanto no que
se refere aos equipamentos necessários aos serviços quanto em relação ao salário,
ao respeito de seus direitos e à própria valorização do seu trabalho. Neste sentido,
cabe destacar que os trabalhadores da limpeza urbana são, normalmente, pouco
valorizados, fato que pode ser atribuído ao preconceito comum em relação ao
trabalho manual e às atividades tidas como subalternas numa sociedade cindida
pela desigualdade como o Brasil, o que não justifica, pois exercem uma função tão
importante quanto tantas outras.

3.1.5 A qualidade do serviço de limpeza urbana na visão da população

A análise da gestão dos resíduos sólidos na cidade de Piripá contemplou


também uma pesquisa direta com uma parcela da população, tratando de sua
avaliação em relação ao serviço de limpeza urbana. Nessa pesquisa, a amostra
pesquisada corresponde a 5% do número de domicílios urbanos. Como mostra o
Gráfico 09, quanto à avaliação do serviço de limpeza pública (coleta, transporte e
destinação final dos resíduos sólidos urbanos), 51% das pessoas pesquisadas,
consideram-no bom; 38% o avalia como regular, uma quantidade relevante da
população; para 8%, é ruim e apenas 3% faz outra avaliação, considerando péssimo
o serviço em questão.
72

As justificativas da população referentes à avaliação do serviço de limpeza


pública variam de acordo à percepção e ao grau de conhecimento das pessoas
pesquisadas a respeito do tema em questão. As que consideram o serviço ruim ou
regular apontam, dente outras, as seguintes irregularidades: veículos de coleta e
transporte inadequados, falta de proteção para os servidores (máscaras, luvas,
calçados apropriados, etc), insuficiência de veículos e funcionários para o serviço de
limpeza urbana, frequência irregular e a deposição dos resíduos a céu aberto.
A insatisfação da população em relação ao serviço mencionado pode ser
constatada na fala de alguns dos pesquisados:

É ruim porque as pessoas que coletam o lixo trabalham


desprotegidas e o destino final é a céu aberto, contaminando o solo e
as pessoas que frequentam o local;
É regular, porque os equipamentos utilizados para limpeza urbana
não são adequados para tal serviço, uma vez que se apresentam em
mau estado de conservação, e quanto à destinação final, o local não
oferece a estrutura adequada para a recepção do lixo;
Não é bom, porque os funcionários da Prefeitura fazem a coleta sem
os equipamentos de proteção individual, o transporte não é
adequado e a destinação final também. (informação verbal) 9

9
Falas inscritas no questionário aplicado à população, destinado à pesquisa sobre a gestão dos
resíduos sólidos da cidade de Piripá-BA.
73

Mesmo aqueles que avaliam o serviço como bom e dizem que as ruas são
limpas e que existe coleta regular, mencionam algumas deficiências como falta de
aterro sanitário, transporte inapropriado, baixo salário dos servidores e inexistência
de coleta seletiva. É importante destacar que para muitos a limpeza pública é boa
pelo simples fato de existir o serviço de coleta, desconsiderando a forma como esta
é realizada, o pessoal que atua no gerenciamento dos resíduos e seu destino final.
Neste caso, nota-se que a resposta está vinculada ao nível de percepção de cada
pessoa em relação ao assunto abordado. Por outro lado, há também os que só se
preocupam com os problemas do seu entorno, ignorando os que dizem respeito a
toda a população.
Outro aspecto considerado foi a existência de lixeiras públicas nas
proximidades das residências. Neste item constatou-se que para 92,2% dos
pesquisados tais lixeiras simplesmente não existem (Tabela 04), o que torna comum
o hábito de utilizar os locais à frente das residências para depositar o “lixo” antes da
coleta.

Tabela 04 - Existência de lixeiras públicas na cidade de Piripá-BA


segundo a população, 2009

Existência de lixeira %
Há lixeira 7,8
Não há lixeira 92,2
Total 100
Fonte: Pesquisa de campo, janeiro de 2009.

