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PROF.ª Dra. M.

TERESA NAPPI MORENO


E-MAIL: mteresanappi@yahoo.com.br
 “Os deuses são justos, e de nossos vícios
prazerosos, fazem instrumentos para nos
atormentar.”
( Shakespeare, in Junguiana, p.6, 1994)

 “A dependência nos mantém em contato com


os deuses... Os deuses surgem através de uma
ferida.”
(Marion Woodman, in Junguiana, p. 6, 1994)
 “O ópio dilata o que contornos não tem mais,
Aprofunda o ilimitado,
Alonga o tempo, escava a volúpia e o
pecado,
E de prazeres sensuais
Enche a alma para além do que conter lhe é
dado.”
(Baudelaire, in Junguiana, p. 6, 1994)
 “No entanto, é possível que haja substâncias
na química de nossos corpos que
apresentem efeitos semelhantes, pois
conhecemos pelo menos um estado
patológico – a mania – no qual uma
condição semelhante à embriaguez surge
sem administração de qualquer droga
intoxicante. “
(Freud, in Junguiana, p. 7, 1994)
 “Álcool em latim spiritus, e se usa a mesma
palavra para a experiência religiosa mais
elevada assim como para o mais perverso
veneno. A formula auxiliadora é, pois,
spiritus contra spiritum.”
(Jung, p. 13, 1994)
SER HUMANO É VISTO COMO UM TODO
INTEGRADO:
BIO –PSIQUICO – SOCIAL – ESPIRITUAL -
AMBIENTAL - ECOLOGICO – HISTÓRICO -
E ALGO MAIS QUE NINGUÉM SABE.
- Jung ([1935] 1997) - corpo e psique - uma única
coisa - totalidade

- Jung ([1935] 1997) “... ideias suspensas sobre a não


entrada com as emoções subjacentes aos conflitos,
podem expressar-se facilmente no corpo,
frequentemente como problemas de pele, de
estômago e intestino, ou seja, diarreia ou
constipação. As pessoas que não querem deixar algo
ir embora, podem produzir uma extraordinária
constipação.”
“A sintomatologia de uma doença é, ao
mesmo tempo, uma tentativa natural de
cura.”
(Jung, 1934/2011, par. 312)
 “O viciado nunca está presente: está sempre
correndo ou sonhando com o passado
maravilhoso ou com o futuro incrível. De
modo que ele nunca está em seu corpo. E
assim, seu corpo sofre. Desabitado. E é deste
ponto que surge uma terrível sensação de
fome.”
( Marion Woodman, in Junguiana, p.9,
1994)
 Dependência:

 Do latim dependência.
 Sujeição, subordinação, complemento, estado ou
caráter de dependente.
(Ferreira, p. 537, 1986.)
 Dependente:
 Pessoa que não dispõe de recursos para promover a
sua subsistência. (se tiver, não utiliza)
 Pessoa que vive à expensas de outra.
( idem, p. 537)
 Abuso:
 Do latim abusu.
 Mau uso, uso errado, excessivo, descomedido.
(idem, p. 17)
 Compulsão:
 Do latim compulsione.
 Tendência à repetição. Ato de compelir.
(idem, p. 443).
 Compelir:
 Do latim compellere.
 Obrigar, coagir, impelir, empurrar.
(idem, p. 439).
 Impelir:
 Impulsionar para algum lugar,
 Instigar, arremessar.
(idem, 921).

 Hybris : ultrapassagem do metron humano,


desmedida, excesso, ultrapassagem da medida.
(Brandão, 2002)
 “ A hybris pode ser entendida como uma falta de
controle em relação aos próprios impulsos,
podendo ser considerada uma doença por seu
caráter irracional e desequilibrado.”
(Borges et al, 2013, p. 23)
 Quem, o que dentro do individuo o impulsiona?

 Jung (1921/2012):
 Somos influenciados pelo “ar” que respiramos...
Temos uma “aparente liberdade”...

