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PRINCÍPIOS LIMITADORES DO PODER PUNITIVO ESTATAL

CRIMES EM ESPÉCIE
São os princípios fundamentais de direito penal em um Estado Democrático de Direito, as
garantias do homem contra o poder punitivo do Estado e estão albergados na Constituição Federal
brasileira no artigo 5º.
Possuem função de orientar o legislador ordinário para elaborarem leis conforme impõe a
Constituição, com funções garantistas, alicerçado na teoria da culpabilidade. (Bitencourt, p. 10) O
legislador ordinário não pode atuar com um poder legiferante despótico, criando leis desligadas dos
valores constitucionais. (Estefan e Gonçalves, p. 147)

a) Princípio da Legalidade - reserva legal


Busca controlar o poder estatal punitivo, a fim de eliminar injustiças cometidas por qualquer
arbitrariedade. Fuerbach, no início do século XIX consagrou o princípio da reserva legal pela fórmula
latina nullum crimen, nulla poena sine lege.
O princípio da reserva legal não admite desvios nem exceções e representa uma conquista da
consciência jurídica que obedece a exigência de justiça, que somente os regimes totalitários o têm
negado. (Cairoli, apud Bitencourt, p. 10)
Há previsão constitucional deste princípio no artigo 5º, XXXIX, estabelecendo que “não haverá
crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Impõe o princípio em
estudo que a elaboração de leis incriminadoras deva ser realizada exclusivamente pela lei, ou seja,
nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena pode ser aplicada sem que antes do fato
exista a lei tipificando o fato como crime e a respectiva pena.
Ainda, deve ser originada da União, conforme impõe artigo 22, I, todavia, poderá delegar aos
Estado dependendo de lei complementar inteligência do artigo 22 PU CF
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Estado, dependendo de lei complementar, inteligência do artigo 22, PU, CF.
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Jurisprudência:

​ Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para trancar ação penal
A
contra dois homens que foram presos e denunciados sob a acusação de adulterar a placa de um
veículo semirreboque frigorífico. Seguindo o voto da relatora, ministra Laurita Vaz, o colegiado entendeu
que o artigo 311 do Código Penal – que trata da adulteração de identificação de veículo automotor –
não se aplica a semirreboques. "Desse modo, constata-se que a conduta imputada aos recorrentes –
adulteração de placa de semirreboque – é formalmente atípica, pois não se amolda à previsão do artigo
311, caput, do Código Penal, de modo que, em atenção ao princípio da legalidade, é de rigor o
trancamento da ação penal quanto ao delito em análise", decidiu a relatora. (ST/HC98058)

b) Princípio da intervenção mínima


O princípio da legalidade limita a atuação judiciária, todavia, não inibe a intervenção do legislador
para criar qualquer tipo de norma, inclusive para fatos insignificantes. Diante disso surge a
importância do princípio da intervenção mínima, chamado de ultima ratio, o qual impõe limites ao
legislador, limitando o poder punitivo do Estado, pois, a criminalização de uma conduta só se legitima
se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. (Bitencourt, p. 11)
A eleição de uma conduta como criminosa somente se legitima se for para proteger um bem
jurídico quando outros ramos do direito, como as medidas civis e administrativas, não forem
suficientes para tal proteção. Por isso o direito penal, considerado como ultima ratio, assume posição
subsidiária (princípio) justificando-se sua intervenção quando somente outras formas jurídicas não
forem suficientes para proteger os bens jurídicos.
Antes de aplicar uma lei penal e sua respectiva pena, deve-se atentar para a utilização de meios
extrapenais de controle social. Os legisladores contemporâneos de primeiro e terceiro mundo abusam
do uso do direito penal, criminalizando muitas condutas, desnecessariamente, em contradição com a
intervenção mínima, levando ao descrédito a lei e a sanção penal, por perder sua força intimidativa
diante da inflação legislativa. (Bitencourt, p. 11). O Direito Penal tem sido utilizado como prima ratio na
tentativa de solucionar conflitos sociais no lugar do uso de outros meios de controle social.

Jurisprudência:

Furto de água vitimando a companhia de abastecimento. Ressarcimento do prejuízo antes do


oferecimento da denúncia. Colorido meramente civil dos fatos. Carência de justa causa. Trancamento
da ação penal. Viabilidade. Princípio da intervenção mínima. Princípio da fragmentariedade. Princípio
da subsidiariedade. CPP, art. 647. CF/88, art. 5º, LXVIII. CP, art. 155. O Direito Penal deve ser encarado
de acordo com a principiologia constitucional. Dentre os princípios constitucionais implícitos figura o
da subsidiariedade, por meio do qual a intervenção penal somente é admissível quando os demais
ramos do direito não conseguem bem equacionar os conflitos sociais. In casu, tendo-se apurado, em
verdade, apenas um ilícito de colorido meramente contratual, relativamente à distribuição da água, com
o equacionamento da quaestio no plano civil, não se justifica a persecução penal. (STJ/HC)

c) Princípio da fragmentariedade
Trata-se de princípio corolário dos princípios da reserva legal e intervenção mínima, pois nem
todas lesões a bem jurídicos são crimes, uma vez que nem todos os bens jurídicos são albergados
l di i l O di i ld
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pelo direito penal. O direito penal deve proteger os bens jurídicos mais importantes contra agressões
graves. @prof.joaobittenocurt
O caráter fragmentário se dá no momento em que o direito penal se ocupa apenas de uma parte
dos bens jurídicos protegidos pela lei. O caráter fragmentário do direito penal determina que não se
devem sancionar todas as condutas lesivas aos bens jurídicos, somente aquelas mais graves e mais
perigosas. Cabe ao direito penal atribuir relevância somente a pequenos fragmentos de ilicitude.
Existem inúmeras condutas que contrariam o arcabouço jurídico, todavia, somente uma parcela
interessa ao direito penal, são as mais graves, que atentam aos bens mais relevantes para a vida em
sociedade. (ESTEFAN e GONÇALVES, p. 138)
Jurisprudência
(Recurso especial. Descaminho. Princípio da insignificância. Valor do tributo iludido. Parâmetro de
R$ 10.000,00. Elevação do teto, por meio de Portaria do ministério da fazenda, para R$
20.000,00. Instrumento normativo indevido. Fragmentariedade e subsidiariedade do
direito penal. Inaplicabilidade. Lei penal mais benigna. Não incidência. Recurso provido). (STJ)

d) Princípio da subsidiariedade
Corolário do princípio da intervenção mínima, determina que o direito penal não possa ser
utilizado a não ser quando se confrontar com um fato grave que atente contra a paz e o convívio
social. Portanto, havendo norma extrapenal deve-se privilegiá-la diante da lei penal, uma vez que a
subsidiariedade impõe a ineficácia das medidas principais.
Jurisprudência

A título de exemplo citamos a jurisprudência em que não houve pagamento de tributos na importação
de mercadorias, entendendo o STF que a conduta é irrelavante, em face da Lei 10.522/02, pois seu
artigo 20 dispensa a execução tributária de até R$ 10.000,00. Inexistência de lesão ao bem jurídico
penalmente tutelado. (STF, HC 96582 - 2011)

d) Princípio da insignificância ou Bagatela


Surgiu do direito civil, levado ao direito penal por Claus Roxin. Quer dizer que o direito penal não
deve se ocupar de assuntos irrelevantes, incapazes de lesar o bem jurídico legalmente tutelado. É
baseado em valores de política criminal e funciona como causa de exclusão da tipicidade MATERIAL.
o STJ firmou entendimento que o valor até 10% do salário mínimo PODE ensejar aplicação do
princípio, mas não como único parâmetro.

Jurisprudência

O Tribunal catarinense considerou que, na hipótese, trata-se de um furto de uma carteira que possuía
R$ 195,00 (cento e noventa e cinco reais) em notas e moedas, subtraída da cesta da bicicleta da vítima,
a qual estava estacionada em frente ao estabelecimento comercial farmácia Sul Catarinense. [...]
Embora o valor da res furtiva seja superior a 10% do salário mínimo vigente ao tempo da suposta
infração penal, tal requisito não pode ser o único parâmetro a ser avaliado, devendo-se levar em
consideração que a carteira e o montante foram totalmente recuperados, conforme termo de
reconhecimento e entrega de fl. 23, não se mostrando recomendável o processamento da ação penal,
eis que evidente a inexpressividade da lesão jurídica provocada. [...] Outrossim, consoante se extrai das
certidões de antecedentes, não existe sentença condenatória alcançada pelo manto da coisa julgada,
de modo que não pode ser utilizada como fator conducente ao afastamento da suscitada aplicação do
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de modo que não pode ser utilizada como fator conducente ao afastamento da suscitada aplicação do
princípio da insignificância, haja vista que os recorridos devem ser considerados tecnicamente
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primários. (STJ/AgRg no REsp 1872218 / SC/2020)

O reduzido valor patrimonial do objeto material não autoriza, por si só, o reconhecimento da
criminalidade de bagatela. Exigem-se também requisitos subjetivos, conforme entendimento do STJ.

Jurisprudência

Há que se conjugar a importância do objeto material para a vítima, levando-se em consideração a sua
condição econômica, o valor sentimental do bem, como também as circunstâncias e o resultado do
crime, tudo de modo a determinar, subjetivamente, se houve relevante lesão. (HC 60.949/PE, 2007)

A Terceira Seção desta Corte Superior, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.193.196/MG,
pacificou o entendimento de que é formal e materialmente típica a conduta descrita no art. 184, § 2º,
do Código Penal, não havendo que se falar, portanto, no princípio da adequação social ou no
princípio da insignificância. (STJ/AgRg no REsp 1767921 / SP/2018)

O paciente, policial militar, fardado e em serviço, subtraiu uma caixa de bombons de um supermercado,
colocando-a dentro de seu colete à prova de balas. Vê-se, assim, não ser possível aplicar o princípio da
insignificância à hipótese, visto não estarem presentes todos os requisitos necessários para tal
(mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de
reprovação do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada). Apesar de poder tachar
de inexpressiva a lesão jurídica em razão de ser ínfimo o valor dos bens subtraídos (R$ 0,40), há alto
grau de reprovação na conduta do paciente, além de ela ser relevante par ao Direito Penal; pois, aos
olhos da sociedade , o policial militar representa confiança e segurança, dele se exige um
comportamento adequado, dentro do que ela considera correto do ponto de vista ético e moral. (HC
192.242/MG, 2011)

O princípio da insignificância tem aplicação a qualquer espécie de delito que com ele seja
compatível, e não apenas aos crimes contra o patrimônio.

JURISPRUDÊNCIA

"[...] conforme se extrai do quadro fático delineado no acórdão, desponta claro que o recorrente agiu
com dolo, no mínimo genérico, ao autorizar a comercialização de produtos em estabelecimento público
sem o devido procedimento licitatório, em desrespeito aos princípios da impessoalidade, da moralidade
e da legalidade, restando configurado o ato de improbidade capitulado no art.11 da Lei 8.429/1992". O
ato havido por ímprobo, deve ser administrativamente relevante, sendo de se aplicar, na, na sua
compreensão, o conhecido princípio da insignificância, de notável préstimo no Direito Penal moderno, a
indicar a inaplicação da sanção criminal punitiva ao agente, quando o efeito do ato agressor é de
importância mínima ou irrelevante, constituindo a chamada bagatela penal: de minimis noncurat
Praetor'".
PENAL PROCESSUAL PENAL AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL AUSÊNCIA DE
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PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.AUSÊNCIA DE
IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA A UM DOS CAPÍTULOS DO RECURSO. SÚMULA 182/STJ. OPERAÇÃO
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DÓLAR-CABO. REMESSA ILEGAL DE DIVISAS AO EXTERIOR. VALOR INFERIOR A R$ 10.000,00.
TIPICIDADE. DOSIMETRIA. CULPABILIDADE ELEVADA. EXPERIÊNCIA NA ÁREA FINANCEIRA. AGRAV OS
REGIMENTAIS PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA EXTENSÃO, IMPROVIDOS. 2. Não se admite a
incidência do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da tipicidade de conduta
enquadrada como crime contra o Sistema Financeiro Nacional 3. Na transferência eletrônica de dólares
(sistema de compensação), mesmo em parcelas inferiores a U$ 10.000,00 - saída meramente escritural
da moeda - a norma de regência exige, de forma exclusiva, o processamento por meio do sistema
bancário, com perfeita identificação do cliente ou beneficiário (STJ/AgRg no REsp 1614236 / RS /2017)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OBTENÇÃO INDEVIDA DE
SEGURO DESEMPREGO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
ALEGADO ESTADO DE NECESSIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. APLICAÇÃO DO PRIVILÉGIO PREVISTO NO
ART. 171, §1º, DO CP. VALOR SUPERIOR AO SALÁRIO-MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO
REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (STJ/AgRg no AREsp 1134815 / MS /2017)

"Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito
tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art.
20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério
da Fazenda". (STJ/2020)

Ementa: PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE DESCAMINHO. VALOR SONEGADO INFERIOR AO FIXADO
NO ART. 20 DA LEI 10.522/2002, ATUALIZADO PELAS PORTARIAS 75/2012 E 130/2012 DO MINISTÉRIO
DA FAZENDA. RETROATIVIDADE DA NORMA MAIS BENÉFICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
APLICABILIDADE. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. I - Nos termos da jurisprudência deste Tribunal,
o princípio da insignificância deve ser aplicado ao delito de descaminho quando o valor sonegado for
inferior ao estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, atualizado pelas Portarias 75/2012 e 130/2012
do Ministério da Fazenda, que, por se tratarem de normas mais benéficas ao réu, devem ser
imediatamente aplicadas, consoante o disposto no art. 5º, XL, da Carta Magna. II – Ordem concedida
para restabelecer a sentença de primeiro grau, que reconheceu a incidência do princípio da
insignificância e absolveu sumariamente o ora paciente com fundamento no art. 397, III, do Código de
Processo Penal. (STF/HC121408/2014)

De acordo com a jurisprudência, esses crimes admitem a aplicação do princípio da insignificância,


havendo um limite de R$ 20.000,00, que é o valor em relação ao qual a Fazenda pode requerer o
arquivamento (não ajuizar execução fiscal), conforme a Lei nº 10.522/02 e as Portarias nº 75 e 130, de
2012, do Ministério da Fazenda.

Súmula 589 do STJ: "É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais
praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas".
A reincidência é motivo idôneo para a fixação de regime inicial de cumprimento de pena mais gravoso
(Súmula n. 269 do STJ). 3. No âmbito das relações domésticas, não se aplica o princípio da
insignificância aos crimes praticados mediante violência contra mulher. F(STJ/AgRg no AREsp 1724849
/ SE /2020)
Anota-se que a prática do delito de furto qualificado por rompimento de obstáculo, concurso de agentes
ou por arrombamento, o caso dos autos, indica a especial reprovabilidade do comportamento e afasta a
aplicação do princípio da insignificância (STJ/AgRg no REsp 1899462 / DF /2021)
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aplicação do princípio da insignificância. (STJ/AgRg no REsp 1899462 / DF /2021)
Não se cogita da incidência do princípio da insignificância ao caso em apreço, de igual modo, pelo fato
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do crime de furto ser qualificado pelo rompimento de obstáculo, circunstância concreta desabonadora,
nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior, suficiente para impedir a aplicação do referido
brocardo. Além disso, deve ser considerada a incidência da majorante do furto noturno, o que evidencia,
de per si, a maior gravidade da conduta delitiva. (STJ/HC 559086 / SC /2020)
O pequeno valor da res furtiva - uma parafusadeira, que representa cerca de 7% do salário mínimo
vigente à época dos fatos -, aliado à capacidade financeira da vítima, um hipermercado, ao qual o bem
foi restituído, denota não relevante interesse social na onerosa intervenção estatal, ainda que se trate
de réu reincidente (STJ/AgRg no AREsp 1617119 / SP /2020)
Na hipótese, excepcionalmente se aplica o princípio da insignificância à conduta de subtrair 2 (dois)
frascos de condicionador de um supermercado, que foram, inclusive, restituídos, embora conste a
existência de uma condenação penal pelo crime de furto, conforme a moldura fática evidenciada pelas
instâncias ordinárias. (STJ/AgRg no REsp 1715427 / MG /2019)
Princípio da Insignificância: não aplicado ao furto de 2 barras de chocolate e 1 garrafa de vodca,
avaliados em R$ 83,00 (oitenta e três reais), valor superior a 10% do salário mínimo vigente e devido à
reiteração delitiva. (STJ/AgRg no AREsp 1328883 / MS /2019)


e) Princípio da culpabilidade
Visa combater a responsabilidade penal objetiva, ou seja, responsabilização pela simples
produção do resultado. Atualmente vige o princípio da culpabilidade, descrito pela brocardo latino
nullum crimen sine culpa. Ninguém responderá por prática de fato absolutamente imprevisível, deverá
haver dolo ou culpa. Assim, não há responsabilidade objetiva pelo simples resultado, a
responsabilidade penal é do fato e não do autor e a culpabilidade é a medida da pena. (Bitencourt, p.
14)

Jurisprudência

É ilegal a aplicação de sanção de caráter coletivo, no âmbito da execução penal, diante de depredação
de bem público quando, havendo vários detentos num ambiente, não for possível precisar de quem
seria a responsabilidade pelo ilícito. O princípio da culpabilidade irradia-se pela execução penal, quando
do reconhecimento da prática de falta grave, que, à vidência, culmina por impactar o status libertatis do
condenado. (STJ/2014)[2]

f) Princípio da humanidade
Impossibilita a adoção de pena de morte e prisão perpétua, pois a pena não pode atingir a
dignidade da pessoa humana ou que causar lesões físicas ou psicológicas ao condenado. Também
são inibidas pelo princípio as penas cruéis e infamantes, a tortura e os maus-tratos.
Nenhuma pena privativa de liberdade pode ter uma finalidade que atente contra a incolumidade da
pessoa como ser humano.
O réu deve ser tratado como pessoa humana. (Jesus, 2011). Há previsão constitucional no artigo
5º, incisos XLVII, XLVIII, XLIX e L.

Jurisprudência
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Jurisprudência

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3. Se é verdade que a segurança pública deve ser resguardada, não menos importante é que a nossa
Carta Política erige como direito fundamental o Princípio da Humanidade das Penas, consectário de um
dos fundamentos da República: a dignidade da pessoa humana. 4. A medida de inserção do apenado, a
essa altura, no Presídio Federal, não anda em consonância com a proporcionalidade em sentido estrito.
Isso porque, realizada a ponderação dos valores, da segurança pública, de um lado, e, de outro, o direito
individual à humanidade das penas - este agregado ao caráter excepcional do cumprimento em regime
penitenciário federal -, tem-se que o primeiro cede lugar ao segundo, um vez que, no caso concreto, o
condenado já ultrapassa três anos de permanência no rigoroso regime de segurança máxima.

g) Princípio da irretroatividade da lei penal


Trata-se de regra suprema em casos de conflitos de lei penal, previsto no artigo 2º, PU do CP e XL
da CF. A lei, ao entrar em vigor até cessar sua vigência rege todos os atos abrangidos pela sua
vigência. Entre os dois limites situa-se sua eficácia. Não alcança fatos ocorridos antes ou depois dos
dois extremos, não retroage e nem tem ultra-atividade, porém, somente no tocante a lei mais severa. A
lei mais favorável deverá retroagir, artigo 5º, XL, CF. (Bitencourt, p. 16).
Atente-se que as leis excepcionais ou temporárias constituem-se em exceção a este princípio, são
dotadas de ultra-atividade, já que, mesmo após sua vigência serão aplicadas a fatos ocorridos em sua
vigência.

Jurisprudência

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PERMANENTE PARA O


TRÁFICO. 2. DOSIMETRIA. PENAS-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. ILEGALIDADE MANIFESTA.
INEXISTÊNCIA. EXPRESSIVA QUANTIDADE DA SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE APREENDIDA. 4. CRIME
COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º 6.368/76. APLICAÇÃO RETROATIVA APENAS DA CAUSA DE
DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N.º 11.343/06. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA POR
INTEIRO DA NOVA LEI. POSSIBILIDADE, SE MAIS BENÉFICA AO RÉU. (STJ/HC 245392/SP/2014)

O crime e a pena devem estar definidos em lei prévia ao fato cuja punição se pretende. A lei penal
produz efeitos a partir de sua entrada em vigor, não pode retroagir, salvo para beneficiar o réu. É
proibida a aplicação da lei penal inclusive aos fatos praticados durante seu período de vacatio. Embora
já publicada e vigente, a lei ainda não estará em vigor e não alcançará as condutas praticadas em tal
período. ((Masson, p. 25). Durante a vacância não há lei nova, mas apenas expectativa de lei. (Estefan
e Gonçaves, p. 224)[5]

h) Princípio da Adequação Social


Uma conduta deve ser tipificada como crime quando apresentar relevância social. Assim, algumas
condutas, pela relevância social que apresentam não devem ser consideradas criminosas. Algumas
condutas típicas carecem de relevância por serem toleradas no meio social, assim, o comportamento
que se amolda a determinada descrição típica formal, porém materialmente irrelevante, adequando-se
ao socialmente permitido ou tolerado, não realiza materialmente a descrição típica.
Exemplo é a colocação de um brinco, tradicionalmente aceito, como embelezamento, mesmo que
constitui-se em lesão corporal. (Nucci, p. 229). Também como exemplo de conduta aceita e aprovada
consensualmente pela sociedade pode-se citar as touradas que são os animais torturados até a
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consensualmente pela sociedade pode se citar as touradas, que são os animais torturados até a
morte, dentro de arenas, mas fora, certamente matar um animal com tiros seria considerado crime.
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(Nucci, p. 229)

Jurisprudência

HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. PRINCÍPIOS DA ADEQUAÇÃO SOCIAL E DA


INSIGNIFICÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. ABOLITIO CRIMINIS DETERMINADA PELA LEI N. 10.695/2003.
NÃO OCORRÊNCIA. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA. (STJ/HC 531030 / SP /2020)
De acordo com o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, não se aplica o
princípio da adequação social aos crimes de favorecimento da prostituição ou manutenção de casa de
prostituição. (AgRg no REsp 1508423/MG, julgado em 01/09/2015)

TIPO PENAL
É a descrição abstrata de uma conduta, tratando-se de uma conceituação puramente funcional, que
permite concretizar o princípio da reserva legal (não há crime sem lei anterior que o defina). A
existência de tipos penais incriminadores (modelos de condutas vedadas pelo direito penal, sob
ameaça de pena) tem a função de delimitar o que é penalmente ilícito do que é penalmente irrelevante,
tem o objetivo de dar garantia aos destinatários da norma, pois ninguém será punido senão pelo que o
legislador considerou delito, bem como tem a finalidade de conferir fundamento à ilicitude penal.
(Nucci, p. 197)

Estrutura do tipo penal

1. Título ou Nomen juris:

É o nome dado ao crime, pelo legislador, como no artigo 155, CP que o tipo penal é "subtrair para si
ou para outrem coisa alheia móvel", o título é FURTO.

2. Norma penal incriminadora:

São aquelas que definem as infrações penais e fixam as respectivas penas. São também
chamadas de tipos penais.

a) Primeira parte da norma incriminadora (preceito primário)

Descreve os elementos necessários para que o fato seja considerado crime.

Exemplo: Art. 155 – “subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel” (PRECEITO PRIMÁRIO)

a2) Segunda parte da norma incriminadora: (preceito secundário)

É a previsão da pena a ser aplicada.


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p p p

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Exemplo: furto “reclusão de um a quatro anos, e multa”

b) Norma penal permissiva:

Prevê licitudes ou a impunidade de determinados comportamentos típicos.

Exemplo: exclusão do aborto provocado por médico quando não há outro meio para salvar a
vida da gestante, ou quando a gravidez resulta de estupro e há consentimento da gestante (art. 128); a
legítima defesa prevista no artigo 25, CP.

3. Elementos ou elementares

a) objetivos: não se ligam à vontade do indivíduo. Se subdividem em:

I) descritivos: são aqueles reconhecidos por juízos de realidade, não necessitando de juízos de
valor. Nucci descreve que ao estudar o tipo penal do homicídio, estamos diante de um tipo
composto integralmente por elementos descritivos, pois, matar alguém não exige nenhum tipo de
valoração, apenas constatação que foi eliminada a vida de um ser humano. (Nucci, 2011, p. 198)

II) normativos: estes exigem juízos de valor. Conforme Nucci (2011, p. 198) são verificáveis por
sentimentos e opiniões e exemplifica com o delito de ato obsceno (233, CP), o conceito de obsceno
demanda juízo de valor, pois, sabe-se que é um ato que causa vergonha, de cunho sexual. O que
causa espanto à uma pessoa pode não causar à outra e também, deve-se analisar a situação em
conformidade com a época e o local. Outros exemplos, a expressão indevidamente no artigo 151,
1º,II; sem justa causa no artigo 154 e sem permissão legal no artigo 292, todos do CP.
III) elementos subjetivos: São os elementos relacionados à vontade e à intenção do agente. Nucci
ensina que são elementos subjetivos do tipo específicos, pois há tipos que possuem e outros que não
necessitam, caso do homicídio, pois, matar alguém, prescinde de qualquer finalidade especial para
concretizar-se, uma vez que não importa o motivo pelo qual se mata alguém. Por outro lado, há tipos
que requerem finalidades específicas, por parte do agente ou não se realizam, como na prevaricação
(319, CP) que exige a abstenção do seu dever para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Outro
exemplo é o furto, ao requerer o especial fim de subtrair "para si ou para outrem".(2011, p. 199)

4. Qualificadoras:

Trata-se de circunstância que altera a pena em abstrato (preceito secundário); descreve novas
penas, máxima e mínima.

Exemplo: homicídio simples (6 a 20 anos) – homicídio qualificado (12 a 30 anos)

5. Causas de aumento de pena:


-São índices de soma ou multiplicação a serem aplicados sobre a pena estabelecida na fase
anterior.
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

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Exemplo: homicídio (vítima é menor de 14 anos, a pena é aumentada de 1/3 (art. 121, § 4º, 2ª
parte). Receptação dolosa (pena é aplicada em dobro se o bem for público -art. 180, § 6º)

6. Divisão dos tipos penais de acordo com o bem jurídico atingido:

As infrações foram agrupadas em 11 títulos, de acordo com o bem jurídico afetado.

Título I – dos crimes contra a pessoa;

Título II – dos crimes contra o patrimônio;

Título III – dos crimes contra a propriedade imaterial;

Título IV – dos crimes contra a organização do trabalho;

Título V - dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos;

Título VI – dos crimes contra a dignidade sexual;

Título VII – dos crimes contra a família;

Título VIII – dos crimes contra a incolumidade pública;

Título IX – dos crimes contra a paz pública;

Título X – dos crimes contra a fé pública;

Título XI – dos crimes contra a Administração Pública.

DOS CRIMES EM ESPÉCIE


A partir deste bloco passaremos a estudar os crimes em espécie, conforme plano de aprendizagem.

DOS CRIMES CONTRA A PESSOA


Neste bloco passaremos a estudar os principais crimes contra a pessoa.

HOMICÍDIO
Homicídio simples: "matar alguém" (art. 121, caput, CP)

É a realização da conduta matar alguém. Não demanda motivo especial e a ausência de motivo,
segundo jurisprudência não o qualifica como motivo fútil. Se o homicídio simples é cometido em
atividade típica de grupo de extermínio, mesmo que por um sujeito ativo, é considerado crime
hediondo, conforme artigo 1º, I da Lei 8072/90.

Por extermínio deve-se entender crimes de chacina, matança generalizada, por pertencer a um
i l i l
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
grupo social ou racial.
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PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO SIMPLES (DOLO
EVENTUAL). CRIME CONEXO COM O DELITO DO ART. 306 DO CTB (CONDUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR
COM CAPACIDADE PSICOMOTORA ALTERADA EM RAZÃO DA INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL). CONSUNÇÃO.
QUESTÃO A SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JÚRI. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(STJ/AgRg no REsp 1881282/PR)

Homicídio privilegiado:

"Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio
de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um
sexto a um terço". (art. 121, § 1º, CP)

Neste caso há uma diminuição de pena, já que são as possibilidades são causas de diminuição de
pena, ou minorantes e não interferem na descrição do fato típico. Bitencourt salienta que as duas
primeiras figuras privilegiadas estão relacionados aos motivos determinantes do crime, relevante valor
social ou moral (p. 80).

a) relevante valor social: tem motivação e interesse coletivo, deve ser relevante. Age nesta situação
quem mata por amor a pátria, por amor paterno ou filial.

b) relevante valor moral: diz respeito aos princípios éticos dominantes, nobre e merecedor de
indulgência. Deve ser relevante. A compaixão ou piedade perante o sofrimento, como na eutanásia..

"Os motivos de relevante valor social ou moral, também estão relacionados no artigo 65, III, a, CP,
como circunstâncias atenuantes. Se reconhecida a privilegiadora, inadmissível reconhecê-la como
atenuante para evitar o bis in idem. (Bitencourt, p. 82)

declaração da vítima que teria dito ao apelado que iria acusá-lo de estupro, provocando, deste
modo, sua reação. (TJ/RS)

c) sob o domínio de violenta emoção: A emoção é um estado afetivo que produz


momentaneamente a violenta perturbação da personalidade do indivíduo. "A violenta emoção recebe
tratamento diferenciado segundo o grau de influência que possa ter sobre a autodeterminação do
agente: de um lado, poderá assumir a mera condição de atenuante de pena (quando tiver simples
"influência"), ou, então, como pode ocorrer nos crimes de homicídio e de lesões corporais, caracterizar
causa de diminuição de pena ou minorante (quando assumir o domínio). (Bitencourt, p. 83).

Ex.: O cônjuge que flagra uma traição, pai que mata estuprador da filha.

Sob o domínio de violenta emoção significa agir sob choque emocional, que subjuga o sistema
nervoso, situação em que os freios inibitórios são liberados, orientados por ímpetos incontroláveis,
que reduz a censurabilidade. No caso da atenuante do ar. 65, c, o agente se apresenta apenas sob
influência da violenta emoção e não dominado
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
influência da violenta emoção e não dominado.
@prof.joaobittenocurt
d) injusta provocação da vítima: A provocação deve ter partido da própria vítima e seja injusta o que
não significa antijurídica, mas quer dizer não justificada, não permitida, não autorizada por lei. Não se
confunde com agressão que seria caso de legítima defesa.

e) imediatamente entre provocação e reação: A reação tem que ser imediata. Bitencourt ensina que
é necessário que entre a causa da emoção (injusta provocação) e esta (reação) praticamente inexista
intervalo. Para o autor, o homicídio praticado friamente horas após a pretendida injusta provocação da
vítima não pode ser considerado privilegiado (p. 85).

A simples existência de paixão, conforme artigo 28, I, CP, não basta para o reconhecimento da
privilegiadora. Concluindo, se a emoção for menor, apenas influenciando a prática do crime, ou não for
logo em seguida a injusta provocação da vítima, não constituirá a privilegiadora, mas a atenuante
genérica do artigo 65, III, c, CP (Bitencourt, p. 83)

Há súmula, 162, do STF impondo a quesitação do homicídio privilegiado no júri. É um direito público
subjetivo do condenado quando reconhecido pelo Tribunal do Júri, nos crimes contra a vida e nos
demais casos, quando presentes os requisitos objetivos e subjetivos.

homicídio qualificado

Homicídio qualificado é crime hediondo, artigo 1º, I da Lei 8072/90. .

§ 2° Se o homicídio é cometido:

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;

a) paga: o agente recebe previamente a recompensa pelo crime

b) promessa de recompensa: há apenas expectativa de receber a recompensa, condicionada à


prática do crime.

Em ambos os casos a recompensa não precisa ser em dinheiro, podendo ser vantagem de natureza
patrimonial ou pessoal. Responde quem praticou e quem pagou ou prometeu. Bitencourt (p. 85)
entende que deva ser de natureza econômica, todavia, há entendimento em sentido contrário.

c) motivo torpe

Atinge profundamente o ideal de ética e coletividade, algo repugnante, indigno. Para Bitencourt (p.
85) o ciúme patológico não serve para excluir o crime e nem para qualificá-lo.

II - por motivo fútil

d) por motivo fútil;

É motivo insignificante, banal e não se confunde com motivo injusto. Ciúme, ausência de motivo
não é motivo fútil
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
não é motivo fútil.
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III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou
de que possa resultar perigo comum;

a) emprego de veneno: deve ser empregado dissimuladamente. Para o envenenamento constituir


meio insidioso é indispensável que a vítima desconheça a circunstância de estar sendo envenenada.
Veneno é toda substância biológica ou química que no organismo possa causar lesões ou morte.

A depender da vítima outras possibilidades surgem, como ministrar açúcar em demasia para
um diabético. Bitencourt (p. 92) assevera que a administração forçada ou com o conhecimento da
vítima não qualifica o crime. Se utilizada violência poderá ser a qualificadora do meio cruel.

b) fogo ou explosivo: Também podem constituir meio cruel (fogo em mendigos) ou que pode
resultar em perigo comum, a depender dos fatos. O fogo pode qualificar quando derrama-se
combustível em um local e ateia fogo.

Explosivo é qualquer artefato capaz de provocar explosão, como dinamite, bomba caseira,
coquetel molotov.

c) asfixia: é o impedimento da função respiratória resultando em falta de oxigênio no sangue do


indivíduo. (Apud Bitencourt, p. 93). A asfixia mecânica se dá por enforcamento, estrangulamento,
afogamento, esganadura ou sufocação. A asfixia tóxica pode ser produzida por gases deletérios como
monóxido de carbono.

Asfixia não é agravante genérica, assim, o individuo que asfixiar alguém, produzindo lesões
corporais, sem animus necandi, não responderá pela agravante da asfixia nem pela qualificadora, já
que se limita ao homicídio. (Bitencourt, p. 93)

d) tortura: meio que causa prolongado sofrimento. Há o crime de tortura tipificado na Lei 9455/97,
com pena de 8 a 16 anos de reclusão em caso de morte. Esclarece Bitencourt (p. 93) se ao torturar
alguém o sujeito ativo agir com animus necandi deverá responder pelo crime qualificado pela tortura.
Por outro lado, se o resultado morte for preterdoloso, ou seja, se queria a tortura sem a morte teremos
a aplicação da lei 9455/97.

e) Meio insidioso: é o meio usado com estratégia, o emprego de recurso de dissimulação, vindo a
surpreender a vítima que não via o propósito do agente dissimulado.

f) meio cruel: Para Bitencourt (p. 94) é a forma brutal, bárbara ou martirizante de executar o crime
como no pisoteamento ou dilaceração do corpo à facadas. É o que causa sofrimento desnecessário. A
crueldade praticada após a morte da vítima não qualifica o delito.

g) meio que possa resultar perigo comum: é o que pode atingir muitas pessoas.

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne


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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

impossível a defesa do ofendido;


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a) à traição: é o ataque sorrateiro, inesperado, como no tiro pelas costas. Não se configura
tradição se a vítima pressentir a intenção do agente, pois elimina o fator surpresa.

b) emboscada: É a tocaia, espreita, quando o agente se esconde para surpreender a vítima

c) mediante dissimulação: oculta-se a intenção do crime a fim de surpreender a vítima. Faz-se


passar por amigo, ilude a vítima e esta passa a não ter motivos para desconfiar de qualquer intenção
de ataque.

d) recurso que impossibilita ou dificulta a defesa: recurso que tenha a mesma natureza de traição,
emboscada. que são exemplos de recursos que impossibilita a defesa. Bitencourt (p. 96) salienta que
esta regra tem a finalidade de permitir a qualificadora mesmo quando o recurso utilizado para a prática
do crime tenha dificuldade de adequar-se à uma ou outra das modalidades específicas do dispositivo.

e) surpresa: é um ataque inesperado, imprevisto e imprevisível e a vítima não tenha notado a


possibilidade de ocorrer o ataque, pois aí, não será mais surpresa.

V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

a) assegurar a execução: Prática de outro crime com o fim de assegurar a prática de outro crime, como
aquele que para sequestrar mata o guarda-costas

c) assegurar a ocultação e impunidade: a finalidade é destruir a prova do outro crime.

d) assegurar vantagem de outro crime: para garantir o êxito da outra prática delitual e o eventual
aproveitamento do produto do crime.

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

Feminicídio

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:

§ 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar;

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

A violência contra a mulher está inserida num contexto cultural, atinge toda as classes sociais e
níveis socioeducativos. O legislador não criou um tipo penal, apenas uma qualificadora do homicídio
praticado contra mulher em situação de violência doméstica ou familiar ou menosprezo ou
discriminação pela condição de mulher.

Feminicídio pressupõe violência baseada no gênero, agressões que tenham como motivação a
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
opressão à mulher. é imprescindível que a conduta do agente esteja impregnada pelo menosprezo ou
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discriminação à condição de mulher da vítima. (Sanches, Rogério).

Bitencourt, (p. 102) exemplifica que se alguém (homem ou mulher), que é credor de uma mulher
cobra-lhe o valor devido e esta nega-se a pagá-lo, enraivecido o cobrador desfere-lhe um tiro e mata.
Nesta hipótese, não se trata de crime de gênero, isto é, o homicídio não foi praticado em razão da
condição de mulher, mas sim de devedora, e tampouco foi decorrente da violência doméstica ou
familiar , logo não incidirá a qualificadora do feminicídio, embora possa incidir a qualificadora do
motivo fútil.

Uma discussão é quanto a ser a violência doméstica e familiar, já que pode ocorrer, em alguns
casos, que uma pessoa que não seja familiar, coabite e venha ser agredida.

Este crime pode ser praticado por qualquer pessoa, homem ou mulher. Já, quanto ao sujeito
passivo, como regra e a mulher. "O substantivo mulher abrange logicamente lésbicas, transexuais e
travestis" (Bitencourt, p. 103). Ainda podemos citar as esposas, companheiras, amantes, filhas, netas,
mãe, avó, mas não se admite partentes por afinidade, como sogra, cunhado, genro. Ainda resta discutir
o casamento homoafetivo em que um dos homens exerce a função feminina. Para Bitencourt não se
admite, já que o tipo penal é taxativo quanto ao termo mulher, porém, independentemente do gênero, o
ser masculino também poder ser vitima de violência doméstica, diferentemente da Lei Maria da Penha,
que por ser mais abrangente, admite medidas protetivas alcançadas aos homens da relação
homoafetiva, desde que desempenhe o papel da mulher.

Por outro lado, admitimos a possibilidade de figurarem na relação homossexual feminina, ambas,
tanto como autora como vítima, indistintamente, do crime de feminicídio. (Bitencor,t p. 105)

VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes
do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em
decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em
razão dessa condição:

Inicialmente deve-se destacar que companheiro ou cônjuge é possível nos relacionamentos


homoafetivos. Parentes consanguíneos até 3º grau engloba pais, avós, bisavós, filho, neto, bisneto e
os colaterais são irmãos, tios e sobrinhos. Não serão alvo deste delitos os parentes por afinidade,
como sogros, genros e cunhados.

a) no exercício da função ou em decorrência dela: Se não existir qualquer ligação com a função, a
morte de um policial não incidirá esta qualificada.

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

§ 3º Se o homicídio é culposo:

Pena - detenção de um a três anos


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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Pena detenção, de um a três anos.

@prof.joaobittenocurt
Segundo o PU do art. 18, CP, a regra é que os delitos sejam dolosos, apenas, por exceção, quando
previsto no tipo penal, haverá o crime culposo. O inciso II do art. 18 descreve que o delito culposo é
aquele praticado por imprudência, negligência ou imprudência.

Na imprudência e na imperícia há a inobservância de cuidados recomendados pela experiência no


exercício comum no exercício do cotidiano humano. A imperícia é a falta de capacidade, despreparo
ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício da arte, profissão ou ofício. (Bitencourt, p.
117).

Majorantes do crime de homicídio

§ 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância
de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima,
não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo
doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor
de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos

Majorante significa um plus na culpabilidade, ao contrário da qualificadora que que integra a


tipicidade. As majorantes e minorantes não se confundem com qualificadoras ou agravantes e
atenuantes genéricas. Funcionam como modificadoras da pena, na terceira fase do cálculo de sua
aplicação. (Bitencourt, p. 138).
Majorante no homicídio culposo (§ 4º, primeira parte)

No homicídio culposo há quatro possibilidades de aumento de pena.

a) inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício

Não se confunde com a modalidade de culpa imperícia que significa inaptidão, inabilidade
profissional ou insuficiência de capacidade técnica. Na majorante o agente conhece a regra técnica,
porém, não a observa. Esta majorante, ao contrário da imperícia aplica-se somente a profissional.
(Bitencourt, p. 138). A inobservância de regra técnica impõe maior reprovabilidade da conduta

b) omissão de socorro à vítima

Evidentemente não constitui crime autônomo. Incide quando o socorro requerido seja possível de
realizar, portanto, exclui-se a possibilidade de punir crime impossível quando, por exemplo, ocorre uma
morte instantânea ou imediato socorro por terceiro, do mesmo modo, aquele que se ausenta do local
por temer represálias.

c) Não procurar diminuir as consequências do comportamento

Pune uma espécie de omissão de socorro.

d) Fuga para evitar prisão em flagrante


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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
d) Fuga para evitar prisão em flagrante

Para @prof.joaobittenocurt
Bitencourt (p. 140) esta política equivocada em vez de reprimir a fuga, tem estimulado
muitos motoristas irresponsáveis a abandonar o local do acidente, para evitar a prisão em flagrante.

Majorante do homicídio doloso

a) contra menor de 14 anos ou maior de 60 anos (§ 4º, 2ª parte)

Causa de aumento de pena acrescentada pelo ECA. Há incidência obrigatória sempre que o
homicídio praticado contra menor de 14 anos e for doloso, nas modalidades simples, privilegiado ou
qualificado. Considera-se a menoridade na data do fato delituoso.

A majorante, incluída por ordem do Estatuto do Idoso, incide quando a vítima for maior de 60
anos.

Quando incidir a majorante não se aplica a agravante genérica do art. 61, II, h do CP (crime contra
criança ou idoso). É fundamental que o sujeito ativo tenha consciência da menoridade ou condição de
idoso ou será inaplicável a majorante. O desconhecimento da idade da vítima, por parte do sujeito ativo
pode configurar erro de tipo e a dúvida sobre a idade, pode acarretar dolo eventual.

Perdão Judicial

§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências


da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária

Neste caso o agente é punido pelo próprio fato que provocou, em razão das gravosas
consequências produzidas que o atingem profundamente (Bitencourt, p. 144). As consequências
podem ser de ordem moral ou material.

Se presentes os requisitos o perdão judicial deverá ser obrigatoriamente aplicado. Trata-se de um


direito público subjetivo . Trata-se de causa de extinção da punibilidade, art. 107, IX.

A Súmula 18 do STJ "A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da


punibilidade, não subsistindo qualquer efeito da condenatório".

Homicídio doloso praticado por milícia privada

§ 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada,
sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio.

A incidência da majorante ocorrerá sempre que ficar comprovado o objetivo da prestação de


serviço de segurança ou por grupo de extermínio. Deve-se cuidar para não ocorrer na condenação o
bis in idem, ou seja, aplicar esta majorante e o artigo 288-A (constituição de milícia privada).
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 17/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO e AUXÍLIO AO SUCICÍDIO


@prof.joaobittenocurt
Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio
material para que o faça:

Pena — reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

§ 1o Se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave ou


gravíssima, nos termos dos §§ 1o e 2o do art. 129 deste Código:

Pena — reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.

§ 2o Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte:

Pena — reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

§ 3o A pena é duplicada: I — se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil; II — se a vítima
é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.

§ 4o A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de
rede social ou transmitida em tempo real.

§ 5o Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual

§ 6o Se o crime de que trata o § 1o deste artigo resulta em lesão corporal de natureza gravíssima e é
cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade ou deficiência mental,
não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode
oferecer resistência, responde o agente pelo crime descrito no § 2o do art. 129 deste Código.

§ 7o Se o crime de que trata o § 2o deste artigo é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou
contra quem não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art.
121 deste Código.”

O bem jurídico tutelado é a vida. Ensina Bitencourt (p. 204) não existe o direito de morrer pois não
há um direito sobre a vida. A vida é um bem jurídico indisponível. O suicídio ofende interesses morais
do Estado e socialmente danoso.

O ordenamento jurídico vê o suicídio e na própria automutilização um fato imoral e socialmente


danoso, que deixa de ser penalmente indiferente quando concorre com a atividade da vítima outra
sinergia individual provinda da manifestação de vontade de outro ser humano. É exatamente a sua
natureza ilícita que legitima, excepcionalmente, a coação exercida para impedi-lo (art. 146, § 3º, II, CP)
(Bitencourt, p. 205)

A lei penal pune a participação no suicídio, seja moral ou material, porém, pela nova dicção legal
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

do caput do art. 122, não há necessidade, para configurar o delito em comento a ocorrência morte ou
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lesão corporal grave ou gravíssima.

São os verbos requeridos para realização da conduta:

a) induzir: é fazer surgir a ideia;

b) instigar: é reforçar, estimular a ideia já existente

c) auxiliar: ajudar materialmente.

É indiferente o meio empregado para a induzir ou instigar, desde que animem o suicida a ter este
comportamento. Já, prestar auxílio significar participar contribuir materialmente com o sujeito ativo,
como emprestar uma faca, uma corda, um revólver, etc.

O auxílio pode ocorrer desde a fase da preparação até a fase executória do crime, ou seja, pode
ocorrer antes ou durante o suicídio ou a automutilação, desde que não haja intervenção nos atos
executórios, caso contrário estaremos diante de homicídio, como exemplifica Manzini: o agente puxa a
corda de quem se quer enforcar; segura a espada contra a qual se atira o suicida; provoca imissão de
gás no quarto onde a vítima está acamada e deseja morrer; ajuda a amarrar uma pedra no pescoço de
quem se joga ao mar (Bitencourt, p. 210)

É insuficiente a exteriorização da vontade de participar. Não basta realizar a atividade descrita no


tipo penal se esta não influir na atividade final do suicida. Não tem relevância a participação se o
suicídio ou a automutilação, não for, pelo menos tentada. (Bitencourt, p. 210)

Também deve saber que está colaborando na realização do intento penal do suicida, quer seja o
próprio suicídio ou a automutilação, ou seja, precisa ter consciência e vontade de participar da ação do
sujeito ativo.

Enfim, induzir, instigar e auxiliar que, teoricamente, representariam mera atividade de partícipe,
neste tipo, constituem o núcleo do tipo penal. Se for mais de um a estimular as condutas proibidas,
teremos coautoria e não participação. (Bitencourt, p. 210)

Outra situação, que admite participação, é quando um agente colabora de alguma forma com o
sujeito ativo que estimula a prática do suicídio ou automutilação, hipótese em que não estará atuando
diretamente junto a vítima.

Este crime somente é praticado na modalidade dolosa, com a intenção de suicídio ou automutilação
da vítima. Se o agente levar alguém, por culpa, a praticar o tipo em comento, haverá atipicidade da
conduta.

Consumação e tentativa

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§ 1o Se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave ou


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gravíssima, nos termos dos §§ 1o e 2o do art. 129 deste Código:

Pena — reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.

§ 2o Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte:

Pena — reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Consuma-se a participação em suicídio com a morte da vítima e a participação na automutilação


com a sua execução material pela própria vítima. Consuma-se a ação criminosa quando o tipo penal
está inteiramente realizado, isto é, quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato da lei penal.
Sem a supressão da vida da vítima não se pode falar em suicídio consumado, mesmo que a ação
produza lesão corporal grave, posto que a ela o preceito primário não se refere Do mesmo modo, sem
a efetiva mutilação do próprio corpo pela vítima, seja decepando seus membros, superiores ou
inferiores, inteiros ou parte deles, seja deformando seu rosto ou o próprio corpo tampouco se pode
falar em automutilação consumada. (Bitencourt, p. 213)

Com essa afirmação deixamos claro, desde logo, que a produção de lesões corporais graves não
consuma o tipo penal na forma de suicídio; contudo, dependendo da natureza, extensão ou
profundidade da lesão deformando o seu corpo ou decepando seus membros, certamente, estar-se-á
diante da consumação da nova figura da automutilação. (Bitencourt, p. 213)

O atual artigo 122, CP trata-se de crime formal, porém, em seu § 2º, há a presença de crime
material, com a consumação do suicídio ou da automutilação.

As condutas previstas no caput, por serem formais, não admitem tentativa, já que seu iter criminis
não admite fracionamento. No entanto, no § 2º, tratando-se de crime material, há possibilidade de
ilícito tentado, já que é possível fracionar a conduta.

Bitencourt (p. 215) E, para concluir, a lesão corporal de natureza grave como consequência da
participação de alguém que livre e conscientemente queria o resultado morte, provocado pela própria
vítima, é a comprovação mais contundente de que, a despeito do dolo do agente, o resultado ficou
aquém do pretendido (qual seja, a morte), e isso não é outra coisa senão tentativa.

Majorantes

Foram inseridas nos parágrafos 3º ao 5º, CP

§ 3o A pena é duplicada:

I — se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil;

II — se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.


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a) Motivo@prof.joaobittenocurt
egoístico: é o alto grau de insensibilidade e caráter. É a busca da vantagem pessoal a
qualquer preço que chega a sacrificar uma vida em benefício de seus interesses, como por uma
herança, um bem patrimonial, etc.

b) Motivo torpe: É o motivo repugnante, abjeto que repugna a consciência da coletividade. O ciúme,
dependendo da motivação poderá ver a ser considerado torpe.

c) Motivo fútil: É motivo insignificante, banal, desproporcional à reação criminosa. A exposição de


motivos do CP define motivo fútil como aquele que pela ínfima importância não pode ser considerado
motivo par ao crime. Observe que não se trata da ausência de motivo

d) Vítima menor de 14 anos: O menor, para ser vítima de suicídio ou automutilação, precisa dispor de
certa capacidade de discernimento e de ação. Como, nesse crime, a vítima se autoexecuta, é
indispensável que tenha essa capacidade de entender e deliberar, bem como capacidade de se
autoexecutar, caso contrário, estaremos diante de um homicídio praticado por meio de autoria
mediata, agora expressamente prevista no § 7o deste artigo, mas, doutrinariamente, já fazíamos essa
afirmação, mesmo sem lei expressa. (Bitencourt, p. 222)

Enfim, considerando a idade da vítima, poderemos ter as seguintes hipóteses: o sujeito ativo
responderá por homicídio quando a vítima não for maior de quatorze anos; por participação em
suicídio, com pena duplicada, quando a vítima tiver entre quatorze e dezoito anos (§ 3o); e por
participação em suicídio ou automutilação com a pena normal, quando a vítima tiver dezoito anos
completados. (Bitencourt, p. 222)

e) Capacidade de resistência diminuída por qualquer causa: Não se trata da eliminação da capacidade
de resistência e poderá decorrer em decorrência de genética, enfermidade, embriaguez, instigar um
demente ao suicídio. "A capacidade de resistência pode ser diminuída por qualquer causa, seja em
razão de desenvolvimento mental incompleto ou retardado, seja em razão de enfermidade,
embriaguez, drogodependência ou senilidade ou que, por qualquer causa, não pode oferecer
resistência, como, pela vulnerabilidade da vítima que, por qualquer outra causa, não pode oferecer
resis-tência". (Bitencourt, p. 223)

Se existir ausência absoluta de capacidade, estará configurado o homicídio, conforme disposto no


§ 7º do artigo em comento.

§ 4o A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de
rede social ou transmitida em tempo real.

A rede de computadores ou a rede social são utilizadas como meio para a prática do crime, e não
apenas como meio para transmitir a sua prática, ou seja, quando através delas se induz, instiga ou
auxilia alguém a suicidar-se ou a automutilar-se. (...) A gravidade da conduta, autorizando aumento até
o dobro da pena aplicada, reside no fato de sua abrangência mundial e o potencial para incentivar
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p p , g p p
quantidade indeterminada de pessoas a prática desse crime. (Bitencourt, p. 223)
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§ 5o Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual

Contudo, não se trata aqui, neste parágrafo, da ocorrência ou da participação de reunião de


pessoas (grupo) ou da utilização de rede virtual, mas somente de o agente ser líder ou coordenador de
grupo ou de rede virtual, que é coisa bem diferente. A configuração de grupo poderá ocorrer com muito
mais frequência, permitindo, assim, a sua aplicação em muito mais casos concretos, pois bastará que
o dito grupo componha-se de pelo menos três pessoas (duas pessoas não formam um grupo, mas
poderá, no máximo, configurar uma coautoria simples, a despeito da equivocada previsão para os
crimes contra o tráfico de entorpecentes). (Bitencourt, p. 225)

Mas, destaque-se, trata-se de aumento de pena apenas para o líder do grupo ou rede social, não
para todos os integrantes.

§ 6o Se o crime de que trata o § 1o deste artigo resulta em lesão corporal de natureza gravíssima e é
cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade ou deficiência mental,
não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode
oferecer resistência, responde o agente pelo crime descrito no § 2o do art. 129 deste Código.

No § 6o, inovando na forma de definir ou tipificar condutas criminosas, o legislador transforma esta
infração penal, que é contra a vida (estímulo ao suicídio ou à automutilação), naquela descrita no § 2o
do art. 129, que é crime contra a integridade física (lesão corporal grave), dificultando, inclusive, a sua
interpretação e aplicação. (Bitencourt, p. 225)

No entanto, convém destacar, desde logo, que para a ocorrência dessa transformação de um crime
tentado, em outro consumado, mais grave, é indispensável a ocorrência simultânea dos dois
pressupostos legais: de um lado, a gravidade da lesão sofrida pela vítima, e, de outro lado, a
vulnerabilidade da suposta vítima, como descrito ao final do § 6o. (Bitencourt, p. 225)

§ 7o Se o crime de que trata o § 2o deste artigo é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou
contra quem não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art.
121 deste Código.”

Trata-se, a rigor, de reclassificação do “crime de suicídio ou automutilação” para o crime de


homicídio — por determinação legal — praticado mediante autoria mediata, posto que o agente,
querendo, por qualquer razão, suprimir a vida da vítima, astuciosamente, a leva a automatar-se ou
automutilar-se (com resultado morte), pois se trata de alguém “incapaz de entender o caráter ilícito da
ação” e, consequentemente, sem capacidade para consentir e, muito menos, para audoterminar-se e
eliminar sua própria vida. (Bitencourt, p. 227)

A condição de vulnerável é atribuída ao menor de 14 anos ou por enfermidade ou doença mental,


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A condição de vulnerável é atribuída ao menor de 14 anos ou por enfermidade ou doença mental,
ou por qualquer outro motivo não reúne condições de discernimento sobre sua prática. Observe-se que
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não há necessidade do enfermo ou doente mental ser inimputável.

O artigo determina que a vítima, nas circunstâncias que elenca, é, indiscutivelmente, vulnerável e
ponto final. Não se questiona esse aspecto, ele é incontestável, trata-se de presunção juris et jure, que
não admite prova em sentido contrário. Não importa nem mesmo que o exame concreto demonstre
que a vulnerabilidade constatada é relativa, isto é, incompleta, apresenta-se em seu grau menor, pois,
mesmo assim, essa conclusão é irrelevante, pois estamos falando da supressão da vida de alguém, ao
contrário do que pode ocorrer na hipótese de estupro de vulnerável. (Bitencourt, p. 228)

INFANTICÍDIO

Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:

Pena - detenção, de dois a seis anos.

É uma modalidade especial de homicídio, considerando-se as condições especiais do sujeito ativo


que atua influenciado pelo estado puerperal, durante ou logo após o parto.

a) Características
- delito cometido sob a influência do estado puerperal;
- tenha como objeto o próprio filho da parturiente;
- seja cometido durante ou logo após o parto;
Se a prova dos autos, inclusive a de natureza pericial, atesta a que a recorrente matou o
filho, após o parto, sob a influência de estado puerperal, imperiosa a desclassificação da
imputação de homicídio qualificado para que a pronúncia seja levada a julgamento pelo
cometimento do crime de infanticídio. (TJMG AC 1.0702.04.170251-6/001, 2009)
Inexistindo elemento probatório a demonstrar que psiquicamente perturbada sua
consciência e vontade, por efeito do estado puerperal, salvo as condições de miséria em
que vivia, não se pode, de plano, operar a desclassificação da conduta. (TJRS, RSE,
70014057491, 2006)
Conceitos básicos

a) PUERPÉRIO: ou sobreparto ou pós-parto, é o período cronologicamente variável, de âmbito


impreciso durante o qual se desenrolam todas as manifestações involutivas e de recuperação da
genitália materna havidas após o parto. (REZENDE, Jorge de. O puerpério)
b) SOB A INFLUÊNCIA DO ESTADO PUERPERAL: Se exige a conjugação do estado puerperal, com a
influência por ele exercida na agente. Se não houver essa influência no comportamento da gestante, o
fato deverá ser tratado como homicídio.

No caso, considerando que os fatos não ocorreram logo após o parto, não há como
reconhecer a influência do estado puerperal. (TJSP, RSE, 224.577-3, 1998)
c) PROVA PERICIAL: O entendimento da jurisprudência majoritária é no sentido da dispensa da perícia
médica para a constatação do estado puerperal, visto que este efeito é normal e corriqueiro de
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médica para a constatação do estado puerperal, visto que este efeito é normal e corriqueiro de
qualquer parto. O que na realidade existe é uma presunção juris tantum, ou seja, até que se prove ao
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contrário, a mulher após o parto tem perturbações psicológicas e físicas, geralmente normais, mas,
quando intensas causa um distúrbio tão grande que a mulher pode eliminar o neonato. (BARROS, 2004,
p. 125)

Estado Puerperal. Prova. Perícia Médica dispensável. Efeito normal de qualquer parto.
Inteligência do art. 123 do CP. (TJSP, RT 655, p. 272.)
Mãe que, ao satisfazer suas necessidades fisiológicas em uma fossa, deu à luz uma
criança, abandonando dentro da mesma. Autoria e materialidade comprovadas. Conduta
praticada logo após o parto – influência do estado puerperal. Desnecessidade de seu
reconhecimento por prova pericial. Recurso provido para esse fim. (TJSP, RSE, 155.866-3,
1995)

d) INIMPUTABILIDADE: Se a parturiente, completamente perturbada psicologicamente, dada a


intensidade do seu estado puerperal, considerado aqui como de nível máximo, provocar a morte de seu
filho durante o parto ou logo após, deverá ser tratada como inimputável, afastando-se, outrossim, a
sua culpabilidade e, consequentemente, a própria infração penal. (GRECO, Rogério, 2015, p. 352.)

