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Certificação e Qualidade:

reflexões sobre a avaliação de conformidade, prática que vem se consolidando


em resposta às exigências do mercado

José Augusto Allão Kendall Pinto de Abreu, Alexandre Eliasquevitch Garrido e Thaís Cabral F.
Pedreira1

Parte I – Alguns conceitos da Avaliação da Conformidade


Assistiu-se ao longo da década de 90 a uma proliferação de selos de qualidade
nos mais diversos setores e para o mais variado tipo de produtos ou serviços.
Trata-se de uma resposta do mercado a uma cada vez maior preocupação dos
consumidores e clientes com a qualidade dos produtos ou serviços que
adquirem.
As empresas passaram a preocupar-se em comprar melhor, testar o que
compravam, em produzir melhor e assegurar-se que o que produziam atendia
ao esperado pelos clientes. Por essa razão, práticas consagradas em outros
países, mas que não se tinham desenvolvido plenamente no nosso país
começaram a se difundir. É neste contexto que se disseminam os selos de
qualidade e começa a se desenvolver a certificação de produtos no Brasil.
Os selos de qualidade fazem parte de um conjunto de ferramentas e técnicas
relacionadas com a demonstração de que requisitos previamente especificados
para um produto ou serviço foram cumpridos. Essa atividade é tecnicamente
chamada de avaliação da conformidade. Assim, a avaliação da conformidade
envolve, dentre outras, atividades como a realização de ensaios, de inspeções,
a certificação ou a acreditação.
Usualmente, os requisitos para os produtos ou serviços são estabelecidos em
normas técnicas (que no Brasil são elaboradas pela ABNT – Associação
Brasileira de Normas Técnicas) ou regulamentos técnicos (que são
estabelecidos pelas autoridades do governo em diversos campos, de acordo
com os respectivos mandatos legais), mas podem também ser estabelecidos
em contratos.
As empresas cada vez mais procuram utilizar maneiras de transmitir da melhor
forma possível a informação do atendimento dos requisitos das normas
técnicas pelos seus produtos. Do ponto de vista técnico, a avaliação da
conformidade considera os mecanismos de demonstração da conformidade em
três grandes categorias:
- declaração do fornecedor: quando a empresa afirma, sob sua
responsabilidade que o produto ou serviço atende aos requisitos da norma
técnica. Embora seja o meio mais barato e simples, depende essencialmente
da reputação da empresa e da credibilidade que os clientes atribuem a essa
declaração;

1
Consultores da Sextante Ltda, empresa de consultoria especializada em normalização, regulamentação
técnica e avaliação da conformidade
- qualificação pelos clientes (ou qualificação de fornecedores): quando é o
cliente que verifica o atendimento do produto aos requisitos das normas
técnicas; neste caso a empresa aceita que o cliente realize inspeções, testes e
avaliações da qualidade dos seus produtos antes e durante os fornecimentos.
É uma ferramenta eficaz, mas pode ser bastante custosa, em particular quando
a empresa tem diversos clientes diferentes que podem estabelecer condições
diferentes de controle e acompanhamento da produção;
- certificação: quando uma entidade de terceira parte (isto é, independente de
que fornece ou fabrica e de quem compra ou representa os seus interesses),
com competência técnica, testa o produto ou serviço e atesta publicamente que
ele atende aos requisitos das normas técnicas. Muitas vezes, o processo da
avaliação do produto inclui uma verificação do processo de produção.
Normalmente, o custo da certificação fica entre o custo da declaração do
fornecedor e o custo da qualificação pelos clientes. Outra das vantagens da
certificação é justamente eliminar múltiplas avaliações por parte dos clientes.
A certificação é efetuada por organismos de certificação, que são organizações
de caráter tecnológico, independentes das partes envolvidas, que efetuam as
verificações e avaliações no produto e que funcionam de acordo com rígidas
regras estabelecidas em normas técnicas internacionais de aceitação
generalizada, para assegurar a sua credibilidade. A verificação da competência
técnica dos organismos de certificação é feita mediante a sua acreditação. O
organismo de acreditação no Brasil é o Inmetro.
Assim, cabe a pergunta sobre qual o mecanismo mais adequado para uma
empresa?
Essa discussão será apresentada na segunda parte do presente artigo (na
próxima edição).