Em relação ao que poderia ser feito para melhorar o serviço de limpeza


pública e a gestão dos resíduos sólidos, a população pesquisada apresenta uma
série de sugestões, tais como: a) Fornecer equipamentos de proteção individual
para os trabalhadores e capacitá-los para tal serviço; b) adquirir carros apropriados
para coleta e transporte do lixo, construir um aterro sanitário; c) ampliar o número de
lixeiras públicas e melhorar a freqüência da coleta; d) aumentar o número de
funcionários e veículos; e) informar a população sobre os dias e horários da coleta; f)
implementar o sistema de coleta seletiva; g) reaproveitar e/ou reciclar parte dos
resíduos. Como afirmam alguns moradores: “O lixo deveria ser reciclado, pois a
cidade está crescendo e há grande produção...”; “O Poder Público deveria
74

preocupar-se mais com o serviço de limpeza pública, porque a questão do lixo é


séria”; “Destinar corretamente o lixo”.
E quanto ao que a população poderia fazer para contribuir com a limpeza da
cidade, a grande maioria diz que esta deveria cuidar melhor do seu lixo doméstico,
armazenando-o em sacos plásticos e colocando nos locais de coleta somente nos
dias e horários preestabelecidos. Outros tantos disseram que a população deveria
cobrar do poder público o cumprimento das propostas referentes à limpeza pública,
e uma parcela relevante disse que a limpeza dos terrenos baldios deveria ser de
responsabilidade dos seus donos. Pode-se registrar alguns depoimentos nesse
sentido:

A população deve cobrar do Poder Público mais empenho quanto


aos projetos direcionados à limpeza pública, organizar o lixo em suas
casas e procurar locais mais adequados para o seu depósito;
Limpar os terrenos baldios, evitando assim doenças como a dengue;
Primeiro, iniciar em casa uma campanha de separação e
reaproveitamento do lixo, não jogar papéis ou qualquer lixo fora do
lixeiro, orientar os vizinhos da rua ou do bairro, denunciar os
infratores da limpeza pública, procurar o Poder Público para
denunciar, apresentar sugestões e juntos realizar campanhas e
mutirões em prol do meio ambiente. (informação verbal) 10

Considerando que o espaço urbano de Piripá encontra-se dividido em


localidades popularmente conhecidas como bairros, com características distintas, e
que os serviços públicos não atendem igualmente a todo o espaço, torna-se
necessário a espacialização dos resultados da pesquisa de campo.
Neste contexto, é importante salientar que a avaliação varia no espaço
urbano, como pode ser observado na Tabela 05. No Centro e no Loteamento
Califórnia, a maioria das pessoas considera o serviço regular, sendo
respectivamente 60% e 40%, enquanto que nos demais “bairros”, uma parcela maior
da população o avalia como bom, dos quais o que apresenta a porcentagem mais
expressiva é o “bairro Casas Populares”, com 73%, seguida do “Horizonte Azul, com
66%. Um aspecto que estas duas localidades enfocam é o fato da freqüência de
coleta ter passado de uma para duas vezes por semana, considerando importante
melhoria no serviço de limpeza urbana.
10
Falas inscritas no questionário aplicado à população, destinado à pesquisa sobre a Gestão dos
resíduos sólidos na cidade de Piripá-BA.
75

Tabela 05 – Avaliação do serviço de limpeza pública na cidade de


Piripá-BA segundo a população, por bairro, 2009

Avaliação Centro Alto do Bairro Horizonte Casas Califórnia


Campo Novo Azul Populares
Ruim 15% 7% - 7% - 20%
Regular 60% 33% 33% 27% 27% 50%
Bom 25% 60% 60% 66% 73% 20%
Ótimo - - - - - -
Outra - - 7% - - 10%
Fonte: Pesquisa de campo, janeiro de 2009.