Ré. Inimputável em razão de doença mental. Estado puerperal. Correta absolvição


sumária com aplicação de medida de segurança. ( TJRS, RD 70014810014, 2006.)

e) SUJEITO ATIVO: somente a mãe

f) SUJEITO PASSIVO: filho.

g) LIMITE TEMPORAL: A expressão durante o parto indica o momento a partir do qual o fato deixa de
ser considerado como aborto e passa a ser entendido como infanticídio. A expressão logo após o
parto deve ser entendida à luz do princípio da razoabilidade. A medicina aponta o período de seis a
oito semanas como tempo normal de duração do puerpério. (REZENDE, 1998, p. 373) Para Neusa Bittar
é o período compreendido entre 8 e 60 dias. (BITTAR, Neusa. 2011,p. 169).
h) ELEMENTO SUBJETIVO: somente previsão de dolo.
i) CONSUMAÇÃO E TENTATIVA: consuma-se com a morte, portanto, deve haver prova que durante os
atos de execução devia estar vivo. Há tentativa em virtude da possibilidade de fracionamento do iter
criminis.

j) Distinção:

ABORTO: Distingue-se o infanticídio do aborto porque este somente pode ocorrer antes do início do
parto.
HOMICÍDIO: Quando a mãe não retirou a vida do filho sob a influência do estado puerperal.
EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE RECÉM-NASCIDO: Expor ou abandonar recém nascido para ocultar a
própria desonra, estando ou não sob o estado puerperal. ([12] Mirabete, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato.
2015, p. 58)

ABORTO
Conforme Aníbal Bruno provocar aborto é interromper o processo fisiológico da gestação, com a
consequente morte do feto. (GRECO, 2015, p.355). O Código Penal pune, de forma diversa, dois
personagens que estão envolvidos diretamente no aborto, a gestante e o terceiro que nela realiza o
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p g q g q
aborto, rompendo a teoria monista da autoria delituosa.
Quando@prof.joaobittenocurt
a própria gestante executa as manobras tendentes à expulsão do feto, praticará o crime de
autoaborto (124 CP); se for um terceiro que o realiza, deverá ser averiguado se foi com ou sem
consentimento da gestante (art. 125 e 126 CP). A gestante responde pelo crime do art. 124 , em razão
de seu consentimento e a terceira pessoa que realiza a manobra pelo crime do art. 125 do CP.
(GONÇALVES, Victor Eduardo Rios, p. 160)
Há causa especial de aumento de pena quando a gestante sofre lesão corporal de natureza grave,
ou ocorre sua morte, conforme art. 127 do CP.
Ainda há possibilidade legal de realização do aborto nos casos em que a vida da gestante correr risco
com a manutenção da gravidez, ou quando esta for resultante de estupro, desde que o aborto seja
precedido de seu consentimento, ou quando incapaz, de seu representante legal, ex vi do art. 128 CP.

a) Marco da proteção legal
- INÍCIO: a vida tem início a partir da concepção ou fecundação, isto é, desde o momento em que o
óvulo feminino é fecundado pelo espermatozoide masculino. Conduto, para fins de proteção por
intermédio da lei penal, a vida só terá relevância após a nidação, que diz respeito à implantação do
óvulo já fecundado no útero materno, o que ocorre quatorze dias após a fecundação. ((GONÇALVES,
Victor Eduardo Rios, p. 160)
Assim, enquanto não houver a nidação não haverá possibilidade de proteção a ser realizada por
meio da lei penal.
- FIM: Se a vida, para fins de proteção pelo tipo penal que prevê o delito de aborto, tem início a partir da
nidação, o termo ad quem para essa específica proteção se encerra com o início do parto. Portanto, o
início do parto faz com que seja encerrada a possibilidade de realização do aborto, passando a morte
do nascente a ser considerada homicídio ou infanticídio, dependendo do caso concreto.
A destruição da vida intrauterina antes do início do parto caracteriza a hipótese de
aborto, cuja punição a título de culpa não é prevista pelo Código Penal Brasileiro.
Conduto, se a morte ocorreu depois de iniciado o parto, a hipótese é de homicídio,
caso não tenha sido praticado pela mãe sob influência do estado puerperal. O
início do parto é marcado pelo período de dilatação do colo do útero, consoante a
doutrina penal. Eventual erro na escolha do procedimento médico, desde que
honesto, não caracteriza conduta negligente. Absolvição decretada. (TJMG, rel.
Des. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 30.01.2007.
b) ESPÉCIES DE ABORTO:
I) natural ou espontâneo: Ocorre quando o próprio organismo materno se encarrega de expulsar o
produto da concepção.
II) provocado (dolosa ou culposamente): As espécies dolosas são as previstas no artigo 124, CP
(autoaborto ou aborto provocado com o consentimento da gestante), 125 CP (aborto provocado por
terceiro sem o consentimento da gestante) e 126 (aborto provocado por terceiro com o consentimento
da gestante).
Não há previsão legal para a modalidade culposa do aborto, razão pela qual se uma gestante, com
seu comportamento culposo vier a dar causa à expulsão do feto, o fato será considerado como um
indiferente penal.
c) SUJEITO ATIVO
I) art. 124: Aborto provocado pela gestante (autoaborto) ou aborto provocado com seu consentimento:
Trata-se de crime de mão própria, portanto somente a gestante pode ser autora.
II) t 125 Ab t d
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t i ti t d t t Q l d
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II) art. 125: Aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante: Qualquer pessoa pode
ser sujeito@prof.joaobittenocurt
ativo. Quanto ao sujeito passivo, afirma-se que é o produto da concepção e a própria
gestante.
III) art. 126: Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante: Qualquer pessoa pode
ser sujeito ativo. Quanto ao sujeito passivo somente a produto da concepção, pois, a gestante permitir
que com ela sejam praticadas as manobras abortivas, as lesões de natureza leve porventura sofridas
não a conduzirão a condição de vítima, dado o seu consentimento. Porém, no caso de lesões graves ou
morte da gestante, esta será sujeito passivo, haja vista invalidade de seu consentimento em
decorrência da gravidade dos resultados.
d) CONSUMAÇÃO E TENTATIVA: Se consuma com a morte do produto da concepção. Há possibilidade
de tentativa, quando não resultar em morte.
e) CAUSAS DE AUMENTO DE PENA: Os resultados apontados no art. 127 do CP – lesão corporal grave
e morte – somente podem ter sido produzidos culposamente, tratando-se, na espécie, de crime
preterdoloso, ou seja, o dolo do agente era o de produzir tão somente o aborto, e, além da morte do
feto, produz lesão corporal grave na gestante ou lhe causa a morte. Assim, lesões corporais graves e a
morte somente podem ser imputadas ao agente a título de culpa. Se ele queria, com seu
comportamento inicial, dirigido à realização do aborto, produzir na gestante lesão corporal grave ou
mesmo sua morte, responderá pelos dois delitos (aborto + lesão corporal grave ou aborto + homicídio),
desde que o intuito também não fosse apenas causar lesão corporal, pois neste caso, o artigo será o
129, § 2º,CP.
f) ABORTO LEGAL (art. 128): Há duas possibilidades de aborto legal, ou seja, o aborto que pode ser
realizado em virtude de autorização da lei penal.
I) aborto terapêutico (curativo) ou profilático (preventivo) : Ocorre quando não há outro meio de salvar
a gestante, como no caso da gravidez tubária, em que o óvulo fecundado não se implanta no útero, e
sim em uma das trompas, podendo gerar seu rompimento e grave hemorragia interna. (GONÇALVES,
Victor Eduardo Rios, p. 170.). Em regra deve ser realizado por médico, somente se admitindo que se
faça por qualquer pessoa em caso de iminente morte.
II) aborto sentimental, humanitário ou ético: Gravidez resultante de estupro, devendo haver
consentimento da gestante ou de seu representante legal se ela for incapaz e deve ser realizado por
médico.
g) Agressão à mulher sabidamente grávida: Se o agente almeja o aborto, responderá pelo delito
tipificado no art. 125 do CP; se não tinha essa finalidade, mas esse resultado era previsível, deverá ser
responsabilizado pelo art. 129, § 2º, V, CP.
h) Ordem judicial para realização do aborto legal: A lei penal e a lei processual penal não preveem
nenhum tipo de formalização judicial no sentido de obter uma ordem para que seja levada a efeito
qualquer uma das modalidades do chamado aborto legal, seja aquele de natureza terapêutica ou
profilática, previsto no inciso I do art. 128 ou mesmo o de natureza sentimental ou humanitária, cuja
previsão expressa encontra-se no inciso II do mencionado artigo.

Uma vez comprovado, mediante laudo médico conclusivo, que a gestante


necessita, sob pena de vir a óbito, de tratamento quimioterápico e radioterápico
que se revela incompatível com a continuidade da gravidez, a autorização para
interromper a gestação é medida que se revela necessária. (STJ, HC 266445/GO,
2013.)

O aborto necessário, como qualquer outro procedimento médico de urgência,


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assim considerado como aquele do qual depende a vida do paciente, não precisa,
@prof.joaobittenocurt
via de regra, de autorização judicial. (TJ/RS Ap. Crim.70019613397, 2007)
Na mesma linha, em nenhuma das modalidades de aborto legal exige-se autorização judicial. Para
realização do aborto sentimental, basta que o médico se convença da ocorrência da violência sexual,
por exames que tenha feito na vítima, por cópias de depoimentos em inquérito policial ou boletim de
ocorrência. (GONÇALVES, Victor Eduardo Rios, p. 171)
h) Aborto Anencéfalo - ADPF54 (VER ARTIGO)

A anencefalia consiste na malformação do tubo neural, a caracterizar-se pela ausência parcial do


encéfalo e do crânio, resultante de defeito no fechamento do tubo neural durante o desenvolvimento
embrionário. Em seu diagnóstico, é necessária a constatação da ausência dos hemisférios cerebrais,
do cerebelo, além da presença de um tronco cerebral rudimentar ou, ainda, a inexistência parcial ou
total do crânio. (GONÇALVES, Victor Eduardo Rios, p. 172)
Por maioria dos votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou
procedente o pedido contido na Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 54, ajuizada na Corte pela Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Saúde (CNTS), para declarar a inconstitucionalidade de
interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencefálico é
conduta atípica nos arts. 124, 126 e 128, incisos I e II, todos do Código Penal.
Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluzo, que julgaram
a ADPF improcedente (STF, ADPF 54/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 2012.

Posterior ao julgamento do STF o Conselho Federal de Medicina, em 2012 publicou a Resolução n.


1.989/2012, regulamentando o procedimento em casos de constatação de anencefalia. De acordo com
o artigo 1º Da Resolução, na ocorrência do diagnóstico inequívoco da anencefalia o médico pode, a
pedido da gestante, independente de autorização do Estado, interromper a gravidez.
i) MAJORANTE NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

O inciso III do art. 234-A, que fora incluído ao Código Penal pela Lei n. 12.015/09, determina que a
pena para os crimes contra a dignidade sexual, previstos no Título VI, seja aumentada de metade, se
do crime resultar gravidez.

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@prof.joaobittenocurt
Aula 10 - Crimes contra a pessoa (Aborto)

Assista o vídeo complementar sobre


crime de aborto

LESÃO CORPORAL
O tipo penal visa proteger a integridade física e a saúde da pessoa, inclusive a fisiológica e
psíquica. Bitencourt (p. 278) salienta que o bem jurídico protegido é de natureza individual, devendo
preponderar assim, pelo menos teoricamente, o interesse particular perante o interesse do Estado. No
entanto, historicamente, perante nosso ordenamento jurídico, sempre se sustentou que o
consentimento da vítima autorizando lesões à sua integridade física é irrelevante. Contudo, também
nessa área a evolução cultural se faz presente, e a própria indisponibilidade da integridade física se
relativiza, pois a ação penal relativa às lesões corporais leves e às lesões culposas passa a depender
da vontade discricionária da vítima, que poderá ou não representar contra o ofensor.

Como se trata de crime comum o sujeito ativo não requer condição especial, podendo, o crime, ser
praticado por qualquer pessoa. Quanto ao sujeito passivo, exceto o comando normativo que requer
que a vítima seja mulher grávida, nos demais será qualquer pessoa.

Importante salientar que a autolesão é irrelevante para o direito penal, exceto se for a lesão utilizada
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para prática de um estelionato, por exemplo, como requerer um seguro de vida. Bitencourt (p. 279)
@prof.joaobittenocurt
explica que convém destacar que, se um inimputável, menor, ébrio ou por qualquer razão incapaz de
entender ou de querer, por determinação de outrem, praticar em si mesmo uma lesão, quem o
conduziu à autolesão responderá pelo crime, na condição de autor mediato (art. 20, § 2o, do CP).

Considerações propedêuticas

A conduta da lesão consiste em lesar a integridade física ou a saúde de alguém, seja por ofensa
externa, no primeiro caso ou interna, como fraturas, mutilações, ferimentos em geral, no segundo caso,
como alterações fisiológicas ou psíquicas.

Em caso de pluralidade de lesões o crime continua sendo apenas um, porém, simples dor física
não configura o tipo, mas, salienta Bitencourt (p. 280) que o crime pode advir de efeito moral, mas, a
simples dor, não configura delito.

O Código Penal Brasileiro estipula que as lesões são classificadas em leve (caput); graves (§ 1º);
gravíssimas (§ 2º); seguidas de morte (§ 3º); privilegiadas (§§ 4º e 5º); culposas (§ 6º) e majoradas (§
7º, 8º), violência doméstica, (§§ 9º, 10 e 11) e contra autoridade (§ 12)

"Sustentamos que a lesão à integridade física ou à saúde deve ser, juridicamente, relevante. É
indispensável, em outros termos, que o dano à integridade física ou à saúde não seja insignificante.
Nesse sentido já se manifestava o saudoso Aníbal Bruno, afirmando: “Não caberia, evidentemente,
punir como lesão corporal uma picada de alfinete, um beliscão ou pequena arranhadura, um resfriado
ligeiro, uma dor de cabeça passageira”. Pequenas contusões que não deixam vestígios externos no
corpo da vítima, provocando apenas dor momentânea, não possuem dignidade penal, e estão aquém
do mínimo necessário para justificar uma sanção criminal. Portanto, aplicável o princípio da
insignificância. (Bitencourt, p. 281)

O elemento subjetivo do crime é o dolo, ou seja, a livre e consciente vontade de ofender a


integridade física. Deve-se considerar o dolo, o dolo eventual e o preterdolo. Mas, o tipo admite a
modalidade culposa.

A consumação se produz quando há o efetivo resultado da ação ou omissão, ou seja, ocorra a


ofensa à integridade física ou à saúde. Exceto as modalidades culposa e preterdolosa, é possível a
tentativa. Haverá tentativa quando o agente ao iniciar a execução de uma agressão, antes de
completá-la, é impedido por terceiro. Neste caso, distingue-se da contravenção de vias de fato porque
o meio empregado pelo agente era potencialmente causador de lesão.

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena: detenção de três meses a um ano.

Se identifica por exclusão, configurando-se sempre que não ocorrer nenhum dos demais tipos,
previstos nos parágrafos seguintes
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previstos nos parágrafos seguintes.

Como@prof.joaobittenocurt
afirmado, anteriormente, não é caso somente de ofensa à integridade física, mas também à
saúde, assim, como explica Bitencourt (p. 284) se alguém, ameaçado vier a sofrer convulsões ou
outras patologias, haverá o crime, bem como, pode exsurgir a lesão indireta, quando o agente desfere
um golpe com uma alavanca, a vítima se esquiva, mas cai e se feri.

Lesão corporal de natureza grave

§ 1º Se resulta:

I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

É a efetiva impossibilidade de realizar as atividades cotidianas e lícitas, como trabalho, lazer,


caminhadas, etc., não sendo relevante para a formação do tipo apenas as atividades econômicas, já
que crianças e idosos também podem ser vítimas do ilícito em comento. O período de mais de 30 dias
deve ser aferido por perícia.

Salienta Bitencourt (p. 287) que cicatrizes oriundas de agressões não qualificam a lesão se a
vítima deixar de realizar suas atividades apenas por vergonha.

A atividade habitual não pode ser ilícita, como o marginal que não pode realizar suas condutas
criminosas por mais de 30 dias, portanto, não incide a qualificadora, mas, por outro lado, atividade
ilícita é diferente de atividade imoral, assim, a prostituição, pode, em caso de a lesão sofrida causar
incapacidade por mais de 30 dias, qualificar o delito. (Bitencourt, p. 287)

II - perigo de vida;

Se trata da existência de perigo concreto de morte, oriundo da lesão sofrida. Nesse sentido,
exemplificava Magalhães Noronha, “Um ferimento no pulmão é geralmente perigoso; todavia, pode, no
caso concreto, a constituição excepcional do ofendido, a natureza do instrumento ou qualquer outra
circunstância, impedir que se verifique esse risco. A lesão grave só existe, portanto, se, em um dado
momento, a vida do sujeito passivo esteve efetivamente em perigo” (Apud Bitencourt, p. 288) Lesões
como traumatismo craniano certamente qualificam o delito.

Importante frisar que se a intenção do agente foi a morte da vítima, não estar-se-á diante deste
tipo penal, mas da tentativa de homicídio.

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

É a redução da capacidade funcional da vítima, que deve ser por duração, ao menos imprevisível,
não se exigindo a confirmação de que a debilidade jamais poderá ser revertida.

Membros são partes do corpo que se prendem ao tronco, podendo ser superiores e inferiores:
braços, mãos, pernas e pés; sentido é a faculdade de percepção, de constatação e, por extensão, de
comunicação: visão, audição, olfato, paladar e tato; função é a atividade específica de cada órgão do
corpo humano (ex.: respiratória, circulatória, digestiva, secretora, locomotora, reprodutora e sensitiva).
(Bitencourt, p. 288)

IV aceleração de parto:
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
IV - aceleração de parto:
@prof.joaobittenocurt
O que se exige, em verdade, é que a agressão perpetrada provoque um nascimento prematuro,
uma antecipação de parto. Premissa desta qualificadora é que o feto seja expulso com vida e
sobreviva, pois a agressão que causa aborto (morte do feto) constitui lesão gravíssima (art. 129, º 2º,
V) - (Gonçalves,, p. 192)

O agente deve saber da gravidez para não caracterizar responsabilidade objetiva, bem como, é
crime preterdoloso, pois, a intenção do agente é lesionar e, culposamente, causa o nascimento
prematuro. Se a intenção fosse provocar o aborto e causasse o nascimento prematuro responderia por
tentativa de aborto sem o consentimento da gestante.

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

LESÃO CORPORAL GRAVÍSSIMA

As hipóteses deste parágrafo 2º apresentam pena maior do que as do parágrafo anterior, por isso
conhecidas como lesões gravíssimas.

É possível que o laudo pericial aponte, concomitantemente, a existência de lesão grave e


gravíssima, como a amputação de um braço, além de caracterizar lesão gravíssima pela perda de
membro, causou também perigo de vida à vítima pelo extenso sangramento provocado (lesão grave).
Nestes casos, o réu responde por crime único, aplicando-se a qualificadora de maior pena - lesão
gravíssima. Se uma mesma agressão provocar pluralidade de lesões gravíssimas, o fato só poderá ser
levado em conta pelo juiz na fixação da pena base, pois trata-se de crime único. (Gonçalves, p. 193)

§ 2° Se resulta:

I - Incapacidade permanente para o trabalho;

É a incapacidade para o trabalho em geral, a chamada incapacitação genérica e não especifica,


assim, afirma Gonçalves (p. 193) se alguém ganhava a vida como guitarrista profissional e a agressão
lhe causou diminuição na agilidade de uma das mãos, impossibilitando-o de continuar na profissão de
músico, mas poderá exercer diversas outras profissões, a lesão não será gravíssima, mas meramente
grave (incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias)

II - enfermidade incurável;

Trata-se da alteração permanente da saúde da vítima por processo patológico, a transmissão ou


provocação intencional de uma moléstia para a qual não existe cura no estágio atual da medicina.

III perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

Membros

Pode ocorrer por mutilação, quando o agente retira uma parte do corpo da vítima, como, cortar a
mão com um facão; ou amputação ocorre por cirurgia, após o agente dar causa a um ferimento em
uma perna, braço, etc.

A inutilização do membro determina que ele continue ligado ao corpo da vítima, todavia,
i it d d li ti id d
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
incapacitado de realizar as atividades próprias, como, após agressão, ficar paraplégica.
@prof.joaobittenocurt
A extirpação de um dedo constitui lesão grave (debilidade permanente), exceto se for o polegar,
em que a doutrina aponta tratar-se de lesão gravíssima por ficar a vítima impossibilitada de pegar e
segurar normalmente objetos. A extirpação da mão constitui inutilização de membro, e a do braço todo
constitui perda de membro. Provocar paralisia completa de braço ou perna é inutilização de membro,
enquanto provocar diminuição de sua força ou mobilidade caracteriza lesão grave.(Gonçalves, p. 195)

Se a vítima passar a utilizar prótese, da mão, braço, etc, o crime continuará consumado, porém,
em havendo reimplante e recuperado os movimentos, haverá desclassificação para lesão mais branda.

Sentidos

Já foi estudado que, em caso de cegueira em um só olho ou surdez em um só ouvido, há lesão


grave, porque a vítima continua podendo ver e ouvir, não tendo havido perda ou inutilização de quais
desse sentidos. Por isso, ocorre perda da visão ou audição quando a vítima fica totalmente cega ou
surda e inutilização quando resta tão pouca capacidade, que só consegue enxergar vultos disformes
ou sombras, ou só consegue ouvir sons distorcidos sem poder compreedê-los. (Gonçalves, p. 195)

Função

Algumas funções são imprescindíveis para a vida, como a respiratória, caso em que estará
configurada a morte. No caso de perda da função reprodutora, como na agressão em que a vítima
perde os testículos, pênis ou ovários, estará configurada a lesão gravíssima, já que extirpada a função
reprodutor ou sexual.

Também no caso de cirurgia transexual, com ablação do pênis, entende-se que não há crime se
fica plenamente demonstrado que a pessoa tinha todas as características psicológicas do sexo
feminino - via-se e comportava-se como mulher - de tal forma que a cirurgia somente lhe trouxe
benefícios. (Gonçalves, p. 196)

IV - deformidade permanente;

Trata-se de dano estético permanente e visível que provoque impressão vexatória. Pode ser a
perda de beleza, como cortes profundos que deixam grandes cicatrizes, queimaduras com água ou
ácido, arrancamento de olhos, orelhas

V - aborto:

Aborto, neste caso, é a consequência culposa do ato de lesionar, pois, trata-se de crime
preterdoloso, ou seja, dolo na lesão e culpa no aborto, mas, o agente deve saber da gravidez

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Lesão corporal seguida de morte

§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quís o resultado, nem
assumiu o risco de produzí-lo:

Trata-se de crime preterdoloso, pois a intenção era lesionar, mas, culposamente, surge a morte,
f
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
como numa facada na perna e atinge a artéria femural e morre de hemorragia.
@prof.joaobittenocurt
Se o agente comete vias de fato - ato agressivo sem intenção de lesionar - e disso decorre a morte
da vítima - o agente responde apenas por homicídio culposo. É o que ocorre quando alguém dá um
empurrão na vítima e esta acaba se desequilibrando e caindo de cabeça no chão, sofrendo, com isso
traumatismo craniano (Gonçalves, p. 199)

A diferença entre lesão corporal seguida de morte e homicídio culposo decorre de que na primeira
o antecedente é um delito doloso e, no segundo, um fato penalmente indiferente, ou, quando muito
contravencional. Assim, se a morte for consequência de simples via de fato (empurrão que causa a
queda da vítima e a lesão mortal), haverá homicídio culposo. (Mirabete, p. 83)

Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Diminuição de pena

§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o
domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a
pena de um sexto a um terço.

Como no homicídio, lesões nas modalidades graves, gravíssimas ou seguidas de morte possuem
a forma privilegiada, possibilitando a redução da pena. Mirabete (p. 83)afirma que são causas para
diminuir a pena as paixões sociais (patriotismo, sentimento filial) e a agressão por provocação injusta
da vítima que provoca violenta emoção

a) relevante valor social: tem motivação e interesse coletivo, deve ser relevante. Age nesta situação
quem agride por amor a pátria, por amor paterno ou filial.

b) relevante valor moral: diz respeito aos princípios éticos dominantes, nobre e merecedor de
indulgência. Deve ser relevante. A compaixão ou piedade perante o sofrimento.

"Os motivos de relevante valor social ou moral, também estão relacionados no artigo 65, III, a, CP,
como circunstâncias atenuantes. Se reconhecida a privilegiadora, inadmissível reconhecê-la como
atenuante para evitar o bis in idem. (Bitencourt, p. 82)

c) sob o domínio de violenta emoção: A emoção é um estado afetivo que produz


momentaneamente a violenta perturbação da personalidade do indivíduo. "A violenta emoção recebe
tratamento diferenciado segundo o grau de influência que possa ter sobre a autodeterminação do
agente: de um lado, poderá assumir a mera condição de atenuante de pena (quando tiver simples
"influência"), ou, então, como pode ocorrer nos crimes de homicídio e de lesões corporais, caracterizar
causa de diminuição de pena ou minorante (quando assumir o domínio). (Bitencourt, p. 83).

Ex.: O cônjuge que flagra uma traição, pai que agride estuprador da filha.

Sob o domínio de violenta emoção significa agir sob choque emocional, que subjuga o sistema
nervoso, situação em que os freios inibitórios são liberados, orientados por ímpetos incontroláveis,
que reduz a censurabilidade. No caso da atenuante do ar. 65, c, o agente se apresenta apenas sob
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

influência da violenta emoção e não dominado.


@prof.joaobittenocurt
d) injusta provocação da vítima: A provocação deve ter partido da própria vítima e seja injusta o que
não significa antijurídica, mas quer dizer não justificada, não permitida, não autorizada por lei. Não se
confunde com agressão que seria caso de legítima defesa.

Por fim, as privilegiadoras constantes do § 4o do art. 129 aplicam-se somente às lesões corporais
graves, gravíssimas ou seguidas de morte. Para a hipótese de lesões corporais leves, as
privilegiadoras aplicáveis são aquelas do § 5o, e não estas. (Bitencourt, p. 299)

Substituição da pena

§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa,
de duzentos mil réis a dois contos de réis:

I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior;

II - se as lesões são recíprocas.

A lei permite a substituição da pena por outra menos grave, desde que as lesões sejam leves,
podendo substituir a detenção por multa, quando for o crime praticado por motivo de relevante valor
social ou moral ou sob domínio de violenta emoção, logo após a injusta provocação da vítima ou
lesões recíprocas.

Lesão corporal culposa

§ 6° Se a lesão é culposa:

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

São as lesões causadas por imprudência, negligência ou imperícia e, como é culposa, não importa
a gravidade. São exemplos fumar próximo a um depósito de pólvora, provocando a explosão; avaliar,
erroneamente, o médico, a radiografia, não percebendo fraturas que ocasionaram deformidade ao
paciente; (Mirabete, p. 88)

Aumento de pena

§ 7o Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4o e 6o do art. 121
deste Código

O parágrafo 4º do artigo 121 estabelece que ao condenado por lesão corporal culposa quando o
crime resultar de inobservância de regra técnica de arte, ofício ou profissão, se o agente deixar de
prestar imediato socorro à vítima ou não procurar diminuir as consequências de seu ato ou fugir para
evitar a prisão em flagrante. Quando doloso o crime se a vítima for menor de 14 anos ou maior de 60
anos.

O parágrafo 6º trata de milícia privada sob pretexto de prestação de serviço de segurança ou por
grupo de extermínio.

Na aplicação dessa majorante deve se agir com extremo cuidado para não incorrer em bis in idem
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 34/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Na aplicação dessa majorante deve-se agir com extremo cuidado para não incorrer em bis in idem,
aplicando dupla punição pelo mesmo fato, isto é, condenar o agente pelo crime do art. 288-A e, ao
@prof.joaobittenocurt
mesmo tempo, condená-lo pelo homicídio ou pela lesão corporal com o acréscimo da majorante aqui
prevista. No caso, a condenação deverá ser somente pela prática do crime de constituição de milícia
privada (art. 288-A) e pelo de homicídio (simples ou qualificado, ou pela lesão corporal, dependendo
das demais circunstâncias), mas sem esta nova majorante, pois, a nosso juízo, configura um odioso
bis in idem. (Bitencourt, 294)

§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121

É o caso do perdão judicial, concedido sempre que a consequência for tão ou mais grave que a
aplicação de uma pena pelo Estado, como nos casos em que em acidente de veículo, dirigido pelo pai,
o filho resta lesionado.

Violência doméstica

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou


com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas,
de coabitação ou de hospitalidade:

Conforme especifica a lei 11.340/06, violência doméstica familiar contra a mulher é qualquer forma
de violência, por ação ou omissão, baseada no gênero e praticada no âmbito da família, do convívio
doméstico ou de relação íntima de afeto atual ou pretérita, ainda que ausente a coabitação, que cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (art. 5º e 7º)

Neste parágrafo também está inserida a lesão corporal leve, já que a proteção não é apenas à
incolumidade física, mas também do homem ou da mulher, mas também a tranquilidade e harmonia
familiar, pois há enorme insensibilidade com quem convive ou já conviveu.

O parágrafo tipifica a lesão corporal leve, em havendo vias de fato, não haverá a incidência. Para
Bitencourt (p. 304) Essa não abrangência das “vias de fato” na criminalização das lesões corporais
domésticas coloca em destaque a deficiência e a insuficiência desse novo tipo penal, que, para
atender às aspirações dos movimentos sociais referidos, mereceria outra redação, mais abrangente,
mais técnica e menos excludente. Para atingir esse desiderato, seria recomendável que ao lado do
verbo nuclear fosse incluída a locução “violência” ou mesmo “violência doméstica”, exatamente pela
extensão de seu significado.

Assim, acreditamos que, pela descrição típica, a lesão praticada contra ascendente, descendente,
irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, pode ser praticada em
qualquer local, e não apenas nos limites territoriais da “morada da família”: comprovando-se essa
relação com o sujeito passivo, eventual crime de lesão corporal leve encontrará adequação típica no §
9o, e não no caput do art. 129, como ocorria até o advento da Lei n. 10.886, de 17 de junho de 2004,
desde que, segundo os termos legais, “prevaleça-se” da situação doméstica. (Bitencourt, p. 304)

Com efeito, afora o elenco de sujeitos passivos contido no § 9o, a dita “violência doméstica” pode
ser praticada contra outros sujeitos passivos, desde que se prevaleça das relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade. A locução “ou ainda prevalecendo-se” quer significar que a mesma
conduta proibida pode tipificar-se quando for praticada contra “outros sujeitos”, além daqueles
expressamente mencionados, apenas com o acréscimo da elementar “prevalecendo-se das relações”
mencionadas Significa ainda a contrario sensu que a mesma conduta para adequar se ao tipo penal
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 35/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
mencionadas. Significa ainda, a contrario sensu, que a mesma conduta, para adequar-se ao tipo penal
em exame, não exige a presença desse elemento normativo, qual seja, prevalecer-se de “relações
@prof.joaobittenocurt
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade”, quando a vítima for uma daquelas mencionadas
expressamente no texto legal.

A babá que praticar lesões contra criança poderá ser enquadrada neste parágrafo, porém, deve-se
ficar presente que não se confunde esta violência doméstica com relação trabalhista.

Destaque-se que o termo violência tem significado mais abrangente que lesão corporal, pois, a
primeira não exige a lesão ou vias de fato

Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente, que, no entanto, poderá
preferir utilizar outros meios, como fogo, água, energia elétrica etc. Não é necessário que a violência
utilizada seja irresistível ou idônea para produzir graves danos; basta que possa ser definida como
violência e tenha condições de produzir lesões corporais (e não que as produza necessariamente)”
(Bitencourt, p. 306)

No entanto, a exemplo do que ocorre na injúria real — praticada com violência —, pode-se sustentar
que a “violência” mencionada no nomen iuris — violência doméstica — não abrange a violência moral,
isto é, a grave ameaça (vis compulsiva), pois, quando o legislador deseja integrá-la ao tipo
incriminador, o faz expressamente. Na verdade, sempre que o Código Penal emprega a expressão
“violência” sem a alternativa “ou grave ameaça” está excluindo a denominada “violência moral”,
limitando-se a adotar a violência física, ou seja, aquela que é empregada sobre o corpo da vítima.
(Bitencourt, p. 306)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o
deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço

Incidirá o aumento de pena nos casos de lesão corporal grave, gravíssima e seguida de morte

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido
contra pessoa portadora de deficiência

Quando as lesões forem praticadas como definidas no § 9º tiver como vítima portador de
deficiência, sem definir espécie ou extensão da deficiência.

Rogério Sanches invoca o decreto 3.298 de 1999 para definir o conceito de pessoa portadora de
deficiência. Bitencourt discorda, salientando que admitir majoração de pena por decreto presidencial
estar-se-ia infringindo o princípio da legalidade. A comprovação médica da existência de deficiência já
seria o suficiente, além, é claro, do agressor saber da existência de tal deficiência (p. 307)

Quanto a ação penal, sabe-se que a regra geral é que todo o crime é de ação pública plena e quando
não o for, haverá especificação para o tipo penal. A lesão corporal tratada como violência doméstica,
em se tratando de sua ação penal, foi pacificada por intervenção no STJ e STF ao a definirem como
ação penal de natureza pública incondicionada.

Na ADI 4 424 o STF decidiu que será de ação pública plena independentemente de ser dolosa ou
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Na ADI 4.424 o STF decidiu que será de ação pública plena, independentemente de ser dolosa ou
culposa (rel. Min. Marco Aurélio, 2012). Já, o STJ editou a Súmula 542 “A ação penal relativa ao crime
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de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada”

§ 12. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da
Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no
exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente
consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços

Essa causa de aumento, elevando em um a dois terços a pena, aplica-se a todas as modalidades de
lesões corporais dolosas, da mais leve até as lesões corporais gravíssimas e a seguida de morte. Fica
excluída, portanto, dessa majoração, somente a lesão corporal culposa independentemente de sua
gravidade (Bitencourt, p. 295)

CAPÍTULO III - Artigos 130 ao 136

Do artigo 130 ao 136, inseridos no capítulo III do título I, CP, crimes considerado subsidiários, ou
seja, somente imputável quando o fato não constitui crime mais grave, normalmente estes crimes de
perigo são subsidiários dos delitos de dano.

ART. 130 - PERIGO DE CONTÁGIO VENÉREO

Art. 130 - Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de
moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

A conduta típica constitui-se na prática de relação sexual ou qualquer ato libidinoso, inclusive o
beijo, (satisfação sexual) desde que haja contato corporal.

A proteção é destinada à saúde humana, ao sancionar a EXPOSIÇÃO de outra pessoa à doenças


venéreas. Mirabete esclarece que havendo o contágio pode haver crime de lesão corporal dolosa ou
culposa. (p.92)

O delito é crime comum, pode ser praticado por qualquer homem ou mulher, bem como a vítima.
Trata-se de norma penal em branco, inclusive se esclarece na Exposição de Motivos do CP, no item 44
estabelece que não se faz enumeração taxativa das moléstias venéreas, portanto, deve haver Portaria,
oriunda da ANVISA para definir as doenças.

A AIDS não é moléstia venérea. (Mirabete, p. 93) A AIDS, que não é moléstia venérea e que não se
transmite somente por atos sexuais, poderá tipificar o crime do art. 131, lesão corporal seguida de
morte ou até mesmo homicídio, dependendo da intenção do agente, mas nunca o crime de perigo de
contágio venéreo. (Bitencourt, p. 340)

O delito se consuma consuma com a exposição ao perigo, não havendo necessidade da


contaminação Para Bitencourt (p 349) "por fim a exemplo de outras figuras delituosas como a
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
contaminação. Para Bitencourt (p. 349) por fim, a exemplo de outras figuras delituosas — como a
extorsão @prof.joaobittenocurt
mediante sequestro, corrupção passiva etc. —, a efetiva contaminação do ofendido
constituirá simples exaurimento do crime de perigo de contágio venéreo, que, para alguns, tipificaria
um crime de dano, que poderia ser, eventualmente, lesão corporal dolosa ou culposa, conforme o caso.
Contudo, como o dolo é de perigo, presume-se que o agente não tenha querido transmitir a moléstia.
Assim, no máximo, poderia responder pelo crime de lesões corporais culposas, que, no entanto, ficaria
igualmente afastada em razão de sua sanção ser menor que a do crime de perigo. E, se houver a
intenção de contagiar a vítima, o tipo será a figura qualificada do § 1o do art. 130, cuja sanção já é
devidamente agravada

Este delito admite tentativa, pois há iter criminis, quando, por exemplo, o agente busca manter
relações com a vítima, que não aceita.

Se, no entanto, agiu com dolo de dano, responderá por lesão corporal dolosa, simples, grave ou
gravíssima, segundo a natureza desta.

Com a comprovação da prática de relações sexuais ou ato libidinoso qualquer, do agente com a
vítima presume-se o perigo. Trata-se, porém, de presunção juris tantun, que admite prova em contrário.
Ensina Hungria "Assim, se se averiguar que o sujeito passivo é pessoa com especial imunidade ao
contágio ou já contagiada (de moléstia da mesma natureza, e afastada a hipótese de uma possível
recrudescência), inexiste o crime: o mais que se poderá reconhecer uma uma tentativa inadequada".
(Mirabete, p. 93)

Na primeira parte do artigo há exigência de dolo de praticar o ato libidinoso, sabendo o agente que
está contaminado. Na segunda parte do artigo o agente deve saber que está contaminado.

Se o agente contaminado procura evitar a transmissão da moléstia, usando preservativos, por


exemplo, estará, com certeza, afastando o dolo. Com esse comportamento, se sobrevier eventual
contaminação, em tese, não deverá responder sequer por lesão corporal culposa, pois tomou os
cuidados objetivos requeridos nas circunstâncias. (Bitencourt, p. 339)

§ 1º - Se é intenção do agente transmitir a moléstia:

A intenção do agente é transmitir a moléstia, porém, como ensina Hungria, se o agente sabe-se
contaminado, mas não possui a intenção de transmitir estar-se-á diante do dolo eventual e o agente
deverá responder pelo caput, já que este parágrafo exige a intenção do dano. (Bitencourt, p. 440)

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Crime impossível

Restando comprovado que o ofendido já era contaminado ou portador da mesma moléstia, não
haverá crime, ou seja, evidenciado estará a hipótese de crime impossível, por absoluta impropriedade
do objeto. Em outros termos, não se pode expor a perigo de contaminação, ou mesmo contaminar,
quem já está contaminado. Haverá, igualmente, crime impossível se o sujeito ativo supuser,
erroneamente, que está contaminado. (Bitencourt, p. 349 e 350)

Podemos raciocinar com a hipótese de crime impossível, tanto pela ineficácia absoluta do meio
(agente que não é portador de qualquer doença) com pela absoluta impropriedade do objeto (vítima já
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 38/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
(agente que não é portador de qualquer doença), com pela absoluta impropriedade do objeto (vítima já
contaminada com a doença grave que o agente pretende transmitir-lhe). (Greco, p. 382)
@prof.joaobittenocurt
§ 2º - Somente se procede mediante representação.

A ação é pública condicionada à representação

ART. 131 - PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE

Art. 131 - Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato
capaz de produzir o contágio:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

O sujeito ativo poder ser qualquer pessoa contaminada e o sujeito passivo também não exige
qualidade especial. A contaminação poderá se dar pela prática de qualquer ato capaz de transmitir
(beijo, espirro intencional, lamber o garfo), inclusive sexual, desde que não seja para transmitir doença
venérea.

Pode o agente valer-se de meios diretos ou indiretos à consecução da transmissão da
moléstia grave. Meios diretos dizem respeito àqueles em que houver um contato pessoal
do agente, a exemplos do aperto de mão, do beijo, do abraço, etc. Indiretos são aqueles
que decorram da utilização de quaisquer instrumentos capazes de transmitir a moléstia
grave, a exemplo de seringas, bebidas, etc. (Greco, p. 381)

Em que pese o Código Penal não estabelecer o que é moléstia grave, que deve ser contagiosa, não
implica em norma penal em branco, já que grave e contagiosa decorre da própria doença e não
necessita diplomas complementares. Deve ser moléstia grave (tuberculose, gripe suína – pode se
doença sexual, desde que não decorra de ato sexual que tipifica o art. 130 - doença venérea)
Com efeito, moléstia grave é somente um elemento normativo, que exige, para a sua compreensão,
uma atividade valorativa, pois implica um juízo de valor, sendo insuficiente uma atividade meramente
cognitiva. Por isso, a definição do que é moléstia grave cabe à medicina, pois se trata de um conceito
médico. A moléstia grave, por fim, não contagiosa não é objeto de preocupação do art. 131.
(Bitencourt, p. 356)
Trata-se de crime de perigo, não há necessidade de efetivo contagio para a consumação, que ocorrerá
no instante em que o agente pratica o ato capaz de produzir o contágio, desde que praticado com o
dolo de transmitir a moléstia.
Haverá crime impossível se o agente não está contaminado, supondo o contrário, ou se a pessoa
que o agente quer contagiar já for portadora da doença, não sendo possível sequer sua agravação.
Também haverá crime impossível se o ato praticado não é hábil a contagiar, apesar de ser
transmissível a moléstia. (Mirabete, p. 97)
A ação penal é pública incondicionada.

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ARTIGO 132 - PERIGO PARA A VIDA OU SAÚDE DE OUTREM


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Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:

Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

O sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, bem como o sujeito passivo. A conduta consiste em expor
alguém a perigo – criar ou colocar a vítima em situação de risco (tirar fininho de um pedestre; não
fazer os exames no sangue do doador; fechar o carro de outra pessoa de forma intencional) – não
pode constituir fato mais grave;

Pratica o crime do art. 132 do CP o motorista que, imprimindo velocidade excessiva ao


seu caminhão, aproxima-se perigosamente do veículo da vítima que seguia a sua gente,
obrigando-a a imprimir em seu automóvel velocidade incompatível com as condições de
tráfego, para evitar que o agente lhe abalroasse a traseira, gerando, assim, situação de
risco aos envolvidos.(TJ/SP, Ap. 1185631-2, Rel. Jose´Urban, j. 29.06.2000)

Exige-se o dolo de expor a perigo e consuma-se no momento em que é praticado ato que resulte
perigo concreto;

Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de


outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos
de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais

É o caso, por exemplo, dos chamados boias-frias, os quais são transladados em caminhões para
as fazendas, sem cuidados necessários para o transporte. Mirabete (p. 100) esclarece que para a
tipificação neste parágrafo, não basta a desobediência às normas de trânsito, por exemplo, mas a
existência do perigo concreto para a vida ou saúde de outrem.

Como nas demais hipóteses (crimes anteriores) o art. 132 do Código Penal, foi consignado no tipo
penal aquilo que a doutrina denomina de subsidiariedade expressa, haja vista que a própria lei se
preocupou em alertar para o fato de que a infração penal de perigo somente será punida se não houver
a produção de um resultado mais grave, ou seja, o dano.
Se no disparo de arma de fogo houver lesão, o delito será de homicídio tentado, em regra.
Ocorrendo arremesso de objetos contra a vítima, poderá haver crime de lesão, caso estas venham a
ocorrer. Disparos em via pública o delito será do Estatuto do Desarmamento.
A ação penal é incondicionada.

ART. 133 - ABANDONO DE INCAPAZ

Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por
qualquer motivo incapaz de defender se dos riscos resultantes do abandono:
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qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono:

Pena @prof.joaobittenocurt
- detenção, de seis meses a três anos.

Abandonar significa deixar desassistido, desamparado, incapaz de defender-se dos riscos


resultantes do abandono, que se encontre na especial relação de assistência. É indiferente que o
abandono seja temporário ou definitivo, desde que seja por espaço juridicamente relevante, capaz de
colocar a vida em risco. (Bitencourt, p. 230 e 231)

Trata-se de crime próprio, pois só pode ser autor do delito quem exerce cuidado, guarda ou
vigilância ou autoridade sobre a vítima. O sujeito passivo é a pessoa que está sob guarda, cuidado ou
vigilância ou autoridade do agente, desde que incapacitada de se defender dos riscos.

A conduta consiste em deixar incapaz sem assistência, afastando-se dele, de modo que fique
exposto a risco, como ocorre nos casos envolvendo o marido em relação à esposa, guia alpino, pai em
relação aos filhos.

Caracteriza o delito de abandono de incapaz a conduta do acusado que sai para beber, os
deixando os filhos sozinhos no quintal, sem alimentação e retorna embriagado, não
prestando a eles a devida assistência, expondo-os a situação de perigo para a vida ou
para a saúde, sendo certo que presente está o dolo, pois agia com a vontade livre de fazê-
lo. (TJ/SP, Ap. 1323503/5, Rel. Oliveira Passos, j. 24.10.2002.)


Consuma-se no momento em que a vítima sofre situação concreta de perigo. Para Mirabete (p.
104) é possível a tentativa. Bitencourt (p. 236) exemplifica que o agente pode abandonar alguém nas
circunstâncias descrita no tipo penal, mas a pronta e imediata intervenção de terceiros pode impedir
que o risco se concretize.

§ 1º - Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

§ 2º - Se resulta a morte:

Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Estes dois parágrafos preveem figuras qualificadas pelo resultado, se do abandono resultar lesão
grave ou morte, da vítima. Quem abandona incapaz, como qual tem especial relação de "assistência ou
proteção, cria, com a sua conduta, o risco da ocorrência do resultado, e, nesse caso, assume a
condição de garantidor, mas, no caso deste artigo, um garantidor privilegiado", pois não responde pelo
resultado, como prevê o artigo 13, § 2º, alínea "c". (Bitencourt, p. 236 e 237)

Aumento de pena

§ 3º - As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço:

I - se o abandono ocorre em lugar ermo;

É o local considerado habitualmente isolado ou não frequentado pois, o fundamentado aumento


está na improvável ou impossibilidade de socorro.

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II - se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima.
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O aumento se funda na maior imperiosidade do dever que incumbe a estas pessoas, pois o
desvalor da ação é muito superior ao que fosse praticado por outra pessoa, não se admitindo analogia
para extensão do alcance da majorante. Greco afirma que para que seja preservado o princípio da
legalidade, cuja vertente contida no brocardo nullum crimen mulla poena sine lege stricta proíbe o
emprego de analogia in malam partem, temos de rechaçar a possiblidade de ser aplicada ao
companheiro a mencionada causa especial de aumento de pena. (p. 389)

Caso dos autos em que o réu abandonou seus filhos de 15 e 12 anos, deixando-os
sozinhos na casa em que residiam, sem alimentos, roupas e outros bens de uso
doméstico, vindo, os menores, a passar por privações e dificuldades, devendo o acusado
ser condenado pela prática do crime de abandono de incapaz, cabível a majoração da
pena, nos termos do previsto no art. 133, § 3º, CP. (TJRS, ACr 70035082890, rel. Des.
José Antônio Hirt Preiss, DJERS 28.07.2010.)

III – se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos

Representa maior gravidade o delito praticado contra pessoa idosa, mas, observe-se deve ser
maior de 60 anos.

A majoração deixará de existir se qualquer das figuras elencadas constituir elementar do tipo ou
sua qualificadora, como pode ocorrer, por exemplo, no crime de infanticídio. Não se aplica, igualmente,
as agravantes do art. 61, II, alíneas "e" e "h", para evitar bis in idem.

Esta majorante estabelece o aumento de 1/3 para todos os casos e a ação penal é incondicionada

ART. 134 - EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE RESCÉN NASCIDO

Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

expor (deixar em local onde não haverá assistência) ou abandonar (deixa onde ele estava e se afasta) o recém-
nascido.
- só há crime se o recém-nascido for exposto a perigo concreto (não configura deixar no hospital – configura
deixar na rodoviária, porta de um supermercado);
dolo com o fim de ocultar desonra própria.
- quando o fato já é conhecido da coletividade, não há como ocultar a desonra, é art. 133.
- se deixar na lata de lixo para morrer é homicídio tentado; (se estiver em estado puerperal, será infanticídio)
-
no momento em que o recém-nascido sofre perigo concreto;
a perigo, pois, a despeito de sua tenra idade, o perigo pode ter sido evitado pela empregada, familiares ou terceiros
que, imediatamente, recolham o abandonado. À evidência que, nesse caso, com a intervenção de terceiro, familiares
ã t í di t d t t ti
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ou não, esta­ríamos diante de tentativa.
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Sujeito ativo é o pai e mãe (Nélson Hungria, Magalhães Noronha, Damásio de Jesus, Mirabette) ou somente
a mãe (Celso Delmanto e Cezar Roberto Bitencourt)
Sujeito ativo do crime de abandono de rescén nascido somente pode ser a mãe (cfime próprio), vistoq ue
objetiva ocultar desonra própria. Contudo, admitimos que a mulher já decaída no conceito público, cuja desonra seja
notória, não pode ser sujeito ativo do crimen exceptum. (Bitencourt, p. 395)

b) Sujeito passivo:
- recém-nascido (duas correntes – queda do cordão unbilical ou primeiro mês)
Não se pode conceber como recém-nascido aquele que, com alguns meses de vida, é
abandonado pela mãe, que tinha por finalidade ocultar desonra própria. Nesse, caso, acreditamos,
o delito será aquele previsto pelo art. 133 do Código Penal.[1]
A omissão do Código Penal brasileiro em definir o recém­nascido, que preferiu uma linguagem menos
precisa, provocou profundas divergências doutrinário­juris­ prudenciais sobre limite e extensão desse
conceito, que, mais que médico, é norma­ tivo, mais que lógico, é político. Segundo Hungria, sempre
invocado como paradigma, afirmava que “O limite de tempo da noção de recém-nascido é o momento
em que a délivrance se torna conhecida de outrem, fora do círculo da família, pois, desde então, já não
há mais ocultar desonra”12 tude da definição de Hungria, sustentava que “é o que nasceu há poucos
dias”13 . . Magalhães Noronha, criticando a ampli­ . Para Damásio de Jesus, na mesma linha de Ari
Franco e Frederico Marques, “existe a figura do recém­nascido até o momento da queda do cordão
umbilical” (Bitencourt, p. 387)

- § 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - detenção, de um a três anos.

§ 2º - Se resulta a morte:

Pena - detenção, de dois a seis anos.

A exemplo do que afirmamos em relação ao crime de abandono de incapaz, a forma penal de 1984, com a previsão do
art. 13, § 2o, revogou os §§ 1o e 2o do art. 133. Esses dois dispositivos previam figuras qualificadas pelo resultado, se
do abandono do recém­nascido resultasse (a) lesão corporal de natureza grave ou (b) a morte da vítima. Na verdade, a
mãe que abandona recém-nascido, absolutamente incapaz de defender­se de qualquer perigo, é duplamente
garantidora, na condição de genitora (decorrente de lei — art. 13, § 2o, alínea a, do CP) e como criadora, com a conduta
anterior, do risco da ocorrência do resultado (art. 13, § 2o, alínea c, do CP). Logo, se sobrevier algum crime de dano, a
mãe responderá por este, como autora, na forma de comissão por omissão. (Bitencourt, 400 e 401)
Não é a opiniao de Greco, Mirabete e Victor Gonçalves.
- pública incondicionada;

[1] GRECO, Rogério, 2015, p. 390.

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ART. 135
@prof.joaobittenocurt OMISSÃO DE SOCORRO

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança
abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente
perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

O sujeito ativo é qualquer pessoa, mas o sujeito passivo deve ser criança abandonada,
extraviada, pessoa ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo.

O tipo objetivo consiste em:


a) falta de assistência imediata: (pessoa pode prestar o socorro imediatamente e não o faz – ex.: uma
pessoa vê outra se afogando e, sabendo nadar, nada faz para salvá-la – só se configura quando a
prestação de socorro não põe em risco a vida da pessoa)
b) falta de assistência mediata: (agente não podendo prestar socorro, deixa de solicitar auxílio às
autoridades)

A conduta é praticada com dolo e a consumação ocorre com a omissão.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza
grave, e triplicada, se resulta a morte.

causa de aumento de pena:


- se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave ou morte;

ART. 135-A CONDICONAMENTO DE ATENDIMENTO MÉDICO


HOSPITALAR

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Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento
prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar
emergencial:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão
corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte

O sujeito ativo é comum, pode ser qualquer pessoa e o sujeito passivo, àquela que necessita de
atendimento especial.
O tipo objetivo é exigir a assinatura da garantia de pagamento como condição para o atendimento,
preenchimento de formulários administrativos. É necessário que se trate de pessoa em quadro de
emergência;
O tipo Subjetivo é o dolo e o delito se consuma com a simples exigência da garantia ou
preenchimento de formulários, mesmo que depois a pessoa venha a ser atendida;
A ação pena é pública incondicionada.

ART. 136 - MAUS TRATOS

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Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para
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fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados
indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de
correção ou disciplina:
Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.
§ 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
§ 2º - Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
§ 3º - Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze)
anos.

O sujeito ativo é especial, por isso trata-se de crime próprio, já que deve haver relação jurídica de
autoridade. O sujeito passivo também exige condição especial, relação de subordinação. Como a
esposa não é subordinada, sendo vítima, haverá incidência do art. 129, § 9º)
O tipo objetivo é expor a vida ou a saúde da vítima por: (privação de alimentos; privação dos
cuidados indispensáveis; sujeição a trabalhos excessivos ou inadequados, abuso dos meios de
disciplina e correção) e tipo subjetivo é o dolo.
Consuma-se no momento da produção do perigo.

§ 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:


Pena - reclusão, de um a quatro anos.
§ 2º - Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
§ 3º - Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze)
anos.

Trata-se de crime preterdoloso, pois o resultado lesão grave ou morte não é doloso.

ART. 137 RIXA

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 46/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

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Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores:

Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.

Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação
na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Trata-se de tumulto, com grande quantidade de pessoas envolvidas, em que não se consegue
identificar quem é o agressor ou o agredido.
O sujeito ativo e passivo são comuns, desde que haja no mínimo três pessoas envolvidas, o
chamado concurso necessário
O tipo objetivo é tomar parte em troca de agressões, desferindo chutes, socos, pauladas, etc,
dividindo-se a participação em material, quem briga e moral, quem incentiva os demais a lutarem.
O tipo subjetivo é o dolo e consuma-se no momento da troca de agressões.
A ação penal é pública incondicionada.

Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação
na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Se resulta morte ou lesão de natureza grave. Trata-se de crime preterdoloso.

ART. 138 CALÚNIA

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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

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Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

Exceção da verdade

§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:

I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por
sentença irrecorrível;

II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;

III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença
irrecorrível.

O sujeito ativo é qualquer pessoa, já que se trata de crime comum, inclusive quem toma
conhecimento e sabendo da falsidade da imputação, a propala (§ 1º)
O sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa, inclusive desonrados, mortos, adolescente,
doentes mentais.
O tipo objetivo é imputar fato determinado, definido como crime, já que só existe calúnia se a
imputação for falsa;
O tipo subjetivo é o dolo de ofender a honra.
Consuma-se no momento em que terceira pessoa tomar conhecimento da imputação.
A distinção entre calúnia e denunciação caluniosa é:
a) calúnia: intenção é atingir a honra da vítima;
b) denunciação caluniosa: intenção é prejudicar a pessoa perante as autoridades públicas, narrando
que a pessoa teria cometido um crime ou contravenção, quando, na verdade, sabe que ela é inocente.
Os meios de execução podem ser verbal, escrito, gestos ou qualquer meio simbólico.
Exceção da verdade significa a possibilidade que tem o sujeito ativo de poder provar a veracidade
do fato imputado (art. 138, § 3o, do CP) Provada pelo agente que a imputação que faz é verdadeira,
não se há que falar em calúnia. A calúnia admite exceção da verdade, salvo em três hipóteses: nos
crimes de ação privada, quando o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível (§ 3o, I); nos
fatos imputados contra o presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro (§ 3o, II); se
o ofendido foi absolvido do crime imputado por sentença irrecorrível (§ 3o, III). (Bittencourt, p. 452 e 453)

ART 139 DIFAMAÇÃO

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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

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Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Exceção da verdade

Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e


a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

O sujeito ativo poder ser qualquer pessoa, bem como o sujeito passivo, inclusive pessoa jurídica,
porém, não é punível difamação contra mortos.
O tipo objetivo consiste em imputar fato determinado que cause má-fama, arranhe a reputação –
qualquer fato ofensivo que não seja crime (ex.: trabalhador embriagado no serviço; empreiteiro utilizou
material de péssima qualidade; empregado dorme no serviço; juiz não lê direito os processos; mulher
casada está tendo relações sexuais com o vizinho; viu determinada pessoa pagando programa para
travesti). Não se exige que a imputação seja falsa

O crime de difamação consiste na imputação de fato que incide na reprovação ético-


social, ferindo, portanto, a reputação do indivíduo, pouco importando que o fato imputado
seja ou não verdadeiro. ( STJ, Apn. 390/DF, rel. Min. Felix Fishcer).

O tipo Subjetivo consiste me dolo de denegrir a honra alheia. A consumação ocorre quando terceira
pessoa toma conhecimento e pode ser por escritos, verbal, gestos ou meios simbólicos.
A exceção da verdade é incabível, já que a veracidade da informação não afasta a tipicidade, exceto
quando o fato for imputado a funcionário público no exercício de suas funções, pois, há interesse em
demonstrar que um funcionário público agiu de forma irregular.

ART. 140 INJÚRIA

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:

I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio
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empregado, se considerem aviltantes:


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Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a
condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:

Pena - reclusão de um a três anos e multa.

Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, bem como o sujeito passivo, exceto pessoa jurídica. O tipo
objetivo difere dos demais crimes contra a honra (único que não atribui fato determinado), pois, o
agente não faz uma narrativa, mas qualifica negativamente outrem, com xingamentos, expressão
desonrosa para se referir a alguém. (safado, velhaco, vagabundo, golpista, corrupto, pedófilo, piranha,
vagabunda). O tipo subjetivo é o dolo de atingir a honra.
Consuma-se quando chega ao conhecimento da vítima;
Conforme o parágrafo 1º o juiz poderá deixar de aplicar a pena quando houver provocação do
ofendido (sujeito ativo xingou no momento em que era provocado pela vítima ou no caso de revide
imediato.
h) Injúria real (§ 2º)
- agente ofende a vítima por meio de agressão física (raspar o cabelo, esbofetear em público, cuspir no
rosto, atirar tomate pode em quem está fazendo um discurso)
- se resultar em lesões leves, haverá concurso formal de crimes (lesão + ofensa)

Disposições comuns

Exclusão do crime

Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes
é cometido:

Não se tratam de qualificadoras, mas majorantes, ou seja, causas de aumento de pena. Trata­-se, na
realidade, das mesmas ações que violam o mesmo bem jurídico honra, com a produção basicamente
do mesmo evento. No entanto, o desvalor dessas ações, em determinadas circunstâncias, é
consideravelmente maior e merece­dor, portanto, de maior reprovação penal. (Bitencourt, p. 496)

I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;

Como sustentava Magalhães Noronha, “por sua qualidade, pelas elevadas funções que exerce o
Presidente, pode dizer­-se que a ofensa a ele irrogada não deixa de refletir em todos os cidadãos. Essa
proteção “reforçada” da honorabilidade do presidente da República estende-­se expressamente a
“chefe de governo estrangeiro” por razões não apenas de política criminal, mas também de política
diplomática, que objetivam as boas relações internacionais. Eventual ofensa dirigida contra a honra
de um governante estrangeiro reflete-­se diretamente sobre a nação por ele governada. Enfim, a alta
relevância política da função exercida pelo presidente da República, primeiro mandatário da Nação,
justifica essa majoração legal. (Bitencourt, p. 496)

"Concluindo, para impedir a exceção da verdade, admitimos a ampliação do sentido da expressão


“chefe de governo” para abranger “chefe de Estado” (art. 138, § 2o), porque objetiva preservar a
honorabilidade dessa autoridade; mas essa ampliação interpretativa contudo será impossível para
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honorabilidade dessa autoridade; mas essa am­pliação interpretativa, contudo, será impossível para
majorar a pena (art. 141, I), por violar o princípio da reserva legal, algo inadmissível em um Estado
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Democrá­tico de Direito. (Bitencourt, p. 497)

II - contra funcionário público, em razão de suas funções;

Ofensa que se relaciona ao exercício de suas funções; da vida funcional, a dignidade da função.
Deve a ofensa relacionar-se ao cargo exercido.

Se se diz, v.g., que o tesoureiro de certa repartição não passa de vil peculatário, a injúria é
qualificada; não assim se se afirma que, em certo dia, ele seduziu determinada donzela; já
agora não há qualificação da calúnia, não há aumento de pena. (NORONHA, Edgard
Magalhães. Direito Penal, vol. 2, p. 133.)

III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação
ou da injúria.

Pelo menos três pessoas

A presença de duas pessoas, apenas, além do querelante e do querelado, não equivale à de


várias pessoas, como exigível para o reconhecimento da mesma qualificadora,
compreendendo-se, como tal, pelo menos três. (AP. Crim. 2006. 050.06257, 6. Câmara
Criminal, rel. Des. Maria Zelta Procópio da Silva, j. 11.10.2007)

São exemplos de meios que facilitam a divulgação dos crimes o uso de autofalante, distribuição
de folder, escrever em lugar de fácil acesso, como em muros, viadutos, autdoors.

IV – contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria.

Neste caso há ressalva ao delito de injúria, ou seja, em caso de prática de injúria não incide a
majoração de pena. Portanto, incide majoração a calúnia e difamação intentada contra pessoa maior
de 60 anos ou portadora de deficiência.
Se a prática for injuriosa, o delito perpetrado será o do art. 140, § 3º, CP, a injuria preconceituosa.
Para que ocorro a a majoração é necessário que o sujeito ativo tenha conhecimento da idade ou
limitação, caso contrário poderá haver erro de tipo. Para que ocorro a a majoração é necessário que o
sujeito ativo tenha conhecimento da idade ou limitação, caso contrário poderá haver erro de tipo.

§ 1º - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em


dobro.

No caso de alguém ser contratado para denegrir a honra da vítima, em razão da torpeza incide o
aumento de pena.

Exclusão do crime

A lei somente albergou como causas de exclusão do crime a injúria e a difamação, não incluindo a
calúnia.

Art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível:

I f i d j í
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di ã d l t d 51/171
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I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador;
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A ofensa tem que ser:
a) irrogada em juízo;
Deve ser no andamento da audiência. Pode ser por escrito, nos autos. (Greco, p. 436)
b) tenha relação com a discussão da causa;
O fato de chamar alguém de aproveitador e desonesto, na defesa que se faz por conta de
uma ação de cobrança que o agente entende como indevida, pode estar acobertado pela
imunidade judiciária, haja vista a sua ligação com a causa em litígio. (Greco, p. 437)

Ao contrário, dizer que a vítima é corno, pois que sua mulher tem o hábito de sair com
qualquer pessoa que conhece, não tem a menor ligação com a ação de cobrança, razão pela
qual o agente deverá responder pelo crime contra a honra. (Greco, p. 438)

c) proferida pela parte ou seu procurador.