Revista Metalurgia e Materiais, no. 561, nov.2005

Certificação e Qualidade:
há várias formas de dizer que um produto ou serviço atende os requisitos e
normas técnicas.
José Augusto Allão Kendall Pinto de Abreu, Alexandre Eliasquevitch Garrido e Thaís Cabral F.
Pedreira2

Parte II – Algumas reflexões


Na primeira parte deste artigo foi apresentada uma discussão sobre a
certificação e selos de qualidade. A seguinte pergunta foi lançada: qual desses
mecanismos é o mais adequado para uma empresa. Obviamente não há uma
resposta única, mas um bom critério é considerar o que o mercado acha.

2
Consultores da Sextante Ltda, empresa de consultoria especializada em normalização, regulamentação
técnica e avaliação da conformidade.
De fato, compreende-se que é decisiva a opinião que os clientes (potenciais ou
reais) depositam nas diferentes alternativas e isto refere-se em grande parte à
credibilidade que eles vêm na maneira de como se assegura essa
conformidade. Por um lado, se o fornecedor for uma empresa consagrada no
mercado, com uma reputação de grande credibilidade, é provável que para um
grande número de clientes ou potenciais clientes seja suficiente uma
declaração, que pode ser formal, de que os produtos atendem aos requisitos
das normas técnicas. Mas quando a empresa não é conhecida (por exemplo
por estar se introduzindo num novo mercado) a alternativa da declaração do
fornecedor não será apropriada.
Outro fator importante além da reputação do fabricante ou fornecedor, é o
impacto que o produto ou serviço em desacordo com as normas técnicas têm
na perspectiva do cliente, isto é, se resulta em danos à propriedade, em
problemas para a saúde, ou, no caso em que o cliente vai incorporar esse
produto ou serviço, como um insumo, num novo produto ou serviço, se o não
atendimento às normas técnicas compromete a qualidade de novo produto
produzido pelo cliente. Nestes casos, a despeito da reputação do fornecedor, o
cliente provavelmente desejará se assegurar da conformidade do produto por
outros meios.
Os selos de qualidade que têm proliferado são iniciativas de comunicar ao
mercado que um produto ou serviço está conforme um requisito especificado,
normalmente uma norma técnica. Neste sentido, é muitas vezes entendido
como sendo uma forma de certificação. Mas nem sempre é.
Algumas vezes os selos de qualidade são implementados e geridos por
organismos competentes tecnicamente e com a necessária independência em
relação às partes envolvidas. Nestes casos, os selos de qualidade nada mais
são que programas de certificação, com toda a credibilidade que lhes é
inerente.
Outras vezes são iniciativas de organizações empresariais com o propósito de
promover a qualidade numa abordagem setorial. Normalmente contam com o
apropriado rigor técnico na administração do seu selo. Não obstante, não se
pode dizer que possam assegurar a independência e credibilidade de um
programa de certificação.
Há alguns casos, em especial na área da saúde, em grande parte devido a
influências culturais norte-americanas, em que associações profissionais
também estabeleceram selos de qualidade para produtos, que repousam em
grande extensão na reputação que as associações profissionais têm junto à
população.
Evidentemente, a credibilidade não é uma característica objetiva e depende
essencialmente da percepção de quem recebe a informação, isto é, não
adianta nada quem afirma alguma coisa considerar-se com credibilidade se as
pessoas a quem é dirigida essa afirmação não reconhecem essa credibilidade.
Por outro lado, os organismos de certificação são organizações especializadas
nessas atividades e os custos dos seus serviços refletem esse
profissionalismo. As organizações de outra natureza que se envolvem no
desenvolvimento de selos da qualidade precisam criar estruturas específicas
com essa finalidade, do que resulta que normalmente os selos de qualidade
que são implementados por organizações não especializados tendem a ser
mais caros.
Um dos pontos que merece maior reflexão é a questão da transparência e a da
independência na operação. É evidente que não se pode julgar a priori que um
selo conduzido por uma organização empresarial não pode assegurar a
independência das suas decisões. Mas é óbvio que são necessários esforços
adicionais para convencer os interessados dessa independência.
Assim, os selos de qualidade são meios legítimos de se diferenciarem produtos
no mercado mas abrangem iniciativas que são programas de certificação e
programas de outra natureza. Muitas vezes o mercado não está preparado
para distinguir aqueles que legitimamente são programas de certificação de
outros que na aparência o são mas que na realidade estão mais próximos de
declarações de fornecedor, ou seja, iniciativas de primeira parte.
As empresas devem procurar identificar com clareza quais são as expectativas
dos seus clientes e procurara atender a essas expectativas da maneira mais
eficaz possível. Programas de certificação acreditados gozam da melhor
reputação junto ao mercado e são um mecanismo bastante eficaz para
diferenciação no mercado.

Revista Metalurgia e Materiais, no.562, dez. 2005

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