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O filho do meu chefe

Marcelle Oliveira
Copyright © 2020 Marcelle Oliveira
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Angel Parker
Sempre fui sozinha e independente. Dona de uma personalidade forte e
impetuosa. Mas bastou Jason Collins adentrar aquela empresa para ferrar com todas as
minhas estruturas. Quando o filho do meu chefe decidiu, junto a mim, reerguer os negócios
falidos de seu pai, todas as minhas seguranças se esvaíram. Encontrei-me tentada por
aquele homem extremamente interessante, poderoso e cheio de mistérios. Mas o meu
coração não poderia ser entregue. Eu carregava uma promessa dentro de mim. Diante de
uma terrível decepção amorosa, prometi a mim mesma não me envolver em histórias
toscas de amor.

Jason Collins
Assim que cheguei de Londres, não pude negar que me senti completamente
abalado por uma das personalidades mais fortes que já conheci em toda a minha vida. Os
olhos castanhos expressivos, a voz imponente e cheia de atitude, tudo em Angel Parker era
afrodisíaco. No entanto, os traumas de uma adolescência conturbada poderiam me
impedir de viver um grande amor?
Angel Parker e Jason Collins foram feitos um para o outro, se não fossem os traumas que o
passado deixou impresso em suas vidas.
Girei em meus saltos e saí desorientada da sala do meu chefe. Os
projetos ainda tremiam em minhas mãos, juntamente com a ansiedade que me
consumia loucamente.
Era a décima vez que eu tentava agradar a Victor Collins, apenas
neste mês. Ele era um senhor muito rabugento que tratava todos os seus
subordinados com muito desdém. Para ele, apenas as suas ideias, o seu
trabalho que realmente valiam dentro daquela empresa. Qualquer pessoa que
pretendesse retirar uma vírgula de seus projetos, ele se incumbia logo de
cortar as asas, e eu era uma dessas que sempre tentava enfrentar o seu jeito
duro e irredutível de lidar com a equipe.
Fazia dois anos que eu estava empregada na Collins Construtora. A
empresa renomada desenvolvia projetos de shoppings, condomínios,
hospitais e, agora, o grande xodó de Sr. Victor, um resort na República
Dominicana.
Por mais que a equipe tentasse inovar os projetos, buscar novas
parcerias, o sempre tão tradicional Victor Collins barrava qualquer tipo de
renovação nos trâmites da empresa, o que já estava fazendo com que o grupo
Collins não se destacasse mais no mercado, como sempre ocorrera nos
últimos anos.
— Sr. Victor não aceitou, outra vez, a sugestão de alterar esta parte
do projeto, Leonard. — jogo o corpo exausto na cadeira, desabafando com o
meu amigo.
Ele termina o café e deposita a xícara sobre a mesa.
— Novidade! Esse velho vai acabar com a empresa se não começar
a ouvir a equipe, trabalhar junto aos nossos ideais. — noto os seus olhos
revoltados. — Porra! Saímos da faculdade há pouco tempo, fazemos cursos
todos os anos, nos atualizamos constantemente! Podemos ajudá-lo a reerguer
os negócios e fazer com que a Collins Construtora volte a disputar com as
concorrentes no mercado!
— Exatamente. — cruzo os braços, desanimada. — E quer saber?
Eu desisto desses embates com Sr. Victor. Para mim, chega. O que ele quiser
fazer com os seus negócios, que faça.
Deslizo a minha cadeira junto à mesa de trabalho e tento voltar a
me concentrar em meus e-mails. Contudo Leonard ainda me fala de maneira
mais contida.
— Eu até acreditaria em você, Angel, se eu não te conhecesse, mas
eu duvido muito que na reunião das três, você não vá se colocar
brilhantemente frente às asneiras proferidas por Sr. Victor.
Sorrio, após inspirar profundamente.
— Leonard, não me desafie.
O meu amigo pisca o olho para mim, antes de colocar os fones de
ouvido, também tentando retornar aos seus afazeres.
Os meus olhos apenas se atentam ao relógio prateado na parede,
desejando que os ponteiros se arrastem até as três da tarde. Eu não estava em
um bom dia, para participar de mais uma reunião desgastante. Por um lado, o
que ainda me animava na empresa era a equipe, que sempre fora bastante
unida. Tratávamos sempre de realinhar as orientações de Sr. Victor, após a
reunião e, na maioria das vezes, descartávamos alguns dos detalhes e
fazíamos do nosso jeito, quando o rabugento não percebia.
— Vamos, equipe? — May, a secretária, nos convoca de repente.
Mal havia me dado conta e a reunião das três horas já havia chegado.
Levantei da cadeira, deixando a ideia de alteração de projeto dentro
da gaveta, também tentava deixar lá todos os argumentos. Eu iria ficar muda,
completamente muda, pois não aguentava mais tantas humilhações. O que
ainda me animava, pelo menos, era o bom salário que recebia ao final do
mês.
Leonard me acompanhou até a sala de reunião e abriu a porta para
mim, com um sorriso desanimado nos lábios. Era visível o abatimento nos
rostos cansados das pessoas. Ninguém mais suportava aturar as sandices de
nosso chefe.
Assim que entramos na sala, Sr. Victor já estava sentado em sua
cadeira de honra e nos olhava de maneira compenetrada. As mãos
entrelaçadas sob o queixo e a xícara vermelha de café ao lado de uma pilha
de papéis. Hoje, não sairíamos daqui ainda com dia.
— Boa tarde a todos. — ele pigarra, antes de continuar. — Como
sabem, estamos enfrentando uma avalanche de problemas nesta empresa. —
sinto o cotovelo de Leonard cutucar a minha costela. — As parceiras estão
fracassando no mercado e, com isso, acabam nos levando juntos pelo ralo da
falência.
Mordo a ponta do lápis, terrivelmente incomodada com a fala de Sr.
Victor. Havia hipocrisia em tudo o que ele dizia. E quando me dou conta,
sinto as palavras escapulirem, de repente, por minha boca.
— Senhor, perdoe-me, mas a equipe já o alertou quanto à falência,
há um tempo, e por isso que sempre buscamos...
— Srta. Angel, eu não preciso que refresque a minha memória, eu
não faço questão da sua opinião neste momento.
Umedeço os lábios, segurando a raiva por dentro. Abaixo o rosto
não querendo mais encarar o rabugento nos olhos. Estava irritada por não
conseguir manter a minha boca calada e, sobretudo, por não fazer Sr. Victor
entender que o erro, a falência, e tudo de negativo que estava acontecendo na
empresa, neste momento, era culpa dele, exclusivamente dele, pois sempre
trabalhávamos para o sucesso dos negócios, enquanto ele, orgulhosamente,
ignorava-nos.
Após observar os rostos desestimulados à minha frente, resolvo
permanecer no embate com o meu chefe.
— Sim, mas se o senhor nos escutasse, agora não estaria passando
por esse tipo de situação! — bato o lápis sobre a mesa, enquanto falo. — Já
refletiu sobre a dimensão do patrimônio construído pelo senhor e pelo seu
irmão Ronny Collins, nos últimos anos? Quanto tempo de vida o senhor
dispensou a essa empresa? E, agora, por orgulho, põe tudo a perder?
Relaxo na cadeira, sentindo que havia me livrado de um bolo
imenso de palavras que já estava há semanas entalado em minha garganta. Os
meus amigos me encaram assustados, enquanto Estefani faz um sinal com as
mãos para que eu me acalme.
— Angel, por favor, me respeite. — Sr. Victor grita, batendo a mão
sobre a mesa. — Enquanto eu estava lutando por esse empreendimento, você
estava chorando à espera de sua mãe, para limpar as suas fraldas. — o dedo
em riste. — Melhor você fechar a sua boca e me deixar concluir a reunião.
— Sempre isso. — retruco — Esse autoritarismo desmedido! Eu
não vou mais tentar fazê-lo enxergar o primordial, que é confiar no trabalho
da sua equipe.
— E quem te falou que eu não confio no trabalho da equipe,
menina? — Sr. Victor está de pé, prestes a voar em meu pescoço. — Eu já
despedi alguém nesse tempo? Por mais que me afrontem e venham com
ideias mirabolantes que não condizem com o nicho do mercado, eu sempre
mantive vocês aqui, com um bom salário.
Ouço a suspiros e burburinhos. Certamente existiam mais corações
agoniados naquela sala, além do meu.
— Senhor, pagar os direitos de funcionários tão antigos poderia
levá-lo à falência de imediato... — Leonard rebate, fazendo Sr. Victor bufar
irritado.
— Bom, calem a boca, para eu poder prosseguir. — desconversa,
passando o lenço marrom pelo rosto suado, antes de se sentar, tentando
acalmar os ânimos. — O meu filho está chegando da Europa esta noite. Ele
virá trabalhar conosco para nos auxiliar nas demandas. — despeja.
E um silêncio se instaura.
As pessoas se entreolham.
Se não bastasse a arrogância do pai, agora teria que aturar
também a petulância do filho?
Estou sem esperanças de que isso possa dar certo.
— O meu filho é um homem muito competente. — continua,
orgulhoso. — Ele é formado em Engenharia, pela Universidade de Harvard, e
possui Doutorado em Engenharia Civil, em Massachusetts. O que podemos
esperar é que o mercado volte a nos reconhecer como uma ameaça para a
concorrência, assim que Jason Collins pisar nesta empresa.
O burburinho se inicia.
Sr. Victor nos observa com o olhar apreensivo, enquanto esfrega
uma mão na outra de maneira ansiosa.
— Aposto que o filho dele seja a sua cópia fiel. — May cochicha
para Leonard.
— Espero que ouça ao filho, pelo menos! Se ele estiver realmente
disposto a mudar a rotina dessa empresa. — digo aos dois, enquanto Sr.
Victor continua tentando convencer a equipe de que está fazendo o melhor
pela Collins Construtora:
— Eu sei que vocês estão tão apreensivos quanto eu, mas eu não
vejo outra saída.
Reviro os olhos, imaginando que a outra saída seria dar o devido
crédito ao nosso trabalho, mas... enfim... Apenas resolvo me calar a me
indispor mais uma vez.
— Amanhã será um dia muito importante para a Collins
Construtora. — Sr. Victor discursa, dando um tom de esperança à sua voz. —
Não podemos esmorecer diante dos desafios, principalmente do grandioso
projeto da República Dominicana. — após se levantar, ajeitando a calça de
alfaiataria no corpo, ele finalmente conclui a enfadante reunião. — Tenham
uma boa noite.
Saímos daquela sala, em silêncio, preocupados com os rumos da
construtora. Estávamos todos com a corda no pescoço, prestes a perdermos
nossos excelentes salários, bem como a autoestima, já que éramos bons
profissionais que não recebiam o devido reconhecimento, há muitos anos.
— Eu preciso tomar todas! — Leonard reclama, ao mesmo tempo
em que desliga o computador e arruma os seus pertences por cima da mesa.
— Não exagere, querido, você precisa estar aqui, amanhã, com a
sua melhor cara de trouxa. — Estefani implica, já com a bolsa no ombro.
Sento sobre a mesa, abraçando as pastas de projetos contra o corpo,
sugerindo aos meus amigos:
— Que tal irmos ao pub, afogar todas as mágoas?
Imediatamente, eles concordam, optando por uma noite agradável,
após o maçante expediente.

***

Já era noite, quando deixamos a empresa, em direção ao pub


elegante que ficava em uma das esquinas do quarteirão.
May, Leonard, Luan e Estefani estavam apreensivos quanto à
notícia de que o filho gabaritado de Sr. Victor iria chegar de Londres, para
tentar reerguer a empresa do pai, que já se encontrava na iminência de falir.
— Na minha humilde opinião, vai ser um inferno! — May
esbraveja, bebendo um copo de uísque sem culpa alguma. — Imagina se já
não aturamos Sr. Victor, ter que aturar também o filho!
Estávamos em uma das mesas daquele requintado ambiente.
Leonard fumava, enquanto eu bebia uma boa dose de tequila.
— Mas, também, não devemos ser tão resistentes! — rebato. —
Quem sabe ele vai trazer novos ares ao lugar, a empresa vai voltar a
deslanchar novamente...
— Eu não tenho esperanças. — Leonard afirma categoricamente,
antes de dar mais uma tragada em seu cigarro.
— Eu só não vou embora, porque os salários da Collins são
imbatíveis, inclusive já recebi diversas propostas, até mesmo de trabalhar em
outro estado. — Luan esnoba, mastigando uns petiscos.
Enquanto isso, observo Leonard franzir o cenho, antes de
aconselhar o colega.
— Se eu fosse você, Luan, seguiria os seus instintos, cara. A
Collins não durará nem mais um ano!
— Quanto pessimismo. — critico, recusando do garçom mais uma
dose de bebida. — Estou decidida a dar uma chance ao filho do chefe.
— Jason Collins. — May debocha, revirando os olhos. — Já
imagino a pompa com que chegará aqui.
— Calma. Temos que acolher o cara, se ficarmos blindados para a
mudança, seremos exatamente como Sr. Victor. — argumento, tentando fazê-
los enxergar de que não poderia ficar pior do que já estava.
— Tem razão, Angel. Concordo com você. — Leonard assente, me
olhando nos olhos, enquanto os outros ficam calados, entretidos com o
pianista que se colocava à frente do instrumento, junto a uma nuvem densa de
gelo seco.
Passo a língua pelos lábios alcoólicos, imaginando que o filho do
chefe nem ao menos havia chegado, e as inquietações já perturbavam toda a
equipe.
Até quando viveríamos inseguros dentro da Collins Construtora?
O pianista dá início à apresentação, enquanto May e Estefani
dividem a atenção com a música e com um grupo de rapazes que se
acomodava mais ao fundo do pub.
Luan sorri debochado com Leonard, observando os olhares gulosos
das duas moças. Pelo jeito, a nuvem negra de inquietações havia dissipado.
Apesar de estar junto aos meus amigos, ainda sentia o cansaço
extremo consumir cada célula de meu corpo. Estava rendida à exaustão que a
empresa de Victor Collins trazia aos meus dias. Em meio a um suspiro,
verifico o relógio e noto que já são quase onze da noite.
— Queridos, eu preciso ir. — digo, retirando olhares de surpresa
dos meus amigos. — Ainda vou abastecer o carro. — levanto da mesa e sinto
uma leve tontura por conta da tequila, mas nada que me atrapalhasse ao
volante.
— Não entendo por que você mora naquela cabana! — Leonard
acende outro cigarro, enquanto me enche a paciência. — Tão distante de
tudo!
— Se você morasse em Nova York, pelo menos uma vez na vida,
iria me entender bem. — May e Estefani concordam comigo. — Eu amo estar
em paz, em meio à natureza... os cervos sempre aparecem por lá, para me dar
bom dia, e os passarinhos me acordam nas manhãs mais quentes. Naquela
cabana, eu me esqueço inclusive da existência de Sr. Victor.
Os meus amigos sorriem, rendidos aos meus argumentos.
— Ok, Branca de Neve, tenha uma boa noite. — Leonard era
irritante.
Reviro os olhos, acenando para o pessoal do trabalho, com um
sorrisinho desanimado.
Enquanto pago a comanda, imagino o que poderia estar prestes a
acontecer nos próximos dias. Pensar que todos nós corremos riscos de perder
os nossos empregos me incomoda de maneira absurda. Apenas por elucubrar
as portas da empresa se fechando, uma dor aguda atravessa o meu coração.
Eu amava aquele lugar, apesar de tudo. Já havia contribuído com muitos dias
e noites de trabalho duro pelos negócios de Sr. Victor. Certamente, esses
seriam os meus pensamentos durante mais uma noite insone.
Empurro a porta do pub e um vento frio bagunça os meus cabelos.
Entro no carro e saio em direção à cabana, imaginando o tanto que eu gostava
de estar verdadeiramente sozinha, reenergizando os meus pensamentos, ao
final do expediente de trabalho. Nos dias mais frios, quando chegava em
casa, costumava acender a lareira e ler um bom livro, já nas noites mais
amenas, tomava um bom chá na varanda. Sempre fui muito independente e
exatamente por isso que gostava de dividir a minha rotina comigo mesma,
espairecendo dos dramas que me consumiam a saúde psicológica, naquela
empresa.
Os meus pais ficaram na Carolina do Norte, assim que recebi essa
proposta de emprego. Quando terminei a faculdade, não demorou muito para
eu ser convidada por Sr. Victor a trabalhar na Collins Construtora, por
indicação do CEO da empresa onde estagiei. O que eu não poderia imaginar é
o quanto seria desgastante. O velho estava sempre de mau humor e me
tratava como um verdadeiro lixo.
Dirigi mais um pouco e imaginei que deveria depositar todas as
esperanças na vinda de Jason Collins, afinal de contas o filho do chefe teria
que fazer alguma diferença naquela empresa. Ou eu teria que planejar o meu
retorno para a Carolina do Norte, e nada mais desanimador que estar de volta
à casa dos pais, aos vinte e cinco anos de idade, depois de uma vida
independente consolidada.
Apesar de estar sozinha, solteira, eu não sentia falta de um
relacionamento. Vez ou outra, eu dormia na casa de Leonard. Ele era uma
espécie de amizade colorida. Mas nunca passamos de beijos e de noites
quentes regadas a vinho, sabíamos encarar o nosso relacionamento aberto
com muita maturidade. Inclusive, no ambiente de trabalho, ninguém sabia a
respeito de nós dois, porque, na verdade, nós dois nunca existiu. Éramos bons
amigos e apenas isso.
Assim que parei para abastecer o carro, notei o posto deserto. Já era
quase meia-noite e imediatamente me arrependi por estar correndo riscos
naquele lugar inóspito.
Depositei a bomba no carro e olhei ao redor, ouvindo, ao mesmo
tempo, um carro se aproximar. O meu coração alterou os batimentos, à
medida em que eu tentava encher o tanque, mas os números não avançavam
com a rapidez que eu desejava, no marcador digital.
De repente, o carro encostou. A minha boca ressecou, apenas por
fitar o veículo preto estacionando ao meu lado. O que me restava era apenas
mentalizar para onde eu poderia correr, caso algo de suspeito acontecesse.
Assim que terminava de completar o tanque, o vidro do carro preto
se abaixou.
Os meus olhos arregalaram quando fitei um homem bonito. Bonito,
não, lindo. Um galã de Hollywood, um modelo da Versace, algo do tipo.
Céus, de onde havia saído aquela grata surpresa?
— Boa noite. — que voz! — Desculpas se eu te assustei. Não tive
intenção alguma.
Terminei de abastecer o carro e mal me dei conta que um sorriso
bobo estava desenhado em meus lábios.
— Imagina. — digo, ajeitando uma mecha por de trás da orelha. —
Aqui é deserto e por isso fiquei preocupada quando o seu carro estacionou,
mas agora vejo que está tudo bem.
E quem disse que beleza é sinônimo de bom-caratismo, Angel
Parker?
Havia perdido o juízo.
Observo curiosa o belo homem em seu carro de luxo, à minha
frente. Ele tem as mãos sobre o volante e, enquanto fala, aparecem covinhas
em sua bochecha.
Um charme.
— Você sabe me dizer onde eu consigo um restaurante aberto a
essa hora? Um McDonald’s que seja...
— Aqui perto tem uma lanchonete. — estava prestes a convidá-lo
para a minha casa. — Não é um ambiente muito legal, mas lá servem tacos
deliciosos. Pertence a uma mexicana.
— Eu detesto comida mexicana. — é categórico.
Os olhos pretos tão intensos me analisam.
Coço o alto da cabeça, tentando me lembrar aonde o galã poderia
saciar a sua fome.
— Então, se você seguir por mais uns dez quilômetros, poderá
encontrar uma loja de conveniência...
— Ok, obrigado. — ele faz menção de fechar o vidro do carro, mas
logo pausa. — Qual é o seu nome?
— Angel, Angel Parker.
— Obrigado, Angel.
O vidro imediatamente se fecha e o rapaz sai em disparada em
direção à tal loja de conveniência. Coitado, preferia comer congelados a
saborear aqueles tacos maravilhosos. Enfim, cada um com as suas escolhas.
Assim que me sento ao volante, imagino que não é uma má ideia
comprar uns tacos para levar para casa. Hoje, praticamente não almocei,
estudando e alterando os projetos que foram dolorosamente ignorados por Sr.
Victor.
Decidida, dou a partida no carro e vou em direção à Casa
Mexicana. Era um ambiente simples que ficava há poucos metros dali.
Costumava ir até lá quando a fome apertava no meio da noite, ou quando eu
não estava a fim de ir para o cooktop ou de comer congelados.
Assim que eu chego ao estacionamento, os meus olhos não
acreditam no que veem. O tal carro preto estacionado à beira da estrada, um
pouco antes do pequeno portão da lanchonete.
O cara além de lindo era um tremendo mentiroso!
Entretanto, a presença do bonitão não me intimida. Adentro
determinada a lanchonete e não é preciso de muito esforço para encontrá-lo
sentado em uma das mesas da Casa Mexicana, devorando os tacos, além de
uma porção de nachos que já se encontrava ao lado de seu refrigerante,
esperando também ser vencida pela fome devoradora do executivo. Ele só
poderia ser um, afinal estava de terno a essas horas.
Chego ao balcão, debruçando em meus cotovelos. A garçonete para
imediatamente de lavar as louças, para me atender. Enquanto isso, espicho os
olhos em direção ao belo moreno e a fome do rapaz era tanta, que mal notou
a minha presença, ou talvez não tivesse boa memória e já havia se esquecido
do meu semblante.
— Quero cinco tacos para viagem, por favor. — solicitei, olhando
ainda pelo canto dos olhos para o bonitão, imaginando que a minha fome era
tão intensa quanto a dele.
O homem faz menção de pegar o nacho na cestinha e finalmente me
olha surpreso, limpando a boca com o guardanapo. Ele estava completamente
sem graça, talvez envergonhado por ter mentido.
Relaxo as costas contra o balcão com um sorriso malicioso
desenhado na boca.
— Parece estar bom, não é mesmo? — ironizo.
Ele sorri, e as minhas pernas perdem as forças.
Sexy.
— Desculpa, Angel... — uau, ainda lembrava do meu nome. — Eu
menti porque eu não confio em estranhos. — ele faz um sinal para que eu me
sente à sua mesa. Obviamente, aceito. — Você acha que eu confiaria em uma
menina sozinha, em um posto de gasolina vazio, num lugar deserto, quase de
madrugada? Ainda mais que não vi se estava acompanhada.
Estou boquiaberta. O homem fala de maneira tão séria que acaba
me convencendo que eu poderia, sim, ser uma ameaça.
— Você está falando sério? — pergunto, recebendo o embrulho de
tacos das mãos da garçonete.
— Infelizmente, sim. — e ele me encara com as sobrancelhas
tortas.
— Mas, agora, pelo o que pode ver, não sou nenhuma criminosa ou
algo do tipo. — relaxo em minha cadeira, tentando entender aonde o belo
rapaz pretendia chegar.
— Tem certeza? — ele me pergunta.
Gargalho.
— Estou brincando, Angel, mas sinceramente não confiei no
primeiro momento em que te vi naquele lugar, afinal de contas, estou com
uma mala de dólares no carro e não queria correr riscos. — ele fala
despretensiosamente, enquanto engole os nachos como se fossem pipocas.
— Pelo jeito, agora, está confiando em mim. — completo,
observando-o beber o refrigerante.
— Estou sim. — então, ele deposita uma mão sobre a minha.
Estremeço com aquele gesto. Rapidamente analiso e não vejo aliança alguma.
— Você mora por aqui?
— Sim... eu moro em uma cabana. — ele me ouve, atentamente,
analisando com cuidado cada cantinho do meu rosto. — Os meus amigos me
julgam louca, mas é a melhor forma de eu encontrar a paz e descansar a
minha mente.
Retiro a minha mão da dele, para jogar os meus cabelos para trás.
Aquele homem exalava luxúria. Estava preocupada com os rumos
dos meus instintos.
— Eu não acho você tão louca, a não ser que me diga que mora
sozinha.
Sorrio.
— Sim, eu moro sozinha. — céus, ele estava despindo a minha vida
inteira. Aonde isso ia parar? — E será que eu deveria confiar em você? —
pergunto.
O belo homem ajeita os cotovelos sobre a mesa e me encara nos
olhos de maneira sedutora. Imediatamente mordo os lábios.
— Se me der uma chance, eu te dou alguns bons motivos para você
confiar em mim.
Semicerro os olhos, focando apenas na boca bem desenhada. O seu
rosto era bruto e angelical ao mesmo tempo, os olhos escuros, tão escuros
quanto a madrugada. A língua tentadoramente deliciosa desliza por seus
lábios, com o intuito de me enlouquecer. Aperto o embrulho de tacos nas
mãos, quando sinto o bonitão se aproximar de mim, sutilmente percebo que a
nossa respiração alterna uma com a outra. Eu não sei o que o belo executivo
pretendia, mas como num instinto selvagem, apenas balbucio, sentindo o seu
rosto bem próximo ao meu.
— Eu quero.
E numa fração de segundos, as nossas bocas se unem em um beijo
sôfrego. O meu corpo imediatamente esquenta de tesão. Eu só poderia estar
sonhando por ter encontrado um homem lindo, perdido na noite, apenas com
dólares no carro.
Cessamos o nosso beijo, de repente, pois o clima havia esquentado
no meio de nossas pernas. O rapaz se levanta da cadeira, disfarçando uma
leve ereção, para alegria dos meus olhos que encaravam aquele delicioso
volume. Então, ele estica a sua mão para mim. Assim que seguro em seus
dedos, ele leva a minha mão até a sua boca, ainda quente por meus lábios, e
beija o meu dorso sedutoramente.
Perco o ar, por segundos, com tanto charme.
Ao sair, após acertar a conta, o belo homem me abraça e conduz o
meu corpo em direção ao carro.
Estava excitada, o sabor da boca do moreno era intenso, eu
precisava provar um pouco mais daquela imoralidade.
Chegamos próximos ao carro de luxo. O meu coração pulsava cheio
de desejo. O rapaz apenas me olha compenetradamente nos olhos, antes de
grudar o corpo inteiro ao meu. Estou estrategicamente entre o moreno e o
veículo, prestes a desfalecer tamanha sensação que perpassa cada parte de
meu corpo.
— Qual é o seu nome? — sussurro, sentindo os seus lábios quentes
em meu pescoço.
— Clarck.
Não tenho tempo de perguntar mais nada. Clarck levanta os meus
cabelos castanhos com as mãos, enquanto me beija a boca e gruda o pau duro
contra o meu corpo. Estou rendida como se eu fosse uma adolescente nas
mãos de um homem experiente e maduro, no entanto calculávamos quase a
mesma idade.
Sinto as suas mãos preencherem a minha cintura. Clarck desce uma
delas até o final de minha saia. Sorrio em seus lábios sentindo cócegas em
minha coxa. Sugo a sua língua saborosa, sentindo os seus dedos subirem em
direção à minha calcinha. O homem morde o meu lábio assim que encontra a
minha boceta melada. As pontas dos seus dedos exploram as camadas
quentes de meu sexo, me fazendo arrepiar e revirar os olhos de tesão. O que
me resta é explorar as suas costas, intrometendo as minhas mãos por debaixo
de sua camisa social branca e encontrar a sua pele quente e levemente suada.
Os músculos de suas costas se contraem a cada movimento desferido em
minha boceta.
Lambo o seu lóbulo e gemo em seu ouvido.
— Ai...
De repente, Clarck abre a porta de trás do carro, como um convite.
Imediatamente, deito-me na poltrona, sem titubear, e o delicioso moreno vem
para cima do meu corpo, desfazendo o nó da gravata, lançando-me um olhar
sério.
Ele era forte, perfumado e lindo como um deus grego.
As suas mãos se adiantam em meu decote, retirando os meus seios
para fora, e eu arfo a cada lambida em meus mamilos. Estou molhada para
ele, loucamente excitada. O homem coloca o pau duro e melado para fora da
calça e eu mordo os lábios de tesão. Clarck abre as minhas pernas e puxa a
minha calcinha por baixo da saia lápis. Levanto o quadril ajudando-o naquela
empreitada deliciosa. Assim que o homem coloca a camisinha, sorrio
imaginando a loucura que estava prestes a fazer ali. Então, ele penetra
deliciosamente o seu pau em mim, fazendo com que eu arranhe as suas costas
e morda o seu ombro, sedenta por mais.
Ele investe um pouco mais de seu pênis entre as minhas pernas,
mordendo o meu queixo e olhando compenetradamente em meus olhos.
Pressiono a sua bunda gostosa, de maneira que o pau gostoso
alcance o mais fundo do meu corpo.
Choramingo sentindo os seus dentes morderem o bico de meu peito.
O membro enrijecido e grande estava prestes a me fazer gozar como nunca
antes.
Que homem era aquele?
Clarck investe mais um pouco o pênis, com solavancos intensos
entre as minhas pernas. Os seus lábios vermelhos de nossos beijos beijam os
meus olhos, bochechas e queixo, é o suficiente para eu gozar e gemer
excitada.
Nunca havia gozado tão rapidamente.
A respiração ofegante está prestes a cessar com os meus sentidos.
Os batimentos cardíacos vibram em meus tímpanos, prestes a me ensurdecer.
Clarck sorri em meus lábios, pressionando um pouco mais os meus
seios e goza, apertando os olhos de maneira atraente.
— Angel, é um pecado ser tão gostosa. — confessa, colando beijos
molhados na minha boca.
E eu apenas sussurro, rendida.
— Você é tão... intenso... — sentia todas as emoções correrem por
minha corrente sanguínea. Os lábios doloridos de tantos beijos insanos.
O moreno se levanta de cima do meu corpo e ajeita o pênis
avantajado para dentro da calça, afivelando o cinto, logo em seguida.
— Agora eu preciso seguir o meu caminho. — informa, esticando-
me uma das mãos. As sobrancelhas tortas emolduravam um olhar sério.
Seguro em seus dedos, levantando-me do carro, ficando de pé ao
lado do moreno.
— Boa noite, Clarck. — despeço-me, ajeitando o decote e a saia. A
voz ainda alterada pela tempestade de desejo.
— Ei... — ele puxa a minha mão. — Não vai me dar o último
beijo?
Sorrio.
— Não. — ele me encara atordoado, talvez não esperasse por
minha negação.
Então, entro em meu carro. Assim que me sento ao volante, desço o
vidro da janela, fitando o olhar conturbado de Clarck.
— Não te dou o último beijo, porque você pode se apaixonar. —
despeço-me daquele gato com dois toques na buzina.
Estefani iria enlouquecer quando eu contasse a ela, sobre a minha
aventura insana.
O rapaz fica com os lábios entreabertos, coçando o queixo,
observando-me partir.
Adorava deixar esse olhar perdido nos homens.
Enquanto dirijo em direção à cabana, sinto o meu corpo arder
excitado. Isso nunca havia acontecido comigo antes. Eu sabia superar muito
bem essas transas casuais e esses cafajestes que surgiam no meio da
madrugada, em busca de sexo. Mas com Clarck estava estranhamente difícil
de superar. O meu corpo inteiro gritava por ele, a ponto de eu fechar os olhos,
sentindo a penetração em minha vagina, e rebolar sobre a poltrona do carro,
como se ele ainda me comesse deliciosamente.
Só poderia ser o efeito da tequila.
Com muito custo, chego à cabana, abrindo a porta da sala e
correndo em direção ao banheiro.
Retiro os scarpins, a saia, a calcinha, a camisa social e o sutiã.
Completamente pelada, vou na direção do box, abro o chuveiro, e lá eu me
deleito, ainda com Clarck presente nos meus mais indecentes pensamentos.

***

— Estefani, você não vai acreditar na noite louca que eu tive


ontem, depois da nossa happy hour.
Subíamos o elevador, com os nossos copos de isopor na mão,
preenchidos pelo café com leite que tomávamos diariamente.
— Então, quer dizer que você saiu mais cedo do pub, com a
intenção de pegar homens gostosos por aí? — destila o seu veneno, enquanto
ajeita o cabelo aloirado no espelho.
— Eu disse que a minha noite foi louca e não previsível. — bebo
mais um gole, antes de continuar. Estefani já me fita com os olhos altamente
curiosos. — Acredita que eu estava abastecendo o carro, quando um moreno
lindo, forte, alto, tudo de maravilhoso que você pode imaginar, parou ao meu
lado e pediu recomendação de restaurante, lanchonete, enfim...
— De madrugada? Um forasteiro pelo jeito.
A porta do elevador se abre e saímos em direção ao setor.
— Escuta... ele tinha um carro luxuoso, estava de terno preto e
tinha uma mala de dólares no veículo. Dividimos uns tacos na Casa
Mexicana, depois de eu encontra-lo lá, por acaso. O cara começou a me olhar
sedutoramente, a voz rouca, e você acha que eu fui louca em resistir?
Recosto na parede, perto da porta da sala onde trabalhávamos.
Estefani me analisa como se imaginasse cada cena em sua cabecinha criativa.
— Muito menos eu, que sou mais tímida, resistiria! — ela responde
com um sorriso safado desenhado na boca.
— Transamos no banco de trás do carro. — sussurro e depois
concluo, pausadamente. — Que homem!
— Gostoso? — ela pergunta, olhando-me por cima dos óculos
vermelhos.
— Nível hard.
Estefani e eu sorríamos, ainda no corredor, quando fomos
abordadas por Leonard.
— Animadas para a chegada do novo chefe?
Coitado, nem imaginava o que realmente permitia os nossos
sorrisos.
— Putz, já havia me esquecido. — Estefani retruca.
— Eu estou ansiosa. — digo, caminhando junto aos dois em direção
à sala. — Serão melhores para todos as possíveis e futuras mudanças.
Em resposta, Leonard cruza os dedos e me encara.
Finalmente, adentramos o setor. Cumprimentei os colegas de
trabalho com um “bom dia”, deixando as pastas sob o teclado. Liguei o
computador, enquanto terminava o meu café tranquilamente, quando Sr.
Victor passou no meio das mesas como um rastro de pólvora.
— Esse moleque já começou atrasando! Estou começando a
acreditar que foi um erro convidá-lo a trabalhar comigo, poderia tê-lo deixado
quieto lá na Europa! — após esbravejar, entra para a sua sala, completamente
mal-humorado.
Novidade seria se eu o visse bem-humorado.
— Viu, Angel? Nem o próprio pai acredita que o filho poderá
mudar o andamento da empresa. — Leonard analisa. — Estamos fodidos.
Giro a cadeira na direção do meu amigo.
— Eu volto para a Carolina do Norte, se falirmos. Vou morar com
os meus pais e arrumar um emprego por lá mesmo. Nenhuma empresa paga
melhor que a Collins e eu não vou ficar perdendo o meu tempo nesta cidade.
Leonard desgruda os olhos da tela de seu computador e me encara
aturdido. O olhar triste que ele me lança, incomoda-me um pouco.
— E nunca mais vamos nos ver?
Simplesmente não acredito no que ouço, imediatamente tento
contornar o assunto.
— Para que existem as redes sociais? — pergunto e retorno com a
cadeira para a minha mesa.
— Ah, mas o contato físico é muito melhor. — apenas sinto a mão
de Leonard deslizar pelo meu braço.
E isso me irrita.
— Para, Leonard, por favor. — olho ao redor e as pessoas nos
encaram, assim que grito, então trato logo de baixar o meu tom de voz. —
Estefani já me perguntou, na semana passada, se eu já tive alguma coisa com
você. Poxa, você não sabe ser discreto!
Então, Leonard desliza em sua cadeira, até mim, retirando os fones
de ouvido.
— Sinceramente, eu não entendo a sua resistência a
relacionamentos, Angel!
— Você nunca vai entender. — respondo com os olhos grudados
nos dele. Queria por um fim naquele assunto.
Leonard ainda me encara, à espera de explicações. O rapaz queria
que eu desse uma palestra sobre os meus sentimentos, sobre o que eu pensava
sobre relacionamentos, mas o que me coube, naquele momento, foi deixar
aquela fala pairando no ar, para o desespero de Leonard. Ele ainda deveria
sonhar com nós dois juntos bebendo chocolate quente, em uma noite fria de
Inverno. Bem, isso não combinava comigo. No momento, eu me preservava
mais do que qualquer outra coisa, depois de uma baita decepção amorosa que
arruinou parte dos meus dias.
— Ele está chegando! — Sr. Victor sai como um louco pela porta
do seu escritório, com o celular em uma das mãos. — Vamos reunir na sala!
Jason acabou de estacionar! — faz o seu alarde e depois caminha em direção
ao corredor.
Prontamente, todos da equipe levantam de suas cadeiras e um
burburinho se instaura.
Borboletas alçam voo em meu estômago, enquanto alongo os
braços à frente do corpo.
O futuro da empresa estava nas mãos daquele rapaz.
Caminhamos juntos em direção à sala de reunião, enquanto May e
Estefani elucubravam em suas mentes assanhadas, se o rapaz era bonito e
atraente, pelo menos. Diziam que estavam fartas de ter um chefe enjoado e
rabugento como Victor Collins.
— Sentem-se, vamos aguardá-lo juntos aqui.
Os olhos de Sr. Victor brilhavam de maneira ansiosa. Ele estava
apreensivo, certamente depositou todas as fichas no filho, ou já poderia
contar com a falência batendo, cada vez mais, à sua porta.
— Ele chegou! Bem-vindo, Jason Collins!
Maneio a cabeça para o lado, em direção à entrada da sala.
Os meus olhos paralisam, enquanto o meu coração altera os
batimentos. As minhas pernas embambecem e perco o ar por segundos.
— Clarck... — balbucio encarando o rosto sem expressão de Jason
Collins.
Levanto-me da mesa de reunião e encaro completamente atordoada
o moreno de olhos sérios com quem transei na noite passada. Não poderia ser
mais estranho, fitá-lo e realizar que ele seria o meu chefe, e o pior, que ele era
o filho do meu maior desafeto, o homem mais repugnante que já havia
conhecido em toda a minha vida, Victor Collins.
Faço menção de sair da sala, quando ouço à voz irritante de meu
chefe.
— Mocinha, aonde pensa que vai? Você ainda não se deu conta de
que o seu novo chefe acabou de chegar? — a estupidez escorrendo por seus
lábios murchos.
Olho ao redor e os meus colegas de trabalho me encaram, sem
entender o que poderia estar acontecendo. Exceto May, que encara Clarck ou
Jason, com um olhar derretido e hipnotizante.
— Pirou, Angel? Senta logo aí! — Leonard me puxa de repente,
obrigando-me a sentar ao seu lado.
Mal posso encarar o homem gostoso de terno preto que caminha em
direção à cadeira ao lado do pai. As minhas bochechas ruborizam, apenas por
eu imaginar que já transamos...
Que loucura, Deus do céu.
— Bom dia, equipe! — Sr. Victor tem um sorriso irritante no rosto,
raramente o via sorrindo, apenas quando debochava de um de nós. — Esse é
o meu filho, Jason Collins.
— Puta que pariu, que gato. — Estefani cochicha em meu ouvido.
May praticamente baba, mordendo a ponta do lápis e encarando,
sem pudor, o filho do chefe. Percebo que os botões de sua camisa social já
estão desabotoados até a altura dos seios.
Uma oferecida.
— Bom dia a todos. — como ele era sério, nem parecia o cachorrão
de ontem à noite. — Primeiramente, queria dizer que é uma grande alegria
estar de volta aos Estados Unidos. Como vocês já devem saber, o meu pai é
um tanto quanto orgulhoso e preferiu me manter longe de seus negócios, até
enfim perceber que eu posso ser ferramenta indispensável na engrenagem
dessa empresa. — o meu queixo cai. Pelo jeito Jason Collins não abaixava a
cabeça para o pai e, sem intenção alguma, acaba dizendo tudo o que
pensávamos a respeito de Sr. Victor. — Pai, obrigado pelo convite e por
confiar em mim. — o moreno segura nas mãos enrugadas do pai e estala um
beijo sobre elas. Em seguida, volta a nos olhar. — Eu pretendo, equipe, dar
andamento ao projeto do resort e preciso que vocês me auxiliem.
— O que você disse, filho? — Sr. Victor quica em suas tamancas.
— Você não pode confiar inteiramente nesses incompetentes.
O meu coração vibra em meu peito, consternado com tamanho
desaforo.
— Um momento, Sr. Victor. — dou um tapa sobre a mesa. Eu nem
ao menos sei o que estou fazendo! Estou completamente revoltada diante de
tamanha ofensa. — O senhor deveria encontrar adjetivo mais condizente com
a nossa capacidade de trabalho nesta empresa. Se não fossem o nosso
trabalho árduo, as nossas reuniões para realinhar as asneiras que sempre diz
nesta sala, já estaríamos de portas fechadas!
Noto o olhar raivoso de meu chefe, que morde os lábios irritado ao
ouvir as minhas justas palavras.
— Angel, você enlouqueceu? — é o que Sr. Victor consegue
perguntar.
— Deixe ela, pai. — Jason entra em defesa, mantendo um olhar
confiante no meu, empolgante, talvez. Havia admiração de certa maneira, por
isso me sinto ainda mais segura.
— Sim, eu enlouqueci, a partir do momento em que deixei de
almoçar para rever os seus projetos, quando deixei de dormir, para convencer
as empresas parceiras a manter os seus contratos com a Collins Construtora,
enlouqueci, Sr. Victor, quando eu deixei os meus pais na Carolina do Norte
por acreditar nesta empresa. — e assim que recupero o fôlego, acrescento. —
O senhor me envergonha. — levanto da cadeira, prestes a sair da sala, mas
Jason faz um gesto com a mão para que eu me sente.
Sem entender, eu o obedeço, como se um feitiço penetrasse os meus
sentidos.
— Angel... — Jason Collins profere o meu nome pausadamente.
Mesmo ferrada por dentro, eu o encaro com segurança. — pelo jeito você é o
gás de que essa equipe tanto precisa. — assinto com um semblante mais
pacífico. — Noto pelos olhares mortos e desanimados dos seus
companheiros. Já os seus, brilham, acreditam no futuro da Collins. Meu pai
não seria louco em perdê-la para a concorrência.
Sr. Victor abaixa os olhos e, em seguida, me encara. Eu conseguia
perceber que ele, no fundo, concordava com o filho.
— Angel sabe apenas me desobedecer. Não se iluda com essa
pirralha. — despeja, dando de ombros. Ele era repugnante.
— Pai, isso é horrível. — Jason o adverte, olhando em seus olhos.
— Por favor, me deixe sozinho com a equipe!
Um silêncio reina naqueles poucos segundos. Jason Collins não
estava de brincadeira.
— Mal chegou na empresa e já quer tomar o meu lugar, moleque?
— agora, os desaforos eram desferidos contra o filho, e isso me enoja.
— Eu não quero tomar o seu lugar, pai. — as suas sobrancelhas
grossas e bem feitas se unem uma a outra, Jason está irado. — Eu não quero
que a porra dessa empresa entre em falência. Para que isso não aconteça, o
senhor precisa confiar no meu trabalho. Ou quer que eu saia por aquela porta
para nunca mais voltar?
Uau, que homem.
— Isso não. — Sr. Victor, finalmente, baixa o tom de voz.
— Então, pai, por favor, me dê licença. — impõe, esticando a mão
em direção à porta.
Leonard, imediatamente, enfia o cotovelo em minha costela,
enquanto eu abaixo os olhos com “vergonha alheia” de Sr. Victor.
Olho ao redor e Luan segura o sorriso nos lábios.
Estávamos triunfantes. Jason Collins havia vingado cada um de nós,
no momento daquela reunião.
O chefe mantém o olhar apático, enquanto caminha em direção à
porta, com o rabo entre as pernas. Finalmente, havia engolido o orgulho e se
rendido ao filho.
— Peço desculpas pelo o que meu pai sempre foi para vocês, —
uau, o cafajeste era gentil, de certa forma. — afinal, o conheço muito bem.
Sempre relutei, negando muitos convites para vir trabalhar na América com
ele. Eu sempre soube que não seria fácil. E, na verdade, vocês mereciam um
prêmio por terem levado essa empresa nas costas, terem aturado as sandices
do velho Victor, sem esmorecer. — e ele conclui sua fala me encarando de
maneira perturbadora. Imediatamente Leonard percebe, e me gruda os olhos,
como se tivesse alguma posse sobre mim. — Angel, você tem espírito de
liderança. Quero contar com você para as reuniões com as empresas
parceiras.
— Bem, Clarck... — sorrio com ironia, enquanto o moreno
semicerra os olhos. — digo... Jason, eu preciso pensar um pouco, antes de
assumir tais responsabilidades.
O belo moreno me olha dentro dos olhos seriamente, abalando,
dessa maneira, todas as minhas estruturas. Não quero perder o meu olhar do
dele, então ficamos durante aqueles breves segundos, devorando um ao outro
com a nossa íris gulosa. Quando, sem esperar, Jason sorri de lado, como se
um filme da noite de ontem passasse em sua cabeça. A minha boca resseca e
desvio imediatamente o olhar, antes mesmo que o galã derrubasse o único fio
de segurança que ainda existia dentro de mim.
— Sr. Jason, eu estou inteiramente à sua disposição. — May dá
praticamente um miado ao proferir essas poucas palavras.
Ela estava me irritando.
— Obrigado, May. — enquanto debruça os braços sobre a mesa, o
belo acrescenta. — Queria dizer que vocês são jovens, assim como eu. Somos
contemporâneos nos estudos, então eu acredito que vamos nos entender
muito bem.
— Seja bem-vindo, Jason Collins. Eu digo, em nome da equipe. —
Estefani se adianta, fazendo com que eu perceba esperança nos rostos dos
meus amigos.
O filho do chefe agradece. Ele era a nossa única salvação no
momento. E eu estava feliz, apesar das circunstâncias, por saber que teríamos
um líder que pensava como a maioria de nós, que possuía vontade de sobra
para reerguer os negócios do pai.
Além de um tremendo sedutor, era um homem sério, não um
estúpido como Sr. Victor. Bom, pelo menos essa foi a primeira impressão que
tivemos daquele belo rapaz.
— Seja bem-vindo, Jason Collins. — disse, rendida, analisando os
seus olhos me observarem, exatamente da mesma maneira como me olhava,
quando desejou os meus beijos, ontem à noite.
— Obrigado, Angel. — ele sorriu para mim e imediatamente eu
engoli em seco todas as vontades que tentavam ultrapassar a minha pele
naquele momento.
— May, você pode chamar o meu pai, por favor? — Jason
acrescenta. — Eu preciso entregar essa pasta a ele.
Os meus olhos arregalam. Certamente era a pasta de dólares. Pelo
menos, quanto a isso, não havia mentido.
May prontamente obedece ao filho do chefe, levantando de sua
cadeira e caminhando pela sala, exagerando no rebolado. Sem perder tempo,
desvio o meu olhar para Jason. O moreno faz algumas anotações, ignorando o
quadril nervoso daquela assanhada.
Em pouco segundos, a porta se abre. Sr. Victor entra na sala de
reunião com o mesmo olhar altivo de sempre. Caminha até perto do filho e
pergunta de maneira sarcástica.
— Acabou a sua reunião?
Jason o encara com pouca paciência.
— Pai, por favor, se for para ter ciúmes e ficarmos nessa guerra
eterna, melhor eu deixar que o senhor cuide dos seus negócios sozinho. —
esse era apenas o primeiro dia e Jason já estava represando a vontade de
enforcar o próprio pai.
— Está bem. — o chefe responde em um tom nada convincente. —
Para que me chamou?
Jason se levanta da cadeira e presenteia os meus olhos com o corpo
esbelto. O terno marcava os músculos do corpo, sutilmente. Os ombros
largos, os braços torneados, ele era uma tentação. E ao mesmo tempo
lamentava por não o ter visto completamente pelado quando me fodia
deliciosamente, ontem, em seu carro.
Cruzo as pernas, bloqueando os instintos, para direcionar a minha
atenção inteiramente ao que o filho do chefe teria para falar.
— Pai, eu gostaria de entregá-lo esta pasta, na frente de todos, para
que fiquem como testemunhas do verdadeiro fim a que se destina este
dinheiro. — Jason destrava a pasta preta, abrindo-a por cima da mesa. Todos
observam embasbacados o bolo de dinheiro que se encontrava ali dentro. Sr.
Victor morde os lábios entusiasmado com o que fitava. — São oitocentos mil
dólares para ajudar na recuperação da empresa. Esse dinheiro precisa ser
destinado apenas a isso, entendeu, pai? Por enquanto, eu vou guardá-lo no
cofre.
— Eu posso acompanhar o senhor até o cofre da empresa. — May
manifesta-se de repente, demonstrando ser mais exibida do que eu realmente
poderia imaginar.
Reviro os olhos por ela estar se mostrando tão irritantemente
oferecida. Faltava pouco para a secretária se deitar sobre a mesa e abrir as
pernas para Jason, ali mesmo.
— Eu vou agradecer a sua companhia, querida.
Querida?
Semicerro os olhos, enervada.
— Pelo jeito a nossa amiga está prestes a conseguir um “bom-
partido, como sempre sonhou. — Estefani cochicha no meu ouvido.
— Enlouqueceu, Ester? Não seja ridícula. — faço uma negativa
com a cabeça, ao mesmo tempo em que digito em minha agenda eletrônica.
— Parece que quer entrar nessa disputa. — debocha.
Então, prontamente a encaro nos olhos.
— Obviamente não quero. Isso não tem lógica.
Estefani me devolve um olhar desconfiado.
E, sem ao menos perceber, os três se levantam da mesa de reunião.
Sr. Victor caminha mais à frente, ajeitando os cabelos, como num tique
nervoso. May vai junto a Jason, desferindo olhares e sorrisos mal-
intencionados ao belo moreno.
E eu me odeio simplesmente pela presença de Jason Collins me
incomodar de maneira nada entendível.
***

