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TEORIA GERAL DO DIREITO PRIVADO

SITUAÇÕES JURÍDICAS – situações da vida que têm relevância jurídica


 Ativas: titularidade de um direito ou de um poder (poderes)
 Passivas: titularidade de um dever ou de uma adstrição (deveres, vinculações)
Geralmente as situações jurídicas são complexas, integram componentes ativos e passivos.

RELAÇÃO JURÍDICA – como estrutura, é particularmente hábil para os direitos relativos,


sobretudo para os direitos de crédito, e não deve ser abandonada; mas não se lhe pode pedir
que explique tudo no Direito.

É relacional uma situação jurídica que se insere numa relação jurídica.


Exemplo: a situação do credor ou dever numa relação jurídica creditícia
A situação do proprietário não se insere numa relação jurídica.
Os direitos de personalidade não são relacionais.
É mais eficiente exprimir por posição jurídica a situação jurídica relacional ou não, em que se
encontra colocado, alguém no Direito.

NOÇÃO JURÍDICA DE PODER – disponibilidade dum meio para atingir determinado fim
ou conjunto de fins cuja utilização o direito regula de modo unitário.
A noção de poder jurídico não deve ser confundida com poder de facto.
Só é um poder jurídico a disponibilidade de meios, dentro daquilo que é permitido ao Direito.
Na noção de poder jurídico desempenha um papel determinante ilicitude.

PODERES DE GOZO
Traduzem se na disponibilidade do uso e da fruição de certo bem.

PODERES CREDITÍCIOS
Possibilidade de exigir licitamente de outrem uma certa conduta ativa (ação) ou passiva
(omissão).
O exercício de poderes creditícios exige e pressupõe a cooperação do devedor. Os poderes
creditícios são por isso de caracter relacional, isto é, relacionam o seu titular - o credor – com a
pessoa que lhe esta vinculada – o devedor.
Os poderes de gozo são absolutos.

PODERES POTESTATIVOS
Traduzem se na possibilidade de unilateralmente produzir um efeito jurídico de provocar uma
modificação na esfera jurídica de outra pessoa, sem a sua cooperação, sem o seu
consentimento e até contra a sua vontade.
Os poderes potestativos não necessitam da cooperação das pessoas em cuja esfera jurídica
vão produzir a sua eficácia.
Os poderes potestativos correspondem, no lado passivo, por sujeições – esfera jurídica da
pessoa sujeita poder ser modificada pelo titular do poder potestativo, sem que o possa
impedir.
Os poderes potestativos costumam ser designados como direitos potestativos.

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DIREITO EM SENTIDO OBJETIVO E EM SENTIDO SUBJETIVO
Direito Objetivo – corresponde á ordem jurídica globalmente entendida como uma ordem
normativa do agir com Justiça; ordem de agir que contem os critérios e as regras do agir justo
numa dada comunidade de pessoas.

DIREITO SUBJETIVO – modo como certa pessoa pode agir justamente no seio da OJ global; o
critério de agir é centrado na pessoa concreta que age e no modo como ela pode agir em
determinada circunstancia. É neste sentido que se diz que certa pessoa tem direito de
propriedade sobre uma coisa que lhe pertence ou que tem um direito de crédito de certa
quantia sobre um seu devedor. Os direitos subjetivos estão muito ligados á autonomia privada,
são uma manifestação poderosa da liberdade da pessoa.

O direito subjetivo é composto por poderes e também subordinadamente de deveres.


O direito subjetivo pode conter poderes de gozo, poderes creditícios e poderes potestativos.
Pode conter também, embora apenas acessoriamente, deveres e ónus.
 O direito de propriedade por exemplo tem o seu núcleo fundamental preenchido por
poderes de gozo. Estes traduzem-se no uso (faculdade de licitamente aproveitar a
utilidade que a coisa tem para a realização dos fins do seu dono) na fruição (colher a
fazer seus e consumir os frutos que produzir).

 A ideia de licitude é fundamental na distinção de gozo conforme ao direito e de


apropriação de coisa alheia (furto).

 O direito de crédito tem no seu cerne a pretensão – exigência dirigida pelo titular do
direito a uma outra pessoa que está vinculada a agir de certo modo.

 Os poderes potestativos e as correspondentes sujeições também têm um papel muito


importante no direito subjetivo. Por exemplo, o poder que cabe ao credor de interpelar
o devedor para que cumpra, constituindo-o assim em mora, é um poder potestativo.

 O direito subjetivo comporta também vinculações ou deveres. Continuam a existir


deveres de boa fé (762º CC). Exemplo: dever do mínimo dano

 Os direitos subjetivos também contem frequentemente ónus – encargo ou sacrifício que


o titular do direito tem de sofrer para que possa beneficiar de uma vantagem. Não deve
ser confundido com um dever. Exemplo: 1220º CC

Dividem-se em:
 Direitos absolutos - aqueles que são oponíveis erga omnes, que podem ser exercidos
contra todos. Exemplo: direitos de personalidade e de propriedade
 Direitos relativos - só podem ser exercidos contra certas pessoas. Exemplo: direitos de
crédito

A substancia do direito subjetivo prende-se com a realização de fins do seu titular, com os meios
(bens) que servem de instrumento a essa realização.
O direito subjetivo é substancialmente funcional, tem um sentido de utilidade que se perde se
não se tiver em atenção qual o fim do titular que deve realizar.

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A substancia do direito subjetivo resulta da afetação jurídica de bens aos fins de pessoas e não
da afetação jurídica de bens à realização de fins da sociedade – É esta uma das principais
diferenças que permitem distinguir o direito subjetivo do direito objetivo
A função principal do direito subjetivo é pessoal. São a satisfação pessoal do titular do direito e
o seu interesse que orientam finalisticamente o conteúdo e o exercício do direito subjetivo.

No entanto, o direito objetivo também exerce influencia sobre o direito subjetivo: jus- eticidade;
princípios ético jurídicos como a boa fé e os bons costumes.

