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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL

CAPITULO III
PESSOAS COLETIVAS

73. Classificações doutrinais das pessoas coletivas: Corporações e Fundações; Pessoas coletivas de direito público e Pessoas coletivas de direito privado
As pessoas coletivas são objeto de numerosas classificações. Importa dar indicação dos termos e do conteúdo das principais.
Corporações e Fundações
Tem ela por critério a composição do substrato quanto ao primeiro dos elementos integradores: as corporações são coletividades de pessoas, as fundações são
massas de bens.
As Corporações são constituídas e governadas por um agrupamento de pessoas (os associados), que subscrevem originariamente os estatutos e outorgam no
ato constitutivo ou aderem posteriormente à organização. Os associados dominam através dos órgãos da corporação, podendo mesmo alterar os estatutos.
As Fundações são instituídas por um ato unilateral do fundador de afetação de uma massa de bens a um dado escopo de interesse social. O fu ndador, além de
indicar no acto da instituição o fim da Fundação e de especificar os bens que lhe são destinados, estabelecerá de uma vez para sempre as normas disciplinadoras
da sua vida e destino.
As Corporações visam um fim próprio dos associados, podendo ser altruístico, e são governadas pela vontade dos associados. São regidas por uma vontade
imanente, por uma vontade própria, que vem de dentro e, por isso, pode dizer-se que têm órgãos dominantes.
As Fundações visam um interesse estranho às pessoas que entram na organização fundacional; viam um interesse do fundador de natureza social e são
governadas pela vontade inalterável do fundador, que deu o impulso inicial à Fundação e, desse modo, a animou com a vontade n ecessária à sua vida. São
reguladas, pois, por uma vontade transcendente, por uma vontade de outrem, que vem de fora e, por isso, pode dizer-se que têm organização servientes.

Pessoas coletivas de direito público e pessoas coletivas de direito privado


Esta distinção é traçada na doutrina em aplicação de critérios variados. Reina acerca dos termos da distinção uma grande variedade de opiniões.
Limitar-nos-emos a expor um critério que nos pareceu ser o mais nítido de todos.
O critério proposto pode sintetizar-se neste enunciado: são de direito público as pessoas coletivas que disfrutam, em maior ou menor extensão, o chamado jus
imperii, correspondendo-lhe portanto quaisquer direitos de poder público, quaisquer funções próprias da autoridade estadual; são de direito privado todas as
outras.
Pessoas coletivas públicas são pois aquelas às quais couber uma tal posição de supremacia, uma tal possibilidade de afirmar uma vontade imperante. A pessoa
coletiva pública por excelência será o próprio Estado, visto que lhe compete a totalidade do poder público, só podendo este pertencer a outras pessoas coletivas
na exata proporção em que o Estado lho tenha concedido. Públicas são ainda estas mesmas pessoas coletivas a que costuma dar-se o nome de entes públicos
menores, por serem titulares ou portadores do poder público, mas só num âmbito mais reduzido e subordinadamente ao imperium estadual. Uma pessoa
coletiva será deste género quando possa formular determinações que valham e tenham força executória em confronto de terceiros e não só dos seus próprios
associados, tratando-se de corporações, ou só em confronto destes, sendo todavia, por qualquer forma, legalmente obrigatória a sua pertinência à corporação.
A distinção – pessoas coletivas públicas/pessoas coletivas privadas – representa a transposição para o domínio da personalidade coletiva da summa divisio do
direito.
Compreende-se, pois, a dificuldade de encontrar um critério unânime, bem como a existência de zonas cinzentas ou de transição.
Pensamos que uma correta solução deste problema deve encontrar-se a partir da diversidade de regimes jurídicos consagrados na lei para as pessoas coletivas
públicas e para as pessoas coletivas privadas e do fundamento racional dessa diversidade.

Pessoas coletivas públicas


Categorias dentro das referidas pessoas coletivas:
a) as pessoas coletivas de população e território, como o Estado e as autarquias locais (freguesia, município, distrito);
b) os institutos públicos (por ex. as Universidades), que são serviços e fundos do Estado e das Regiões Autónomas, dotados de personalidade jurídica, e integram
a administração indireta do Estado e das Regiões Autónomas.

Pessoas coletivas privadas


Seguimos aqui o critério e a tipologia de Manuel de Andrade. De acordo com tal critério, há que distinguir as pessoas coletivas de utilidade pública e as pessoas
coletivas de utilidade particular.
As pessoas coletivas de utilidade pública podem dividir-se ainda em pessoas coletivas de fim desinteressado ou altruístico e pessoas coletivas de fim interessado
ou egoístico.
Passamos pois a explicar.

a) pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública: são as que se propõem um escopo de interesse público, ainda que, concorrentemente se dirijam à
satisfação de um interesse dos próprios associados ou do próprio fundador. Mas são possíveis diversas modalidades:
→ pessoas coletivas de fim desinteressado ou altruístico: o interesse a satisfazer é de natureza altruística, ou seja, é o interesse em promover certos
interesses de outras pessoas (os beneficiários). Os associados ou o fundador tomam a peito determinados interesses alheios. E trata-se de pessoas coletivas de
utilidade pública, porque à comunidade social importa que tais interesses sejam satisfeitos. A esta categoria pertencem todas as fundações – excetuado
porventura algum raríssimo caso e ainda um grande número de associações, como as de beneficência ou as humanitárias.
→ pessoas coletivas de fim interessado ou egoístico: nestas pessoas coletivas o escopo visado interessa de modo egoístico aos próprios associados, mas é tal
que ao mesmo tempo interessa à comunidade. Este fim pode ser de diversa ordem, daí uma subsequente subdistinção em:
1. Pessoas coletivas de fim ideal - o objetivo egoístico que uma pessoa coletiva se proponha pode consistir num interesse de natureza ideal (não económica):
recreio, desporto, instrução, cultura física ou intelectual, etc. É o que sucede, por ex. com clubes recreativos ou desportiv os.
2. Pessoas coletivas de fim económico não lucrativo – a pessoa coletiva pretende conseguir certas vantagens patrimoniais para os seus associados: subsídios
pecuniários no caso de invalidez, empréstimos em boas condições, etc. Trata-se, pois, de uma finalidade económica. Mas não de finalidade lucrativa, pois não se
cuida propriamente de obter lucros para repartir pelos associados. Nesta categoria localizam-se as associações de socorros mútuos e instituições congéneres, as
caixas de crédito agrícola, os sindicatos, as associações patronais e as cooperativas de consumo, crédito, construção e habitação. O escopo visado por estas
associações, ao mesmo tempo que interessa de modo egoístico aos associados, interessa também à coletividade.

b) pessoas coletivas de direito privado e utilidade particular: a finalidade própria destas pessoas coletivas é de mero interesse particular. Também aqui o
interesse privado não deixa de ter atinências com o interesse público, só não assumem relevo especial, e por isso a lei limita-se a olhar ao interesse particular
dos associados. As pessoas coletivas de utilidade particular só podem ser as que se dirigem a um escopo lucrativo: fazer lucros para distribuir entre os seus
componentes. Trata-se das sociedades; daquelas sociedades que têm personalidade jurídica. Devem integrar-se igualmente neste âmbito os chamados
agrupamentos complementares de empresas (A.C.E), bem como os agrupamentos europeus de interesse económico (A.E.I.E). Trata-se de agrupamentos de
pessoas singulares ou coletivas (sobretudo sociedades) com o fim de melhorar as condições de exercício ou de resultado das respetivas atividades económicas,
mediante, por ex., a realização de estudos e investigações de natureza técnica e económica que a todos interessem, a aquisição de maquinaria para emprego
em comum, a propaganda e a representação de produtos em mercados externos, etc.

74. Classificações legais das pessoas coletivas: Associações, Fundações e Sociedades Associações, fundações e sociedades - Esta classificação tripartida
(Associações, Fundações, Sociedades) não tem um carácter unitário, porque as associações e sociedades são pessoas coletivas de tipo corporativo e por isso
opõem-se às fundações. Por outro lado, as associações e fundações, integram uma mesma categoria oposta às sociedades, porque estas visam fins económicos
e aquelas não.
A tipificação legal das Associações, Fundações e sociedades é notória no Código Civil. Este regula a matéria das associações e fundações no cap. II, dedicado às
pessoas coletivas, arts. 167º seg. - Associações; arts. 185º seg. - Fundações.

Espécies ou tipos de sociedades:


A primeira distinção a estabelecer é entre as sociedades civis e as sociedades comerciais:
● As sociedades comerciais (art. 980.º) tenham por objeto a prática de atos de comércio e adotem o tipo de sociedade em nome coletivo, de sociedade por
quotas, de sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedade em comandita por ações. As sociedades que tenham por objeto a prática
de um ato de comércio (ou mais) devem adotar um dos tipos referidos. As sociedades comerciais têm personalidade jurídica (art. 5º do Código das Sociedades
Comerciais).
● As sociedades civis (e sociedades civis sob a forma comercial) têm exclusivamente por objeto a prática de atos não comerciais. Estas podem constituir-se sob
a forma comercial, segundo algum dos quatro tipos de sociedades comerciais conhecidos pela nossa lei, ficando sujeitas às disposições do Código das
Sociedades Comerciais. As sociedades civis sob a forma comercial têm personalidade jurídica. Relativamente às restantes sociedades civis (sob forma civil), a
personalidade jurídica constitui uma questão ainda hoje discutida – nós inclinamo-nos para a solução negativa; nenhuma norma atribui personalidade jurídica às
sociedades civis, havendo igualmente outros argumentos contra a personalidade jurídica das referidas sociedades.

Dentro das sociedades comerciais e das civis em forma comercial, a mais importante classificação é a que tomo como critério a presença ou ausência de
responsabilidade pessoal dos sócios perante os credores sociais e a extensão dessa responsabilidade.
Sob este ponto de vista, têm os interessados de escolher um dos tipos legais de sociedade indicados na lei. Vigora nesta medida o princípio do numerus clausus
ou da tipicidade.
São os seguintes os tipos legais de sociedades conhecidos na nossa lei:
a) Sociedades em nome coletivo – caracterizam-se pela responsabilidade pessoal e limitada perante os credores sociais, subsidiariamente em relação à
sociedade e solidariamente com outros sócios;
b) Sociedades por quotas – os sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, mas são solidariamente responsáveis por todas as entradas convencionadas no
contrato social, isto é, respondem para com a sociedade pela realização da sua quota, e ainda, solidariamente com os demais, pelas prestações devidas à
sociedade por algum ou alguns dos outros associados por força da não realização integral das suas quotas; o capital social está dividido em quotas;
c) Sociedades anónimas – os sócios estão isentos de responsabilidade pessoal pelas dividas da sociedade e os credores sociais só se podem pagar pelos bens
sociais; o capital social está dividido em frações a cada uma das quais corresponde uma ação; cada sócio tem a sua responsabilidade limitada, para com a
sociedade, pelo capital que subscreveu, isto é, pelo montante das ações respetivas, nada mais tendo a satisfazer, mesmo que os outros sócios estejam em dívida
para com a sociedade.
d) Sociedades em comandita – são uma combinação entre os tipos anteriores, pois intervêm nelas sócios que assumem responsabilidade ilimitada, como os
sócios das sociedades em nome coletivos (sócios comanditados), e sócios que só arriscam o valor das suas entradas, como os acionistas das sociedades
anónimas (sócios comanditários); o capital social pode ou não ser representado por ações.

75. Classificações de novos entes dotados de personalidade coletiva


Continuamos a orientar-nos pelo critério dos poderes de soberania, a fim de classificar as novas pessoas coletivas, tendo em conta o interesse prático que a
destrinça entre pessoa coletivas públicas e pessoas coletivas privadas pode alcançar.
● Empresas públicas
O recurso ao esquema de empresa pública assentou na convicção da maior eficácia para a sociedade numa gestão de unidades produtivas, pertencentes à
coletividade, segundo o regime de direito privado.
Foi discutida a qualificação das empresas públicas, tal discussão foi (e está hoje) superada, existindo um novo regime constante do Decreto-Lei n.º558/99, de 17
de Dezembro, que consagrou o direito privado como «o direito aplicável por excelência toda a atividade empresarial, seja ela pública ou privada».
Nos termos desse D-L (558/99), as empresas públicas são sociedades constituídas nos termos da lei comercial, em que o Estado ou outras entidades públicas
estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma direta ou indireta, uma influência dominante em virtude da detenção da maioria do capital ou
dos direitos de voto, ou do direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização. É aplicável a estas
empresas públicas o direito privado, com a ressalva das especialidades contidas nesse mesmo D-L, onde se não prevê a atribuição de poderes de autoridade.
Trata-se, pois, de pessoas coletivas de direito privado.
A par do regime geral, esse contém normas sobre empresas que exploram serviços de interesse económico geral. Tais normas não alteram a qualificação destas
empresas.
O novo regime das empresas públicas autonomizou, ainda, a categoria de «entidades públicas empresariais», para pessoas coletivas, que diz serem de direito
público, com natureza empresarial e criadas pelo Estado. Tais entidades estão sujeitas ao regime geral, mas ficam sujeitas a um regime de tutela, embora menos
estrito do que o previsto no anterior diploma. Pelas razões aduzidas anteriormente, no domínio do regime das empresas públicas de 1976, e porque a sujeição a
esta tutela não é, em face do critério seguido, bastante para alterar a natureza das entidades, inclinamo-nos também, hoje, para a sua qualificação como
pessoas coletivas de direito privado.

● Pessoas coletivas de utilidade pública


Pessoas coletivas de utilidade pública são, nos termos da qualificação legal, «as associações ou fundações que prossigam fins de interesse geral, ou da
comunidade nacional ou de qualquer região ou circunscrição, cooperando com a Administração Central ou a administração local, em termos de merecerem da
parte desta administração a declaração de «utilidade pública» (art. 1º, n.º1 D-L n.º460/77, de 7 de Novembro).
O n.º2 engloba as pessoas coletivas de utilidade pública a administrativa.
A declaração de utilidade pública depende de concessão do Governo (art. 3.º), é publicada no Diário da República (art. 6.º) e deve ser requerida pelas pessoas
coletivas interessadas (art. 5.º).
Apesar de gozarem de benefícios fiscais e de outras regalias, são pessoas coletivas privadas.

● Instituições de segurança social


A atual Lei de Bases da Segurança Social prevê, no artigo 115.º, n.º1, que o sistema de segurança social é integrado, além de por serviços integrados na
administração direta do Estado, por «instituições de segurança social que são pessoas coletivas de direito público, integradas na administração indireta do
Estado».

● Instituições particulares de solidariedade social – I.P.S.S.


Abrangem as associações de solidariedade social, irmandades da Misericórdia, cooperativas de solidariedade social, associações de voluntários de ação social,
associações de socorros mútuos, fundações de solidariedade social.
Se forem legalmente constituídas e registadas, adquirem a categoria de pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública.
São pessoas coletivas privadas.

● Unidades de exploração coletiva de trabalhadores


Trata(va)-se de associações de trabalhadores, sendo a mesma designação utilizada, contudo, relativamente a entidades que podem não ter sequer
personalidade jurídica. Devem considerar-se como pessoas coletivas privadas, quando forem pessoas jurídicas.

● Associações e partidos políticos


De acordo com o critério da titularidade de poderes soberano são de considerar pessoas coletivas privadas. Tê, todavia, um regime especial, com certos direitos
que se explicam pela sua função de concorrer «para a livre formação e o pluralismo de expressão da vontade popular e para a organização do poder político».

● Associações por (associações de empregadores e associações sindicais ou sindicatos)


São pessoas coletivas privadas.
Reportamo-nos ao critério dos sujeitos, isto é, da detenção ou não de poderes de soberania. A classificação de muitas destas entidades como pessoas coletivas
privadas não significa que não sejam pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública.
76. Constituição das pessoas coletivas: formação do substrato das corporações (associações e sociedades) de direito privado
→ Constituição das associações:
À formação do substrato das associações referem-se os artigos 167.º e 168.º.
O artigo 167.º, no seu n.º1, refere-se ao chamado ato de constituição da associação, enunciando as especificações que o mesmo deve conter. No n.º2 refere-se
aos chamados estatutos.
O ato de constituição da associação, os estatutos e as sua alterações estão sujeitos a exigências de forma e publicidade.
Devem constar de escritura pública (art.168.º, n.º1); em caso de inobservância desta exigência, a sanção correspondente ao vício de forma será a nulidade
(art.220.º).
Devem, além disso, o ato de constituição e os estatutos ser publicados no jornal oficial, sob pena de ineficácia em relação a terceiros, cabendo oficiosamente
ao notário remeter o respetivo extrato para publicação, bem como à autoridade administrativa e ao Ministério Público a constituição e estatutos, bem como a
alteração destes (art.168.º, n.º2 e 3).
Por outra via, a falta de escritura pública, provocando a nulidade do ato de constituição e dos estatutos, impede o reconhecimento da associação (art.158.º), a
qual figurará como associação sem personalidade jurídica (art.195.º e seg).
A formação do substrato das sociedades pressupõe um contrato de sociedade. Prescreve-se igualmente para a generalidade das sociedades comerciais e civis
em forma comercial a exigência de escritura pública.