 Zoja (1992)
 Sociedade com seus padrões e valores dominantes
da sociedade, consciência coletiva.
 DAC: um individuo contra-produtivo, e não
improdutivo. Ter um lugar e uma identidade no
mundo, na sociedade, na família.
 QUEM DENTRO DE MIM ME IMPULSIONA HOJE?
 Padrões, quais processos arquetípicos presentes
nas diversas compulsões e dependências?
 Mensagens do inconsciente coletivo?
Transformações?

 Zoja (1992):
“herói negativo”- necessidade de
transcender sem se importar com o preço a pagar.
Mesmo que cause dano à sua saúde física e
emocional.
 Quando percebe que família e sociedade “giram ao
seu redor” o dependente estaria inserido “no papel
arquetípico do herói negativo.” (p.22)
 Jung não fala diretamente de dependências.

 Em “Estudos psiquiátricos” cita caso de uma


paciente que comprava muito, gastando
mais do que podia, sem se preocupar com a
sua situação financeira... Seria um caso de
compulsão por compras? (oniomania)
 Em relação alcoolismo, questiona se seria
um dos perigos da personalidade
extrovertida... Será?
 Bauer (1982, apud Fortim e Araújo, 2103):
“talvez seja mais frutífero buscar na obra de
Jung, os dinamismos arquetípicos que
expliquem melhor os padrões de
dependência em vez de procurar referências
específicas sobre a questão.” (p.13).
 DEFINIÇÃO DE FARMACODEPENDÊNCIA:

 OMS (1961) “...estado psíquico e algumas vezes físico,


resultante de interação entre um organismo vivo e uma
substância, caracterizado por modificações de
comportamento e outras reações que sempre incluem
um impulso a utilizar a substância de modo contínuo
ou periódico, com a finalidade de experimentar seus
efeitos psíquicos e, algumas vezes, de evitar o
desconforto da privação.
A tolerância pode estar presente ou não.”
Silveira Filho, 2002, p. 13.
 Silveira Filho, 2002 :
 Na história do dependente vemos
frequentemente a existência de:
** uma mãe simbiótica, ou,
** ambivalente, ao mesmo tempo superprotetora
e abandonadora.
 Nos relacionamentos com suas mães,
observamos que os dependentes tendem a
mantê-las à distância, às vezes valendo-se
mesmo de muita agressividade.
 A proximidade pode evocar uma sensação
de afastamento e de vazio.
 Imagem materna geralmente é carregada de
conotações fálicas e agressivas: aspecto
arcaico da mãe “não-humanizada”,
arquetípica.
 O distanciamento diminui a ameaça de
dissolução no inconsciente e permite,
juntamente com a droga, a preservação de
uma identidade, ainda que fragmentária.
(incesto urobórico)

 Dependente: possuído pelo símbolo, e,


paralisado na elaboração simbólica.
Figura paterna:

** Percebida como alguém que abdica de


seu papel, configurando-se como ausente
ou impotente.

** Imagem paterna vista, sentida, como


impactante, agressiva.

** Dificuldade de humanização da figura


masculina, geralmente pela ausência de
uma figura humana adequada.
 Dificuldades na organização egóica:

** Dinamismo Matriarcal.
** Dinamismo Patriarcal.

 Zoja: “ um modo de ser no mundo”.

 Família “necessitando” de um “bode


expiatório”.

 Família: não quer o bêbado, mas não


necessariamente o “alcoolista”, o dependente.
 Presente nas DAC:

 Criança abandonada, ferida, rejeitada...

 Dinamismos matriarcal e patriarcal: alterações,


fixações, dificuldades na transição, na ruptura,
manutenção de simbiose...