Qualquer dos sujeitos da relação processual, como autor, réu, assistente, litisconsorte, MP, etc.
Há entendimento que se pode, inclusive, ser contra o magistrado, já que a lei penal não faz
distinção. (Greco, 438)

A imunidade do advogado não é limitada subjetivamente quanto à ofensa irrogada contra


magistrado, porque inexiste no ordenamento jurídico tal restrição, entendimento que, com
maior rigor, deve prevalecer após a nova ordem constitucional que instituiu a imunidade
profissional, mais abrangente que a imunidade judiciária. Embora excessiva, desnecessária
e censurável a manifestação do advogado em face da conduta do magistrado, se verificada
no contexto da discussão da causa e mediante provocação do juiz do feito quanto à sua
atuação, impõe-se o reconhecimento da inviolabilidade profissional (STJ, RHC, 14166/RJ,
rel. Min. Paulo Medina, 6. Turma)

II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a


intenção de injuriar ou difamar;

Não pode ser com a intenção de macular a honra da vítima, deve ser crítica e com esta intenção.

III - o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que
preste no cumprimento de dever do ofício.

Parágrafo único - Nos casos dos ns. I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá
publicidade.

Quando o funcionário relata fatos, mesmo que emitindo conceitos desfavoráveis, o faz em benefício
da Administração Pública, sendo seu dever de ofício relatar tudo com a maior fidelidade possível,
mesmo que suas informações maculem a imagem de pessoas, exclui-se a ilicitude em razão do estrito
cumprimento do dever legal.
Deve ser praticado no cumprimento de dever funcional, dentro das atribuições do funcionário.

Palavras que, em tese constituem injúria, proferidas por magistrado em relação à colega, em
sessão reservada para apreciar conduta do ofendido, como resultado de acerba discussão,
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 52/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
p p , ,
não tipifica a injúria (art. 140 CP), devendo ser reconhecida e excludente do art. 142, III, do
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CP. (STJ, Apn, 101, rel. Min.Willian Patterson)
- Agente que dá publicidade...
Significa que não há a imunidade dos incisos I e III, aquele que, tomando conhecimento da
difamação e ou injuria, dá publicidade a elas.

Retratação

Art. 143 - O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação,
fica isento de pena.

Parágrafo único. Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-
se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios
em que se praticou a ofensa.

Trata-se de extinção da punibilidade, conforme art. 107, VI, CP.


Somente há retratação nos delitos de calúnia e difamação, excluindo-se a injúria. Deve ser feita
antes da sentença.

O ofensor tem oportunidade de se retratar de forma cabal nos crimes de calúnia e


difamação até a sentença, quando ficará isento de pena. (TJ/RJ, Ap. crim. N.
2002.050.02207, rel. Des. João Antônio, j. 8.8.2002)

É incabível a retratação nos crimes contra a honra praticados contra funcionário público, em
razão de suas funções, por ser ação penal incondicionada. (STJ/RHC 6718/RJ,
rel.Min.Edson Vidigal, 5. T)
A retratação, prevista no art. 143 do CP, tem sua aplicabilidade restrita a ação penal privada,
relativa aos crimes de calúnia e difamação,. Tratando-se ação penal pública, incabível é a
retratação. (STF (RHC/SP 61303) STJ, REsp/DF. 60048)

Art. 144 - Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se
julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não
as dá satisfatórias, responde pela ofensa.

Procedimento anterior ao início da ação penal de iniciativa privada. Ocorre quando, o


agente, embora não afirmando fatos ofensivos à honra da vítima, deixe pairar no ar algumas
dúvidas, valendo-se de expressões equívocas, com duplo sentido. ( GRECO, Rogério, p.
443.)
Se o agente não se explicar, haverá normal processamento, podendo até mesmo ser absolvido.
Caso opte por explicar-se em juízo e, em virtude disso, dissipar a dúvida com relação aos termos e
expressões dúbias por ele utilizadas, restará afastado o dolo, eliminando-se a infração penal.
O juiz não julga a natureza das explicações ou a sua recusa, mas havendo o oferecimento
da peça preambular da ação penal, avaliará se as explicações atendem os postulados
doartT. 144. (BITTENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de direito penal, v. 2, p. 416.)

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo
quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput
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do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo,
bem como no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

A ação penal nos crimes contra a honra, como regra geral, é de exclusiva iniciativa privada (art.
145), ao contrário da acepção do Código Penal, segundo a qual a ação penal pública incondicionada é
a regra geral; será, no entanto, pública condicionada (art. 145, parágrafo único) quando: a) praticada
contra presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro (com requisição do ministro da
Justiça); b) contra funcionário público, em razão de suas funções (com representação do ofendido); c)
tratar­-se de injúria preconceituosa (§ 3o), segundo a nova redação do parágrafo único do art. 145 (Lei
n. 12.033/2009).
E, finalmente, a ação penal será pública incondicionada (arts. 140, § 2o, e 145, caput, 2a parte)
quando, na injúria real, da violência resultar lesão corporal. Essa é uma peculiaridade exclusiva da
injúria, que os outros crimes contra a honra — calúnia e difamação — não têm. No entanto, a ação
penal será pública incondicionada somente em relação às lesões corporais, pois, em relação ao crime
de injúria, a ação penal continua de exclusiva iniciativa privada. Ademais, com o advento da Lei n.
9.099/95, que transformou a natureza da ação penal no crime de lesões corporais leves, deve-­se rever
essa previsão no crime de injúria. Assim, quando da violência resultarem lesões corporais leves, a
ação penal será pública condicionada à representação, e somente quando resultarem lesões graves a
ação penal será pública incondicionada.
Assim, quando da violência resultar lesões corporais leves, a ação penal será pública
condicionada à representação, e somente quando resultarem lesões graves a ação penal será
pública incondicionada.(BITTENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de direito Penal, v, 2, p. 349)

ART. 146 - CONSTRANGIMENTO ILEGAL

Constrangimento ilegal

Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver
reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a
fazer o que ela não manda:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Aumento de pena

§ 1º - As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, se


reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de armas.

§ 2º - Além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência.

§ 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo:

I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante


legal, se justificada por iminente perigo de vida;
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

II - a coação exercida para impedir suicídio.


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O sujeito ativo é qualquer pessoa, bem como o sujeito passivo. O tipo objetivo é ocorre quando o
agente constrange, coage, obriga a vítima a fazer ou não fazer algo; (agente ameaça de fazer um mal,
inibindo a vítima a não realizar um trabalho para o qual fora contratado não é crime de ameaça).
O tipo Subjetivo é o dolo e consuma-se, já que crime material, quando a vítima, coagida, faz o que o
agente mandou ou deixa de fazer o que ele ordenou.
A ação penal é incondicionada e há previsão de aumento de pena quando, para executar o crime se
reúnem mais de três pessoas ou há emprego de arma. Há autonomia das lesões quando resultar o
constrangimento, também, em lesões.
Quanto às excludentes da tipicidade, ocorrem quando há intervenção médico-cirúrgica em caso de
discordância do paciente, por correr perigo de vida, não se constituindo em lesão corporal quando o
paciente está desacordado, bem como coação para impedir suicídio.
Há caráter subsidiário este delito, pois é extorsão obrigar vítima a assinar cheque, obrigar credor a
não entrar em juízo (intenção econômica); é estupro força a vítima a atos de natureza sexual (intenção
libidinosa); é tortura obrigar com violência a confessar um crime; é sequestro ou cárcere privado privar
pessoa da liberdade por certo tempo; é crime contra consumidor forçar a pagar dívida; é crime eleitoral
obrigar a votar; é crime de tortura obrigar a entregar carregamento de droga..
O constrangimento exercido para satisfazer uma pretensão legítima tipifica o art. 345 do CP, exercício
arbitrário das próprias razões.
Situação de permanência: a privação da liberdade de alguém, mediante sequestro ou cárcere privado,
exige permanência, isto é, deve perdurar no tempo por lapso razoável. Tanto assim que o crime é
permanente, aquele cuja consumação se prolonga no tempo. Uma conduta instantânea de impedir que
alguém faça alguma coisa que a lei lhe autoriza concretizar, segurando-a por alguns minutos, configura
o delito de constrangimento ilegal. O fato de se exigir uma situação de permanência não significa que,
para a consumação do crime do art. 148, haja necessidade de muito tempo. O importante é detectar a
intenção do agente para a tipificação do delito correto: se o autor age com a intenção de reter a vítima
por pouco tempo para que não pratique determinado ato, é constrangimento ilegal; se atua com a
vontade de reter a vítima para cercear-lhe a liberdade de locomoção, é sequestro; se atua com a
intenção de privar-lhe a liberdade para exigir alguma vantagem, trata-se de extorsão mediante
sequestro. (Nucci, 2021)

Situação de permanência: a privação da liberdade de alguém, mediante sequestro ou cárcere privado,


exige permanência, isto é, deve perdurar no tempo por lapso razoável. Tanto assim que o crime é
permanente, aquele cuja consumação se prolonga no tempo. Uma conduta instantânea de impedir que
alguém faça alguma coisa que a lei lhe autoriza concretizar, segurando-a por alguns minutos, configura
o delito de constrangimento ilegal. O fato de se exigir uma situação de permanência não significa que,
para a consumação do crime do art. 148, haja necessidade de muito tempo. O importante é detectar a
intenção do agente para a tipificação do delito correto: se o autor age com a intenção de reter a vítima
por pouco tempo para que não pratique determinado ato, é constrangimento ilegal; se atua com a
vontade de reter a vítima para cercear-lhe a liberdade de locomoção, é sequestro; se atua com a
intenção de privar-lhe a liberdade para exigir alguma vantagem, trata-se de extorsão mediante
sequestro. (Gonçalves, Victor Eduardo, R , 2022)

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 55/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

@prof.joaobittenocurtART. 147 - AMEAÇA

O art. aponta os meios pelos quais o autor pode levar a efeito o delito de ameaça. Segundo o
diploma repressivo, a ameaça pode ser praticada por meio de palavras, escritos (cartas, bilhetes) ou
gestos (faz gesto de degola).
A ameaça se consuma ainda que, analisada concretamente, a vítima não tenha se intimidado ou
mesmo ficado receosa do cumprimento da promessa de mau injusto. Basta, para fins de sua
caracterização que a ameaça tenha a possibilidade de infundir temor em uma pessoa e tenha chegado
ao seu conhecimento, não havendo necessidade da presença da vítima.
Quanto à tentativa é controvertido. Noronha afirma ser possível, já que pode haver
fracionamento, como no caso de uma carta. Para Hungria isso se trata de ato preparatório.
Refuta-se, afirmando que ato preparatório é a compra de papel, caneta. A remessa é ato de
execução. (NORONHA, Edgard Magalhães, v. 2, p. 159.)
Para ser ameaça deverá ser promessa de um mal futuro, injusto e grave. Não se pode confundir com
a ameaça constante em crimes como a do constrangimento ilegal e do roubo.
Por outro lado, quando há promessa de mal imediato, caso este venha a ser concretizado, a ameaça
ficará por ele absorvida.
Para Nucci a ameaça deve ser de mal futuro, afirmando que ou o agente busca intimidar ou
seu oponente, prometendo-lhe a ocorrência de um mal injusto e grave que vai acontecer, ou
está prestes a cometer um delito e avizinha-se dos atos executórios, portanto, uma
tentativa, caso não chegue à consumação. Exemplifica com o sujeito que diz que vai pegar
a arma para matar o seu rival, o que, de fato, está fazendo. Deve ser considerado um ato
preparatório ou até mesmo executório do delito de homicídio. ( NUCCI, Guilherme de
Souza. Código Penal Comentado, p. 466.) Mesma posição sustenta Greco. (GRECO,
Rogério, p. 456.)
Em sentido contrário Damásio de Jesus afirma que a figura típica do art. 147 do CP não
exige que o mal seja futuro. Além disso, futuro é tudo aquilo que ainda não aconteceu,
referindo-se ao fato de que irá ocorrer em instantes ou depois de algum tempo. ( JESUS,
Damásio E.. Direito Penal. V. 2, p. 250. JESUS, Damásio E.. Direito Penal. V. 2, p. 250.)
Superstição.
Aos que acreditam em superstição, é possível que alguém afirme que irá fazer uma
macumba para ocorrer um acidente de trânsito. Ofende o bem juridicamente protegido,
portanto, haverá responsabilização. ( GRECO, Rogério, p. 457.)
Ameaça proferida em estado de ira ou cólera
São as ocorridas durante discussões acaloradas. Não há unanimidade em apontar se o fato seria
crime de ameaça.
As ameaças proferidas no ímpeto da cólera não são politicamente imputáveis, e deve ser
consideradas como meras expressões jactanciosas. (CARRRA, Francesco. Programa de
Derecho Criminal, v. 4. P. 373.)

Também assevera Fragoso que não há crime se a ameaça constituir apenas uma explosão
de cólera, não revelando o propósito de intimidar. (FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de
direito penal, p. 223.)
Apesar da autoridade dos renomados autores acreditamos que permissa vênia não ser
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Apesar da autoridade dos renomados autores acreditamos que, permissa vênia, não ser
essa a melhor posição. Isso porque grande parte das ameaças são proferidas enquanto o
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agente se encontra em estado colérico. Entretanto, isso, não significa afirmar que, em
decorrência desse fato, o mal prometido não tenha possibilidades de infundir temor à
vítima. (GRECO, Rogério, p. 455.)
O estado de ira, de raiva ou de cólera não exclui a intenção de intimidar. Ao contrário, a ira é
a força propulsora da vontade de intimidar. ( BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de
Direito Penal, 2007, p.368.)
Observe-se que para caracterizar a ameaça não há necessidade de que o agente, efetivamente
tenha a intenção real de cometê-lo, bastando que seja capaz de infundir temor em um homem normal.
AMEAÇA PROFERIDA EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ

Parte da doutrina afirma que, nesse caso, a embriaguez afastaria o dolo do agente, a exemplo de
Luiz Regis Prado que esclarece não poder ser havida como séria a ameaça realizada em estado de
embriaguez do agente. ( PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal brasileiro, v. 2, p. 284.)

Se o agente estiver embriagado a ponto de não saber o que diz, não teremos condições de
identificar o dolo em seu comportamento. Entretanto, se a embriaguez foi um ato que teve o
poder de soltar os freios inibidores do agente, permitindo que proferisse a promessa de um
mal injusto e grave, pois que pretendia infundir temor à vítima, não podemos descartar a
caracterização do delito. Assim, somente aquele estado de embriaguez que torne ridícula a
ameaça feita pelo agente é que poderá afastar a infração penal, em razão da evidente falta
de dolo; ao contrário, se o agente, mesmo que sob os efeitos do álcool ou de substâncias
análogas, tiver consciência do seu comportamento, deverá responder pelas ameaças
proferidas. (GRECO, Rogério, p. 458.)

ART. 147- A - PERSEGUIÇÃO

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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

@prof.joaobittenocurt
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade
física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou
perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:

I – contra criança, adolescente ou idoso;

II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121
deste Código;

III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.

§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

§ 3º Somente se procede mediante representação.

ART. 148 - CÁRCERE PRIVADO


Privar alguém de sua liberdade significa retirar o direito de ir e vir ou permanecer.
(...) O que a lei penal protege, na espécie, particularmente, é a liberdade pessoal de
movimento, a faculdade de movimento da pessoa no âmbito especial que a lei lhe
assegura, o direito de ir e vir ou escolher o lugar onde quer ficar. (TJRS, Ap Crim.
70017814807, 2 Câm. Crim., rel. Marco Aurélio de Oliveira Canosa, DJ 18.1.2008.)
Entende-se que sequestro e cárcere privado significam a mesma coisa, apenas que, no cárcere
privado há menor espaço para se locomover.
MODALIDADES QUALIFICADAS
Parágrafo Primeiro
I – vítima ascendente
II - internação da vítima
Em locais para tratamento de saúde física ou mental. Se o crime é praticado internando-se a
vítima em casa de saúde ou hospital, onde o agente consegue mascarar sua intenção criminosa,
revestindo-se de aparente legitimidade sua conduta.
III – privação da liberdade dura mais de 15 dias.
No mínimo 16 dias.
IV – crime praticado contra menor de 18 anos
V – crime praticado com fins libidinosos.
Conjunção carnal, relação anal, sexo oral praticado por homem ou mulher.
O delito será qualificado mesmo que o agente não pratique qualquer ato de natureza libidinosa
com a vítima.
No entanto, se vier a praticá-lo, haverá o chamado concurso de crimes, respondendo o agente pelo
seqüestro qualificado em concurso material com o delito sexual, como o estupro.

Parágrafo segundo
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Parágrafo segundo
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tratos, para Hungria se deve entender qualquer ação ou omissão que cause o possa causar
dano ao corpo ou saúde da vítima ou vexá-la moralmente (exercer contra ela violências, privá-las de
alimentos ou da possibilidade de asseio, sujeitá-la a zombarias cruéis, não lhe dar agasalho contra frio,
etc). Se dos maus tratos resultar lesão corporal ou morte, haverá concurso material de crimes,
respondendo o agente na conformidade do art. 51. (69 – concurso material)
A expressão natureza da detenção refere-se ao modo e condições objetivas da detenção em si
mesma (meter a vítima a ferros ou no tronco, insalubridade do local, forçada promiscuidade da vítima
com gente de classe muito inferior à sua, exposição da vítima a males ou perigos que excedem aos da
forma simples do crime. (HUNRIGA, Nélson. Comentários ao Código Penal, v. VI, p. 198.)
Restando comprovada a restrição de liberdade da vítima por razoável lapso temporal,
sem o seu devido consentimento, não há como se acolher a tese absolutória quanto
ao delito de cárcere privado. (TJMG, Processo 1.0672.07.266351-7/001, rel. Des.
Antônio Armando dos Anjos, DJ 21.05.2009.)
Não há qualquer dúvida de que o acusado restringia a liberdade física da vítima,
mantendo-a trancafiada no interior da residência, na companhia de seus filhos.
(TJRS, AC 70024517179, 1 Câm. Criminal, rel. Des. Ivan Leomar Bruxel, DJ
29.12.2008.)
A conduta descrita na peça acusatória amolda-se perfeitamente ao tipo penal
descrito no art. 148 do Código Penal, uma vez que, após a consumação do delito de
roubo, os agentes efetuaram a conduta de privar a liberdade de locomoção das
vítimas, o que só veio a cessar com a intervenção dos policiais que efetuaram a
prisão em flagrante. (STJ, HC 61488/MS, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ
7.02.2008.)
SUJEITO ATIVO E PASSIVO
Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo. Todavia, se o crime for praticado por funcionário público
no exercício de suas funções, aplica-se, de acordo com o princípio da especialidade , a alínea “a” do
art. 3 da Lei 4898/1965 (abuso de autoridade)
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Consuma-se com a efetiva impossibilidade de locomoção da vítima.
Admite tentativa, todavia, se a vítima, por curto espaço de tempo se viu limitada no seu direito
ambulatorial, o delito será consumado.

SEQUESTRO E ROUBO COM PENA ESPECIALMENTE AGRAVADA PELA RESTRIÇÃO DA LIBERDADE


DA VÍTIMA
Se durante a prática de um crime de roubo a vítima for privada de sua liberdade por um
período relativamente curto, teremos tão somente o crime de roubo com a pena
especialmente aumentada em razão da aplicação do inc V do parágrafo 2 do art. 157 do CP.
Se for por um período longo de privação de liberdade, podemos raciocinar em termos de
concurso material entre o delito de roubo e o de seqüestro ou cárcere privado, afastando-se
neste caso, a causa especial de aumento de pena do roubo. (GRECO, Rogério, 2015, p.
464.)
Em concurso material, caracterizados restam os delitos de cárcere privado (art. 148, doCP)
e de roubo simples (art. 157, CP), e não, somente, o de roubo qualificado (art. 157, § 2º, V,
do CP), se a vítima é mantida presa e amarrada muitas horas após consumado o delito
patrimonial devendo ser este post factum punível de forma autônoma ( TJMG Processo
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patrimonial, devendo ser este post factum punível de forma autônoma. ( TJMG, Processo
1.0251.02. 000259-7/001, rel. Gudesteu Biber, pub. 19.9.2006.)
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SÚMULA 711 DO STF.
“A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é
anterior à cessação da continuidade ou da permanência”.

ART. 149 - REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À ESCRAVO

Redução a condição análoga à de escravo

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva,
quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de
dívida contraída com o empregador ou preposto: (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. (Redação dada pela Lei nº
10.803, de 11.12.2003)

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;
(Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador,
com o fim de retê-lo no local de trabalho. (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

I – contra criança ou adolescente; (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

Modernamente a escravidão não é lícita, portanto, o bem jurídico protegido é a coação do agente, a
uma situação de fato, permanentemente ilegítima.
O bem jurídico protegido é a liberdade individual. O crime fere a dignidade humana, despojando-os
de todos os seus valores ético-sociais, transformando em coisa.
A redução a condição análoga à de escravo difere do crime de seqüestro ou cárcere privado,
pois, naquele a liberdade “consiste na impossibilidade de mudança de lugar, sempre e
quando a pessoa queria, sendo indiferente que a vontade desta dirija-se a essa mudança”,
enquanto neste, embora também se proteja a liberdade de autolocomover-se do indivíduo,
ela vem acrescida de outro valor preponderante, que é o amor próprio, o orgulho pessoal, a
dignidade que todo indivíduo deve preservar enquanto ser, feito à imagem e semelhança do
criador. (BITENCOURT, Cezar Roberto, 2007, p. 383)
Sujeito ativo e passivo
Sujeito ativo é qualquer pessoa, pois é um crime comum. Se for funcionário público, no exercício
de suas funções, poderá ser enquadrado no crime de abuso de autoridade, Lei 4898/65.
Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa desde que esteja na condição de contratado
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa, desde que esteja na condição de contratado,
empregado, empreiteiro, operário do sujeito ativo. Deve haver relação de vínculo trabalhista entre
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sujeito ativo e passivo.
Tipo objetivo
Reduzir significa sujeitar uma pessoa à outra, em condição semelhante à de escravo, a um estado
de servidão, de submissão absoluta.
Não se trata de simples encarceramento ou confinamento, que constituiriam crimes menos
graves. É irrelevante que a vítima tenha ou disponha de relativa liberdade, pois esta não lhe será
suficiente para libertar-se do jugo do sujeito ativo.
Os meios para a prática do crime são variados, como a retenção de salário, pagamento
irrisório, descontos de alimentação e de habitação desproporcionais aos ganhos com
violência ou grave ameaça. Quase sempre a finalidade da conduta delitiva é a prestação de
serviços, ou seja, a execução de trabalho em condições desumanas, indignas ou sem
remuneração adequada. (BITENCOURT, Cezar Roberto, 2007, p. 385)
O crime é de ação vinculada, permitindo o texto legal a tipificação do ilícito sempre que se mostrar
presente quaisquer das condutas típicas nele elencadas. (GONÇALVES, Victor Eduardo Rio, 2013, p.
295.) Portanto, incide no crime quem, constituindo em numerus clausus.
a) submissão da vítima a trabalhos forçados ou jornada exaustiva;
O crime de redução à condição análoga à de escravo caracteriza-se mediante a submissão
dos trabalhadores em sentido amplo, de modo que um pequeno excesso na jornada de
trabalho é justificativa insuficiente para aperfeiçoá-lo. A necessidade de colheita imediata
de uma safra perecível, serviço de natureza temporária, embora não justifique a exploração
dos trabalhadores contratados para este fim, é circunstância comum no campo que exige
um esforço extra de mão de obra, sem, em tese, caracterizar trabalho escravo. (TRF, rel.
Italo Fioravanti SAbo Mendes, DJe 4.7.2014.)
b) sujeição a condições degradantes de trabalho;
Desprezam-se as condições mínimas de respeito às normas de proteção ao trabalho, de saúde,
segurança e higiene, etc...
c) restrição, por qualquer meio, da liberdade de locomoção em razão de dívida contraída para com o
empregador ou preposto deste;
V.g, o trabalhador é obrigado a comprar cesta básica de alimentação de seu próprio empregador,
quase sempre por preços superiores aos praticados no mercado, transformando-se em um refém de
sua própria dívida.
PARÁGRAFO PRIMEIRO
d) cerceamento do uso de meios de transporte, com intuito de reter a vítima no local de trabalho;

e) manutenção de vigilância ostensiva no local de trabalho ou apoderamento de documentos ou
objetos pessoais dos trabalhadores, com o fim de retê-lo.
Parágrafo Segundo:
I) contra criança e adolescente....
Conceito fornecidos pelo ECA, ou seja, até 12 anos incompletos é criança e até 18, ao completar a
maioridade, é adolescente.
II – por motivo de preconceito.....
O que impeliu o agente a reduzir à vítima à condição análoga de escravo foram questões de
preconceito.
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 61/171
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p
PENA:
De 2 @prof.joaobittenocurt
a 8 anos e multa, além da correspondente à violência, havendo fraude ou ameaça, serão
absorvidas.

ART. 149 -A - TRÁFICO DE PESSOAS

Art. 149-A. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa,
mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de: (Incluído pela Lei nº
13.344, de 2016) (Vigência)

I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo; (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016)
(Vigência)

II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; (Incluído pela Lei nº 13.344, de


2016) (Vigência)

III - submetê-la a qualquer tipo de servidão; (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

IV - adoção ilegal; ou (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

V - exploração sexual. (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016)
(Vigência)

§ 1o A pena é aumentada de um terço até a metade se: (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016)
(Vigência)

I - o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de
exercê-las; (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

II - o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência;
(Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

III - o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de


hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao
exercício de emprego, cargo ou função; ou (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional. (Incluído pela Lei nº 13.344,
de 2016) (Vigência)

§ 2o A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização
criminosa. (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016) (Vigência)

ART. 150 - VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 62/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Art. 150 -@prof.joaobittenocurt


Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou
tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

§ 1º - Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou


de arma, ou por duas ou mais pessoas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência.

§ 2º - (Revogado pela Lei nº 13.869, de 2019) (Vigência)

§ 3º - Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências:

I - durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar prisão ou outra diligência;

II - a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na
iminência de o ser.

§ 4º - A expressão "casa" compreende:

I - qualquer compartimento habitado;

II - aposento ocupado de habitação coletiva;

III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

§ 5º - Não se compreendem na expressão "casa":

I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição
do n.º II do parágrafo anterior;

II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

FURTO
Conceito de furto:

Furtar significa apoderar-se ou assenhorear-se de coisa pertencente a outrem, ou seja, tornar-se


senhor ou dono daquilo que, juridicamente, não lhe pertence. (Nucci, 2020, p. 759)

O tipo subtrair significa tirar, fazer desaparecer ou retirar e, somente em última análise, furtar
(apoderar-se). O simples fato de alguém tirar coisa pertencente a outra pessoa não quer dizer,
automaticamente, ter havido um furto, já que se exige, ainda, o ânimo fundamental, componente da
conduta de furtar, que é assenhorear-se do que não lhe pertence. (Nucci, 2020)

O sujeitos ativo e passivo podem ser qualquer pessoa, já que não exigem condição especial. Para
Nucci (2020) não é sujeito passivo o mero detentor da coisa; se não é proprietário nem possuidor, não
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pode figurar como sujeito passivo de crime patrimonial, pois a detenção não possui valor econômico.
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Exemplo: o funcionário da empresa, ao levar o dinheiro ao banco para efetuar um pagamento referente
ao empregador, caso tenha a quantia subtraída, o sujeito passivo é a empresa. O segundo refere-se ao
caso do ladrão que subtrai coisa já furtada de outro ladrão. Há crime de furto, embora a vítima seja o
legítimo dono ou possuidor do objeto. Portanto, inexiste impunidade: o primeiro ladrão, bem como o
segundo respondem por furto, tendo por sujeito passivo o proprietário da coisa.

O crime consuma-se quando a coisa sai da esfera de proteção ou vigilância da vítima, já que
atualmente não é necessária a posse mansa e pacífica, mas apenas que seja retirado da esfera de
proteção do proprietário por algum tempo, já que é crime material, porém, segundo Nucci (2020) se
houver perseguição e em momento algum conseguir o autor a livre disposição da coisa, trata-se de
tentativa.

Nesse sentido: STF: “1. Para a consumação do furto, é suficiente que se efetive a inversão da posse,
ainda que a coisa subtraída venha a ser retomada em momento imediatamente posterior.
Jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal. 2. Ordem denegada” (HC 114329-RS, 1.ª T.,
rel. Roberto Barroso, 01.10.2013, m.v.).

O elemento subjetivo do tipo é o dolo e não existe a forma culposa.

Coisa, conforme Nucci (2020) é tudo aquilo que existe, podendo tratar-se de objetos inanimados ou
de semoventes. No contexto dos delitos contra o patrimônio (conjunto de bens suscetíveis de
apreciação econômica), cremos ser imprescindível que a coisa tenha, para seu dono ou possuidor,
algum valor econômico.

Furto de coisa puramente de estimação: entendemos não ser objeto material do crime de furto, pois
é objeto sem qualquer valor econômico. Não se pode conceber seja passível de subtração, penalmente
punível, por exemplo, uma caixa de fósforos vazia, desgastada, que a vítima possui somente porque
lhe foi dada por uma namorada, no passado, símbolo de um amor antigo. (Nucci, 2020). Há posição em
sentido contrário: TJPR: “Pode haver concurso de crimes entre a violação de sepultura e furto, desde
que o objeto material do furto não seja o cadáver ou de próteses do cadáver. A lei não exige que a
coisa furtada tenha valor comercial ou de troca, bastando que seja bem patrimonial, isto é, que
represente alguma utilidade para quem detenha a posse, ou até mesmo um significado ditado pelo
valor afetivo” (Ap. Crim. 225248-0-PR, 1.ª C. Crim., rel. Cunha Ribas, 15.05.2003, v.u.;

Furto de cadáver: pode ser objeto material do crime de furto caso tenha valor econômico e esteja na
posse legítima de alguém (ex.: subtrair o corpo pertencente a um museu, que o exibe por motivos
científicos ou didáticos). Não sendo este o caso, a subtração do cadáver pode constituir crime contra o
respeito aos mortos (art. 211, CP). “Os mortos são coisas, e são suscetíveis de ser levados de um
lugar a outro. No entanto, não podem ser objeto de furto porque não são coisas alheias, e por isso não
pertencem como coisas próprias a pessoa alguma. Não obstante, quem se apodera do corpo de um
i l t d t
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t f t é i lh i ” (LAJE ROS 64/171
L
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animal morto, em posse de outrem, comete furto, porque é uma coisa alheia” (LAJE ROS, La
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interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 115). (Nucci, 2020)

Assim: TJSP: “O cadáver – salvo quando perde sua individualidade, o que se dá, por exemplo, se
constituir patrimônio de algum instituto científico, passando a ter valor econômico e a ser coisa alheia
– é coisa fora do comércio e sua proteção é erigida em razão de princípios éticos, religiosos, sanitários
e de ordem pública impostos pelo direito positivo” (1.ª C., 18.05.1987, rel. Marino Falcão, RT 619/291,
acórdão antigo, mas mantido para ilustrar, em face da raridade de realização do crime). (Nucci, 2020)

Furto de coisas abandonadas (res derelicta) não pertencentes a ninguém (res nullius) ou perdidas
(res deperdita): as duas primeiras situações não podem ser objeto do crime de furto, uma vez que não
integram o patrimônio de outrem; a terceira hipótese também não se encaixa como objeto de furto,
pois há tipo específico para tal caso, cuidando-se de apropriação indébita (art. 169, parágrafo único, II,
CP). Na jurisprudência: TJMA: “Coisa abandonada (res derelicta) é aquela que não pertence a ninguém,
não podendo ser objeto de furto por não integrar o patrimônio de outrem. Se o objeto do crime é de
propriedade conhecida, estando apenas em local desabitado, seu apoderamento implica conduta
ilícita” (Ap. 0118342013-MA, 2.ª C. Crim., rel. José Bernardo Silva Rodrigues, 30.01.2014, v.u.). (Nucci,
2020)

Furto de coisas de ínfimo valor e princípio da insignificância: em tese, as coisas de pequeno valor
podem ser objetos do crime de furto, embora se deva agir com cautela nesse contexto, em face do
princípio da insignificância (crimes de bagatela). O Direito Penal não se ocupa de insignificâncias
(aquilo que a própria sociedade concebe ser de somenos importância), deixando de se considerar fato
típico a subtração de pequeninas coisas de valor nitidamente irrelevante. Ex.: o sujeito que leva, sem
autorização, do banco, onde vai sacar uma determinada quantia em dinheiro, o clipe que está sobre o
guichê do caixa, embora não lhe pertença. Não se deve exagerar, no entanto, na aplicação do princípio
da bagatela, pois o que é irrelevante para uns pode ser extremamente importante para outros. Ex.:
subtrair uma galinha, de quem só possui um galinheiro com quatro, representa um valor significativo,
que necessitará ser recomposto. Por outro lado, subtrair um pintinho de uma granja imensa, com
milhares de aves, pode ser insignificante, sem qualquer afetação ao patrimônio. Por outro lado, deve-
se analisar, cuidadosamente, a conduta do agente do furto, pois, assim fazendo, a insignificância pode
ser afastada em face do caso concreto. Além disso, há vários outros fatores a considerar, como as
condições pessoais do réu (primário ou reincidente, bons ou maus antecedentes), bem como a
situação fática concreta, não se admitindo a insignificância, quando se trata de delito qualificado.
(Nucci, 2020)

Na jurisprudência: STF: “Habeas corpus. Direito penal. Furto qualificado. Ínfimo valor da res furtiva.
Rompimento de obstáculo. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. 1. A pertinência do princípio
da insignificância deve ser avaliada, em casos de pequenos furtos, considerando não só o valor do
bem subtraído, mas igualmente outros aspectos relevantes da conduta imputada. 2. Não tem
pertinência o princípio da insignificância em crime de furto qualificado cometido mediante
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 65/171
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pertinência o princípio da insignificância em crime de furto qualificado cometido mediante
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rompimento de obstáculo. Precedentes. 3. Ordem denegada” (HC 121760-MT, 1.ª T., rel. Rosa Weber,
14.10.2014, v.u.); “Habeas corpus. 2. Tentativa de furto qualificado com emprego de chave falsa (rádio
CD player automotivo, avaliado em cento e noventa e nove reais). Absolvição sumária. Reforma da
decisão pelo TJMG. 3. Pedido de aplicação do princípio da insignificância. 4. Ausência de um dos
vetores considerados na aplicação do princípio da bagatela: o reduzido grau de reprovabilidade da
conduta. 5. Reiteração delitiva. Precedentes no sentido de afastar o princípio da insignificância a
acusados reincidentes ou de habitualidade delitiva comprovada. 6. Ordem denegada” (HC 122529-MG,
2.ª T., rel. Gilmar Mendes, 02.09.2014, v.u.); “1. Embora seja reduzida a expressividade financeira dos
bens subtraídos (avaliados em R$ 114,00), não se mostra possível acatar a tese de irrelevância
material da conduta, pois, além de o delito ter sido praticado com o rompimento de obstáculo, noticiam
os autos que o paciente responde a outro processo por crime contra o patrimônio, o que demonstra
que sua personalidade está voltada para a prática delitiva. 2. Essas circunstâncias inibem a
aplicabilidade do postulado da insignificância ao caso concreto. 3. Ordem denegada” (HC 121134-ES,
1.ª T., rel. Dias Toffoli, 06.05.2014, v.u.); “O valor da res furtiva não pode ser o único parâmetro a ser
avaliado, devendo ser analisadas as circunstâncias do fato para decidir-se sobre seu efetivo
enquadramento na hipótese de crime de bagatela, bem assim o reflexo da conduta no âmbito da
sociedade. In casu, a) o paciente foi condenado a 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial
semiaberto, por ter arrombado a porta de aço do Bar Rei Momo, na cidade de Vitória/ES e subtraído do
interior do estabelecimento a quantia de R$ 6,00 (seis reais) em notas, bem como um porta-moedas de
plástico, contendo R$ 19,00 (dezenove reais) em moedas. Na sentença condenatória, o magistrado
destacou que, além da quantia subtraída, a vítima ainda teve um prejuízo de R$ 80,00 (oitenta reais),
referente ao conserto da porta do estabelecimento que foi arrombada. As instâncias precedentes
deixaram de aplicar o princípio da insignificância em razão de ser o paciente contumaz na prática
criminosa. O legislador ordinário, ao qualificar a conduta incriminada, apontou o grau de afetação
social do crime, de sorte que a relação existente entre o texto e o contexto (círculo hermenêutico) não
pode conduzir o intérprete à inserção de uma norma não abrangida pelos signos do texto legal. In
casu, a conduta do paciente, como narrada na denúncia – furto qualificado pelo rompimento de
obstáculo e pelo concurso de agentes –, não pode ser considerada como inexpressiva para fins
penais, nem há de ser qualificada como sendo de menor afetação social. O reconhecimento da
atipicidade da conduta do paciente, pela adoção do princípio da insignificância, poderia, por via
transversa, imprimir nas consciências a ideia de estar sendo avalizada a prática de delitos e de desvios
de conduta, porquanto trata-se de condenado reincidente” (HC 118853-ES, 1.ª T., rel. Luiz Fux,
29.04.2014, v.u.). STJ: “Consoante já assentado pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio da
insignificância deve ser analisado em correlação com os postulados da fragmentariedade e da
intervenção mínima do Direito Penal, no sentido de excluir ou afastar a própria tipicidade da conduta,
examinada em seu caráter material, observando-se, ainda, a presença dos seguintes vetores: (I)
mínima ofensividade da conduta do agente; (II) ausência total de periculosidade social da ação; (III)
ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento; e (IV) inexpressividade da lesão jurídica
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 66/171
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ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento; e (IV) inexpressividade da lesão jurídica
@prof.joaobittenocurt
ocasionada (conforme decidido nos autos do HC 84.412-SP, de relatoria do Ministro Celso de Mello,
DJU 19.04.2004)” (AgRg no REsp 1445876-MG, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz, v.u.). (Nucci, 2020)

Furto de talão de cheques: pode ser objeto do crime de furto, visto possuir nítido valor econômico,
tanto para quem subtrai, que o vende a estelionatários, quanto para a vítima, que é obrigada a sustar
os cheques, retirar outro talão, pagando ao estabelecimento bancário taxas elevadas e sofrendo
prejuízo material. “É suficiente que tenham um valor, ou algum valor, sem importar que esse valor
traduza sempre uma estrita referência ao econômico. O valor da coisa não equivale a que ela deva ser
intrinsecamente valiosa para todos. Por isso é que pode ter um valor afetivo e pode ser furtada” (LAJE
ROS, La interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 113). (Nucci, 2020)

Furto de uso: não se trata de crime, pois, como mencionado nos comentários feitos na análise do
núcleo do tipo e do elemento subjetivo, há necessidade do ânimo de assenhoreamento. Se o agente
retirar a coisa da posse da vítima apenas para usar por pouco tempo, devolvendo-a intacta, é de se
considerar não ter havido crime. Cremos ser indispensável, entretanto, para a caracterização do furto
de uso, a devolução da coisa no estado original, sem perda ou destruição do todo ou de parte. Se
houver a retirada de um veículo para dar uma volta, por exemplo, devolvendo-o com o para-lama
batido, entendemos haver furto, pois houve perda patrimonial para a vítima. De um modo indireto, o
sujeito apropriou-se do bem de terceiro, causando-lhe prejuízo. Lembremos que a intenção de se
apoderar implica, também, na possibilidade de dispor do que é do outro, justamente o que ocorre
quando o agente trata a coisa como se sua fosse. Utilizar um automóvel para uma volta, provocando
uma colisão e devolvendo-o danificado, é o modo que o autor possui de demonstrar a sua franca
intenção de dispor da coisa como se não pertencesse a outrem. Além disso, é preciso haver imediata
restituição, não se podendo aceitar lapsos temporais exagerados. E, por fim, torna-se indispensável
que a vítima não descubra a subtração antes da devolução do bem. Se constatou que o bem de sua
propriedade foi levado, registrando a ocorrência, dá-se o furto por consumado. É que, nesse cenário,
novamente o agente desprezou por completo a livre disposição da coisa pelo seu dono, estando a
demonstrar o seu ânimo de apossamento ilegítimo. Em síntese: admitimos o furto de uso desde que
presentes os seguintes requisitos, demonstrativos da total ausência do ânimo de assenhoreamento:
1.º) rápida devolução da coisa; 2.º) restituição integral e sem qualquer dano do objeto subtraído; 3.º)
devolução antes que a vítima perceba a subtração, dando falta do bem. (Nucci, 2020)

Na jurisprudência: TJSP: “não há falar-se em furto de uso, pois os apelantes chegaram a se deslocar
com o veículo até outro Estado, vindo o mesmo a ser localizado apenas três dias após a subtração. A
vítima sofreu prejuízo, tanto que foram subtraídas algumas peças do veículo, inclusive o motor, o que
não se coaduna com a tese do furto de uso” (Ap. 0000994-55.2009.8.26.0279, 2.ª C., rel. Antonio Luiz
Pires Neto, 16.12.2013, v.u.). TJRS: “Nenhuma prova veio aos autos de que o réu necessitou fazer uso
do veículo da vítima para levar sua mãe ao médico. Para configuração do furto de uso é necessário
que o agente tenha a intenção exclusiva de usar o bem por um curtíssimo período de tempo e de
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

devolvê-lo ao seu proprietário logo após o uso, de livre e espontânea vontade, o que não é o caso dos
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autos. Não comprovadas as circunstâncias caracterizadoras do estado de necessidade, conforme art.
24 do CP” (Ap. Crim. 70059853374-RS, 7.ª C. Crim., rel. Carlos Alberto Etcheverry, 20.08.2015, v.u.).
TJMG: “Não se agasalha a tese de ‘furto de uso’ quando não houver a devolução espontânea do bem e
no seu estado original à vítima” (Ap. Crim. 1.0479.12.024141-5/001-MG, 5.ª C. Crim., rel. Adilson
Lamounier, 25.08.2015). TJPR: “A ocorrência do furto de uso pressupõe a devolução rápida da coisa no
estado original, sem qualquer perda ou destruição no todo ou em parte, antes que a vítima dê falta do
objeto furtado” (Ap. Crim. 1327937-3-PR, 5.ª C. Crim., rel. José Laurindo de Souza Netto, 30.07.2015,
v.u.). (Nucci, 2020)

Furto em túmulos e sepulturas: cremos haver, como regra, apenas o crime de violação de sepultura
(art. 210, CP) ou, conforme o caso, destruição, subtração ou ocultação de cadáver (art. 211, CP), pois
os objetos materiais que estão dentro da cova não pertencem a ninguém. Foram ali abandonados pela
família. Entretanto, se o agente subtrai adornos ou bens que guarnecem o próprio túmulo, como
castiçais ou estátuas de bronze, naturalmente há furto. (Nucci, 2020)

Na jurisprudência: TJMG: “A violação de túmulo com a consequente subtração do crânio ali


sepultado configura tão somente o crime de violação de sepultura, não havendo que se falar em
concurso material com o delito de furto em razão de as partes do esqueleto do defunto não
configurarem coisas alheias móveis” (Ap. Crim. 1.0281.01.000374-3/001-MG, 5.ª C. Crim., rel. Adilson
Lamounier, 05.08.2008, v.u., mantido para ilustração). E tratando de furto da arcada dentária do
defunto: “Não se pretenda dizer que pertence ele à família, que é coisa que faz parte do patrimônio dos
herdeiros do morto e que estes seriam, de conseguinte, as vítimas do crime de furto. Seria risível
pensar tal hipótese. Se fosse assim, teria o cadáver que ser sempre objeto de inventário... E, se não
tivesse o defunto família, passaria ele a constituir res nullius e não poderia ser objeto de furto!” (RT
619/291, julgado antigo, mas peculiar). (Nucci, 2020)

Furto sob vigilância: é possível ocorrer a hipótese descrita no art. 17 do Código Penal, ou seja, o
sujeito eleger um meio absolutamente ineficaz ou voltar-se contra um objeto absolutamente impróprio
no cometimento do furto. Haveria, nesse caso, tentativa inidônea ou quase crime, que não é punida. O
importante é analisar se o meio eleito é, de fato, absolutamente ineficaz para a prática do crime, no
caso concreto e não simplesmente em tese. O mesmo se diga de ser o objeto absolutamente
impróprio, no caso concreto. Se um indivíduo é vigiado num supermercado o tempo todo por
seguranças e câmeras internas, de modo a tornar, naquela situação concreta, impossível a
consumação do delito de furto, trata-se da hipótese do art. 17. Mas se a vigilância for falha ou
incompleta, cremos ser cabível falar em tentativa. O mesmo se diga de uma tentativa de furto de quem
não possui bens economicamente viáveis. Se, de fato, nada puder ser levado, pois a vítima está
completamente depauperada, pode ser crime impossível, embora, quando exista algo passível de se
constituir objeto do furto – com algum valor, portanto –, cremos tratar-se de tentativa de furto. No
entanto dispositivo antifurto instalado em veículo ou outro bem qualquer não torna impossível o
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
entanto, dispositivo antifurto instalado em veículo ou outro bem qualquer não torna impossível o
delito. (Nucci, 2020)
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Preceitua a Súmula 567 do STJ o seguinte: “sistema de vigilância realizado por monitoramento
eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não
torna impossível a configuração do crime de furto”. Cuida-se de dispositivo supérfluo, pois, como se
sustenta, o sistema de vigilância pode ou não permitir a consumação do delito, a depender do caso
concreto. Logo, os termos da referida súmula dizem exatamente isso: a simples existência do sistema
de vigilância – por si só – não torna impossível a consumação. Porém, dependendo do sistema de
monitoramento, pode gerar a hipótese do art. 17 do Código Penal. Na jurisprudência: STF: “Havendo
possibilidade, ainda que remota, de burlar a vigilância exercida sobre a coisa e, por conseguinte, de
ofender o bem jurídico tutelado pela norma penal, não se configura o crime impossível. Precedentes”
(HC 107.577-MG, 1.ª T., rel. Cármen Lúcia, 10.05.2012, m.v.). STJ: “1. É possível a consumação do
delito de furto, ainda que haja vigilância por meios eletrônicos no local dos fatos. Vale dizer, a
existência de sistema de segurança não torna, por si só, o crime impossível. 2. Agravo regimental não
provido” (AgRg no REsp 1413041-MG, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz, 24.03.2015, v.u.); “A existência
de sistema de monitoramento eletrônico ou a observação dos passos do praticante do furto pelos
seguranças da loja não rende ensejo, por si só, ao automático reconhecimento da existência de crime
impossível, porquanto, mesmo assim, há possibilidade de o delito ocorrer. Precedentes das Turmas
componentes da Terceira Seção” (HC 216114-RJ, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura,
07.11.2013, v.u.). (Nucci, 2020)

A questão da trombada: cremos não se tratar de furto, e sim de roubo. A violência utilizada na
trombada, por menor que seja, é voltada contra a pessoa para arrancar-lhe a bolsa, a corrente, o relógio
ou qualquer outro bem que possua, de forma que configurada está a figura do art. 157. Dizer que o ato
violento tem por objetivo apenas a coisa é desconhecer o significado da “trombada”, que
inexoravelmente provoca o toque físico ao corpo da vítima, com uso da força bruta. O furto deve
prescindir de todo e qualquer tipo de violência contra a pessoa, não havendo lesão à integridade física
do ofendido. Pode-se falar em furto – mas, nesse caso, não acreditamos tratar-se de “trombada” –
quando o agente ludibria a vítima, retirando-lhe o bem que possui. Ex.: fingindo limpar o líquido que
propositadamente derrubou na roupa do ofendido, o autor toma-lhe a carteira. Há toque físico no corpo
da vítima, embora esta conduta seja típica do furto, porque não houve violência contra a pessoa. Na
jurisprudência: TJPR: “I – Não merece acolhimento o pleito desclassificatório para furto, pois o crime
foi cometido mediante grave ameaça, consubstanciada pela violência aplicada pelo agente. Assim,
restou configurada circunstância elementar do crime de roubo, uma vez que o empurrão dado na
vítima é suficiente para configuração do tipo previsto no artigo 157 do Código Penal. II – ‘(...) O tipo
penal do furto é bem claro, prevendo conduta livre de qualquer violência (uso de força ou coação)
contra a pessoa humana, enquanto o tipo do roubo inclui tal figura. Logo, não é possível dizer que um
‘singelo’ empurrão no ofendido não é suficiente para concretizar a violência exigida pelo tipo legal de
roubo A violência não tem graus ou espécies: estando presente transforma o crime patrimonial do
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roubo. A violência não tem graus ou espécies: estando presente, transforma o crime patrimonial do
art. 155 para o previsto no art. 157 (...)’. (Nucci, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado. 7ª ed.
@prof.joaobittenocurt
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, pags. 684)” (Ap. Crim. 1662226-3-PR, 4.ª C. Crim., rel. Celso
Jair Mainardi, 29.06.2017, v.u.). (Nucci, 2020)

Furto de cartão de crédito e bancário: a simples subtração do cartão de plástico pode ser
considerada crime de bagatela, ou seja, fato atípico. O cartão não tem valor algum e a administradora
ou o estabelecimento bancário, comunicado o furto, repõe o mesmo ao cliente sem nenhum custo,
como regra. Por isso, a situação é diversa daquela que apresenta o talão de cheques. Neste caso, há a
necessária e custosa sustação das folhas e o reenvio de outro, muitas vezes cobrado. Se o agente do
furto utilizar o cartão para fazer saques ou comprar algum produto em lugar do titular da conta,
configura-se o estelionato. (Nucci, 2020)

Furto de imagem: a coisa, objeto do delito, deve ser palpável, não podendo tratar-se de uma
imagem, como a captada por meio de uma foto ou filme. Se uma pessoa invade um lugar para
fotografar ou filmar alguma coisa, pode responder por violação de domicílio e até violação de direito
autoral, no tocante ao uso da imagem, mas não por furto. “O furto deve ser furto de coisa, ou recair em
uma coisa; a coisa mesma deve ser subtraída. É por isso que não comete furto o fotógrafo do Santo
Sudário que, em 1898, em Turim, porque se limitou tão somente a fotografá-lo” (LAJE ROS, La
interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 100). (Nucci, 2020)

Furto famélico: pode, em tese, constituir estado de necessidade. É a hipótese de se subtrair


alimento para saciar a fome. O art. 24 do Código Penal estabelece ser possível o perecimento de um
direito (patrimônio) para salvaguardar outro de maior valor (vida, integridade física ou saúde humana),
desde que o sacrifício seja indispensável e inevitável. Atualmente, não é qualquer situação que pode
configurar o furto famélico, tendo em vista o estado de pobreza que prevalece em muitas regiões de
nosso país. Fosse ele admitido sempre e jamais se teria proteção segura ao patrimônio. Portanto,
reserva-se tal hipótese a casos excepcionais, como, por exemplo, a mãe que, tendo o filho pequeno
adoentado, subtrai um litro de leite ou um remédio, visto não ter condições materiais para adquirir o
bem desejado e imprescindível para o momento. Na jurisprudência: “Admite-se o furto famélico
àqueles que, vivendo em condições de maior indigência, subtraíram objetos, aptos a satisfazer
privação inadiável, na qual padeciam tanto eles como seus familiares e dependentes. Ninguém furta
gêneros alimentícios para acrescentá-los a seu patrimônio; fá-lo, tão somente, para saciar a fome e
atender suas vicissitudes imediatas, pois que apenas a isso se prestam mercadorias de tal natureza”
(TJPB, Ap. 99.004701-5, C. Crim., rel. Júlio Aurélio Moreira Coutinho, 16.11.1999, v.u., RT 773/647,
julgado antigo, mas mantido para ilustrar a situação). (Nucci, 2020)

Elemento normativo do tipo, alheia é toda coisa que pertence a outrem, seja a posse ou a
propriedade. Conceito de móvel: é a coisa que se desloca de um lugar para outro. Trata-se do sentido
real, e não jurídico. Assim, ainda que determinados bens possam ser considerados imóveis pelo direito
civil, como é o caso dos materiais provisoriamente separados de um prédio (art. 81, II, CC: “Não
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, p p p ( , ,
perdem o caráter de imóveis: (...) II – os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele
@prof.joaobittenocurt
se reempregarem”), para o Direito Penal são considerados móveis, portanto suscetíveis de serem
objeto do delito de furto. No mesmo sentido: “ainda que o Código Civil considere que as coisas móveis
postas intencionalmente pelo proprietário, como acessórias de um imóvel, devem ser consideradas
como tais, quem se apodera delas não comete usurpação de imóvel, mas furto” (LAJE ROS, La
interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 111). (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a coisa sujeita à subtração, que sofre a conduta
criminosa; o objeto jurídico é o patrimônio do indivíduo, que pode ser constituído de coisas de sua
propriedade ou posse, desde que legítimas. A mera detenção, em nosso entender, não é protegida pelo
Direito Penal, pois não integra o patrimônio da vítima. (Nucci, 2020)

Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou
especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente na diminuição do patrimônio
da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo
(“subtrair” implica ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a
aplicação do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se
prolongando no tempo), na maior parte dos casos, embora seja permanente na forma prevista no § 3.º
(furto de energia); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico tutelado);
unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários atos
integram a conduta); admite tentativa. (Nucci, 2020)

Causa específica de aumento de pena e aplicabilidade: trata-se do furto cometido durante o


repouso noturno – ou simplesmente furto noturno –, especial circunstância que torna mais grave o
delito, tendo em vista a menor vigilância que, durante a noite, as pessoas efetivamente exercem sobre
os seus bens, seja porque estão repousando, seja porque há menor movimentação na comunidade,
facilitando a perpetração do crime. O legislador, reconhecendo o maior gravame, impõe um aumento
de um terço para a pena, em quantidade fixa e predeterminada. (Nucci, 2020)

A jurisprudência majoritária tem entendido que essa causa de aumento deve ser aplicada somente
ao furto simples, isto é, à figura prevista no caput, tendo em vista a sua posição sistemática na
construção do tipo penal. A pena do furto qualificado, já aumentada nas suas balizas mínima e
máxima, não seria por este aumento afetada. Ademais, as circunstâncias que envolvem o furto
previsto no § 4.º já são graves o suficiente para determinar uma justa punição ao autor da infração
penal. Era a nossa posição. Na última fase da aplicação da pena incidem as causas de aumento, no
caso, um terço a mais, por consideração ao §. 1.º. A posição da causa de aumento no tipo penal, bem
como da qualificadora, é completamente indiferente, levando-se em conta o processo trifásico de
aplicação da pena.

Na jurisprudência, no sentido da nossa posição: STF: “Não convence a tese de que a majorante do
repouso noturno seria incompatível com a forma qualificada do furto a considerar para tanto que sua
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repouso noturno seria incompatível com a forma qualificada do furto, a considerar, para tanto, que sua
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inserção pelo legislador antes das qualificadoras (critério topográfico) teria sido feita com intenção de
não submetê-la às modalidades qualificadas do tipo penal incriminador. Se assim fosse, também
estaria obstado, pela concepção topográfica do Código Penal, o reconhecimento do instituto do
privilégio (CP, art. 155, § 2.º) no furto qualificado (CP, art. 155, § 4.º) – como se sabe o Supremo
Tribunal Federal já reconheceu a compatibilidade desses dois institutos. Inexistindo vedação legal e
contradição lógica, nada obsta a convivência harmônica entre a causa de aumento de pena do repouso
noturno (CP, art. 155, § 1.º) e as qualificadoras do furto (CP, art. 155, § 4.º) quando perfeitamente
compatíveis com a situação fática” (HC 130.952/MG, 2.ª T., rel. Dias Toffoli, 13.12.2016, v.u.). (Nucci,
2020)

No STJ “O entendimento consagrado neste eg. Superior Tribunal de Justiça é de que não há
incompatibilidade entre o furto qualificado e a causa de aumento relativa ao seu cometimento no
período noturno. A jurisprudência deste eg. Tribunal Superior é firme no sentido de que as normas que
estabelecem as qualificadoras do furto e a causa de aumento do repouso noturno são harmonizáveis,
haja vista que o legislador tanto nas qualificadoras objetivas (§ 4º do art. 155 do Código Penal) como
na referida causa de aumento apreciou e revalorou o desvalor da ação do agente, e não fez uma
análise sob a ótica do desvalor do resultado. Impende registrar que a causa de aumento de pena em
comento, assim como as demais majorantes previstas no Código Penal e na legislação esparsa, nada
mais são do que circunstâncias especiais erigidas pelo legislador infraconstitucional como de maior
gravidade. Nesse contexto, a inserção na derradeira etapa da dosimetria apenas serve para cristalizar
a maior reprovação da conduta, tendo em mente a existência de um procedimento sancionatório
lógico, gradativo e escalonado. Precedentes: STJ e STF” (HC 509.594/SP, 5.ª T., rel. Felix Fischer,
06.06.2019, v.u.); “1. A causa de aumento prevista no art. 155, § 1º, do CP visa punir mais severamente
o agente que se utiliza da diminuição da vigilância sobre a res, própria do período de repouso noturno,
com o fim de facilitar a prática ou ocultação da empreitada criminosa. Precedente” (AgRg no AREsp
1.422.065/TO, 6.ª T., rel. Nefi Cordeiro, 18.06.2019, v.u.); “1. A causa de aumento prevista no § 1° do
artigo 155 do Código Penal, que se refere à prática do crime durante o repouso noturno – em que há
maior possibilidade de êxito na empreitada criminosa em razão da menor vigilância do bem, mais
vulnerável à subtração –, é aplicável tanto na forma simples como na qualificada do delito de furto. 2.
Agravo regimental improvido” (AgRg no REsp 1721890-MS, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura,
22.05.2018, v.u.). (Nucci, 2020)

Repouso noturno: entende-se por repouso noturno, a fim de dar segurança à interpretação do tipo
penal, uma vez que as pessoas podem dar início ao repouso noturno em variados horários, mormente
em grandes cidades, o período que medeia entre o início da noite, com o pôr do sol, e o surgimento do
dia, com o alvorecer. A vigilância tende a ser naturalmente dificultada quando a luz do dia é substituída
pelas luzes artificiais da urbe, de modo que o objetivo do legislador foi justamente agravar a pena
daquele que se utiliza desse período para praticar o delito contra o patrimônio. Ensina JORGE
ALBERTO ROMEIRO que ocorreu na Índia a primeira anotação encontrada na lei penal acerca da
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 72/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
ALBERTO ROMEIRO que ocorreu na Índia a primeira anotação encontrada na lei penal acerca da
@prof.joaobittenocurt
circunstância agravante de furto praticado durante a noite: “Se os ladrões, depois de haverem feito
uma brecha num muro, cometem um roubo durante a noite, que o rei ordene a sua empalação em
pontudo dardo, após a amputação das duas mãos” (parágrafo 276 do Código de Manu). Continua o
mestre dizendo que Moisés já definia o período noturno “como o espaço de tempo que medeia entre o
pôr e o nascer do sol” (A noite no direito e no processo penal, p. 181). Assim, no contexto desta causa
de aumento, se a vítima dorme durante o dia – por ser vigilante noturno, por exemplo –, não incide a
agravação da pena. Por outro lado, é possível haver o aumento caso o furto seja cometido em zona
rural (sítio ou fazenda), fora da casa-sede, desde que os moradores estejam repousando. (Nucci, 2020)

Na jurisprudência: TJMT: “Para que se reconheça a incidência da majorante descrita no § 1.º do art.
155 do Código Penal, não basta que o sol tenha se posto, sendo imprescindível a aferição dos hábitos
da comunidade em que praticado o crime, tarefa para a qual o juízo local tem, em regra, mais aptidão
que o Tribunal. Tratando-se de delito perpetrado no início da noite, pouco após o crepúsculo, quando
boa parcela da população ainda permanece alerta, não há falar em ‘repouso noturno’, porquanto tal
expressão, utilizada pelo referido dispositivo legal, é voltada justamente à maior reprovação da
subtração realizada sob inexistente ou reduzida vigília do ofendido e da vizinhança, não se
confundindo com ‘período noturno’” (EIfNu 15852/2017-MT, Turma de Câmaras Criminais Reunidas,
rel. Marcos Machado, 01.06.2017, m.v.).