77. Constituição das pessoas coletivas: formação do substrato das fundações de direito privado
Na vigência do Código Seabra podiam levantar-se dificuldades quanto a ser admissível dispor de bens por testamento ou até por ato entre vivos para uma
fundação que se quisesse constituir.

No Código atual não podem surgir quaisquer dúvidas, pois o art. 185º é expresso em permitir a instituição de fundações de ambas as maneiras, devendo o
instituidor indicar no ato de instituição o fim da fundação e especificar os bem que lhe são destinados e podendo ainda providenciar sobre a sede, organização,
funcionamento e eventual transformação ou extinção do ente fundacional.
Instituição por testamento. Qual a natureza jurídica do ato de instituição por testamento? Tem-se admitido na doutrina portuguesa que o ato de instituição,
quer realizado entre vivos quer praticado em testamento, é um negócio jurídico unilateral autónomo, sui generis. Esta tomada de posição inspirou-se em
Ferrara, para quem a instituição de uma fundação em testamento “não é vocação de herdeiro ou legado, e por isso não é governada pelos princípios
sucessórios, mas é um negócio autónomo de instituição de um obra ou de destinação de um património”. Tal negócio, quer praticado em testamento, quer
entre vivos, qualifica-o Ferrara como pertinente a uma categoria que designa por negócio de destinação.

Que dizer acerca deste ponto?


Sem dúvida que o ato de instituição de uma fundação em testamento tem características diferentes da instituição de herdeiro ou legatário. No primeiro caso
visa-se a criação de um novo ente jurídico; nos últimos verifica-se uma atribuição patrimonial a favor de pessoas já existentes. Nessa medida pode considerar-se
legítima a afirmação de que ato de instituição é um negócio autónomo, sui generis.
Todavia, este ato, quando contido num testamento, tem características diferentes das que lhe cabem quando praticado entre vivos. Assim, é livremente
revogável até ao momento da morte do testador, mas torna-se irrevogável quando o testador faleça, ao contrário do ato entre vivos, que só se torna irrevogável
quando o reconhecimento é requerido ou principia o reconhecimento oficioso, etc.
Por outro lado, se os bens destinados à fundação consistem na totalidade ou numa quota do património do falecido, aplicam-se à instituição certas normas
privativas da instituição do herdeiro, como por exemplo o art. 2301º (direito de acrescer entre herdeiros), o art. 2068º (responsabilidade pelas dívidas do
falecido), etc. Se, diversamente, se atribuem à fundação apenas bens ou valores determinados, aplicam-se as normas privativas do legado, quanto a estes ou
outros problemas.

Em face ao exposto, parece que só teoricamente tem significado a afirmação de que o negócio de fundação, quando adote a veste testamentária, é um negócio
autónomo, sui generis, pois sempre a sua efetivação terá de se realizar através do mecanismo técnico-jurídico da herança ou legado, aplicando-se-lhes as
disposições duma ou doutra instituição, consoante os casos.

Qual o modus faciendi a observar para se erigir a fundação por testamento?


Se os estatutos foram formulados pelo testador, devem os herdeiros ou executores testamentários requerer o reconhecimento, que pode aliás ser
oficiosamente promovido pela autoridade competente (art. 185º, nº2). Na falta de estatutos lavrados pelo instituidor ou na in suficiência deles, compete aos
executores do testamento elaborá-los ou completá-los, incumbindo a sua elaboração à própria autoridade competente para o reconhecimento, se os executores
os não lavrarem dentro do ano posterior à abertura da sucessão (art. 187º). Elaborados os estatutos, terá lugar o reconhecimento, a requerimento dos
executores ou ex officio.
Instituição por ato entre vivos. À face do Código de 1867, Manuel de Andrade, depois de concluir pela admissibilidade da constituição de fundações por ato
entre vivos, concluía serem as disposições respetivas verdadeiras doações. Tal conclusão resultava de não conhecer o Código outro tipo de disposições gratuitas
entre vivos, além da doação, mas suscitava todavia dificuldades. As dificuldades eram contornadas por Manuel de Andrade observando que o essencial no
conceito de doação não era a contratualidade, mas sim tratar-se de um ato de atribuição patrimonial gratuita.
Esta tentativa de explicação de uma solução positiva aceitava-se, dada embora a sua vulnerabilidade, na falta de outra explicação mais satisfatória.
No domínio do Código de 1966, todavia, nada nos impede de reconhecer ao ato de instituição entre vivos, de jure constituído, a natureza que logicamente lhe
deve ser assinalada e que a melhor doutrina aponta: trata-se de um negócio jurídico unilateral. O CC de 1966 reconhece (art. 457º) a eficácia vinculada da
promessa unilateral de uma prestação, embora só nos casos previsto na lei. Ora, um dos casos previstos é o ato entre vivos de instituição de uma fundação (art.
185º).

Que dizer da tendência de certa doutrina para desdobrar o ato de instituição e dois atos: um ato ou negócio de fundação visando a constituição dum novo ente
jurídico, e um ato ou negócio de dotação, liberalidade a favor do sujeito de direito criado pelo primeiro?
Tal análise do ato de instituição é de repudiar em face do CC, pois:
• A vontade do instituidor não basta para criar um novo sujeito de direito, sendo necessária a intervenção do reconhecimento
• O art. 188º estabelece que será negado o reconhecimento, se não forem afetados à fundação bens suficientes. Quer dizer, o primeiro ato não pode subsistir a
se, sem segundo
A distinção é, pois, como observava Manuel de Andrade, “antes ideal que real ou prática”.
Quid júris, se o instituidor se arrepende depois do ato de instituição e quiser revogar? Será imediatamente irrevogável a instituição, uma vez lavrada a escritura
pública exigida no nº3 do art. 185º?
O Código sanciona, no mesmo preceito, a doutrina segunda a qual a instituição só se torna irrevogável quando for requerido o reconhecimento ou principiar o
respetivo processo oficioso. Portanto, até este momento, pode o fundador revogar a disposição.
E na hipótese de o fundador morrer antes desse momento? Deverá entender-se, como na vigência do Código do 1867, que, em princípio, a instituição caducará?
Parece que não. Esta solução era defendida, na vigência do Código de Seabra. Com o Código de 1966, todavia, temos lei aplicável especialmente à hipótese: o
art. 185º, nº4, segundo o qual aos herdeiros do instituidor não é permitido revogar a instituição, salvo por força das normas sobre a sucessão legitimária. Tal
solução está aliás em conformidade com a regra do art. 226º
Resulta, igualmente, do mesmo art. 185º, nº3 e 4, que o ato de instituição não pode ser revogado co fundamento em superveniência de filhos legítimos ou outra
causa própria da revogação das doações.

78. Constituição das pessoas coletivas: o reconhecimento; suas modalidades


Por força do reconhecimento, a pessoa coletiva passa de mera entidade de facto a centro autónomo de relações jurídicas.
No nosso direito não vigora o sistema da livre constituição das pessoas coletivas, tendo de intervir na formação destas um momento de reconhecimento
verdadeiro e próprio.

Mas pergunta-se: trata-se ainda dum reconhecimento normativo, embora condicionado à verificação de determinados requisitos que devem acrescer aos
elementos do substrato, ou será antes um reconhecimento por concessão, mediante ato individual da autoridade pública?
Encontramos na nossa lei manifestações das duas modalidades.
O CC de 1966 acolheu no art. 158º, na sua redação primitiva, o reconhecimento por concessão, não só para as fundações como também para as associações.
Pretendia-se, com o reconhecimento por concessão, efetuar um controlo administrativo de constituição das associações. O Estado podia assim controlar,
através dum ato discricionário, a constituição de qualquer associação.
Perante esta situação, assistiu-se a um desenvolvimento das sociedades cooperativas, as quais, sendo sociedades comerciais não estavam sujeitas ao
reconhecimento por concessão, adquirindo personalidade jurídica nos mesmos termos que outras sociedades, isto é, mediante o reconhecimento normativo
condicionado.

Este movimento foi, porém, de curta duração, pois em 1971 um Decreto-Lei dispôs que as sociedades cooperativas que se proponham exercer ou exerçam
atividades não económicas estavam sujeitas ao regime das associações.
Com a alteração dos princípios políticos ordenadores da sociedade, operada em 25 de Abril de 1974, foram alterados os pressupostos condicionantes da
liberdade de associação. Os entraves à constituição de associações desapareceram, logo nesse mesmo ano, com o Decreto-Lei nº594/74, de 7 de Novembro.
O Decreto-Lei nº594/74 veio, pois, consagrar, quanto às associações, o reconhecimento normativo condicionado, sem necessidade de qualquer ato individual e
discricionário de uma autoridade pública para a concessão da personalidade jurídica.
O controlo de conformidade dos estatutos ou da associação à lei ou à moral pública passou a ser feito posteriormente, não impedindo a aquisição de
personalidade, podendo apenas, se for o caso disso, provocar a declaração judicial de extinção de pessoa coletiva.
Entrou em vigor em 1976 a CRP, sujo o art. 46º, nº1, veio declarar terem os cidadãos “o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização,
constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respetivos fins não sejam contrários à lei penal”.

O reconhecimento das associações é hoje o reconhecimento normativo condicionado embora se tenham alterado os requisitos legais que devem acrescer ao
substrato.
Com efeito, enquanto, a partir de 1974, bastava o mero depósito do ato de constituição e dos estatutos, após prévia publicação no Diário do Governo e num dos
jornais mais lidos na região, a lei atual formula uma maior exigência para a constituição de uma escritura pública. Este documento realiza-se perante notário, o
qual, deste modo, é a entidade que vai efetuar um primeiro controlo de legalidade.
A vantagem deste controlo, efetuado logo no momento da constituição da associação, é de sublinhar, pois se vira ab initio a constituição das pessoas coletivas
sem os requisitos exigidos ou com objetivos contrários à ordem pública, determinantes da sua posterior extinção judicial caso tivessem sido legalmente
constituídas, situação que acarretaria certamente maiores prejuízo aos interessados e até eventualmente a terceiros.

Uma vez celebrada a escritura pública, compete ao notário, oficiosamente, a expensas da associação, comunicar a constituição e estatutos, bem como as
alterações destes, à autoridade administrativa e ao Ministério Público e remeter ao jornal oficial um extrato para publicação (art. 168º, nº2), para que possam
produzir efeitos em relação a terceiros (art. 168º, nº3). O Ministério Público deverá promover a declaração judicial de nulidade quando haja violação do art.
280º.
A exigência de escritura pública justifica-se, quer pela maior solenidade conferida ao ato de constituição, como pela segurança jurídica resultante de um ato
celebrado e confirmado por uma autoridade (o notário) e, finalmente, pelas vantagens que um controlo prévio da legalidade do ato envolve.
Foi alterado o nº2 do art. 182º, que prevê agora a extinção das associações através das associações através de decisão judicial e não já por via administrativa,
consequência óbvia da consagração do reconhecimento normativo em substituição do reconhecimento por concessão.
Refira-se, por último, que a epígrafe do capítulo II se referia a associações não reconhecidas, sendo agora designadas como associações sem personalidade
jurídica (arts. 195º e ss).
O art. 258º, nº2, aplicável às fundações, prescreve o reconhecimento por concessão ou individual, da competência da autoridade administrativa.

Pergunta-se: esta competência, para atribuir a personalidade às fundações, é vinculada ou discricionária?


Na competência da autoridade administrativa há poderes discricionários e poderes vinculados à lei. Assim, por exemplo, exigindo-se que o escopo das
fundações seja física ou legalmente possível e não contrário à lei (art. 280º), os conceitos de possibilidade física e legal e de não contrariedade à lei vinculam a
autoridade. Igualmente a apreciação sobre se o ato não é contrário à ordem pública nem ofensivo dos bons costumes é uma apreciação vinculada a um
elemento objetivo, embora de conteúdo indeterminado.
Já são, porém, discricionários os poderes de apreciação resultantes, no que toca ao reconhecimento das fundações, do art. 188º: deve ser negado o
reconhecimento no caso de o fim da fundação não ser considerado de interesse social, bem como no caso de insuficiência do pat rimónio afetado à fundação.
Um regime especial é o referente a uma categoria determinada de associações e fundações: as eclesiásticas.
Nesta categoria, a personalidade jurídica da Igreja Católica, da Conferência Episcopal Portuguesa e das “dioceses paróquias e outras jurisdições eclesiásticas” é
reconhecida diretamente pela Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa, de 2004. A personalidade jurídica das restantes pessoas da Igreja Católica
é reconhecida às que hajam sido constituídas e participadas à autoridade competente pelo bispo da diocese onde tenham a sua sede, ou pelo seu legítimo
representante, até à data da entrada em vigor da Concordata de 2004 e, quanto às constituídas ou comunicadas depois deste momento, através da inscrição em
registo próprio do Estado, com base em documento autêntico emitido pela autoridade eclesiástica competente.

À generalidade das pessoas coletivas religiosas aplica-se o regime dos arts. 33º a 44º da Lei da Liberdade Religiosa. As igrejas e demais comunidades religiosas,
bem como as associações e fundações por elas criadas, podem adquirir personalidade jurídica, seja através de inscrição no registo das pessoas coletivas
religiosas previsto nesse diploma, seja nos termos gerais previstos no CC para as pessoas coletivas privadas.
O reconhecimento das sociedades comerciais ou civis em forma comercial é o reconhecimento normativo condicionado (arts. 1º, 5º e 36ç e ss do Cód. das
Sociedades Comerciais).
A exigência formal de escritura pública implica a intervenção de um agente público (o notário), mas nem por isso se trata de um reconhecimento por concessão.
É que o notário vai limitar-se a exarar as declarações das partes, autenticando a sua emissão, e apreciando a existência ou não de um motivo de nulidade do
contrato, mas não realiza nenhuma apreciação sobre a conveniência da constituição da sociedade ou qualquer outro julgamento discricionário.

79. Capacidade para o exercício de direitos das pessoas coletivas


À primeira vista as pessoas coletivas não têm capacidade para o exercício de direitos (ou capacidade de agir), pois ela consiste na aptidão para pôr em
movimento a capacidade jurídica por atividade própria, sem necessidade de ser representado ou assistido por outrem. Ora, as pessoas coletivas só podem agir
por intermédio de certas pessoas físicas, não agindo por si mesmas, estariam, assim, privadas da capacidade para o exercício de direitos. Isto defendem alguns
autores.

Outros autores são da opinião contrária. Isto depende da natureza do vínculo entre a pessoa coletiva e as pessoas que procedem em seu nome e no seu
interesse. Se for um vinculo de verdadeira organicidade, teremos capacidade para o exercício de direitos, pois a relação entre um órgão e o ente em que se
integra é de verdadeira identificação, agindo o órgão é a própria pessoa que age. Se for um nexo de mera representação , devemos rejeitar a tese da
capacidade para o exercício de direitos pois há autonomia entre as personalidades jurídica do representante e do representado (é uma relação intersubjetiva
entre dois sujeitos, contrario da relação orgânica que é intrasubjectiva).

Devemos seguir o primeiro critério, o de um nexo de verdadeira organicidade. Vemos isso pelo artigo 162º, mas sobretudo pela responsabilidade civil
extracontratual da pessoas coletivas. Normalmente não há responsabilidade civil extracontratual dos representados pelos atos dos seus representantes → o
artigo 500º abrange um sector da representação: casos em que o procurador pode ser considerado um comissário. Isto só acontece quando está numa relação
de dependência com o representado, quando está sujeito a um seu poder de direção. Ora, os órgãos não são encarregados de nenhuma comissão, os órgãos
superiores (ex. assembleia geral) não estão numa relação de dependência, mas são eles os formuladores da vontade da pessoa coletiva. Ora, o artigo 165º
estatui essa responsabilidade civil para as pessoas coletivas, daí que digamos que as pessoas coletivas tenham capacidade para o exercício de direitos.

80. Capacidade jurídica (capacidade de gozo de direitos) das pessoas coletivas


Enquanto a capacidade de gozo das pessoas singulares é de carácter geral, a das pessoas coletivas é uma capacidade jurídica específica → artigo 160º.

