Você está na página 1de 3

Resolução caso prático TGDC I

Caso nº 79

Livro dos casos práti cos

 Teresa é menor, nos termos do artigo 122.º, do Código Civil (doravante,


denominado por CC), carecendo de capacidade de exercício (medida dos
direitos e obrigações que uma pessoa é suscetível de exercer, pessoal e
livremente), como disposto no artigo 123.º, do mesmo diploma;

 A incapacidade dos menores pode, no entanto, ser suprida pelo poder paternal
ou pelo tutor, nos termos previstos no artigo 124.º, CC;

 Neste caso, Teresa, menor de 17 anos, procede à compra de um iate, usando


o dinheiro que ganhara na lotaria, oferecendo-o a Gisela. Atendendo à
incapacidade de exercício de Teresa, teremos que avaliar se o seu ato se
encontra englobado nas exceções à incapacidade dos menores, previstas no
artigo 127.º, CC;

 No artigo 127.º/1, CC vêm dispostos os atos que os menores, ainda que


carecendo de incapacidade de exercício, estão autorizados a realizar.
Analisando este artigo, constamos que:

o A alínea a) só se aplica aos atos dos menores, com mais de 16 anos,


relativamente a bens que hajam sido adquiridos pelo seu trabalho;

o A alínea b) impõe a verificação de 3 requisitos cumulativos:

1. Que os negócios jurídicos sejam próprios da vida corrente do


menor;

2. A capacidade natural do menor, a qual, remetendo-se para o


artigo 263.º, CC, se entende como a capacidade de entender e
querer, exigida pela natureza do negócio a efetuar;

3. Que a despesa ou a disposição dos bens seja ou tenha sido de


pequena importância. Neste ponto contrapõem-se 2 análises
possíveis ao elemento literal, do preceito em causa, “pequena
importância”:

 Análise objetiva – diz-nos que o valor considerado de


pequena importância será igual para todos os sujeitos
menores, independentemente da sua situação financeira;
 Análise subjetiva – faz depender este elemento da
situação financeira do menor;

o Por fim, a alínea c) diz respeito aos negócios jurídicos ou a atos


praticados pelo menor, com a devida autorização, no âmbito da sua
profissão, arte ou ofício;

 Ora, no caso em análise, atendendo aos requisitos apresentados, podemos


concluir que a compra de um iate não se pode enquadrar nas exceções do
artigo 127.º/1, CC visto que:

o Quanto à alínea a), apesar de se tratar de um maior de 16 anos, Teresa


não comprou o iate com bens que haja adquirido pelo seu trabalho, mas
sim com dinheiro proveniente de um jogo;

o No que toca à alínea b), é natural entender que a compra de um iate,


independentemente, da situação financeira do menor (que, neste caso,
poderia ser considerada face ao montante elevado do prémio) e,
portanto, da análise objetiva ou subjetiva do preceito, não parece
enquadra-se nos negócios “próprios da vida corrente do menor”, nem
implica uma despesa de pequena importância;

o Por fim, quanto à alínea c), Teresa não procedeu à compra do iate, no
âmbito das suas competências profissionais;

 Visto isto, o negócio celebrado por Teresa será inválido, sendo anulável, nos
termos do artigo 125.º, CC. (atenção que este artigo, nomeadamente os
prazos, só se aplica aos negócios do menor já celebrados; nos casos em que
as partes ainda não tenham cumprido as suas obrigações aplica-se o regime
geral da anulabilidade do artigo 285.º, CC);

 A anulabilidade, arguida, dentro dos prazos e por quem tem legitimidade para
tal, nos termos do artigo 125.º, CC, tem eficácia retroativa – artigo 289.º/1, CC.
Isto significa que se o negócio de Teresa for anulado, o negócio tem-se como
não efetuado, ou seja, a propriedade do iate que, com a celebração do negócio
entre Teresa e Gisela, entra na esfera jurídica desta segunda, passa para a
esfera jurídica de Teresa, novamente; perante a anulação, os negócios não
produzem os seus efeitos, tais como a transmissão da propriedade;

 Assim, se o negócio for anulado, Gisela é obrigada a devolver o iate a Teresa;

 A incapacidade de Teresa podia, ainda, ser suprida pelo poder paternal ou pelo
tutor de Teresa, nos termos do artigo 124.º, CC - neste caso, o negócio seria
válido; o negócio podia ser confirmado, conforme o disposto no artigo 125.º/2,
CC;
 No caso de Teresa ter sido objeto de ação de acompanhamento, nos termos
do artigo 138.º, CC e seguintes, teríamos que atentar o disposto no artigo
154.º, CC, quanto aos atos do acompanhado:

o Se entendermos que o negócio celebrado entre Teresa e Gisela, foi


efetuado depois de anunciado o início do processo de
acompanhamento, este ato será anulável, após a decisão final,
somente se se mostrar prejudicial ao acompanhado, nos termos do
artigo 154.º/1, alínea b), CC;

o Se, por outro lado, nos termos do artigo 154.º/3, CC, o negócio tiver
sido celebrado antes do início do processo de acompanhamento,
aplicar-se-á o regime da incapacidade acidental, disposto no artigo
257.º, CC. O regime da incapacidade acidental dispõe que a declaração
negocial e, consequentemente o negócio por ela incitado, será anulável
se se verificar que o declarante (neste caso, Teresa), na altura do
negócio, não teria a perceção do sentido do seu ato ou que o negócio
se encontrava inquinado por falta de vontade;

 Nota: Podia arguir-se que Teresa não podia jogar no Totoloto, visto que este
faz parte de um conjunto de jogos a dinheiro interditos a menores. Logo, será
que o ato podia ser anulado? (algo para perguntar ao assistente!! Hei de
perguntar ao meu também)

Você também pode gostar