— Não gosto da maneira como esse tal Jason fica te olhando.


Estava almoçando junto a Leonard em um dos restaurantes
próximos à empresa. Era um restaurante de comida contemporânea que, vez
ou outra, apreciávamos frequentar, para sair um pouco da rotina do ambiente
de trabalho.
Já havia se passado uma semana desde quando Jason pisou, pela
primeira vez, na Construtora. Leonard, por sua vez, estava terrivelmente
incomodado com o tom sedutor com que o moreno olhava para mim,
constantemente.
— Que maneira? Não percebi. — dou de ombros, não querendo
alimentar os ciúmes idiotas de meu amigo.
— Como não? Você sempre fica constrangida!
— Leonard, por favor, dá um tempo. — bato o guardanapo de linho
sobre a mesa. — Que eu me lembre, não temos compromisso algum para
você sustentar ciúmes infundados.
O rapaz bebe o seu suco, encarando-me com desconfiança, e ao
mesmo tempo eu imagino que se ele soubesse que eu já havia sentido o
membro ereto de Jason inteiro dentro de mim, enlouqueceria.
— Olha só quem chegou! — Leonard informa, com um sorriso
animado nos lábios. Maneio a cabeça para trás e os meus olhos vislumbram
Jason e May conversando e sorrindo com intimidade, adentrando o
restaurante.
Eu não acredito que a secretária está prestes a conseguir o que
sempre almejou. Estar em um relacionamento com um ricaço, com o homem
mais lindo que já ousei fitar, em toda a minha vida.
— Está irritada, Angel? — Leonard pergunta, ao mesmo tempo, em
que coloca uma garfada de purê de batata roxa na boca.
— Claro que não. — sorrio, ignorando as sensações estranhas que
me consumiam por dentro.
Tento me atentar apenas às ervilhas que me encaram de volta no
prato, mas logo somos surpreendidos.
— Boa tarde! — os dois estão parados próximos à mesa. May está
com um sorriso que não cabe no rosto.
— Boa tarde, May. Boa tarde, chefe. — respondo, aguardando o
que eles estavam intencionados a fazer ali.
— Chefe, não. — Jason sorri de lado, enfiando as mãos nos bolsos.
— Eu sou o filho do chefe. Não me coloque tantas responsabilidades nas
costas, Angel.
Todas as vezes em que Jason proferia o meu nome, eu sentia as
minhas pernas perderem as forças. A voz sedutora, os lábios perfeitos que
juntavam as letras do meu nome de maneira tão inebriante, além das covinhas
em sua bochecha que me deixavam hipnotizada, tentando assimilar que o
rosto de Jason fora realmente desenhado por anjos.
— Podemos sentar com vocês? — May pergunta, já puxando uma
das cadeiras.
Jason, ainda de pé, sorri completamente sem graça.
— Podem sim, mas eu vou ter que pedir licença, — Leonard limpa
a boca e deposita o guardanapo sobre a mesa. — preciso adiantar algumas
tarefas.
E eu imediatamente odeio Leonard. Eu não poderia acreditar que
ele estava me deixando sozinha junto a Jason e May, propositalmente. Estava
prestes a segurá-lo naquela mesa, até que eu terminasse o meu almoço.
Apesar de tudo, estava sem saída, e o que me restava era observar
rendida May e Jason se sentarem à nossa mesa. Enquanto isso, Leonard paga
a sua conta ao garçom e se levanta, me deixando sozinha junto aos dois.
A minha boca está seca, a comida passeia por minha língua, eu não
consigo simplesmente engoli-la. Mal posso conter o incômodo de ter Jason
ao meu lado. O seu perfume me faz lembrar do momento em que ele colou o
seu corpo ao meu, pela primeira vez, entre ele e o carro.
— Angel, o que você recomenda? — May pergunta como se fosse a
primeira vez que frequentasse o restaurante.
Mastigo as ervilhas, sem paciência.
— O cardápio está aqui. — sou direta e lhe entrego o menu. A loira
franze o nariz.
— Pensou na minha proposta?
Sobressalto com aquela pergunta. Viro para o lado e tenho os dois
olhos negros focados compenetradamente nos meus. Os pelos de meus braços
eriçam e eu não sei se o motivo é a água gelada que desce por minha garganta
ou o poder enfeitiçante da íris negra de Jason Collins.
— Ainda não tive a oportunidade, mas certamente estarei disposta a
ajudá-lo com as empresas parceiras. — sibilo, focando em seus lábios. — Eu
tenho facilidade em lidar com os outros empresários, já são íntimos do meu
trabalho.
— Eu imaginei. — ele sorri torto, bebendo uma taça de água com
limão, em seguida.
— A Angel é extremamente competente. Se não fosse por ela, já
estaríamos todos no olho da rua. — May acrescenta, me retirando um sorriso
amarelo.
— Concordo com você, May. — Jason afirma, sério. Os seus olhos
ainda estão grudados aos meus de maneira muito intensa. O que será o que
ele desejava com tanto charme? — Pretendo levar alguém da equipe para a
República Dominicana, para analisarmos de perto as obras do resort.
— Eu estou inteiramente à disposição. — May dá um miado, com
os olhos presos ao cardápio.
Enjoada.
— Obrigado, querida, mas possivelmente eu vou levar a Angel
comigo.
Os pedaços de abóbora dançam na minha língua e mal consigo
mastigá-los. Jason estava disposto a me enlouquecer.
— Eu agradeço a consideração, Jason, mas eu prefiro que leve o
seu pai. — sou categórica.
O moreno sorri de lado, engolindo a sua água com limão.
— E se formos nós três? — o moreno sugere.
— Para...
Jason sorri, jocoso. Ele estava balançando com os meus sentimentos
dessa maneira.
E assim que o garçom chega à mesa para anotar o pedido dos dois,
eu solicito a minha conta. Já estava me sentindo sufocada com aquele belo
homem ao meu lado, destilando o seu charme sem pudor algum.
Eu era fraca para esse tipo de coisa. Homens bonitos e perfumados
mexiam terrivelmente comigo.
— Não vai esperar pela gente, amiga? — May pergunta, fazendo
muxoxo.
— Imagina, eu não quero atrapalhar o momento de vocês.
Jason sorri torto, talvez incomodado com a minha ironia.
Cumprimento os dois, antes de colocar a bolsa à tiracolo e sair pela
porta do restaurante.
Caminho tranquilamente em direção à empresa, aliviada por ter me
livrado de momento tão constrangedor. Enquanto isso, fazia uma organização
mental dos meus afazeres do dia. Com Jason Collins tocando os negócios, me
sentia mais confiante em expor as minhas ideias, tratar mais de perto os
detalhes do resort. E quando viro a primeira esquina, na direção do quarteirão
da empresa, ouço alguém chamar por meu nome.
— Angel!
Maneio o corpo para trás e Jason vem correndo ao meu encontro.
Era uma cena curiosa de se ver. O terno do moreno esvoaçava, enquanto o
volume entre as pernas balançava sutilmente com o trote de seus passos.
Homem delicioso.
O meu coração descompassa.
O que será que ele queria?
— Oi, o que foi?
O moreno está ofegante. Então, sem dizer nada, ele segura
delicadamente em meus braços, e me leva para um beco, perto da floricultura.
Não consigo me desvencilhar de suas mãos grandes.
— Angel, desculpas.
A sua respiração alcança o meu rosto. O cabelo preto não estava
mais tão alinhado assim.
— Desculpas por causa das inúmeras mentiras? — recosto no muro,
enquanto Jason se coloca estrategicamente à minha frente. — Para mim, você
ainda é o Clarck que não gosta de comida mexicana.
Jason sorri de maneira contida. Os olhos sérios ainda tentando
despir a minha alma.
Ainda não havíamos tido a oportunidade de colocar os devidos
pingos nos is.
— Não, eu sou Jason e sou fã da culinária mexicana. — ele brinca,
acariciando o meu queixo. — Me perdoe, Angel. Eu jamais poderia imaginar
que você era a garota que o meu pai sempre comentou.
Cruzo os braços e o encaro desconfiada.
— O que Sr. Victor pode ter comentado sobre mim?
Ele responde com a voz sedutora e as mãos que vão imediatamente
até a minha cintura.
— A fedelha mais competente da empresa.
Retiro as mãos de Jason de meu corpo, ainda sem acreditar que
algum elogio sincero poderia partir da boca de Sr. Victor a meu respeito.
— E, você, deixou a May sozinha? — desconverso, afastando-me
de Jason.
— Aproveitei que ela foi ao banheiro. — o moreno se aproxima e
responde me olhando nos lábios. — Depois eu me viro com ela.
— O que você quer de mim? — pergunto, depositando as mãos nos
ombros de Jason, afastando-o de meu corpo, contrariada.
— Tantas coisas... primeiro que viaje comigo para avaliarmos o
projeto do resort na República Dominicana. — o rapaz enfia as mãos nos
bolsos e quando me dou conta, ele disfarçava uma deliciosa ereção.
Não iria resistir por muito tempo.
— Você me conheceu há uma semana e já está me fazendo uma
proposta desse nível? — permaneço no embate.
— Angel, você ainda não entendeu que o meu pai está desviando o
dinheiro da empresa para a sua conta pessoal? Talvez esse projeto não exista.
Arregalo os olhos com aquela revelação.
— O quê? — estou perplexa.
Jason umedece os lábios antes de continuar:
— Por que você acha que ele recusa ajuda da equipe quanto ao
projeto do resort?
Imediatamente levo as mãos à boca.
Agora entendia os motivos dos riscos de a empresa falir, a qualquer
momento. Pelo jeito, parte do capital estava sendo desviado e isso afetava
diretamente nos lucros da Collins Construtora.
— Meu pai deve estar mancomunado com o indiano dono do resort.
— Jason está visivelmente impaciente, passando os dedos entre os cabelos
pretos. — E por isso me chamou, para eu ajudar a livrá-lo da enrascada onde
está se metendo. Ele jamais me confessaria os seus planos sórdidos, no
entanto, como eu já o conheço, imediatamente desconfiei dos desvios dos
lucros. — de repente, o moreno pega as minhas mãos e eu sinto as suas
palmas geladas. — Por favor, não conte a ninguém, Angel. Eu precisava
desabafar com você e precisava, também, fazer isso fora da empresa.
— Pode confiar em mim. — assinto, observando os seus olhos
preocupados.
Jason sorri de lado, antes de dizer:
— Por isso eu trouxe os dólares. Vai ser a isca perfeita para saber o
que o Sr. Victor está realmente intencionado a fazer.
— Maquiavélico. — confesso, sorrindo.
Naquele momento, uma breve admiração me envolve os
sentimentos. Jason era inteligente, articulado e, apesar de tudo, estava
disposto a ajudar o louco do seu pai.
E, sem eu ao menos me dar conta, o moreno diminui os passos entre
os nossos corpos, mirando o olhar soturno em minha boca, exclusivamente. O
coração começa a dançar em meu peito, enquanto eu ansiava degustar o sabor
da língua daquele belo homem, sem demoras.
Estava infernalmente entregue ao charme de Jason Collins.
— Me dá um beijo? — ele me pede com a voz rouca, sinto as suas
mãos em meu rosto.
Resolvo brincar, afinal de contas, eu não poderia ser tão fácil assim.
— Não. — abaixo as suas mãos, agora tão quentes. — Eu não
posso ficar me envolvendo com você dessa maneira. Você é o filho do meu
chefe.
Jason revira os olhos.
Debochado.
Atrevido.
— E daí, Angel? Aqui eu sou Jason Collins e nada mais além disso.
Sedutoramente, ele encosta o seu corpo ao meu, outra vez,
ignorando os nossos postos naquela empresa. Jason segura firme em minha
cintura, enquanto os meus olhos hipnotizam em sua boca vermelha. Estava
rendida. Arfo assim que sinto o volume ereto encostar entre as minhas
pernas. Umedeço os lábios ansiosa para sentir o sabor daquele homem lindo.
Jason desliza as suas mãos por minhas costas até a minha bunda e me beija a
boca, amassando as minhas nádegas, ao mesmo tempo.
Que loucura deliciosa.
Levo uma das pernas ao entorno de seu corpo e enfio os dedos entre
os seus cabelos pretos, sentindo a língua gostosa passear pela minha, como se
Jason sugasse todo o meu bom senso.
Éramos como dois adolescentes recém-saídos da escola.
Uma das mãos do filho do meu chefe segura em minha coxa,
fazendo com que eu morda o seu lábio inferior e também...
— O que significa isso?
Olhamos assustados para o lado e Leonard nos encara com todo o
furor nos olhos esverdeados.
— Angel, por favor, me explique o que está acontecendo!
— Eu não te devo explicações, Leonard. — afasto-me de Jason,
limpando a boca borrada de batom.
Estava constrangida e completamente sem paciência com os ciúmes
gratuitos do meu amigo. Eu realmente não entendia o que estava ocasionando
atitudes tão inexplicáveis, absurdas, na verdade.
— Leonard, você por acaso é namorado da Angel? — Jason
pergunta enervado, enquanto encara o rapaz aloirado nos olhos.
— Cara, cala a sua boca. — Leonard responde, afastando o moreno
com um dos braços, e, então, para a minha surpresa, eu noto que o meu
amigo possui um buquê de rosas na mão.
Estava cada vez mais difícil de entender as suas pretensões.
— Eu não sou namorada desse idiota. — respondo, aproximando-
me do moreno, para pedi-lo: — Por favor, Jason vá almoçar.
— Você vai ficar sozinha com ele? — pergunta, amavelmente.
— Nada demais. — dou de ombros. — Eu me viro, afinal de
contas, já estou acostumada a lidar com os absurdos de Leonard.
E todas as vezes em que os ciúmes gritavam, eu me condenava por
ter me envolvido com aquele rapaz grudento!
Jason, finalmente, se afasta, indo em direção ao restaurante, antes
de deixar um olhar imponente nos olhos de Leonard.
Saio do beco e vou em direção à calçada. Observo Jason indo ao
longe e fico admirando o seu porte de modelo.
— Garota, explique o que você estava fazendo! — sobressalto-me
com as sandices daquele chato.
— Está cego, Leonard? Eu estava beijando a boca do filho do
chefe. — debocho, sem piedade.
Leonard caminha de um lado para o outro ainda com as flores na
mão. Será que ele estava intencionado a me pedir em namoro? Não sabia de
relação alguma de meu amigo com outra pessoa, então só poderia ser isso.
Apenas finjo que não vejo o buquê.
— Angel, você não presta.
— Por que não? — pergunto aborrecida. — Eu não tenho
compromisso algum com você, quantas vezes eu vou precisar repetir!
Leonard se aproxima de mim com um olhar maligno. E eu já estava
preparada para os seus desaforos.
— Todos saberão da sua postura naquela empresa.
Semicerro os olhos, incrédula, enquanto articulo mil argumentos,
mas apenas me rendo a desafiá-lo.
— Vá em frente, fofoqueiro.
Leonard me encara com os olhos ainda preenchidos de ódio e,
então, se vira, finalmente retornando ao trabalho. Ele ainda tinha o buquê de
flores na mão e imediatamente o enfia em uma lixeira.
Certamente ainda sustentava esperanças de me namorar, mas o meu
amigo estava indo na contramão das conquistas, agindo dessa maneira
patética e infantil.
Assim que observo Leonard sumir em uma das esquinas, resolvo
dar os primeiros passos em direção à construtora. Estava disposta a evitá-lo
pelos próximos dias.
Enquanto caminho pela calçada, imagino que nunca tive horário de
almoço tão conturbado!
Chegando à empresa, ainda sinto o sabor da boca de Jason Collins.
Não tinha dúvidas de que ele estava disposto a me enlouquecer. O seu poder
de sedução estava prestes a me retirar dos trilhos, jogando-me à beira de um
precipício de loucuras.
Encaro-me pelo espelho do elevador e sorrio para a minha imagem,
satisfeita por ter beijado o filho do meu chefe.
Que homem mais interessante.
Imprevisível.
Saio do elevador com o coração na mão. Possivelmente Leonard já
teria alarmado quanto ao meu beijo em Jason e eu já deveria ser fofoca nas
rodinhas de conversa que existiam naquele lugar.
Preparo o meu psicológico antes de adentrar o setor.
Assim que caminho pela sala, ouço a burburinhos e pessoas que
cochicham inspecionando os meus passos.
E eu apenas desejava ser invisível, naquele momento.
— Você não perde tempo. — sou abordada, quando coloco a minha
bolsa sobre a cadeira.
— O que foi, Ester? — pergunto, mas já presumia o pior.
— Leonard chegou esbravejando, para quem quisesse ouvir, sobre o
seu beijo no filho do chefe. — noto irritação em Estefani. Deveria estar com
raivinha que Jason beijou a mim e não a ela.
— Meu Deus, qual o problema de vocês? — falo em um tom mais
alto para que todos naquela sala ouçam. — Eu sou solteira. Jason também!
Foi apenas um beijo!
Mas, mesmo assim, os olhares reprovadores permanecem. Os
supostos santos imaculados continuavam a me julgar.
De repente, ouço a passos na minha direção. A voz grave ecoa em
meus ouvidos, sem eu ao menos me dar conta.
— Repita agora o que a senhorita disse, Angel Parker.
As minhas pernas congelam, respiro mas não tenho oxigênio. Sr.
Victor está à minha frente com os olhos arregalados. Mas não é o bastante
para me intimidar.
— O seu filho me beijou. — respondo, irritada, afinal de contas,
éramos maiores de idade! E eu já estava sem paciência para tanto drama.
O chefe me encara e noto as suas mãos trêmulas.
— Meu Deus, será que eu estou lidando com adolescentes nessa
empresa? — esbraveja.
— Parece que sim. Não temos autonomia para fazer simplesmente
nada neste lugar.
O velho dá um tapa sobre a minha mesa. O barulho reverbera por
todo o ambiente.
— Chega, Angel! Basta! — ele grita, o que me assusta um pouco.
— Passe no RH agora. Você está despedida.
Olho ao redor e o circo estava armado, sendo que eu era a atração
principal daquele picadeiro.
— Sim, senhor. — respondo, blasé, ainda que o meu mundo tivesse
acabado de implodir.
O silêncio rapidamente impera naquele lugar. Abaixo o rosto,
segurando o choro, mas, mesmo assim, ainda consigo sorrir para Estefani,
enquanto separo os meus pertences.
A minha amiga segura em meu ombro, completamente em choque
com o que acabara de acontecer ali.
— Angel, converse com o Jason! Você não pode ser despedida!
Imediatamente, encaro os seus óculos vermelhos.
— Eu não quero mais ouvir o nome de ninguém dessa família.
Virei as costas e saí determinada em direção ao RH.
Estacionei o carro e caminhei apressado até o carona, para abrir a
porta para May.
Já havíamos atrasado quase meia hora em nosso horário de almoço.
Mais cedo, a secretária havia me convidado para almoçar em um
restaurante italiano. May havia citado item a item do cardápio,
completamente empolgada a me convencer, porém quando fitei Angel
caminhando junto a Leonard, em direção ao restaurante de culinária
contemporânea, decidi mudar os planos e estacionar por ali.
Angel era a peça fundamental para me ajudar a reerguer os
negócios de meu pai, afinal de contas, eu estava sozinho nesta empreitada e
precisava de alguém que fosse cúmplice para descobrir até que ponto poderia
chegar a ganância de Victor Collins.
O velho Victor não era um homem completamente confiável. Ele
era bipolar, controlador e altamente estúpido, por conta disso, eu estava na
Europa, junto à minha mãe, desde quando terminei os estudos em
Massachusetts.
Mamãe era uma senhora muito elegante e delicada, que não
combinava em nada com as brutalidades do meu pai. Exatamente por isso que
eles se divorciaram há uns vinte anos, mais ou menos. Ela partiu para a Itália
e eu não a condenei, por motivos óbvios.
Nas férias escolares, sempre que eu ia visitá-la, era recebido com
todos os mimos maternos, o que tornava o meu retorno à América muitas
vezes doloroso.
Enquanto estava no elevador, sentia a secretária me destilar um
olhar diferente. Ela estava me seduzindo, passando um dos dedos pelo colo.
Mas eu não estava ali para me relacionar com mulheres, eu estava na Collins
Construtora para protegê-la de uma iminente falência e para tanto eu já havia
escolhido uma aliada forte, inteligente e absurdamente linda, Angel Parker.
Entramos no setor e a equipe estava bastante agitada. Olhei ao redor
e não encontrei Angel, e daí me dei conta de que Leonard já poderia ter
proferido aos sete ventos a respeito do nosso beijo, naquele beco.
— O que está acontecendo aqui? — pergunto, assim que entro na
sala de meu pai, depositando a pasta sobre a mesa.
— Eu que te pergunto, moleque! — o homem levanta de sua
cadeira e vem na minha direção como se estivesse possuído por algum
demônio. — Veio aqui para me ajudar nos negócios ou para beijar a boca das
funcionárias?
Bufo, furioso.
A essas alturas, ainda teria que dar satisfações da minha vida!
— Não misture as coisas, pai, por favor. Angel é uma mulher muito
atraente, o senhor sabe muito bem disso. — caminho até a imensa janela de
vidro e fito as pontas dos arranha-céus, apenas para evitar encarar o meu pai
nos olhos.
Eu não estava a fim de perder a cabeça.
— Eu não sei de nada. — ele responde de maneira impaciente. —
Na minha opinião, é uma pirralha mimada, que sempre me faltou com
respeito.
— O senhor ainda não enxergou que ela é a melhor funcionária que
existe nesta empresa? — volto a encará-lo, não disfarçando a minha ira. —
Que Angel já salvou os seus negócios por muitas vezes?
— Balela! — esbraveja, levantando uma das mãos. — Ainda bem
que me livrei daquela menina. Deveria ter feito isso antes.
— Se livrou como? — uno as sobrancelhas, temendo o que o meu
pai estava prestes a falar.
— Eu a pus no olho da rua!
Semicerro os olhos, completamente atordoado. Imediatamente,
desfiro um soco na parede.
— Eu não posso acreditar!
— Pare de se apegar a detalhes, menino. Vá trabalhar que é para
isso que eu te chamei aqui.
Ignoro o meu pai. Ele havia passado dos limites!
— Onde ela está? — pergunto, já com a pasta na mão.
— Não está no meu bolso.
Já havia me esquecido de como meu pai poderia ser debochado e
irritante.
Bato a porta e saio em disparada em direção ao estacionamento.
Atravesso a sala com os passos decididos, enquanto ouço algumas daquelas
mulheres me chamarem. Mas eu não tinha mais tempo a perder. Eu precisava
encontrar a Angel.
Assim que chego ao estacionamento, olho para um lado, para o
outro e não encontro o carro vermelho daquela mulher.
Isso me apavora.
Imediatamente vou em direção ao meu carro e dirijo para a estrada
onde nos encontramos pela primeira vez.
Eu não poderia perder Angel Parker.
O meu pai era extremamente esperto. Quando me imaginou junto a
Angel, talvez tenha inferido que nós dois juntos éramos bons o bastante para
darmos conta de todos os seus planos imundos. Esse era o seu verdadeiro
desespero.
Angel era sagaz, autossuficiente e Sr. Victor possivelmente se
apavorou quando se deu conta de nossa possível aliança.
Entretanto o meu pai não iria derrubar os meus planos. Eu estava
disposto a fazer de tudo para salvar os negócios de nossa família, junto a
minha bela e impetuosa cúmplice.
Chegando ao posto de gasolina, eu vejo um senhor abastecendo o
seu jipe. Sem demoras, estaciono ao seu lado.
— Boa tarde, senhor. Por acaso, conhece Angel Parker? — sou
direto, não queria perder tempo.
Enquanto o coroa me analisa, torcia intimamente para que ele me
desse uma resposta positiva.
— A mocinha que mora na cabana? — sorrio, afinal de contas, para
mim, ela era um mulherão.
— Isso. Cabelos longos e castanhos, aparenta ter uns vinte e cinco
anos de idade... — estou esperançoso.
Então, o homem de cabelos grisalhos cruza os braços e me encara
com desconfiança.
— Quem me garante que você é confiável?
Inferno!
O que me resta é abrir o porta luvas e pegar a minha carteira. Por
trezentos dólares, ele me daria o endereço completo de Angel.
Mostro as notas ao homem e pergunto, novamente.
— Onde a Angel mora?
O cara tenta relutar, coça a barba mal feita, respira fundo e
finalmente fala.
— Daqui a seis quilômetros, à esquerda, em direção à floresta.
Segue reto e dobra na segunda ponte.
Entrego as notas aos seus dedos sujos de óleo.
— Pelo jeito, quem não é confiável aqui é o senhor, se vendendo
dessa maneira. — fecho o vidro e acelero para o endereço indicado.
O caminho para a cabana de Angel era muito bonito, arborizado,
com pinheiros que contornavam a beira da estrada. Ora ou outra subia por
ladeiras.
E era longe, extremamente isolado.
Assim que me deparei com a cabana, notei uma luz acesa em seu
interior. A pequena casa era feita de madeiras e ficava embaixo das copas das
árvores. Era um lugar aconchegante e muito bonito.
— Angel é realmente muito corajosa para morar sozinha neste
lugar.
Bati a porta do carro e caminhei na direção do casebre. O carro de
Angel também estava estacionado. Subi as escadas que me levavam até uma
pequena varanda e dei três toques na porta.
Assim que abriu, encontrei o rosto bonito daquela menina
determinada. Ela não estava chorando, como imaginei encontrá-la, mas o
sorriso confiante também já havia desaparecido terrivelmente de seu rosto.
— Oi. — cumprimento ainda à porta.
— O que você quer, Jason? — ela me pergunta e sai em direção ao
interior da casa e eu entendo aquilo como um convite para entrar.
— Eu quero que você retorne à empresa. — sou direto, enquanto a
sigo pelo pequeno cômodo.
— Com o seu pai, lá? Nem morta. — responde, se jogando sobre o
sofá marrom.
Inspiro, entendendo que aquela mulher forte estava exausta,
cansada de enfrentar, como um escudo, todas as barbaridades de meu pai. A
sua paciência e o seu emocional, pelo jeito, possuíam prazo de validade.
Sento-me ao seu lado, entre as almofadas, imaginando que seria
difícil de convencê-la.
— Não tem outro jeito, Angel. Eu preciso que me ajude a reerguer a
Collins Construtora.
Ela não me encara nos olhos, como das outras vezes, apenas abraça
uma das almofadas, e eu ainda observo como ela estava linda de shorts jeans
e moletom, sem a roupa sexy de executiva.
— Eu não tenho mais nada a ver com os negócios da família
Collins.
Ela era irredutível. De uma personalidade tão forte como aço.
— Não diga isso. Você não é essa pessoa cruel. Pense nos seus
amigos, no seu emprego.
— E quem vai pensar em mim, Jason Collins? — finalmente, ela
me encara. Pela voz entrecortada, percebo que a sua alma está esfacelada.
O que me resta é segurar em suas mãos e olhar dentro de seus
olhos.
— Eu estou aqui, isso não significa nada para você?
A bela mulher se cala por um momento. Eu acredito que Angel já
tenha uma resposta afiada pronta para sair por sua boca, mas ela engole as
palavras e leva as mãos até meus ombros.
— Eu preciso pensar.
Angel se levanta e caminha descalça sobre um tapete macio de
pelos. Ela morde o canto das unhas e não me encara mais.
Prontamente, levanto do sofá e me aproximo daquela bela mulher.
— Este é o meu número. — repasso-lhe um cartão. — Decidindo,
me ligue antes de comparecer à empresa.
Ela lê por alguns segundos o teor daquele papel e me encara.
— Se estiver preocupado com o seu pai, não perca o seu tempo. Ele
sempre me odiou e não vai ser diferente, caso eu decida retornar.
Essas poucas palavras me enchem de esperança.
— Todos saberem do nosso beijo não te incomoda? — cruzo os
braços, ansiando por uma resposta.
— De maneira alguma, foi apenas um lapso de minha parte. — é
cruel.
Levo uma das mãos ao seu rosto delicado, inspecionando os seus
olhos que me fitam desanimados.
— Não pareceu, Angel. Você estava completamente envolvida.
Ela respira de maneira profunda, abaixando os olhos. Aquela
mulher era repleta de sentimentos, mas não fazia questão de demonstrá-los.
Simulava todas as suas emoções, para se fazer de durona, mas por um
descuido, já me provou ser a mais doce das criaturas.
— Acho que você já pode ir, Jason. Eu preciso ficar sozinha,
conversar com os meus pais.
— Eles moram aqui?
Retorno ao sofá, não querendo me desvencilhar daquela companhia
tão agradável, nem tão cedo.
A bela garota finalmente se rende e se senta ao meu lado.
— Não, eles são da Carolina do Norte. Na verdade, eu fui criada e
nascida lá, apenas deixei as minhas raízes para ser humilhada pelo seu pai.
Sorrio incrédulo.
— Não fale isso, Angel. É muito doloroso para mim. Me vem à
memória todas as angústias que a minha mãe precisou passar enquanto os
dois estavam casados.
Finalmente, ela me encara com um olhar mais terno.
— Eu tenho dó de sua mãe e principalmente de você, Jason, por ter
um ser tão deplorável como uma das figuras mais importantes dentro da sua
família.
— É a vida. — relaxo nas almofadas, conformado. — São coisas
que não se podem escolher.
Sem eu esperar, Angel segura em minha mão. Ela me surpreende
com aquele gesto.
— Sabia que eu te admiro muito, Jason? Simplesmente por estar
disposto a salvar a empresa de Victor Collins. Se fosse outro, simplesmente
ignoraria o pedido do seu pai, por motivos óbvios, para viver a sua vida, em
Londres.
Sorrio genuinamente, feliz por ter conseguido presenciar doçura em
Angel, outra vez.
— Apesar de tudo, ele é o meu pai, não é mesmo?
— Você está certo.
Ficamos por segundos olhando um para o outro. Acho que essa era
maneira mais eficaz de reconhecermos as nossas afinidades. Angel explorava
o meu interior com facilidade, quando oscilava o seu olhar no meu de
maneira tão compenetrada. Eu ainda tentava descobrir o que de tão pesado
aquela mulher carregava em seu íntimo para tornar-se tão forte, tão
destemida. E eu sabia que teria ainda muito o que aprender com ela.
— Amanhã, eu te espero cedo na empresa. — insisto, acariciando o
seu queixo.
— Vá com calma, por favor. — responde, retirando a minha mão de
seu rosto.
— Até agora apenas a urgência fez parte de nossos encontros. —
sibilo, mirando exclusivamente na boca carnuda, deliciosa.
— Deve ser por que sejamos intensos demais para perdermos
tempo.
Diminuo o espaço entre os nossos corpos, me ajeitando no sofá.
Sinto o perfume dos cabelos de Angel e os seus lábios úmidos são um convite
altamente tentador.
— Você é encantadora, Angel. Corajosa por se esconder nessa
cabana no meio do nada.
Ela sorri.
— Aliás, como soube que é aqui onde eu moro?
— Um senhor me deu o seu endereço, no posto de gasolina. —
preferi omitir o detalhe dos trezentos dólares.
— É, realmente estou muito vulnerável aqui. — cruza os braços e
relaxa casualmente entre as almofadas. — Não se pode confiar em mais
ninguém.
— Sim... por isso você tem o meu número, pode me ligar a
qualquer horário.
Angel me observa e pisca os olhos lentamente.
Tentadoramente linda.
— Obrigada, Jason.
— Está na minha hora. — levanto do sofá. Não queria que a nossa
conversa tão agradável terminasse em sexo. Eu não estava ali para isso,
embora os meus instintos insistissem em me trair. — Espero revê-la em
breve. Todos estão tristes com a sua partida.
Angel já está de pé, à minha frente.
— Exceto Leonard. — ela completa.
— Pelo jeito o cara é apaixonado por você, e também quem não
seria?
Beijo uma de suas mãos, viro as costas e deixo as palavras pairando
no ar.
Saio da cabana e entro no carro, observando o vento brincar nos
cabelos de Angel, que se encontra tão vulnerável na varanda daquele casebre.
Angel Parker era realmente muito especial, e eu apenas desejava
que ela não ficasse desapontada comigo, quando conhecesse as obscuridades
do meu passado.
Cheguei ao apart hotel e joguei a minha pasta sobre o sofá. Retirei o
paletó e desfiz o nó da gravata.
Agora eu entendia quando Angel enaltecia a solidão. Sem dúvida
alguma, era útil, ajudava-me a descansar dos meus pensamentos, dos
brainstormings tão aterrorizantes em minha mente.
O que me ajudava a relaxar, de certa forma, era o saco de pancadas
pendurado próximo à minha cama. Era um resquício de minha adolescência
que me acompanhava em qualquer lugar que eu estivesse.
Assim que coloco os shorts e visto as luvas de couro, respiro fundo
e brevemente, e em seguida, desfiro os socos. Eu era fã de boxe. E todas as
vezes em que eu socava o saco de areia, eu me sentia mais leve, em paz. O
suor descia por minha pele, o meu tórax suava e não era apenas transpiração,
eram as energias todas que eu externava.
Agora, eu pensava em meu pai e em toda a sua ingratidão com
Angel. Se a menina decidisse, a qualquer momento, retornar à Carolina do
Norte, eu nem ao menos saberia. Isso me inflama. Desfiro mais socos. Os
meus braços tencionam, enquanto elevo a força em meus músculos, em
direção àquele objeto.
Estou ofegante, afasto-me do saco de pancadas e passo o braço
sobre a testa para conter as gotas de suor. Fecho os olhos e novamente me
vem a imagem daquela noite, o grupo de garotos, a usina antiga. Um trauma
que eu jamais superaria.
Retiro as luvas e vou em direção à geladeira. Pego a garrafa de
energético e bebo no gargalo. A sede que eu sentia era avassaladora.
Enquanto estou na pequena cozinha do apart hotel, o meu celular
toca. Olho para a mesa de cabeceira e é Radesh Achanta, o dono do resort na
República Dominicana.
Estranho aquela ligação no meio da noite.
— Alô.
— Estou tentando falar com o seu pai, mas ele não me atende. Não
sei o que o velho Victor está pretendendo. Desapareceu nos últimos dias.
Soco o colchão da cama, num ímpeto de fúria. Meu pai deveria
estar desviando mais dinheiro da empresa!
— Sr. Achanta, eu vou ajudá-lo. Eu preciso que tenha paciência. O
seu projeto vai caminhar.
— Eu preciso deste resort pronto para inaugurar no próximo
Verão. Eu não admito mais atrasos.
Bom, pelo menos o resort e as intenções de construí-lo existiam.
Isso me alivia demasiadamente. Não seria mais necessário ir até Punta Cana
para certificar da existência do projeto.
— Eu me comprometo, senhor, por favor...
Inferno, desligou!
Sr. Radesh Achanta já deveria estar impaciente com os sumiços de
meu pai.
Além disso, o atraso da obra não era um bom sinal. Eu havia
repassado aquela grande quantia de dinheiro à empresa, para que Victor
Collins desse o devido andamento aos detalhes finais da obra. Acreditava,
também, que ainda poderíamos contar com a reserva dos lucros — se ainda
existissem! — para entregar o empreendimento a Sr. Achanta, dentro do
prazo combinado.
Certamente, meu pai agora estaria bêbado, abraçado à sua garrafa
de uísque, dormindo como um morto. Convivi longos anos de minha vida ao
lado de Victor Collins e isso ainda era o mínimo que eu poderia inferir a seu
respeito. E o que me resta é pegar o carro e ir em direção à sua mansão.