O artigo 160º.º, n.º2 refere que estão excecionados do âmbito da capacidade jurídica das pessoas coletivas :
a) relações jurídicas vedadas por lei (ex. capacidade testamentaria ativa – 2182º);
b) relações jurídicas inseparáveis da personalidade singular (direitos derivados da vida humana como casamento ou filiação, por exemplo).
À primeira vista parecia estarem-lhe negados os direitos de personalidade, no entanto elas podem ser titulares de pelo menos alguns, caso do direito ao nome
(artigo 72º), o direito à honra que pode-se desentranhar da tutela geral da personalidade (artigo 70º).
Resulta a contrario do artigo 160º, n.º1 estarem fora da capacidade jurídica das pessoas coletivas os direitos e obrigações que não sejam necessários ou
convenientes à prossecução dos seus fins. É o chamado «princípio da especialidade do fim».
O fim estatutário será a medida do âmbito da capacidade, ou seja, serão os atos necessários, adequados ou convenientes ao fim que está previsto nos seus
estatutos. Tal restrição não impede que as pessoas coletivas de fim desinteressado ou fim egoístico ideal possam praticar atos de natureza lucrativa, em ordem
a obter recursos para a prossecução dos seus fins. Isto diz-nos Manuel de Andrade.
Manuel de Andrade refere ainda que deriva do principio da especialidade a incapacidade das sociedades comerciais fazerem doações, ainda que essa proibição
não seja total, já que a sociedade pode fazer doações remuneratórias a empregados e clientes (941º) e pode praticar donativos conformes aos usos sociais
(940º, n.º2).
As pessoas coletivas têm capacidade testamentária passiva (2033º, n.º 2 alínea b). Quanto à aceitação de doações podemos aplicar por analogia este mesmo
artigo.

81. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS COLETIVAS

I- Responsabilidade contratual
Esta resulta da capacidade da pessoa coletiva contrair obrigações. Vem enunciada no Art.165º. As pessoas coletivas respondem pelos atos dos seus órgãos,
agentes ou mandatários que produzam a violação de uma obrigação, em sentido técnico, remetendo-nos para o 800º. Há responsabilidade civil nos termos
gerais da responsabilidade civil contratual, Art.798º e ss. Há a necessidade de culpa do órgão ou agente tanto nos casos de falta de cumprimento como nos de
cumprimento defeituoso Art.799º nº1. Para existir responsabilidade civil contratual das pessoas coletivas é necessário que o contrato de onde emerge a
obrigação infligida, tenha sido celebrado por que tinha poderes para vincular a pessoa coletiva e caus. O Art.165º estatui que as pessoas coletivas respondem
nos mesos termos em que os comitentes respondem pelos atos ou omissões dos seus comissários.

II- Responsabilidade extracontratual


A responsabilidade extracontratual das pessoas coletivas, por força do principio de justiça, segundo o qual quem emprega determinadas pessoas para vantagem
própria, deve suportar os riscos da sua atividade. Existe responsabilidade civil por facto ilícito culposo, em que os órgãos deliberativos violam direitos ou
interesses legalmente protegidos de terceiros provocando-lhes em termos de causalidade adequada danos (deliberação de uma empresa descarrega nas aguas
de um rio poluentes que vão danificar culturas) – a pessoa coletiva tem que indemnizar as pessoas cujo património danificou, em termos dos Art.483º ss.
Mas a responsabilidade civil mais comum nas pessoas coletivas, é a responsabilidade civil objetiva ou pelo risco, ou seja, a pessoa coletiva emprega
determinadas pessoas para vantagem própria, como tal deve suportar os riscos da sua atividade. O Art.165º remete para o Art.500º.

Pressupostos da responsabilidade civil da pessoa coletiva:


1. É preciso que recaia igualmente a obrigação de indemnizar Art.500º nº1, desde logo que tenha havido culpa da pessoa simples que praticou o ato ilícito
causador do dano Art.483º; salvo se se tratar de matérias onde se responde sem culpa Art.502º/503º; ou no caso ainda mais excecional por intervenções licitas
como estado de necessidade Art.339º nº2. Exige-se que o ato tenha causado danos e que estes estejam em relação de causalidade adequada com o ato Art.500º
nº2.
2. É preciso que o ato danoso haja sido praticado pelo órgão, agente ou mandatário no exercício da função que lhe foi confiada. Art.500º º2

- Quando se pode considerar o ato praticado no exercício das funções?


a) Procedimentos levados a cabo pelo agente na qualidade de representante da pessoa coletiva:
b) Comportamentos causados pelas funções que lhe foram atribuídas;
c) Atos integrados no quadro geral de competências, ou poderes que lhe foram confiados, mesmo que praticados em vista de interesses privados/ ou com
intenção de lesar um terceiro Art.500º nº2. Desde que esses atos tenham exclusivamente interesses da pessoa coletiva ou prossigam simultaneamente
interesses pessoas e da pessoa coletiva.
d) Nos casos em que o gente visa apenas interesses pessoas e integrado formalmente no quadro geral da sua competência se aproveita de uma aparência social
que cria um estado de confiança (boa-fé) do lesado na licitude do comportamento do agente.

Estaremos no não exercício das funções quando se prosseguem exclusivamente interesses pessoais do agente. O agente, órgão ou mandatário fica obrigado a
indemnizar ao lado da pessoa coletiva. Trata-se de uma responsabilidade solidária, aplicando-se o Art.497º por remissão do Art.499º, ou seja, será
responsabilizada apenas a sociedade, se não for determinado o órgão ou agente culpado do ato desencadeador da responsabilidade.

Quanto às relações internas, a pessoa coletiva que tiver satisfeito a indemnização tem direito a regresso contra o órgão, agente ou mandatário, poendo exigir o
reembolso de tudo o que haja pago, desde que este tenha culpa no plano das relações internas.
(Pode haver externamente, mas não internamente como no caso de um motorista que adormece a atropela uma pessoa, mas a causa da fadiga deve-se às
instruções dadas pela entidade patronal para um trabalho sem o necessário repouso Art.500º nº3, neste houve culpa por parte do comitente também. Também
o órgão, agente ou mandatário pode exercer a ação de regresso contra a pessoa coletiva se não houve da sua parte qualquer culpa no plano das relações
internas Art.497ºnº2, ou ainda no caso de indefinição da culpa no plano interno, é aplicada a parte final deste mesmo Art.

82. Capacidade das pessoas coletivas para a aquisição ou alienação de imóveis


As pessoas coletivas possuem uma capacidade jurídica que sofre duas limitações de ordem geral: a resultante do princípio da especialidade do fim e a resultante
do facto de certas relações pressuporem a personalidade singular (art.160.º). Também lhes é reconhecida a capacidade para o exercício de direitos.
Esta capacidade para o exercício de direitos sofria, na versão originária do Código e até 1977, uma limitação por força do art.161.º. Tal disposição criava uma
espécie de inabilitação das pessoas coletivas para a aquisição, a alienação ou oneração de imóveis. Esta norma foi revogada pelo Decreto-Lei n.º496/77.

No nosso direito, como noutros sistemas jurídicos, verificava-se uma tradição já secular no sentido de restringir a capacidade das pessoas coletivas
relativamente à aquisição de direitos reais sobre os bens imóveis.
Em correspondência com este pensamento, o Código Civil de 1867, no artigo 35.º, pretendeu evitar a reconstituição de patrimónios excessivos e manteve o
mesmo regime. Na reforma do Código Civil de 1930 o artigo 35.º foi modificado, permitindo às pessoas perpétuas a aquisição a título oneroso de bens
indispensáveis e dispensando-as de converter em títulos de dívida pública os bens recebidos a título gratuito, mas sujeitando-as ao pagamento de um imposto
de sucessão ou transmissão por cada período de 30 anos.

Desta resenha deduz-se que o regime da capacidade das pessoas morais perpétuas para a aquisição de imóveis era, antes da entrada em vigor do CC de 1966, os
seguintes: podiam adquiri-los a título oneroso, se fossem indispensáveis; estavam proibidas, sob pena de nulidade, de fazer aquisições onerosas de bens
dispensáveis e podiam adquirir a título gratuito quaisquer bens.
O art.161.º do CC, na sua redação originária, permitiu livremente as aquisições a título gratuito, mas estabeleceu uma incapacidade para o exercício de direitos
no que toca à aquisição onerosa de bens imóveis e à alienação ou oneração dos mesmos a qualquer título, incapacidade suprível por uma autorização do
Governo.
Na sanção do n.º2 do art.161.º falava-se de nulidade, no caso de falta de autorização do Governo. Cremos que se tratava de uma invalidade mista (com
caracteres predominantes de nulidade e de anulabilidade).
O regime da nulidade e anulabilidade dos negócios jurídicos conta dos artigos 285.º e seguintes. A nulidade pode ser invocada a todo o tempo, por qualquer
interessado e é insuscetível de confirmação. A anulabilidade só pode ser arguida por certas pessoas, dentro de um ano a contar da cessação do vício que lhe
serve de fundamento e é sanável por confirmação.

II TEORIA GERAL DO OBJETO DA RELAÇÃO JURIDICA


CAPÍTULO I
GENERALIDADES

83. Objeto da relação jurídica. Conceito, objeto e conteúdo


O Objeto é aquilo sobre que incidem os poderes do titular do direito, é o “quid” sobre que incidem os poderes do titular ativo da relação jurídica (é o contrário
do conteúdo). Conteúdo é o conjunto de poderes ou faculdades que o direito subjetivo comporta.
O direito subjetivo traduz-se num poder atribuído a uma pessoa, este poder e as faculdades que o integram, podem, quase sempre, ser exercitado sobre um
determinado “quid”, corpóreo ou incorpóreo.
Ou seja, objeto é aquilo sobre que recaem os poderes do titular do direito, enquanto que o conteúdo é o conjunto dos poderes ou faculdades que o direito
subjetivo comporta.

84. Objeto imediato e objeto mediato


Generalidades: o objeto é aquilo sobre que incidem os poderes do titular do direito, é o “quid” sobre que incidem os poderes do titular ativo da relação juríd ica
(contrário de conteúdo que é o conjunto de poderes ou faculdades que o direito subjetivo comporta).
a) Objeto imediato: aquilo que diretamente está submetido aos poderes ideais que integram um direito subjetivo, exemplo é o ato de entrega da coisa – a
prestação; 

b) Objeto mediato: aquilo que só de uma forma mediata ou indireta, isto é, através de um elemento mediador está submetido aqueles poderes, exemplo, a
própria coisa que deve ser entregue. 


85. Os possíveis objetos de relações jurídicas


I e VII- A própria pessoa, ou seja, certas manifestações ou modos de ser físicos ou morais da pessoa – direitos sobre a própria pessoa. Autores criticam do ponto
de vista lógico (já que levaria a distinguir no homem duas pessoas: um sujeito e outro objeto dos seus direitos de personalidade) e do ponto de vista moral
(legitimaria o suicídio ou a automutilação) este possível objeto. 

No entanto, a lei concretiza alguns direitos sobre certos aspetos da personalidade Art.70º ss. Também não acontece e legitimação do suicídio visto que o Art.81º
diz que toda a limitação voluntária dos direitos de personalidade é nula se for contrária aos princípios da ordem pública

II- Sobre outras pessoas, não se trata de direitos subjetivos, mas de poderes-deveres (poder paternal Art.1878º e o poder tutelar Art.1935º), estes incidem
diretamente sobre a pessoa do filho ou do pupilo, não são direitos de domínio ou soberania sobre a pessoa, não ferindo a sua dignidade, mas visando o seu
beneficio. O pupilo ou o filho estão sujeitos ao poder tutelar. Estes são direitos que conferem poderes destinados a habilitarem os pais ou o tutor ao
cumprimento dos seus deveres para com o filho ou pupilo, podendo os titulares de tais direitos ser sancionados se não exercerem e não cumprirem os deveres
ao serviço dos quais eles se encontram.

III- As prestações, conforme o direito de crédito, conforme foi aludido, o objeto é um confuta, ou seja, a prestação. Nestes direitos o objeto não é rigorosamente
uma coisa, mas um comportamento do devedor. Por vezes, (obrigações de prestação de coisas) a prestação é o objeto imediato e a própria coisa será o objeto
mediato, noutros casos, (obrigações de prestação de facto positivo ou negativo) a prestação é também o objeto da relação jurídica, não sendo de distinguir
entre o objeto mediato e objeto imediato.

IV- Coisas corpóreas ou bens materiais: têm existência física, podem ser apreendidas pelos sentidos, podem ser tocadas, o interesse de saber se são corpóreas
reside no Art.1302º. É necessário que estes objetos corpóreos revistam certos requisitos: existência autónoma, idoneidade para satisfazer interesses humanos,
isto é, devem ser uteis, possibilidade de sujeição jurídica ao poder exclusivo de um ou alguns homens, isto é, devem ser apropriáveis.

V- Coisas incorpóreas ou bens imateriais:


Podem ser objeto de propriedade intelectual, como por exemplos os direitos de autor e propriedade industrial (marcas), ambos sujeitos a legislação especial
Art.1303º. Estes bens têm valor patrimonial autónomo, pois podem ser explorados economicamente. Compreende-se aqui, que o direito reconheça esses bens e
tutele-os mediante a atribuição a título de aquisição originária de direitos ao autor das obras em questão.
O objeto de tais direitos não é uma coisa corpórea, o objeto do direito do autor não é o livro, ou o filme, mas sim a obra na sua conceção ideal. O conteúdo do
direito do autor, é o chamado direito patrimonial do autor, ou seja, poder de disposição exclusiva da obra, reservando-se para o autor a exploração económica
dela.
VI- Direitos subjetivos: Direitos enquanto objeto de outros direitos, são também coisas incorpóreas, como por exemplo o penhor de direitos e o trespasse de um
estabelecimento comercial ou industrial.
O problema é de índole construtiva, discutindo-se se se trata de direitos sobre direitos, de transmissão limitada de direitos, ou ainda de um novo direito limitado
com o mesmo objeto do direito anterior. Algumas soluções parecem ajustar-se à figura dos direitos sobre direitos, ex: penhor de direitos Art.679º, usufruto de
direitos de crédito Art.1439º, usufruto de rendas vitalícias Art. 1464º.

CAPÍTULO II
AS COISAS E O PATRIMÓNIO

86. Noção jurídica de coisa


Num sentido corrente e amplo, coisa é tudo o que pode ser pensado, ainda que não tenha existência real e presente.
Num sentido físico, coisa é tudo o que tem existência corpórea, é suscetível de ser captado pelos sentidos.
Quanto ao sentido jurídico de coisa, o Art.202º define como “tudo aquilo que pode ser objeto de relações jurídicas”. Mas não se pode considerar esta definição
rigorosa, dado que há entes suscetíveis de serem objetos de relações jurídicas que não são coisas em sentido jurídico. Tais como as pessoas, as prestações e os
modos de ser ou bens da própria personalidade.

Quanto aos bens imateriais, objeto dos direitos de autor, podem integrar-se no conceito de coisas, embora tenham um regime especial relativamente ao regime
geral das coisas e não estejam previstas nas várias classificações das coisas enumeradas no Art.203º. São coisas incorpóreas.

No Art.202º é tomado por coisa tudo aquilo “que pode ser objeto de relações jurídicas”, dado que os bens de carácter estático, carecidos de personalidade, só
são coisas em sentido jurídico quando puderem ser objeto de relações jurídicas. Para esse efeito, devem:
1. Ter existência autónoma ou separada (uma casa é uma coisa, não o sendo seriam pedras e paredes separadas);
2. Ter possibilidade de apropriação exclusiva por alguém (não são coisas os bens que escapam ao domínio do ser humano, como estrelas, planetas...);
3. Ter aptidão para satisfazer interesses ou necessidades humanas (ser humano é a medida e o critério do relevo jurídico das coisas, por isso não são coisas uma
gota de água, porque não serve para nada);

O CC define várias categorias de coisas, essas têm interesse porque a lei faz, por vezes, corresponder regimes jurídicos específicos a certas categorias e não a
outras. Assim no Art.204º são definidos os vários tipos de coisas.

87. Noção de património


A palavra património conhece por parte dos juristas, várias aceções.

Fala-se de património global, quando se tem em vista o conjunto de relações jurídicas ativas e passivas (direitos e obrigações) avaliáveis em dinheiro de que uma
pessoa é titular. É importante destacar alguns pontos sobre esta noção:
a) Trata-se do conjunto de relações jurídicas, não se trata do conjunto de imóveis, móveis, créditos ou outros direitos patrimoniais. O património é integrado por
direitos sobre as coisas, direitos de crédito, obrigações e outros direitos patrimoniais.
b) Não fazem parte do património certas realidades, suscetíveis de ter grande relevância para a vida económica das pessoas, mas que não são relações jurídicas
existentes, sendo antes meras fontes de rendimentos futuros, tais como o caso da força do trabalho, da competência técnica de um individuo, etc...
c) Só fazem parte do património as relações jurídicas suscetíveis de avaliação pecuniária, esta pecuniaridade pode resultar do valor de troca do direito, por este
ser alienável mediante uma contraprestação, ou do valor de uso traduzido em um o direito, proporcionar o gozo de um bem, material ou ideal, que só se obtém
mediante uma despesa.

