Você está na página 1de 5

9. As cidades, as catedrais, as universidades e a escolástica.

As Cidades
Com a chegada dos povos germânicos (séculos V e VI) muitas pessoas que viviam
nas cidades da Antiguidade se deslocaram para a área rural. Fizeram isso, ou por temor
das tribos germânicas que chegavam, algumas delas bastante violentas, ou pelo fato de
que estando na área rural estavam mais próximos dos alimentos, caso acontecesse alguma
guerra.
Por isso a Alta Idade Média (476-1000) se caracterizou por ser o período em que
a população se encontrava na área rural1, mesmo se nem todas as cidades, do período
Antigo, deixaram de existir, elas se despovoaram. Também vai ser na Alta Idade Média
que vai se desenvolver o feudalismo2, um sistema que se caracterizava pela
descentralização do poder, ou seja, o poder estava nas mãos dos senhores feudais (donos
dos feudos-nobres). Cada feudo (um grande pedaço de terra-latifúndio) tinha a sua justiça,
a sua administração e a sua economia. Além disso, a economia era baseada na agricultura
e na utilização do trabalho dos servos. Outra característica do feudalismo são as relações
de suserania e vassalagem. O suserano era quem dava um lote de terra ao vassalo, em
troca o vassalo prestava um juramento de fidelidade ao suserano. O suserano, por sua vez,
prometia a proteção deste vassalo. O rei era um suserano como outro (neste período ele
não tinha o poder do reino centralizado na sua mão). Os servos eram aqueles que
trabalhavam a terra dos senhores feudais (suseranos ou vassalos). Estes servos eram
camponeses que recebiam um pedaço de terra (do senhor feudal) para trabalharem para
eles mesmos, mas em troca deveriam pagar uma série de tributos ao senhor feudal como,
por exemplo: a corveia (trabalhar alguns dias da semana nas terras do senhor feudal), a
talha (parte da produção do servo deveria ser dada ao senhor feudal), a banalidade (taxa
paga pelo uso de instrumentos ou bens do feudo como o moinho, o forno, o celeiro ou
pontes), etc. Outra característica do feudalismo era a pouca mobilidade social, ou seja,
quem nascia nobre morria nobre, quem nascia servo morria servo.
A partir da segunda metade do século X começaram a surgir as novas cidades e
aquelas da Antiguidade, que nunca desapareceram, passaram a se repovoar. Essas novas
cidades, que em um primeiro momento eram apenas um agrupamento de casas, vão surgir
nos cruzamentos das estradas. Essas vilas surgiram onde aconteciam as feiras. Ou seja, o

1
LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 47.
2
IRVIN, D. T.; SUNQUIST, S. W. História do Movimento Cristão Mundial. São Paulo: Paulus, 2004, p.
426-427.
ressurgimento das cidades está ligado ao renascimento do comércio desse mesmo
período.
As cidades que nasceram, a partir do século X, e mesmo aquelas já existentes, que
aos poucos foram se repovoando, foram chamadas de burgos. Por isso seus moradores
foram chamados de burgueses. Sempre que falarmos de burgueses na Idade Média
estamos falando de habitantes das cidades, que na maioria das vezes eram comerciantes3
ou pequenos artesãos. Na Idade Média morar nas cidades passou a ser considerado um
ato de liberdade em relação às obrigações que os servo tinham para com o senhor dono
da terra. Stadtluft macht frei (o ar das cidades torna você livre) era um ditado popular em
regiões da atual Alemanha4.
O morador das cidades tinha sido servo ou era nobre. Por isso aqui já se encontra
uma mudança de uma das características do feudalismo que era a pouca mobilidade
social. O servo que vai para a cidade, muitas vezes, melhora a sua condição social (por
isto o ditado anterior). É bom lembrar que estas novas cidades surgiram em um lugar que
estava dentro de um feudo, por isso em um primeiro momento estas cidades dependiam
do senhor feudal daquele território. Também vai ser por essa razão que estas cidades terão
que pagar as taxas impostas por este senhor. Com o passar do tempo algumas cidades vão
conseguir comprar a sua independência (cidades livres). Outra característica das cidades
era que o poder dentro delas era compartilhado, além disso serão criadas leis próprias
para uma melhor organização. Este processo de renovação do fenômeno urbano
aconteceu entre o século XI e XIII.
Além de estar dentro de um feudo, ter uma organização própria, ser habitada por
burgueses (que muitas vezes tinham saído do campo), outra característica das cidades
medievais eram as suas muralhas5. Todas as cidades medievais eram muradas como forma
de proteção para possíveis ataques6.