***

Já era meia-noite, quando dobrei a primeira curva em direção à casa


da minha infância. Aquele lugar me remetia a muitas lembranças e,
infelizmente, a maioria delas não eram tão boas de se relembrar.
O meu pai sempre foi muito injusto comigo, o seu jeito indiferente
e o coração duro nunca me proporcionaram momentos muito felizes.
Acredito que seja por conta desses altos e baixos na convivência
com meu pai que decidi dedicar grande parte dos meus dias ao boxe. O
esporte era uma perfeita válvula de escape, além das alegrias das vitórias no
tatame que preenchiam todo o vazio que Victor Collins teimava em deixar em
meu coração, dia após dia.
Estaciono em frente à mansão e noto a casa escura. Embora eu já
soubesse que o meu pai estaria mais uma vez, imergido nas bebidas, eu
estava demasiadamente preocupado.
Abri a porta de casa e a sala estava iluminada apenas pelos abajures
altos e elegantes que decoravam aquele ambiente requintado. Dei poucos
passos, mas o suficiente para enxergá-lo deitado em uma das poltronas de
couro, ressonando profundamente. Como o premeditado, a garrafa de uísque,
ao seu lado, já estava pela metade.
Cheguei perto de Victor e cruzei os braços, de maneira impaciente,
observando o seu semblante deplorável. Ele babava enquanto um ronco
estranho reverberava pelo cômodo.
— Pai, ei. — dou um toque em seu ombro. De repente, ele abre os
olhos, assustado, e segura em meu pulso com brutalidade.
— Aonde você estava, moleque?
Os seus cabelos grisalhos estão bagunçados e a sua voz
entrecortada penetra os meus ouvidos, de maneira que o bafo alcóolico
adentra imediatamente por minhas narinas.
Retiro o meu pulso de sua mão.
— Está bêbado outra vez!
Viro de costas, indo em direção à cozinha, para pegar um pouco de
água gelada, mas o meu pai, completamente debilitado pelo álcool, que já
tomava conta de grande parte de sua corrente sanguínea, levanta cambaleante,
vindo na minha direção.
— Você é um inútil, vagabundo! — esbraveja, gesticulando as
mãos. — O que você pensa da vida? Que vai viver de esporte! Rasguei
dinheiro pagando a sua faculdade!
— Eu não sou mais um adolescente! Enlouqueceu? — grito,
observando a vermelhidão nos olhos de Victor Collins. — Quer saber? Eu
vou embora! Não sei o que estou fazendo aqui.
Nem me dou conta e ele se aproxima, segurando, com os punhos
cerrados, a gola de minha camisa, então meu pai enfia os olhos raivosos
dentro dos meus e me desfere palavras muito cruéis.
— Verme, faça isso mesmo, suma da minha frente, agora. Eu não
estou a fim de aturar pirraça de um fedelho como você, um imundo que só
serve para sugar todo o meu dinheiro!
Sem eu ao menos esperar, um soco alcança o meu rosto, num
impacto doloroso em minha mandíbula. Viro o rosto, colocando a mão onde
doía e volto a encará-lo. Victor Collins caminhava sem rumo pela sala,
trocando as pernas.
— É só isso o que o senhor sabe fazer? Me bater? — chuto a mesa
de centro, observando o vaso indiano quicar sobre a sua superfície. — Por
favor, fale alguma coisa! Os anos se passaram e nada mudou? — grito,
esperando que ele me responda, queria tentar encontrar algum resquício de
arrependimento em sua fala, porém o que acontece é o contrário de minhas
esperanças.
— Eu te bato porque eu não posso te... — o homem pausa.
— Não pode o quê, Victor Collins? Termine a sua fala!!! —
esbravejo, sentindo uma dor de cabeça descomunal.
O meu pai se joga sobre a poltrona e me encara nos olhos. Um dos
olhares mais frios que já ousou me fitar.
— Você não tem coragem... é um covarde... — sibilo, sentindo o
meu coração dilacerado.
Caminho pela sala, em silêncio, apenas ouvindo a respiração
afetada daquele que se dizia “meu pai”. Passo as mãos pelo rosto e viro-me
na direção daquele senhor de sessenta e oito anos.
Milionário, poderoso e completamente infeliz.
— O que você quer ainda comigo? — ele pergunta, orgulhoso.
Aproximo-me do sofá, segurando em seus braços.
— Vamos para o banho.
— Não. — ele reluta, mas, mesmo assim, ainda mantenho as
minhas mãos firmes em seus braços magros.
— Vamos agora. — grito, sem lhe dar chance alguma de relutar.
Teimei, pegando o velho no colo, exatamente como se fosse um
inválido. Um homem inteligente e poderoso, agora, rendido em meus braços.
Ele era magro e aparentava fumar, no entanto não suportava a fumaça do
cigarro, dizia que ninguém nasceu com uma chaminé na cabeça para se
render dessa maneira ao tabaco.
Ele tinha as suas fraquezas, loucuras, maldades.
Mas era o meu pai.
Enquanto subo as escadas com Victor Collins em meu colo,
imagino o quanto fui maltratado a vida inteira, nesta casa. Socos, brigas,
injustiças. Contudo, nunca tive sede de vingança, principalmente após a noite
mais triste da minha vida, na usina de asfalto.
Enchi a banheira de água fria, enquanto o velho Victor estava
deitado sobre a cama.
E não demorou muito para cair no sono outra vez.
Tirei a sua roupa e o coloquei sentado naquela água gelada. Aos
poucos, ele relaxou e, então, ajudei a ensaboar as suas costas. Não era a
primeira vez e nem a última em que eu faria isso por ele.
— Está tudo bem. — eu lhe disse enquanto ele me olhou nos olhos,
confessando:
— Eu te amo, filho.
Amassei os lábios, contendo as dores que pulsavam em meu
coração.
Às vezes, eu duvidava do seu amor, às vezes, não. Nunca me senti
em terreno seguro para afirmar com precisão sobre os sentimentos do meu
pai.
Segurei em suas mãos magras e Victor Collins já se sentia mais
sóbrio. Ele conseguiu se enxugar sozinho e vestir o seu pijama de marca.
Ainda em silêncio, o meu pai se deitou sob o edredom e fechou os olhos, em
segundos, já ressonava.
Saí do quarto e desci as escadas em direção à sala de estar. Então,
passei pela adega e pelo bar, e levei todas as garrafas comigo.
Eu não sabia mais o que fazer para salvar papai de si mesmo. Tanto
na empresa, quanto nas bebidas.
Poucos minutos depois, já dirigia em direção ao apart hotel, mas
com o coração ainda destruído.
Todas as vezes em que o meu pai agia dessa maneira, era uma parte
de mim que morria.

***

Fazia duas semanas que eu não tinha mais notícias de Angel Parker,
se ela resolvera retornar à Carolina do Norte ou se ainda estava decidindo
ficar. Eu não poderia me permitir procurá-la outra vez. Não queria parecer
invasivo. O que me restava era focar nas esperanças de que Angel retornaria
em breve.
Hoje, era quarta-feira. Normalmente, o meu pai tirava esse dia de
folga. E para mim era extremamente bom, já que era o momento ideal para eu
desenvolver o trabalho junto à equipe, sem ser importunado.
— Leonard, por favor, venha até a minha sala. — disse, quando
passei perto do rapaz, não conseguindo evitar a tristeza ao fitar a mesa vazia
de Angel, ao seu lado.
A função de Leonard, na Collins Construtora, era a de cuidar da
prestação de contas, entre tantas outras coisas. O rapaz, apesar de tóxico, era
competente no que fazia, e me restava saber dele, quanto à verba destinada ao
resort de Sr. Achanta.
Eu estava evitando, ao máximo, dirigir palavras àquele cara, desde
quando ele ferrou com a vida de Angel, sobre o nosso beijo, mas, hoje, eu
não poderia mais evitar, precisava dar conta dos assuntos com Leonard,
aproveitando que o meu pai não estaria aqui, para vigiar as minhas
averiguações.
— Pois não. — o rapaz chega à minha sala e cruza os braços,
próximo à porta, imediatamente percebo o seu semblante impaciente.
Ele me odiava.
— Pode sentar. — digo, apontando para a cadeira.
— Estou bem assim. — reluta, colocando as mãos nos bolsos.
Assim que me sento à cadeira, entrelaço as mãos sobre a mesa e
observo o rosto de poucos amigos daquele homem.
— Leonard, eu vou ser bem direto. Sr. Achanta entrou em contato
comigo há alguns dias, para cobrar a pronta execução do resort em Punta
Cana. — noto o rapaz desviar o olhar preocupado. — Por que ainda não
entregamos boa parte da obra? Não poderemos atrasar, afinal de contas, o
indiano foi categórico, exigiu que a obra seja executada até o Verão.
O rapaz sorri debochado, coçando os cabelos da nuca de maneira
impaciente.
— Jason, por favor, eu sou um reles funcionário. Você deve
direcionar essas cobranças ao seu pai.
— Não mude o assunto. — levanto da cadeira e caminho na sua
direção. — Não se exima de suas responsabilidades. Basta me dizer o que
pode estar ocasionando esse atraso!
Já estava perdendo a paciência com a maneira despreocupada que
Leonard tratava de assuntos tão sérios!
— As contas estão em dia, Jason. Apenas reproduzo o que constam
nas notas fiscais que o seu pai me repassa. — ele diz, mas não é o suficiente
para me convencer de que ele não sabia de mais nada.
Então, me aproximo ainda mais de Leonard e o encaro nos olhos.
No primeiro momento, ele se abala, para depois esboçar forçadamente um
olhar arrogante.
— O meu pai já mexeu nos oitocentos mil dólares que eu trouxe
para auxiliá-lo no projeto?
Leonard se cala por segundos, engole em seco, antes de passar a
mão pela barba.
— Acredito que sim.
Essa resposta me deixa demasiadamente preocupado. Se o projeto
não estava caminhando, para onde poderia estar sendo destinado todo o
dinheiro? Ao mesmo tempo, eu não confiava em Leonard, poderia estar
mentindo para encobrir Victor Collins.
— Por favor, chame a May.
O rapaz vira de costas, não evitando o semblante angustiado. Ele
sabia de mais coisas do que se permitiu falar.
Segundos depois, a secretária chega à sala, batendo as unhas
grandes na superfície da porta. A saia justa e curta mostrava as coxas
morenas de sol. O decote ousado. A boca vermelha que destacava no meio do
rosto bem maquiado. Ela era bonita, mas nem tanto quanto Angel.
— Pois não, Sr. Jason?
— Jason, por favor. — respondo, concentrado, procurando uns
documentos sobre a mesa.
— Não consigo tratá-lo apenas como Jason, pareço ser íntima sua,
sem ao menos ser...
Levanto o rosto e miro nos olhos de May. Ela aparentava ser
ingênua, entretanto de inocente não tinha simplesmente nada.
— Não é questão de intimidades, May. Esse é o meu nome e... não
suporto formalidades.
— Pois não, Jason. — ela diz, em meio a um sorriso cheio de
insinuações.
Coço a barba, querendo desviar do olhar da loira que me despia o
corpo sem pudor algum.
— Eu preciso que você me acompanhe até o cofre.
— Claro.
May solta os cabelos do coque, cheia de intenções com aquele
gesto, mas eu tento continuar firme em minha postura exclusivamente
profissional.
— Você sabe a senha? Eu sei que o meu pai mudou nos últimos
dias. — pergunto, enquanto ela se senta sobre a minha mesa.
Parecia uma adolescente num joguinho barato de conquista.
— Sim, eu sei. — ela cruza as pernas e, dessa vez, eu não consigo
desviar o meu olhar, imediatamente noto a renda branca da calcinha que
aparece sutilmente com aquele gesto atrevido. — Inclusive Sr. Collins pediu
para que eu não te repassasse.
— Ele pediu isso? — estou pasmo.
— Sim, mas eu não estou a fim de obedecê-lo.
Entorto os lábios num sorriso, observando aquela mulher. Ao
mesmo tempo, temia por May pedir algo em troca.
Assim que atravessamos juntos o setor, não pude evitar de perceber
os olhares insinuadores. Talvez eu ser tão jovem não passava credibilidade
dentro daquela empresa. A maioria das pessoas certamente acreditavam que
eu estava ali apenas para “comer” mulheres.
A porta do elevador se abre, e com um gesto, eu peço a May que
passe à minha frente. Ela sorri em agradecimento. A mulher se coloca
estrategicamente em frente ao espelho e se encara, contornando os lábios
carnudos com um dos dedos, como se tirasse o excesso do batom vermelho.
Apenas desvio o olhar para o meu celular, torcendo para que o elevador
vencesse os andares, sem demoras.
Finalmente saímos daquele pequeno espaço, May vai à minha
frente, rebolando de maneira sedutora. Ela me olha de lado, talvez
certificando se eu acompanhava com os olhos o seu maldito rebolado, então
atento o olhar ao final do corredor, concentrado de que eu estava ali apenas
para o trabalho e exclusivamente isso.
May tem um molho de chaves na mão, ela abre a porta da antessala,
que dava para a sala sigilosa, onde se encontravam o cofre e alguns
documentos peculiares.
— Você quer saber o segredo do cofre? — ela me pergunta, assim
que entramos na antessala. A outra porta, onde ficava o cofre, ainda estava
trancada.
May não me dá chances de dizer simplesmente nada, ela segura
firme em meu paletó e me empurra contra a parede. Respiro fundo, já
inferindo o que a secretária poderia estar querendo comigo.
— Quero, mas não sob condições. — respondo, analisando o seu
rosto cheio de desejos.
— Não, Jason... você está completamente enganado... — após
lamber o meu queixo, ela sibila: — Gostoso... — sinto a unha de May
deslizar pelo meu peitoral. — Agora, quem manda aqui sou eu.
Assim que me afasto da parede, ajeitando o paletó do terno, May se
joga à minha frente, entreabrindo os lábios, ao mesmo tempo em que afana
um dos seios. Tento me controlar, mas os meus instintos já me obrigavam a
comê-la.
— May, não me provoque dessa maneira. — informo, segurando
em seu pulso, tentando pará-la, mas é em vão.
A mulher coloca os seios para fora e levanta a saia delicadamente.
Respiro ofegante, passando a mão entre os cabelos, sem saber mais o que
fazer para desviar o meu olhar.
Tento disfarçar que os desejos começavam a borbulhar em minha
corrente sanguínea, mas a ereção praticamente rasga a minha calça.
May sorri, quando passeia os olhos pelo meu corpo e me puxa para
si.
— Não pode ser dessa maneira... — balbucio, mirando em seus
lábios.
— Você me deseja, eu sei...
Beijo a boca da secretária, odiando-me por ser tão fraco. As minhas
mãos já se adiantam em seus seios macios, enquanto acaricio um dos bicos
rosados. Ouço May gemer excitada, em meu ouvido, pedindo que eu fique
pelado para ela.
A sala estava silenciosa, apenas o som do alarme do cofre e dos
nossos beijos molhados preenchiam aquele lugar.
Já estava completamente entregue. Como um adolescente no auge
de sua ebulição de hormônios, eu me rendia à sedução de May, naquela
pequena sala.
Sem demoras, abaixo o meu rosto em direção aos seus seios e
lambo-os, sentindo os mamilos durinhos excitados deslizar por minha língua.
Ela sorri quando desço a mão por sua coxa gostosa, levando um dos dedos até
sua calcinha branca de renda. Abaixo um pouco uma das laterais de sua
lingerie e abro as camadas de sua boceta, em busca do nervinho excitado.
Não é preciso de muito para senti-lo quente e melado na ponta de meus
dedos. Deslizo gostoso pelo seu clitóris e ela grita, mordendo o meu ombro.
Imediatamente já sinto a mão da secretária entrar por minha calça e
apertar deliciosamente o meu pau duro. Ela esfrega o polegar na cabeça
melada, o que me faz apertar os olhos, enquanto sugo a sua língua e enfio
dedos em seu canal molhado.
A mulher rebola em meus dedos e choraminga assim que cravo as
unhas em sua bunda, prestes a rasgar a sua pele tamanho tesão, tamanha raiva
por não conseguir me sustentar por muito tempo em minha postura
profissional.
May segura o meu rosto e pede quase sem voz para que eu penetre
em sua boceta.
Abro o cinto e coloco o pau para fora, quando...
— Desculpa incomodar alguma coisa, mas queria apenas avisar que
estou de volta.
Olho para o lado e os olhos frios de Angel Parker me encaram.
— A senha é o número da placa do carro do seu pai.
May se afasta, cabisbaixa, ajeitando a roupa no corpo.
Estou desnorteada, observando o rosto apavorado de Jason Collins.
Ele simplesmente não sabe o que fazer com as mãos.
— Angel, você... você voltou.
Ele tenta sorrir, mas não consegue. O moreno desejava naquele
momento fugir, abrir um buraco no chão, para desaparecer irreversivelmente.
— Desculpas, Angel. — ele vem para perto de mim, com aqueles
lábios manchados de batom vermelho. Que cena patética! — A May ficou me
provocando, eu tentei relutar!
— Eu não estou perguntando nada. Faça o que você quiser com
esse seu pênis! — respondo de maneira crua.
— Angel... eu preciso apenas ver o cofre. — ele ainda tenta limpar
os lábios com um lenço, absurdamente sem graça. — Você me acompanha?
Não quero que me vejam aqui sozinho.
Respiro fundo, imaginando que eu deveria acompanhar aquele
cafajeste, até o bendito cofre, afinal de contas, eu estava ali, na Collins
Construtora, apenas para o trabalho. E não para casos bestas de romance com
cafajestes lindamente deliciosos.
Faço que sim com a cabeça, ainda esboçando um semblante sério.
Assim que me movo em direção à outra porta, Jason sorri torto, mostrando as
covinhas, aliviado.
Já estávamos dentro da sala, quando o belo moreno acionou o cofre.
Ele estava visivelmente ansioso. A porta imensa e robusta se abre,
lentamente. Os meus olhos penetram curiosos para o interior do cofre e ao
mesmo tempo eu imagino que Sr. Victor jamais me permitiria embrenhar em
segredos tão ocultos daquela empresa.
Lá dentro havia papéis, alguns bolos de dinheiro e a pasta que Jason
havia trazido de Londres. Ele imediatamente pega e destrava a pasta, e
quando abre, vejo poucos dólares em relação ao montante que Jason havia
trazido da Europa.
— Olha, Angel, se tiver cinquenta mil dólares aqui é muito. —
lamenta, apavorado.
O meu coração aperta, em preocupação. Era muita canalhice da
parte de Sr. Victor.
— E o projeto do resort, não está caminhando?
Jason guarda a pasta e trava outra vez o cofre, enquanto fala.
— Segundo o Sr. Achanta, que é o dono do resort, não está.
Jason leva as mãos ao rosto e suspira de maneira profunda. Se eu
não o tivesse flagrado em um amasso com May, talvez poderia oferecê-lo um
ombro-amigo, mas diante de toda a situação... sem chances!
— Boa sorte, então. — desejo, ao mesmo tempo em que me viro
em direção à saída.
Mas tão logo sinto a mão de Jason em meu braço.
— É só isso? Boa sorte? Você não vai me ajudar a investigar o
desaparecimento desse dinheiro?
Os seus olhos retratam um amontoado de decepções.
— Está na cara que é o seu pai. — retiro lentamente a mão de Jason
de mim. — Ele está desviando os fundos da empresa. Você ainda não
percebeu? É o suicídio da Collins Construtora! — Jason parecia não querer
acreditar na realidade nua e crua. — Agora, eu preciso passar no RH. Eu vim
até aqui apenas para comunicá-lo da minha decisão, após Luan me falar no
elevador, que você e May estavam vindo juntos em direção à sala sigilosa.
Jason está visivelmente triste. Eu sabia das suas boas intenções em
ajudar a salvar a empresa do seu pai, mas eu não queria me permitir
esmorecer diante de todo o seu charme, afinal de contas, ele não merecia a
minha atenção, até pelo menos eu ter digerido o “amasso” dos dois, nesta
sala.
— Sim, Angel, você será recontratada, eu deixei tudo articulado
com o RH, mas eu ainda preciso da sua ajuda. — ele coça o queixo, antes de
continuar na sua ideia fixa. — Obviamente, o dinheiro está sendo desviado
por meu pai, como eu mesmo já havia te falado, mas eu preciso saber aonde
ele está destinando valores tão absurdos e com qual intenção... — então, ele
se aproxima de mim e infelizmente sinto o perfume barato de May em sua
roupa. — Você já parou para pensar, Angel, que o meu pai pode ter um
aliado dentro desta empresa?
Após um breve silêncio, Jason segura em minha mão de maneira
delicada. Volto a olhar em seus olhos negros e ele exibe um semblante
perdido. Parecia que o rapaz confiava apenas em mim, como peça-chave,
para ajudá-lo a salvar os seus negócios.
— A May não está te ajudando? — implico, ao mesmo tempo em
que cruzo os braços, evitando a sua mão na minha.
— Angel, você está com ciúmes? — ele pergunta junto a um
sorrisinho charmoso.
— Não foi nada agradável vê-lo atracado com aquela oferecida,
mas não chega a esse ponto. — sou sincera, para a satisfação visível de Jason
Collins.
Viro as costas e caminho até o elevador. Imediatamente sinto os
passos de Jason vindo na minha direção.
Aperto o botão, para subir até o RH e assim que a porta abre, o
rapaz se enfia comigo naquele pequeno espaço.
Ele estava irritantemente lindo naquele terno cinza.
— Hoje, combinamos de ir à boate, o que acha? — pergunta, com
as mãos no bolso.
— Não... não sei se vou... — suspiro. — ainda não retornei ao setor
para sentir como estará o clima entre mim e a equipe.
O elevador se abre e Jason, gentilmente, segura a porta para que eu
passe.
— Vai estar tudo bem, a questão agora é você não comentar o que
viu na antessala do cofre.
Cretino!
Congelo os passos, apenas para encará-lo nos olhos.
— Você realmente não conhece a May. Se prepare para quando
chegar lá em cima. Todos já saberão de detalhes! — estou visivelmente
irritada. Continuo vibrando os meus saltos por aquele corredor, enquanto
Jason tenta me acompanhar.
— Isso vai ser péssimo. — Jason esboça um semblante preocupado.
— Pois é... — sorrio triunfante, por inferir que o rapaz já deveria
estar terrivelmente arrependido por ter se atracado com a secretária. — você
já deve estar carregando nos ombros a fama de cafajeste!
— Não foi a minha intenção, Angel, a May me chantageou.
— Não parecia.
Finalmente, paramos em frente à porta do RH. Jason me analisa
com os olhos brilhantes.
— Estou muito feliz que você decidiu voltar.
Sorrio e abaixo os olhos, quando ouço inesperadamente, declaração
tão cheia de afeto.
O charme de Jason me constrangia.
Então, ele segura delicadamente em meu queixo, nivelando os
nossos olhares.
— Angel, eu confio tanto em você... apesar de tão pouco tempo de
convívio, foram momentos tão intensos juntos, eu não sei explicar porque eu
tenho essa sensação de que eu já te conheço há tanto tempo.
Abaixo os olhos novamente, relutando confessar que eu sentia
exatamente o mesmo por ele.
Umedeço os lábios e inspeciono aquele lindo rosto... de um
cafajeste!
— Fica aí tentando entender os seus sentimentos, Jason, enquanto
eu vou assinar a readmissão.
Abro a porta, deixando-o estatelado do outro lado do vidro. O rapaz
engole em seco, antes de me dizer:
— Seja bem-vinda, outra vez, Angel Parker.

***

— Boa tarde, equipe. Queria dar a vocês uma ótima notícia!


Estou junto a Jason, na porta do setor, sentindo o meu coração
martelar em meu peito. Estava exageradamente ansiosa para saber logo da
reação dos meus amigos.
— Angel está de volta! — Jason profere, sorrindo, enquanto eu dou
os primeiros passos para dentro da sala.
Todos vibram, aplaudindo, quando atravesso a porta.
Entro naquele setor com a mesma sensação de quando deixei os
meus pais e a minha cidade para trás, para acreditar numa carreira bem-
sucedida na Collins Construtora.
Parecia a primeira vez.
Os meus olhos marejam, pois a recepção foi bem melhor do que eu
esperava.
Exceto Leonard, que ainda com os seus fones de ouvido, fazia que
não me via, mantendo os olhos presos na tela do computador.
— Hoje, teremos um bom motivo para sair para dançar! — Estefani
vem sorrindo ao meu encontro, me dando um forte abraço. — Quero saber
por que não atendeu às minhas ligações, Angel.
Sorrio, deixando os meus pertences novamente sobre a mesa.
— Eu estava em um momento em que precisava reorganizar os
meus pensamentos, Ester, pensar se de fato valeria a pena estar de volta a
Collins Construtora. — então, nos sentamos nas cadeiras. — Foi humilhante
a maneira como eu saí daqui, então eu precisava desse momento comigo
mesma. — suspiro antes de prosseguir. — E se eu parasse para conversar
com você, Ester, certamente iria influenciar na minha decisão, já que eu
estava com saudades de todos vocês, até mesmo do fofoqueiro do Leonard,
então eu queria que o meu retorno acontecesse da maneira mais genuína
possível.
— Você está certa, Angel. — minha amiga segura em minha mão.
— E quer saber? Leonard ficou realmente mal quando você foi despedida por
Sr. Victor.
Reviro os olhos.
— Eu duvido muito dos arrependimentos de Leonard.
A minha amiga me censura com o olhar semicerrado, por cima dos
óculos vermelhos, antes de prosseguir.
— Ah... e Jason Collins... — Estefani dá um suspiro em meio a um
sorrisinho. — também não demonstrou alegria com a sua partida. Ele estava
ansioso com a sua volta, Angel! Parecia que tinha certeza de que você
retornaria.
— Ele aparenta ser seguro em tudo o que faz. — inspiro, quando
me dou conta que essas palavras se desprenderam do meu íntimo, sem ao
menos perceber.
— Vocês combinam tanto, sabia? — Estefani me analisa com um
olhar de ternura, enquanto sinto em meu peito uma sensação boa e estranha,
ao mesmo tempo. — Vocês têm a mesma força de vontade, o mesmo brilho
no olhar quando o assunto é esta empresa.
Sorrio amarelo, sem saber o que responder.
Será que estava tudo tão nítido assim?
— Querida! Estou tão feliz que você está de volta! — sinto umas
mãos repousarem sobre os meus ombros, de repente.
Olho para cima e encontro o sorriso largo da secretária de Victor
Collins.
— Obrigada, May. — agradeço, querendo continuar o assunto com
Estefani, mas a loira se ajoelha à minha frente, depositando as mãos em meus
joelhos.
— Uau... o Jason é um gostoso... você sabe do que eu estou
falando...
— Não, não sei. — estou perplexa com tanta falta de noção. —
Também não sei por que está me falando isso!
May sorri debochada, o que me inflama ainda mais.
— Angel, não se faça de sonsa, minha linda...
— May, eu não estou me fazendo de sonsa, eu apenas não quero
dividir com você assunto tão irrelevante como este. — May se levanta
lentamente da minha frente. — Jason Collins é um excelente profissional e
apenas isso o que me interessa. — minto.
A moçoila entorta o nariz e sai em direção à sua mesa. Precisei dar
um basta em suas insinuações antes mesmo que eu entrasse num embate com
aquela assanhada. Não que eu estivesse com ciúmes, ou coisas do tipo, mas a
May era a rainha do nonsense! E isso me irritava!
Bom, pelo menos a secretária não chegou a proferir aos quatro
ventos a respeito de seu “amasso” em Jason. Talvez temesse acontecer com
ela, o mesmo que aconteceu comigo, após o meu beijo naquele cafajeste: o
“olho da rua”.
— Depois conversamos, Angel. — Estefani levanta-se da cadeira
após testemunhar o meu embate com May. — Ainda tenho muitas novidades
para te contar. — e sai, piscando o olho.
Já imaginava que Ester teria muito para me contar a respeito de
Jason e May.
Será que eles estariam tendo um caso?
Inspiro lentamente, tentando me desvencilhar dos pensamentos
patéticos que rodeavam a minha mente.
Que se danassem aqueles dois!
Assim que me coloco à frente do computador, sorrio aliviada por
estar de volta. Eu não saberia viver sem a minha rotina louca neste lugar.
E quando olho para o lado, Leonard ainda finge que não me vê.
Apenas reviro os olhos entediada com as criancices daquele rapaz.
— Jason Collins colocou você para dentro de novo? Por isso que é
vantajoso se atracar com o chefe da empresa pelos becos da cidade.
Giro a cadeira na direção de Leonard assim que ouço às suas
palavras ácidas, tão gratuitamente. Ele só poderia estar enlouquecendo, ou
simplesmente estava tentando me enlouquecer!
— Leonard, o que está acontecendo? Eu fiz alguma coisa para
você?
O rapaz sorri de lado, como se eu estivesse perguntando um
absurdo qualquer.
— Sempre tão segura quanto a relacionamentos e agora parece mais
uma idiota apaixonada pelos cantos dessa empresa.
Eu nunca havia visto Leonard descompensado dessa maneira.
O que a presença de Jason estaria fazendo com a sua autoestima,
com o seu bom-senso, os seus neurônios? Parecia um maníaco, neurótico,
prestes a me sufocar com tantos ciúmes absurdos. E o melhor a fazer, no
momento, é ignorá-lo.
— Você está vendo coisas, Leonard.
Agora, quem coloca os fones nos ouvidos sou eu, destinando a
minha atenção inteiramente aos projetos futuros da empresa.
Ajudar Jason Collins era o meu único objetivo, no momento.

***

Retoquei o batom no espelho do banheiro. Não estava tão


empolgada para curtir a noite com os meus amigos, na boate, mas apenas por
ter uma oportunidade de espairecer, de ter uma social, já era o suficiente para
me animar. Passei um pouco mais de rímel, em meus longos cílios, desfiz o
coque e penteei os cabelos. Em seguida, encarei-me por segundos no espelho.
As minhas olheiras, pelas noites mal dormidas, devido a todas as indecisões
quanto ao meu futuro profissional na Collins, ainda estavam lá.
Suspirei e saí ainda desanimada do banheiro, apagando a luz, e
quando fiz menção de caminhar em direção ao elevador, dei um esbarrão em
um corpo forte e imponente. Para a satisfação dos meus desejos, era Jason
Collins. Os meus olhos imediatamente esquadrinharam cada parte de seu
corpo. Ele estava sem o paletó do terno e sem a gravata. Apenas a blusa
branca marcando o corpo robusto e lindamente torneado... de um cafajeste.
Ele sorriu torto.
— Está linda. — sibilou me olhando de maneira séria.
Ao mesmo tempo, inspirei lentamente, tentando represar todos os
elogios que eu poderia desferir àquele belo rapaz, contendo-me apenas a
agradecê-lo.
— Quer uma carona, Angel? — Jason recosta casualmente no
batente da porta do nosso setor e coloca as mãos nos bolsos, aguardando um
“sim” de minha parte.
Passeio um pouco mais os meus olhos gulosos sobre a abertura dos
botões de sua camisa social, fitando o início dos músculos de seu peito,
imaginando o quanto era estranho ter transado com Jason, sem realmente tê-
lo inteiramente nu, em meus braços, sem saber como é aquele belo homem,
exatamente como veio ao mundo. Apesar de termos limitado a uma
“rapidinha”, certamente foi mais delicioso do que muitas transas que já me
permiti por aí.
— Não, eu vou no meu carro, obrigada. — observo como Jason me
analisa com os olhos sérios. — Assim não dependo de ninguém, quando
precisar ir embora.
— A gente se encontra lá? — o tom sedutor de sua voz faz uma
bagunça imensa em meus desejos.
Apenas assinto, ajeitando a bolsa no ombro.
O que eu mais queria era passar a noite inteira dentro daqueles
braços fortes. E ao mesmo tempo me odiava por estar tão carente de Jason,
nos últimos dias.
Uma dualidade de emoções, era o que eu verdadeiramente sentia.
— O que foi, Angel? Estou te achando triste. — Jason analisa,
enquanto dá pequenos passos na minha direção.
Abaixo os olhos, querendo confessar todas as confusões
sentimentais que aquele belo homem me surtia, mas apenas me permito dizer:
— É cansaço.
Jason me encara desconfiado, certamente a minha desculpa não
havia colado, e para a minha surpresa, ele continua com a sua voz
desconcertante e rouca no silêncio daquele imenso corredor.
— Pensei que estivesse feliz por estar de volta à empresa. Eu sei o
quanto leva o seu trabalho a sério na Collins e batalha para que não fechemos
as portas.
Dou um longo suspiro, antes de ajeitar os fios que escorregam por
minha testa. Surpreendia-me saber como Jason sabia tanto a meu respeito, em
tão pouco tempo de convívio. Talvez eu fosse a mais óbvia das mulheres no
seu ranking de cafajestices.
— É exatamente por isso que estou desanimada, Jason. Não sei se
tomei a decisão correta ao retornar. Na verdade, não sei se valerão à pena
mais embates pela frente, com o seu pai.
Jason arregala os olhos em preocupação. Talvez eu tivesse jogado
um balde d’água fria nas suas esperanças quanto ao meu engajamento frente
à recuperação de seus negócios.
— Eu entendo o seu desânimo, Angel, mas apenas quero que pense
com carinho no que podemos fazer juntos quanto ao futuro da Collins. —
então, sinto Jason colocar uma madeixa por trás de minha orelha. — Só que
agora não é hora para isso. Quero te encontrar feliz na boate, sem
preocupações de trabalho.
Concordei, entendendo todas as aflições que Jason poderia estar
passando diante da postura irresponsável de seu pai.
Eu sempre estive disposta a ajudá-lo, isso eu não poderia negar.
Desde quando Jason pisou nesta empresa, eu estive completamente
determinada a mudar os rumos da Collins, no entanto, o que eu não esperava,
era ser derrubada por um sorriso torto de covinhas e sedutores olhos negros.
Isso, realmente, não estava nos meus planos.
E a minha preocupação se dava apenas por isso.
Eu não queria me envolver com Jason Collins.
Após me despedir do filho do meu chefe, com um sorriso nem tão
animado assim, sigo em direção ao elevador. E enquanto caminho pelo
corredor de mármore, sinto o olhar do belo homem queimar a minha pele.
Eu não entendia muito bem quais eram as suas intenções e, ao
mesmo tempo, procurava descobrir o que me fazia sentir tão terrivelmente
tentada por Jason. Parecia que ele deixava escapulir algum tipo de energia
magnética prestes a me grudar ao seu corpo, de maneira irreversível.
Já no carro, imagino o quanto seria difícil de resistir aos encantos
de Jason Collins, esta noite.
Ele não era apenas mais um.
A transa no carro de luxo de Jason, naquele fim de noite, me trouxe
uma espécie de conexão diferente com aquele homem. E depois de descobrir
que o belo era filho do meu chefe e partilhava dos mesmos anseios que os
meus, entendi que aquele cara não atravessava os caminhos de minha vida
por acaso.
Mesmo Jason se mostrando um belo cafajeste, eu estava disposta a
sentir os seus beijos outra vez, obviamente sem o intuito de compromissos!
Longe de mim!
Saborear aqueles lábios e me permitir naquele corpo era o que eu
mais desejava nas últimas horas. Já estava extremamente difícil fazer de
conta que os meus desejos por Jason não existiam.
Vê-lo pelado ainda era uma meta a ser alcançada, dentro da minha
check list de coisas para fazer antes dos trinta anos.