Fala-se de património bruto ou líquido, quando se tem em vista o conjunto de direitos avaliáveis em dinheiro, pertencentes a uma pessoa, abstraindo, portanto,
das obrigações. Trata-se de saldo patrimonial, ou seja, relações jurídicas ativas ou direitos e relações jurídicas passiveis ou obrigações.
Esfera jurídica- totalidade das relações jurídicas de que uma pessoa é sujeito, esta abrange o património e os direitos e obrigações não aviáveis em dinheiro.

O conceito de património traduz a soma ou o conjunto das relações jurídicas avaliáveis em dinheiro, pertencentes a uma pessoa. Quem pretender alienar, por
ato entre vivos, todas as suas relações patrimoniais têm de recorrer aos vários tipos negociais adequados à alienação de cada um dos elementos componentes
do seu património, observando os requisitos necessário para cada um desses atos. Este, é, portanto, um conjunto de relações jurídicas e não uma unidade. Não
há um direito único sobre o património bruto ou global.

88. O fenómeno da autonomia patrimonial ou separação de patrimónios


I- Na esfera jurídica de uma pessoa existe normalmente apenas um património. Em certos casos, seremos forçados a concluir existir na titularidade do mesmo
sujeito, alem do seu património geral, um conjunto de relações patrimoniais submetido a um tratamento jurídico particular, tal como se fosse de pessoa diversa,
estamos então perante um património autónomo ou separado. Este património caracteriza-se por ser um conjunto de relações patrimoniais sujeito a um regime
jurídico particular, ou seja, um mesmo sujeito é titular de um património global e de um património autónomo.
Mas qual é o critério do reconhecimento da autonomia ou separação de património?
O critério preferível é o da responsabilidade por dividas:

II- O património autónomo ou separado será, assim, o que responde por dividas próprias, isto é, só responde e responde só ele por certas dividas. Torna-se
necessário, que um certo património responda apenas por certas dividas do seu titular, não respondendo pelas outras, e que por aquelas dividas só o
património autónomo responda, não podendo elas afetar o património geral do seu titular. As dividas pelas quais só o património autónomo responde, são as
dividas relacionadas com a função especifica, com a finalidade especial desse património.
1. Um estabelecimento comercial seria um património autónomo se, respondesse apenas pelas dividas comerciais do seu titular com exclusão das dividas
estranhas ao exercício do comércio e, se por essas dividas comerciais não respondesses os restantes bens do comerciante.
2. No nosso direito privado, a herança será um património autónomo, se os bens hereditários responderem apenas pelas dividas do de cujus, e não pelas dividas
pessoas do herdeiro, e se pelas dividas do de cujus responder só o ativo da herança e não o património pessoal do herdeiro.

III- No património autónomo no direito português, o caso mais nítido é a herança – conjunto das relações jurídicas patrimoniais que, por força da morte de um
individuo, passam da titularidade deste para os herdeiros e legatários.
As características de uma plena autonomia patrimonial manifestam-se:
a) Tanto no caso de aceitação a beneficio do inventario Art.2071º/1 como se no caso de aceitação pura e simples Art.2071º/2 o herdeiro não responde pelas
dividas da herança para além das forças dos bens herdados, ou seja, não responde ultra vires hereditatis. Sendo que o ónus da prova de insuficiência do ativo
hereditário cabe ao herdeiro e não aos credores na aceitação pura e simples Art.2071º/2 e o ónus da prova da existência de mais bens além dos inventariados
cabe aos credores na aceitação a beneficio de inventario Art.2071º/1 só a herança responde pelas suas dividas e não os herdeiros;
b) Na circunstancia dos credores da herança e os legatários gozarem de preferência sobre os credores pessoais do herdeiro, durante os cinco anos subsequentes
à abertura da sucessão ou à constituição da divida se esta é posterior Art.2070º; os credores pessoais só podem, portanto, pagar-se pelos bens hereditários,
depois de satisfeitos os credores do de cujus, desparecendo assim a autonomia patrimonial com o pagamento destes; passados cinco anos cessa também, a
autonomia patrimonial da herança, estejam ou não pagos os credores do de cujus, pois cessa a preferência consagrada no Art.2070º. A herança só responde, em
principio, pelas dividas da herança, e não por outras dividas Art.2070º

V- Estando um património autónomo afetado à satisfação exclusiva de certas dividas, parece que, se um bem desse património se perde, adquirindo-se
concomitantemente outro valor (ex: vende-se um objeto que é trocado pelo preço correspondente, troca-se um objeto por outro). Se um bem desse património
autónomo se perde, adquirindo-se outro valor, este valor deve substituir-se ao primeiro bem tomando o seu lugar no património autónomo, fazendo as suas
vezes. A isto se chama sub-rogação real. Esta instituição da substituição de uma coisa que se perdeu por força de um ato ou facto jurídico que simultaneamente
implicou a aquisição de um valor, ocupando o novo valor o lugar do anterior, como novo objeto da mesma relação jurídica que já existia.

89. A figura do património coletivo


Referimo-nos a patrimónios conjuntos quando estamos perante um único património pertencendo a vários sujeitos:

a) Património Coletivo: trata-se da mesma massa patrimonial que pertence em bloco, globalmente, a um conjunto de pessoas sem possibilidade de cada uma
dessas pessoas alienar uma quota ou fração desse património ou requerer a divisão enquanto não terminar a causa geradora do surgimento do património
coletivo.
A forma que se conhece no nosso direito de um património coletivo é o da comunhão conjugal (quer a comunhão geral de bens, qu er a comunhão de
adquiridos). Quanto às dividas da responsabilidade de ambos os cônjuges temos o Art.1695º; quanto à responsabilidade de dividas de um dos cônjuges temos o
Art.1696º, refira-se que a menção mencionada no Art.1969º só é possível de execução quando se processa à extinção da comunhão conjugal, com a extinção do
casamento ou através da separação de bens entre cônjuges. Nos Art.1682º e 1681º, temos a necessidade de consentimento dos cônjuges na alienação ou
oneração de bens móveis e imóveis de forma a garantir a estabilidade no casamento.

b) A compropriedade ou propriedade comum: aqui estamos perante uma comunhão por cotas ideais, isto é, cada comproprietário é simultaneamente titular do
direito de propriedade sobre a mesma coisa Art.1403º nº1. Trata-se de uma comunhão por quotas ideais, em que cada proprietário tem direito a uma quota
ideal ou fração do objeto comum Art.1403º nº2. Contrariamente ao património coletivo, o comproprietário pode dispor de toda a sua quota na comunhão ou de
parte dela Art.1408º, daí também que o comproprietário não seja obrigado a permanecer na indivisão, podendo exigir a divisão da coisa comum Art.1412º.

TEORIA GERAL DO FACTO JURÍDICO


TITULO I
DOS FACTOS JURIDICOS EM GERAL
CAPÍTULO I
CONCEITOS E CLASSIFICAÇÃO

90. Noção de facto jurídico


Facto jurídico é todo o ato humano ou acontecimento natural juridicamente relevante, ou seja, produtor de efeitos jurídicos. Contrariamente, factos ajurídicos
são factos da vida real irrelevantes ou indiferentes ao qual a ordem jurídica não liga quaisquer consequências (convite para um passeio).

91. Classificação dos factos jurídicos


a) Factos voluntários ou atos jurídicos: estes resultam da manifestação da vontade humana enquanto elemento juridicamente relevante, são ações humanas
tratadas pelo direito enquanto manifestações de vontade. Ex: testamento ou contrato
b) Factos involuntários ou naturais: são estranhos a qualquer processo volitivo, ou porque resultam de causas de ordem natural, ou porque a sua eventual
voluntariedade não tem relevância jurídica, por ex. o nascimento.
c) Os factos jurídicos voluntários podem ser lícitos ou ilícitos: os atos lícitos são conforme à ordem jurídica e por ela consentidos; os atos ilícitos são factos
contrários à ordem jurídica e por ela reprovados e sancionados.
d) Negócios jurídicos e simples atos jurídicos: A distinção entre negócios jurídicos e simples atos jurídicos assenta no critério da relação que intercede entre a
vontade das partes dirigida a um resultado e os efeitos jurídicos produzidos. Os negócios jurídicos são factos voluntários cujo núcleo essencial é integrado por
uma ou mais declarações de vontade tendentes a produzir determinados efeitos jurídicos que coincidem com a vontade das partes. Ex: contratos. Nestes, o
comportamento de cada parte aparece exteriormente como uma declaração visando certos resultados prático-empíricos, e os efeitos determinados pela lei são
os correspondentes aos resultados cuja intenção foi manifestada. Os efeitos dos negócios jurídicos produzem-se de acordo com a vontade. Os simples atos
jurídicos são factos voluntários cujos efeitos se produzem mesmo que não tenham sido previstos ou queridos pelos seus autores, embora muitas vezes haja
concordância entre a vontade destes e os referidos efeitos. Os efeitos dos simples atos jurídicos produzem-se por força da lei. É o que sucede com a gestão de
negócios Art.464º ss, com a notificação ao devedor da cessão de créditos Art.583º.
- Dentro dos simples atos jurídicos, é usual fazer-se a seguinte distinção:
1. quase negócios jurídicos: traduzem-se na manifestação exterior de uma vontade, como por ex. interpelação do devedor Art.805º nº1
2. operações jurídicas: traduzem-se na efetivação ou realização de um resultado material ou factual a que a lei liga determinados efeitos jurídicos, como por ex.
a ocupação de animais bravios Art.1318º

CAPÍTULO II
AQUISIÇÃO, MODIFICAÇÃO E EXTINÇÃO DE RELAÇÕES JURÍDICAS

92. Preliminares
Os factos jurídicos desencadeiam determinados efeitos. Esses efeitos jurídicos consistem fundamentalmente numa aquisição, numa modificação ou numa
extinção de relações jurídicas.

93. Conceito e modalidade de aquisição de direitos.


Aquisição originária e aquisição derivada, e modalidades desta última.
Um direito é adquirido por uma pessoa quando esta se torna titular dele.

a) Noção
A aquisição de direitos é a ligação de um direito a uma pessoa, pensamos no lado ativo da relação jurídica. Diz-se que o sujeito adquire um direito, quando esse
direito se liga a esse sujeito. Não se confundem as noções de aquisição de direitos e de constituição de direitos. A constituição de um direito é o surgimento, é a
criação de um direito que não existia anteriormente. Toda a constituição de um direito implica a sua aquisição, dado não existirem direitos sem sujeito. Mas,
nem toda a aquisição evolve uma constituição de direito, como por ex. a aquisição derivada translativa (adquire-se por transferência um direito já constituído e
preexistente na titularidade de outra pessoa, direito que mantem a sua identidade, apesar da mudança de sujeito).

b) Os dois tipos fundamentais de aquisição de direitos são a aquisição originária e a aquisição derivada.
Na aquisição originária o direito adquirido não depende da existência ou da extensão de um direito anterior, que poderá até não existir. Quando o direito
anterior exista, o direito não foi adquirido por causa desse direito, mas apesar dele. São casos desta, a ocupação de coisas móveis Art.1318º ss, usucapião
Art.1287º ss, no caso de caça e pesca Art.1319º nem sequer há um direito anterior e em todos eles o direito do adquirente não foi adquirido por causa do
direito anterior, mas apenas dele. Na aquisição derivada, o direito adquirido funda-se ou filia-se na existência de um direito na titularidade de outra pessoa, a
existência anterior desse direito e a sua extinção ou limitação é que geral a aquisição do direito pelo novo titular, é que são a causa dessa aquisição. Ou seja, é a
aquisição em que o direito que se adquire depende não só do facto aquisitivo, mas também do direito anterior, como por ex. a aquisição de propriedade através
do contrato de compra e venda, a aquisição de um crédito ou de uma relação contratual por cessão.

Estes caracterizam-se por base num critério de causalidade, que vê a aquisição derivada como consequência ou efeito imediato da extinção subjetiva ou da
limitação de um direito anterior, enquanto que na aquisição originária não existe qualquer ligação causal entre a perda ou diminuição de um direito e a
aquisição.

c) Modalidades de aquisição derivada: translativa, constitutiva e restitutiva:


1. Aquisição derivada translativa (a mais vulgar)
O direito adquirido é o mesmo que já pertencia ao anterior titular. Assim, se um individuo adquire o domínio de um prédio por compra, doação, ou sucessão
mortis causa, legítima ou testamentária. (compra e venda, por ex)

2. Aquisição derivada constitutiva


O direito que se adquire tem um conteúdo ou extensão inferior ao direito anterior, o direito que se adquire é menos extenso q ue o direito anterior. É o caso de
o proprietário de um prédio constituir (por venda) uma servidão, ou outro direito real de gozo ou de garantia, a favor de outrem.

É importante a distinção entre cessão da posição contratual e subcontrato. A cessão da posição contratual Art.424º ss, por ex a cessão da posição de comprador
ou de vendedor num contrato de fornecimentos periódicos, esta é uma aquisição derivada translativa da posição contratual, ist o é, da relação contratual
emerge do contrato de fornecimento. O subcontrato, por ex a subempreitada Art.1213º é uma aquisição derivada constitutiva, pois uma contratante concede ao
outro a possibilidade de usar a posição contratual que para o primeiro resulte de um contrato principal ao qual este ultimo continua ligado.

3. Aquisição derivada restitutiva


Tem em vista a possibilidade do titular de um direito real limitado (ex. servidão) se demitir dele, unilateral ou contratualmente, recuperando assim o
proprietário a plenitude dos seus poderes, em virtude da conhecida elasticidade ou força expansiva do direito de propriedade. Portanto, qualifica-se de
restitutiva porque ela vai repor as coisas no estado anterior à constituição do direito real que se extingue.

d) Distinção entre aquisição derivada e sucessão:


Sucessão: é o subingresso de uma pessoa na titularidade de todas as relações jurídicas ou de determinada relação jurídica de outrem. Esta coincide apenas com
a aquisição derivada translativa, pois só nesta é que o direito adquirido é o mesmo do anterior titular.
Quando falamos em sucessão referimo-nos aos direitos e também às dividas, enquanto na aquisição rigorosamente só diz respeito a direitos. As dividas não se
adquirem, mas sim assumem-se como diz a epigrafe do Art.595º. Podemos utilizar sucessão num sentido amplo (tanto mortiscausa como intervivos) e aí o titular
anterior do direito designa-se por autor, antecessor ou causante e o adquirente por sucessor ou causado. Mas, frequentemente utiliza-se sucessão num sentido
estrito, designando apenas a sucessão mortis causa aí o autor da sucessão é designado por hereditando ou de cujus e os sucessores ou causados por herdeiro ou
legatário conforme sucedam na totalidade ou numa quota do património ou em bens ou valores determinados.

e) A transmissão de direitos:
Esta equivale à aquisição derivada translativa. No entanto, num sentido amplo pode-se utilizar a expressão “transmissão de direitos” para abranger qualquer
forma de aquisição derivada. A transmissão, tal como a sucessão refere-se tanto aos direitos, como às dividas.

94. Importância da distinção derivada e aquisição originária


Na aquisição originária a extensão do direito adquirido depende apenas do facto ou titulo aquisitivo. Na aquisição derivada a extensão do direito do adquirente
depende do conteúdo do facto aquisitivo, mas depende ainda da amplitude do direito do transmitente, não podendo em regra ser maior que a deste direito:
nemo plus júris ad transfere potest qual ipse haberet (ninguém pode transferir para outrem mais direitos de que o próprio tem). É esta a regra fundamental da
aquisição derivada. Ex: logo se A vende a B uma coisa da qual não era proprietário esse ato é nulo com fundamento legal no Art.892º e ss – venda de coisa
alheia.

95. Exceções à regra geral da aquisição derivada


Este principio comporta exceções, ou seja, situações em que o adquirente pode obter um direito que não pertencia ao transmitente ou é mais amplo do que
aquele que pertencia a esse mesmo transmitente.

a) Instituto do registo predial e registo similares (aeronaves, navios...): as pessoas devem inscrever, com o fim de lhes dar publicidade aos diversos atos
inerentes a bens imóveis e outros bens indicados, em particular os atos de que resulte a aquisição de direitos reais sobre os mesmos bens.

Quem são os terceiros para efeitos de registo predial?


São as pessoas que do mesmo autor ou transmitente adquirem direitos incompatíveis sobre o mesmo prédio: trata-se fundamentalmente da ideia de que o
registo, não pretende assegurar a existência efetiva do direito da pessoa a favor de quem está registando o bem. O registo não dá direitos, apenas os conserva.

