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25/06/2020

DISCUSSÕES INTRODUTÓRIAS
COMPREENDENDO ASPECTOS QUE NORTEIAM A LINGUAGEM

Profa. Dra. Isabelle Cahino Delgado


NELF / UFPB / CNPq

“A linguagem é ela mesma um trabalho pelo qual, histórica, social e culturalmente, o homem organiza e
dá forma a suas experiências. Nela se produz, do modo mais admirável, o processo dialético entre o que
resulta da interação e o que resulta da atividade do sujeito na constituição dos sistemas linguísticos, as
línguas naturais de que nos servimos. (...) É na interação social, condição de desenvolvimento da
linguagem, que o sujeito se apropria [do] sistema linguístico, no sentido de que constrói, com os outros, os
objetos linguísticos de que se vai utilizar, na medida em que se constitui a si próprio como locutor e aos
outros como interlocutores.”

(Franchi, 1987, pág. 12, grifo nosso)

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(LAMÔNICA; FERREIRA-VASQUES IN GIANNECCHINI; MAXIMINO, 2018)

• Integridade do SNC;
O desenvolvimento da linguagem envolve

para o ser humano (LAMÔNICA, 2010):


inúmeros fatores que devem ser analisados
para a compreensão deste processo essencial

• Processo maturacional;
• Integridade sensorial;
• Habilidades cognitivas;
• Habilidades intelectuais;
• Processamento de informações ou aspectos
perceptivos;
• Aspectos emocionais;
• Influência do ambiente que a criança está
inserida.

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(LAMÔNICA; FERREIRA-VASQUES IN GIANNECCHINI; MAXIMINO, 2018)

• Outro foco de estudo acerca da linguagem


está baseado em seus aspectos receptivos e
expressivos, considerando-se a premissa de
que a compreensão de uma palavra antecipa
sua produção (Scheuer et al., 2003), apesar
da existência de relação intrínseca e recíproca
entre elas (Lima; Almeida, 2007).

Qual o papel do gesto na aquisição


da linguagem?

Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

• Tradicionalmente, os • McNeill (1985) • Então, no processo


estudos em aquisição da
linguagem e algumas expôs a premissa de aquisição da
práticas clínicas [como a de que a linguagem
da Fonoaudiologia e da linguagem é diferentes gestos e
Psicologia] focavam
apenas o sempre produções verbais
desenvolvimento das multimodal, pois são adquiridas e se
produções verbais das gesto e fala são aperfeiçoam
crianças, concebendo as
produções gestuais como constitutivos de mutuamente em
elementos acessórios na um único sistema um contínuo em
comunicação, usados, linguístico, eles se contextos de
segundo Knap e Hall
(1999), para auxiliar o encontram interação e de
fluxo de fala, para integrados numa atenção conjunta
enfatizar palavras e/ou mesma matriz de (LIMA, 2015).
expressões que em si
mesmas não teriam produção e
sentido completo (LIMA, significação.
2015).

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Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

• Por contextos de interação, entendemos


qualquer situação naturalística em que há
trocas comunicativas desenvolvidas pelo
dialogismo, que é o constante diálogo entre os
diversos discursos que se configuram em uma
comunidade, em uma cultura e é constituído
pelas relações dialógicas que possuem caráter
intrinsecamente social (BORTOLOZZI, 2013).

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Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

• Nesse contexto, a atenção conjunta é


fenômeno primariamente social ou cognitivo-
social que favorece a criança a interagir com o
adulto e a utilizar como base a linguagem dele
(TOMASELLO, 1995; CARPENTER, NAGEL e
TOMASELLO, 1998), promovendo o processo
constitutivo de sua própria matriz linguística.

• (LIMA, 2015)

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Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

• Segundo Tomasello (2003) as cenas de atenção conjunta são definidas como interações
sociais nas quais a criança e o adulto prestam conjuntamente atenção a uma entidade
externa por um período razoável de tempo.

• Tomasello (2008) aponta que a comunicação humana depende de uma “infraestrutura


cognitiva”, que possibilita a capacidade de cooperação entre os seres humanos e, pela
qual, a língua se desenvolve e se estrutura. Essa capacidade permite que as ações ou as
vocalizações assumam significados em comum entre os indivíduos.