 Dinamismo arquetípico de Dionísio: identificação


dificultando elaborações dos matriarcais que
predominam aqui. Vivência estruturante
possibilita abertura de caminho para a criatividade
e ampliação de consciência.
(Palomo, 2006).
 Palomo (2006) coloca a respeito de Dionísio:
experiência de excesso e êxtase, contidos dentro de
rituais religiosos. Mito fala do êxtase e não de
dependências...
 Naifeh (1995, apud Fortim e Araújo, 2013) diz que
as dependências estariam relacionadas à regressão
ao arquétipo materno e à uma dificuldade em
saber lidar com o arquétipo paterno...
 Nos diversos autores também: aceitar a própria
sombra, integração de seus aspectos, e não sempre
projetar no “outro” é difícil...
 ONIOMANIA
 Compulsão por compras, dependência por compras,
comprar descontrolado, Shopaholic.
 Kraepelin e Bleuler – início séc. XX – foram os
primeiros a estudar esse comportamento.
 “O elemento particular é a impulsividade; eles não
podem evitá-la, o que algumas vezes se expressa
inclusive no fato de que, a despeito de terem uma
boa formação acadêmica, os pacientes são
absolutamente incapazes de pensar diferentemente e
de conceberem as consequências sem sentido de seu
ato e as possibilidades de não realizá-lo. Não chegam
nem a sentir o impulso...” “Impulso patológico."
( Silveira e Niel, 2016, p. 23)
 1990 retomada de interesse...(estudos)
 Dependência/ Obsessivo.
 Crônico e repetitivo, difícil de ser interrompido.
 Incapacidade de resistir a necessidade e urgência em
comprar.
 Angústia, ansiedade, irritação / aliviadas com o
comprar...
 Sensação de decepção e/ou desapontamento com si
mesmo, após a compra.
 Experiência solitária.
 Geralmente compras mais para si, e às vezes para
familiares ou amigos.
 Predominância sexo feminino (80%)
 Início adolescência, adulto jovem.
 Oniomania (compulsão por compras)
 Geralmente:
 Suprir carência infantil de afeto, presentes
compensadores pela falta de afeto das figuras
parentais.
 Compensar necessidades financeiras anteriores.
 Controle sobre o objeto, possuir. (contra-
rolar)(não deixar ir, fluir..._
 Sensação de vazio ser preenchida pelo excesso.
 Status – falsa sensação de nobreza.
 Necessidade de receber atenção, afeto, melhorar
autoestima.
 Ser um “rico” e carente...
 ACUMULADORES COMPULSIVOS
 Disposofobia – fobia em dispor das coisas.
 Aquisições excessivas e incapacidade de descartar
objetos, podendo resultar numa desordem que
debilita o indivíduo.
 Recolher de modo ilimitado, objetos de pouca ou
nenhuma utilidade, e as vezes deixados no lixo por
outros.
 Síndrome de Miséria Senil: pode acometer pessoas
com mais idade.
 Síndrome de Diógenes (de Sinope): filósofo grego,
vivia como um mendigo, recolhendo objetos da rua,
e que não tinham valor.
 Parece ser o 1º relato sobre acumulação compulsiva.
 Prejuízo emocional, social, financeiro, físico e as
vezes até problemas legais.
 Família: também, raiva, vergonha, dificuldade na
inter-relação familiar.
 Pode começar aos poucos, de um quarto para outro
– sala – cozinha – casa toda.
 Incapazes de organização de seu espaço de
convivência.
 Difícil o desapego.
 Dificuldade em decidir o que fazer, o que descartar,
pelo medo extremo de achar estar tomando
decisões erradas, jogando fora coisas que mais
tarde precisarão delas.
 Ansiedade alta: pensando no que descartar.
 Sensação de vazio e perda.
 Agressividade e irritabilidade.
 Depressão: só em pensar na limpeza.
 Animais: ter muito e não cuidar
adequadamente.(transtorno de acumulação de
animais).
 Quais vazios interiores que necessitam ser
preenchidos?
 Autoestima?
 Indivíduos acumuladores compulsivos podem ter
esses traços há tempos, e alguns traumas poderão
desencadear esse transtorno.
 Apresentam algumas diferenças na função cerebral.
 Segundo Tolin (in Ballone, 2013) quando essas
pessoas são estimuladas a descartar coisas, objetos,
cérebro deles geralmente manifestam ativação
excessiva no córtex, cingulado anterior...esta região
cerebral estaria envolvida na tomada de decisões,
principalmente as ações que envolvem informações
conflituosas e falta de certeza.
 Tb apresentam atividade elevada na insula, região
que monitora estados emocionais e físicos.