***

A boate estava lotada. Infiltrei no meio das pessoas, à procura de


algum rosto conhecido, mas o que encontrei foram apenas os corpos
dançantes e suados por toda a extensão daquele ambiente.
As luzes azuladas piscavam incessantemente, enquanto eu olhava
ao redor. O gelo seco saindo por debaixo da mesa do DJ serpentinava pelo ar,
juntando-se aos flashes coloridos dos pequenos holofotes presos ao teto.
Fazia tempo em que eu não vinha a este lugar. Da última vez, terminei a noite
na casa de Leonard, ou melhor, na sua cama, entre garrafas de vinho e
pedaços de queijos suíços, e apenas por me lembrar do ocorrido, o meu
estômago se contorce em ojeriza.
Dou breves passos, esquivando-me das pessoas, tentando me
aproximar do bar, quando de repente sinto uma mão repousar em meu ombro.
Os pelos de meu braço eriçam no mesmo instante. Eu já deveria
saber de quem se tratava, afinal, os meus instintos afloravam apenas com o
toque de Jason Collins.
Maneei o rosto para trás e fitei os olhos negros daquele belo
homem. Ele sorria sedutoramente para mim, enquanto eu nivelava os nossos
corpos. A música que preenchia a boate era alta e agitada, mas, por aqueles
segundos, eu não ouvia exatamente mais nada.
— Quer dançar? — o belo rapaz me convida com os olhos
compenetrados nos meus.
Assinto, imaginando que era para aquilo mesmo que eu estava ali
esta noite.
Envolvi os meus braços no pescoço de Jason e prontamente já senti
as suas mãos em minha cintura. Sorri para o cafajeste, imaginando que ele era
o desejo de muitas garotas daquela empresa, entretanto a química entre nós
dois era, certamente, a mais perfeita de todas.
Desde o primeiro dia, desde o primeiro contato, eu já senti como
Jason detinha o poder inexplicável de abalar todas as minhas estruturas.
— Você é tão bela, isso é um crime... — sussurrou em meu ouvido,
deixando o meu coração sem ritmo.
Os dedos do moreno se misturam aos meus cabelos, e eu já presumi
que aquilo era um prenúncio de um beijo.
O mar de gente, que nos envolvia, me dava ainda mais coragem de
continuar naquela loucura deliciosa, afinal de contas, por ali, não havia
ninguém conhecido, até o momento.
Jason cola os seus lábios lentamente aos meus e sorri, como se me
provocasse com aquele gesto. Assim que inspiro o seu perfume amadeirado e
sinto-me envolvida em seus braços fortes, sugo a sua boca macia e carnuda,
num beijo sôfrego.
Já era o bastante para me sentir anestesiada de tesão.
O moreno pressiona o seu corpo contra o meu, de maneira que eu
sinto o volume protuberante em sua calça. Os desejos de Jason por mim eram
tão reais quanto os meus por ele. Imediatamente deslizo as mãos por suas
costas largas e desço até a bunda durinha, apertando entre os dedos toda a
delícia do corpo daquele homem. Jason morde o meu lábio, fazendo-me
gemer excitada.
Grudamos as nossas bocas em um beijo demorado. E eu me odiava
por estar amando todas as sensações boas que percorriam cada parte do meu
corpo, quando eu estava dentro daqueles braços deliciosamente musculosos.
Eu não queria envolver-me com Jason, eu não queria...
A minha boca lateja por todas as chupadas imorais que Jason
desfere em meus lábios. Respiro ofegante, perguntando-me ao mesmo tempo,
se deveria pausar o fogo que nascia no interior de nossos corpos, a cada toque
lascivo de sua língua na minha.
— Vamos tomar um drink? — espalmei as mãos contra o corpo de
Jason, convidando-o, antes mesmo que perdesse todos os rumos do juízo.
— Claro. — ele responde, entrelaçando os nossos dedos.
— Melhor não, Jason. — solto a minha mão da dele, sob o seu
olhar surpreso. — Não quero que ninguém do trabalho pense que estamos
juntos.
O rapaz inspira lentamente, fechando os olhos.
— Não sei por que você se importa tanto com eles, Angel! Não
estou envolvendo a sua mão na minha porque vamos noivar na semana que
vem! É apenas um gesto de carinho!
Tento equilibrar-me em minhas pernas, ao testemunhar tantos
gestos gentis de Jason. Parecia que ele preenchia a maioria dos pré-requisitos
para ser um namorado maravilhoso, mas, ao mesmo tempo, não estava certo
eu entregar o meu coração a um cafajeste, afinal de contas, hoje, mais cedo,
ele passava aqueles dedos todos pelo corpo de May!
— É o meu ambiente de trabalho, Jason. Eu não quero me expor
dessa maneira. — tento convencê-lo, com a voz crua.
O moreno sorri e leva a mão ao meu queixo.
Os meus lábios entreabrem espontaneamente ao sentir o seu toque
delicado.
— E o que me resta é respeitar as suas inseguranças. — ele diz.
Sorri para Jason, afetada por sua consideração.
Céus, eu não poderia estar tão envolvida assim!
Ele me entendia como se nos conhecêssemos há muito tempo.
E assim que fiz menção de ir em direção ao bar, Jason seguiu ao
meu lado como o bom amigo de trabalho que era. E enquanto passávamos
entre a multidão de jovens, eu imaginava o quanto estava satisfeita com a sua
companhia naquela noite.
Assim que nos sentamos no bar, o belo rapaz solicitou duas
bebidas. O barman preparou os nossos drinks e entregou as duas taças a
Jason. Em seguida, ele me entregou uma, dirigindo-me aquele olhar sério que
me fazia perder todo o bom-senso.
Jason era um sedutor nato.
— Um brinde ao seu retorno a Collins Construtora. — disse com a
taça em riste.
— Um brinde.
Tintilamos os nossos drinks e bebemos, olhando
compenetradamente no olho um do outro.
Tudo o que eu precisava saber, no momento, era até quando eu
poderia negar os meus sentimentos por Jason.
Admirá-lo era o que eu mais fazia a todo instante.
— Está realmente feliz que estou de volta? — pergunto,
depositando a taça sobre o balcão.
Jason está sentado à minha frente. Uma de suas pernas está
levemente flexionada, brindando-me com uma imagem deliciosa de seu
volume saliente.
Engulo as salivas de minha boca, para dar atenção ao que ele me
falava.
— Ainda duvida, Angel? Além de uma excelente profissional, você
mexe muito comigo, com os meus instintos. Tudo em você é afrodisíaco,
garota.
Uau, que cantada!
Estou sem graça, encarando-o com estupefação.
Então, Jason bebe o seu drink, passando, depois, a língua pelos
lábios alcoólicos, sem se preocupar se me incendiava a calcinha, daquela
maneira.
Retiro o meu blazer, sentindo a respiração falhar.
E apenas mentalizava que Jason era um homem gostoso e cafajeste,
que merecia tão somente umas fodas e uns beijos, e mais nada além disso.
Ao mesmo tempo eu me perguntava por que insistia em mentir para
mim mesma.
— Jason, você me constrange dessa maneira. Gosta de seduzir não
apenas a mim, mas a todas pelo jeito. — volto a sugar o canudo, esquivando
o meu olhar do dele.
— E você, Angel? Uma mulher tão inteligente, interessante,
independente, acha que seduz poucos por aí, não é mesmo? — debocha.
— Ah, Jason, você sempre sai pela tangente! — então ele sorri torto
e estica a sua mão para mim. Assim que entrelaçamos os nossos dedos, ele
me puxa e eu caio sentada em seu colo. O volume duro incomodando a minha
bunda, me excita. — O que você quer de mim? — balbucio num fio de voz.
Jason acaricia o meu rosto e responde com a voz rouca.
— Você. Você já me basta.
Quando cruzamos os nossos olhares, já sentia a respiração de Jason
alcançar a minha, então ouvimos vozes conhecidas.
Sem esperarmos, somos abordados por May, Leonard e Estefani.
Pulo do colo de Jason, ajeitando a minha saia e pegando a bebida
sobre o balcão, outra vez.
Chatos! Queria que todos eles fossem abduzidos daquela boate,
neste exato momento.
— Chegamos agora. Perdemos alguma coisa? — Estefani pergunta
de maneira empolgada, levando um dos braços sobre o meu ombro.
— A pista de dança está animadíssima, eu sugiro que não percam
tempo no bar. — Jason dá a dica, e eu prontamente imagino que ainda não
havíamos curtido o suficiente esta noite.
E, sem eu esperar, May se coloca estrategicamente por trás do belo
moreno, levando as suas mãos aos ombros largos de Jason e faz uma
massagem, enquanto me encara. Simplesmente reviro os olhos, ignorando as
insinuações daquela mulher.
— Olha a May, que oferecida. — Ester cochicha em meu ouvido.
Segundos depois, Jason segura na mão de May, colocando-a à sua
frente.
— Querida, por favor, dessa maneira eu vou dormir, ainda não
aproveitei a noite, o bastante. Acho que Leonard precisa de mais massagens
desse tipo do que eu, parece meio estressado nos últimos dias.
May está visivelmente constrangida.
De massagens brochantes ela entendia.
Sorrio, abaixando os olhos, satisfeita com a resposta de Jason
Collins, enquanto isso Leonard o ignora, focando a sua intenção
exclusivamente ao celular. O rapaz, assim que chegou, nem ao menos nos
cumprimentou e mantinha as sobrancelhas unidas em descontentamento,
analisando a todo o tempo a tela acesa do smartphone.
O que parecia era que Leonard ainda não havia superado a minha
amizade com o filho do chefe.
— Então, vamos para a pista? — Estefani pergunta, olhando para
mim, por cima dos óculos vermelhos.
Deixo a taça já vazia sobre o balcão e me levanto, observando May
cochichar no ouvido de Jason.
A minha noite não seria mais a mesma com a presença desgastante
daquela mosca de padaria.
— Vamos, sim! — concordo, saindo ao lado de Estefani, enquanto
Jason caminhava mais atrás junto a May.
Ela não desgrudava do rapaz, um minuto sequer, estava prestes a
sufocá-lo e também a romper o meu último fio de paciência.
— Preciso conversar com você, Angel.
O meu coração imediatamente vibra em meu peito, pois eu
conhecia bem aquela voz.
Olho para trás, sentindo a mão de Leonard em meu braço. Os outros
amigos, distraídos, seguem para a pista, enquanto fico estatelada junto ao
grudento, que me encara nos olhos de maneira estranha.
— Conversar, agora? Tem certeza? — pergunto, retirando o meu
braço de sua mão.
Leonard passa os dedos pelo rosto, antes de me perguntar, com um
olhar furioso.
— Você está tendo um caso com o Jason?
Respiro profundamente, levando as minhas mãos aos ombros de
Leonard.
Estava prestes a surtar!
— De novo essas cobranças?!
Leonard se aproxima um pouco mais de mim e segura em meus
pulsos. Ele olha exclusivamente para a minha boca.
— O que ele tem que eu não tenho, Angel? — a lista era grande,
mas eu prefiro me calar.
— Para, Leonard! — eu o empurro com ódio. — Parece um
adolescente!
Ainda vejo o corpo do rapaz cambalear para trás.
— Eu sou completamente louco por você, Angel... me dá uma
chance... — implora, de maneira humilhante, enquanto noto os seus olhos
marejados.
Será que Leonard estava realmente apaixonado ou era apenas uma
espécie de obsessão por eu não ter assumido um compromisso sério e, assim,
ter ferido o seu orgulho?
E quando eu observo os seus olhos translúcidos e altamente
abalados, eu constato que Leonard estava, na realidade, prestes a
enlouquecer.
— Nós já conversamos sobre isso. — digo, colocando a mão contra
o peitoral de Leonard, tentando afastá-lo, mais uma vez.
Ele também era forte e alto. Um armário. Mas não chegava aos pés
de Jason Collins.
— Por que você não presta atenção em mim, Angel? — ele grita, de
repente. — Por que está encarando a porra do Jason junto com a May
dançando na pista? Você ainda não entendeu que ele não presta!
Apesar da música alta, a voz de Leonard penetra
desconfortavelmente em meus ouvidos. Eu estou claramente assustada com
tamanha ira, com os lábios molhados que me desferiam palavras cruas, com
toda brutalidade.
Ainda assim, tento manter a compostura.
— Obrigada por se preocupar comigo, Leonard, mas eu não estou a
fim de ouvir aos seus conselhos patéticos, às suas preocupações...
— Angel. — ele me interrompe, segurando forte em meu pulso.
— Me solta, agora, covarde!
Os dedos de Leonard ainda se enfiam em minha pele, fazendo com
que eu os veja afundar com força em meu pulso, prendendo, dessa maneira,
todo o sangue em minha mão.
Sinto medo, além de muito ódio.
— Por favor, me dê uma chance, Angel. — ele aperta, agora, o meu
braço. — Eu prometo te fazer feliz.
Imediatamente, dou um tranque em sua mão e consigo me
desvencilhar.
Leonard estava completamente agressivo, respirando de maneira
ofegante, tal qual uma fera.
Mesmo assim, não esmoreço.
— Você vai me fazer feliz, se respeitar a minha decisão! — grito
com o dedo em riste. — Somos apenas amigos e se caso permaneça nessa
insistência, nem colegas de trabalho seremos mais.
— Algum problema, Angel?
Olho para o lado e Jason Collins surge, no meio de nós dois.
As minhas mãos tremiam, o meu braço doía e eu não queria ver
Leonard nunca mais à minha frente.
— Não, eu acho que Leonard já entendeu. — respondo com a voz
entrecortada.
Cravo os olhos nos olhos do rapaz aloirado, antes de sair de perto
daquele chato, amparada por Jason. Íamos em direção à pista de dança,
enquanto eu notava o olhar repleto de ódio de Leonard cobrir a minha
existência.
Ele estava completamente fora de si, numa fixação desmedida
quanto a nós dois juntos. E eu apenas imaginava que deveria tomar muito
cuidado, afinal de contas, Leonard poderia ser capaz de qualquer coisa,
dentro da sua louca obsessão.
— Está tudo bem, Angel? — Estefani vem ao meu encontro, com o
semblante preocupado.
Detenho apenas a acariciar o braço que o imbecil havia deixado
dolorido.
— Leonard está me pressionando. Ele não aceita que não estou a
fim de namorá-lo.
Jason e May estão próximos e também ouvem atentos ao assunto.
— Ei, vocês têm um caso? — Estefani pergunta, fazendo com que
eu dirija os meus olhos para os olhos surpresos de Jason e de May.
Até agora, nenhum deles possuía total certeza quanto à minha
amizade colorida.
— Tivemos, foi coisa rápida. — desconverso. — Mas isso não
importa, agora! Eu realmente estou preocupada com a obsessão de Leonard.
Não é a primeira vez que ele enche os meus ouvidos de besteiras.
— Eu não me dei conta, Angel, que você havia ficado para trás com
aquele estúpido! Ele te machucou? — Jason me pergunta com os olhos
angustiados.
E eu prontamente imagino que se ele não estivesse com a atenção
inteiramente dispensada à May, certamente teria notado a abordagem idiota
de Leonard, entretanto prefiro engolir as palavras.
— Sim, ele me machucou, me assustou, está completamente fora de
si!
— Covarde! — Jason passa as mãos pelos cabelos, irritado. — Eu
vou ficar de olho nesse cara. E qualquer desconfiança que você tenha das
atitudes de Leonard, você me comunica, Angel. Colocá-lo no olho da rua me
interessa muito.
— Calma. — Estefani se aproxima. — Deve estar bêbado. Leo não
fez por mal.
— Não defenda ele, Ester. Leonard não presta! — esbravejo,
surpresa com a atitude de minha amiga.
— Agora, esqueçam de Leonard, vamos aproveitar a noite. — May
me puxa pela mão, de repente, me levando para o centro da pista.
Sem dúvidas, colocava “panos quentes” na discussão que se
formava por conta das loucuras daquele rapaz descompensado.
A música vibra alto em meus tímpanos, embalando os nossos
corpos, e mesmo ainda preocupada, tentava esquecer das palavras duras
daquele louco obsessivo, a maneira bruta com que me tratou.
Eu nunca o havia visto desta maneira.
E o que me incomodou, durante toda a noite, nem foram os olhares
gulosos de May dirigidos a Jason, na boate, mas Leonard que me analisava
com revolta, ódio e tudo mais nesse contexto, sentado em um dos bancos do
bar, bebendo copos e mais copos de uísque.
Por mais que eu lutasse contra, Leonard conseguiu acabar com a
noite perfeita que idealizei ao lado de Jason Collins.

***

Já era tarde quando observei ao redor e notei que Leonard não


estava mais na boate. Aproveitei para despedir dos meus amigos e partir para
cabana. Amanhã seria o meu primeiro dia de trabalho junto a Sr. Victor,
depois da minha demissão, e eu não estava a fim de me atrasar.
Estefani e May paqueravam um grupo de rapazes espanhóis que
havia chegado à boate há algumas horas, e durante esse tempo, ainda pude
desfrutar da companhia de Jason todinha para mim.
— Angel, por favor, deixa eu te acompanhar até a sua casa. — o
rapaz pediu, passando o dedo em meu rosto.
Estávamos na fila, para pagar a comanda de consumos.
— Não, Jason. — ajeito uma mecha de cabelo por detrás da orelha.
— Eu agradeço, mas não há necessidade, sempre faço esse mesmo caminho,
até em horários mais tardes... estou acostumada.
Jason coça o queixo e me olha de lado, desconfiado.
Um charme.
— Está bem, então.
Mesmo ele concordando, alguma coisa me dizia que eu não o havia
convencido por completo, pois Jason estalava os ossos dos dedos, ainda
preocupado.
— Ei, eu te aviso quando chegar à cabana. Combinado? — tento
acalmá-lo, acariciando a sua barba mal feita.
Os meus dedos deslizam por aquela textura, enquanto mergulho em
seus olhos pretos, tão absortos em me proteger. Jason, então, envolve o meu
rosto em suas mãos e meu coração descompassa involuntariamente com
aquele gesto.
— Angel, — ele balbucia em meus lábios. — você é delicada,
mesmo sendo forte o tempo inteiro, você é frágil, doce... embora destemida.
Você é tão sagaz, mas isso não te exime dos riscos daquela estrada escura, da
cabana isolada...
Seguro delicadamente nas mãos de Jason e beijo o seu dorso,
olhando em seus olhos.
— Eu só tenho a agradecer tanto carinho... — sorrio, envaidecida.
Jason havia colocado sentimentos bons em meu coração, outra vez. — mas
eu estou neste mundo para enfrentar qualquer tipo de risco, vencê-los ou não,
também estou aqui para descobrir.
Ele me olhou e sorriu de lado. As covinhas enfeitavam o seu
sorriso.
— Você deve ter dado muito trabalho aos seus pais na infância, na
adolescência...
Estiquei os lábios num sorriso.
— Sou tão fácil de se ler, assim? — cruzei os braços, jocosa.
— Caramba, coitados dos seus pais, menina.
— Ah, mas Victor Collins também já deve ter te dado umas boas
palmadas, anjinho de candura.
O sorriso de Jason some instantaneamente de seu rosto. De
imediato, me dou conta de que havia falado mais do que deveria.
A relação entre pai e filho era visivelmente conturbada e esse
deveria ser um terreno muito delicado o qual eu deveria respeitar.
— Desculpa. Eu não falei por mal. — digo, constrangida,
segurando na mão bonita de Jason.
— Que isso, Angel. — ele mira os seus olhos no chão. — Eu só
estou preocupado em você retornar para casa sozinha, — então, finalmente,
ele me presenteia com a bela imagem de seu rosto. — e também, todas as
vezes em que tocamos no nome do meu pai, eu me lembro do dinheiro que
ele está desviando, do que ele pode estar fazendo com esses lucros...
— Calma, eu vou te ajudar. — interrompo Jason, levando as
minhas mãos em seu rosto.
— Já decidiu, então? — ele me pergunta com um olhar carente. Às
vezes, eu ainda enxergava um menino naquele homem poderoso e sedutor.
Apenas assinto, entendendo que eu deveria ceder aos meus sonhos e
aos sonhos de Jason, de ver a Collins Construtora crescer novamente, no
mercado.
Jason beija a minha testa em agradecimento.
E já era a nossa vez de acertar as contas da boate. E o rapaz gentil
não permitiu que eu pagasse as minhas despesas.
Cada gesto daquele homem me surpreendia tanto...
— Agora, eu preciso ir. — já estávamos no estacionamento. —
Assim que chegar em casa, eu vou te ligar, combinado?
Jason concordou e, em seguida, deixou um beijo delicado em meus
lábios.
O rapaz virou de costas e caminhou em direção ao seu carro,
enquanto eu pisava em nuvens até chegar ao meu.
Apesar de tudo, a minha noite valeu à pena.
Já a madrugada não estava tão bonita. Havia uma névoa que
encobria todo o asfalto. O céu era soturno e coberto por nuvens densas.
Então, apenas liguei uma música para me distrair até a cabana.
Quando olhava pelo retrovisor, tinha a sensação de que um carro
me seguia, mas vez ou outra o veículo diminuía e sumia na imensidão do
asfalto negro.
Deveria ser apenas impressão, e não Jason ou qualquer outra
pessoa, no meu encalço.
Em poucos minutos, já estava chegando em casa. Saí do carro
aliviada, por ter chegado bem. Uma vez, o pneu do carro furou e me vi em
maus lençóis para trocá-lo. Sim, eu sabia lidar com essas questões mecânicas,
afinal de contas quem mora sozinho precisa estar preparado para qualquer
tipo de situação.
Entrei na cabana, acendendo a luz da sala, quando perco o ar e sinto
a alma deixar o meu corpo.
Leonard estava sentado casualmente em meu sofá.
— Você enlouqueceu!!!! O que está fazendo aqui? — jogo a bolsa
sobre Leonard, tamanho susto e desespero.
O rapaz está com os olhos conturbados. E isso me assombra
demasiadamente.
— Cala a boca e me obedeça, Angel.
Leonard vem lentamente na minha direção. Sinto o meu coração
preso em minha garganta, prestes a escapulir pela boca. Olho ao redor e
encontro a janela arrombada.
Isso me inflama.
Faço menção de escapar para fora da cabana, mas Leonard é rápido
e me alcança, empurrando o meu corpo contra a parede. Grito ao sentir o
impacto nas minhas costas. Tento me desvencilhar, mas o rapaz segura em
meu rosto, grudando a sua boca à minha de maneira bruta. Empurro o seu
corpo, enquanto sinto os seus dedos cravarem em meu rosto, a sua língua
nojenta insistindo em entrar por meus lábios, mas Leonard é forte e resiste,
então o que me resta é dar uma joelhada em suas partes íntimas.
— Piranha. — ele grita, colocando as mãos onde doía.
É minha oportunidade.
Corro, em direção à porta da sala, mas logo tenho os passos
interrompidos, porque, mesmo com dor, Leonard é ligeiro e me alcança outra
vez.
Grito.
— Socorro!!!
— Vem comigo. — ele balbucia de maneira apavorante.
Leonard coloca os meus braços para trás e gruda seu pênis nojento
em minha bunda.
— Me solta!!! — peço, mas é em vão.
Imediatamente, sinto as minhas mãos adormecerem com a força
que ele faz em meus pulsos. A sua respiração está em minha nuca enquanto
ele executa movimentos em minha bunda, com o pênis ereto.
Tenho vontade de vomitar.
Leonard, ainda não satisfeito com aquela tortura, me joga sobre o
sofá e eu caio estatelada de quatro. O pilantra levanta a minha saia, enquanto
tento fugir do seu alcance. Agarro uma almofada, outra, elas escapolem de
minhas mãos. Seguro no braço do sofá, mas ele me puxa com toda a força e
apenas vejo as marcas das minhas unhas marcarem linhas, no tecido
aveludado.
— Calma, gostosa. Já fizemos isso antes. — Leonard balbucia.
Então, não me dando por vencida, estico a mão em direção à uma
bailarina de porcelana que está sobre a mesa de centro e arremesso contra o
rosto de Leonard.
— Caralho, Angel!
Ele grita, mas parece que lhe dou mais forças para que me persiga.
Quando estava conseguindo correr em direção ao quarto, com o
intuito de me trancar dentro do cômodo, o cara simplesmente se joga sobre o
meu corpo. Sou arremessada e caio estatelada no chão. O meu maxilar dói
com o impacto que recebo no rosto.
— Para!!! — choro, sem forças.
Leonard está por cima de mim. Ele é forte e eu, de bruços, apenas
perco o ar.
Ouço o troglodita sorrir, enquanto levanta a minha saia lápis, retira
a minha calcinha e gruda o membro ereto em minha bunda.
— Sai, nojento! — grito com a voz chorosa.
— Você vai gostar, minha Angel.
Leonard levanta os meus cabelos com o próprio rosto e lambe a
minha orelha, ainda segurando firmemente em meus braços. Aperto os olhos,
sentindo a náusea preencher o meu estômago, a cada baforada e lambida em
minha orelha.
O calhorda solta de meus pulsos, finalmente. Logo sinto-os
doloridos como uma espécie de cãibra. Os meus braços caem ao lado do meu
corpo.
Estou sem forças.
E, sem eu esperar, o que eu mais temia, acontece. Leonard abre
com brutalidade as minhas nádegas e prepara o pênis para fazer o anal.
Debato-me no chão, dando socos para trás, em seus braços, mas é
em vão.
— Assim, eu vou gozar rápido, delícia. — ele ainda balbucia.
— Eu te odeio!!!
De repente, quando Leonard estava prestes a penetrar em mim, a
porta da cabana se abre num estrondo.
— Jason... — balbucio sem saber se era uma miragem.
— Leonard, eu vou te matar! — Jason grita indo na direção do
pilantra.
O moreno segura Leonard pelos ombros, retirando-o por cima de
mim. Sem forças, permaneço no chão, anestesiada com tudo o que tinha
acabado de acontecer ali.
Apenas ouço aos socos que Jason desfere naquele monstro.
Um, dois, três, quatro... dezenas de socos...
Estou apavorada e não consigo olhar para o que estava
acontecendo. Somente ouço aos grunhidos de Leonard e a respiração de fúria
de Jason. Envolvo o meu rosto nas mãos, a fim de não encarar Jason
espancando Leonard com uma raiva desmedida.
Quando tomo coragem e olho para trás, vejo Leonard desmaiado,
esvaído em sangue.
— Para, Jason! Ele já apagou!
Jason dá um chute no corpo de Leonard.
O moreno estava atordoado, bufava, era outra pessoa.
Estou em choque, observando Jason suado, com respingos de
sangue por toda a camisa social.
— Angel... — Jason tem lágrimas nos olhos. — você está bem? —
ele está abaixado ao meu lado.
Umedeço os lábios, antes de tentar falar.
Havia perdido a voz.
— Agora, está.
Jason me puxa pelas mãos e me pega no colo, num abraço. Choro
tudo o que eu poderia, afogando o rosto em seu ombro.
Ele era o meu herói.
Sinto as mãos tão carinhosas de Jason massagear os meus cabelos.
O moreno dá pequenos beijos em minha têmpora, enquanto molho a sua
camisa de lágrimas.
Assim que olho para o tapete felpudo, encontro manchas de sangue.
Jason havia acabado com o rosto de Leonard. Eu nunca poderia imaginar o
quanto ele era forte.
— Você o machucou muito. — digo, finalmente mirando nos olhos
pretos do moreno.
— Desculpa, — Jason me coloca delicadamente no chão, e caminha
sem rumo pela sala, envolta do corpo apagado de Leonard. — eu não sei o
que me deu... eu não consigo imaginar aquela cena outra vez.
— Você me salvou. — corro em direção a Jason, segurando em
suas mãos, que estavam quentes e tremiam. — Leonard estava alcoolizado,
não sei do que seria capaz...
— Eu vou chamar a ambulância, Angel, — Jason acaricia o meu
rosto, enquanto fala. — e amanhã Leonard estará no olho da rua.
Assinto, com os olhos tristes.
Encaro Leonard machucado no chão e imagino a que ponto pode
chegar a paixão.
Ele havia enlouquecido.
Um cara tão bonito, divertido, havia tentado me estuprar.
Um verme, é o que ele era.
Cuspo sobre o rosto de Leonard e Jason me puxa contra o seu
corpo, no mesmo momento.
— Calma, Angel. Isso nunca mais vai acontecer.
Ficamos por segundos abraçados um no corpo do outro, ainda
digerindo o pesadelo da nossa madrugada. Ao mesmo tempo, tentávamos
encontrar conforto, estávamos completamente destruídos por dentro.
Assim que a ambulância chegou, os socorristas imobilizaram o
corpo de Leonard.
Jason prontamente explicou o que havia acontecido naqueles breves
minutos que, para mim, duraram horas. Eles levaram o corpo apagado de
Leonard, e quando a porta da ambulância se fechou, eu fiquei imaginando
que se Jason não chegasse a tempo, quem estaria naquela maca seria eu.
A polícia também foi acionada.
Entrei no carro de Jason e fomos até a delegacia dar todos os
esclarecimentos necessários. Foram feitos, também, o exame de corpo de
delito e tudo de indispensável nesses trâmites.
— Vocês estão liberados, até sair o resultado das apurações. — o
delegado nos informou, assim que deixamos a delegacia.
— Angel... — Jason envolveu o meu rosto em suas mãos, enquanto
eu sentia o frio da noite cobrir a minha pele. — vamos para o apart hotel, não
quero te deixar sozinha na cabana. Na verdade, você vai ter que mudar de lá.
— Eu não quero... — sussurro com o coração apertado. — mas vai
ser necessário, no momento...
Certamente, as lembranças tão cruéis iriam me perturbar pelos
próximos dias.
Jason me colocou dentro de seus braços, me levando para o seu
carro de luxo.
Partimos em direção ao apart hotel.
Olhava a madrugada escura pela janela, enquanto imaginava
satisfeita o quanto estava me sentindo acolhida, protegida por aquele belo
homem.
Assim que estacionei na garagem do apart hotel, notei os olhos
tristes de Angel. Aquilo me arruinou por dentro. Ela não merecia qualquer
tipo de injustiça ou sofrimento.
Subimos calados o elevador. Angel tinha um roxeado no rosto que
denunciava as atrocidades de Leonard. A minha vontade, no momento, era de
voltar no tempo e retornar da boate, junto a Angel, no seu carro, até mesmo
contra a sua vontade! Contudo não me condeno por completo. Assim que
Angel partira em direção à cabana, eu a segui, como maneira de guiar o seu
caminho. Não estava com um bom pressentimento frente às insistências de
Leonard.
— Aqui é onde moro nas últimas semanas. — proferi, assim que
abri a porta do apartamento.
Angel sorriu contida, observando ao redor com os seus grandes
olhos castanhos. E ela se deteve a encarar o saco de pancadas. Ali, já inferia a
minha destreza nos socos.
— Você luta boxe? — ela perguntou com a voz fraca, sentando-se,
ao mesmo tempo, sobre a cama.
— Sim, na verdade, lutei durante toda a minha adolescência. —
aconchego-me ao seu lado. — O meu sonho sempre foi ser lutador
profissional, mas não tive o apoio da família e muito menos de meu pai.
Observo o sorriso de censura de Angel preencher os seus lábios
sensuais.
— Como sempre o velho Victor cortando o barato de todo mundo.
Concordei com a garota, antes de segurar em suas mãos macias, e
dar beijos sobre elas.
— Obrigada por tudo. — ela sibilou com a voz entrecortada.
A mulher sempre tão forte e destemida, agora estava imergida em
emoções.
— Não me agradeça. O que eu fiz por você foi o mínimo, perto do
que realmente poderia ter feito. — olhei seriamente em seus olhos,
acariciando o seu rosto. Angel sorriu e suspirou com o meu toque. — Se
quiser tomar um banho, o banheiro é ali, eu posso te emprestar uma camisa
limpa, também, se quiser.
— Eu realmente preciso de um banho. — a voz de Angel
transparece tristeza. — O cheiro imundo de Leonard ainda está em minha
pele.
— Vamos esquecer disso, por favor. — me aproximo do corpo de
Angel, colocando os dedos entre os seus cabelos castanhos. — Tome um
banho e relaxe.
Angel assentiu, ainda com os olhos muito abatidos. Pegou uma
camisa social branca de listras azuis, em meu guarda-roupa, e partiu para o
chuveiro. Enquanto isso, retirei a camisa ainda manchada, a calça, ficando
apenas de cueca, sobre a cama, esperando que a bela garota saísse do
banheiro.
Li alguns e-mails em meu celular e já foi tempo o suficiente para
ouvir o chuveiro desligar.
Segundos depois, Angel se apresentou à minha frente apenas
vestida na camisa social. Levantei da cama aturdido com aquela imagem.
Ela não se cansava de ser linda.
As coxas torneadas por debaixo da camisa, os cabelos molhados e
longos jogados de lado, o sorriso tão frágil... e não parecia que aquela mulher
possuía um controle emocional invejável.
— Você está linda.
— Para, Jason... — ela sorriu envergonhada e se aproximou.
— É verdade, você é linda, Angel.
Os seus olhos gulosos passearam por meu corpo seminu, assim que
ela parou à minha frente. Naquele momento, apenas tentávamos deter o
controle de nossas emoções.
— Eu vou tomar o meu banho agora. — disse, desvencilhando o
meu olhar do dela. — Eu arrumei a cama para você, Angel. Eu vou dormir no
sofá.
— Não, Jason... por favor... durma comigo.
Angel se joga em meus braços como uma criatura indefesa — coisa
que ela não era. Imediatamente sinto a sua respiração esquentar o meu
peitoral, então correspondo o seu abraço com beijos carinhosos nos seus
cabelos. O perfume bom de banho era muito agradável.
A garota me encara e eu analiso o seu rosto marcado, enquanto
sentia uma dor descomunal perpassar os meus sentidos.
Prontamente encaminho Angel para a cama e, ainda com os olhos
pesados de tristeza, ela se aconchega nos travesseiros. A menina precisava
descansar. Ajudei a cobri-la com o lençol, retirando alguns cabelos de seu
rosto.
— Eu já volto. — sibilei e fui para o banheiro, já louco para
retornar e sentir o meu corpo colado ao dela.
Certamente seria a minha melhor noite de sono.
Ter Angel por perto, tão indefesa, sabendo que eu poderia protegê-
la pelo resto da noite, era de uma satisfação imensa. Era o mínimo que eu
poderia fazer por ela, perto do que já fez por mim, sem ao menos saber,
quando lutou incansavelmente pela Collins Construtora.
Assim que saí do banho, Angel já ressonava tranquilamente. Os
seus cílios longos e pretos destacavam na pele branca. Sua boca era bem
desenhada e assim era ainda mais bonita.
Apenas de shorts, me aconcheguei por detrás de Angel Parker.
Abracei o seu corpo e ela sorriu baixinho.
— Está tudo bem... — falei, acariciando os seus cabelos.
Angel segurou forte em minha mão, ao me sentir abraçar o seu
corpo.
Aquela moça era uma joia rara e eu estava prestes a preservá-la.

***

— Vou precisar ir em casa pegar uma roupa, não dá para trabalhar


com a sua camisa.
— De jeito nenhum. Você está extremamente sexy dessa maneira.
— Angel sorriu e me encarou de lado, enquanto mordia uma maçã.
Era de manhã bem cedo e tomávamos juntos o café, na bancada da
cozinha americana.
Angel dormiu a noite inteira. Eu me preocupei em acordar vez ou
outra, no meio da madrugada, para certificar se ela estava bem, e todas as
vezes em que abri os olhos para velar o seu sono, eu encontrava um
semblante de paz. Aquilo era reconfortante, embora eu soubesse que, ao
acordar, o coração da moça ainda estaria em pedaços.
— O seu pai não vai querer despedir Leonard. — Angel fala de
repente, o que me deixa um pouco inseguro.
— Por que, não? — pergunto, terminando a xícara de café.
Angel dá mais uma mordida na maçã vermelha, enquanto eu a
encaro curioso, falando de boca cheia.
— Porque Leonard é o seu braço direito.
Calo-me por segundos, imaginando que eu estava disposto a fazer
de tudo para não ver mais Leonard, nem sequer na calçada daquele prédio.
Aquele canalha não poderia mais cruzar o meu caminho. Eu não sei do que
eu seria capaz.
— Leonard é o contador e sem dúvidas sabe dos desvios das verbas.
— passo a mão, pelos cabelos, preocupado. — Ele sabe de muitas coisas,
Angel.
Corto uma fatia de bolo, enquanto a bela garota levanta até a pia
para fazer um café expresso.
— Exatamente, Jason. — ela sorri de raiva. — Por isso mesmo que
Sr. Victor vai rir do meu estupro e vai querer manter Leonard.
Jogo a xícara sobre o pires, com brutalidade, imaginando que Angel
estava completamente dentro da razão. Essa era a hipótese mais óbvia.
— Victor Collins é o meu pai e exatamente por isso que eu sei que,
infelizmente, ele pode vir a agir dessa maneira. — bebo mais um gole de
café, antes de esbravejar. — Mas eu não divido o mesmo ambiente com
aquele verme!
— Muito menos eu. — Angel se senta novamente ao meu lado com
a sua xícara saindo fumaça. — Mal posso olhar naqueles olhos de cobra.
— Se não conseguirmos convencer o meu pai da demissão de
Leonard, sem dúvidas, a polícia vai agir. Ele vai ser detido, Angel, por tudo o
que ele te fez.
Angel termina o seu café e senta em meu colo, de frente para mim.
As pernas abertas sobre as minhas pernas.
Umedeço os lábios com aquele gesto ousado.
Angel estava linda com os cabelos despenteados e os olhos sem o
contorno da maquiagem.
— Eu não sei o que poderia ser de mim se você não chegasse,
Jason...
A voz doce de Angel lamentando as cruéis possibilidades me
quebra por dentro.
Levo as minhas mãos ao seu rosto.
— Não pense nas hipóteses. Pense que você está aqui comigo agora
e que muitas coisas ruins foram evitadas.
Angel me olha de maneira tão excitante que mal posso controlar os
meus instintos. O seu quadril sobre a parte mais quente do meu corpo é um
convite. Abraço a sua cintura, depositando as mãos sobre o seu quadril. Ela
expira tão intensamente, a ponto de eu sentir a sua respiração morna aquecer
o meu rosto.
Seguro no queixo de Angel e dou um beijo delicado em sua boca.
Era extremamente torturante para mim, controlar os desejos todos que a
aquela mulher me causava.
— Angel, vamos? Estamos atrasados. — balbuciei, contrariado.
Preferi sair o quanto antes para o trabalho ou em minutos já estaria
disposto a ter Angel inteira para mim, em minha cama.
A garota saiu de meu colo, ainda afetada por nossos desejos.
Abri a porta e descemos o elevador, em silêncio. Angel estava
visivelmente preocupada com o que a esperava na empresa. Não poderia
negar, que eu também estava completamente agoniado com a possível reação
de meu pai diante da atitude cruel e repugnante de Leonard.
E isso me afligia.
Levei Angel até a cabana e esperei ela se trocar e pegar parte dos
seus pertences. Não saí do carro, adiantando algumas demandas da empresa
no celular. Assim que ouvi a porta da casa se fechar, olhei para o lado e vi
Angel descer as escadas da varanda, lindamente em um vestido colado ao
corpo, preto e branco. Estava deslumbrante. Mal pude disfarçar a minha cara
de bobo.
— Você deveria ser processada por ser tão linda. — falei
seriamente, enquanto dava partida no carro. O charme de Angel estava
prestes a me derrubar.
— Se você não foi processado, por que eu deveria? — ela dá de
ombros, sorrindo, e então percebo que a garota havia maquiado o roxo em
seu rosto.
Selecionei no carro, uma música em que a letra falava sobre “paz”.
Angel sorriu para mim com charme.
— Eu te dou um prêmio se me convencer de que há algo mais
precioso que a paz.
Ainda com os olhos compenetrados na estrada, respondi para ela.
— O amor é mais precioso, porque ele é a origem de todos os
outros sentimentos bons. É como se o amor estivesse num patamar mais
elevado, talvez por isso que seja tão difícil de ser alcançado.
Ela me encara de maneira incrédula.
— Uau, eu não conhecia esse seu lado poeta.
— Eu acho que não precisa ser poeta para dizer o que se sente. —
sorri de lado.
Angel olha para a estrada e umedece delicadamente os lábios.
— Queria ter a destreza de falar de sentimentos, assim, como você.
Então, analiso o rosto de Angel, antes de concluir.
— Seus olhos já dizem por você, menina. Não se preocupe.
Angel me encarou intrigada. Talvez ela temesse eu enxergar muito
mais além do que ela estava permitindo demonstrar. E isso a incomodava,
pois eu estava atingindo um terreno íntimo e talvez intocado, o do seu
coração.