LIMITES DO DIREITO SUBJETIVO – ABUSO DE DIREITO


Os limites consagrados no 334º são de 3 ordens: boa fé, os bons costumes e o fim social e
económico do direito.

a. Contrariedade à boa fé
No contacto social envolvido no exercício do direito subjetivo, o titular do direito deve
agir com boa fé. Ver 762º nº2 também.
 Honeste agere: o direito deve ser exercido honestamente, como deveria ser
exercido por uma pessoa de bem
 Alterum non laedere – princípio do minino dano: o direito deve ser exercido de
modo não danoso, ou do modo menos danoso possível. O exercício do direito
não permite ao seu titular causar a terceiros danos desnecessários e evitáveis.
 Venire contra factum proprium: o direito deve ser exercido sem frustrar
expectativas criadas pelo seu titular. No exercício do direito o seu titular deve
respeitar a fé, deve evitar frustrar a confiança que tenha suscitado em outrem
– inadmissibilidade de comportamentos contraditórios. Uma vez consolidada a
confiança e a expectativa, desde que essa consolidação da confiança seja
imputável ao titular do direito, a brusca inflexão de atitude é contrária à boa fé.
Inalegabilidade formal – aquele que dá lugar ou permite que se mantenha um
vício conducente à invalidade formal de um ato ou negócio jurídico age
contraditoriamente quando vem depois invocar a invalidade decorrente da
deficiência formal que provocou ou permitiu.

b. Contrariedade aos bons costumes


O direito faz parte da ética e nada pode valer como direito se for contrário à ética, à
moral, aos bons costumes.
A clausula geral dos bons costumes é mais ampla que a da boa fé.
Trata-se de um dever ser imanente no ser, que não se encontra muitas vezes nas
palavras da lei, mas que é respeitado no exercício do direito pelas pessoas de bem.

c. Desvio em relação ao fim social ou económico


É frequente, embora não seja necessário, que o direito subjetivo além do seu fim pessoal
subjetivo, tenha também uma função social e económica objetiva, para a realização da
qual é reconhecida pela OJ ao seu titular. Sempre que assim suceda, o exercício do
direito será abusivo quando seja contrário a esse fim económico social que,
conjuntamente com o fim pessoal, preenche a sua função.

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A REPRESENTAÇÃO
Instituto jurídico que consiste no exercício jurídico em nome de outrem com imputação jurídica
na esfera da pessoa em cujo nome se atua.
Quem age – representante
Aquele em cuja esfera jurídica se produz a eficácia jurídica da ação – Representado
O ato praticado ou celebrado pelo representante é juridicamente imputado à autoria do
representado.

a. Representação e substituição
Na representação ocorre um fenómeno de substituição. O representante substitui o
representado no exercício jurídico. Esta é a principal utilidade da representação.
O representado pode estar impedido por ausência, incapacidade, ou doença por
exemplo ou pode simplesmente ser lhe mais conveniente ser representado por outra
pessoa.
Nem sempre que há substituição há representação.

b. Representação e legitimação
O representante não poderia atuar em nome do representado e agir sobre bens e
interesses do representado por falta de legitimidade. Se o fizesse, sem representação, a
eficácia do seu agir não se produziria na esfera jurídica do representado – 268º CC
A representação atribui ao representante legitimidade.
O que é característico da representação é a eficácia representativa. Os atos praticados
pelo representante são tidos como praticados pelo representado.

c. Representação e interposição
Na representação existe um fenómeno de interposição de pessoas. Entre o
representado e a outra parte introduz-se uma outra pessoa – o representante.
A interposição não significa só por si representação:
 Mandato sem representação (1180º e ss) : o mandatário age em nome próprio
e produz-se na sua própria esfera jurídica a respetiva eficácia, ficando obrigado
a transferir para o mandante as situações jurídicas adquiridas nesse exercício.
 Núncio: na nunciatura uma outra pessoa é designada para comunicar a vontade
de outrem, sem, contudo, lhe assistir qualquer margem de autonomia no agir:
o núncio limita-se a transmitir e não a emitir uma declaração da qual constitui
um mero veículo. Exemplo de nunciatura – casamento por procuração (1620º)
em que o procurador se limita a exprimir a vontade do nubente.

Atuação em nome de outrem


 258º CC
 O representante atua em nome do representado
 O representante, no agir representativo, deve deixar claro que não está a atuar em seu
nome mas sim em nome e representação de outrem.
 A representação não é oculta nem reservada
 A outra parte deve estar consciente de que o seu interlocutor é um representante e que
está a agir em nome do representado, por isso pode exigir que o representante faça
prova dos seus poderes sob pena de a declaração não produzir efeitos 260º

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 Revelado que a atuação é em nome de outrem, os seus efeitos nunca se poderão
produzir na esfera do representante
 Mesmo que faltem ao representante os necessários poderes (representação sem
poderes) a sua atuação é ineficaz perante o falso representado, mas não produz efeitos
na esfera jurídica do falso representante 268º
 Na representação há atuação em nome de outrem e atuação por conta de outrem.

Atuação por conta de outrem


 Atuar sobre bens ou interesses de outra pessoa que não os daquela que age
Exemplo: mandato sem representação (1180º) em que o mandatário age em nome próprio,
mas por conta do mandante

Representação sem poderes 268º


Os poderes de representação invocados não existem ou não são tao amplos como afirmado.
Há uma falta de poderes
O regime é o da ineficácia simples: os efeitos próprios dos atos não se produzem, nem na esfera
do falso representante nem na do falso representado
 O representante não está a atuar em nome próprio, logo a imputação do ato à sua
autoria e à sua esfera jurídica seria violentamente contrária à autonomia privada
 A ineficácia em relação ao suposto representado impõe se por falta de legitimidade do
falso representante para agir sobre a esfera jurídica daquele, em virtude da inexistência
dos invocados poderes de representação
A representação sem poderes não supõe atuação juridicamente reprovável por parte do falso
representante. Este pode estar convicto da existência dos poderes representativos que invoca.
Será já ilícita a invocação consciente de poderes de representação que não existem.

Ratificação – o suposto representado pode ratificar a atuação do falso representante.


Se assim fizer a eficácia dos atos praticados produz-se na sua esfera jurídica, como se os
poderes de representação existissem. A ratificação tem efeito retroativo “sem prejuízo
dos direitos de terceiro” e está sujeita à forma exigida para a procuração.
A outra parte do negócio pode exigir que o falso representante obtenha a ratificação do
ato e fixar-lhe um prazo para tal (a ratificação considera se recusada se não for feita
dentro desse prazo) ou revogar ou rejeitar o ato salvo se, no momento da conclusão,
conhecia a falta de poderes do falso representante.

Abuso da representação
Quem atua tem efetivamente poderes de representação, mas faz um uso incorreto dos mesmos.
Pressuposto - consciência do abuso. Se houver desvio no exercício de poderes representativos,
mas o representante não tiver disso consciência poderá haver incumprimento ou cumprimento
defeituoso da relação subjacente, mas não haverá abuso.
Só há abuso se o representante estiver consciente de que está a exercer os poderes
representativos de modo incompatível com a relação subjacente.