Exemplo 1:
A vendeu a um automóvel ou um prédio a B, e depois a C, B e C são terceiros entre s e prevalece a venda a C, se foi primeiramente registada, embora A já não
fosse o verdadeiro proprietário, pois a sua venda a B é plenamente válida e eficaz inter partes. Assim, se B adquire um bem sujeito a registo, mas não o regista e
C adquire o mesmo bem, e o regista, aplica-se a regra da prioridade do registo, e não da aquisição do direito sobre o bem, de modo que, embora A já não seja
proprietário do bem, se verifica uma situação de aquisição a non domino (aquisição de um bem que já não era titulado por A) – logo há um exceção ao principio
do nemo plus iuris.
➔ Enquanto não for registado, embora a aquisição produza efeitos inter partes, estes efeitos não se poderão opor a terceiros quando não haja tal
aquisição sido registada. Assim quanto aos bens sujeitos a registo, não se aplica a regra da prioridade ou prevalência de transmissão, mas a regra
da prioridade do registo.

Exemplo 2:
Se o mesmo prédio for vendido por A a B e por C a D, neste caso prevalece das duas vendas a que foi feita pelo verdadeiro proprietário, mesmo que a outra
tenha sido registada em primeiro lugar.

Exemplo 3:
A vende um prédio a B, que regista a aquisição, e este vende logo a C, que igualmente regista o ato, C terá de abrir mão do prédio, no caso de a primeira venda
(de A a B) ser logo declarada nula ou anulada, dado o efeito retroativo da invalidade da primeira compra, que provoca uma invalidade derivada.
➔ É que o registo estabelece apenas uma presunção de existência da propriedade da pessoa a favor de quem o prédio está registado. Garante
apenas a terceiros, entendendo que o individuo a favor de quem está registado um prédio foi seu titular, ou então ainda o é.

A partir daqui, concluímos que o registo predial não se destina a realizar uma proteção máxima de segurança na aquisição de direito sobre imóveis, mas uma
proteção mais limitada: não a garantir que, se se adquire de quem tem o prédio registado em seu nome, se faz uma aquisição válida e firme, mas, a assegurar
que, se o direito existiu na titularidade dessa pessoa, então ela ainda o conserva.
Esta garantia – a única conferida pelo registo – deve se considerar plena, pelo que deve funcionar, sejam ambas as aquisições onerosas ou gratuitas e sem que
se deva admitir prova tendente a demonstrar que o terceiro devia conhecer, ou conhecia o ato anterior não inscrito, isto é, sem que releve a boa ou má fé
subjetivos do terceiro. A segurança que se pretende garantir ao comercio jurídico, seria fortemente afetada, se o terceiro, adquirente de quem tem um prédio
registado a seu favor, ficasse exposto, às incertezas, aos gastos, tendentes a provar que ele conhecia uma alienação anterior.

b) Da inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé


Deste advém uma regra especial de proteção de terceiros contra nulidade decorrente de simulação Art.243º. Como resulta do Art.240º os negócios simulados
são nulos. No entanto, no Art.243º nº1 vem estabelecer um regime de inoponibilidade desta nulidade com base numa simulação, desde que se preencham dois
requisitos cumulativos:
1. Ser terceiro: Dr. Mota Pinto defende que terceiros são todos os que vissem a sua posição jurídica afetada pela simulação (a que não sejam os próprios
simuladores ou os herdeiros após a morte).
2. Esteja de boa fé: o Art.243º nº2, este só fala em ignorância da simulação e não em desconhecimento sem culpa como vem no Art.291º nº3, ou seja, haverá de
boa fé, ainda que com culpa do terceiro, ou seja, se houver possibilidade de ele conhecer. No Art.243º nº2 o momento considerado é o da aquisição de direitos
e não o da má fé superveniente. Embora se considere sempre má fé a aquisição por parte de terceiro após o registo de ação de simulação Art.243º nº3.

Exemplo 1:
Se o simulado adquirente de um prédio, porém, vender ou doar, por ato verdadeiro, o mesmo prédio a um terceiro e este ignorar a simulação, o terceiro
adquire validamente esse objeto Art.243º. Ora, dedo que o vendedor ou doador tinha adquirido a propriedade por ato simulado e, portanto, nulo, o terceiro
adquire de quem não era proprietário, ao invés do que prescreve o principio nem plus júris ... (ninguém pode transferir para outrem mais direitos do que o
próprio tem).

c) Da eventual inoponibilidade das nulidades e anulabilidades a terceiro de boa fé


Por força do principio nemo plus júris..., se A transmitiu, por negócio nulo ou anulável, um prédio a B e este por sua vez, o transmitiu a C, declarado nulo ou
anulado o primeiro ato, o segundo seria também nulo e, consequentemente, C devia restituir o prédio. Isto porque as nulidades e anulações operam em face de
terceiros e não só em face da contraparte. A solução está no CC. Aí se estabelece no Art.291º, um regime de inoponibilidade a terceiros de boa fé, adquirentes a
titulo oneroso, das nulidades e anulações de negócios respeitantes a imóveis ou móveis sujeitos a registo, desde que a ação tendente à declaração de nulidade
ou à anulação não seja proposta e registada dentro dos três aos posteriores à conclusão do negócio.

Desta advém a regra geral da proteção de terceiros contra qualquer invalidade (nulidades e anulabilidades) Art.291º - este artigo estabelece um regime de
inoponibilidade da nulidade e anulação de negócios jurídicos anteriores com base nos seguintes pressupostos cumulativos:
1. Estejam em causa bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo;
2. Onerosidade da aquisição;
3. Ser terceiro, são terceiros aqueles que inseridos numa mesma cadeia de transmissões linear e sucessiva, vêm a sua aquisição afetada por um vicio de um
negócio precedente (não pode haver invalidade própria);
4. Haja boa fé, sendo a boa fé determinada no nº3 do Art.291º, como ignorância não culposa das causas de invalidade dos atos anteriores à aquisição do direito
pelo terceiro, ou seja, tem de haver um desconhecimento efetivo no momento da sua aquisição;
5. Ser um negócio nulo ou anulável – só funciona contra causas de invalidade;
6. A aquisição ter de ser registada antes do registo da ação – efeitos laterais do registo;
7. A posição do terceiro só se consolida após 3 anos do decurso do negócio inválido Art.191º nº2 (se for numa cadeia conta o último negocio inválido). Embora
no caso da anulabilidade há sanção pelo decurso do tempo Art.287º nº1.

96. Modificação de direitos


Noção: tem lugar quando alterado ou mudado um elemento de um direito, permanece a identidade do referido direito apesar da alteração ocorrida. A
perduração do direito, apesar da modificação verificada, significa que o ordenamento jurídico continua a tratar o direito como se não tivesse tido lugar a
alteração. O direito é o mesmo e não um direito novo.

a) Modificação subjetiva:
Há uma substituição dos sujeitos na titularidade do direito, permanecendo a identidade objetiva do direito. Há uma sucessão no direito, é o que se verifica no
domínio dos direitos de crédito, e quanto a atos inter vivos, com a cessão de créditos e com a sub-rogação nos créditos Art.577º e 589º ss. Pode ainda resultar
de uma multiplicação dos sujeitos por adjunção (p.ex um novo devedor assume a obrigação para com o credor, permanecendo o devedor vinculado).

b) Modificação objetiva:
Muda-se o conteúdo ou o objeto do direito, permanecendo o direito idêntico. Muda o conteúdo se, p. exemplo é concedida pelo credor ao devedor uma
prorrogação do prazo para o cumprimento. Muda o objeto se, p. exemplo não cumprindo o devedor culposamente a obrigação, o seu dever de prestar é
substituído por um dever de indemnizar.

97. Extinção de direitos


A extinção de direitos tem lugar quando um direito deixa de existir na esfera jurídica de uma pessoa.

a) Extinção subjetiva ou perda de direitos


O direito sobrevive em si, apenas mudando a pessoa do seu titular. O direito mudou de titularidade, extinguiu-se para aquele sujeito, mas subsiste na esféria
jurídica de outrem. Verifica-se sempre que tem lugar uma sucessão na titularidade dos direitos.

b) Extinção objetiva
Se o direito desaparece, deixando de existir para o seu titular ou para qualquer outra pessoa. Nesta hipótese não há sucessão, transmissão ou aquisição
derivada translativa de direitos. É o que acontece se há destruição do objeto do direito, p. exemplo destruição de coisa por incendio, ou até se há abandono de
um móvel.

Uma forma particular de extinção de direitos é a correspondente aos institutos da prescrição Art.300ºss e da caducidade Art.328ºss

a) Se um titular de direito o não exercer durante certo tempo fixado na lei, extingue-se esse direito. Diz-se nestes casos, que o direito prescreveu, ou que o
direito caducou.
O beneficiário a prescrição, pode recusar o cumprimento da prestação ou opor-se ao exercício do direito prescrito. No entanto, se o devedor, tiver cumprido
espontaneamente a obrigação prescrita, o credor goza de soluti retentio, não podendo o obrigado repetir o que haja prestado Art.304º. Isto porque, as dividas
prescritas passam a constituir obrigações naturais.
A caducidade opera também a extinção do direito.

b) Ao falarmos de prescrição, referimo-nos à prescrição extintiva ou negativa: extinção de um direito que pode não ser acompanhado pela aquisição
correspondente. Tem a ver com objetivos de conveniência ou oportunidade social, mais do que propriamente com objetivos de justiça. Enquanto que na
prescrição aquisitiva ou usucapião: ao contrário da prescrição extintiva aqui adquirem-se direitos reais.

c) A prescrição aplica-se aos direitos subjetivos propriamente ditos, enquanto a caducidade visará os direitos potestativos. A nossa lei, seguindo um critério
formal, afirma que quando um direito deva ser exercido durante certo prazo aplicam-se as regras da caducidade, salvo se a lei se referir expressamente à
prescrição Art.298º nº2.

Há importantes diferenças de regime jurídico entre a prescrição e a caducidade:


1. A prescrição é inderrogável como resulta do Art.300º enquanto que se admitem estipulações convencionais acerca da caducidade Art.330º;
2. A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal Art.333º, enquanto que a prescrição tem de ser invocada, não podendo o tribunal oficiosamente supri-
la Art.303º.
3. A caducidade em principio não comporta causas de suspensão nem de interrupção Art.328º, ao contrário da prescrição que se suspende e interrompe em
casos previstos na lei Art.318ºss e Art.323ºss.
4. O prazo ordinário da prescrição é de 20 anos Art.309º, prevendo a lei para certas situações uma prescrição de cinco anos Art.310º, havendo ainda prazos mais
curtos para as prescrições presuntivas, que se fundam numa presunção de cumprimento. Enquanto que na caducidade não vem previsto na lei prazos normais,
existem prazos processuais, mas normalmente tem um carácter substantivo com amplitudes muito variáveis Art.1786º.

TÍTULO II
DO NEGÓCIO JURÍDICO E DO SIMPLES ATO JURÍDICO
SUBTÍTULO I
CONCEITO, ELEMENTOS E CLASSIFICAÇÕES
CAPÍTULO I
CONCEITO E ELEMENTOS

98. Conceito e importância do negócio jurídico


O negócio jurídico é um facto voluntário, lícito, cujo conteúdo essencial é constituído por uma ou mais declarações de vontade dirigidas à realização de certos
efeitos práticos com a intenção de os alcançar sob tutela do direito e em que o ordenamento jurídico atribui efeitos jurídicos correspondentes, determinados
em geral em conformidade com a intenção manifestada pelo declarante ou declarantes. A sua importância prende-se com o facto de ser o instrumento principal
de realização do principio da autonomia da vontade, um dos princípios fundamentais do nosso direito civil.
A importância do negócio jurídico manifesta-se na circunstancia de este figura ser um instrumento principal de realização do princípio da autonomia da vontade
ou autonomia privada.

99. Relação entre a vontade exteriorizada na declaração negocial e os efeitos jurídicos do negócio
1. Teoria dos efeitos jurídicos
Para esta doutrina, os efeitos jurídicos produzidos, tais como a lei os determina, são perfeitamente e completamente correspondentes ao conteúdo da vontade
das partes. Ou seja, deve haver, exata e completa correspondência entre o conteúdo da vontade das partes e os efeitos jurídicos produzidos tais como a lei os
determina. Os próprios efeitos derivados de normas supletivas resultariam da tácita vontade das partes.
Críticas:
- As partes dos vários negócios não têm uma ideia completa e exata de todos os efeitos que o ordenamento jurídico atribui às suas declarações de vontade. Se
esta doutrina fosse verdade só os juristas completamente informados sobre o ordenamento poderiam celebrar negócios jurídicos.
- As normas supletivas só deixam de se aplicar quando uma vontade real contrária for manifestada, não bastando provar-se que as partes não pensaram no
ponto ou até não teriam querido aquele regime.

2. Teoria dos efeitos práticos


As partes manifestam apenas uma vontade de efeitos práticos ou empíricos, normalmente económicos ou sociais, sem carácter ilícito. Ou seja, basta que a
declaração se dirija a certos efeitos práticos ou empíricos sem carácter ilícito, fazendo a lei corresponder a esses efeitos práticos, efeitos jurídicos concordantes.
Crítica:
- Tal como esta doutrina define o negócio jurídico, este não se distingue de outros atos que não são negócios jurídicos que se fiam na honorabilidade das partes
(ex. empréstimo de honra, cortesia moral).

3. Teoria dos efeitos práticos jurídicos


É o ponto de vista correto. Os autores dos negócios jurídicos visam certos resultados práticos ou materiais e querem realizá-los por via jurídica, ou seja, quem
realiza negócios jurídicos visa certos resultados. Tem ainda, uma vontade de efeitos jurídicos, não se dirigindo apenas a efeitos práticos, basta uma
representação global prática dos efeitos jurídicos imediatos e fundamentais. Há uma intenção dirigida a um determinado efeito económico juridicamente
garantido.

Por falta de intenção de efeitos jurídicos temos de distinguir os negócios jurídicos dos chamados negócios de pura obsequidade. -> São promessas ou
combinações da vida social, às quais é estranho o intuito de criar, modificar ou extinguir um vínculo jurídico (convite para jantar).

A falta de vontade de efeitos jurídicos distingue, igualmente, os negócios jurídicos dos chamados meros acordos. -> são combinações sobre matéria que é
normalmente objeto de negócios jurídicos, mas que, excecionalmente, estão desprovidas de intenção de efeitos jurídicos. (empréstimo de honra).

100. Elementos dos negócios jurídicos


É a tripartição em elementos essenciais, elementos naturais e elementos acidentais.

1. Elementos essenciais
Podem ser aqueles relativos à existência do negócio jurídico, sem os quais o mesmo não chegaria a ter existência material, falamos então da declaração, dos
sujeitos e do conteúdo. Segundo a sistematização tradicional, que considera essenciais os requisitos ou condições gerais de validade de qualquer negócio,
falamos ainda da capacidade das partes, a declaração de vontade sem anomalias e a idoneidade do objeto, Art.280º.

Pode igualmente falar-se de elementos essenciais no sentido de elementos essenciais de cada negócio típico ou nominado. São as características próprias de
cada modalidade negocial, como p. exemplo a locação Art.1022º ss, em que temos:
1º a obrigação de proporcionar à outra parte o solo de cada coisa
2º gozo esse que é temporário (diferente de compra e venda)
3º obrigação da outra parte a pagar a correspondente retribuição

2. Elementos naturais
São os efeitos negociais derivados de disposições legais supletivas. Não é necessário que as partes configurem qualquer cláusula para a produção destes efeitos,
dado que podem ser excluídas por estipulação. São exemplos de normas supletivas, e de efeitos correspondentes a elementos naturais dos respetivos tipos de
negócios jurídico o Art.885º compra e venda.

3. Elementos acidentais
São as cláusulas acessórios dos negócios jurídicos. Elas não caracterizam o tipo negocial em abstrato, mas tornam-se imprescindíveis para que o negócio
concreto produza os efeitos a que elas tendem, como p. exemplo a cláusula de juros.

CAPÍTULO II
CLASSIFICAÇÕES DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

101. Negócios jurídicos unilaterais e contratos ou negócios jurídicos bilaterais


Negócios unilaterais: há só uma declaração de vontade (testamento) e ou várias declarações mas paralelas, formando um só grupo (procuração feita por duas
pessoas a favor de um mesmo advogado). Estes negócios só afetam diretamente uma pessoa que os pratica, ou afetam outra pessoa, mas atribuindo-lhe uma
faculdade ou uma posição favorável (procuração).
Negócios bilaterais ou contratos: há duas ou mais declarações de vontade de conteúdo oposto, mas convergente com a pretensão de um resultado jurídico
unitário, embora com um significado diferente para cada parte. Há, assim, uma oferta ou proposta e a aceitação que se concilia num consenso.

