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18/11/2019 Autopoiése do Direito - Âmbito Jurídico

    

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01/05/2010

Resumo: Com forte característica interdisciplinar, Niklas Luhmann partindo de conceitos extraídos
da matemática, física e biologia, desenvolve sua teoria dos sistemas sociais, onde um dos elementos
que a sustenta é a análise da autopoiése. Considerando a aplicação, com maior ênfase na América
Latina, dos conceitos de sua teoria no campo do jurídico, faz-se necessário uma maior aproximação
dos juristas Brasileiros as idéias de Luhmann e da autopoiése do direito. Trata-se de texto elaborado
objetivando transmitir uma visão geral dos conceitos básicos correlacionados a autopoiése e dos
sistemas sociais nos moldes de Niklas Luhmann.

Palavras-chaves: Niklas Luhmann; Autopoiése do Direito; Sistema Jurídico;

Sumário: 1. Origens; 1.1. Interdisciplinaridade; 2. Sistema; 2.1. Diferenciação Sistêmica; 2.2.


Sistema Aberto e Fechado; 3. Autopoiése; 4. Sistema jurídico autopoiético; 4.1. Comunicação; 5.
Conclusão. Bibliografia.

1. Origens

1.1.Interdisciplinaridade

Tendo inicialmente uma base conceitual marcada pela interdisciplinaridade, que vai além da
multidisciplinaridade, o entendimento da “autopoiese do direito” adota conceitos de áreas do
conhecimento anteriormente pouco interativas com a Sociologia.

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Da matemática foi importado o desenvolvimento do estudo da teoria dos conjuntos, com auxilio de
cálculo diferencial, os conjuntos finitos e infinitos.

Segundo Willis Santiago Guerra Filho[1],

“Essa via, tomada pela matemática, através da teoria dos conjuntos, de, por abstração, encontrar na
concretude de cada coisa a universalidade de todas as coisas, a unidade (do conjunto) na pluralidade
(dos elementos), é precisamente a mesma via para a qual aponta a dialética”.

A contribuição da matemática não se restringiu aos conjuntos, pois aliado a tais desenvolvimentos e
implicações, George Spencer-Brown detectando contradições no sistema axiomático e a necessidade
de construção de estruturas fundamentais em lógica e matemática, introduz uma nova classe de
números, os imaginários, implicando nova visão sobre os conceitos de matéria e tempo[2].

O desenvolvimento conceitual de números imaginários repercutiu além da matemática, alcançando a


física, filosofia, cibernética, psicologia, e biologia, essa última materializada na concepção de
autopoiese por dois biólogos chilenos, Humberto Maturana e Francisco Varela.

Os citados cientistas designaram como “autopoiese” a capacidade dos seres vivos de produzirem a si
próprios, em uma rede fechada de processos biológicos onde as moléculas produzidas por emio de
interações geram outras moléculas com a mesma capacidade das que as produziu. Assim, um sistema
vivo, sendo autônomo, estará constantemente se autoproduzindo, autorregulando, mediante interações
com o meio, sem contudo necessitar de estruturas externas.

Maturana e Varela (1973) introduziram o conceito de “autopoiese” para caracterizar os seres vivos,
enquanto sistemas que produzem a si próprios, sendo tal conceito estendido à teoria sociológica por
Niklas Luhmann.

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2. SISTEMA

Antes de prosseguirmos nessas breves considerações acerca da evolução científica influenciadora da


sociologia, faz-se necessário nos atermos, mesmo que momentaneamente, ao conceito e entendimento
de “sistema”.

A ciência tradicional procura validar seus conceitos por meio da criação de provas experimentais,
utilizando em geral artifícios de laboratório, enquanto que o método de validação sistêmico faz uso da
modelização, que se trata de construir um modelo simples que mostre um comportamento semelhante
ao da realidade observada.[3]

Conforme observa Marcio Pugliesi[4] quanto a modelização,

“(…) e isso pode ser feito por sucessivos ensaios e simulações, como é prática habitual nos estudos
econômicos e sociais contemporâneos.

Para modelizar uma realidade sistêmica, o que primeiro importa conhecer é o resultado do seu
funcionamento, ou seja, os seus objetivos (caso se trate de um sistema), funções (em um subsistema)
ou restrições (em um ecossistema). Os pormenores serão progressivamente conhecidos, mas numa
abordagem inicial podem permanecer vagos. Pelo contrário, a abordagem clássica da realidade
começa por se inteirar dos pormenores, mas despreza completamente os objetivos de um sistema, até
mesmo por evitar a teleologia e preocupar-se, primariamente, com as previsões em um estado de
incerteza estruturada”.