***

Assim que entramos no setor, percebi Angel segura, apesar das


aflições e das dores que ainda deveria sentir por dentro. Ela caminhava de
cabeça erguida, com um sorriso leve nos lábios.
Angel era bem mais forte do que eu realmente poderia imaginar.
Quando fiz menção de caminhar em direção à sala de Victor
Collins, para ter a maldita conversa, Estefani veio correndo até mim, com um
semblante um tanto quanto desesperado.
Angel já estava à sua mesa, ligando o computador.
— Aconteceu alguma coisa, Estefani? — estávamos em frente à
porta do escritório de meu pai.
— O Leonard, ele... ele foi assaltado. — ela aperta os olhos antes
de continuar. — Uns caras bateram muito no seu rosto e por conta desse
horror, ele está internado em estado grave, no hospital.
A garota passa as mãos pelo rosto transtornado, enquanto eu
imagino que as mentiras velavam o lado obscuro da alma de Leonard.
No momento certo, não só Estefani, mas todos saberiam da terrível
realidade quanto ao ocorrido na noite passada, e ao mesmo tempo eu temia
quanto à reação de Angel, após os seus colegas de trabalho tomarem ciência
do estupro.
Era de dilacerar a alma.
— Estefani, eu soube.
— Você soube? — ela arregala os olhos apavorada.
— Sim. — calo por segundos imaginando que “os caras” que
haviam acabado com Leonard se resumiam apenas a mim e a todo o meu
ódio. — Ele vai sair dessa e, em breve, teremos notícias. — respondo de
maneira crua, querendo adentrar a sala de Victor Collins, o quanto antes.
Estefani assente com os olhos caídos. Jamais imaginaria que a
notícia que eu realmente esperava era a da prisão do canalha.
— Onde está a May? — pergunto a Estefani, assim que noto a mesa
da secretária vazia.
— Ela está com Leonard no hospital.
Cerro os lábios, entrando na sala, logo em seguida. Não queria mais
perder o meu tempo com aquele assunto. Eu precisava estar com meu pai e
dar um basta em tudo o que me afligia.
— Bom dia. — disse entrando à sala, encontrando-o sentado à
mesa, fazendo algumas anotações em um livro preto.
— Eu já soube que a Angel voltou. — ele me responde de maneira
áspera. Os olhos ainda baixos sobre as anotações. — Você veio para cá para
passar por cima das minhas ordens, Jason?
— Sim, eu vim. — jogo a pasta sobre uma das cadeiras. — Se não
preferia ter ficado na Europa e, então, nada mudaria.
E para a minha surpresa, o velho Collins berra, espalmando as mãos
sobre a mesa.
— Jason, você não conhece essa menina, está iludido!
Contudo eu não me intimido. Dou breves passos em direção àquele
senhor rabugento e o encaro nos olhos.
— Pai, o assunto é sério. Eu preciso que me escute.
— Sobre o dinheiro que você trouxe da Europa, aposto! —
esbraveja, fazendo um movimento impaciente com o braço.
— É mais sério do que isso. — os seus olhos agora me fitam. As
suas pálpebras estão trêmulas. Notava estresse em cada célula do seu corpo.
— Ontem à noite saímos para a boate, então lá eu já percebi atitudes
estranhas de Leonard! — meu pai desvia o olhar, fazendo movimentos
irritantes com a cabeça, como se eu estivesse ocupando o seu tempo com
amenidades. Então, decido ser direto. — Leonard assediou Angel o tempo
inteiro! E quando a garota foi embora para casa, eu resolvi segui-la, para
certificar se chegaria bem, mas quando eu estacionei em frente à sua casa, eu
ouvi gritos. Leonard estava estuprando Angel!
A minha voz sai embargada. Era doloroso demais reviver tais
lembranças.
— Mas você também vai procurar problemas, Jason! Não tem que
se meter onde não é chamado!
Victor Collins caminha em direção à estante de livros, deixando-me
apavorado com as suas duras palavras.
— É só isso o que o senhor vai falar? — balbucio, perplexo.
— O que quer que eu faça?! — ele me encara. — Quer que eu dê
uns dias de folga para Angel relaxar depois do ocorrido?
Com a raiva fumegando em meu corpo, dou um chute em uma das
cadeiras pesadas de madeira.
O meu pai sorri de lado, colocando as mãos nos bolsos.
Eu não podia ser filho daquele homem, definitivamente!
— O senhor debocha de uma situação como essa? — grito, sentindo
a minha corda vocal romper. — Angel foi estuprada! Qual a parte que não
entendeu?
— Balela, foi uma transa! O seu ciúme está te cegando.
Meu pai simplesmente se senta em sua cadeira e retornar às
anotações, como se tudo o que eu houvesse acabado de dizer naquela sala
fosse uma piada de muito mau gosto.
Angel, por sua vez, não iria sofrer quando eu a colocasse a par da
reação do meu pai, pois ele simplesmente agiu da maneira previsível que
esperávamos.
— Pai. — bato as duas mãos sobre o seu maldito livro. — Porra! —
ele me olha seriamente. — Custa muito ser um homem de verdade? — noto
os seus lábios amassarem de ódio. — Porque o que eu vejo agora à minha
frente é um covarde. Você é pior do que os ratos do esgoto dessa rua.
Viro de costas, caminhando em direção à porta, quando sinto Victor
Collins me deter com uma das mãos em meu braço.
— Moleque, eu não te eduquei para me tratar dessa maneira. Me
peça perdão agora! — a sua voz sai rasgada, enquanto os seus olhos me
amaldiçoam em silêncio.
Apenas sorrio sarcasticamente.
Era absurdo atrás de absurdo.
— Eu não vou te pedir perdão, eu vou te pedir apenas que demita
Leonard. — peço calmamente, mas o que eu desejava no momento era gritar
de raiva por não ser compreendido.
— Não, eu não vou fazer isso. — Victor Collins se afasta,
visivelmente irritado com o meu pedido.
Cruzo os braços, tentando equilibrar as minhas emoções.
— Realmente não sabia que sustentava tanta consideração por esse
rapaz!
O meu pai me encara e dá um longo suspiro. Ele procurava por
palavras, argumentos, mas não os encontrava. Estava claro que Leonard sabia
de todo o esquema do desvio de dinheiro.
— Leonard foi um dos primeiros a chegar aqui. Sempre muito
competente, eficaz, proativo em tudo o que se propõe a fazer. Não vou perdê-
lo para a concorrência!
Passo as mãos pelos cabelos, suspirando lentamente. Neste
momento sinto uma dor física e emocional conflagrar todos os meus sentidos.
— Então, estuprar uma funcionária não é motivo o bastante?
— Infelizmente, não.
Mordo os lábios analisando o meu pai voltar às suas tarefas.
Eu não tinha exatamente mais nada para fazer ali.
Bato a porta da sala, antes de deixar um olhar de decepção para ele.
Eu não entendia porque estava tão abalado, surpreso, se tudo o que
Victor Collins acabara de dizer naquela sala foi justamente tudo dentro do
esperado.
Ele sempre agia assim, inconsequente e friamente, quando eu mais
precisava do seu apoio.
Poder e dinheiro, apenas o que lhe interessava.
Suspiro, colando o corpo à porta, as mãos sobre o rosto.
Estou disposto a descobrir o nível de envolvimento de Leonard com
os desvios de dinheiro da Collins.
Eu não estou aqui à toa.
Estou determinado a dar um basta na farra dos dois!
Jason Collins bateu estrondosamente a porta do escritório do pai. O
meu coração chegou à minha boca ao vê-lo sair com um semblante de ódio
em direção ao setor.
O filho do meu chefe atravessou a sala e se sentou ao meu lado. Ele
respirava de maneira ofegante e suas mãos tremiam denunciando as feridas
de sua alma.
— Vou pegar uma água para você. — disse, fazendo menção de
levantar da cadeira.
— Não, Angel, não precisa. Por favor. — Jason me interrompe,
segurando delicadamente o meu braço.
Sinto uma dor imensa ao fitá-lo tão abalado. Os seus olhos
marejavam, mas não permitiam lágrimas.
— O que imaginávamos aconteceu, não é mesmo? — sibilo,
olhando exclusivamente no belo rosto de Jason.
— Sim. — a voz sai rouca.
— Essas questões judiciais demoram tramitar. — seguro no anel
prateado em sua mão. — Mais cedo ou mais tarde, já visualizo Leonard
adentrando por aquela porta, com o sorriso mais cínico desenhado na sua cara
de pau.
— Eu não vou permitir, Angel. — Jason diz com a raiva cerrando
os seus lábios. — Eu vou demiti-lo. Eu vou passar por cima da hierarquia.
Fodam-se as vontades de Victor Collins!
Jason fecha os olhos e passa uma das mãos pelo rosto. Estava
atordoado e a tempestade de suas emoções nem tão cedo estiaria.
— Então o seu pai não quer mesmo o Leonard no olho da rua,
depois de tudo o que aconteceu? — pergunto, mesmo já sabendo da resposta.
— Obviamente não. — Jason agora segura em minhas mãos. —
Leonard é o seu comparsa no desvio de lucros, Angel, e agora só me restam
as benditas provas!
— Olha o computador do canalha bem aí à sua frente.
Jason imediatamente alterna o olhar na tela apagada e nos meus
olhos esperançosos. Mordisco os lábios, imaginando que deveria haver
maneira de adiantar a prisão do maldito.
— Ótimo, eu vou começar a vasculhar.
O belo homem estica a mão e liga o computador, ajeitando a sua
cadeira à frente da tela.
— Se tiver senha, certamente é o seu nome ao contrário. Dranoel.
— infelizmente, eu conhecia bem o lado narcisista daquele verme.
— Dranoel?
— Sim.
Jason digita rapidamente a suposta senha e em seguida me olha com
um leve sorriso nos lábios.
— Foi.
Havia esperanças nos olhos de Jason. Certamente aquele
computador guardava muitos segredos. Ele clica de maneira ansiosa sobre os
ícones da área de trabalho, cerrando os lábios vermelhos, enquanto penso que
Leonard jamais poderia imaginar que eu chegaria a esse ponto, de querer
vasculhar cada passo seu dentro daquela construtora, afinal de contas, eu era
a Angel, a menina legal e simpática que dava o sangue por seus amigos. Mas
a partir do momento em que Leonard conquistou a minha inimizade, ele não
se deu conta de que essa foi a maior falta de sorte de toda a sua vida.
— Angel, eu já perguntei à recepção do apart hotel. — Jason me
recupera das divagações, chegando com a sua cadeira ao meu lado, outra vez.
Está visivelmente mais calmo. — Tem um apartamento vago ao meu lado.
Você pode morar lá pelos próximos dias.
Abaixo os olhos completamente arrasada. Deixar o meu cantinho
era o pior que poderia acontecer.
— Está ótimo. — finjo conformação.
— Eu sei que está triste em deixar o seu sossego, mas é o melhor a
fazer no momento. — ele me encara com ternura, descobrindo, assim, todas
as minhas fragilidades.
— Obrigada por tudo, Jason. — entrelaço os nossos dedos. Era
impressionante como a presença daquele bonito rapaz me trazia tanto
conforto e segurança.
Depois de muito tempo, era a primeira vez que eu não me sentia
sozinha nesta cidade.
Quando, sem esperarmos, sobressaltamos com a porta do setor se
abrindo de maneira abrupta. May adentra de repente a sala. Os olhos
inchados de tanto chorar. Estava sem maquiagem, o que a deixava um pouco
pálida e mais nova do que realmente era.
— Jason.
A secretária cai sobre os braços do moreno, dando fungadas sobre o
seu ombro.
Reviro os olhos, analisando aquela cena, fazendo um esforço
descomunal para encontrar forças onde eu não tinha. Era necessário manter o
equilíbrio emocional, para não puxar May pelos cabelos!
— O Leo... o nosso amigo...
— May, por favor. — Jason tenta se desvencilhar da mulher,
segurando em seus braços.
— Jason, ele está apagado no CTI. — ela diz olhando-o nos olhos.
— Quem fez isso com ele vai ter que pagar caro!
— O que você disse, May? — Estefani surge no meio dos dois. A
voz ainda rouca de tristeza.
— Ester, o nosso amigo... — May sibila, em meio a um choro
forçado e infantil. — ele não pode morrer...
Bufo, terrivelmente incomodada com o que estava acontecendo ali.
E não apenas eu, mas Jason que enrugava as sobrancelhas em
descontentamento a cada lágrima derramada pelas duas. Então ele se levanta
da cadeira, de maneira abrupta, deixando um solavanco no corpo de May.
Jason estava completamente atordoado ao ter ouvido todas as palavras ácidas
da secretária. Então, o moreno sai como uma ventania, pelo setor, o que me
deixa extremamente preocupada.
Os olhos de May e de Estefani se analisam desconfiados.
— Com licença, meninas. — falo, antes de levantar da cadeira e ir
até a copa.
Quando abro a porta, encontro Jason sentado com o rosto entre as
mãos.
— A May é uma exagerada. — sibilo me abaixando com as mãos
em seus joelhos. — Leonard não deve estar tão mal assim. Inclusive ele pode
ter pedido para que ela faça aquele teatro todo.
— Se esse cara morrer, eu estou fodido. — a voz sai abafada, o
rosto ainda apagado pelas mãos bonitas e tentadoras.
— Calma, Jason. — sussurro, entrelaçando os dedos em seus fios
pretos. — Vaso ruim não quebra...
O rapaz finalmente me encara. Noto o branco de seus olhos repleto
de raízes vermelhas, e o meu coração esfacela.
Jason estava enfrentando essas atribulações por causa de mim! Isso
não era justo!
— Se eu soubesse não tinha comentado do estupro com meu pai.
Não adiantou de nada, apenas te expus.
Engulo em seco, notando o que preocupava Jason Collins, de fato,
era a minha exposição diante do caso, entretanto o que apenas me
atormentava era Jason se sentir eternamente culpado pelo que fez com
Leonard.
— Imagina, Jason. Quem deve se sentir exposto é Leonard, pela
atrocidade que fez! Eu me senti encurralada, indefesa, nunca me senti tão
pequena, tão frágil... é de uma impotência inexplicável... — o nó na garganta
me entala.
— Covarde! — Jason esbraveja, socando a mesa.
Seguro as suas mãos, apertando os seus dedos.
— Sr. Victor não vai expor Leonard. — desabafo. — Mesmo ele
sabendo que o seu cúmplice me estuprou, você acha que o seu pai vai
consolar May e Ester, falando para elas que Leonard mereceu, que foi um
estupro... enfim...
— O que você fez com Leonard, Jason Collins?
A voz ressoa dentro da copa no mesmo timbre de uma trovoada.
Olhamos assustados para a porta e Sr. Victor estava materializado, com os
punhos cerrados, a espera de respostas.
— Eu? — Jason sorri sarcasticamente. — Quebrei os ossos do seu
rosto. Por que, pai?
Sr. Victor adentra lentamente o cômodo, batendo a porta com força.
— Você não aprendeu com o seu passado, moleque? Quer passar
por aquilo tudo outra vez?
Os meus olhos arregalam imediatamente.
— Que passado?
— Angel, meu pai está delirando.
Jason não me encara. Ele se detém apenas a morder o lábio inferior,
esboçando um olhar atordoado.
— Vai mentir para a sua namoradinha? — Victor Collins pergunta
em meio a um sorriso debochado. — Você não diz sempre que Angel é muito
esperta? Você acha mesmo que ela vai acreditar nas suas historinhas?
— Do que ele está falando? — pergunto a Jason, levantando-me
perturbada da cadeira.
— Pai, por favor! — Jason esbraveja, mordendo os nós dos dedos,
tentando encerrar o assunto, o que me deixava terrivelmente assustada.
Ele guardava segredos em seu passado!
Sr. Victor dá breves passos até Jason, colocando o dedo indicador
no peito do filho.
— Espero de coração que não aconteça o pior com Leonard. Eu não
vou te proteger mais, Jason Collins.
O chefe vira as costas e sai da copa, deixando o rapaz num conflito
interno. Era completamente perceptível que o coração daquele homem era tão
profundo e obscuro quanto o universo intergaláctico. Jason respira de
maneira ofegante, olhando para o nada, como se estivesse prestes a romper os
seus pulmões por conta da respiração tão afetada de sentimentos.
— Jason... o que aconteceu... — levo as minhas mãos ao seu rosto
vermelho, desnorteado.
— Angel, por favor, agora não é o melhor momento para isso. —
ele diz, retirando lentamente as minhas mãos de sua face.
Jason sai da copa e eu o deixo ir esfriar os seus nervos.
Passo as mãos pelo rosto imaginando o quanto eu estava sendo
imergida numa avalanche de problemas. A ansiedade pela condenação de
Leonard, os mistérios que Jason Collins guarda em seu coração...
E eu apenas desejava não me decepcionar com um dos caras mais
incríveis que já conheci em toda a minha vida.
Após resfriar os meus ânimos, no bistrô da esquina, decidi retornar
à construtora. Tomei uma taça de vinho, enquanto as palavras de meu pai
reverberavam, e também as palavras de May, quanto ao estado de saúde de
Leonard, que atribulavam demasiadamente os meus pensamentos.
Eu não iria relaxar enquanto eu não visse o pilantra vivo e atrás das
grades.
Entrei decido no setor, indo em direção ao computador de Leonard.
Angel apenas me encarou com ternura. Estiquei os lábios num falso
sorriso e afanei o seu ombro, indo em direção ao escritório de Victor Collins.
— Pai, aqui está o computador de Leonard. — entrei pela sala, sem
ao menos bater à porta.
Levava a torre debaixo do braço, depositando-a sobre a mesa do
meu pai, logo em seguida.
Victor Collins nem se deu ao trabalho de reagir à minha presença.
— Está aqui! — tentei chamar a sua atenção.
— Eu não quero ver esta merda.
— O senhor sabe que é necessário! — espalmo as mãos sobre a
mesa. — Se não levantarmos todos os lucros, as despesas dos últimos anos,
nunca vamos descobrir o que realmente pode estar ocasionando a falência
desta construtora! — e concluo. — A não ser que o senhor já tenha respostas
para isso.
O velho Victor arremessa a caneta para o outro lado da mesa.
— Você e a sua amiguinha descobriram alguma coisa?
— Ainda não. — começo a ligar os cabos na torre, para termos
acesso às informações de Leonard. — Não temos certeza de nada, para ser
mais exato. Quem sabe de tudo, aqui, na verdade, é o senhor! O único que
pode me ajudar a desvendar esses mistérios.
O meu pai coça o queixo desconfiado. Na verdade, Sr. Collins
estava apreensivo, completamente sem saída, afinal de contas estava na
iminência de descobrir o seu plano sórdido. Não me assustaria imaginar que o
meu pai deveria estar arrependido quando me chamou para ajudar a salvar a
sua empresa.
Assim que acessamos o computador de Leonard, encontramos
diversas pastas em sua área de trabalho. E nenhuma nos interessava. Quando
entrei no histórico do navegador de internet, eu vi o acesso a um banco da
Suíça. Aquilo ali já me respondeu parte das perguntas.
— O senhor sabe disso, pai? — pergunto, virando o monitor para o
senhor que me encarava de maneira séria.
Sr. Victor Collins se cala. Deposita o rosto entre as mãos e dá um
longo e audível suspiro.
— Credit Suisse! Já ouviu falar? — insisto de maneira impaciente.
— Sim... — responde num fio de voz. — eu e Leonard desviamos
dinheiro da empresa.
O coração vibra dolorosamente em meu peito ao ouvir aquela
confissão, apesar de eu já desconfiar que os dois salafrões estariam
usufruindo dos lucros da construtora, há algum tempo.
— Porra, por que fez isso! — grito, ficando de pé.
O meu pai também se levanta da cadeira e caminha pelo tapete
persa, mirando os olhos exclusivamente nos sapatos de couro italiano,
quando de repente esbraveja:
— A sua mãe e o seu tio não merecem usufruir dos lucros, são uns
imprestáveis!
Bufo, passando os dedos entre os cabelos.
Óbvio, só poderia ser isso!
— Já entendi tudo. — aproximo de meu pai, olhando em seus
olhos, antes de coçar impacientemente a barba por fazer. — Pelo jeito, você
também me inclui nesse clã.
— Você foi burro, Jason! Burro! — ele grita, de repente, deixando
salivas escapulirem pela boca. — Você foi muito além do que era realmente
necessário! — passa a mão pelo rosto, num desabafo. — Sempre fiz tudo
com muita cautela para que as coisas não desandassem, para que não
perdêssemos a mão! O que pode estar havendo!
Após confessar as suas imundícies, junto a Leonard, meu pai
imediatamente se senta em frente ao computador, depositando os óculos de
maneira atribulada sobre o rosto.
Mordo os nós dos dedos, represando toda a raiva que eu sentia da
cara deslavada de meu pai.
Um cínico, é o que ele era.
— Anda, Jason! Me ajuda aqui!
Dou um breve suspiro, antes de me aproximar de meu pai. Já que eu
estava ali, deveria seguir até o fim, colocando todos os devidos pingos nos is.
Assim que confrontamos o extrato da conta de Victor Collins na
Suíça, com a soma das planilhas de Leonard e o saldo final na sua conta na
Credit Suisse. — a senha Dranoel me permitiu muitas coisas —, chegamos
finalmente a um desfecho.
— Leonard está te roubando, pai. — concluo, dando um murro
sobre a mesa, digerindo ainda aquela maldita surpresa.
— O quê? — ele me encara com os olhos praticamente saindo de
suas órbitas.
— Olha esse saldo.
Aponto a caneta para a tela do computador.
Era um valor exorbitante.
— Isso é mais que o quíntuplo do que tenho em minha conta, Jason.
Eu prometi trinta por cento ao rapaz, se ele estivesse de acordo em me ajudar
nos desvios, e ele faz isso comigo?
Meu pai joga os óculos sobre a mesa, passando o lenço marrom
pelo rosto.
A sua pressão deveria estar nas alturas.
— Bem-vindo à realidade, pai. E outra coisa que eu quero te
mostrar. Olha o quanto temos de capital e lucros no momento.
Circulo o valor com caneta vermelha e entrego a planilha a Sr.
Collins.
— Só isso? — balbucia, sem forças para dar conta de tantas
revelações.
— Sim. Isso não dá para fazer uma parede daquele resort em Punta
Cana.
Caminho desnorteado pela sala e ao fitar a janela, noto que já
anoiteceu.
— Mais uma empresa parceira nos deixou esta semana, não temos a
quem recorrer, Jason. — ele lamenta, com os olhos perdidos.
Então, caminho em sua direção, tentando manter suavidade no tom
de voz.
— Temos sim a quem recorrer. À sua conta na Suíça. Ou as portas
da Collins Construtora serão fechadas.
O meu pai se cala, me fitando com os olhos arregalados. Ele
mastiga a ponta da caneta, enquanto eu observo o suor romper os vincos de
sua testa.
— Você não tinha que ter se metido nisso, moleque... eu poderia
resolver com Leonard assim que o garoto saísse do hospital.
Gargalho, sarcasticamente.
— Em que mundo o senhor vive? Acha mesmo que Leonard vai te
pedir desculpas, beijar as suas mãos, e devolver todo o dinheiro que roubou?
Francamente!
Meu pai levanta da cadeira, jogando o lenço sobre a mesa.
— Como você pode ter tanta certeza das coisas, Jason! Estou
completamente arrependido por ter te tirado da Europa, para me colocar
contra a parede!
Cruzo os braços, impaciente.
— Então poderia ter ficado aí, sendo roubado, até se encontrar
sozinho diante da falência. Pelo menos, agora, o senhor tem uma saída, pois
sabe o contexto de toda a armação de vocês dois! Devolva os lucros a Collins
Construtora e tudo será resolvido!
Meu pai dá de ombros, além de me dar as costas.
— Eu não vou fazer isso. Que ideia mais idiota! — então, ele se
vira, de repente, me lançando um olhar de fúria. — Jason, ouça bem, eu não
vou continuar dando luxo ao seu tio e muito menos à sua mãe, depois de lutar
incansavelmente por esta empresa.
Engulo um bolo dolorido em minha garganta, observando a
crueldade desenhada no semblante de meu pai.
A ganância estava cada vez mais incutida nas atitudes e palavras
daquele homem.
Passo os dedos pelo rosto e sinto o sistema nervoso influenciar no
controle de minhas mãos.
— Tio Ronny é um senhor de oitenta anos, pai! Como o senhor
pode impedir que ele usufrua disso tudo aqui, depois de ele ter te ajudado nos
primeiros passos dessa empresa? Sem a colaboração de tio Ronny nada disso
aqui existiria!
As mãos de Victor Collins vão imediatamente até o meu pescoço.
Ele segura firmemente em meu colarinho, prestes a rasgá-lo.
— Não tire o meu mérito, moleque.
— Eu não estou retirando o mérito de ninguém, o senhor que não
pode chegar ao ponto de excluir a participação de tio Ronny dos negócios.
Papai me solta bruscamente.
— Ronny é uma múmia, parasita, sanguessuga de dinheiro. E a sua
mãe... sem comentários.
— A minha mãe merece o céu depois que te aturou durante tantos
anos de sua vida! — minha voz sai entrecortada. — Ela ainda sofre as
consequências psicológicas por ter lidado durante muito tempo com esse seu
jeito inescrupuloso de tratar as mulheres! — a emoção prestes a dar ritmo às
minhas palavras, mas eu não permito. — Mamãe relutou, mas o senhor
deveria ser denunciado por isso!
O meu pai vira o rosto, por segundos, e quando volta a me olhar,
um soco me alcança, de repente.
Abaixo o rosto entre as mãos, sentindo o gosto do sangue preencher
a minha língua.
Todos os ossos do meu nariz doem.
— Porra, não se cansa de me bater! — grito, observando meu pai
suspirar descompassadamente com os punhos cerrados.
— Você não presta, Jason. É exatamente igual a sua mãe.
— Não fale da mamãe. — grito, levando o dedo ao rosto de Sr.
Collins. — Lave essa boca podre para falar dela.
— Eu vou te...
— Vai o quê? Me matar? — pergunto em meio a sorrisos de
deboche. — Por que nunca conclui a sua ameaça, Victor Collins?
— Do que está falando, eu não disse nada.
Sai para o outro lado da sala, com os olhos presos ao chão, como o
tremendo covarde que era.
— Você acha que eu sou um imbecil, pai! Mas o imbecil maior
aqui é o senhor que caiu na lábia de um babaca como o Leonard.
— Cala a sua boca! — ele grita, deixando o rosto ser preenchido
rapidamente com o sangue de sua ira.
Exausto das sandices de Sr. Victor, retiro o paletó preto e jogo-o
sobre o ombro.
Meu pai está de costas, em frente à janela, fitando a lua cheia que
preenchia aos poucos o céu prateado.
Dou um toque em seu ombro, para chamar a sua atenção. Ele me
encara, sem perder a fúria que ainda digeria.
— Ou devolve os lucros da empresa ou a Collins Construtora fecha
as portas amanhã. A decisão é sua.
Em resposta, Victor Collins revira os olhos, amassando os lábios
enrugados.
Era extremamente importante ele saber que o futuro da empresa
estava exclusivamente em suas mãos, e também na porra de suas decisões.
Já tendo esgotado toda a minha paciência, saio do escritório e bato a
porta.
Na semana seguinte, deixei a cabana para finalmente mudar para o
apart hotel de Jason Collins.
O pequeno caminhão levou as minhas mudanças, no horário do
almoço. Os rapazes foram ligeiros e deixaram todos os móveis montados e
em seu devido lugar, antes das duas da tarde. Por mais que Jason houvesse
insistido em me ajudar na mudança, eu não permiti. Hoje seria o dia crucial
para que ele resolvesse junto ao pai os problemas que arruinavam a Collins
Construtora.
Olhei à volta, sentindo um incômodo no coração, talvez fosse mau
pressentimento quanto ao futuro da empresa. As esperanças já estavam se
esvaindo lentamente.
O apart hotel era pequeno e aconchegante, embora um pouco
barulhento, pois a janela da pequena sala dava para uma rua movimentada.
Mas o que fez o meu coração sorrir foi assim que percebi que a minha porta
era grudada à porta de Jason Collins. De certa maneira eu me sentia segura,
protegida e, além de tudo, sentimentos bons cresciam dentro de mim, sem eu
ao menos permitir ou me dar conta, apesar das aflições que vinham
interromper os meus suspiros de alegria, vez ou outra.
Fui em direção ao banho, satisfeita. Estava tudo organizado. Nem
eu ao menos sei como consegui dar conta de todas as caixas de papelão
sozinha. E eu também não tinha tanta coisa assim para arrumar. Os meus
pertences se resumiam às minhas roupas, livros e algumas quinquilharias.
Os meus pais já estavam cientes da minha mudança, no entanto não
detalhei o motivo, apenas me contive a dizer que estava isolada demais no
meio do mato e precisava de um lugar mais perto de tudo. Obviamente me
entenderam e desejaram boa sorte.
O que me afligia ainda era me envolver demasiadamente com
Jason. As coisas foram acontecendo tão de repente que agora me vejo
morando ao seu lado. Eu não estava a fim de me imergir num romance, de
viver um caso de amor. Ainda não havia superado a morte de meu primeiro
namorado, há alguns anos atrás. Todas as vezes em que tentei dar um passo à
frente na minha vida amorosa, acontecia algo de errado. Era como se Simon
estivesse de algum lugar impedindo a minha verdadeira felicidade.
Apago uma lágrima, enquanto termino o banho para estar na
empresa, dentro de alguns minutos.
May havia mandado uma mensagem solicitando a minha presença
na reunião das três. Certamente era algo urgente, caso contrário não teriam
interrompido a minha folga. Folga merecida, diga-se de passagem, pois na
última semana havia virado noites ao lado de Jason, revirando as anotações,
pastas, registros de Leonard, sob o olhar de estranhamento de Estefani e May.
Elas nos condenavam por estarmos agindo friamente diante da situação do
canalha no hospital e, sobretudo, usufruindo de sua ausência para identificar
os desvios de dinheiro.
Saí do banho e vesti a minha melhor roupa de executiva. O roxeado
em meu rosto já estava levemente discreto, embora ainda aparecesse, e o que
me restava era disfarçar aquela marca com base, ainda que as marcas no meu
coração nem tão cedo se apagariam.
Todas as vezes em que eu olhava aquele machucado, eu tinha
certeza do quanto eu odiava Leonard.
Calcei os sapatos, peguei a bolsa sobre o sofá e saí para o
estacionamento. Já estava no carro quando recebi uma mensagem de Jason
Collins.
— Angel, está chegando?
— Daqui a cinco minutos.
Uau, realmente deveria ser urgente. Os meus nervos se
empertigavam apenas por imaginar do que poderia se tratar a reunião das três
horas.
Subi o elevador, esfregando as mãos suadas. Estava bastante
ansiosa. Assim que entrei no setor, já estava vazio. Certamente todos estavam
na sala de reunião.
Abri a porta de vidro e encontrei toda a equipe sentada em volta da
mesa longa de madeira. Sr. Victor e Jason, à cabeceira.
O belo rapaz piscou para mim com um sorriso torto, assim que me
viu. Fui ao céu e voltei, para me sentar ao lado de Estefani.
— Olha a cara dos dois. Estamos fodidos. — ela cochicha,
grudando os lábios na minha orelha.
— Calma. São notícias boas. Tenho certeza. — menti, tentando
acalmar Ester.
Após vislumbrar as feições de luto dos dois, as esperanças todas
morreram instantaneamente.
— Boa tarde. — Jason dá início à reunião, antes de beber um copo
inteiro de água. — Como vocês todos já sabem e não é surpresa para
ninguém, estamos há um bom tempo tentando vencer o monstro da falência,
cada vez mais presente à nossa porta. — Jason engole em seco, antes de
continuar. — Após algumas investigações, que inclusive a Angel me ajudou
nos últimos dias, sentei com o meu pai, então discutimos, fizemos cálculos,
descobrimos documentos no cofre, enfim... — ele esfrega os olhos com as
mãos, talvez represando as emoções. — Sr. Achanta, o dono do resort em
Punta Cana, já foi avisado que não será mais possível darmos conta da obra
até o prazo estipulado, ou mesmo que não houvesse prazo algum... — e após
um suspiro, Jason conclui com a voz desanimada. — Estamos falidos.
O meu coração vibra dolorosamente em meu peito, fazendo-me
sentir uma faca afiada atravessar todas as camadas de minha pele. Sim, era
uma dor indescritível saber que não valeram de nada todas as horas
dispensadas ao trabalho. Sr. Victor Collins não lutou o bastante para reverter
a situação da falência.
A sala está silenciosa. Observo os olhares perdidos, as lágrimas que
já se adiantavam em avançar pelos rostos desacreditados.
O que seria daquela equipe eficiente daqui para frente? Eu apenas
desejava prever.
— É triste, mas... — Sr. Victor limpa as lágrimas com o seu lenço
marrom. — as portas da Collins Construtora se fecham esta tarde.
Levo as mãos à boca, após um longo e audível suspiro. O
burburinho se instaura e May já abre a boca num choro.
— Angel, e agora? — Estefani retira os óculos e me encara
atordoada.
— Não sei... — sussurro, imaginando o que Jason havia descoberto.
Sr. Victor levanta-se com dificuldades da cadeira.
— Calma, calma. Vocês terão tempo hábil para conseguir outro
emprego.
Qualquer palavra que ele dissesse no momento não seria o
suficiente para sarar as dores e os medos que sentíamos, diante daquela
situação.
Jason ainda está sentado à mesa. Ainda que um olhar sério e seguro
esteja estampado em seu belo rosto, a voz entrecortada denunciava que, por
dentro, ele estava quebrado.
— A empresa apresentou um grande desfalque no capital. Os lucros
foram todos desviados.
Após essa fala do filho do chefe, os colegas de trabalho se detêm
apenas a especular em cochicho o nome de Leonard.
— Mas quem fez isso, Jason? — May pergunta atordoada.
— Não cabe no momento. — ele se resume a dizer.
— Será que foi o Leonard, Angel? — Estefani inquere com a
curiosidade desenhada no olhar. — Vocês reviraram os seus documentos ao
avesso!
— Ele era o contador, Ester. Foi necessário. Mas apenas Jason e Sr.
Victor têm essa resposta. — desconverso.
Estava claro que Leonard teve o seu dedo podre nessa história.
— Quando souber, me conta? Eu vou matar essa criatura.
Ester lança os óculos sobre a mesa, completamente aturdida.
— Calma, Ester. Temos que manter a cabeça no lugar. — falo em
vão, afinal de contas estávamos todos no olho da rua, sem esperanças de um
novo emprego, nem tão cedo.
— Podem começar a recolher os seus pertences, — Sr. Victor está
sentado à mesa enquanto dita as suas últimas ordens. — arquivem os
projetos. A empresa será vendida. Não quero nada que pertença a vocês aqui
dentro.
Abraço a minha amiga com força. Passava um filme em minha
cabeça, naquele momento. Havia deixado as minhas raízes para trás, para
estar aqui. Lutei incansavelmente, depositei todas as minhas esperanças em
um futuro promissor para a minha carreira. Por mais que eu houvesse lutado
pela Collins, e depois junto a Jason, não demos conta de tantos desfalques.
— Angel, você vai para casa agora? Podemos conversar? — ouço à
voz rouca de Jason em meu ouvido, a sua mão em meu ombro.
— Sim, claro.
Levanto da mesa, deixando um abraço forte em meus amigos de
trabalho. Todos estavam desolados, incrédulos com o rumo que a Collins
Construtora havia tomado. May choramingava nos braços de Sr. Victor,
praticamente se sentando no colo do velho. Um exagero.
E eu simplesmente o ignoro.
Sr. Victor merecia apenas o meu olhar de desprezo, após toda a sua
falta de consideração por mim.
Desci o elevador com os meus pertences nas mãos, após arquivar os
projetos como Sr. Victor havia orientado. Jason me encarava pelo espelho,
com os olhos avermelhados. Certamente havia dias em que ele não dormia,
tentando costurar todos os indícios que ocasionaram a falência.
— Foi o Leonard, não foi? — pergunto, fitando os seus olhos
tristes.
— Foi. — a voz fraca. — No começo, eram ele e meu pai aplicando
em contas laranja na Suíça. No final, apenas Leonard. Após aprender todos os
caminhos, o pilantra começou a roubar o meu pai, a roubar a empresa como
um todo.
Passo a mão pelo rosto e paro em minha boca, olhando assustada a
minha imagem no espelho do elevador.
— Uma coisa eu não entendo, por que o seu pai resolveu desviar os
lucros da empresa, se isso poderia levá-lo à falência? Não faz sentido!
A porta do elevador se abre e saímos em direção ao
estacionamento.
— Para não dividir com o seu irmão mais velho, tio Ronny, e com a
minha mãe. Eles têm direito sobre isso tudo aqui, Angel.
Apenas ouço ao som do meu salto vibrar, enquanto caminhamos
pelo chão de cimento do estacionamento.
— E o resort na República Dominicana, os oitocentos mil dólares
que você trouxe da Europa?
Paramos em frente ao meu carro.
— Desvios e mais desvios, Angel. — Jason passa as mãos pelos
cabelos. — O resort foi um parque de diversão para Leonard. Ele desviou
praticamente todo o dinheiro que seria empregado nas obras. — estou
boquiaberta, os olhos marejam. — O meu pai acreditava que a maioria dos
lucros estava indo para a sua conta na Suíça, mas na realidade recebia apenas
dez por cento de tudo.
— E o seu pai achava dez por cento o bastante?
Recosto no carro, cruzando os braços, eu precisava saber dos
detalhes.
— Claro! O meu pai, na verdade, não desconfiava. Por confiar
demais em Leonard, deixou tudo em suas mãos, deu todos os caminhos para
o pilantra, que ficou milionário às custas do trabalho de todos vocês.
Calo-me por segundos, imaginando de onde vinha todo o dinheiro
para as viagens infundadas, para as compras colossais feitas pela internet.
— Você vai denunciá-lo por estelionato, Jason?
— Certamente, Angel. — o rapaz se encosta ao meu lado, as mãos
nos bolsos, o olhar ainda muito perdido. — Vou pedir para incluir no
processo do estupro. Leonard não vai ter saída.
Respiro mais aliviada, pois as esperanças de que Leonard pagaria
por tudo o que me fez renascem em meu coração.
— Leonard sempre disfarçou muito bem! — sorrio indignada. —
Revoltadinho com as exigências de Sr. Victor, com os desaforos que o chefe
nos desferia... Puro teatro!
— Sim... — Jason se aproxima ainda mais de mim. Posso sentir o
seu perfume delicioso. — Os dois eram aliados. Mas Leonard traiu o meu
pai.
— Nunca imaginei que Leonard poderia ser pior que Sr. Victor... —
imediatamente me dou conta. — desculpa... falei demais... — as minhas
bochechas ruborizam. — às vezes me esqueço de que ele é o seu pai, deve ser
por que vocês dois não se parecem em nada...
— Não tem problema, Angel. Às vezes eu também me faço a
mesma pergunta, se sou filho de Victor Collins.
Jason abaixa a cabeça sentindo o peso das emoções comprimirem
os seus sentimentos.
— Então, a gente se encontra no apart hotel? — desconverso. Não
aguentava mais fitar Jason tão arruinado.
O rapaz assente, deixando um beijo caloroso em meu rosto, antes de
entrar no carro de luxo.

***

Respiro fundo, subindo junto a Jason o elevador do apart hotel. A


amargura, naquele momento, não estava apenas em mim, mas nitidamente
nele também. Os seus olhos pretos e levemente puxados eram de uma tristeza
sem fim.
Assim que chegamos em frente às nossas portas, Jason fez menção
de girar a chave, mas antes pediu com carinho:
— Entra, Angel, por favor.
Assenti sem ao menos me dar conta. Eu não poderia negar a minha
companhia àquele rapaz tão incrível que já fizera tanto por mim.
Entrei no apartamento de Jason e ele foi em direção à cama, sem
dizer uma palavra. O rapaz se jogou sobre o colchão macio. Era como se
precisasse se render às tempestades de emoções que reviravam
impiedosamente o seu interior.
Sem ação, fiquei ainda de pé, observando o belo moreno em seu
terno chumbo, a gravata cinza e os sapatos pretos brilhantes que compunham
o visual daquele executivo em forma de tentação.
Jason estava com as mãos sobre o rosto e assim permaneceu
durante alguns segundos, dividindo o seu silêncio com fungadas.
— Você está chorando? — perguntei, assustada, sentando-me ao
seu lado.
— Dói demais a derrota, Angel. — respondeu com a voz abafada
por suas mãos.
— Você não tem culpa. — disse, retirando os sapatos com os pés e
me aconchegando entre os travesseiros, ao lado de Jason Collins. — Pelo o
que entendi, o seu pai foi completamente egoísta.
— Sim, — finalmente, ele me olha e ajeita a cabeça em meu colo,
então levo os dedos aos seus cabelos pretos e cheirosos. — agora o meu pai
deve estar aprontando as suas malas para partir para a Europa. Certamente vai
viver a sua vida de luxo, longe dos Estados Unidos.
— Não vai denunciá-lo? — a pergunta escapole sem eu ao menos
perceber.
— Do que adiantaria, Angel? — a sua voz falha, engasgada. — Eu
não tenho coragem de fazer isso com o velho Victor. É estranho, parece que
existe uma força interior que me impede de fazer qualquer tipo de maldade
contra ele, simplesmente por ele ser meu pai.
Vejo a lágrima descer por seus olhos e se misturar aos poucos pelos
de sua barba.
— Jason, você tem um coração bom. É isso. — engulo a emoção
presa em minha garganta.
— Eu acho que é trauma, mas deixa para lá. — Jason desconversa,
se ajeitando em minhas pernas.
— Tem a ver com o seu passado? — sibilo, me arrependendo, logo
em seguida. Não queria ser invasiva, ainda mais no momento conturbado que
Jason atravessava.
O rapaz apenas suspira lentamente tentando recuperar o ritmo de
sua respiração.
— Por favor, Angel, eu não quero tocar neste assunto.
Engulo em seco. Eu não poderia ser tão insensível a ponto de ficar
insistindo com os mistérios do seu passado, numa ocasião turbulenta como
essa. Então, apenas assinto, acreditando que Jason iria me colocar a par de
tudo em momento mais oportuno.
— Angel, — ele sibila, de repente. Cesso os carinhos em seus
cabelos, já inferindo que Jason estava prestes a me dizer algo muito sério.
Notava pelo seu tom de voz. — eu vou ter que ir embora para a Europa.
Dito e feito.
O meu coração vibra dolorosamente em meu peito, assim que
absorvo o sentido daquelas palavras. E ao mesmo tempo eu me pergunto, por
que eu estava tão surpresa, já que era mais que óbvio Jason ir embora, depois
de ter lutado, em vão, pelos negócios da família.
— É triste, mas... a sua vida é lá, não é mesmo? — finjo
conformidade, segurando em minha garganta um “não vá embora, Jason, pelo
amor de Deus.”
O rapaz então se senta à cama, retirando os sapatos e se aconchega
ao meu lado.
— Eu pretendo voltar, Angel, é só por algumas semanas.
Analiso o seu rosto, tentando encontrar em mim, argumentos para
que ele fique.
— Eu não estou entendendo...
— Angel, — Jason segura em minha mão, e sem me olhar nos
olhos, ele diz. — eu acho que posso confiar um segredo a você.
Arqueio as sobrancelhas em surpresa, ansiando pelo o que Jason
estava prestes a falar.
— Segredo? — pergunto colocando uma mecha por detrás da
orelha.
Ele apenas me encara por segundos, antes de me confiar os seus
mistérios. Seus olhos estavam inchados, o que não anulava a sua beleza.
— Eu ainda luto, Angel.
Sorrio de lado, imaginando aquele belo moreno num ringue,
desferindo socos em seus adversários, os músculos tencionados a cada
movimento, o suor perpassando as costas largas, os shorts boxer marcando o
corpo, para, sem intenções, mexer com os desejos até das mais castas e
reservadas... então eu apenas inspiro anestesiada com os meus pensamentos
indecentes.
— Boxe?
— Sim. — os olhos de Jason brilham e eu imagino que a sua
realização pessoal estava mais nas lutas do que em qualquer empresa ou
mundo coorporativo. — Tenho os meus negócios em Londres, mas participo
de lutas livres. Já consegui muita grana no tatame. — ele sorri e as covinhas
tentadores se desenham em seu rosto. — Inclusive os oitocentos mil dólares
foram prêmio de uma luta que venci em Manchester. — confessa, orgulhoso.
Ajeito os travesseiros sob a cabeça e olho para o teto, divagando.
— E esse valor é irrisório na sua conta bancária... — reviro os
olhos, com um sorrisinho.
— Angel... — ele sorri, me presenteando com os seus dentes
brancos. — você sabe que eu tenho as minhas empresas em Londres, que elas
caminham bem e longe do temido monstro da falência.
Jason se ajeita na cama e alinha o seu corpo à frente do meu.
Pisco os olhos lentamente, fitando a sua boca tentadora.
— Então, você luta apenas por esporte? — pergunto.
— Exatamente... e no mês que vem, haverá uma luta em Liverpool.
Não é nada oficial, é uma luta clandestina, sem regras, sem juiz, apenas muito
dinheiro em jogo.
Amasso os lábios apreensiva. Todo e qualquer fio de entusiasmo,
que sentia com nossa conversa, imediatamente se dissipa.
— Isso não é perigoso?
Então, o rapaz intromete os seus dedos nos meus fios castanhos.
Fecho os olhos sentindo o carinho de Jason Collins.
— Uma vez você me falou que está neste mundo para enfrentar
qualquer tipo de risco, vencê-los ou não, caberia a você descobrir.
— Que memória. — sorrio. — É exatamente isso.
— Não precisa se preocupar, Angel. — ele ajeita o seu corpo contra
o meu e percebo a sua voz sair sibilada. — Eu tenho treinado bastante. Estou
disposto a vencer os caras e angariar um dinheiro para comprar a Collins
Construtora.
— Caras? — ignoro os seus propósitos.
— Sim, são alguns rankings. — ele segura em meu queixo. —
Quanto mais vitórias, mais dinheiro.
Mordisco os lábios e imediatamente me levanto da cama. Estava
com medo, muito medo do que poderia acontecer com Jason nessas lutas. Era
um risco sério que ele iria enfrentar, apenas pela maldita empresa de seu pai.
Vou até o saco de pancadas e empurro, vendo-o balançar
lentamente.
— E se você perder? — temia as contrapartidas.
Jason responde me observando pelo canto dos olhos.
— Ou você ganha ou você ganha, Angel. Não tem isso.
As palavras chegam aos meus ouvidos como um ácido deteriorante.
Inferia nas entrelinhas de sua fala que poderia acontecer o pior com Jason.
Ajoelho sobre a cama e vou em direção a ele. Os olhos inflamados de
preocupação.
— Jason, por favor... Por que você não tenta angariar esse dinheiro
de outra maneira? — pergunto com as mãos no seu rosto.
— Eu não posso desfalcar os recursos das minhas empresas, Angel.
— o rapaz segura em minhas mãos e antes de abaixá-las, dá um beijo sobre
elas. — Muito menos deixar a Collins nas mãos de um estranho, isso é
doloroso demais, fere o meu ego.
— Jason, mas... — a minha voz embarga.
— Angel, vai ficar tudo bem. — Jason se ajeita, envolvendo a
minha cintura nas mãos. — Você vai ficar linda de CEO.
— Eu? — sorrio perplexa.
— Você acha que eu estou fazendo isso tudo por quem? — Jason
dá um beijo lento em meu pescoço. — Você é um talento desperdiçado. —
outro beijo. — Tem que estar imediatamente no comando de alguma
empresa.
— Impressão sua... — gemo.
— Você é modesta... — os beijos se espalham por todo o meu
pescoço, a voz rouca e excitante. — e a mulher mais foda que eu já conheci
em toda a minha vida.
Fecho os olhos recebendo os beijos de Jason por todo o meu
pescoço. Os seus lábios quentes provocam sensações libidinosas por cada
célula do meu corpo. O meu braço empola de prazer. Quando me dou conta,
estou deitada sobre a cama e Jason desfaz o nó da gravata, me encarando com
um olhar altamente sedutor.
O meu peito infla descompassado, já estava ansiosa para o nosso
sexo, afinal de contas já esperava há muito tempo por esse dia.
Os botões da camisa branca de Jason se abrem lentamente, com o
movimento de seus dedos. Mordo a língua, observando o peitoral forte e
dourado surgir aos poucos por debaixo daquela roupa. Abaixo lentamente os
olhos e encontro o pau duro marcando o alto de sua calça chumbo.
Não consigo me conter e me sento sobre a cama, retirando o cinto
de Jason, descendo o seu zíper e a calça pelas laterais. Ouço-o sorrindo,
enquanto ele suspende a minha camisa vermelha. Em seguida, Jason retira a
cueca e, para a minha satisfação, já vejo aquele homem lindo completamente
pelado.
Sinto a minha boceta inflamar, desejosa pelos toques daquele
homem. Imediatamente retiro o sutiã e me deito sobre a cama, quando Jason
retira a saia lápis preta.
— Linda... — Jason balbucia descendo os dedos entre os meus
seios e barriga, alcançando as laterais da minha calcinha vermelha.
À medida em que a lingerie desce por minhas pernas, sinto o
borbulhar insano de tesão em minha boceta. Jason desce o dedo até ela e, sob
um olhar fixo e sério, ele abre as camadas de meu sexo. Ansiava para que ele
não embromasse muito e tocasse imediatamente em meu clitóris.
Mas Jason estava a fim de me enlouquecer.
Primeiro ele coloca um dos dedos em meu canal, conferindo o nível
de minha excitação. Ele sorri torto quando me sente completamente melada.
Mordo os lábios e aperto os olhos quando ele penetra os dedos fazendo
movimentos de ir-e-vir na minha cavidade.
Levo as mãos até meus seios e toco em meus mamilos, me
excitando, enquanto Jason continua firme em sua empreitada de me matar de
tesão.
— Boceta gostosa.
Sem ao menos esperar, sinto o toque da sua língua quente e
experiente em meu clitóris. Os movimentos que perpassavam o meu nervinho
excitado me fazem gemer e rebolar na boca de Jason.
Ele aperta as minhas coxas e o misto de dor e prazer, me faz sentir
o iminente gozo, mas não permito me deleitar agora, era cedo demais.
Jason é atrevido e desce a língua até o meu canal. Sinto a sua língua
entrar.
Grito.
Imediatamente, o belo moreno coloca as minhas pernas sobre os
seus ombros, empinando o meu quadril. Ele molha o seu dedo em minha
excitação e escorrega até o cuzinho.
— Céus. — digo, ofegante.
— Você é toda perfeita.
Jason faz anal com o dedo, molhando-o hora ou outra em minha
boceta melada. Deslizo a minha mão até o nervinho excitado e o meu dedo
mexe de um lado para o outro, enquanto o gostoso faz anal e sorri de lado,
observando a excitação vencer todas as minhas forças.
Nossos dedos se encontram, no meio dos lábios da boceta. Jason
segura em meu dedo e leva-o em direção à minha cavidade melada. Ele
pressiona o meu dedo para dentro de mim, enquanto morde o meu joelho, as
pernas ainda sobre os seus ombros.
— Jason. — choramingo.
Sem eu esperar, o moreno retira as minhas pernas para o lado e com
as mãos em minha cintura, me ajuda a ajoelhar sobre a cama. Amasso os
lençóis entre os dedos, quando sinto Jason abrir a minha bunda.
— Depiladinha. — ele sussurra.
Pretendendo me roubar todo o ar que me resta, sinto a língua
atrevida penetrar o meu cuzinho. Sorrio, empolgada. Em seguida, o belo
moreno lambe toda a extensão da minha boceta até atrás, me retirando um
gemido estridente.
As suas mãos cravam em minhas nádegas, ao mesmo tempo que
Jason Collins permanece com as lambidas quentes e imorais em meu clitóris.
Rebolo em sua boca, babando de tesão por todos os lados.
— Vem cá... — o moreno sussurra, de repente, virando o meu
corpo para ele e, em seguida, se ajeita entre as minhas pernas. Imediatamente
sinto o pau duro penetrar em minha cavidade.
Jason empurra a cabeça melada e fricciona. Aperto os olhos,
sentindo a delícia imensa e ereta entrar deliciosamente.
— Mais. — sussurro arranhando as suas costas suadas.
Os beijos cálidos de Jason alcançam a minha boca, enquanto ele se
apoia na cama com uma das mãos, a outra amassa o meu seio, apertando vez
ou outra o meu mamilo rosado.
O pênis gostoso desliza para dentro e para fora.
Grito.
— Não!
Abro os olhos e vejo o rosto de Jason suado, vermelho de prazer.
Os lábios cerrados de quem estava concentrado no que fazia. Os meus braços
arrepiam.
Que homem lindo.
Um galã do sexo.
Aperto os olhos e mordo o ombro largo de Jason.
Sinto-o atingir o mais fundo do meu sexo. É uma sensação
perturbadora.
— Céus. — gemo, sentindo o orgasmo iminente.
Jason sorri torto e penetra com mais força, brutalidade.
Os movimentos bruscos de seu corpo sobre o meu, mela as nossas
peles de suor, afetando os nossos sentidos do tesão que nos envolvia.
Sinto a ebulição de desejos perpassar a minha corrente sanguínea.
Contorço, sentindo os espasmos, os gemidos latentes em minha boca.
Gozo deliciosamente.
Jason apenas segura o meu rosto entre as suas mãos e suga os meus
lábios, investindo entre as minhas pernas, quando sinto-o derreter dentro de
mim.
Segundos depois, estamos exaustos sobre a cama, ofegantes, as
mãos entrelaçadas, os olhos tentando alcançar o teto.
Éramos bons em tudo o que fazíamos juntos.