• A infraestrutura cognitiva necessária para a comunicação cooperativa já está em vigor em


seres humanos em uma idade muito precoce, antes que a criança comece a usar a língua
(TOMASELLO, 2008).

(LIMA, 2015)

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Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

Crianças com 1 ano de idade,


Segundo Nóbrega (2010), a
por exemplo, antes de usar a
expressão atenção conjunta é
língua, apontam para coisas
usada para indicar o conjunto
para compartilhar interesses e
de comportamentos triádicos,
dar informações, para indicar
que refletem o envolvimento
algo que lhes interessam pelas
da coordenação do bebê na
quais elas gostariam que o
sua interação com objetos e
outro se interessasse também,
pessoas, resultando em um
de modo que seu interesse seja
triângulo referencial – criança,
compartilhado (KENDON,
adulto e objeto ou evento.
2009).

(LIMA, 2015)

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Qual o papel do gesto na


aquisição da linguagem?

É importante observar a constituição dessas cenas de atenção


conjunta nos contextos de interação, visto que elas são locais
privilegiados para favorecer o desenvolvimento da linguagem e da
cognição, e garantir o engajamento e participação da criança nas
atividades realizadas  Aspectos que devem ser considerados no
espaço clínico também.

Com isso, as trocas comunicativas e olhar entre os sujeitos atraem o


foco do outro para o objeto ou evento, fundamentam a interação e
funcionam como feedback durante o contexto de atenção conjunta. E
no processo de aquisição da linguagem não é diferente, as crianças a
partir do olhar, dos gestos e das produções verbais se inserem nas
cenas de atenção conjunta, em interlocução com o parceiro, e estas
colaboram para o próprio aprimoramento das produções infantis.
(LIMA, 2015)

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Reflexões iniciais...

O que consideramos
desenvolvimento
neurotípico da
linguagem?

O que consideramos
como transtorno?

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Reflexões iniciais...
• O surgimento da linguagem verbal, natural e
espontâneo é, certamente, índice relevante
do desenvolvimento normal, bem como pode
ser tomado como preditivo do
desenvolvimento cognitivo e social da
criança.

(TAMANAHA; PERISSINOTO; ISOTANI, 2011)

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Reflexões iniciais...

• São elementos da dimensão linguística as habilidades fonológicas,


morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmáticas da criança. Por
sua vez, as habilidades de simbolização, representação,
conceituação, memória, percepção e sensação sustentam a
dimensão cognitiva. E, sintetizando, são consideradas na dimensão
da performance, situações comunicativas em que a criança
compreende o que ouve ou lê, formula a linguagem e a expressa na
fala ou escrita de maneira pertinente ao contexto.
(CARROW-WOOLFOLK; LYNCH, 1982)

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Reflexões iniciais...

• Alguns estudiosos vêm apontando que não é


possível identificar um único fator
desencadeador e/ou de sustentação da
linguagem, tanto no desenvolvimento
considerado típico como nos considerados
distintos ou atípicos.

(SUE; SUE; SUE, 2000; WALDEN; HERLEY, 2008)

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Reflexões iniciais...

Da extensão e velocidade no trajeto


Assim sendo, é a descrição do próprio percorrido e tomando como referência
desenvolvimento que possibilita a A assincronia no desenvolvimento a idade cronológica, a idade mental e o
distinção entre o suceder típico e o pode ser mensurada pela análise da desempenho em provas específicas, é
atípico da linguagem e a identificação trajetória do desenvolvimento da possível ao clínico a identificação e
de sinais de atraso ou de desvio em tal criança (THOMAS et al, 2009). diferenciação entre os padrões típicos,
processo. os de atraso e os de desordem de
linguagem.

DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

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Por um lado, consideramos


Por outro lado, consideramos
que a situação de atraso ou
que a situação de desvio,
retardo no processo de
desordem ou, ainda, distúrbio
linguagem retrata a cronologia
de linguagem está além da
do desenvolvimento como
cronologia.
referência.