O mesmo autor indica que,

“De acordo com Von Bertalanfly, o criador da Teoria do Sistema Geral, sistema é o ‘conjunto de
unidades em inter-relações mútuas’. Para Morin, o sistema é ‘uma inter-relação de elementos que
constituem uma entidade ou unidade global. Outras definições poderiam ser apresentadas, mas o que

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interessa reter é que a noção de sistema engloba sempre duas idéias: relação e organização. Num
sistema, os seus elementos relacionam-se e, assim, adquirem uma organização, uma totalidade que
revela a regra do sistema” [5].

A teoria sistêmica é dotada de uma universalidade e reflexividade.

“Por pretender uma universalidade, de tudo poder explicar, a teoria de sistemas há de, por si mesma,
explicar a si própria. Isso lhe confere uma terceira característica, que é também atribuída aos sistemas
por ela estudados: a auto-referência.” [6]

Ainda na formação da teoria sistêmica aplicada a sociologia, Luhmann desenvolveu alguns conceitos
de Talcott Parsons[7] que estabeleceu uma “teoria da ação” baseada no esquematismo fim/meio –
componente “ação” – de Weber, e o componente “sistema” de Durkheim.

Especificamente quanto a teoria da ação, em apertado resumo, Parsons estruturando o funcionalismo


estrutural esboça uma construção teórica visualizada nos “diagramas cruzados”.

2.1. Diferenciação Sistêmica

Segundo Willis Santiago Guerra Filho (GUERRA FILHO, 2009, p.208) a teoria dos sistemas deve
poder tudo explicar utilizando o sistema (auto-referência) e o que não é sistema, ou seja, o meio
circundante ou ambiente.

A sociedade e sua complexidade intrínseca estimula a diferenciação entre ambiente e sistema, este
por sua vez em diversos sistemas, ou subsistemas.

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“A ‘diferenciação sistêmica’ entre ‘sistema’ e ‘ambiente’ é o artifício básico empregado pela teoria,
diferenciação essa que é trazida ‘para dentro’ do próprio sistema, de modo que o sistema total, a
sociedade, aparece como ‘ambiente’ dos próprios sistemas parciais, que dele (e entre si) se
diferenciam por reunirem certos elementos, ligados por relações, formando uma ‘unidade’.”
(GUERRA FILHO, 2009, p.208).

Considera-se um sistema como unidade baseado na organização, que se mantida invariante, mantém
o sistema. O que pode variar são seus elementos componentes desse sistema. Para a organização o
que importa é o tipo peculiar de relação entre os elementos, já para as estruturas o que importa é que
haja elementos em interação, fornecidos pelo meio ao sistema[8].

A concepção sistêmica, nos moldes apresentados por Luhmann,

“pretende explicar os padrões recursivos das interações entre os atores sociais, os quais formam
sistemas de comunicações, que, na realidade, constituem a própria natureza das sociedades”.[9]

2.2. Sistema Aberto e Fechado

Outro aspecto desenvolvido por Niklas Luhmann foi a adoção de um modelo de sistema aberto, em
substituição ao usual modelo fechado[10].

Importando conceitos da física, economia, biologia, mecatrônica, entre outros, e aplicando-os a


sociologia, importantes conceitos foram adaptados como entropia (que faz com que os sistemas
estabeleçam um processo de troca entre sistema e meio) e intercâmbio. Nesse aspecto o sistema deve
ter capacidade de se distinguir do meio, sendo capaz de combinar todas as possibilidades de
operações, existindo sistemas que podem observar e distinguir, ou seja, com capacidade de
diferenciação dos sistemas e meio.

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Ocorre que no sistema social, no modelo de Luhmann, ele é fechado operacionalmente, enquanto
geram e produzem internamente seus próprios elementos de funcionamento sem a interferência ou
influência de elementos externos, mas abertos enquanto realiza intercâmbio entre sistema e meio
mediante irritações externas.