O abuso da representação não acarreta, em principio a ineficácia do agir representativo abusivo


(269º). Na representação voluntária o representante é fruto da livre de escolha do
representado, pelo que o risco de abuso deve recair sobre ele. O abuso é uma questão interna
entre representante e representado e não pode, em principio, ser oposta a terceiros.
O abuso só acarreta ineficácia se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso.

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Procuração
É um negocio jurídico unilateral pela qual alguém confere a outrem poderes de representação.
Pessoa que confere a procuração – constituinte
Pessoa a quem os poderes são conferidos – procurador
É um negócio unilateral que se completa com a declaração negocial do constituinte.

a. Procuração expressa
A procuração é outorgada através de uma declaração de vontade. Na maior parte dos
casos esta declaração é expressa. O constituinte declara então constituir seu procurador
alguém que identifica e a quem declara conferir poderes de representação para, em seu
nome, praticar certos atos ou celebrar certos negócios.

b. Procuração tácita 217º


Da existência dos poderes de representação é de concluir, com toda a probabilidade, do
comportamento tolerante daquele de quem a representação é invocada. A
concludência deve resultar do comportamento tolerante do representado e não do
comportamento daquele que invoca a qualidade de procurador.
O fundamento da procuração reside na autonomia privada e o comportamento do
representado constituiu uma declaração negocial tácita.

Substabelecimento 264º
O procurador pode, em principio, conferir a outra pessoa os poderes de representação que lhe
foram concedidos pela procuração.
 Com reserva – o procurador mantem os poderes de representação que tinha; o
procurador e o substabelecido mantêm um concurso de poderes de representação e
qualquer um deles os pode exercer.
 Sem reserva – cessam os poderes do procurador inicial que substabeleceu os seus
poderes.
O substabelecimento é diferente do mero recurso a auxiliares.

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INVALIDADE: NULIDADE E ANULABILIDADE
Nulidade – exemplos de negócios nulos
 Falta de forma imposta por lei
 Contrariedade a preceito de lei imperativa do conteúdo do negocio jurídico
 Negócios jurídicos cujo conteúdo ou fim com que foram celebrados sejam incompatíveis
com a Lei, a Moral e a Natureza.

Anulabilidade – exemplos de negócios anuláveis


 Negócios celebrados com falta de capacidade de exercício
 Viciados por erro
 Dolo
 Coação moral
 Usura
 Incapacidade acidental
 Negocio consigo mesmo
 Negocio usuário

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INTERESSE PÚBLICO E PRIVADO NA INVALIDADE
Nulidade Anulabilidade
 Ineficácia originária e o negocio nulo não chega a  Ineficácia superveniente, o negocio anulável nasce
alcançar eficácia jurídica válido mas precário e frágil. Pode vir a ser anulado
 Estão em causa interesses de ordem pública. É o mas também pode vir a não ser.
próprio OJ que não tolera o vicio e que não permite  Estão em causa interesses privados, o Direito permite
que o negocio chegue a ter eficácia, não aceita que as pessoas cujo interesse esteja em jogo que
o vicio seja sanado, permite a sua arguição por escolham e decidam livremente entre manter,
qualquer interessado sem limite de tempo e confirmar ou anular o ato. Não permite a arguição do
determina o conhecimento oficioso do tribunal. vicio por qualquer interessado nem o conhecimento
 O direito recusa a validade oficioso e estabelece prazos relativamente curtos
para a anulação, sendo que quando esgotados o vicio
se sana.
 O direito confere a certas pessoas especialmente
protegidas a faculdade de se libertarem do negocio
pedindo ao tribunal que o anule.
 É um regime especial de proteção.

CARACTER ORIGINÁRIO OU SUPERVENIENTE


Nulidade Anulabilidade
Ineficácia originária, invocável por qualquer interessado, Ineficácia superveniente, só é invocável pelas pessoas em
sem dependência de prazos e insanável cuja proteção seja estabelecida e é sanável pelo decurso do
Negocio nulo não chega verdadeiramente a vigorar, é prazo ou por quem tiver legitimidade para a arguir.
ineficaz desde o momento em que foi celebrado (ex tunc). Negócio anulável é originariamente válido e eficaz mas é
Um vez que a nulidade é originária, o Tribunal frágil e pode vir a ser anulado. Enquanto não for anulado, o
oficiosamente ou a requerimento da parte, não anula o negócio anulável é válido.
negocio, mas antes, declara a sua nulidade, limita-se a O tribunal emite uma decisão que torna o negocio invalido,
reconhecer e a declarar que o negócio é nulo. isto é, que anula o negocio que até então era válido.
Ação de nulidade é declarativa Ação de anulação é constitutiva.

LEGITIMIDADE
Nulidade Anulabilidade
É de conhecimento oficioso e o tribunal deve declará-la Não pode ser invocada oficiosamente pelo Tribunal e só têm
logo que dela se aperceba, sem que seja necessário o legitimidade para requerer a anulação “às pessoas em cujo
requerimento da parte nesse sentido. interesse a lei estabelece” 287ºCC – legitimidade ativa é
Tem ainda legitimidade para requerer a declaração de restrita às pessoas que são especialmente protegidas , as
nulidade “qualquer interessado” 286º CC – tem anulabilidades são tipicamente regimes de proteção,
legitimidade qualquer pessoa que esteja interessada na estatuídos em beneficio de certas pessoas e a legitimidade
declaração de nulidade para anular é restrita a essas mesmas pessoas.
RETROATIVIDADE
Nulidade Anulabilidade
A eficácia jurídica não se chega a verificar e por isso não é Apenas a retroatividade da anulação o é em sentido próprio
correto em termos técnicos falar de retroatividade.
Todavia, como muitas vezes o negócio nulo, antes da
declaração de nulidade, produziu efeitos tácitos torna-se
necessário reger juridicamente o modo de repor a
situação.
CADUCIDADE
Nulidade Anulabilidade
Pode ser invocada a qualquer tempo. Só pode ser requerida dentro de 1 ano subsequente à cessação
do vicio que a origina, ou, sem limite de tempo, enquanto o
negócio não estiver cumprido – regime geral
A contagem do prazo de anulação começa quando cessa o vício.