Características do regime dos negócios unilaterais:


1. É desnecessária a anuência da contraparte, a eficácia do negócio unilateral não carece de concordância de outrem;
2. Vigora, quanto aos negócios unilaterais, o princípio da tipicidade Art.457º, sendo apenas admitidos os negócios que estiverem especificamente previstos na
lei.
3. É importante distinguir entre negócios unilaterais receptícios (a declaração só é eficaz se for e quando for levada a conhecimento de certa pessoa, ex.
denuncia de arrendamento Art.1055º), e negócios unilaterais não receptícios (basta a emissão sem ser necessária comunica-la a quem quer que seja, ex.
testamento).

Características do regime dos negócios bilaterais ou contratos:


1. Não são integrados por dois negócios unilaterais, sendo que cada uma das declarações (proposta e aceitação) é emitida em vista de um acordo.
2. É importante distinguir entre contratos unilaterais (geral obrigações para uma parte ex. doação) e contratos bilaterais ou sinalagmáticos (geram obrigações
para ambas as partes, obrigações ligadas entre si por um nexo de causalidade ou correspetividade ex. compra e venda).
2. Há autores que referem ainda os contratos bilaterais imperfeitos, nestes há inicialmente apenas obrigação para uma das partes, surgindo eventualmente mais
tarde obrigações para a outra parte, em virtude do cumprimento das primeiras e dados termos. Nestes contratos não há exceção de não cumprimento do
contrato e também não há condição resolutiva tácita Ex. mandato Art.1157º.

102. Negócios entre vivos e negócios “mortis causa”


Entre vivos: destina-se a produzir efeitos em vida das partes.

Mortis causa: destinam-se a produzir efeitos depois da morte do declarante ou depois da morte de alguma das partes. O exemplo mais favorável é o
testamento, que se destaca por ser um ato livremente revogável pelo testador Art.2179º, não sendo sequer renunciável a faculdade da revogação Art.2311, a
transferência dos bens hereditários a favor dos herdeiros e legatórios só se opera após a morte do testador Ar.2031º, os herdeiros ou legatários não podem, em
vida do testador, renuncias à sucessão ou dispor dela Art.2028º nº1e2.

Características:
1- Nos negócios mortis causa há uma prevalência dos interesses do declarante sobre o interesse na proteção da confiança do declaratário, ao contrário dos
negócios inter vivos em que há uma tutela das expectativas da parte que se encontra em face da declaração negocial;
2- O testamento é claramente um negócio mortis causa. As doações por morte são, em princípio nulas Art.946º como quaisquer outros pactos ou contratos
sucessórios Art.2082º nº2. Estes são objeto de uma conversão legal em disposições testamentárias Art.946º nº2.
Certos pactos sucessórios contidos em convenções antenupciais são válidos Art.1700º. Em relação a estes, as disposições a favor de um dos esposados feitas
pelo outro ou por terceiro são negócios híbridos ou mistos já que têm características de negócio mortis causa já que só se verifica transferência de bens depois
da morte, no entanto há uma restrição de poderes feita ao disponente, algo que é típico dos negócios inter vivos Art.1701º.
As disposições a favor de terceiros feitas pelos esposados são negócios mortis causa se o terceiro não interveio na convenção antenupcial Art.1704º e serão
negócios híbridos se ele interveio como aceitante Art.1705º.

103. Negócios consensuais ou não solenes e negócios formais ou solenes


Negócios formais ou solenes: São aqueles para os quais a lei prescreve a necessidade de observância de determinada forma, o acatamento de terminados
formalismos ou de terminadas solenidade e, sem o qual o negócio jurídico é inválido Art.220º. Quando o negócio é formal, as partes não o podem realizar por
todo e qualquer comportamento declarativo, a declaração negocial deve, nos negócios formais realizar-se através de certo tipo de comportamento imposto pela
lei.

Negócios consensuais ou não solenes: São aqueles em que a validade do negócio jurídico não está dependente de qualquer requisito formal, podendo ser
realizado por qualquer comportamento. Ou seja, podem ser celebrados por quaisquer meios declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial, porque a lei
não impõe uma determinada roupagem exterior para o negócio.

O princípio geral do nosso código em matéria do formalismo é o da liberdade declarativa ou liberdade de forma Art.219º. Quando nos casos excecionais, a lei
prescrever uma certa forma e esta não for observada a declaração negocial é nula Art.220º.
Exemplos de negócios formais:
a) Para os quais a lei exige documento autêntico: constituição de associações Art.168º, compra e vende de imóveis Art.875º;
b) Para os quais a lei obriga apenas ao documento particular: doação de móveis não acompanhada de tradição da coisa Art.947º nº2, doação de imóveis
Art.947º;
c) Para os quais a lei exige um documento autenticado: Art.363º nº3 em que há confirmação de determinado negócio jurídico através do notário;

104. Negócios consensuais e negócios reais


Os negócios reais são aqueles em que se exige além das declarações de vontade das partes, a prática anterior ou simultânea de um certo ato material de
entrega de uma coisa como elemento de estrutura do negócio jurídico e não como efeito do contrato.

105. Negócios obrigacionais, reais, familiares e sucessórios


O critério desta classificação diz respeito à natureza da relação jurídica constituída, modificada ou extinta pelo negócio jurídico.
Nos negócios sucessórios, o princípio da liberdade contratual sofre importantes restrições resultantes de algumas normas imperativas (ex. testamento, pactos
sucessórios). Restrições essas tais como sucessão legitimária, proibição dos pactos sucessórios.
Nos negócios familiares pessoais, a liberdade contratual está praticamente excluída, podendo apenas os interessados celebrar ou não o negócio, mas não
podendo fixar-lhe livremente o conteúdo, nem podendo celebrar contratos diferentes dos previstos na lei. (casamento, perfilhação, adoção).
Nos negócios familiares patrimoniais, existem, em maior escala, a liberdade de convenção Art.1698º, sofrendo embora restrições Art.1899º. (convenções
antenupciais)
Nos negócios reais, o principio da liberdade contratual sofre considerável limitação derivada do principio da tipicidade Art.1306º, visto que não é permitida a
constituição, com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei Art.1306º. (venda
ou doação de coisa certa e determinada)
Nos negócios obrigacionais, vigora o princípio da liberdade negocial, quanto aos contratos, abrangendo a liberdade de fixação do conteúdo dos contratos
típicos, de celebração de contratos diferentes dos previstos na lei e de inclusão nestes de quaisquer cláusulas Art.405º; quanto aos negócios unilaterais vigora,
porém, o princípio da tipicidade Art.457º.

106. Negócios patrimoniais e negócios pessoais


O critério distintivo é, também, o da natureza da relação jurídica a que o negócio se refere. A distinção revela-se, quanto à amplitude do princípio da liberdade
contratual.
Negócios pessoais: são negócios fora do comércio jurídico, isto é, quanto a problemas como o da interpretação do negócio jurídico e o da falta ou dos vícios da
vontade, não tem que atender às expectativas dos declaratários e aos interesses gerais de contratação, mas apenas à vontade real do declarante. (casamento,
adoção)
Negócios patrimoniais: há o predomínio do princípio da liberdade contratual, ou seja, predomínio da vontade declarada sobre a vontade real, de forma a tutelar
a confiança do declaratário e também os interesses do tráfico jurídico Art.236º nº1.

107. Negócios causais e negócios abstratos


O critério desta classificação é o da relevância, para os efeitos do negócio, da sua função económica ou social típica ou da relação jurídica que constitui a sua
causa.
Negócios abstratos: os efeitos deste negócio são separados da sua causa (negócios cambiários, aceite de uma letra).
Negócios causais: o direito não isola o seu conteúdo da respetiva causa.

108. Negócios onerosos e negócios gratuitos


a) Importância da distinção: manifesta-se p. exemplo em matéria de impugnação pauliana Art.612º nº1, e também para a proteção do terceiro adquirente de
boa fé contra qualquer invalidade de negócio jurídico anterior Art.291º.

b) A distinção dos negócios jurídicos em onerosos e gratuitos tem como critério o conteúdo e finalidade do negócio nos teros que a seguir se evidenciam:
Os negócios onerosos ou a titulo oneroso: pressupõem atribuições patrimoniais de ambas as partes, existindo, segundo a perspetiva destas, um nexo de
correspetividade entre as referidas atribuições patrimoniais. Cada uma das partes faz uma atribuição patrimonial que considera retribuída ou contrabalançada
pela atribuição da contraparte. Não é necessário um equilíbrio ou uma equivalência das prestações ou atribuições patrimoniais, consideradas pelo sue valor
objetivo ou normal. O que releva á a avaliação das partes ou, mais que a avaliação, a vontade o intento das partes.
De qualquer modo as partes estão de acordo em considerar as duas atribuições patrimoniais como correspetivo uma da outra. Neste sentido pode dizer-se que
no negócio oneroso as partes estão de acordo em que a vantagem que cada uma vida obter é contrabalançada por um sacrifício que está numa relação de
estrita causalidade com aquela vantagem. (arrendamento, aluguer, compra e venda)
Os negócios gratuitos ou a titulo gratuito caracterizam-se pela intervenção de uma intenção liberal. Uma parte tem a intenção devidamente manifestada, de
efetuar uma atribuição patrimonial a favor da outra sem contrapartida ou correspetivo, sem a pretensão de nenhum equivalente económico. A outra parte age
com consciência e vontade de receber essa vantagem sem proporcionar uma vantagem à outra parte (doação e depósitos gratuitos).

c) É possível a existência de contratos unilaterais onerosos?


Sim, é possível tais como o mútuo oneroso Art.1145º. É que nos contratos unilaterais onerosos a correspetividade estabelece-se, não entre duas obrigações (só
há obrigações por um dos lados, visto que são contratos reais), mas entre duas atribuições patrimoniais que consistem numa prestação contemporânea da
formação do negócio (a entrega de uma soma em dinheiro para ser utilizada) e numa obrigação (a de restituir o capital e pagar os juros).

109. Contratos comutativos e contratos aleatórios


É uma subdivisão dentro dos contratos onerosos.
Nos contratos aleatórios: as partes submetem-se a uma possibilidade de ganhar ou de perder. A onerosidade consiste na circunstancia de ambas estarem
sujeitas ao risco de perder, embora, no final de contas, só venha a ganhar.
a) Pode haver uma só prestação dependendo de um facto incerto, a determinação de quem a realizará (aposta, certos tipos de jogo);
b) Pode haver uma prestação certa e outra incerta, de maior montante do que aquele (seguro de incêndio);
c) Pode haver duas prestações certas na sua existência, mas uma delas incerta quanto ao momento da sua verificação e ao seu montante (seguro de vida);

Os contratos de jogo e aposto não são válidos, e não constituem fontes de obrigações civis, no entanto quando lícitos são fon te de obrigações naturais
Art.1245º, excetuando-se as competições desportivas com relação às pessoas que nelas tomarem parte Art.1246º e outras exceções previstas em legislação
especial Art.1247º.

110. Negócios parciários


São uma subespécie de negócios onerosos.
Negócios parciários: caracterizam-se pelo facto de uma pessoa prometer certa prestação em troca de uma qualquer participação nos proventos que a
contraparte obtenha por força daquela prestação. (parceria pecuária Art.1121º)

111. Negócios de mera administração e negócios de disposição


Há uma restrição, por força da lei ou de sentença, dos poderes de gestão patrimonial dos administradores de bens alheios, ou de bens próprios alheios, ou até
em alguns casos de bens próprios (ex. inabilitações), aos atos de mera administração ou de ordinária administração. Ex, administração de bens Art.1922º, 1967º;
Inabilitações Art.153º e 154º.

Conceito de atos de mera administração e de atos de disposição:


Por vezes a lei qualifica, ela própria, certos negócios jurídicos como atos de administração ordinária ou de disposição. Veja-se o cado do Art.1024º em que a lei
qualifica como ato de administração ordinária a locação num prazo inferior a 6 anos. Mas, o CC não se limita sempre a restringir os poderes de administração de
bens alheios aos atos de mera administração, seguiu muitas vezes o sistema de fazer uma enumeração de certos atos que são permitidos ou vedados ao
referido administrador (Art.1889º, 1937º, 1938º).

No entanto, a lei muitas vezes não restringe os poderes de certas pessoas a atos de ordinária administração sem qualquer especificação. Quando a lei não
esclarece através de uma definição ou de uma enumeração quais os atos que integram uma dada categoria teremos de nos guiar pelos interesses que estão em
jogo e o sentido das normas que espelham esses mesmos interesses.

Assim, atos de mera administração são os correspondentes a uma gestão concedida e limitada, com exclusão dos atos arriscados (que podem originar grandes
lucros e também prejuízos elevados) que afetam a substância dos bens. São, assim os atos que correspondem a uma atuação prudente, dirigida a manter o
património e a aproveitar as virtualidades normais de desenvolvimento:
São atos de mera administração:
a) Atos de conservação dos bens administrados: atos destinados a fazer quaisquer reparações necessárias nesses bens tendentes a evitar a sua deterioração ou
destruição;
b) Atos tendentes a prover à frutificação normal: essa frutificação é a pelo modo habitual parra os bens administrados (atos destinados a prover ao cultivo de
uma terra nos termos usuais do arrendamento);

Atos de disposição são os atos que afetam a substancia de património administrado, que altera a forma ou a composição desse capital administrado, que
atingem a raiz dos bens, ultrapassando parâmetros de uma atuação prudente e comedida.
São, assim, atos de disposição:
a) Atos de frutificação anormal: como é o caso da transformação de um Pinhal em Vinha, abrir uma pedreira num terreno de cultivo;
b) Atos tendentes a prover ao melhoramento do património administrado, desde que não sejam feitos com os rendimentos existentes da administração: como é
o caso da abertura de um poço, ou cercar de muro um prédio rustico não havendo necessidade disso;
c) As alienações onerosas: atos que envolvem transferência de propriedade para outrem (compra e venda, troca). No entanto, nem todas as alienações onerosas
são atos de disposição. Só o são as que afetam a substância dos bens (ex. não é ato de disposição o corte e venda de 20 pinheiros secos que nada estavam a
fazer no pinhal).
d) Onerações: trata-se de imposição de um ónus real sobre um determinado prédio (ex. constituição de uma servidão de passagem).
e) Doações: tratam-se de liberalidades de alienação sem contrapartida;

SUBTITULO II
ELEMNTOS ESSENCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO
CAPÍTULO I
CAPACIDADE E LEGITIMIDADE

112. Remissão
A capacidade e a legitimidade são os pressupostos gerais de validade dos negócios jurídicos.
A capacidade traduz-se num modo de ser ou qualidade do sujeito em si.
A capacidade negocial de gozo é a suscetibilidade de ser um sujeito jurídico ser titular de direitos e obrigações derivados de negócios jurídicos. Contrapõe-se-lhe
a incapacidade negocial de gozo que representa um absoluto impedimento ou proibição da titularidade de tais relações e, como tal, é insuprível.
A capacidade negocial de exercício: é a aptidão para celebrar, modificar ou extinguir negócios jurídicos, por atividade própria ou através de um representante
voluntário. Contrapõe-se-lhe a incapacidade negocial de exercício que representa um impedimento ou proibição não absoluta da realização de negócios, e como
tal, é suprível pelos institutos da representação ou da assistência.

A legitimidade é uma relação existente entre o sujeito e o conteúdo do ato. Contrapõe-se-lhe a ilegitimidade, ou seja, a falta dessa relação de tal modo que o
sujeito não pode com a sua vontade afetar esse direito ou essa obrigação.

CAPÍTULO II
A DECLARAÇÃO NEGOCIAL
DIVISÃO I
Noções gerais

113. A declaração negocial como verdadeiro elemento do negócio jurídico


O CC regula a declaração negocial nos Art.217º e ss. Trata-se de um verdadeiro elemento do negócio, uma realidade componente ou constitutiva da estrutura
do negócio.
A capacidade de gozo ou de exercício e a legitimidade são apenas pressupostos ou requisitos de validade, importando a sua falta uma invalidade. A idoneidade
do objeto negocial é, igualmente, um pressuposto ou requisito de validade, pois a sua falta implica a nulidade do negócio. A declaração negocial é um elemento
integrante do negócio jurídico, conduzindo a sua falta à inexistência material do negócio.

114. Conceito de declaração negocial


A declaração negocial é o comportamento de uma pessoa (por palavras escritas ou faladas ou até sinais) que segundo os usos da vida, convenção dos
interessados ou até de disposição legal apareça como destinado a exteriorizar um certo conteúdo de vontade negocial, ou em todo o caso, o revela e traduz
sendo a vontade negocial: a intenção de realizar certos efeitos práticos com ânimo de que sejam juridicamente tutelados e vinculantes pela ordem jurídica. Dá-
se aqui claramente um conceito objetivista de declaração negocial, sendo a sua nota principal não um elemento interior como a vontade efetiva ou psicológica,
mas num elemento exterior no comportamento declarativo.
A função de declaração negocial consiste em exteriorizar a vontade psicológica do declarante e torna-la cognoscível para o declaratário. Ora, hoje o direito civil
coloca na sua primeira linha de proteção as expectativas dos declaratários e a segurança do comércio jurídico daí que a nossa lei dê prioridade ao elemento
objetivo – comportamento exteriorizado pelo declarante do que a sua vontade psicológica. No nosso CC, o legislador refere-se à declaração de vontade, falando
antes de declaração negocial.