Condições para a aplicação do aumento: há duas posições a respeito do tema: a) é indispensável


que o furto ocorra em casa habitada, com os moradores nela repousando. Justamente porque
prevalecia esse entendimento, não se admitia a incidência do aumento quando o furto ocorresse em
casa comercial. É posição ultrapassada na jurisprudência; b) a causa de aumento está presente desde
que a subtração ocorra durante o repouso noturno, ou seja, quando as pessoas de um modo geral
estão menos atentas, com menor chance de vigilância dos seus e dos bens alheios, porque anoiteceu.
Se um imóvel é invadido durante a noite, estando ou não habitado, com ou sem moradores no seu
interior repousando, o furto merece pena mais severa. É a solução correta, pois sustentar o contrário
faz com que a circunstância agravante se concentre no fato de haver maior perigo para a vítima – que
está em casa dormindo – quando a subtração se realiza no mesmo local, o que não nos parece tenha
sido o objetivo da lei. Nessa visão: STJ: “IV – A causa especial de aumento de pena do furto cometido
durante o repouso noturno pode se configurar mesmo quando o crime é cometido em estabelecimento
comercial ou residência desabitada, sendo indiferente o fato de a vítima estar, ou não, efetivamente
repousando. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça” (HC 501.072/SC, 5.ª T., rel. Felix Fischer,
06.06.2019, v.u.); “1. Para a configuração da circunstância majorante do § 1.º do art. 155 do Código
Penal, basta que a conduta delitiva tenha sido praticada durante o repouso noturno, dada a maior
precariedade da vigilância e a defesa do patrimônio durante tal período, e, por consectário, a maior
probabilidade de êxito na empreitada criminosa, sendo irrelevante o fato de as vítimas não estarem
dormindo no momento do crime. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg
no AREsp 882 249 ES 5 ª T rel Ribeiro Dantas 04 10 2016 v u ) TJMS: “1 – Para a incidência da
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
no AREsp 882.249-ES, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 04.10.2016, v.u.). TJMS: 1 – Para a incidência da
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causa especial de aumento prevista no § 1.º do art. 155 do Código Penal, é suficiente que a infração
ocorra durante o repouso noturno, sendo irrelevante o fato de se tratar de estabelecimento comercial
ou de residência, habitada ou desabitada, bem como o fato de a vítima estar, ou não, efetivamente
repousando. 2 – Recurso improvido” (Ap. 0012133-39.2015.8.12.0002-MS, 3.ª Câmara Criminal, rel.
Francisco Gerardo de Sousa, 24.08.2018, v.u.).

Furto privilegiado: difundiu-se o entendimento de a figura prevista no § 2.º tratar-se do furto


privilegiado, em que pese ser somente uma causa de diminuição da pena. Poder-se-ia falar em
privilégio em sentido amplo. A autêntica figura do privilégio haveria de representar uma nova faixa
para a fixação da pena, diminuindo-se o mínimo e o máximo em abstrato, estabelecidos pelo legislador
no preceito sancionador do tipo penal. Entretanto, analisando-se a especial circunstância prevista,
conclui-se significar uma causa obrigatória de diminuição da pena em limites variáveis entre um a dois
terços e até mesmo a substituição da pena de reclusão pela de detenção e da pena privativa de
liberdade pela de multa (aliás, nessa última hipótese, está-se diante de um autêntico privilégio, pois a
pena em abstrato se altera completamente para menor). (Nucci, 2020)

Diferença da insignificância: esta gera a atipicidade da conduta, pois o bem subtraído possui ínfimo
valor, incapaz de afetar o patrimônio da vítima. A figura do furto privilegiado permite a concretização
do delito, embora com atenuação da pena. O valor do bem afetado foge da esfera da bagatela,
permitindo, entretanto, a sua consideração como de pequena monta. Nesse sentido: STF: “Convém
distinguir, ainda, a figura do furto insignificante daquele de pequeno valor. O primeiro, como é cediço,
autoriza o reconhecimento da atipicidade da conduta, ante a aplicação do princípio da insignificância.
Já no que tange à coisa de pequeno valor, criou o legislador a causa de diminuição referente ao furto
privilegiado, prevista no art. 155, § 2.º, do Código Penal” (HC 111.331-RS, 2.ª T., rel. Ricardo
Lewandowski, 20.03.2012, v.u.). (Nucci, 2020)

Inaplicabilidade da insignificância às formas qualificadas do delito ou quando as condições


pessoais do agente forem desfavoráveis: como se sabe, os requisitos para o reconhecimento do crime
de bagatela foram apresentados pela doutrina e pela jurisprudência. A maioria das posições
encontradas nesse contexto demandam o ínfimo valor da coisa lesada, além de não possuir o agente
antecedentes criminais e não haver interesse público envolvido. No entanto, há mais um fator,
demonstrativo da maior periculosidade do autor, no tocante à prática da infração penal inserido no
cenário qualificado ou com causa de aumento. Torna-se, então, injustificável aplicar, por exemplo, a um
autor de furto mediante arrombamento o princípio da insignificância; a sua maior ousadia de romper
obstáculo para subtrair a coisa, afasta o caráter ínfimo de sua conduta, demonstrativa de mais
expressiva antissociabilidade. Na jurisprudência: STF: “A teor do disposto no art. 155, § 2.º, do Código
Penal, se o criminoso é primário e a coisa furtada possui pequeno valor, o juiz pode substituir a pena
de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa.
Mostra-se inadmissível assentar a atipicidade, mormente quando o furto ou a tentativa se fez
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mediante destruição ou rompimento de obstáculo” (HC 107.119-RS, 1.ª T., j. 06.11.2012, m.v., rel.
@prof.joaobittenocurt
Marco Aurélio). STJ: “1. Esta Corte Superior de Justiça tem afastado a incidência do princípio da
insignificância nos casos de furto qualificado perpetrado mediante o rompimento de obstáculo,
mormente quando há circunstância que evidencia a existência de prejuízo decorrente da qualificadora,
como na hipótese destes autos” (AgRg no AREsp 1455789/MG, 6.ª T., rel. Sebastião Reis Júnior,
30.05.2019, v.u.). TJSC: “Tendo em vista que o valor de R$ 500,00 não pode ser considerado irrisório e
que o crime foi praticado durante o repouso noturno (CP, art. 155, § 1.º), ficam evidenciados, no caso
concreto, a expressividade da lesão jurídica e o maior grau de reprovabilidade do comportamento do
réu, impedindo, assim, a aplicação do princípio da insignificância. A reparação do dano, nos termos do
art. 16 do Código Penal, é causa de redução da pena e não de reconhecimento de atipicidade da
conduta. Recurso não provido” (Ap. Crim. 0001032-25.2013.8.24.0007-SC, 4.ª C. Crim., rel. Roberto
Lucas Pacheco, 29.06.2017, v.u.). TJTO: “Verificado que o Réu ostenta antecedentes criminais
específicos, por envolvimento em crimes contra o patrimônio, resta impossível incidência do referido
princípio da insignificância” (Ap. Crim. 0006027-79.2017.8.27.0000-TO, Turmas das C. Crim., rel.
Ronaldo Eurípedes de Souza, 04.04.2017, v.u.). (Nucci, 2020)

Primariedade: é o primeiro requisito para o reconhecimento do furto privilegiado. A primariedade é


um conceito negativo, ou seja, significa não ser reincidente. Portanto, quem não é reincidente, é
primário. A reincidência ocorre quando o réu comete novo crime, após já ter sido condenado
definitivamente, no Brasil ou no exterior. Lembremos, no entanto, que a condenação anterior somente
surte efeito para provocar a reincidência desde que não tenha ocorrido o lapso temporal de cinco anos
entre a data do cumprimento ou da extinção da pena e o cometimento da nova infração penal. Ver
comentários ao art. 63 do Código Penal. É preciso anotar que a lei foi bem clara ao exigir somente a
primariedade para a aplicação do benefício, de modo que descabe, em nosso entendimento, clamar
também pela existência de bons antecedentes. (Nucci, 2020)

Pequeno valor: não se trata de conceituação pacífica na doutrina e na jurisprudência, tendo em vista
que se leva em conta ora o valor do prejuízo causado à vítima, ora o valor da coisa em si. Preferimos o
entendimento que privilegia, nesse caso, a interpretação literal, ou seja, deve-se ponderar unicamente
o valor da coisa, pouco interessando se, para a vítima, o prejuízo foi irrelevante. Afinal, quando o
legislador quer considerar o montante do prejuízo deixa isso bem claro, como o fez no caso do
estelionato (art. 171, § 1.º, CP). Por isso, concordamos plenamente com a corrente majoritária, que
sustenta ser de pequeno valor a coisa que não ultrapassa quantia equivalente ao salário mínimo. De
fato, seria por demais ousado defender a tese de que um objeto cujo valor seja superior ao do salário
mínimo – auferido por grande parte da população – possa ser considerado de “pequeno valor”. Nessa
linha: STJ: “Conforme o entendimento deste Superior Tribunal, se o valor da res subtraída não excede a
importância correspondente ao salário mínimo vigente à época dos fatos e o agente é primário,
mostra-se possível o reconhecimento do furto privilegiado” (AgRg no REsp 1447688-SP, 5.ª T., rel.
Jorge Mussi, 12.02.2015, v.u.); “Afasta-se a incidência do furto privilegiado quando o valor dos bens
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subtraídos é muito superior ao salário mínimo” (AgRg no REsp 1.265.654-RS, 6.ª T., rel. Sebastião Reis
@prof.joaobittenocurt
Júnior, 02.02.2012, v.u.). TJPR: “Para a concessão do benefício do privilégio no crime de furto (artigo
155, § 2.º, do Código Penal) exige-se a primariedade do agente, bem como seja a res furtiva de
pequeno valor, ou seja, a importância do bem não deve ultrapassar um salário mínimo” (Ap. Crim.
1659997-2-PR, 4.ª Câmara Criminal, rel. Celso Jair Mainardi, 29.06.2017, v.u.). Por derradeiro, deve-se
salientar que o “pequeno valor” precisa ser constatado à época da consumação do furto, e não quando
o juiz for aplicar a pena.

Aplicação do privilégio à figura qualificada: há polêmica quanto à possibilidade de aplicação do


privilégio às figuras qualificadas previstas no § 4.º, prevalecendo o entendimento acerca da
possibilidade. Assim, segundo a orientação hoje minoritária, o privilégio seria útil somente às figuras
do caput e do § 1.º, mas não ao tipo qualificado. Discordamos desse posicionamento. No caso do
homicídio, o § 1.º do art. 121, que é considerado o homicídio privilegiado, aplica-se, conforme doutrina
e jurisprudência majoritárias, não somente ao caput, mas também ao § 2.º, que cuida das
qualificadoras. Por que não fazer o mesmo com o furto? Inexistindo razão para dar tratamento
desigual a situações semelhantes, cremos ser possível a aplicação da causa de diminuição da pena às
hipóteses qualificadas do § 4.º. Ademais, ao se cuidar do chamado privilégio, aponta-se, na realidade,
uma causa de diminuição de pena incidindo sobre um tipo qualificado. Assim, não vemos razão para
punir o réu primário, que subtraiu coisa de pequeno valor, valendo-se de escalada, com a mesma pena
daquele que subtraiu coisas de elevado valor, utilizando o mesmo expediente. São situações
diferentes, que merecem o cuidado de aplicações diferenciadas quanto à reprimenda: para um, a pena
de dois anos, diminuída de um a dois terços; para o segundo, a pena de dois anos, sem qualquer
diminuição. Deve-se incentivar, segundo cremos, as hipóteses de diminuição de pena – e não
simplesmente de atenuantes – com possibilidade de fixação da pena abaixo do mínimo legal em
casos nitidamente menos graves. Nesse prisma: STF: “Habeas corpus. Penal.Furto. Compatibilidade
entre o privilégio e a qualificadora do crime de furto: possibilidade. Precedentes. Habeas corpus
concedido. 1. As causas especiais de diminuição (privilégio) são compatíveis com as de aumento
(qualificadora) de pena previstas, respectivamente, nos §§ 2.º e 4.º do artigo 155 do Código Penal.
Precedentes. 2. Habeas corpus concedido” (HC 123.934-MG, 2.ª T., rel. Cármen Lúcia, 11.11.2014,
v.u.); “Não há vedação legal ao reconhecimento do furto como sendo concomitantemente qualificado
(art. 155, § 4.º) e privilegiado (art. 155, § 2.º)” (HC 101.256-RS, 1.ª T., rel. Dias Toffoli, 02.08.2011,
m.v.). O STJ editou a Súmula 511: “É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2.º do art.
155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente,
o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva”. E ainda: STJ: “2. A causa de
diminuição prevista no art. 155, § 2.º, do Código Penal pode ser aplicada conjuntamente com
determinadas qualificadoras do furto, mormente as de natureza objetiva, tal como o concurso de
agentes presente no caso” (AgRg no AREsp 1.478.374/SP, 6.ª T., rel. Laurita Vaz, 04.06.2019, v.u.); “1.
A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das
circunstâncias do crime cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 76/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da
constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. 2. Nos moldes
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da Súmula 511/STJ, ‘é possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do Código
Penal nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o
pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva’. Mais: para a substituição da pena de
reclusão por detenção, bem como para a definição do quantum de redução da pena ou aplicação
exclusiva de multa, devem ser valorados os elementos concretos dos autos, podendo ser sopesada a
qualificadora, in casu, o concurso de agentes, o que, por certo, revela maior reprovabilidade da conduta
a justificar resposta penal superior, sem que se possa falar em bis in idem. 3. Agravo regimental
desprovido” (AgRg no REsp 1675685 – SC, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 24.05.2018, v.u.). 21. Aplicação
dos §§ 1.º e 2.º concomitantemente: há perfeita possibilidade. Trata-se de um concurso entre causa
de aumento e causa de diminuição da pena, devendo o juiz aplicar as regras gerais para a fixação da
pena. Assim, poderá aumentar de um terço a pena, por conta do furto praticado durante o repouso
noturno, bem como, em seguida, compensar a elevação com a diminuição de um terço, por conta do
disposto no § 2.º. Poderá, também, aumentar a pena em um terço (§ 1.º) e diminuí-la de dois terços (§
2.º). Se preferir aplicar o privilégio, que é a substituição da pena privativa de liberdade pela multa,
logicamente, o aumento do § 1.º deixará de ter importância. Enfim, conforme o caso, o § 1.º entra em
sintonia com o § 2.º, cabendo a aplicação de ambos, mas pode o § 2.º suplantar o aumento do § 1.º,
como já exposto. 21-A. Critérios gerais para aplicação do privilégio, segundo o STJ: “1. O
reconhecimento do privilégio legal – direito subjetivo do réu – exige a conjugação de dois requisitos
objetivos, consubstanciados na primariedade e no pequeno valor da coisa furtada que, na linha do
entendimento pacificado neste Superior Tribunal, deve ter como parâmetro o valor do salário mínimo
vigente à época dos fatos. 2. A Terceira Seção desta Corte Superior consolidou o entendimento, no
julgamento dos Recursos Especiais Representativos de Controvérsia n. 1.193.932/MG, 1.193.558/MG,
1.193.554/MG e 1.193.194/MG, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC, de que o privilégio previsto
no § 2.º do art. 155 do Código Penal pode ser aplicado mesmo quando o acusado for condenado pela
prática de furto qualificado, desde que, como na espécie, a(s) qualificadora(s) seja(m) de natureza
objetiva. Súmula n. 511 do STJ. 3. A aplicação da minorante abre um leque de possibilidades para o
magistrado, que deve fundamentar a escolha que faz entre as alternativas legais: a) substituir a pena
de reclusão por detenção; b) diminuir a pena privativa de liberdade de um a dois terços; c) aplicar
somente a pena de multa. 4. Como se trata de delito duplamente qualificado – o que demonstra maior
reprovabilidade da conduta –, não é possível substituir a pena privativa de liberdade por multa. 5.
Diante da ausência de outros elementos que permitam identificar maior gravidade do delito perpetrado
(tanto que a pena-base foi exasperada pela presença das duas qualificadoras, sem mencionar as
circunstâncias judiciais do art. 59 do CP), deve a pena privativa de liberdade ser reduzida na fração
máxima prevista no § 2.º do art. 155 do Código Penal. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem
concedida de ofício para, reconhecida a incidência do privilégio descrito no art. 155, § 2.º, do Código
Penal, determinar a diminuição da pena imposta aos pacientes em 2/3” (HC 208.685-SP, 6.ª T., rel.
Rogerio Schietti Cruz 21 06 2016 DJe 29 06 2016) (Nucci 2020)
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Rogerio Schietti Cruz, 21.06.2016, DJe 29.06.2016). (Nucci, 2020)
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Equiparação a coisa móvel: para não haver qualquer dúvida, deixou o legislador expressa a intenção
de equiparar a energia elétrica ou qualquer outra que possua valor econômico à coisa móvel, de modo
que constitui furto a conduta de desvio de energia de sua fonte natural. Energia é a qualidade de um
sistema que realiza trabalhos de variadas ordens, como elétrica, química, radiativa, genética,
mecânica, entre outras. Assim, quem faz uma ligação clandestina, evitando o medidor de energia
elétrica, por exemplo, está praticando furto. Nessa hipótese, realiza-se o crime na forma permanente,
vale dizer, a consumação se prolonga no tempo. Enquanto o desvio estiver sendo feito, está-se
consumando a subtração de energia elétrica. (Nucci, 2020)

Nos casos de furto de energia elétrica, diferentemente do que acontece na sonegação fiscal, o
pagamento do valor subtraído antes do recebimento da denúncia não permite a extinção da
punibilidade. Nessas hipóteses, a manutenção da ação penal tem relação com a necessidade de coibir
ilícitos contra um recurso essencial à população. Além disso, em razão da natureza patrimonial do
delito, é inviável a equiparação com os crimes tributários, nos quais é possível o trancamento da ação
penal pela quitação do débito.

Tese foi fixada, por maioria, pela 3ª seção do STJ, que pacificou jurisprudência da Corte sobre o
tema superando entendimento divergente - segundo o qual a extinção da punibilidade prevista no
artigo 34 da lei 9.249/95 para crimes tributários aplica-se ao furto de energia. (www.stj.jus.br. Acesso
em 29.04.21)

A conduta de alterar o medidor de energia para que não marque corretamente o consumo
caracteriza o crime de estelionato, concluiu a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O
colegiado rejeitou um recurso em que a defesa dos réus sustentava a atipicidade da conduta ao
argumento de que esse crime exigiria a indução de uma pessoa a erro, conforme descrito no artigo
171 do Código Penal – o que não teria ocorrido no caso. (www.stj.jus.br. Acesso em 29.04.2)

De acordo com o Ministério Público do Distrito Federal (MPDF), duas pessoas alteraram o medidor
de energia de um hotel, colocando uma espécie de gel no equipamento para que ele marcasse menos
do que o consumo verdadeiro de energia. O MPDF denunciou ambos pelo crime de estelionato.
(www.stj.jus.br. Acesso em 29.04.2)

Furto de sinal de TV a cabo e internet: é válido para encaixar-se na figura prevista neste parágrafo,
pois são formas de energia. Nessa ótica: STJ: “(...) o sinal de TV a cabo pode ser equiparado à energia
elétrica para fins de incidência do artigo 155, § 3.º, do Código Penal. Doutrina. Precedentes” (RHC
30847-RJ, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 20.08.2013, v.u.). TJRJ: “Sentença que absolveu sumariamente o
apelado do crime previsto no art. 155, § 3.º, do Código Penal, com fulcro no inciso III do artigo 397 do
Código de Processo Penal, por entender atípica a conduta narrada na denúncia. O Ministério Público
busca a reforma da sentença, com o consequente prosseguimento do processo em seus ulteriores
termos. Para tanto, alega que a subtração de sinal de internet é fato típico. Revela a denúncia que o
recorrido há aproximadamente um ano distribuía sinal de internet (Velox) para oito residências 78/171
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da
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
recorrido há aproximadamente um ano distribuía sinal de internet (Velox) para oito residências da
@prof.joaobittenocurt
Comunidade Pavão-Pavãozinho, recebendo R$ 40,00 (quarenta reais) mensais de cada usuário. Essa
conduta adéqua-se perfeitamente ao tipo penal descrito no art. 155, § 3.º, do Código Penal, em sua
parte final. Não se trata de analogia in malam partem, mas sim de interpretação analógica, autorizada
no art. 3.º do Código de Processo Penal. No caso, o furto de sinal de internet é válido para encaixar-se
na figura típica em questão, pois é uma forma de energia por equiparação com valor econômico.
Precedente do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o crime de furto de sinal de TV a cabo. Recurso
ministerial provido, para reformar a sentença e determinar o prosseguimento da ação penal perante o
juiz tabelar, em observância ao princípio do livre convencimento motivado do julgador” (Ap. 0414389-
34.2011.8.19.0001-RJ, 7.ª C. Crim., rel. Siro Darlan de Oliveira, 18.11.2014, m.v.). (Nucci, 2020)

Conceito de qualificadora: convém relembrar que o crime é qualificado quando o tipo penal faz
prever circunstâncias acrescentadas ao tipo básico, tornando-o mais grave. O gravame é exposto na
forma da alteração do mínimo e do máximo em abstrato das penas previstas para o delito. Assim,
enquanto o furto simples (figura básica ou elementar) tem uma pena de reclusão de 1 a 4 anos e
multa, o furto qualificado (contendo circunstâncias específicas) altera a pena para reclusão de 2 a 8
anos e multa. (Nucci, 2020)

Destruição: é a conduta que provoca o aniquilamento ou faz desaparecer alguma coisa. (Nucci,
2020)

Rompimento: é a conduta que estraga ou faz em pedaços alguma coisa. O rompimento parcial da
coisa é suficiente para configurar a qualificadora: STJ: “A subtração de objetos situados no interior do
veículo mediante rompimento de obstáculo, como na hipótese, com rompimento do vidro traseiro
direito de automóvel e destruição da máquina elétrica, qualifica o delito. (Precedentes)” (REsp
982.895-RS, 5.ª T., Felix Fischer, 27.03.2008, v.u.).

Obstáculo: é o embaraço, a barreira ou a armadilha montada para dificultar ou impedir o acesso a


alguma coisa. Nessa ótica: STF: “A jurisprudência da Corte está consolidada no sentido de que
‘configura o furto qualificado a violência contra coisa, considerado veículo, visando adentrar no recinto
para retirada de bens que nele se encontravam’ (HC 98.606-RS, 1.ª T., rel. Min. Marco Aurélio, DJe
28.05.2010)” (HC 110.119-MG, 1.ª T., rel. Dias Toffoli, 13.12.2011, v.u.). STJ: “Segundo o entendimento
da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, configura circunstância qualificadora do rompimento
de obstáculo, prevista no art. 155, § 4.º, inciso I, do Código Penal o furto cometido com o rompimento
dos vidros de veículo para a subtração de objetos do seu interior” (HC 185.817-SP, 5.ª T., rel. Marco
Aurélio Bellizze, 03.05.2012, v.u.). (Nucci, 2020)

Destruição ou rompimento da própria coisa furtada: há duas correntes, fundamentalmente,


analisando o assunto: a) não se aplica a qualificadora quando o agente atua contra a própria coisa.
Assim, quem rompe o vidro do veículo para ter acesso ao seu interior, levando-o depois com uma
“ligação direta”, praticaria furto simples. Na jurisprudência: STJ: “A incidência da qualificadora do art.
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

155, § 4.º, inciso I, do Código Penal, pressupõe conduta praticada pelo réu objetivada à destruição ou
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ao rompimento do óbice que dificulta a obtenção da coisa. Se o dano é contra o próprio objeto do
furto, sendo o obstáculo peculiar à res furtiva, não incide a majorante” (AgRg no AREsp 230117-DF, 5.ª
T., rel. Felix Fischer, 24.02.2015, v.u.); b) aplica-se a qualificadora quando a conduta do agente se volta
contra obstáculo inerente à própria coisa. No exemplo supracitado, estaria presente a qualificadora.
Pensávamos, quando iniciamos o estudo do assunto, ser mais adequada a primeira posição, pela fiel
leitura do tipo penal. Afinal, a norma estipula ser qualificado o furto quando o autor destrói (aniquila)
ou rompe (faz em pedaços) uma barreira que impede a subtração da coisa. É razoável supor, portanto,
que o agente, pretendendo subtrair joias de um cofre situado numa residência, seja levado a romper ou
destruir obstáculos. Arrombando uma porta ou uma janela, ingressa no recinto. Depois, torna-se
necessário romper ou destruir a porta do cofre. Com isso, tem acesso às joias. É um furto qualificado
pela maior audácia e poder de destruição do autor da infração penal. No caso do ladrão que destrói o
vidro de uma das janelas do carro, estaria ele, em verdade, estragando a própria coisa que pretende
levar. Essa primeira impressão cessa quando percebemos que há coisas cujo obstáculo a sua
subtração é inerente ao próprio objeto desejado. É o exemplo do veículo. O vidro de um carro não
funciona exclusivamente como protetor do motorista contra chuva ou vento, mas também é um
obstáculo natural aos que pretendem subtraí-lo. O dono, ao largar seu automóvel na rua, faz questão
de trancá-lo, fechando bem os vidros, que podem, inclusive, estar conectados a alarmes e outros
dispositivos de emergência. Portanto, acredita que está mais bem protegido do que se o largasse com
os vidros abertos. O agente que destrói o vidro para ter acesso ao carro certamente está sendo mais
audaz e causando mais danos do que aquele que encontra o veículo aberto, levando-o. Não se podem
fechar os olhos para a realidade. O proprietário de um automóvel sem capota, por exemplo, pode não o
deixar na rua justamente porque sabe estar sem proteção alguma, mais sujeito ao furto, portanto.
Aquele que possui o veículo protegido por portas e vidros não possui a mesma desconfiança. Sabe-se,
aliás, ser mais dificultosa a subtração quando o carro está devidamente fechado do que quando está
aberto, sem qualquer obstáculo. Uma árvore, noutro exemplo, pode estar sujeita a furto. O seu
proprietário somente não colocou a planta sob maior proteção porque acredita que ela está
naturalmente preservada pelas raízes grudadas ao chão. Assim, aquele que leva a árvore, arrancando-a
do solo, estragando seu vínculo natural com a terra, deve responder por furto qualificado. Nem todos
os obstáculos são externos à coisa. Cremos, pois, mais acertada a segunda posição. E mais: não
vemos necessidade alguma de a subtração consumar-se para incidir a qualificadora. O sujeito que
destrói o vidro do carro, sendo surpreendido quando fazia a “ligação direta”, deve responder por
tentativa de furto qualificado. (Nucci, 2020)

Necessidade do exame de corpo de delito: se o crime deixa vestígios, é indispensável o exame de


corpo de delito (art. 158, CPP), não podendo supri-lo a prova testemunhal. Esta somente será admitida,
em lugar do exame, caso os vestígios tenham desaparecido, conforme preceitua o art. 167 do Código
de Processo Penal. Nesse prisma: STJ: “3. Quanto à escalada, a jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça é assente no sentido de que a incidência da qualificadora prevista no art 155 § 4º inciso II do
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 80/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Justiça é assente no sentido de que a incidência da qualificadora prevista no art. 155, § 4 , inciso II, do
Código Penal exige exame pericial, somente admitindo-se prova indireta quando justificada a
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impossibilidade de realização do laudo direito, o que não restou explicitado nos autos” (HC
508.935/SP, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 30.05.2019, v.u.); “1. Nos termos da consolidada jurisprudência
vigente neste Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento das qualificadoras de rompimento de
obstáculo e da escalada, para fins de conferir maior reprovabilidade ao crime de furto, exige, nos
termos do art. 158 do CPP, a realização de exame de corpo de delito. Precedentes” (AgInt no HC
437.169/SC, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, j. 18.09.2018, v.u.); “(...) A qualificadora do inciso I do § 2.º do
artigo 155 do Código Penal resta configurada quando o agente rompe ou destrói um obstáculo
colocado de forma a impedir ou dificultar a subtração da coisa. No caso, as instâncias ordinárias, com
supedâneo em laudo pericial, concluíram que o réu arrombou a janela da residência da vítima com a
utilização de um pedaço de ferro, rompendo um plástico que a fechava, danificando a parte inferior da
janela, o que tipifica a mencionada qualificadora. 3. O arrombamento da janela de residência para fins
de subtração de bens que encontravam-se em seu interior, atrai a incidência da qualificadora do
rompimento de obstáculo à subtração da coisa. 4. Inviável a reversão das conclusões expostas pelas
instâncias ordinárias no sentido de que houvera apenas o rompimento do plástico que trancava a
janela, não ocorrendo sua danificação, pois, referido entendimento demanda, inexoravelmente, o
revolvimento das provas dos autos, providência não admitida na via estreita do mandamus. 5. Habeas
Corpus não conhecido” (HC 381.310-SC, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 21.02.2017, v.u.).
TJMT: “A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que para incidir a
qualificadora prevista no art. 155, § 4.º, inciso I, do Código Penal exige exame pericial para a
comprovação do rompimento de obstáculo, somente admitindo-se prova indireta quando justificada a
impossibilidade de realização do laudo direto. Pena definitiva reduzida em atendimento à decisão do
STJ, que afastou a qualificadora do rompimento de obstáculo, no âmbito de Recurso Especial” (Ap.
96837/2014-MT, 1.ª C. Crim., rel. Paulo da Cunha, 27.06.2017, v.u.). TJPE: “(...) Nos termos da
jurisprudência do STJ, é indispensável a realização de perícia para o reconhecimento da qualificadora
prevista no art. 155, § 4.º, II, do Código Penal, admitindo-se a substituição do laudo pericial por outros
meios de prova somente quando o delito não deixar vestígios, se estes tiverem desparecido ou, ainda,
se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo, o que não ocorreu na hipótese”
(Ap. 450386-8-PE, 2.ª C. Crim., rel. Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima, 05.04.2017, v.u.). (Nucci,
2020)

Desnecessidade do exame pericial: há corrente sustentando a viabilidade de suprimento do laudo


pericial, atestando o rompimento de obstáculo, por outros meios de prova, tais como o auto de
constatação e testemunhas. Conferir: STJ: “II – Com efeito, para a configuração de furto qualificado
pelo rompimento de obstáculo, o exame pericial não se constitui o único meio probatório possível para
a comprovação da qualificadora de rompimento de obstáculo no crime de furto, sendo lícito,
considerando o sopesamento das circunstâncias do caso concreto, a utilização de outras formas, tais
como a prova a documental e a testemunhal, desde que devidamente justificada a impossibilidade de
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realização do laudo pericial” (HC 507.569/SP, 5.ª T., Felix Fischer, 06.06.2019, v.u.). TJRS: “Frente à
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demonstração do rompimento de uma porta do veículo da vítima para a realização da subtração, deve
ser mantida a incidência da respectiva qualificadora. Auto de constatação referendado pela prova oral,
especialmente os depoimentos dos policiais militares que atenderam à ocorrência” (Ap. Crim.
70060526720-RS, 8.ª C. Crim., rel. Naele Ochoa Piazzeta, 13.05.2015, v.u.). (Nucci, 2020)

Destaque para o furto de água: verifica-se em decisão proferida pelo STJ que o furto de água não
pode ser considerado insignificante, diante da crise hídrica pela qual atravessa o país. Além disso, o
pagamento da quantia devida não afasta o crime. Conferir: STJ: “Esta Corte Superior tem entendido ser
inviável a aplicação do princípio da insignificância na hipótese de furto qualificado pelo rompimento de
obstáculo, ante a audácia demonstrada pelo agente, a caracterizar maior grau de reprovabilidade da
sua conduta. O reconhecimento do privilégio legal – direito subjetivo do réu – exige a conjugação de
dois requisitos objetivos, consubstanciados na primariedade e no pequeno valor da coisa furtada, que,
na linha do entendimento pacificado neste Superior Tribunal, deve ter como parâmetro o valor do
salário mínimo vigente à época dos fatos. A conduta do paciente – da subtração da água mediante
rompimento de obstáculo (lacre do hidrômetro e uso de um by pass) – não se revela como de escassa
ofensividade penal e social, visto que a lesão jurídica não se resume à água subtraída da empresa
vítima, mas, mas da imposição de uma série de riscos a toda sociedade. Em tempos de escassez
hídrica, aquele que furta água não precisa se preocupar em economizar, pois sobre ele não incidirão
dispositivos como bandeiras tarifárias, multas por excesso de consumo etc. Ademais, as perdas de
água não se apresentam apenas como um problema econômico decorrente da falta de pagamento
pela água consumida, pois têm implicações mais amplas, com repercussões significativas no que
concerne à saúde pública, com a possibilidade de contaminação da rede por ligações clandestinas, à
necessidade de investimentos para as ações de redução ou manutenção das perdas – que não são
cobertos pelo eventual pagamento da água furtada –, à perda de funcionamento eficiente do sistema,
entre outros. A importância em se coibir a prática do furto de bem tão precioso para a vida e a
cidadania tem movido inúmeras agências governamentais e internacionais em torno da preservação
da água, a ponto do Painel de especialistas em perdas de águas da IWA (Associação Internacional da
Água) estabelecer entre as metas de manejo da água – desde a captação, passando pelo tratamento,
até a distribuição – a necessidade de reduzir os impactos dos furtos que causam perdas
desnecessárias para o sistema de distribuição. A prática disseminada das ligações clandestinas de
água – os ‘gatos’ – acabam por ter um último efeito deletério: por aumentarem demasiadamente os
índices de perda das companhias de abastecimento – risco esse avaliado pelos bancos no momento
de avaliar os projetos de investimento – inviabilizam o acesso a linhas de financiamento do Banco
Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Mundial, atrasando, assim, o cronograma de expansão
das companhias de abastecimento e de saneamento, postergando, assim, o acesso da população mais
carente à água limpa e à rede de coleta de resíduos, direitos humanos garantidos na Constituição
Federal de 1988. Situação que se diferencia – pela exclusividade da tese defensiva da insignificância
da conduta – da julgada no RHC nº 59 656-MG em que a Sexta Turma por maioria deu provimento ao
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da conduta – da julgada no RHC n 59.656-MG, em que a Sexta Turma, por maioria, deu provimento ao
recurso (este relator ficou vencido), por considerar que o pagamento do débito perante a companhia de
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água antes do oferecimento da denúncia extingue a punibilidade, mediante aplicação analógica do
disposto nos arts. 34 da Lei n.º 9.249/1995 e 9.º da Lei n.º 10.684/2003. Agravo regimental não
provido” (AgRg no HC 308.536-MG, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz, 24.05.2016, DJe 06.06.2016).
(Nucci, 2020)

Abuso de confiança: confiança é um sentimento interior de segurança em algo ou alguém; portanto,


implica credibilidade. O abuso é sempre um excesso, um exagero em regra condenável. Portanto,
aquele que viola a confiança, traindo-a, está abusando. A qualificadora que diz respeito ao abuso de
confiança pressupõe a existência prévia de credibilidade, rompida por aquele que violou o sentimento
de segurança anteriormente estabelecido. Ex.: uma empregada doméstica que há anos goza da mais
absoluta confiança dos patrões, que lhe entregam a chave da casa e várias outras atividades pessoais
(como o pagamento de contas), caso pratique um furto, incidirá na figura qualificada. Por outro lado, a
empregada doméstica recém-contratada, sem gozar da confiança plena dos patrões, cometendo furto
incide na figura simples. Note-se que a simples relação de emprego entre funcionário e empregador
não faz nascer a confiança entre as partes, que é um sentimento cultivado com o passar do tempo.
Pode aplicar-se, no entanto, a agravante de crime cometido valendo-se da relação doméstica ou de
coabitação. Cabe, ainda, uma última análise, especialmente voltada à relação empregatícia. Não se
deve excluir, automaticamente, a incidência da qualificadora quando um empregado qualquer, recém-
contratado, praticar furto contra o patrão. Deve-se verificar a forma de contratação. É possível que o
empregador tome todas as cautelas possíveis para contratar alguém, tomando referências e buscando
uma relação de confiança acima de tudo. Encontrada a pessoa – algo que é atualmente típico no
contexto da empregada doméstica –, instala o empregado no seu posto, já acreditando estar diante de
uma pessoa de confiança. Se for cometida a subtração, cremos estar configurada a qualificadora. De
outra parte, há empregadores que não se preocupam, primordialmente, com a relação de confiança a
ser estabelecida com o empregado. Contratam pessoas sem grande cautela. Nesse caso, sofrendo um
furto, não há de incidir a figura qualificada. Entendemos que afastar a qualificadora do abuso de
confiança unicamente porque o empregado é novel seria desconectar o Direito Penal da realidade, uma
vez que se sabe a enorme diferença existente entre patrões que buscam estabelecer, logo de início e
como pressuposto para a contratação, uma relação de confiança e segurança com a pessoa
empregada e outros que não agem da mesma forma. Por isso, conforme o caso concreto, o abuso de
confiança pode figurar como qualificadora no contexto do empregado que, recém-contratado, pratica
furto contra o patrão. Na jurisprudência: STJ: “Estando comprovada a relação de confiança entre a
empregada doméstica e a vítima que a contrata – seja pela entrega das chaves do imóvel ou pelas
boas referências de que detinha a Acusada – cabível a incidência da qualificadora ‘abuso de confiança’
para o crime de furto ora sob exame. Precedente” (HC 192.922-SP, 5.ª T., rel. Laurita Vaz, 28.02.2012,
v.u.). TJSC: “Pratica furto qualificado a empregada doméstica que, valendo-se da confiança depositada
por seus empregadores, subtrai bens que teve acesso em decorrência de seu labor e de diminuta
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 83/171
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vigilância” (Ap. 2011.047727-4, 4.ª C., rel. Roberto Lucas Pacheco, 19.09.2012, v.u.).
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Fraude: é uma manobra enganosa destinada a iludir alguém, configurando, também, uma forma de
ludibriar a confiança que se estabelece naturalmente nas relações humanas. Assim, o agente que criar
uma situação especial, voltada a gerar na vítima um engano, tendo por objetivo praticar uma subtração
de coisa alheia móvel, incide da figura qualificada. Ex.: o funcionário de uma companhia aérea que, no
aeroporto, a pretexto de prestar auxílio a um turista desorientado, prometendo tomar conta da
bagagem da vítima, enquanto esta é enviada a outro balcão de informações, subtrai bens contidos nas
malas incide na figura qualificada. A fraude está caracterizada pelo desapego que o proprietário teve
diante de seus bens, uma vez que acreditou na estratégia criada pelo referido funcionário. Crendo ter
os seus pertences guardados por pessoa credenciada por companhia aérea, deixou-os sem proteção e
viu-se vítima de um furto. Foi enganado, logrado, ludibriado. Nota-se, pois, como a fraude implica num
modo particularizado de abuso de confiança. Este, por si só, exige uma relação específica de
segurança concretizada entre autor e vítima, enquanto a fraude requer, apenas, um plano ardiloso que
supere a vigilância da vítima, fazendo com que deixe seus bens desprotegidos, facilitando a ação
criminosa. A fraude é uma “relação de confiança instantânea”, formada a partir de um ardil. Na
jurisprudência: STJ: “A Terceira Seção desta Corte Superior firmou o entendimento no sentido de que a
subtração de valores de conta-corrente, mediante transferência fraudulenta, utilizada para ludibriar o
sistema informatizado de proteção de valores, mantidos sob guarda bancária, sem consentimento da
vítima, configura crime de furto mediante fraude, previsto no art. 155, § 4.º, inciso II, do Código Penal –
CP. O delito em questão consuma-se no local da agência bancária onde o correntista fraudado possui a
conta, nos termos do art. 70 do Código de Processo Penal – CPP” (CC 145.576-MA, 3.ª Seção, rel. Joel
Ilan Paciornik, 13.04.2016, DJe 20.04.2016).

Furto com fraude versus estelionato: eis polêmica estabelecida no caso concreto, provocando
variadas posições na jurisprudência. O cerne da questão diz respeito ao modo de atuação da vítima,
diante do engodo programado pelo agente. Se este consegue convencer o ofendido, fazendo-o incidir
em erro, a entregar, voluntariamente, o que lhe pertence, trata-se de estelionato; porém, se o autor, em
razão do quadro enganoso, ludibria a vigilância da vítima, retirando-lhe o bem, trata-se de furto com
fraude. No estelionato, a vítima entrega o bem ao agente, acreditando fazer o melhor para si; no furto
com fraude, o ofendido não dispõe de seu bem, podendo até entregá-lo, momentaneamente, ao autor
do delito, mas pensando em tê-lo de volta. Ilustrando: Fulano apresenta-se como comprador do carro
anunciado no jornal por Beltrano; pede para dar uma volta; Beltrano entrega a chave do veículo para o
“teste”; Fulano foge com o carro. Houve furto com fraude. Por outro lado, Fulano, apresentando-se
como comprador, entrega cheque falsificado a Beltrano, que lhe passa a chave, o manual do carro, um
recibo e pensa ter efetivamente vendido o veículo. O cheque, por óbvio, não é compensado. Houve
estelionato. Na jurisprudência: STJ: “No furto mediante abuso de confiança, tem-se o bem subtraído
por desatenção, uma vez que o agente, de forma fraudulenta, burla a vigilância da vítima para furtá-la.
Já no estelionato, a fraude é usada como meio para obter o consentimento da vítima que, iludida,
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 84/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

entrega voluntariamente o bem ao agente. Hipótese em que a paciente se valeu da condição de


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enfermeira doméstica para, mediante abuso de confiança, furtar talões de cheques e utilizá-los de
forma fraudulenta, restando caracterizado o crime previsto no art. 155, § 4.º, II, do Código Penal. 4.
Habeas corpus não conhecido” (HC 305864-SC, 5.ª T., rel. Gurgel de Faria, 05.02.2015, v.u.). TJPI: “1.
Devidamente comprovadas a materialidade e autoria do delito previsto no artigo 155, § 4.º, inciso II,
todos do Código Penal, que foi admitido pela ré. 3. Embora esteja presente tanto no crime de
estelionato quanto no de furto qualificado, a fraude, no primeiro caso, é utilizada para induzir a vítima
ao erro, de modo que ela própria entrega seu patrimônio ao agente; enquanto que no furto, a fraude
visa burlar a vigilância da vítima, que, em razão dela, não percebe que a coisa lhe está sendo subtraída.
2. Hipótese em que a conduta do réu, na posse de cartão eletrônico da vítima, fez saques de valores
sem o consentimento da titular, se subsume ao furto qualificado previsto no art. 155 do Código Penal.
3. Apelo conhecido e improvido” (Ap. 2017.0001.002722-4-PI, 1.ª Câmara Especializada Criminal, rel.
Edvaldo Pereira de Moura, 27.06.2018, v.u.). TJGO: “Diferencia-se o furto qualificado pela fraude do
estelionato porque, no primeiro, a fraude possibilita a subtração do bem pelo agente sem a anuência
da vítima, enquanto que, no segundo, a fraude faz com que a própria vítima lhe entregue
espontaneamente a coisa ou a vantagem ilícita” (Ap. Crim. 197397-79.2015.8.09.0175-GO, 1.ª C. Crim.,
rel. Itaney Francisco Campos, 18.04.2017, v.u.).

Escalada: é a subida de alguém a algum lugar, valendo-se de escada. Escalar implica subir ou
galgar. Portanto, torna-se fundamental que o sujeito suba a algum ponto mais alto do que o seu
caminho natural, ou seja, é o ingresso anormal de alguém em algum lugar, implicando acesso por
aclive. Ex.: subir no telhado para, removendo telhas, invadir uma casa. Por outro lado, quando o agente
ingressar no imóvel por uma janela que está próxima ao solo não se configura a qualificadora, por não
ter obrado ele com esforço incomum. Se houver arrombamento, pode-se falar na figura do inciso I; se a
janela estiver aberta, há furto simples. Acrescentamos, no entanto, a posição de NÉLSON HUNGRIA,
com a qual concordávamos, para incluir no contexto desta qualificadora outras possibilidades
anormais de ingresso em algum lugar, mediante a utilização de meios artificiais não violentos ou
contando com a própria agilidade. Dessa forma, poder-se-ia falar em escalada, quando o agente
invadisse uma casa, por exemplo, através de uma via subterrânea, normalmente não transitável, como
o túnel de um esgoto (Comentários ao Código Penal, v. VII, p. 44). A interpretação extensiva, firmada
por HUNGRIA, é desnecessária para dar sentido à norma. Logo, torna-se inadequada em face do
princípio da legalidade. Admitimos a utilização da interpretação extensiva, mas somente quando
indispensável para conferir racionalidade à aplicação da lei penal, seja ela incriminadora ou não. Não é
o caso. Escalar é subir por escada, galgar um obstáculo, mas não se aprofundar num porão ou num
subterrâneo. Quisesse o legislador punir mais severamente, como furto qualificado, quem ingressa
numa residência pelo túnel do esgoto, deveria ter usado outra fórmula, como, por exemplo, mediante
ingresso por meio anormal. No entanto, nada impede que o juiz, valendo-se das circunstâncias
judiciais do art. 59, valore o ingresso em determinado lugar pelo porão ou subterrâneo, mas não como
a qualificadora de escalada Conferir ainda a lição de LAJE ROS: “o autor deve vencer as defesas que
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 85/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
a qualificadora de escalada. Conferir ainda a lição de LAJE ROS: o autor deve vencer as defesas que
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resguardam as coisas, e as deve vencer mediante esforço, toda vez que o obstáculo seja vencido sem
aquela circunstância, a agravante não poderá ser aplicada, em razão de que o obstáculo não se
apresentava como defesa, mas apenas como um puro e simples ornamento. (...) É preciso saber se o
ingresso ou a entrada por um lugar não destinado a isso equivale à escalada. É evidente que o ladrão,
ao escalar um muro, o faz por um lugar que não está destinado à entrada. O muro é o que impede a
entrada. No entanto, pode o autor do delito ter acesso por um lugar não destinado a servir de entrada e
o faça sem escalada. Neste sentido, uma janela de baixa altura não tem por fim servir de entrada. O
ingresso por esse lugar, sem ser por escalada, não agrava a infração, porque a razão do maior aumento
da pena não se funda na entrada por um lugar não destinado a isso, mas no fato de que se deve vencer,
ou superar algo que se apresenta como um obstáculo, e que tenha sido posto para dar maior proteção
às coisas” (La interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 196-200). (Nucci, 2020)

Laudo pericial: como regra, deve ser realizado, pois os vestígios são visíveis após a prática do
crime. Excepcionalmente, pode ser substituído por testemunhas. O importante é não ter o Estado
contribuído para a não realização do exame pericial. Na jurisprudência: STJ: “No caso dos autos, não
tendo sido realizada perícia no local e inexistindo no aresto combatido qualquer menção sobre a
impossibilidade da sua realização, deve ser afastada a incidência da qualificadora relativa à escalada,
prevista no artigo 155, § 4.º, inciso II, do Código Penal” (AgRg no REsp 1594566-SC, 5.ª T., rel. Jorge
Mussi, 28.06.2016, DJe 01.08.2016); “1. A pacífica jurisprudência desta Corte, com ressalva do
entendimento pessoal do relator, entende que para o reconhecimento da incidência da qualificadora da
escalada, prevista no art. 155, § 4.º, II, do Código Penal, não se prescinde da realização de exame
pericial, devendo restar consignado que a sua substituição por outros meios probatórios somente é
possível quando não existirem vestígios ou se o corpo de delito houver desaparecido. Em último caso,
o exame pericial pode ser afastado quando as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do
laudo. 2. Hipótese em que, embora as instâncias ordinárias tenham se utilizado dos depoimentos da
vítima e das testemunhas, além da confissão do réu, para concluir pela incidência da qualificadora da
escalada, deixaram de proceder à realização de perícia técnica, inviabilizando o seu reconhecimento.
3. Agravo desprovido” (AgRg no REsp 1468309-MG, 5.ª T., rel. Gurgel de Faria, 24.02.2015, v.u.).

Destreza: é a agilidade ímpar dos movimentos de alguém, configurando uma especial habilidade. O
batedor de carteira (figura praticamente extinta diante da ousadia dos criminosos atuais) era o melhor
exemplo. Por conta da agilidade de suas mãos, conseguia retirar a carteira de alguém, sem que a
vítima percebesse. Não se trata de “trombadinha”, que investe contra a vítima, arrancando-lhe, com
violência, os pertences. Como vimos, nessa hipótese trata-se de roubo. Na jurisprudência: STJ:
“Somente a excepcional, incomum, habilidade do agente, que com movimento das mãos consegue
subtrair a coisa que se encontra na posse da vítima sem despertar-lhe a atenção, é que caracteriza,
revela, a ‘destreza’. Não configuram essa qualificadora os atos dissimulados comuns aos crimes
contra o patrimônio – que, por óbvio, não são praticados às escâncaras” (REsp 1478648-PR, 5.ª T., rel.
Newton Trisotto 16 12 2014 v u )
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 86/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Newton Trisotto, 16.12.2014, v.u.).
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Chave falsa: é o instrumento destinado a abrir fechaduras ou fazer funcionar aparelhos. A chave
original, subtraída sub-repticiamente, não provoca a configuração da qualificadora. Pode haver, nessa
hipótese, conforme o caso concreto, abuso de confiança ou fraude. A mixa – ferro curvo destinado a
abrir fechaduras –, segundo nos parece, pode configurar a qualificadora. Afinal, deve-se notar que se a
chave é falsa não há de possuir o mesmo aspecto ou a mesma forma da chave original.

Concurso de duas ou mais pessoas: quando mais de um agente se reúnem para a prática do crime
de furto é natural que se torne mais acessível a concretização do delito. Por isso, configura-se a
qualificadora. O apoio prestado, seja como coautor, seja como partícipe, segundo entendemos, pode
servir para configurar a figura do inciso IV. O agente que furta uma casa, enquanto o comparsa, na rua,
vigia o local, está praticando um furto qualificado. Inexiste, na lei, qualquer obrigatoriedade para que o
concurso se dê exclusivamente na forma de coautoria (quem pratica o núcleo do tipo, executando o
crime), podendo configurar-se na forma de participação (auxílio a quem pratica a ação de subtrair). Na
jurisprudência: TJRS: “Para o reconhecimento da qualificadora prevista no art. 155, § 4.º, inc. IV, do CP,
prescindível que os autores tenham previamente ajustado a prática subtrativa. Basta a prova da
participação de duas ou mais pessoas no delito e que estas possuam o completo domínio da ação
criminosa” (Ap. Crim. 70060526720-RS, 8.ª C. Crim., rel. Naele Ochoa Piazzeta, 13.05.2015, v.u.).
(Nucci, 2020)

Qualificadora do emprego de explosivo: introduzida pela Lei 13.654/2018, tem o objetivo de


proporcionar um tratamento mais rigoroso à nova modalidade de furto a caixas eletrônicos, por meio
da explosão do maquinário para, na sequência, haver a retirada do dinheiro. Menciona-se no § 4º-A o
uso de explosivo (substância inflamável, capaz de produzir explosão, isto é, um abalo seguido de forte
ruído causado pelo surgimento repentino de uma energia física ou expansão de gás) ou artefato
análogo (todos os produtos que possam produzir resultado similar, tal como o engenho de dinamite,
que envolve explosivo à base de nitroglicerina), seguido da causação de perigo comum (probabilidade
de dano a um número indeterminado de pessoas).

Quanto ao perigo envolvendo pessoas incertas, torna-se relevante verificar em qual local se deu a
explosão. Como regra, tratando-se de caixas eletrônicos, eles estão em zonas urbanas, logo,
habitadas, motivo pelo qual o perigo comum se torna evidente. Mas, caso a explosão seja realizada
num celeiro, para o furto de um cavalo, em local rural não habitado no momento, não se pode aplicar
esta qualificadora. Resta ao juiz utilizar o rompimento de obstáculo para a subtração da coisa. Era
preciso tomar uma atitude com relação a essa situação, embora o próprio julgador pudesse, valendo-
se dos elementos do art. 59 do Código Penal, aplicar pena-base mais severa, justamente pelo emprego
de explosão para atingir a coisa almejada. No entanto, preferiu o legislador tomar a dianteira e criou a
qualificadora prevista no § 4º-A. É preciso cautela para a composição de todas as qualificadoras do
tipo do art. 155, pois todas elas merecem ser consideradas, quando presentes, embora em diversas
fases da aplicação da pena. Esta qualificadora indica uma pena de reclusão, de quatro a dez anos, e
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 87/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
fases da aplicação da pena. Esta qualificadora indica uma pena de reclusão, de quatro a dez anos, e
pena pecuniária (multa). (Nucci, 2020)
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Qualificadora do § 7.º, a que possui a maior sanção em abstrato. Supera, portanto, as qualificadoras
do §4.º, do § 5.º e do § 6.º. Ilustrando, se o agente em duas ou mais pessoas, explodir um caixa
eletrônico, rompendo obstáculo para subtrair o dinheiro, deve o julgador eleger a qualificadora do §
4.º-A para começar o processo de individualização da pena. As duas outras circunstâncias
qualificadoras (duas ou mais pessoas; rompimento de obstáculo), previstas no § 4.º, devem ser
valoradas como circunstâncias judiciais (art. 59, CP), promovendo um aumento da pena-base. A partir
da edição da Lei 13.964/2019, esta figura passa a ser considerada crime hediondo (art. 1º, IX, Lei
8.072/90). Só se poderá computar como hediondo, quando o crime for cometido depois do início de
vigência da referida Lei 13.964/2019 (final de janeiro de 2020). Afinal, lei penal mais rigorosa não pode
retroagir para prejudicar o réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal).

Qualificadora do transporte do veículo: trata-se de outra figura de crime qualificado. A pena


aumenta – nas faixas abstratas mínima e máxima –, para reclusão de 3 a 8 anos, quando o veículo
automotor for transportado para outro Estado da Federação ou para o exterior. Esta qualificadora foi
introduzida pela Lei 9.426/96, depois de intensa pressão exercida pelas companhias de seguro, fartas
de indenizar subtrações de veículos automotores, cujo destino, na maioria das vezes, era outro Estado
da Federação ou mesmo outro país. (Nucci, 2020)

Esquecimento da pena de multa: o tipo penal, quando foi modificado para receber mais uma
qualificadora, teve um defeito: olvidou o legislador a pena de multa, típica sanção penal dos delitos
contra o patrimônio.

Veículo automotor: todo veículo que é dotado de instrumentos de automovimentação. Há de ter um


motor de propulsão, circulando por seus próprios meios. Pode ser um automóvel, um barco, uma moto,
entre outros. (Nucci, 2020)

Análise do tipo penal: a expressão “venha a ser transportado” acabou configurando um delito
material, ou seja, exige-se o resultado naturalístico previsto no tipo penal, sendo preciso que o veículo
automotor efetivamente seja levado para outro Estado da Federação ou ainda a outro país. Se ficar na
mesma unidade federativa, não há a incidência da qualificadora. Portanto, cremos não haver tentativa
de furto qualificado se o ladrão está conduzindo o veículo para outro Estado ou país e é surpreendido
pela polícia. Segundo a redação do tipo penal, trata-se de uma situação mista, abrangendo um crime
qualificado pelo resultado (transpor as fronteiras do Estado ou do País) e uma finalidade específica de
agir (ter o fim de transpor as fronteiras do Estado ou do País). O ladrão, ao subtrair o veículo
automotor, pode ou não ter o fim de conduzi-lo a outro Estado brasileiro ou a outro país, embora a
qualificadora só se configure quando, realmente, essa finalidade se delinear na mente do agente, além
de ser, de fato, atingida. O veículo que efetivamente vai para outro Estado ou país torna o delito mais
grave, pois dificulta sobremaneira a recuperação do bem pela vítima.

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 88/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Interpretação extensiva do termo Estado: equiparado a Estado, para inúmeras finalidades, está o
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Distrito Federal. Veja-se o disposto nos arts. 32 e 34 da Constituição Federal. O Distrito Federal não
poderá dividir-se em Municípios, mas tem a competência legislativa reservada aos Estados e
Municípios, sendo dirigido por um Governador, contando com leis aprovadas por Deputados Distritais.
Ademais, salvaguarda-se o Distrito Federal, tanto quanto o Estado, da intervenção federal da União,
exceto em algumas situações, expressamente previstas na Constituição. E mais: muitas leis
equiparam, para seus propósitos, o Distrito Federal ao Estado. Como exemplo, pode-se mencionar o
disposto no art. 1.º, § 3.º, II, da Lei Complementar 101/2000: “Nas referências: (...) a Estados entende-
se considerado o Distrito Federal”. Por isso, se o agente do furto encaminhar o veículo para o Distrito
Federal, saindo de qualquer outro Estado da Federação, terá incidido na hipótese desta qualificadora.
(Nucci, 2020)

Conhecimento e adesão à qualificadora: é imperioso que o agente ou seus comparsas tenham


perfeita noção de que o veículo foi subtraído com a finalidade de ser levado a outro Estado da
Federação ou ao exterior, aceitando tal situação. Caso algum dos concorrentes para a prática do delito
desconheça totalmente a remessa do automóvel para esses lugares, não pode incidir a qualificadora,
por inexistência de dolo. Não se pune a forma culposa de furto em caso algum. (Nucci, 2020)

Regras de preponderância de qualificadora: deve-se utilizar, como faixa de aplicação da pena


(mínimo e máximo), a qualificadora com os maiores valores. Havendo a incidência, no caso concreto,
de outras qualificadoras, elas não mais serão usadas como tais; passam a ser utilizadas como
agravantes (se possível) ou como circunstâncias judiciais (art. 59, CP). Ilustrando, caso o agente furte
um veículo, incidindo inicialmente na figura do caput (furto simples) e depois leve o objeto subtraído
para fora do País, a figura é qualificada (§ 5.º). Se o autor do furto rompeu obstáculo para a subtração
da coisa (figura do § 4.º, I, do art. 155) e, em seguida, levou o veículo automotor para fora do Estado ou
do País, incide somente a qualificadora mais grave, que é a do § 5.º. (Nucci, 2020)

Qualificadora do furto de animais: a Lei 13.330/2016 introduziu esta qualificadora, que passa a
conflitar com outras. Desse modo, em primeiro lugar, o operador do direito precisa optar pela mais
grave: a) utilizar, em primeiro plano, a qualificadora do § 4.º-A ou do § 7.º (maiores penas); b) depois, a
qualificadora do § 5.º; c) na sequência, a qualificadora do § 4.º; d) finalmente, a qualificadora do § 6.º
(a terceira maior pena). Nada impede, no entanto, a utilização das circunstâncias descritas nas
qualificadoras que não puderam ser usadas para fixar a faixa de aplicação da pena na primeira fase
(pena-base, art. 59, CP) ou na segunda (agravantes/atenuantes), conforme o caso concreto. O
propósito legislativo foi a maior tutela em relação aos semoventes (animais, que sempre foram
considerados, para efeito de furto, como coisas), domesticáveis (apto a se tornar caseiro, manso,
domado, como são os cães há milênios), de produção (algo decorrente do trabalho humano, com ou
sem instrumentos específicos, para atingir larga escala de produtos, com o fim de comércio e lucro).
Visando à pormenorização dos animais domesticáveis de produção, acrescentou-se a parte final, até
para tutelar o semovente morto: ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração O
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
para tutelar o semovente morto: ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração. O
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abate significa a matança de animais para servir de alimento (no sentido específico desta
qualificadora); essa ressalva faz com que o furtador não escape à punição se resolver matar um boi no
pasto para depois subtraí-lo, por exemplo. Outra cautela legislativa, buscando evitar a tergiversação do
intérprete no tocante à nova circunstância, fez inserir a viabilidade de matar o animal e separá-lo em
pedaços no próprio lugar da subtração. Desse modo, seja para facilitar o transporte, seja para tentar a
descaracterização de furto de animais (pois estes estariam abatidos e divididos em partes), o agente
continua respondendo pela qualificadora. Pode-se argumentar que encontrar o animal abatido, noutro
local, distante do lugar de onde foi subtraído, cortado em pedaços, desfiguraria a qualificadora, pois ali
se menciona dividido em partes no local da subtração. Seria uma interpretação literal e alheia aos
princípios hermenêuticos básicos. Por óbvio, se o agente levou o animal inteiro, abatido ou vivo, para
realizar a tarefa de dividi-lo em partes noutro local, a qualificadora já estava configurada. O ponto
fundamental da circunstância de aumento de pena é a subtração de animal domesticável (excluindo-
se, pois, todos os selvagens, como onças, leões, zebras, girafas etc.), que sirva à produção básica de
alimentos e congêneres. Ex.: bois, vacas, porcos, galinhas, ovelhas etc. Deve-se evitar, por óbvio, o
animal não domesticável, como o peixe, o jacaré, o camarão, entre outros, embora possa ser de
produção. Deveria ter optado o legislador por incluir uma causa de aumento de pena; assim, mesmo
que houvesse a presença de outras qualificadoras, ela poderia incidir. Elegendo a figura qualificada, é
de anotar ser inviável inserir qualificadora sobre qualificadora, ou seja, não se qualifica duas vezes um
crime, quando as circunstâncias advêm de parágrafos diferentes, como já esclarecido no início desta
nota. (Nucci, 2020)

Qualificadora da subtração de explosivo: esta circunstância qualificadora se volta ao objeto da


subtração: coisa considerada perigosa, possibilitando a explosão, gerando situação de perigo comum.
Sob outro prisma, a qualificadora do § 4.º-A enfoca o modo de execução do crime de furto, visto que o
agente se vale de explosão para atingir o objeto desejado. A constituição potencial de danos
consideráveis a pessoas impôs, para ambas, uma faixa de pena em abstrato bastante elevada:
reclusão, de 4 a 10 anos, e multa. O objeto material desta figura qualificada é qualquer substância
explosiva (elemento inflamável, capaz de produzir explosão, isto é, um abalo seguido de forte ruído
causado pelo surgimento repentino de uma energia física ou expansão de gás). Embora neste
dispositivo não se tenha mencionado artefato análogo, como consta do § 4.º-A, nada impede que se
use interpretação extensiva para incluí-lo neste âmbito. O cenário desta qualificadora prescinde da
menção a perigo comum, pois não ocorre explosão, mas a subtração de coisa apta a produzir o
engenho explosivo. Da mesma forma como já mencionado em outros itens, esta qualificadora deve ser
aplicada quando em concurso com outras de menor valor (§§ 4.º, 5.º e 6.º). Pode ocorrer, entretanto, a
subtração de substância explosiva, mediante o uso de explosivo detonado para romper obstáculo à
retirada da coisa. Deve-se dar preferência à primeira conduta (explodir o local), aplicando-se o § 4.º-A.
Depois, leva-se em consideração a circunstância do rompimento de obstáculo (§ 4.º, I) e de o objeto
ser substância explosiva (§ 7.º) como circunstâncias judiciais, para elevar a pena-base, com
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 90/171
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fundamento no art. 59 do Código Penal.