***

— Já acordou? — apenas escutei a voz rouca em meu ouvido,


assim que me contorci em meio aos lençóis.
Abri lentamente os olhos com um sorriso bobo brincando em meus
lábios e imediatamente me deparei com os olhos negros fitando a minha
existência.
— Que horas são? — sentei de maneira abrupta sobre a cama,
sentindo ainda o calor do corpo de Jason em minha pele.
— São sete da noite. Algum compromisso?
O moreno me desfere carinhos nos cabelos, enquanto analisa o meu
olhar perdido.
— Não... eu preciso ir para casa.
Enrolei o lençol no corpo e comecei a catar as roupas emboladas,
jogadas pelo chão.
— Angel, fica mais um pouco. — Jason pede ainda sentado sobre a
cama.
Ele estava completamente nu.
Os meus olhos observam de longe toda a sua beleza. Os músculos
bonitos, a barriga trincada, mesmo ele estando sentado sobre a cama. Uma
das pernas torneadas está levemente flexionada, o que não me impede de fitar
o membro gostoso rosado, capaz de me fazer sair de meu corpo sem nenhum
esforço.
— Não, eu vou, Jason. — disse, já vestindo a lingerie e a roupa.
— O que foi? — de repente ele se levanta e vem para perto.
Sem ao menos perceber, sinto o rapaz ajeitar os meus longos
cabelos com as mãos, a boca em meu ouvido.
Inspiro lentamente prestes a reviver todas as sensações de desejo.
— Fica. — insiste.
— Não... — balbucio, fitando os seus olhos preocupados. Simon
certamente dizia para eu partir. — Amanhã, a gente se fala, Jason. — sorrio
amarelo. — Acho que foi porque eu me lembrei que estou desempregada. —
minto.
Essa era uma das minhas preocupações, mas não maior do que eu
me meter em um romance.
— Está desempregada, por enquanto, Angel. — Jason, ainda como
veio ao mundo, cruza os braços e esboça um olhar sério. Mas os meus olhos
se preocupam apenas a esquadrinhar cada canto do seu corpo. — Não se
esqueça dos meus planos, você está neles, garota.
O rapaz segura o meu rosto em suas mãos e me beija lentamente a
boca.
A sua língua traiçoeira era capaz de ferrar com todas as minhas
estruturas, por isso, após o seu beijo quente, abaixei o rosto e deixei o
apartamento com urgência.
Eu não poderia me envolver, não poderia.
Assim que adentrei o meu apart, senti o perfume de Jason Collins
em minha pele. Tão fresco, tão perturbador.
Vou imediatamente para o banho, represando todas as vontades que
me obrigavam a estar com Jason, pelo resto da noite.

***

Era bem cedo, quando terminei o café da manhã. Acabei de


organizar a cozinha e decidi jogar o lixo fora. Talvez eu pudesse encontrar
Jason Collins por um acaso no hall entre os nossos apartamentos, e ao mesmo
tempo eu não entendia o que de tão urgente havia nessa minha necessidade
matinal de estar na presença do belo moreno.
Assim que puxei a maçaneta, os meus olhos se arregalaram em
decepção. Encontrei May perfeitamente estampada à frente da porta de Jason.
No mesmo pé que saí, retornei para dentro de casa, com a sacola de lixo
tremendo na mão.
Bati a porta e colei o meu corpo contra a superfície de madeira.
Apertei os olhos, me odiando por me sentir tão terrivelmente incomodada
com aquela cena.
O que May poderia estar querendo?
Seria a convite de Jason Collins?
A campainha tocou cedo. Abri os olhos, ainda sonolento,
imaginando que Angel deveria ter aceitado a cópia das chaves do meu
apartamento, quando a ofereci, no último final de semana em que passamos
juntos. Estávamos estreitando a nossa relação, embora ainda não
soubéssemos quais eram as nossas reais pretensões. Angel, muitas das vezes,
era fria, indiferente, e isso, ao mesmo tempo que me incomodava, me fazia
sentir ainda mais atraído pelo seu jeito difícil e único.
A campainha soa mais uma vez, enquanto procuro por minha cueca.
Seria bem mais agradável ser surpreendido por Angel Parker me acordando
com um beijo e não com um barulho irritante de campainha.
Já de shorts e apenas com ele, vou em direção à porta.
Assim que puxo a maçaneta, enrugo a testa em estranhamento,
quando fito May, ao invés dos olhos castanhos de Angel Parker.
— Uau, por isso que gosto de fazer surpresas... ou me receberia
assim propositalmente? — a moça pergunta, inspecionando o meu corpo com
os olhos assanhados.
— O que você quer, May? — pergunto, cruzando os braços,
seriamente.
Eu nem ao menos poderia imaginar que aquela mulher sabia do
meu endereço!
— Não preciso responder o óbvio. — ela sibila, segurando em meus
braços.
May não me dar oportunidade de mais nada. Simplesmente espalma
a mão em meu peitoral, empurrando o meu corpo para dentro do
apartamento.
Tento afastar a moça, mas é em vão, ela me empurra para cima do
sofá. A cabeça ainda pesada de sono me trai, então, sem reação, caio
estatelado sobre as almofadas, observando May ajoelhar-se lentamente sobre
o meu corpo.
— Eu não quero nada com você. — sou taxativo, enrugando as
sobrancelhas de raiva.
Em resposta, ela passa os dedos de baixo para cima no meu sexo,
pausando-os estrategicamente sobre o meu pênis.
Um arrepio perpassa a minha espinha, mas eu ignoro, afinal de
contas estava em um momento muito prazeroso ao lado de Angel e já
sustentava intenções reais de namorar aquela garota.
— May, por favor... — seguro em sua mão, ainda vendo a moça
ajoelhada sobre o meu corpo.
Então ela sorri e começa a desabotoar a sua camisa.
Reviro os olhos entediado.
Que inferno!
— Caralho, May, qual parte você não entendeu que eu não quero
nada com você!
Ela finge que não me ouve, lançando a camisa de seda sobre o
tapete.
— Jason, você bateu no Leonard... eu sei de tudo... — ela sussurra,
passando os dedos entre os seios.
— O que você quer? — insisto, segurando em seus pulsos.
— Ele está consciente agora, — ela se solta de minhas mãos num
movimento brusco. — se recuperando do estrago que esses braços fortes
fizeram no seu rosto. — e ela aperta os meus músculos.
Falar sobre Leonard a essa hora da manhã era nauseante.
— Espero que você também tenha sabido dos motivos! — retruco,
segurando nos joelhos de May, tentando afastá-la.
A mulher reluta, sentando sobre o meu pau.
Concentro na conversa sobre o calhorda, para que os instintos não
aflorassem.
— Os motivos? Ciúmes, obviamente. — May diz e sorri de lado.
— Não! — levanto abruptamente por baixo de seu corpo, deixando
May se estatelar no tapete. Estava furioso. — Leonard estava estuprando
Angel! — grito, caminhando pela sala. — Eu faria o mesmo por você e por
qualquer outra mulher que estivesse sendo sacrificada a esse ato repugnante!
— Você é uma pessoa do bem, — ela segura em meus braços,
ainda de sutiã. E eu me odeio por meus olhos se sentirem tão atraídos para
aquela parte de seu corpo. — não pode querer denunciar os desvios que
Leonard fez na Collins. O estupro já é o bastante, não acha?
Viro de costas, abismado com as intenções de May.
— Eu já o denunciei pelo o estelionato! E não vou retirar a queixa.
Aliás, foi Leonard que te mandou aqui? — sou bruto e não escondo a minha
raiva.
— Óbvio que não! — a moça responde, catando a camisa no chão.
E me sinto extremamente aliviado quando a vejo finalmente abotoar
a roupa.
— Leonard deve ter te prometido dinheiro, May. Confesse! — a
voz ainda carregada de ojeriza, enquanto encaro o olhar cínico da loira.
— Não, Jason, não. — ela se aproxima de mim, segurando em
meus braços. Os olhos piedosos. — Leo é o meu amigo e eu estou aqui pela
nossa amizade, exclusivamente.
— May, chega! — caminho em direção à saída, abrindo a porta e
torcendo para que a moça tenha um pouco de senso e saia do meu
apartamento. — Você deveria ter vergonha por defender Leonard, depois de
tudo o que ele fez. Você sabe de tudo, garota. Não se faça de cínica.
A moça caminha lentamente na minha direção. Apesar de fingir os
sentimentos, era notório que estava me odiando naquele momento.
— Eu preciso de um emprego. — ela cochicha, espalmando a mão
em meu peito e balbucia analisando os meus lábios. — Eu quero ir para a
Europa com você, Jason Collins.
Gargalho.
— Não conhecia o seu senso de humor, querida.
E os meus olhos se preocupavam apenas a encarar a porta fechada
do apartamento de Angel.
— Eu estou falando sério! — May guincha.
E quando me dou conta, a fechadura se move, a porta se abre e
Angel presenteia os meus olhos com a sua bela imagem.
— Bom dia, Jason. — ela sussurra, analisando-me junto a May.
— Bom dia, amiga! — a loira, surpresa com a abordagem de Angel,
vai na sua direção, para abraçá-la com falsidade.
— Angel, — bufo. — Leonard pediu que May viesse até aqui para
me chantagear! — ela me encara tentando dar credibilidade à minha fala. —
Pediu que eu retirasse a denúncia de estelionato, argumentando que o estupro
já é o suficiente!
— May? — Angel está perplexa. — Você veio pedir isso?
A secretária abaixa os olhos, após ser encurralada pela voz
autoritária de Angel.
— Eu soube de tudo o que aconteceu, eu sinto muito, amiga. —
May balbucia com os olhos cínicos.
— Você não sente nada, May, — Angel se aproxima da loira,
mirando um dos dedos no seu rosto. — caso contrário, não teria vindo
chantagear o Jason... e eu nem quero imaginar como!
May revira os olhos teatralmente, antes de cruzar os braços e olhar
nos olhos de Angel.
— Quer saber? Você é uma dramática! Leonard disse que nem
chegou a consumar e...
Angel não permite que May conclua os seus raciocínios de merda.
A sua mão espalma no rosto descarado da moça.
— O que você fez? — a loira pergunta com a voz chorosa.
— Sua falta de empatia me enoja!
E Angel, ainda com a mão em riste, parte para cima de May outra
vez, mas eu a impeço.
— Angel, por favor. — seguro em seus braços, observando os seus
olhos revoltados.
May ainda acaricia o rosto, depois do tapa bem merecido que
recebeu de Angel Parker.
Imediatamente vou em direção ao elevador e pressiono
incansavelmente o botão, querendo, o quanto antes, dar um basta naquele
mal-estar. A porta finalmente se abre e, então, seguro na mão de May e a
coloco naquele pequeno espaço.
Angel caminha de um lado para outro, no hall do apart hotel.
— Essa mulher é louca. — sibilo, passando as mãos pelos cabelos,
assim que a porta do elevador se fecha.
— Eu imaginava que May era uma pessoa volúvel e sem opinião,
mas não a esse ponto! Como pode tratar da situação que passei com tanto
descaso e frieza? — pergunta com os olhos inflamados. — Aposto que ela
nunca tenha ouvido falar em sororidade.
— Certamente, não. E o que me preocupa, principalmente, é que
Leonard está quase saindo do hospital. Eu não posso voltar a encará-lo,
Angel.
— Muito menos, eu, Jason, muito menos, eu...
Abracei Angel e senti a sua respiração ofegante. Os pesadelos da
noite após a boate ainda a incomodavam e afetavam o seu interior de alguma
maneira.
— Angel, você ainda não me falou se conseguiu superar aquela
noite... — seguro o seu rosto em minhas mãos, afastando-o lentamente.
— De certa maneira sim... — os seus olhos marejam. — todas as
vezes que me vêm as lembranças, sinto um desconforto quase palpável, aqui
dentro, no entanto a sua imagem arrombando aquela porta surge em meus
pensamentos, como acalento, como se fosse para interromper o meu
pesadelo, Jason... e isso me alivia. — ela segura forte em minha mão. —
Você não permitiu que acontecesse o pior.
— É exatamente isso, o pior não aconteceu...
— Sim... e isso me conforma.
Peguei Angel em meu colo e a abracei com força, beijando os
cabelos que desciam por seu ombro. Ela chorou, como se revivesse todas as
atribulações, mas eu também entendia que aquelas lágrimas poderiam ser
lágrimas de alívio.
Sem querer, senti os nossos corações palpitarem no mesmo ritmo,
então, sorri contido, satisfeito com a sintonia tão presente em nossos corpos.
***

— Uma vez você me disse que também morou em Nova York? —


pergunto.
Angel estava sentada na poltrona à minha frente, as pernas
flexionadas sobre o sofá. Ela ainda vestia a sua camisola de seda cor-de-rosa.
Era de manhã bem cedo, quando eu apareci em sua porta com um
bolo de chocolate na mão. Havia me arriscado em uma receita para
incrementar o nosso café matinal, e também para retirar um sorriso bonito da
boca de Angel.
De vez em quando, eu gostava de fazer essas surpresas. Não tinha
como ignorar que aquela mulher incrível morava ao meu lado.
Angel me atendia sempre com um sorriso genuíno estampado no
rosto. Parecia a gratidão eterna que a movia, por eu tê-la salvado das mãos de
Leonard, na fatídica noite.
— Eu morei por um tempo, em Nova York, na época da minha
adolescência. Estudei até me formar. — então, Angel me encara com a boca
cheia. — Uau, esse bolo está realmente muito bom.
Sorri, por vê-la feliz.
— Mas você fez a sua faculdade na Carolina do Norte? —
pergunto, depositando o prato vazio sobre a mesa de centro.
— Exatamente. — Angel tinha um charmoso bigode de chocolate.
— Eu não queria mais ficar longe dos meus pais.
De repente, a menina se cala. Ela leva o pedaço de bolo de um lado
para o outro da boca, como se quisesse me confessar algo.
— E também... aconteceu algo muito grave, Jason... uma tragédia...
— finalmente Angel fala, me arrancando um suspiro profundo.
— Tragédia?
— Sim...
Ela abaixa os olhos e deposita o prato ainda cheio de bolo sobre a
mesa de centro. Certamente havia perdido o apetite por conta de lembranças
tão cruéis.
Então, caminho na sua direção e me sento ao seu lado.
Seguro nas mãos de Angel e elas estão como pedra de gelo.
— Se não quiser falar sobre esse assunto, eu respeito a sua decisão.
Angel fecha os olhos e uma lágrima escapole.
O meu coração aperta preocupado.
— O meu namorado faleceu nessa época, Jason. — ela confessa
com o olhar sem brilho. — Foi muito difícil, para mim, superar... às vezes, eu
acho que ainda não superei. — a sua voz falha e Angel leva as mãos ao rosto.
Abraço a garota contra o meu corpo.
— Por isso tão resistente a relacionamentos? — é o que apenas me
preocupo a perguntar.
Por mim, já estaríamos acendendo velinhas de aniversário de
namoro, neste bolo.
Não me reconheço, talvez eu seja um brega romântico!
— Eu não consigo mais sentir segurança dentro de um
relacionamento, Jason. — Angel rola o anel prateado que tenho na mão
esquerda. — Parece que, a qualquer momento, eu vou perder a pessoa com
quem me relaciono.
Seguro o seu queixo, fazendo com que os seus olhos me fitem.
— Mas você já chegou a arriscar um pouco o seu coração, Angel?
Entregá-lo, sem medo...
— Nunca mais, Jason, nunca mais eu me senti confiante.
Analiso o rosto daquela moça. Tantas decepções para um coração
tão jovem.
A vida realmente não escolhia as suas vítimas.
Aperto as mãos de Angel nas minhas, imaginando que certamente
estávamos aqui para sofrer por amor, afinal de contas, a garota ainda não
havia me entregado os seus sentimentos.
— Você já deve saber, Angel, que mexe comigo de uma maneira
completamente inexplicável. — confesso, no seu ouvido.
O perfume dos seus cabelos, os olhos tão expressivos, o jeito que
sorria para mim, definitivamente estava difícil de simular o que Angel fazia
com o meu coração.
— Jason? — ela pergunta com incredulidade.
— Às vezes, eu tenho vontade de trancar a porta de casa e não
deixar você atravessar o hall, para estar de volta ao seu apartamento.
Ela sorri. Os dentes sujos de chocolate.
— Possessivo dessa maneira?
Aproximo o meu corpo ainda mais. Levo a minha mão aos cabelos
de sua nuca, grudo a minha testa na dela.
— Não é posse, é desejo, é saudade da sua companhia.
Angel calou-se por segundos, até que as nossas bocas se
aproximaram, e nos beijamos. Ao mesmo tempo, eu sentia nos lábios de
Angel que ela me queria, mas eu entendia os traumas que a freavam.
— A sua campainha tocou. — ela sibilou em minha boca. Nem ao
menos havia escutado.
— Quem será a essa hora?
Antes de dar alguns beijos leves na boca de Angel, desvencilhei-me
contrariado.
A garota abriu a porta para mim e quando coloquei os olhos para
fora, me deparei com um senhor em frente à minha porta.
— Pois não? — perguntei, desconfiado.
— Eu sou oficial de justiça. O Sr. Jason Collins se encontra?
Um tranque freia as batidas do meu coração.
— Sou eu.
Angel me encara de maneira perplexa, os olhos conturbados.
— O senhor está intimado a comparecer na delegacia.
Engulo em seco, recebendo a caneta e o papel nas mãos. Não reluto
em assinar onde deveria.
Este era apenas o início do desfecho do processo de Leonard.

***

No dia seguinte, chegamos à delegacia, no horário marcado. Angel


estava me encarando com os seus olhos grandes e atribulados, enquanto um
mau pressentimento tratava logo de envolver todos os meus instintos. Eu
preferia que ela estivesse me esperando no apart hotel, no entanto insistiu em
me acompanhar.
Estacionei o carro e me virei para a aquela mulher decidida.
— Angel, esses assuntos não te fazem bem. Por favor, me espere no
carro.
— Pelo contrário, Jason. Se eu não estiver com você, vou me sentir
realmente mal. Eu preciso saber do que o delegado precisa.
Coço a barba, impaciente.
— Angel, por favor...
— Nada do que você me disser vai me convencer a ficar neste
carro. — ela me interrompe, categórica como de costume.
Então, apenas encarei Angel nos olhos, sem argumentos. O que me
apavorava era o que o delegado poderia querer comigo, a essas alturas,
depois de todas as provas, de todas as denúncias.
E apenas comigo?
Por quê?
Se Angel também estava envolvida no caso.
Caminhamos juntos em direção à sala do delegado. A bela garota
mantinha um sorriso confiante na boca, assim que o guarda abriu a porta para
entrarmos.
Sentamos em frente ao jovem senhor, ele colocou os óculos,
pigarrou, antes de prosseguir com a sua fala.
— Jason Collins, mais uma vez envolvido em atos de violência!
Primeiro, o envolvimento com a morte de Simon Kern e, agora, Leonard
Corazza...
Angel segura em meus braços com força, antes de gritar chorosa.
— Simon Kern? Ele é o meu ex-namorado!!!
O meu coração sangrou naquele momento.
— Senhorita, por favor, está tumultuando a sala. — o delegado me
advertiu com a voz áspera.
— Eu preciso saber o que está acontecendo aqui! — levantei
atordoada da cadeira. As lágrimas já se adiantavam pelo meu rosto sem eu
precisar fazer esforço para tanto. — Vocês devem estar confundindo! Jason
não tem envolvimento com a morte do meu namorado!
— Calma, Angel, por favor. — Jason me implora com os olhos
tristes. — Eu fui inocentado.
A minha visão fica turva.
Ele havia confessado!
— Jason, o que você fez com o Simon naquela usina de asfalto? —
balbucio, anestesiada.
— Senhorita, quem faz as perguntas aqui sou eu! — o delegado me
interrompe num grito. — Pode se retirar!
Senti, de repente, alguém tocar em meus ombros. Era o policial me
encaminhando para fora da sala.
Saí da delegacia com as mãos entre os cabelos, o olhar sem rumo,
todos os sentidos paralisados.
Por pouco, não respirava.
Simon havia sido morto naquela noite.
As lembranças retornavam de maneira tão nítida, tão real.
Tão cruel.
O meu coração recupera as suas feridas, nem tão completamente
cicatrizadas nos últimos anos.
Simon Kern saiu do meu apartamento, naquela noite de sábado,
após assistirmos Harry Potter e a Ordem da Fênix, lançamento na época.
Disse que iria para casa, com a desculpa de que o seu pai estava precisando
de ajuda em algumas planilhas da empresa. Eu estranhei. Simon detestava
Matemática. Já, no dia seguinte, recebi a notícia de que ele havia sido jogado
do alto da usina antiga de asfalto.
Um grupo de garotos estava lá, naquela noite. E eu chorava apenas
por imaginar que um deles era Jason Collins.
Caminho pelo centro da cidade, sem rumo. As lágrimas me
encharcam os olhos, enquanto cerro os lábios, já sem sentir a força das
pernas.
— Não, Jason, não... — balbucio, lembrando do homem incrível,
que fez tanto por mim, nos últimos meses.
Havia alguma coisa errada.
Não combinava com Jason, definitivamente não combinava.
Simon foi empurrado do alto da usina. A troco de quê?
Até hoje essas perguntas me roubavam a paz e apenas Jason Collins
poderia ter as repostas.
Seria difícil demais ouvir toda a história outra vez, mas eu
precisava saber da verdade, dos detalhes, apenas isso me interessava. Eu
precisava desse acalento.
Atravesso o asfalto e os carros desviam do meu corpo. Os raios de
sol que despontam do céu azul esquentam ainda mais os meus miolos.
Eu queria fugir.
Fugir de mim mesma.
Jason, agora, era sinônimo de decepção, crueldade.
Recosto em uma árvore para desfrutar daquela sombra agradável,
enquanto as lembranças me assolam.
Simon era um rapaz popular, amigo, que cantava no coral da igreja.
Ele não merecia essa morte tão cruel, não merecia.
Eu o amava tanto quando ele morreu, eu era completamente
apaixonada. Quando as minhas amigas me ampararam naquela manhã de
domingo, eu o esperava em frente ao meu prédio, para irmos ao Central Park,
como fazíamos todos os finais de semana. Mas o carro de Simon não dobrou
a esquina.
Perla e Ellen vieram ao meu encontro. Não conseguiam dizer nada,
apenas me encaravam com agonia. Assim que perguntei pela décima vez o
que havia acontecido, trataram logo de verbalizar todo a tristeza que sentiam.
— Ele morreu, Angel.
— Não, Perla, Simon foi morto.
Elas me abraçaram forte, enquanto as emoções me arrebatavam,
então, rendida ao desespero, desmaiei no asfalto.
Eu nunca mais fui a mesma pessoa depois daquele episódio.
Quando eu acordei, já no hospital, eu apenas desejava que fosse um
pesadelo.
Eu desejava não amar Simon como eu amava.
Ao mesmo tempo em que prometia a mim mesma nunca mais me
envolver com ninguém, nos próximos anos.
Quando me dou conta, estou sentada no banco do parque. A brisa
leve arrepia os meus braços, enquanto observo o ir e vir de pessoas. Uns
correm, outros caminham conversando com suas companhias. O lago verde é
opaco e reflete a cor das árvores que o margeiam.
Aperto os olhos e escapolem mais lágrimas. Todas as vezes em que
as palavras do delegado ocupavam as minhas lembranças, era um pedaço do
meu coração que era esfacelado.
Os meus olhos estão embaçados. O nariz já entope por conta de
todas as emoções que insistem em escapulir por cada ponto de meu corpo. A
visão turva alcança de maneira abrupta uma imagem conhecida no meio das
pessoas.
Não, não poderia ser.
Eu conhecia aquele jeito de andar, os cabelos aloirados que
esvoaçavam à medida em que os passos avançavam em minha direção.
— Leonard? — pergunto a mim mesma, sentindo o mundo ruir ao
meu redor.
Imediatamente me levanto do banco. Corro em direção à saída do
parque. Os pombos voam à minha volta, enquanto avanço para o asfalto,
fugindo de Leonard.
O verme havia recebido alta do hospital.
Droga! Eu o odeio!
Corro, simplesmente porque não queria qualquer tipo de contato
com aquele monstro.
Mas sinto que ele ainda está no meu encalço.
Assim que maneio o rosto para trás, vejo o rapaz correr na minha
direção. Ele ainda exibia uns curativos no rosto. As consequências das
monstruosidades que ele havia feito comigo.
— Angel! Espera! — Leonard grita.
Apenas passo as mãos pelo rosto, enquanto aperto mais os passos.
Agora, me dava conta por que havia vindo instintivamente na direção do
parque. Costumava vir aqui quando precisava reenergizar. E ainda me
lembrava que foi Leonard que me sugeriu este lugar como ponto de escape.
Ele também tinha o hábito de caminhar pelo parque da cidade quando estava
passando por alguma atribulação, ele me dizia que o verde da natureza fazia
bem para os seus conflitos.
Dobro a primeira esquina, me esgueirando entre as pessoas, quando
tropeço em meus próprios pés e me apoio em uma grade de uma construção
qualquer.
O palpitar em meu peito é avassalador, a ponto de interferir na
minha respiração. Imediatamente olho para trás, quando sinto uma mão em
meu ombro.
— Oi, Angel. — apesar do olhar sofrido, Leonard ainda deixava o
deboche escapulir por sua voz.
— Sai daqui, Leonard.
Ainda seguro na grade, tentando me equilibrar. As emoções e a
presença indigesta de Leonard estavam prestes a me derrubar.
— Aconteceu alguma coisa? — ele me pergunta.
— Não seja cínico, monstro! — grito.
— Calma, Angel, — ele coloca as mãos em meus braços. — eu sou
o mesmo Leonard de sempre. O que aconteceu naquele dia foi um lapso. Eu
estava bêbado e...
— Cala a sua boca! — grito, cerrando os punhos. — Você é um
covarde. Não pode ter a mulher que quer, porque não é homem o suficiente
para conquistar. Precisa apelar para a força física e toda a nojeira inteira que é
você.
Cuspo em seu rosto, sem pensar nas consequências.
— Angel, eu... — tenta falar, limpando a saliva que escorre
lentamente por seu olho.
— Você vai pagar por tudo o que fez. O estupro, os desvios de
dinheiro, tudo. — a minha garganta dói tamanha a força de minhas palavras.
— Não se iluda, Angel Parker. — ele sorri. — Você não pode
desmerecer a minha inteligência dessa maneira. Embora o seu namoradinho
seja um bom obstáculo no meio de todos os meus planos.
Passo as mãos pelo rosto, desejando evaporar junto às fumaças dos
carros.
— Jason Collins não é o meu namorado! — grito. — Ele apenas me
livrou de sua imundície, naquela noite.
— Você está muito nervosa, — debocha, encostando casualmente
na grade. — espero encontrá-la em um outro momento para conversarmos,
para você me perdoar.
Gargalho, sentindo o ódio abrasar todo o meu rosto.
— Morra querendo o meu perdão. De mim, você terá apenas
desprezo. E eu irei torcer a todo momento para o seu pior, Leonard.
Apenas vejo o rapaz morder os lábios, apreensivo. Conseguia
enxergar que, no seu íntimo, ele sentia medo do seu futuro, dos prenúncios
obscuros iminentes em seus caminhos.
Viro de costas e caminho na direção do apart hotel.
As emoções ainda insistiam em retirar toda a minha razão.
E assim que adentro o hall, ouço Jason Collins chamar por meu
nome.
A porta de vidro se abre, assim que me aproximo. E os meus olhos
brilham quando vislumbro a bela imagem de Angel Parker.
— Angel!
Chamo por seu nome, ao mesmo tempo em que a vejo adentrar o
elevador. E ela simplesmente me ignora. Mas eu não a condenava por isso.
Angel havia descoberto os segredos do meu passado. O pesadelo que
assolava a minha existência desde quando eu era um adolescente de dezoito
anos.
O que eu jamais poderia imaginar era que Angel tinha um
envolvimento desse nível com a vítima daquela noite. Contudo eu não tive
culpa, eu não tive, por mais que eu tente me convencer disso, parece que
existe uma voz interior que me fala dia após dia, que eu falhei com Simon,
que eu deveria ter salvado a sua vida.
Já estava em frente ao apartamento de Angel, quando respiro fundo
antes de tocar a campainha, uma, duas, três vezes. A garota mais uma vez me
ignora.
— Angel, por favor, precisamos conversar. — falo em sua porta. —
Eu não quero retornar para a Inglaterra sem esclarecer tudo o que for
necessário.
Abaixo o rosto e colo a testa na superfície de madeira, torcendo
intimamente para que Angel cedesse e abrisse a sua porta para mim.
Imediatamente, ouço a chave girar.
Sorrio incrédulo.
A porta se abre lentamente e então encontro os olhos castanhos e
sérios de Angel. Apesar de uma nuvem negra estar estacionada sobre a sua
aura, ainda havia muita beleza naquele rosto.
— Oi. — disse, contido.
Temia a sua reação ao me ver.
— O que você quer, Jason?
Angel não me olha mais nos olhos.
— Eu quero explicar para você o que aconteceu naquela noite na
usina antiga. Vai ser doloroso demais para você reviver essas lembranças, eu
sei... mas, para mim, também não vai ser diferente.
A garota faz um gesto com uma das mãos para que eu entre em seu
apartamento.
— Pode sentar.
Eu me aconchego de um lado do sofá. Ela puxa uma cadeira da
bancada da cozinha e se senta. Os olhos ainda tristes retratavam uma alma
dolorida.
— Fala o que aconteceu, Jason. Eu não aguento mais viver essa
tortura. Até hoje eu não sei a verdade sobre a morte de Simon. — a voz sai
entrecortada.
Debruço em meus joelhos, mirando exclusivamente no tapete de
pelos.
Eu precisava de coragem.
— Ele se jogou, Angel. — balbucio.
— Você só pode estar mentindo, — ela grita, se levantando
atordoada da cadeira. — afinal de contas, mentiras fazem parte do seu
repertório, não é mesmo?!
Aperto os olhos com as palavras que me atingem certeiramente.
— Eu não estou mentindo, Angel. — sou incisivo. — Eu preciso
que você acredite em mim ou... especule o que preferir. — estava prestes a
perder as esperanças de recuperar a confiança de Angel.
A garota respira de maneira profunda, fechando lentamente os
olhos. Finalmente, volta a se sentar na cadeira.
A voz firme velava as suas atribulações do momento.
— O que houve, então?
Fico em silêncio, passando a mão entre os cabelos e então decido
falar. Era doloroso demais reviver tais lembranças.
— Era a madrugada de sábado. Eu e os garotos resolvemos ir até a
usina antiga de asfalto para fazer uma aposta. Quem conseguisse descer por
uma das chaminés, ficaria com o dinheiro que arrecadaríamos nas próximas
lutas. — Angel me encara atentamente, esboçando um semblante duvidoso.
— A chaminé era imensa, tinha uns doze metros de altura, mais ou menos.
Adorávamos correr riscos e provar para nós mesmos que éramos capazes de
vencê-los. — dou um meio sorriso, antes de concluir. — Inconsequências da
adolescência... — então, Angel caminha na minha direção e, calada, se senta
ao meu lado, no sofá. — Eu e mais uns cinco caras lutávamos no ringue do
Brooklyn. Quando aconteciam as lutas e saíamos vencedores, ganhávamos
uma boa grana, e foi por isso que decidimos fazer esse desafio.
— Eu não estou conseguindo entender! — ela espalma a mão
contra uma almofada. — Como Simon foi parar lá? Ele nunca lutou, pelo
contrário... sempre foi averso à violência!
— Boxe não é violência, Angel, é esporte.
A garota revira os olhos de maneira impaciente.
— Mas o que vai acontecer em Liverpool, nas próximas semanas,
sem regras, sem juiz, sem derrotas, isso, na minha opinião, não é esporte!
Calo-me por segundos, sem argumentos. Angel jamais entenderia
as emoções que percorriam a minha pele quando estava num ringue, quando
comemorava as vitórias, quando recebia e me esquivava dos golpes. Era
exatamente isso o que me movia e eram essas sensações que me levariam até
o tatame de Liverpool, para vencer e receber toda a grana necessária para a
compra da Collins.
— O seu pai deveria te repassar a empresa, — ela continua. — já
que você é um empresário bem-sucedido! — implica, dando de ombros.
— Até parece que não conviveu o suficiente com Victor Collins,
para não perceber toda a sua ganância! — Angel reluta por alguns segundos,
mas, rendida, finalmente concorda comigo. — Bem, onde paramos?
A moça recosta contra o sofá, exibindo um semblante exausto.
— Preferia que não retornasse a esse assunto, Jason, mas é muito
importante para mim, saber o que aconteceu com Simon, os motivos que o
levaram até essa maldita usina.
Olho para as mãos de Angel e resolvo segurar em uma delas. Sentia
em suas palmas suadas e geladas, todos os mal-estares de sua alma.
— Simon era vizinho do Mark, um dos meus amigos. Estudavam
em escolas diferentes. Mark tinha uma irmã, a Vanessa. E Simon era
apaixonado por ela.
— O que você está falando? — Angel grita, me encarando com
revolta. Ela solta abruptamente a minha mão e respira de maneira ofegante,
esperando por respostas.
— Ouça, Angel. — me ajeito no sofá, observando os seus olhos
marejados. — Você precisa saber quem era Simon!
Sinto o meu coração apertar dolorosamente. Era difícil demais
testemunhar todo o sofrimento de Angel.
E ela ainda não sabia da metade!
— Então você está insinuando que eu não conheço o meu próprio
ex-namorado?
Aperto os olhos e dou um breve suspiro.
— Infelizmente não.
Angel sorri debochada, mas, mesmo assim, prossigo.
— Mark chegou uma vez em casa e flagrou Simon e Vanessa
transando no sofá de sua sala. — Angel arregala os olhos gradativamente,
enquanto continuo com as revelações, a voz branda. — A irmã de Mark tinha
apenas quinze anos, era menor de idade e Simon, além de ser maior, tinha
uma namorada, você.
— Canalha! Eu desconfiei várias vezes que ele me traía, mas nunca
quis acreditar...
Angel debruça em seus joelhos e chora, amargurada.
Abraço o seu corpo e beijo o alto de seus cabelos. Não era apenas
ela que sentia tanto sofrimento com essa história.
Engulo em seco, imaginando que ainda nem havia chegado no
ponto mais doloroso dos fatos.
— Mark quis matar Simon. Matar. — Angel me encara, finalmente.
Os brancos de seus olhos estão vermelhos. — Mark teve que segurar toda a
sua raiva ou se não faria uma grande merda naquela tarde. Então, ele pediu
que Simon estivesse na usina antiga para participar de uma aposta. Se Simon
conseguisse vencer o desafio de descer a chaminé, seria perdoado, caso
contrário, Mark iria contar ao pai do ocorrido e ele certamente iria tomar as
medidas judiciais cabíveis.
Angel esfrega as mãos no rosto e me encara.
— Então, Simon caiu?
— Simon se jogou, Angel. Era orgulhoso. — a moça se deita no
sofá, as pernas em meu colo. Vejo os solavancos em seu corpo devido ao
choro doloroso. Em seguida, ela apenas se detém a fitar o teto da sala. —
Chegou no início da descida, Simon travou, ficou paralisado, olhando do alto.
Parece que tinha algum tipo de fobia. Eu fui o único que me arrisquei, fui até
ele e estiquei a minha mão, falando: “Segura, cara. Vamos sair dessa.” Mas
Simon me ignorou. Ele discutiu comigo, disse que éramos todos covardes,
frouxos, que lutar boxe não fazia de nós mais homens do que ele, então,
pulou. — Angel chora, permitindo inúmeras lágrimas por seu rosto. —
Simplesmente não acreditamos quando Simon se jogou, acabando com a sua
vida e com a nossa também. Após a tragédia, respondemos processo, quase
fomos detidos, além do trauma que ele deixou em mim e principalmente em
Mark... e em você também. — fecho os olhos por segundos, querendo dar um
basta naquele assunto indigesto. — O meu pai me ajudou muito na época,
apesar de toda a indiferença que ele sempre teve comigo. Essa foi a parte boa.
Victor Collins executou com maestria o seu papel de pai.
Calada, Angel se levanta lentamente do sofá, caminha descalça pela
sala, no seu conjunto de moletom cinza. A garota vai até a janela e inspira,
fechando os olhos, desejando ar, desejando fôlego para absorver tantas
revelações cruéis. O Simon verdadeiro havia sido apresentado a Angel,
finalmente. Aquele rapaz não valia a água que bebia. Um sórdido. Angel nem
ao menos poderia imaginar saber de outras histórias a seu respeito.
— Jason, por favor, me deixa. — ela finalmente fala, com a voz
rouca de choro.
— Você está chateada comigo? — me aproximo, levando as mãos
em seus ombros. — Eu não tive culpa de o destino cruzar as nossas vidas
dessa maneira, eu jamais poderia imaginar da sua ligação com Simon.
— Por favor, vá embora. — ela se vira, séria, destruída. — Eu não
quero te ver mais.
Engulo um bolo dolorido em minha garganta. Eu não entendia o
que faltava para Angel me perdoar.
O que me restava era obedecê-la, respeitar as suas dores, entender
os tropeços tão dolorosos que o destino impôs em sua vida.
Segurei em sua mão e deixei um beijo quente em seu dorso.
Em seguida, saí e bati a porta.
No dia seguinte, partiria para a Europa.
Tranquei a porta do apartamento, ainda com esperanças de estar de
volta nos próximos meses. A mala preta na mão. Estava empolgado e
acreditava que venceria as lutas, conquistando o montante para comprar a
Collins do meu pai, o que não passava de uma tremenda e maldita ironia.
Comprar um negócio que poderia ser meu por direito! Mas ele havia excluído
a mim e tio Ronny de todas as ações, o que não era surpreendente, pois não
passava de mais uma atitude repugnante, em meio a tantas outras, na sua
tosca trajetória de vida.
Assim que retiro a chave da maçaneta, os meus olhos rolam para a
porta de Angel. Ainda era de manhã bem cedo e certamente a garota que
atormentava com todos os meus sentimentos, ainda deveria estar dormindo.
E eu não poderia mais negar.
Estava completamente apaixonado.
Ao mesmo tempo sentia insegurança, temendo por não encontrar
mais Angel quando retornasse da Inglaterra, afinal de contas, ela foi
categórica, disse que não queria me ver mais, no entanto os seus olhos diziam
o contrário, por isso eu acreditava que era apenas um momento difícil para
ela, onde precisava digerir toda a verdade sobre Simon e sobre o meu
envolvimento com a morte de seu ex-namorado. Eu estava disposto a me
afastar no momento, mas os nossos sentimentos eram reais e isso me dava
esperanças de que, ao retornar, seria finalmente correspondido nas minhas
pretensões.
Imediatamente pego um post it em meu bolso e colo na porta
vizinha.
Estarei em Londres pelos próximos dias. Você já tem o meu
número. Além disso, deixo o contato de Harry, o dono da loja de camisas de
rock que vai ajudar na organização do evento. Espero vê-la em breve,
querida Angel.
Desci o elevador, com um nó na garganta pressionando todos os
meus sentimentos. Eu não queria me afastar de Angel Parker. A vontade, no
momento, era de me aconchegar ao seu lado naquela cama, e dormir pelo
resto da manhã, sentindo o perfume dos seus longos cabelos castanhos.
Angel era um incentivo a mais para eu vencer no ringue. A Collins
Construtora precisava de uma mulher como ela comandando os negócios.
Inteligente, batalhadora e firme em suas atitudes.
Teria que dar certo.
Assim que a porta do elevador se abre, o celular vibra em meu
bolso. Será que Angel já teria acordado e se deparado com o meu bilhete?
E os meus olhos semicerram decepcionados, quando vejo o nome
do meu pai na tela acesa.
— Alô.
— Filho, estou ligando para avisar que acabei de pousar na Suíça,
neste minuto.
— Você o quê? — estou perplexo.
— Não sei por que a surpresa, moleque. Já deveria inferir as
minhas intenções. Eu vou morar na Europa. Afinal de contas, por que apenas
você e sua mãe que podem viver aqui?
— E tio Ronny?
— Ele tem as suas duas filhas. Está amparado.
— Eu não quis dizer isso, pai. E os direitos de tio Ronny na
empresa?
— A Collins Construtora já está à venda no mercado. Assim que
angariar esse dinheiro, eu não coloco mais os meus pés na América, por um
bom tempo. Talvez, você nunca mais ouça o meu nome.
— Pai, preste atenção. Eu vou comprar a Collins. Eu apenas te peço
que espere por duas semanas.
— Você? O que te deu para deixar os seus negócios na Europa?
Ah, já sei! Angel Parker!
— Eu não vou deixar os negócios na Europa, aliás, eu não preciso
te dar detalhes da minha vida, se também não faz questão de dividir os seus
planos comigo.
— Não tem isso, Jason. O primeiro que aparecer com a grana, eu
vendo.
— Ok, eu vou ser o primeiro.
Desligo o celular, já no carro, dirigindo rumo ao aeroporto. O meu
voo sairia daqui a uma hora e eu já estava atrasado.
Como o meu pai me irritava! O deboche, a ironia, a frieza! E eu
ainda desejava que não fosse dessa maneira! Quantas vezes eu deitei em meu
travesseiro e chorei por horas, tentando entender o que o motivava a ser desse
jeito, o que eu poderia ter feito com a sua vida, para ele me retribuir sempre
com brutalidades.
Ou, simplesmente, este era o seu jeito.
Questão de índole.
Suspiro, imaginando que resolveria parte dos meus problemas com
a compra da empresa. Angel estaria comigo à frente dos negócios, tio Ronny
e mamãe iriam participar dos lucros. Isso tudo era gás necessário para
enfrentar os meus adversários.
Soco o volante, num momento de empolgação, imaginando que eu
estava muito perto da realização dos meus sonhos.