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Redução
A invalidade do negocio pode ser parcial – quando a causa da invalidade atinge apenas
uma ou algumas clausulas ou estipulações e ainda quando a invalidade resulta da
estipulação de algo excessivo.
A invalidade parcial pode implicar ou não a invalidade total.
Quando não acarrete a invalidade total do negocio este manter-se-á valido na parte não
afetada pela causa de invalidade e fica reduzido à parte válida.
 Dá-se a redução sempre que num caso de invalidade parcial, se mantenha como
válida a parte sã do negocio, sendo declarada nula ou anulada apenas a parte
viciada.

 A redução não pode contrariar a autonomia privada, logo, da redução não pode
resultar um negocio que as partes não teriam querido celebrar.

Pode ser:
 Legal – quando resulta de imposição legal independentemente da vontade das
partes
 Voluntária – quando depende da vontade das partes – REGRA GERAL

No caso de anulabilidade parcial – o tribunal só pode decidir sobre a redução no âmbito


do que lhe for pedido. Se uma das partes no processo pedir a redução, a outra pode
opor-se alegando que não teria celebrado o negocio sem a parte a reduzir; do mesmo
modo que se uma das partes pedir a anulação ou a declaração de nulidade total do
negocio, a outra pode opor se e pedir a redução.

No caso de nulidade parcial – o tribunal não pode deixar de conhecer a nulidade e só


deve deixar de reduzir quando se convença de que as partes não teriam celebrado o
negocio sem a parte viciada (292º)

Conversão
Pode ser entendida numa perspectiva que a aproxima da qualificação.
“Re-valoração do comportamento negocial das partes, mediante a atribuição de uma
eficácia sucedânea da que a ela se ajustaria se respeitasse os requisitos de validade e
eficácia do negócio”
Se nada no negocio mudasse com a conversão, este continuaria a ser afectado pela
invalidade. A re-valoração não é possível sem uma modificação do seu conteúdo. O
negocio antes e depois de convertido não é igual. Importa saber até onde pode o
negocio ser modificado, através da conversão, e manter-se ainda o mesmo negócio.

É preciso verificar se subsiste no negocio a converter matéria negocial suficiente para o


negocio depois de convertido e em seguida, se é licito dar vigência a essa matéria
subsistente, como negócio, e prescindir de tudo o que estava viciado, sem violentar a
autonomia privada.

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O relacionamento entre a redução e a conversão
 Em regra, há redução a não ser que se conclua que as partes não teriam
celebrado o negocio tal como reduzido (292º)
 Em regra, não há conversão, salvo quando o fim prosseguido pelas partes
permita supor que elas o teriam querido se tivessem previsto a invalidade (293º)

TEMPO: PRESCRIÇÃO E CADUCIDADE


Prescrição – efeito jurídico da inercia prolongada do titular do direito no seu exercício.
Traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente
em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita.
Pode ser invocada ativamente pelo obrigado antes mesmo de o titular do direito exigir
o cumprimento.
A prescrição resulta da desvalorização da inércia do titular no exercício do direito. Tem
também uma utilidade importante de dispensar o devedor de cumprir, depois de
esgotado o prazo legal.

 Prescrição comum – o beneficiário só precisa de invocar e demonstrar a inércia


do titular do direito no seu exercício durante o tempo fixado na lei. O regime
comum da prescrição é neutro em relação ao cumprimento ou incumprimento-
A prescrição ocorre, quer o devedor já tenha cumprido, quer não.
 Prescrição presuntiva – funda-se na presunção do cumprimento. Passados os
prazos da lei, o devedor pode opor a prescrição à pretensão do credor. Esta
presunção é ilidível e o credor pode ainda alegar e demonstrar que o devedor
não cumpriu. Passado certo tempo sem o credor exigir o cumprimento,
presume-se que o devedor já cumpriu.

Caducidade – extinção de um direito pelo decurso do respetivo prazo.


Estão sujeitos a caducidade os direitos que devam ser exercidos durante certo prazo
298º/2.
Estão sujeitos a prescrição direitos subjetivos disponíveis, que não sejam direitos reais
e que não sejam temporários; estão sujeitos a caducidade os direitos temporários, isto
é, aqueles cujo exercício esteja sujeito a certo prazo.

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A DECLARAÇÃO NEGOCIAL
A declaração negocial é um comportamento voluntário que se traduz numa
manifestação de vontade com conteúdo negocial, feita no âmbito do negocio.
Negocio jurídico unilateral – a declaração negocial preenche a totalidade do ato jurídico
e esgota a sua materialidade
Contrato – pluralidade de declarações negociais
Pode ser:
 Recipienda – quando tenha um destinatário especifico
 Não recipienda – quando seja feita a uma ou mais pessoas indeterminadas

A declaração negocial torna-se perfeita quando se consuma, isto é, quando se liberta do


seu autor e ganha uma substancia própria e quando alcança a finalidade que lhe foi
imprimida. Ao tornar-se perfeita a declaração negocial alcança a sua plena eficácia.

Eficácia das declarações negociais – artigo 224º


As declarações negociais tornam-se perfeitas no tempo em que chegam ao poder do
declaratário ou são dele conhecidas.
É irrelevante que o declaratário, que tem em seu poder a declaração, a não leia ou dela
não tome conhecimento. Se não o fizer, a declaração torna-se perfeita e plenamente
eficaz. Sempre que a não receção da declaração pelo declaratário seja devida apenas a
sua culpa a declaração torna-se eficaz.
A declaração só se torna eficaz se a sua receção foi devida apenas a culpa do
declaratário. Se houver também culpa do declarante ou de terceiro, ou caso fortuito ou
de força maior, já assim não sucede.

Declaração expressa Vs Declaração tácita – artigo 217º


Declaração expressa – o comportamento finalisticamente dirigido a exprimir ou
comunicar algo. A declaração expressa não tem necessariamente que ser verbal, pode
ser simplesmente gestual. Ex: caso de licitação em leilão com um simples aceno

Declaração tácita – o comportamento do qual se deduza com toda a probabilidade a


expressão ou a comunicação de algo, embora esse comportamento não tenha sido
finalisticamente dirigido à expressão ou à comunicação daquele conteúdo; é aquela que
se deduz de um comportamento.

As declarações expressas e tácitas têm em principio o mesmo valor. Só nos casos em


que a lei exija é que a declaração tem que ser expressa (ex: 957ºCC)
Quando a lei nada diga em contrário, as declarações negociais tanto podem ser feitas
expressa como tacitamente.
Tanto as declarações tácitas como expressas podem ser recipiendas ou não.