Esquematicamente é como se fosse uma homeostase, onde ora o sistema permanece aberto recebendo
estímulos, irritações, do ambiente, buscando equilíbrio dinâmico por meio da diminuição de conflitos
regular o ambiente interno, ora comporta-se como sistema fechado por não necessitar de elementos
externos para sua auto-regulação, mas tão somente, enquanto aberto, para estímulo a sua regulação.

Conforme Marcelo Pereira de Mello[11]

“a idéia de que o sistema legal constitui um sistema fechado não deve obscurecer o fato de que todo
sistema mantém conexões com seu ambiente. Luhmann formula essa concepção da seguinte maneira:
o sistema legal é aberto porque é fechado e é fechado porque é aberto. (…) O autor, com esse
paradoxo, quer expressar a forma particular do relacionamento entre o sistema legal e o ambiente
societário. Como afirma, o sistema legal tem seu componente e sua forma própria de expressão: a
norma; o seu modo próprio de operação, o código lícito e ilícito. Pode haver influência política na
legislação, mas somente a lei pode modificar a lei. Somente dentro do sistema legal a mudança das
normas legais pode ser percebida como mudança da lei (cf. Luhmann, 1986, p.113). Ao que
acrescente: é sempre uma norma que decide quais fatos têm relevância legal ou não. Nesse sentido, o
sistema legal é um sistema normativamente fechado”.

Ao mesmo tempo em que considera o sistema “normativamente fechado”, ao estabelecer que


somente a norma que decide a relevância legal, o sistema jurídico é “cognitivamente aberto” na
medida em que é estimulado pelas informações do ambiente e em contínua adaptação às exigências
do ambiente.

Luhmann denomina de “dupla contingência dos sistemas” o fato de eles operarem de maneira fechada
normativamente e ao mesmo tempo operam de maneira aberta cognitivamente, “na qual a assimetria
entre o sistema e seu ambiente os força a uma recíproca adaptação e mudança”[12].

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Assim os sistemas legais apresentam uma combinação de disposições normativas e cognitivas,


estabelecendo condicionalidades para a introdução no sistema dos estímulos do ambiente, ou
irritações.

“Nesse sentido, as normas legais, diferentemente das concepções de Kelsen e Durkheim, não derivam
de uma ordem legal factual nem de uma norma fundamental, mas são ‘programas de
condicionalidades’ para a introdução no sistema dos estímulos (informações) do ambiente”.[13]

3. AUTOPOIÉSE

Tomando as premissas já citadas, desenvolvendo aspectos da biologia, estabelece com conceito


fundamental a autopoiesis[14], ou seja, a autoreprodução[15] da vida, por meio de elementos que são
reproduzidos pela vida. Aplicando a sociologia, é dizer que a reprodução os elementos e estruturas do
sistema é realizada com ajuda de seus próprios elementos. Essa característica é responsável por um
aumento constante de possibilidades até que a complexidade atinja limites intoleráveis pelo sistema,
levando-o a mudar sua forma de diferenciação.

Sendo o sistema estabelecido por Luhmann um sistema complexo, contém mais possibilidades do que
pode realizar num dado momento, portanto é capaz de fixar seus próprios limites ao diferenciar-se do
ambiente (capacidade de distinguir sistema e meio), limitando as possibilidades no seu interior.
Porém, como forma de evolução objetivando o enfrentamento com o ambiente, que por meio
“perturbação” ao sistema (denominado também de irritação) serve de estímulo a mudança da
estrutura, dependendo da tolerância do sistema. Assim, graças a sua capacidade de produzir a si
mesmo, autopoiese, evolui e responde ao meio na medida que entende necessário[16].

Nas palavras de Niklas Luhmann[17]:

“a Teoria dos Sistemas foi se constituindo em um sistema de auto-observação, recursivo, circular,


autopoiético, dotado de uma dinâmica intelectual própria e fascinante, (…)”

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Em resumo temos que o sistema é uma organização autopoiética e essa contém estruturas muito
diversas, dependendo do tipo de sistema, podendo reagir a irritação e estímulos provenientes do meio
ou de autoirritação. Desses aspectos extrai-se que:

“É possível dizer, então, que a seleção de acontecimentos ocorridos no meio – e capazes de produzir
efeitos no sistema – é condição de possibilidade para que o sistema, com esse espectro tão
seletivamente apurado, possa empreender algo.” [18]

Baseado na teoria da redução de complexidade[19] na qual o sistema desenvolve um modelo de


reação padrão, frente a dados distintos provenientes do meio, porém, a um mesmo estímulo oriundo
do meio, o sistema pode reagir diferentemente, dependendo do estado em que se encontre. Assim,
segundo Luhmamm[20] “nas crises, pode-se fazer o inabitual: mudar estruturas em situações em que
normalmente não se transformariam”.