Retrata alterações específicas no surgimento


Ocorre quando o surgimento de e no encadeamento de comportamentos
determinados comportamentos de comunicativos, como nos casos de DEL.
comunicação ou o encadeamento desses Refere-se, ainda, a um desvio nítido do
comportamentos é similar ao da maioria das processo de desenvolvimento infantil, com
crianças, porém com emergência ou ritmo aquisições de comportamentos incomuns à
lentificados e notadamente inferiores à comunicação e não esperados em nenhuma
idade mental da criança. faixa etária, como nos transtornos globais
de desenvolvimento.

(TAMANAHA; PERISSINOTO; ISOTANI, 2011)

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Período crítico x diagnóstico fonoaudiológico


“Entre dois e três anos de idade, a linguagem emerge através
da interação entre maturação e aprendizado pré-programado.
Entre os três anos de idade e a adolescência, a possibilidade
de aquisição primária da linguagem continua a ser boa; o
indivíduo parece ser mais sensível a estímulos durante este
período e preservar uma certa flexibilidade inata para a
organização de funções cerebrais para levar a cabo a
complexa integração de subprocessos necessários à adequada
elaboração da fala e da linguagem. Depois da puberdade, a
capacidade de auto-organização e ajuste às demandas
psicológicas do comportamento verbal declinam rapidamente.
O cérebro comporta-se como se tivesse se fixado daquela
maneira e as habilidades primárias e básicas não adquiridas
até então geralmente permanecem deficientes até o fim da
vida”
(LENNEBERG, 1967 apud SCARPA, 2001).

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Pinker (1994 apud Scarpa, 2001) afirma que a


aquisição de uma linguagem normal é garantida até a
idade de 6 anos, é comprometida entre 6 até pouco
depois da puberdade, e é rara daí para a frente. Este
autor chega a especular que o período crítico se
explica por mudanças maturacionais no cérebro, tais
como o declínio da taxa de metabolismo e do número
de neurônios durante a idade escolar e da diminuição
do metabolismo e do número de sinapses cerebrais na
adolescência.

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Escala de desenvolvimento infantil

Linguagem Linguagem Metalinguagem Leitura Escrita


compreensiva expressiva •Consciência Fonológica •Leitura de palavras e •Escrita temática
•Estímulos ambientais •Não-verbal •Consciência pseudopalavras •Ortografia
•Comandos verbais •Pragmática Fonoarticulatória •Compreensão leitora
•Semântica •Consciência Sintática
•Sintaxe •Nomeação Seriada Rápida
•Morfologia •Memória de Trabalho
Fonológica
•Fonologia

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Marco legal da primeira infância


Lei 13257/2016

Participação da família e do estado na proteção e


promoção da criança desenvolvendo programas e
ações, criando redes de proteção e cuidado à
criança;

Apoio às famílias incluindo visitas domiciliares e


programas de promoção da paternidade e
maternidade responsáveis, buscando articulação
das áreas de saúde, nutrição, educação, assistência
social, cultura, trabalho, habitação, meio ambiente e
Direitos Humanos, entre outras, com vistas ao
desenvolvimento integral da criança;

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Marco legal da primeira infância


Lei 13257/2016

Famílias em situação de vulnerabilidade e risco ou com direitos


violados para exercer seu papel protetivo de cuidado e
educação da criança na primeira infância, bem como as que têm
crianças com indicadores de risco ou deficiência terão
prioridade nas políticas sociais públicas;

Qualificação da formação profissional;

Programas que se destinam ao fortalecimento da família no


exercício de sua função de cuidado e educação de seus filhos na
primeira infância promoverão atividades centradas na criança,
focadas na família e baseadas na comunidade.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

A partir do Marco Legal a intervenção precoce deve ser oferecida à crianças e


seus familiares por profissionais qualificados, visando a promoção do
desenvolvimento infantil com a participação efetiva da família nas decisões e
intervenções com seus filhos;

Segundo Guralnick (1997), entre 1970 a 1995 existiu a primeira geração de


pesquisas sobre intervenção precoce: um período fértil de abordagens
terapêuticas e atividades diversificadas que evoluíram para programas de
intervenção precoce bem estabelecidos, com suportes e serviços para crianças
e suas famílias, sendo tais programas de responsabilidade da sociedade e
oferecidos para crianças com deficiências estabelecidas ou crianças cujo
desenvolvimento estava comprometido por fatores biológicos ou ambientais.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

Em 1998 houve a proposta de um modelo interacional,


afirmando que diversos fatores de risco e proteção
relacionados a características sociais, da família, pais e
criança afetavam os resultados da criança e dos pais nos
programas de intervenção precoce.