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Valor jurídico do silêncio 218º
O silêncio é a ausência de declaração, a não declaração
O silêncio não deve ser confundido com a declaração negocial tácita. Nesta existe um
comportamento negocial que tem um sentido que é juridicamente relevante. No
silencio nada existe.
O silencio é a ausência de uma ação, é pura omissão.

O silencio só tem o valor jurídico que eventualmente lhe for atribuído por lei, por
convenção ou pelos usos. Para que o silencio tenha alguma relevância jurídica é
necessário que exista preceito de lei, ou convenção negocial ou um uso que lhe atribuam
esse valor.

Interpretação e integração das declarações negociais 236º a 239º CC (regras gerais) *

Posições subjetivistas – o negocio não podia valer sem o suporte da vontade do seu
autor, seria de acordo com a vontade subjetiva desse autor que deveria valer.

Posições objetivistas – a declaração negocial deveria ser interpretada segundo o sentido


que da própria declaração se depreendesse, de acordo com as circunstâncias do caso. A
teoria da interpretação teria como finalidade a determinação do sentido objetivamente
contido na declaração tal como expressa e como entendida pelo declaratário concreto
ou por um declaratário razoável.

* existem também regras especiais como por exemplo os artigos 10º e 11º do DL 446/85
de 25 de out relativos à interpretação das cláusulas contratuais gerais

Artigo 236º
Nº1 O sentido juridicamente relevante de uma DN é aquele que do comportamento do
declarante possa ser deduzido por um declaratário normal, colocado na posição do
autor da declaração, desde que esse sentido não contrarie a expectativa razoável do
autor da declaração.
Nº2 Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com
ela que vale a declaração emitida.

 Sempre que haja consenso das partes sobre o sentido da declaração deve ser de
acordo com ele que esta deve ser interpretada.
 Em caso de divergência entre o sentido subjetivo da declaração e o seu sentido
objetivo, prevalece o sentido subjetivo desde que o declaratário o conheça.
No caso de divergência em que o declaratário desconheça a vontade real do
declarante, pode então o sentido objetivo prevalecer, salvo se o declarante não
puder contar com ele, isto é, desde que ele não colida com a expectativa razoável
do autor da declaração.

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Artigo 237º - Relevância do caracter gratuito ou oneroso na interpretação
Negócios gratuitos – prevalece o sentido da declaração menos grave para o disponente
Negócios onerosos – prevalece o sentido que conduzir a um maior equilíbrio das
prestações

Exemplo: no caso de uma doação pura, a duvida é resolvida no sentido que for menos
pesado para o doador; no caso de uma compra e venda a duvida é resolvida no sentido
que maior equilíbrio económico consiga entre comprador e vendedor.

E nos casos intermédios?


O texto do artigo 237º do CC só é adequado aos casos de gratuidade ou onerosidade
perfeitas. No caso de contratos atípicos ou menos típicos (que não sejam nem
perfeitamente atípicos nem perfeitamente onerosos – casos intermédios), de acordo
com o espirito do 237 há que recorrer à interpretação de acordo com a equidade, para
dar solução às dúvidas suscitadas.

Artigo 238º - A interpretação dos negócios formais


Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha o
mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que
imperfeitamente expresso.

 As exigências legais de forma dos negócios jurídicos são excecionais e fundam-


se na necessidade de promover a ponderação das partes.
 Fundam-se também na necessidade de segurança do tráfego e de documentação
– proteção de terceiros.
 Fundam-se também na necessidade da sua publicidade. Exemplo: exigência legal
de escritura publica a propósito da compra e venda de imoveis
 A solenidade da forma pode também ser exigida por convenção – forma
convencional – e pode ter sido adotada espontaneamente no negocio
independentemente de uma especial exigência da lei ou de convenção – forma
voluntária.

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Integração das declarações negociais 239º
Na falta de disposição especial, a declaração deve ser integrada de harmonia com a
vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo
com os ditames da boa fé, quando outra solução seja por eles imposta.

A incompletude da estipulação negocial pode ser reparada, em principio, quer pelo


direito dispositivo, quer pela integração.

Forma das declarações negociais 219º a 223ºCC


A forma é o modo de exteriorização do negocio jurídico.
A regra atualmente é a de liberdade de forma – 219ºCC

A forma deve distinguir-se das formalidades que são atos ou factos complementares
cuja satisfação ou verificação são exigidas para a prática do ato ou para a celebração do
negócio.
Estas formalidades podem ser anteriores, concomitantes ou posteriores à celebração do
negócio.

Forma interna Vs Forma externa


Forma interna – participa do ser e da existência do ato; faz parte dele e sem ela o ato ou
não é qualificável como tal ou é mesmo juridicamente inexistente.

Forma externa – é a forma de que o ato se reveste, é algo que lhe acresce mas que não
participa da sua essência, do seu ser. Exemplo: escritura publica no contrato de compra
e venda de imóvel. É esta a que se referem os artigos no CC.

Forma “ad substantiam” e forma “ad probationem”


A falta de forma ad substantiam acarreta a nulidade do ato.
A falta de forma ad probationem acarreta como consequência a impossibilidade de
prova: o ato só pode ser provado com aquela forma, ou revestido de uma forma mais
solene. Sem a forma ad probationem o ato é válido mas não pode ser provado.

Em regra, as exigências legais de forma são ad substantiam.


Art.220º - o desrespeito pela forma exigida por lei tem como consequência a nulidade

Forma legal 221ºCC


Aquela que é exigida por lei.
Regra – 219º - Liberdade de forma
Exceção – a lei exige com alguma frequência que os atos e negócios jurídicos adotem
uma forma especial
O fundamento das exigências legais de forma é a necessidade de levar as partes a refletir
antes de praticarem atos consideravelmente graves.

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As exigências legais de forma são de ordem publica e têm por função acautelar
interesses relevantes; fundam-se principalmente em razões de publicidade, de
ponderação e de prova.
Ver artigos 221º e 238º
Exemplos – 168º, 185º e 981º CC

Forma convencional 223ºCC


É aquela que é exigida, não pela lei, mas pelas partes ou por uma delas.
A forma convencional não assenta em razoes de ordem pública.
É o interesse negocial interprivado e a autonomia privada que a fundamenta
Esta forma não poderá ser de solenidade inferior à forma legal, uma vez que a
convenção das partes não poderá valer contra preceito injuntivo da lei - limite

Caso em que a estipulação da forma convencional seja contemporânea ou posterior ao


ato – se houver fundamento para concluir que as partes se quiserem vincular desde o
momento em que celebraram o ato, presume-se que a convenção teve em vista apenas
a consolidação do negócio, mas não a sua substituição; em caso contrario deve ser
entendido que com a nova convenção sobre a forma, o negocio foi substituído ou
renovado.