Um aspecto relevante nesta avaliação é o fato de nenhuma das pessoas


pesquisadas considerar ótimo o serviço de Limpeza Pública da cidade,
demonstrando clara deficiência na organização deste setor. Por outro lado, apenas
alguns moradores do “Bairro Novo” e do Loteamento Califórnia fizeram outra
avaliação, para estes, o serviço é péssimo. E suas justificativas se baseiam na
utilização de carros inadequados para coleta, na irregularidade da freqüência e,
principalmente, na destinação final, uma vez que os resíduos são depositados em
um “lixão”.

3.2 ELEMENTOS PARA UMA AVALIAÇÃO CRÍTICA DA GESTÃO DOS RESÍDUOS


SÓLIDOS EM PIRIPÁ-BA

Com base nos resultados da pesquisa de campo realizada por meio da


consulta à população local no que se refere à qualidade dos serviços de limpeza
pública, poder-se-ia afirmar que, sob tal prisma, a gestão dos resíduos sólidos
urbanos em Piripá se encontra numa situação aceitável, pois 51% das pessoas
pesquisadas classificam-na como “boa”. Porém, quando analisada no contexto geral
da pesquisa, considerando a qualidade ambiental urbana, não se obtém uma
avaliação tão satisfatória, o que se explica pela insuficiência de políticas públicas
destinadas ao saneamento básico, e especialmente à gestão dos resíduos sólidos
urbanos, associada à falta de planejamento para a execução dos serviços neste
setor, o que se manifesta em diversos problemas.
A análise do serviço de coleta evidencia suas deficiências, a começar pela
sua freqüência desigual: enquanto que no Centro predomina a freqüência diária, no
76

Loteamento Califórnia, a coleta é realizada apenas uma vez por semana,


percebendo-se uma acentuada discrepância. Outro aspecto relevante, apontado
inclusive pelos pesquisados de algumas áreas do espaço urbano, é a irregularidade
da freqüência, possibilitando o espalhamento dos detritos, e dessa forma,
degradando o ambiente e expondo os moradores ao forte mau cheiro e aos riscos à
saúde. O próprio gestor municipal admite falhas neste serviço quando diz: “A coleta
é feita toda com funcionários da prefeitura e num sistema ainda um pouco atrasado,
que deixa, a gente tem que ser sincero, deixa muito a desejar”. (informação verbal)11
No que se refere aos equipamentos utilizados no serviço de limpeza urbana
verifica-se tamanha irregularidade, uma vez que são utilizados veículos não
apropriados, levando os próprios coletadores a compactar o “lixo”, expondo-os a
uma situação degradante.
Tratando-se especificamente das condições de trabalho dos servidores que
atuam no gerenciamento dos resíduos, nota-se certo descaso do Poder Público
municipal, uma vez que a maioria deles trabalha desprotegida, apenas alguns
utilizam equipamentos de proteção individual, aumentando, dessa forma, a
probabilidade de sofrerem acidentes e expondo-os aos riscos de contaminação pelo
contato direto com os resíduos.
A pesquisa também revela que muitos servidores apresentam problemas de
saúde como cefaléia, hipertensão arterial e problemas respiratórios, segundo eles
associados à função que exercem (o que de fato é muito provável). Vale lembrar que
43% dos servidores que se queixam de tais problemas não procuraram o médico, o
que contribui para piorar ainda mais as suas condições de trabalho. Neste sentido,
Anjos e Ferreira (2001), referindo aos efeitos dos resíduos na saúde humana,
afirmam que

O odor emanado dos resíduos pode causar mal estar, cefaléias e


náuseas em trabalhadores [...]. Ruídos em excesso, durante as
operações de gerenciamento dos resíduos, podem promover a perda
parcial ou permanente da audição, cefaléia, tensão nervosa,
estresse, hipertensão arterial. Um agente comum nas atividades com
resíduos é a poeira, que pode ser responsável por desconforto e
perda momentânea da visão, e por problemas respiratórios e
pulmonares (ANJOS; FERREIRA, 2001, p. 692).