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ROUBO (art. 157)

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência
a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra
pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou
para terceiro.

§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:

I – (revogado);

II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.

IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o
exterior;

V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.

VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente,


possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.

VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca;

§ 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):

I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;

II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato


análogo que cause perigo comum.

§ 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou
proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo.

§ 3º Se da violência resulta:

I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;

II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.

Crime complexo: o roubo é um furto associado a outras figuras típicas, como as originárias do
d i lê i d
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(N i 2020) 91/171
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emprego de violência ou de grave ameaça. (Nucci, 2020)
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Sujeitos ativo e passivo: podem ser qualquer pessoa. É preciso ressaltar que também a vítima
somente da violência, mas não da subtração, pode ser sujeito passivo. Isto se deve aos objetos
jurídicos protegidos pelo roubo, que incluem, além do patrimônio, a integridade física e a liberdade do
indivíduo. (Nucci, 2020)

Princípio da insignificância: não pode ser aplicado no contexto do roubo. Trata-se de crime complexo,
que protege outros bens além do patrimônio, de forma que a violência ou a grave ameaça não podem
ser consideradas de menor relevância, configuradora do delito de bagatela. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STF: “Na concreta situação dos autos, não há como acatar a tese de irrelevância material da conduta
protagonizada pelo paciente, não obstante a reduzida expressividade financeira dos objetos que se
tentou furtar. A conduta debitada ao paciente, analisada inclusive sob o aspecto da violência física
perpetrada em desfavor de uma pessoa idosa, justifica a mobilização do aparato de Poder em que o
Judiciário consiste. Pelo que o processamento criminal do acusado não é de ser considerado medida
drástica ou mesmo desproporcional ao particularizado modo como se deu a lesão ao bem jurídico
tutelado pela norma incriminadora. Ordem denegada” (HC 111.198-MG, 2.ª T., rel. Ayres Britto,
06.03.2012, v.u.). “O crime de roubo se caracteriza pela apropriação do patrimônio de outrem mediante
violência ou grave ameaça à sua integridade física ou psicológica. No caso concreto, ainda que o valor
subtraído tenha sido pequeno, não há como se aplicar o princípio da insignificância, mormente se se
considera que o ato foi praticado pelo paciente mediante grave ameaça e com o concurso de dois
adolescentes, fato esse que não pode ser taxado como um comportamento de reduzido grau de
reprovabilidade. A jurisprudência consolidada nesta Suprema Corte é firme no sentido de ser
inaplicável o princípio da insignificância ao delito de roubo” (HC 97.190-GO, 1.ª T., rel. Dias Toffoli,
10.08.2010, m.v.). (Nucci, 2020)

Análise do núcleo do tipo: Não serve para caracterizar o roubo a violência exercida contra coisa, exceto
se, de algum modo, atingir pessoa humana. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “Para a configuração do crime de roubo é necessário que a violência empregada seja direcionada
à vítima, e não à coisa, sendo certo que a configuração do delito previsto no art. 157, caput, do Código
Penal – na hipótese de violência dirigida ao objeto – ocorrerá apenas se a violência repercutir na
pessoa, impedindo-a de oferecer resistência, o que não é a hipótese dos autos” (AgRg no AREsp
742.765-MG, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 16.06.2016, DJe 24.06.2016). (Nucci, 2020)

Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se o elemento subjetivo específico, consistente em subtrair a coisa
para si ou para outrem. No § 1.º, observa-se a seguinte finalidade específica: assegurar a impunidade
do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. Não se pune a forma culposa. (Nucci, 2020)
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Roubo de uso: não existe tal forma em nosso entendimento, pois o agente, para roubar –
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diferentemente do que ocorre com o furto –, é levado a usar violência ou grave ameaça contra a
pessoa, de forma que a vítima tem imediata ciência da conduta e de que seu bem foi levado embora.
Logo, ainda que possa não existir, por parte do agente, a intenção de ficar com a coisa definitivamente
(quer um carro somente para praticar um assalto, pretendendo depois devolvê-lo, por exemplo),
consumou-se a infração penal. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STF: “Configura-se o crime de roubo quando a subtração do bem é cometida mediante violência ou
grave ameaça. Impossibilidade de desclassificação para o crime de furto. É desnecessário que a
violência física perpetrada cause dano à integridade corporal da vítima, sendo suficiente, para a
caracterização do roubo, imposição de força física, material ou simples vias de fato capazes de minar
a possibilidade de resistência à subtração do bem. Precedentes” (HC 107.147-MG, 1.ª T., rel. Rosa
Weber, 17.04.2012, v.u.). (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a coisa subtraída pelo agente e também a pessoa que
sofre a violência, direta ou indireta, ou a grave ameaça. Os objetos jurídicos são o patrimônio, a
integridade física e a liberdade do indivíduo.

Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou
especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente na diminuição do patrimônio
da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo
(“subtrair” implica ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a
aplicação do art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea,
não se prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico
tutelado); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários
atos integram a conduta); admite tentativa.

Roubo contra várias pessoas através de uma ação: concurso formal. Como regra, a ação
desencadeada pelo agente envolve uma única grave ameaça, voltada a determinados ofendidos,
confinados num local. Eles se desfazem dos seus pertences, quase ao mesmo tempo, constituindo
cenário único. Por isso, caracteriza-se a figura do art. 70 do Código Penal. Ilustrando, o autor ingressa
num ônibus, anuncia o assalto e pede que todos passem os bens. Concretiza-se o concurso formal
perfeito, pois o agente não possui desígnios autônomos, vale dizer, dolo direto em relação a cada uma
das vítimas, que nem mesmo conhece. Eventualmente, pode-se falar em concurso formal imperfeito
(art. 70, caput, segunda parte, CP), desde que se prove o desígnio autônomo (dolo direto) do autor do
crime no tocante a cada um dos ofendidos.

Jurisprudência: STJ: “1. O entendimento desta Corte é o de que a prática do crime de roubo mediante
uma só ação, mas contra vítimas distintas, enseja o reconhecimento do concurso formal, e não de
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crime único. Precedentes do STJ (HC 366.078/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe
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21/2/2017)” (AgRg no AREsp 968.423/SP, 5.ª T., rel. Joel Ilan Paciornik, 05.02.2019, v.u.).

Roubo seguido de resistência: concurso material. Ambos os delitos tutelam bens jurídicos diversos:
patrimônio e administração da justiça. Ademais, normalmente, quando a polícia chega o roubo já se
encontra consumado, momento em que o agente investe contra os policiais, agressivamente, para
evitar a prisão. Vislumbramos crimes independentes, gerando a figura do art. 69 do CP. (Nucci, 2020)

Roubo e estado de necessidade: embora a corrente majoritária na jurisprudência não aceite a


possibilidade de se alegar estado de necessidade quando se pratica um roubo, não vemos óbice legal
a tanto. É evidente que o que se pretende coibir é o abuso e a falsa alegação de necessidade. Em
casos excepcionais, no entanto, cremos possível haver a excludente de ilicitude, mesmo no contexto
do roubo. Destaque-se que a excludente do art. 24 do Código Penal permite que, em situação de perigo
não gerada pelo autor do fato necessário, pode-se até matar. Vide o caso do náufrago que mata o
outro para ficar com a boia somente para si, salvando-se. Assim, se alguém, necessitando de um carro
com absoluta urgência para salvar seu pai, que está sofrendo um enfarte, utiliza de violência, retirando
um motorista de dentro do seu veículo para dele fazer uso, pode-se perfeitamente configurar o estado
de necessidade. Recentemente, vários jornais brasileiros noticiaram o caso de uma vítima de
sequestro que, conseguindo fugir do cativeiro, carregando consigo a arma do sequestrador, foi
obrigada a levar o carro de terceiro – pois ninguém queria lhe dar carona na zona erma em que se
encontrava – para poder fugir do bairro onde estava aprisionada. Assim que vislumbrou uma viatura da
Polícia Militar, jogou o carro subtraído contra ela e se apresentou como vítima de sequestro em fuga.
Esta é uma nítida hipótese de roubo por estado de necessidade.

“Trombada”: como já tivemos oportunidade de analisar no contexto do furto, qualquer tipo de violência
incidente sobre a pessoa humana, com a finalidade de levar-lhe os pertences, configura o roubo, e não
um simples furto. Ainda que a violência seja exercida contra a coisa, se de algum modo atingir a
pessoa (lesionando-a ou não), existe roubo. O tipo penal do furto é bem claro, prevendo conduta livre
de qualquer violência (uso de força ou coação) contra a pessoa humana, enquanto o tipo do roubo
inclui tal figura. Logo, não é possível dizer que um “singelo” empurrão no ofendido não é suficiente
para concretizar a violência exigida pelo tipo legal de roubo. O roubo está consumado quando o agente
retira o bem da esfera de disponibilidade e vigilância da vítima. Não há necessidade de manter posse
mansa e pacífica, que seria o equivalente a desfrutar da coisa como se sua fosse. Entretanto, o mínimo
que exige um delito, classificado como material, quanto à consumação, é atingir o bem jurídico por
completo, no caso, misto (patrimônio + incolumidade física). Simplesmente tocar no bem não nos
parece suficiente; retirá-lo das mãos da vítima, mas ser preso na frente desta, sem que o bem fuja ao
controle de seu proprietário ou possuidor, também não. Em nossa visão, torna-se indispensável a
inversão da posse, retirando a coisa da esfera de vigilância da vítima. Entretanto, o que se tem
observado nas Cortes é uma nítida confusão terminológica. Alguns julgados mencionam ser
desnecessária a posse “mansa e pacífica”, mas exigem a “inversão da posse”. É o que nos parece
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des ecessá a a posse a sa e pac ca , as e ge a e são da posse . o que os pa ece
correto. Outros, no entanto, fragilizam essa tese, afirmando bastar a “posse precária”, sem, no entanto,
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esclarecer em detalhes o que isso significa na prática. Há julgados defendendo a posse mansa e
pacífica. Enfim, as denominadas “correntes” na questão da consumação do roubo (e do furto) são
relativas. Visualizando esse cenário, a maioria tende a demandar, pelo menos, que o agente retire a
coisa da esfera de proteção e vigilância da vítima, por meio de posse precária, momentânea ou fugaz,
mas com inversão de posse, dispensada a mansuetude e pacificidade.

Jurisprudência:

STF: “O Supremo Tribunal Federal entende desnecessária a posse mansa e pacífica da coisa subtraída
pelo agente para a consumação do delito de roubo” (HC 110642-RS, 2.ª T., rel. Ayres Britto, 29.11.2011,
v.u.).

STJ: “1. Conforme decidido pela Terceira Seção deste Superior Tribunal por ocasião do julgamento do
Recurso Especial n. 1.499.050/RJ, representativo da controvérsia (de minha relatoria, ainda não
publicado), ‘Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem, mediante emprego de
violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida a perseguição imediata ao agente
e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada’. Na
hipótese dos autos, a moldura fática foi delineada de maneira incontroversa pelas instâncias
ordinárias, porquanto ficou provado que os agentes, mediante violência exercida pelo emprego de
arma de fogo, renderam os ofendidos e ingressaram em seu veículo, havendo um dos réus assumido a
direção. Assim, ainda que breve e não de forma mansa, pacífica e desvigiada, houve a inversão da
posse, razão pela qual o delito se consumou” (AgRg no AREsp 548.088-MG, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti
Cruz, 21.06.2016, DJe 01.07.2016);

Concurso de roubo e extorsão: é possível haver, pois são crimes de espécies diferentes, cada qual
previsto num tipo penal. Assim, o agente que ingressa numa residência, subtraindo coisas com
violência ou grave ameaça, e, em seguida, delibera obrigar a vítima a dar-lhe a senha do caixa
eletrônico ou faz com que o ofendido vá retirar o dinheiro, trazendo-o até o agente, comete roubo e
extorsão, em concurso material.

Jurisprudência:

STF: “Apesar da eventual dificuldade, em casos práticos, da distinção entre roubo e extorsão, havendo
condutas autônomas, inviável o reconhecimento de crime único. 2. Não há como reconhecer a
absorção de uma conduta pela outra, pois o roubo não constitui meio para a prática da extorsão ou
vice-versa” (RHC 112.676-MG, 1.ª T., j. 21.08.2012, v.u., rel. Rosa Weber).

STJ: “A teor da jurisprudência desta Corte, a extorsão não é meio necessário para a prática do crime de
roubo, tampouco o inverso, razão pela qual não se mostra possível a aplicação do princípio da
consunção entre os referidos delitos” (REsp 1.799.010/GO, 6.ª T., rel. Sebastião Reis Júnior,
23.04.2019, v.u.); “1. É firme o entendimento desta Corte Superior de que ficam configurados os
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3.0 . 0 9, .u.); . e o e te d e to desta Co te Supe o de que ca co gu ados os
crimes de roubo e extorsão, em concurso material, se o agente, após subtrair bens da vítima, mediante
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emprego de violência ou grave ameaça, a constrange a entregar o cartão bancário e a respectiva
senha, para sacar dinheiro de sua conta corrente (HC 127.320/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz,
Sexta Turma, julgado em 07/05/2015, DJe 15/05/2015)” (AgRg no REsp 1.702.185/SP, 6.ª T., rel. Nefi
Cordeiro, j. 13.03.2018, v.u.).

Roubo próprio e roubo impróprio: o modelo abstrato de conduta do caput configura o roubo próprio,
isto é, a autêntica forma de realização do roubo. O agente usa a violência ou a grave ameaça para
retirar os bens da vítima. Entretanto, existe uma segunda forma, prevista no § 1.º, denominada de
roubo impróprio, que se realiza quando o autor da subtração conseguiu a coisa sem valer-se dos
típicos instrumentos para dobrar a resistência da vítima, mas é levado a empregar violência ou grave
ameaça após ter o bem em suas mãos, tendo por finalidade assegurar a impunidade do crime ou a
detenção da coisa definitivamente. Há duas possibilidades para o emprego da violência ou da grave
ameaça após a subtração ter-se efetivado: assegurar a impunidade, significando garantir que o agente
não será preso (ex.: dar o ladrão um soco na vítima, que tenta prendê-lo, após descobrir a subtração),
ou assegurar a detenção da coisa para si ou para terceiro, querendo dizer que o objeto retirado do
ofendido não deve voltar à sua esfera de disponibilidade (ex.: proferir o ladrão uma ameaça de morte,
apontando o revólver, para que a vítima não se aproxime, tentando recuperar o bem que percebe estar
sendo levado embora).

Jurisprudência:

STJ: “Nos moldes do art. 157 do Código Penal, a violência ou grave ameaça caracterizadoras do crime
de roubo poderão ser empregadas antes, durante ou logo após a subtração do bem. Assim, malgrado
possa ter o agente iniciado a prática de conduta delitiva sem o uso de violência, se terminar por se
valer de meio violento para garantir a posse da res furtivae ou, ainda, a impunidade do delito, terá
praticado o crime de roubo, ainda que em sua modalidade imprópria (CP, art. 157, § 1.º), não havendo
se falar em furto” (HC 415376-SP, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 03.05.2018, v.u.).

TJRS: “A materialidade e a autoria restaram suficientemente comprovadas pela prova produzida nos
autos. O réu, conquanto tenha negado as agressões na vítima, admitiu, no seu interrogatório, ter ido, na
companhia de dois asseclas, até a propriedade do lesado, com o intuito de subtraírem galinhas,
atribuindo o furto e as agressões apenas a um dos comparsas. No entanto, a prova angariada aos
autos torna assente o ingresso do réu na propriedade da vítima, retirando as aves do galinheiro,
quando foi surpreendido pela vítima, a qual, ao dar as costas para ele, foi violentamente agredido na
cabeça, viabilizando a fuga dos agentes. Violência perpetrada com intuito de firmar a detenção da res,
amoldando-se ao tipo penal do artigo 157, § 1.º, do CP, como constou na sentença” (TJRS, Ap. Crim.
70061323705-RS, 8.ª C. Crim., rel. Isabel de Borba Lucas, 12.08.2015, v.u.).

Tentativa no roubo impróprio: há duas posições a respeito: a) pode haver tentativa de roubo impróprio,
d t d t
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id bt ã é d tid t i i t t 96/171
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quando o agente, apesar de ter conseguido a subtração, é detido por terceiros no instante em que
pretendia @prof.joaobittenocurt
usar violência ou grave ameaça; b) não é cabível. Se a subtração se concretizou, não há que
se falar em tentativa de roubo impróprio: ou o agente usa violência ou grave ameaça e está
consumado o roubo impróprio, ou não a utiliza e mantém-se somente a figura do furto (simples ou
qualificado). A polêmica é de difícil solução, embora esteja concentrada no significado a ser dado à
expressão “logo depois de subtraída a coisa”. Se entendermos que tal expressão quer dizer o mesmo
que furto consumado, naturalmente não se pode aceitar a ocorrência da tentativa de roubo impróprio,
uma vez que a coisa já saiu da esfera de disponibilidade e vigilância da vítima. Não teria cabimento
supor que, encontrado o autor bem longe do lugar da retirada do bem e ingressando em luta com o
ofendido, a quem está agredindo quando é detido, está-se falando de tentativa de roubo impróprio. O
que temos é um furto consumado em concurso com um crime violento contra a pessoa. Entretanto, se
dermos à expressão a simples conotação de “retirada da coisa” da vítima, sem necessidade de se
exigir a consumação do furto, então podemos cuidar da tentativa de roubo impróprio. O ofendido, por
exemplo, vendo que sua bicicleta está sendo levada por um ladrão, vai atrás deste que, para assegurar
sua impunidade ou garantir a detenção da coisa, busca agredir a pessoa que o persegue, momento em
que é detido por terceiros. Existe aí uma tentativa de roubo impróprio. Esta nos parece ser a melhor
posição. No § 1.º do art. 157 não se utilizou a expressão “subtraída a coisa” com o mesmo sentido
amplo e firme da “consumação do crime de furto”, vale dizer, exigindo-se a posse mansa e tranquila da
coisa subtraída. O método de praticar o roubo é que varia. Enquanto no caput o agente usa a violência
ou a grave ameaça para vencer a resistência da vítima, levando-lhe os bens, no § 1.º ele faz o mesmo,
embora logo após ter conseguido, sozinho, tomar a coisa almejada. Na primeira hipótese, que é a mais
usual, aponta um revólver para a vítima, ameaçando-a de morte e com isso vencendo-lhe a resistência,
para tomar-lhe a bicicleta. No segundo caso, toma-lhe a bicicleta e, quando pretende escapar, notando
a aproximação da vítima, aponta-lhe a arma, ameaçando-a de morte. Se neste momento for preso,
tentou praticar um roubo impróprio. Naturalmente, se o furto está consumado (o bem foi retirado da
esfera de vigilância e disponibilidade da vítima) e o agente é encontrado, logo depois, em situação que
faça presumir ser ele o autor da infração penal (art. 302, IV, CPP), ainda que possa haver flagrante pela
prática do furto, caso haja o emprego de violência contra a pessoa ou grave ameaça, estamos diante
de crime autônomo. E, finalmente, se o agente está subtraindo a coisa (não conseguiu fazê-lo ainda),
quando a vítima se aproxima entrando em luta com o ladrão, que é preso em seguida, deve-se falar em
tentativa de furto seguida de eventual crime contra a pessoa. Na jurisprudência, adotando o não
cabimento:

Jurisprudência:

TJSC: “O delito de roubo impróprio consuma-se no momento em que o agente, logo após a subtração
de coisa alheia móvel, utiliza violência ou grave ameaça à pessoa para assegurar a impunidade do
crime ou a detenção da res para si ou para terceiro, não se admitindo, pois, a figura tentada”
(2015.015339-0-Lages, 2.ª C. Crim., rel.Sérgio Rizelo, 12.05.2015, v.u.).

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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Causas de aumento da pena: faz parte da tradição a denominação de roubo qualificado às formas de
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subtração previstas no § 2.º, embora sejam apenas causas de aumento da pena. A existência de uma
qualificadora, como acontece no furto (§ 4.º do art. 155), seria suficiente para alterar a faixa de
aplicação da pena, aumentando-se, concomitantemente, o mínimo e o máximo. No caso presente,
impõe a lei somente um aumento, que pode variar de um terço até a metade.

Incidência de mais de uma causa de aumento: há quatro posições principais nesse contexto: a) deve
haver um único aumento, baseado numa das causas constatadas. Se houver mais de uma
circunstância, as demais podem ser consideradas como circunstâncias judiciais (art. 59) para
estabelecer a pena-base; b) o aumento, que é variável (um terço até a metade), deve ser proporcional
ao número de causas presentes. Assim, havendo uma única, cabe aumentar a pena em um terço. Se
todas estiverem presentes, o juiz deve aumentar a pena da metade; c) a existência de mais de uma
causa de aumento por si só não significa a elevação necessária da pena. O juiz, se assim entender,
ainda que presentes várias causas de aumento, poderia aplicar o acréscimo de apenas um terço, pois
o que está em jogo é a gravidade do meio empregado, e não o número de incisos do § 2.º que estejam
configurados; d) deve haver a elevação necessária (entre um terço e metade) e suficiente para, no
entendimento do julgador, punir de modo justo o crime, com as circunstâncias presentes, sem
qualquer critério matemático fixo. A última posição é a correta e vem ganhando adeptos, inclusive nos
Tribunais Superiores.

Juriprudência:

Súmula 443 do STJ: “O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo
circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera
indicação do número de majorantes”. A presença de uma só causa de aumento pode ser tão relevante
e grave que justifique o aumento de metade da pena. Por outro lado, duas causas de aumento podem
ser de mínima ofensividade, no caso concreto, determinando o aumento de apenas um terço. Em
suma, não se deve aceitar um critério matemático para a fixação da pena.

STJ: “O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige
fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número
de majorantes – enunciado n. 443 da Súmula desta Corte. – Na hipótese, o aumento da pena em
fração superior a 1/3 ocorreu em razão da quantidade de majorantes, sem fundamentação baseada
em circunstâncias que desbordem do tipo penal circunstanciado, a evidenciar a necessidade de
aplicação da fração mínima” (HC 398752-SP, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 19.06.2018, v.u.);
“O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige
fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número
de majorantes (STJ, Súmula 443)” (HC 284328-SP, 5.ª T., rel. Newton Trisotto, 14.04.2015, v.u.); “O
aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige
fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número
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de majorantes. Súmula n. 443 do STJ. 6. Não obstante as instâncias ordinárias hajam particularizado o
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fato de o delito ter sido cometido com emprego de arma e em concurso de agentes, não foi apontado
elemento dos autos (modus operandi, por exemplo) que, efetivamente, evidenciasse real necessidade
de exasperação da pena, na terceira fase da dosimetria, no patamar estabelecido” (HC 300272-SP, 6.ª
T., rel. Rogerio Schietti Cruz, 24.03.2015, v.u.). TRF-3: “O § 2.º do art. 157 do Código Penal estabelece
que, em razão da incidência das causas de aumento, a pena aumenta-se de um terço até metade.
Portanto, considerando que estão presentes três das hipóteses previstas em tal dispositivo legal, é
justificável a fixação da fração de aumento em 5/12 (cinco doze avos), a qual se mostra razoável e
adequada ao caso dos autos e é mantida” (Ap. 75134-SP, 5.ª T., rel. André Nekatschalow, 25.06.2018,
v.u.). Quanto às demais posições, registremos os equívocos: a) a primeira pretende usar causas de
aumento como circunstâncias judiciais, o que está errado. Se elas são circunstâncias para elevar a
pena na terceira fase, não podem ser transferidas pelo operador do Direito para a primeira fase; b) a
segunda espelha critério puramente matemático, como se pode ver na nota 19 abaixo, algo
extremamente danoso à individualização da pena, pois não faz o julgador pensar e refletir, ocupando-
se ele somente de aplicações automáticas de frações, abstratamente consideradas; c) não considerar
todas as circunstâncias, mas apenas uma é outra ofensa à individualização da pena, visto inexistir
razão plausível para ignorá-las. Tudo o que o agente faz deve ser rigorosamente ponderado pelo juiz.

Concurso de duas ou mais pessoas: (§ 2º, II) sempre mais perigosa a conduta daquele que age sob a
proteção ou com o auxílio de outra pessoa. Assim, o autor de roubo, atuando com um ou mais
comparsas, deve responder mais gravemente pelo que fez. Entendemos, na esteira do ocorrido com o
crime de furto, que basta haver o concurso de duas ou mais pessoas, sem necessidade de estarem
todas presentes no local do crime. Afinal, não se pode esquecer da participação, moral ou material,
também componente do quadro do concurso de agentes. Por derradeiro, vale lembrar que o concurso
pode somar imputáveis com inimputáveis, configurando do mesmo modo a causa de aumento.
Conferir: TJDF: “O fato de o crime de sido cometido por duas pessoas, sendo uma inimputável, não
afasta a ocorrência de concurso de pessoa a justificar o afastamento da norma que majora o delito
nessa circunstância embrenhado, até porque a lei não faz nenhuma menção a respeito da capacidade
punitiva do agente” (Ap. 2009.05.1.000338-5-DF, 1.ª T. Crim., rel. João Egmont, 22.10.2009, v u.). Sob
outro prisma: TJAL: “Para fins de incidência da majorante contida no art. 157, § 2.º, II, do CP,
consoante remansoso entendimento doutrinário e jurisprudencial, sequer é exigível a identificação dos
corréus para o reconhecimento dessa causa de aumento, bastando a prova de que dois ou mais
agentes concorreram para o crime, o que restou sobejamente demonstrado nos autos, inclusive pela
própria confissão extrajudicial do corréu” (Ap. 0700051-52.2015.8.02.0053-AL, C. Crim., rel. Sebastião
Costa Filho, 21.06.2017, v.u.)

Vítima a serviço de transporte de valores: o roubo é mais grave quando o agente subtrai bens de quem
está transportando valores pertencentes a terceiro. Essa atividade envolve, fundamentalmente, as
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p p , ,
empresas que se dedicam justamente a esse transporte, constituindo alvo identificável e atrativo aos
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assaltantes. Além disso, o prejuízo, nessas situações, costuma ser consideravelmente alto. Por tais
causas, ocorre a maior reprovação da conduta.

Dolo direto: exige o tipo penal que o agente conheça a circunstância referente ao transporte de valores
de terceiros, razão pela qual não se configura a causa de aumento quando houve dolo indireto
(assumir o risco de provocar o resultado).

Veículo automotor levado a outro Estado ou para o exterior: efetivamente levado para outro Estado.

Vítima com a liberdade cerceada: introduzida pela Lei 9.426/96, teve o legislador por finalidade punir
mais gravemente o autor do roubo que, além do mínimo indispensável para assegurar o produto da
subtração, detém a vítima em seu poder. Entretanto, não houve interpretação pacífica desse novo
dispositivo, tendo em vista que quatro situações podem surgir: a) o agente segura a vítima por
brevíssimo tempo, o suficiente para tomar-lhe o bem almejado (ex.: disposto a tomar o veículo da
vítima, o agente ingressa no automóvel unicamente para, alguns quarteirões depois, colocá-la para
fora). Trata-se de roubo, mas não se aplica a causa de aumento do § 2.o, V; b) o agente segura a vítima
por tempo superior ao necessário ou valendo-se de forma anormal para garantir a subtração planejada
(ex.: subjugando a vítima, o agente, pretendendo levar-lhe o veículo, manda que entre no porta-malas,
rodando algum tempo pela cidade, até permitir que seja libertada ou o carro seja abandonado). Aplica-
se a causa de aumento do inciso V do § 2.o.
Jurisprudência

STJ: “A restrição de liberdade das vítimas em poder do réu por 40 (quarenta) minutos mostra-se
relevante para o reconhecimento da majorante prevista no artigo 157, § 2.º, V, do Código Penal” (AgRg
no REsp 1297987-SP, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 16.06.2016, DJe 22.06.2016).

TJRS: “O fato de os ofendidos terem permanecido no interior do banheiro, a mando dos réus e por
poucos minutos, não é suficiente para configurar a majorante prevista no inciso V do § 2.º do art. 157
do CP” (Ap. Crim. 70064412166-RS, 7.ª C. Crim., rel. Carlos Alberto Etcheverry, 11.06.2015, m.v.);

c) o agente pretende segurar a vítima consigo para percorrer bancos 24 horas e fazer saques. Nesta
hipótese, utiliza-se o tipo penal do art. 158, § 3.º (sequestro relâmpago);

d) o agente, além de pretender subtrair o veículo, tem a nítida finalidade de privar a liberdade do
ofendido, para sustentar qualquer outro objetivo, como passar em caixa eletrônico para fazer saque.
Trata-se de concurso material entre roubo (veículo) e extorsão, conforme art. 158, § 3.º, CP (saques
em caixas eletrônicos). A partir da edição da Lei 13.964/2019, esta figura passa a ser considerada
crime hediondo (art. 1º, II, a, Lei 8.072/90). Só se pode computar como hediondo, quando o crime for
cometido depois do início de vigência da referida Lei 13.964/2019 (final de janeiro de 2020). Afinal, lei
penal mais rigorosa não pode retroagir para prejudicar o réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal).
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Subtração de substâncias explosivas: inserida pela Lei 13.654/2018, esta circunstância pretende tratar
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de maneira mais rigorosa a onda de subtração e uso de explosivos, cuja finalidade principal é estourar
caixas eletrônicos para captar o dinheiro. No entanto, acrescentar à já extensa lista de causas de
aumento do § 2.º do art. 157 é uma enorme perda de espaço para, realmente, incrementar a pena.
Deve o julgador elevar a pena entre 1/3 e metade, agora levando em conta a existência de cinco
fatores; noutros termos, é muito pouco aumento para a quantidade de circunstâncias que podem
envolver um roubo. Essa nova causa de exasperação da pena deveria ter recebido um tratamento
específico, destacado do referido § 2.º.

Violência ou grave ameaça exercida com emprego de arma branca:

A prática do roubo com emprego de arma branca, com a reforma da Lei 13.964/2019, passou
novamente a ser causa de aumento, integrando o incisivo VIII do § 2º do art. 157. 20. Se a violência ou
ameaça é exercida com emprego de arma. Ao mesmo tempo em que houve a mencionada revogação,
incluiu-se o § 2.º-A, prevendo o aumento da pena de 2/3 se houver emprego de arma de fogo.

Arma é o instrumento utilizado para defesa ou ataque. Denomina-se arma própria, a que é destinada,
primordialmente, para ataque ou defesa (ex.: armas de fogo, punhal, espada, lança etc.). Logicamente,
muitas outras coisas podem ser usadas como meios de defesa ou de ataque. Nesse caso, são as
chamadas armas impróprias (ex.: uma cadeira atirada contra o agressor; um martelo utilizado para
matar; uma ferramenta pontiaguda servindo para intimidar). Quando o tipo penal se refere apenas à
arma, devem-se admitir as próprias e as impróprias. Quando ele se refere às armas brancas, diz
respeito a todas aquelas que, por exclusão, não são de fogo. Esta causa de aumento, que subsistia,
genericamente, como arma, no inciso I deste § 2º, retornou no inciso VIII, por força da Lei
13.964/2019.

§ 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):

Conceito de arma: é o instrumento utilizado para defesa ou ataque. Denomina-se arma própria, a que é
destinada, primordialmente, para ataque ou defesa (ex.: armas de fogo, punhal, espada, lança etc.).
Logicamente, muitas outras coisas podem ser usadas como meios de defesa ou de ataque. Nesse
caso, são as chamadas armas impróprias (ex.: uma cadeira atirada contra o agressor; um martelo
utilizado para matar; uma ferramenta pontiaguda servindo para intimidar). Quando o tipo penal se
refere apenas a arma, devem-se admitir as próprias e as impróprias. Afinal, quando quer, o legislador
deixa claro tratar-se de arma de fogo (vide o § 2.º-A, I, deste artigo). Para a análise do emprego de
arma (própria ou imprópria), há duas visões a respeito do tema: a) critério objetivo: avalia o “emprego
de arma”, segundo o efetivo perigo que ela possa trazer à vítima. Logo, para essa teoria, uma arma de
brinquedo, embora seja útil para constituir a grave ameaça, não presta à finalidade do aumento, que é
a sua potencialidade lesiva concreta à pessoa do ofendido; b) critério subjetivo: analisa o “emprego de
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arma”, conforme a força intimidativa gerada na vítima. Sob esse prisma, uma arma de brinquedo é
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instrumento hábil à configuração da causa de aumento, uma vez que o temor provocado no ofendido é
muito maior – diminuindo a sua capacidade de resistência consideravelmente – quando é utilizada.
Preferimos a teoria objetiva, ou seja, respeitando-se o princípio da legalidade, deve-se considerar arma
exatamente aquilo que pode ser usado como instrumento de ataque ou defesa – ainda que seja
imprópria (como, v. g., a utilização de um machado para intimidar o ofendido). É, sem dúvida, mais
perigosa a exposição da vítima do roubo a quem possua objeto desse cabedal. Ao contrário, o sujeito
que exerce a grave ameaça valendo-se de outros meios, como o emprego de sua própria força física,
gera menor potencialidade lesiva ao ofendido, que, inclusive, pode sentir-se mais preparado a reagir.
Por isso, não podemos aquiescer na consideração de arma de brinquedo como se arma fosse. Ela não
é instrumento de ataque ou defesa, nem próprio, nem impróprio. Logo, nesse caso, não nos parece
esteja configurada qualquer circunstância para elevar a pena do roubo. A despeito disso, o Superior
Tribunal de Justiça havia adotado o critério subjetivo e entendeu configurar o aumento quando o
agente atuasse valendo-se de arma de brinquedo. Era o conteúdo da Súmula 174: “No crime de roubo,
a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena”.

Jurisprudência:

Em 24 de outubro de 2001, a Terceira Seção da Corte cancelou a referida Súmula, por maioria de votos
(REsp 213.054-SP, rel. José Arnaldo da Fonseca, com voto vencedor. O único voto vencido foi proferido
pelo Min. Edson Vidigal).

STJ: “A Terceira Seção desta Corte firmou entendimento de que o uso de arma de brinquedo na prática
do delito de roubo não acarreta a incidência da causa especial de aumento prevista no art. 157, § 2.º,
inciso I, do Código Penal, cancelando, assim, o enunciado n. 174 da Súmula do STJ. Ordem concedida
para decotar a causa de aumento pelo emprego de arma” (HC 214.944-SP, 6.ª T., rel. Maria Thereza de
Assis Moura, 17.05.2012, v.u.). Na doutrina, nos termos de LAJEROS, “admitido que o roubo se pode
cometer com violência ou com intimidação às pessoas, torna-se muito difícil ao proprietário ou ao
detentor defender a propriedade, ou o que tem em seu poder, quando o autor se vale de armas para
cometer o delito. Isso porque anula toda possibilidade de defesa, e já resulta impossível frente a um
ladrão armado, opor qualquer tipo de resistência. Não é o mesmo à mão limpa que a mão armada” (La
interpretación penal en el hurto, el robo y la extorsión, p. 288).

Arma de brinquedo: não se trata de arma, nem própria, nem imprópria. Tem poder de intimidação, pois
a vítima ficará atemorizada e entregará seus bens, quando ameaçada pelo agente com um revólver de
brinquedo, por exemplo. Noutros termos, a arma de brinquedo pode ser instrumento suficiente para
gerar a grave ameaça, mas não tem cabimento utilizar esse aspecto para elevar a pena do agente. Há
mais um ponto: depende da arma de brinquedo. Se ela se constituir em aparente brinquedo (feita em
plástico vermelho, por exemplo), nem para constituir o tipo penal servirá, uma vez que não é apta a
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gerar no ofendido qualquer poder intimidativo.


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Arma defeituosa ou sem munição e a simulação: na hipótese de arma defeituosa, entendemos ser
indispensável a análise do caso concreto, desde que ela seja apreendida. Caso a arma seja
considerada pela perícia absolutamente ineficaz por causa do seu defeito, não se pode considerar ter
havido maior potencialidade lesiva para a vítima (teoria objetiva do emprego de arma); logo, não se
configura a causa de aumento.

Jurisprudência:

STJ: “Diante da comprovada ausência de potencialidade lesiva da arma empregada no roubo, atestada
em laudo pericial, mostra-se indevida a imposição da causa de aumento de pena prevista no inc. I do §
2.º do art. 157 do CP” (HC 190.313-SP, 5.ª T., rel. Gilson Dipp, 17.03.2012, v.u.). Se a arma for
considerada relativamente capaz de dar disparos, cremos presente o aumento previsto. No que se
refere à arma sem munição, é apenas um meio relativamente ineficaz, pois a qualquer momento pode
o agente colocar projéteis e disparar contra a vítima. Assim, entendemos deva estar configurada a
causa de aumento. Outra hipótese cuida da simulação de arma, quando o agente se vale do próprio
dedo ou de um instrumento pontiagudo embaixo de suas vestes, dando a impressão de carregar um
revólver. Entendemos ser meio suficiente para gerar a grave ameaça, pois a vítima normalmente não
costuma blefar nesses casos, entregando os seus bens.

Jurisprudência:

TJDFT: “1 Réu condenado por infringir o artigo 157 do Código Penal, depois de subtrair o telefone
celular de uma mulher que caminhava na rua no começo da manhã, depois de ameaçá-la simulando
portar um revólver. (...)” (APR 20151010083459-DFT, 1.ª T. Crim., rel. Romão C. Oliveira, 02.03.2017).
23. Concurso de duas ou mais pessoas: sempre mais perigosa a conduta daquele que age sob a
proteção ou com o auxílio de outra pessoa. Assim, o autor de roubo, atuando com um ou mais
comparsas, deve responder mais gravemente pelo que fez. Entendemos, na esteira do ocorrido com o
crime de furto, que basta haver o concurso de duas ou mais pessoas, sem necessidade de estarem
todas presentes no local do crime. Afinal, não se pode esquecer da participação, moral ou material,
também componente do quadro do concurso de agentes. Por derradeiro, vale lembrar que o concurso
pode somar imputáveis com inimputáveis, configurando do mesmo modo a causa de aumento.

TJDF: “O fato de o crime de sido cometido por duas pessoas, sendo uma inimputável, não afasta a
ocorrência de concurso de pessoa a justificar o afastamento da norma que majora o delito nessa
circunstância embrenhado, até porque a lei não faz nenhuma menção a respeito da capacidade
punitiva do agente” (Ap. 2009.05.1.000338-5-DF, 1.ª T. Crim., rel. João Egmont, 22.10.2009, v u.). Sob
outro prisma: TJAL: “Para fins de incidência da majorante contida no art. 157, § 2.º, II, do CP,
consoante remansoso entendimento doutrinário e jurisprudencial, sequer é exigível a identificação dos
corréus para o reconhecimento dessa causa de aumento, bastando a prova de que dois ou mais
agentes concorreram para o crime, o que restou sobejamente demonstrado nos autos, inclusive pela
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g p q j p
própria confissão extrajudicial do corréu” (Ap. 0700051-52.2015.8.02.0053-AL, C. Crim., rel. Sebastião
@prof.joaobittenocurt
Costa Filho, 21.06.2017, v.u.).

TJRS: “Ocorre concurso de pessoas quando a conduta típica é realizada de forma compartilhada por
dois ou mais agentes criminosos, enlaçados por um acordo expresso ou implícito de vontades e que
almejam alcançar resultado comum. A demonstração de prévio ajuste entre os agentes é
desnecessária, bastando prova da participação de comparsas com domínio do evento delitivo.
Especificamente quanto à majorante prevista para o crime de roubo, sua incidência não pressupõe que
todos os agentes criminosos subtraiam bens e empreguem violência ou profiram grave ameaça contra
a vítima, bastando que um deles assim proceda e que esta circunstância seja do conhecimento e conte
com a aprovação dos demais” (Ap. Crim. 70063765036-RS, 8.ª C. Crim., rel. Naele Ochoa Piazzeta,
13.05.2015, v.u.).

TJMG: “Comprovado que, no roubo, os meliantes agiram previamente ajustados e em unidade de


desígnios, aproximando-se da vítima conjuntamente e fugindo unidos após a subtração, resta
caracterizada a majorante relativa ao concurso de pessoas, sendo desnecessária a identificação de
todos os comparsas ou que estes realizassem atos próprios de execução do tipo penal” (Ap. Crim.
1.0290.13.011691-3/001-MG, 7.ª C. Crim., rel. Cássio Salomé, 05.02.2015).

Concurso material entre roubo qualificado e associação criminosa armada: possibilidade, pois os bens
jurídicos são diversos. Enquanto o tipo penal do roubo protege o patrimônio, o tipo penal da
associação criminosa guarnece a paz pública.

Jurisprudência:

STF: “Esta Corte já firmou o entendimento de que a condenação simultânea pelos crimes de roubo
qualificado com emprego de arma de fogo (art. 157, § 2.º, I, do CP) e de formação de quadrilha armada
[associação armada] (art. 288, parágrafo único, do CP) não configura bis in idem, uma vez que não há
nenhuma relação de dependência ou subordinação entre as referidas condutas delituosas e porque
elas visam bens jurídicos diversos. Precedentes” (HC 113.413-SP, 2.ª T., rel. Ricardo Lewandowski, j.
16.10.2012, v.u.). Ver, também, a nota 28 ao art. 288.

Concurso formal entre roubo e corrupção de menores: o agente, maior de 18 anos, ao praticar o crime
de roubo juntamente com o menor, preenche, por meio de uma só conduta, dois tipos penais. Aplica-
se, então, o concurso formal. No entanto, se o autor do roubo tiver por finalidade, além da subtração
patrimonial, conduzir o adolescente ao cometimento de várias infrações penais, corrompendo-o, atua
com desígnios autônomos, respondendo por concurso formal imperfeito, somando-se as penas.

Jurisprudência:

STJ: “Assim, verificada a ocorrência de concurso formal entre o crime de roubo e de corrupção de
menores, as penas referentes aos dois delitos serão aplicadas cumulativamente somente quando
d t d i tê i d d í
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início
i tô t d t C tái é d 104/171
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demonstrada a existência de desígnios autônomos por parte do agente. Caso contrário, é de ser
aplicada a@prof.joaobittenocurt
mais grave das penas cabíveis aumentada de 1/6 (um sexto) até 1/2 (metade), por expressa
disposição legal (art. 70, primeira parte, do Código Penal)” (HC 134.640-DF, 6.ª T., rel. Alderita Ramos
de Oliveira, 06.08.2013, v.u.).

TJMS: “Se o réu visava subtrair valores de estabelecimento comercial e objetos das demais pessoas
que frequentavam o local, cuja ação foi desenvolvida com o auxílio dos adolescentes, dando causa,
com esse fim, à configuração de dois delitos (furto qualificado e corrupção de menores), imperativa
torna-se a aplicação da regra do concurso formal perfeito” (APL 00046107820128120002, 1.ª C., rel.
Maria Isabel de Matos Rocha, 14.10.2013, v.u.).

Desnecessidade da apreensão da arma e prova da causa de aumento: a materialidade do roubo


independe da apreensão de qualquer instrumento, assim como a prova da autoria pode ser
concretizada pela simples, mas verossímil, palavra da vítima. Por isso, igualmente, para a configuração
da causa de aumento (utilização de arma de fogo), bastam elementos convincentes extraídos dos
autos, ainda que a arma não seja apreendida. Afinal, somente é exigido laudo pericial caso o crime
deixe vestígios materiais (art. 158, CPP). O uso da arma para concretizar a grave ameaça, por exemplo,
é conduta independente, que não deixa rastro algum.
Jurisprudência:

STF: “Roubos qualificados pelo emprego de arma e pelo concurso de agentes, em concurso formal (CP,
art.157, § 2.º, I e II, por duas vezes, c/c o art. 70). Ausência de apreensão da arma de fogo e de sua
submissão a perícia. Irrelevância. Emprego de arma demonstrado por outro meio de prova. Causa de
aumento de pena mantida. Precedentes. Ilegalidade inexistente” (HC 125769-SP, 2.ª T., rel. Dias Toffoli,
24.03.2015, v.u.); “A qualificadora do art. 157, § 2.º, I, do Código Penal pode ser evidenciada por
qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima – reduzida à impossibilidade de resistência
pelo agente – ou pelo depoimento de testemunha presencial” (HC 111.839-MT, 1.ª T., rel. Luiz Fux,
22.05.2012, v.u.). “Não se mostra necessária a perícia da arma empregada no roubo para comprovar o
seu potencial lesivo, visto que essa qualidade integra a própria natureza do artefato, no caso, um garfo
de cozinha, reduzindo a possibilidade de resistência da vítima” (HC 107.347-MG, 1.ª T., rel. Ricardo
Lewandowski, 24.05.2011, v.u.).

STJ: “A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que, para a incidência da
majorante prevista no art. 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal, é prescindível a apreensão e perícia da
arma, desde que evidenciada sua utilização por outros meios de prova, como na espécie” (HC 326.837-
SP, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 16.06.2016, DJe 22.06.2016); “Para a caracterização da
majorante prevista no inc. I do § 2.º do art. 157 do Código Penal não é necessária a ‘apreensão e
realização de perícia em arma utilizada na prática do crime de roubo, se por outros meios de prova
restar evidenciado o seu emprego’ (STJ, 3.ª S., EREsp 961.863-RS, rel. Min. Gilson Dipp, j. 13.12.2010;
STF, 2.ª T., RHC 115.077, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 06.08.2013; HC 109.547-RS, 1.ª T., rel. Min.
) (
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início ) “ 105/171
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Cármen Lúcia, j. 13.03.2012)” (HC 202833-RJ, 5.ª T., rel. Newton Trisotto, 19.05.2015, v.u.); “Nas
hipóteses @prof.joaobittenocurt
em que a arma não foi apreendida e periciada e, via de consequência, não foi comprovado o
seu efetivo poder vulnerante, cumpre salientar que a Terceira Seção deste Superior Tribunal, quando
do julgamento dos EREsp 961.863-RS, de relatoria do Ministro Celso Limongi (Desembargador
convocado do TJSP), e Relator para acórdão o Ministro Gilson Dipp, DJe 06.04.2011, firmou o
entendimento de que, para a incidência da causa especial de aumento prevista no inciso I do § 2.º do
art. 157 do Código Penal, mostram-se prescindíveis a apreensão e a realização de perícia na arma
utilizada na prática do crime de roubo, desde que seja comprovada a sua utilização na prática
delituosa por outros meios de prova. Na espécie, o Juiz singular apoiou-se no depoimento da vítima,
para concluir pela utilização da arma no crime de roubo” (HC 317405-SP, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti
Cruz, 21.05.2015, v.u.). (Nucci, 2020)

TJRS: “A declaração precisa e segura da vítima ao referir a presença de armas de fogo no momento da
ação delitiva é suficiente à demonstração do uso do artefato. (...)” (Ap. 70077755155-RS, 6.ª Câmara
Criminal, rel. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, 28.06.2018, v.u.). TJMS: “É prescindível a apreensão
de arma para que seja considerada a majorante prevista no art. 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal”
(Ap. 0001767-88.2013.8.12.0008-MS, 2.ª C. Crim., rel. José Ale Ahmad Netto, 10.07.2017, v.u.). (Nucci,
2020)

TJPA: “Vítima descreveu com riqueza de detalhes os fatos ocorridos no dia do delito onde fora
confirmado o uso de arma. Desnecessária a existência de auto de apreensão da arma para a
configuração da causa de aumento de pena disposta no artigo 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal haja
vista que o uso da arma pode ser evidenciado por qualquer meio de prova, notadamente a prova
testemunhal e o que se extrai dos autos evidencia que as ações delituosas descritas na denúncia se
deram com o emprego da arma como meio de intimidação da vítima. Improvimento” (Ap.
2017.02639051-95-PA, 1.ª Turma de Direito Penal, rel. Maria Edwiges Miranda Lobato, 13.06.2017,
v.u.). (Nucci, 2020)

TJMG: “Demonstrada a utilização de arma no cometimento do roubo, torna-se necessário o


reconhecimento da causa de aumento de pena, ainda que a arma não tenha sido apreendida e
periciada” (Ap. Crim. 1.0153.12.012117-0/001-MG, 1.ª C. Crim., rel. Flávio Leite, 03.02.2015). (Nucci,
2020)

TJSC: “É iterativo o entendimento desta Corte, que encontra amparo nos Tribunais Superiores, de que é
prescindível a apreensão da arma utilizada no crime de roubo, bem como a sua submissão à perícia,
para o reconhecimento da majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal, bastando que esteja
demonstrada pelas palavras das vítimas ou por outras provas idôneas” (Ap. 2015.006715-4-Capital, 3.ª
C. Crim., rel.Moacyr de Moraes Lima Filho, 14.04.2015, v.u.). (Nucci, 2020)

TJGO: “I – É suficiente para a responsabilização pelo crime de roubo agravado a prova dos autos
constituída das declarações da vítima, depoimento testemunhal e interrogatório, aliada às
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

circunstâncias da apreensão do bem, revelando que os processados, agindo em concurso, com o


@prof.joaobittenocurt
emprego de arma de fogo, ameaçaram, subjugaram e subtraíram para si o veículo da vítima, que
reconheceu os autores do delito, devendo receber o sancionamento previsto pelo art. 157, § 2.º,
incisos I e II, do Código Penal Brasileiro” (Ap. Crim. 126766-54.2014.8.09.0011-GO, 2.ª C. Crim., rel.
Luiz Claudio Veiga Braga, 04.04.2017, v.u.). (Nucci, 2020)

Destruição de obstáculo com explosivo: destruir significa demolir, devastar, causar danos a alguma
coisa; romper quer dizer abrir algo à força ou arrombar. As duas condutas alternativas são realizadas
pelo uso de explosivo (substância inflamável, capaz de produzir explosão, isto é, um abalo seguido de
forte ruído causado pelo surgimento repentino de uma energia física ou expansão de gás) ou artefato
análogo (todos os produtos que possam produzir resultado similar, tal como o engenho de dinamite,
que envolve explosivo à base de nitroglicerina). Mas somente isso não basta; é preciso gerar perigo
comum, ou seja, a probabilidade de causar dano a um número indeterminado de pessoas. Como regra,
a conduta retratada neste caso ocorre em bancos ou caixas eletrônicos, que se situam em zona
urbana, logo, próximo a residências ou estada de pessoas. Desse modo, é praticamente certa a
aplicação dessa causa de aumento. Entretanto, pode-se argumentar com o uso de explosivos, durante
um roubo, em zona rural, distante de qualquer comunidade. Seria inviável gerar perigo comum, motivo
pelo qual a causa de aumento seria inaplicável. (Nucci, 2020)

Emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido: é preciso lembrar que as armas de uso restrito e
as proibidas estão descritas em decretos emitidos pelo Presidente da República (ex.: arma de uso
restrito: pistola semi-automática 9mm; arma de uso proibido: metralhadora automática). Havendo a
incidência de mais essa causa de aumento, a pena se aplica em dobro. É preciso destacar que,
havendo várias causas de aumento, o juiz, a teor do art. 68, parágrafo único do Código Penal, pode
aplicar todas elas ou apenas a que mais aumente a pena. Em nosso entendimento, o concurso entre a
utilização de arma de fogo (art. 2º-A, inciso I) e o emprego de arma de uso restrito ou proibido, por
serem hipóteses muito semelhantes deve haver a aplicação da mais grave apenas. Porém, o concurso
de duas ou mais pessoas e o emprego de arma de fogo pode ser quadro disposto à aplicação de duas
causas de aumento, pois são situações de periculosidade para a vítima diversas. A partir da edição da
Lei 13.964/2019, esta figura passa a ser considerada crime hediondo (art. 1º, II, b, Lei 8.072/90). Só se
pode computar como hediondo, quando o crime for cometido depois do início de vigência da referida
Lei 13.964/2019 (final de janeiro de 2020). Afinal, lei penal mais rigorosa não pode retroagir para
prejudicar o réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal). (Nucci, 2020)

Crime qualificado pelo resultado lesões graves: é uma das hipóteses de delito qualificado pelo
resultado, que se configura pela presença de dolo na conduta antecedente (roubo) e dolo ou culpa na
conduta subsequente (lesões corporais graves – art. 129, §§ 1.º e 2.º, CP). A partir da edição da Lei
13.964/2019, esta figura passa a ser considerada crime hediondo (art. 1º, II, c, Lei 8.072/90). Só se
pode computar como hediondo, quando o crime for cometido depois do início de vigência da referida
Lei 13 964/2019 (final de janeiro de 2020) Afinal lei penal mais rigorosa não pode retroagir para
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Lei 13.964/2019 (final de janeiro de 2020). Afinal, lei penal mais rigorosa não pode retroagir para
prejudicar@prof.joaobittenocurt
o réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal). (Nucci, 2020)

Hipóteses quanto ao resultado mais grave: a) lesão grave consumada + roubo consumado = roubo
qualificado pelo resultado lesão grave; b) lesão grave consumada + tentativa de roubo = roubo
qualificado pelo resultado lesão grave, dando-se a mesma solução do latrocínio (morte consumada +
tentativa de roubo; ver a nota 33 infra); c) lesão grave tentada + roubo tentado = tentativa de roubo
com lesões graves; d) lesão grave tentada + roubo consumado = roubo consumado com lesões graves.
(Nucci, 2020)

Crime qualificado pelo resultado morte: trata-se da hipótese do latrocínio, quando também se exige
dolo na conduta antecedente (roubo) e dolo ou culpa na conduta subsequente (morte). É considerado
crime hediondo. Cuidou o legislador de explicitar ser preciso haver, anteriormente, violência, razão pela
qual entendemos não estar configurada a hipótese do latrocínio se, da grave ameaça, resultar lesão
grave ou morte. Deve haver nexo de causalidade entre a prática do roubo e o resultado morte de
qualquer pessoa envolvida nesse cenário, ou seja, não necessariamente a vítima do delito patrimonial.
(Nucci, 2020)

Jurisprudência:

TJRS: “Para a configuração do tipo penal previsto no art. 157, § 3.º, in fine, do Código Penal, deve
haver o resultado morte como consequência da violência empregada à pessoa no contexto do roubo e
em razão dele, tal como no caso concretizado nos autos, em que o policial foi baleado e morto
justamente porque interveio em favor da vítima da subtração do automóvel. Importante referir que a
aludida capitulação legal não requer que a violência seja exercida diretamente contra o possuidor ou o
proprietário do bem, sendo imprescindível, todavia, que exista relação de causalidade entre a
subtração patrimonial e a morte. O conjunto probatório demonstra a certeza sobre a autoria delitiva do
latrocínio no que tange aos três recorrentes, sendo dois deles réus confessos. Embora o réu P. não
tenha efetivamente executado a conduta descrita no verbo nuclear do tipo, tarefa atribuída aos corréus
D. e R., sua atuação foi decisiva para o deslinde da infração penal, haja vista que levou seus comparsas
armados até o local do crime e os auxiliou posteriormente na fuga, não se podendo falar em
participação de menor importância” (Ap. Crim. 70063290340-RS, 5.ª C. Crim., rel. Lizete Andreis
Sebben, 10.06.2015, m.v.). Há posição em sentido contrário, exigindo mero nexo de causalidade entre
o roubo (com violência ou grave ameaça) e o resultado mais grave. Não se admitindo a aplicação do §
3.º quando houver grave ameaça, a única solução viável é o desdobramento das condutas em dois
delitos em concurso: roubo + lesões graves ou roubo + homicídio. O segundo delito será punido dolosa
ou culposamente, conforme o caso. (Nuccui, 2020)

Aspectos do resultado morte: cremos que a violência empregada para o roubo é apta a causar a morte
de qualquer pessoa, e não somente da vítima. Assim, se um dos autores atira contra o ofendido, mas
termina matando quem está passando pelo local, comete latrocínio. O mesmo se diga se o agente
desfere tiros contra a polícia que chega no momento do assalto ou contra a vítima matando um outro
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desfere tiros contra a polícia que chega no momento do assalto ou contra a vítima, matando um outro
comparsa.@prof.joaobittenocurt
A violência empregada trouxe o resultado “morte”, não necessariamente do ofendido, pois
o direito protege a vida humana, e não somente a vida da vítima do crime patrimonial. É evidente que a
morte do coautor ou de quem está passando precisa, de algum modo, estar conectada ao roubo, a fim
de garantir o liame causal. Se o agente resolve matar o comparsa, durante um assalto, simplesmente
porque este diverge de suas ordens, não se pode falar em latrocínio. Porém, a aplicação da teoria do
erro quanto à pessoa é cabível. Pela importância do argumento, mantivemos o julgado, embora antigo:
(Nucci, 2020)

TJSP: “Se da violência resulta morte, diz a lei, o crime é de latrocínio. E não exige que a morte seja da
própria vítima de lesão patrimonial. Esse crime, qualificado pelo resultado, é gravemente apenado (um
dos que mais o são no Código Penal), porque, para obtenção do proveito material, não se tergiversa no
emprego da violência física, que vem a final a produzir a eliminação da vida humana, ainda que seja do
próprio partícipe do crime, mortalmente atingido pelo próprio companheiro” (no caso, o tiro foi
disparado contra a vítima) (Rev. 139.808-SP, Grupo Criminal, rel. Prestes Barra, 05.02.1980, v.u., RT
544/337). Se, pretendendo matar a vítima, mata o coautor, responde como se tivesse assassinado o
ofendido. Logo, é latrocínio. Mas se, desejando livrar-se do comparsa, mata-o durante um roubo,
cremos estar configurada a hipótese de homicídio em concurso com o roubo. Não há ainda conexão
entre a morte e o roubo, deixando de se configurar o latrocínio quando a vítima reage e mata um dos
agentes. Outra observação relevante diz respeito a qualquer morte ocorrida em virtude de atos alheios
ao roubo, como ocorre, por exemplo, no caso de fuga em veículo, dando causa a acidente de trânsito.
Inexiste latrocínio. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: O delito de latrocínio resta configurado quando a violência física empregada no delito de roubo
enseja a morte da vítima. Sendo a morte decorrente de acidente automobilístico, não há se falar em
roubo qualificado pela morte, mas sim em crimes autônomos de roubo circunstanciado e de homicídio
culposo no trânsito” (REsp 1.085.129-MG, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura, 10.04.2012, m.v.).
Sobre disparo de comparsa, pode haver punição de todos, se houver nexo causal: (Nucci, 2020)

STF: “É jurisprudência assente desta Corte que ‘o coautor que participa de roubo armado, responde
pelo latrocínio, ainda que o disparo tenha sido efetuado só pelo comparsa’ (HC 74.861-SP). Não pode,
porém, ser imputado o resultado morte ao coautor quando há rompimento do nexo causal entre a
conduta dele e a de seu comparsa, como quando o coautor é preso pela Polícia antes da realização do
disparo do tiro fatal pelo comparsa e ainda em local diverso da prática do roubo” (HC 109.151-RJ, 1.ª
T., j. 12.06.2012, m.v., rel. Rosa Weber). (Nucci, 2020)