 “Essa região está envolvida em sensações como


nojo, vergonha e outras emoções “negativas” fortes.
Juntas, essas regiões ajudam o indivíduo a decidir a
importância dos objetos.”
(Tolin, 2012, apud Ballone, 2013)
 Ex de uma caso bem severo:
 Acumulação extrema ou hoarding – março 1947
 Nova York – policia chamada para investigar a
descoberta de um cadáver num edifício de 3
andares, no Harlem.
 Local pertencia a 2 irmãos idosos.
 Encontraram montanhas de lixo, até o teto, 14
pianos, um automóvel Ford, e um resto de um feto
com duas cabeças.
 Sistema de túnel para andar entre os objetos, e lá
estavam os corpos dos 2 irmãos, um morreu
esmagado e o outro por inanição.
(Ballone, 2013)
 A angústia que indivíduo sente nessas
compulsões e dependências, ocorre quando
há ausência ou insuficiência de elaboração
psíquica, levando o individuo a ficar
submetido a um afluxo de excitações, de
origem externa ou interna, que é incapaz de
dominar, provocando um estado de
desamparo psíquico.
 Existência de uma ação, pensamento ou
uma sequência complexa de
comportamentos, determinados por uma
força interna imperativa, incapaz de se
dominar, provocando um estado de
desamparo e, em alguns casos,
constrangimento, em outros, compensação e
alívio.
 Sociedade interferindo no – sujeito – dificultando
processo de individuação.
 “De um lado, esmagado pelo coletivo social, o
indivíduo vive um progressivo empobrecimento da
alma, pois as diversas instâncias psíquicas tendem
a não se comunicar e a incapacidade de
simbolização é a regra. A consciência nesse caso é
também limitada pelas possessões das ”
personalidades dissociadas “ sobre o eu. As
experiências vividas são mal elaboradas quando a
consciência está cindida e dominada por uma
única função”.
(Maroni, A. et al, 2005, pág. 33; apud Leal, 2006).
 SINTOMA – SIMBOLO – COMPLEXOS –
IMAGEM ARQUETÍPICA – ARQUÉTIPO.

 PREENCHER UM VAZIO INTERIOR, UMA


FERIDA INSACIAVEL!
 BALLONE, Geraldo J. Acumuladores compulsivos in: Psiqweb, Internet-disponível em
http://www.psiqueweb.med.br/2013.
 BORGES, M. Beatriz F.; OLIVEIRA, Marilene D.; SAMPAIO, Sonia M. D.; Di GIACOMO,
João Marcos da C. Entre 8 e 80, qual a medida certa? Os caminhos e descaminhos da
libido entre a obesidade e a magreza. Junguiana, nº 31/2, p. 23-32, 2013.
 FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 2ª ed.Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
 FORTIM, Ivelise; ARAUJO, Ceres A. Psicologia Analítica e as dependências, uma
revisão. Junguiana, n º 31/12, p.12-22, 2013
 KAST, V. Pais e Filhas Mães e Filhos. São Paulo: Edições Loyola, 1997.
 KALINA,E. Clínica e Terapêutica de Adicções.Porto Alegre: Artmed, 2001.
 JUNG, C. Gustav, Spiritum contra spiritum: a correspondência entre Bill Wilson e C.G.
Jung. Junguiana, nº 12, p. 10 – 13, 1994.
 JUNG, C. G. Fundamentos da psicologia analítica. Petrópolis: Vozes, 1972. Original
publicado em 1935.
 ––––––––– Estudos psiquiátricos. O.C., Vol 1, Petrópolis: Vozes, 1903/2012.
 __________ Tipos psicológicos. 5ª ed. O.C., Vol. 6 Petrópolis: Vozes, 1921/2012.
 –––––––––– O desenvolvimento da personalidade.12ª ed. O.C. Vol. 17. Petrópolis: Vozes,
1925/ 2012.
 PALOMO, Victor. Uma contribuição da psicologia analítica para a farmacodependências.
In:SILVEIRA, D. X.; MOREIRA, F.G Panorama atual de drogas e dependências. São Paulo:
Atheneu, v. 1, cap. 17, item 4, p. 234-239, 2006.
 ZOJA, Luigi. Nascer não basta. São Paulo: Axis Mundi, 1992.

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