116. Elementos constitutivos normais da declaração negocial


Numa declaração negocial pode distinguir-se normalmente os seguintes elementos:
a) A declaração propriamente dita (elemento externo) – consiste no comportamento declarativo;
b) A vontade de ação (elemento interno) – consiste no querer concreto, na realidade volitiva que normalmente existirá e coincidirá com o sentido objetivo da
declaração.

Esta vontade real pode decompor-se em três subelementos:


a) A vontade de ação - consiste na voluntariedade (consciência e intenção) do comportamento declarativo. Ex: não existe vontade de ação quando uma pessoa
por ato reflexo ou distraidamente faz um gesto e este aparece como declaração negocial, ou quando uma pessoa é coagida a realizar um negócio;
b) A vontade da declaração ou vontade da relevância negocial da ação – consiste em o declarante atribuir ao comportamento querido o significado de uma
declaração negocial. Este subelemento só esta presente se o declarante tiver consciência e vontade de que o seu comportamento tenha significado negocial
vinculativo. Ex: pode faltar vontade da declaração se uma pessoa julgando assinar uma simples ficha para o arquivo de um banco, assina uma declaração
negocial. Se um individuo num leilão faz um gesto de saudação a um amigo isso é entendido como oferta de uma certa importância, sem que a pessoa se
aperceba disso.
c) A vontade negocial, vontade de conteúdo da declaração ou intenção do resultado – consiste na vontade de celebrar um negócio jurídico de conteúdo
coincidente com o significado exterior da declaração. É uma vontade efetiva correspondente ao negócio concreto que aparece exteriormente declarada. Ex:
pode haver um desvio na vontade negocial quando uma pessoa atribui aos termos da declaração um sentido diverso do que é exteriormente captado, ex: uma
pessoa quando quer comprar a quinta de regaleira e erradamente declara que quer comprar a quinta da gosteira pensando erradamente ser este o seu nome
(erro no nome).

Vimos que pode haver uma falta de vontade de ação, uma falta de vontade da declaração e um desvio na vontade negocial. São estes os casos de divergência
entre a vontade e a declaração. Essa divergência pode ainda resultar de um desvio da vontade de ação: ex. a pessoa quer escrever quinta da regaleira, ou prédio
nº20 e por lapso engana-se a escrever ou a falar e sai-lhe quinta da regaleira nº30.

117. Declaração negocial expressa e declaração negocial tácita


Os negócios jurídicos, realizam uma ampla autonomia privada, na medida em que, quanto ao seu conteúdo, vigora o principio da liberdade negocial Art.405º.
Quanto à forma, é igualmente reconhecido pelo ordenamento jurídico um critério de liberdade: o principio da liberdade declarativa. Tal principio está
consagrado nos Art.217º (possibilidade de declarações negociais expressas e tácitas) e Art.219º (liberdade de forma).
Por vezes, a lei exige, porem, que a declaração negocial seja de eficácia real ao contrato-promessa Art.587º nº2 (garantia expressa de solvência do devedor por
parte do cedente do crédito) Art.595º nº2. Outras vezes a lei tem o cuidado de frisar que um certo negócio pode ter lugar por uma declaração tácita, p. exemplo
os Art.288º nº3 confirmação expressa ou tácita dos negócios anuláveis, Art.302º nº2 renuncia tácita à prescrição.

A distinção consagrada na lei no Art.217º é a proposta pela teoria subjetiva expressa:


A declaração é expressa quando feita por palavras, escrito ou quaisquer outros meios direitos, fontais, imediatos de expressão de vontade, e é tácita quando do
seu conteúdo direto se infere um outro, isto é. Quando se destina a um certo fim, mas implica e torna cognoscível, a latere, (quando se deduz de factos que,
com toda a probabilidade, a revelam).
A declaração tácita é compatível com a existência de um negócio formal Art.217º nº2, ex. testamento em que não há declaração expressa de atribuição de um
determinado legado, mas por uma declaração de vontade do testador chega-se a essa conclusão. Segundo o critério da interpretação dos negócios jurídicos
consagrado no Art.236º conclui-mos que no que respeita a uma declaração tácita em que dum comportamento se pode concluir um certo sentido negocial, tal
não exige a cônscia subjetiva por parte do autor desse significado implícito, que objetivamente ele possa ser deduzido do comportamento do declarante.

118. O valor do silencio como meio declarativo


A questão é a de saber se o silencio é entendido não apenas como um “nada a dizer”, mas como um “nada a fazer”, pode considerar-se um facto concludente
(declaração tácita) no sentido da aceitação de propostas negociais.
O Art.218º dá-nos essa resposta, estabelecendo que o silencio não vale como declaração negocial, a não ser que esse valor lhe seja atribuído por lei, convenção
ou uso. Repudia-se o velho princípio do “quem cala consente”, dado que isto seria inaceitável visto que violaria a autonomia das pessoas, dando-lhes sempre
ónus de responder a qualquer proposta de contrato. Poder-se ia também aproveitar da impossibilidade de responder das pessoas, por diversas razões
(excessivos afazeres, negligência), para se captares aceitações.

Só lhe caberá tal significado havendo norma legal ou convenção das partes nesse sentido, bem como nas hipóteses:
- de um uso prevalente em certo circulo social (uso geral p. exemplo num determinado ramo de atividade económica);
- ou uma prática estabelecida entre os contraentes a legitimar a atribuição de sentido negocial a um comportamento omissivo (uso particular, p. exemplo no
caso de uma pessoa enviar habitualmente a outra mercadorias que esta recebe, sem aceitar nem rejeitar, e paga em devido tempo, criando-se entre ambas uma
prática deste tipo);

Também é afastada a ideia de que o silêncio vale como declaração quando o silenciante podia e devia falar, o saber se devia ou não falar não é claro e mesmo se
houvesse o dever de falar, não se deve concluir do silêncio uma certa declaração, mas apenas a verificação de um incumprimento do dever de falar suscetível de
incorrer o silenciante na obrigação de reparar os danos causados a outrem pela frustração da sua confiança em receber uma reposta - dano da confiança ou
interesse contratual negativo.

Só tem valor como declaração quando a lei, convenção negocial ou o uso lho atribuam, caso so Art.923º nº2. No que respeita às mercadorias recebidas pelas
pessoas, quando remetidas com a proposta há legislação que protege o destinatário, que não é obrigado a recambiá-las, devendo apenas restitui-las se o
proponente as mandar buscar, estando na sua conservação apenas obrigado a abster-se de as deteoriar por dolo ou negligencia.

119. Declaração negocial presumida. Declaração negocial ficta


A declaração negocial presumida tem lugar quando a lei liga a um comportamento o significado de exprimir uma vontade negocial, podendo ilidir-se de tal
presunção mediante prova em contrário – artigo 350 n1 e 2. Exemplos: artigo 926º (vendas a contento e vendas sujeitas a prova, artigo 2225º (disposições
testamentárias a favor de uma generalidade de pessoas), etc.

A declaração negocial ficta tem lugar sempre que a um comportamento seja atribuído um significado legal tipificado sem admissão de prova em contrário.
Exemplos: Artigo 923º nº2, artigo 1054º. Em processo civil, o caso típico é a chamada confissão ficta (artigo 448º nº1 do código de processo civil)

O regime-regra é o de as presunções legais podem ser ilididas, mediante prova em contrário, só deixando de ser assim quando a lei o proibir (artigo 350 nº2).
Quer isto dizer que salvo os casos excecionais consagrados na lei, as presunções legais são presunções “tantum iuris”.

120. Protesto e reserva


Emitido certo comportamento declarativo pode o seu autor recear que lhe seja imputado por interpretação um certo sentido. Para o impedir o declarante
afirma abertamente não ser esse o seu intuito. A esta declaração dá-se o nome de protesto. O protesto tem o nome de reserva, quando consiste na declaração
de que um certo comportamento não significa renúncia a um direito próprio ou o reconhecimento de um direito alheio. Exemplos: o mutante recebe certa
importância, a titulo de juros mas, julgando ter direito a receber mais, declara não prescindir do excedente; a vítima de um acidente de aviação recebe do
causador deste uma soma pecuniária mas declara que isso não significa renúncia de receber o montante total dos danos que considera mais elevados, etc.

Afirma-se comummente que o protesto não vale quando o comportamento declarativo só consente a interpretação contra a qual o declarante se quer
acautelar. É o pensamento expresso no aforismo protestitativo facto contraria nihil relevat (por exemplo: a declaração de não querer ratificar um negócio, ao
mesmo tempo que se utiliza ou consome prestação dele derivada). A validade deste aforismo não tem, porém, um alcance absoluto.

121. Forma da declaração negocial


Vantagens e inconvenientes do formalismo negocial. O formalismo negocial tem as seguintes vantagens principais:
- Assegura uma mais elevada dose de reflexão das partes. Nos negócios formais, o tempo que medeia entre a decisão de concluir o negocio e a sua celebração
permite repensar o negocio e defende as partes contra a sua ligeireza ou precipitação dá-lhes oportunidade de medir a importância e os riscos do ato. No
mesmo sentido concorre a própria solenidade do formalismo.
- Separa os termos definitivos do negócio da fase pré-contratual (negociação)
- Permite uma formulação mais precisa e completa da vontade das partes, facultando a corresponde assistência especializada (sobretudo no caso de
documentos notariais)
- Proporciona um mais elevado grau de certeza sobre a celebração o negócio e os seus termos, evitando-se os perigos ligados à falível prova de testemunha.
- Possibilita uma certa publicidade do ato, o que interessa ao esclarecimento de terceiros.

Estas vantagens pagam-se, porém, pelo preço de dois inconvenientes principais:


a) Redução da fluência e celeridade do comércio jurídico.
b) Eventuais injustiças, derivadas de uma desvinculação posterior de uma parte do negócio, com fundamento em nulidade por vício de forma, apesar
de essa parte ter querido efetivamente o ato jurídico negocial.

Ponderando as vantagens e inconvenientes do formalismo negocial, sancionou o código civil (art. 219º) o princípio da liberdade de forma ou da
consensualidade. Considerando quanto a certos negócios jurídicos prevalecerem as vantagens sobre os inconvenientes admitiu porém numerosas e importantes
exceções a este princípio. Na sistemática do código as normas excecionais que exigem determinada forma encontram-se formuladas a propósito da
regulamentação especial dos negócios ou atos jurídicos a que essa exigência se refere, a alguns dos quais já se aludiu, quando se exemplificou a distinção entre
negócios formais e consensuais.

O formalismo exigível para um certo negócio pode ser imposto pela lei (forma legal) ou resultar de uma estipulação ou negócio jurídico das partes (forma
convencional) como acontece por exemplo, quando durante as negociações prévias se convenciona que o futuro ou futuros negócios entre partes se deverão
revestir de certa forma.
O problema da legitimidade da forma convencional é debatido na doutrina, o código resolveu-o no sentido da admissibilidade e eficácia dos negócios
determinativos da forma (art.223). Porém, é óbvio que o reconhecimento das estipulações das partes sobre forma do negócio não significa que os particulares
possam afastar, por acordo, as normas legais que exigem requisitos formais para certos atos, pois trata-se de normas imperativas. O reconhecimento da formal
convencional significa apenas, poderem as partes exigir determinados requisitos para um ato, pertencente a um tipo de negocial que a lei regula como não
formal ou que sujeita a um formalismo menos solene.

O negócio dirigido à fixação de uma forma especial para um ulterior negócio não está sujeito a formalidades. Com efeito não se exigindo no artigo 223º
quaisquer requisitos formais para o pacto sobre a forma ai previsto, este negócio cairá dentro do campo de aplicação do princípio geral do nosso direito: o
princípio da liberdade de forma (artigo 219º)

III – Âmbito da forma exigida – No que toca ao problema de saber quais as clausulas ou estipulações negociais a que a forma legal é aplicável, quando exigida
entende-se que a forma abrangia não só as clausulas essências do negócio jurídico mas também as estipulações acessórias típicas ou atípicas, quer as
contemporâneas da conclusão do negócio, quer as subsequentes, mas já não se estenderia tal exigência aos chamados pactos abolitivos ou extintivos.
O código civil de 1966 consagrou esta regra na medida em que estatui que em princípio as estipulações acessórias anteriores ao negócio ou estipulações
acessórias anteriores ao negócio ou contemporâneas dele devem revestir a forma exigida pela lei para o ato, sob pena de nulidade (art211). Admitem-se
contudo na mesma disposição restrições a este princípio. Reconhece-se a validade de estipulações verbais anteriores ao documento exigido para a declaração
negocial ou contemporâneas dele, desde que se verifiquem, cumulativamente as seguintes condições:
a) Que se trate de clausulas acessórias – não deve tratar-se de estipulações essenciais e parece dever igualmente tratar-se de estipulações adicionais
que completem documento, que estejam para além do conteúdo do mesmo e não de estipulações que o contradigam que estejam em contrário
dele.
b) Não sejam abrangidos pela razão de ser da exigência de documento (por exemplo: num contrato de compra e venda nada se diz num contrato de
compra e venda sobre o lugar e o tempo do pagamento mas prova-se que as partes convencionaram verbalmente que o preço seria determinado
em certa data e em certo local; parece que tal acordo verbal deve ser respeitado mas não havendo lugar à aplicação de quaisquer normas
supletivas.
c) Que se prove que as cláusulas acessórias correspondem à vontade das partes – este requisito é óbvio pois traduz-se na prova de que a estipulação
existiu, se sobre o ponto de acessório há cláusula no documento, o pacto verbal não será valido pois tem de se admitir que as partes, regulando
aquele ponto no documento, não quiseram de todo o pacto verbal anterior ou contemporâneo. Por outro lado, é manifesto que há uma presunção
natural de o documento ser completo, pelo que na dúvida sobre a existência de uma estipulação acessória anterior ou simultânea, adicional é de
decidir contra a sua existência.

Temos todavia que tomar atenção a possibilidade de as estipulações acessórias não formalizadas, a que se refere o artigo 221 produzirem efeitos em bem
menores do que prima facie pode parecer isto dado o disposto no artigo 394º que declara inadmissível a prova por testemunhas se tiver por objeto convecções
contrárias ou adicionais ou conteúdo de documentos autênticos ou particulares. Assim se defende o conteúdo dos documentos (seu caracter verdadeiro e
integral) contra os perigos da precária prova testemunhal. Em conformidade com a máxima “lettres passent témoins” da coordenação do artigo 221 com o
artigo 394 resulta que as estipulações adicionais não formalizadas, anteriores ou contemporâneas no documento, não abrangidas pela razão determinante da
forma, só produziram efeitos, se tiver lugar a confissão ou se forem provadas por documento, embora menos solene do que o exigido para o negócio (expl. Uma
carta no caso de um negocio dever constar de escritura publica)

Quanto aos pactos modificativos (adicionais ou contrários a clausulas acessórias ou essências constantes do documento) e aos pactos extintivos ou abolitivos o
numero dois do artigo 221 dispensa-os de forma legal prescrita para a declaração, se as razões das exigências especiais da lei não lhes forem aplicáveis. A
aplicação deste critério será segura em alguns casos. Considerava-se que os pactos pelos quais se altera a área do prédio vendido, ou aumenta ou se agrava as
obrigações por exemplo fiança, cuja constituição a lei sujeita a forma, devem considerar-se abrangidos pela exigência de forma legal; mas não já quando o pacto
cancele ou reduza as obrigações de alguma ou de ambas as partes (sujeição a um prazo da obrigação de pagar o preço, remissão do preço, limitação da
obrigação do fiador, etc.) Noutras hipóteses, porém, poderá haver lugar a dúvidas.
IV- Consequências da inobservância da forma:
a) Distinção doutrinal entre formalidades “ad substantiam” e formalidades simplesmente “ad probationem”: as primeiras são insubstituíveis por
outro género de prova, gerando a sua falta a nulidade do negocio, enquanto a falta das segundas pode ser suprida por outros meios de priva mais
difíceis de conseguir (confissão; era também o caso, no nosso antigo direito, do juramento)
b) Consequências da inobservância da forma no nosso direito:
a) Inobservância da forma legal -Em conformidade com a orientação da generalidade das legislações e com os motivos de interesse públicos
que determinam as exigências legais de forma. O Código Civil liga a inobservância da forma legal a nulidade, e não a mera anulabilidade.
Poderá parecer, à primeira vista, que tal solução conduzirá a resultados injustos. Com efeito, nula por falta de forma, uma compra em que o
comprador já pagou o preço ou um mútuo em que a quantia mutuada já foi entregue ao mutuário, parece que haveria um locupletam ento
injusto do vendedor ou do mutuário, pois não seria obrigado a entregar
a coisa vendida ou a restituir a importância recebida, dada a nulidade dos
contratos donde resultaria essa obrigação. Não se verifica, todavia, tal locupletamento à custa alheia, pois, uma vez declarado nulo o
negócio, deverá ser restituído tudo o que tiver sido prestado em consequência do negócio viciado, podendo a prova da prestação, para o
efeito desta obrigação de restituir, ser feita por qualquer dos meios de prova admitidos em geral pela lei. É o que resulta do artigo 289.º
(efeitos da
declaração de nulidade), disposição que está em coerência com o instituto (de aplicação subsidiaria do enriquecimento sem causa (art.473.
), embora o regime da obrigação de restituir particularmente quanto ao objeto (289.º, n.º 1, e 479.º) e quanto à prescrição (482.º), seja, na
hipótese de ter por fundamento uma declaração de nulidade, um regime não coincidente com o regime geral do enriquecimento sem
causa.
A nulidade deixará de ser a sanção para a inobservância da forma legal sempre que, em casos particulares, a lei determine outra consequência (art.220.º). Pode
suscitar-se, a este propósito, o problema de saber se o nosso direito, nalguns casos, não considerará certas formalidades como simplesmente probatórias ou
«ad probationem».