11
Informação fornecida pelo prefeito da gestão 2004/2008, em 30/12/2008.
77

Porém, a situação pior no que se refere à gestão dos resíduos sólidos


urbanos, em Piripá, está na destinação final, pois, como já foi exposto, a totalidade
dos resíduos, produzida no espaço urbano, é depositada em um vazadouro a céu
aberto (lixão). Embora não haja participação alguma da população na administração
desse componente do serviço de limpeza pública (mostrando-se, por vezes, passiva
diante dos problemas observados), este foi o aspecto mais mencionado pela
população que considera o serviço de limpeza pública ruim ou regular. Como
atestam alguns dos pesquisados: “É regular, porque o ‘lixão’, destino final do lixo é
uma alternativa altamente prejudicial à saúde humana [...]”; “É ruim, porque o lixo é
depositado a céu aberto”.
Neste contexto, é importante ressaltar que a deposição de resíduos a céu
aberto resulta numa série de problemas como poluição atmosférica, contaminação
do solo e das águas subterrâneas, que tem contribuído para a degradação
ambiental, bem como da qualidade de vida do ser humano, principalmente, das
populações que não dispõem de coleta domiciliar regular, das que residem nas
proximidades dos “lixões” ou que vivem da coleta de resíduos nestes locais.
Ao avaliar a gestão dos resíduos sólidos municipais, Jeová Barbosa, prefeito
da gestão 2004/2008, aponta que houve melhorias, mas evidencia a necessidade da
destinação adequada destes, quando menciona a contaminação das águas dos rios,
a exemplo do Rio Gavião, que banha o município.

Olha, eu acho que já teve pior, mas a gente precisa melhorar muito,
[...] sabendo que nada provisório atende às necessidades. É... a
coisa tem que ser tratada com urgência, ainda mais nós aqui que
temos os rios próximos desse aterro provisório. A gente sabe que
boa parte desses já tá contaminado, e é difícil voltar... E os
moradores das margens dos rios, eles têm reclamado. Foram feitos
alguns ajustes, foi encanado água para eles de postos artesianos
para que não precisassem comprar [...], mas a gente sabe que
precisa fazer muito mais, porque o Rio Gavião recebe tudo... é mal
utilizado por todos nós. Essa é uma questão urgente, [...].
(informação verbal) 12

Nota-se que no começo da sua fala, o prefeito faz referência ao aterro


controlado, que segundo ele é um local provisório de deposição de resíduos, o que

12
Informações fornecidas pelo prefeito da gestão 2004/2008, em 30/12/2008.
78

mostra desconhecimento do gestor no que se refere à destinação final atual, uma


vez que o local referido já deixou de existir, sendo o “lixão”, espaço real de
deposição dos resíduos da cidade. No entanto, em relação ao Rio Gavião, foi
abordado um fato relevante que é a contaminação de suas águas, causada tanto
pelos resíduos quanto pelo despejo de todo o esgoto da cidade. Realmente, a
destinação adequada dos resíduos bem como do esgoto da cidade é uma questão a
ser resolvida com urgência.
O Secretário de Infra-estrutura também enfoca a questão da destinação final
dos resíduos em sua avaliação, admitindo a deficiência da gestão neste aspecto.

[...] a vigilância cobrou que fosse construído um aterro sanitário, isso


em todos os municípios da região, como nós não tivemos a
oportunidade de efetuar esse tipo de trabalho. Eu acredito que o
trabalho ficou desgastado em relação a isso, ficou deficiente em
função disso aí. Na verdade, nós tivemos que cavar profundas valas
prá que fosse colocado esse lixo, mas de maneira apenas provisória,
não atendendo à questão que a gente tinha necessidade. Eu acredito
muito que a grande solução, principalmente nas pequenas cidades,
está no consórcio inter-municpal prá coleta e reaproveitamento desse
lixo. [...] então se uma vez nós não conseguimos atingir, eu acho que
teríamos maior eficiência se juntos, nas pequenas cidades,
fizéssemos esse serviço. (informação verbal) 13

Na avaliação do atual prefeito, o serviço de Limpeza Pública está numa fase


“boa”, mas “tem muito que melhorar”. Em se tratando das propostas para este setor,
a primeira refere-se ao transporte dos resíduos, quando fala da tentativa de
conseguir um veículo apropriado para coleta, admitindo a precariedade dos veículos
existentes.