Conforme Willis Santiago Guerra Filho[21],

“Sistema autopoiético é aquele dotado de organização autopoiética, em que há a (re)produção dos


elementos de que se compõe o sistema e que geram sua organização pela relação reiterativa
(“recursiva”) entre eles. Esse sistema é autônomo porque o que nele se passa não é determinado por
nenhum componente do ambiente mas sim por sua própria organização, isto é, pelo relacionamento
entre seus elementos. Essa autonomia do sistema tem por condição sua clausura, quer dizer, a
circunstância de o sistema ser ‘fechado’, do ponto de vista de sua organização, não havendo
‘entradas’ (inputs) e ‘saídas’ (outputs) para o ambiente, pois os elementos interagem no e através
dele, que é ‘como o agente que conecta as extremidades do sistema (como se fosse uma gigantesca
sinapse) e o mantém fechado, autopoiético’.”

Maturana criou uma abordagem sistêmica aplicável em pesquisas biológicas de tal maneira que
impede a extensão a estudos sociológicos sem certos ajustes adaptativos. Para ele os sistemas sociais,
assim como na biologia, as relações devem se dar por meio de acoplamentos estruturais, ou seja,
interações mútuas entre sistemas, num ambiente redundante, fechado, conseqüentemente com

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condutas comunicativas. Dessa característica uma conduta desviante é uma conduta não-
comunicativa, e para Muturana só há relacionamento social quando se dêem relações de aceitação
mútua, devendo haver para tanto uma congruência espontânea na conduta dos indivíduos que o
integram.

O biólogo chileno desenvolve suas observações em sistemas vivos, autopoiéticos enquanto sistema,
mas também com essa característica em cada elemento seu, e esses elementos, reunidos em unidades
formam o sistema.

Para Luhmann, os elementos o são apenas para os sistemas, que os empregam como unidades, e eles
existem apenas enquanto parte de um sistema, “teoreticamente diferenciados do seu meio, e que dessa
forma produziria e reproduziria, reflexiva e auto-referencialmente, seus elementos, enquanto
autopoiético” [22].

Assim, enquanto que para Maturana a autopoiése dá-se ao nível de elementos, que se autoproduzem,
em Luhmann isso ocorre ao nível de sistema, “que autoproduziria seus elementos, a unidade
formadora por ele e, logo, também a si mesmo” [23].

Diferente dos sistemas vivos, sistemas sociais teriam ao invés de elementos vivos, significações,
pensamentos, etc., apenas elementos comunicativos, comunicações, que produzem outras
comunicações, não existem no ambiente mas só no sistema social (sociedade), enquanto sistema
comunicativo global. Nesse “macro sistema” o sistemas parciais, ditos “sistemas funcionais”,
aparecem como ambiente uns para os outros.

Assim o que não é ambiente é sistema, enquanto que os subsistemas, ou sistemas parciais/funcionais,
são considerados ambiente em relação aos demais por estarem externos a esses, ainda que sejam
partes do macro sistema (sistema social). Essa relação é esquematicamente apresentada abaixo, de
maneira bastante simplificada.

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Nos sistemas sociais é fundamental a presença de um mecanismo de auto-observação que traria para
dentro dele a diferença sistema/ambiente.

“Para Gunther Teubner, (…) para estudar a sociedade como um sistema comunicativo autopoiético,
há que se lançar mão de um conceito de ‘autopoiese’ em que esta não seria ‘um processo cego, como
para Maturana, mas sim uma combinação de autoprodução e auto-observação”.[24]

Luhmann propõe substituir o funcionalismo estrutural (ou funcionalismo da manutenção das


estruturas, que tem origem nos estímulos de estudos etnológicos e social-antropológicos), de raízes
ontológicas e que, a seu ver, continha uma série de limitações, por um consistente em equivalências
funcionais. Conforme Javier Torres Nafarrate[25], “o equifuncionalismo é o conceito para designar
um método, que, para resolver problemas, desenvolve uma especial sensibilidade frente a diferentes
soluções equivalentes”.