3
LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 164-166.
4
Idem, p. 144-151.
5
Idem, p. 146.
6
Visualizar algumas muralhas medievais: disponível em
https://www.google.com/search?q=muralhas+medievais&client=firefox-b-d&sxsrf=ALeKk03SxmrbAM-
Ib1fA-
O6ALG5P7Rtm6w:1591021864286&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ahUKEwjewbOo6uDpAhW
jA9QKHYyXAa0Q_AUoAXoECA0QAw&biw=1221&bih=559 Acesso em 26/05/2020.
As Catedrais
Entre o século X e XII surgiu na Europa um estilo arquitetônico denominado
Românico. A partir do século XII surgiu um novo estilo arquitetônico que os estudiosos
consideram ser uma evolução do Estilo Românico e que foi denomina Estilo Gótico7.
O Estilo Gótico ou Arquitetura Gótica foi desenvolvido na França em pleno
período medieval, onde originalmente se chamava "Obra Francesa" (Opus Francigenum).
O exemplo máximo da Arquitetura Gótica foram as Catedrais. Essas construções tinham
como características a verticalidade (sempre muito altas, para estar mais perto de Deus),
a iluminação, por isto muitas janelas e a rosácea (também com o seu sentido espiritual).
As Catedrais eram construídas nas cidades e por isto nascem dentro daquele
contexto. A medida que as cidades foram se enriquecendo os moradores das cidades
acreditavam que precisavam agradecer a Deus por tudo o que Ele lhes havia
proporcionado. Por isso constroem as Catedrais. A ideia da verticalidade entra no
contexto de tentar chegar ao céu. Isto vai exigir que os arquitetos estudassem novas
formas de construções para que paredes tão altas não caíssem (por isto que este período
também vai significar um desenvolvimento da arquitetura e da construção civil).
Paralelemente as cidades vão começar a disputar quem tinha a Catedral mais alta e mais
bonita.
A primeira igreja construída em Estilo Gótico foi a Catedral Basílica de Saint
Denis (1144), outras importantes igrejas em Estilo Gótico foram a Catedral de Chartres
(1260), a Catedral de Notre Dame de Reims (iniciada em 1211 só foi completada em
1516), a Catedral de Colônia (começou a ser construída em 1248 e terminou em 1880),
Catedral de Amiens (começou a ser construída em 1220 e terminou em 1288), Catedral
de Notre Dame Paris (começou a ser construída em 1163).

As Universidades
A palavra Universidade apareceu pela primeira vez em Paris, para designar a
comunidade de mestres e de estudantes parisienses (universitas magistrorum et
scholarium), em 12218. A Universidade nasceu nas cidades e em um primeiro momento
era chamada de Escola da Catedral, porque funcionava junto das Catedrais e era uma
instituição da Igreja. A Universidade se constituía de um curso básico (ou artes liberais).
O curso básico era composto de sete áreas: gramática, retórica e lógica (trivium) e

7
A apresentação deste trabalho sobre o Estilo Gótico está bem interessante, dar uma olhada, disponível
em http://pt.slideshare.net/alessandroderetti/arte-gtica-7667781 Acesso 27/09/2019.
8
LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 173.
aritmética, música, geometria e astronomia (quadrivium). Qualquer pessoa podia cursar
o curso básico, as exigências eram: saber latim, pagar as taxas e ser do sexo masculino.
Os meninos começavam seus estudos aos 13 ou 14 anos. Depois deste curso básico o
estudante podia ingressar nas escolas superiores que tinha três campos: medicina, direito
(canônico e civil) e teologia. Terminado o primeiro nível o estudante defendia uma tese
e se tornava mestre de artes. A partir daí esse estudante podia ensinar. Nas escolas
superiores a conclusão do período de estudos culminava com o doutorado. Qualquer
pessoa podia submeter uma tese para a defesa pública, inclusive mulheres9.
O surgimento do mestre universitário foi paralelo ao surgimento do comerciante
(mercador). O comerciante foi acusado de vender o tempo que só pertencia a Deus. O
mestre universitário vai ser acusado de vender um bem que só pertence a Deus, a ciência.
O mestre universitário acumulava um trabalho de reflexão e escrita (pesquisa) e um
trabalho de ensino10.
Como já foi dito a universidade era uma instituição da Igreja por isto tinha certa
autonomia com relação ao poder temporal. Contudo, como instituição da Igreja, a
universidade teve que aceitar algumas intervenções pontifícias (distantes e leves). Mais
duras foram algumas intervenções de bispos, como as intervenções do bispo de Paris
Estevão Tempier (1268-1279)11. Em 1270 e 1277 o bispo de Paris Estevão Tempier
publicou condenações contra os mestres parisienses, inclusive Tomás de Aquino, contra
os empréstimos, reais ou supostos, dos mestres parisienses das ideias de um comentador
árabe de Aristóteles, Averróis12.
Comumente se considera a Universidade de Bolonha como a primeira
universidade que foi fundada (1088). A Universidade de Paris foi fundada em 1170.

A Escolástica
A Escolástica foi um método de ensino utilizado na Idade Média nas
Universidades. Esse método se caracterizava pela tentativa de conciliar a fé cristã com a
razão. Anselmo de Cantuária (1033-1109)13 é considerado o pai da Escolástica. O método

9
IRVIN, D. T.; SUNQUIST, S. W. História do Movimento Cristão Mundial. São Paulo: Paulus, 2004, p.
528-529.
10
LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 174.
11
Idem, p. 174-175.
12
Averróis (1126-1198) foi um filósofo e médico muçulmano nascido em Córdoba, na Espanha. Um dos
maiores conhecedores e comentadores de Aristóteles e quem contribuiu para a redescoberta de Aristóteles
na Europa. Disponível em https://educacao.uol.com.br/biografias/averroes.htm Acesso 01/06/2020.
13
IRVIN, D. T.; SUNQUIST, S. W. História do Movimento Cristão Mundial. São Paulo: Paulus, 2004, p.
530-531.
da Escolástica se baseava no uso da dialética: arte de argumentar por perguntas e respostas
em uma situação de diálogo. A meta da dialética era a inteligência da fé. Esse
procedimento implicava o recurso à razão14.
O método da Escolástica funcionava da seguinte forma, tendo por objetivo
construir um problema. O mestre apresentava uma quaestio (questão) e essa quaestio era
discutida (disputatio) entre o mestre e os alunos. Depois da discussão (disputatio) era o
mestre quem chegava a solução do problema (determinatio)15.

14
LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 185.
15
Idem, p. 186.

Você também pode gostar