Pretendo equipar melhor, com maquinário. A gente está tentando,


[...] através de convênio com o governo do Estado, conseguir uma
máquina para coleta de lixo, um veículo especial de coleta. Se a
gente conseguir esse veículo, prá mim, já é um grande passo, já que
é levado na caçamba a céu aberto, caindo lixo no meio da rua e na
estrada. (informação verbal) 14

13
Informações fornecidas pelo secretário de Infra-estrutura Gil César da Silva Santos, em
31/01/2009.
14
Informações fornecidas pelo prefeito do município Anfrísio Barbosa Rocha, em 13/02/2009.
79

Quando questionado a respeito de sua proposta para a destinação final,


aspecto tão importante da gestão de resíduos, o prefeito admite o seu
desconhecimento sobre o que deve ser feito, deixando clara a inexistência de
projetos para esta área, mas afirma que pretende fazer algo neste sentido:

[...] é difícil eu lhe dar uma resposta sobre a destinação final, porque
ainda não tenho conhecimento do que o Ministério Público exige, o
que a lei exige que seja feito. E também dos riscos ao meio
ambiente. Eu não sei o que deve ser feito. Eu não posso dar a
resposta exata, mas a gente vai trabalhar nessa área, contratar um
profissional que entenda para avaliar o que vai ser feito de agora em
diante. (informação verbal) 15

Referindo-se a outros serviços que também fazem parte do saneamento


básico, o prefeito enfoca a questão do esgotamento sanitário e demonstra interesse
em promover melhorias direcionadas a este setor.

O abastecimento de água e o esgotamento sanitário deveriam ser


por conta da Embasa, a empresa que abastece o município, que
coleta impostos, mas na verdade a empresa só presta o serviço de
água, a parte do esgoto que é mais complicada, não faz, ficando
assim a mercê da prefeitura. [...] prá conseguir suprir a necessidade
do município, a gente vai ter que fazer um convênio com o governo
do Estado ou federal, pra conseguir recursos prá fazer o serviço de
esgotamento bem feito [...]. É de interesse da gente, porque uma
pessoa que não tem o esgotamento sanitário será um paciente do
Posto de Saúde e também mais gasto para a Prefeitura. O
abastecimento de água, como eu já disse, é de responsabilidade da
Embasa, mas também não deixa da prefeitura estar fazendo a parte
dela, de tá cobrando melhorias do serviço da Embasa. (informação
verbal) 16

Por fim, considerando todos os aspectos apresentados e os depoimentos dos


gestores municipais, fica evidente que a gestão dos resíduos sólidos urbanos não se
constitui numa prioridade no âmbito da Administração Pública Municipal. Esta se
encontra numa situação de carência, que poderá ser superada com políticas
públicas eficientes, geridas por meio de planejamento e maior interesse político.

15
Informações fornecidas pelo prefeito do município, em 13/02/2009.
16
Informações fornecidas pelo prefeito do município, em 13/02/2009.
80

3.3 SUGESTÕES PARA A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS

Diante da situação em que se encontra o município de Piripá no que concerne


à gestão dos resíduos sólidos urbanos, medidas eficazes precisam ser adotadas
com o propósito de organizar os serviços de limpeza urbana, pensando na escassez
dos recursos naturais, na qualidade do ambiente e, dessa forma, nas condições de
vida de toda a população. Para tanto, seguem algumas sugestões que poderão
contribuir para a melhoria das condições sócio-ambientais do espaço ao qual se
destinam:

• Ampliação do quadro de servidores que atua no gerenciamento dos


resíduos, garantindo o fornecimento de equipamentos de proteção
individual e cursos de capacitação com o objetivo de informá-los dos
riscos ambientais e à saúde pública. Além disso, realizar
acompanhamento da saúde desses servidores através de consultas
médicas periódicas, assim como o fornecimento de tratamento
adequado, quando for o caso;