Unida a essa alteração do funcionalismo, de estrutural para funcional (mais tarde denominado de
sistêmico) aprimorou e adaptou a teoria da ação, de Talcott Parsons[26], cujas obras influenciou de
uma maneira ou outra o sistema de Luhmann.

Nesse aspecto é interessante a reprodução do texto de Luhmann[27]:

“Assim, a teoria da ação se apresenta mais orientada para o indivíduo na qualidade de sujeito e,
dessa maneira, a sociologia se abre à possibilidade de integrar aspectos psíquicos e orgânicos daquele
que age; em contrapartida, emprega-se a teoria do sistema para designar realidades de grande escala
(macrossociais), de modo a conservar seu caráter de elevada abstração.” (grifo nosso).

Dessa forma expressamente Luhmann estabelece um distanciamento das relações inter-pessoais, ou


microrelações, tomando como princípio a grande escala da teoria do sistema, fator preponderante para
não só a própria fundamentação teórica de sua teoria mas, para outros temas do direito
contemporâneo, como por exemplo a incorporação a base filosófica do ‘direito penal do inimigo’.[28]

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4. SISTEMA JURÍDICO AUTOPOIÉTICO

O sistema jurídico é considerado um dos “sistemas funcionais”, ou sistemas parciais, do sistema


social global, com a tarefa de reduzir a complexidade do ambiente por meio da absorção do
comportamento social.

“O sistema jurídico, para Luhmann, integra o ‘sistema imunológico’ das sociedades, imunizando-as
de conflitos entre seus membros, surgidos já em outros sistemas sociais (político, econômico,
familiar, etc). (…) Para tanto, a complexidade da realidade social, com sua extrema contingência, é
reduzida pela construção de uma ‘para-realidade’, codificada a partir do esquematismo binário
‘direito/não-direito’ (ou ‘lícito/ilícito), em que se prevêem os conflitos que são conflitos para o
Direito e se oferecem as soluções que são conformes ao Direito”. [29]

O fechamento operacional, e a autopoiése do sistema, dá a este a possibilidade de se desenvolver


dinamicamente[30]. Assim o desenvolvimento do Direito se dá reagindo apenas aos seus próprios
impulsos, mas estimulado por “irritações” do ambiente social.

“O sistema jurídico, enquanto autopoiético, é fechado, logo, demarca seu próprio limite, auto-
referencialmente, na complexidade própria do meio ambiente, mostrando o que dele faz parte, seus
elementos, que ele e só ele, enquanto autônomo, produz, ao conferir-lhes qualidade normativa
(=validade) e significado jurídico às comunicações que nele, pela relação entre esses elementos,
acontecem”.[31]

Considerando o Direito como capaz de se autoproduzir, portanto o sistema jurídico como


autopoiético, há a necessidade de elementos do meio ambiente.

Hans Kelsen (Teoria pura do direito) falando sobre sistemas estático e dinâmico na ordem jurídica,
estabelece que um há “normas regulando normas” e no outro “condutas produzindo normas”.
Adaptando esse raciocínio ao sistema jurídico – sob a teoria dos sistemas sociais – teríamos as

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condutas como elementos provenientes do meio, ou de outro sistema, que irritam o sistema jurídico,
fazendo com que haja uma seletividade (por meio da seleção dentre as diversas possibilidades de agir
– denominado por Luhmann de dupla seletividade) gerando uma reação do sistema jurídico que
resulta na produção de uma norma, essa sim regula a conduta.

“O sistema (jurídico) é autopoiético e diferenciado de outros, pois estabelece conexões que conferem
sentido (jurídico) a condutas referidas, assim, umas às outras e delimitadas, no sistema, em relação ao
ambiente”.[32]

Quando, por exemplo, a conduta que gerou a reação do sistema jurídico ao produzir uma norma
reguladora do sistema social, é proveniente de outro sistema, fala-se na necessidade de realizar o
acoplamento estrutural do sistema jurídico com outros sistemas sociais, como o político, econômico,
etc. Nesse contexto a constituição é a grande responsável pelo acoplamento estrutural ente os
sistemas jurídico e político[33].

A caracterização do sistema jurídico como um sistema social autopoiético se faz por meio da
identificação de sua especificidade na realização da forma exclusiva com que nesse sistema, o
Direito, se veiculam comunicações.