Multiplicidade de vítimas: tendo o legislador optado por inserir o latrocínio ou o roubo com lesões
graves como delito qualificado pelo resultado, no contexto dos crimes contra o patrimônio, é preciso
considerar que a morte de mais de uma pessoa (ou lesões graves), porém, voltando-se o agente contra
ó ti ô i ( t id
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lh bt i í l d l) tit i i ú i109/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
um só patrimônio (ex.: matar marido e mulher para subtrair o veículo do casal), constitui crime único.
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Nesse caso, entretanto, deve o magistrado ponderar as consequências do crime (mais de uma morte)
para majorar a pena, valendo-se do art. 59 do Código Penal. Essa tem sido a posição majoritária na
jurisprudência. (Nucci, 2020)

STF: “A 2.ª Turma concedeu, em parte, habeas corpus para afastar concurso de crimes e determinar
ao juízo de primeiro grau que considere a circunstância de pluralidade de vítimas na fixação da pena-
base, respeitado o limite do ne reformatio in pejus. Na espécie, alegava-se que o paciente teria
cometido o delito em detrimento de patrimônio comum, indivisível do casal. Assim, insurgia-se de
condenação por dois latrocínios: um tentado e o outro consumado em concurso formal – v.
Informativo 699. Reconheceu-se a prática de crime único de latrocínio. Destacou-se que, ainda que se
aceitasse a tese de patrimônio diferenciado das vítimas, em função das alianças matrimoniais
subtraídas, o agente teria perpetrado um único latrocínio. Pontuou-se que o reconhecimento de crime
único não significaria o integral acolhimento do pedido. Frisou-se que afastar-se o aumento de 1/6 da
pena, relativo ao concurso de crimes, poderia levar à injustificável desconsideração do número de
vítimas atingidas” (HC 109.539-RS, 2.ª T., rel. Gilmar Mendes, 07.05.2013, v.u., Informativo 705). Em
contrário, confira-se o magistério de MARCELO FORTES BARBOSA: “Não concordamos com a posição
do v. acórdão citado [diz respeito à multiplicidade de mortes, porém com o reconhecimento de crime
único], e assim procedemos porque entendemos que, tendo o Egrégio Supremo Tribunal Federal
assinalado na Súmula 610: ‘Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não
realize o agente a subtração de bens da vítima’, adotada a velha tese de Carrara de que o latrocínio se
consuma com a efetivação do delito contra a vida, por mais grave, não vemos como se possa ver na
hipótese um só latrocínio. Com efeito, se duas foram as mortes, ainda que uma só a subtração
patrimonial, em face da Súmula que não pode ser desprezada por pretextos técnicos, sob pena de se
ignorar completamente o direito sumular, que hoje é uma realidade no país, dois latrocínios ocorreram
mediante uma só ação, ainda que proposta a unidade de desígnios. (...) Ainda que se possa entender a
posição majoritária como rigorosamente técnica, em virtude da artificialidade da colocação do
latrocínio entre os crimes contra o patrimônio, a verdade é que o rigor técnico de uma situação
visivelmente postiça pode nos levar a uma jocosa, se não fosse trágica, ironia forense: ‘mate no
atacado e pague no varejo’...” (Latrocínio, p. 58-60). (Nucci, 2020)

Muito embora se compreenda a indignação do autor, mantemo-nos fiéis ao cometimento de um só


delito, caso o patrimônio de uma só pessoa ou família seja atingido, ainda que ocorra mais de uma
morte ou lesão grave. É a técnica que inspira a legalidade e esta nos confere a segurança de que não
haverá crime sem lei anterior que o defina. No entanto, somos levados a rememorar, outra vez, que o
caso pode ser solucionado, a bem da justiça, na fixação da pena, que varia, no caso do latrocínio, entre
20 e 30 anos. Para isso existe a individualização da pena, a merecer consideração rigorosa do
magistrado. Duas mortes não podem terminar em pena mínima de vinte anos, por exemplo. Vale a
majoração cabível em função do art. 59 do Código Penal. De outra parte, se o roubo com resultado
l ã t f i i d id
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t l d t 157 § 3 º d Códi P l id d
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lesão grave ou morte foi indevidamente colocado no art. 157, § 3.º, do Código Penal, cuida-se de
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política legislativa, artífice do princípio da legalidade, dado que ao Judiciário não cabe editar leis.
Dessa forma, tecnicamente, a multiplicidade de mortes (ou lesões graves) não leva à prática de vários
latrocínios, caso o patrimônio seja unitariamente lesado. (Nucci, 2020)

Há quatro hipóteses possíveis: a) roubo consumado e homicídio tentado: tentativa de latrocínio. Na


jurisprudência: STJ: “2. Se houve prova de que o acusado agiu com animus necandi, no crime de roubo,
não ocorrendo a consumação da morte por circunstâncias alheias à vontade do réu, conclui-se pela
ocorrência da tentativa de latrocínio e não o roubo qualificado pela lesão corporal de natureza grave.
(AgRg no REsp 1647962/MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em
09/03/2017, DJe 15/03/2017). 3. Mantida a condenação pelo delito de latrocínio tentado, ficam
prejudicados os demais pleitos” (AgRg no AREsp 1.291.179/SP, 6.ª T., rel. Nefi Cordeiro, j. 07.05.2019,
v.u.); b) roubo consumado e homicídio consumado: latrocínio consumado, inexistindo divergência na
jurisprudência; c) roubo tentado e homicídio tentado: tentativa de latrocínio. Conferir: STF: “Ante a
inadequação da via eleita, a 1.ª Turma, por maioria, julgou extinto habeas corpus em que se pleiteava a
estipulação da pena do paciente de acordo com a primeira parte do § 3.º do art. 157 do CP (‘Art. 157 –
Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou
depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena – reclusão, de
quatro a dez anos, e multa. (...) § 3.º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão,
de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo
da multa’). Na espécie, trata-se de condenado com fulcro no art. 157, § 3.º, c/c o art. 14, II, ambos do
CP, por decisão transitada em julgado. Esclareceu-se que se buscava o enquadramento jurídico da
conduta a ele imputada como crime de roubo seguido de lesão corporal de natureza grave – e não
tentativa de latrocínio –, com nova fixação da pena-base, pois a vítima sobrevivera. Rejeitou-se
eventual concessão da ordem de ofício. Assentou-se não ser possível enfrentar ponderação de
circunstâncias fático-probatórias em writ para verificar como teria ocorrido o delito. O Min. Luiz Fux
acentuou estar caracterizada a tentativa de tirar a vida da vítima, que não se teria consumado por
motivos alheios à vontade do paciente. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem.
Asseverava inexistir, no ordenamento jurídico pátrio, a tentativa de latrocínio, que consistiria ficção
jurídica conflitante com o preceito legal. Além do mais, sublinhava que o latrocínio pressuporia sempre
a morte” (HC 110.686-DF, 1.ª T., rel. Dias Toffoli, 05.02.2013, m.v., Informativo 694). STJ: “1. Prevalece
nesta Corte o entendimento de que, sempre que caracterizado o dolo do agente de subtrair o bem
pertencente à vítima e o dolo de matá-la, não ocorrido o resultado morte por circunstâncias alheias à
sua vontade, configura-se o latrocínio na modalidade tentada. Precedentes. 2. Para decidir a respeito
da eventual desclassificação do delito de latrocínio na modalidade tentada para roubo seguido de
lesão corporal grave, é necessário analisar a possível existência do animus necandi e verificar se o
agente atentou contra a vida da vítima, não consumando o delito por circunstâncias alheias à sua
vontade. 3. É fato incontroverso no acórdão recorrido que o acusado pretendia subtrair o patrimônio da
segunda vítima e ceifar-lhe a vida. 4. Esta Corte Superior, de forma reiterada, já decidiu que incide o
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g p@prof.joaobittenocurt j q
concurso formal impróprio (art. 70, segunda parte, do Código Penal) no crime de latrocínio, nas
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hipóteses em que o agente, mediante uma única subtração patrimonial, busca alcançar mais de um
resultado morte, caracterizados os desígnios autônomos. Precedentes. 5. Na espécie, além de a
conduta do recorrido haver atingido duas esferas patrimoniais distintas – subtraiu bens dos dois
ofendidos –, o acusado desferiu tiros contra as duas vítimas. 6. Recurso provido para reconhecer a
prática de latrocínio tentado contra a segunda vítima e o concurso formal impróprio com o latrocínio
consumado e, por conseguinte, readequar a pena imposta ao réu” (REsp 1282171-MG, 6.ª T., rel.
Rogerio Schietti Cruz, 21.06.2016, DJe 29.06.2016); d) roubo tentado e homicídio consumado:
latrocínio consumado. Neste último caso, dever-se-ia falar, tecnicamente, em latrocínio tentado, pois o
crime patrimonial não atingiu a concretização, embora da violência tenha resultado a morte.
Entretanto, segundo a jurisprudência predominante, como a vida humana está acima dos interesses
patrimoniais, soa mais justa a punição do agente por latrocínio consumado, até mesmo porque o tipo
penal menciona “se da violência resulta morte”, seja ela exercida numa tentativa ou num delito
consumado anterior. É a posição esposada pela Súmula 610 do Supremo Tribunal Federal (“Há crime
de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da
vítima”). 34. Inviabilidade de aplicação do art. 9.º da Lei 8.072/90: a Lei dos Crimes Hediondos
estabeleceu, no referido art. 9.º, que a pena do roubo qualificado pelo resultado (157, § 3.º) deve ser
acrescida da metade, respeitado o limite superior de 40 anos, se a vítima estiver em qualquer das
hipóteses do art. 224 do Código Penal. Esse artigo, entretanto, foi revogado pela Lei 12.015/2009, pois
enumerava as pessoas até 14 anos de idade, alienadas ou débeis mentais e que não pudessem opor
resistência por qualquer motivo. Era a chamada presunção de violência. Outros tipos penais foram
criados pela referida Lei 12.015/2009, envolvendo essas pessoas mais vulneráveis a agressões
sexuais. De todo modo, deixa de existir parâmetro válido para a aplicação do art. 9.º da Lei 8.072/90,
vez que a norma penal de referência (art. 224, CP) foi revogada. Em boa hora, pois se chegava ao
absurdo de a pena mínima coincidir com a máxima. Assim, praticar latrocínio contra menor de 14 anos
levava o juiz a fixar a pena mínima de 30 anos (20 anos + metade), que era também o máximo
permitido. Em nosso entendimento, havia lesão ao princípio constitucional da individualização da pena
(art. 5.º, XLVI, CF), tornando a aplicação do aumento inconstitucional. Entretanto, a questão está
superada.

EXTORSÃO
Art. 158. Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, com o intuito de obter para si ou
para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma
coisa:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa.

§ 1.º Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma aumenta-se a pena
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
§ 1. Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta se a pena
de 1/3 (um@prof.joaobittenocurt
terço) até 1/2 (metade).

§ 2.º Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3.º do artigo anterior.

§ 3.º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária
para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da
multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2.º e
3.º, respectivamente.

Extorsão: é uma variante de crime patrimonial muito semelhante ao roubo, pois também implica uma
subtração violenta ou com grave ameaça de bens alheios. A diferença concentra-se no fato de a
extorsão exigir a participação ativa da vítima fazendo alguma coisa, tolerando que se faça ou deixando
de fazer algo em virtude da ameaça ou da violência sofrida. Enquanto no roubo o agente atua sem a
participação da vítima, na extorsão o ofendido colabora ativamente com o autor da infração penal.
Assim, como exemplos: para roubar um carro, o agente aponta o revólver e retira a vítima do seu
veículo contra a vontade desta. No caso da extorsão, o autor aponta o revólver para o filho do ofendido,
determinando que ele vá buscar o carro na garagem da sua residência, entregando-o em outro local
predeterminado, onde se encontra um comparsa. Nota-se, pois, que na primeira situação o agente
toma o veículo da vítima no ato da grave ameaça, sem que haja ação específica do ofendido, que
simplesmente não resiste. Na segunda hipótese, a própria vítima busca o veículo, entregando-o, sob
ameaça, a terceiro. E mais: no roubo a coisa desejada está à mão; na extorsão, a vantagem econômica
almejada precisa ser alcançada, dependendo da colaboração da vítima. (Nucci, 2020)

Análise do núcleo do tipo: constranger significa tolher a liberdade, forçando alguém a fazer alguma
coisa. É justamente a diferença do roubo, cujo núcleo é subtrair, demonstrando que o agente prescinde
da colaboração da vítima, pois tem o bem ao seu alcance. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “O entendimento desta Corte é no sentido de que ‘o emprego de violência ou grave ameaça é
elementar do crime tipificado no art. 158 do Código Penal. Assim, se o funcionário público se utiliza
desse meio para obter vantagem indevida, comete o crime de extorsão, e não o de concussão’ (HC n.
149.132/MG, Rel. Ministro Sebastião Reis, Sexta Turma, julgado em 2/8/2011, DJe 22/8/2011)” (AgRg
no REsp 1048381-RS, 6.ª T., rel. Antonio Saldanha Palheiro, 17.04.2018, v.u.).

TJRS: “O tipo penal extorsão (Erpressung) visa à proteção jurídica do patrimônio e à liberdade pessoal.
Na doutrina germânica é considerado típico neste tipo de crime o que se denomina de
Freikaufcharakter, isto é, o que caracteriza o crime é a previsão de pagamento de um resgate
(vantagem econômica indevida) exigido pelo agente, através do qual a vítima resgata, por uma
prestação econômica a que foi coagida a satisfazer, sua liberdade de ação, liberdade de decisão,
visando, desta forma, à cessação dos efeitos da coação, podendo o pagamento se dar somente com o
intuito de evitar se/desviar se de eventuais danos Nesta senda malgrado a ameaça prevista no art
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
intuito de evitar-se/desviar-se de eventuais danos. Nesta senda, malgrado a ameaça prevista no art.
@prof.joaobittenocurt
158 do Código Penal, enquanto meio de execução do crime, deva sempre ser dirigida a uma pessoa –
sujeito passivo do ato de constranger –, que é coagida a fazer, tolerar que se faça ou omitir-se sob a
promessa de que, do contrário, lhe será causado mal injusto e futuro, tratando-se de crime patrimonial
a ameaça pode ter por conteúdo, além de dano à própria integridade física do coagido ou de terceiro,
os bens jurídicos que o coagido titulariza. (...)” (Ap. 70076550136-RS, 7.ª Câmara Criminal, rel. José
Conrado Kurtz de Souza, 28.06.2018, m.v.).

Flanelinhas e similares: os indivíduos, conhecidos por flanelinhas, são aqueles que, a pretexto de vigiar
o carro de determinada pessoa, ao estacionar em plena via pública, cobram por isso. No entanto, não é
uma simples cobrança, em várias oportunidades, mas uma ameaça – velada ou expressa – de que
poderão danificar o veículo, caso não lhes seja paga determinada quantia, geralmente exorbitante. Em
primeiro lugar, a conduta é ilícita porque o carro está na rua, local público, o que independe de qualquer
pagamento, como regra. Em segundo, pagar certa quantia depende da vontade exclusiva do
proprietário do automóvel, não podendo haver qualquer espécie de coerção. Em suma, a conduta é, no
mínimo, irregular. Outra modalidade de flanelinha é aquele que, no semáforo, constrange o motorista a
lhe pagar certa quantia para que o para-brisa do carro seja lavado. Geralmente, o constrangimento é
realizado por meio de súplicas sucessivas. Cuida-se de coerção emocional, não se podendo nem
mesmo considerar ilícita, pois até mesmo a contravenção de mendicância não mais subsiste. Por
outro lado, há quem exija o pagamento de qualquer valor, batendo no vidro e ameaçando o motorista.
Como regra, no entanto, tais condutas não chegam a ponto de configurar o delito de extorsão, cuja
pena é a mesma do roubo. Contudo, não se pode descartar completamente a tipificação no art. 158,
pois o constrangimento pode ser efetivo e grave, com ameaça crível e virulenta, de modo a atemorizar
a vítima, que alternativa não vê a não ser pagar o valor demandado. Portanto, depende-se da
verificação de cada caso concreto. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

TJSP: “Art. 158, caput, do Código Penal. Sentença condenatória. Materialidade e autoria devidamente
demonstradas nos autos, sobretudo pelos seguros relatos da vítima e de um dos milicianos
responsáveis pela prisão em flagrante do acusado. A conduta do agente se amolda perfeitamente ao
aludido tipo penal, não sendo o caso de absolvição por atipicidade ou insuficiência de provas, assim
como a pretendida desclassificação. Comprovada a grave ameaça, a aferição da vantagem econômica
indevida exigida configura mero exaurimento. (...)” (Ap. Crim. 0075845-63.2015.8.26.0050, 16ª. C., rel.
Camargo Aranha Filho, 07.08.2018, m. v.).

2. Inviável a desclassificação do crime para as contravenções previstas no artigo 42, inciso I, ou no


artigo 65, ambos da LCP, uma vez que a conduta do réu ultrapassou a simples moléstia ou perturbação
da tranquilidade das vítimas, desbordando para a sua intimidação, tudo no intuito de constrangê-las a
lhe dar dinheiro, amoldando-se, assim, ao tipo do artigo 158 do Código Penal. 3. Embora o delito de
extorsão seja crime formal ele somente se consuma quando a vítima depois de atacada pela violência
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extorsão seja crime formal, ele somente se consuma quando a vítima, depois de atacada pela violência
ou grave ameaça, realiza o comportamento desejado pelo extorsionário. No caso concreto, não tendo
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as vítimas realizado o comportamento exigido pelo acusado, tanto que não lhe deram qualquer
dinheiro, trancando-se no carro e resistindo às intimidações até a chegada da polícia, certo é que o
delito não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do réu, impondo-se o reconhecimento da
forma tentada, eis que não percorrido integralmente o iter criminis” (Ap. Crim. 70063955306-RS, 5.ª C.
Crim., rel. Cristina Pereira Gonzales, 27.05.2015, v.u.).

Alegação de ingresso com ação judicial: tal medida não configura ameaça ilícita a ponto de
caracterizar o crime de extorsão (ou mesmo o delito de ameaça). Cuida-se de um direito de qualquer
pessoa, previsto na Constituição Federal (nenhuma lesão de direito será excluída da apreciação do
Judiciário). Portanto, quem afirma que, se tal medida ou conduta não for concretizada, ingressará em
juízo, nada mais faz do que alertar sobre o exercício de um direito. Na

Jurisprudência:

STJ: “Não é mal injusto a ameaça de ingressarem advogados com ações judiciais ou de cumprirem
eles ordem judicial após vigente, mas exercício de direito que, mesmo abusivo, não configura o crime
de extorsão. 4. Habeas corpus não conhecido. Concedida a ordem de ofício para, reconhecida a
atipicidade material da conduta, trancar a ação penal” (HC 51465-SP, 6.ª T., rel. Nefi Cordeiro,
05.02.2015, v.u.).

Sujeitos ativo e passivo: qualquer pessoa.

Violência ou grave ameaça: É fundamental que a ameaça seja grave bastante para constranger, de
fato, a vítima, a ponto de vencer sua resistência, obrigando-a a fazer o que não quer. Do contrário, o
delito não se configura.

Jurisprudência:

STJ: “Hipótese em que foi exigido da vítima o pagamento de determinado valor (indevida vantagem
econômica), sob pena de destruição de seu caminhão – bem necessário ao desempenho de sua
atividade habitual –, que havia sido furtado. O Tribunal de origem, alinhado ao entendimento deste
Sodalício, concluiu pela tipicidade da conduta praticada pelo agravante, na medida em que a ameaça a
que se refere o caput do artigo 158 do Código Penal, exercida com o fim de obter a indevida vantagem
econômica, pode ter por conteúdo grave dano à pessoa ou aos bens da vítima. Precedentes desta
Corte e do STF” (AgRg no AREsp 724.776-SC, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 10.03.2016, DJe 16.03.2016).

Ameaça espiritual: a liberdade de culto e crença é assegurada pela Constituição Federal; cada pessoa
pode acreditar no que bem quiser, tanto na existência de Deus, como na inexistência. Pode crer em
santos ou espíritos – ou nada disso. Cuidando-se de uma questão de fé, não vemos como aceitar o
preenchimento do tipo penal da extorsão, quando o agente se vale de elementos espirituais para obter
vantagem da vítima. Não há violência, nem grave ameaça, quando calcadas em dados esotéricos. O
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

sobrenatural não pode ser reconhecido pelo Direito como agente válido para intimidar pessoas ou
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valorizar coisas. Quem doa bens, acreditando estar dando a entes espirituais, assim o faz porque quer.
Desse modo, parece-nos inviável usar a espiritualidade para amedrontar quem quer que seja. Imagine-
se se isso for alargado. Pode-se invocar bruxas e gnomos para amedrontar pessoas e, com isso,
conseguir alguma vantagem. Não nos parece razoável encaixar essas “ameaças” como válidas para
tipificar a extorsão.

Jurisprudência:

STJ: “1. Orientação jurisprudencial no sentido de reconhecer como extorsão a ‘ameaça de mal
espiritual’ (REsp n. 1299021/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em
14/2/2017, DJe 23/2/2017). 2. A ‘grave ameaça’, elementar do delito de extorsão, consiste na
intimidação que atua na dimensão psicológica da vítima, considerando a influência de múltiplos
fatores” (AgRg no AREsp 1.009.662/RJ, 6.ª T., rel. Antonio Saldanha Palheiro, 03.04.2018, v.u.). (Nucci,
2020)

Elemento subjetivo: pune-se a extorsão quando houver dolo. Inexiste a forma culposa. Exige-se, ainda,
o elemento subjetivo do tipo específico ou o dolo específico, consistente na expressão “com o intuito
de obter...”. (Nucci, 2020)

Indevida vantagem econômica: o termo “indevida” demonstra a presença de um elemento normativo


do tipo, de forma que, caso a vantagem exigida seja legítima, pode o agente responder por outro delito,
como o exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP). A vantagem econômica demonstra,
nitidamente, ser um crime patrimonial. (Nucci, 2020)

Consumação: em que pese defendermos ser a extorsão um crime formal (não exige o resultado
naturalístico consistente na redução do patrimônio da vítima), ainda há alguns aspectos a considerar
no tocante ao momento consumativo. Ocorre que há, fundamentalmente, três estágios para o
cometimento da extorsão: 1.º) o agente constrange a vítima, valendo-se de violência ou grave ameaça;
2.º) a vítima age, por conta disso, fazendo, tolerando que se faça ou deixando de fazer alguma coisa;
3.º) o agente obtém a vantagem econômica almejada. Este último estágio é apenas configurador do
seu objetivo (“com o intuito de...”), não sendo necessário estar presente para concretizar a extorsão.
Entretanto, o simples constrangimento, sem que a vítima atue, não passa de uma tentativa. Para a
consumação, portanto, cremos mais indicado atingir o segundo estágio, isto é, quando a vítima cede
ao constrangimento imposto e faz ou deixa de fazer algo. (Nucci, 2020)

Súmula 96 do STJ: “O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem


indevida”.

Jurisprudência:

STJ: “A extorsão é crime formal e se consuma no momento em que a vítima, submetida a violência ou
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grave ameaça, submete-se ao comando do criminoso, sendo irrelevante a efetiva obtenção da


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indevida, que constitui mero exaurimento do delito. Inteligência da Súmula 96/STJ.
Precedentes” (HC 410.220/PB, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 08.02.2018, v.u.). (Nucci, 2020)

Condutas da vítima: fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa é precisamente a
colaboração do ofendido para a configuração do crime de extorsão. É natural deduzir que somente
tenha havido concordância porque existiu violência ou grave ameaça, embora seja indispensável que a
vítima, de alguma forma, aquiesça ao propósito do autor. (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a pessoa que sofre a violência ou a grave ameaça; os
objetos jurídicos são o patrimônio da vítima, bem como a sua integridade física e a sua liberdade.
(Nucci, 2020)

Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou
especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico necessário, configurando-se com o
constrangimento imposto à vítima). (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “O crime de extorsão é formal e consuma-se no local em que a violência ou a grave ameaça é
exercida com o intuito de constranger alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Inteligência da
Súmula n.º 96 desta Corte Superior” (CC 129275-RJ, 3.ª S., rel. Laurita Vaz, 11.12.2013, v.u.); de forma
livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“constranger” implica
ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art.
13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se
prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico tutelado);
unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários atos
integram a conduta); admite tentativa.

Causas de aumento de pena: ver comentários ao art. 157, § 2.º.

Crime qualificado pelo resultado lesão grave ou morte:

Sequestro relâmpago: a Lei 11.923/2009 criou-se a figura típica do sequestro relâmpago, inserindo no
art. 158, § 3.º, do Código Penal, uma circunstância nova de execução do crime de extorsão, bem como
a previsão da possibilidade de dois resultados qualificadores (lesão grave e morte). No mesmo
parágrafo, houve o aproveitamento para a inclusão de uma qualificadora (crime cometido mediante a
restrição da liberdade da vítima, sendo essa a condição necessária para a obtenção da vantagem
econômica), com pena de reclusão, de 6 a 12 anos, e multa, mas também trouxe a figura qualificada
pelo resultado, ou seja, se do sequestro relâmpago advier lesão grave, a pena será de reclusão, de 16 a
24 anos; se ocorrer morte, a pena será de reclusão, de 24 a 30 anos. Em primeiro lugar, convém
destacar inexistir qualquer conflito aparente de normas ou confusão legislativa pela simples vigência
do disposto no art 157 § 2 º V do Código Penal (“se o agente mantém a vítima em seu poder
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do disposto no art. 157, § 2. , V, do Código Penal ( se o agente mantém a vítima em seu poder,
restringindo sua liberdade”). Já sustentávamos anteriormente, conforme se constata nos comentários
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a esse dispositivo, ser inaplicável a causa de aumento do art. 157, § 2.º, V, ao caso do sequestro
relâmpago. Para tal situação, seria necessária a tipificação em roubo seguido de sequestro, por
ausência de outra figura específica. A partir da inclusão do § 3.º ao art. 158, passa-se ao tipo preciso
de extorsão, cujo constrangimento é voltado à restrição da liberdade da vítima como forma de pressão
para a obtenção de vantagem econômica. Não mais se aplica o concurso de crimes (roubo +
sequestro), inserindo-se o caso concreto, denominado vulgarmente de sequestro relâmpago, na figura
nova. Jamais houve confusão entre roubo e extorsão. Quando o agente ameaça a vítima portando uma
arma de fogo, exigindo a entrega do automóvel, por exemplo, cuida-se de roubo. A coisa desejada,
afinal, está à vista e à disposição do autor do roubo. Caso o ofendido se negue a entregar, pode sofrer
violência, ceder e o agente leva o veículo do mesmo modo. Porém, no caso da extorsão, há um
constrangimento, com violência ou grave ameaça, que exige, necessariamente, a colaboração da
vítima. Sem esta colaboração, por maior que seja a violência efetivada, o autor da extorsão não obtém
o almejado. Por isso, obrigar o ofendido a empreender saque em banco eletrônico é extorsão – e não
roubo. Sem a participação da vítima, fornecendo a senha, a coisa objetivada (dinheiro) não é obtida.
Logo, obrigar o ofendido, restringindo-lhe (limitar, estreitar) a liberdade, constituindo esta restrição o
instrumento para exercer a grave ameaça e provocar a colaboração da vítima é exatamente a figura do
art. 158, § 3.º, do Código Penal. Permanece o art. 157, § 2.º, V, do Código Penal para a hipótese mais
rara de o agente desejar o carro da vítima, ilustrando, levando-a consigo por um período razoável, de
modo a se certificar da inexistência de alarme ou trava eletrônica. É um roubo, com restrição limitada
da liberdade, de modo a garantir a posse da coisa, que já tem em seu abrigo. Entretanto, rodar com a
vítima pela cidade, restringindo-lhe a liberdade, como forma de obter a coisa almejada, contando com
a colaboração do ofendido, insere-se na extorsão mediante restrição à liberdade. Finalmente, a nova
figura também não se confunde com a extorsão mediante sequestro, tendo em vista que nesta última
hipótese, a privação (destituir, tolher) da liberdade é mais que evidente, ingressando o ofendido em
cárcere, até que haja a troca da vantagem como condição ou preço do resgate. (Nucci, 2020)

Jjurisprudência:

STJ: “1. O § 3.º do art. 158 do CP, introduzido pela Lei n. 11.923/2009, qualifica o crime de extorsão
quando cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a
obtenção da vantagem econômica, passando a pena de reclusão a ser de 6 (seis) a 12 (doze) anos,
além da multa. Se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§
2.º e 3.º, respectivamente. 2. A Lei n. 11.923/2009 não cria um novo delito autônomo, chamado de
‘sequestro relâmpago’, sendo apenas um desdobramento do tipo do crime de extorsão, uma vez que o
legislador apenas definiu um modus operandi do referido delito. 3. Tendo em vista que o texto legal é
unidade e que as normas se harmonizam, conclui-se, a partir de uma interpretação sistemática do
artigo 158 do Código Penal, que o seu § 1.º não foi absorvido pelo § 3.º, pois, como visto, o § 3.º
constitui-se qualificadora estabelecendo outro mínimo e outro máximo da pena abstratamente
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 118/171
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constitui se qualificadora, estabelecendo outro mínimo e outro máximo da pena abstratamente
cominada@prof.joaobittenocurt
ao crime; já o § 1º prevê uma causa especial de aumento de pena. 4. Dessa forma, ainda
que topologicamente a qualificadora esteja situada após a causa especial de aumento de pena, com
esta não se funde, uma vez que tal fato configura mera ausência de técnica legislativa, que se explica
pela inserção posterior da qualificadora do § 3.º no tipo do artigo 158 do Código Penal, que surgiu
após uma necessidade de reprimir essa modalidade criminosa. 5. Em circunstância análoga, na qual
foi utilizada majorante prevista topologicamente em parágrafo anterior à forma qualificada, tal como
na hipótese dos autos, esta Corte Superior decidiu que, sendo compatível o privilégio do art. 155, § 2.º,
do Código Penal com as hipóteses objetivas de furto qualificado – entendimento proferido no Recurso
Especial representativo da controvérsia n. 1.193.194/MG –, mutatis mutandi, não há incompatibilidade
entre o furto qualificado e a causa de aumento relativa ao seu cometimento no período noturno. 6. No
presente caso, ficando claramente comprovada a utilização da arma pelos acusados para o
cometimento do crime, bem como que ambos agiram em comunhão de vontades, praticando os
crimes ora em análise, não há como se afastar o fato dos delitos terem sido praticados em concurso
de pessoas e com o emprego de arma de fogo, devendo incidir a causa de aumento prevista no § 1.º
do art. 158 do CP. 7. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa, poderá o juiz – considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a
personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias – aumentar a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo. 8. No presente caso, apesar das
circunstâncias judiciais terem sido consideradas favoráveis em relação aos recorridos, foram
praticados mais de 10 crimes de extorsão qualificada pela restrição da liberdade das vítimas (art. 158,
§ 3.º, do CP), contra pessoas diferentes, com violência ou grave ameaça, o que justifica a aplicação da
continuidade delitiva específica (art. 71, parágrafo único, do CP). 9. Recurso especial provido” (REsp
1.353.693-RS, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 13.09.2016, v.u.); “O delito descrito no art. 158,
§ 3º, do Código Penal é formal, restando configurado apenas com o constrangimento da vítima,
mediante violência ou grave ameaça e com restrição à sua liberdade, na intenção de obter vantagem
econômica indevida. A obtenção da vantagem - na hipótese, os saques realizados - configura o
exaurimento do crime. 4. O fato de a vítima ter fornecido as senhas de seus cartões bancários e de
crédito, depois de ter sido abordada e mantida em seu veículo pelo paciente e outros agentes, sendo
ameaçada com o uso de arma de fogo, enquanto outro elemento realizava saques em sua conta
bancária, caracteriza o crime de extorsão qualificada, o qual não se confunde com o roubo, sendo que,
na hipótese, todos os bens foram devolvidos depois da realização dos saques” (HC 402871-SP, 5.ª T.,
rel. Ribeiro Dantas, 20.03.2018, v.u.). (Nucci, 2020)

Proporcionalidade das penas: pode-se dizer, em primeira análise, que as penas previstas para a nova
figura típica são muito elevadas e não estariam em harmonia com outros delitos. Afinal, somente para
o sequestro relâmpago, prevê-se sanção de reclusão de 6 a 12 anos. Porém, em nosso entendimento,
há perfeita proporcionalidade. A extorsão cometida com emprego de arma ou por duas ou mais
pessoas pode redundar na pena de 5 anos e 4 meses a 15 anos de reclusão. Ora, a extorsão com
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 119/171
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restrição à liberdade que, invariavelmente, é cometida com emprego de arma e mediante concurso de
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duas ou mais pessoas, atinge 6 a 12 anos. Está aquém do mal cometido contra a vítima, que, além de
sofrer o constrangimento mediante emprego de arma e concurso de pessoas, como regra, ainda tem a
liberdade restringida, sofrendo trauma psicológico, em grande parte das vezes. O mesmo se diga do
roubo com emprego de arma ou concurso de duas ou mais pessoas (reclusão, de 5 anos e 4 meses a
15 anos). Comparar a nova penalidade do sequestro relâmpago com crimes sexuais, por exemplo,
afirmando que os seis anos de pena mínima do delito de estupro fere a proporcionalidade implica não
analisar o contexto global. O fato de ser grave o delito de estupro não elimina, em hipótese alguma, a
igual ou superior gravidade do sequestro relâmpago. Ademais, o que sempre nos pareceu lesão à
proporcionalidade é o esquecimento do crime de homicídio, que fere o mais relevante bem jurídico – a
vida humana. Não se pode mais sustentar a pena do homicídio simples em singelos seis anos. Afinal,
se o estupro e o sequestro relâmpago merecem, como pena mínima, seis anos, algo está errado. E o
equívoco deve-se à mantença da pena do delito de homicídio em apenas seis anos. Se quisermos
debater a proporcionalidade das penas eleitas pelo Legislativo, poderíamos começar com o crime
previsto no art. 273 (falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins
terapêuticos ou medicinais), que é infração de perigo, com pena de reclusão de 10 a 15 anos e
considerado hediondo. Se muitos erros existem na legislação penal brasileira, não nos parece seja no
tocante à pena do sequestro relâmpago. Por derradeiro, se houver lesão grave ou morte à vítima, optou
o legislador pela sanção prevista para a outra modalidade de extorsão, prevista no art. 159. Não fugiu,
portanto, de um padrão de comparação. Estaria equivocada a previsão do art. 159, §§ 2.º e 3.º, do CP?
Haveria lesão à proporcionalidade? Eis outro passo importante para debater a questão. No entanto, se
essas penalidades forem consideradas justas, nada impede, por política criminal, a fixação de
igualdade no tocante à outra modalidade de extorsão, que também fere o direito à liberdade,
consistente no sequestro relâmpago. (Nucci, 2020)

Tipo remissivo: optou o legislador por criar uma forma de remissão no tocante às sanções previstas
para os possíveis resultados qualificadores. Por isso, quando, da prática do sequestro relâmpago,
ocorrer lesão grave, a pena será de reclusão, de 16 a 24 anos (cf. art. 159, § 2.º, CP); se ocorrer morte,
a pena será de reclusão, de 24 a 30 anos (cf. art. 159, § 3.º, CP).

Inserção no rol dos crimes hediondos: quando a Lei 11.923/2009 inseriu a figura criminosa do
sequestro relâmpago terminou cometendo um equívoco: não lançou esse tipo específico no rol do art.
1º da Lei 8.072/90. Houve debate doutrinário e jurisprudencial acerca de estar ou não esse delito
previsto, ainda que implicitamente, como crime hediondo. Essa omissão chegou ao fim, pois a Lei
13.964/2019 inseriu, expressamente, esse tipo no art. 1º, III, da Lei dos Crimes Hediondos.
Continuamos com a nossa posição anterior de que a extorsão com privação da liberdade da vítima não
poderia ser considerado hediondo, até ser formalmente incluída no referido rol do art. 1º da Lei
8.072/90, sob pena de lesão ao princípio da legalidade. Isto significa que somente quem praticar
extorsão com privação da liberdade da pessoa ofendida, após entrar em vigor a Lei 13.964/2019 (final
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

de janeiro de 2020), poderá responder como delito hediondo. Afinal, a lei é prejudicial ao réu e não
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pode retroagir, abrangendo fatos pretéritos.

EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO


Extorsão mediante sequestro

Art. 159. Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como
condição ou preço do resgate:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1.º Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de 18 (dezoito)
ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha:

Pena – reclusão, de 12 (doze) a 20 (vinte) anos.

§ 2.º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena – reclusão, de 16 (dezesseis) a 24 (vinte e quatro) anos.

§ 3.º Se resulta a morte: Pena – reclusão, de 24 (vinte e quatro) a 30 (trinta) anos.

§ 4.º Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a


libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).

Análise do núcleo do tipo: sequestrar significa tirar a liberdade, isolar, reter a pessoa. Tal fato constitui
crime autônomo (art. 148, CP), quando a finalidade do agente é, realmente, insular a vítima. Entretanto,
havendo finalidade específica, consistente na obtenção de vantagem patrimonial, torna-se uma
modalidade de extorsão. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

TJSE: “I – O tipo objetivo do delito de extorsão mediante sequestro caracteriza-se pelo impedimento,
por qualquer meio, que alguém exerça o seu direito de ir e vir, com a finalidade de obter qualquer
vantagem, como condição ou preço do resgate. II – A extorsão mediante sequestro, prevista no art.
159 do Código Penal, consumou-se quando o agente sequestrou a vítima (ação), cujo fito foi a
tentativa de causar a boa impressão na simulação que pretendeu e, com isso, obter o reate da sua
relação amorosa com a vítima. III – A dosimetria da pena aplicada deu-se em consonância com o
disposto nos arts. 59 e ss. do Código Penal, não merecendo retoque o comando sentencial também
neste ponto. IV – Recurso conhecido e desprovido” (Ap. Crim. 201600307040-SE, C. Crim., rel.
Diógenes Barreto, 14.06.2016, v.u.). (Nucci, 2020)

Sujeitos ativo e passivo: qualquer pessoa.

Elemento subjetivo: é o dolo que deve abranger os elementos objetivos do tipo Não há a forma
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Elemento subjetivo: é o dolo, que deve abranger os elementos objetivos do tipo. Não há a forma
culposa. Exige-se, ainda, o elemento subjetivo do tipo específico – “com o fim de obter, para si ou para
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outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate”. É o dolo específico na doutrina
tradicional. (Nucci, 2020)

Consumação: tratando-se de crime formal, pune-se a mera atividade de sequestrar pessoa, tendo a
finalidade de obter resgate. Assim, embora o agente não consiga a vantagem almejada, o delito está
consumado quando a liberdade da vítima é cerceada. Por outro lado, convém destacar que o crime de
extorsão mediante sequestro está consumado, do mesmo modo, ainda que o agente, privando a
liberdade da vítima, com a intenção de pleitear resgate, não tenha tempo para fazê-lo. Imagine-se que
tenha sido preso antes de concretizar a exigência para a libertação da vítima, porém fique, claramente,
demonstrado, nos autos da investigação ou do processo, ter sido essa a sua intenção quando agiu
contra o ofendido: o delito está finalizado, não se cuidando de mera tentativa. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “Cuidando-se de crime formal, sequestrada a vítima e exigido o resgate, ocorre a consumação,
ainda que não se tenha conseguido a vantagem econômica almejada (Súmula 96/STJ). Ordem
denegada, em consonância com o parecer ministerial” (HC 86.127-RJ, 5.ª T., rel. Napoleão Nunes Maia
Filho, 21.02.2008, v.u.). (Nucci, 2020)

Vantagem: há duas posições: a) tendo em vista que o tipo penal menciona qualquer vantagem, não
importa seja ela econômica ou não, devida ou indevida; b) levando-se em conta que o tipo penal é uma
extorsão cometida através de um sequestro, estando no contexto dos crimes patrimoniais, ela deve ser
econômica. Preferimos esta última corrente, pois o crime do art. 159 tem o mesmo nomen juris do
anterior, ou seja, extorsão, que é nitidamente patrimonial, não só porque fala em obtenção de
vantagem econômica, mas também porque é crime contra o patrimônio. Ora, a extorsão mediante
sequestro é a maneira de se obter a vantagem econômica, valendo-se da privação da liberdade de uma
pessoa. O resgate tem um preço, que necessita da conotação patrimonial. Não vemos sentido algum
em incluir um crime cujo resultado visado pode ser ofensivo a outros bens jurídicos, que não o
patrimônio, neste cenário. Se o legislador olvidou, no tipo penal, a palavra “econômica”, para designar
a vantagem – erros, aliás, são bastante comuns na elaboração de leis –, não quer isso dizer que o
intérprete deva ficar circunscrito à literalidade da norma. Ademais, para extrair o real significado e o
alcance do tipo penal incriminador, deve-se, sempre, promover o seu confronto com os demais tipos
que fazem parte do mesmo capítulo onde está situado no Código Penal. Por isso, cremos que a
extorsão mediante sequestro não passa de uma extorsão, cujo objetivo é uma vantagem econômica,
praticada por meio particularizado, que é a privação da liberdade da vítima. Assim também a posição
de MAGALHÃES NORONHA: “O Código fala em qualquer vantagem, não podendo o adjetivo referir-se à
natureza desta, pois ainda aqui, evidentemente, ela há de ser, como no art. 158, econômica, sob pena
de não haver razão para o delito ser classificado no presente título” (Direito penal, v. 2, p. 279). (Nucci,
2020)
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 122/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
)

Por outro @prof.joaobittenocurt


lado, acompanhamos a posição majoritária que defende ser necessário ser a vantagem
indevida, pois, caso seja devida, a pena ficaria extremamente desproporcional. Assim, havendo
sequestro para obtenção de vantagem devida, é mais justo punir por sequestro em concurso com
exercício arbitrário das próprias razões. (Nucci, 2020)

Condição: é uma obrigação que se impõe à(s) vítima(s) para que possa haver a libertação.

Preço: é a recompensa ou o prêmio que proporcionará a libertação. (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a pessoa privada da sua liberdade, bem como aquela
que perde o patrimônio, e o objeto jurídico é tanto o patrimônio quanto a liberdade do indivíduo. (Nucci,
2020)

Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou
especial); formal (delito cujo resultado naturalístico previsto no tipo penal – recebimento do resgate –
pode não ocorrer, contentando-se, para a sua configuração, com a conduta de sequestrar); de forma
livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“sequestrar” implica
ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art.
13, § 2.º, do Código Penal); permanente (o resultado se prolonga no tempo); unissubjetivo (que pode
ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta); admite
tentativa. Trata-se de crime hediondo (Lei 8.072/90). (Nucci, 2020)

Figura qualificada: as hipóteses do § 1.º constituem qualificadoras, pois são circunstâncias mais
graves que servem para aumentar, abstratamente, o mínimo e o máximo previstos para a pena. (Nucci,
2020)

Duração superior a 24 horas: quando a privação da liberdade da vítima tiver prazo superior a 24 horas,
o delito torna-se qualificado, tendo em vista o maior perigo gerado para o ofendido, inclusive à sua
saúde, diante do estresse enfrentado. (Nucci, 2020)

Sequestro de menor de 18 anos: a proteção é maior às vítimas menores de 18 anos, mais frágeis e
ainda em formação da personalidade, que podem sofrer abalos psicológicos gravíssimos pela privação
arbitrária da sua liberdade. (Nucci, 2020)

Sequestro de idoso: trata-se de introdução proporcionada pelo Estatuto do Idoso. Não há dúvida que a
pessoa maior de 60 anos, pela fragilidade natural de sua situação física e mental, pode sofrer um
trauma inigualável se for vítima de um sequestro. Se o menor de 18 anos, que ainda está formando sua
personalidade, pode sofrer abalo psicológico de monta (vide nota anterior), o maior de 60 anos
encontra-se na plena maturidade de sua existência, merecendo respeito e tratamento digno.
Envelhecer é processo natural da vida, devendo a sociedade zelar para o bem-estar dos idosos,
registrando-se o disposto no art. 8.º da Lei 10.741/2003: “O envelhecimento é um direito
personalíssimo e a sua proteção um direito social nos termos desta Lei e da legislação vigente”
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 123/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
personalíssimo e a sua proteção um direito social, nos termos desta Lei e da legislação vigente .
(Nucci, 2020)
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Jurisprudência:

STJ: “O Estatuto do Idoso, disciplinado pela Lei 10.741, de 1.º de outubro de 2003, ao inserir a
expressão ‘ou maior de 60 anos’ ao § 1.º do art. 159 do Código Penal, previu uma nova hipótese
qualificadora ao crime de extorsão mediante sequestro, incidente quando o sujeito passivo for idoso,
que, por presunção legal, sofreria maior abalo psicológico, agravando o resultado, a justificar a
penalização mais severa” (HC 246.613-RJ, 6.ª T., j. 23.10.2012, v.u., rel. Assusete Magalhães). (Nucci,
2020)

Bando ou quadrilha: valeu-se o tipo penal da figura específica prevista no art. 288 do Código Penal,
atualmente modificado pela Lei 12.850/2013, intitulando-se associação criminosa. Desse modo, é
necessária a prova de que três ou mais pessoas se associaram com a finalidade específica de cometer
crimes. Não se trata, nesse caso, de uma mera associação eventual, pois, se assim fosse, deveria o
legislador ter feito constar apenas o “concurso de mais de ... pessoas”. Nessa hipótese, o crime de
associação criminosa (art. 288, CP) resta absorvido pela figura qualificada da extorsão mediante
sequestro. (Nucci, 2020)

Fato que dá margem ao resultado qualificador: entende-se ser o sequestro, pois o núcleo do tipo é
“sequestrar pessoa”, sendo este o fato principal. A meta a ser atingida – obtenção do resgate – não é
nem exigível para a consumação do delito. Nota-se, ainda, no § 1.º que o legislador continuou a falar
do sequestro, prevendo questões pertinentes ao prazo de duração, à idade da vítima e à autoria.
(Nucci, 2020)

Forma qualificada pelo resultado: este e o próximo parágrafo constituem figuras pertinentes ao delito
agravado pelo resultado. Se do fato resultar lesão corporal grave, a pena eleva-se para reclusão, de 16
a 24 anos; se resultar morte, a pena sofre a elevação para reclusão, de 24 a 30 anos. Diversamente do
roubo (art. 157, § 3.º, CP), onde constou “se da violência resulta lesão grave ou morte”, neste caso
mencionou o tipo penal apenas “se do fato resulta lesão grave ou morte”, o que significa, portanto,
qualquer espécie de violência (física ou moral). Ex.: se durante um sequestro, em razão da forte
pressão emocional exercida contra a vítima privada de sua liberdade, ela sofre um ataque cardíaco e
morre, cuida-se da figura qualificada prevista no art. 159, § 3.º.

Delação premiada: a Lei 8.072/90, que instituiu os crimes hediondos, houve por bem criar, no Brasil, a
delação premiada, que significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s)
comparsa(s). É o “dedurismo” oficializado, que, apesar de moralmente criticável, deve ser incentivado
em face do aumento contínuo do crime organizado. É um mal necessário, pois trata-se da forma mais
eficaz de se quebrar a espinha dorsal das quadrilhas, permitindo que um de seus membros possa se
arrepender, entregando a atividade dos demais e proporcionando ao Estado resultados positivos no
combate à criminalidade. (Nucci, 2020)
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 124/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
( )

Requisito @prof.joaobittenocurt
do concurso de agentes: para a delação produzir a redução da pena do réu é necessário que
o delito tenha sido cometido por, pelo menos, duas pessoas, já que se fala em “concurso” e
“concorrente”. Logo, seja o denunciante coautor ou partícipe, poderá usufruir do benefício. (Nucci,
2020)

Autoridade: qualquer autoridade capaz de levar o caso à solução almejada, causando a libertação da
vítima (delegado, juiz, promotor, entre outros). (Nucci, 2020)

Libertação do sequestrado: observa-se ser requisito fundamental ocorrer a libertação da pessoa


sequestrada. Sem esta, não há aplicação do prêmio para a delação, que, no caso presente, não se liga
unicamente à identificação e à prisão dos responsáveis pelo crime. Por outro lado, é indispensável que
a informação prestada pelo agente delator seja útil para a referida libertação (vide o emprego do verbo
“facilitando”). Se a libertação for conseguida por outros meios, sem o uso da informação prestada pelo
denunciante, não se aplica a redução da pena. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “Após receber a notícia do fato, os policiais diligenciaram no sentido de localizar onde os saques
haviam sido efetuados, dirigindo-se a outra cidade, onde encontraram os suspeitos. O paciente apenas
forneceu o número de telefone de seu comparsa. Foi o policial Carlos Alberto quem negociou a
libertação da vítima. O paciente em nenhum momento facilitou a resolução do crime e sequer
influenciou na soltura da vítima. Não se visualiza aqui a possibilidade de aplicar-se o benefício da
delação premiada” (HC 107.916-RJ, 6.ª T., rel. Og Fernandes, 07.10.2008, v.u.).

Extorsão indireta: Art. 160. Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de
alguém, documento que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Análise do núcleo do tipo: exigir significa ordenar ou reclamar, enquanto receber quer dizer aceitar ou
acolher. Portanto, a extorsão indireta ocorre quando o agente ordena ou aceita, como garantia de uma
dívida, abusando da vítima, um documento passível de gerar um procedimento criminal contra alguém.
Imagine-se a situação daquele que, necessitando muito de um empréstimo e pretendendo convencer a
pessoa que lhe emprestará a quantia de que irá pagar, entrega, voluntariamente, nas mãos do credor
um cheque sem suficiente provisão de fundos. O simples fato de o credor aceitar tal oferta já configura
o delito, pois sabe que, no futuro, poderá apresentar o cheque e enquadrar o devedor na figura do
estelionato.

Garantia de dívida: a dívida existente entre autor e vítima pode ser resultante de contrato, título
extrajudicial ou qualquer outra forma de obrigação. É possível que a dívida, conforme a sua
constituição, seja ilícita, como a que decorre de um empréstimo a juros exorbitantes.

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 125/171
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Elemento subjetivo: é o dolo, que envolve, inclusive, a noção de estar abusando da vítima. Não existe a
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forma culposa. Admite-se, ainda, o elemento subjetivo do tipo específico, consistente na finalidade de
garantir uma dívida. No mesmo sentido: NORONHA, Direito penal, v. 2, p. 287.

Elemento normativo do tipo: abusar significa exagerar, usando de modo inconveniente alguma coisa.
No caso presente, indica-se, claramente, que o credor, aproveitando-se da situação do devedor – que
sempre é de inferioridade pelo simples fato de dever –, exige ou recebe algo indevido.

Documento que proporciona procedimento criminal: são documentos, segundo o disposto no Código
de Processo Penal, “quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares” (art. 232).
Os relevantes para a composição deste tipo penal são aqueles que podem proporcionar a instauração
de uma ação penal ou inquérito policial contra alguém, como o cheque sem fundos, a duplicata fria, a
confissão da prática de um delito etc.

Potencialidade lesiva do documento: não se exige que o documento efetivamente cause a instauração
de uma ação penal ou de um inquérito policial contra a vítima, mas simplesmente que possa provocar
esse resultado.

Procedimento criminal: ao mencionar singelamente procedimento criminal, o tipo penal sinalizou tanto
para a ação penal quanto para o inquérito policial, um de natureza jurisdicional e o outro de natureza
administrativa. É natural supor, no entanto, que, em última análise, pensou-se na hipótese da ação
penal, pois o inquérito é meramente preparatório desta.

Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é o credor de uma dívida, enquanto o sujeito passivo é o
devedor, que entrega o documento ao agente, ou terceira pessoa que pode ser prejudicada pela
apresentação do documento às autoridades. Note-se que o tipo penal refere-se a “vítima”,
demonstrando, com nitidez, ser o devedor, que entregou peça importante para sua segurança nas
mãos do algoz.

Objetos material e jurídico: o objeto material é o documento que sofre a conduta criminosa, finalidade
maior do autor; o objeto jurídico é tanto o patrimônio, quanto a liberdade da vítima.

Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que demanda sujeito ativo qualificado ou especial – no
caso presente, é o credor da dívida); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente
no efetivo prejuízo para a vítima, seja pela diminuição do seu patrimônio, seja pelo perigo de sofrer um
procedimento criminal); de forma vinculada (o tipo penal impõe o modo pelo qual a extorsão é
praticada: exigindo-se ou recebendo-se documento); comissivo (“exigir” ou “receber” implicam ações)
e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, §
2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando
no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra,
vários atos integram a conduta); admite tentativa. Há quem defenda que na forma “exigir” o crime é
formal e na forma “receber” é material, embora, com a devida vênia, não concordemos com tal
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posição. O crime é sempre formal. O resultado naturalístico previsto no tipo penal, que não se exige
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seja atingido, não é o mero recebimento do documento, mas sim a possibilidade de dar causa à
instauração de um procedimento criminal. Assim, em ambas as formas o delito é formal.

DANO (163)

Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Dano qualificado

Parágrafo único - Se o crime é cometido:

I - com violência à pessoa ou grave ameaça;

II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave

III - contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia,


fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de
serviços públicos;

IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima:

Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Código Penal, por sua vez, cuidando da proteção ao patrimônio – bem constitucionalmente
protegido também –, tipificou a conduta de quem destrói, inutiliza ou deteriora coisa alheia. (Nucci,
2020)

Análise do núcleo do tipo: destruir quer dizer arruinar, extinguir ou eliminar; inutilizar significa tornar
inútil ou imprestável alguma coisa aos fins para os quais se destina; deteriorar é a conduta de quem
estraga ou corrompe alguma coisa parcialmente. Quem desaparece com coisa alheia,
lamentavelmente, não pratica crime algum. (Nucci, 2020)

Sujeitos ativo e passivo: tanto o ativo, quanto o passivo podem ser qualquer pessoa. (Nucci, 2020)

Elemento subjetivo: é o dolo. Não há forma culposa.(Nucci, 2020)

Jurisprudência:

TJMG: “I. Para a verificação do dolo do agente no crime previsto no art. 163 do CP, não se discute o
seu objetivo principal (dolo específico), bastando a vontade livre e consciente de se provocar o dano
(dolo genérico). II. Embora a substituição da pena privativa de liberdade seja benéfica ao réu, ela não
perde o seu caráter sancionatório, devendo ser suficiente para cumprir as funções retributiva e
preventiva da pena, sob o risco de se tornar inócua a reprimenda e gerar o sentimento de impunidade”
(Ap. Crim. 1.0144.13.001883-7/001-MG, 1.ª C. Crim., rel. Alberto Deodato Neto, 25.04.2017, v.u.).
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( p , , , , )
(Nucci, 2020)
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Conceito de coisa: é tudo aquilo que existe, podendo tratar-se de objetos inanimados ou de
semoventes. No contexto dos delitos contra o patrimônio (conjunto de bens suscetíveis de apreciação
econômica), cremos ser imprescindível que a coisa tenha, para seu dono ou possuidor, algum valor
econômico. Por isso, é razoável o entendimento daqueles que sustentam ser possível a configuração
do crime de dano quando houver pichação de propriedade alheia, uma vez que isso significa a
“deterioração” do bem, que fatalmente necessitará ser recuperado, causando prejuízo ao seu dono.
(Nucci, 2020)

Elemento normativo do tipo: alheia quer dizer pertencente a outra pessoa (posse ou propriedade)
que não é o agente. (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o material é a coisa que sofre a conduta criminosa do agente; o objeto
jurídico é o patrimônio. (Nucci, 2020)

Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou
especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente na diminuição do patrimônio
da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os
verbos implicam ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a
aplicação do art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea,
não se prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico
tutelado); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários
atos integram a conduta); admite tentativa.

Dano qualificado e bagatela: em tese, são incompatíveis, pois as circunstâncias envolvendo o tipo
qualificado ganham relevo por si sós, independendo do valor da lesão causada. Entretanto, a nós
parece deva-se analisar o caso concreto. (Nucci, 2020)

Jurisprudência

STJ: “A conduta de destruir, inutilizar ou deteriorar a coisa alheia, restrita ao tipo simples do crime
de dano, afronta unicamente o patrimônio privado, sendo plenamente possível o reconhecimento de
sua atipicidade material. Entrementes, nos termos do art. 163, parágrafo único, do Código Penal, o
crime de dano qualificado porta acréscimo substancial de reprovabilidade, diante da maior
periculosidade dos meios utilizados (incisos I e II), a maior relevância social de seu objeto atingido
(inciso III) ou pelas consequências para a vítima e mesquinhez do motivo (inciso IV). Nas hipóteses de
dano qualificado, independente do valor patrimonial do bem, havendo transcendência do bem jurídico
patrimonial, atingindo bens jurídicos outros, de relevância social, incabível a aplicação da bagatela,
diante da evidente periculosidade social da ação e maior grau de reprovabilidade da conduta. In casu,
o suposto comportamento do paciente mostrou-se extremamente reprovável, transcendendo o mero
prejuízo financeiro sofrido pela Administração Pública porquanto o bem danificado possui
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 128/171
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prejuízo financeiro sofrido pela Administração Pública, porquanto o bem danificado possui
inquestionável valor de relevância social, consistente no regular funcionamento dos órgãos policiais,
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que restou prejudicado, e o respeito às autoridades policiais, que é essencial à segurança pública” (HC
324.550-MT, 5.ª T., rel. Ribeiro Dantas, 16.06.2016, DJe 28.06.2016). (Nucci, 2020)

Violência ou grave ameaça à pessoa: a forma correta de redação deveria ser esta (violência ou
grave ameaça à pessoa), e não como consta no tipo (violência à pessoa e grave ameaça), já que
ambas as circunstâncias são dirigidas à pessoa humana. Trata-se da violência física ou da ameaça
séria voltada contra a pessoa, e não contra a coisa, pois a destruição, inutilização ou deterioração,
previstas no caput, já abrangem violência contra a coisa. (Nucci, 2020)

Emprego de substância inflamável ou explosiva: a utilização de material que se converte em


chamas com facilidade ou de material provocador de explosão pode qualificar o dano, se não se
constituir em crime mais grave. Esta é a natureza nitidamente subsidiária da qualificadora. (Nucci,
2020)

Assim, se alguém explodir o veículo da vítima em um descampado, longe de outras pessoas,


comete dano qualificado. Entretanto, se o fizer em zona urbana, colocando em risco a segurança
alheia, comete outro delito mais grave (explosão – art. 251, CP). (Nucci, 2020)

Patrimônio público: quem danifica bem público deve responder mais gravemente, pois o prejuízo é
coletivo, e não individual. Logo, mais pessoas são atingidas pela conduta criminosa. Na lição de
MAGALHÃES NORONHA, “à expressão patrimônio, usada no dispositivo, não se pode dar o sentido
restrito do inciso III do art. 66 do Código Civil [atual art. 99, III]. Se assim fosse, excluir-se-iam do
gravame bens como as ruas, praças e edifícios, que são de uso comum do povo e de uso especial, para
os quais, entretanto, milita a mesma razão de maior tutela. O vocábulo patrimônio tem, portanto,
acepção ampla, abrangendo não só os dominiais como os de uso comum do povo e os de uso especial
(CC, art. 66, I e II) [atual art. 99, I e II]” (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

Aplicando-se o princípio da insignificância: STJ: “A jurisprudência desta Corte Superior assentou


que o delito previsto no art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal cuida de conduta que provoca
lesão a bem jurídico de relevante valor social e afeta toda a coletividade, razão pela qual não cabe a
aplicação do princípio da insignificância” (AgRg no HC 462.482/SC, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz,
07.05.2019, v.u.); (Nucci, 2020)

A figura típica do delito previsto no art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal cuida-se de
conduta que provoca lesão a bem jurídico de relevante valor social, afetando toda a coletividade, razão
pela qual não cabe a aplicação do princípio da insignificância. Precedentes. Incidência do enunciado n.
83 da Súmula do STJ” (AgRg no AREsp 1006934-MS, 5.ª T., rel. Joel Paciornik, 21.11.2017, v.u.).
(Nucci, 2020)

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 129/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Preso que danifica a cadeia para fugir: entendíamos que deveria responder, sempre, por crime de
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dano qualificado, pois não se exigiria, no tipo penal, qualquer elemento subjetivo específico,
consistente na intenção de causar prejuízo. Logo, se destruísse ou deteriorasse a cela para escapar,
mereceria responder pelo que fez. Entretanto, melhor refletindo, para escapar da prisão (algo que
configura apenas falta grave para condenados), sem agredir pessoa, a única forma é destruindo algum
obstáculo (do contrário, nem seria prisão). Assim sendo, cremos estar embutido, para haver dano, o
elemento subjetivo específico, calcado na vontade de causar dano gratuito ao estabelecimento. Nesse
prisma, exigindo dolo específico:

STJ: “1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o delito de dano ao
patrimônio público, quando praticado por preso para facilitar a fuga do estabelecimento prisional,
demanda a demonstração do dolo específico de causar prejuízo ao bem público (Precedentes). 2. Na
espécie, os presos danificaram as celas 1 e 2, retirando barra de ferro do banheiro com o objetivo de
arrombar a grade que ligava o corredor ao pátio do estabelecimento prisional. 3. Os termos da
denúncia e os depoimentos coletados durante a investigação policial demonstram que o dano ao
patrimônio público fora praticado pelo recorrente com o objetivo único de evadir-se do
estabelecimento prisional. Desse modo, não havendo elementos a demonstrar o dolo específico
necessário à configuração do delito descrito no art. art. 163, parágrafo único, inciso III, do Código
Penal, impõe-se o reconhecimento da atipicidade da conduta. 4. Recurso ordinário provido para
declarar atípica a conduta e extinguir a Ação Penal n. 0000929-96.2011.8.02.0040, Vara Única da
Comarca de Atalaia” (RHC 56.629-AL, 6.ª T., rel. Antonio Saldanha Palheiro, 30.06.2016, DJe
01.08.2016). (Nucci, 2020)

Motivo egoístico: é um particular motivo torpe o egoísmo. Quem danifica patrimônio alheio
somente para satisfazer um capricho ou incentivar um desejo de vingança ou ódio pela vítima deve
responder mais gravemente pelo que faz. Ex.: o agente destrói a motocicleta do colega de classe
somente para ser o único da sua turma a ter aquele tipo de veículo. Há quem sustente que um mero
“sentimento pessoal de vingança” não serve para qualificar o delito, havendo necessidade de existir
um objetivo posterior de ordem econômica, com o que não concordamos. A motivação egoística liga-
se exclusivamente ao excessivo amor-próprio do agente, ainda que ele não possua interesse
econômico envolvido. (Nucci, 2020)

Prejuízo considerável para a vítima: quando o crime de dano provoca na vítima um prejuízo de
elevado custo, sendo esta a intenção do agente, é preciso puni-lo mais gravemente. Assim, por
exemplo, é a conduta daquele que destrói a casa do inimigo, causando-lhe imenso transtorno e vultosa
diminuição patrimonial. Prejuízo considerável para a vítima: quando o crime de dano provoca na vítima
um prejuízo de elevado custo, sendo esta a intenção do agente, é preciso puni-lo mais gravemente.
Assim, por exemplo, é a conduta daquele que destrói a casa do inimigo, causando-lhe imenso
transtorno e vultosa diminuição patrimonial.