Forma voluntária 222ºCC


É aquela que excede a exigida por lei.
Quando as partes adotam a forma escrita para a prática de atos para os quais a lei não
exige qualquer forma especial e que poderiam ser praticados de qualquer modo, até
oralmente.

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VÍCIOS DAS DECLARAÇÕES NEGOCIAIS

FALTA DE VONTADE NEGOCIAL – SITUAÇÕES EM QUE NÃO HÁ DECLARAÇÃO NEGOCIAL


Coação absoluta 246º
Referida como coação física
Caso em que o declarante for coagido pela força física a emitir a declaração negocial 
a declaração não produz qualquer efeito Inexistência

Enquanto na coação moral existe vontade negocial, embora essa vontade tenha sido
pressionada, influenciada, viciada pelo medo causado pela ameaça, na coação física
(absoluta) não existe qualquer vontade negocial, não há uma escolha.
A coação absoluta tem como consequência jurídica a inexistência, não existe uma
declaração negocial.

Falta de consciência da declaração 246º


Casos em que o declarante não tem consciência de fazer uma declaração negocial
O autor do comportamento não tem consciência de estar a emitir uma declaração
negocial, portanto, não está efetivamente a fazê-lo.
A falta de consciência da declaração importa inexistência.
A aparência que assim for criada pode vir a causar dano a alguém que a interprete como
uma verdadeira declaração negocial. Se ele tiver culpa na falta de consciência e na
criação dessa aparência de declaração negocial, incorrerá em responsabilidade civil e
deverá indemnizar os danos que assim causar.

Declarações não sérias 245º


Casos em que o autor da declaração a produz sem qualquer intenção negocial, na
expectativa de que isso seja conhecido pelo declaratário.
Exemplos: representações cénicas, teatrais
Há nestes casos a intenção da emissão daquelas declarações e a intenção de criar uma
aparência, mas há a convicção de que a falsidade da aparência é conhecida e que não
irá lesar ninguém.
Se a declaração séria for emitida em circunstâncias tais que “induzam o declaratário a
aceitar justificadamente a sua seriedade” o declarante incorre em responsabilidade civil
e terá de indemnizar os danos que causar com a sua prática.

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NA REPRESENTAÇÃO E NA DECISÃO
Simples
Erro vício
NA REPRESENTAÇÃO* * Usura (273º e 274º)
(251º a 254ºCC)
Dolo *Incapacidade acidental (257º)
Coação moral
Vícios

NA DECISÃO*
(255º e 256º CC)
Simulação (240º a 243º
CC)

Intencionais
Reserva mental (244ºCC)

NA EXTERIORIZAÇÃO Erro na declaração (247º


e 248º CC)

Erro de cálculo ou escrita


Nao intencionais
(249º CC)

Erro na transmissao da
declaração (250º CC)

1. VÍCIOS NA REPRESENTAÇÃO
Erro-vício
Consiste numa falsa perceção da realidade. Pode ser espontâneo ou provocado (dolo).
Artigo 251º - erro sobre a pessoa ou sobre o objeto do negocio
O erro sobre a pessoa resulta de uma desconformidade entre o conhecimento que a
parte tem da pessoa da outra parte.
O erro sobre o objeto tem uma grande amplitude.

Para que o negócio seja anulável é necessário que se verifiquem 2 pressupostos:


 Essencialidade - O negocio só é anulável se o erro for tal que sem ele a parte não
o teria celebrado ou pelo menos não o teria celebrado com aquele conteúdo.
 Cognoscibilidade - É ainda necessário que o declaratário conhecesse ou não
devesse ignorar a essencialidade

A parte que errou tem o ónus de demonstrar este duplo requisito: que se não tivesse
ocorrido o erro, não teria celebrado o negocio ou não o teria celebrado desse modo, e
que a outra parte sabia ou não devia desconhecer que assim era.
Se o vicio só tiver atingido parte e não a totalidade do negócio este poderá ser reduzido
– 292º
Se se demonstrar que ambas as partes teriam celebrado um negocio diferente se não
tivesse ocorrido o erro poderá eventualmente ser convertido – 293º

Erro sobre os motivos


Artigo 252º - erro que incida sobre os motivos determinantes da vontade, mas que se
não refira á pessoa do declaratário nem ao objeto do negócio.
É necessária a essencialidade do erro, mas a lei exige neste caso o acordo das partes
sobre a essencialidade.
A consequência jurídica do erro sobre os motivos também é a anulabilidade.

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Erro sobre a base do negócio
Artigo 252º/ 2
Algo exterior ao negocio que constitui o seu ambiente circunstancial envolvente, a
realidade em que se insere. É necessário que seja relevante para ambas as partes. Se for
relevante apenas para uma parte não é sobre a base do negócio.
É necessário que haja erro. É, pois, necessário que tenha ocorrido uma falsa
representação do quadro circunstancial que constitui a base do negócio.
Para que uma das partes invoque o erro, seja ele sobre o objeto ou a pessoa da
contraparte (251º), sobre os motivos (252º/2) ou sobre a base do negócio (252º/2),
basta que ela própria tenha incorrido em erro.

O dolo
Sempre que o erro (falsa representação da realidade) não seja espontâneo, mas sim
provocado, é tratado nos artigos 253º e 254º como dolo.
O negócio viciado por dolo é anulável.
Este envolve 3 elementos:
 Elemento objetivo (artificio ou embuste)
 Elemento subjetivo (intenção ou consciência) – pressupõe uma atitude
subjetiva do agente, que pode traduzir-se na intenção ou na simples consciência
de enganar ou manter no engano o autor da declaração
 Elemento finalista (de induzir em erro) – o embuste, seja consciente ou
intencional, deve ser finalisticamente dirigido a induzir ou manter em erro o
declarante, ou a dissimular esse erro

Distinção entre dolus bonus e dolus malus


Entre o embuste inadmissível e a boa técnica mercantil nem sempre a fronteira é
clara.
Artigo 253º/2 – dolo licito (as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos
segundo as conceções dominantes no comércio jurídico; a dissimulação do erro
quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da lei, de estipulação
negocial ou daquelas conceções)
Há dolo ilícito sempre que uma das partes use artifícios enganosos, omita
informações ou não cumpra o dever de esclarecimento com violação da boa fé e dos
usos próprios do comercio.
O critério de distinção entre dolus bonus e dolus malus integra o dever de boa fé pre-
contratutal (227º) e o imperativo dos bons costumes.