“Note-se que a autonomia do sistema jurídico não há de ser entendida no sentido de um isolamento
deste em face dos demais sistemas sociais, o da moral, religião, economia, política, ciência, etc.,
funcionalmente diferenciados em sociedades complexas como as que se têm na atualidade. Essa
autonomia significa, na verdade, que o sistema jurídico funciona com um código próprio, sem
necessidade de recorrer a critérios fornecidos por algum daqueles outros sistemas, aos quais, no
entanto, o sistema jurídico se acopla, através de procedimentos desenvolvidos em seu seio,
procedimentos de reprodução jurídica, de natureza legislativa, administrativa, contratual e,
principalmente, judicial”.[34]

“Autonomia não significa ‘autarquia’, nem ‘autismo’. Autonomia, nesse contexto, significa apenas
que o sistema jurídico funciona com o seu próprio código (binário), ou seja, que na determinação do
que seria lícito e juridicamente correto (Recht) ou ilícito e juridicamente incorreto (Unrecht) não há

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necessidade de importar critérios de outros sistemas, mesmo estando eles conectados ao sistema
jurídico, através de procedimentos de várias espécies – legislativos, administrativos, contratuais e,
especialmente, judiciais –, que são de fundamental importância para as operações dentro dos sistemas
de auto-reprodução judicial (=operarational closeness, operative Geschlossenheit). A autonomia do
sistema e seu fechamento operacional são condições de possibilidade de sua conexão com outros
sistemas, ou seja, de sua ‘abertura’ (Offenheit) cognitiva”.[35]

4.1. Comunicação

A teoria dos sistemas sociais autopoiéticos substitui a oposição epistemológica ‘sujeito/objeto’ pela
diferenciação funcional ‘sistema/objeto’ e “considera como seu objeto não o ser humano, mas o
intercâmbio de comunicação.

Em Parsons “o ser humano não é analisado no âmbito da antropologia, mas sim visto sob a
perspectiva da ação. Consequentemente, a unidade do ser humano aparece desmembrada e percebem-
se fortemente os componentes do ser humano que sustentam a ação”.

Para Luhmann, mesmo não ignorando que as condutas sociais sejam praticadas pelo homem, não os
insere no sistema social. Tal exclusão põe em relevo a principal distinção do sistema social dos
demais: as comunicações que só se realizam dentro do sistema, e não a presença humana.[36]

A importância dada a comunicação para o sistema e conseqüente desconsideração do homem,


individualmente considerado, tem sido uma das críticas contra o sistema apresentado por Luhmann.

Esse entendimento é primordial para a compreensão do mecanismo do direito, sobretudo o penal


contemporâneo: conforme devido a um estímulo do meio, ou seja, uma irritação causada por quem
não é considerado integrante da ‘pacífica e ordeira’ convivência social nos moldes estabelecidos por
quem detém o poder, gera uma resposta inabitual do meio. Nesse ambiente situa-se a explicação
Luhmanniana quanto ao direito penal de emergência e as mais variadas reações, normalmente
drásticas e inusitadas.

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Diferentemente da teoria da ação, na qual a comunicação é entendida como o êxito ou o fracasso da


transmissão de uma informação, na teoria dos sitemas o que é enfatizado é a verdadeira emergência
da comunicação. Considerando a comunicação como única operação genuinamente social, a teoria
dos sistemas considera que “a função da comunicação reside em tornar provável o altamente
improvável: a autopoiesis do sistema de comunicação, denominado sociedade”[37].

Sendo a comunicação o principal foco do sistema social, essa é forma de interação sistema e meio, e
de estruturação interna com relação aos subsistemas, Luhmann toma como foco de estudo justamente
essa diferença entre sistema e ambiente. Segundo esse foco, a sociedade não é constituída de pessoas
e de relações entre pessoas, mas a sociedade seria constituída exclusivamente de comunicação. As
pessoas estão no ambiente do sistema social, sendo, portanto um subsistema, denominado sistema
psíquico.

É estabelecido alguns sistemas entre eles os: não-vivos, incapazes de produzirem a si mesmos (não
autopoieticos, ou allopoietico – depende de interferência externa); vivos, compostos de operações
vitais, responsável pela manutenção do sistema – células, animais, corpo humano, etc; psíquicos,
formado pela consciência e composto de pensamento (autopoiético); e por fim os sociais, composto
de comunicação.