Assim os resultados do desenvolvimento infantil podem ser


mediados pelos comportamentos e atitudes dos pais que, por
sua vez, são influenciados por diversas variáveis: estressores,
saúde física e mental dos pais, recursos financeiros, recursos
sociais, apoio do cônjuge, características da criança, etc)

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

Dunst (2000) delineou uma terceira geração de pesquisas em intervenção precoce a


qual enfatizava “serviços centrados na família” em oposição a serviços centrados na
criança e ressaltava a importância de se mesclar experiências diárias que
valorizavam a competência de profissionais com as intervenções planejadas.

Para Landy e Menna (2006) a intervenção precoce também pode ser dirigida a
crianças de famílias de múltiplos riscos.

Assim, a intervenção precoce se destina a família de crianças com atraso no


desenvolvimento, crianças com deficiências estabelecidas e crianças que convivem
com fatores de risco, tanto biológicos quanto ambientais.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

• Embora o objetivo geral da intervenção • Esses objetivos são acompanhados por


precoce seja favorecer o desenvolvimento serviços individuais, terapêuticos,
infantil, para esses autores ela consiste desenvolvimentais e educacionais para a
em serviços multidisciplinares oferecidos criança em conjunto com apoios
para crianças de zero a 5 anos de idade planejados para as suas famílias
visando promover saúde e bem-estar (SHONKOFF, MEISEL, 2000).
infantil, minimizando atrasos de
desenvolvimento, remediando
deficiências emergentes ou existentes,
prevenido deterioração funcional e
promovendo a parentabilidade adaptativa
e o funcionamento familiar adequado.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

• A criança aprende e se desenvolve interagindo com seus familiares em


Conceitos importantes para
a intervenção precoce
(KEILTY, 2016):

experiências diárias e com objetos em ambientes estimuladores;


• A intervenção precoce não deve ser dirigida apenas à criança e as suas
necessidades, mas a toda família;
• Deve haver coordenação entre os vários serviços disponíveis para a
família;
• A intervenção precoce é apenas o começo. Todos os suportes são
oferecidos no presente, mas o futuro também tem que ser considerado.
Os profissionais e a família devem pensar em conjunto sobre as
habilidades das crianças após a intervenção precoce.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

• Encaminhamento e elegibilidade;
Componentes do processo
de intervenção precoce
(KEILTY, 2016):

• Necessidade de avaliação, considerando objetivos da família e necessidades para


o seu filho;
• Elaboração de um plano de intervenção embasado na avaliação realizada e na
parceria profissional-família;
• Implementação do plano de intervenção criado por meio de visitas de intervenção;
• Planejamento dos períodos de transição principalmente o que ocorrerá após o
período de intervenção precoce;
• Coordenação dos serviços por um profissional especialista em conduzir
programas de intervenção precoce e conhecedor dos serviços existentes na
comunidade.

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Intervenção precoce
(WILLIAMS, AIELLO, 2018)

• Por fim a importância de se intervir precocemente com crianças expostas à pobreza e outras
condições de risco são sinalizadas nos estudos longitudinais que apontam os efeitos
benéficos quando a criança atinge a vida adulta.

• Entre os benefícios apontados estão maiores ganhos salariais (GERTLER et al., 2014); maior
competência intelectual, realização acadêmica e conhecimento em geral (WALKER, CHANG,
VERA-HERNANDEZ, GRANTHAM-MCGREGOR, 2011), melhores índices de saúde
(CAMPBELL et al., 2014) e redução de violência e sintomas de depressão (WALKER et al.,
2011).

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