Há que tomar em conta o artigo 364.º do atual Código, integrado nas disposições sobre direito probatório material constante do mesmo. Aí se reafirma no n1 o
princípio o geral, segundo o qual os documentos autênticos, autenticados ou particulares são formalidades «ad substanciam». No n.2, estatui-se que o
documento pode ser substituído por confissão expressa, se resultar claramente da lei que foi exigido apenas para prova da declaração. Donde se infere que
quaisquer documentos (autênticos ou particulares) serão formalidades «ad probatio nem», nos casos excecionais em que resultar claramente da lei que a
formalidade tida em vista ao ser formulada certa exigência de forma foi apenas a de obter prova segura acerca do ato e não qualquer das outras finalidades
possíveis do formalismo negocial (obrigar as partes a reflexão sobre as consequências do ato, assegurar a reconhecibilidade do ato por terceiros ou o seu
controlo no interesse da comunidade, etc.). Admite-se nestes casos, como meio de suprimento da falta do documento, a confissão expressa.

Nem sempre será isenta de dúvidas a aplicação do critério do n.º do artigo 364º: quando é que se poderá concluir «resultar claramente da lei que o documento
é exigido apenas para prova da declaração?” exemplo nítido era o correspondente ao artigo 1088º.Já se defendeu que era também, atualmente, o
caso do artigo 7º n.º 3, do Regime do Arrendamento Urbano.

Na doutrina nacional e estrangeira já se tem posto o problema de saber se a possibilidade de invocação da nulidade por vício de forma não pode ser excluída
por aplicação da cláusula geral da boa-fé ou do abuso do direito entre nós sancionada no artigo 334º
É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou
económico desse direito». Deverá admitir-se a invocação da nulidade com fundamento em vício de forma, quando essa invocação por uma das partes constitua
um abuso do direito, isto é, quando o comportamento do invocante, globalmente considerado, seja intoleravelmente ofensivo do nosso sentido ético-jurídico?

Assim, p. ex., será verdadeiramente escandalosa, «excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou
económico desse direito» (art. 334º) a arguição da nulidade, com fundamento em vício de forma, por um contratante que a provocou, fazendo como que
falsificar por outrem a sua própria assinatura ou induzindo dolosamente a outra parte a não insistir pela formalização do negócio ou procedendo em termos de
criar na outra parte a expectativa de que a nulidade jamais seria arguida, aceitando, p expl. Públicos, reiterados e dispendiosos testemunhos de gratidão por
uma liberalidade feita, aliás, sem a forma devida. A doutrina tem discutido o problema desde há décadas. Propendia-se para a solução da improcedência da
arguição da nulidade, quando esta arguição revestisse as características de um abuso de direito.

Alguns autores, porém, não admitiam que o princípio do abuso de direito (ou o princípio da boa fé) pudesse limitar a eficácia das normas que exigem a forma,
dados os fins imperativos de segurança que estas têm em vista, pelo que deveriam ser estritamente aplicadas («jus strictum»). Neste sentido se pronunciou
também, num primeiro momento, LARENZ (S48), que, todavia, corrigia a injustiça concreta resultante da indefetível aplicação das regras sobre o formalismo,
impondo, em caso de abuso de direito, ao autor do abuso, a obrigação de indemnizar a outra parte pelo interesse contratual negativo.

Já na anterior edição desta obra se defendeu a primeira solução (embora reconhecendo que o problema, como caso-limite, dava margem a largas
dúvidas).
É certo que a aplicação das regras de forma pode conduzir a uma ou outra solução de menos equidade, sem que possa, todavia, afastar-se a sua aplicação
nesses casos, pois trata-se de um preço conscientemente pago para fruir o rendimento social correspondente às vantagens do for- malismo negocial. É da
essência do direito encarar as condutas subspecie societatis e não sub specíe individui. Entre essas vantagens está a criação e tutela do valor de segurança
jurídica, que só pode ser plenamente realizado sacrificando o critério de “justiça de cada caso”. Esta perspetiva é correta, pois, de outro modo, renunciar-se-ia à
realização do interesse público que subjaz à formulação das exigências de formalismo negocial. Dela decorre que os negócios, afetados por vício de forma,
tenham de ser nulos: se assim não fosse, não se garantiria o acatamento dos preceitos sobre a forma, que passariam a ser meras recomendações.

Tal consideração não exige, porém que as regras da boa forma devam ser consideradas um jus strictum indefetivelmente aplicado, sem qualquer subordinação a
um princípio supremo do direito, verdadeira exigência fundamental do “jurídico” como é o do artigo 334º (abuso do direito). O interprete, desde que lealmente
aceite como boa e valiosa para o comum dos casos a normal que prescreve a nulidade dos negócios feridos de vicio de forma, está legitimado para, nos casos
excecionalíssimos do artigo 334º, afastar a sua aplicação tratando-se a hipótese como se o ato estivesse formalizado. Fora destes casos excecionalíssimos se
uma das partes atou com má-fé nas negociações, o negócio é nulo, mas surgirá uma indemnização por força do artigo 227º

Aliás, os próprios autores que sustentavam o caracter de jus strictum das normas sobre a forma procuravam as escandalosas injustiças a que dá lugar o abuso do
direito através de uma indeminização do chamado dano de confiança. A segurança e a vida jurídica da certeza do direito sendo valores de importância
fundamental na ordenação da vida social e compreendendo-se o seu acatamento mesmo que para isso se pague o tributo de alguma injustiça, não podem ser
afirmadas com sacrifício das elementares exigências do “justo”.

Atualmente a doutrina admite-se que a invocação da nulidade por vicio de forma não proceda quando se verifiquem certas circunstancias qualificadoras da
situação enquadrando-se tais casos seja numa responsabilidade pela confiança seja nos institutos do abuso do direito e da boa-fé. E também a jurisprudência
nacional tem admitido que a invocação da nulidade por falta da forma legalmente exigida possa ser impedida pela proibição do abuso do direito, já desde os
anos 70. São hipóteses enquadradas no abuso do direito de dolus praeteritus em que uma parte obstou à observância da forma legal pré-ordenadamente, para
vir depois a invocar esse vicio ou de inadmissível comportamento contraditório (de venire contra factum proprium ), em que a falta de forma, mesmo que não
provocada dolosamente pela parte que a vem invocar, lhe é imputável , tendo a outra parte efetuado um «investimento» com base na confiança depositada na
validade do negócio.

Há que ter em conta, todavia, que a solução com base no abuso de direito poderá não ser viável ou adequada, pois a exigência legal de forma serve também
interesses públicos e a nulidade pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal. Nestes casos, restará ao lesado exigir o ressarcimento dos danos sofridos, com
fundamento em responsabilidade pré-contratual da outra parte (quando for esse o caso).

Inobservância da forma convencional -Rege a este respeito o artigo 223.º É óbvio que, tratando-se de averiguar quais as consequências da falta de requisitos
formais que a lei não exige, mas as partes convencionaram, a resposta ao problema posto deve ser pedida, em primeiro lugar, à vontade das partes. O artigo
223.º limita-se a estabelecer presunções que, como todas as presunções legais, são em princípio meramente relativas ou «tantum juris» (art. 350.°). Essas
presunções são duas, variando com o facto que é base da presunção. Assim:
1) Se a forma especial foi estipulada antes da conclusão do negócio, consagra-se uma presunção de essencialidade, isto é presume-se sem a
observância da forma, o negócio ineficaz a forma tem, pois, carácter constitutivo;
2) Se a forma foi convencionada após o negócio ou simultaneamente com ele, havendo, nesta última hipótese, fundamento para admitir que as
partes se quiseram vincular desde logo, presume-se que as partes não quiseram substituir o negócio, suprimindo-o e concluindo-o de novo, mas apenas visaram
consolidá-lo ou qualquer outro efeito (p. ex., dar-lhe mais clareza, tomar a prova mais segura, dar-lhe fé em face de terceiros, etc.)

122. Perfeição da declaração negocial


A declaração negocial com um destinatário ganha eficácia logo que chegue ao seu poder ou é dele conhecida. As declarações não reptícias tomam-se eficazes
logo que a vontade se manifesta na forma adequada.

Desta doutrina, constante do artigo 224.º, n.º 1, decorre, para os contratos, ter a nossa lei optado pela doutrina da receção quanto ao momento da sua
conclusão. Quer dizer: o contrato está perfeito quando a resposta, contendo a aceitação, chega à esfera de ação do proponente, isto é, quando o proponente
passa a estar em condições de a conhecer.

Concretizando algo mais: quando a declaração de aceitação foi levada à proximidade do destinatário de tal modo que, em circunstâncias normais, este
possa conhecê-la, em conformidade com os seus usos pessoais ou os usos do tráfico (v. g., apartado, local de negócios, casa); uma enfermidade, uma ausência
transitória de casa ou do estabelecimento são riscos do destinatário, e também é considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por
ele recebida - artigo 224º nº2 (nos termos do n. 3 do artº224) todavia, é ineficaz a «declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não
poder ser conhecida»). Não será preciso tanto, todavia, se, por qualquer meio, foi dele conhecido.

123. Em que consiste o problema. Posições possíveis.


O negócio jurídico, como qualquer outra manifestação do espirito humano, postula uma interpretação. Só que nos negócios juríd icos como nas leis -a
interpretação não visa pôr em relevo um resultado destinado a uma pura assimilação ou compreensão intelectuais (uma mensagem) ou afetivas, mas tem em
vista evidenciar um conteúdo normativo (um conjunto de comandos) que vai pautar a conduta de algumas pessoas (no negócio jurídico, a conduta das
respetivas partes).

A interpretação nos negócios jurídicos é a atividade dirigida a fixar o sentido e alcance decisivo dos negócios, segundo as respetivas declarações integradoras.
Trata-se de determinar o conteúdo das declarações de vontade e, consequentemente, os efeitos que o negócio visa produzir, em conformidade com tais
declarações, e virá a produzir, se não houver qualquer motivo de invalidade.

Como atividade ou operação dirigida à fixação do sentido negocial, a interpretação não pode ser abandonada ao senso empírico de cada intérprete, mas deve
pautar-se por regras ou critérios cuja formulação é, precisamente, o objeto da teoria da interpretação dos negócios ou hermenêutica negocial.

A teoria da interpretação pode ver e vê frequentemente alguns dos seus resultados convertidos em verdadeiras normas jurídicas – dirigidas ao juiz às partes –
onde se fixam os princípios ou critérios interpretativos é o caso dos artigos 236º e seguintes do atual código civil.

II – Para haver uma declaração e interpretar é necessário estarmos perante um ato ou uma conduta voluntaria equiparável, uma ação ou omissão controláveis
pela vontade. Não é declaração negocial – não é rigorosamente ato humano – uma manifestação feita durante o sono, em narcose ou em situação que exclua
toda a direção consciente da vontade bem como a coação absoluta.

Apesar de corresponder ao estado atual do nosso direito civil uma perspetiva objetivista da declaração negocial, não podemos ver nela uma mera notificação ou
comunicação, um simples indício probatório da existência da correspondente vontade dos efeitos jurídicos. Não podemos deixar de a considerar como um ato
determinante, uma manifestação de validade que é o fundamento imediato da verificação dos efeitos jurídicos. Além de ser um ato determinante, a declaração
é também porém um ato social de comunicação que tem de ter relação com aquele a quem se destina ou o conhece. Estes dois aspetos que, exacerbados
conduziram ao “dogma da vontade” ou ao “dogma da declaração” acerca da essência do negócio jurídico conjugam-se na prevalência do elemento objetivo, não
de prendível, porém, da existência de uma vontade de agir (com consciência de validade)

III- As duas tarefas fundamentais da hermética dos negócios jurídicos são dar resposta as seguintes questões:
a) Qual o tipo de sentido negocial decisivo, cuja determinação constitui o fim da atividade interpretativa?
b) Quais os elementos, os meios ou subsídios que o intérprete deve tomar em consideração na busca do sentido negocial relevante?

A resposta dada à primeira questão condicionará, aliás, a resposta a dar à segunda.


IV - Teoria da interpretação dos negócios jurídicos tem dado lugar à formulação de conceções opostas. Não vamos descrever agora as numerosas variantes que
têm sido propugnadas dentro de cada um dos grupos de doutrinas. Basta que se tome conhecimento da existência de posições subjetivistas e de posições
objetivistas.

Para as posições subjetivistas o intérprete deve buscar, através de todos os meios adequados, a vontade real do declarante. O negócio valerá com o sentido
subjetivo, isto é como foi querido pelo autor da declaração.

Para as posições objetivistas o intérprete não vai pesquisar a vontade efetiva do declarante, mas um sentido exteriorizado ou cognoscível através de certos
elementos objetivos. O objeto da interpretação não é a vontade como «facto da vida anímica interior», mas a declaração como ato significante. É uma
interpretação normativa e não uma interpretação psicológica. Não se dá relevo necessariamente à vontade real do declarante, nem sequer necessariamente à
vontade real do declaratório. Não estamos perante uma mera averiguação de factos; há que averiguar factos, mas a conclusão, a partir deles, é valoração
jurídica e critério normativo.

De entre as doutrinas objetivistas merece referência, por ser a melhor das suas variantes, a chamada teoria da impressão, do destinatário; a declaração deve
valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratório, lhe atribuiria; considera-se o real declaratório nas
condições concretas em que se encontra e tomam-se em conta os elementos que ele conheceu efetivamente mais os que uma pessoa razoável, quer dizer,
normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido, e figura-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratório razoável.

Órgão, agente e mandatários (distinção)


→ Órgãos são a própria pessoa coletiva em presença – podem ser deliberativos (são a cabeça da empresa) ou executivos (põem em marchas as execuções
tomadas por órgãos deliberativos).
→ Os agentes são funcionários das pessoas coletivas encarregados de praticar operações materiais mais ou menos complexos em função do encargo do
funcionário – contabilidade, fotocópias, arquitetos.
→ Os mandatários são pessoas encarregues de celebrar atos jurídicos em nome das pessoas coletivas – podem ser gerentes ou diretores.

Sindicato dos bancários do sul e ilhas: corporação porque visa interesse comum, de direito privado, utilidade pública, e tipo de fim económico mas não lucrativo.
Fundação Eugénio de Almeida: pessoa coletiva de direito privado, utilidade pública e o fim é desinteressado e altruístico
Pedra e Cal construções lda: pessoa coletiva de direito privado, utilidade particular e interesse económico lucrativo (sociedade por cotas)
Fabrício Cunha – canalizações unipessoal lda: pessoa coletiva de interesse privado, utilidade particular e interesse entómico e lucrativo, (sociedade comercial
unipessoal)
Associação dança jazz: (uma associação não pode ser uma sociedade) pessoa coletiva de direito privado, utilidade publica e de interessado eu egoístico, de fim
ideal não económico
Balancete- SEROT (Sociedade de revisores oficiais de cotas) Pessoa coletiva de direito privado e utilidade particular, interesse económico e lucrativo (sociedade
civil sob forma civil)
Associação dos amigos das cegonhas: pessoa coletiva de direito privado, atividade pública, de fim desinteressado ou altruístico

Quase negócios jurídicos


Simples atos jurídicos
Facto Involuntário ou natural “ex lege” Atos materiais ou operações jurídicas
Jurídico Voluntário = ato jurídico Receptícios
Unilaterais Não receptícios
Negócios jurídicos
(ex voluntate) Contratos
Unilaterais

Bilaterais

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