O poder é exercido numa ameaça de sanção, por meio da comunicação. Assim o sistema político vai
selecionar somente as informações que sirvam para manter o governo no poder, ou seja, que sirvam
para que o ambiente continue obedecendo às decisões políticas.

5. CONCLUSÃO

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Considerando a natureza do trabalho ora apresentado, formulado para dar arcabouço introdutório ao
tema abordado e tendo em vista a necessidade da exposição de maneira resumida a autopoiese do
direito, torna-se incongruente uma conclusão nos moldes de um trabalho mais denso (monográfico
acadêmico).

Porém, destacam-se alguns importantes aspectos citados no decorrer deste trabalho, entre eles:

1. A relação do sistema com o meio é semelhante a homeostase, onde ora o sistema permanece aberto
recebendo estímulos, irritações, do ambiente, buscando equilíbrio dinâmico por meio da diminuição
de conflitos regular o ambiente interno, ora comporta-se como sistema fechado por não necessitar de
elementos externos para sua auto-regulação, mas tão somente, enquanto aberto, para estímulo a sua
regulação. Ao mesmo tempo em que considera o sistema “normativamente fechado”, ao estabelecer
que somente a norma que decide a relevância legal, o sistema jurídico é “cognitivamente aberto” na
medida em que é estimulado pelas informações do ambiente e em contínua adaptação às exigências
do ambiente.

2. o destaque de premissas centrais introduzidas por Luhmann: sociedade não consiste em pessoas,
mas em comunicação, de maneira autopoiética, e deve ser entendida como sistema mundial.[38]

3. As atuais severas críticas a centralização da visão de Luhmann na comunicação e conseqüente


deslocamento do homem do centro da sociedade.[39]

4. a utilização da teoria dos sistemas sociais de Luhmann, sobretudo quanto a autopoieses do direito,
nas mais variadas áreas das ciências sociais.

Bibliografia

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PUGLIESI, Márcio. Teoria do direito. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 57.

Notas:

[1] GUERRA FILHO, W. S.. Teoria da Ciência Jurídica. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 197.

[2] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 202.

[3] PUGLIESI, Márcio. Teoria do direito. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 57.

[4] PUGLIESI. Op. cit., p. 57.

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[5] PUGLIESI. Op. cit., p. 58.

[6] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 208.

[7] Nos dizeres de Luhmann (op. cit., p. 58): “deve-se agradecer a Parsons por ter dado visibilidade à
arquitetura teórica, já que graças a ela pode-se julgar o que é possível empreender com a teoria, e
ainda criticá-la”.

[8] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 208.

[9] MELLO, Marcelo Pereira de. A perspectiva sistêmica na sociologia do direito: Luhmann e
Teubner. Tempo Social – Revista de Sociologia. USP. São Paulo, v. 18, n.1, p. 351-373, junho.2006,
p. 353.

[10] Modelo fechado no qual não sofre interferência de elementos externos.

[11] MELLO. Op. cit., p. 355.

[12] MELLO. Op. cit., p. 356.

[13] MELLO. Op. cit., p. 356.

[14] O sistema tem estrutura mutável, criando subsistemas como forma de evolução objetivando o
enfrentamento com o ambiente. Essa evolução depende do estímulo do ambiente, que, conforme a
tolerância do sistema, esses estímulos podem levá-lo a mudar suas estruturas. Essa capacidade de
produzir a si mesmo é denominada de autopoiese.

[15] Autopoiese vem do grego auto “próprio”, e poiesis “criação”, daí o seu uso como sinônimo de
autoprodução ou autocriação, conforme a aplicação dada.

[16] Segundo Luhmann (op. cit.,p. 126) “um sistema vai se tornando paulatinamente autopoiético e,
neste sentido, depende, em princípio, mais do meio, e logo adquire a autonomia. Portanto, as
estruturas estariam primeiramente determinadas pelo meio, e depois, pouco a pouco, desenvolveriam
suas próprias operações”.

[17] LUHMANN. Op. cit., p. 79.

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18/11/2019 Autopoiése do Direito - Âmbito Jurídico

[18] LUHMANN. Op. cit., p. 132.

[19] Incorporado da escola de psicologia funcionalista de Egon Brunswik (1952).

[20] LUHMANN. Op. cit., p. 180.

[21] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 209.

[22] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 211.

[23] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 211.

[24] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 212.