***

Cheguei em Londres e me deparei com uma cidade cinza. O clima


peculiar daquele lugar me deixava abatido, e esse era um dos motivos que me
trazia arrependimento por não ter investido nos meus negócios na Itália, onde
mamãe morava, no momento.
Estava no táxi enquanto imaginava que saí de Londres há alguns
meses, com tantos sonhos, com tanta vontade de reerguer os negócios de meu
pai, mas o destino resolveu brincar comigo, me trazendo Angel no lugar do
sucesso da empresa.
E, apesar de tudo, estava feliz com essa condição. Eu pretendia
conquistar Angel, tê-la como a minha namorada. Aquela mulher me ajudaria
a tocar os negócios na América, enquanto poderia estar vez ou outra em
Londres, supervisionando as empresas daqui e, também, lutando boxe.
Por mais que eu já houvesse tentado, eu não conseguia me
desvencilhar do ringue. O prazer da vitória estava lá. As dores da derrota
também, e tão fisicamente! Todas essas emoções ajudavam a construir a
minha personalidade.
A superar todos os meus traumas.
Abri a porta do meu apartamento e tudo estava da mesma maneira,
quando parti. Ali, apenas eu havia mudado, ou melhor, o meu coração, que
havia ganhado nova forma e ritmo.
Angel estava nele, alimentando sentimentos nunca antes
direcionados a mulher alguma.
— Jason Collins?
Viro para trás e noto que deixei a porta aberta e, ao lado dela,
estava a minha vizinha.
— Bom dia, Kelly. — sorrio e, apesar das circunstâncias, estava
feliz por revê-la.
— Pensei que não fosse mais voltar. — ela diz, caminhando
lentamente na minha direção.
Quando me dou conta, noto que a ruiva está ainda de camisola. O
hobby de seda marfim por pouco camufla sobre a pele alva.
Ela adentra a minha sala com intimidade. Na verdade, toda a
intimidade que aquela mulher tinha por mim, eu havia permitido. Kelly
costumava ser a minha válvula de escape, a minha amiga, a minha amante.
— É só por algumas semanas. — informei, desfazendo o nó da
gravata.
— E aí, conseguiu salvar a empresa da falência? — ela pergunta, se
sentando sobre a mesa de jantar e cruzando as pernas de maneira sensual.
Desvio o olhar, retirando o sobretudo e as luvas de couro.
— Não... — sou reticente. Era difícil demais confessar uma derrota.
— Não? — ela insiste, dando um pequeno salto da mesa.
— Não. Isso eu não consegui mudar.
Desabotoo os punhos da camisa social e dobro as mangas até a
altura dos bíceps.
— Então, o que conseguiu mudar afinal de contas? — ela chega
bem perto, olhando em meus olhos, pretendendo desvendar os meus
segredos. — Você está estranho, Jason!
— Eu me apaixonei, Kelly. — digo, num rompante. — Eu estou
perdidamente apaixonado por uma mulher.
Kelly engole em seco, me encarando com espanto.
— Eu não acredito.
Jogo o corpo no sofá, debruçando os cotovelos nos joelhos.
— Também não faço questão que acredite. — não a fito nos olhos.
— Esse romance você não vai conseguir derrubar. Os meus sentimentos por
Angel já estão perfeitamente solidificados. Uma rocha!
Kelly bate palmas com deboche.
— Uau, Jason Collins apaixonado. — sorri, sarcasticamente. —
Pensei que não fosse me surpreender com mais nada!
— Sem deboche, Kelly.
Levanto do sofá e vou em direção à porta, quando sinto a ruiva
grudar o seu corpo ao meu.
Sua respiração em minha nuca, as mãos de unhas vermelhas em
meu tórax.
— Mas essa Angel está agora há alguns oceanos de distância, que
tal matarmos as saudades?
— Não existe oceano o suficiente que possa me afastar da presença
de Angel. Ela está aqui. — coloco a mão contra o peito, sentindo o perfume
de Angel, imaginando o seu sorriso, a sua voz, ela estava a todo o tempo nos
meus pensamentos. De fato, não existia distância.
— Você bebeu? — pergunta, sorrindo, enquanto me desvencilho de
seu corpo esguio.
— Para, Kelly! Para de diminuir os meus sentimentos! Você nunca
vai entender! — finalmente, a encaro. — E que se foda também, eu não te
devo satisfações. Agora, eu preciso descansar. — jogo o corpo sobre uma das
poltronas.
Além de cansado, estava enfrentando diversas atribulações, tudo
isso anulava qualquer fio de paciência.
— A luta em Liverpool será no próximo final de semana? — Kelly
se senta ao meu lado.
Debruço a cabeça no encosto do sofá
— Sim. — respondo friamente, com os olhos fechados.
— Boa sorte, então.
De repente, sinto um beijo roubado, na boca.
Abro os olhos, surpreso.
Kelly sai pela sala, deixando o hobby esvoaçar a cada passo dado
em direção à porta. E assim que ela sai, respiro mais aliviado.
Eu nunca havia negado simplesmente nada a Kelly.
Definitivamente, os meus sentimentos por Angel Parker estavam cada vez
mais reais.
Logo em seguida, tomei coragem para me desvencilhar do
aconchego do sofá, para deixar a mala no quarto e trocar a roupa.
Os shorts boxer já estava em meu corpo. O tórax livre. As mãos
perfeitamente encaixadas nas luvas de couro.
Fui em direção à sala de treino do meu apartamento.
Embora exausto da viagem, dos problemas que ainda teria que
encarar de frente, precisava treinar, socar aquele saco de pancadas,
simplesmente para me sentir vivo, resistente ao que eu ainda teria que
enfrentar pelos próximos dias.
Hoje, estava disposto a treinar até o anoitecer, sobretudo por ser um
grande risco lutar em um tatame que já havia ceifado a vida de alguns
colegas.
— Jason Collins deixou isso para você.
Encaro Estefani na porta de meu apartamento, com o post it colado
na ponta de seu dedo indicador. Retiro imediatamente o bilhete da posse de
minha amiga e leio atentamente o teor do pequeno papel. O meu coração
arritmava à medida em que os meus olhos interpretavam cada palavra de
Jason.
— Ele foi embora. — sussurro com os olhos perdidos.
O que eu temia realmente aconteceu.
— Jason foi embora para onde? Voltou para Londres? — Ester me
pergunta com as sobrancelhas franzidas. — Por favor, me conta o que está
acontecendo, Angel. — então, ela conclui com um olhar de estranhamento.
— Você está péssima.
Sorrio de lado, imaginando o tamanho de minhas olheiras e, então,
saio do apartamento, fechando a porta, em seguida.
— Eu vou te contar tudo, mas o que acha de bebermos um expresso
na cafeteria da esquina?
Ester assente com os olhos brilhantemente curiosos.
Caminhamos juntas pela calçada, enquanto sentia o meu estômago
revirar de fome. Já estava acostumada com os mimos que Jason trazia vez ou
outra para o nosso café-da-manhã, e natural que a essas alturas até o meu
organismo estranhasse a sua ausência.
Sorrio, observando Ester falar pelos cotovelos. Naquele momento,
eu simplesmente não ouvia nada do que saía por sua boca, apenas imaginava
que poderia ser perfeito Jason e eu juntos, mas, infelizmente, ainda não me
sentia à vontade para me imergir em um romance. Sim, era definitivamente
cruel o que eu estava fazendo com os meus sentimentos e com os sentimentos
de Jason Collins. Ignorar todos os suspiros apaixonados que o belo rapaz me
arrancava, sem ao menos se dar conta, era anular qualquer possibilidade de
ser realmente feliz dentro daqueles braços fortes.
No entanto, eu não poderia negar que a conversa que tivemos sobre
a fatídica noite da usina abandonada, retirou de dentro de mim parte dos
traumas, dos possíveis sentimentos que ainda poderia nutrir por Simon Kern.
Ele havia me traído, me enganado por diversas vezes, enquanto me dava as
suas desculpas esfarrapadas. Simon era depressivo, e eu, romântica e
dedicada, fazia de tudo para ajudá-lo, mas em troca recebi apenas chifres e
mentiras!
Assim que chegamos ao Café, Ester jogou a bolsa sobre a poltrona
acolchoada e se sentou cruzando os braços.
— Angel, você não está bem... tenho certeza de que não ouviu um
terço de minhas palavras enquanto vínhamos para cá.
Suspiro e me sento constrangida à frente de Estefani.
— Por favor, me desculpa, você não imagina a avalanche de
problemas, de decepções que me pegou nas últimas semanas.
Seguro o cardápio, passando os meus olhos sobre as pequenas
letras, e não consigo ler simplesmente nada.
— O que houve?
Respiro fundo e seguro nas mãos de minha amiga. Por mais que eu
relutasse falar sobre esses assuntos, era completamente necessário. Eu
precisava desabafar, quanto mais eu verbalizava todas as tristezas, mais eu
me sentia livre dos traumas de minha adolescência.
— Primeiro Jason me contou que, além de um empresário bem-
sucedido, ele luta boxe.
A minha amiga sorri de lado e eu percebo como os pensamentos
voam em sua cabecinha cheia de imaginação.
— Logo notei por aqueles braços contornados de músculos. —
Ester sorri assanhada, enquanto consegue retirar um meio sorriso de mim.
— Jason foi embora porque vai lutar, e assim pretende angariar
fundos para comprar a empresa do pai.
Estefani arregala os olhos.
— Nossa, tanto dinheiro assim?
O garçom se aproxima e pedimos dois cafés com panquecas de
mirtilo.
— Diz ele que precisa ganhar várias lutas, que o prêmio é muito
bom. Inclusive, pessoas de várias partes do mundo virão para a disputa.
Neste momento, sinto o meu coração atormentado, pulsando
instintivamente com saudades de Jason.
— Você pretende ir para a Inglaterra, torcer por ele? — Ester
pergunta cheia de intenções.
— Óbvio que não. — sou categórica. — A minha convivência com
Jason Collins já passou dos limites!
E no mesmo momento eu me odeio por ser dessa maneira, por ainda
não conseguir assumir, para mim mesma, a paixão avassaladora que
preenchia todas as artérias de meu coração.
— Angel, você está apaixonada. — Ester me encara por cima dos
óculos, enquanto engulo em seco. — Não adianta negar a si mesma. Eu só
não entendo por que você não cede a todos esses sentimentos! — os seus
olhos estão revoltados. — Jason também é louco por você! Sortuda!
Finalmente, consigo sorrir.
Talvez eu realmente fosse uma menina de sorte, precisava apenas
acatar essa condição e deixar o meu coração livre para receber todo o amor de
Jason Collins.
No entanto, as inseguranças ainda falavam por mim.
— Eu não posso me envolver em relacionamentos. — bebo um
pouco do café, já em nossa mesa. — Não me trazem segurança. Veja bem,
Ester! — ela me encara assustada ao ouvir a minha voz esganiçada. — Onde
Jason está agora? Foi embora! E se estivéssemos namorando? Eu iria ficar
aqui com cara de otária, com um simples post it na mão?
Estefani revira os olhos enquanto termina de mastigar a sua
panqueca.
— Então, você não tem pretensão alguma de namorar Jason? — as
sobrancelhas tortas em estranhamento.
— Não... como você sabe, — gaguejo. — sempre fui resistente a
romances, por causa de um ex-namorado que tive... ele faleceu. — então,
engulo em seco, antes de me corrigir. — Na verdade, ele cometeu suicídio.
— Ester está com os olhos estupefatos. — Isso foi em Nova York, na época
da escola... e você nem imagina quem estava nessa tal usina, nesta noite,
junto ao meu ex-namorado Simon.
— Quem? — pergunta, cuspindo farelos de panqueca.
— Jason Collins!
Estefani leva as mãos à boca, ao mesmo tempo em que sacode a
cabeça, incrédula.
Calada, ela tentava unir os fatos, encaixar o quebra-cabeça, mas
caberia a mim, desabafar com ela todos os últimos acontecimentos.
A minha amiga escuta atentamente às minhas tragédias
sentimentais. E então percebo que já estou mais forte para falar sobre Simon,
a traição, o suicídio, o que sofri na época. Quando conto sobre Jason, que ele
ainda teve a intenção de esticar a mão para Simon e salvá-lo, o meu coração
se enche de paixão, a respiração é mais lenta e profunda.
Como eu não havia percebido antes.
Ele era o homem da minha vida.
— Então, quando Jason foi depor sobre a surra que deu em
Leonard, o delegado acabou falando que este era o segundo caso de violência
no qual Jason estava envolvido. — concluo, observando Ester imóvel à
minha frente.
— Uau, realmente não sei como você conseguiu suportar revelação
tão terrível, — Ester confessa, arregalando ainda mais os olhos. — mas o que
acalenta é que Jason ainda teve a intenção de salvar Simon! Jason não teve
culpa, Angel! Foi inocentado. — concordo com minha amiga, os meus olhos
perdidos. Realmente havia sido injusta com Jason. — E eu também não sabia
que Leonard havia te estuprado. — vejo uma lágrima prestes a descer pelo
rosto de Estefani. — Sempre quando ia hospital, ele me contava uma história
tosca sobre uns caras que o assaltaram e bateram em seu rosto, inclusive não
cheguei a perceber qualquer fio de arrependimento em seus olhos.
Soco a mesa, indignada, chamando a atenção de alguns clientes.
— Um monstro! É o que ele é, Estefani!
Coloquei a última fatia de panqueca na boca, quando sou
surpreendida pela voz estridente de minha amiga.
— Não acredito, olha!
Assim que viro o rosto para trás, em direção à porta, dou de cara
com Leonard e May.
Juntos, sorrindo.
Os meus olhos ardem de raiva ao fitar aquela cena nauseante.
A panqueca está seca em minha boca, sinto dificuldades para
engoli-la.
— Leonard! — Estefani se adianta, levantando da cadeira, indo em
direção aos dois.
— Cuidado, Ester. — falo alto, propositalmente. — Ele é um
covarde. Pode te machucar.
Leonard e May param juntos, no meio da cafeteria.
O canalha cruza os braços e nos encara com o olhar mais cínico que
ainda é capaz de esboçar.
— Vocês duas, o que querem?
Estefani cerra os punhos e olha dentro dos olhos do boçal. Estava
apreensiva com o que ela estava prestes a dizer, e também com a possível
reação de Leonard.
— Você é uma decepção, Leonard! Jamais poderia imaginar atitude
tão baixa vinda de você. Agora noto que a maneira como se portava na
empresa, era apenas para disfarçar esse seu lado inescrupuloso, cruel. — o
olhar altivo de Leonard me enoja. Quero matá-lo! — Enganou a todas nós, se
fez de amigo, parecia ser um homem de caráter, mas na verdade é uma das
almas mais podres que eu já tive o desprazer de conhecer. — o rosto de Ester
está vermelho. A raiva materializada em sua voz. — E você, May, nunca
ouviu falar em empatia? O que está fazendo ao lado desse canalha, depois de
tudo o que ele fez com os negócios de Sr. Victor, com a nossa amiga Angel,
principalmente?
— Nossa, você está nervosa, Ester. Calma... — May se resume a
deboches, enquanto Leonard bufa, revirando os olhos. — olha só, — então,
ela estica a mão em nossa direção. — somos namorados!
O anel prateado de compromisso reluz nos nossos olhos.
Não poderia imaginar cena mais patética.
— O “bom-partido” que sempre sonhou conquistar é bem diferente
dessa coisa! — Estefani implica, enquanto me detenho a entreabrir os lábios,
incrédula com a ambição desmedida de May.
— Ester, não fique com ciúmes. — Leonard debocha. — Depois
que eu me livrar de todas as acusações bestas, eu vou morar com a minha
namorada, bem longe daqui. Vocês ainda vão ouvir falar da nossa felicidade.
Sorrio, sem conseguir me conter.
Era um asno completo.
— Tome cuidado, May. — finalmente, resolvo falar. — O futuro de
Leonard é atrás das grades e eu já imagino você, nessa pompa toda, indo
visitá-lo num presídio, bem longe daqui. — a loira arregala os olhos afetada
por minhas palavras e isso me conforta. — Faça uso da inteligência pelo
menos uma vez na vida.
Viramos as costas e saímos em direção a calçada, deixando os dois
imbecis plantados no meio da cafeteria.
Era extremamente desagradável dividir qualquer tipo de espaço
com um deles.
May e Leonard eram frios, interesseiros, soberbos e faziam
qualquer baixaria por dinheiro, coincidência ou não, eram par-perfeito um
para o outro.
Caminhava apressado pelo asfalto de Liverpool, após sair do trem
que partira essa madrugada de Londres. A mochila nas costas. A chuva fina
que insistia em cair desde os últimos dias. O capuz do casaco de moletom
preto cobria parte do meu rosto, ajudando a me livrar dos pingos recorrentes.
Finalmente, havia chegado o grande dia.
Estava empolgado, um pouco apreensivo e extremamente ansioso.
Era um misto de sensações que eu sentia, até chegar no ringue. Lá, a
adrenalina do momento me daria toda a segurança indispensável para vencer
as lutas.
Cheguei perto do galpão que ficava nos fundos de um ferro velho.
Ainda do lado de fora, já ouvi o grito da torcida, a música alta e envolvente.
Apesar do frio, as minhas mãos suavam.
Subi a escada-caracol de ferro e, quando entrei pela porta, encontrei
Harry, meu amigo e organizador do evento.
— Não acreditei quando li o seu nome, meu caro. Pensei que não
viesse!
Espalmamos nossas mãos e nos abraçamos.
Estava feliz por rever aquele cara. Éramos amigos também fora do
ringue. Harry não lutava, era apenas mais um patrocinador e apostador nato.
Ele fazia o contato com os lutadores de outros países, organizava o espaço e,
inevitavelmente, respondia a alguns processos. Esse tipo de luta era proibido
no país, mas era o único jeito dos amantes de luta livre, que não eram
profissionais, se encontrarem, usufruir de seus poucos segundos de fama e
ainda levar um bom dinheiro para casa, caso vencesse o seu adversário.
— Você já me viu desistir em algum momento? — perguntei,
enquanto retirava a mochila das costas.
Harry fez uma negativa com a cabeça.
— Vá se trocar, Jason Collins. Você é o terceiro a entrar no ringue.
— informa com um sorriso empolgado.
— Quem vai ser o meu adversário? — jogo a mochila no chão.
Harry cruza os braços cheios de tatuagens e me encara nos olhos.
— Aslan Tabor.
Sorrio de lado.
Eu não estava intimidado.
— Aquele turco maldito? — pergunto, retirando o casaco, a camisa.
— O próprio. Eu te avisei que hoje não seria fácil.
Dou pequenos pulos, aquecendo os músculos. Harry me encara
desconfiado. Talvez não acreditasse na minha vitória.
Apesar de eu não ter lutado com Aslan Tabor, eu sabia que o turco
já havia me prejudicado em algumas lutas. Uma delas, foi no ano passado.
Enfrentei um cara de Londres que usou drogas, fez uso de dopagem
bioquímica, por indicação do Aslan. Embora as nossas lutas não tenham
regras, esse tipo de atitude ultrapassa a honestidade, que no mínimo deve ser
considerada ao lidar com os nossos adversários.
Obviamente, eu perdi.
Mas o maldito Tabor ganhou a sua aposta.
Após ser descoberta a dopagem, o britânico nunca mais foi
convidado para participar das lutas organizadas por Harry.
Mas o que eu não entendia era por que o meu amigo ainda insistia
em convidar esse tal de Aslan!
Vou para o vestiário, já sentindo a ansiedade consumir cem por
cento de minhas células, visto os shorts boxer, enrolo a faixa nas mãos e
coloco as luvas.
Estava me sentindo pronto.
Havia treinado o suficiente, nos últimos dias.
E, assim que saio do vestiário, devidamente vestido para o ringue,
Harry me adverte.
— Nada de luvas, por hoje, Jason!
Concordo, sentindo o meu coração bater mais forte. Retiro as luvas,
guardando-as no armário.
Hoje, não seria realmente fácil, mas, apesar de tudo, eu estava
confiante, afinal existiam motivos o suficiente para me dar toda a
concentração e força necessárias.
Então, o que me restava era esperar pela minha hora. Tão logo
sento-me em um banco de cimento, fecho os olhos e Angel está em meus
pensamentos. Eu estava ali por ela, pelo nosso futuro juntos, na Collins
Construtora, e principalmente fora dela.
Assim que anunciam o próximo embate, saio do meu momento de
concentração, alongo as pernas e os braços, enquanto algumas meninas
passam produto em meu corpo. Recebo o protetor para os dentes e então
Harry sussurra em meu ouvido:
— O turco está enfezado hoje, está a fim de ficar milionário. Vai lá
e coloca esse ogro para beijar o chão.
Recebo o toque em minhas costas, para que eu siga para o ringue.
As pessoas aplaudem, gritam, mas o nome de Aslan Tabor se sobrepõe.
Ainda assim, não esmoreço, toda a pressão psicológica era
necessária para me dar mais força, e também a certeza da vitória.
As luzes piscam e Aslan adentra o ringue como um touro. Ele exibe
os músculos em movimentos toscos com os braços. Agora, ele está careca e
usa um cavanhaque ridículo, bem diferente da última vez em que eu o vi. Sua
feiura é assustadora, inclusive parece que saiu de algum filme medieval.
Continuo firme, o meu olhar penetra nos olhos raivosos de Aslan.
Parecia um pitbull prestes a devorar todas as minhas carnes.
Assim que ficamos frente a frente, percebo que ele é apenas alguns
centímetros mais alto do que eu.
Mas eu treinei.
Eu era perspicaz.
Naquele caso, não era questão de força, mas de inteligência,
reflexo.
O sino toca, de repente.
A luta começa.
Aslan tenciona os músculos dos braços em uns movimentos de fúria
e exibicionismo e, em meio ao seu show patético, ele solta um grito.
Mas todo o seu teatro não me desestabiliza.
Sério, o encaro de volta, os punhos em riste.
Aslan olha bem no fundo dos meus olhos, as pernas levemente
flexionadas e um soco é desferido na minha direção.
Desvio.
E isso o enerva.
Durante alguns segundos continuamos nos encarando com os
punhos erguidos. Sinto o suor descer entre os músculos do meu peito, a
adrenalina tomava conta da minha pele e de todos os meus sentidos.
Esperando pela ocasião perfeita, lanço um soco no rosto de Aslan.
Ele vira com o impacto que recebe. Não recuo. Lanço mais outro soco em sua
nuca. Dou uma chave em seu pescoço, mas o turco é forte e consegue me
levantar em suas costas.
Permaneço dando socos em sua cabeça.
O braço ainda em volta de seu pescoço.
O sangue começa a descer da têmpora do meu adversário, mas
ainda não consigo me desvencilhar de seu corpo.
Aslan gira os braços, o que interfere no meu equilíbrio, então ele
consegue me jogar sobre o tatame. O meu corpo quica com o impacto. Tento
me levantar, mas em questão de segundos um soco alcança o meu rosto.
Dois, três, quatro socos.
E ainda mais duas lutas pela frente.
A Collins. Eu preciso comprar a Collins.
Num impulso, rolo no chão e consigo me levantar, alçando um
chute no rosto de Aslan. O brutamontes se desestabiliza e o seu corpo
cambaleia até encostar nas cordas. E o maldito faz isso de impulso e, numa
fração de segundos, cai sobre mim.
Permaneço com socos em seu rosto, sentindo todo os seus quilos
sobre cada parte do meu corpo.
Aslan Tabor baba e respira ofegante, recebendo os meus golpes.
Todo o seu peso o destrói em segundos.
Consigo retirá-lo de cima de mim e rolá-lo para o lado contrário.
Um soco alcança o meu rosto assim que me coloco em cima de meu
adversário. Concentro-me apenas nos socos, na força de meus braços. Dois
golpes em seu rosto, três, meia dúzia deles.
O homem apaga.
Respiro ofegante, sentindo o rosto e cabelos encharcados de suor.
Algum ponto de meu rosto sangra e todos os meus ossos doem.
Harry vem até mim, com um sorriso orgulhoso e, então, levanta o
meu braço.
— Temos um vencedor! Jason Collins!
Não consigo sorrir, enquanto recebo os aplausos. O meu corpo está
anestesiado, mas por dentro estou contaminado de alegria.
Estava a dois passos da vitória.

***

Estou sentado no banco de cimento ao lado de outros lutadores.


Tenho uma toalha nas costas e os pensamentos todos em Angel Parker.
Desejava verdadeiramente que ela estivesse aqui comigo, me dando todo o
seu apoio e as suas palavras de incentivo, mas, pelo pouco que percebi, a
garota sentia insegurança por eu lutar, ela achava isso um risco.
Irônico!
A moça que vivia em função dos riscos, completamente destemida
e corajosa, se preocupava dessa maneira comigo! E, mesmo assim, ainda
vivia negando os seus sentimentos por mim.
Se toda a preocupação de Angel não fosse amor, eu não pertencia
mais a este mundo.
Ela me amava da mesma maneira que eu a amava.
De um jeito despretensioso. Não sentíamos medo de perder um ao
outro, justamente por que o destino já provou, diversas vezes, que está pronto
para unir nós dois em qualquer momento de nossas vidas.
— Você foi bem, Jason. — de repente me surpreendo com uma
garota se sentando em meu colo.
Os shorts colado ao quadril, o top que deixava todo o resto de seu
corpo nu.
Apenas enrugo as sobrancelhas em estranhamento.
— Por favor. — profiro, entredentes, retirando a menina do meu
colo, apenas com uma mão.
— Hummm... — ela geme, se sentando ao meu lado. — Um cara
difícil. Diferente de todos aqui. — sem me dar conta, a morena sibila em meu
ouvido. — Deliciosa tentação.
A minha pele arrepia e eu me odeio por isso. Viro o rosto para o
lado e a garota sustenta um sorriso pretensioso nos lábios, inspecionando
cautelosamente todos os meus poros arrepiados.
— Seus instintos te traíram. — conclui com a voz adocicada.
— Eu estou aqui para lutar, garota. Olha só quantos caras loucos
por você! — aumento o tom de voz, sem me dar conta. — Me deixa quieto,
por favor!
Então, a morena se ajeita ao meu lado, leva uma das mãos até
minha coxa e desliza as unhas sobre minha pele, ignorando, dessa maneira,
toda a minha falta de paciência.
— Você é o mais lindo de todos, parece um modelo.
Expiro incomodado.
— Você me quer na sua cama? Não perca o seu tempo! — a garota
arregala os olhos. — Eu tenho namorada.
O meu coração aperta dolorosamente, no mesmo instante.
Eu desejava loucamente que Angel Parker fosse de fato a minha
namorada, que eu não precisasse mentir a essas alturas.
— Para que cama, se eu tenho um lugarzinho ali fora ideal para a
nossa transa? — e pisca o olho.
— Chega.
Sou ríspido e saio de perto da garota, disfarçando o pau duro com a
toalha.
Inferno!
Por que os meus instintos explodiam nessas situações!
Eu amava Angel, amava!
Eu não queria foder ninguém, a não ser ela.
E apenas com ela, fazer amor.
Evito cruzar com aquela morena novamente, me infiltrando em um
aglomerado de pessoas.
— Jason Collins! — Harry anuncia, ao microfone, de repente.
Expiro devagar, antes de subir no ringue.
Assim que passo por debaixo das cordas, noto que o meu adversário
já está a postos.
Sorrio contido quando encontro mais um rosto familiar. O japonês
reconhecido como o fodão das artes marciais.
Os meus olhos brilham ansiosos.
Estava disposto a fazer história nesse ringue!
As construções passam pelos meus olhos na mesma velocidade do
carro. O Big Ben, majestoso, recebe tons alaranjados por conta do sol tímido
que vez ou outra surge por detrás das nuvens.
O frio de Londres me pegou de surpresa. Esfrego uma mão a outra,
ao mesmo tempo em que sinto a ansiedade tomar conta de todo o meu corpo.
Temia o resultado das lutas de Jason, ao mesmo tempo em que não
imaginava qual poderia ser a sua reação ao me ver.
Antes de deixar os Estados Unidos, havia entrado em contato com o
tal do Harry, mas ele não estava na loja. A sua esposa me atendeu, ela foi
extremamente simpática e solícita, disse que sentia muita consideração por
Jason e então, após eu me identificar e contar a ela parte da nossa história,
July me passou o endereço completo do prédio onde o belo rapaz morava.
Não titubeei e comprei as passagens para a semana seguinte,
coincidentemente para o final de semana das lutas de Jason.
A minha conversa com Estefani, na última vez que nos
encontramos, foi extremamente válida. Minha amiga me deu muitos
conselhos, além de me fazer sentir melhor, apenas por eu poder desabafar os
meus sentimentos, verbalizar o que me incomodava e me freava a viver junto
a Jason Collins.
E, agora, já não incomodava mais tanto assim.
Os traumas do passado deixaram de ser traumas para se tornarem
meras lembranças tristes.
Os traumas haviam dado lugar ao amor.
E eu estava feliz com essa condição, com o coração mais leve e
cheio de esperanças.
— Chegamos.
O motorista do táxi informou assim que estacionamos próximos a
um prédio residencial contornado por tijolinhos charmosos. As janelas eram
brancas e as árvores sem folhas davam um encanto a mais àquela rua com um
ar cinematográfico.
Agradeci e saí do carro, ajeitando o sobretudo marrom no corpo. A
tarde estava fria, apesar do mormaço, então tratei logo de me aconchegar no
hall do prédio.
Levei a pequena mala e me coloquei estrategicamente em frente ao
elevador, enquanto digitava ansiosa em minha agenda eletrônica, em busca
do número do andar e do apartamento de Jason.
Quando, sem esperar, a porta do elevador se abre e, de dentro dele,
sai uma ruiva exótica, muito bonita e elegante.
Ela me encara curiosa.
— Boa tarde!
Devolvo o sorriso.
— Boa tarde, por acaso conhece Jason Collins? — não perco
tempo. — Eu anotei o número do apartamento dele em algum lugar...
— Jason é o meu vizinho — ela me interrompe. — e pelo o seu
sotaque você deve ser a Angel.
Arqueei as sobrancelhas em surpresa, com a perspicácia da ruiva.
— Uau, ele já falou de mim para você?
Não podia negar que estava me sentindo vaidosa, naquele
momento.
— Sim... — ela saiu do elevador e parou à minha frente com os
braços cruzados. — nós somos amigos e ele, por um acaso, acabou me
confessando parte dos seus sentimentos. — Amigos? Mantenho o sorriso
congelado na boca. Então, a moça olha em meus olhos e frisa com a voz
tranquila. — Garota, Jason é um cara muito especial. Carinhoso, protetor,
sofre nas mãos do pai até hoje... Ele merece todo o amor do mundo. — então,
ela conclui levando a mão ao meu ombro. — Cuide dele, tá.
— É... — fico sem palavras.
Sem chão, na verdade.
— Olha, Jason está em um compromisso. Essa é a chave do seu
apartamento, número 501.
A moça se adianta a pegar um molho em sua bolsa MK.
Imediatamente, retira uma chave dourada do seu molho e me entrega.
É, realmente eles eram íntimos e eu nem queria imaginar o nível de
intimidade!
— Toma, essa chave é sua agora. — ela pega a minha mão e
deposita a chave dentro dela, fechando os meus dedos, em seguida. — Faça
uma surpresa para Jason. Ele vai gostar.
Sorrio amarelo.
— Obrigada.
A moça pisca o olho verde para mim e sai com um semblante leve,
em direção à saída.
Fico feito estátua, ainda assimilando todas as novidades que me
pegaram de surpresa.
Novidades boas, pelo menos!
Assim que saí do elevador, caminhei receosa até o número indicado
pela moça ruiva.
Caramba, nem ao menos havia perguntado o nome dela.
Abri a porta e os meus olhos encontraram uma sala bonita, estilosa.
Incrível como tudo ali, cada detalhezinho, me remetia a Jason Collins.
Aquele era exatamente o seu estilo: moderno, discreto.
Fecho a porta e coloco a mala no chão. O silêncio do apartamento
de Jason me causa desconforto, parecia que eu estava invadindo a sua
intimidade sem a sua permissão, e acabo me sentindo constrangida por isso.
Mas, não o suficiente para me intimidar. Exploro a sala elegante,
caminhando pelo tapete felpudo, sem conseguir represar a curiosidade. Vou
até o raque e me surpreendo com um majestoso porta-retrato. Nele, havia
uma foto de Jason junto a uma jovem senhora de cabelos pretos. Ela
aparentava ser bastante requintada e sorria orgulhosa do filho que segurava
uma placa prateada, nas mãos. Observo mais de perto e noto que era algum
tipo de premiação pelo sucesso de suas empresas.
Jason Collins era realmente um homem bem-sucedido, realizado,
próspero e, agora, cabia apenas a mim dá-lo a satisfação plena de seus
desejos, fazer com que ele seja feliz também no amor.
Com um sorriso bobo na boca, vou até o corredor, os olhos ainda
curiosos. Abro uma das portas e deparo com uma sala de treino. O saco de
pancadas vermelho depreende-se do alto do teto. Um tatame ocupa parte do
chão. Há uma esteira e um armário com alteres.
Ali, eu não sentia apenas o cheiro selvagem de Jason, mas, também,
a sua presença.
Aquele belo rapaz sustentava dentro de si, um sonho frustrado.
Tornar-se lutador profissional de boxe. Caminho pelo tatame e imagino que,
mais uma vez, Victor Collins impediu a sua completa felicidade, afinal de
contas ter um sonho interrompido no meio do caminho é algo extremamente
doloroso, são os sonhos que nos movem em busca de novas perspectivas.
Analiso o saco de pancadas e me sinto reconfortada. Jason, neste momento,
lutava, realizava do seu jeito torto, o seu sonho de menino e, a partir dali,
realizaria outra grande aspiração, a compra da Collins Construtora.
As lutas iriam trazer não só a vitória, mas a empresa para as suas
mãos.
Abro a outra porta, que ficava ao lado oposto da sala de treino.
— O quarto de Jason... — sussurro, passando as pontas dos dedos
pelos lençóis egípcios, imaginando que aquela ruiva já deveria ter se
deleitado muitas vezes nesta cama king size, junto àquele corpo king
escultural.
Imediatamente, trato logo de parar de imaginar tais coisas e seguro
um travesseio nas mãos.
Inspiro o perfume amadeirado de Jason.
Céus, eu estava completamente louca por este homem.
Rendida a tudo o que ele significava, no momento, para mim.
Jogo o corpo sobre a cama, deixando os meus cabelos se
espalharem por toda a extensão do lençol branco. Fecho os olhos e mentalizo
energias boas para Jason, naquele tatame.
Feliz e vitorioso, era como eu desejava encontrá-lo mais tarde.
Kimura Sakai era um jovem lutador de apenas dezoito anos. Eu já
havia ouvido falar dele, nos encontros com os meus amigos de ringue, nas
festas que participávamos para comemorar as vitórias, sempre muito regadas
a bebidas e mulheres. Mas, agora, por eu estar em um outro momento,
pretenderia, após essa luta, ir diretamente para o meu apartamento, comunicar
o meu pai da compra da Collins.
O rapaz está de calça preta, ele faz uns movimentos com os braços,
enquanto encara atentamente o meu rosto. Parecia que Kimura desejava
prever os meus golpes, enquanto eu me detinha apenas a ameaçá-lo com os
meus punhos cerrados.
O moleque vem na minha direção e me lança um chute no tórax,
fazendo com que eu desabe diretamente no tatame. Caído, observo o rapaz
caminhando despretensiosamente para perto, talvez já cantando vitória, mas
engato uma tesoura em suas pernas e o derrubo apenas com o movimento dos
meus pés. Ele cai e, assim que me aproximo, o garoto desfere um soco em
minha testa, sinto o corte se abrir na pele, o sangue descer até minha
sobrancelha, imediatamente retribuo com força o soco e apenas com um
golpe, o rapaz apaga.
— Jason Collins! — nem me dou conta e Harry ergue o meu braço,
anunciando a vitória. — Seria ele o novo campeão de nosso duelo triplo?
— Duvido!
Ouvimos de repente, um grito na plateia.
— Ele não vai passar pelo Andrew Lenshing! — outro completa.
— Quem é esse, Harry? — perguntei, ao mesmo tempo em que
descia do ringue, sem esmorecer diante da torcida adversária.
— Ele é da Escócia. Um dos melhores da região.
Calo-me por segundos, sentindo a força e a determinação tomar
conta de cada parte dos meus músculos. E assim que os irmãos de Kimura
abordam Harry, afasto-me para o outro lado.
Uma garota me entrega uma garrafa d’água. Agradeço, pego de sua
mão e engulo todo o líquido, jogando um pouco da bebida sobre a nuca e
peitoral.
— Você quer me enlouquecer assim?
A morena surge do nada.
Que inferno!
— Não, eu não quero te enlouquecer. — sou ríspido.
A garota sorri, mordendo o lábio inferior e sai de perto de mim,
deixando um amasso atrevido na minha bunda.
Expiro com raiva, observando o rebolado da mulher.
— Tentação maldita!

***
Já estava preparado para o último e terceiro round. Alonguei os
braços e estalei o meu pescoço, olhando com gana nos olhos azuis daquele
maldito escocês. Sua fama não iria me intimidar, muito menos o seu histórico
nos rankings, afinal, ele havia sido derrotado apenas uma vez.
Harry havia me colocado a par de tudo, sem conseguir esconder a
sua preferência pelo meu adversário, inclusive o meu amigo inferiu que eu
não precisava de mais libras, segundo ele, os valores que angariei nas duas
últimas lutas já eram o suficiente, e ainda citou o meu cargo de CEO! No
entanto, ele não sabia dos meus sonhos, dos meus planos, então não deveria
deduzir porra nenhuma, no fim das contas.
Tínhamos excelentes patrocinadores. Eu era um deles, com todas as
minhas empresas, além de empresários do ramo do esporte, donos de cassino,
apostadores viciados. Rolava muita grana, para os lutadores e também para
quem apostava corretamente.
O sino toca, a torcida está em polvorosa com o seu lutador preferido
a postos, e o tal do Andrew Lenshing não embroma, me acerta o primeiro
soco. Tento reagir, mas ele golpeia certeiramente o meu estômago. Ignorando
a dor, desfiro um soco em seu rosto, mas, ágil, ele segura em meu pulso. O pé
alcança a minha costela, outro soco em meu rosto e eu caio.
As luzes sobre os meus olhos piscam incessantemente, ao mesmo
tempo em que uma dor aguda e insuportável envolve todos os meus órgãos.
Mais um soco.
Outro soco.
Perder não estava nos meus planos.
Outro chute no meu rosto.
A escuridão à minha frente.
Já era mais de meia noite e eu estava debruçada sobre a cama, já de
banho tomado, em meu pijama de veludo, ligando insistentemente para o
celular de Jason Collins.
Mas ele não me atendia.
Sentia uma agonia profunda, não queria imaginar o pior, mas os
pensamentos malditos tratavam logo de me trair.
Será que Jason está bem?
Está... vivo?
Soco um dos travesseiros, imaginando que ele poderia ter optado
em vender um dos seus negócios, aqui na Europa! Ou simplesmente desejava
que o egoísmo de Sr. Victor não fosse tão cruel, o velho poderia
perfeitamente dividir os seus negócios com Jason, pelo menos, mas
gananciosamente o eximiu de todos os direitos.
— Se acontecer alguma coisa grave com Jason, Victor Collins será
o culpado! — esbravejo, com o celular tremendo entre os dedos.
Ligo, mais uma vez, inutilmente. O telefone apenas cai na Caixa
Postal. A essas alturas, eu já deveria ter ligado o suficiente para ter acabado
com a sua bateria.
Por que eu deixei Jason vir disputar essa luta?
No final das contas, eu também estava me sentindo culpada, afinal,
eu não o impedi. Eu o deixei se despedir de mim, com um beijo quente em
meu dorso, e sair do meu apartamento, com todas as intenções de vir para
Londres.
Eu disse que eu não queria vê-lo mais.
Minha mãe sempre diz que palavra tem poder. E ela tem razão. Eu
corro o risco de nunca mais ver Jason Collins.
Deito o rosto sobre o travesseiro e me sinto preenchida por agonia.
O que eu poderia fazer no momento? Onde ficava esse maldito ringue! Eu
estava de mãos atadas apenas esperando pelo pior.
Por fim, decido ligar para a loja de camisas de seu amigo Harry.
Merda!
Também não atendem.
Levanto-me da cama, sem me importar com o horário, e vou
imediatamente até a porta da tal ruiva. Ela poderia me dar alguma luz.
Angustiada e de braços cruzados é que eu não poderia ficar!
Toco a campainha uma vez, aguardo alguns segundos para a porta
se abrir.
A mulher pálida, como uma clara em neve, me encara com os olhos
inchados de sono.
— Aconteceu alguma coisa com o Jason? — pergunta, preocupada.
— Não sei... eu estou desesperada! — a voz é rouca de choro. — Já
é de madrugada e até agora não tenho notícias.
— Calma, Angel. — ela ainda consegue sorrir! — Liverpool é
distante. Jason já deve estar no trem a caminho, sem contar que eles
costumam tratar dos ferimentos antes de voltar para casa.
— Deus do céu. — levo as mãos à boca, havia me esquecido desse
maldito detalhe.
— Pois é, namorar Jason Collins é viver com emoção. — cruza os
braços, recostando ao batente.
— Você já namorou ele? — a pergunta sai como um espirro.
As minhas bochechas queimam ruborizadas, mas, ainda assim,
anseio por uma resposta.
— Eu? Imagina! — sorri e revira os olhos. — Jason nunca foi de se
apaixonar por ninguém, realmente você deve ser especial.
Abaixo a cabeça afetada por palavras tão significativas, as minhas
pernas ainda tremiam por conta de todas as emoções que me arrebatavam,
então apenas agradeço e saio quieta em direção à porta de Jason.
Assim que me encontro novamente sozinha, naquele apartamento,
entendo que não tenho mais saída, apenas faço orações para que ele chegue
bem, para que Jason Collins volte a me presentear com o seu belo sorriso de
covinhas tentadoras.