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 130/171
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APROPRIAÇÃO IINDÉBITA (168)

Apropriação indébita

Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Aumento de pena

§ 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa:

I - em depósito necessário;

II - na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário


judicial;

III - em razão de ofício, emprego ou profissão.

Análise do núcleo do tipo: apropriar-se significa apossar-se ou tomar como sua coisa que pertence a
outra pessoa. Cremos que a intenção é proteger tanto a propriedade, quanto a posse, conforme o caso.
Num primeiro momento, há a confiança do proprietário ou possuidor, entregando algo para a guarda ou
uso do agente; no exato momento em que este é chamado a devolver o bem confiado, negando-se,
provoca a inversão da posse e a consumação do delito. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “O Tribunal de origem combateu e rechaçou a tese de atipicidade por falta de posse do numerário,
apontando que o paciente sacou os valores depositados por ordem judicial em caderneta de poupança
de que ele mesmo era titular, apesar de ciente de que não poderia movimentá-los, e quando chamado a
restituí-los, não atendeu a determinação. Desse modo, caracteriza-se indevida inversão da posse,
diante da configuração do animus rem sibi habendi” (HC 117.764-SP, 6.ª T., rel. Og Fernandes,
27.10.2009, v.u.). (Nucci, 2020)

Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é a pessoa que tem a posse ou a detenção de coisa alheia; o
sujeito passivo é o senhor da coisa dada ao sujeito ativo. (Nucci, 2020)

Elemento subjetivo: é o dolo. Não existe a forma culposa. Entendemos não haver, também, elemento
subjetivo do tipo específico. A vontade específica de pretender apossar-se de coisa pertencente a
outra pessoa está ínsita no verbo “apropriar-se”. Portanto, incidindo o dolo sobre o núcleo do tipo, é
isso suficiente para configurar o crime de apropriação indébita. Quando a não devolução decorrer de
outro elemento subjetivo, tal como a negligência ou o esquecimento, não está caracterizada a infração
penal. (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a coisa alheia móvel; o objeto jurídico é o patrimônio.
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 131/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Objetos ate a e ju d co: o objeto ate a é a co sa a e a ó e ; o objeto ju d co é o pat ô o.
(Nucci, 2020)
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Posse ou detenção: a coisa precisa ter sido dada ao agente para que dela usufruísse, tirando alguma
vantagem e exercitando a posse direta, ou pode ter sido dada para que fosse utilizada em nome de
quem a deu, ou seja, sob instruções ou ordens suas. A posse ou a detenção devem existir previamente
ao crime e precisam ser legítimas. (Nucci, 2020)

Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que demanda sujeito ativo qualificado ou especial, no
caso o indivíduo que recebeu a coisa em confiança); material (delito que exige resultado naturalístico,
consistente na diminuição do patrimônio da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por
qualquer meio eleito pelo agente); comissivo ou omissivo (“apropriar-se” pode implicar em ação ou
omissão) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do
art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se
prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico tutelado);
unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); unissubsistente ou plurissubsistente (pode
haver um único ato ou vários atos integrando a conduta); admite tentativa, conforme o meio eleito pelo
agente. (Nucci, 2020)

Reparação do dano: o Código Penal não elegeu a reparação do dano, nos delitos patrimoniais, como
causa que pudesse afastar a punibilidade do agente, devendo-se aplicar o art. 16 (arrependimento
posterior), que é somente causa de redução da pena, dentro das condições ali especificadas.
Entretanto, é lógico que, havendo reparação integral do dano, logo após a negativa de restituição da
coisa dada ao agente, é possível excluir o dolo, ou seja, a vontade de se apropriar de coisa alheia.
Conforme o caso concreto, portanto, cremos ser curial a análise da tipicidade, verificando-se se, de
fato, o sujeito queria se apossar da coisa alheia. Entretanto, a mera devolução da coisa, antes do
recebimento da denúncia, não afasta o crime: (Nucci, 2020)

STF: “O ressarcimento do dano, após a consumação do crime de apropriação indébita (CP, art. 168) e
antes de oferecida a denúncia, não extingue, por falta de previsão legal, a punibilidade. Com base
nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia, sob a alegação de falta de
justa causa, o trancamento de ação penal proposta contra o paciente pela suposta prática de delito de
apropriação indébita, consistente no fato de, na condição de advogado, ter deixado de repassar
quantia que recebera, procedente de ação cível, ao detentor da titularidade do direito substancial” (HC
86.649-SP, 1.ª T., rel. Marco Aurélio, 08.11.2005, Informativo 408). (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ, no crime de apropriação indébita o ressarcimento do dano não exclui a tipicidade, apenas
configura causa de redução da pena, se praticada antes do recebimento da denúncia, conforme artigo
16 do Código Penal – CP, o qual trata do arrependimento posterior. Precedentes. Ademais, a
apropriação indébita tem como objetividade jurídica a proteção do patrimônio, não se aplicando a esse
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 132/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

delito institutos exclusivos dos crimes contra a ordem tributária, em atenção aos princípios da
@prof.joaobittenocurt
legalidade e especialidade” HC 452.163/RS, 5.ª T., rel. Joel Ilan Paciornik, 19.02.2019, v.u.). (Nucci,
2020)

Causas de aumento da pena: não se trata de § 1.º, mas sim de autêntico parágrafo único. Houve, na
realidade, um lapso do legislador na enumeração do art. 168. Quando estiver presente alguma dessas
causas, deve o agente responder por uma pena mais grave, concretizada através de um aumento de
um terço. (Nucci, 2020)

Depósito necessário: está a demonstrar que o sujeito passivo não tinha outra opção a não ser confiar a
coisa ao agente. Por isso, se sua confiança é atraiçoada, deve o sujeito ativo responder mais
gravemente pelo que fez. Entende, majoritariamente, a doutrina ser “depósito necessário”, para
configurar esta causa de aumento, o depósito miserável, previsto no art. 647, II, do Código Civil, ou
seja, o depósito que se efetua por ocasião de calamidade (incêndio, inundação, naufrágio ou saque).
(Nucci, 2020)

Nas outras hipóteses de depósito necessário (arts. 647, I, e 649 do Código Civil), que tratam dos
casos de desempenho de obrigação legal ou depósito de bagagens dos viajantes, hóspedes ou
fregueses em casas de hospedagem, resolve-se com outras figuras típicas: peculato (quando for
funcionário público o sujeito ativo), apropriação qualificada pela qualidade de depositário judicial ou
apropriação qualificada em razão de ofício, emprego ou profissão. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STF: “Imputação do crime de apropriação indébita. Art. 168, § 1.º, I, do CP. Não devolução de
veículo objeto de contrato de compra e venda, depois da desconstituição amigável deste. Fato
absolutamente atípico. Caso de mero inadimplemento de obrigação de restituir, oriunda do
desfazimento do negócio jurídico. Simples ilícito civil. Inexistência de obrigação original de devolver
coisa alheia móvel e, sobretudo, de depósito necessário, inconcebível na hipótese. Caso de posse
contratual. Inépcia caracterizada. Absolvição do réu” (AP 480-PR, T. P., rel. Cezar Peluso, 11.03.2010,
m.v.). (Nucci, 2020)

Qualidade da pessoa: o tutor, o curador, o síndico, o liquidatário, o inventariante, o testamenteiro e o


depositário judicial são pessoas que, em regra, recebem coisas de outrem para guardar consigo,
necessariamente, até que seja o momento de devolver. Por isso, devem responder mais gravemente
pela apropriação. O rol não pode ser ampliado. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “A figura do síndico a que se refere o inciso II do § 1.º do art. 168 do Código Penal diz respeito
ao síndico da massa falida, hoje denominado administrador judicial (Lei 11.101/2005), e não ao
síndico de condomínio edilício” (REsp 1552919-SP, 5.ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 24.05.2016,
) ( )
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 133/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
DJe 01.06.2016). (Nucci, 2020)
@prof.joaobittenocurt
Ofício, emprego ou profissão: a apropriação, quando cometida por pessoas que, por conta das suas
atividades profissionais de um modo geral, terminam recebendo coisas, através de posse ou detenção,
para devolução futura, é mais grave. Por isso, merece o autor pena mais severa. Não vemos
necessidade, nesta hipótese, de haver relação de confiança entre o autor e a vítima, pois o tipo penal
não a exige – diferentemente do que ocorre no caso do furto qualificado (art. 155, § 4.º, II). (Nucci,
2020)

Jurisprudência:

STJ: “2. Não há como se afastar a circunstância agravante prevista no inciso III do § 1º do art. 168
do Código Penal – CP, porquanto a apropriação indébita ocorreu em decorrência do paciente ter se
apropriado de dinheiro recebido por ter proposto, na qualidade de advogado, ação previdenciária” (HC
454.519/RJ, 5.ª T., rel. Joel Ilan Paciornik, 21.05.2019, v.u.). (Nucci, 2020)

TJSC: “O advogado que, em razão do ofício, recebe valores pertencentes a sua cliente e não os
repassa, bem como se recusa a restituir tal verba, pratica o delito de apropriação indébita. Os fatos
refogem do âmbito do mérito ilícito civil quando o agente, após diversas solicitações da vítima, nega-
se a devolver o valor apropriado e passa a dispor da coisa como se sua fosse. (...) No caso, a forma
como se portou o agente, que apresentou escusas infundadas para justificar o apossamento sobre a
coisa, repassou cheque sem fundo à vítima e, mesmo após ser condenado em ação de cobrança,
deixou de restituir integralmente o valor devido, revelam a vontade livre e consciente de apropriar-se
de quantia monetária” (2013.035462-8-Araranguá, 1.ª C. Crim., rel.Carlos Alberto Civinski, 07.04.2015,
v.u.). (Nucci, 2020)

Apropriação indébita contra idoso: a Lei 10.741/2003 criou a seguinte figura típica, no art. 102:
“Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-
lhes aplicação diversa da de sua finalidade: Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa”.
Portanto, havendo apropriação de coisa alheia móvel de pessoa maior de 60 anos, segue-se o disposto
na lei especial e não mais o preceituado no art. 168 do Código Penal, embora a pena seja a mesma.
(Nucci, 2020)

Uma crítica merece ser feita, no entanto. As figuras de aumento de um terço, previstas no § 1.º do
art. 168, não mais podem ser utilizadas para o crime contra o idoso. Assim, ilustrando, caso um
advogado se aproprie do dinheiro do cliente com mais de 60 anos, a pena será fixada entre 1 e 4 anos
de reclusão e multa, mas sem o aumento de crime praticado em razão de ofício, emprego ou profissão,
pois forma não prevista no Estatuto do Idoso. No mais, a alteração deu-se no tocante à maior extensão
da figura típica da apropriação criada pelo Estatuto do Idoso, que não menciona somente coisa móvel,
mas fala genericamente de bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento e não exige que
estejam eles na posse ou detenção do autor do crime. Apropriação indébita contra idoso: a Lei
10 741/2003 criou a seguinte figura típica no art 102: “Apropriar se de ou desviar bens proventos
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
10.741/2003 criou a seguinte figura típica, no art. 102: Apropriar-se de ou desviar bens, proventos,
pensão ou@prof.joaobittenocurt
qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade:
Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa”. Portanto, havendo apropriação de coisa alheia
móvel de pessoa maior de 60 anos, segue-se o disposto na lei especial e não mais o preceituado no
art. 168 do Código Penal, embora a pena seja a mesma. (Nucci, 2020)

É natural que, no tocante ao verbo apropriar-se (tomar posse de algo que pertence a outra pessoa),
como regra, o objeto do delito esteja na posse ou detenção de quem o retira da esfera de
disponibilidade do idoso. Excepcionalmente, pode o agente apossar-se daquilo que não detinha antes,
quase equiparando a figura da apropriação ao furto. Por outro lado, na modalidade desviar (alterar o
destino, afastar ou desencaminhar), a figura da lei especial possibilita a configuração do crime ainda
que o agente não retenha para si o valor retirado da esfera de disponibilidade do idoso, podendo, por
exemplo, encaminhar a terceiro. Consultar, ainda, a modificação ocorrida no art. 183, introduzindo o
inciso III, que não mais permite a aplicação da imunidade a parentes que cometam delito patrimonial
quando envolver o idoso. (Nucci, 2020)

APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA (168-A)

Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no
prazo e forma legal ou convencional:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que
tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;

II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis
ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social.

§ 2o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o


pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência
social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.

§ 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for
primário e de bons antecedentes, desde que:

I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou

II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele
estabelecido pela previdência social administrativamente como sendo o mínimo para o ajuizamento
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 135/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento
de suas execuções fiscais.
@prof.joaobittenocurt
§ 4o A faculdade prevista no § 3o deste artigo não se aplica aos casos de parcelamento de
contribuições cujo valor, inclusive dos acessórios, seja superior àquele estabelecido,
administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.

Conceito de seguridade social e diferença da previdência social: ensina Celso Barroso Leite que “a
seguridade social deve ser entendida e conceituada como o conjunto das medidas com as quais o
Estado, agente da sociedade, procura atender à necessidade que o ser humano tem de segurança na
adversidade, de tranquilidade quanto ao dia de amanhã. A capacidade de pensar é uma das
características mais marcantes do homem; e pensar no futuro é uma forma ao mesmo tempo natural e
avançada de exercer essa capacidade. (...) As necessidades essenciais de cada indivíduo, a que a
sociedade deve atender, tornam-se na realidade necessidades sociais, pois quando não são atendidas
repercutem sobre os demais indivíduos e sobre a sociedade inteira” (apud WAGNER BALERA, Curso de
direito previdenciário, p. 20). (Nucci, 2021)

Há diferença entre seguridade social e previdência social. A primeira é o gênero do qual é espécie a
segunda. Explica, ainda, Celso Barroso Leite que “a previdência social é o mais importante dos
programas de seguridade social; a tal ponto que essa predominância chega a concorrer para certa
confusão entre as duas expressões. Sabe-se igualmente que a previdência social se destina à
população economicamente ativa, ou seja, a quem exerce atividade remunerada – no fundo a garantia
primeira pelo menos dos recursos essenciais à subsistência. Poderia, então, parecer pouco coerente,
para não dizer contraditório, o fato de a seguridade social começar pela parte da população que em
tese menos necessita dela. (...) Seja como for, repito, a Constituição caracterizou bem cada coisa e
distinguiu o todo das partes e estas uma das outras. Assim, não há como confundir seguridade social
e previdência social. (Nucci, 2020)

Já apontei uma das possíveis causas dessa confusão: a terminologia estrangeira e internacional.
Outra, também já mencionada, é a especificidade e o maior porte da previdência social, cujas
despesas com o pagamento dos benefícios superam com folga as dos demais programas” (ob. cit., p.
27). A Lei 8.212/91, que continha os crimes previdenciários, utilizava a expressão “seguridade social”,
enquanto a atual previsão, trazida pela Lei 9.983/2000, vale-se de “previdência social”. Embora
creiamos que deveria ter sido mantida a anterior expressão – seguridade social, que é mais
abrangente –, é bem verdade que a contribuição previdenciária diz respeito, diretamente, ao custeio da
previdência social, razão pela qual optou o legislador por substituir o gênero pela espécie na redação
dos novos tipos penais. (Nucci, 2020)

Abrangência do título (nomen juris): é válida a rubrica – apropriação indébita previdenciária – para
todas as figuras previstas neste artigo: caput e § 1.º.

Análise do núcleo do tipo: deixar de repassar significa não transferir quantia à unidade
d i i t ti bí l O bj t d
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d t i i é t ib i ã lhid d t ib i t 136/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
administrativa cabível. O objeto da conduta omissiva é a contribuição recolhida dos contribuintes.
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Jurisprudência:

STJ: “I – É assente o entendimento já consolidado nesta Corte que ‘o tipo penal do artigo 168-A do
Código Penal constitui crime omissivo próprio, que se consuma com o não recolhimento da
contribuição previdenciária dentro do prazo e das formas legais, inexigindo a demonstração do dolo
específico’ (AgRg no AREsp 774.580/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 04/04/2018)”
(AgRg no AREsp 1040813-SP, 5.ª T., rel. Felix Fischer, 17.05.2018, v.u.). (Nucci, 2020)

Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é o substituto tributário, que tem, por lei, o dever de recolher
determinada quantia, também legalmente prevista, do contribuinte e repassá-la à previdência social.
Há posição que não permite figurar como sujeito ativo representante de pessoa jurídica de Direito
Público. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

TRF-2.ª Região: “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito vem dispensando


tratamento diversificado, em crimes da mesma natureza que o presente, conforme sejam os ilícitos
praticados por representantes de pessoas jurídicas de direito privado ou de direito público. No primeiro
caso, pessoas de direito privado, há, em tese, uma apropriação indevida de valores descontados a
título de contribuição social por entidades particulares. No segundo, pessoas de direito público, ainda
que os valores descontados não sejam repassados à Autarquia Previdenciária (INSS) [atualmente, a
competência para a arrecadação dos valores atinentes a contribuições sociais do RGPS é da
Secretaria da Receita Federal do Brasil – Lei 11.457/2007, art. 2.º], não se pode afirmar, propriamente,
a apropriação de valores por particulares, haja vista que a natureza pública do órgão arrecadador
determina que tais valores permaneçam sob administração e emprego públicos” (Ap.
200051130003310, 5.ª T., rel. Alberto Nogueira, 19.10.2004, v.u.). (Nucci, 2020)

O sujeito passivo é o Estado, especificamente o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não se pune a forma culposa. Cremos existir elemento
subjetivo do tipo específico, consubstanciado na vontade de fraudar a previdência, apossando-se,
indevidamente, de quantias não pertencentes ao agente. Aliás, não foi à toa que o legislador utilizou,
para denominar os crimes previstos neste artigo, de apropriação indébita previdenciária. É controversa
essa posição. Na doutrina, exigindo apenas o dolo, sem elemento subjetivo específico: ANTONIO
LOPES MONTEIRO (Crimes contra a Previdência Social, p. 37). Melhor analisaremos essa questão na
próxima nota, embora reconheçamos que, atualmente, tem prevalecido, nos tribunais, a corrente que
defende apenas o dolo, sem elemento subjetivo específico. (Nucci, 2020)

Exigência do elemento subjetivo específico (dolo específico): a polêmica em torno dessa exigência
teve início por ocasião da criação do tipo penal incriminador previsto no art. 95, d, da Lei 8.212/91 (ora
revogado pela Lei 9.983/2000), que estabeleceu o tipo omissivo próprio consistente em deixar de
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 137/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
revogado pela Lei 9.983/2000), que estabeleceu o tipo omissivo próprio consistente em deixar de
recolher contribuição devida à Seguridade Social. Primeiramente, pretendeu-se equiparar o referido
@prof.joaobittenocurt
delito do art. 95, d, ao crime de apropriação, previsto no art. 168 do Código Penal. Fazendo-se tal
equiparação, seria natural exigir, para a configuração do delito previdenciário, elemento subjetivo do
tipo específico (dolo específico), que é ínsito à conduta de “apropriar-se”, como se explicou nos
comentários formulados ao art. 168 supra. A apropriação significa a pretensão de apossar-se de coisa
pertencente a outra pessoa, o que não era, em tese, exigido no crime previsto no art. 95, d. Era a
posição adotada por Roque Antônio Carrazza (apud CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, Contribuições
previdenciárias. Não recolhimento. Art. 95, d, da Lei 8.212/91. Inconstitucionalidade, p. 507). Em
oposição, havia o entendimento daqueles que defendiam a não equiparação da figura criminosa
previdenciária à apropriação indébita. Nesse sentido, menciona o Juiz Federal Celso Kipper: “Sendo
estruturalmente diferentes os tipos da apropriação indébita e do crime de não recolhimento das
contribuições arrecadadas dos segurados, não há equiparação possível entre os dois delitos no
tocante às condutas descritas nos tipos penais. O crime de não recolhimento, na época própria, da
contribuição devida à Previdência e arrecadada de terceiros não é, portanto, crime de apropriação.
Deste, as leis previdenciárias anteriores à Lei 8.137/90 só haviam aproveitado a pena (equiparação
quoad poenam). A primeira consequência da estrutura omissiva do tipo do delito de não recolhimento
das contribuições arrecadadas dos segurados, e da não equiparação ao crime de apropriação indébita,
é a de que não se exige para a consumação do primeiro o animus rem sibi habendi, ou seja, o propósito
de inverter o título da posse passando a possuir a coisa como se fosse sua, com a deliberada intenção
de não restituir, própria da acepção do vocábulo apropriar-se, elemento integrativo do tipo penal do
segundo delito. Havendo o desconto dos empregados das quantias relativas à contribuição
previdenciária, e a posterior omissão no seu recolhimento aos cofres da Seguridade Social, consuma-
se o delito, sem que seja preciso investigar, no animus do agente, a intenção de restituir ou não as
quantias descontadas. O dolo necessário é o genérico, consistente na intenção de descontar do salário
dos empregados as quantias referentes e de deixar de repassá-las à Seguridade Social” (apud
CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, Contribuições previdenciárias. Não recolhimento. Art. 95, d, da Lei
8.212/91. Inconstitucionalidade, p. 505-506). A posição intermediária, com a qual concordamos
plenamente, terminou prevalecendo, isto é, não há equiparação entre o crime previdenciário, que prevê
uma figura omissiva própria, e a apropriação indébita. Entretanto, não se pode admitir que inexista
elemento subjetivo do tipo específico, consistente na especial vontade de se apossar de quantia
pertencente ao INSS. Transformar o crime previdenciário num delito de mera conduta, sem qualquer
finalidade especial, seria indevido, porque transformaria a lei penal num instrumento de cobrança.
Assim, o devedor que, mesmo sem intenção de se apropriar da contribuição, deixasse de recolhê-la a
tempo, ao invés de ser executado pelas vias cabíveis, terminaria criminalmente processado e
condenado. Haveria nítida inconstitucionalidade da figura típica, pois a Constituição veda prisão civil
por dívida, e o legislador, criando um modelo legal de conduta proibida sem qualquer animus rem sibi
habendi, estaria buscando a cobrança de uma dívida civil através da ameaça de sancionar penalmente
o devedor Entretanto demandando-se o dolo específico – a vontade de fraudar a previdência
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 138/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
o devedor. Entretanto, demandando se o dolo específico a vontade de fraudar a previdência,
apossando-se do que não lhe pertence –, deixa de existir mera cobrança de dívida, surgindo o
@prof.joaobittenocurt
elemento indispensável para configurar o delito previdenciário. É o que defende HUGO DE BRITO
MACHADO: “A lei ordinária que define como crime o simples inadimplemento de uma dívida, e comina
para o que nele incorre pena prisional, conflita com a norma da Constituição que proíbe a prisão por
dívida. Há, na verdade, evidente antinomia entre a norma da Constituição, que proíbe a prisão por
dívida, e aquela da lei ordinária, que define como crime o inadimplemento de dívida, para viabilizar,
dessa forma, a aplicação da pena prisional ao devedor inadimplente”. Sustenta, então, para contornar a
inconstitucionalidade do crime de mera conduta, a exigência do dolo específico (elementar subjetiva)
para fazer valer o tipo incriminador, já tendo decidido a esse respeito o TRF, 5.ª Reg., 1.ª T., j.
01.12.1994, DJU, Seção I, 10.03.1996 (citado por CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, Contribuições
previdenciárias. Não recolhimento. Art. 95, d, da Lei 8.212/91. Inconstitucionalidade, p. 507). No
mesmo prisma: MISABEL ABREU MACHADO DERZI, HELOÍSA ESTELLITA SALOMÃO e LEÔNIDAS
RIBEIRO SCHOLZ (artigo citado, p. 507). Em síntese, pois, exige-se o elemento subjetivo específico
para que os tipos penais incriminadores previdenciários, omissivos próprios – seja o do art. 168-A,
seja o previsto no § 1.º, I, que é repetição do art. 95, d, da Lei 8.212/91, não padeçam do mal da
inconstitucionalidade. Ainda assim, convém mencionar a lição de CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, que,
não se convencendo da exigência do dolo específico, sustentava a inconstitucionalidade do
mencionado crime previsto no art. 95, d, da Lei 8.212/91, embora não concordemos com a conclusão
extraída. Seus argumentos continuam válidos, pois as figuras omissivas foram, com pequenas
alterações, repetidas pela Lei 9.983/2000, que alterou o Código Penal. Evoca o autor paranaense a
interpretação enunciativa, isto é, quando o intérprete se limita a enunciar uma nova regra, derivada da
anterior. Exemplo disso seria a interpretação de que a lei que proíbe o menos proíbe o mais. Conclui,
portanto, que, proibida constitucionalmente a prisão civil, implicitamente está proibido também o mais,
que é a prisão criminal. E preleciona: “A simples tipificação como crime da conduta omissiva do sujeito
passivo tributário (contribuinte ou responsável) não é compatível com o texto constitucional à luz de
uma leitura mais sofisticada e, especialmente, compromissada com a efetividade da Constituição,
assim como dos direitos fundamentais que ela proclama” (artigo citado, p. 511). Por outro lado,
segundo o mesmo autor, o crime de apropriação indébita previdenciária estaria a ferir o princípio da
proporcionalidade: “É evidente que o legislador se houve com excesso. Ele não está a tipificar a
conduta fraudulenta, o abuso de confiança (como faz a lei penal-tributária portuguesa, v. g., ou a
legislação brasileira revogada), a apropriação em proveito próprio, mas apenas, através de um tipo
omissivo próprio, a conduta (no sentido genérico) consistente em não pagar (satisfazer) obrigação
tributária. (...) A medida, depois, é desproporcionada, agredindo o princípio da justa medida. É, por isso
mesmo, excessiva, desmedida, desajustada, irracional e desarrazoada, resultando na aniquilação
injustificada do direito de não sujeição à privação da liberdade por dívida, previsto no art. 5.º, LXVII, da
Lei Fundamental da República. Neste ponto é preciso lembrar que o interesse protegido pela norma
penal (arrecadação do Estado) não é suficiente para justificar a aniquilação do direito fundamental.
Reitere-se: o poder de legislar não implica o de destruir!” (Contribuições previdenciárias Não
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 139/171
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Reitere-se: o poder de legislar não implica o de destruir! (Contribuições previdenciárias. Não
@prof.joaobittenocurt
recolhimento. Art. 95, d, da Lei 8.212/91. Inconstitucionalidade, p. 525). (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “I – ‘É assente o entendimento já consolidado nesta Corte que ‘o tipo penal do artigo 168-A do
Código Penal constitui crime omissivo próprio, que se consuma com o não recolhimento da
contribuição previdenciária dentro do prazo e das formas legais, inexigindo a demonstração do dolo
específico’ (AgRg no AREsp n. 774.580/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 04/04/2018)”
(AgRg no REsp 1.799.126/RN, 5.ª T., rel. Felix Fischer, 06.06.2019, v.u.). (Nucci, 2020)

TRF-3: “O dolo no crime de apropriação indébita previdenciária, conforme pacificado pelo E.


Superior Tribunal de Justiça, resta caracterizado com a vontade de não repassar ao INSS as
contribuições recolhidas dentro do prazo e forma legais, não se exigindo o animus rem sibi habendi.
Prescindível é a demonstração do dolo específico como elemento essencial do tipo inscrito no artigo
168-A do Código Penal, ou seja, para a configuração do delito basta que o agente tenha descontado
dos salários dos trabalhadores os valores que estes estão obrigados a contribuir para a Previdência
Social e deixado de repassá-los à Autarquia na época própria, o que aconteceu no caso ora posto” (Ap.
52100-MS, 1.ª T., rel. Hélio Nogueira, 11.07.2017, m.v.). (Nucci, 2020)

Previdência social: como já mencionado, a previdência social é uma das atividades da seguridade
social, tendo por finalidade cobrir as “situações de incapacidade do trabalhador por doença, invalidez,
morte ou idade (auxílios, aposentadorias, pensão), desemprego involuntário (seguro-desemprego),
salário-família e auxílio-reclusão para os segurados de baixa renda (o art. 13 da EC 20 fixou em R$
360,00 e que devem ser reajustados), pensão por morte” (EROS PICELI, ob. cit., p. 32). 20.
Contribuições previdenciárias: são espécies de tributos, subordinando-se aos mesmos princípios que
regem o fenômeno tributário no direito, como diz Aliomar Baleeiro (apud WAGNER BALERA, Curso de
direito previdenciário, p. 45).

Diversidade da figura do caput e da prevista no § 1.º: aparentemente, deixar de repassar à


previdência social as contribuições recolhidas seria o mesmo que deixar de recolher contribuição
destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a
terceiros ou arrecadada do público, o que não corresponde à realidade. A figura do caput tem por fim
punir o substituto tributário que deve recolher o que arrecadou do contribuinte à previdência social e
não o faz. É a aplicação do art. 31 da Lei 8.212/91: “A empresa contratante de serviços executados
mediante cessão de mão de obra, inclusive em regime de trabalho temporário, deverá reter 11% (onze
por cento) do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher, em nome da
empresa cedente da mão de obra, a importância retida até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da
emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver
expediente bancário naquele dia, observado o disposto no § 5.º do art. 33 desta Lei” (redação dada
pela Lei 11.933/2009). A outra figura típica, como será visto, volta-se diretamente ao contribuinte-
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empresário que deve recolher a contribuição arrecadada dos seus funcionários. (Nucci, 2020)
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Prazo e forma legal ou convencional: trata-se de norma penal em branco, merecendo o
complemento de outras leis e regulamentos. Especialmente, deve-se consultar a Lei 8.212/91, que traz
os prazos e as formas legais para o repasse ser feito. (Nucci, 2020)

Objetos material e jurídico: o objeto material é a contribuição recolhida do contribuinte. O objeto


jurídico é a seguridade social. É a tutela da subsistência financeira da previdência social. (Nucci, 2020)

Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que só pode ser cometido por sujeito qualificado,
que é o substituto tributário); formal (delito que não exige, para sua consumação, a ocorrência de
resultado naturalístico). Cremos ser formal e não simplesmente de mera conduta, pois a falta de
repasse, conforme o montante e a frequência, pode causar autênticos “rombos” nas contas da
previdência social, que constituem nítido e visível prejuízo para a Administração Pública. É crime de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); omissivo (o verbo implica
abstenção); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo, dando-se em momento
determinado): (Nucci, 2020)

Jurisprudência

STJ: “O crime de apropriação indébita previdenciária é instantâneo e unissubsistente. A cada vez


que é ultrapassado in albis o prazo para o recolhimento dos tributos, há a ocorrência de um novo
delito. Assim, não prospera a tese de que a omissão no pagamento de contribuições referentes a
meses diversos, mesmo que consecutivos, deve ser considerada como sendo um só crime – cuja
consumação de prolongou no tempo –, e não como vários delitos em continuidade, como
reconheceram a sentença condenatória e o acórdão que a manteve, em apelação” (HC 129.641-SC, 6.ª
T., j. 04.09.2012, v.u., rel. Sebastião Reis Júnior); unissubjetivo (aquele que pode ser cometido por um
único sujeito); unissubsistente (praticado num único ato); não admite tentativa. (Nucci, 2020)

Competência: é da Justiça Federal e a ação é pública incondicionada. (Nucci, 2020)

Condição objetiva de punibilidade: é fundamental que a apuração do débito, na esfera


administrativa, tenha sido concluída. Do contrário, torna-se inviável o ajuizamento de ação penal por
apropriação indébita de contribuição previdenciária. (Nucci, 2020)

Jurisprudência

STJ: “Segundo entendimento adotado por esta Corte Superior de Justiça, os crimes de sonegação
de contribuição previdenciária e apropriação indébita previdenciária, por se tratarem de delitos de
caráter material, somente se configuram após a constituição definitiva, no âmbito administrativo,
reconhecendo a regularidade do respectivo crédito (Precedentes)” (RHC 28.798-PR, 5.ª T., j.
23.10.2012, v.u., rel. Campos Marques). “Cinge-se a questão em saber se, em relação ao delito de
apropriação indébita previdenciária, previsto no art. 168-A do CP, faz-se necessário o exaurimento da
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via administrativa em que se discute a exigibilidade do crédito tributário. Isso posto, a Turma negou
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provimento ao recurso ao entendimento de que, em relação ao delito de apropriação indébita
previdenciária, exige-se a constituição definitiva do crédito tributário para que se dê início à
persecução criminal. Precedentes citados: HC 96.348-BA, DJ 04.08.2008, e HC 82.397-RJ, DJ
19.05.2008” (REsp 1.028.984-MT, 5.ª T., rel. Felix Fischer, 02.10.2008). (Nucci, 2020)

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que
tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;

II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis
ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social.

Análise do núcleo do tipo: deixar de recolher significa não arrecadar ou não entregar à previdência
social o que lhe é devido. O objeto é a contribuição ou outra importância destinada à previdência. A
figura corresponde ao antigo art. 95, d, da Lei 8.212/91. (Nucci, 2020)

Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é o “titular de firma individual, os sócios solidários, os
gerentes, diretores ou administradores que efetivamente tenham participado da administração da
empresa a ponto de concorrer de maneira eficaz para a conduta punível” (EROS PICELI, ob. cit., p. 29).
O sujeito passivo é o Estado, especificamente o INSS. 28. Elemento subjetivo do tipo: ver nota 17 ao
caput. 29. Prazo legal: é norma penal em branco, necessitando de complemento. Ver art. 30 da Lei
8.212/91, com as alterações proporcionadas pelas Leis 11.324/2006, 11.718/2008 e 11.933/2009.

Outra importância: estipula o art. 195, § 4.º, CF, que “a lei poderá instituir outras fontes destinadas a
garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I”. Logo,
além das contribuições previdenciárias, “considerada a magnitude do sistema de seguridade social
que o constituinte pretende ver implantado no Brasil, é certo que a criação, majoração e extensão dos
benefícios e serviços configurará, em breve, uma exigência social e política da sociedade”, como
esclarece WAGNER BALERA (ob. cit., p. 63). E continua o autor, demonstrando que tal já ocorreu com a
edição da Lei Complementar 84/96, que instituiu outras fontes de custeio para a manutenção da
seguridade social. Portanto, deixar de recolhê-la, como determina a lei, configura o crime de
apropriação indébita previdenciária. (Nucci, 2020)

Desconto concretizado de pagamento feito: essa foi uma modificação positiva trazida pela Lei
9.983/2000. A antiga figura típica (art. 95, d, da Lei 8.212/91) não mencionava expressamente que o
desconto tivesse sido feito, embora a doutrina e a jurisprudência já viessem exigindo tal situação.
Logo, somente se concretiza o tipo penal da apropriação indébita previdenciária caso o empregador
desconte a contribuição do segurado e não a repasse à previdência. (Nucci, 2020)
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 142/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
ç g p p ( )

@prof.joaobittenocurt
Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que só pode ser cometido por sujeito qualificado,
como mencionado supra); formal (delito que não exige, para sua consumação, a ocorrência de
resultado naturalístico). Cremos ser formal e não simplesmente de mera conduta, pois a falta de
repasse, conforme o montante e a frequência, pode causar autênticos “rombos” nas contas da
previdência social, que constituem nítido e visível prejuízo para a Administração Pública. É crime de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); omissivo (o verbo implica
abstenção); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo, dando-se em momento
determinado); unissubjetivo (aquele que pode ser cometido por um único sujeito); unissubsistente
(praticado num único ato); não admite tentativa. (Nucci, 2020)

Análise do núcleo do tipo: deixar de pagar significa não satisfazer encargo devido. O objeto é o
benefício devido a segurado, já reembolsado pela previdência social. É figura equivalente ao antigo
delito previsto no art. 95, f, da Lei 8.212/91. (Nucci, 2020)

Benefício: é o ganho pago pela previdência social ao segurado, através da empresa. Normalmente é
adiantado pela empresa, que depois termina compensando os valores com as contribuições devidas
pela folha salarial. Exemplo de benefício: salário-família (EROS PICELI, ob. cit., p. 30).

Necessidade do reembolso realizado: para a configuração do crime omissivo (“deixar de pagar”) é


preciso que a previdência social tenha efetuado o pagamento à empresa e esta não o tenha repassado
ao segurado. É lógico que assim seja, pois, do contrário, não seria apropriação indébita.

Objetos material e jurídico: o objeto material é o benefício devido ao segurado. O objeto jurídico é a
seguridade social.

Causa de extinção da punibilidade: exigem-se, para que a punibilidade do agente da apropriação


indébita previdenciária seja afastada, os seguintes requisitos: a) declaração do valor devido
(demonstrar à previdência o montante arrecadado ou recolhido de contribuinte ou segurado e não
repassado); b) confissão da prática delituosa, isto é, a admissão de não ter feito o recolhimento ou o
repasse na época e da forma previstas em lei. Em verdade, o termo usado não é o mais adequado, pois
confessar significa admitir contra si, por quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno
discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente, em ato solene e
público, reduzido a termo, a prática de algum fato criminoso. Não é isso o que sempre ocorre, pois,
para a existência da confissão, pede-se que o indivíduo já seja considerado suspeito ou acusado pelo
Estado da prática de um crime. Ora, o próprio parágrafo prevê que a “confissão” necessita ser feita
antes do início da ação fiscal, logo, antes de o Estado ter ajuizado ação de execução da dívida
previdenciária, mas sem fazer qualquer referência à existência de um inquérito ou processo criminal a
respeito. Assim, é possível que o sujeito não tenha recolhido a contribuição, apropriando-se dela, e
esteja em vias de sofrer uma ação fiscal, sem que a conduta tenha resvalado na esfera penal. Enfim, o
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
esteja e as de so e u a ação sca , se que a co duta te a es a ado a es e a pe a . ,o
que se quis efetivamente dizer – e seria o termo mais apropriado – é haver “autodenúncia”, isto é, a
@prof.joaobittenocurt
admissão do cometimento de um fato criminoso (o não recolhimento da contribuição devida na época
oportuna), sem que o Estado já tenha eleito o sujeito como suspeito ou acusado; c) efetuar o
pagamento (recolher o devido com todos os encargos, visto que o parágrafo menciona que tudo deve
ser realizado “na forma definida em lei ou regulamento”, implicando nos acréscimos); d) prestar as
informações devidas (além de declarar o devido, precisa esclarecer a previdência social a respeito da
sua real situação, para que os próximos recolhimentos sejam corretamente efetuados. Assim, deverá
narrar as despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou prestação de serviços que
tem empreendido); e) espontaneidade (sinceridade na declaração, demonstrando arrependimento,
agindo sem subterfúgios). Em Direito Penal, como já foi visto por ocasião do estudo da desistência
voluntária e da atenuante da confissão espontânea, o termo espontaneidade é diferente de
voluntariedade. Significa arrependimento, vontade de efetivamente colaborar com o Estado para sanar
o desvio cometido. Outra interpretação seria ilógica, ou seja, dizer que espontâneo é o mesmo que
voluntário seria negar o próprio conteúdo das condutas “declarar”, “confessar” e “efetuar” o
pagamento. Ora, a pessoa que declara, confessa e paga o devido naturalmente o faz de maneira
voluntária, sem coação. Se for coagida a fazê-lo, não está confessando, pois a admissão de culpa
involuntária não pode ser ato considerado juridicamente válido. E mais: a confissão somente pode ser
voluntária, pois, não fosse assim, e estaria o direito aceitando a admissão de culpa sob tortura, por
exemplo, o que é uma inconsequência. Pode-se até dizer que, vulgarmente, confissão é o simples
reconhecimento da culpa, em qualquer circunstância, mas não para provocar efeito jurídico.
Acrescentemos, ainda, que confundir a espontaneidade com mera iniciativa do agente, enquanto
voluntariedade seria agir livre de qualquer coação, embora sem iniciativa própria, mas sob sugestão de
terceiros, ao que nos parece, é dilapidar a diferenciação entre os dois termos, construída, ao longo de
muito tempo, pela doutrina pátria. Fosse assim e teríamos a seguinte situação, como exemplo: o
sujeito que confessasse por influência de sua mãe, convencendo-o de que sua atitude criminosa não
foi correta, estaria confessando voluntária, mas não espontaneamente, simplesmente porque houve
influência externa. Logo, não teria direito à atenuante da confissão espontânea, o que é um ilogicismo.
Ele estaria arrependido, justamente porque ouviu os reclamos de sua genitora, mas o seu ato não
poderia ser considerado de sua iniciativa. A espontaneidade somente tem sentido no contexto da
sinceridade de propósito e não superficialmente no âmbito da iniciativa de agir. Afinal, quem age
voluntariamente, atua através de seu próprio empreendimento, livre de qualquer coação. Não
considerar a sinceridade de propósito no contexto da espontaneidade é mascarar o intento de
equipará-la, para todos os efeitos, à voluntariedade, o que refoge à doutrina e jurisprudência
majoritárias. Embora admitindo que há diferença entre voluntariedade e espontaneidade, LUIZ REGIS
PRADO sustenta que houve incorreta redação do legislador, utilizando o termo espontaneamente em
lugar de voluntariamente, merecendo haver correção, pelo intérprete, no momento da aplicação. Alega
que o ato voluntário também deve comportar a extinção da punibilidade, valendo-se da interpretação
extensiva para que se dê o devido alcance à norma (Curso de direito penal brasileiro v 2 p 499) Não
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 144/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
extensiva para que se dê o devido alcance à norma (Curso de direito penal brasileiro, v. 2, p. 499). Não
nos parece deva o intérprete alterar, quando da aplicação da norma, a sua redação, fazendo valer a
@prof.joaobittenocurt
voluntariedade em vez da espontaneidade, pois, como já mencionado acima, se o agente declara e
confessa a dívida, já o faz voluntariamente, sendo inadmissível supor que a lei contenha palavras
inúteis. Logo, preferiu o legislador demandar, também, a espontaneidade, isto é, que o devedor o faça
sem qualquer subterfúgio, somente para beneficiar-se do favor legal; f) agir antes do início da ação
fiscal, entendida esta como o efetivo ajuizamento de ação de execução pelo órgão competente. Não
cremos caber, nesse caso, a simples investigação administrativa, pois ação fiscal deve ser expressão
paralela a ação penal, que não abrange, certamente, o inquérito. Logo, não se vincula esta causa de
extinção da punibilidade à instauração de inquérito policial, nem há referência ao oferecimento de
denúncia, mas sim à atuação do Fisco. Não há óbice a tal condição, eleita pelo legislador, embora não
deixe de ser estranha. Se o devedor já está sob investigação policial, por apropriação indébita
previdenciária, em vez de ter por parâmetro, para saldar sua dívida, o oferecimento da denúncia, passa
a levar em conta a ação fiscal. Imagine-se a hipótese de o agente ser denunciado, mas não ter havido,
ainda, ação de execução, seja porque o INSS, ou os órgãos fiscais de arrecadação da União, andou
mais lentamente, seja porque foi inepto.

Aplicando-se literalmente a letra do artigo acrescentado pela Lei 9.983/2000, caberia a extinção de
punibilidade, o que se torna contraditório com o § 3.º, I, que prevê a aplicação do perdão ou do
privilégio se a ação fiscal já se iniciou, mas antes de oferecida a denúncia. Portanto, sendo necessária
a interpretação sistemática para dar sentido à contradição criada pelo legislador, parece-nos curial
manter o seguinte quadro: a) se o Estado não ajuizou ação fiscal, tampouco ação penal: pago o débito
integral, julga-se extinta a punibilidade do agente (§ 2.º); b) se o Estado já ajuizou ação fiscal, mas não
a ação penal: cabe perdão judicial ou a aplicação do privilégio (§ 3.º, I); c) se o Estado não ajuizou
ação fiscal, mas sim ação penal: não cabe a extinção da punibilidade, pois seria o maior dos
contrassensos exterminar a pretensão punitiva do Estado quando ele agiu a tempo, na esfera penal,
sem ter havido boa vontade do devedor para saldar o devido à previdência, além do que o § 3.º, I, veda
a aplicação do perdão e do privilégio – favores legais menores em comparação à extinção da
punibilidade – quando a ação penal já foi iniciada. Seria privilegiar a ilogicidade declarar a extinção da
punibilidade para quem já é réu em ação penal, sem que possa o juiz, por expressa vedação legal, no
mesmo caso, conceder um mero privilégio. Logo, o que naturalmente pretende a lei, embora tenha o
preceito sido redigido de modo inadequado, é garantir a extinção da punibilidade antes da ação do
Estado para cobrar a dívida, imaginando que, nesse estágio, não haveria ainda ação penal, já que nem
a ação fiscal existe. Por outro lado, quando houver ação de cobrança, mas ainda não houver denúncia,
pode-se conceder perdão ou privilégio, desde que satisfeito o débito; d) se o Estado já ajuizou tanto a
ação fiscal, quanto a ação penal: cabe apenas, em caso de pagamento, a atenuante genérica prevista
no art. 65, III, b, do Código Penal. (Nucci, 2020)

Jurisprudência:

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 145/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

STF: “1. Tratando-se de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, § 1º, I, CP), o pagamento
integral do@prof.joaobittenocurt
débito tributário, ainda que após o trânsito em julgado da condenação, é causa de extinção
da punibilidade do agente, nos termos do art. 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03. Precedentes” (RHC
128.245, 2.ª T., rel. Dias Toffoli, 23.08.2016, v.u.). (Nucci, 2020)

Inaplicabilidade do princípio da insignificância: trata-se de dinheiro público, de modo que a


apropriação de contribuição previdenciária não deve beneficiar-se do cenário do crime de bagatela.
(Nucci, 2020)

Jurisprudência:

STJ: “II – Inaplicável o princípio da insignificância aos delitos de apropriação indébita previdenciária
(art. 168-A, do Código Penal) e sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A, do Código Penal)
consoante entendimento assentado do. col. Supremo Tribunal Federal que conferiu caráter
supraindividual ao bem jurídico tutelado, haja vista visarem proteger a subsistência financeira da
Previdência Social. Precedentes” (AgRg na RvCr 4.881/RJ, 3.ª Seção, rel. Felix Fischer, 22.05.2019,
v.u.).

Em contrário: STJ: “2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, nos casos de apropriação
indébita previdenciária, entende cabível a aplicação do princípio da insignificância quando o valor do
débito não ultrapassar R$ 10.000,00, excluídos os juros e a multa incidentes após a inscrição em
dívida ativa. Interpretação do art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Precedentes” (AgRg no REsp
1.609.757/SP, 6.ª T., rel. Antonio Saldanha Palheiro, 27.02.2018, v.u.). 45. Não aplicação do art. 34 da
Lei 9.249/95: o Supremo Tribunal Federal considerava aplicável à hipótese do não recolhimento de
contribuições previdenciárias a causa de extinção da punibilidade prevista na referida lei. Entretanto,
naquela hipótese, era preciso pagar toda a dívida antes do recebimento da denúncia. Ora, existindo
causa específica para o crime previdenciário, não mais tem cabimento a aplicação do mencionado art.
34. Portanto, deixando de pagar o devido até a ação fiscal ter início, já não se deve considerar extinta a
punibilidade caso o recolhimento seja efetuado antes da denúncia.

Parcelamento do débito administrativamente: se houver o deferimento, na órbita administrativa, do


parcelamento do débito, autorizando-se o devedor a efetuar o pagamento, não há razão para deixar de
excluir a sua punibilidade no campo penal. Afinal, o Estado aceitou receber o que lhe era devido e
empreendeu um acordo com a parte devedora. Não haveria sentido algum em se aplicar qualquer
punição. Por outro lado, há situações, previstas em lei, em que o parcelamento do débito suspende a
pretensão punitiva do Estado, até que se constate o pagamento integral da dívida.

Jurisprudência

STJ: “1. No campo do direito penal, não importa verificar a legalidade da concessão do
parcelamento dos débitos relativos às contribuições previdenciárias descontadas dos empregados,
mas apenas o seu eventual deferimento pela autoridade administrativa. 2. Assim, comprovado que o
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

benefício da suspensão da pretensão punitiva (Lei 10.684/2003, art. 9.º, caput), pelo parcelamento do
@prof.joaobittenocurt
débito, somente veio a lume no cenário legal quando já iniciada a persecutio criminis in iuditio, esse
fato recomenda o deferimento do direito como medida de respeito à igualdade e aos direitos
individuais do cidadão, previstos na Carta Magna brasileira, independentemente de ter sido
concretizado após o recebimento da denúncia. 3. Recurso desprovido” (HC 87.324-SP, 6.ª T., rel. Maria
Thereza de Assis Moura, 21.06.2007, v.u.).

Perdão judicial ou figura privilegiada: criou-se, com o § 3.º, uma hipótese alternativa de perdão
judicial (“deixar de aplicar a pena”) ou de privilégio (aplicação somente da multa). Mas há requisitos
gerais e específicos. Os gerais, válidos para qualquer hipótese, são: a) primariedade; b) bons
antecedentes. Sobre os conceitos de primariedade e bons antecedentes, remetemos o leitor aos
comentários aos arts. 63 (primariedade) e 59 (antecedentes), sabendo-se, desde logo, que primário é o
sujeito que não é reincidente (o conceito é feito por exclusão) e possui bons antecedentes aquele que
não os ostenta negativos (mais uma vez o conceito é feito por exclusão). Os específicos estão
previstos nos incisos.

Leis de refinanciamento: muitas normas autorizando o refinanciamento de dívidas tributárias, em


geral, podem ter reflexo – ou não – nas normas benéficas ao réu, previstas no Código Penal. No § 3º
do art. 168-A, prevê-se a viabilidade de aplicação de um perdão judicial ou de uma modificação da
pena privativa de liberdade, transformada em multa, nos casos descritos pelos incisos I e II. Tome-se
como exemplo o art. 9º da Lei 10.684/2003: “É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos
crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-
A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a
pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de
parcelamento. § 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva. § 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios”. Não cremos ter havido revogação tácita do § 3º do art.
168-A por conta da edição da Lei 10.684/2003. Pode tornar-se inútil o referido § 3º, desde que a
pessoa jurídica relacionada ao agente do crime previdenciário estiver incluída no programa de
refinanciamento e, pagando tudo, extingue-se a punibilidade da pessoa física. Porém, é preciso
considerar que a participação nesses programas de refinanciamento não é obrigatória. Logo, alguém
pode ser processado por apropriação indébita previdenciária e beneficiar-se do disposto pelo art. 168-
A, § 3º, I ou II, do Código Penal. Do mesmo modo, o empregador individual, que não toma parte em
refinanciamento destinado a pessoas jurídicas.

Promoção do pagamento: deve o agente efetuar o pagamento de todo o montante devido à


previdência social (contribuição previdenciária + acessórios) antes do oferecimento da denúncia e
depois do início da ação fiscal. Como já mencionado, deve-se deixar de aplicar o art. 34 da Lei
9 249/95 pois há hipótese nova criada pela Lei 9 983/2000 Caso a atuação do Fisco tenha início já
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 147/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
9.249/95, pois há hipótese nova criada pela Lei 9.983/2000. Caso a atuação do Fisco tenha início, já
não existe@prof.joaobittenocurt
possibilidade de a punibilidade ser extinta, embora subsista a alternativa de conseguir o
agente o perdão judicial ou a substancial redução da pena, trocando-se a pena privativa de liberdade
pela exclusiva aplicação de multa. 48. Valor devido de pouca monta: a segunda hipótese para a
aplicação do perdão judicial ou do privilégio é ser o montante devido aos cofres previdenciários igual
ou inferior ao estabelecido pela própria previdência, administrativamente (o que prescinde de lei), para
justificar uma execução fiscal. Se o Fisco não tem interesse em cobrar judicialmente o valor, não há
cabimento para a atribuição de penalidades severas ao agente.

Critério para a escolha do juiz: tendo em vista que o legislador previu hipóteses alternativas, mas
impôs condições cumulativas para as duas, é preciso distinguir quando o magistrado deve aplicar o
perdão judicial e quando deve aplicar somente a multa. Assim, para um ou para outro benefício
demandam-se primariedade, bons antecedentes e pagamento integral da dívida ou pequeno valor das
contribuições devidas. Parece-nos que a escolha deve se fundar nos demais elementos norteadores,
sempre, da análise do agente do crime, que são as circunstâncias judiciais do art. 59. Dessa forma, a
verificação da personalidade e da conduta social do autor, dos motivos do delito e das circunstâncias e
consequências da infração penal, que constituem a culpabilidade, maior ou menor reprovação social
do que foi feito, levarão o juiz à decisão mais justa: perdão ou multa.

Excesso de benefícios: se o contribuinte já conseguiu parcelamento, não há necessidade de outros


benefícios, como os previstos no § 3º.

ESTELIONATO
Art. 171, caput — Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou
mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena — reclusão, de um a cinco anos, e multa

Valendo-se de alguma artimanha, consegue enganar a vítima e convencê-la a entregar-lhe algum


bem e, na sequência, locupleta-se ilicitamente com tal objeto. O artifício se mostra presente quando,
para enganar a vítima, o agente lança mão de algum artefato, faz uso de algum objeto para ajudá-lo no
engodo. No conto do bilhete premiado, por exemplo, ele engana a vítima com um bilhete falso. No
conto da guitarra, ludibria a vítima fazendo truque com uma falsa máquina de fazer dinheiro e a vende
para esta. O artifício também pode consistir em disfarces, efeitos especiais etc. Ardil é a conversa
enganosa, ou seja, o agente engana a vítima com mentiras verbais. (Gonçalves, 2020)

Exemplos.:

Sabendo que uma televisão deve ser retirada em certo local por pessoa chamada Eurípedes, o
agente comparece alguns minutos antes, mente chamar-se Eurípedes, pega a televisão e vai-se com
ela embora; pessoa entra em contato telefônico e se apresenta como representante de empresa que
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 148/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
cuida de crianças abandonadas ou de pessoas idosas e pede doação em determinada conta corrente,
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quando, em verdade, trata-se de um golpe (esta é uma das modalidades do conto do vigário).
(Gonçalves, 2020)

Por fim, a expressão qualquer outro meio fraudulento é uma fórmula genérica, inserida no tipo penal
para abranger qualquer outra artimanha capaz de enganar o sujeito passivo, como, por exemplo, o
silêncio. A Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal, em seu item 61, ressalva que “o
próprio silêncio, quando malicioso ou intencional, acerca do preexistente erro da vítima, constitui meio
fraudulento característico do estelionato”. (Gonçalves, 2020)

Assim, se a vítima espontaneamente incide em erro e, por isso, está prestes a entregar um bem ou
valor ao agente, e este, antes de recebê-lo, percebe o engano e se cala, para que a entrega se
concretize e ele obtenha vantagem, responde por estelionato. Em tal caso, o agente manteve a vítima
em erro por meio de fraude (o silêncio). Nota-se, pois, que a fraude caracterizadora do estelionato
pode consistir em uma omissão. (Gonçalves, 2020)

Conforme já mencionado no estudo do crime de furto mediante fraude, quando se procurou


estabelecer a distinção em relação ao estelionato, o art. 171, caput, exige que alguém seja induzido ou
mantido em erro e que, por isso, entregue um bem, próprio ou alheio, ao agente. Esta pessoa
ludibriada, portanto, pode ser a mesma que sofre o prejuízo ou terceiro. (Gonçalves, 2020)

É necessário, contudo, que o agente engane um ser humano, não havendo estelionato, e sim furto,
por parte de quem, fazendo uso de um cartão clonado em um caixa eletrônico, consegue sacar, sem
autorização, dinheiro da conta da vítima. Nesse caso, não existe alguém que tenha sido enganado.
Ademais, houve subtração de valores. (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência

“1. O furto mediante fraude não se confunde com o estelionato. A distinção se faz primordialmente
com a análise do elemento comum da fraude que, no furto, é utilizada pelo agente com o fim de burlar
a vigilância da vítima que, desatenta, tem seu bem subtraído, sem que se aperceba; no estelionato, a
fraude é usada como meio de obter o consentimento da vítima que, iludida, entrega voluntariamente o
bem ao agente. 2. Hipótese em que o agente se valeu de fraude eletrônica para a retirada de mais de
dois mil e quinhentos reais de conta bancária, por meio da ‘Internet Banking’ da Caixa Econômica
Federal, o que ocorreu, por certo, sem qualquer tipo de consentimento da vítima, o Banco. A fraude, de
fato, foi usada para burlar o sistema de proteção e de vigilância do Banco sobre os valores mantidos
sob sua guarda. Configuração do crime de furto qualificado por fraude, e não estelionato” (STJ — CC
67.343/GO — Rel. Min. Laurita Vaz — 3a Seção — julgado em 28-3-2007, DJ 11-12-2007, p. 170).
(Gonçalves, 2020)

No mesmo sentido os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: CC 131.043/MA — Rel.