[25] Comentário em nota de rodapé da obra: LUHMANN, Niklas. Introdução à Teoria dos Sistemas.
Trad. Ana Cristina Arantes Nasser. Petrópolis: Vozes, 2009, p. 37.

[26] Parsons extrai de Max Weber o componente da ação e de Émile Durkheim o sistêmico. Parsons,
segundo análise de Luhmann, entende que a ação é uma propriedade emergente da realidade social,
denominando essa relação de realismo analítico, onde (por meio dos diagramas cruzados) o ser
humano não é analisado no âmbito da antropologia, mas sim visto sob a perspectiva da ação.

[27] LUHMANN. Op. cit., p. 42.

[28] ALFERES, Eduardo Henrique. Abolicionismo e terceira velocidade do Direito Penal.


Conclusões à vista das posições básicas de uma e outra corrente. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n.
2448, 15 mar. 2010. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14518>. Acesso
em: 17 abr. 2010.

[29] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 212.

[30] NEVES, Rômulo Figueira. Acoplamento estrutural, fechamento operacional e processos


sobrecomunicativos na teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann. 2005. 149f. Dissertação
(Mestrado em Sociologia). Universidade de São Paulo – USP. São Paulo. 2005.

[31] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 215.

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[32] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 219.

[33] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 220.

[34] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 224.

[35] GUERRA FILHO. Op. cit., p. 231.

[36] AGUIAR, Tatiana. Proposta de Interpretação para os atos elisivos: dialogando com a filosofia
da Linguagem e com a Teoria dos Sistemas. 2008. 253f. Dissertação (Mestrado em Direito).
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP. São Paulo. 2008, p. 121. Segundo a autora:
“o homem dentro do sistema psíquico apenas irrita o sistema social, para que este, no seu interior,
realize comunicação”.

[37] LUHMANN. Op. cit., p. 306.

[38] “Luhmann introduz três premissas em sua análise da sociedade que produziram não apenas
críticas vigorosas, mas também muita incompreensão, a ponto de ser acusado de ter um pensamento
anti-humanista e cínico: 1. A sociedade não consiste de pessoas. Pessoas pertencem ao ambiente da
sociedade. 2. A sociedade é um sistema autopoiético que consiste de comunicação e mais nada. 3. A
sociedade só pode ser adequadamente entendida como sociedade mundial” (BECHMANN, Gotthard;
STEHR, Nico. Niklas Luhmann. Tempo Social – Revista de Sociologia, USP, São Paulo, n. 13, p.
185-200, nov. 2001, p. 192).

[39] Conforme BECHMANN e STEHR: “O banimento das pessoas para o ambiente da sociedade
completa a descentralização da cosmologia humanista. Tendo sido retirada do centro do universo na
Renascença, desprovida de sua origem única ao ser colocada no contexto da evolução por Darwin, e
desnudada de sua autonomia e autocontrole por Freud, o fato da humanidade agora ser libertada das
amarras da sociedade por Luhmann parece ser uma extensão consistente dessa tendência. Enquanto a
tradição clássica européia, com sua distinção entre humanos e animais, dotava os humanos de sentido,
razão, vontade, consciência e sentimentos, a separação inexorável dos sistemas mentais e sociais que
Luhmann substitui por homo socialis deixa claro que a sociedade é uma ordem sui generis emergente,
que não pode ser descrita em termos antropológicos. A sociedade não tem o caráter de um sujeito –
nem mesmo no sentido enfático transcendental, como uma condição da possibilidade de idéias
subjacentes definitivas ou de mecanismos de qualidades humanas. Não é um endereço para apelos
humanos de ação, e certamente não um lugar para reinvindicar igualdade e justiça em nome de um
sujeito autônomo. A sociedade é a redução comunicativa definitive possível que separa o

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indeterminado do que é determinável, ou o que é processável da complexidade improcessável” (op.


cit., p. 192).

Informações Sobre o Autor

Eduardo Henrique Alferes

Mestre em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Pós-graduado
em Direito Penal pela Escola Superior de Advocacia (ESA/OABSP). Pós-graduado em Direitos
Humanos e Direito Internacional Humanitário. Especialista em Justiça e Sistema Criminal pela
Universidade de São Paulo (USP).Professor universitário com docência em Direito Penal, Direito
Processual e Penal Militar, e Direitos Humanos.

Direito Penal Revista 76

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