***

— Angel...
Custo a me situar onde eu estava, que horas eram, enfim, o que
havia acontecido para que a minha cabeça doesse de maneira tão severa!
Apenas abro lentamente os olhos, quando, surpreendentemente, me sinto
acolhida no meio dos braços de Jason.
O seu rosto tem marcas por todos os lados. Levo as mãos aos seus
cabelos, sentindo as lágrimas rolarem por minha face.
— Você... voltou... — balbucio, sentindo um misto de emoções.
Estava feliz por vê-lo, mas com medo do que ele teria para me falar.
Abraço o moreno, sentindo um alívio enlouquecedor. Ele estava
cheiroso, banho tomado e num lindo pijama preto.
— Você também voltou para mim, garota... — sussurra em meu
ouvido, abrandando todas as inseguranças que eu estava sentindo para
reencontrá-lo.
— Eu sempre fui sua. — balbuciei em seus lábios, ansiosa para
sentir o sabor de sua boca. — Me perdoe, naquela tarde. Eu não sabia o que
estava dizendo, enfim, me arrependi amargamente por ter falado que eu não
queria te ver mais.
Apesar das cicatrizes, Jason é mais lindo que um dia ensolarado de
Outono.
— Eu fiquei magoado, Angel, verdadeiramente magoado, — a sua
voz é séria. — mas tive maturidade o bastante para entender pelo o que
estava passando, naquele momento, afinal, você tinha acabado de receber
tantas revelações cruéis e nada mais óbvio do que se sentir encurralada por
decepções, querendo se isolar do mundo, — então, ele me encara. — mas o
que me confortou foi que eu vi no seu olhar, Angel, que você não dizia
aquelas palavras amargas do fundo do seu coração.
Jason sorri torto, mas ainda havia um ar pesaroso em seus olhos
negros.
Ajeito o corpo entre os travesseiros e seguro nas mãos de Jason. Os
nós de seus dedos estavam feridos.
— Você estava certo, Jason. Eu não usei de sentimentos para pedir
que se afastasse da minha vida. Eu fui cruel, sem querer ser...
Em resposta, Jason segura em minha nuca e cola o meu rosto ao seu
corpo. Pude sentir os batimentos de seu coração.
— Eu já me senti assim, Angel, encurralado por decepções. —
fecho os olhos, concentrando em sua voz, no perfume de sua roupa. —
Quando tudo passa é que percebemos que ainda somos fortes o bastante para
superar e voltar a acreditar na vida. No nosso caso, no amor.
Afastei o meu rosto do corpo de Jason e concordei com as suas
palavras.
Então, beijei com cuidado a sua boca sensual, sentindo o sabor
mentalado de sua língua.
— Como você entrou aqui? Foi a Kelly? — Jason perguntou, assim
que desgrudamos nossos lábios.
— A ruiva? Sim, foi ela. — sorri contida. — Ela me disse palavras
muito bonitas a seu respeito, a respeito de seus sentimentos...
Jason sorriu torto, e eu daria um braço para saber o que se passava
em seus pensamentos.
Então, interrompo-o curiosa.
— E a luta, me conta!
Jason me analisa por segundos, antes de se ajeitar ao meu lado na
cama. Ele cobre o corpo com o edredom e se vira na minha direção, mesmo
assim, ainda não consigo decifrar se o seu semblante era de vitória ou de
derrota.
— Foi muito difícil, Angel. Na verdade, mais difícil do que eu
imaginei. — sinto os seus dedos acariciarem os meus cabelos. — Primeiro,
eu lutei com um turco, o cara era um monstro, extremamente forte, mas foi
exatamente isso o que o prejudicou. Ele não tinha tanta destreza, agilidade e
eu venci, angariando nessa luta quinhentas mil libras.
— Deus do céu. — sorrio incrédula — Mas esse valor já é o
suficiente para comprar a empresa?
— Não. O meu pai quer três milhões de dólares.
Mordo os lábios, apreensiva, ansiando para que Jason contasse logo
de uma vez o que aconteceu naquele ringue!
— E as outras lutas?
— A segunda foi ridícula. — Jason sorri e as covinhas tentadoras
estão lá. — Um japonês de dezoito anos! Apesar de suas altas habilidades
com artes marciais, em poucos minutos ele caiu no tatame.
— Coitado. — digo, sem querer.
— Coitado? Olha o que ele fez na minha testa!
Havia um corte gigante e meia dúzia de pontos. O meu coração
aperta.
— Ainda bem que você venceu esse moleque. — concluo, fazendo
um carinho na barba de Jason.
O moreno sorri e deixa um beijo no alto da minha cabeça.
— E a terceira luta? — temia perguntar.
— Foi extremamente difícil, Angel. — a voz de Jason é crua. —
Um escocês. Ele tem uma fama imensa nos ringues e apesar de eu não me
intimidar, Andrew Lenshing conseguiu me derrubar de primeira, foram
muitos socos e, então, eu desmaiei.
— Meu Deus!
Ajeito o corpo na cama e me levanto, caminhando atordoada pelo
quarto. Com a mão na boca, imagino que o mal-estar que senti, era um mau
presságio do que Jason estava passando, naquele momento, no ringue.
— Angel, senta aqui, vai. O pior já passou. — me pede daquele
jeito dele.
Sexy.
Rendida, jogo o corpo nos braços de Jason.
— O que aconteceu, afinal? Estou nervosa!
Jason sorri em meu ouvido e, então, continua:
— Eu estava desmaiado, ouvindo todo o burburinho ao redor, a
música alta que ainda tocava insistentemente, foi quando senti um cheiro
forte de álcool em meu nariz. Abri os olhos lentamente, retornando pouco a
pouco com os sentidos, então fitei a morena ajoelhada ao meu lado.
Os meus olhos arregalam imediatamente, um gosto ácido em minha
boca.
— Morena? — sorrio, indignada.
— Angel? — Jason gargalha. — Ciúmes?
— Sim, são ciúmes.
Retiro um dos travesseiros por debaixo da cabeça e coloco entre as
pernas, como um escape da fúria que me abrasava o coração.
— Eu fui fiel o tempo inteiro, garota, mesmo ainda não tendo
compromissos com você.
Engulo um bolo dolorido em minha garganta. A respiração falha e,
então, decido desconversar.
Ainda esperava pelo momento certo, pelo nosso momento.
— E o que a tal morena fez? — não consigo disfarçar a minha voz
desdenhosa, exatamente como uma menina mimada sofrendo com ciúmes do
namoradinho.
— Ela me ajudou, ela me recuperou do desmaio, Angel. Engraçado
que acordei com o triplo de força e de vontade de vencer, comparado com as
outras lutas! — Jason sorri sem acreditar. E eu estou boquiaberta. — Parecia
que aqueles minutos ali, apagado, foram necessários para eu poder
restabelecer os sentidos e voltar a lutar. Andrew Lenshing também não
esperava que isso poderia acontecer! Ele sentiu a raiva em meus pulsos. Eu
acabei com ele, Angel. No primeiro golpe.
Abruptamente, me sento sobre a cama.
— Então, você ganhou?
Jason envolve o meu rosto em suas mãos e me encara com aqueles
olhos negros e sexys, prontos para despir a minha alma.
— Sim, meu amor. Você é a mais nova CEO da Collins
Construtora!
Devolvi o sorriso tão verdadeiramente feliz e, num momento de
empolgação, me joguei em seu colo.
Jason não sustentou o meu peso e caiu para trás no colchão,
enquanto eu subi sobre o seu corpo e o cobri de beijos, nocauteando-o de
amor.

***

Saímos bem cedo do apartamento de Jason, rumo ao aeroporto


internacional de Londres, para encontrar o seu pai, na Suíça. O que separava
Jason de seus sonhos eram apenas algumas horas de voo.
Na manhã anterior, o belo moreno havia ligado para Victor Collins,
não disfarçando toda a ansiedade para entrar em contato com o pai.
Jason permitiu que eu ouvisse toda a conversa pelo viva-voz,
enquanto nos embolávamos embaixo do edredom, assistindo a uma série
qualquer na TV.
— Alô!
— Pai, sou eu.
— Fala.
— A empresa ainda está à venda?
— Claro, ninguém tem essa grana tão fácil assim! Nenhum
empresário bem-sucedido quer se desfazer de seus negócios para comprar a
Collins.
— Eu sou o primeiro, então? — Jason pergunta e pisca o olho para
mim.
— Você? O que quer dizer com isso?
— Eu vou comprar a empresa, pai. Agora, eu só preciso assinar os
papéis.
— São três milhões de dólares e você não desfez de nenhum de seus
negócios?
— Isso não importa!
— Você estava lutando, moleque?
— Eu... — Jason sorri sem graça, sem saber o que dizer.
— Você corre riscos de morrer na porra daquele tatame, parece
que enlouqueceu!
— Preocupado comigo? Estou verdadeiramente admirado.
Ouço Sr. Victor bufar do outro lado da linha.
— Amanhã, às 13h, eu te espero no restaurante Le Lumière.
Respiro aliviada, entendendo que Sr. Victor havia cedido.
— Certo, estarei aí, no horário combinado.
Jason não disfarça o sorriso, os olhos genuinamente felizes.
— Está feliz, meu amor? — pergunto, rolando na cama e ajeitando
o meu corpo sobre o dele.
— Como nunca antes em toda a minha vida.
Apesar do semblante sério, eu percebia que Jason sentia uma
satisfação plena por ter recuperado, finalmente, a Collins.
Ele acreditava que nós dois juntos iríamos fazer história dentro
daquela construtora, enquanto eu me sentia não só feliz por vê-lo feliz, mas,
sobretudo, satisfeita por poder trabalhar sem as resignações de Sr. Victor e,
dessa maneira, ainda mais empenhada ao sucesso da empresa em todo o
mercado.
De repente, Jason sorri e uma lágrima escapole de seu olho. Passo o
dedo sobre ela e, fitando a sua íris negra ainda temperada de alegria, concluo
que Jason Collins merecia toda a felicidade estampada em seu rosto, todo o
alívio que alterava os batimentos do seu coração. E, além de tudo, ele
merecia, principalmente, todo o meu amor.
Pousamos na Suíça e faltava apenas uma hora para o encontro com
o meu pai. O dinheiro que angariei na luta já estava em minha conta bancária,
esperando apenas por minha assinatura no contrato, para ser imediatamente
transferido para a conta já recheada de Victor Collins.
Assim que entramos no táxi, em direção ao restaurante Le Lumière,
percebi o olhar feliz de Angel Parker. Há muito tempo eu não a via dessa
maneira, leve e segura dos seus sentimentos. A garota parecia que estava o
tempo inteiro tentando ser outra pessoa, simulando sentimentos, represando a
paixão que já estava estampada em todas as suas expressões e atitudes, sem
ela ao menos se dar conta.
Segurei em sua mão e apertei forte, então Angel mirou em mim os
seus olhos grandes e castanhos, e disse:
— Estou feliz por estarmos a caminho da realização do seu sonho.
Sorri torto, analisando a doçura de suas palavras.
— Saiba, Angel, que o meu sonho maior eu já realizei, ter você em
minha vida.
Em resposta, a bela garota grudou a sua boca na minha, retirando
um beijo sôfrego de meus lábios. Senti o tesão e a paixão alcançarem todos
os meus sentidos, enquanto as minhas mãos deslizavam por suas costas e
entre os cabelos fartos.
Assim que saímos em frente ao restaurante, recebemos a brisa
gelada em nossas peles, apesar do lindo dia de céu azul que fazia em Berna,
naquela tarde.
A fachada de vidro me permitiu de imediato vislumbrar Victor
Collins já sentado de costas em uma das mesas, aguardando pelo nosso
encontro. Neste minuto, Angel parou ao meu lado e segurou em minha mão.
Estranhei quando notei os seus olhos apreensivos.
— Jason, eu não quero me sentar junto a vocês. Prefiro aguardá-lo
em uma mesa próxima.
Amassei os lábios, já imaginando o quanto Victor Collins
incomodava Angel.
E não era para menos.
— A presença do meu pai não te faz bem, não é mesmo?
— Desculpa, Jason, mas é exatamente isso. — ela abaixa os olhos,
talvez constrangida. — As palavras que Victor Collins já me dirigiu, as
atitudes frente ao caso de Leonard, tudo isso me traz uma repulsa imensa
quando estou na presença de seu pai.
— Não precisa se desculpar e muito menos justificar, Angel. —
levo a mão ao seu rosto. — Eu compreendo perfeitamente. — noto os seus
olhos mais tranquilos. — Então, você realmente não se importa de me esperar
em outra mesa?
— De maneira alguma, Jason. — Angel leva a mão ao meu peitoral.
— Vou pedir um vinho e uns queijos, torcendo para que você feche logo o
seu negócio.
A garota sorriu mais calma e me beijou, antes de se adiantar na
minha frente e se sentar de costas em uma mesa ao lado de Victor Collins.
Assim que me aproximei da mesa do meu pai, ele se levantou e me
encarou com aquele olhar frio e de poucos amigos o qual ele era mestre em
exibir.
— Cheguei agora de Londres. — disse, já me sentando à mesa.
— Por que o seu rosto está cheio de marcas, esses pontos em sua
testa? Ainda está lutando, Jason Collins? — pergunta enfurecido, ainda de pé
à minha frente.
— Sim, estou. — não teria como omitir.
O meu pai balança a cabeça de maneira irritante, antes de puxar a
cadeira e se sentar ao meu lado.
Apenas reviro os olhos com toda a sua preocupação de fachada.
— Um dia você pode se dar realmente muito mal, não só pela
questão da saúde, mas principalmente pela sua carreira. — e para a minha
surpresa, noto um olhar preocupado. — Quem vai dar credibilidade a um
CEO que vive se atracando por aí como um pitbull encurralado e cheio de
ódio?
— Pai, por favor, — aproximo do seu rosto, com a voz crua. — não
estou aqui para discutir sobre as minhas decisões. Porra, eu tenho trinta e dois
anos!
— Jason, você é irônico, — meu pai relaxa na cadeira, ao mesmo
tempo em que me lança um sorriso jocoso. — sempre arrotando valores e
bons costumes, agora fazer apologia à violência não o incomoda?
— Apologia à violência? — gargalho. — Quem é você para me
criticar e discursar sobre apologia à violência? — os olhos de meu pai
arregalam, ao perceber o meu tom de voz. — Quem me socou durante a
minha vida inteira? Quem batia em mamãe? Isso sim é apologia à violência,
ou melhor, é a própria violência nua e crua. — estava furioso com tanta
audácia nas palavras de Victor Collins. Antes de engolir em seco, prossigo.
— No ringue, eu e os demais lutadores estamos lá por livre e espontânea
vontade. O cara que me cortou a testa, com um golpe, não foi obrigado a
estar lá. Sentimos prazer no que fazemos. Resistimos a dor, enfrentamos os
nossos limites, ficamos cara a cara com a morte porque a gente gosta desse
tipo de desafio! O boxe e a luta livre me ajudaram a superar parte dos meus
traumas, foram uma espécie de válvula de escape. — o meu pai vira o rosto
para o lado contrário, visivelmente indignado com o meu discurso. —
Esporte é para isso, pai! Para entender que é saudável ser derrotado, apesar
das dores físicas. Isso é o interessante, estar disposto a enfrentar os limites,
dentro de uma disputa saudável. Já a parte da violência eu deixo inteiramente
com o senhor!
O meu pai ainda mantém os olhos presos na mesa ao lado, então me
dou conta de que ele observava Angel tomar o seu vinho, e não dava a
mínima atenção aos meus argumentos, o que era mais que comum dentro de
nossa relação.
— Aquela é a sua namoradinha? — pergunta, sem me olhar nos
olhos, como o tremendo covarde que era.
— Sim, é a Angel. Ela não quer falar com o senhor porque já a
violentou muito com as suas atitudes e palavras bestas.
Victor Collins me encara com os olhos em chamas.
— Não a obriguei a ficar na empresa, inclusive a despedi!
— Pai, não seja insensível, — respiro fundo, tentando manter a
calma. — a garota saiu de outro estado para trabalhar na sua empresa, largou
família, lar, raízes para se dedicar aos negócios, sonhar com o futuro de sua
própria carreira. Angel foi extremamente forte por aturar com firmeza todos
os seus tratamentos imorais. Pelo o amor ao trabalho, não esmoreceu. Analise
um pouco, por favor.
O meu coração se enchia de paixão, quando eu falava qualquer
coisa a respeito de Angel.
Analisar as atitudes daquela garota e confrontar o meu pai, em
defesa dela, me traziam tantas sensações boas, que eu me sentia cada vez
mais orgulhoso por tê-la ao meu lado.
Se eu tinha argumentos ao seu respeito, era porque Angel permitia
nas suas atitudes.
— Falando em empresa, ainda estou indeciso se devo vendê-la a
você ou não. — o meu pai despeja, de repente.
Apenas sorrio incrédulo, analisando-o dobrar o guardanapo de
linho.
— Pai, por favor, não seja ridículo.
— Tenho certeza que vai dividir os lucros com Ronny e sua mãe.
Então, ele me encara, talvez esperando por minha reação.
No entanto, não me acovardo.
— Tio Ronny e mamãe participarão dos lucros da empresa, sim e
daí?
— É isso, — ele bate a mão sobre a mesa. — não quero dar esse
gostinho a eles.
Arregalo os olhos impressionado com a ideia fixa de meu pai de
não querer dar qualquer tipo de vantagem ao meu tio e à mamãe.
Ele estava se superando, agindo com tanta teimosia, infantilidade e,
sobretudo, injustiça.
— Para de ser tão ganancioso, porra! Pelo amor de Deus! Por
egoísmo vai deixar de fechar um negócio milionário comigo!
Sinto a minha respiração ofegante.
Meu pai era capaz de me fazer sentir ódio por ele.
Um horror.
— Boa tarde, Sr. Victor.
Olhamos sobressaltados para o lado e Angel estava de pé em frente
à nossa mesa. Certamente após ter ouvido ao nosso embate decidiu interferir.
A bela garota jogou os longos cabelos para trás e se sentou em uma
das cadeiras.
O olhar, gélido.
Ela sabia muito bem o que a trazia para o meio de nossos conflitos.
— Por que o senhor não quer dar os papéis para Jason Collins
assinar? — pergunta, sem rodeios, debruçando os braços sobre a mesa.
O meu pai sorri irritado.
Angel era mestra em tirá-lo do sério.
— Garota, a essas alturas, não estou a fim de entrar em nenhuma
discussão com você.
— O senhor não sente vergonha de torturar o seu filho até o último
segundo? De fazer tanta maldade, tratá-lo como se fosse o seu pior inimigo?
As palavras de Angel atingem certeiramente o ego de Victor
Collins. O sorriso debochado desaparece imediatamente de seu rosto, as suas
mãos tremem, quando percebo que ele ajeita a gravata apenas por tique.
— Angel, por favor... — seguro na mão da garota, não querendo
que ela travasse uma batalha com o meu pai.
Não por ele!
Mas eu temia o que poderia vir a sair pela boca de Victor, para
atingi-la.
No entanto, segura como uma rocha, a moça permanece irredutível
em suas intenções.
— Sr. Victor, você não tem medo do seu futuro?
— O quê?! — ele pergunta com cara de tolo. Mas certamente o
meu pai já temia receber o impacto das próximas palavras de Angel.
E ela continua.
— Tem apenas o Jason como filho, não tem mais esposa, o seu
irmão, pelo jeito, também não te suporta. Não tem medo de ficar sozinho?
O velho dá uma forte e audível bufada, antes de passar a mão pelos
cabelos grisalhos.
— Eu vou embora.
Pega a pasta e se levanta.
Angel simplesmente não perde tempo.
Fica de pé e ergue o dedo para Victor Collins.
Eu não esperava menos dela.
— Se o senhor se levantar dessa cadeira agora, todos os e-mails,
todos os áudios de assédio moral serão entregues à polícia, ou o senhor
realmente acha que eu apaguei tudo, para ignorar as suas boçalidades, da
mesma maneira que a sua esposa fez, como Jason fez por amor?
Semicerro os olhos analisando a atitude de Angel Parker.
Ela era demasiadamente esperta. Por essa, nem eu esperava, muito
menos o meu pai.
— Você não seria capaz disso? — Victor Collins pergunta com a
voz fraca.
Ele estava se sentindo nas mãos de Angel. E com toda a certeza
deveria estar se odiando por isso.
— A Collins era um sonho, Sr. Victor. — Angel continua firme. —
Eu não pensava em mais nada a não ser crescer dentro daquela construtora.
Sim, eu aturei alguns desaforos, engoli muitos sapos, mas o que me conforta
é que eu não fiquei calada, eu defendi a mim e à equipe, com unhas e dentes.
E guardei esses arquivos, simplesmente porque eu não estava segura em
desfazê-los, para depois vir a precisar no futuro, e eu acho que a hora chegou,
pelo jeito. — ela dá de ombros, enquanto o meu pai permanece estático,
boquiaberto. — Na verdade, é o senhor que vai decidir o futuro de tais
registros.
O meu pai encara a mim e a Angel de soslaio. Ele quer ceder, mas o
orgulho obrigando-o a relutar.
De repente, ele joga a pasta preta sobre a mesa, deixando um golpe
de ar atingir a minha face. Destrava a pasta e pega os papéis.
Angel me encara pelo canto dos olhos e sorri discretamente para
mim, se sentando ao meu lado.
Não perco tempo e seguro as folhas entre as mãos, faço a leitura do
contrato e assino, antes mesmo que o meu pai desistisse.
— O número da sua conta eu já tenho, vou fazer a transferência
agora. — informei, guardando a caneta no bolso do paletó.
O meu pai, ainda de pé, pega a parte do contrato que lhe cabe e
guarda na pasta de couro.
Oscila o olhar desdenhoso em mim e em Angel, antes de dizer:
— Façam bom proveito daquele maldito mausoléu.
O velho nos deixou e saiu pela porta, sem olhar para trás. Senti um
nó em minha garganta simplesmente por imaginar, que eu corria riscos de
não ver Victor Collins nunca mais na minha vida.
— Apesar de tudo, eu sei que não está feliz.
A garota me surpreende segurando em minha mão. Certamente,
havia notado a angústia no meu olhar perdido em direção à porta.
— Angel, o meu pai não tem jeito. E eu acredito que seja mais fácil
eu aceitar esse seu lado cruel a entender as suas atitudes.
— Ele é assim, Jason. — ela segura em meu queixo. — A gente que
tem mania de tentar justificar tudo.
— Você tem razão, meu amor. — dei um falso sorriso, beijando a
sua mão. — Agora, vamos para outro restaurante. Vamos almoçar. Eu não
quero ficar nem mais um minuto sequer aqui. — disse, já ficando de pé,
ajeitando o paletó no corpo.
Saí de mãos dadas, em direção à rua, com a mulher que acreditava
verdadeiramente em meus sonhos, que por muito tempo ajudou a salvar os
negócios de meu pai.
Agora, ela havia acabado de salvar todos os nossos sonhos, de me
salvar das intenções cruéis de Victor Collins.
***

Era a primeira vez de Angel na Suíça, por isso resolvi levá-la a um


restaurante famoso, especializado em fondue.
Assim que entramos naquele ambiente requintado, a bela garota
ficou extremante encantada. Havia enormes arranjos de flores sobre a mesa,
além de um castiçal de onde velas bonitas exibiam as suas chamas dançantes.
Sem demoras, o fondue foi servido, enquanto conversávamos
empolgados sobre assuntos diferentes de negócios e lutas de boxe. Em
segundos, já saboreávamos a carne e os molhos deliciosamente gostosos.
Angel sorria e me contava sobre os seus momentos felizes na
Collins. Não conseguimos evitar por muito tempo falar sobre o que realmente
amávamos.
É surpreendente acreditar, mas a garota havia sido feliz naquela
construtora, quando triunfava em suas conquistas, quando fechava as
parcerias com as outras empresas, quando os seus amigos reconheciam toda a
sua dedicação no trabalho.
— Eu tenho muitos sonhos para a Collins, Jason. Eu só tenho a
agradecer por você me permitir isso. — ela sibilou, antes de enfiar um
mignon na boca.
— Angel... — segurei em sua mão. — eu já te falei que a Collins
precisa muito de você. Não tenho dúvidas de que será a empreendedora mais
bem-sucedida daquela cidade.
Os olhos castanhos brilharam esperançosos. Certamente, passava
um filme pela cabeça de Angel.
— E ganhar prêmios como você? — sorrio da espirituosidade da
garota. E ela continua. — Eu tenho apenas um pedido, Jason. — me encara
de maneira insegura.
— Pode falar, princesa. — balbuciei, observando Angel umedecer
os lábios.
— A Estefani pode ser a nossa secretária?
Sorrio, abertamente.
— Óbvio! Nem precisava pedir!
Angel sorri empolgada, já com mil planos em sua linda cabecinha.
— Alguns amigos eu queria ter novamente por perto. — confessa,
dando um tom saudoso à sua fala.
— Fique à vontade, meu amor, para fazer tudo o que pretender. —
levo o meu dedo ao seu queixo. — Eu confio inteiramente em você.
As nossas bocas se tocaram imediatamente se rendendo ao
magnetismo que as envolvia. Fomos interrompidos apenas quando o garçom
chegou, depositando um balde de espumante sobre a mesa.
— Angel, eu queria aproveitar o momento para te fazer um pedido
também... — pego um anel de brilhante em meu bolso. Já havia comprado a
joia para Angel, há algumas semanas, para presenteá-la quando retornasse
aos Estados Unidos, mas, sem intenções, ela decidiu adiantar as coisas. —
Além de minha CEO, quer ser a minha namorada?
A garota não conseguiu dizer uma palavra sequer, apenas levou as
mãos à boca, quando ouviu ao meu pedido tão emanado de sentimentos,
então, ela mirou os olhos no diamante que despontava do alto do anel
dourado e sorriu.
Segurei em sua mão e Angel se emocionou quando coloquei a joia
em seu dedo.
— Eu te amo, Jason. — foi tudo o que a garota me disse, antes de
nos beijarmos e brindarmos o nosso amor.
— Gostou da surpresa? — pergunto, observando Angel
extremamente entusiasmada com o meu presente.
Ela sorri e uma lágrima escapole.
— A minha cara de boba apaixonada não te responde?
Levo a mão até os seus cabelos e olho em seus olhos, por segundos,
imaginando o que havíamos passado juntos, o que havíamos superado, para
chegar até aqui.
A companhia de Angel tornou as coisas mais fáceis, sem dúvidas.
— Eu também te amo, Angel Parker.
O meu corpo se preencheu de desejo, enquanto o meu coração
repousou numa sensação de paz absoluta, assim que ela segurou o meu rosto
e me deu um beijo quente na boca.
Junto a Angel, eu desejava trilhar os caminhos de meus sonhos, até
a vida se tornar pequena e se esvair pelos meus últimos dias.
Então, ela sorriu para mim e disse em meus lábios que eu era o
homem de sua vida.
Eu era simplesmente o cara mais sortudo do mundo.
Não fazia mais sentido morar em apartamentos separados. Já havia
algumas semanas em que Angel dormia em meus braços, naquele apart hotel,
nos Estados Unidos.
Estávamos exaustos com a recuperação da empresa, as obras, a
contratação dos funcionários, além das reuniões e mais reuniões com as
empresas candidatas a novas parcerias.
Apesar da loucura que se tornaram as nossas vidas, tudo estava
caminhando da melhor maneira possível. Angel estava realizada em sua
profissão, finalmente. Ela possuía carta branca para agir frente aos negócios,
da melhor forma que preferisse, o que obviamente não acontecia na época de
Victor Collins.
Assim que abri a porta do apartamento para sairmos juntos, para
mais um dia de trabalho, encontramos inesperadamente o rapaz da
floricultura.
— Jason Collins? — perguntou, conferindo o meu nome em um
pequeno papel.
— Sou eu. — afirmei desconfiado, enquanto Angel unia as
sobrancelhas em estranhamento.
— Esse buquê é para o senhor.
Recebi as flores na mão, ressabiado com gesto tão delicado. Peguei
o cartão entre os botões e li atentamente o teor daquele papel, para mim e
para Angel.
Filho, estou feliz por suas conquistas. Você sempre foi um rapaz
destemido, competente, carinhoso, repleto de valores. Não merecia menos
que a empresa e a Angel ao seu lado. Sejam muito felizes. Venham me visitar,
em breve. Beijos, mamãe.
— Por um segundo pensei que fosse Victor Collins. — a garota
profere, revirando os olhos.
Dou um meio sorriso, depositando o cartão de volta no meio dos
lírios.
— Nem nos meus mais loucos sonhos ele faria isso, Angel.
A garota amassou os lábios, notando o descontentamento cru em
meu rosto.
Retornei ao apartamento para colocar as flores na água.
Não era exatamente o gesto de mamãe que me incomodava, mas
sim a indiferença de papai que sobressaia nesses momentos. Foi assim a vida
inteira, por que infernos haveria de mudar?
Então, entrelacei a minha mão, na mão de Angel e descemos juntos
o elevador, enquanto eu sentia uma dor praticamente física atingir os meus
sentimentos.
— Está tudo bem, Jason? — ela me perguntou, analisando o meu
rosto sério.
— Eu apenas desejava que o meu pai me amasse verdadeiramente.
— confessei, arrancando um audível suspiro da garota.
— Não sei o que dizer, eu acho que não sou a melhor pessoa para
falar do seu pai. — respondeu de maneira sincera, sem conseguir me olhar
nos olhos.
A porta se abriu e caminhamos em direção ao estacionamento.
No final das contas, eu já estava conformado com a minha sina
cruel de não ter um pai-exemplo.
— Se existir pessoa ideal para falar bem de meu pai, me apresente,
por favor. — rebati.
— Leonard! — Angel brincou, enquanto eu me lembrei que teria
que avisá-la do andamento do processo.
O agito no trabalho estava tão intenso que havia me esquecido de
colocá-la a par do caso de Leonard.
— Falando nesta merda, preciso te dar uma boa e uma má notícia.
— O que houve? — ela parou perto do carro e manteve os seus
olhos fixos nos meus.
— Leonard foi condenado, mas já ouvi rumores de que ele está
foragido.
Angel abaixa os olhos, passando as mãos pelo rosto, não querendo
acreditar nas armações do pilantra.
— Ele me falou, naquele dia, na cafeteria, quando estava com Ester,
que pretendia ser feliz ao lado de May. A tolinha deve estar junto a ele nessa
empreitada.
Desfiro carinhos no rosto lindo de Angel.
— Leonard vai ser pego, não tenho dúvidas disso.
— É o que eu mais quero no momento... — ela balbuciou, olhando
para a minha boca.
— E não é me beijar?
Angel sorriu, apertando os olhos.
Envolvi a sua cintura fina em meu braço e beijei a sua boca
deliciosa, sem me preocupar se o meu pau estava eriçado dentro de minha
cueca, pronto para fazer Angel gozar.
Como a primeira vez, encostei o seu corpo ao carro e pressionei
todo o meu corpo contra o dela, num beijo excitante e cálido.
Foi extremamente difícil sair para trabalhar naquela manhã.
Retornamos ao apartamento e nos deleitamos até quase a hora do
almoço.
Tínhamos disso, vez ou outra nos rendíamos aos nossos desejos
ardentes.
E urgentes.

***

Assim que chegamos à empresa, já demos de cara com o nosso


escritório completamente reformulado. As paredes estavam todas forradas
por um papel de parede texturizado em tons marfim. Angel havia escolhido
cada detalhe, planejado com todo o cuidado, se inspirando em seu bom gosto,
para evitar que lembrássemos de qualquer detalhe de Victor Collins naquele
ambiente.
Angel caminhou pela sala da presidência, passando os dedos pelas
mesas de madeira escura. Estavam estrategicamente colocadas uma ao lado
da outra.
— Nossa, Jason, ficou incrível! Superou as minhas expectativas! —
ela falou com os olhos marejados, a voz aveludada de uma menina
sonhadora.
— E o que achou disso? — perguntei, entregando a ela um porta-
retrato.
— Não acredito! Que lindo!
Era uma foto nossa em Berne, em uma daquelas paisagens lindas de
serras e flores. E eu apenas observava os olhos entusiasmados de Angel
fitando os nossos sorrisos naquela lembrança.
— E agora temos uma televisão para vídeo conferência. — disse,
analisando a tela de oitenta polegadas na parede à frente de nossas mesas.
— Sr. Victor sempre relutou ter uma dessas. — ela falou enquanto
depositava o porta-retrato na estante. — Isso facilita tanto o trabalho. —
Angel lamentou e se sentou em uma das cadeiras luxuosas.
— Pois é...
Pego o controle e ligo a televisão em um canal de notícias,
imediatamente aparece uma reportagem que me intriga.
Nesta manhã, foi detido no aeroporto internacional de Dallas,
Leonard Corazza. O contador foi condenado a quinze anos de prisão por
crimes de estelionato e estupro. Ele tentava fugir junto a namorada May
Richardson, quando foi detido por policiais acionados no momento da
identificação do criminoso.
— Deus do céu. — Angel está petrificada, os olhos sempre tão
expressivos, agora quase saem de órbita. — Que notícia maravilhosa! —
completa em meio a um sorriso e se joga em meu colo.
— Viu, meu amor? — segurei o seu rosto em minhas mãos. — Eu
disse que tudo iria se resolver da melhor maneira. Com justiça.
— Graças a Deus. — Angel tem os braços envolta de meu pescoço.
— Estou me sentindo tão aliviada, parece que retirei um piano das costas.
— A gente merece ser feliz, minha princesa.
Beijei os lábios macios de Angel Parker, imaginando que a sina de
Leonard não poderia ser diferente da que ele havia escolhido. Ele esfacelou o
coração e a moral daquela mulher incrível, além de roubar o meu pai — sim,
Victor Collins também fez por merecer — e falir esta empresa.
Agora, apenas as grades da prisão mereciam a sua desprezível
companhia.
***

Semanas depois, a Collins Construtora já estava em seu pleno


funcionamento. Angel em seu posto de CEO comandava todos os mais de
cinquenta funcionários sob o seu pulso firme, senso de justiça e espírito de
equipe.
E como eu me orgulhava daquela mulher...
Sentado em minha cadeira, eu apenas a admirava passar de um lado
para o outro em seus saltos altos, o corpo esbelto, os cabelos longos que
esvoaçavam de acordo com o ritmo de seus passos. Era uma imagem para
qualquer um ficar babando.
Sem conseguir resisti-la, puxei a minha namorada pela mão.
Angel caiu sorrindo sobre o meu colo.
— Já está com saudades? — perguntou, com o sorriso genuíno
desenhado em seus lábios.
— O tempo inteiro. — sussurrei. — É muito difícil de resistir você
assim tão independente, cheia de compromissos, dando ordens, brincando
com os meus desejos...
Cobri o seu pescoço de beijos cálidos, enquanto sentia Angel
derreter entre os meus braços.
— E você nesse terno preto, esse olhar sério, pensa que é fácil para
mim?
Sorri, afanando um de seus seios deliciosos.
E, sem esperarmos, a porta da sala da presidência se abre.
— Desculpa.
— Volta Ester, o que houve? — Angel falou ao mesmo tempo em
que se desvencilhava de meu colo.
— Chegaram essas correspondências. — Estefani entrou pela sala,
deixando a papelada sobre a mesa. Constrangida com o nosso amasso, fechou
a porta, sem ao menos nos olhar.
E eu, inocente, imaginando que ela já estivesse acostumada com
essas cenas...
— Você sabe o que é isso, Jason? — Angel me pergunta,
inspecionando cada envelope.
— Só temos um jeito de descobrir.
Curiosos abrimos os envelopes de papel pardo, retirando os
calhamaços de folha de dentro deles e então nos demos conta de que eram
propostas de parcerias com diversas empresas europeias.
— O que significa isso? — a minha namorada me pergunta, com os
olhos presos aos documentos.
— É tudo o que a gente precisa, Angel! — balbucio, sem acreditar.
Ainda leio o teor de alguns daqueles papéis e o meu coração acelera
apenas inferindo o que poderiam ser aquelas propostas. O peso delas para a
Collins.
— Mas fizemos apenas contato com as empresas norte-
americanas... — Angel fala, desconfiada.
— Tem uma carta.
O meu coração pressionou em minha garganta quando reconheci a
letra de meu pai.
Jason e Angel, comuniquei alguns empresários conhecidos meus
em Berna, Roma e Berlin. Eles demonstraram interesse de firmar parceria
com a Collins. Não deixem para depois, eles possuem o intuito de alavancar
a empresa no mercado.
Jogo os papéis sobre a mesa, dando um chute na cadeira, em
seguida.
— O que foi, Jason? — Angel me encara assustada e eu
prontamente a abraço forte.
— O meu pai conseguiu todas as parcerias que precisávamos. —
não consigo disfarçar a emoção em minha voz.
— Victor Collins? — pergunta de maneira esganiçada.
— Sim, eu sei, é assustador, mas com a assinatura desses contratos,
estamos prontos para disputar com a concorrência, em breve. Seremos uma
ameaça, Angel Parker!
A garota sorri, ainda sem acreditar, e me abraça com ternura,
quando ouço Angel sussurrar em meu ouvido.
— Jason... Sr. Victor te ama do jeito dele.
— Está pronta?
Jason entrou no quarto de nossa casa, vestido em um lindo e
elegante smoking. Os seus olhos negros estavam brilhantes, certamente
felizes pelo evento que nos esperava esta noite.
— Só faltam os sapatos. — informei colocando os brincos de rubi.
O belo moreno ainda me encarava pelo reflexo do espelho,
enquanto me ajudava a fechar a lateral do vestido.
— Nunca vi mulher tão linda. — sussurrou em meu ouvido,
intrometendo as suas mãos em minha cintura.
Viro-me para Jason e sorrio.
Definitivamente, ele era o meu sonho realizado.
Estávamos casados há um ano, morando em nossa casa nova em um
bairro bem próximo da nossa empresa, ou melhor, da minha empresa. Jason
sempre me corrigia e fazia questão que eu entendesse que se não fossem o
meu posto na Collins Construtora e todo o trabalho dispensado, certamente os
negócios não teriam deslanchado.
E, agora, o resultado de anos de trabalho comandando a Collins
estaria nesse grandioso evento no Hotel Elegance.
Após calçar os sapatos, peguei a clutch e entrelacei o meu braço no
braço de Jason, saindo entusiasmada do quarto, e quando dei o primeiro
passo em direção à escada, senti uma breve tontura.
— O que foi, Angel? — Jason me amparou preocupado.
— Acho que passei muito tempo de olhos fechados para a Susie
concluir a maquiagem. Deve ser vertigem ou algo do tipo.
Jason assentiu ainda apreensivo, mas mesmo assim entramos no
carro em direção à festa dos empresários do ano, apenas porque consegui
convencê-lo de que talvez tenha sido uma queda de pressão por conta de
todas as emoções que envolviam aquela noite.
Assim que adentramos o imenso salão, foi difícil conter a emoção.
Muitas pessoas se aproximaram, me parabenizando pelo meu trabalho frente
à Collins.
Apenas agradecia de maneira modesta, sem deixar de frisar que
nada seria possível sem o meu principal sócio, Jason Collins.
Sentamos em uma mesa elegante, na companhia de alguns amigos
da empresa.
Jason puxou a cadeira para mim e se sentou ao meu lado.
Ester estava junto a nós, na companhia de seu noivo, Frédéric. Ele
era um dos nossos parceiros da empresa alemã.
— Está ansiosa, Angel? — me perguntou com os mesmos olhos
faceiros e curiosos. Nada havia mudado.
— Bastante, Ester! Na verdade, parece um sonho, imaginar que
estou aqui dividindo sorrisos com pessoas tão altamente gabaritadas. —
confessei, observando ao redor.
E ao perceber o ir e vir de pessoas tão importantes no mundo dos
negócios, imaginei o quanto trabalhei para alcançar a realização de mais esse
sonho.
Apenas a indicação ao prêmio já me satisfazia inteiramente.
— Você merece, minha princesa. — Jason esticou um braço sobre o
meu ombro, me acolhendo com ternura. — Você está apenas colhendo os
frutos de todo o seu trabalho árduo e, principalmente, ratificando a sua
capacidade profissional.
Dei um beijo em sua boca, completamente envaidecida com as suas
palavras tão cheias de reconhecimento. Finalmente, sentia prazer ao exercer a
minha profissão, comandar uma equipe da maneira que sempre desejei que
fosse, com muita colaboração, confiança e, sobretudo, humanidade.
O garçom, então, se aproximou de nossa mesa, com uma bandeja
repleta de taças borbulhantes de espumante, mas, imediatamente recusei.
— Está tudo bem, Angel? — Estefani pergunta com rugas de
desconfiança na testa, afinal de contas eu era uma esponja, quando se tratava
de prosecco.
— Eu não quero parecer alterada quando for receber o prêmio. —
justifiquei, sorrindo, enquanto Jason e Estefani, que me conheciam bem,
encaravam-me com cisma.
Após o discurso da cerimonial do evento, os destaques começaram
a ser chamados ao palco para receber os seus merecidos prêmios. Apenas
apertava a minha mão nas mãos de Jason, ansiosa para ouvir o tão esperado
prêmio “empresário do ano”.
— Você vai subir ao palco, Angel, fique calma. — o moreno
tentava me consolar, enquanto a minha boca transbordava de canapés.
A ansiedade me consumindo a alma.
— Eu acho que agora chegou a hora de anunciar! — Estefani me
encara empolgada, sorrindo e batendo palminhas.
Fecho os olhos e faço todas as orações que a minha mãe me
ensinou, sentindo Jason respirar ofegante ao meu lado.
— O prêmio de empresário do ano é para a CEO Angel Parker, da
Collins Construtora!
Levantei da cadeira, embalada pela empolgação do momento.
Estefani e Jason apenas me aplaudiam deixando a emoção escapulir em
lágrimas brilhantes pelos seus rostos. Entre assovios e o reluzir dos flashes,
subi ao palco.
Recebi emocionada a placa de congratulações.
As mãos suadas, mas a voz firme de uma empresária de sucesso.
— Esse prêmio eu dedico ao grande amor da minha vida, Jason
Collins. Se não fosse por ele, acreditar em mim, me dar essa oportunidade de
tocar os negócios de sua família, nada disso seria possível. Ele me mostrou
que nós mulheres podemos sim estar à frente de empresas como essa, de
desafios como esse. Temos capacidade para alçar voos muitos altos. Somos
fortes, sim, e eu acredito que podemos ser ainda melhores juntas. Obrigada a
todas as minhas parceiras de trabalho. Vocês são o toque de empatia de que
tanto preciso para vencer os desafios do dia-a-dia. — recebo os aplausos
sentindo um arrepio contornar a minha espinha.
— Jason! — ele me encara, sério, embora a emoção estampada em
seus olhos umedecidos. — Aqui dentro... está o termômetro do nosso amor...
— a voz falha. Então, apenas abaixo os olhos, acariciando a barriga. — Eu
estou grávida.
Mais uma chuva de aplausos, para eu receber o meu marido ao
palco. Ele merecia estar ali comigo, além de ter me dado todas as
oportunidades, Jason era um CEO referência em Londres, reconhecido
internacionalmente por suas empresas. Ele era respeitado por muitos ali
presentes.
Em poucos minutos, o belo moreno está ao meu lado com os olhos
marejados. Ele alternava os seus sorrisos com um choro tímido.
Então, Jason Collins pega o microfone da minha mão, pedindo
licença à cerimonial. Em reposta, a mulher pisca o olho para ele e sorri,
retirando de mim um breve e contido suspiro de ira.
— Eu me lembro bem da primeira vez em que eu te vi, Angel
Parker. Linda e autêntica, me deixou feito bobo te vendo partir no seu carro,
naquela noite de tacos mexicanos. Depois, o destino resolveu unir nós dois de
todas as maneiras possíveis, passamos por fases dolorosas, mas superamos
juntos. Naquele momento, eu já te amava, Angel. E entre todos os amores
que eu tenho na vida, — ele chora contido, tocando em meu ventre. — você e
o nosso filho serão para sempre o meu amor preferido.
Em meio aos aplausos, recebi um beijo sôfrego de Jason Collins.
Os assovios, o som dos flashes das câmeras, o prazer de estar
grávida do homem da minha vida, o prêmio na mão, eu não poderia me sentir
mais realizada!
E quando olhei para Estefani, li em seus lábios.
— Sortuda!
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