Para que tenha relevância anulatória é necessário que o dolo cause erro e que esse
erro seja essencial.

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Se ambas as partes se enganarem uma à outra (dolo bilateral) nem por isso a vontade
e o discernimento negociais deixam de ser perturbados – ambas as partes têm
legitimidade para pedir a anulação do negócio

Poe se a questão de saber se a anulação do negocio por dolo pode prejudicar o terceiro
que seja beneficiário “de algum direito por virtude da declaração”
Artigo 254º/2 – protege o terceiro inocente
Se o terceiro tiver sido o autor do dolo, se sabia ou se devia saber que houve dolo, o
terceiro beneficiário deixa de merecer proteção legal.

2.VÍCIOS NA DECISÃO
Coação moral
A decisão negocial que é extorquida por medo está viciada por falta de liberdade
suficiente. O negócio viciado por coação é anulável.
No caso da coação moral existe escolha, vontade negocial embora viciada pelo medo,
enquanto na coação física simplesmente não há vontade negocial.

Artigo 255º - requisitos da eficácia anulatória da coação moral


 Ameaça
 Ilicitude da ameaça (não constitui coação a ameaça do exercício normal de um
direito)
 Dupla causalidade da ameaça (é necessário que a ameaça seja finalisticamente
dirigida à prática do ato cuja viciação por dolo esteja em questão e não a
qualquer outro)
 Finalidade de extorquir a declaração negocial (a ameaça só tem relevância
anulatória se for efetivamente causal do ato ou do comportamento negocial
viciado – dupla causalidade – é necessário que a ameaça cause medo e que esse
medo, por sua vez, seja determinante do negocio viciado.)

Na usura a situação de inferioridade é pré existente, enquanto que na coação moral é o


agente que a cria.

2.1. VÍCIOS NA REPRESENTAÇÃO E NA DECISÃO


Usura 282º e 283º
É vicio da vontade e vicio do conteúdo. A situação de inferioridade é pré existente,
enquanto que na coação moral é o agente que a cria.
É vicio da vontade enquanto o discernimento e a liberdade de decisão vítima da usura
estão diminuídos.
É necessário que haja um aproveitamento consciente e reprovável da situação de
inferioridade da vitima e ainda que o negocio assim celebrado esteja desequilibrado
injustificadamente.

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 Negócio usurário – defeito de formação; defeito de conteúdo; colide com os
bons costumes.

Requisitos:
A. Desequilíbrio excessivo ou injustificado
Excessivo será o valor que se encontrar para além dos máximos ou mínimos que
forem normais ou típicos no mercado, no meio social e económico em que o
negócio for celebrado.
B. Inferioridade
Artigo 282º - situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência,
estado mental ou fraqueza de carácter
Não devemos cingir-nos demasiado á letra da lei, isto é, basta que se trate de
uma situação de inferioridade negocial tal que dessa inferioridade resultasse
para ele a inabilidade para compreender o mau negócio que fazia ou para evitar
fazê-lo.
C. Exploração reprovável
Exige que haja um aproveitamento consciente e intencional da vantagem
comparativa em que o usurário se encontra perante o lesado.
Esta situação de aproveitamento pode ser aceitável ou reprovável, tal como
acontece com o dolo, também a exploração da inferioridade alheia pode ser
aceitável segundo as conceções dominantes no comércio jurídico.
Será inaceitável a exploração que colida com a exigência de boa fé na celebração
do negócio. É aqui que a usura se aproxima da contrariedade à Moral.

Consequência jurídica – a anulação ou a modificação


O lesado pode livremente optar pela anulação ou pela modificação.
O usurário, se for pedida a anulação, pode oferecer a modificação, mas não pode tomar
a iniciativa de a pedir. Se for medida a modificação, não lhe assiste a faculdade de optar
pela anulação.
A anulação só pode ser pedida pela parte em proteção de quem foi estabelecida.
A modificação pode ser pedida por qualquer das partes porque se traduz na correção da
injustiça interna do negócio.

O regime da anulabilidade não tem especialidades em relação ao regime geral.


O regime da modificação tem como finalidade a reposição do desequilíbrio que o
inquina. A remissão para a equidade tem aqui o sentido da procura de um equilíbrio
económico entre as prestações.

Incapacidade acidental
A deficiência de discernimento e de liberdade na decisão negocial pode ser
momentânea. O declarante pode estar “acidentalmente incapacitado de entender o
sentido da declaração ou privado do livre exercício da sua vontade.

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O ato praticado em incapacidade acidental é anulável.
Artigo 257º/1 – para que haja anulabilidade, é necessário que a incapacidade em que
se encontra o declarante seja notória ou conhecida do declaratário. Se não conhecido
ou reconhecível o estado de incapacidade do declarante é irrelevante e não afeta a
validade do negócio.

3. VICIOS DA EXTERIORIZAÇÃO
Divergência entre a vontade e a declaração
O declarante ao exteriorizar a sua vontade e decisão negocial declara algo de diferente
do que queria.
A divergência entre a vontade e a declaração pode ser intencional ou não intencional.

DIVERGÊNCIA INTENCIONAL – declarante exterioriza a sua declaração com um


conteúdo diferente daquele que era o seu projeto negocial e fá-lo intencionalmente,
com consciência de que aquilo que declara é diferente daquilo que é o seu projeto
negocial.
 Simulação
 Reserva mental

DIVERGÊNCIA NÃO INTENCIONAL – declarante sem ter consciência e intenção


exterioriza deficientemente o seu projeto negocial, de tal modo que a declaração seja
diferente daquilo que queria
 Erro na declaração
 Erro de cálculo ou de escrita
 Erro na transmissão da declaração

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DIVERGÊNCIAS INTENCIONAIS
I. Simulação
Divergência bilateral entre a vontade e a declaração, que é pactuada entre as partes
com a intenção de enganar terceiros.
Na simulação, as partes acordam entre si emitir uma declaração negocial que não
corresponde à sua real vontade e fazem-no com o intuito de enganar terceiros.
Exemplo: simulação de preço na cv de imoveis para reduzir a sisa

3 elementos estruturais da simulação


 Acordo entre as partes com o fim de criar uma falsa aparência de negócio (pacto
simulatório)
 Divergência entre a vontade declarada e a vontade real
 Intuito de enganar terceiros

Na simulação é de crucial importância o pacto simulatório – acordo que tem como


conteúdo a estipulação entre as partes da criação de uma aparência negocial, da
exteriorização de um negócio falso. A esta aparência negocial pode corresponder um
negocio verdadeiro que as partes mantêm oculto ou pode também não corresponder
qualquer negocio.