Min. Gurgel de Faria — 3a Seção — julgado em 8-10-2014, DJe 14-10-2014; AgRg no CC 110.767/SP —
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 149/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Rel. Min. Gilson Dipp — 3a Seção — julgado em 9-2-2011, DJe 17-2-2011); CC 81.477/ES — Rel. Min. Og
@prof.joaobittenocurt
Fernandes — 3a Seção — julgado em 27-8-2008, DJe 8-9-2008; REsp 1.163.170/SP — Rel. Min. Felix
Fischer — 5a Turma — julgado em 19-8-2010, DJe 20-9-2010. O tipo penal do estelionato exige, ainda,
que a vantagem obtida pelo agente seja ilícita. Caso seja lícita a vantagem obtida por meio da fraude, o
crime será o de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345). Por se tratar de crime contra o
patrimônio, a vantagem ilícita visada pelo este-lionatário deve ser, necessariamente, de cunho
patrimonial (Gonçalves, 2020)

Consumação:

A forma como o art. 171 está redigido não permite outra conclusão senão a de que o estelionato é
crime material, que só se consuma quando o agente efetivamente obtém a vantagem ilícita almejada.
Saliente-se que o estelionato pressupõe duplo resultado: o prejuízo da vítima e a vantagem do agente.
Esses resultados, normalmente, são concomitantes, porém é possível (embora raro) que a vítima sofra
o prejuízo e o agente não obtenha a vantagem pretendida; em tal caso, o crime considera-se tentado. É
o que ocorre, por exemplo, quando alguém publica um anúncio fraudulento de venda de veículo em um
jornal e convence a vítima a efetuar um depósito em determinada conta bancária, a fim de concretizar
o negócio. A vítima faz o depósito, mas, por erro, digita o número errado e a pessoa em cuja conta o
dinheiro caiu, ao notar os valores, imediatamente, saca o dinheiro. Em tal hipótese, a pessoa que
publicou o anúncio e não recebeu o dinheiro responde por tentativa de estelionato, e aquela em cuja
conta corrente o dinheiro foi depositado por engano incide no crime de apropriação de coisa havida
por erro. (Gonçalves, 2020)

Quando a vítima sofre o prejuízo em uma comarca e a vantagem é obtida pelo agente em outra é
nessa última que a ação penal deve ser proposta — local da consumação. (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência:

“O prejuízo alheio, apesar de fazer parte do tipo penal, está relacionado à consequência do crime de
estelionato e não à conduta propriamente. De fato, o núcleo do tipo penal é obter vantagem ilícita,
razão pela qual a consumação se dá no momento em que os valores entram na esfera de
disponibilidade do autor do crime, o que somente ocorre quando o dinheiro ingressa efetivamente em
sua conta corrente” (STJ — CC 139.800/MG — Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca — 3a Seção —
julgado em 24-6-2015 — DJe 1o-7-2015). De ver-se, entretanto, que em julgados mais recentes o
Superior Tribunal de Justiça passou a entender que o foro competente nesses casos de transferência
bancária é o do local da agência da vítima, indicando que teriam passado a entender que o crime se
consuma no local em que a vítima sofre prejuízo. Nesse sentido: AgRg no CC 146.524/SC — Rel. Min.
Jorge Mussi — 3a Seção — julgado em 22-3-2017 — DJe 30-3-2017; AgRg no CC 145.119/PR — Rel.
Min. Felix Fischer — 3a Seção — julgado em 10-8-2016 — DJe 17-8-2016; CC 143.621/PR — Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz — 3a Seção — julgado em 25-5-2016 — DJe 7-6-2016; CC 142.934/PR — Rel. Min.
Nefi Cordeiro — 3a Seção — julgado em 14-10-2015 — DJe 30-11-2015. (Gonçalves, 2020)
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 150/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
e Co de o 3a Seção ju gado e 0 0 5 Je 30 0 5. (Go ça es, 0 0)

@prof.joaobittenocurt
Essas últimas decisões do Superior Tribunal de Justiça contrariam texto expresso de lei, pois o
núcleo do tipo do art. 171, caput, do Código Penal é o verbo “obter”. Contrariam, também,
entendimento pacífico na dou-trina no sentido de que o estelionato consuma-se com a obtenção da
vantagem. Em termos de política criminal, todavia, trata-se de solução justa, pois facilita a
investigação a apuração no local da agência bancária da vítima. Além disso, como se trata de “crime
contra o patrimônio” seria questionável a opção do legislador de exigir a efetiva obtenção da vantagem
pelo agente para fim de consumação. (Gonçalves, 2020)

Tentativa

A tentativa mostra-se possível em várias fases do crime, desde que o agente já tenha dado início à
execução do delito e não tenha conseguido obter a vantagem visada: a) O agente emprega a fraude e
não consegue enganar a vítima. Nesse caso, é necessário que o meio fraudulento não seja totalmente
ineficaz, conforme se verá abaixo. b) O agente emprega a fraude, engana a vítima, mas ela acaba não
entregando os bens ou valores a ele. Ex.: no momento em que a vítima ludibriada iria efetuar a entrega,
outra pessoa intervém e a alerta sobre o golpe, impedindo que a entrega se concretize. c) O agente
emprega a fraude, engana a vítima, ela entrega os valores, mas estes não chegam a ele, que, portanto,
não obtém a vantagem visada. Essa hipótese foi explicada no item anterior. É o que ocorre se a vítima
é ludibriada e convencida a remeter algum bem ao agente, pelo correio ou por transporta-dora, e o bem
desaparece no trajeto. (Gonçalves, 2020)

Crime impossível:

Quando o agente emprega a fraude, mas não consegue enganar a vítima, é sempre necessário
avaliar se a fraude empregada poderia tê-la enganado. Se concluirmos que sim, mas que a vítima não
foi enganada por algum especial cuidado que tenha tido no caso concreto, o agente responderá por
tentativa. Se, entretanto, restar claro que a fraude era totalmente inidônea, o fato será considerado
atípico por ter havido crime impossível por absoluta ineficácia do meio. A ineficácia da fraude, todavia,
deve ser analisada de acordo com a vítima escolhida pelo golpista no caso concreto, pois é comum
que estelionatários abordem pessoas muito humildes e consigam ludibriá-las com farsas que não
enganariam a maioria das pessoas. Nenhum brasileiro, por exemplo, seria enganado se o agente
desse, de troco, algumas notas de cruzeiros ou cruzados (unidades monetárias antigas). Tal conduta,
todavia, pode enganar um estrangeiro que tenha acabado de chegar ao País, e é óbvio que os
golpistas, intencionalmente, procuram abordar tais pessoas em rodoviárias ou aeroportos. Ressalte-
se, ainda, que, se a vítima for enganada e o estelionato se consumar, sequer é necessário analisar a
eficácia da fraude, já que a conclusão é evidente. (Gonçalves, 2020)

Sujeito ativo:

É tanto aquele que emprega a fraude como aquele que dolosamente recebe a vantagem ilícita. Ex.:
João e Pedro previamente combinados colocam o crime em prática João emprega fraude e convence
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 151/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
João e Pedro, previamente combinados, colocam o crime em prática. João emprega fraude e convence
@prof.joaobittenocurt
Lúcia a entregar um objeto para Pedro, que, após recebê-lo, desaparece com o bem. Em tal caso, Pedro
tomou parte na própria execução do delito e, portanto, é coautor do crime de estelionato. Lembrando,
porém, que, para a existência do crime, é necessário que o agente vise “proveito próprio ou alheio”,
indaga-se como deve ser a responsabilização do terceiro, destinatário da vantagem ilícita, que, ao
contrário do exemplo acima, não toma parte na execução do estelionato, recebendo o bem das mãos
do golpista após a consumação de tal crime. A resposta depende da forma como tal pessoa se
envolveu nos fatos. Se ela, de alguma maneira, estimulou anteriormente a prática do crime, será
partícipe do estelionato. Se, entretanto, não o estimulou, mas, no momento em que recebeu o bem, já
estava ciente de sua procedência criminosa, responde por receptação dolosa (art. 180, caput, do CP).
Por fim, se não estimulou a prática do crime e tampouco sabia da procedência ilícita do bem, sua
conduta é atípica. (Gonçalves, 2020)

Sujeito passivo:

Os que sofrem o prejuízo patrimonial e todos os que foram enganados pela fraude perpetrada
(ainda que não sejam economicamente prejudicados). É plenamente possível, portanto, que o agente
engane uma pessoa e esta entregue bem pertencente a outra, hipótese em que ambas são vítimas de
um único estelionato. Essa situação, aliás, é muito comum em golpes dados em lojas ou similares,
quando o prejuízo é do estabelecimento comercial e a pessoa ludibriada é um funcionário. Pessoas
jurídicas também podem ser sujeito passivo do crime em tela na condição de prejudicadas
economicamente pelo golpe. (Gonçalves, 2020)

Estelionato e falsificação de documento:

A falsificação de documento, público ou particular, está tipificada como crime nos arts. 297 a 299
do Código Penal. É muito comum, todavia, que a falsificação do documento tenha por finalidade
enganar a vítima para viabilizar um golpe, tal como se dá com a falsificação de cheque alheio. Existem
casos em que os golpistas falsificam em gráficas as próprias folhas do cheque. Outros alteram para
mais o valor de cheques que receberam já preenchidos e assinados pelo titular da conta e, em seguida,
depositam ou sacam o valor do cheque ou dele fazem uso em compras, causando prejuízo ao
emitente. É também comum o agente subtrair a folha em branco e, passando-se pelo titular da conta,
falsificar sua assinatura no momento da aquisição de produtos. Para esses casos, surgiram quatro
correntes na doutrina e na jurisprudência, embora o tema esteja atualmente pacificado por uma
súmula do Superior Tribunal de Justiça: (Gonçalves, 2020)

1) O agente deve ser punido pelos dois crimes, em concurso material, uma vez que atingem bens
jurídicos distintos (o patrimônio e a fé pública), o que impede que um absorva o outro.

2) Os crimes são autônomos, mas deve ser aplicada a regra do concurso formal. Essa corrente é
semelhante à primeira no que diz respeito a um delito não absorver o outro. Altera-se apenas a
interpretação quanto à forma do concurso de crimes.
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 152/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
te p etação qua to à o a do co cu so de c es.

@prof.joaobittenocurt
3) A falsificação do documento, por ter pena maior (dois a seis anos de reclusão), absorve o
estelionato.

4) O agente responde apenas por estelionato. O crime de falsificação de documento fica absorvido
por ser crime-meio (princípio da consunção).

Esse é o entendimento atualmente adotado em razão da Súmula n. 17 do Superior Tribunal de


Justiça: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais po-tencialidade lesiva, é por este
absorvido”.

De acordo com a súmula, quando o agente falsifica um cheque alheio e engana o vendedor de uma
loja, fazendo-se passar pelo correntista, só responde pelo estelionato porque, em tal caso, o cheque foi
entregue ao vendedor, e o golpista não pode mais usá-lo (a falsificação se exauriu no estelionato). No
entanto, se o agente tivesse também falsificado um documento de identidade para apresentá-lo ao
vendedor no momento da compra com o cheque falso, ele responderia por dois crimes: estelionato e
falsificação do documento de identidade. É que este documento permanece com o agente após a
prática do estelionato, subsistindo, portanto, a potencialidade lesiva que a súmula menciona. Por se
tratar do mesmo raciocínio, entende-se que a subtração da folha de cheque, por ser crime-meio, fica
absorvida pelo estelionato, o mesmo ocorrendo quanto à eventual receptação da cártula em branco.
(Gonçalves, 2020)

Ação penal:

A Lei n. 13.964/2019 introduziu o § 5o no art. 171 do Código Penal, passando a prever que, no crime
de estelionato, a ação penal é pública condicionada à representação, exceto se a vítima for a
Administração Direta ou Indireta, criança ou adolescente, pessoa com deficiência mental, maior de 70
anos ou incapaz. Nessas últimas hipóteses, a ação é incondicionada. Essa modalidade de ação penal
vale para o estelionato comum do art. 171, caput, do CP, e para as demais modalidades do § 2o. As
normas de caráter processual penal têm aplicação imediata, nos termos do art. 2o do CPP. Assim, não
é necessária a representação em relação a ações penais que já estejam em curso (denúncia já
recebida). A representação, contudo, será necessária em relação a estelionatos que ainda estejam em
fase de investigação (inquérito policial). (Gonçalves, 2020)

Art. 171, § 1o — Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena
conforme o disposto no art. 155, § 2o

Essa forma de privilégio aplica-se ao estelionato comum, descrito no caput do art. 171, e também
às figuras assemelhadas, descritas em seu § 2o. Para que seja reconhecido o benefício, o agente deve
ser primário e o prejuízo da vítima de pequeno valor. Em outras palavras, é necessário que o juiz
reconheça, na sentença, que o réu não é reincidente e que o prejuízo por ele causado à vítima não
ultrapassou o montante de um salário mínimo na data dos fatos. (Gonçalves, 2020)
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 153/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Deve-se@prof.joaobittenocurt
levar em conta o prejuízo causado no momento da consumação do crime, de modo que
eventual reparação posterior do dano não autoriza a concessão do benefício, tornando possível,
contudo, a aplicação do instituto do arrependimento posterior (art. 16 do CP), desde que a reparação
ocorra antes do recebimento da denúncia. Na tentativa de estelionato, o que se leva em conta é o
montante do prejuízo que o agente causaria se consumasse a infração. (Gonçalves, 2020)

As consequências do privilégio também são as mesmas do furto: a) substituição da pena de


reclusão por detenção; b) redução da pena privativa de liberdade de um a dois terços; c) aplicação
somente da pena de multa. O estelionato privilegiado difere do furto privilegiado, na medida em que,
neste, se leva em conta o valor do bem subtraído, e não o prejuízo causado à vítima. (Gonçalves, 2020)

Figuras assemelhadas:

O § 2o do art. 171 do Código Penal descreve uma série de subtipos de estelionato que possuem a
mesma pena da figura fundamental do caput. A principal distinção é que a figura fundamental, por ser
genérica, é subsidiária em relação às demais. Com efeito, nos seis subtipos contidos nos incisos do §
2o, a lei expressamente descreve em que consiste o meio fraudulento empregado pelo agente, de
modo que a figura comum do art. 171, caput, do Código Penal, só poderá ser aplicada nas hipóteses
remanescentes, não abrangidas pelas figuras específicas. (Gonçalves, 2020)

Art. 171, § 2o — Nas mesmas penas incorre quem: I — vende, permuta, dá em pagamento, em locação
ou em garantia coisa alheia como própria

No crime em análise, o agente se passa por dono de certo bem (móvel ou imóvel) e o negocia com
terceiro de boa-fé sem possuir autorização do proprietário, causan-do, assim, prejuízo ao adquirente. O
delito se consuma no instante em que o agente recebe o preço. No caso de locação, a consumação se
dá com o recebimento do valor do aluguel. (Gonçalves, 2020)

A tentativa é plenamente possível. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime
comum. Sujeito passivo é quem adquire, aluga ou recebe o bem em garantia sem saber que não
pertence ao agente. Se este, no caso concreto, entregar o bem que vendeu ou alugou sem que seja o
seu proprietário, será também sujeito passivo o dono da coisa. Suponha-se que o caseiro de um imóvel
de veraneio ou de campo, sabendo que os donos passarão um tempo sem ir ao local, apresente-se
como dono e venda o imóvel a terceiro, entregando-lhe as chaves e desaparecendo em seguida. Os
compradores usam a casa durante um tempo até que os verdadeiros proprietários aparecem no local e
descobrem o ocorrido, e ingressem com ação para reaver a posse. Tanto o comprador como o dono
foram vítimas do crime. (Gonçalves, 2020)

Trata-se de crime de ação vinculada, pois o tipo penal enumera os modos de execução de forma
taxativa (venda, permuta, locação, dação em pagamento ou em garantia), não admitindo ampliação por
analogia. Por essa razão, a elaboração de compromisso de compra e venda por parte de quem não é
d ã tit i i áli
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início
i t li t h j bt ã d t 154/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
dono não constitui o crime em análise, e sim o estelionato comum, caso haja obtenção de vantagem
ilícita — o @prof.joaobittenocurt
que não gera grande diferença, já que a pena em abstrato é a mesma. (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência:

“Na esfera penal, vender difere de prometer vender, dois institutos civis com características próprias
e efeitos diversos. Não havendo crime sem lei anterior que o defina, não pode o intérprete equiparar a
promessa de venda de coisa alheia como própria, não prevista expressamente em lei, à venda, prevista
em lei, de coisa alheia como própria” (TJGB — Rel. Ney Cidade Palmeiro — RT 417/377); “O vocábulo
‘vender’ significa transmitir domínio, que não se confunde com o simples compromisso de compra e
venda, onde existe típica obrigação de fazer, não podendo ser este meio uma das formas
configuradoras do delito previsto no art. 171, § 2o, I, do CP de 1940” (TJSP — Rel. Marino Falcão — RT
614/286). (Gonçalves, 2020)

Conforme já estudamos ao abordar o crime de furto, em termos jurisprudenciais, firmou-se


entendimento de que a venda a terceiro de boa-fé de objeto furtado pelo próprio ladrão constitui post
factum impunível porque ele estaria apenas transformando em dinheiro o bem subtraído (fazendo
lucro em relação ao bem furtado). A propósito: “A disposição de coisa produto de crime, ou parte dela,
como própria, não constitui crime autônomo. Não passa de exaurimento do delito perpetrado pelo
agente. É fato posterior não punível” (Tacrim-SP — Rel. Fernandes Rama — RT 556/345). (Gonçalves,
2020)

Em termos doutrinários o tema é controvertido. Heleno Cláudio Fragoso a respeito do tema diz que
“os fatos posteriores que significam um aproveitamento e por isso ocorrem regularmente depois do
fato anterior são por este consumidos. É o que ocorre nos crimes de intenção, em que aparece
especial fim de agir. A venda pelo ladrão da coisa furtada como própria não constitui estelionato”. Com
entendimento contrário, Francisco de Assis Toledo sustenta que “se o agente vende a coisa para
terceiro de boa-fé, comete estelionato em concurso material, com o antecedente furto, por empreender
nova lesão autônoma contra vítima diferente, através de conduta não compreendida como
consequência natural e necessária da primeira”. Apesar de concordamos com os argumentos da
última corrente, é forçoso lembrar que, na prática, a primeira é que vem sendo adotada pelos tribunais.
Veja-se, ainda, que, quando o ladrão dá ciência ao comprador de que o bem é furtado, não se cogita do
crime de disposição de coisa alheia como própria porque o comprador foi informado de que o bem não
é do furtador. Em tal caso, o adquirente responde por crime de receptação dolosa. (Gonçalves, 2020)

Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria

Art. 171, § 2o — Nas mesmas penas incorre quem: II — vende, permuta, dá em pagamento ou em
garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a
terceiro, mediante paga-mento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias.

As condutas típicas são as mesmas do parágrafo anterior — vender, permutar, dar em pagamento ou
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08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

em garantia — tendo sido excluída apenas a hipótese de locação. No crime em análise, todavia, o
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objeto pertence ao agente, contudo está gravado de cláusula de inalienabilidade ou de ônus, ou cuida-
se de coisa litigiosa ou de imóvel que o agente prometeu vender parceladamente a outrem. Apenas na
última figura o objeto material necessariamente deve ser coisa imóvel, por expressa determinação
legal. (Gonçalves, 2020)

Nas demais, pode ser móvel ou imóvel. É preciso salientar que não haverá crime se o agente realizar
o negócio após cientificar a outra parte acerca das circunstâncias que envolvem o bem, uma vez que o
texto legal estabelece como elementar do crime o silêncio em torno delas. O fato de a causa
impeditiva estar registrada em Cartório não exclui o crime, já que o tipo penal esclarece que a exclusão
só se dá quando a parte expressamente informa a outra a esse respeito. Coisa inalienável é aquela que
não pode ser vendida em razão de determinação legal, convenção (doação com cláusula de
inalienabilidade, por exemplo) ou disposição testamentária. Coisa gravada de ônus é aquela sobre a
qual pesa um direito real em decorrência de cláusula contratual ou disposição legal (art. 1.225 do
Código Civil). É o caso, por exemplo, da hipoteca e da anticrese (Gonçalves, 2020)

Bem litigioso é aquele objeto de discussão judicial (usucapião contestado, reivindicação etc.).
Existe, por fim, crime na alienação ou oneração de imóvel que o agente prometeu vender a terceiro
mediante pagamento em prestações. Note-se que, aqui, a conduta consiste em vender, permutar ou
dar em pagamento ou garantia imóvel sobre o qual pesa compromisso de compra e venda válido com
terceira pessoa. O imóvel ainda pertence ao agente, mas sobre ele pesa compromisso de compra e
venda. Já vimos no tópico anterior que quem assina compromisso de vender coisa alheia como se
fosse própria comete estelionato comum, por não haver tal conduta típica dentre as modalidades
criminosas do § 2o. O crime se consuma no momento em que é realizada a conduta típica e a tentativa
é possível. (Gonçalves, 2020)

Defraudação do penhor

Art. 171, § 2o — Nas mesmas penas incorre quem: III — defrauda, mediante alienação não consentida
pelo credor ou outro modo, a garantia pignoratícia, quando tem a posse do bem empenhado

O penhor é um direito real em que a coisa móvel dada em garantia fica sujeita ao cumprimento da
obrigação. Uma pessoa, por exemplo, empresta dinheiro a outra, e o devedor entrega joias ao credor
como garantia da dívida. O devedor continua sendo dono dos bens, mas eles ficam na posse do credor,
de modo que, não havendo pagamento da dívida, as joias serão usadas para tal fim — serão vendidas
pelo credor, por exemplo. Note-se que, tal como mencionado, a regra é que, com a constituição do
penhor, o bem móvel passe às mãos do credor. É, aliás, o que dispõe o art. 1.431 do Código Civil:
“constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que, em garantia do débito ao credor ou a
quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação”.
Ocorre que, no parágrafo único do mesmo art. 1.431, o legislador estabeleceu algumas hipóteses em
que o bem empenhado pode ficar nas mãos do devedor (cláusula constituti): “no penhor rural,
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 156/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
q p p ( ) p
industrial, mercantil e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do devedor que as deve
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guardar e conservar”. É exatamente nessas hipóteses que pode surgir o crime de defraudação do
penhor, isto é, quando o devedor está em poder do bem empenhado e o vende, permuta, doa, ou de
alguma outra maneira o inviabiliza como garantia de dívida — destruindo-o, ocultando-o, inutilizando-o,
consumindo-o etc. Sujeito ativo é somente o devedor que tem a posse do bem empenhado. Trata-se de
crime próprio. Sujeito passivo é o credor que, com a defraudação, fica sem a garantia de sua dívida.
(Gonçalves, 2020)

Consumação:

Ocorre no momento da defraudação, ainda que, posteriormente, o agente seja forçado ao


pagamento mediante ação judicial. A tentativa é possível.

Fraude na entrega de coisa

Art. 171, § 2o — Nas mesmas penas incorre quem: IV — defrauda substância, qualidade ou quantidade
de coisa que deve entregar a alguém.

A presente infração penal pressupõe uma situação jurídica envolvendo duas pessoas, em que uma
tem o dever de entregar objeto, móvel ou imóvel a outra; porém, de alguma forma o modifica
fraudulentamente, de modo que possa prejudicar a outra parte. Essa alteração pode recair sobre a
substância (natureza da coisa a ser entregue, por exemplo, entregar objeto de vidro no lugar de cristal
ou latão dourado no lugar de ouro), sobre a qualidade (entregar mercadoria da mesma espécie, mas de
pior qualidade, objeto usado como se fosse novo) ou sobre a quantidade (dimensão ou peso menores
etc.). Apesar da forma como está redigido o dispositivo, entende-se que, para fim de consumação,
exige-se a efetiva entrega do bem à vítima. Assim, o ato de defraudar o bem antes da efetiva entrega é
considerado ato preparatório, pois o agente pode ainda se arrepender e efetuar a entrega dentro dos
parâmetros combinados. Por isso, a tentativa é possível quando o agente tenta, mas não consegue
entregar o bem. Ex.: a vítima percebe a fraude a se recusa a receber o objeto. Sujeito ativo pode ser
qualquer pessoa que, por alguma razão, esteja obrigada a entregar alguma coisa a outrem. Sujeito
passivo é qualquer pessoa que tenha o direito de receber a coisa da outra parte. (Gonçalves, 2020)

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

Art. 171, § 2o — Nas mesmas penas incorre quem: V — destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa
própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as consequências da lesão ou doença, com o
intuito de haver indenização ou valor de seguro.

Premissa deste crime é a prévia existência de um contrato de seguro em vigor, sem o qual haveria
crime impossível. Existem três hipóteses elencadas no texto legal: a) Destruir ou ocultar, no todo ou
em parte, coisa própria. Pode ser coisa móvel (veículo, por exemplo) ou imóvel. Comete o crime, por
exemplo, quem, por não querer mais um veículo ou precisar de dinheiro, nele ateia fogo ou o esconde.
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 157/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

Tem-se, ainda, reconhecido o crime em análise quando alguém leva seu veículo a outro Estado ou País
@prof.joaobittenocurt
e lá o vende e, em seguida, alega ter sido furtado para solicitar o valor do seguro. b) Lesionar o próprio
corpo ou saúde. Nessa modalidade, o agente se autolesiona, mas faz parecer à seguradora que foi
vítima de agressão ou de acidente. Como o texto legal se refere à autolesão, teoricamente o crime
seria o de estelionato comum quando o agente solicitasse a outra pessoa que o agredisse para, em
razão da lesão, solicitar o seguro. (Gonçalves, 2020)

Prevalece, contudo, o entendimento esposado por Magalhães Noronha, segundo o qual, em tal
hipótese, haverá coautoria no crime de fraude contra seguradora, sem prejuízo da punição do agressor
pelo crime de lesão corporal — pois o consentimento da vítima não exclui o delito por ser a
incolumidade física bem indisponível, precipuamente em relação às lesões de natureza grave ou
gravíssima que, em regra, são aquelas que geram direito à indenização por parte da seguradora.
(Gonçalves, 2020)

Damásio de Jesus agente se autolesiona, mas o beneficiário é terceiro (filho, esposa), posto que,
em tal caso, o golpe contra a seguradora não se altera. Magalhães Noronha entendimento e defende
que, se a beneficiária é terceira pessoa, configura-se o crime comum de estelionato, posto que a figura
do art. 171, § 2o, V, pressupõe intenção “de haver” a indenização, isto é, de obtê-la em proveito próprio.
c) Agravar as consequências da lesão ou doença. Ex.: provocar infecção em um ferimento para que
ocorra gangrena na perna e a necessidade de amputação. O crime de fraude contra seguradora é
formal, isto é, consuma-se no momento em que o agente realiza a conduta típica (destruir, ocultar,
autolesionar etc.), ainda que o agente não consiga receber o que pretendia por ter a seguradora
descoberto o golpe. Como o tipo penal exige que o agente queira receber o valor do seguro, a prova da
sua má-fé normalmente se faz pelo documento em que ele solicita a indenização ou o pagamento do
seguro, com alegações falsas (de que sofreu uma queda, por exemplo, em caso de autolesão).
(Gonçalves, 2020)

O efetivo recebimento do valor do seguro, contudo, é mero exaurimento do delito. Se o agente


esconde seu veículo em um sítio em Campos do Jordão e solicita a indenização na cidade de São
Paulo, o crime deve ser apurado na primeira cidade, local onde foi praticada a conduta típica. A
situação é similar à da extorsão mediante sequestro em que o crime se consuma com a captura da
vítima, e não com o pedido de resgate. A tentativa é possível, como, por exemplo, no caso de quem
tenta empurrar seu veículo morro abaixo e é impedido por terceiros. Deve, porém, haver prova de que o
fazia a fim de aplicar golpe na seguradora. Sujeito ativo do delito é o segurado. Trata-se de crime
próprio. (Gonçalves, 2020)

Sujeito passivo é a seguradora. O bem jurídico tutelado é o patrimônio da empresa seguradora, sen-
do a coisa ou o corpo do agente mero instrumento do delito.

Fraude no pagamento por meio de cheque

A t 171 § 2 N i
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início
VI it h fi i t i ã d f d158/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
Art. 171, § 2o — Na mesma pena incorre quem: VI — emite cheque sem suficiente provisão de fundos
em poder @prof.joaobittenocurt
do sacado, ou lhe frustra o pagamento

Tipo objetivo

Esse dispositivo prevê duas condutas típicas autônomas: 1) Emitir cheque sem fundos. Em tal
hipótese, no momento em que o agente preenche o cheque e o entrega a terceiro, já não existe a
quantia respectiva em sua conta bancária. É a hipótese mais comum, em que a vítima, acreditando na
boa-fé do agente, entrega-lhe uma mercadoria em troca de uma cártula que, em seguida, não é
honrada pelo banco por insuficiência de fundos, ficando, assim, com o prejuízo. 2) Frustrar o
pagamento do cheque. Nessa modalidade, existe o dinheiro respectivo na conta bancária no momento
da emissão da cártula, porém o emitente, antes de a vítima conseguir descontar o valor na agência,
saca a quantia que ali havia ou emite ordem de sustação (Gonçalves, 2020)

Para a configuração desses crimes, é necessário que o sujeito tenha agido de má-fé, isto é, com
dolo de obter vantagem ilícita pela emissão do cheque ou pela frustração de seu pagamento. Por essa
razão, não responde pelo crime em tela quem consegue provar que imaginava ter o dinheiro disponível
na conta, mas se esqueceu de que havia contas em débito automático que diminuíram o seu saldo
naquela data. (Gonçalves, 2020)

Nesse sentido existe a Súmula n. 246 do Supremo Tribunal Federal: “comprovado não ter havido
fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos”. Apesar de a súmula só fazer
menção à uma das figuras típicas, por ser ela a mais comum, é evidente que a regra também vale para
aquele que susta um cheque para um cheque para pagar um móvel ou eletrodoméstico que comprou,
mas o bem não lhe é entregue, não há crime na sustação da cártula. O delito reside na ilegítima
frustração do pagamento. (Gonçalves, 2020)

Para a configuração do crime de fraude no pagamento por meio de cheque, é necessário que a
emissão do título tenha sido a causa determinante do convencimento da vítima e, portanto, a razão
direta de seu prejuízo e do locupletamento do agente. Por tal motivo, entende-se que não se configura
tal delito quando o cheque é emitido para pagamento de dívida anterior ou de obrigação já vencida e
não paga, posto que, em tal caso, o prejuízo da vítima é anterior à emissão do cheque. (Gonçalves,
2020)

Veja-se o exemplo de pessoa que, por imprudência, causa um acidente de veículos provocando
apenas danos materiais no carro da outra parte e, imediatamente, emite um cheque para pagar pelos
estragos causados, mas o cheque volta sem fundos. Não há crime porque o prejuízo era anterior, ou
seja, foi a colisão entre os veículos que gerou o dano econômico. Em outras palavras, o causador do
acidente poderia simplesmente ter dito que não iria pagar, hipótese em que o dono do carro abalroado
teria que ingressar com ação cível para provar sua culpa e, só após a procedência da ação de
conhecimento, receberia o que lhe era devido. Assim, o cheque sem fundos melhorou a situação
jurídica do credor pois embora não tenha recebido o valor respectivo pela recusa de pagamento
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 159/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
jurídica do credor, pois, embora não tenha recebido o valor respectivo pela recusa de pagamento
decorrente@prof.joaobittenocurt
da insuficiência de fundos, não precisará ingressar com ação de conhecimento, pois, sendo
o cheque um título executivo extrajudicial, poderá ser executado imediatamente. (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência:

“Se a emissão de cheque servia para pagamento de alugueres e despesas de condomínio em


atraso, e pois, para pagamento de dívida que preexistia à sua emissão, o título não melhorou e muito
menos piorou a situação do credor, que ficou a mesma. Não foi o credor induzido a desfalcar o seu
patrimônio, por, na boa-fé, aceitar o cheque. O seu patrimônio já estava desfalcado pela dívida já
existente que deve ser cobrada pelos meios regulares. O prejuízo, evidentemente, tem que ser
resultado do recebimento do cheque pela vítima” (Tacrim-SP — Rel. Gonzaga Franceschini — Jutacrim
91/403). (Gonçalves, 2020)

Não há crime na emissão de cheque sem fundos para substituição de outro título de crédito
anteriormente emitido e não honrado. Trata-se também de hipótese de prejuízo anterior. Veja-se:
“Emissão e entrega de cheque sem lastro em substituição a nota promissória vencida não traz para o
agente proveito patrimonial e nem piora a situação do credor, podendo tão só caracterizar eventual
ilícito civil” (Tacrim-SP — Rel. Gonzaga Franceschini — Jutacrim 90/387); “Sendo material o delito do
art. 171, § 2o, VI, do CP, indispensável a superveniência de prejuízo. Não se confi-gura, portanto, o
crime quando o cheque sem fundos é dado em pagamento de dívida representada por outro título de
crédito, como, por exemplo, duplicata vencida” (TAPR — Rel. Martins Ricci — RT 629/366). (Gonçalves,
2020)

É claro, por outro lado, que existe o crime quando o cheque é emitido para pagamento de alguma
compra porque, em tal caso, a vítima entrega a mercadoria em contrapartida ao cheque recebido.
Saliente-se, ainda, que é necessário que a emissão do cheque tenha causado algum prejuízo, uma
diminuição patrimonial para a vítima, o que não ocorre, de acordo com a jurisprudência, quando a
cártula é emitida para pagamento de dívida de jogo ilícito ou de programa com prostituta. Nesse
sentido: “As dívidas de jogo ou aposta não obrigam a pagamento. Sendo ato estranho ao Direito Civil,
ipso facto, não está sujeito à sanção penal o cheque como meio de pagamento de tal dívida. Se a lei
civil, em determinado caso, nega proteção ao patrimônio, não poderá ter cabimento aí a sanção penal”
(Tacrim-SP — Rel. Ricardo Couto — RT 413/272). (Gonçalves, 2020)

Quando se trata de cheque especial, em que o banco garante o pagamento até determinado valor,
somente haverá crime se este for ultrapassado. Se o banco pagar o cheque porque o seu valor estava
dentro do limite de garantia, e o cliente não repuser posteriormente os valores, não haverá crime,
tratando-se de mero ilícito civil pelo descumprimento de cláusula contratual. (Gonçalves, 2020)

O cheque tem natureza jurídica de ordem de pagamento à vista. É, contudo, extremamente comum
que as pessoas o utilizem como se fosse uma nota promissória, no caso do cheque pré-datado (que a
doutrina costuma chamar de pós-datado porque contém data posterior à da emissão). Entende-se que,
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 160/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
p p q p ) q
nesse caso, não se pode falar no crime de fraude no pagamento por meio de cheque porque o agente
@prof.joaobittenocurt
não lançou mão do título como cheque. Assim, se o destinatário do título aguardar a data aprazada, e o
cheque não for pago por falta de fundos, duas situações podem ocorrer:

a) se ficar provado que o agente emitiu o cheque de má-fé, com intenção, desde o início, de obter
vantagem ilícita, responde por estelionato comum (art. 171, caput);

b) se não for feita tal prova, o fato será considerado atípico. (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência: “A vítima aceitando o cheque pré-datado para descontá-lo no banco sacado 17 dias
depois de sua emissão, concorreu para que o cheque fosse desfigurado de ordem de pagamento à
vista para promessa de pagamento a prazo, e, assim, o fato perdeu a tipicidade do crime previsto no
art. 171, § 2o, VI, do CP” (STF — Rel. Min. Soarez Muñoz — RT 592/445). (Gonçalves, 2020)

Distinção:

Não se confunde o crime de fraude no pagamento por meio de cheque, que só pode ser cometido
nas duas modalidades anteriormente estudadas pelo titular da conta, com inúmeros outros golpes que
podem ser praticados com cheque alheio ou com o próprio talonário, mas em situações diversas das
previstas no § 2o, VI, do art. 171, e que configuram o estelionato comum do caput, tal como nos casos
abaixo:

a) Falsificação de cheque alheio.

b) Abertura de conta corrente com documentos falsos e consequente obtenção de cheques


verdadeiros do banco. Em tal caso, o banco normalmente não paga os cheques alegando falta de
fundos, até que descobre o verdadeiro golpe — uso de documentos falsos para a abertura da conta.
Após a descoberta da farsa, resta claro que o crime é o de estelionato comum, sendo irrelevante o
carimbo de cheque sem fundos colocado pelo banco no verso da cártula.

c) Sustação do cheque antes de sua emissão. Nesse caso, a fraude é anterior à própria emissão.

d) Emissão de cheques que ainda estavam em poder do agente, mas referentes a conta corrente
que já fora encerrada:

Jurisprudêncida:

“Configura-se o estelionato clássico, previsto no caput do art. 171 do CP, o pagamento através de
cheque sem fundos, de conta encerrada, porquanto se trata de meio ardiloso preconcebido, com vistas
a ludibriar a boa-fé do credor, não se confundindo com o delito previsto no § 2o, VI, do supracitado
dispositivo legal” (TAMG — Rel. Carlos Biasutti — RT 678/358). (Gonçalves, 2020)

Existe divergência na hipótese em que alguém recebe um cheque nominal e, ao tentar sacá-lo junto
banco, é informado da inexistência de fundos e, para não ficar com o prejuízo, resolve fazer compras
át l d d
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início
Di l d i l i ã
161/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
com a mesma cártula, endossando-a. Dizem alguns que o endosso equivale a uma nova emissão
@prof.joaobittenocurt
porque recoloca o título em circulação, caracterizando, assim, o crime do art. 171, § 2o, VI, do Código
Penal. Outros sustentam que endosso e emissão são institutos distintos, de forma que o endossante
deve responder por estelionato comum. (Gonçalves, 2020)

Sujeito ativo:

É o titular da conta corrente do cheque emitido.

Sujeito passivo:

É a pessoa que sofre o prejuízo em decorrência da recusa de pagamento por parte do banco
sacado.

Consumação:

É pacífico o entendimento de que o crime em análise não se consuma no instante em que o cheque
entra em circulação, mas apenas no momento em que o banco sacado efetivamente recusa o
pagamento. Assim, não há crime quando alguém emite um cheque sem fundos, mas imediatamente
cobre o valor respectivo em sua conta bancária, antes da recusa de pagamento pelo banco. Bastará
para a consumação, contudo, uma única recusa competente, esclarecem o momento consumativo, já
que a competência se fixa pelo local da consumação do delito: (Gonçalves, 2020)

1) Súmula n. 244 do Superior Tribunal de Justiça: “compete ao foro local da recusa processar e
julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos”.

2) Súmula n. 521 do Supremo Tribunal Federal: “o foro competente para o processo e julgamento
dos crimes de estelionato, sob a modalidade de emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é
o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado”.

Assim, se a conta corrente do emitente for da cidade de Bauru, será esta a comarca competente,
qualquer que tenha sido o local da compra feita com o cheque sem fundos. (Gonçalves, 2020)

Quando, todavia, a compra é feita mediante falsificação de cheque alheio, a solução é diferente,
porque o crime cometido é o de estelionato comum, que se consuma no momento e no local da
obtenção da vantagem ilícita. Assim, se o agente faz uma compra na cidade de Niterói e ali recebe as
mercadorias compradas, mas efetua o pagamento falsificando cheque de pessoa cuja conta fica na
cidade de Campinas, o foro competente é o de Niterói. (Gonçalves, 2020)

Nesse sentido existe, inclusive, a Súmula n. 48 do Superior Tribunal de Justiça: “compete ao juízo
do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante
falsificação de cheque”.

Tentativa:

É possível em ambas as modalidades do crime:


https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 162/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
É possível em ambas as modalidades do crime:
@prof.joaobittenocurt
a) se o agente, de má-fé, emite um cheque sem fundos, e um parente ou amigo deposita o valor no
banco antes da apresentação da cártula, sem que o sujeito tenha feito qualquer pedido nesse sentido;

b) após a emissão dolosa de um cheque, o agente solicita ao gerente a sua sustação e este se
esquece de concretizá-la, vindo o cheque a ser pago. (Gonçalves, 2020)

Ressarcimento do valor do cheque

Como no crime em análise o nome do criminoso encontra-se estampado no cheque, é comum que
ele seja intimado a depor no Distrito Policial e, em tal ocasião, se disponha a ressarcir a vítima. O
Supremo Tribunal Federal, ciente de que o interesse primordial da vítima é receber o valor do cheque, e
não o de punir o seu emitente, aprovou, por política criminal, a Súmula n. 554, segundo a qual o
pagamento do valor do cheque, antes do recebimento da denúncia, retira a justa causa para a ação
penal. Essa súmula, entretanto, não se aplica a outras modalidades de estelionato, em relação às quais
o ressarcimento antes do início da ação tem apenas o condão de reduzir a pena em face do
arrependimento posterior (art. 16 do CP). (Gonçalves, 2020)

Jurisprudência:

O ressarcimento integral, no tocante ao crime de estelionato, na sua forma fundamental, não tem o
condão de extinguir a punibilidade” (STJ — AgInt no RHC 75.903/SP — Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz
— 6a Turma — julgado em 17-11-2016 — DJe 29-11-2016); “Esta Corte firmou o entendimento de que o
ressarcimento integral no tocante ao crime de estelionato, na sua forma fundamental, não tem o
condão de extinguir a punibilidade. É de ver que até se permite tal providência no que se refere ao
crime tipificado no art. 171, § 2o, VI, do Código Penal, desde que o ressarcimento ocorra em momento
anterior ao recebimento da denúncia. 3. O ressarcimento do dano, na hipótese do crime de estelionato
na sua forma fundamental, pode ensejar apenas a aplicação do art. 16 do Código Penal” (STJ — HC
279.805/SP — Rel. Min Maria Thereza de Assis Moura — 6a Turma — julgado em 23-10-2014 — DJe 10-
11-2014);

“Não se pode falar em trancamento da ação penal por falta de justa causa quanto ao crime de
estelionato na sua forma fundamental, porquanto a orientação contida na Súmula 554 do Supremo
Tribunal Federal é restrita ao crime de estelionato na modalidade de emissão de cheque sem fundos,
prevista no art. 171, § 2o, inciso VI, do Código Penal. Precedentes” (STJ — HC 156.424/SP — Rel. Min.
Laurita Vaz — 5a Turma — julgado em 20-9-2011 — DJe 3-10-2011);

“Na linha dos precedentes desta Corte, a reparação do dano, anteriormente ao recebimento da
denúncia, não exclui o crime de estelionato em sua forma básica, uma vez que o disposto na Súmula n.
554 do STF só tem aplicação para o crime de estelionato na modalidade emissão de cheques sem
fundos, prevista no art. 171, § 2o, inciso VI, do Código Penal” (STJ — RHC 20.387/BA — Rel. Min. Felix
Fischer — 5a Turma — julgado em 27-2-2007 — DJ 30-4-2007, p. 329).
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 163/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
j g ,p )

@prof.joaobittenocurt
Já o pagamento do valor do cheque após o início da ação, mas antes da sentença, implica
reconhecimento de atenuante genérica do art. 65, III, b, do Código Penal. (Gonçalves, 2020)

Causas de aumento de pena

Art. 171, § 3o — A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade


de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência. Art. 171, §
4o — Aplica-se a pena em dobro se o crime for cometido contra idosos (Gonçalves, 2020)

Além da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, são entidades de direito público as autarquias
e as entidades paraestatais. Tendo em vista o grande número de fraudes praticadas contra o INSS, o
Superior Tribunal de Justiça aprovou a Súmula n. 24 assim dispondo: “aplica-se ao crime de
estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do §
3o do art. 171 do Código Penal”. De lembrar-se apenas que o dispositivo contém, tecnicamente,
causas de aumento de pena, e não qualificadoras propriamente ditas. É comum que, com o emprego
da fraude, o próprio agente passe a auferir, mensalmente, benefícios indevidos junto à entidade
autárquica. Nesse caso, evidencia-se o caráter permanente da infração, de modo que a prescrição
somente passa a correr a partir do último recebimento.

Jurisprudência:

Nesse sentido: “É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que o ‘crime
de estelionato previdenciário, quando praticado pelo próprio beneficiário das prestações, tem caráter
permanente, cessando a atividade delitiva apenas com o fim da percepção das prestações’ (HC
107.385, Rel. Min. Rosa Weber). 2. No caso, sendo o paciente o próprio beneficiário das prestações, o
termo inicial da contagem do prazo de prescrição é a data em que cessada a permanência do delito
(art. 111, III, do CP)” (STF — HC 99.503 — Rel. Min. Roberto Barroso — 1a Turma — julgado em 12-11-
2013, acórdão eletrônico DJe-244 divulg. 11-12-2013, public. 12-12-2013); “Paciente que é beneficiário
das parcelas de aposentadoria percebidas mediante fraude (recebimento de auxílio-doença mediante a
falsificação de laudos periciais) pratica crime permanente, previsto no art. 171, § 3o, do CP, cuja
execução se protrai no tempo, renovando-se a cada parcela recebida. Assim, o termo inicial do prazo
prescricional deve ser contado a partir da cessação do pagamento do benefício indevido, e não do
recebi- mento da primeira parcela remuneratória. 2. Ordem denegada” (STF — HC 117.168 — Rel. Min.
Teori Zavascki — 2a Turma — julgado em 3-9-2013, processo eletrônico DJe-182 divulg. 16-9-2013,
public. 17-9-2013). No mesmo sentido a 3a Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou
entendimento de que, “sendo o objetivo do estelionato a obtenção de vantagem ilícita em prejuízo
alheio, nos casos de prática contra a Previdência Social, a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma
é reiterada, mês a mês, enquanto não há a descoberta da aplicação do ardil, artifício ou meio
fraudulento. Tratando-se, portanto, de crime permanente, inicia-se a contagem para o prazo
prescricional com a supressão do recebimento do benefício indevido e, não, do recebimento da
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 164/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

primeira parcela da prestação previdenciária, como entendeu a decisão que rejeitou a denún-cia” (REsp
@prof.joaobittenocurt
1.206.105/RJ — Rel. Min. Gilson Dipp — 3a Seção — julgado em 27-6-2012, DJe 22-8-2012).
(Gonçalves, 2020)

Note-se que, nesses casos, o agente emprega fraude uma única vez e passa a auferir lucros ilícitos
mensais, tratando-se, assim, de crime único (de natureza permanente). Diferente é a hipótese —
razoavelmente comum — em que terceira pessoa, após a morte do beneficiário regular, apossa-se do
cartão do falecido e, ludibriando a autarquia (sem comunicar a morte), vai mensalmente ao banco para
retirar os valores indevidos após a morte. Em tal caso temos crimes de estelionato em continuidade
delitiva (um para cada saque indevido), pois o agente, a cada mês, realiza nova fraude. (Gonçalves,
2020)

Jurisprudência:

Nesse sentido: “O delito de estelionato, praticado contra a Previdência Social, mediante a realização
de saques depositados em favor de beneficiário já falecido, consuma-se a cada levantamento do
benefício, caracterizando-se, assim, continuidade delitiva, nos termos do art. 71 do Código Penal,
devendo, portanto, o prazo prescricional iniciar-se com a cessação do recebimento do benefício
previdenciário. Precedentes. Agravo regimental desprovido” (STJ — AgRg no REsp 1.378.323/PR — Rel.
Min. Marilza Maynard (Desembargadora Convocada do TJ/SE) — 6a Turma — julgado em 26-8-2014 —
DJe 10-9-2014); “Tem aplicação a regra da continuidade delitiva ao estelionato previdenciário
praticado por terceiro, que após a morte do beneficiário segue recebendo o benefício antes
regularmente concedido ao segurado, como se ele fosse, sacando a prestação previdenciária por meio
de cartão magnético todos os meses. 2. Diversamente do que ocorre nas hipóteses de inserção única
de dados fraudulentos seguida de plúrimos recebimentos, em crime único, na hipótese dos autos não
há falar em conduta única, mas sim em conduta reiterada pela prática de fraude mensal, com
respectiva obtenção de vantagem ilícita. 3. Recurso desprovido” (STJ — REsp 1.282.118/RS — Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura — 6a Turma — julgado em 26-2-2013 — DJe 12-3-2013). (Gonçalves,
2020)

O Superior Tribunal de Justiça entende inaplicável o princípio da insignificância ao estelionato


previdenciário: “O princípio da insignificância ‘não se aplica ao delito previsto no art. 171, § 3o, do
Código Penal, uma vez que o prejuízo não se resume ao valor recebido indevidamente, mas se estende
a todo o sistema previdenciário, notadamente ao FAT — Fundo de Amparo ao Trabalhador’ (EDcl no
AgRg no REsp 970.438/SP — Rel. Min. Og Fernandes — 6a Turma — julgado em 11.09.2012; HC
180.771/SP — Rel. Min. Jorge Mussi — 5a Turma — julgado em 16.10.2012)” (STJ — RHC 56.754/RS —
Rel. Min. Nefi Cordeiro — 6a Turma — julgado em 3-5-2016 — DJe 12-5-2016); (Gonçalves, 2020)

“O aresto objurgado alinha-se a entendimento assentado neste Sodalício no sentido de que


cuidando-se de estelionato praticado contra entidade de direito público, inviável se mostra o
reconhecimento do crime de bagatela independentemente dos valores obtidos indevidamente pelo
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 165/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
reconhecimento do crime de bagatela, independentemente dos valores obtidos indevidamente pelo
agente, haja vista a maior reprovabilidade de sua conduta, que atenta contra o patrimônio público, a
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moral administrativa e a fé pública, situação que atrai o óbice do Verbete Sumular n. 83/STJ, também
aplicável ao recurso especial interposto com fundamento na alínea a do permissivo constitucional”
(STJ — AgRg no AREsp 627.891/RN — Rel. Min. Jorge Mussi — 5a Turma — julgado em 17-11-2015 —
DJe 25-11-2015). (Gonçalves, 2020)

Será também majorada a pena se o crime for cometido contra instituto de economia popular,
assistência social ou beneficência, justificando-se o aumento pelo fato de que o prejuízo reflete em
seus beneficiários — que são pessoas necessitadas. A Lei n. 13.228/2015 acrescentou uma causa de
aumento de pena no art. 171, § 4o, do Código Penal, que recebeu a denominação “estelionato contra
idoso”. Estabelece referido dispositivo que a pena do estelionato será aplicada em dobro quando a
vítima do delito for pessoa idosa, ou seja, com idade igual ou superior a 60 anos. Há muitos casos,
todavia, em que o agente não tem conhecimento de que a vítima é idosa e, em tais hipóteses, a
majorante não poderá incidir, como, por exemplo, em certos golpes perpetrados pela internet nos quais
não há qualquer contato entre o autor do crime e a vítima. (Gonçalves, 2020)

Falsificação de documento público

Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público
verdadeiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se


a pena de sexta parte.

§ 2º - Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade


paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os
livros mercantis e o testamento particular.

§ 3o Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir:

I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova


perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório;

II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva


produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido escrita;

III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da


empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado.

§ 4o Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3o, nome do
segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato de trabalho ou de prestação
de serviços

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 166/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

O crime de falsificação de documento é mais conhecido pela denominação “fal-sidade material”,


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diferenciando-se, assim, da falsidade ideológica (que também é modalidade de falsidade documental).

ormalidades legais, no desempenho de suas funções. Exs.: carteira de identidade, CPF, Carteira de
Habilitação, Carteira Funcional, Certificado de Reservista, Título de Eleitor, escritura pública etc. Um
particular pode cometer crime de falsidade de documento público, desde

que falsifique documento que deveria ter sido feito por funcionário público ou altere documento
efetivamente elaborado por este. Não se trata, portanto, de crime próprio, podendo ser cometido por
funcionário público ou por particular. Na hipótese de a falsificação ter sido feita por funcionário,
prevalecendo-se de seu cargo, a pena sofre-rá aumento de um sexto, nos termos do art. 297, § 1o.

Documentos públicos por equiparação O art. 297, em seu § 2o, equipara alguns documentos
particulares a documento

público, permitindo, assim, a punição de quem os falsifica como incursos em crime mais grave. Os
documentos públicos por equiparação são os seguintes:

a) os emanados de entidade paraestatal (autarquias, empresas públicas, so-ciedades de economia


mista, fundações instituídas pelo Poder Público); b) o título ao portador ou transmissível por endosso
(cheque, nota promissó-ria etc.); c) as ações das sociedades mercantis: sociedades anônimas ou em
comandita por ações; d) os livros mercantis: utilizados pelos comerciantes para registro dos atos de
comércio (livro diário, por exemplo). Veja-se, porém, que a falsificação do livro de registro de
duplicatas caracteriza crime específico, previsto no art. 172, parágrafo único, do Código Penal; e) o
testamento particular (hológrafo): aquele escrito pessoalmente pelo testador (art. 1.876 do Código
Civil)

Falsificação de documento particular

Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular
verdadeiro:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Falsificação de cartão

Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de
crédito ou débito.

Tipo objetivo Documento particular é aquele que não é público em si mesmo ou por equipa-ração.
Os requisitos dos documentos particulares são os mesmos dos documentos públicos (forma escrita,
autor certo, conteúdo com relevância jurídica e valor proba-tório), sendo que, entretanto, não são
elaborados por funcionário público no desem-penho de suas funções. Ex.: contratos de compra e
venda, de locação, notas fiscais, carteira de sócio de clube etc. O documento particular registrado em
cartório não tem sua natureza alterada. O

registro é apenas para dar publicidade ao documento, no sentido de ficar registrada a sua
existência em determinada data, mas não altera seu caráter particular. Assim, quando alguém registra
um compromisso de compra e venda, a finalidade é demons-trar que tal contrato já havia sido
celebrado em certa data, de modo que uma venda posterior a outra pessoa não tenha valor. Se, depois
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 167/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
celebrado em certa data, de modo que uma venda posterior a outra pessoa não tenha valor. Se, depois
do registro, alguém modifica ma-liciosamente cláusulas do contrato, comete falsificação de
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documento particular (na modalidade de “alteração”). Por sua vez, se alguém altera a própria matrícula
do imó-vel no Cartório (registros ou averbações), comete falsificação de documento público. A cópia
autenticada de documento particular continua sendo documento particular.

o falsificado seja semelhante a um verdadeiro. Caso se trate de um plástico em branco com clone
apenas da fita magnética, incapaz de enganar pessoas mas apto a viabilizar sa-ques indevidos em
caixas eletrônicos, a punição será apenas pelo crime de furto. A falsidade material de documento
particular para fins eleitorais constitui crime especial, previsto no art. 349 do Código Eleitoral (Lei n.
4.737/65)

Falsidade ideológica

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele
inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três


anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular. (Vide Lei nº
7.209, de 1984)

Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo,


ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta
parte.

Tipo objetivo A falsidade ideológica também é conhecida por falsidade intelectual, ideal ou mo-ral.
Nela, o documento é autêntico em seus requisitos extrínsecos e emana realmente da pessoa que nele
figura como seu autor. Assim, apenas o seu conteúdo é falso. Conforme menciona o tipo penal, trata-
se de falsidade nas declarações contidas no documento. • Condutas típicas

Estão elencadas no art. 299 três condutas típicas:

1) Omitir declaração que devia constar do documento. Nessa modalida-de, a conduta é omissiva
pois se refere a uma declaração que deixou de constar. O agente elabora um documento deixando,
dolosamente, de inserir alguma informação que era obrigatória. 2) Inserir declaração falsa ou diversa
da que devia constar. O agente con-fecciona o documento inserindo informação inverídica ou diversa
da que de-via constar. Trata-se de conduta comissiva. Exs.: autoridade responsável que elabora
Carteira de Habilitação declarando que determinada pessoa é habili-tada quando ela, em verdade, foi
reprovada no exame (declaração falsa); ou declarando que a pessoa é habilitada em categoria diversa
da qual ela foi efetivamente aprovada (declaração diversa da que deveria constar).

te fornece informação falsa a terceira pessoa, responsável pela elaboração do documento, e esta,
sem ter ciência da falsidade, o confecciona. Ex.: alguém declara que é solteiro ao Tabelião durante a
lavratura de uma escritura para prejudicar os direitos de sua esposa de quem está se divorciando.

Nas duas primeiras hipóteses (omitir e inserir) existe a chamada falsidade ime-diata, pois é a
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 168/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

própria pessoa que confecciona o documento quem comete o falso ideológico. Na última modalidade
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(fazer inserir) a lei não pune quem confecciona o documento, mas quem lhe passa a informação falsa
(falsidade mediata). Nessa figura quem elabora o documento está de boa-fé, desconhece a falsidade
da declaração. Se tal pessoa conhecesse a falsidade da declaração e, ainda assim, elaborasse o
documento, seria autor do crime na modalidade “inserir” declaração falsa, ao passo que a pessoa que
lhe solicitou ou incentivou para desse modo agir seria partícipe de tal crime.

Objeto material As condutas podem recair sobre documento público ou particular, sendo que, na

primeira hipótese, a pena é de reclusão, de um a cinco anos, e multa, e, na segunda, reclusão, de um


a três anos, e multa.

Certidão ou atestado ideologicamente falso

Art. 301 - Atestar ou certificar falsamente, em razão de função pública, fato ou circunstância que
habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer
outra vantagem:

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

Falsidade material de atestado ou certidão

§ 1º - Falsificar, no todo ou em parte, atestado ou certidão, ou alterar o teor de certidão ou de


atestado verdadeiro, para prova de fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público,
isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem:

Pena - detenção, de três meses a dois anos.

§ 2º - Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se, além da pena privativa de liberdade, a
de multa.

Objetividade jurídica A fé pública, no sentido de se evitar que funcionários públicos emitam atestado

ou certidão ideologicamente falsos a fim de beneficiar alguém perante a Administra-ção.

Tipo objetivo Não se deve confundir o crime em tela com o delito de falsidade ideológica (art.

299), que se refere à falsificação de um documento. Aqui a conduta recai sobre ates-tado ou certidão
feito por funcionário público acerca de fato ou circunstância. No dizer de Damásio de Jesus,251

“atestado é um documento que traz em si o testemunho

de um fato ou circunstância. O signatário o emite em face do conhecimento pessoal a respeito de seu


objeto, obtido, na espécie do tipo, no exercício de suas atribuições funcionais. Certidão (ou certificado)
é o documento pelo qual o funcionário, no exer-cício de suas atribuições oficiais, afirma a verdade de
um fato ou circunstância con-tida em documento público”. A diferença, portanto, é que a certidão é
feita com base em um documento guardado ou em tramitação em uma repartição pública, enquanto o
atestado é um testemunho por escrito do funcionário público sobre um fato ou cir-cunstância. Só
existe o crime quando o atestado ou certidão emanam originariamente do funcionário público A
https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 169/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt
existe o crime quando o atestado ou certidão emanam originariamente do funcionário público. A
conduta de extrair cópia falsa de documento público guar-dado em repartição constitui crime mais
@prof.joaobittenocurt
grave, de falsidade documental. O fato ou circunstância a que a lei se refere deve guardar relação com
a pessoa

destinatária. Além disso, exige-se para a configuração desse delito que o atestado ou certi-dão tenha
por finalidade a) habilitar alguém a obter cargo público; b) isentá-lo de ônus ou de serviço de caráter
público; c) levá-lo à obtenção de qualquer outra vantagem. Essa última hipótese é uma formulação
genérica, mas, segundo a doutrina dominante, deve ser in-terpretada em consonância com as três
hipóteses anteriores, ou seja, a vanta-gem deve ter caráter público.

São exemplos: dar atestado de bom comportamento carcerário para preso conse-guir algum benefício
ou para determinada pessoa obter cargo público; atestar que al-guém é pobre para obter defensor
público ou a assistência do Ministério Público, ou, ainda, para obter vaga em hospital público; certificar
que alguém já atuou como jurado para isentá-lo de novamente atuar nessa função; certificar que
alguém já prestou servi-ço militar para isentá-lo de qualquer ônus etc. Ressalte-se que, para a
caracterização do delito, é necessário que o funcionário

saiba da falsidade da informação e da finalidade a que se destina o atestado ou certidão (obtenção de


cargo público, isenção de ônus etc.) e, mesmo assim, dolosamente o emita.

PARÁGRAFO PRIMEIRO

Tipo objetivo Nessa modalidade de delito, a falsidade do atestado ou certidão é material e,

portanto, consiste em falsificar, no todo ou em parte, atestado ou certidão, ou alterar o teor de certidão
ou atestado verdadeiro. É também necessário que o objeto da fal-sificação seja fato ou circunstância
que habilite alguém a obter cargo público, isen-ção de ônus ou de serviço de caráter público, ou
qualquer outra vantagem. É necessário que o dolo do agente abranja a finalidade para a qual será
utiliza-do o objeto material do crime.

Falsidade de atestado médico

Art. 302 - Dar o médico, no exercício da sua profissão, atestado falso:

Pena - detenção, de um mês a um ano.

Parágrafo único - Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa.

Tipo objetivo O tipo penal é expresso no sentido de que o crime em análise pressupõe que um

profissional da medicina forneça um atestado médico falso a alguém. O crime só se caracteriza


quando o conteúdo do atestado guarda relação com as funções médi-cas: existência de certa doença,
necessidade de repouso para convalescência, atendi-mento de pessoa em consulta médica, atestado
de óbito etc. A falsidade pode ser total ou parcial, mas deve referir-se a ato juridicamente relevante. O
atestado deve ter sido dado por escrito. Quem usa o atestado médico falso incorre no crime do art.
304 com a pena do art. 302.

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 170/171
08/09/2022 19:55 @prof.joaobittenocurt

RELATIVO@prof.joaobittenocurt
AOS DELITOS DE FALSIDADE, ELABORADO COM BASE NA OBRA DE Gonçalves, Victor
Eduardo R. Esquematizado - Direito penal - parte especial. Disponível em: Minha Biblioteca, (10th
edição). Editora Saraiva, 2020.

BIBLIOGRAFIA
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ESTEFAN, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal Esquematizado. 3. ed. São Paulo:
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GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, 2015.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2002.

MASSON, Cleber. Direito Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal, 7. ed. São Paulo: RT, 2011.

_______Código Penal Comentado. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

QUEIROZ, Paulo. Curso de Direito Penal. 10 ed. Editora JusPodivm, 2014.

SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal, Parte Geral. 5. ed. Florianópolis: Conceito editorial, 2012.

SILVA, David Medina da. O Crime Doloso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

ZAFFARONI, Raúl Eugenio; PIERANGELI, José Henrique. Da Tentativa. 6. ed. São Paulo: RT, 2000.

___________Manual de Direito Penal Brasileiro. 2. ed. São Paulo: RT, 1999.

ZAFFARONI, Raúl Eugenio. Estructura Basica del Derecho Penal. Buenos Aires: Ediar, 2012.

https://sites.google.com/view/prof-joaobittenocurt/início 171/171

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