• Realização de campanhas a fim informar e sensibilizar a população


local em relação aos problemas provenientes dos resíduos sólidos
para que esta contribua com a limpeza pública, através de anúncios
em rádios, carros de som e/ou de folders informativos;

• Fornecimento de equipamentos adequados para limpeza urbana, e


distribuição de lixeiras com tampa nos logradouros públicos;

• Implementar programas que visem o reaproveitamento dos resíduos,


assim como a preservação dos recursos naturais, e
consequentemente a proteção do ambiente urbano, a exemplo da
coleta seletiva. Para isso, é necessária a preparação da população a
fim de que o programa seja executado com eficiência. Quanto aos
produtos aproveitáveis, podem ser reciclados no próprio município ou
vendidos para centros de reciclagem, e a renda poderá ser aplicada
no próprio setor de limpeza urbana;
81

• Construção de um aterro sanitário, já que constitui a estrutura de


engenharia mais adequada para deposição de resíduos sólidos, pois
além de proteger o solo e as águas subterrâneas dos efeitos nocivos
dos resíduos, evita a poluição atmosférica.

É importante salientar que a efetivação das sugestões apresentadas depende


de iniciativas do poder público municipal, mas com a participação ativa da população
local a fim de se obter resultados ambiental e socialmente mais satisfatórios.
Conforme Kobyiama (2008), as ações que visam a efetivação de condições
adequadas de saneamento dependem não somente do poder público, mas também
da comunidade. A coleta seletiva, por exemplo, tem resultados muito mais
significativos quando a própria população separa seus resíduos.
82

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A questão dos resíduos sólidos tem sido motivo de preocupação na


atualidade. Embora a produção de detritos seja inerente à própria sobrevivência
humana, a partir da Revolução Industrial, com o aumento da produção, sobretudo de
produtos descartáveis, aumentou significativamente a quantidade de resíduos
produzida no espaço urbano. Agora, o desafio para estas e as futuras gerações é
encontrar locais apropriados para depositá-los.
A partir dos dados obtidos na pesquisa de campo, é possível afirmar que o
município de Piripá-BA é carente de políticas públicas destinadas à gestão dos
resíduos sólidos urbanos, o que inviabiliza a eficiência dos serviços neste setor. Vale
ressaltar que o saneamento básico não se constitui prioridade dentre os setores da
administração pública municipal, evidenciando descaso político em relação aos
serviços fundamentais de gestão urbana.
Em se tratando de limpeza urbana, não se pode abdicar do papel da
sociedade local enquanto contribuição importante para a eficiência das políticas
públicas direcionadas ao setor. Em Piripá, a não participação ativa da população na
gestão dos resíduos e poucas práticas adequadas ao serviço, tais como
acondicionar adequadamente os resíduos, colocá-los à disposição para a coleta nos
dias e horários preestabelecidos e não lançá-los em terrenos baldios, contribuem
para uma gestão que não atenda aos princípios legais.
Neste contexto, é importante mencionar algumas deficiências existentes no
município em relação à gestão dos resíduos sólidos urbanos, como falta de
organização necessária à execução dos serviços de limpeza urbana, veículos
inapropriados para coleta e transporte dos resíduos, destinação inadequada dos
mesmos e precárias condições de trabalho dos servidores. Tais deficiências se
manifestam na poluição atmosférica, do solo e das águas subterrâneas, além dos
problemas de saúde pública, comprometendo, dessa forma, o equilíbrio do ambiente
e a qualidade de vida de seus moradores.
Conclui-se que, a gestão dos resíduos sólidos no município de Piripá carece
de melhorias, e as quais somente serão possíveis com políticas públicas eficazes
associadas a maior interesse por parte do poder público municipal, bem como da
participação ativa da população local. Para tanto, serão necessários maiores
investimentos financeiros e em recursos humanos destinados ao setor.
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