Simulação relativa – quando sob a aparência criada com a simulação existir um negócio
oculto – negocio simulado e negocio dissimulado
Simulação absoluta – quando sob o negócio aparente nenhum negocio verdadeiro
existir – negocio simulado

Artigo 240º/2
O negócio simulado é nulo, mas o negocio dissimulado pode valer como se fosse
concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do
negócio simulado.
No caso da simulação relativa, o que vale é o negócio real (dissimulado); no caso da
simulação absoluta não existe um negócio real que possa valer, o negocio simulado não
tem relevância jurídica.

Artigos 242º e 243º


A posição jurídica dos simuladores é desvalorizada em relação à dos terceiros de boa fé,
no que respeita à legitimidade para arguir e à oponibilidade da simulação.
Aos terceiros de boa fé é reconhecida sem limites, a legitimidade para arguir a simulação
Os simuladores só podem arguir a simulação entre si, mas não podem opô-la a terceiros
de boa fé.

Tipos de simulação
 Subjetiva – incide sobre as pessoas intervenientes; é vulgar fazer intervir uma
contraparte falsa, com o fim de ocultar a identidade do verdadeiro interveniente
no contrato (interposição fictícia)

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 Objetiva – incide sobre o negócio ou alguma das suas cláusulas; por exemplo a
simulação de preço ou a simulação tipo

A simulação e a forma
Artigo 241º/2 – se o negocio dissimulado for de natureza formal, só é valido se tiver sido
observada a forma exigida por lei.

Manuel de Andrade + opinião do prof


É suficiente que o negócio aparente (simulado) respeite a forma exigida para o negócio
real (dissimulado) para que este seja formalmente válido.

Arguição da simulação
Artigo 240º/2 – Nulidade do negócio simulado – regime especial
A nulidade pode ser arguida pelos próprios simuladores entre si, ainda que a simulação
seja fraudulenta, mas não contra terceiros de boa fé. Nas relações dos simuladores um
com o outro, não há razão para proteger um em detrimento do outro. Entre os
simuladores não há restrições à invocabilidade da simulação.

Artigo 242º/2
Estatuto dos herdeiros dos simuladores – é permitida a arguição da simulação pelos
herdeiros legitimários que pretendam agir em vida do autor da sucessão contra os
negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar.

Artigo 243º
Não permite a arguição da simulação pelo simulador contra um terceiro de boa fé.
Só os terceiros inocentes são protegidos.
A posição jurídica dos terceiros de boa fé prevalece claramente sobre a dos simuladores
e dos terceiros de má fé

Prova da simulação
Artigo 394º/3 – a lei veda aos simuladores o recurso a testemunhas para a prova, quer
do pacto simulatório quer do negócio real (dissimulado), quando o negócio aparente
(simulado) esteja titulado em documento autentico ou particular.
Permite o recurso a testemunhas para a prova da simulação quando não for arguida
pelos simuladores, isto é, quando for invocada por terceiros.

II. Reserva mental


Artigo 244º - Divergência intencional e unilateral entre a vontade e a declaração, feita
com o intuito de enganar o declaratário.
Na reserva mental o declarante mente e tenta enganar.
A reserva mental é irrelevante, “não prejudica a validade da declaração”.
Não há ação sem exteriorização. A reserva mental não constitui, por isso, declaração
negocial.

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Se a reserva for conhecida pelo declaratário deixa de haver razão para o proteger. A
reserva mental quando conhecida pelo declaratário segue o regime da simulação –
analogia.

DIVERGÊNCIAS NÃO INTENCIONAIS


I. Erro na declaração
A divergência não intencional entre a vontade e a declaração ocorre sempre que o
declarante inadvertidamente faz constar da sua declaração algo que não coincide com
aquilo que queria declarar.
É importante distinguir o erro na declaração do erro vício:
 O erro vicio incide no processo de formação da vontade negocial; o erro
obstáculo prejudica, não já a formação da vontade, mas a sua expressão e causa
uma divergência não intencional entre o que a pessoa exprime e aquilo que ela
queria exprimir.
 No erro vicio a pessoa erra ao decidir; no erro obstáculo a pessoa erra ao
declarar.

Artigo 247º - A declaração afetada por erro obstáculo é anulável. A anulabilidade


depende de 2 pressupostos:
 Essencialidade – que o erro incida sobre um elemento do negocio que seja
determinante da sua celebração, isto é, que a parte que errou o não teria
celebrado se se tivesse apercebido do erro.
 Cognoscibilidade – é ainda necessário que a mesma essencialidade seja
conhecida, ou não deva ser ignorada da outra parte; basta que, nas
circunstâncias concretas do negócio, a outra parte devesse, com uma diligência
normal, conhecê-la.
A demonstração destes pressupostos constitui ónus de quem invoca o erro: da parte
que errou.

Artigo 248º - verificada a ocorrência do erro na declaração, o negocio mantem-se válido


se o declaratário aceitar o negócio como o declarante o queria.

II. Erro de cálculo ou de escrita


O declarante faz constar algo de errado na sua declaração, não porque tenha sofrido de
uma falsa perceção da realidade (erro vicio), nem porque se tenha enganado na
expressão (erro obstáculo) mas porque se enganou nas contas, porque errou numa
operação de cálculo.

Artigo 249º - estabelece um regime diferente da anulabilidade: o da correção do erro.


Em vez de se anular a declaração negocial, importa neste caso, corrigi-la. Isto desde que
se verifiquem os pressupostos da correção: que o erro seja revelado no próprio contexto
da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.

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III. Erro na transmissão da declaração
Artigo 250º - prevê o caso em que o declarante tenha incumbido uma outra pessoa de
transmitir a sua declaração – Núncio
O declarante formou bem a sua vontade e exprimiu-a corretamente ao núncio. Não
houve erro vicio nem erro obstáculo. O vicio na declaração ocorre no momento em que
o núncio comunica ao declaratário incorretamente aquilo que o declarante o incumbiu
de dizer.
O erro na transmissão da declaração tem o mesmo regime jurídico que o erro na
declaração.
Este regime pressupõe que seja inocente a divergência na transmissão da declaração
pelo núncio. Nº2 – se a inexatidão for devida a dolo do intermediário, a declaração é
sempre anulável, mesmo que não se verifiquem os requisitos

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